APRESENTAÇÃO A Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes e de Jovens tem o compromisso de incorporar a atenção à saúde deste grupo populacional à estrutura e mecanismos de gestão, à rede de atenção do SUS e às ações e rotinas do Sistema Único de Saúde (SUS) em todos seus níveis. Ela servirá de norteadora para as diversas ações, serviços e programas do setor Saúde – nas esferas federal, estadual e municipal - em acordo com as diretrizes do SUS Promover a saúde de adolescentes e jovens exige compreender que os comportamentos iniciados nessa idade são cruciais para o restante da vida, porque repercutem no desenvolvimento integral da pessoa. A saúde nestas faixas etárias está diretamente relacionada à promoção da participação juvenil no exercício da cidadania, em especial, no fortalecimento dos seus vínculos familiares e comunitários e por meio de ações de educação em saúde e prevenção de agravos. Esta Política está em consonância com a Constituição Brasileira que elegeu, como um de seus princípios norteadores, a prevalência dos direitos humanos. O outro pilar que a sustenta é o Estatuto da Criança e do Adolescente, onde crianças e adolescentes são reconhecidos como sujeitos sociais, portadores de direitos e garantias próprias, independentes de seus pais e/ou familiares e do próprio Estado. Esta foi a grande mudança de paradigma que estabeleceu obrigações diferenciadas para o Estado, para as famílias e para a sociedade em geral, configurando a denominada Doutrina da Proteção Integral. Fruto de uma construção coletiva, que incluiu adolescentes e jovens no processo, é uma política integrada à política nacional de saúde e articulada a outros setores governamentais e não governamentais, fundamentais para a atenção integral à saúde deste grupo populacional. Traz um novo olhar sobre o este segmento etário e apresenta, também, uma concepção mais abrangente de saúde. Esta inclui uma combinação de intervenções práticas, capazes de promover o desenvolvimento saudável desta população e um arcabouço teórico que estimula a reflexão e o desenvolvimento de novos conhecimentos sobre a sua saúde. A implementação dessa Política, em âmbito nacional, requer o desenvolvimento de ações de saúde que poderão contribuir para o alcance dos objetivos e metas que constam do Pacto pela Vida ( ou é Saúde?), fortalecendo o atendimento na Atenção Básica, onde a maioria dos problemas de saúde dos adolescentes e dos jovens encontra resolutividade. SUMÁRIO 1. Introdução.................................................................................................................................. 01 2. Adolescências e Juventudes....................................................................................................... 02 3. Vulnerabilidade.......................................................................................................................... 03 4. Marco Legal............................................................................................................................... 4.1 O Estatuto da Criança e do Adolescente............................................................................... 4.2 As Leis Orgânicas da Saúde (nº 8.080 de 19/09/90 e nº 8.142 de 28/12/90)....................... 4.3 A Lei Orgânica de Assistência Social (nº 8.742 de 7/12/93)................................................ 05 05 06 06 5. Análise da Saúde de Adolescentes e Jovens.............................................................................. 5.1 Causas Esternas.................................................................................................................... 5.2 Saúde Sexual e Saúde Reprodutiva...................................................................................... 5.3 Violência Doméstica/Intrafamiliar....................................................................................... 5.4 Uso Prejudicial de Álcool e outras Drogas.......................................................................... 06 07 07 09 10 6. Atenção Integral à Saúde de Adolescentes e Jovens................................................................. 6.1 Diretrizes.............................................................................................................................. 6.2 Objetivo Geral...................................................................................................................... 6.3 Objetivos Específicos........................................................................................................... 6.4 Eixos Prioritários de Ação.................................................................................................... 6.5 Temas Estruturantes da Atenção Integral............................................................................. 6.5.1 Participação Juvenil........................................................................................................ 6.5.2 Equidade de Gêneros e Empoderamento do Sexo Feminino.......................................... 6.5.3 Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos..................................................................... 6.5.4 Projeto de Vida............................................................................................................... 6.5.5 Cultura da Paz................................................................................................................. 6.5.6 Etica e Cidadania............................................................................................................ 6.5.7 Igualdade Racial e Étnica............................................................................................... 11 11 11 12 13 13 13 14 15 16 16 17 18 7. Um Novo Olhar para a Atenção Integral à Saúde de Adolescentes e Jovens............................ 7.1 A Adoção de Um Olhar Diferenciado para com o Jovem.................................................... 7.2 Atenção Básica como Estratégia Prioritária de Atenção à Saúde de Adolescentes e Jovens............................................................................................................................................ 7.3 Promoção da Saúde de Adolescentes e Jovens..................................................................... 7.4 Demanda Organizada............................................................................................................ 19 20 20 22 22 8. Diretrizes para operacionalização da Política de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes e de Jovens.................................................................................................................................... 8.1 Promoção da Saúde.............................................................................................................. 8.2 Crescimento e Desenvolvimento Saudáveis........................................................................ 8.3 Saúde Sexual e Saúde Reprodutiva...................................................................................... 8.4 Redução da morbimortalidade por causas externas.............................................................. 23 24 25 26 28 9. Responsabilidades de Gestão dos Entes Federados.................................................................. 9.1 Secretarias Municipais de Saúde e Distrito Federal............................................................ 9.2 Secretarias Estaduais de Saúde e Distrito Federal............................................................... 9.3 Ministério Saúde.................................................................................................................. 29 29 30 30 10. Referências.............................................................................................................................. 32 1. INTRODUÇÃO No Brasil contemporâneo, a geração de adolescentes e jovens, de 10 a 24 anos de idade, é a mais numerosa em toda a sua história, representando, em 2004, um total de 54.286.535 pessoas, 30,3% da população brasileira1 (IBGE). A grande maioria (84%) dos adolescentes e jovens brasileiros vive em áreas urbanas, enquanto que 16% vive em áreas rurais. Cada uma destas parcelas representa desafios e demandas distintos para a Saúde. A energia, o espírito criativo, inovador e construtivo da população jovem devem ser considerados como um rico potencial, capaz de influenciar de forma positiva o desenvolvimento do país. Para assumir esse papel de relevância na sociedade, é necessário que adolescentes e jovens tenham acesso universal a bens e serviços que promovam a saúde e a cidadania. Em consonância com os preceitos da Constituição Federal de 1988, que elegeu como um de seus princípios norteadores a prevalência dos direitos humanos e, dentro destes direitos, preconizou a saúde como um direito de todos, em 1989, o Ministério da Saúde instituiu no Brasil o Programa de Saúde do Adolescente (PROSAD) – para a faixa etária de 10 a 19 anos completos - que foi implantado em todo o território nacional. As suas bases programáticas abordavam, a partir do quadro epidemiológico nacional, as áreas prioritárias: crescimento e desenvolvimento, sexualidade, saúde bucal, saúde mental, saúde reprodutiva, saúde do escolar adolescente e prevenção de acidentes, cujas ações se desenvolviam em todos os níveis de atenção por equipes muldisciplinares de saúde, em centros de referência. Havia uma ênfase nas ações educativas e na participação dos adolescentes como multiplicadores de saúde. Em 1990 o Estatuto da Criança e do Adolescente vem trazer a prioridade absoluta na atenção integral a esta faixa etária reassegurando o direito à vida e à saúde “mediante e a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso em condições dignas de existência”. Em 1993 foram lançadas as primeiras Normas de Atenção à Saúde Integral do Adolescente, com a finalidade de orientar as equipes de saúde na atenção ao adolescente, tendo como pano de fundo os princípios e as diretrizes do Sistema Único de Saúde recentemente implantado. Estas foram enviadas aos serviços de saúde de todos os Estados, recomendando-se a capacitação específica das equipes de saúde para esse atendimento. A realização da Reunião Mundial de Ministros da Juventude em Portugal, em 1998, que contou com a presença do Secretário dos Direitos Humanos do Brasil e de enviados pelo Ministério da Saúde, trouxe um novo olhar sobre a vulnerabilidade deste grupo etário – 15 a 24 anos – às repercussões sobre o processo saúde-doença advindas das determinações socioeconômicas e políticas da Reforma do Estado no Brasil. Sendo assim, em 1999 o Ministério da Saúde ampliou a especificidade no atendimento em saúde à faixa etária de 10 a 24 anos, elaborando, ainda, uma Agenda Nacional sobre a saúde de adolescentes e jovens abordando os principais agravos à saúde trazidos pelos dados epidemiológicos e por 1 No ano 2000, o Brasil, sozinho, era responsável por 50% dos jovens da América Latina e 80% dos jovens do Cone Sul. Além disso, entre os 191 países membros da Organização das Nações Unidas, o Brasil é o 5º com maior percentagem de jovens na sua população. 1 pesquisas nacionais2, na procura de integrar ações intra e inter governamentais para a atenção integral à saúde deste grupo populacional. O ano de 2004 traz horizontes mais promissores para a atenção integral à saúde de adolescentes e jovens, uma vez que este grupo etário passou a ser visto em todas as suas necessidades para ter condições dignas de existência. Iniciaram-se as discussões para a criação, em 2005, da Secretaria da Juventude e o Conselho Nacional de Juventude, onde o Ministério da Saúde tem assento, como mecanismos para identificar e articular as ações para atender às necessidades mais prementes da juventude brasileira. Nesse cenário, o Ministério da Saúde deu continuidade às discussões para elaboração de uma política nacional que respondesse às necessidades de saúde e aos anseios dos adolescentes e jovens brasileiros de ambos os sexos. Para isto convocou coordenadores estaduais e municipais responsáveis pela saúde de adolescentes e jovens, profissionais de saúde, universidades, conselhos profissionais, áreas de interface no Ministério da Saúde, ongs e grupos organizados de adolescentes e de jovens, para desenvolver o processo de elaboração desta política, terminado-o no final de 2005, após consulta pública. Em 2006 deu-se início à pactuação e discussão junto aos gestores estaduais e municipais do SUS, para posterior aprovação da política tendo em vista a garantia do direito constituído de adolescentes e jovens à saúde no âmbito do SUS.. Ainda nesse período as três esferas de gestão, Ministério da Saúde, Estados e Municípios, desenvolveram uma ampla revisão do arcabouço normativo, tendo em vista que transcorridas quase duas décadas do processo de institucionalização do Sistema Único de Saúde, a sua implantação e implementação evoluíram muito, especialmente em relação aos processos de descentralização e municipalização das ações e serviços de saúde. O processo de descentralização ampliou o contato do Sistema com a realidade social, política e administrativa do país e com suas especificidades regionais, tornando-se mais complexo e colocando os gestores à frente de desafios que busquem superar a fragmentação das políticas e programas de saúde através da organização de uma rede regionalizada e hierarquizada de ações e serviços e da qualificação da gestão. Trabalhar pela saúde de adolescentes e jovens exige uma visão holística do ser humano e uma abordagem sistêmica das necessidades desta população, não se restringindo à prevenção de doenças e agravos ou ao atendimento clínico. A saúde deve ser entendida em sua acepção mais abrangente, com suas diversas dimensões e múltiplos fatores causais. É fundamental que os gestores e profissionais de saúde, a família e a sociedade em geral compreendam os processos e necessidades desse grupo etário, assim como os fatores ambientais, sociais e culturais que afetam a sua saúde. Estas características específicas e influências do contexto precisam ser consideradas também no planejamento, desenvolvimento, gestão e organização dos serviços de saúde. Garantir o desenvolvimento integral da adolescência e da juventude requer a construção de políticas públicas capazes de prover atenção integral à saúde em todos os níveis de complexidade. 