UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
CENTRO DE EDUCAÇÃO DE SÃO JOSÉ
CURSO DE DIREITO
O VÍNCULO EMPREGATÍCIO E AS COOPERATIVAS DE TRABALHO
MILENA FERREIRA AGACY
São José, junho de 2007.
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
CENTRO DE EDUCAÇÃO DE SÃO JOSÉ
CURSO DE DIREITO
O VÍNCULO EMPREGATÍCIO E AS COOPERATIVAS DE TRABALHO
MILENA FERREIRA AGACY
Monografia submetida à Universidade do
Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito
parcial à obtenção do grau de Bacharel
em Direito.
Orientador: Professora Msc. Solange Lúcia Heck Kool
São José, junho de 2007.
3
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
CENTRO DE EDUCAÇÃO DE SÃO JOSÉ
CURSO DE DIREITO
O VÍNCULO EMPREGATÍCIO E AS COOPERATIVAS DE TRABALHO
MILENA FERREIRA AGACY
A presente monografia foi aprovada como requisito para a obtenção do grau de
bacharel em Direito no curso de Direito na Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.
São José, 12 de junho de 2007.
Banca Examinadora:
_______________________________________________________
Profª. MSc. Solange Lúcia Heck Kool - Orientadora
_______________________________________________________
Profª. MSc. Giselle Meira Kersten - Membro
_______________________________________________________
Profª. MSc. Luciana de Araújo Grillo Schaefer - Membro
4
AGRADECIMENTO
Primeiramente a Deus, meu amigo, meu pai,
minha força e proteção, a quem agradeço pelo dom
da vida, pela família que me presenteou e a quem
entrego meus caminhos e em que confio
incondicionalmente.
A meus pais, Ilmar e Maria Helena, por todo
seu amor, dedicação e carinho, em todos os
momentos de minha vida. Por sua educação, pelos
valores que me ensinaram, pelo exemplo de vida,
pela confiança e pelo incentivo que me conduziram
até este momento.
Aos meus irmãos, Marcel e Alessandro, muito
importantes em minha vida e minha história.
Aos meus avós, Osmar, Hilda, João Célio,
que, já ausente, sempre foi exemplo de
determinação e continua presente em meu coração,
e Iracema pela confiança e orgulho sempre
depositados em minha caminhada.
Ao meu amado namorado, Daian, por sua
paciência, compreensão, companheirismo e amor ao
longo da elaboração deste trabalho e em todo
período acadêmico.
Aos meus cachorrinhos, Puff e Meg, pela
alegria, carinho, nos momentos de desânimo, e pelo
companheirismo ao lado dos livros e computador,
mesmo quando queriam competir com eles e, com
isso, arrancavam sorrisos de meu rosto.
Aos meus amigos, por todo carinho, incentivo,
auxílio, ao longo de minha vida e também pela
compreensão nos momentos de ausência, em razão
deste trabalho.
Agradeço também, de forma especial, a minha
querida orientadora Solange, que, além de uma
grande mestra, se mostrou uma amiga. Obrigada
pelos ensinamentos, pelas contribuições, pelo
carinho e pela confiança.
5
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho,de forma especial, a meus
queridos pais, a quem muito amo, por terem me
incentivado e mostrado a importância de estudar e
lutar pelos meus sonhos. E, principalmente, por têlos tornado possíveis.
6
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSALIBIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte
ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do
Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de
toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
São José, junho de 2007.
Milena Ferreira Agacy
Graduanda
7
SUMÁRIO
RESUMO................................................................................................................ 9
INTRODUÇÃO........................................................................................................10
1. COOPERATIVISMO ........................................................................................ 12
1.1. BREVE HISTÓRICO ................................................................................... ..12
1.2. COOPERATIVISMO NO BRASIL................................................................. .14
1.2.1. NOÇÕES HISTÓRICAS .................................................................................... 14
1.2.2. EVOLUÇÃO LEGISLATIVA .............................................................................. .15
1.3. CONCEITO DE COOPERATIVAS................................................................ .17
1.4. NATUREZA JURÍDICA DAS COOPERATIVAS ............................................ 19
1.5. CARACTERÍSTICAS DAS COOPERATIVAS............................................... .21
1.6. OBJETIVO DAS COOPERATIVAS............................................................... .24
1.7. CLASSIFICAÇÃO DAS COOPERATIVAS.................................................... .26
1.7.1. QUANTO À FORMA LEGAL DE CONSTITUIÇÃO ................................................... 26
1.7.2. QUANTO AO OBJETO .................................................................................... .27
2. COOPERATIVAS DE TRABALHO................................................................. .30
2.1. CONCEITO................................................................................................... .30
2.1.1. TIPOS DE COOPERATIVAS DE TRABALHO ........................................................ .32
2.1.3. COOPERATIVAS DE TRABALHO X EMPRESA. ................................................... .33
2.2. OBJETIVO DAS COOPERATIVAS DE TRABALHO ..................................... .34
2.3. ATOS COOPERATIVOS X ATOS NÃO COOPERATIVOS............................ 35
2.4. CONSTITUIÇÃO E SISTEMA ORGANIZACIONAL ...................................... .37
2.4.1. CONSTITUIÇÃO ............................................................................................ .37
2.4.2. SISTEMA ORGANIZACIONAL ........................................................................... .39
2.5. O COOPERADO........................................................................................... .41
2.5.1. DA RESPONSABILIDADE DOS COOPERADOS .................................................... .42
8
3. RELAÇÃO DE TRABALHO E AS COOPERATIVAS DE TRABALHO.......... .44
3.1. RELAÇÃO DE TRABALHO.................... ...................................................... .44
3.1.1. RELAÇÃO DE EMPREGO ................................................................................ .44
3.1.2. EMPREGADO ............................................................................................... .46
3.1.2.1. Pessoa natural ....................................................................................... .47
3.1.2.2. Pessoalidade.......................................................................................... .47
3.1.2.3. Continuidade .......................................................................................... .48
3.1.2.4. Onerosidade........................................................................................... .48
3.1.2.5. Subordinação ......................................................................................... .49
3.1.3. DIFERENÇA ENTRE EMPREGADO E TRABALHADOR AUTÔNOMO .......................... 50
3.1.4. EMPREGADOR ............................................................................................. .51
3.2. PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO.................... ............................ .51
3.2.1. PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO .............................................................................. .52
3.2.2. PRINCÍPIO IN DUBIO PRO OPERARIO ................................................................ .52
3.2.3. PRINCÍPIO DA IRRENUNCIABILIDADE DE DIREITOS ............................................ .53
3.2.4. PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DA REALIDADE........................................................... .53
3.3. A FLEXIBILIZAÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO..................................... .54
3.4. A TERCEIRIZAÇÃO E AS COOPERATIVAS DE TRABALHO .................... .56
3.5. RELAÇÃO DE EMPREGO X AS COOPERATIVAS DE TRABALHO .......... .58
3.6. ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL DO TRIBUNAL REGIONAL DO
TRABALHO DA 12ª REGIÃO.............................................................................. .64
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................ .67
REFERÊNCIAS................................................................................................... .70
9
RESUMO
O tema pesquisado versa sobre as Cooperativas de Trabalho, um importante
instrumento de inclusão social, já que são formadas pela união de trabalhadores
autônomos, que, através da cooperação mútua e do solidarismo, se unem com o
objetivo de obter melhorias na sua condição profissional e pessoal, presente cada
vez mais em nossa sociedade. Primeiramente, faz-se um breve histórico do
surgimento do cooperativismo no mundo e no Brasil, bem como a sua evolução
legislativa. Analisam-se também os conceitos, características, natureza jurídica,
objetivos e classificação das cooperativas. A seguir, abordam-se especificamente as
Cooperativas de Trabalho, suas definições, características, diferenças com outros
tipos societários, seus objetivos, formalidades e a figura do cooperado. Também se
analisa a relação de trabalho, a relação de emprego, as partes que envolvem esta
relação: empregado e empregador, os requisitos necessários para a configuração do
vínculo empregatício, a flexibilização do direito do trabalho, de forma especial a
terceirização. Discute-se, ainda, a relação existente nos casos de terceirização
realizada pelas Cooperativas de Trabalho. Discussão que se inicia com o acréscimo,
pela lei 8.949/94, do parágrafo único do artigo 442 da CLT, que prevê que não há
vínculo empregatício dos cooperados com a cooperativa, nem daqueles com os
tomadores de serviços, o que motivou a proliferação de falsas cooperativas, que têm
como intuito apenas aumentar sua lucratividade e não pagar os encargos sociais e
verbas decorrentes da relação trabalhista aos empregados. Na verdade, são meras
locadoras de mão-de-obra. E, finalmente, analisam-se decisões do Tribunal Regional
da 12ª Região, de Santa Catarina, sobre o tema.
Palavras-chave:
Empregatício
Cooperativas
de
Trabalho.
Relação
de
emprego.
Vínculo
10
INTRODUÇÃO
O crescimento do desemprego na sociedade atual, em razão de vários
fatores, dentre os quais a introdução de novas tecnologias, como a automação, a
robotização e a informatização, atinge todos os setores da economia, reduzindo de
maneira drástica a oferta de postos de trabalho.
Uma das medidas para solucionar ou, ao menos, amenizar esse grave
problema está relacionada com a flexibilização das relações de trabalho, ora
apontada como a principal alternativa para o desemprego, ora criticada pela forma
como está sendo implementada no Brasil.
São muitas as formas de flexibilização do trabalho, destacando-se a
terceirização, muito praticada através das cooperativas de trabalho, que são uma
alternativa de organização coletiva dos trabalhadores, com o objetivo de melhorar
os problemas sociais, especificamente o desemprego.
Contudo, o que se observa na prática é que o objetivo maior da cooperativa
de trabalho, que é o de aperfeiçoar as relações de trabalho, funcionando como uma
solução para problemas sociais graves, gerados pelo desemprego, nem sempre se
concretiza no Brasil. Tal instrumento, que deveria resolver problemas sociais, surge,
em alguns casos, de forma fraudulenta, com o intuito de diminuir custos de
produção, desviar o pagamento dos direitos trabalhistas, funcionando como
prestadoras de serviços especializados a terceiros, que aumentam os problemas
existentes na sociedade brasileira no que diz respeito às relações de trabalho.
Diante disso, verifica-se a importância do estudo das cooperativas,
principalmente a de trabalho e sua repercussão no campo do direito.
Quanto à metodologia empregada, registra-se que o método de abordagem
utilizado será o método indutivo, e a técnica de pesquisa que servirá de suporte à
metodologia deste trabalho científico será a documentação indireta, com a utilização
da pesquisa documental e bibliográfica.
Tem-se por objetivo geral a demonstração da possibilidade da configuração
de vínculo nas cooperativas de trabalho, e como objetivos específicos o estudo das
características das cooperativas, de forma específica das cooperativas de trabalho e
os elementos que levam à caracterização da fraude na legislação trabalhista, e o
vínculo empregatício.
11
Para tanto, principia-se, no Capítulo 1, tratando de noções sobre
Cooperativismo. Primeiramente um breve histórico de seu surgimento no mundo,
ressaltando seus precursores e princípios, e, posteriormente, no Brasil, bem como a
evolução legislativa no ordenamento pátrio. A seguir, analisa-se o conceito dado por
diversos doutrinadores sobre o tema, a natureza jurídica, as características,
objetivos e classificação das cooperativas.
No Capítulo 2, realiza-se uma abordagem específica sobre as Cooperativas
de Trabalho, os conceitos dados, os tipos existentes, a diferença entre ela e outros
tipos societários, de forma especial as empresas de mão-de-obra e as empresas de
um modo geral. São também verificados seus objetivos específicos, a diferença dos
chamados atos cooperativos e atos não cooperativos, as formalidades exigidas para
sua constituição e funcionamento, e, ainda, são analisadas as características do
cooperado e sua responsabilidade na cooperativa.
No Capítulo 3, que trata especificamente sobre o tema estudado, inicialmente
discorre-se sobre a relação de trabalho, em especial sobre a relação de emprego,
conceituam-se as figuras desta relação, o empregado e o empregador, e os
requisitos necessários à formação do vínculo que os une. Em seguida, explana-se
sobre a flexibilização ocorrida no direito do trabalho e principalmente sobre a
terceirização, pois é esta uma das principais relações existentes com as
cooperativas de trabalho.
Analisa-se, de forma especial, a terceirização das cooperativas de trabalho
após a mudança trazida com a inserção do parágrafo único do artigo 442 da
Consolidação das Leis do Trabalho, CLT, através da edição da lei 8.949/94, que
dispõe que os cooperados não possuem vínculo empregatício com as cooperativas,
tampouco com os tomadores de serviço. No entanto, verificar-se-á que o presente
artigo não se basta, sendo necessária a análise de outros requisitos do ordenamento
jurídico, principalmente do direito trabalhista, para a constatação ou não do vínculo
empregatício. Por fim, averiguar-se-á a posição do Tribunal Regional da 12ª Região,
de Santa Catarina, acerca do assunto estudado.
O presente Trabalho de Pesquisa encerra-se com as Considerações Finais,
nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da
estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre as Cooperativas de
Trabalho, com o intuito de engrandecer este tipo de sociedade, tão importante em
nosso país.
12
1. COOPERATIVISMO
1.1. BREVE HISTÓRICO
O sistema de cooperação é da natureza do ser humano, na busca de um
objetivo comum. Com isso, já nos tempos antigos, a cooperação era encontrada na
subsistência, na caça, na pesca e até na construção de moradias. 1
“O cooperativismo surgiu a partir do espírito de congregação e solidarismo do
homem que, através da ajuda mútua, passou a atingir com maior facilidade os seus
objetivos”. 2
Ainda no ano 400 a.C., os mercadores chineses, prejudicados por naufrágios,
se uniam com o objetivo de cooperação. Todos auxiliavam no transporte das
mercadorias da embarcação e dividiam os prejuízos sofridos, com o objetivo de
evitar que o dono e sua família passassem por dificuldades. 3
Charles
Fourier4
(1772-1837),
francês,
foi
um
dos
precursores
do
cooperativismo. Criou os falanstérios, que eram unidades auto-suficientes,
semelhantes a uma cooperativa de produção agrícola, com o objetivo de reformar
toda a sociedade. Tratava-se de um local onde viveriam mil e quinhentas pessoas
em regime comunitário, de modo a substituir a unidade familiar e doméstica,
considerada mesquinha, por grandes serviços coletivos, em que pobres e ricos
conviveriam espontaneamente, não em competição, mas em cooperação. 5
As associações de trabalhadores pioneiras com moldes cooperativos
surgiram no século XVIII. Essas associações visavam à união de esforços, à ajuda
mútua e à garantia da subsistência dos trabalhadores desempregados na Revolução
Industrial, substituídos pelas máquinas. 6
Neste sentido, ensina Maria Célia de Araújo Furquim:
Trabalhadores passaram a se agrupar movidos pela solidariedade, cujo
lema é “um por todos e todos por um”, princípio básico do movimento e
1
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág. 19.
GONÇALVES, Nilton Oliveira. Terceirização de mão-de-obra. São Paulo: LTR, 2005. pág. 56.
3
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág. 19.
4
Acreditava que a manutenção de propriedade, embora sob forma de co-propriedade, ou de
propriedade em que os co-proprietários são também co-interessados, torna o trabalho atraente e
produtivo. (PINHO, Diva Benevides. O Cooperativismo no Brasil: da vertente pioneira à vertente
solidária. São Paulo: Saraiva, 2004. pág. 194).
5
PINHO, Diva Benevides. O Cooperativismo no Brasil: da vertente pioneira à vertente solidária.
São Paulo: Saraiva, 2004. pág. 194.
6
BEZERRA, João Estenio Campelo. Cooperativas de Trabalho: relação de emprego. Brasília:
Brasília Jurídica, 2005. pág. 17.
2
13
descobriram que, conservando a propriedade privada, sem intervenção
direta do Estado na ordem econômica, é possível proporcionar melhores
7
condições de vida sócio-econômica através da cooperação entre eles.
A primeira cooperativa foi registrada em 1844, na Inglaterra, na cidade de
Rochadele, resultante da união de 28 tecelões desempregados, atravessando difícil
situação econômica em conseqüência da tecnologia implantada na época, as
máquinas a vapor, trazidas pela Revolução Industrial, que diminuíam suas
atividades. 8
Seu criador foi Charles Howarth, discípulo de Robert Owen9 (1711- 1858),
que, após um ano de economias, conseguiu juntar com os demais cooperados 28
libras, usadas para a abertura do armazém, chamado de Sociedade dos Probos
Pioneiros de Rochadele.10
Os princípios da sociedade, que permanecem em vigor até hoje nas
cooperativas, eram: “a livre adesão, o controle democrático, a vedação de qualquer
discriminação social, política e religiosa, venda de preços de mercado e investimento
de reservas para educação.” 11
Na França, na mesma época, teve início, por iniciativa de Philippe Buchez12
(1796-1865) e Louis Blanc13 (1812- 1882), o movimento das cooperativas de
produção. Não menos importante que o movimento inglês, embora não com o
7
FURQUIM, Maria Célia de Araújo. A Cooperativa como Alternativa de Trabalho. São Paulo: LTR,
2001. pág. 22.
8
GONÇALVES, Nilton Oliveira. Terceirização de mão-de-obra. São Paulo: LTR, 2005. pág. 56.
9
Nascido em Newton, País de Gales, co-proprietário de uma grande fábrica de fios em New Lanarck,
preocupava-se com os problemas sociais da época, principalmente com o baixo nível de vida dos
operários ingleses. Defendia a distribuição dos excessos de riqueza às sociedades humanas, a
promoção de um novo homem e por fim, uma reforma social de forma pacífica e gradual. (PINHO,
Diva Benevides. O Cooperativismo no Brasil: da vertente pioneira à vertente solidária. São Paulo:
Saraiva, 2004. pág. 254).
10
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág. 21.
11
GONÇALVES, Nilton Oliveira. Terceirização de mão-de-obra. São Paulo: LTR, 2005. pág. 56.
12
Defendia a tese de associação cooperativa dos produtores livres de maneira pacífica e sem
espoliação. Os operários reunir-se-iam para: a) colocar em comum suas poupanças; b) obter
empréstimos; c) produzir em comum; d) assegurar a todos igual salário; e) reunir receitas líquidas em
um fundo comum. (PINHO, Diva Benevides. O Cooperativismo no Brasil: da vertente pioneira à
vertente solidária. São Paulo: Saraiva, 2004. pág.96-97).
13
Francês, acreditava que a livre-concorrência era a principal responsável pelos males e injustiças
sociais, nocivos aos operários, mas também à burguesia. Foi ela quem separou os detentores dos
instrumentos de produção daqueles que acionavam esses instrumentos com seu trabalho. Pregava a
criação de uma oficina social, organizada com empréstimo estatal e com estatutos sociais também
fixados pelo estado, no início com dirigentes indicados pelo mesmo. Porém, a partir do momento que
os associados se conhecessem, os cargos seriam preenchidos por eleição. Prevaleceria o princípio
da igualdade dos salários, independente da capacidade, princípio que os operários aceitariam, graças
ao novo meio criado pela associação. (PINHO, Diva Benevides. O Cooperativismo no Brasil: da
vertente pioneira à vertente solidária. São Paulo: Saraiva, 2004. pág. 94).
14
mesmo sucesso, o movimento francês teve participação marcante na consolidação
do movimento cooperativista no mundo. 14
Na Alemanha, ainda neste mesmo século, foram constituídas, a partir de
1849, as cooperativas de crédito e consumo. Herman Schulze15 (1808-1883) foi o
fundador deste sistema, chamado “Schulze-Delitzsch”, em razão da cidade onde
morava, Delitzsch, que se voltou para os pequenos produtores urbanos e para os
artesões. 16
Diante as experiências das primeiras cooperativas, Nilton Oliveira Gonçalves
acrescenta:
Criou-se um padrão de organização que teve um crescimento vertiginoso e
que foi alargamente adotado nas cooperativas a partir de então,
especialmente nas zonas industriais do norte da Inglaterra e Escócia,
rapidamente alastrando-se entre os trabalhadores urbanos da GrãBretanha, França, Alemanha, Suécia, e entre a população rural da Noruega,
17
Holanda, Dinamarca e Finlândia.
