DUAS EXPERIÊNCIAS COM A UTILIZAÇÃO DE
TECNOLOGIAS INFORMACIONAIS E COMUNICACIONAIS
EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
Davis Oliveira ALVES
Universidade Federal de Ouro Preto
Fausto Rogério ESTEVES
Universidade Federal de Ouro Preto
Frederico da Silva REIS
Universidade Federal de Ouro Preto
RESUMO: O presente trabalho apresenta duas experiências realizadas com a utilização de
computadores, implementadas como parte de um projeto de pesquisa que norteará as
dissertações dos dois primeiros autores, os quais cursam o Mestrado Profissional em Educação
Matemática da UFOP, sob a orientação do terceiro autor deste trabalho. A primeira experiência
consistiu do planejamento, aplicação e avaliação de atividades de laboratório relacionadas ao
ensino de Funções Lineares e Quadráticas, sendo implementada com alunos do Ensino
Fundamental de uma escola particular de Belo Horizonte – MG. A segunda experiência
consistiu de um curso realizado com Professores de Matemática dos Ensinos Fundamental e
Médio da cidade de Alfenas – MG, oferecido pela Secretaria de Educação do Estado de Minas
Gerais. Nas duas experiências, destaca-se o papel das TIC’s na sala de aula de Matemática
como uma metodologia capaz de redirecionar o processo de ensino de Matemática,
proporcionando uma aprendizagem realmente significativa.
PALAVRAS-CHAVE: Tecnologias Informacionais e Comunicacionais; Educação Matemática.
1. Introdução
A utilização de Tecnologias Informacionais e Comunicacionais no processo de
ensino e aprendizagem da Matemática, com destaque para os ambientes informatizados,
vêm se firmando como uma das principais tendências de pesquisa e prática em
Educação Matemática. Tal utilização vem gerando uma série de mudanças, tanto
curriculares quanto na postura do professor. Como destaca Borba (1999, p. 285):
A introdução das novas tecnologias – computadores, calculadoras gráficas e
interfaces que se modificam a cada dia – tem levantado diversas questões.
Dentre elas, destaco as preocupações relativas às mudanças curriculares, às
novas dinâmicas da sala de aula, ao novo papel do professor e ao papel do
computador nesta sala de aula.
O uso do computador em sala de aula tem que ser feito de forma criativa e
investigativa para que esta ferramenta metodológica do processo de ensino e
aprendizagem da Matemática não se torne apenas mais um adereço na sala de aula,
como o quadro negro, o giz e o caderno. Acredita-se que o uso deste instrumento tem
que gerar na sala de aula um ambiente de curiosidade e questionamento, o que poderá
gerar mudanças no papel do professor e do aluno.
Silva (1990) afirma que uma das mudanças e transformações decorridas na
inserção de novas tecnologias na sala de aula é a transição do papel do professor de
tradicional, para facilitador da construção da aprendizagem. Este processo de mudança
de atitudes é longo e com diferentes graus de evolução, devido à diversidade na
formação dos professores. Ressalta-se que a construção de uma nova ação pedagógica
comprometida com a filosofia da utilização de ambientes informatizados em sala de aula
não se apresenta de forma homogênea, dependendo de diversos fatores. Tais fatores, em
nosso entendimento, podem ocorrer desde a dificuldade pessoal de cada professor, até a
problemas financeiros, físicos e operacionais.
Esta mudança de papel torna o professor, um mediador na construção do ensino,
instigando e sugerindo questionamentos aos seus alunos. Estes assumiriam uma postura
de agentes ativos na construção de seu conhecimento, testando e experimentando em
tempo real seus próprios questionamentos, pois, segundo Penteado (1997, p. 302) “com
a presença do computador, a aula ganha um novo cenário, refletindo-se na relação do
professor com os alunos e no papel desempenhado pelos demais atores presentes”.
Outro
destaque
para
a
utilização
de
Tecnologias
Informacionais
e
Comunicacionais na perspectiva da Educação Matemática é feito por Ponte &
Canavarro (1997, p. 101), ao relacionar uma função da utilização de computadores e
calculadoras no ensino:
No que diz respeito aos valores e atitudes, a calculadora e o computador são
particularmente importantes no desenvolvimento da curiosidade e do gosto
por aprender, pois proporcionam a criação de contextos de aprendizagem ricos
e estimulantes, onde os alunos sentem incentivada a sua curiosidade.