2. ADOLESCÊNCIAS E JUVENTUDES A presente Política adota os termos adolescência e juventude em seu plural – adolescências e juventudes – no intuito de se reconhecer a grande diversidade de experiências, condições de vida e características sociais, raciais, étnicas, religiosas, culturais, de gênero e de orientação sexual que compõem o universo desses segmentos populacionais. 2 Como a Pesquisa Nacional sobre Desenvolvimento e Saúde da População Brasileira de 1996 2 O Ministério da Saúde adota a convenção elaborada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) que delimita o período entre 10 e 19 anos, 11 meses e 29 dias de idade como adolescência, e o situado entre 15 e 24 anos como juventude. Há, portanto, uma interseção entre a segunda metade da adolescência e os primeiros anos da juventude. O presente documento, que adota a convenção acima, recorre aos termos “população jovem” ou “pessoas jovens” para se referir ao conjunto de adolescentes e jovens, ou seja, à abrangente faixa compreendida entre 10 e 24 anos. A adolescência é uma etapa do desenvolvimento do ser humano marcada por profundas transformações biopsicossociais. O acelerado crescimento físico dessa fase é acompanhado pela maturação sexual. A capacidade de abstração e o pensamento crítico se desenvolvem, juntamente com um maior senso de independência emocional e de auto-conhecimento. Formula-se, gradualmente, o código pessoal de valores éticos. A puberdade, componente biológico da adolescência, é universal. A dimensão psicossocial da adolescência, entretanto, pode variar consideravelmente de acordo com o momento histórico e o contexto sócio-cultural, ou mesmo inexistir enquanto categoria social. Os processos de amadurecimento físico, mental, emocional, social e moral da adolescência também são influenciados pelas peculiaridades inerentes a cada sujeito, tornando complexa a sua delimitação e conceituação. Tradicionalmente, a adolescência tem sido abordada, no senso comum e também por profissionais de saúde, como mera “transição” ou “preparação para a vida adulta”, refletindo uma visão de mundo adultocêntrica. De acordo com essa perspectiva, o adolescente deve estudar e se desenvolver para que possa, “no futuro, tornar-se um cidadão”. No discurso de diversos atores sociais, incluindo expressivos segmentos da mídia, a adolescência é imediatamente associada a “problemas” – abuso de álcool e drogas, gravidez na adolescência, comportamentos anti-sociais, desinteresse pelos estudos e, mais recentemente, como autor de violências e infrações legais. Em síntese: encarada como um tempo de espera, criticada em suas iniciativas e posturas, vinculada a problemas individuais e sociais, renegada em seus anseios de participação e protagonismo, seduzida pelos apelos do consumismo, hedonismo e individualismo, a adolescência transformou-se, de fato, numa “crise”. Não se trata de uma crise inerente a esse período de vida mas de uma construção social e cultural cujas significações repercutem tanto sobre as pessoas que atravessam essa fase, quanto sobre a sociedade. A juventude é uma categoria sociológica, estando relacionada à inserção no mundo social, ou seja, ao processo de conquista da independência econômica e profissional. 3. VULNERABILIDADE Os valores, atitudes, hábitos e comportamentos que marcam a vida dos adolescentes encontram-se em processo de formação e cristalização. Ao mesmo tempo, a sociedade e a família passam a exigir do indivíduo, ainda em crescimento e maturação, maiores responsabilidades com relação a sua própria vida. Por outro lado, fatores externos constituem uma poderosa influência sobre o modo como adolescentes e, também, os jovens pensam e se comportam. Os valores e o comportamento dos amigos ganham importância crescente na medida em que surge um natural distanciamento dos pais em direção a uma maior independência. 3 Também, exercem influência os elementos que compõem o meio em que eles vivem, como os veículos de comunicação de massa, a indústria do entretenimento, as instituições comunitárias e religiosas, e os sistemas: legal e político. De outra parte, estão necessidades de grande importância para o desenvolvimento desse segmento, representadas pelo acesso à educação formal, aos serviços de saúde, às atividades recreativas, ao desenvolvimento vocacional e às oportunidades de trabalho. Muito freqüentemente, a pobreza , o preconceito, privam o adolescente e o jovem de tais acessos. Acresce-se ainda a enorme exposição do adolescente e do jovem aos riscos associados à violência física, aos distúrbios sociais, às migrações e aos conflitos armados, somando-se, ainda, a curiosidade de quem está descobrindo o mundo e, às vezes, sente o desejo de experimentar tudo o que se apresenta como novo. Tal situação, onde se imbricam fatores biológicos e psicológicos, culturais, socioeconômicos, políticos e étno-raciais, pode aumentar a vulnerabilidade desse segmento populacional aos mais diversificados agravos à saúde, especialmente em situações em que não haja a garantia dos direitos de cidadania3. O risco de mortalidade por violências não se distribui de forma homogênea no espaço geográfico, mesmo no âmbito de cada município, evidenciando os fatores de vulnerabilidade. Em geral, os bairros mais pobres – também os menos providos de serviços básicos – apresentam taxas de mortes violentas mais elevadas que a média de sua cidade. Muitos desses bairros são marcados pela ausência de opções de lazer e cultura, bem como de espaços públicos para o convívio comunitário e a prática desportiva, evidenciando um quadro de negação dos direitos e da cidadania de segmentos socialmente excluídos que caracteriza a violência estrutural4. Desse modo, adolescentes e jovens das classes marginalizadas, inclusive indígenas, ciganos e jovens de outros povos tradicionais, além de estarem submetidos a um maior risco de serem vitimizados pelas modalidades de violência que ocorrem indistintamente em todos segmentos sociais, são vitimados5 (de forma exclusiva ou, ao menos, preferencial) pelas expressões da violência estrutural – discriminação social, racismo, dificuldade de acesso aos serviços públicos, falta de oportunidades, dentre outras. Apesar de os homicídios afetarem a população como um todo, a população adolescente e jovem é especialmente vulnerável a este evento. O principal grupo de risco para mortalidade por homicídio na população brasileira é composto por adolescentes e jovens do sexo masculino, afrodescendentes, que residem em bairros pobres ou nas periferias das metrópoles, com baixa escolaridade e pouca qualificação profissional. Trata-se, portanto, de uma nítida desigualdade associada à etnia e condição social. Um componente intrínseco da pessoa e fundamental na saúde de adolescentes e jovens é a sexualidade que não se limita a uma função biológica responsável pela reprodução; ela manifesta-se de diferentes formas de acordo com a fase evolutiva do ser humano, desde o seu nascimento até a 3 Nesse sentido, a pesquisa desenvolvida pelo Instituto Cidadania, em 2002, evidencia elementos que apontam para a vulnerabilidade desse grupo populacional: a inserção social, profissional e educacional, além das dificuldades de serem ouvidos em suas opiniões e necessidades, são os maiores problemas enfrentados pelos jovens brasileiros na atualidade. As pessoas jovens estão entre as principais vítimas do modelo econômico adotado nas últimas décadas, no qual a exclusão social se aprofunda. Nesse ano, apenas 41,3% dos jovens vivia em famílias com renda familiar per capita acima de 1 salário mínimo, sendo que 12,2% (4,2 milhões) vivia em famílias com renda per capita de até ¼ de salário mínimo. Em 2001, mais da metade dos jovens entre 15 e 24 anos não estudava e apenas 42% chegava ao Ensino Médio. De outro lado, a histórica desigualdade racial no Brasil ocasiona uma maior vulnerabilidade de adolescentes e jovens negros em relação à saúde, à educação e ao mercado de trabalho. 4 Um mapeamento da cidade de São Paulo demonstrou que as áreas desprovidas de equipamentos de lazer e cultura são as que apresentam altos índices de violência (Folha de São Paulo, 6/5/2001: C1 e C3). 5 Adotou-se aqui a distinção entre os conceitos de vitimação, que se refere a adolescentes que sofrem as injustiças da estrutura social e o de vitimização, que identifica aqueles submetidos à violência direta (UNICEF, 1998). 4 sua morte. A sexualidade transcende o aspecto meramente biológico, manifestando-se, também, como um fenômeno psicológico e social, fortemente influenciado pelas crenças e valores pessoais e familiares, normas morais e tabus da sociedade Para adolescentes e jovens, esta dimensão traduz-se em um campo de descobertas, experimentações e vivência da liberdade, como também de construção de capacidade para a tomada de decisões, de escolha, de responsabilidades e de afirmação de identidades, tanto pessoais como políticas. A sexualidade se destaca como campo em que a busca por autonomia de projetos e práticas é exercida de forma singular e com urgência próprias da juventude6. As transformações na vida sócio-cultural nas últimas décadas têm como uma de suas conseqüências o início da vida sexual de adolescentes cada vez mais cedo, caracterizando uma mudança do padrão de comportamento social e sexual. Essa vivência dos adolescentes e dos jovens ocorre em diversas condições trazidas pelas desigualdades de gênero, pelas distintas condições sócio-econômicas e culturais, pela raça/cor e etnia, pelas relações de poder entre gerações e as discriminações pela orientação sexual. Essas desigualdades afetam as diferentes dimensões da vida social de adolescentes e de jovens - em particular em relação à saúde - e reverberam de modo perverso nos dados sobre mortalidade e morbidade entre este segmento populacional, no que se refere à saúde sexual e à saúde reprodutiva de ambos os sexos. 4. MARCO LEGAL Em 1989, a Assembléia Geral das Nações Unidas adotou a Convenção sobre os Direitos da Criança, ratificada pelo Brasil em 1990, introduzindo no plano normativo: o valor intrínseco da criança e do adolescente como ser humano, a necessidade de especial respeito à sua condição de pessoa em desenvolvimento, o reconhecimento como sujeitos de direitos e sua prioridade absoluta nas políticas públicas. O reconhecimento, pelas Nações Unidas, de crianças e adolescentes como sujeitos sociais, portadores de direitos e garantias próprias, independentes de seus pais e/ou familiares e do próprio Estado, foi a grande mudança de paradigma que estabeleceu obrigações diferenciadas para o Estado, para as famílias e para a sociedade em geral dentro da Doutrina de Proteção Integral. A Constituição Brasileira de 1988 elegeu, como um de seus princípios norteadores, a prevalência dos direitos humanos. Assim, o cumprimento das obrigações internacionais assumidas e o reordenamento dos marcos jurídico-institucionais aos critérios das Convenções Internacionais de Direitos Humanos são exigências constitucionais. Nesse contexto, destacam-se as seguintes Leis: 4.1. O Estatuto da Criança e do Adolescente O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) reconhece todas as crianças e adolescentes como sujeitos de direitos nas diversas condições sociais e individuais, e fundamenta-se na doutrina da proteção integral. A condição de “pessoa em desenvolvimento” não retira de crianças e adolescentes 6 UNESCO. Juventude e Sexualidade. Brasilia: UNESCO, 2003. 5 o direito à inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral, abrangendo a identidade, autonomia, valores e idéias, o direito de opinião e expressão, de buscar refúgio, auxílio e orientação. Vale ressaltar que tais direitos estendem-se aos adolescentes em conflito com a lei, que cumprem medidas sócioeducativas. Eles se encontram sob a tutela do Estado, o qual passa a ter uma responsabilidade maior ainda na proteção de sua condição física, psíquica e social, devendo garantir-lhes todos os direitos assegurados a qualquer adolescente, dentre eles o direito à saúde. Na definição das linhas de ação para o atendimento da criança e do adolescente, o ECA destaca as políticas e programas de assistência social, determinando o fortalecimento e ampliação de benefícios assistenciais e políticas compensatórias como estratégia para redução dos riscos e agravos de saúde dos jovens. O acesso da criança e do adolescente à justiça também é reformulado a partir do Estatuto, criandose a Justiça da Infância e Juventude no âmbito dos Poderes Judiciários Estaduais, além de mecanismos e procedimentos próprios de proteção judicial e extrajudicial dos interesses individuais, difusos e coletivos das crianças e adolescentes. 4.2. As Leis Orgânicas da Saúde (n.º 8.080 de 19/09/90 e nº 8.142 de 28/12/90) As Leis Orgânicas da Saúde, e todas as suas alterações hora vigentes, vêm regulamentar o comando constitucional que instituiu o modelo descentralizado e universal de atenção à saúde, reconhecendoa como um direito de todos. A participação da sociedade civil no processo de implementação e gestão do SUS é assegurada na Conferência Nacional de Saúde, realizada a cada quatro anos, e na representação paritária nos Conselhos Nacional, Estadual e Municipal de Saúde. 4.3. Lei Orgânica da Assistência Social (n.º 8.742 de 07/12/93) Visando a assegurar existência digna e justiça social a todos, a Constituição brasileira cria o direito à assistência social que, independente de contribuição, ampara a quem dela necessitar. Este direito foi regulamentado pela Lei Orgânica da Assistência Social, a qual destaca, dentre seus objetivos, o amparo às crianças e adolescentes carentes, e garante um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência que comprove não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Essas legislações possuem um traço comum: a descentralização política e administrativa, com ênfase nos municípios, e a participação da sociedade na formulação das políticas. Esse novo marco conceitual e legal possibilita uma melhor articulação institucional, e o desenvolvimento de programas e ações que dêem conta da realidade local, sem perder de vista a proposta nacional. 