Com estes breves comentários, percebe-se o esforço realizado pelo
movimento cooperativista, através da criação das cooperativas, na tentativa de
amenizar os efeitos causados pelo avanço do sistema capitalista nos cidadãos
operários.
1.2. COOPERATIVISMO NO BRASIL
1.2.1. Noções históricas
No Brasil, embora, em 1848, o médico francês Jean Maurice Faivre tenha
fundado, com um grupo de europeus, nos sertões do Paraná, a colônia Tereza
Cristina, organizada em bases cooperativas, que muito contribuiu na memória
coletiva como elemento formador do cooperativismo no País, o destaque do
movimento se deu com a chegada dos imigrantes europeus, principalmente italianos,
14
POLONIO, Wilson Alves. Manual de Sociedades Cooperativas. São Paulo: Atlas, 2004. pág. 28.
Magistrado, acreditava que, por meio da associação, a sociedade moderna organizava sua
iniciativa para exercer eficaz ação em todas as esferas da vida nas quais o Estado, com todo seu
poder, não pode chegar. (PINHO, Diva Benevides. O Cooperativismo no Brasil: da vertente pioneira
à vertente solidária. São Paulo: Saraiva, 2004. pág. 278).
16
POLONIO, Wilson Alves. Manual de Sociedades Cooperativas. São Paulo: Atlas, 2004. pág. 28.
17
GONÇALVES, Nilton Oliveira. Terceirização de mão-de-obra. São Paulo: LTR, 2005. pág.57.
15
15
franceses e alemães, no final do século XIX, que coincidiu com o movimento em prol
da criação de sindicatos profissionais. 18
A partir daí, diversas outras cooperativas foram criadas, como, por exemplo, a
Associação Cooperativa dos Empregados da Cia. Telefônica de Limeira SP (1891), a
Cooperativa Militar de Consumo do Rio de Janeiro (1894) e a Cooperativa de
Consumo dos Empregados da Viação Férrea de Santa Maria RS (1913), à época a
maior cooperativa da América do Sul. Em 1907 e 1911, em Minas Gerais e no Sul do
Brasil, surgiram as cooperativas de produção, como as agropecuárias e agrícolas. 19
Segundo Estenio Campelo, cabe ressaltar que o cooperativismo pátrio foi
germinado no meio rural e promovido por elites agrárias. Desta forma, sufocado pela
grande dependência ao poder estatal, perdeu seu caráter contestador e reformador,
característico do movimento europeu. 20
Neste sentido, prossegue o autor:
A visão política do cooperativismo brasileiro era aquele do controle social,
tendo como perspectiva da ascensão social rural apenas a modernização
da agricultura. O Estado Brasileiro, controlado pela elite agrária, que
conservou o poder mesmo com a industrialização urbana, mostrou sua
marca autoritária e intervencionista na criação das cooperativas e na
21
regulamentação jurídica do Direito do Trabalho.
De tal modo, o intervencionismo do Estado, bem como a criação de leis e
regulamentos, existentes até hoje, não impediu o êxito do movimento cooperativista
no território brasileiro, existentes em diferentes campos da economia, como será
visto posteriormente.
1.2.2. Evolução legislativa
O ordenamento jurídico brasileiro estabeleceu várias normas acerca das
cooperativas ao longo dos anos. No entanto, neste item, pretende-se demonstrar
apenas os diplomas legais de maior relevância.
Segundo Polonio, o primeiro dispositivo legal que dispôs sobre as
cooperativas no Brasil foi o Decreto nº. 979 de 6 de janeiro de 1903, que regulava as
18
MAUAD, Marcelo José Ladeira. Cooperativas de Trabalho: sua relação com o direito do Trabalho.
2.ed. São Paulo: LTR, 2001. pág.69.
19
FREDIANI, Yone. Tendências do Direito Material e Processual do Trabalho. São Paulo: LTR,
2000. pág. 28.
20
BEZERRA, João Estenio Campelo. Cooperativas de Trabalho: relação de emprego. Brasília:
Brasília Jurídica, 2005. pág. 20.
21
BEZERRA, João Estenio Campelo. Cooperativas de Trabalho: relação de emprego. Brasília:
Brasília Jurídica, 2005. pág. 21.
16
atividades dos sindicatos de profissionais da agricultura, atividades rurais e de
cooperativas de produção e consumo. Posteriormente, foi promulgado o Decreto nº.
1.637, em 5 de janeiro de 1907. Possuía 26 artigos, dos quais 16 se destinavam às
sociedades cooperativas.22
Posteriormente, o Decreto nº. 19.770, de 19 de março de 1931, “permitia aos
sindicatos o direito de organizar e administrar cooperativas, inspirado nos princípios
de Rochadele” 23, e o Decreto nº. 22.239, de 19 de dezembro de 1932, consolidou a
regulamentação das cooperativas no Brasil.
24
Um ano mais tarde, este Decreto foi
substituído pelo de nº. 23.611. Em 1934, o Decreto nº. 24.647 instituiu o
cooperativismo sindicalista. A ele seguiu-se o Decreto-lei 581, de 1º de agosto de
1938, ambos revigorados pelo Decreto-lei nº. 8.401, de 1945. 25
Nas duas décadas seguintes, a evolução legislativa não parou. Em 1966, na
data de 21 de novembro, o Decreto-lei nº. 59 revogou todos os diplomas anteriores,
definiu a política nacional de cooperativismo e reorganizou o Conselho Nacional do
Cooperativismo, criado pelo Decreto nº. 46.438, de 16 de julho de 1959. 26
Este Decreto foi sucedido pelo Estatuto Geral do Cooperativismo, lei nº.
5.764, de 16 de dezembro de 197127, que, conforme seu preâmbulo, “define a
política nacional de cooperativismo, institui o regime jurídico das sociedades
cooperativas e dá outras providências”.28
Em 1988, ano da promulgação da atual Constituição Federal, as cooperativas
foram mencionadas pela primeira vez em uma Carta Magna Brasileira:
Artigo 5º: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no
País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[…]
XVIII - a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas,
independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu
funcionamento;
Artigo 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o
Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e
planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo
para o setor privado.
22
POLONIO, Wilson Alves. Manual de Sociedades Cooperativas. São Paulo: Atlas, 2004. pág. 29.
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág.32.
24
BEZERRA, João Estenio Campelo. Cooperativas de Trabalho: relação de emprego. Brasília:
Brasília Jurídica, 2005. pág. 23.
25
BEZERRA, João Estenio Campelo. Cooperativas de Trabalho: relação de emprego. Brasília:
Brasília Jurídica, 2005. pág. 21.
26
POLONIO, Wilson Alves. Manual de Sociedades Cooperativas. São Paulo: Atlas, 2004. pág. 29.
27
BEZERRA, João Estenio Campelo. Cooperativas de Trabalho: relação de emprego. Brasília:
Brasília Jurídica, 2005. pág. 24.
28
BRASIL. Lei 5764/71. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5764.htm.
23
17
[…]
§ 2º - A lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de
associativismo. § 3º - O Estado favorecerá a organização da atividade
garimpeira em cooperativas, levando em conta a proteção do meio ambiente
e a promoção econômico-social dos garimpeiros.
§ 4º - As cooperativas a que se refere o parágrafo anterior terão prioridade
na autorização ou concessão para pesquisa e lavra dos recursos e jazidas
de minerais garimpáveis, nas áreas onde estejam atuando, e naquelas
29
fixadas de acordo com o artigo 21, XXV, na forma da lei.
Sobre os dispositivos constitucionais supra-elencados, ensina Estenio
Campelo:
Após longos debates na Assembléia Constituinte, em 1988, o texto final da
atual Carta Política, veio acolher muitas pretensões do cooperativismo,
garantindo autonomia no que se refere aos direitos individuais, limitando o
espaço da intervenção estatal e reconhecimento da importância do
30
cooperativismo para o desenvolvimento sócio-econômico.
Ainda, em 9 de dezembro de 1994, através da lei nº. 8.949, foi inserido o
parágrafo único do artigo 442 da Consolidação das Leis do Trabalho, que determina
que, independente do ramo de atividade, não existe vínculo entre a cooperativa e
seus cooperados, nem destes com os tomadores de serviços. 31
Por fim, foi promulgada a lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002, o Novo
Código Civil, com vigência após um ano de sua publicação, que dispõe sobre as
cooperativas em seus artigos 1.093 a 1.096. 32
Verificados os dispositivos que tratam sobre as cooperativas, passar-se-á a
análise de seus conteúdos, a fim de aprofundar o presente estudo.
1.3. CONCEITO DE COOPERATIVAS
No Congresso de Praga, em 1948, foi aprovado pela Aliança Cooperativa
Internacional (ACI), organização mundial das cooperativas, criada em Londres, em
1895, com o objetivo de preservar os princípios de Rochadele, o seguinte conceito
legal sobre as sociedades cooperativas:
“Será considerada como cooperativa, seja qual for a sua constituição legal,
toda a associação de pessoas que tenha por fim a melhoria econômica e
29
.BRASIL.
Constituição
da
República
Federativa
do
Brasil.
Disponível
em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil/constituicao/constituicao.htm.
30
BEZERRA, João Estenio Campelo. Cooperativas de Trabalho: relação de emprego. Brasília:
Brasília Jurídica, 2005. pág. 25.
31
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág. 43.
32
POLONIO, Wilson Alves. Manual de Sociedades Cooperativas. São Paulo: Atlas, 2004. pág. 30.
18
social de seus membros pela exploração de uma empresa baseada na
33
ajuda mútua e que observe os princípios de Rochadele”.
De tal modo, de acordo com os termos da conceituação acima, o artigo 3º da
Lei 5.764/71 instituiu o regime jurídico das sociedades cooperativas em nosso país,
assim definindo a sociedade cooperativa:
Celebram contrato de sociedade cooperativa as pessoas que
reciprocamente se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o
exercício de uma atividade econômica, de proveito comum, sem objetivo de
34
lucro.
Neste sentido, Sérgio Pinto Martins ensina:
A cooperativa é a reunião de esforços em comum entre os envolvidos, de
forma coordenada, para atingir determinado fim. Não tem, portanto, a
cooperativa objetivo de lucro e os cooperados prestam serviços para a
referida associação com total autonomia, isto é, sem subordinação.[…] Os
cooperados não têm subordinação entre si, mas um dever de colaboração
35
para atingir um fim comum.
Da mesma forma, define Yone Frediani:
Trata-se a cooperativa de uma sociedade de pessoas, que,
voluntariamente, se associam, juntando suas economias e esforços, para a
concretização de um objetivo comum, seja na área de produção, consumo,
36
trabalho etc.
Valentin Carrion, por sua vez, diz que se trata “da associação voluntária de
pessoas que contribuem com seu esforço pessoal ou suas economias, a fim de obter
para si as vantagens que o agrupamento pode propiciar.”
37
Outrossim, Jorge Luiz Souto Maior leciona:
As cooperativas são sistemas de ajuda mútua em que pessoas que
possuem necessidades comuns associam-se, voluntariamente para,
mediante o exercício de um esforço conjunto e eliminando intermediário,
satisfazer essas necessidades. As cooperativas têm um fim econômico
porque visam à melhoria da situação econômica de seus membros,
mediante um escopo puramente mercantil, o que as distingue das demais
38
atividades empresarias.
O cooperativismo, segundo Iron, deverá ter por base a posse privada dos
meios de produção, um planejamento descentralizado e individualizado, centrado na
33
FRANKE, Valmor. Direito das Sociedades Cooperativas: direito comparativo. São Paulo:
Saraiva, 1973. pág. 69 Apud FURQUIM, Maria Célia de Araújo. A Cooperativa como Alternativa de
Trabalho. São Paulo: LTR, 2001.
34
BRASIL. Lei 5764/71. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5764.htm.
35
MARTINS, Sérgio Pinto. Comentários a CLT. 6.ed. São Paulo: Atlas, 2003. pág. 356.
36
FREDIANI, Yone. Tendências do Direito Material e Processual do Trabalho. São Paulo: LTR,
2000. pág. 34.
37
CARRION, Valentin. Comentários À Consolidação das Leis do Trabalho. 31. ed. São Paulo:
Editora Saraiva, 2005. pág. 281.
38
MAIOR, Jorge Luiz Souto. O Direito do Trabalho como Instrumento de Justiça Social. São Paulo:
LTR, 2000. pág. 322.
19
cooperativa e no cooperado. Este é, na verdade, um empreendimento com duas
faces, uma econômica, quando atua como empresa e trata da realização e controle
da economia dos cooperados, e outra social, quando promove condições voltadas
ao meio social do cooperado. Portanto, é “uma associação autônoma de pessoas
que se unem voluntariamente para fazer frente às necessidades e aspirações
econômicas, sociais e culturais comuns por meio de uma empresa de propriedade
conjunta e democraticamente controlada”. 39
Assim, a cooperativa é apenas a gerenciadora da mão-de-obra e do capital e
tem como objetivo a obtenção de serviços e benefícios a seus associados. Os
resultados econômicos da cooperativa pertencem aos sócios-cooperados, em razão
de a mesma não objetivar lucro para si. São eles os possuidores do capital e dos
demais meios de produção, além de serem a própria força de trabalho. Portanto não
existe subordinação, apenas colaboração mútua.
1.4. NATUREZA JURÍDICA DAS COOPERATIVAS
O artigo 4º da lei 5.764/71 define as cooperativas como detentoras de
características próprias, diferenciando-as das demais sociedades:
as cooperativas são sociedades de pessoas, com forma e natureza jurídica
próprias, de natureza civil, não sujeitas a falência, constituídas para prestar
40
serviços aos associados […]
Ao defini-las como sociedade de pessoas, a lei desejou diferenciá-las das
sociedades de capital, apesar de não existir sociedade sem a presença desses dois
elementos (sócios e capital). A classificação diz respeito à prevalência de um deles
sobre o outro, ou seja, em algumas sociedades, a realização do objeto social
depende essencialmente dos atributos individuais dos sócios; já, em outras, essa
realização não depende das características subjetivas dos sócios. Nas primeiras, o
sócio é mais importante que a contribuição material que este dá para a sociedade;
39
IRION, J.E. Cooperativismo e economia social. São Paulo: STS, 1997. pág.47.apud
GUIMARÃES, Valeska Nahas; KOROSUE, Aline; OLIVEIRA, Elaine Cristina. Flexibilização ou
Precarização das Condições de Trabalho? : o caso do trabalho em Santa Catarina. Florianópolis:
UFSC, 2000. pág.6. Disponível em: www.roce.nuca.ie.ufrj.br/abet/3reg/07.doc. Acesso em: 10 de abril
de 2007.
40
BRASIL. Lei 5764/71. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5764.htm.
20
nas últimas, ocorre o inverso: as características pessoais do sócio são irrelevantes
para o sucesso ou insucesso da empresa. 41
Para Wilson Alves Polonio, é desnecessário lei para classificar uma
sociedade cooperativa, conforme preleciona:
A sociedade cooperativa pode ser tomada como uma sociedade
genuinamente de pessoas, e nem precisaria de lei para classificá-la como
tal, uma vez que tem como fundamento a solidariedade, a igualdade e a
42
comunhão de interesses dos associados.
A denominação “natureza jurídica própria” permite o entendimento de que se
trata de um gênero da natureza civil, já que a sociedade cooperativa tem uma
característica ímpar, eis que é uma das poucas sociedades constituídas pelos
associados, para prestar serviços a eles próprios, o que não as impede de prestar
serviços a não cooperados. 43
A sociedade cooperativa, embora possa ter como objeto social a atividade
mercantil, de natureza comercial, é constituída para prestar serviços aos associados.
Assim, tendo em vista essa dupla personalidade, ficou ao legislador a posição a ser
tomada acerca de sua natureza e o fez, definindo-a expressamente como civil. 44
Porém, afirma Sérgio Pinto Martins:
Não deveria ser dito que a cooperativa tem forma e natureza jurídica
próprias, pois, na verdade, tem direito próprio, que é o Direito Cooperativo,
ou então legislação própria, que é a Lei 5.764/71. Assim tais afirmações não
precisariam ficar na definição legal. Pior foi colocar que as sociedades
45
cooperativas têm forma e natureza jurídica própria e natureza civil.
Entretanto, com o advento do Código Civil de 2002, as sociedades passaram
a ser classificadas conforme o artigo 982:
[…] considera-se empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de
46
atividade própria de empresário sujeito a registro, e simples, as demais.
Contudo, esta classificação não seria suficiente para o devido enquadramento
da cooperativa. Deste modo, o legislador, ao conferir-lhe a natureza de sociedade
41
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. Vol.2. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, pág.
23.
42
POLONIO. Wilson Alves. Terceirização: aspectos legais, trabalhistas e tributários. São Paulo:
Atlas, 2000.
43
POLONIO, Wilson Alves. Manual de Sociedades Cooperativas. São Paulo: Atlas, 2004. pág. 40.
44
POLONIO, Wilson Alves. Manual de Sociedades Cooperativas. São Paulo: Atlas, 2004. pág. 40.
45
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág. 59.
46
.BRASIL. Código Civil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/ L10406.htm.
21
civil, classificou-a como sociedade simples, conforme dispõe o parágrafo único do
referido artigo, que apresenta a seguinte redação:
47
Independente de seu objeto, considera-se empresária a sociedade por
48
ações, e simples a cooperativa.
Ademais, afirma Amador Paes de Almeida:
A sociedade cooperativa não se confunde com as sociedades comuns,
exatamente por faltar-lhe finalidade especulativa, embora não seja o lucro
incompatível com a sua natureza. Muito ao contrário, o lucro está para a
cooperativa na mesma situação em que está para a empresa pública,
constituindo-se em mera decorrência de uma gestão profícua, mesmo
porque, como já observamos, dificilmente manter-se-á uma sociedade
49
cooperativa deficitária.
Ao afirmar que a cooperativa tem natureza civil e que não fica sujeita a
falência, mas é registrada na Junta Comercial, o legislador torna-se contraditório,
pois é óbvio que, por ter natureza civil, assim como as demais sociedades civis, não
estará sujeita ao regime falimentar. Todavia, por ter natureza própria, não se sujeita
exatamente ao Direito Civil ou ao Direito Comercial.50
Diante destas posições, pode-se dizer que a definição da natureza jurídica
das cooperativas ainda é controvertida e amplamente discutida pelos doutrinadores.
1.5. CARACTERÍSTICAS DAS COOPERATIVAS
As características das cooperativas vinham dispostas nos incisos do artigo 4º
da lei 5.764/7151; no entanto, com a promulgação da lei 10.406/200252, o Código
47
POLONIO, Wilson Alves. Manual de Sociedades Cooperativas. São Paulo: Atlas, 2004. pág. 41.
.BRASIL. Código Civil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/ L10406.htm.
49
ALMEIDA, Amador Paes de. Manual das sociedades comerciais. 12. ed. São Paulo: Saraiva,
1999, pág. 346.
50
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág. 5960.
51
Artigo 4º As cooperativas são sociedades de pessoas, com forma e natureza jurídica próprias, de
natureza civil, não sujeitas a falência, constituídas para prestar serviços aos associados, distinguindose das demais sociedades pelas seguintes características:
I - adesão voluntária, com número ilimitado de associados, salvo impossibilidade técnica de prestação
de serviços;
II - variabilidade do capital social representado por quotas-partes;
III - limitação do número de quotas-partes do capital para cada associado, facultado, porém, o
estabelecimento de critérios de proporcionalidade, se assim for mais adequado para o cumprimento
dos objetivos sociais;
IV - inacessibilidade das quotas-partes do capital a terceiros, estranhos à sociedade;
V - singularidade de voto, podendo as cooperativas centrais, federações e confederações de
cooperativas, com exceção das que exerçam atividade de crédito, optar pelo critério da
proporcionalidade;
VI - quórum para o funcionamento e deliberação da Assembléia Geral baseado no número de
associados e não no capital;
48
22
Civil vigente, o artigo 1.094 da referida lei passou a regular a matéria. No entanto,
conforme disposto no artigo 1.093 do Código Civil:
A sociedade cooperativa reger-se-á pelo disposto no presente Capítulo,
53
ressalvada a legislação especial.