Esta discussão nos remete idéias de Gravina & Santarosa (1998, p.1), que trazem
uma reflexão sobre o que significa “fazer matemática: experimentar, interpretar,
visualizar múltiplas facetas, induzir, conjeturar, abstrair, generalizar e, enfim,
demonstrar”.
Acreditamos que o uso de Tecnologias Informacionais e Comunicacionais em
sala de aula, de forma a instigar o aluno, para que com isto, este construa seu
conhecimento a partir da visualização e concretização de seus questionamentos na tela
do computador ou calculadoras gráficas, trará a tona este conceito de fazer matemática.
2. A primeira experiência: as TIC’s e o ensino de Funções Lineares e Quadráticas
As atividades propostas foram realizadas no ano de 2004, em uma escola
particular de Belo Horizonte, tendo como sujeitos da pesquisa, sete dos vinte alunos de
uma turma da 8º série do Ensino Fundamental e a Professora Beatriz, licenciada em
Matemática pela Universidade Federal de Minas Gerais, com experiência docente desde
1976, lecionando em todas as séries dos Ensinos Fundamental e Médio, sendo três anos
em escolas públicas e o restante em escolas particulares. Tais sujeitos se encaixam com
os objetivos desta pesquisa, sendo a escolha de alunos da 8º série do Ensino
Fundamental justificada pelo contato introdutório que tiveram durante as aulas com o
tema “Função”. Quanto à Professora Beatriz, a mesma possui um perfil profissional
consolidado, com uma grande experiência em sala de aula.
Durante a aplicação das atividades, os sujeitos da pesquisa foram divididos em
dois grupos, sendo orientados todo o tempo pelo primeiro autor deste trabalho, como
pesquisa de campo integrante de seu trabalho de conclusão do curso de Especialização
em Educação Matemática da Universidade Federal de Ouro Preto, realizado sob a
orientação do terceiro autor deste trabalho. As atividades de Funções Lineares e
Quadráticas foram implementadas em uma tarde, tendo a duração total de três horas,
utilizando-se o software MATHGV.
O MATHGV é um programa construtor de gráfico de equações, comportando
gráficos cartesianos 2D, gráficos cartesianos 3D e polares. Apresenta o recurso de
mostrar, em uma mesma tela, o gráfico de várias funções simultaneamente, o que
configura uma excelente ambiente para construção de famílias de curvas e exploração
da transformação de funções, tais como deslocamentos verticais e horizontais, reflexões
sobre seus coeficientes. Encontra-se disponível para download na internet, no endereço
eletrônico <http://www.mathgv.com>, versão na língua inglesa. O MATHGV apresenta
uma interface agradável de se operar e de fácil manuseio de seus controles.
Utilizou-se, durante as atividades, a versão 3.0 do MATHGV, em língua inglesa,
datada de abril de 1998. Acreditou-se que as definições de configuração do programa
seriam adequadas aos objetivos da pesquisa.
O primeiro conjunto de cinco atividades propostas se relacionava ao conteúdo de
Funções Lineares – A Reta e seus Coeficientes, nas quais se explorou: a representação
gráfica de Funções Lineares; o estudo de funções crescentes; o estudo de funções
decrescentes; o estudo de funções constantes; o estudo de funções com o mesmo
coeficiente angular (Condição de Paralelismo).
O segundo conjunto de três atividades propostas se relacionava ao conteúdo de
Funções Quadráticas – A Parábola e seus Coeficientes, nas quais se explorou: a
representação gráfica de Funções Quadráticas; a concavidade da parábola; as raízes da
Função Quadrática e seu gráfico.
Os sujeitos da pesquisa realizavam as atividades e respondiam as questões
propostas oralmente, discutindo o que havia sido representado na tela do computador, o
que gerou várias conjecturas e conclusões sobre o tema “Função”.
Como instrumento auxiliar de registro e coleta de dados foi utilizado um
questionário composto de quatro questões, que foram respondidas pelos sujeitos da
pesquisa, após a aplicação das atividades propostas.