5. ANÁLISE DA SAÚDE DE ADOLESCENTES E JOVENS 5.1 Causas Externas A mortalidade da população jovem brasileira é marcada pelas causas externas, que englobam agressões, homicídios, suicídios, acidentes de tráfego e de trabalho, afogamentos, envenenamentos, dentre outras. A mortalidade por homicídios7 entre a população jovem no Brasil apresentou 7 Na Classificação Internacional de Doenças, os homicídios encontram-se dentro do capítulo das causas externas de mortalidade, sendo constituído pelo agrupamento X85-Y09. 6 acentuado aumento nas últimas décadas, sendo, por isso destacada como importante indicador para nortear as propostas desta política8. Na população entre 10 a 14 anos, os acidentes de transporte ocupam o primeiro lugar, os afogamentos, o segundo, enquanto os homicídios representam a terceira causa de morte. Já entre as faixas de 15 a 19 anos, e de 20 a 24 anos de idade, os homicídios representam a principal causa de morte superando todas as outras causas de morte violentas e todas as enfermidades. As taxas de mortalidade são, respectivamente, 42,9 e 67,9 por 100.000 habitantes (SIM/DATASUS/2002. Os homicídios caracterizam-se como um grave problema social e de Saúde Pública, pela sua magnitude e abrangência, com impactos na área social, econômica e de saúde, afetando indivíduos, famílias e a coletividade. Também devem ser levados em consideração os anos de vida perdidos e o aumento da carga de morbidade - incapacidades, lesões, problemas crônicos, dentre outros decorrentes das agressões não-fatais. Além disso, os jovens do sexo masculino representam a maioria das vítimas por homicídios no Brasil, o que confere à população masculina um forte fator demográfico de risco. Em 2002, o risco de uma pessoa jovem (entre 10 a 24 anos de idade), do sexo masculino, morrer vítima de homicídio era aproximadamente 14 vezes maior do que o das pessoas jovens do sexo feminino9. 5.2. Saúde Sexual e Saúde Reprodutiva As políticas e programas de saúde voltados para adolescentes e jovens nem sempre levam em consideração que a sexualidade é parte do desenvolvimento humano e os conceitos de amor, sentimentos, emoções, intimidade e desejo com freqüência não se incluem nas intervenções de saúde sexual e saúde reprodutiva (OPAS, 2002 in MS, 2006). Nesse contexto, os adolescentes e os jovens não têm reconhecimento social como pessoas sexuadas, livres e autônomas, estando submetidos a situações de vulnerabilidade, no plano pessoal, social e institucional e a interdições pessoais diversas. No entanto, começam mais cedo a vida sexual face às transformações nos padrões sócio-culturais nos comportamentos sociais e sexuais. Em 2001/2002, dos adolescentes brasileiros com faixa etária entre 12 e 17 anos, 32,8% já haviam tido relações sexuais. Se entre mulheres como um todo se assistiu nas quatro últimas décadas um decréscimo na taxa de fecundidade (em 1940, a média nacional era de 6,2 filhos(as), em 2000, passa a 2,3 filhos(as), entre adolescentes e jovens o sentido é inverso. Durante toda a década de 90 até o ano de 2001, a taxa de fecundidade entre adolescentes aumentou 26%. A partir de 2002, estudo de Berquó e Cavanaghi (2004) baseado nos censos do IBGE de 1980, 1991 e 2000, evidenciou que houve uma diminuição na fertilidade em todas as faixas etárias, inclusive em adolescentes de 15 a 19 anos de idade. É fato também que a gravidez não planejada, quando indesejada, pode revelar-se em um grave problema para a saúde sexual e saúde reprodutiva de adolescentes e jovens brasileiras/os, como o atesta o número de atendimentos decorrente de aborto no SUS, bem como nos índices de óbitos maternos juvenis. Este é um problema de saúde preponderante entre mulheres jovens, em particular, entre negras e pobres, mais expostas aos riscos do aborto em condições inseguras, como também as conseqüências das deficiências na assistência obstétrica e dos impactos das condições de vida na situação de saúde. 8 Em 2002, os homicídios produziram um total de 49.695 mortes no País. Deste total, 19.800 mortes, ou seja, 40%, ocorreram entre a população entre 10 a 24 anos de idade, evidenciando a concentração da mortalidade por homicídios entre a população jovem (SIM/DATASUS). 9 Naquele ano, as taxas de mortalidade por homicídios foram, respectivamente, 69,4 (por 100.000 hab.) e 5,1 (por 100.000 hab.) (SIM/DATASUS). 7 A experiência e outros estudos10 têm demonstrado que a gravidez pode ser uma opção para adolescentes, podendo estar incluída em projetos de vida de adolescentes e jovens tanto do sexo feminino quanto do masculino. A maternidade e a paternidade podem se revelar, ainda, como um elemento reorganizador da vida e não somente desestruturador. Dados da Pesquisa GRAVAD11, realizada em três grandes capitais brasileiras entre adolescentes e jovens homens e mulheres com idade entre 18 e 24 anos, apontaram que a maioria das adolescentes mulheres que engravidaram (97,5%) e dos adolescentes que já engravidaram uma companheira (85,8%), encontravam-se em contextos de relacionamentos afetivos estáveis. Diante da diversidade de contextos nos quais pode ocorrer a gravidez na adolescência, cabe um olhar diferenciado e atento, livre de preconceitos e individualizado para adolescentes de ambos os sexos. Em 2004, foram atendidos no SUS 1.312.823 partos na faixa etária de 10 a 24 anos de idade distribuídos por Região e faixa etária, conforme mostra a tabela abaixo: NÚMERO DE PARTOS SUS - NORMAL E CESÁREO Faixa Etária 2004 Região e UF res Região Norte Região Nordeste Região Sudeste Região Sul Região Centro-Oeste Total PARTO NORMAL 10-14a 15-19a 20-24a 3.173 56.078 67.034 7.835 165.338 203.385 4.779 127.734 179.743 2.059 46.164 58.718 1.527 32.357 42.223 19.373 427.671 551.103 PARTO CESÁREO 10-14a 15-19a 20-24a 1.004 14.973 20.513 2.179 38.227 56.399 1.642 42.123 71.889 717 15.270 23.215 533 10.064 15.937 6.075 120.657 187.953 TOTAL 162.775 473.363 427.910 146.143 102.641 1.312.832 Fonte: Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS) Freqüência por Região e UF res e Faixa etária (18) No ano 2004, foram registradas no SUS, de 10 a 49 anos de idade, 49.660 internações por aborto retido e por razões médicas e legais. Deste número, 30% referiam-se a jovens na faixa etária dos 20 a 24 anos, 19% a adolescentes entre 15 e 19 anos e 1,1% a adolescentes na faixa dos 10 aos 14 anos. (Fonte: SIH-SUS/Datasus/MS). É fato também que a gravidez não planejada, quando indesejada, pode revelar-se em um grave problema para a saúde sexual e saúde reprodutiva de adolescentes e jovens brasileiras/os, como o atesta o número de atendimentos decorrente de aborto no SUS, bem como nos índices de óbitos maternos juvenis. Este é um problema de saúde preponderante entre mulheres jovens, em particular, entre negras e pobres, mais expostas aos riscos do aborto em condições inseguras, como também às conseqüências das deficiências na assistência obstétrica e dos impactos das condições de vida na situação de saúde. Em 2002, foram registrados no DATASUS 1.650 óbitos de mulheres por causas relacionadas à gravidez, parto e puerpério. Destas mulheres, 268 (16%) tinham entre 10 e 19 anos e 687 (42%), entre 20 e 29 anos. Portanto, mais de metade dos óbitos maternos registrados pelo DATASUS atingem a população mais jovem (58%). 10 Cf. ARILHA (1998) e GRAVAD (2003). Estudo multicêntrico realizado em Salvador, Rio de Janeiro e Porto Alegre, mediante estratégias metodológica quantitativas e qualitativas, envolvendo 4.634 jovens, homens e mulheres, com idade entre 18 e 24 anos (27,2% homens e 52,8% mulheres). O período de realização foi 2001-2002. Pesquisa realizada pelo MUSA – Programa de Estudos em Gênero e Saúde – Instituto de Saúde Coletiva/UFBA; Instituto de Medicina Social da UERJ e Núcleo de Antropologia do Corpo e da Saúde da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. 11 8 Esses dados podem estar relacionados, como o demonstram os estudos sobre mortalidade materna já realizados no país, à precariedade na assistência ao pré-natal e, no caso deste segmento populacional, à ausência de atenção específica a adolescentes e jovens gestantes. Vale ressaltar que o aborto inseguro está diretamente relacionado aos índices de mortalidade materna entre adolescentes e jovens, de todas as raças e etnias, atingindo, sobretudo, aquelas em situação de pobreza. Garantir os direitos reprodutivos a adolescentes e jovens de ambos os sexos, nesse contexto, significa assegurar, em todos os casos, as condições de escolha por ter ou não uma gravidez. Para tanto, as informações, os métodos contraceptivos e preservativos, serviços de contracepção e planejamento familiar devem ser disponibilizados, com acesso facilitado aos adolescentes que não querem engravidar ou querem planejar uma gravidez como também a assistência ao pré-natal, ao parto e ao puerpério deve ser assegurada de modo irrestrito, de maneira que a gravidez possa ser desejada, planejada e vivenciada de modo saudável. Outro dado de grande preponderância no contexto da saúde sexual e saúde reprodutiva desta população é o fato de que a epidemia de AIDS tem crescido mais entre adolescentes e jovens do sexo feminino. Em 2003 (CN de DST/AIDS), foram diagnosticados um total de 9.762 novos casos de AIDS. Destes novos casos, 7,2% foram registrados entre jovens masculinos de 13 a 24 anos de idade, enquanto 11,3%, entre jovens mulheres na mesma faixa etária. numa tendência epidemiológica que aponta e feminização da epidemia e indica maior vulnerabilidade das adolescentes à infecção. Uma cruel expressão de violação de direitos humanos é a exploração sexual de adolescentes e jovens no território brasileiro, que tem um impacto direto sobre a saúde sexual e a saúde reprodutiva. Recente estudo do governo federal12mostrou que a exploração sexual de crianças e adolescentes é uma prática disseminada no Brasil – atingindo cidades grandes, médias e pequenas de todo o país - embora a situação seja mais grave em algumas regiões e cidades do país. A exploração sexual está presente em 937 municípios. Destes, 298 (31,8%) situam-se na Região Nordeste; 241 (25,7%) no Sudeste; 162 (17,3%) Sul; 127 (13,6%) no Centro-oeste; e 109 (11,6%) Norte. Outro problema, acrescido à questão, é a exploração e a violência sexual contra adolescentes e jovens de povos tradicionais que ficam vulneráveis quando seus territórios são invadidos e seus costumes e tradições perdem a força de proteção frente à violência e à assimetria de poder trazidas por outras culturas. Para fazer frente a essa questão, o Ministério da Saúde articulou-se com a Secretaria de Direitos Humanos no Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico e à Exploração Comercial Sexual de Crianças e Adolescentes, constituindo parte da rede para a proteção e assistência às vítimas e aos adolescentes autores de violência sexual.. 5.3. Violência Doméstica/Intrafamiliar A morbidade de adolescentes e jovens também é marcada por diversas modalidades de violências, sendo que a maior parte das vítimas não-letais pertence ao sexo feminino. Essas violência permanecem “invisibilizadas” porque freqüentemente são cometidas por alguém de seu convívio – pai, padrasto, parceiro, parente ou vizinho – na maioria das vezes, em seus próprios lares - 63% dos casos de agressão física ocorridos nos domicílios tiveram como vítima a mulher - (PNAD 1998). A violência contra meninas e mulheres, embora não seja exclusiva do âmbito doméstico, ocorre com maior freqüência nesse espaço. Esse tipo de violência, em geral, não evolui a óbito, mas pode causar severos danos à saúde física e mental. Esta situação, também vem crescendo em áreas 12 Estudo Analítico do Enfrentamento da Exploração Sexual Comercial de Crianças e Adolescentes no Brasil (19962004). Brasil: Secretaria Especial de Direitos Humanos: Grupo Violes da Universidade de Brasília, 2005 9 indígenas em todo o Brasil segundo o relatório da oficina: O ECA e as populações infanto-juvenis indígenas, de 2004 realizado pelo o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – CONANDA e Fundação Nacional de Saúde – FUNASA. Quanto aos dados nacionais,13 estima-se que 9,1 milhões de crianças e adolescentes brasileiros, de ambos os sexos, de 0 a 19 anos de idade (15% do total dessa população), são vítimas de abuso sexual. Para a atenção às vítimas da violência intrafamiliar e às suas famílias, o Ministério da Saúde propõe a qualificação dos serviços de saúde para realizar ações de assistência, prevenção de agravos e de proteção, através de ações integradas intrainstitucionalmente entre ás áreas técnicas de Saúde do Adolescente e do Jovem, Saúde da Mulher, e o programa Nacional de DST/Aids. Ao mesmo tempo em que se articula à rede integral de proteção e defesa das vítimas. 