O inciso I, da lei 5.764/71, prevê que a adesão deve ser voluntária e sem
quaisquer restrições, quer por razões sociais, políticas ou religiosas. Todavia, as
cooperativas não estão obrigadas a aceitar a associação de pessoas quando houver
impossibilidade técnica de prestações de serviços. De fato, conforme dispõe a
Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso XX: 54
[…]
55
ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado.
A importância da adesão voluntária dá-se nas falsas cooperativas,
constituídas por empresários, com intuito de se desobrigarem de seus encargos
trabalhistas, que obrigam seus empregados a formar uma cooperativa, para prestar
serviço a sua empresa. 56
Outro atributo importante é a variabilidade do capital social representado por
cotas-partes. Segundo Sérgio Pinto Martins, “O capital fica adaptado às entradas e
VII - retorno das sobras líquidas do exercício, proporcionalmente às operações realizadas pelo
associado, salvo deliberação em contrário da Assembléia Geral;
VIII - indivisibilidade dos fundos de Reserva e de Assistência Técnica Educacional e Social;
IX - neutralidade política e indiscriminação religiosa, racial e social;
X - prestação de assistência aos associados, e, quando previsto nos estatutos, aos empregados da
cooperativa;
XI - área de admissão de associados limitada às possibilidades de reunião, controle, operações e
prestação de serviços.
52
Artigo 1.094. São características da sociedade cooperativa:
I - variabilidade, ou dispensa do capital social;
II - concurso de sócios em número mínimo necessário a compor a administração da sociedade, sem
limitação de número máximo;
III - limitação do valor da soma de quotas do capital social que cada sócio poderá tomar;
IV - intransferibilidade das quotas do capital a terceiros estranhos à sociedade, ainda que por
herança;
V - quorum, para a assembléia geral funcionar e deliberar, fundado no número de sócios presentes à
reunião, e não no capital social representado;
VI - direito de cada sócio a um só voto nas deliberações, tenha ou não capital a sociedade, e
qualquer que seja o valor de sua participação;
VII - distribuição dos resultados, proporcionalmente ao valor das operações efetuadas pelo sócio com
a sociedade, podendo ser atribuído juro fixo ao capital realizado;
VIII - indivisibilidade do fundo de reserva entre os sócios, ainda que em caso de dissolução da
sociedade.
53
.BRASIL. Código Civil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/ L10406.htm.
54
FURQUIM, Maria Célia de Araújo. A Cooperativa como Alternativa de Trabalho. São Paulo:
LTR, 2001. pág. 42.
55
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil/constituicao/constituicao.htm.
56
FREDIANI, Yone. Tendências do Direito Material e Processual do Trabalho. São Paulo: LTR,
2000. pág. 36
23
saídas das pessoas da cooperativa. Permite o inciso I do artigo 1.094 do Código
Civil inclusive a dispensa do capital”. 57
Há limitação no número de cotas-partes aos associados, conforme consta no
parágrafo 1º do artigo 24 da lei 5.764/71, determinado em 1/3 (um terço) do total do
mesmo. Essas, porém, são inacessíveis a estranhos na sociedade, inclusive aos
herdeiros, em caso de morte do cooperado58. Trata-se de uma característica muito
importante, que demonstra a natureza da sociedade de pessoas, diferenciando-a
das sociedades de capital. 59
Outra característica é a singularidade de voto, ou seja, o poder de decisão é
igual para todos os cooperados, sem importar a quantidade de cotas-partes que
possuem na sociedade, salvo exerçam atividade de crédito e optem pela
proporcionalidade. 60
A opção pela proporcionalidade, por não estar definida na própria lei, deverá
ser definida pelo Estatuto Social e permitirá o voto proporcional de seus associados.
61
Trata-se do princípio da gestão democrática, que define que todos os atos de
criação, de elaboração do estatuto e tomada de decisões cabem à assembléia geral,
na qual cada cooperado tem direito a um voto, independentemente do capital que
possui. 62
A distribuição dos resultados, proporcionalmente às operações realizadas
pelo associado, é outra particularidade das cooperativas. Isso quer dizer que, além
das sobras líquidas do exercício, o cooperado também assume os riscos da
atividade. Porém a Assembléia Geral poderá destinar as sobras para finalidades
sociais, como reinvestimento na cooperativa. 63
A
indivisibilidade dos Fundos de reserva e de assistência técnica, educacional
e social, mesmo em caso de dissolução da sociedade, ressalta o espírito da
57
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág. 75.
LEI 5.764/71. Artigo 35. A exclusão do associado será feita: […] II - por morte da pessoa física.
Assim, os herdeiros não têm condição de cooperados. (MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de
Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág. 76.)
59
POLONIO, Wilson Alves. Manual de Sociedades Cooperativas. São Paulo: Atlas, 2004. pág.57
60
C 76.
61
FURQUIM, Maria Célia de Araújo. A Cooperativa como Alternativa de Trabalho. São Paulo:
LTR, 2001. pág. 43.
62
FREDIANI, Yone. Tendências do Direito Material e Processual do Trabalho. São Paulo: LTR,
2000. pág. 36
63
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág. 76.
58
24
instituição, no sentido de preocupação primordial com o bem-estar e o
desenvolvimento dos cooperados, objetivo máximo da entidade. 64
A neutralidade política, social, religiosa e racial vem a corroborar os princípios
constitucionais previstos nos incisos VIII, XLII, do artigo 5º da Constituição Federal:
VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de
convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de
obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação
alternativa, fixada em lei;
XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível,
65
sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;
A prestação de assistência aos associados é um importante diferenciador
entre as cooperativas e os demais tipos societários, visto que os interesses dos
cooperados não se resumem apenas aos resultados financeiros, mas em ações que
melhoram suas condições de vida e, por conseqüência, geram o aumento da
produtividade. 66
Em relação à área de admissão dos associados, tem-se como limite a
viabilidade do bom andamento das atividades com a participação de todos os
cooperados, de modo que uma cooperativa pode alcançar o âmbito nacional. 67
A preocupação com o aspecto formal para a constituição de uma cooperativa
serve para garantir, na formação deste tipo de sociedade, a preservação do espírito
e a finalidade do cooperativismo.
1.6. OBJETIVOS DAS COOPERATIVAS
As cooperativas são criadas por pessoas que se reúnem com o objetivo de,
através de sua contribuição, da solidariedade, atingirem resultados em comum, ou
seja, auferir benefícios inalcançáveis individualmente:
Deste modo, a solidariedade, indiscutivelmente, é a base da cooperativa.
Não importa que, na realidade, cada cooperado tenha seus objetivos e
planos individuais (e não poderia ser diferente); o mais importante, no caso
da cooperativa, é que todos escolheram essa associação como o
68
instrumento através do qual poderiam facilmente atingir seus propósitos.
64
FURQUIM, Maria Célia de Araújo. A Cooperativa como Alternativa de Trabalho. São Paulo:
LTR, 2001. pág. 45.
65
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil/constituicao/constituicao.htm.
66
POLONIO, Wilson Alves. Manual de Sociedades Cooperativas. São Paulo: Atlas, 2004. pág.47.
67
FURQUIM, Maria Célia de Araújo. A Cooperativa como Alternativa de Trabalho. São Paulo:
LTR, 2001. pág. 46.
68
RICCIARDI, Luiz; LEMOS, Roberto Jenkis. Cooperativa, a Empresa do Século XX. São Paulo:
LTR, 2000. pág. 31.
25
A lei, ao instituir o regime jurídico das cooperativas, diferenciando-as das
demais
sociedades
e
dando-lhes
determinadas
características,
conforme
demonstrado no item acima, almejou a melhoria da condição social de seus
associados. Em razão disso, este tipo de sociedade é regido por dois princípios
primordiais: o princípio da dupla qualidade e o da retribuição.
69
O princípio da dupla qualidade afirma que o trabalhador associado tem de ser,
ao mesmo tempo, em sua cooperativa, cooperado e cliente, auferindo as vantagens
dessa duplicidade de situações: 70
Isso significa que, para tal princípio, é necessário haver efetiva prestação de
serviços pela Cooperativa diretamente ao associado e não somente a
terceiros. Essa prestação direta de serviços aos associados/cooperados é,
aliás, conduta que resulta imperativamente da própria Lei de Cooperativas
(artigo 6º, I, Lei n. 5.764/70).
De fato, segundo a lei, as cooperativas singulares (que não se confundem
com as "cooperativas centrais" ou "federações de cooperativas" ou, ainda,
"confederações de cooperativas" - artigo 6º, II e III, Lei das Cooperativas)
"...se caracterizam pela prestação direta de serviços aos associados" (artigo
7º, Lei n. 5.764/70). Na mesma linha, enfatiza o artigo 4º deste diploma que
as cooperativas singulares são "constituídas para prestar serviços aos
associados".
Objetiva, desse modo, o princípio da dupla qualidade que as cooperativas
destaquem-se por uma peculiaridade em face de outras associações: o
próprio associado é um dos beneficiários centrais dos serviços por ela
71
prestados.
Neste sentido, leciona Sylvio Marcondes:
[...] nas sociedades em geral os destinatários dos serviços prestados são os
terceiros, que com elas operam; os sócios são destinatários tão-somente
dos lucros daí resultantes. É possível que qualquer sociedade preste
serviços a um sócio,caso em que este, eventualmente, acumulará a
qualidade de sócio com a posição de terceiro. Na cooperativa, porém, essa
acumulação não é acidental e, ao contrário, integra a sua própria natureza:
o cooperado é, sempre e ao mesmo tempo, membro da coletividade e
72
destinatário dos seus serviços.
Estes princípios têm por finalidade justificar a existência da cooperativa e
demonstrar as vantagens existentes na união de esforços entre os cooperados e a
comprovação de que a mesma potencializa o trabalho humano.
69
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 5.ed. São Paulo: LTR, 2006. pág.
329.
70
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 5.ed. São Paulo: LTR, 2006. pág.
329.
71
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 5.ed. São Paulo: LTR, 2006. pág.
329-330.
72
MARCONDES, Sílvio. Questões de Direito Mercantil. São Paulo: Saraiva, 1997. pág. 425. Apud
FREDIANI, Yone. Tendências do Direito Material e Processual do Trabalho. São Paulo: LTR,
2000. pág. 37.
26
Efetivamente, a cooperativa permite que o cooperado obtenha uma
retribuição pessoal, em virtude de sua atividade autônoma, superior àquilo
que obteria caso não estivesse associado. A retribuição pessoal de cada
cooperado é, necessariamente (ainda que em potencial), superior àquela
alcançada caso atuando isoladamente.
O princípio da retribuição pessoal diferenciada é a diretriz jurídica que
assegura ao cooperado um complexo de vantagens comparativas de
natureza diversa muito superior ao patamar que obteria caso atuando
destituído da proteção cooperativista. A ausência desse complexo faz
malograrem tanto a noção como os objetivos do cooperativismo, eliminando
os fundamentos sociais que justificaram o tratamento mais vantajoso que
73
tais entidades sempre mereceram da ordem jurídica.
Diante disso, pode-se concluir que o objetivo da cooperativa é fornecer
melhores condições aos seus cooperados, através da ajuda mútua e união de
interesses, tanto no campo social quanto no profissional.
1.7. CLASSIFICAÇÃO DAS COOPERATIVAS
A legislação não é taxativa quanto à classificação das cooperativas, em razão
do vasto campo de atuação das mesmas, no entanto exige o uso da expressão
cooperativa, independente do campo de atuação, salvo no caso dos bancos, para os
quais a expressão é vetada, conforme disposto no artigo 5º da lei 5.764/71:
Artigo 5° As sociedades cooperativas poderão adotar por objeto qualquer
gênero de serviço, operação ou atividade, assegurando-se-lhes o direito
exclusivo e exigindo-se-lhes a obrigação do uso da expressão "cooperativa"
em sua denominação.
74
Parágrafo único. É vedado às cooperativas o uso da expressão "Banco".
Neste contexto, classificar-se-ão quanto à sua forma legal de constituição ou
quanto a seu objeto.
1.7.1. Quanto à forma legal de constituição
Quanto à forma de constituição, de acordo com o artigo 6º da lei 5.761/71,
podem ser classificadas em:
a)
Cooperativas singulares: São as sociedades constituídas com o número
mínimo de 20 pessoas físicas, que tenham por objeto a mesma atividade,
sendo excepcionalmente permitida a admissão de pessoas jurídicas que
73
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 5.ed. São Paulo: LTR, 2006. pág.
331.
74
BRASIL. Lei 5764/71. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5764.htm.
27
tenham por objeto as mesmas ou correlatas atividades econômicas das
pessoas físicas. Podem, também, ingressar nessa sociedade outras
sociedades sem fins lucrativos, atendidos, por óbvio, aos requisitos legais e
estatutários.75
b) Cooperativas centrais ou federações de cooperativas: São as cooperativas
cujos associados são cooperativas singulares, num mínimo de três. Pode,
excepcionalmente, admitir associados individuais, desde que essas não
exerçam atividade de crédito.
76
O objeto dessas cooperativas está definido
no artigo 8º da Lei n. 5.764/71:
As cooperativas centrais e federações de cooperativas objetivam organizar,
em comum e em maior escala, os serviços econômicos e assistenciais de
interesse das filiadas, integrando e orientando suas atividades, bem como
facilitando a utilização recíproca dos serviços.
Parágrafo único. Para a prestação de serviços de interesse comum, é
permitida a constituição de cooperativas centrais, às quais se associem
77
outras cooperativas de objetivo e finalidade diversos.
c) Confederações de cooperativa: São constituídas com, no mínimo, três
federações de cooperativas ou cooperativas centrais, da mesma ou de
diferentes modalidades. O seu objetivo está previsto no artigo 9º da referida
Lei:
As confederações de cooperativas têm por objetivo orientar e coordenar as
atividades das filiadas, nos casos em que o vulto dos empreendimentos
transcender o âmbito de capacidade ou conveniência de atuação das
78
centrais e federações.
1.7.2. Quanto ao objeto
Quanto ao seu objeto, serão denominadas de acordo com sua finalidade e
atuação:
a) Cooperativas de produção: as cooperativas de produtores têm como
associados os trabalhadores ou os pequenos produtores do campo ou da
75
POLONIO, Wilson Alves. Manual de Sociedades Cooperativas. São Paulo: Atlas, 2004. pág. 68.
SILVA, Leda Maria Messias da. Cooperativas de Trabalho: terceirização sem intermediação. São
Paulo: LTR, 2005. pág. 73.
77
BRASIL. Lei 5764/71. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5764.htm.
78
SILVA, Leda Maria Messias da. Cooperativas de Trabalho: terceirização sem intermediação. São
Paulo: LTR, 2005. pág. 73.
76
28
zona urbana. Objetivam a colocação dos produtos sem intermediários, que
encareceriam, tornando-os mais competitivos.79
b) Cooperativas de consumo: têm por atividade principal a realização de
compras de produtos de primeira necessidade para vendê-los aos
cooperados, no atacado ou no varejo. Como as demais, objetiva eliminar o
intermediário e os especuladores, sempre visando a vantagens econômicas
aos associados. 80
c) Cooperativas mistas: as cooperativas mistas “são aquelas que apresentam
mais de um objeto de atividades”.81
d) Cooperativas de trabalho: trabalhadores se agrupam organizando seu
trabalho com a finalidade de afastar a figura do empregador e obter melhoria
das condições econômicas e condições gerais de trabalho. 82
e) Cooperativas de crédito: são normatizadas e fiscalizadas pelo Banco Central
do Brasil. Formadas pela reunião de pessoas físicas e de pequena e média
renda, que unem os valores contidos em poupanças, e também por pessoas
jurídicas, para obtenção de bens e serviços, empréstimos para suas
atividades ou para micro e pequenos empresários abrirem ou melhorarem
suas empresas.83
f) Cooperativas habitacionais: são constituídas com o intuito de proporcionar a
seus associados a construção e aquisição de imóveis.
Além das já mencionadas, podem-se mencionar outras classificações, de
acordo com Amador Paes de Almeida:
As cooperativas de beneficiamento de produtos que têm por fim fazer, sem
transformação industrial, expurgo, seleção, benefício, padronização,
classificação e acondicionamento de produtos agrários, para a venda ou
exportação.
As cooperativas de vendas em comum que distinguem-se pelo fato de
organizarem coletivamente a defesa comercial dos produtos particularmente
colhidos ou elaborados por seus associados, lavradores ou criadores, por
eles trazidos à cooperativa para esta, com os recursos próprios, promover,
sem ulterior transformação, a venda nos mercados de consumo ou nos de
exportação.
79
MARTINS, Sérgio Pinto. A Terceirização e o Direito do Trabalho. 7.ed. ver. e ampl. São Paulo:
Atlas, 2005. pág. 97.
80
POLONIO, Wilson Alves. Manual de Sociedades Cooperativas. São Paulo: Atlas, 2004. pág. 69.
81
SILVA, Leda Maria Messias da. Cooperativas de Trabalho: terceirização sem intermediação. São
Paulo: LTR, 2005. pág. 78.
82
POLONIO, Wilson Alves. Manual de Sociedades Cooperativas. São Paulo: Atlas, 2004. pág. 76.
83
PINHO, Diva Benevides. O Cooperativismo no Brasil: da vertente pioneira à vertente solidária.
São Paulo: Saraiva, 2004. pág. 128.
29
As cooperativas escolares que poderão constituir-se dos estabelecimentos,
públicos ou particulares, de ensino primário, secundário, superior, técnico ou
profissional, entre os respectivos alunos, por si ou com o concurso de seus
professores, pais, tutores ou pessoas que os representem, com o objetivo
primordial de inculcar aos estudantes a idéia de cooperativismo e ministrarlhes os conhecimentos práticos da organização e funcionamento de
determinada modalidade cooperativa e, acessoriamente, proporcionar-lhes
84
as vantagens econômicas peculiares à modalidade preferida.
Verificadas as principais classificações existentes no que diz respeito às
cooperativas, iniciar-se-á o segundo capítulo discorrendo, de forma mais
aprofundada, sobre as cooperativas de trabalho, objeto do presente estudo.
84
ALMEIDA, Amador Paes de. Manual das sociedades comerciais. 12. ed. São Paulo: Saraiva,
1999, pág. 345.
30
2. COOPERATIVAS DE TRABALHO
2.1. CONCEITO
A lei 5.764/71, que define a política nacional do cooperativismo, não
conceitua, em seu teor, o que são cooperativas de trabalho. No entanto, este
conceito foi estabelecido anteriormente, através do dec. 22.239/32, em seu artigo
24, que diz:
Artigo 24. São cooperativas de trabalho aquelas que, constituídas entre
operários de uma determinada profissão ou ofício ou de ofícios vários de
uma mesma classe, têm como finalidade primordial melhorar os salários e
as condições de trabalho pessoal de seus associados e, dispensando a
intervenção de um patrão ou empresário, se propõem contratar e executar
obras, tarefas, trabalhos ou serviços, públicos ou particulares, coletivamente
85
por todos ou por grupos de alguns.
Não obstante a conceituação legal dada pelo decreto acima, este tema possui
diversos conceitos, dos quais alguns serão citados.