Com a primeira questão, objetivou-se investigar as experiências que os sujeitos
da pesquisa tiveram quanto à utilização de softwares educacionais, em particular de
Matemática. Através da segunda e terceira questões, objetivamos captar a visão dos
sujeitos da pesquisa sobre a utilização de softwares matemáticos em sala de aula,
juntamente com as aulas tradicionais, a fim de se analisar as vantagens e desvantagens
deste uso. A quarta questão teve como objetivo a análise crítica dos sujeitos a respeito
das atividades propostas, bem como do software MATHGV, utilizado nas atividades.
Como estratégia de organização dos dados, reuniram-se as questões em diversas
categorias de análise.
Os relatos dos sujeitos de pesquisa mostraram claramente que os mesmos já
haviam tido um contato prévio com software de uma maneira geral. Entretanto, ficou
claro que os sujeitos não percebiam os softwares como ferramentas capazes de
contribuir de alguma forma para o ensino de Matemática, deixando transparecer que
concebiam os softwares apenas como mídias eletrônicas.
A partir do contato com um software educacional no contexto do ensino de
Matemática, os sujeitos puderam perceber a inserção dos mesmos no ensino de Funções
Lineares e Quadráticas, de forma dinâmica e ativa na construção do conhecimento
relacionado a este tema. Também ficou evidenciado, tanto para os alunos quanto para a
professora, que este novo cenário de ensino e aprendizagem se sustenta como uma
diretriz metodológica alternativa / complementar ao ensino tradicional de Matemática,
em especial do tema “Função”.
Cabe ressaltar, ainda, que as atividades planejadas e implementadas explicitaram
não só as possibilidades como também os limites da utilização de um software
educacional no contexto do ensino de Matemática, o que ficou muito claro uma vez que
diversos aspectos positivos e negativos desta utilização foram extremamente bem
pontuados / observados pelos sujeitos de pesquisa envolvidos na pesquisa.
3. A segunda experiência: as TIC’s e a formação de Professores de Matemática
Em sua formação inicial (cursos de licenciatura) e mesmo em sua formação
continuada (cursos de especialização e outros), uma grande parte dos professores de
Matemática dos ensinos Fundamental e Médio não desenvolvem metodologias de
utilização de tecnologias como computadores e calculadoras gráficas em situações de
ensino. Diante da constatação desta dura realidade em nossas escolas, a Secretaria de
Educação do Estado de Minas Gerais criou e ofereceu, em 2006, um curso para
professores, cujo objetivo foi uma aproximação entre a máquina computador e o
professor. Tal curso focou o uso do Sistema Operacional Linux como uma ferramenta
para trabalhar assuntos e temas diversos em sala de aula.
Para este curso, alguns professores foram convidados a participar como
multiplicadores, ou seja, após a realização do mesmo, os participantes deveriam
ministrar um curso próprio para outros professores de sua escola. O segundo autor deste
trabalho foi um destes professores convidados a participar do curso sendo que,
posteriormente, o mesmo desenvolveu, com outros dois professores, um curso
ministrado para seus colegas de uma escola-referência da cidade de Alfenas – MG.
Este curso desenvolveu uma metodologia simples, onde o participante pôde
compreender como utilizar alguns aplicativos (editor de texto, editor de planilha e editor
de apresentação) num trabalho com os seus alunos, através de navegação na internet,
por meio de e-mail, ICQ, sites de pesquisa, etc, onde as informações são usadas tanto
para montar um trabalho de pesquisa quanto para promover um debate em sala de aula.
Os professores participantes puderam interagir com temas diversos, mesmo
sendo de áreas diferentes. A maioria teve a oportunidade de participar de um trabalho
utilizando o computador pela primeira vez. Apesar de ser a primeira experiência de
muitos, o resultado foi surpreendente. O interesse geral foi enorme e muitos montaram
sua página na internet, ao final do curso.
O curso foi ministrado em 14 encontros de 2 horas/aula cada, tendo como
conteúdo programático: Apresentação e discussão de pesquisas e estudos que tratam
sobre a integração de Tecnologias na Educação; Introdução à utilização de
computadores na sala de aula; Apresentação e utilização de alguns ambientes
computacionais tais como writer, impress, calc, ressaltando as suas potencialidades
teórico-metodológicas no processo de ensino e aprendizagem.
Ao longo do curso, houveram vários debates relacionados à contribuição da
utilização das TIC’s para um melhor desempenho das atividades docentes em sala de
aula, destacando-se que, para uma utilização correta dessas tecnologias, é preciso que
haja uma estrutura de apoio nas escolas, como técnicos de laboratórios de informática
para se auxiliar o professor, e também que ocorra uma adequação no número de alunos
por turma e na carga horária compatível com a programação / realização de atividades.