5.4. Uso Prejudicial de Álcool, Tabaco e outras Drogas Diversos estudos epidemiológicos mostram um quadro preocupante, com uma tendência mundial à iniciação cada vez mais precoce e de forma mais pesada, no uso abusivo de substâncias psicoativas. O V Levantamento (2004) realizado pelo Centro Brasileiro de Informações Sobre Drogas Psicotrópicas, em todas as capitais brasileiras, com 48.155 estudantes do ensino fundamental e médio da rede pública de ensino, revelou que a idade do primeiro uso de drogas legais, álcool e tabaco, foi menor que o primeiro uso das outras drogas pesquisadas; – em média com 12 anos e 5 meses para álcool e 12 anos e 8 meses para tabaco -. Quanto ao uso de medicamentos de forma abusiva e sem receita, em média, o primeiro uso foi aos 13 anos de idade. A idade do uso da cocaína foi a mais alta, com a média de 14 anos e 4 meses de idade.Quanto aos solventes, continua sendo a droga de maior uso na vida. Por outro lado, o estudo em questão evidencia que o bom relacionamento com os pais e também entre eles e a prática de uma religião parecem ser fatores protetores ao uso pesado de álcool e outras drogas. É fundamental na prevenção ao uso prejudicial de drogas o conhecimento sobre os fatores protetores e os de risco para adolescentes e jovens. Ressalta-se a idade do primeiro uso de drogas lícitas para que as ações preventivas possam anteceder esse evento e tenham um resultado final positivo. Por outro lado, o V Levantamento Nacional evidencia que o uso de drogas está regularmente distribuído entre as classes econômicas, não havendo, então, a necessidade de que a prevenção se preocupe com esse recorte em suas ações. A Lei 11343 de 23 de agosto de 2006 que institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas – Sisnad, prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas e respectivos familiares dentre outras disposições. È importante ressaltar que esta aproxima o entendimento sobre o consumo pessoal de drogas do campo da saúde e incorpora os princípios do Sistema Único de Saúde, não restringindo suas disposições ao campo da segurança pública. Outro importante aporte é o da Política do Ministério da Saúde para a Atenção Integral a Usuários de Álcool e outras Drogas, que preconiza a mudança de modelos assistenciais de atenção integral que contemplem as reais necessidades de pessoas que consomem álcool e outras drogas. No âmbito da saúde pública, historicamente, os transtornos mentais associados ao uso de álcool e outras drogas são a segunda causa de internação psiquiátrica. Considerando dados referentes ao ano de 2004 (DATASUS, 2005), as internações para o tratamento destes transtornos foram na ordem de 13 Azevedo e Guerra (1995) citado por Aloísio (2002). 10 94.312. Destas, 11.715 foram registradas na faixa etária de 10 a 24 anos, representando mais de 12% do total de internações desta natureza, sendo que 3.199 referem-se aos transtornos por uso de álcool e 8.516 por uso de outras substâncias psicoativas. 6. ATENÇÃO INTEGRAL À SAÚDE DE ADOLESCENTES E JOVENS 6.1 Diretrizes 1. Adolescentes e jovens brasileiros, de 10 a 24 anos, têm seus direitos à saúde legalmente constituídos, sendo garantida a atenção integral por faixa etária e grupos populacionais em todos os níveis da atenção, em consonância com os princípios e diretrizes do SUS. 2. O processo de elaboração e de avaliação da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes e Jovens deverá contar com a participação de grupos organizados destes segmentos populacionais. 3. A execução da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes e Jovens será integrada intra e inter institucionalmente, intersetorialmente e com a participação de Estados, municípios e DF; 4. O processo de elaboração, de execução e de avaliação desta Política deverá ser subsidiado pelos sistemas de informações em saúde incorporando as faixas etárias de 10 a 14, 15 a 19, e 20 a 24 anos, contemplando dados relativos à situação de saúde e ao acesso a bens e serviços. 5. O planejamento, execução e avaliação das ações de saúde para adolescentes e jovens deverão garantir os princípios da igualdade entre homens e mulheres, o respeito às diversidades étnicas, raciais culturais, de orientação sexual, e a inclusão de adolescentes e jovens em situação especial de agravos. 6. As ações de saúde destinadas a adolescentes e jovens devem levar em consideração o contexto histórico, social, cultural, econômico e político e em que vivem. 7. As ações de atenção integral à saúde dirigidas a adolescentes e jovens serão permeadas por práticas educativas numa perspectiva participativa, emancipatória, multiprofissional, e voltadas para a eqüidade e cidadania. 8. Na atenção integral à saúde, a participação juvenil deverá ser estimulada e apoiada em ações cooperativas entre profissionais, adolescentes e jovens, favorecendo seu desenvolvimento, sua autonomia e a prática cidadã. 9. O fomento a atividades culturais, esportivas e à convivência comunitária será considerado parte integrante da promoção de saúde. 10. A educação permanente de profissionais de saúde e gestores é condição essencial para garantir a qualidade da atenção à saúde de adolescentes e jovens. 11. A participação das famílias nas ações de atenção integral à saúde de adolescentes e jovens deverá ser incentivada e facilitada no SUS, priorizando-se o bem-estar, a segurança e a autonomia desse grupo etário. 6.2 Objetivo Geral Promover a atenção integral à saúde de adolescentes e de jovens, de 10 a 24 anos, no âmbito da POLÍTICA NACIONAL DE SAÚDE, visando à promoção de saúde, à prevenção de agravos e à redução da morbimortalidade. 11 6.3 Objetivos específicos Implementar e articular ações, programas e projetos, em consonância com a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes e Jovens, de forma integrada e pactuada nos níveis federal, estadual e municipal em acordo com os princípios do SUS, contribuindo para o desenvolvimento saudável, a melhoria das condições de vida e a redução da morbimortalidade nesse grupo etário. Garantir no SUS, em todos os níveis de complexidade do SUS, a assistência de qualidade para a adolescência e juventude, atendendo às suas necessidades de saúde, especificidades de desenvolvimento, inserção sócio-cultural, bem como àquelas relativas à raça, etnia, gênero e orientação sexual. Contribuir para a implementação, acompanhamento e avaliação de ações e serviços para a saúde de adolescentes e de jovens, pactuados entre as três esferas de gestão do SUS. Promover a saúde de adolescentes e jovens de ambos os sexos, das zonas urbana e rural, contemplando as especificidades: étnicas e raciais, de gênero, de orientação sexual, culturais, sociais e regionais, visando ao seu desenvolvimento saudável e à proteção e defesa de suas condições de vida para a melhoria da qualidade de vida deste segmento populacional. Fortalecer, com estados, municípios e DF, ações de prevenção de agravos, promoção da saúde e de assistência à saúde de adolescentes e jovens, contemplando a sua heterogeneidade: regional, étnica, racial, social, cultural, familiar, de gênero, de orientação sexual; Reordenar e qualificar, com estados e municípios, o atendimento na rede do SUS a adolescentes e jovens que vivem em situação de vulnerabilidade: na rua, em acampamentos rurais, em abrigos, àqueles que são deficientes e aos que têm transtornos mentais e aos adolescentes em conflito com a lei que estão em medidas socioeducativas de internação e internação provisória. Promover, com estados, municípios e DF, a participação juvenil autônoma e cidadã, no planejamento e na avaliação das ações de promoção, prevenção e de assistência à saúde para a população adolescente e jovem. Assegurar em conjunto com estados, municípios e DF, os direitos sexuais e reprodutivos por meio da atenção integral à saúde sexual e saúde reprodutiva de adolescentes e jovens de ambos os sexos, de acordo com as especificidades e vulnerabilidade por faixa etária e diferentes grupos populacionais. Fortalecer as ações de assistência, de prevenção de agravos e de promoção à saúde sexual e saúde reprodutiva de adolescentes e jovens de ambos os sexos, em todos os níveis de complexidade do SUS, em conjunto com os estados, municípios e DF; Fomentar a articulação, em conjunto com estados, municípios e DF entre os setores Saúde e Educação, incluindo a educação indígena para o fortalecimento de ações integradas de prevenção a doenças e agravos, notadamente no âmbito da saúde sexual e da saúde reprodutiva; Contribuir para a promoção da saúde sexual e da saúde reprodutiva, no contexto sóciocultural e comunitário de adolescentes e de jovens, entre eles os indígenas, os quilombolas, os ciganos, e outras populações tradicionais, buscando a proteção e defesa de suas condições de vida. Contribuir, em conjunto com estados, municípios e DF, para a redução da morbidade associada à gravidez na adolescência, com atenção especial à faixa etária de 10 a 15 anos de idade. Fortalecer ações de assistência e de prevenção da infecção pelas DST e pelo HIV, nas zonas urbanas e rurais, para adolescentes e jovens e entre eles os indígenas, os quilombolas, os ciganos, e outras populações tradicionais, respeitando a forma de organização de cada povo. 12 Promover ações intersetoriais em conjunto com estados, municípios e DF, que assegurem ações educativas contra desigualdades, sociais, raciais, étnicas e de dificuldade de acesso a bens e a serviços públicos, que vulnerabilizam adolescentes e jovens frente a qualquer tipo de violência; Fortalecer intersetorialmente as ações de prevenção e assistência a agravos relacionados ao uso de álcool e de outras drogas como fatores de vulnerabilidade para acidentes de trânsitos; Contribuir para a redução da morbimortalidade por causas externas em adolescentes e jovens, em articulação com a Política Nacional de Redução de Acidentes e de Violência. 6.4 Eixos Prioritários de Ação Frente à situação de saúde analisada nesse documento, e face ao atual momento de implantação do SUS, a Política Nacional tem, como prioridade, três eixos de ação definidos a partir do reconhecimento das questões prioritárias na atenção à saúde de adolescentes e jovens: • • • Crescimento e desenvolvimento saudáveis; Saúde sexual e saúde reprodutiva; Redução da morbimortalidade por violências e acidentes. 6.5 Temas Estruturantes da Atenção Integral O processo de reflexão sobre os temas estruturantes propostos nessa Política, é fundamental, nas ações de promoção do desenvolvimento e o bem-estar humano em sua multidimensionalidade, favorecendo a incorporação nas ações de saúde e na rede de atenção à saúde, de novos subsídios voltados para o reconhecimento dos adolescentes e jovens como sujeitos plenos de direitos, socialmente mais responsáveis e mais cooperativos, com capacidade de posicionamento frente à sua vida e à sua saúde. Esta abordagem humanizada, voltada para as questões que são importantes para esse grupo populacional, aprofundará nas discussões os padrões de conduta e valores, social e historicamente construídos, as iniqüidades sociais e seus fatores constitutivos, dentre outras questões, que influenciam nas diferenças de expectativas e de papéis sociais que repercutem no crescimento e no desenvolvimento saudáveis desse grupo populacional. Os adolescentes e jovens descobrem-se como autores de suas vidas e passam a desempenhar um papel protagônico no exercício da cidadania e nas interações e práticas cotidianas. A abordagem dos temas estruturantes, abaixo explicitados, complementam o conjunto de “oportunidades e facilidades” que têm o intuito de “facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social” de crianças e adolescentes, preconizado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. 6.5.1 Participação Juvenil Adolescentes e jovens têm o desejo de ser escutados e a necessidade de serem reconhecidos em suas capacidades. Considerados enquanto sujeitos plenos de direito, eles precisam ser vistos de modo concreto como cidadãos, capazes de posicionamento nos diversos níveis do cotidiano em que estão imersos. Um grande número de pessoas jovens tem ideais de transformar a sociedade em algo mais humano e justo, mas não tem idéia de como concretizá-los, nem recebe qualquer incentivo nesse sentido. O conceito de protagonismo juvenil busca uma forma de ajudar o adolescente e o jovem a construir sua autonomia, através da geração de espaços e situações propiciadoras da sua participação criativa, construtiva e solidária, na solução de problemas reais na escola, na comunidade e na vida social mais ampla. 13 Favorecer a participação juvenil é uma estratégia eficaz de promoção da saúde. Seus benefícios são vários. Primeiro, porque contribui para a auto-estima do adolescente e do jovem, a sua assertividade e a formulação de um projeto de vida. Estes aprendizados constituem-se em elementos-chave de qualquer estratégia de prevenção à violência, bem como ao abuso de drogas e às DST/AIDS, nessa faixa etária. Portanto, no nível individual, a participação não é somente um enfoque para se obter uma adolescência e juventude socialmente mais responsável e mais cooperativa. E mais: é o caminho para o desenvolvimento de uma pessoa socialmente sã e, em segundo lugar, leva os adolescentes e jovens a se tornarem participantes importantes das ações que buscam promover a cidadania, e não apenas a serem eventuais usuários de programas, que induzam à consolidação de mecanismos de tutela e subordinação social. O terceiro benefício é acreditar que a participação juvenil não é apenas uma maneira de trazer os jovens para boas ações, desviando-os do mau caminho, e sim acreditar que os adolescentes e jovens são promotores da transformação social (Sposito, 2002). O quarto benefício é que a participação ativa e autônoma de jovens no planejamento, execução e avaliação das ações de saúde contribuirá decisivamente para a eficácia, a resolutividade e o impacto social das mesmas. Em síntese, tanto os adolescentes, quanto o setor saúde, são beneficiados por esse processo, além da comunidade local e da sociedade como um todo. Nesse sentido, a sustentabilidade de qualquer programa de saúde ou de desenvolvimento, em nível de comunidade ou até mesmo de nação, dependerá, a médio e longo prazo, da formação de adolescentes e jovens com capacidade de liderança e espírito de serviço à coletividade. Na realidade, uma parcela da juventude brasileira já está integrada a alguma forma de participação coletiva, a exemplo de grupos artísticos, culturais, desportivos ou religiosos, ONG’s, movimentos estudantis, ecológicos, sociais ou comunitários, escotismo e serviços voluntários. Entretanto, nem todos esses grupos promovem uma efetiva participação juvenil. Vários ainda se baseiam na concepção de algo que é feito para o adolescente e não de algo feito com o adolescente ou, o que seria melhor ainda, algo feito pelo próprio adolescente. 