Assim, segundo Estenio Campelo, são cooperativas de trabalho: “[…]
organização de pessoas que visam ajudar-se mutuamente, sendo o traço
diferenciador dessa forma de sociedade a finalidade da prestação de serviços aos
associados para o exercício de atividade comum ou econômica sem fim lucrativo.” 86
Desta forma, conceitua Diva Benevides Pinho:
Cooperativas de trabalho ou de trabalhadores, cooperativas de operários ou
cooperativas operárias de produção representam um tipo de empresa
alternativa, criada voluntariamente por trabalhadores. Não resultam da
imposição do Estado ou de grupos econômicos, nem do carisma de alguns
87
idealizadores, nem sequer da sustentação de importante capital.
Para Maria Célia de Araújo Furquim:
A Cooperativa de Trabalho consiste naquela em que trabalhadores se
agrupam, organizam seu trabalho em comum, independente da atividade,
cuja finalidade é afastar a figura do empregador, bem como obter melhoria
88
das condições econômicas e das condições gerais de trabalho.
Destarte, completa Valentin Carrion:
85
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág. 33.
BEZERRA, João Estenio Campelo. Cooperativas de Trabalho: relação de emprego. Brasília:
Brasília Jurídica, 2005. pág. 38.
87
PINHO, Diva Benevides. O Cooperativismo no Brasil: da vertente pioneira à vertente solidária.
São Paulo: Saraiva, 2004. pág. 130.
88
FURQUIM, Maria Célia de Araújo. A Cooperativa como Alternativa de Trabalho. São Paulo:
LTR, 2001. pág. 50.
86
31
Cooperativa de trabalho ou de serviços nasce da vontade de seus
membros, todos autônomos e que assim continuam. As tarefas são
distribuídas com igualdade de oportunidades; repartem-se os ganhos
proporcionalmente ao esforço de cada um. Pode haver até direção de
89
algum deles, mas não existe patrão nem alguém que se assemelhe.
De tal modo, foi em virtude da expressiva exploração da mão-de-obra dos
empregadores e o descaso do Estado nas relações de trabalho que surgiu o
movimento cooperativista, que atualmente se expande, sobretudo pelo apoio
constitucional obtido.90
As cooperativas de trabalho apresentam diversas denominações, das quais
se destacam como mais usuais, conforme Estenio Campelo: a) cooperativa de
serviços; b) cooperativa de prestação de serviços; c) cooperativa de profissionais
autônomos; e d) cooperativa de mão-de-obra.91
As cooperativas estão presentes em grande parte dos países, incentivando
suas economias e atenuando o desemprego. Por esta razão, cabe ressaltar o
documento n° 127 da Organização Internacional do Trabalho, OIT, de 21 de junho
de 1966, que enfatiza a importância das cooperativas de trabalho como instrumento
de promoção da justiça social, do progresso econômico e social nos países em
desenvolvimento. 92
Ainda,
revisando
e
substituindo
este
documento,
foi
publicada
a
recomendação nº. 193, que versa sobre a Promoção das Cooperativas, discutida em
Genebra, em 3 de junho de 2002. Prevê como objetivo do cooperativismo o
desenvolvimento econômico e social do cidadão, sua qualificação profissional e
aumento de renda. Acrescenta a referida recomendação que a cooperativa serve
para fornecer ocupação às pessoas, não deixando também de ser um meio de
distribuição de renda.93
Diante dos conceitos e considerações realizadas no decorrer deste item,
verifica-se a importância das Cooperativas de Trabalho, que de forma contínua
89
CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do trabalho. 30. ed. São Paulo:
Saraiva, 2005. pág. 281.
90
BEZERRA, João Estenio Campelo. Cooperativas de Trabalho: relação de emprego. Brasília:
Brasília Jurídica, 2005. pág. 38.
91
BEZERRA, João Estenio Campelo. Cooperativas de Trabalho: relação de emprego. Brasília:
Brasília Jurídica, 2005. pág. 40.
92
BULGARELLI, Waldirio. As sociedades cooperativas e a sua disciplina jurídica. Rio de Janeiro:
Renovar, 2000. pág. 289. Apud BEZERRA, João Estenio Campelo. Cooperativas de Trabalho:
relação de emprego. Brasília: Brasília Jurídica, 2005. pág. 29-30.
93
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág. 9798.
32
levam a acreditar que servem para amenizar os problemas econômicos e sociais
causados pelo mundo capitalista.
2.1.1. Tipos de cooperativas de trabalho
Apesar de já serem classificadas como Cooperativas de Trabalho, por seu
objeto e natureza, segundo Sérgio Pinto Martins, as cooperativas de trabalho podem
se subdividir em:
a) de serviços, nas quais os cooperados, por si próprios, prestam serviços a
quem os requerer, nas diversas especialidades. Na maioria dos casos, o serviço é
prestado individualmente em relação a cada associado, com seus próprios
equipamentos de trabalho, como no caso dos médicos e dentistas associados da
Unimed, da Uniodonto;94
b) de mão-de-obra, que têm por objeto o fornecimento de mão-de-obra para
as empresas, que é quem possui os materiais utilizados para os serviços. Como
exemplo, existem cooperativas de faxineiros, de vigilantes, de porteiros; 95
Segundo Marcelo Mauad, as cooperativas de mão-de-obra também podem
ser denominadas Comanditas Operárias e/ou Equipes Autônomas de Trabalho.96
“Sua característica principal é o fato de tornar-se uma "subempresa” dentro da
empresa” 97
c) mistas, que são as que têm por objeto o fornecimento de serviços e mãode-obra. 98
Além das já citadas, Marcelo Mauad apresenta a classificação promovida por
Alíca Kaplan de Dimer, dividindo-as em: cooperativas de produção propriamente
ditas, organizações comunitárias de trabalho, cooperativas de trabalho propriamente
ditas; além das já citadas cooperativas de mão-de-obra.99
a) As cooperativas de produção propriamente ditas têm como principal
característica o fato de os trabalhadores cooperados possuírem seus
94
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág. 68.
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág. 68.
96
MAUAD, Marcelo José Ladeira. Cooperativas de Trabalho: sua relação com o direito do Trabalho.
2.ed. São Paulo: LTR, 2001. pág. 85.
97
DRIMER, Alicia Kaplan de. Manual das Cooperativas. Buenos Aires: Intercoop, 1997 apud
MAUAD, Marcelo José Ladeira. Cooperativas de Trabalho: sua relação com o direito do Trabalho.
2.ed. São Paulo: LTR, 2001. pág. 85.
98
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág. 68
99
DRIMER, Alicia Kaplan de. Manual das Cooperativas. Buenos Aires: Intercoop, 1997 apud
MAUAD, Marcelo José Ladeira. Cooperativas de Trabalho: sua relação com o direito do Trabalho.
2.ed. São Paulo: LTR, 2001. pág. 85
95
33
próprios estabelecimentos produtivos, acrescidos do maquinário e demais
meios necessários à consecução dos objetivos econômicos da organização.
Os trabalhadores cooperados, por serem os donos dos fatores de produção,
assumem todos os riscos técnicos e econômicos da organização.
Geralmente, esta modalidade de cooperativa laboral possui capital elevado
e normalmente cuidam também de distribuir o produto no mercado.
b) As organizações comunitárias de trabalho guardam certa semelhança
com o modelo anterior, na medida em que também neste caso os
trabalhadores detêm os meios de produção. Sua característica especial é
dada pela forma como se organizam e pelo fato de atingirem, na imensa
maioria dos casos, a agricultura e a pecuária. Outro dado importante é que
a propriedade em comum dos fatores de produção é bastante acentuada
neste caso, em cotejo com a organização retrocitada. O valor considerável
do capital envolvido bem como os fortes vínculos econômicos e sociais
entre os cooperados também evidenciam esta forma de cooperativa.
c) As cooperativas de trabalho propriamente ditas dispõem de um capital
social reduzido. Seu objeto principal é contratar trabalho com outras
pessoas físicas ou empresas para distribuí-los entre seus associados. […]
Constituindo uma força reunida e organizada, podem pleitear melhores
condições de trabalho e preço, diretamente com as empresas ou usuários
100
de seu serviço.
Apesar de possuírem objetos e características semelhantes, podem-se
observar neste item que existem diferentes tipos de cooperativas de trabalho, cada
uma com suas particularidades e ramos de atuação diferentes.
2.1.2. Cooperativa de trabalho X empresa
No que diz respeito a esses dois tipos societários, Nilton Oliveira Gonçalves
elaborou um quadro comparativo, demonstrando suas principais diferenças:
COOPERATIVAS DE TRABALHO
Sociedade de pessoas
Sem fins lucrativos
Presta serviço ao associado (trabalhador)
Associado presta serviços como autônomo
Risco é dos trabalhadores (associados)
Cada associado um voto (gestão democrática)
Política de negócios definidas pelos associados em
Assembléia
Número limitado de associados
Não sujeita à falência
Remuneração dos Trabalhadores (associados) de
acordo com a produção
100
EMPRESA
Sociedade de capital
Visa lucro
O empregado lhe presta serviços
Trabalho subordinado
Risco é dos empresários (donos da
empresa)
Maior participação no capital = Maior
poder de decisão
Dirigentes escolhidos pelos donos –
centralizada
Número limitado de sócios
Sujeita à falência
Empregados
com
salários
pré101
estabelecidos
DRIMER, Alicia Kaplan de. Manual das Cooperativas. Buenos Aires: Intercoop, 1997 apud
MAUAD, Marcelo José Ladeira. Cooperativas de Trabalho: sua relação com o direito do Trabalho.
2.ed. São Paulo: LTR, 2001. pág. 85-86.
101
GONÇALVES, Nilton Oliveira. Terceirização de mão-de-obra. São Paulo: LTR, 2005. pág. 72.
34
Diante disso, percebe-se que a estrutura e os objetivos das cooperativas não
se confundem com os de uma empresa comum.
2.2. OBJETIVOS DAS COOPERATIVAS DE TRABALHO
Além dos objetivos já explanados no primeiro capítulo da presente
monografia, referentes às cooperativas de um modo geral, cabem ressaltar os
objetivos específicos das Cooperativas de Trabalho.
De forma particular, este tipo de cooperativa tem por escopo obter trabalho
para os seus cooperados. É o resultado do trabalho, não importando quem presta
serviços ou de que maneira o mesmo é realizado. 102
Neste mesmo sentido, leciona Marcelo Mauad:
O objeto das sociedades cooperativas laborais, consideradas em seu
conjunto é a prestação de serviços aos seus sócios através do fornecimento
de trabalho, a administração e a comercialização das tarefas por eles
desempenhadas. A finalidade das cooperativas de trabalho é
103
percipuamente gerar trabalho para os cooperados.
Ademais, assim como as demais cooperativas, possui finalidade social, ou
seja, através da ajuda mútua proporcionar igualdade de oportunidades, inclusive
para os desiguais.104
Da mesma forma, coadunam os ensinamentos de Polonio:
As cooperativas de trabalho objetivam melhorar os ganhos de seus
associados, assim como as condições de trabalho destes. Tem-se por
associado o trabalhador da mesma profissão ou não, porém, de uma
mesma classe, ou seja, trabalhadores com identidade de interesses em
razão de sua atividade laborativa. O associado de uma cooperativa de
trabalho é dono do capital do empreendimento cooperativo e autogestor dos
105
negócios comuns.
Sem a existência da cooperativa de trabalho, o trabalhador autônomo ou
eventual procuraria as empresas, submetendo-se aos ditames do contratante, que,
evidentemente, utilizaria da sua posição privilegiada para se favorecer em
detrimento dos interesses do trabalhador. 106
102
62.
103
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág.
MAUAD, Marcelo José Ladeira. Cooperativas de Trabalho: sua relação com o direito do
Trabalho. 2.ed. São Paulo: LTR, 2001. pág. 92.
104
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág.
62.
105
POLONIO, Wilson Alves. Manual de Sociedades Cooperativas. São Paulo: Atlas, 2004. pág. 77.
106
MAUAD, Marcelo José Ladeira. Cooperativas de Trabalho: sua relação com o direito do
Trabalho. 2.ed. São Paulo: LTR, 2001. pág. 130.
35
É aí que se verifica a importância da organização dos trabalhadores em
cooperativas, pois, unidos, poderão, como no caso das cooperativas de produção e
serviços, montar um negócio próprio, que lhes permita produzir seus bens e serviços
e negociá-los diretamente no mercado, com meios e fatores de produção próprios
ou, ainda, nos casos das cooperativas de mão-de-obra, disponibilizar sua força de
trabalho a terceiros, no entanto, com condições de negociação melhores, que
atendam, mesmo que indiretamente, a seus próprios interesses.107
Nilton de Oliveira Gonçalves acredita que a expansão do capitalismo e os
investimentos no mercado de trabalho afrouxarão a intervenção estatal nas relações
de trabalho, e os princípios da autonomia e liberdade passarão a regê-las. Neste
contexto, a cooperativa de trabalho terá um papel cada vez mais importante, já que
é o instrumento que representa os trabalhadores, ao tempo que lhes dá apoio e
assistência.108
Assim, leva-se a acreditar que a cooperativa de trabalho tem por objetivo
específico proporcionar aos cooperados melhorias nas condições de trabalho,
contudo visa, como finalidade geral, proporcionar melhoria na qualidade de suas
vidas.
2.3. ATOS COOPERATIVOS X ATOS NÃO COOPERATIVOS
As sociedades cooperativas, com o intuito de promover suas finalidades
sociais, executam diversas atividades, interagindo ora com o cooperado, ora com
terceiro, isoladamente ou com ambos, em um mesmo contexto. Essa forma de
interação se divide nos chamados atos cooperativos e atos não cooperativos.109
O artigo 79 da lei 5.764/71 traz a definição de atos cooperativos, quais sejam:
Denominam-se atos cooperativos os praticados entre as cooperativas e
seus associados, entre estes e aquelas e pelas cooperativas entre si
110
quando associados, para a consecução dos objetivos sociais.
E ressalta em seu parágrafo único:
O ato cooperativo não implica operação de mercado, nem contrato de
compra e venda de produto ou mercadoria.
107
MAUAD, Marcelo José Ladeira. Cooperativas de Trabalho: sua relação com o direito do
Trabalho. 2.ed. São Paulo: LTR, 2001. pág. 130.
108
GONÇALVES, Nilton Oliveira. Terceirização de mão-de-obra. São Paulo: LTR, 2005. pág. 69.
109
POLONIO, Wilson Alves. Manual de Sociedades Cooperativas. São Paulo: Atlas, 2004. pág.
104.
110
BRASIL. Lei 5764/71. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5764.htm.
36
Segundo Sérgio Pinto Martins, “o ato cooperativo pode ser dividido em ato-fim
e ato-meio. Ato-fim ou ato-principal diz respeito às atividades principais da
cooperativa”. Ato-meio quando envolve negociação entre a cooperativa e o mercado,
que não seja essencial da cooperativa. 111
Esses atos podem ser classificados de três maneiras diferentes:
a) Atos principais, que são aqueles realizados entre a cooperativa e os
cooperados, entre as próprias cooperativas entre si, na condição de associadas,
para a consecução de objetivos sociais. Exemplos deste atos seriam: a busca de
trabalho aos cooperados, o gerenciamento e a administração dos serviços, a
distribuição das sobras. 112
b) Atos auxiliares, que se caracterizam no momento em que a cooperativa
coloca à disposição dos associados os instrumentos indispensáveis para o
cumprimento de sua atividade econômica, para a realização da atividade principal.
113
c) Atos acessórios são, por exemplo, a prática de atos, pelas cooperativas,
que indiretamente tornam possível a sua atuação. Como, por exemplo, as locações,
contratações de serviços, operações relativas à aquisição de equipamentos. 114
Diferente disso, o ato não cooperativo é aquele realizado entre a cooperativa
e o não-associado. Como, por exemplo, a venda de produção agrícola de não
cooperado, em razão da necessidade de atender a um cliente. 115
Do mesmo modo, Amílcar Júnior define:
[…] serão aqueles realizados na utilização de recursos (bens e serviços) de
pessoas (físicas ou jurídicas) que atuem dentro do mesmo objeto social dos
cooperantes, alheios, porém, ao quadro de sócios, para cumprimento dos
contratos com os usuários ou consumidores. Compreendendo este conceito,
ressalta-se a circunstância que, nestes casos, ou seja, nos "atos não
cooperativos" a cooperativa estará prestando serviços a um não cooperante
(pessoa que, pela sua qualificação, poderia se associar à sociedade),
consistindo esse serviço em conceder a essa pessoa (física ou jurídica) uma
parte para a atividade integrante das contratações próprias dos atos
116
principais.
111
78.
112
78.
113
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág.
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág.
TEIXEIRA Jr., Amílcar Barca Teixeira. Revista das Revistas. Brasília: FEUC, julho de 2003.
208.
114
TEIXEIRA Jr., Amílcar Barca Teixeira. Revista das Revistas. Brasília: FEUC, julho de 2003.
208.
115
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006.
79.
116
TEIXEIRA Jr., Amílcar Barca Teixeira. Revista das Revistas. Brasília: FEUC, julho de 2003.
208.
pág.
pág.
pág.
pág.
37
Conforme explanado, percebe-se que o ato cooperativo será classificado de
acordo com a finalidade com que é praticado e para quem é praticado.
2.4. CONSTITUIÇÃO E SISTEMA ORGANIZACIONAL
Assim como as demais cooperativas, a constituição e a organização das
cooperativas de trabalho obedecem aos dispostos da lei 5.764/71. Analisar-se-ão a
seguir as principais formalidades exigidas.
2.4.1. Constituição
A lei 5.764/71 prevê, em seu artigo 14:
a sociedade cooperativa constitui-se por deliberação da Assembléia Geral
117
dos fundadores, constantes da respectiva ata ou por instrumento público.
Ainda, em seu artigo 15, prevê, em seus incisos, o que deverá declarar o ato
constitutivo, sob pena de nulidade:
[…]
I - a denominação da entidade, sede e objeto de funcionamento;
II - o nome, nacionalidade, idade, estado civil, profissão e residência dos
associados, fundadores que o assinaram, bem como o valor e número da
quota-parte de cada um;
III - aprovação do estatuto da sociedade;
IV - o nome, nacionalidade, estado civil, profissão e residência dos
associados eleitos para os órgãos de administração, fiscalização e outros.
118
Embora sejam sociedade civis, os atos constitutivos das cooperativas devem
ser registrados na Junta Comercial, para adquirirem personalidade jurídica.119
Contudo dispõe o artigo 1.093 do Código Civil que a sociedade cooperativa
rege-se pelo disposto no capítulo do mesmo código, ressalvada a legislação
especial. No que for omissa, de acordo com seu artigo 1.096, aplicam-se as
disposições referentes à sociedade simples, nas quais se enquadram as
cooperativas, conforme parágrafo único do artigo 982 do referido código. 120
117
BRASIL. Lei 5764/71. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5764.htm.
BRASIL. Lei 5764/71. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5764.htm.
119
POLONIO, Wilson Alves. Manual de Sociedades Cooperativas. São Paulo: Atlas, 2004. pág. 78.
120
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág.
87.
118
38
Desta feita, de acordo com o artigo 998 do Código Civil, as sociedades
simples, inclusive as cooperativas, devem registrar seu contrato social no Registro
Civil das Pessoas Jurídicas no local da sua sede. Contudo, esclarece-se que, ao se
referir o artigo 1.096 do Código Civil a lei especial, se remete à lei 5.764/71; caso
contrário, teria usado a expressão “a este código”. Assim, serão aplicados os artigos
referentes à sociedade simples apenas quando aquela lei especial for omissa. 121
O artigo 16 da lei 5.764/71 prevê:
o ato constitutivo da sociedade e os estatutos, quando não transcritos
122
naquele, serão assinados pelos fundadores.