Desta forma, a conclusão geral dos participantes foi de que mudanças são realmente
necessárias, mas para que estas alavanquem as mudanças esperadas, é necessária uma
grande interação entre toda a comunidade escolar, a qual inclui professores, alunos,
pais, direção e administração.
4. Considerações finais
Nas duas experiências aqui relatadas, destacou-se a mudança de concepção
como uma das principais contribuições que uma eventual utilização de Tecnologias
Informacionais e Comunicacionais pode oferecer ao processo de ensino e aprendizagem
de Matemática de uma forma generalizada.
Na primeira delas, os alunos participantes da pesquisa realizada, a partir da
realização da mesma, passaram a conceber os softwares como um recurso metodológico
no ensino de Matemática, superando a visão anteriormente utilitária sobre sua função.
Já na segunda experiência, os professores participantes do curso, a partir da
realização do mesmo, passaram a conceber os computadores como um aliado
metodológico no ensino de Matemática, superando uma posição anteriormente
preconceituosa sobre sua utilização.
Entretanto, ainda existem diversos questionamentos relacionados à utilização das
TIC’s que estão sendo focos de pesquisas na perspectiva da Educação Matemática, tais
como: Se este novo cenário de ensino e aprendizagem se sustenta como uma diretriz
metodológica alternativa / complementar ao ensino tradicional de Matemática, então
porque ele não é plenamente contemplado pelos profissionais de educação em sua
prática pedagógica? Seria devido à falta de preparo dos docentes? Seria medo do
professor, uma vez que sua postura perante o aluno, deixa de ser de detentor do saber,
passando a ser de intermediador na construção do conhecimento, com o advento deste
novo cenário na sala de aula?
O fato é que as Tecnologias Informacionais e Comunicacionais estão ganhando
espaço em toda a sociedade, buscando uma interação de forma que seus personagens se
identifiquem com as mesmas, de acordo com suas necessidades temporais e mentais. Na
esfera educacional, não se concebe mais a idéia de educar sem a mediação tecnológica,
mesmo porque, em todos os momentos da civilização humana, a sociedade buscou as
ferramentas tecnológicas disponíveis para se fazer educação.
Então, uma função que nos cabe, educadores matemáticos, é refletirmos sobre os
limites e possibilidades de utilização das TIC’s no ensino de Matemática nos níveis
Fundamental, Médio e Superior. Tal processo de reflexão é lento, mas é como uma teia
que vai se formando conforme os fios vão sendo tecidos e tramados.
Por fim, espera-se que possamos vivenciar, em nossa prática de sala de aula,
processos participativos de compartilhamento de ensinar e aprender (poder distribuído)
através de uma comunicação mais aberta, confiante, de motivação constante, de
integração de todas as possibilidades da aula-pesquisa / aula-comunicação, num
processo dinâmico e amplo de informação inovadora, reelaborada pessoalmente e em
grupo, de integração do objeto de estudo em todas as dimensões pessoais: cognitivas,
emotivas, sociais, éticas e utilizando todas as habilidades possíveis do professor e do
aluno.
Referências
BORBA, M.C. “Tecnologias informáticas na Educação Matemática e reorganização do
Pensamento”. In: BICUDO, M.A.V. (org). Pesquisa em Educação Matemática:
concepções e perspectivas. São Paulo: Editora UNESP, p. 285-295, 1999.
GRAVINA, M.A.; SANTAROSA, L.M. A aprendizagem da Matemática em Ambientes
Informatizados. Congresso Ibero-americano de Informática na Educação, IV. Anais...
Brasília, 1998.
PENTEADO, M.G. O computador na perspectiva do desenvolvimento profissional do
professor. Tese de Doutorado. Faculdade de Educação – Universidade Estadual de
Campinas. Campinas, 1997.
PONTE, J.P.; CANAVARRO, A.P. Matemática e Novas Tecnologias. Lisboa:
Universidade Aberta, 1997.
SILVA, M.G.M. Informática na Educação – Mudança de Atitude dos Professores: Uma
Realidade? Tese de Doutorado. Faculdade de Educação – Universidade Estadual de
Campinas. Campinas, 1990.
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duas experiências com a utilização de tecnologias informacionais e