6.5.2. Eqüidade de Gêneros e Empoderamento do Sexo Feminino A relação entre homens e mulheres ainda é caracterizada pela desigualdade e opressão. Esse padrão foi historicamente construído, pertencendo, portanto, ao âmbito da cultura e dos valores sociais, e não à dimensão biológica. Segundo Scott, gênero é um elemento constitutivo das relações sociais, baseado nas diferenças percebidas entre os sexos e como uma forma primeira de significar as relações de poder, compondo identidades, papéis, crenças e valores. A História tem descrito esses processos como se estas posições normativas fossem produtos de consensos e não de um conflito na sociedade. No sistema de valores que fundamenta a cultura sexista, o masculino representa a supremacia e o poder, enquanto o feminino é associado à fraqueza e dependência. Essa injustiça repercute tanto sobre as mulheres quanto sobre os homens. As relações de gênero, especialmente no que se refere à desigualdade, constituem-se em importantes fatores determinantes das condições de saúde de uma população. Uma vez que metade da população pertence ao sexo feminino e sofre, por conseqüência, discriminações, abusos físicos, psicológicos e sexuais, o impacto numérico desse estado de coisas é enorme. De acordo com a construção sócio-cultural dos gêneros que prevalece na tradição ocidental, a reprodução seria um assunto feminino, em decorrência da natureza da mulher, e o campo da sexualidade seria essencialmente masculino, em decorrência da natureza do homem. 14 No que se refere aos adolescentes e jovens do sexo masculino, pode-se dizer que sua identidade é submetida a uma “automutilação” por terem que reprimir as partes de sua própria personalidade consideradas femininas. Além disto, “o valor cultural da honra masculina” gera a necessidade de comprovar a sua virilidade através de demonstrações de força física, valentia, enfrentamento de perigos e brigas, aumentando os riscos de sofrerem ou praticarem violência. Apesar disto, ainda são minoritários os projetos de investigação e intervenção que incluem também os homens. Apesar das mudanças de papéis sociais que possibilitaram muitos avanços com relação à igualdade de gênero, os homens, ainda hoje, são mais expostos a riscos cotidianos do que as mulheres, seja por questões de trabalho, lazer, de locomoção, etc., contribuindo para a formação de comportamentos estressantes e agressivos. 6.5.3 Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos De maneira geral, à medida que rapazes e moças crescem, os adultos vão criando expectativas diferenciadas. As diferenças culturalmente instituídas entre os sexos influenciam, com freqüência, a vida de adolescentes e jovens, nos campos da sexualidade, da saúde e da inserção social. Em diversos contextos sociais, as moças estão condicionadas a se casar e a serem donas de casa, enquanto que os rapazes são formados pra serem os provedores da família. O uso da imagem da mulher, pela mídia, como símbolo sexual, contribui para fortalecer a desigualdade entre os sexos. As desigualdades sociais e a pobreza também são fatores importantes para aprofundar as iniqüidades de gênero. Essas diferenças de expectativas e papéis sociais são incorporadas e internalizadas por crianças e adolescentes, refletindo em seus comportamentos atuais e futuros, principalmente no que diz respeito à sexualidade, às relações pessoais, com namorados e cônjuges, bem como no acesso a informações e serviços de saúde sexual e saúde reprodutiva oferecidos antes e depois do casamento. Outra importante questão são os tabus e mitos referentes às questões de educação sexual. O que deveria ser um tema natural e intrínseco ao próprio desenvolvimento e crescimento de adolescentes e jovens, freqüentemente se torna uma questão silenciada, tratada em linguagem fechada e distante ou como se fosse algo ilícito. Essas concepções refletem atitudes moralistas e preconceituosas, e contribuem para o sentimento de confusão e vergonha que, muitas vezes, cerca a questão da sexualidade, e para o panorama dos principais agravos a esta população. Um dos avanços principais em relação à sexualidade e reprodução, trazidos pela IV Conferência Internacional sobre a Mulher, realizada em Pequim em 1995, foi definir como diretriz a “prevenção das restrições de direito que favorecem a vulnerabilidade das pessoas” Assim, conforme consta do Marco Referencial em Saúde Sexual e Saúde Reprodutiva de Adolescentes e Jovens, avançou-se nessa conferência com a definição dos direitos reprodutivos e direitos sexuais como direitos humanos. Além disso, foi dada maior visibilidade aos direitos sexuais, que foram expressos em sua definição de maneira mais autônoma em relação aos direitos reprodutivos, ao mesmo tempo em que estes direitos são afirmados como condições para a conquista da igualdade de gênero. É notório, no entanto, que até hoje se avançou mais, em termos de discurso e prática, no campo dos direitos reprodutivos do que no dos direitos sexuais. 15 Nessa Conferência, os direitos sexuais e direitos reprodutivos são definidos como: “Direito de controle e decisão, de forma livre e responsável, sobre questões relacionadas sexualidade, incluindo-se a saúde sexual e reprodutiva, livre de coerção, discriminação violência. A igualdade entre mulheres e homens no que diz respeito à relação sexual reprodução, incluindo-se o respeito à integridade, requer respeito mútuo, consentimento divisão de responsabilidades pelos comportamentos sexuais e suas conseqüências.” à e e e Assim, tais direitos, por definição, não se restringem ao campo da saúde, mas se expressam e se realizam em diferentes dimensões da vida social que afetam a expressão da sexualidade e a experiência da reprodução. 6.5.4 Projeto de Vida O fortalecimento da identidade pessoal e cultural é um processo que envolve a construção do ser, o conhecer-se a si mesmo, o resgate de sua história de vida familiar e comunitária, assim como de suas raízes culturais e étnicas, o reconhecimento do outro, e a reflexão sobre seus valores pessoais. É também um processo que se dá em rede, nas interações pessoais, no diálogo e nos conflitos. Há um momento, nesse processo, em que o adolescente se descobre autor de sua própria vida; começa a olhar para a frente e perguntar-se como garantir um futuro melhor. Em outros termos, o jovem começa a pensar no que tem sido chamado de “projeto de vida”. Pode-se afirmar que o projeto de vida nasce das interações entre o fortalecimento da identidade pessoal e da auto-estima, a consciência da responsabilidade pessoal para com a conquista de melhorias, e o vislumbre de oportunidades ou perspectivas de futuro. São dois planos imbricados e interdependentes: o mundo interno do adolescente, e as interações com o contexto, incluindo as pessoas significativas que fazem parte de seu universo pessoal. É, inquestionavelmente, uma construção pessoal e única. Por outro lado, tudo o que esse adolescente pensa, sabe, sente, sonha e faz é profundamente marcado por sua malha de relações e por suas condições sociais, econômicas e culturais. 6.5.5 Cultura de Paz Na perspectiva tradicional da Saúde Pública, reconhecem-se apenas três papéis que o adolescente pode assumir em relação às violências – autor, vítima ou testemunha. As abordagens preventivas objetivam evitar ou reduzir os riscos de o jovem assumir um desses lugares. Mas elas não deixam claro que “outro” lugar o adolescente deve ocupar, pois negam a violência, mas não afirmam algo positivo, propositivo. Um quarto papel para o adolescente frente ao fenômeno das violências começa a ser reconhecido, o de agente da paz. Em outras palavras, quando o jovem tem a oportunidade de desenvolver as suas potencialidades individuais e habilidades sociais, torna-se capaz de desempenhar um papel protagônico na promoção de uma cultura de paz. Trata-se de um novo lugar social, que vai lentamente se delineando no horizonte cívico do Brasil, como emergência de inúmeras práticas sociais em curso, em programas de educação em saúde, escolas, ONG’s e grupos juvenis. Essas práticas têm acumulado considerável experiência e conhecimento – em geral, não registrado nem sistematizado – a respeito de como engajar adolescentes na construção de uma postura protagônica no exercício da cidadania e nas interações e práticas cotidianas. 16 Segundo Milani (2003), construir uma Cultura de Paz é promover as transformações necessárias e indispensáveis para que a paz seja o princípio governante de todas relações humanas e sociais. (...) Promover a Cultura de Paz significa e pressupõe trabalhar de forma integrada em prol das grandes mudanças ansiadas pela maioria da humanidade – justiça social, igualdade entre os sexos, eliminação do racismo, tolerância religiosa, respeito às minorias, educação universal, equilíbrio ecológico e liberdade política. A Cultura de Paz é o elo que interliga e abrange todos esses ideais num único processo de transformação pessoal e social. Há dois níveis de atuação na construção de uma Cultura de Paz – o micro e o macro. Em ambos, o setor Saúde tem um papel fundamental a cumprir. O primeiro diz respeito ao indivíduo, seus valores e atitudes, relações familiares, comunitárias, profissionais e sociais. Quando se considera o nível micro, constata-se que qualquer pessoa, independente de idade, escolaridade ou condições econômicas pode fazer algo, por menor e simples que seja, como sua parcela de contribuição. Esses esforços precisam ser complementados e amplificados através da atuação no nível macro, que implica em repensar os processos sociais, definir estratégias de mudança coletiva, criar políticas públicas, estruturas institucionais e programas educativos e sociais condizentes com os valores da paz. Este nível caracteriza-se por uma maior complexidade e demanda a articulação e a integração de esforços dos mais diversos atores sociais. Os níveis micro e macro são complementares, interdependentes e precisam ser trabalhados simultaneamente. A Saúde pode atuar no nível micro através de ações educativas, da detecção precoce dos casos de violência (especialmente contra crianças, adolescentes e mulheres), do atendimento às vítimas e aos autores de violência, da formação de adolescentes e jovens como promotores de saúde e agentes de paz. O trabalho no nível macro pode ser impulsionado sempre que a Saúde busca a articulação intersetorial e intragovernamental, visando a implementação de estratégias e ações que garantam a participação juvenil e popular nas instâncias decisórias, a melhoria da qualidade de vida da população, a criação de oportunidades e de espaços públicos visando à convivência, lazer, esportes, artes e cultura, o fortalecimento do senso de pertencimento e dos vínculos comunitários, a disseminação de valores como o respeito às diferenças, o diálogo, a solidariedade, a inclusão e a tolerância religiosa. 6.5.6 Ética e Cidadania O Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 3º estabelece que se deve assegurar “todas as oportunidades e facilidades”, no intuito de “facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social” de crianças e adolescentes. Por sua vez, a Lei 8080, que rege o Sistema Único de Saúde, afirma como um de seus princípios fundamentais a “preservação da autonomia das pessoas na defesa de sua integridade física e moral”. Compreender o desenvolvimento e o bem-estar humanos, em suas multidimensionalidades constitui-se em um desafio ainda por vencer. Tradicionalmente, o Setor Saúde tem reconhecido e trabalhado as dimensões: física, mental, emocional e social. Há, no entanto, um conjunto de necessidades humanas que não diz respeito ao corpo, à mente ou às emoções. São necessidades de sua dimensão espiritual como, por exemplo: transcendência; tomar decisões baseadas em princípios 17 éticos e morais, ser responsável por suas escolhas morais; altruísmo; identificar um propósito para sua vida (BEUST,2000). A busca de sentido e de significado é uma característica distintiva da espécie humana. Quando o viver humano é reduzido às urgências da sobrevivência, às rotinas cotidianas ou aos desejos imediatistas, gera-se o vazio existencial. Diversos pensadores consideram que a raiz da crise que a humanidade atravessa, contemporaneamente, é a ausência de sentido e significado. Muitas pessoas encontram respostas para esta questão na transcendência. Há uma crescente busca por formas nãoinstitucionalizadas de se vivenciar a transcendência, tais como a meditação, as religiões, o contato com a natureza, a contemplação artística, a reflexão filosófica, os ritos e danças dos povos tradicionais. Esta multiplicidade de caminhos pelos quais se busca a paz interior e uma conexão mais profunda com a vida é também um indicador da importância da transcendência para o bemestar humano. Abordar a transcendência humana na promoção da saúde significa criar oportunidades para que os adolescentes e jovens possam discutir, reconhecer, refletir, vivenciar e praticar princípios éticos, em bases universais, plurais, transreligiosas e transculturais, sem qualquer fundamentalismo, dogmatismo ou proselitismo. Segundo Paulo Freire, a ética pressupõe coerência, profundidade na compreensão e interpretação dos fatos, disponibilidade de revisão, possibilidade de mudar de opção e o direito de faze-lo. Adolescentes e jovens podem assumir comportamentos éticos orientados por uma religião. Do mesmo modo, podem optar por orientar-se por uma ética puramente humana. Todas as opções devem ser respeitadas pelos serviços de saúde. Ao mesmo tempo, uma das tarefas do profissional de saúde é estimular o desenvolvimento da curiosidade crítica, pois, como diz Paulo Freire, “a curiosidade como inquietação indagadora, como inclinação ao desvelamento de algo, como pergunta verbalizada ou não, como procura de esclarecimento, como sinal de atenção que sugere alerta faz parte integrante do fenômeno vital” (1996,p.32). A educação em saúde, voltada para adolescentes e jovens, deve favorecer a autonomia, a liberdade e a dignidade humanas, estimulando a reflexão e o posicionamento frente à relações sociais que dificultam ou facilitam assumir comportamentos saudáveis. Deste modo, se compreenderá que, ao conduzirmos nossas vidas por princípios éticos, nos tornamos seres humanos mais livres, autônomos e dignos, e estes são requisitos de uma pessoa saudável. 