O estatuto social, conforme o artigo 21123 da mesma lei, define o objeto social,
as regras e diretrizes das atividades das cooperativas, bem como seu
relacionamento com os associados. Esta é mais uma peculiaridade das
cooperativas, haja vista as sociedades simples serem regidas por contrato social. 124
Ainda, de acordo com o artigo 107 de lei 5.764/71:
as cooperativas são obrigadas, para seu funcionamento, a registrar-se na
Organização das Cooperativas Brasileiras ou na entidade estadual, se
houver, mediante apresentação dos estatutos sociais e suas alterações
125
posteriores".
121
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág.
87.
122
BRASIL. Lei 5764/71. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5764.htm.
123
Artigo 21. O estatuto da cooperativa, além de atender ao disposto no artigo 4º, deverá indicar:
I - a denominação, sede, prazo de duração, área de ação, objeto da sociedade, fixação do exercício
social e da data do levantamento do balanço geral;
II - os direitos e deveres dos associados, natureza de suas responsabilidades e as condições de
admissão, demissão, eliminação e exclusão e as normas para sua representação nas assembléias
gerais;
III - o capital mínimo, o valor da quota-parte, o mínimo de quotas-partes a ser subscrito pelo
associado, o modo de integralização das quotas-partes, bem como as condições de sua retirada nos
casos de demissão, eliminação ou de exclusão do associado;
IV - a forma de devolução das sobras registradas aos associados, ou do rateio das perdas apuradas
por insuficiência de contribuição para cobertura das despesas da sociedade;
V - o modo de administração e fiscalização, estabelecendo os respectivos órgãos, com definição de
suas atribuições, poderes e funcionamento, a representação ativa e passiva da sociedade em juízo
ou fora dele, o prazo do mandato, bem como o processo de substituição dos administradores e
conselheiros fiscais;
VI - as formalidades de convocação das assembléias gerais e a maioria requerida para a sua
instalação e validade de suas deliberações, vedado o direito de voto aos que nelas tiverem interesse
particular sem privá-los da participação nos debates;
VII - os casos de dissolução voluntária da sociedade;
VIII - o modo e o processo de alienação ou oneração de bens imóveis da sociedade;
IX - o modo de reformar o estatuto;
X - o número mínimo de associados.
124
POLONIO, Wilson Alves. Manual de Sociedades Cooperativas. São Paulo: Atlas, 2004. pág. 78.
125
BRASIL. Lei 5764/71. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5764.htm.
39
Segundo o inciso XVIII do artigo 5º da Constituição Federal de 1988, a
criação de associações, bem como de cooperativas, independe de autorização, e é
vedada a interferência estatal em seu funcionamento. Isso significa que a
constituição de uma cooperativa segue o mesmo rito de qualquer sociedade, com
exceção das que precisam de autorização especial de alguns órgãos públicos para
funcionamento, como instituições financeiras pelo Banco Central. 126
Vistas as formas e requisitos para a criação de uma cooperativa, passam-se a
analisar os critérios exigidos em lei para o funcionamento de uma sociedade desta
espécie.
2.4.2. Sistema organizacional
Segundo Leda Maria Messias da Silva, as cooperativas normalmente, para
seu bom funcionamento, possuem as seguintes estruturas; Diretoria ou Conselho de
Administração, Conselho Fiscal e Assembléia Geral. Ressalta-se que a composição
desses órgãos deve ser exclusiva de cooperados, vedada a participação de
terceiros, estranhos à cooperativa. 127
Conforme o disposto no artigo 47 da lei 5.764/71:
A sociedade será administrada por uma Diretoria ou Conselho de
Administração, composto exclusivamente de associados eleitos pela
Assembléia Geral, com mandato nunca superior a 4 (quatro) anos, sendo
obrigatória a renovação de, no mínimo, 1/3 (um terço) do Conselho de
128
Administração.
O conselho de administração e/ou a Diretoria geralmente é composta de
presidente, vice-presidente, secretário e dois diretores. Suas funções principais são:
presidente – convoca as Assembléias Gerais e reuniões do Conselho de
Administração e, ainda, é o representante legal da sociedade; vice-presidente – caso
não esteja previsto de forma diversa no estatuto, tem como função substituir o
presidente em caso de ausência ou em situações de impedimento; secretário –
encarregado da parte administrativa; diretores – têm suas atribuições previstas no
estatuto. 129
126
POLONIO, Wilson Alves. Manual de Sociedades Cooperativas. São Paulo: Atlas, 2004. pág. 80.
SILVA, Leda Maria Messias da. Cooperativas de Trabalho: terceirização sem intermediação. São
Paulo: LTR, 2005. pág. 70.
128
BRASIL. Lei 5764/71. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5764.htm.
129
PINHO, Diva Benevides. O Cooperativismo no Brasil: da vertente pioneira à vertente solidária.
São Paulo: Saraiva, 2004. pág. 112.
127
40
Apesar de serem associados da cooperativa, segundo o artigo 52 da lei
5.764/71:
130
Artigo 52 - São inelegíveis, além das pessoas impedidas
por lei, os
condenados a pena que vede, ainda que temporariamente, o acesso a
cargos públicos; ou por crime falimentar, de prevaricação, peita ou suborno,
concussão, peculato, ou contra a economia popular, a fé pública ou a
propriedade.
Parágrafo único. Não podem compor uma mesma Diretoria ou Conselho de
Administração, os parentes entre si até 2º (segundo) grau, em linha reta ou
131
colateral.
O Conselho fiscal, de acordo com o artigo 56 da lei 5.764/71, será o órgão
fiscalizador da administração da sociedade. É constituído por associados, sendo três
membros efetivos e três suplentes, eleitos anualmente pela Assembléia Geral,
permitida apenas a reeleição de dois conselheiros, ou seja, um terço dos seus
componentes. Adverte-se que, assim como no Conselho de Administração, não
podem fazer parte do Conselho Fiscal os membros elencados no artigo 51 da
mesma lei, bem como os parentes dos diretores até o 2° (segundo) grau, em linha
reta ou colateral, bem como os parentes entre si até esse 2º grau. Também não é
permitida a cumulação de cargos nos órgãos de administração e de fiscalização. 132
Preceitua o artigo 38 da lei 5.764/71:
A Assembléia Geral dos associados é o órgão supremo da sociedade,
dentro dos limites legais e estatutários, tendo poderes para decidir os
negócios relativos ao objeto da sociedade e tomar as resoluções
convenientes ao desenvolvimento e defesa desta, e suas deliberações
133
vinculam a todos, ainda que ausentes ou discordantes.
Desta forma, a assembléia geral é o órgão deliberativo das cooperativas.
Ocorrem de duas formas: Ordinárias ou Extraordinárias. Seu quórum legal, o modo
de convocação e a maioria necessária para as deliberações são predeterminadas no
estatuto social. Reitera-se que cada associado terá direito a apenas um voto,
independentemente do capital social, excetuado o direito de representação, pelo
qual um associado poderá representar outro associado, sendo que somente poderá
representar um. 134
130
Lei 5.764/71. artigo 31 – O associado que aceitar e estabelecer relação empregatícia com a
cooperativa, perde o direito de votar e ser votado, até que sejam aprovadas as contas do exercício
em que ele deixou o emprego; artigo 52 – O diretor ou associado que, em qualquer operação, tenha
interesse oposto ao da sociedade, não pode participar das deliberações referentes a essa operação.
131
BRASIL. Lei 5764/71. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5764.htm.
132
SILVA, Leda Maria Messias da. Cooperativas de Trabalho: terceirização sem intermediação. São
Paulo: LTR, 2005. pág. 71.
133
BRASIL. Lei 5764/71. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5764.htm.
134
PINHO, Diva Benevides. O Cooperativismo no Brasil: da vertente pioneira à vertente solidária.
São Paulo: Saraiva, 2004. pág. 77.
41
A Assembléia Geral Ordinária, de acordo com o artigo 44 da lei 5.764/72, será
realizada nos três primeiros meses após o término social, e deliberará sobre os
assuntos que deverão constar da ordem do dia: prestação de contas da Diretoria e
exame do parecer do Conselho Fiscal, aprovar ou rejeitar os atos relativos à gestão,
deliberar sobre as sobras e seu rateio entre os cooperados, eleição dos
componentes dos órgãos de administração, do Conselho Fiscal e de outros, quando
necessário; também, quando previsto, sobre a fixação do valor dos honorários,
gratificações e cédula de presença dos membros do Conselho de Administração ou
da Diretoria e do Conselho Fiscal.135
Portanto, cabem à Assembléia Geral Extraordinária, conforme o artigo 46 da
mesma lei: deliberações excepcionais, tais como reforma dos estatutos, fusão,
incorporação ou desmembramento, mudança do objeto da sociedade, dissolução
voluntária da sociedade e nomeação de liquidantes, contas do liquidante,
necessitando da aprovação de dois terços dos associados presentes, para que as
decisões ali tomadas tenham validade. 136
Analisados os órgãos que permitem o pleno funcionamento e organização da
cooperativa, verificar-se-ão em seguida, as disposições acerca dos cooperados.
2.6. O COOPERADO
Segundo o artigo 29 da lei 5.764/71:
O ingresso nas sociedades cooperativas é livre a todos que desejarem
utilizar os serviços prestados pela sociedade, desde que adiram aos
propósitos sociais e preencham as condições estabelecidas no estatuto e
preencham as condições estabelecidas no estatuto, ressalvado o disposto
137
no artigo 4º, item I, da lei.
O trabalhador interessado em se tornar cooperado apresentará uma carta de
adesão, para ingressar na sociedade, de preferência feita de próprio punho para
demonstrar o interesse próprio e sem qualquer espécie de pressão. Em seguida,
firmará termo de ciência estatutária e de disponibilidade, também de próprio punho.
Além disso, adverte Sérgio Pinto Martins, o cooperado deverá possuir capacidade
135
SILVA, Leda Maria Messias da. Cooperativas de Trabalho: terceirização sem intermediação. São
Paulo: LTR, 2005. pág. 71.
136
SILVA, Leda Maria Messias da. Cooperativas de Trabalho: terceirização sem intermediação. São
Paulo: LTR, 2005. pág. 71.
137
BRASIL. Lei 5764/71. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5764.htm.
42
plena, de acordo com o Código Civil, ou seja, ter mais de dezoito anos e ser
capaz138. 139
A retirada do cooperado, conforme os artigos 32 a 35 da lei acima, se dá: por
demissão, que só pode ser solicitada pelo mesmo de forma manuscrita; por exclusão
ou eliminação, em razão de infração legal ou estatutária, ou, ainda, em decorrência
de casos específicos, previstos no estatuto. Ressalta-se que as condições de
retirada, nos casos de demissão, eliminação ou exclusão, devem estar previstas no
estatuto, conforme artigo 21, III da lei 5.764. 140
Outrossim, o cooperado deverá participar das assembléias, para que assim
exerça seu direito de participação na sociedade e de voto, e, desta forma
democrática, decidir sobre os rumos da cooperativa; caso contrário, terá que aceitar
a decisão dos demais presentes. 141
Transparece haver autonomia e liberdade para o cooperado ao ingressar nas
cooperativas, bem como a importância do mesmo para o funcionamento da
sociedade.
2.5.1. Da responsabilidade dos cooperados
Conforme o artigo 1.095 do Código Civil:
Artigo 1.095. Na sociedade cooperativa, a responsabilidade dos sócios pode
ser limitada ou ilimitada.
o
§ 1 É limitada a responsabilidade na cooperativa em que o sócio responde
somente pelo valor de suas quotas e pelo prejuízo verificado nas operações
sociais, guardada a proporção de sua participação nas mesmas operações.
o
§ 2 É ilimitada a responsabilidade na cooperativa em que o sócio responde
142
solidária e ilimitadamente pelas obrigações sociais.
Assim, o sócio de cooperativa de responsabilidade limitada responde
subsidiariamente pelas obrigações adquiridas pela Cooperativa perante terceiros, e
limitadamente ao valor das quotas por ele integralizadas, bem como pelos prejuízos
porventura verificados, na proporção das operações que tiver realizado. Já o sócio
138
Pessoa que possui capacidade de pessoalmente atuar na órbita do direito, ou seja, que não é
incapaz. Não possui idade imatura ou deficiência física ou mental determinada. (RODRIGUES, Silvio.
Direito Civil: parte geral. 34.ed. São Paulo: Saraiva, 2003. pág. 39).
139
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág.
88.
140
POLONIO, Wilson Alves. Manual de Sociedades Cooperativas. São Paulo: Atlas, 2004. pág. 81.
141
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág.
88.
142
.BRASIL. Código Civil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/
L10406.htm.
43
de cooperativa de responsabilidade ilimitada, que são aquelas que se constituem
sem capital social, responde ilimitadamente pelas obrigações sociais da mesma.
Nesta modalidade de cooperativa, os credores da cooperativa terão como garantia o
patrimônio pessoal dos sócios. 143
Ainda, prevê a lei 5.764/71, em seu artigo 13:
a responsabilidade do associado para com terceiros, como membro da
sociedade, somente poderá ser invocada depois de judicialmente exigida da
144
cooperativa.
Desta forma, a responsabilidade do cooperado sempre será subsidiária e
segundo a forma que determina o estatuto. 145
Por fim, o artigo 36 da lei 5.764/71 dispõe:
Artigo 36. A responsabilidade do associado perante terceiros, por
compromissos da sociedade, perdura para os demitidos, eliminados ou
excluídos até quando aprovadas as contas do exercício em que se deu o
desligamento.
Parágrafo único. As obrigações dos associados falecidos, contraídas com a
sociedade, e as oriundas de sua responsabilidade como associado em face
de terceiros, passam aos herdeiros, prescrevendo, porém, após um ano
contado do dia da abertura da sucessão, ressalvados os aspectos
peculiares das cooperativas de eletrificação rural e habitacionais.
Portanto, apesar de desligado das atividades da cooperativa, o associado
permanece responsável pela obrigação e participação que lhe é devida, em virtude
de a cooperativa ser apenas um instrumento de melhoria na condição do cooperado,
que assume individual e pessoalmente as obrigações que lhes são confiadas.
143
MONEZI, Mariângela. Sociedade Cooperativa e o Novo Código Civil. São Paulo: 2004.
Disponível em: http://www.advogado.adv.br/artigos/2004/mariangelamonezi/sociedadecooperativa.
htm. Acesso em 10 de maio de 2007.
144
BRASIL. Lei 5764/71. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5764.htm.
145
PINHO, Diva Benevides. O Cooperativismo no Brasil: da vertente pioneira à vertente solidária.
São Paulo: Saraiva, 2004. pág.80.
44
3. RELAÇÃO DE TRABALHO E A COOPERATIVA DE TRABALHO
3.1. RELAÇÃO DE TRABALHO
A expressão Relação de Trabalho refere-se às relações jurídicas que se
caracterizam por terem uma prestação essencial centrada em uma obrigação de
fazer realizada exclusivamente pelo trabalho humano. Assim, engloba toda
modalidade de trabalho admitida atualmente. Deste modo, a relação de emprego, a
relação de trabalho autônomo, de trabalho eventual, de trabalho avulso, dentre
outras relações, são relações de trabalho; contudo, a relação de emprego é um tipo
legal próprio e específico, inconfundível com as demais modalidades de relação de
trabalho.146
Por esta razão, serão analisadas, de forma específica, as características da
relação de emprego.
3.1.1. Relação de emprego
A relação de emprego, de acordo com o caput do artigo 442 da CLT,
caracteriza-se pelo contrato individual de trabalho, que é o acordo tácito ou expresso
realizado entre empregado e empregador.
Inicialmente, esclarece-se que a expressão “contrato individual de trabalho” é
utilizada para distinguir o “contrato coletivo de trabalho”, utilizado na época em que a
CLT foi escrita e que hoje foi substituído pelos acordos147 e convenções148 coletivas
de trabalho. 149
Existem duas teorias que pretendem explicar a natureza jurídica do contrato
de trabalho: a contratualista e a anticontratualista. Para a primeira, a relação
existente entre empregado e empregador é um contrato, pois sua celebração
146
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 5.ed. São Paulo: LTR, 2006. pág.
286.
147
CLT, artigo 611, § 1º - “É facultado aos Sindicatos representativos de categorias profissionais
celebrar Acordos Coletivos com uma ou mais empresas da correspondente categoria econômica, que
estipulem condições de trabalho, aplicáveis no âmbito da empresa ou das empresas acordantes às
respectivas relações de trabalho”.
148
CLT, artigo 611 – “Convenção Coletiva de Trabalho é o acordo de caráter normativo, pelo qual
dois ou mais Sindicatos representativos de categorias econômicas e profissionais estipulam
condições de trabalho aplicáveis, no âmbito das respectivas representações, às relações individuais
do trabalho” .
149
MARTINS, Sérgio Pinto. Comentários a CLT. 6.ed. São Paulo: Atlas, 2003. pág. 442.
45
depende inteiramente da vontade das partes; já a segunda, defende que o
trabalhador não tem autonomia alguma para discutir acerca das cláusulas do
contrato de trabalho. 150
Quanto à forma, o contrato poderá ser expresso ou tácito. Será expresso
quando existir um contrato escrito de trabalho ou, ainda, quando entre o empregador
e o empregado existir apenas uma conversa esclarecendo os pontos da relação
empregatícia, visto que a forma escrita não é exigência legal e que, por ser um
acordo de vontades, produzirá efeitos jurídicos, obrigando as partes reciprocamente.
151
Já o contrato tácito é aquele que não é expresso, ou seja, não existe acordo
pré-definido pelas partes. Assim, a reiteração de serviços pelo empregado ao
empregador, sem a oposição deste, caracteriza a relação de emprego.152
Neste sentido, Valentim Carrion comenta:
A simples tolerância de alguém permitindo e usufruindo o trabalho alheio
terá os mesmos efeitos jurídicos do pacto expresso, se o esforço humano
desenvolvido estiver cercado das mesmas características do contrato de
153
emprego.
Além disso, para a relação de emprego ter validade, assim como nos demais
atos jurídicos, conforme artigo 104 do Código Civil, exige-se agente capaz154, objeto
lícito155, possível156 e determinado ou determinável, e forma prescrita157 e não
defesa158 em lei.159
150
MARTINS, Sérgio Pinto. Comentários a CLT. 6.ed. São Paulo: Atlas, 2003. pág. 442.
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. 29. ed. São Paulo: LTR,
2003. pág. 156.
152
MARTINS, Sérgio Pinto. Comentários a CLT. 6.ed. São Paulo: Atlas, 2003. pág. 442.
153
CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 30. ed. São Paulo:
Saraiva, 2005. pág. 279.
154
Pessoa que possui capacidade de pessoalmente atuar na órbita do direito, ou seja, que não é
incapaz. Não possui idade imatura ou deficiência física ou mental determinada. (RODRIGUES, Silvio.
Direito Civil: parte geral. 34.ed. São Paulo: Saraiva, 2003. pág. 39).
155
Em conformidade com o ordenamento da lei. (PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de
Direito Civil. Vol. I. Rio de Janeiro: Forense, 2006. pág. 486).
156
A impossibilidade jurídica condiz com a ausência de liciedade. Fisicamente impossível é o objeto,
se for insuscetível de realizar-se materialmente. Se o objeto for impossível, é frusto o negócio, em
razão de não poder configurar a relação jurídica que, na verdade, reclama a existência do elemento
objetivo para armar-se e ser impossível o objeto, o mesmo é que não haver. (PEREIRA, Caio Mário
da Silva. Instituições de Direito Civil. Vol. I. Rio de Janeiro: Forense, 2006. pág. 487).
157
O direito considera a forma do negócio jurídico em dois sentidos: num primeiro é a própria
manifestação da vontade, expressão exterior da elaboração psíquica; num segundo, é o conjunto de
requisitos materiais ou extrínsecos, de que a lei entende deva o ato negocial se revestir para ter
eficácia ou para ser apurada a sua existência. (PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de
Direito Civil. Vol. I. Rio de Janeiro: Forense, 2006. pág. 488.).
158
Não proibida em lei.
159
MARTINS, Sérgio Pinto. Comentários a CLT. 6.ed. São Paulo: Atlas, 2003. pág. 354.