6.5.7 Igualdade Racial e Étnica Os dados censitários brasileiros mostram que 44% (IBGE,2002) da população constitui-se de afrodescententes que ainda hoje sofrem as conseqüências perversas dos efeitos e da persistência das práticas e das estruturas advindas da época colonial, principalmente da escravidão, na continuidade das desigualdades sociais e econômicas reveladas pela distribuição desigual de riqueza, pela marginalização e pela exclusão social. Ao lado dos arfrodescendentes encontram-se os povos indígenas que também são vítimas do passado colonialista de nosso país e ainda lutam pelo reconhecimento de seus direitos. Tal situação de desigualdade social e marginalização associada à raça e etnia repercute, hoje, na adolescência e na juventude que enfrenta dificuldades das mais diversas ordens, principalmente no que se refere à saúde. Assim, o principal grupo de risco para mortalidade por homicídio na população brasileira é composto por adolescentes e jovens do sexo masculino, afrodescendentes, que residem em bairros pobres ou nas periferias das metrópoles, com baixa escolaridade e pouca 18 qualificação profissional (MINAYO E SOUZA, 1999, p.14). Freqüentemente, no entanto, “os violentados passam a ser encarados como os violentos”, devido aos preconceitos e à discriminação presentes em nossa sociedade (NETO E MOREIRA, 1999). Os preconceitos e o racismo acrescem, portanto, a exclusão moral à econômica na vida desses adolescentes. Por outro lado, além das causas obstétricas diretas, o aborto inseguro está diretamente relacionado aos índices de mortalidade materna entre adolescentes e jovens, atingindo, sobretudo, as jovens pobres que sofrem mais dramaticamente as conseqüências das deficiências na assistência obstétrica e do impacto das condições de vida no estado de saúde. Em 1997, as complicações provocadas pelo abortamento inseguro foram responsáveis por 16% das mortes maternas de mulheres de 15 a 24 anos (CNPD, 1997). Como parte de um movimento apoiado mundialmente, a Conferência Mundial contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, de 2001, realizada em Durban na África, incorporou as recomendações da Conferência Mundial de Direitos Humanos, de 1993, que ressaltaram a necessidade premente da eliminação de todas as formas de racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância correlata, e reafirmou “os princípios de igualdade e nãodiscriminação e incentivando o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais para todos, sem distinção de qualquer tipo, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou qualquer outro tipo de opinião, origem social e nacional, propriedade, nascimento ou outro status”. No Brasil, criou a Secretaria de Igualdade Racial que, aliada a diversos e importantes movimentos da sociedade civil organizada, tem contribuído, de acordo com as determinações da Conferência Mundial de Durban para assegurar o pleno gozo de todos os direitos humanos, econômicos, sociais, culturais, civis e políticos, os quais são universais, indivisíveis, interdependentes e interrelacionados, e para melhorar as condições de vida de homens, mulheres e crianças de todas as nações (2001). Dentro deste quadro, o Ministério da Saúde apresentou um plano inédito para que o SUS preste atendimento adequado à população negra, tendo em vistas a s doenças que são decorrentes desta raça. Ao mesmo tempo, com ações de saneamento ambiental e atenção básica à saúde indígena, por meio da Fundação Nacional de Saúde – FUNASA - leva qualidade de vida às populações indígenas... (2005). Em 2004 o Conselho Nacional dos Direitos de Crianças e Adolescentes –CONANDA- procurando garantir, também, a proteção integral de crianças e adolescentes indígenas, realizou um debate para estabelecer o adequado entendimento jurídico sobre a aplicação do ECA junto às comunidades indígenas, sem perder de vista os componentes antropológicos inerentes à questão . Esta Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes e Jovens reafirma nas suas diretrizes o respeito pela diversidade Complementar e reconhece que a participação igualitária de todos indivíduos e povos na formação de sociedades justas, eqüitativas, democráticas e inclusivas pode contribuir para um mundo livre do racismo, da discriminação racial, da xenofobia e de intolerância correlata (2001). 7. UM NOVO OLHAR PARA A ATENÇÃO INTEGRAL À SAÚDE DE ADOLESCENTES E JOVENS O direito constitucional à saúde, a asserção de “prioridade absoluta” pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, e os avanços preconizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e a legislação de saúde ainda não alcançaram de forma efetiva essa parcela populacional. 19 Esse descompasso entre as garantias legais à saúde e a realidade cotidiana de adolescentes e de jovens, se deve a múltiplos fatores, dentre os quais destacam-se: a tradicional ênfase em programas de saúde direcionados à mulher e à criança; o mito de que as pessoas jovens não adoecem; o baixo percentual de profissionais da Atenção Básica capacitados para o atendimento; a noção de que apenas os “especialistas” e os centros de referência seriam suficientemente qualificados para atender às suas demandas; a falta de integração entre os serviços de saúde e as demais instituições públicas e não-governamentais que atendem à população jovem. Existe, além disso, a necessidade de incluir, de forma mais abrangente e efetiva, a saúde de adolescentes e jovens nos instrumentos de planejamento e gestão do SUS, como forma de concretizar as ações propostas para esta parcela da população. A combinação dos referidos fatores, ao longo de décadas, resultou na ausência de uma demanda espontânea “explícita” de ações e serviços, por parte de adolescentes e jovens. Resultou também na “invisibilidade” das pessoas jovens no SUS. Isto é, quando elas procuram os serviços de saúde, não são reconhecidas em sua especificidade etária. Via de regra, adolescentes e jovens passam por pronto-socorros, grupos de planejamento familiar e pré-natal, ambulatórios, consultórios odontológicos ou salas de imunização, sem que recebam uma atenção integral, que leve em consideração as suas necessidades como pessoas em desenvolvimento. Ressalta-se o fato de que os adolescentes e jovens masculinos não tem sido atendidos em suas necessidades de saúde relacionadas à sexualidade e à reprodução. Com efeito, os serviços de saúde encontram dificuldades em atender a este público, o que é constatado em estudos, pesquisas e ações envolvendo profissionais de saúde. Os adolescentes também não são reconhecidos como partícipes da vida sexual e da vida reprodutiva e em seu direito, por exemplo, a assumir a paternidade. O desafio para os gestores e profissionais de saúde é qualificar os serviços para que ofereçam uma atenção resolutiva e de qualidade às pessoas jovens das zonas rurais e urbanas de todas as raças, etnias, condição social, gênero e orientação sexual, respeitando as suas características biopsicossociais, seus problemas e necessidades de saúde e para que se adeqüem ao modelo de atenção à saúde proposto nesse documento. 7.1 A adoção de um olhar diferenciado para com a população jovem Implica em fazer o melhor acolhimento possível, ter sensibilidade para com as demandas e necessidades do/da adolescente em acordo com as diversidades de raça e etnia, . Desse modo se pode estabelecer um vínculo de confiança e respeito, fundamental para a continuidade do acompanhamento e êxito do tratamento. Por outro lado, as pessoas jovens buscam as unidades de saúde por diversos motivos – solicitar preservativos, fazer curativo, vacinar-se, consulta odontológica. Independentemente da demanda inicial, o profissional deve enxergar a pessoa jovem na integralidade de seu ser e de sua vida, buscando identificar outras necessidades de seu bem-estar, e envidar esforços para engajá-la em outras ações e serviços de saúde – grupos educativos, atendimento clínico, planejamento familiar etc. 7.2 Atenção Básica como estratégia prioritária de atenção à saúde de adolescentes e jovens Dentro dos princípios gerais descritos na da Política Nacional de Atenção Básica, a Atenção Básica caracteriza-se por um conjunto de ações de saúde, no âmbito individual e coletivo, que abrangem a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação e a manutenção da saúde. É desenvolvida por meio do exercício de práticas gerenciais e sanitárias 20 democráticas e participativas, dirigidas a populações de territórios bem delimitados, pelas quais assume a responsabilidade sanitária. Essa Política estabelece, como parte do seu financiamento, o Piso da Atenção Básica em seus componentes fixo e variável, componente federal para o financiamento da Atenção Básica que tem como base de cálculo o conjunto da população residente no município/Distrito Federal, no qual estão incluídos adolescentes e os jovens. Utiliza tecnologias de elevada complexidade e baixa densidade, que devem resolver os problemas de saúde de maior freqüência e relevância em seu território. É o contato preferencial dos usuários com os sistemas de saúde, estabelecendo-se como porta de entrada de um sistema hierarquizado e regionalizado de saúde, com uma população delimitada sob a sua responsabilidade, intervindo sobre os fatores de risco aos quais a comunidade está exposta; prestando assistência integral, permanente e realizando atividades de educação e promoção da saúde. Tendo em vista os princípios acima expostos, ao invés de preconizar a criação de “centros de referência” especializados na assistência a adolescentes e jovens que ferem o princípio de universalidade do SUS, a Política enfatiza o fortalecimento da Atenção Básica, pois é nesse nível de atenção que a maioria dos agravos à saúde de adolescentes e jovens pode ser resolvida. Nele podese trabalhar de forma universalizada e efetiva a promoção da saúde, a prevenção de agravos e a intersetorialidade, com a equipe de saúde qualificada para esta atenção. Dentre as características do processo de trabalho da Saúde da Família destaca-se a prática do cuidado familiar ampliado, efetivada por meio do conhecimento da estrutura e da funcionalidade das famílias que visa propor intervenções que influenciem os processos de saúde doença dos indivíduos, das famílias e da própria comunidade, incluídos neste contexto adolescentes e jovens da área adstrita. A Atenção Básica deve, em especial, realizar o acompanhamento do crescimento e desenvolvimento (C&D), garantir a atenção à saúde sexual e saúde reprodutiva de ambos os sexos, incluindo o acesso a métodos contraceptivos, articular ações de redução da morbimortalidade por causas externas, e desenvolver ações educativas com grupos. É nesse espaço de atenção, também, que se pode construir uma rede de proteção social que garanta os direitos dessa população. Parcerias com setores como a educação, a cultura, a garantia de direitos, o esporte, o lazer e as artes, a preparação para o mundo do trabalho, devem ser priorizadas, de acordo com a realidade local. As parcerias intersetoriais e as atividades extra-muros são de fundamental importância, mas não devem ser motivo de desatenção para com as competências específicas e exclusivas do setor saúde, tal como a assistência à saúde. À medida que a Atenção Básica se torna mais qualificada e resolutiva, impactos significativos são produzidos também sobre os demais níveis de atenção, desobstruindo hospitais e serviços de emergência e urgência, e permitindo que as demandas mais importantes para a média complexidade sejam atendidas. Tendo em vista que no conceito de rede de atenção, que se busca construir com o pacto pela saúde, a atenção básica é o centro organizador da rede. Desta forma, as necessidades de atenção nos demais espaços devem obrigatoriamente estar subordinadas e articuladas à qualificação da atenção básica. 21 7.3 Promoção da saúde de adolescentes e jovens Nessa faixa etária, embora o atendimento individual seja importante e necessário, as atividades grupais de Educação em Saúde têm primazia. As razões para essa ênfase no atendimento grupal podem ser sintetizadas em: o grupo é um espaço privilegiado para a promoção da saúde e prevenção de agravos; essa estratégia se adeqüa melhor às necessidades dessa faixa etária, tais como fazer parte de um grupo, ser ouvido e respeitado e o impacto numérico que se pode alcançar é bem maior. A promoção da saúde de adolescentes e jovens precisa incorporar ações no serviço de saúde e intersetoriais no combate às desigualdades e iniqüidades relacionadas à raça, etnia, gênero e orientação sexual, e a outras formas de exclusão e discriminação. Embora estas sejam questões do âmbito social e cultural, o seu impacto sobre o bem-estar psicológico e emocional – e, inclusive, sobre a dimensão física da saúde – pode ser devastador. Iniciativas locais que fomentam a participação juvenil, a convivência comunitária, a inserção social, as atividades culturais e esportivas devem ser apoiadas e valorizadas. Os serviços de saúde devem estabelecer mecanismos de referência e contra-referência com essas iniciativas, quer sejam governamentais ou não. As escolas, por excelência, concentram grandes números de adolescentes e jovens, mas a Saúde não deve limitar-se apenas a esta parceria. Grupos jovens, associações de bairro, equipes desportivas, projetos sócio-educativos e movimentos sociais ou artísticos podem constituir-se em excelentes parceiros das equipes de saúde que atuam no mesmo território. A equipe de saúde pode capacitar adolescentes e jovens integrantes desses grupos, assim como estudantes com características de liderança, como promotores de saúde junto a seus pares. O exercício da cidadania, por parte da população jovem, bem como a sua participação nas questões que afetam o seu bem-estar, são alcançados mais efetivamente através de estratégias capazes de contextualizar a sua atuação na comunidade e de envolver seus familiares e pares. A participação juvenil também deve ser efetivada no planejamento, execução e avaliação das ações de saúde, assim como nas instâncias de controle social do SUS. 7.4 Demanda organizada Para se definir as prioridades locais e para desencadear uma demanda organizada, em consonância com a estratégia da territorialidade, as unidades e equipes de saúde podem iniciar ou impulsionar as ações propostas realizando uma análise situacional da saúde de adolescentes e jovens – suas condições de vida, perfil epidemiológico, necessidades, anseios, acesso a bens e serviços, espaços de convivência, formas de participação, etc. Estratégias, como a busca ativa, precisam ser utilizadas em especial para a captação precoce de adolescentes grávidas. A demanda espontânea deve ser atendida, mas é importante trabalhar-se também com a demanda organizada. Além disso, para que as necessidades de saúde que levam os adolescentes e jovens, de ambos os sexos, de todas as raças e etnias, condição social e orientação sexual, aos serviços de saúde sejam sanadas sem que haja agravamento do quadro e seqüelas futuras é necessário que o sistema de saúde se responsabilize no atendimento integral, , respeitando as diferentes formas de auto-cuidado e de cura, nos diferentes níveis de complexidade exigidos para cada caso. 22 8. DIRETRIZES PARA A OPERACIONALIZAÇÃO DA POLÍTICA DE ATENÇÃO INTEGRAL À SAÚDE DE ADOLESCENTES E DE JOVENS A lógica que perpassa esta Política é a da inserção de adolescentes e jovens nas ações e rotinas dos serviços de saúde, ao invés de se constituir em um programa vertical, garantidas pelo sistema de financiamento pactuado no Pacto pela Saúde e no Pacto de Gestão. O objetivo é garantir que a população jovem e, em especial, os seus segmentos mais vulneráveis e/ou em situação de risco, tenham acesso aos serviços de saúde. O modelo de atenção preconizado fundamenta-se na territorialidade, na intersetorialidade, na articulação de parcerias e na participação juvenil. Está fortemente ancorado na promoção da saúde, nas práticas preventivas de educação em saúde, no melhor aproveitamento dos recursos - humanos, culturais, físicos e financeiros - existentes, e na reorientação dos serviços de saúde, de modo a oferecer um olhar diferenciado que considere a singularidade de adolescentes e jovens. As famílias serão envolvidas nesse processo como ação fundamental na atenção integral a essa população. A Educação Permanente em Saúde apresenta-se como uma proposta estratégica para a operacionalização desta Política. Ela contribui para os processos formativos, para a reorientação dos serviços articulando as diferentes esferas de gestão e instituições formadoras. Destaca-se a importância da educação permanente para a mudança de modelo de atenção em saúde, a partir da base territorial, necessário ao atendimento das especificidades da atenção integral à saúde de adolescentes e jovens. O financiamento das ações de saúde para esse segmento populacional está inserido na Portaria GM nº 204 de 29 de janeiro de 2007. Objetivos Específicos: Implementar e articular ações, programas e projetos, em consonância com a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes e Jovens, de forma integrada, e pactuada nas esferas de gestão federal, estadual e municipal, em acordo com os princípios do SUS, contribuindo para o desenvolvimento saudável, a melhoria das condições de vida e a redução da morbimortalidade nesse grupo etário. Garantir no SUS, com estados, municípios e DF, a assistência de qualidade para a adolescência e juventude, atendendo às suas necessidades de saúde, especificidades de desenvolvimento, inserção sócio-cultural, bem como àquelas relativas à raça, etnia, gênero e orientação sexual. Contribuir para a implementação, acompanhamento e avaliação de ações e serviços para a saúde de adolescentes e de jovens, pactuados entre as três esferas de gestão do SUS. Estratégias: 1. Articulação, nas três esferas de gestão do SUS, para a integração intrainstitucional e intersetorial das ações de implementação dessa Política, em âmbito nacional. 2. Articulação intrainstitucional e intersetorial para o fortalecimento e a qualificação das ações de produção da saúde para adolescentes e jovens, de ambos os sexos. 3. Reorientação dos serviços e qualificação de equipes e profissionais da Atenção Básica, junto com os estados, municípios e DF, para oferecer as práticas integrais que atendam às necessidades específicas e singulares da população de adolescentes e jovens. 4. Fomento, em conjunto com os estados, municípios e DF, da participação juvenil e do controle social nas ações para a implementação da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes e Jovens. 23 8.1 Promoção da Saúde A integralidade da atenção, como uma das diretrizes do SUS, pressupõe a organização de serviços e a execução de práticas de saúde que integrem um conjunto de estratégias para a prevenção de agravos e promoção da saúde e para as ações curativas e de reabilitação, perpassando todo o processo de produção da saúde, quer seja individual ou coletivo. Assim, evidencia-se a importância da promoção à saúde na produção de saúde de adolescentes e de jovens, enfatizando a necessidade de estabelecer processos de intervenção intersetoriais e interdisciplinares, a ampliação e diversificação das práticas sanitárias, as mudanças na gestão e no trabalho das equipes de saúde para a construção complementar e de intercâmbio entre esses dois campos da atenção à saúde. Nessa Política é fundamental que o desenvolvimento de ações de promoção à saúde se articulem, no processo de produção da saúde, às de prevenção e às ações curativas e de reabilitação, integradas à Política Nacional de Promoção à Saúde, em consonância com a Política de Saúde Mental do Ministério da Saúde e a Lei 11.343 de 23 de agosto de 2006 que institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas. No entanto, para melhor visualização da operacionalização a promoção de saúde foi colocada em bloco destacado. Nos blocos, a seguir relacionados, estão inseridas as ações de prevenção aos agravos à saúde e as ações de promoção à saúde, para adolescentes e jovens. O bloco de financiamento de Vigilância em Saúde, no seu Art.20 inclui o incentivo à Atividade de Promoção à Saúde; o bloco V - Gestão do SUS - em seu Art.30 apóia a ação de Educação em Saúde e o Incentivo à Participação e Controle Social. No seu Art. 31 inclui os incentivos: I – implantação de CAPS, o II – qualificação de CAPS, o IV - fomento para ações de redução de danos em CAPS AD e o V - inclusão social, pelo trabalho, para pessoas portadoras de transtornos mentais e outros transtornos decorrentes do uso de álcool e outras drogas. Objetivos Específicos: Promover, com estados, municípios e DF, a saúde de adolescentes e jovens de ambos os sexos, das zonas urbana e rural, contemplando as especificidades: étnicas, raciais, de gênero, de orientação sexual, sócio-culturais e as regionais, visando o desenvolvimento saudável, a proteção e a defesa das condições de vida para melhoria da qualidade de vida, em acordo com a Política Nacional de Promoção à Saúde. Adotar, com estados, municípios e DF, estratégias diferenciadas de atenção e reinserção social dos adolescentes e dos jovens usuários ou dependentes de álcool ou de outras drogas e respectivos familiares, que considerem as peculiaridades sócio-culturais deste segmento populacional. Estratégias: 1. Articulações intra, interinstitucional e intersetorial que contribuam para a promoção da saúde e a prevenção de agravos à saúde de adolescentes e de jovens, com atenção diferenciada para os grupos de maior vulnerabilidade e populações de adolescentes e de jovens em situação especial de agravos. 2. Fomento às ações intrainstitucionais e intersetoriais para a articulação, no território, da Atenção Básica e as escolas para ações de promoção da saúde e a prevenção de agravos à saúde integral de adolescentes, de ambos os sexos, contemplando as especificidades: étnicas, raciais, de gênero, de orientação sexual, sócio-culturais e as regionais. 3. Articulação intrainstitucional, interinstitucional e intersetorial para a criação de ambientes favoráveis à inserção social de adolescentes e jovens, com vistas ao acesso a bens sociais e serviços que contribuam para o seu desenvolvimento saudável e empregabilidade, integrada à Política Nacional de Promoção à Saúde. 24 4. Desenvolvimento, com estados, municípios e DF, de ações para a mobilização social em torno das necessidades de saúde integral de adolescentes e de seu potencial de desenvolvimento. 5. Apoio à organização de movimentos locais de adolescentes e jovens, incluindo os indígenas, quilombolas, ciganos e outros povos tradicionais, que promovam a valorização e o fortalecimento da identidade juvenil e sua participação nas políticas que lhe são afetas, integrado à Política Nacional de Promoção à Saúde. 8.2 Crescimento e Desenvolvimento Saudáveis O crescimento e o desenvolvimento (C&D) são processos geneticamente programados, porém fortemente influenciados por fatores ambientais, bem como individuais, a exemplo de nutrição, condições de vida e higiene, estimulação, proteção contra agravos, uso de drogas e medicamentos, atividade física, sono, estresse, incapacidades funcionais e doenças crônicas. Esses fatores podem modificar, interromper ou reverter os fenômenos que caracterizam a puberdade. As interações herança-meio têm início na fecundação, e a adolescência pode ser considerada a última portunidade para se garantir a plena expressão dos potenciais de crescimento e desenvolvimento de cada indivíduo. Para promover o crescimento e o desenvolvimento saudáveis é fundamental que adolescentes de ambos os sexos sejam acompanhados sistematicamente nas unidades básicas de saúde, sendo referidos a outros níveis de complexidade do SUS, quando necessário, podendo-se utilizar a caderneta de saúde de adolescentes, de ambos os sexos, nesta ação, como instrumento de cidadania para essa população. As ações intersetoriais complementam a integralidade da atenção no SUS e devem fazer parte do modelo de atenção na produção da saúde para esses cidadãos. As ações para acompanhamento do crescimento e desenvolvimento estão inseridas no bloco de financiamento da Atenção Básica no Art.10 e no Art.11 - estratégia VII; na Assistência Farmacêutica no Art.24. As ações de vacinação estão inseridas no bloco de Vigilância em Saúde, Art.20 – incentivo VI. Objetivos Específicos: Fortalecer, com estados, municípios e DF, as ações de prevenção de agravos, promoção da saúde e de assistência à saúde integral de adolescentes e jovens, contemplando as heterogeneidades: regional, étnica e racial, sócio-cultural, familiar, de gênero e de orientação sexual. Reordenar e qualificar, com estados, municípios e DF, o atendimento na rede do SUS, a adolescentes e jovens que vivem em situação de vulnerabilidade: na rua, em acampamentos rurais, em abrigos, àqueles que são deficientes, aos que têm transtornos mentais e aos adolescentes em conflito com a lei que estão em medidas socioeducativas de internação e de internação provisória. Promover, com estados, municípios e DF, a participação juvenil autônoma e cidadã, no planejamento e na avaliação das ações de promoção, prevenção e de assistência à saúde para a população adolescente e jovem. Estratégias: 1. Implementação, com os estados, municípios e DF, das ações de acompanhamento do crescimento e desenvolvimento de adolescentes, guardadas as diversidades étnicas e raciais, sócio-culturais, de gênero e de orientação sexual, nas Unidades Básicas de Saúde/Estratégia de Saúde da Família. 3. Fomentar, em conjunto com os estados, municípios e DF, a elaboração e a execução de estudos epidemiológicos regionalizados sobre a morbidade de adolescentes e jovens para orientar os 25 serviços de saúde sobre os procedimentos mais prementes para a atenção integral ao crescimento e desenvolvimento saudáveis. 3. Fortalecer as ações de prevenção de prevenção e assistência a agravos relacionados ao uso de álcool, tabaco e outras drogas, em consonância com as políticas do Ministério da Saúde para: Atenção Integral a Usuários de Álcool e outras Drogas; de Promoção à Saúde e com o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas, para adolescentes e jovens. 4. Estimular, em conjunto com os estados, municípios e DF, a organização, nos serviços de saúde e em ações intersetoriais, de práticas educativas em saúde para grupos de adolescentes, abordando aos temas estruturantes da atenção integral apontados nessa política, integrada à Política Nacional de Promoção à Saúde. 