151
46
Diante disso, Valentim Carrion leciona acerca das relações provenientes de
atividades ilícitas:
[…] A doutrina e a jurisprudência assim também o entendem; e deixam de
reconhecer quaisquer direitos aos empregados; alguns reconhecem a
remuneração, sem entrar no enriquecimento ilícito do empregador, grande
delinqüente; assim, protege-se este em detrimento do empregado, pequeno
delinqüente, uma infeliz vítima do desemprego ou do subemprego
freqüente; […] Há quem distinga a atividade ilícita, por si mesma, daquelas
outras que não seriam se fizesse abstração da finalidade do
empreendimento a que se destinam. A prostituta que exerce seu comércio
carnal subordinada à proprietária da casa de tolerância é exemplo da
primeira atividade (ilícita); a arrumadeira ou o garçom da mesma casa são
exemplos da segunda (lícita). Estas últimas atividades teriam a proteção
160
laboral; a primeira não.
Vistas as formas de relação de trabalho e principalmente a relação de
emprego, analisar-se-ão as partes envolvidas nestas relações.
3.1.2. Empregado
Os requisitos legais da definição de empregado estão no artigo 3º da CLT:
Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de
natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante
161
salário.
Contudo, para a definição tornar-se completa, é necessário buscar, na
definição de empregador, no artigo 2º da CLT, o último requisito, que é a prestação
pessoal de serviços. 162
Destarte, Maurício Godinho Delgado elenca os elementos fático-jurídicos
componentes da relação de emprego:
São cinco: a) prestação de trabalho por pessoa física a um tomador
qualquer; b) prestação efetuada com pessoalidade pelo trabalhador; c)
também efetuada com não-eventualidade; d) efetuada ainda sob
subordinação ao tomador de serviços; e) prestação de trabalho efetuada
163
com onerosidade.
Passa-se à análise de cada uma destas exigências da lei.
160
CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 30. ed. São Paulo:
Saraiva, 2005. pág. 280.
161
.BRASIL.
Consolidação
das
Leis
do
Trabalho.
Disponível
em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-lei/Del 5452.htm.
162
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. 29. ed. São Paulo: LTR,
2003. pág. 167.
163
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 5.ed. São Paulo: LTR, 2006. pág.
291.
47
3.1.2.1. Pessoa natural
Só a pessoa natural ou física pode ser empregada. Não é possível à pessoa
jurídica esta qualidade. A tutela da lei trabalhista é destinada à pessoa física que
trabalha, bem como à sua vida, saúde, integridade física, lazer, valores inerentes à
condição humana; portanto não podem ser tutelados para a pessoa jurídica. 164
Por esta razão, a prestação de serviços por pessoa jurídica, sem a indicação
específica de uma pessoa física realizadora dos serviços, não gera relação de
emprego, exceto quando demonstrado que ouve apenas simulação na criação da
pessoa jurídica, com o intuito de caracterizar a prestação efetiva de serviços da
pessoa física.
165
Assunto que será tratado de forma mais detalhada no decorrer
deste trabalho.
Assim, fica claro que a relação de emprego sempre envolve, em um dos
pólos, obrigatoriamente, uma pessoa física.
3.1.2.2. Pessoalidade
A pessoalidade é outro requisito elencado na definição de empregado.
Dispõe que o empregado é um trabalhador que presta seus serviços pessoalmente.
É daí que se afirma que o contrato de trabalho é intuitu personae166. Desta feita, não
poderá o empregado fazer-se substituir por outra pessoa, sem o consentimento do
empregador.167
Do mesmo modo, ensina Orlando Gomes:
A pessoalidade é uma das notas típicas da prestação de trabalho. O
contrato de trabalho origina para o empregado uma obrigação de fazer
consistente, precisamente, na prestação do serviço convencionado pelas
partes. Esta obrigação não é fungível, isto é, não pode ser satisfeita por
outrem, mas tão-somente por quem a contraiu. Daí dizer-se, em relação ao
empregado, que o contrato de trabalho é concluído intuitu personae. Esta é
a razão pela qual não tem o empregado a faculdade de prestar o serviço por
intermédio de outrem. Não pode fazer-se substituir na empresa em que
trabalha - salvo se o empregador consente. Mas, ainda neste caso, os
efeitos do contrato se suspendem em relação à sua pessoa, para se
produzirem na pessoa do substituto. A obrigação de prestar o serviço é,
164
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. 29. ed. São Paulo: LTR,
2003. pág. 167-168.
165
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 5.ed. São Paulo: LTR, 2006. pág.
291.
166
“Em consideração a pessoa”.
167
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. 29. ed. São Paulo: LTR,
2003. pág. 169.
48
pois, personalíssima e, portanto, intransmissível. Tanto que a morte do
168
169
empregado dissolve, ipso facto , o contrato.
Ressalta-se, todavia, que há situações em que a substituição não suprimirá a
pessoalidade. As substituições consentidas pelo tomador de serviços nem sempre a
afastam, da mesma forma com as substituições autorizadas por lei, como nos casos
de férias, licença-gestante, cumprimento de mandado sindical, por exemplo. 170
Assim, o contrato de trabalho é realizado em razão da pessoa contratada, de
modo que ela não tem a faculdade de se fazer substituir.
3.1.2.3. Continuidade
A continuidade, ou não-eventualidade, é, também, requisito importante. Para
que seja configurada a relação empregatícia, é preciso que a prestação do serviço
pelo empregado não tenha caráter esporádico, eventual. O trabalho prestado de
forma ocasional e transitória não atribui a seu executor a condição jurídica de
empregado. 171
Igualmente, conceitua Maurício Godinho Delgado:
Para que haja relação empregatícia é necessário que o trabalho prestado
tenha caráter de permanência, ainda que por um curto período determinado,
172
não se qualificando como trabalho esporádico.
Assim, trata-se de um pressuposto visível à configuração do vínculo
empregatício.
3.1.2.4. Onerosidade
“Empregado é um trabalhador assalariado, portanto, alguém que, pelo serviço
que presta, recebe uma retribuição”, conforme ensina Amauri Mascaro do
Nascimento.173
168
“pelo próprio fato”.
GOMES, Orlando; GOTTSCHALK, Élson. Curso
Editora Forense, 2002. pág. 70-71.
170
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito
292.
171
GOMES, Orlando; GOTTSCHALK, Élson. Curso
Editora Forense, 2002. pág. 72.
172
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito
293.
169
de Direito do Trabalho. 16.ed. Rio de Janeiro:
do Trabalho. 5.ed. São Paulo: LTR, 2006. pág.
de Direito do Trabalho. 16.ed. Rio de Janeiro:
do Trabalho. 5.ed. São Paulo: LTR, 2006. pág.
49
É esta contribuição que configura o elemento da onerosidade, manifestada
pelas parcelas dirigidas ao empregado em função do contrato pactuado.174
Maurício Godinho Delgado complementa:
A onerosidade manifesta-se pela intenção contraprestativa, pela intenção
econômica conferida pelas partes – em especial pelo prestador de serviços
– ao fato da prestação de trabalho. Existirá o elemento fático-jurídico da
onerosidade no vínculo firmado entre as partes caso a prestação de
serviços tenha sido pactuada, pelo trabalhador, com o intuito
contraprestativo trabalhista, com o intuito essencial de auferir ganho
175
econômico pelo trabalho ofertado.
Desta forma, o salário é o pressuposto que torna o empregado dependente
da relação de emprego, visto que é o motivo pelo qual ele presta seus serviços.
3.1.2.5. Subordinação
A subordinação se caracteriza quando a atividade exercida pelo empregado
permanece sob obediência ou dependência de outrem para quem ela é dirigida.
Orlando Gomes reforça a sua importância:
A subordinação do empregado é requisito não somente da prestação, como,
ainda, o elemento caracterizador do contrato de trabalho, aquele que melhor
permite distingui-lo dos contratos afins. Sua extraordinária importância
decorre do fato de ser o elemento específico da relação de emprego, cuja
presença, nos contratos de atividade, facilita a identificação do contrato de
176
trabalho, propriamente dito.
Sendo assim, conclui-se que será configurada a relação de emprego quando,
na relação entre o empregado e empregador, estiverem presentes os elementos
acima citados: pessoa física que preste serviço a outrem pessoalmente, de forma
subordinada, não-eventual, mediante salário.
173
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. 29. ed. São Paulo: LTR,
2003. pág. 168.
174
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 5.ed. São Paulo: LTR, 2006.
pág.300.
175
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 5.ed. São Paulo: LTR, 2006.
pág.300.
176
GOMES, Orlando; GOTTSCHALK, Élson. Curso de Direito do Trabalho. 16.ed. Rio de Janeiro:
Editora Forense, 2002. pág. 75.
50
3.1.3. Diferença entre empregado e trabalhador autônomo
Primeiramente, a importância de estabelecer esta diferença se dá pelo fato de
a CLT ser aplicada apenas ao empregado.
177
Ademais, trata-se de conceito
indispensável para o entendimento do tema desta pesquisa.
De tal modo, conceitua Orlando Gomes:
Os primeiros (trabalhadores autônomos) não são sujeitos de contrato de
trabalho, não são empregados. Uma classe importante de trabalhadores
autônomos é constituída pelos que exercem profissão liberal. O profissional
liberal celebra contrato com a clientela, que, outrora, se denominava
"locação de serviço", mas que, hoje, assim não deve ser designado, para
que se não faça confusão entre este contrato e o de trabalho, que é a
178
denominação moderna da antiga locação de serviço.
O trabalhador autônomo “tem por objeto a prestação de serviços por conta
própria, autodisciplinados pelo exercente”. 179
Distingue-se o autônomo do empregado em razão da inexistência de
elementos caracterizadores da relação de emprego: a subordinação com o tomador
de serviços e a pessoalidade. 180
Contudo, ressalta Maurício Godinho Delgado:
O trabalhador autônomo pode ser pactuado com cláusula de rígida
pessoalidade – sem prejuízo da absoluta ausência de subordinação. É o
que tende a ocorrer com a prestação de serviços contratada a profissionais
de nível mais sofisticado de conhecimento ou habilidade, como médicos,
advogados, artistas, etc.
Além disso, a diferença entre empregado e trabalhador autônomo pode ser
vista pelo fato de o empregado trabalhar por conta alheia, e o autônomo por conta
própria; este suporta os riscos da atividade econômica, e aquele não, sendo
suportados pelo tomador de serviços. 181
Assim, entende-se que a diferença entre o empregado e o trabalhador
autônomo se dá na forma como a prestação é exercida, bem como pela relação
existente com o tomador.
177
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. 29. ed. São Paulo: LTR,
2003. pág. 170.
178
GOMES, Orlando; GOTTSCHALK, Élson. Curso de Direito do Trabalho. 16.ed. Rio de Janeiro:
Editora Forense, 2002. pág. 88.
179
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho. 20.ed. São Paulo: Saraiva,
2005. pág. 584.
180
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 5.ed. São Paulo: LTR, 2006. pág.
334.
181
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. 29. ed. São Paulo: LTR,
2003. pág. 172.
51
3.1.4. Empregador
O artigo 2º da CLT dispõe:
Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo
os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação
182
pessoal de serviço
Deste modo, define Amauri Mascaro do Nascimento: “Empregador é todo
ente, dotado ou não de personalidade jurídica, como também será tanto a pessoa
física como a jurídica.” 183
Da mesma forma, coaduna Orlando Gomes:
O empregador é a pessoa natural, ou jurídica. Entretanto, a Consolidação
das Leis do Trabalho comete o imperdoável erro de definir empregador
como sendo a empresa. Assim, considera empregador a empresa, individual
ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite,
184
assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços.
Além disso, conforme o parágrafo 1º do mesmo artigo:
Equiparam-se ao empregador, para os efeitos exclusivos da relação de
emprego, os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as
associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que
185
admitem trabalhadores como empregados.
Portanto, o empregador será aquele que, independente de ser pessoa física
ou jurídica, de ter ou não fim lucrativo, possui empregado.
3.2. PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO
Verificadas as partes que integram a relação de trabalho, passa-se a analisar,
de forma sucinta, alguns princípios norteadores do Direito do Trabalho, mais
relevantes ao tema estudado.
182
.BRASIL.
Consolidação
das
Leis
do
Trabalho.
Disponível
em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-lei/Del 5452.htm.
183
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. 29. ed. São Paulo: LTR,
2003. pág. 200.
184
GOMES, Orlando; GOTTSCHALK, Élson. Curso de Direito do Trabalho. 16.ed. Rio de Janeiro:
Editora Forense, 2002. pág. 90.
185
BRASIL.
Consolidação
das
Leis
do
Trabalho.
Disponível
em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-lei/Del 5452.htm.
52
3.2.1. Princípio da Proteção
Define-se este princípio como aquele adotado pelo direito do trabalho ao
reconhecer a desigualdade existente entre as partes da relação jurídica de trabalho,
com a finalidade de diminuir a inferioridade econômica, hierárquica e intelectual dos
trabalhadores. 186
Assim, ensina Maurício Godinho Delgado:
Informa este princípio que o Direito do Trabalho estrutura em seu interior,
com suas regras, institutos, princípios e presunções próprias, uma tela de
proteção à parte hipossuficiente na relação empregatícia – o obreiro –,
visando retificar (ou atenuar), no plano jurídico, o desequilíbrio inerente ao
187
plano fático do contrato de trabalho.
Portanto, este princípio fundamenta-se, nas seguintes razões: a subordinação
jurídica do empregado ao empregador, tornando o contrato de trabalho uma relação
de poder deste em relação àquele; a dependência econômica do empregado em
face do empregador, pois é este, detentor dos meios de produção, que propicia o
meio de subsistência àquele, através do salário; a ignorância pelo empregado de
seus diretos, agravada, muitas vezes, pela baixa escolaridade ou analfabetismo, que
o torna vulnerável ao empregador e a condições de trabalho por ele oferecidas. 188
Destarte, trata-se de uma forma de equilíbrio à relação de trabalho.
3.2.2. Princípio In dubio pro operario
Este princípio é a forma modernizada e adaptada ao direito do trabalho do
princípio in dubio pro misero. Por ele, dentre várias interpretações existentes em
uma mesma norma, deve ser aplicada aquela que for mais benéfica ao trabalhador.
189
Contudo, ressalta Maurício Godinho Delgado:
[…] neste antigo princípio estaria englobada não somente a dimensão de
interpretação normativa, como também uma dimensão de aferição e
valoração dos fatos trazidos a exame do intérprete e aplicador do direto, À
luz desta segunda e combinada dimensão do princípio in dubio pro misero
186
SILVA, Luiz de Pinho Pedreira da. Principiologia do Direito do Trabalho. 2. ed. São Paulo: LTR,
1999. pág. 29.
187
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 5.ed. São Paulo: LTR, 2006. pág.
197-198.
188
SILVA, Luiz de Pinho Pedreira da. Principiologia do Direito do Trabalho. 2. ed. São Paulo: LTR,
1999. pág. 27.
189
SILVA, Luiz de Pinho Pedreira da. Principiologia do Direito do Trabalho. 2. ed. São Paulo: LTR,
1999. pág. 41.
53
(exame dos fatos e provas), propunha-se que a decisão da autoridade
judicial deveria se dirigir em benefício do trabalhador, em caso de dúvida no
190
exame das situações fáticas concretas.
Deste modo, o princípio in dubio pro operario deve ser utilizado para dirimir as
dúvidas e lacunas deixadas pela legislação e a relação de trabalho, no caso
concreto.
3.2.3. Princípio da irrenunciabilidade de direitos
O presente princípio prevê a impossibilidade de o empregado abdicar, por
simples manifestação de vontade, das vantagens e proteções que lhe são
asseguradas pelo ordenamento jurídico. 191
Segundo
Eduardo
Gabriel
Saad,
“a
eficácia
do
postulado
da
irrenunciabilidade é limitada pelas normas de ordem pública que tenham por objeto
determinados institutos do Direito do Trabalho”. 192
Assim, independentemente do empregado, por imposição ou vontade própria,
renunciar a seus direitos protegidos pela ordem jurídica, os mesmos permanecerão
devidos a ele.
3.2.4. Princípio da primazia da realidade
Este princípio, também chamado de contrato realidade, prevê que deve ser
analisada a prática concreta realizada ao longo da prestação de serviços,
independentemente da vontade demonstrada pelas partes no contrato de trabalho. E
é esta prática, que representa a verdadeira relação de trabalho existente, que irá
gerar os direitos e obrigações decorrentes. 193
Neste sentido, leciona Eduardo Gabriel Saad:
No contrato de trabalho, se houver discrepância entre o seu conteúdo e o
que realmente faz o trabalhador, há que se levar em conta o que este
realiza na prática. Em nenhuma hipótese, o que se escreveu ou se estipulou
190
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 5.ed. São Paulo: LTR, 2006. pág.
213.
191
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 5.ed. São Paulo: LTR, 2006. pág.
201.
192
SAAD, Eduardo Gabriel. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTR, 2000. pág. 66.
193
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 5.ed. São Paulo: LTR, 2006. pág.
208.
54
num contrato há de sobrepujar as condições reais em que é prestado o
194
serviço.
Portanto, é por este princípio que se verificam as reais características e
obrigações existem na relação de trabalho.
3.3. A FLEXIBILIZAÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO
O Direito do Trabalho, em toda sua história, através do Estado e de seu
ordenamento jurídico, sempre ocupou uma posição protecionista em relação ao
empregado, com o objetivo de promover certo equilíbrio nas relações trabalhistas.
Esta ampla e intensa proteção tirou, quase que inteiramente, o poder de decisão do
empregado sobre o contrato de trabalho realizado, tornando-o praticamente mero
contrato de adesão entre as partes, obedecendo ao disposto na legislação
trabalhista.195
As inovações tecnológicas e o aumento na produtividade, que são
imprescindíveis ao crescimento da economia, em razão da competitividade existente
no mercado, resulta na diminuição da necessidade de utilização de mão-de-obra.
Por conseqüência, a revolução tecnológica, da mesma forma como ocorreu com a
revolução industrial, ao diminuir os postos de trabalho que são substituídos pelas
máquinas e exigir trabalhadores mais qualificados, contribui para o aumento do
desemprego. 196
Diante disso, segundo Maria Célia de Araújo Furquim:
A incontestável redução dos postos de trabalho, o conseqüente
desemprego, força o trabalhador não só a manter o emprego, abrindo mão
de alguns direitos há anos assegurados, bem como criar alternativas de
trabalho, inclusive formas de trabalho não abrangidas e reguladas pelo
197
Direito do Trabalho
194
SAAD, Eduardo Gabriel. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTR, 2000. pág. 68.
SOARES Jr., Alcídes. A flexibilização no Direito do Trabalho enquanto instrumento de
mudanças nas relações de trabalho. Rio de Janeiro – RJ. Disponível em:
http://www.uepg.br/rj/a1v1at07.htm.
196
FURQUIM, Maria Célia de Araújo. A Cooperativa como Alternativa de Trabalho. São Paulo:
LTR, 2001. pág. 56-57.
197
FURQUIM, Maria Célia de Araújo. A Cooperativa como Alternativa de Trabalho. São Paulo:
LTR, 2001. pág. 57.
195
55
É este afastamento da rigidez de algumas leis, diante de situações
necessárias, ao permitir maior poder de decisão às partes, de modo que possam
alterar seus contratos, que se chama de flexibilização do direito do trabalho. 198
Trata-se de um tema amplo, mas, de uma maneira mais simplificada, pode-se
definir a flexibilização como uma compatibilização do direito do trabalho com a
realidade do mundo moderno. 199
Neste Sentido, leciona Leandro do Amaral D. de Dorneles:
[…] mera adaptabilidade das questões relativas à produção e às mutações
do contexto sócio-político-econômico, sem, necessariamente, subordinação
de interesses e expectativas. […] formas de proteção mais próximas da
realidade. Novos paradigmas de produção, novas exigências de política
econômica, novas exigências de política social e outros fatores […] marco
200
regulatório do mercado de trabalho às mudanças em curso.
Amauri Mascaro do Nascimento dispõe:
O desemprego influiu na criação de novos tipos de contratos individuais de
trabalho que permitissem o aproveitamento de trabalhadores
desempregados, como o contrato a tempo parcial, o contrato de reciclagem
profissional por prazo determinado, além da redução da jornada semanal de
201
trabalho.
Desta forma, as medidas flexibilizadoras devem estar adequadas e
controladas pelos sindicatos, principalmente por meio de negociação coletiva, assim
como já prevê a Constituição sobre a redução salarial, em seu artigo 7º, que é
admitida pela existência de acordo ou convenção coletiva de trabalho. 202
Ressalta-se que é importante distinguir flexibilização e desregulamentação,
conceitos muito utilizados no processo de reestruturação do mercado de trabalho no
Brasil. Assim, veja-se a conceituação de Siqueira Neto:
[…] desregulmentação dos direitos trabalhistas é o processo pelo qual os
mesmos
são
derrogados,
perdendo
a
regulamentação.
A
desregulamentação, na verdade, é um tipo de flexibilização promovida pela
203
legislação. […]
198
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. 29. ed. São Paulo: LTR,
2003. pág. 67.
199
FURQUIM, Maria Célia de Araújo. A Cooperativa como Alternativa de Trabalho. São Paulo:
LTR, 2001. pág. 58.
200
DORNELES, Leandro do Amaral D. de. A Transformação do Direito do Trabalho: da lógica da
preservação à lógica da flexibilidade. São Paulo: LTR, 2002. pág. 140.
201
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. 29. ed. São Paulo: LTR,
2003. pág. 67.
202
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. 29. ed. São Paulo: LTR,
2003. pág. 68.
203
SIQUEIRA NETO. J.F. Direito do Trabalho e Flexibilização no Brasil. São Paulo em Perspectiva –
Flexibilidade, empregabilidade e direitos. São Paulo, v. 11, n. 01, pág. 36, janeiro/março 1997.
apud DORNELES, Leandro do Amaral D. de. A Transformação do Direito do Trabalho: da lógica
da preservação à lógica da flexibilidade. São Paulo: LTR, 2002. pág. 140.
56
Neste sentido, Dorneles complementa:
[…] a desregulamentação traduz um determinado ideal de política pública
que busca tornar as empresas mais competitivas, possibilitando que as
mesmas adotem os paradigmas organizacionais flexíveis no que se refere
ao recrutamento de mão-de-obra, o que antes era dificultado pela suposta
204
“rigidez” característica dos direitos trabalhistas.
Diante disso, conclui-se que em, conseqüência das transformações sociais e
econômicas, o direito do trabalho precisa se modernizar e se adequar às formas de
relações trabalhistas. Contudo, não pode deixar de adaptar conjuntamente a
proteção ao trabalhador.
3.4. A TERCEIRIZAÇÃO E AS COOPERATIVAS DE TRABALHO
O termo terceirização é resultado do neologismo vindo da palavra terceiro, no
sentido de intermediário, interveniente, e foi criado pelos profissionais da área de
administração de empresas, com o objetivo de caracterizar a descentralização das
atividades das empresas, passadas a outrem, estranho a relação de trabalho que as
realizará. 205
Assim, vem a ser a forma que as empresas utilizam para transferir parte de
sua produção, ou serviço, a outras pessoas, físicas ou jurídicas. Com isso, podem se
concentrar de forma exclusiva na elaboração de seu produto final, que é a sua
verdadeira vocação. Ademais, serve para a redução de gastos na produção, devido
à diminuição de encargos sociais, trabalhistas e fiscais, bem como a facilitação da
administração da empresa, já que parte da responsabilidade fica a cargo do
prestador de serviços. 206
A terceirização é um fenômeno relativamente novo no Brasil. Apenas a partir
do final da década de 60 é que se pode verificar a sua inserção na ordem jurídica.
Ainda assim apenas no que dizia respeito à administração direta e indireta no âmbito
dos Municípios, Estados e União, através do decreto-lei nº. 200/67. 207
204
DORNELES, Leandro do Amaral D. de. A Transformação do Direito do Trabalho: da lógica da
preservação à lógica da flexibilidade. São Paulo: LTR, 2002. pág. 140.
205
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 5.ed. São Paulo: LTR, 2006.
pág.429.
206
MAUAD, Marcelo José Ladeira. Cooperativas de Trabalho: sua relação com o direito do
Trabalho. 2.ed. São Paulo: LTR, 2001. pág. 212.
207
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 5.ed. São Paulo: LTR, 2006. pág.
429.
57
Contudo o primeiro dispositivo a tratar efetivamente do assunto e que se
estendeu à esfera privada foi a lei 6.019/74208, lei do trabalho temporário, e
posteriormente a lei 7.102/83, que previu, de forma permanente, a terceirização do
trabalho de vigilância bancária. 209
Com exceção a essas duas modalidades já regulamentadas, declara João
Estênio Campelo Bezzerra:
A doutrina trabalhista tinha na terceirização a visão de algo execrável,
conhecida pelo galicismo "marchandage", que sempre caracterizou uma
relação de emprego. Ela não era aceita, pois o intermediador se apropriava
de um valor que poderia ser pago diretamente ao trabalhador, se esse
210
intermediário não existisse.
Em razão disto, o Tribunal Superior do Trabalho editou a seguinte súmula
256, na época chamada de enunciado:
Contrato de prestação de serviços. Legalidade.
Salvo os casos de trabalho temporário e de serviço de vigilância, previstos
nas Leis n° 6.019, de 3-1-74, e 7.102, de 20-6-83, é ilegal a contratação de
trabalhadores por empresa interposta, formando-se o vínculo empregatício
211
diretamente com o tomador dos serviços. (Res. 4/86 DJ 30-9-86).
É importante destacar que o Direito Pátrio sempre foi resistente à
subcontratação de trabalho, pois entende que o empregador é aquele beneficiado
com a prestação do serviço; neste caso, o tomador. Deste modo, permaneceu inerte
na regulamentação deste tema.212
Posteriormente, foi a jurisprudência que regulamentou a matéria, através da
súmula 331, e mantém hoje a seguinte redação:
Contrato de prestação de serviços. Legalidade (Revisão do Enunciado 256)
I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal,
formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no
caso de trabalho temporário (Lei n° 6.019, de 3-1-74).
II - A contratação irregular de trabalhador, através de empresa interposta,
não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração pública
direta, indireta ou funcional (artigo37,II, da Constituição da República).
III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de
serviços de vigilância (Lei n° 7.102, de 20-6-83), de conservação e limpeza,
208
Lei 6.019/74, artigo 2º - “Trabalho temporário é aquele prestado por pessoa física a uma empresa,
para atender à necessidade transitória de substituição de seu pessoal regular e permanente ou a
acréscimo extraordinário de serviços”.
209
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 5.ed. São Paulo: LTR, 2006. pág.
430.
210
BEZERRA, João Estenio Campelo. Cooperativas de Trabalho: relação de emprego. Brasília:
Brasília Jurídica, 2005. pág. 48.
211
MANNRICH, Nelson. CLT. Legislação Previdenciária. Constituição Federal. São Paulo: Ed.
Revista dos Tribunais, 2000. pág. 1020 apud BEZERRA, João Estenio Campelo. Cooperativas de
Trabalho: relação de emprego. Brasília: Brasília Jurídica, 2005. pág. 49.
212
MAUAD, Marcelo José Ladeira. Cooperativas de Trabalho: sua relação com o direito do
Trabalho. 2.ed. São Paulo: LTR, 2001. pág. 213.
58
bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do
tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.
IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do
empregador, implica na responsabilidade subsidiária do tomador dos
serviços quanto àquelas obrigações, desde que este tenha participado da
relação processual e conste também do título executivo judicial. (Res. 23/93
213
DJ 21-12-93).
Cabe ressaltar os conceitos de atividade-meio e atividade-fim ensinados por
Marcelo Mauad:
Atividade-meio […] seriam todas aquelas atividade ou serviços que não
visassem aos objetivos finalísiticos da empresa. […] Assim, as atividadesfim seriam todas aquelas que convergem diretamente para a elaboração do
214
produto final ou dos verdadeiros misteres da empresa tomadora.
Portanto, de acordo com a súmula 331, verifica-se a ampliação das formas de
terceirização aceitas pelo ordenamento, destinada inclusive para atividade-meio da
empresa, desde que não haja pessoalidade e subordinação direta ao tomador de
serviços.
3.5. RELAÇÃO DE EMPREGO X COOPERATIVAS DE TRABALHO
Historicamente, no Brasil, a terceirização sempre foi contratada entre uma
empresa principal, a tomadora, e outra empresa ou, de forma menos comum,
profissionais autônomos ou eventuais. Porém, atualmente, é comum a contratação
de cooperativas de trabalho. Dentre outros motivos, como a baixa incidência de
encargos, está o acréscimo do parágrafo único do artigo 442 da CLT, através da lei
8.949/94, que dispõe: 215
Qualquer que seja o ramo de atividade da sociedade cooperativa, não
existe vínculo empregatício entre ela e seus associados, nem entre estes e
216
os tomadores dos serviços daquela.
O artigo 90 da lei 5.764/71 já previa:
Qualquer que seja o tipo de cooperativa, não existe vínculo empregatício
217
entre ela e seus associados.
213
BRASIL.
Súmulas
do
Tribunal
Superior
do
Trabalho.
Disponível
em:
http://www.trt02.gov.br/geral/tribunal2/tst/sumulas.htm.
214
MAUAD, Marcelo José Ladeira. Cooperativas de Trabalho: sua relação com o direito do
Trabalho. 2.ed. São Paulo: LTR, 2001. pág. 231.
215
MAUAD, Marcelo José Ladeira. Cooperativas de Trabalho: sua relação com o direito do
Trabalho. 2.ed. São Paulo: LTR, 2001. pág. 212.
216
.BRASIL.
Consolidação
das
Leis
do
Trabalho.
Disponível
em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-lei/Del 5452.htm.
217
BRASIL. Lei 5764/71. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5764.htm.
59
Portanto, a inovação trazida pela CLT foi a adição da expressão “nem entre
os cooperados e os tomadores de serviço daquela”, que isentou o vínculo com os
tomadores de serviço.218
No que versa sobre a relação entre a cooperativa e seus associados, não
existirá vínculo de emprego, quando cumpridos os requisitos da lei nº. 5.764/71 e do
Código Civil, mas sim sociedade entre as partes, com uma finalidade comum de
exploração de uma atividade. Não há que se falar em vínculo, pois os cooperados
exercem a função de prestadores de serviços e também porque não existe
subordinação na cooperativa. 219
Ressalta-se, pois, o artigo 91 da lei nº. 5.764/71, que dispõe:
As cooperativas igualam-se às demais empresas em relação aos seus
220
empregados para os fins da legislação trabalhista e previdenciária.
Para se entender os motivos da inovação, vejam-se os fundamentos do
Projeto de Lei nº. 3.383/92, que foi o responsável pela edição da lei nº. 8.949/94:
Começa-se a admitir, em larga escala, em face do momento econômico e
financeiro em que passa o País, a Terceirização, como uma alternativa de
flexibilidade empresarial. Chega a ser considerada por algumas empresas e
até trabalhadores, em face da recessão, como excelência empresarial, na
contratação de prestação de serviços em substituição à mão-de-obra interna
das empresas.
Está no corporativismo de trabalho a fórmula mágica de reduzir o problema
do desemprego gerado pelo êxodo rural e agora mais precisamente pela
profunda recessão econômica.
O projeto visa, portanto, beneficiar imensa massa de desempregados do
campo [...] Estabelecendo a regra da inexistência de vínculo empregatício,
nos termos ora propostos, milhares de trabalhadores rurais e urbanos [...]
terão o benefício de serem trabalhadores autônomos, com a vantagem de
221
dispensar, a intervenção do patrão.
Sérgio Pinto Martins esclarece os objetivos do projeto:
O objetivo do Projeto de lei nº. 3.383/92 foi reduzir o desemprego,
principalmente na área rural, em virtude do êxodo rural. Visava beneficiar
imensa massa de desempregados no campo, proporcionado-lhes o
222
benefício de serem trabalhadores autônomos.
Observa-se que esta mudança, trazida pela lei 8.949/94, tranqüilizou o
tomador de serviço ao contratar uma cooperativa para utilizar a prestação de serviço
218
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág.
103.
219
MARTINS, Sérgio Pinto. Comentários a CLT. 6.ed. São Paulo: Atlas, 2003. pág. 357.
220
BRASIL. Lei 5764/71. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5764.htm
221
FREDIANI, Yone. Tendências do Direito Material e Processual do Trabalho. São Paulo: LTR,
2000. pág. 40.
222
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág.
43.
60
de seus associados. Isso porque, anteriormente ao advento da lei, os cooperados
entravam com ações trabalhistas diretamente contra o contratante do serviço,
objetivando o reconhecimento do vínculo direto com a empresa, o que gerava uma
justificável apreensão aos contratantes. 223
Em razão disso, Maurício Godinho Delgado afirma:
Isso significa que a ordem jurídica apenas favoreceu a prática
cooperativista, envolvendo produtores e profissionais efetivamente
autônomos (como cabe às cooperativas); neste favorecimento, criou, em
favor dessas entidades, a presunção de ausência de vínculo empregatício.
Porém não conferiu ao cooperativismo instrumental para fraudes
224
trabalhistas.
Todavia, Arnaldo Süssekind leciona:
Esse acréscimo, porque óbvio e desnecessário, gerou a falsa impressão e
conseqüentemente abuso no sentido de que os cooperados podem prestar
serviços às empresas contratantes, sob a supervisão ou direção destas,
sem a caracterização da relação de emprego. Na verdade, porém, somente
não se forma o vínculo empregatício com o tomador dos serviços quando os
cooperativados trabalham na cooperativa e para a cooperativa de que são
partes, como seus associados. O tomador dos serviços da cooperativa deve
estabelecer uma relação jurídica e de fato com a sociedade e não uma
225
relação fática, com efeitos jurídicos, com os cooperativados.
Por este motivo, pela má interpretação do artigo 442, ocorreu uma
proliferação de pseudo-cooperativas, com o objetivo único de lucro, que tinham
como atividade, na realidade, a locação de mão-de-obra, o que, até mesmo, lesou a
imagem de verdadeiras cooperativas. 226
Contudo, a cooperativa não deixa der ser um meio de resolver os problemas
de produção em empresas que procurem diminuir seus custos. É uma terceirização
lícita, prevista em lei, desde que obedeça a seus requisitos. Conquanto não pode ser
agenciadora ou locadora de mão-de-obra, pois distorce seu objetivo, que é ajudar
seus associados. 227
Desta forma, existe uma relação de trabalho entre o cooperado, através da
cooperativa, e o tomador de serviços, mas não uma relação de emprego, haja vista
não estarem presentes os seus requisitos. Ressalta-se que se trata de trabalhador
223
GONÇALVES, Nilton Oliveira. Terceirização de mão-de-obra. São Paulo: LTR, 2005. pág. 73.
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 5.ed. São Paulo: LTR, 2006. pág.
435.
225
SÜSSEKIND, Arnaldo. Curso de Direito do Trabalho. 2.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. pág.
162.
226
FURQUIM, Maria Célia de Araújo. A Cooperativa como Alternativa de Trabalho. São Paulo:
LTR, 2001. pág. 81.
227
MARTINS, Sérgio Pinto. Comentários a CLT. 6.ed. São Paulo: Atlas, 2003. pág. 357.
224
61
autônomo, que apesar de prestar serviços contínuos na atividade-meio do tomador,
de forma especializada, não possui subordinação em relação a este. 228
Assim, Maria Célia da Araújo Furquim ensina maneiras de se verificar a
veracidade de uma terceirização trabalhista:
1. A empresa contratante quando contrata uma cooperativa de trabalho
(seja ela de produção ou serviço ou de mão-de-obra), está contratando, sem
sombra de dúvida, o resultado de uma prestação de serviço, não
importando a pessoal por quem o serviço será prestado. A prestação de
serviço prescinde do requisito intuitu personae, pois temos a ausência do
pressuposto pessoalidade, que, em conjunto com outros fatores, leva à
configuração da relação empregatícia.
2. A sociedade cooperativa, quando contratada, além da equipe de
trabalhadores que, efetivamente, prestam o serviço especializado, se faz
presente também no local de trabalho um coordenador ou gestor, também
cooperado, eleito em assembléia para orientar e dirimir qualquer dúvida por
parte dos associados que estão prestando o serviço. A presença de um
representante da cooperativa, escolhido pelos próprios cooperados,
descaracteriza o poder de direção; enfim, a subordinação do trabalhador
para com aquele que está aproveitando de sua força de trabalho.
3. Analisando, ainda, a onerosidade, que também não está presente na
relação cooperado/tomadora de serviço, pois a empresa contratante
contrata uma sociedade cooperativa, o preço é tratado com relação ao
resultado, sendo que os cooperados ou associados têm remuneração
percebida de acordo com a produção do trabalho de cada um, e essa
tratativa é efetuada pela própria cooperativa. Embora em nome dos
cooperados, é com ela que é firmado o contrato de prestação de serviços.
4. No que se refere à não-eventualidade, a presença desse requisito, por si
só, não caracteriza a existência de vínculo empregatício. Na verdade, esse
requisito, de certa maneira, tem ligação com a pessoalidade. Conforma já
afirmado, a tomadora contrata o resultado, não tendo qualquer importância
para ela que prestação de serviços seja efetuada por trabalhadores
distintos. Esse fato leva, em geral, a uma situação de prestação de serviço
onde a continuidade, considerando-se um único trabalhador, não tem
229
preponderância.
No mesmo sentido, Marcelo Mauad disserta:
O objetivo da jurisprudência ao limitar a terceirização às atividades
especializadas diz respeito à prestação de trabalho das fornecedoras de
serviços, as quais devem desempenhar serviços particularizados, com
especificações próprias, e não simplesmente a realização de todo e
qualquer tipo de tarefa que interesse à tomadora. Presume-se que, por ser
fornecedora especializada em tal atividade, sua prestação seja de melhor
qualidade que aquela desenvolvida pela empresa tomadora. Em uma
palavra, o serviço especializado é a atividade-fim da fornecedora de
230
serviços e a atividade-meio da tomadora.
Portanto, não é possível a realização de atividades-fim da empresa tomadora,
pois a mão-de-obra seria apenas parte de uma falsa cooperativa, que na verdade é
228
SILVA, Leda Maria Messias da. Cooperativas de Trabalho: terceirização sem intermediação. São
Paulo: LTR, 2005. pág. 86.
229
FURQUIM, Maria Célia de Araújo. A Cooperativa como Alternativa de Trabalho. São Paulo:
LTR, 2001. pág. 84.
230
MAUAD, Marcelo José Ladeira. Cooperativas de Trabalho: sua relação com o direito do
Trabalho. 2.ed. São Paulo: LTR, 2001. pág. 230.