8.3 Saúde Sexual e Saúde Reprodutiva Adolescentes e jovens do sexo feminino são atendidas nos serviços de planejamento familiar, prénatal, parto e puerpério existentes, sem que haja, comumente, um processo diferenciado de acolhimento, apoio psicossocial e educação em saúde, centrado em suas características e necessidades. Além disso, são minoritários os serviços de saúde que desenvolvem ações direcionadas a adolescentes e jovens do sexo masculino, em sua condição de co-responsáveis pelos eventos reprodutivos, assim como as pesquisas que ajudam a traçar o seu perfil. Os adolescentes são reconhecidos como sujeitos de direitos sexuais e direitos reprodutivos, afirmados como direitos humanos e condições para o alcance da igualdade de gênero. A consciência desse direito implica em reconhecer a sua individualidade e a sua autonomia, estimulando-os a assumir a responsabilidade com sua própria saúde. Para tanto, as informações e ações educativas em saúde sexual e saúde reprodutiva, os métodos contraceptivos e preservativos, serviços de contracepção e planejamento familiar devem ser disponibilizados, com acesso facilitado aos adolescentes. Garantir os direitos reprodutivos a adolescentes e jovens, de ambos os sexos, no contexto dessa Política, significa assegurar, em todos os casos, as condições de escolha para aqueles não querem engravidar ou querem planejar uma gravidez, como também a assistência ao pré-natal, ao parto e ao puerpério, que deve ser assegurada de modo irrestrito, de maneira que a gravidez possa ser desejada, planejada e vivenciada de maneira saudável. Cabe aos serviços de saúde a prestação de uma assistência adequada e o desenvolvimento de um trabalho educativo que aborde a saúde sexual e saúde reprodutiva com informações científicas claras, introduzindo as abordagens de gênero, étnico/racial, e de livre orientação sexual, levando em consideração, também, as diferenças de inserção sócio-cultural, a forma de organização de povos específicos, entre eles os índios, ciganos, quilombolas e outras populações tradicionais, considerando, ainda, as necessidades específicas de adolescentes e jovens com deficiência e com transtornos psíquicos, garantindo, desse modo, maior assimilação e resolutividade. Além disso, esta abordagem deve respeitar a autonomia dos adolescentes e jovens, dentro dos princípios da confidencialidade e da privacidade, indispensáveis para estabelecer uma relação de confiança e respeito entre profissionais e clientela. Da mesma forma, o atendimento ginecológico realizado no âmbito da Atenção Básica, representa uma importante estratégia que deve ser ampliada. O atendimento realizado por profissional qualificado - médico ou enfermeiro - constitui-se em espaço privilegiado para ações de promoção, prevenção, diagnóstico e de tratamento da saúde sexual e saúde reprodutiva, sendo necessária uma abordagem que respeite as necessidades específicas dessa faixa etária. Os serviços de saúde devem, ainda, buscar a integração das ações com outros setores para que a resposta social contribua para a promoção da saúde e a prevenção de agravos. Dentre as parcerias 26 destacamos a importância daquela estabelecida entre os setores de saúde e educação, que tem por objetivo promover saúde no âmbito escolar. As ações de promoção, prevenção, diagnóstico e de tratamento da saúde sexual e saúde reprodutiva, estão inseridas no bloco da Atenção Básica em seu Art.10 e no Art.11. No bloco de financiamento de Assistência Farmacêutica nos artigos 24, 25 e 26. Na Vigilância à Saúde - Art. 20 e 21. No bloco de financiamento Atenção de Média e Alta Complexidade Ambulatorial e Hospitalar Art.13 em seus componentes I e II. Objetivos Específicos: Assegurar, em conjunto com os estados municípios e DF, os direitos sexuais e direitos reprodutivos por meio da atenção integral à saúde sexual e saúde reprodutiva de adolescentes e jovens de ambos os sexos, de acordo com as especificidades e vulnerabilidade por faixa etária e diferentes grupos populacionais. Fortalecer as ações de assistência, de prevenção de agravos e de promoção à saúde sexual e saúde reprodutiva de adolescentes e jovens de ambos os sexos, em todos os níveis de complexidade do SUS em conjunto com os estados, municípios e DF. Fomentar a articulação, em conjunto com os estados, municípios e DF, entre os setores Saúde e Educação para o fortalecimento da política de prevenção aos agravos à saúde e de promoção de saúde, notadamente no âmbito da saúde sexual e da saúde reprodutiva. Contribuir, em conjunto com os estados, municípios e DF, para a promoção da saúde sexual e da saúde reprodutiva, no contexto sócio-cultural e comunitário de adolescentes e de jovens, entre eles os indígenas, os quilombolas, os ciganos, e outras populações tradicionais, buscando a proteção e defesa de suas condições de vida, integrada à Política Nacional de Promoção à Saúde. Fortalecer ações de assistência e de prevenção da infecção pelas DST e pelo HIV, com os estados, municípios e DF, nas zonas urbana e rural, para adolescentes e jovens e entre eles os indígenas, os quilombolas, os ciganos, e outras populações tradicionais, respeitando a forma de organização de cada povo. Contribuir, em conjunto com os estados, municípios e DF, para a redução da morbidade associada à gravidez na adolescência, com atenção especial à faixa etária de 10 a 15 anos de idade. Estratégias: 1. Estimular, com os estados, municípios, e DF, ações intersetoriais de prevenção aos agravos e de promoção à saúde sexual e à saúde reprodutiva de adolescentes e jovens de ambos os sexos, na Atenção Básica, integradas à Política Nacional de Promoção à Saúde. 2. Articulação intrainstitucional para a realização de ações de contracepção e de planejamento familiar, para adolescentes e jovens, de acordo com as especificidades da faixa etária, étnico e raciais, sócio-culturais e de orientação sexual. 3. Articulação, com estados municípios e DF, de ações intersetoriais entre as unidades básicas de saúde e as escolas, para prevenção de agravos e para a promoção à saúde sexual e à saúde reprodutiva de adolescentes e de jovens, que atendam às suas necessidades de saúde e às suas especificidades de orientação sexual; 27 4. Fomentar intrainstitucionalmente a qualificação e ampliação das ações de assistência à saúde sexual e saúde reprodutiva de adolescentes e jovens de ambos os sexos, em todos os níveis de complexidade do SUS. 5. Articulação intrainstitucional para reorientação e qualificação dos serviços de saúde para atenção integral a adolescentes e jovens, de ambos os sexos, vítimas e autores de violência e a seus familiares. 6. Estimular, com os estados, municípios e DF, o fortalecimento da assistência qualificada a todos os adolescentes e jovens soropositivos e àqueles que procuram os serviços para aconselhamento e testagem, respeitando as especificidades da infecção, do grupo etário, assim como as formas de organização dos povos específicos, entre eles os índios, negros, ciganos e outras populações tradicionais. 8.4 Redução da morbimortalidade por causas externas Em muitos países, particularmente nas Américas, as violências alcançaram tamanha disseminação, magnitude e freqüência que passaram a ser reconhecidas como um problema de Saúde Pública. Suas conseqüências não se limitam às crescentes taxas de mortalidade, mas englobam seqüelas biopsicossociais e morais no nível pessoal, familiar e coletivo, além de impactos econômicos e de sobrecarga do sistema de saúde. Uma análise dos estudos inovadores sobre a violência relacionados à adolescência e juventude nas Américas (YUNES, 1994) concluiu que a abordagem da Saúde Pública para a prevenção da violência enfatiza a combinação de múltiplas estratégias em populações inteiras e que os maiores resultados podem ser esperados quando diversas causas são trabalhadas simultaneamente. Segundo o referido estudo, a redução da violência juvenil pode ser alcançada – a longo prazo – através da educação e da comunicação dirigidas à mudança de atitudes e ao desenvolvimento de habilidades, e a promover mudanças nas políticas sociais e nos ambientes. A sociedade brasileira contemporânea lida com seus adolescentes e jovens de formas bastante ambíguas. Embora eles sejam “os principais destinatários do discurso moral do autocontrole”, permite-se que permaneçam expostos à “ausência de diversificação de redes sociais que os comprometa dentro da sociedade”. Segundo este autor, a tensão experimentada pelos jovens, entre os dois referidos extremos, pode ser um dos motivos do recurso à violência. Conforme a Política Nacional de Redução da Morbimortalidade por Acidentes e Violências do Ministério da Saúde, as ações a serem desenvolvidas são aquelas inerentes à promoção da saúde e voltadas a evitar a ocorrência de violências e acidentes, incluindo as ações destinadas ao tratamento das vítimas, nestas compreendidas as ações destinadas a impedir as seqüelas e as mortes resultantes desses eventos. O financiamento dessas ações está previsto no bloco - Vigilância em Saúde, Art.20 no incentivo III; no bloco de financiamento Atenção de Média e Alta Complexidade Ambulatorial e Hospitalar Art.13 em seus componentes I e II. No bloco da Vigilância em Saúde em seus artigos: 19, 20, 21 e 22. No bloco da Assistência Farmacêutica nos artigos: 24 e 26 . Objetivos Específicos: Promover ações intersetoriais para a promoção de ações educativas contra desigualdades, sociais, raciais, étnicas e de acesso a bens e a serviços públicos, que vulnerabilizam adolescentes e jovens frente à violência, integradas à Política Nacional de Promoção à Saúde. 28 Fortalecer intersetorialmente as ações de prevenção e assistência a agravos relacionados ao uso de álcool e de outras drogas como fatores de risco para acidentes de trânsito, integradas às Políticas Nacionais de Promoção à Saúde e de Redução de Acidentes e de Violência. Contribuir para a redução da morbimortalidade por causas externas em adolescentes e jovens, em articulação com a Política Nacional de Redução de Acidentes e de Violência. Estratégias: 1. Reorientação, em conjunto com os estados, municípios e DF, dos serviços de saúde, em todos os níveis de complexidade do SUS, com as respectivas referências e contra-referências, para o atendimento aos adolescentes e jovens de ambos os sexos, vítimas de violência de qualquer tipo. 2. Articulação intersetorial, em conjunto com os estados, municípios e DF, para ações educativas e de prevenção, dentro da segurança no trânsito, integradas à Política Nacional de Promoção à Saúde. 3. Participação, junto com os estados, municípios e DF, nas ações intersetoriais da rede de atenção integral a adolescentes visando o fortalecimento do Sistema de Garantia de Direitos. 4. Fortalecimento, em conjunto com os estados, municípios e DF, de ações de prevenção e assistência a agravos relacionados ao uso de álcool, tabaco e outras drogas, na perspectiva de redução da vulnerabilidade à violência, em consonância com as Políticas do Ministério da Saúde: para a Atenção Integral a Usuários de Álcool e outras Drogas e de Promoção da Saúde e com o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas. 9. RESPONSABILIDADES DE GESTÃO DOS ENTES FEDERADOS 9.1 SECRETARIAS MUNICIPAIS DE SAÚDE E DISTRITO FEDERAL • Incluir no Plano Municipal de Saúde os problemas mais freqüentes da saúde integral de adolescentes e jovens de ambos os sexos, enfatizando as ações de promoção à saúde, integradas à Política Nacional de Promoção à Saúde; • Discutir e pactuar na Comissão Intergestores Bipartite (CIB) as estratégias e metas a serem alcançadas por essa política a cada ano; • Estabelecer instrumentos de gestão e indicadores para acompanhamento e avaliação do impacto da implantação/implementação da Política; • Executar as ações básicas de promoção à saúde, prevenção de doenças e de agravos e tratamento para adolescentes e jovens, de ambos os sexos, abordando os problemas prioritários detectados no território; • Qualificar a rede de atendimento, a partir da Atenção Básica, para a integralidade da atenção aos adolescentes e aos jovens; • Integrar os serviços e ações executadas por outros setores públicos e comunitários, no fluxo de referências para atendimento integral a adolescentes e jovens de ambos os sexos, integrada à Política Nacional de Promoção à Saúde. • Estimular e viabilizar os processos de educação permanente para os profissionais da Atenção Básica, em saúde integral de adolescentes e de jovens, de ambos os sexos. 9.2 SECRETARIAS ESTADUAIS DE SAÚDE E DISTRITO FEDERAL 29 • Prestar cooperação técnica aos municípios, no processo de qualificação da AB e da ampliação e consolidação da ESF, com orientação para a organização de serviços que considere a incorporação do cenário epidemiológico da saúde de adolescentes e jovens de ambos os sexos. • Apoiar os municípios na elaboração de instrumentos técnicos e pedagógicos que facilitem o processo de formação e educação permanente dos membros da equipe de saúde, em atenção integral à saúde de adolescentes e jovens, de ambos os sexos. • Incluir no Plano Estadual e Regional de Saúde ações da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes e Jovens, com ênfase nas ações de promoção à saúde integradas à Política Nacional de Promoção à Saúde. • Apoiar a qualificação da rede de atendimento, a partir da Atenção Básica, para a integralidade da atenção a adolescentes e jovens de ambos os sexos. • Propor a integração dos serviços e ações executadas por outros setores públicos e comunitários, no fluxo de referências para atendimento integral a adolescentes e jovens de ambos os sexos, integrada à Política Nacional de Promoção à Saúde. • Estimular e viabilizar os processos de educação permanente para os profissionais da Atenção Básica, em saúde integral de adolescentes e de jovens, de ambos os sexos. • Divulgar a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes e Jovens. 9.3 MINISTÉRIO DA SAÚDE • Apoiar técnica e financeiramente os Estados, Municípios e DF, na divulgação da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes e Jovens. • Apoiar tecnicamente as Secretarias de Saúde Estaduais e Municipais e do Distrito Federal, para garantia da educação permanente, específica aos profissionais de saúde da Atenção Básica, em atenção integral à saúde de adolescentes e de jovens. • Estabelecer diretrizes nacionais e disponibilizar instrumentos técnicos e pedagógicos que facilitem o processo de educação permanente dos profissionais da Atenção Básica, em atenção integral à saúde de adolescentes e de jovens. • Acompanhar e avaliar em conjunto com estados e municípios as ações de Atenção Integral à saúde de adolescentes e jovens. • Articular a integração de políticas e ações de saúde intra e inter- institucionalmente, enfatizando as ações de promoção da saúde integradas à Política Nacional de Promoção à Saúde. • Elaborar e distribuir material técnico sobre Saúde Integral de Adolescentes e de Jovens, de ambos os sexos. • Articular com a mídia nacional a divulgação de informações, de interesse da sociedade em geral, sobre temas de atenção integral à saúde de adolescentes e jovens, de ambos os sexos. • Cooperar tecnicamente com a FUNASA e FUNAI, de forma integrada com estados e municípios, para elaboração de diretrizes e normatização para a atenção integral à saúde de adolescentes e de jovens. 30 10. 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