62
a própria tomadora, no entanto com nenhuma função social para com os associados,
da qual as únicas vantagens seriam para o empresário tomador, que ficaria com o
lucro obtido sobre os valores devidos aos empregados, através dos encargos. 231
Não se pode esquecer que a finalidade precípua da sociedade cooperativa é
a prestação de serviços a seus cooperados e não a terceiros. Desta feita, deve-se
observar a real prática dos atos cooperativos, de forma que os cooperados
compartilhem da vida na cooperativa. Caso contrário, fica claro que o maior
interesse da cooperativa é a prestação de serviços a terceiros, de modo a
comprometer a idoneidade da cooperativa e suscitar a existência de fraude. 232
Do mesmo modo, corrobora Leda Maria Messias da Silva com relação às
cooperativas de mão-de-obra:
Assim, pensamos que a cooperativa de mão-de-obra, quando inserida num
processo de terceirização, na atividade-meio, em caráter permanente, deve
absolutamente respeitar os princípios cooperativistas, ou seja, deve
valorizar, mais que tudo, o elemento humano. Isso é plenamente justificável
porque, se temos empresas que terceirizam mão-de-obra permanente,
desde que na atividade-meio, especializada e sem subordinação ou
pessoalidade, conforme permite o enunciado nº. 331 do egrégio TST, não
vemos motivos para não podermos ter cooperativa de mão-de-obra, desde
que autênticas, que realmente primem por respeitar todos os princípios
cooperativistas, que eliminem a figura do intermediário, uma vez que são
essas empresas-prestadoras que fornecem a mão-de-obra, e os próprios
cooperados não o façam por si próprios, por meio de cooperativas, podendo
auferir valores muito mais condizentes com a dignidade do trabalho, que é
233
constitucionalmente pregada.
Ademais, caso não haja interesse comum de sociedade entre as partes,
cooperativa e tomadora, e existam elementos caracterizadores de vínculo, como a
subordinação, será configurado o vínculo de emprego entre o cooperado e a
empresa tomadora de serviço. Este fato ocorre na prática, já que as empresas criam
cooperativas para seus empregados com o objetivo de evitar a caracterização do
vínculo e as obrigações decorrentes dele. 234
231
SILVA, Leda Maria Messias da. Cooperativas de Trabalho: terceirização sem intermediação. São
Paulo: LTR, 2005. pág. 88.
232
MAUAD, Marcelo José Ladeira. Cooperativas de Trabalho: sua relação com o direito do
Trabalho. 2.ed. São Paulo: LTR, 2001. pág. 235.
233
SILVA, Leda Maria Messias da. Cooperativas de Trabalho: terceirização sem intermediação. São
Paulo: LTR, 2005. pág. 88-89.
234
MARTINS, Sérgio Pinto. A terceirização e o direito do trabalho. 7.ed. rev. e. ampl. São Paulo:
Atlas, 2005. pág. 100.
63
Conseqüentemente, não basta apenas a lei prever a inexistência de vínculo
empregatício, pois isto serve apenas como presunção juris tantum, ou seja, relativa,
que pode ser descaracterizada após análise dos pressupostos da relação. 235
Acerca desta análise, Sérgio Pinto Martins leciona:
Deve-se, porém, fazer a interpretação sistemática do parágrafo único do
236
artigo 442 da CLT e do artigo 90 da lei nº. 5.764 com os artigos 2º, 3º e 9º
da CLT. Não se pode interpretar isolada e gramaticalmente o parágrafo
único do artigo 442 da CLT. Entender de forma contrária seria pensar que
os dispositivos há pouco mencionados são contraditórios entre si. Num
sistema jurídico, a lógica determina que esses dispositivos devem ser
interpretados de forma que não existam incompatibilidades. […] Na
aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às
exigências do bem comum. […] A norma trabalhista deve, portanto, ser
237
interpretada em favor do trabalhador, a quem ela visa proteger.
Portanto, constatada a subordinação jurídica do cooperado e da empresa
tomadora de serviços, tornar-se-á evidente o vínculo empregatício e será averiguada
fraude entre a sociedade cooperativa, que na verdade funciona apenas como
intermediária de mão-de-obra. 238
Outrossim, sabe-se que o Princípio da Primazia da Realidade é um princípio
fundamental ao Direito do Trabalho, pelo qual o contrato realidade se sobrepõe ao
contrato escrito. Os aspectos formais não são suficientes para desconfigurar a
relação de emprego, de modo que, presentes os requisitos dos artigos 2º e 3º da
CLT, configurar-se-á a relação de emprego.239
Ainda, segundo Sérgio Pinto Marins, é aplicável o inciso IV da Súmula 331 do
TST:
Sendo responsabilizado subsidiariamente o tomador de serviços, se foi
beneficiado da prestação dos serviços do trabalhador. Muitas vezes, a
discussão diz respeito ao reconhecimento do vínculo empregatício com a
própria cooperativa, que era empregadora. Não fazendo o devedor principal
o pagamento das verbas deferidas ao empregado, que é a cooperativa, fica
240
responsabilizado subsidiariamente o tomador dos serviços.
235
FREDIANI, Yone. Tendências do Direito Material e Processual do Trabalho. São Paulo: LTR,
2000. pág. 44.
236
CLT, artigo 9º - “Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar,
impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação”.
237
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág.
104.
238
BEZERRA, João Estenio Campelo. Cooperativas de Trabalho: relação de emprego. Brasília:
Brasília Jurídica, 2005. pág. 53.
239
FURQUIM, Maria Célia de Araújo. A Cooperativa como Alternativa de Trabalho. São Paulo:
LTR, 2001. pág. 82.
240
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág.
110-111.
64
Deste modo, verificada a existência de cooperativa inidônea, ou seja, uma
sociedade que não é capaz de cumprir com suas obrigações com os cooperados,
demonstrada está a fraude contra a legislação trabalhista, posto que a cooperativa
deve possuir condições plenas de realizar o pagamento a seus cooperados, já que
para sua constituição é exigida a formação de fundos de contingência ou reserva
para este fim. 241
Complementa Sérgio Pinto Martins:
O tomador de serviços terá responsabilidade subsidiária em razão da
escolha de parceiro inidôneo financeiramente (culpa in eligendo) e da falta
de fiscalização quanto ao pagamento das verbas trabalhistas devidas aos
242
empregados da cooperativa (culpa in vigilando).
Conclui-se, pois, que é possível a atividade terceirizada exercida pelas
cooperativas de trabalho, contudo devem ser observados todos os requisitos
exigidos pelo direito pátrio. Caso contrário, em razão do princípio da primazia da
realidade e da verificação da fraude da lei trabalhista, será configurado o vínculo
empregatício com a tomadora de serviços, de modo que o cooperado empregado
terá direito a todas as verbas trabalhistas.
3.6. ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL DO TRIBUNAL REGIONAL DO
TRABALHO DA 12ª REGIÃO
Conforme já explanado nos itens acima, há uma grande demanda na Justiça
Trabalhista Brasileira, entre cooperados e cooperativas ou entre cooperados e
tomadores de serviço, versando sobre a existência de vínculo empregatício nas
relações de trabalho entre eles.
Como forma de ilustrar a realidade das cooperativas em Santa Catarina, citarse-ão algumas ementas sobre o assunto abordado.
Assim, posiciona-se o Tribunal Regional do Trabalho, TRT, 12ª Região,
através das decisões de algumas turmas sobre o reconhecimento de vínculo
empregatício quando verificada a fraude à legislação, o que aparenta já estar
pacificado, apesar do disposto no artigo 442, parágrafo único da CLT:
241
MAUAD, Marcelo José Ladeira. Cooperativas de Trabalho: sua relação com o direito do
Trabalho. 2.ed. São Paulo: LTR, 2001. pág. 241.
242
MARTINS, Sérgio Pinto. Cooperativas de Trabalho. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006. pág.
111.
65
Ementa:
COOPERATIVA.
POSSIBILIDADE
JURÍDICA
DE
RECONHECIMENTO DO VÍNCULO. DESRESPEITO À LEI DAS
COOPERATIVAS. É de se afastar a vedação contida no artigo 442 da CLT,
quando a cooperativa não se destina a promover a ajuda mútua dos
associados, configurando-se em mera prestadora de serviço. (Acórdão
4082/2006 - Juiz Marcus Pina Mugnaini - Publicado no DJ/SC em 04-042006, página: 284.)
Ementa: COOPERATIVA. CONTRATO DE TRABALHO. VÍNCULO.
Inaplicável o artigo 442 da CLT quando se verificar que a cooperativa
figurou como mera intermediadora de mão-de-obra, em flagrante tentativa
de acobertar as relações de emprego, desvirtuando as finalidades da Lei n.º
5.764/71. Em seu artigo 2º, essa Lei prevê como objetivo da cooperativa a
defesa sócio-econômica de seus associados, por meio da ajuda mútua,
procurando libertá-los do intermediário trabalhista, mediante o trabalho
autônomo em atividades agrícolas, industriais, comerciais e prestação de
serviços para empresas privadas e órgãos públicos. Pode-se afirmar,
portanto, que a prestação de serviços por cooperados deve apresentar
como elemento identificador e indispensável a autonomia.
(Acórdão 4065/2006 - Juíza Gisele P. Alexandrino - Publicado no DJ/SC em
03-04-2006, página: 278.)
Ementa: INTERMEDIAÇÃO DE MÃO-DE-OBRA. COOPERATIVA.
VÍNCULO EMPREGATÍCIO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO
ENTE PÚBLICO. A intermediação de trabalhadores fora dos limites legais
representa tentativa de fraude à legislação trabalhista, sendo nulos de pleno
direito os atos praticados com tal intento (artigo 9º da CLT). O vínculo de
emprego se estabelece com a cooperativa. Nos termos do disposto no item
IV do Enunciado nº. 331 do TST, é imperioso reconhecer a responsabilidade
subsidiária do Município, na qualidade de tomador dos serviços. (Acórdão
3792/2006 - Juiz Edson Mendes De Oliveira - Publicado no DJ/SC em 2903-2006, página: 254).
Ementa: SUBCONTRATAÇÃO OU TERCEIRIZAÇÃO DE EMPREGADO DE
COOPERATIVA. FRAUDE NA CONSTITUIÇÃO E NOS FINS DESTA.
Demonstrados o abandono das finalidades cooperativistas e o caráter
fraudulento que marcou a constituição da entidade, a ela não se aplicam o
disposto na Lei nº. 5.764, de 16 de dezembro de 1971 e nem a vedação
prevista no parágrafo único do artigo 442 da CLT. (Acórdão 843/2006 Juíza Sandra Márcia Wambier - Publicado no DJ/SC em 25-01-2006,
página: 145.)
COOPERATIVA DE TRABALHO. DESVIRTUAMENTO DOS OBJETIVOS.
ATUAÇÃO COMO MERA INTERMEDIADORA DE MÃO-DE-OBRA.
INAPLICABILIDADE do parágrafo único do Artigo 442 daCLT. A
Consolidação das Leis do Trabalho é expressa ao excluir a existência de
vínculo empregatício entre a cooperativa e seus associados e entre estes e
os tomadores de serviços daquela (artigo 442, parágrafo único). É evidente
que quando a lei exclui os cooperados da relação de emprego refere-se
apenas àqueles que são realmente cooperados, que mantenham entre si
relação associativa, de forma horizontal. Porém, a partir do momento em
que o contrato é realizado na linha vertical e é constatada uma relação de
pessoalidade, subordinação, não-eventualidade e salário, há reconhecer a
existência de vínculo empregatício em face da presença dos elementos que
o caracterizam. (Acórdão 13707/2005 - Juíza Lília Leonor Abreu - Publicado
no DJ/SC em 24-11-2005, página: 218.)
Contudo, ao se verificar que os requisitos do Código Civil e da lei 5.764/71
foram cumpridos de forma correta, o vínculo não é reconhecido, pois o objetivo do
66
cooperativismo está preservado. É o tipo de cooperativa que deve ser incentivada.
Senão vejamos:
Ementa: SOCIEDADE COOPERATIVA. INEXISTÊNCIA DE VÍNCULO DE
EMPREGO ENTRE A COOPERATIVA E SEUS ASSOCIADOS. Não
havendo prova de fraude que descaracterize a relação jurídica estabelecida
entre o cooperado e a cooperativa, há óbice legal ao reconhecimento do
vínculo empregatício por ele pretendido. (Acórdão 3222/2006 - Juíza Marta
M. V. Fabre - Publicado no DJ/SC em 16-03-2006, página: 301.)
Ementa: VÍNCULO DE EMPREGO. COOPERATIVA. Demonstrado nos
autos que o autor aderiu voluntariamente à sociedade cooperativa e que o
trabalho foi prestado em favor de terceiro de forma não subordinada,
inexiste possibilidade de reconhecimento do vínculo de emprego. (Acórdão
3903/2006 - Juíza Sandra Márcia Wambier - Publicado no DJ/SC em 30-032006, página: 327.)
Ementa: SOCIEDADE COOPERATIVA. INEXISTÊNCIA DE VÍNCULO DE
EMPREGO ENTRE A COOPERATIVA E SEUS ASSOCIADOS. Não
havendo prova de fraude que descaracterize a relação jurídica estabelecida
entre o cooperado e a cooperativa, há óbice legal ao reconhecimento do
vínculo empregatício pretendido pela autora. (Acórdão 1085/2006 - Juíza
Marta M. V. Fabre - Publicado no DJ/SC em 30-01-2006, página: 173.)
Ementa: COOPERATIVA. RELAÇÃO DE EMPREGO. NÃO-OCORRÊNCIA.
Na medida em que é reconhecida a regularidade da constituição e o
funcionamento da sociedade cooperativa, aliado ao fato de não existir
elementos nos autos que comprovem que o trabalho ocorreu nos moldes do
artigo 3º da CLT, impõe-se manter a sentença de fundo, e, por via de
conseqüência, negar provimento a pretensão do autor. Embora as
Cooperativas tenham se servido à fraude de direitos trabalhistas, somente o
exame do caso concreto é que permite verificar se houve, ou não, distorção
em sua utilização.(Acórdão 14402/2005 - Juiz José Ernesto Manzi Publicado no DJ/SC em 05-12-2005, página: 178.)
Diante das ementas apresentadas, percebe-se que o Tribunal Trabalhista de
Santa Catarina coaduna com a posição da doutrina, de forma que suas decisões
analisam mais que apenas a letra da lei, mas sim interpretam de forma sistemática
as normas trabalhistas, de modo que o princípio da realidade é respeitado e a justiça
prevalece, respeitando-se os objetivos do cooperativismo e do direito do trabalho.
67
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O ser humano, em toda sua história, teve presente as idéias de solidarismo e
ajuda mútua. No entanto, com a ascensão do capitalismo, com o aumento da mãode-obra nas cidades e a diminuição dos postos de trabalho, as dificuldades
tornaram-se mais presentes na vida dos habitantes.
Neste contexto, as pessoas perceberam que juntas se tornam mais fortes,
possuem mais possibilidades e diminuem os obstáculos para uma melhoria em suas
condições. Assim se concretizaram os ideais do cooperativismo, que, a partir da
cooperativa de Rochadele, se difundiu inicialmente pela Europa, espalhando-se por
todo o mundo.
No Brasil, o cooperativismo iniciou-se um pouco diferente do modelo europeu,
por ser patrocinado pelas elites agrárias e possuir intervenção governamental, mas
isso não impediu o seu sucesso no país.
Ainda hoje, os princípios rochadeleanos são utilizados como base das
cooperativas, pois visam à igualdade entre os seus associados, à liberdade de
atuação, mesmo que dentro das normas do estatuto, e, principalmente, à melhoria
nas suas condições, tanto profissionais, como pessoais.
As cooperativas regem-se pelo Código Civil, em conjunto com o disposto na
lei 5.764/71, que define a política nacional do cooperativismo; contudo, devem
sempre respeitar os princípios previstos na Constituição Federal e os princípios que
regem o Direito do Trabalho.
Possuem características e exigências próprias, com o objetivo de evitar que a
finalidade precípua das cooperativas, que é servir a seus cooperados, que são ao
mesmo tempo seus donos e beneficiados, seja desvirtuada em razão de interesses
alheios.
As cooperativas estão presentes nos mais diversos âmbitos de atuação. Por
este motivo, a lei não delimita tipos de cooperativa, exigindo apenas que os
princípios e sua finalidade sejam respeitados.
Assim, diante das mudanças ocorridas com a globalização da economia
mundial, não é possível que as relações de trabalho também não se modifiquem,
tornando-se cada vez mais diversificadas, não existindo apenas um modelo da
68
relação de emprego, como partes o empregado subordinado e o empregador, que
se torna apenas mais uma espécie de relação de trabalho. O ser humano é obrigado
a evoluir e procurar novos meios para sobreviver e novas formas de trabalho para
continuar inserido no mercado de trabalho.
E é por este motivo que as cooperativas se tornam tão importantes, pois, ao
eliminar a figura do empregador, possibilitam que, nos mais diversos campos da
economia do país, pessoas que se encontram desempregadas, sem espaço no
mercado de trabalho, tenham um local para desenvolver suas habilidades
laborativas, de forma mais expressiva do que se estivessem procurando empregos
comuns, e consigam sustento para si e seus familiares, além de aprimoramento nos
campos profissional e pessoal, em razão dos benefícios e cursos de capacitação,
muitas vezes, oferecidos pela cooperativa.
Assim ocorre com as Cooperativas de Trabalho, que, através da união de
trabalhadores de determinada área, ou até de mais de uma, oferecem a sua mão-deobra ou prestação de serviços a empresas que procuram aumentar seus lucros e
diminuir tanto seus gastos com o pessoal como a responsabilidade sobre
determinadas atividades que não são seu fim essencial e que podem, desta forma,
ser efetuadas por serviço terceirizado. Trata-se de uma parceria, de um contrato,
que favorece as duas partes: a empresa, que terá sua responsabilidade diminuída e
lucro aumentado e os cooperados, que obterão renda para seu sustento e benefícios
oferecidos pela cooperativa.
Contudo, nem sempre as cooperativas são utilizadas com o intuito de
melhorar a vida dos trabalhadores. Muitos empregadores, procurando obter cada
vez mais lucro para si e burlar a legislação trabalhista, tentam desvirtuar a finalidade
das cooperativas, apenas para não ter o compromisso de pagar os encargos
decorrentes da relação de emprego e os direitos dos trabalhadores.
Isso se tornou mais freqüente com a inserção do parágrafo único do artigo
442 da CLT, que prevê que não haverá vínculo empregatício entre as cooperativas e
seus cooperados e dos cooperados com os tomadores de serviço. Foram criadas
inúmeras
pseudo-cooperativas,
que
nada
mais
são
do
que
empresas
intermediadoras de mão-de-obra, que muitas vezes são criadas pelos próprios
empresários, donos da tomadora de serviço, para se desobrigar dos deveres
decorrentes da relação de trabalho. Não possui nenhuma finalidade social para com
69
seus cooperados, que, diante das dificuldades no atual contexto do mercado de
trabalho, preferem abdicar de direitos irrenunciáveis, de acordo com a legislação
trabalhista, do que ficar sem emprego e passar necessidades.
Porém, o artigo 442, parágrafo único, não tem por objetivo estimular este tipo
de atividade fraudulenta, e, como o direito deve ser visto de forma sistemática, deve
ser analisado em conjunto com as demais regras do ordenamento jurídico. Assim
verificados os requisitos da relação de emprego, que são subordinação,
onerosidade, continuidade, pessoalidade, prestados por pessoa física, o vínculo será
configurado, com base no artigo 9º da CLT, que prevê que são nulos os atos que
têm por objetivo a fraude à legislação trabalhista, neste caso o contrato de prestação
de serviços.
Ademais, é princípio do Direito do Trabalho a Primazia da Realidade, ou seja,
de nada valerá o constante no contrato de prestação de serviços se, na prática, o
que ocorre na relação de trabalho é diverso do que está descrito, ou seja, deverá
sempre levar em conta o contrato realidade.
Apesar disto, não se deve deixar de estimular o crescimento e aprimoramento
das verdadeiras cooperativas de trabalho, já que são um importante instrumento no
combate ao desemprego e desigualdades sociais do mundo globalizado. Deve-se,
todavia, buscar a erradicação das pseudo-cooperativas, que acabam enfraquecendo
o movimento cooperativista.
Portanto, cabe ressaltar que as legítimas Cooperativas são aquelas que
seguem os princípios do Direito do Trabalho, da Constituição, do cooperativismo,
buscando sempre melhorar a vida dos seus associados, e devem ser estimuladas
pelo Poder Público e terem seu total apoio, como de toda a sociedade.
70
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o vínculo empregatício e as cooperativas de trabalho