UNIVERSIDADE CASTELO BRANCO
INSTITUTO QUALITTAS
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” EM CLÍNICA MÉDICA
E CIRÚRGICA DE PEQUENOS ANIMAIS
COLAPSO TRAQUEAL EM CÃO (Canis familiaris)
RELATO DE CASO
Carlos Henrique Lessa de Souza
Rio de Janeiro, jul. 2009
CARLOS HENRIQUE LESSA DE SOUZA
Aluno do curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” em
Clínica Médica e Cirúrgica de Pequenos Animais
COLAPSO TRAQUEAL EM CÃO (Canis familiaris)
RELATO DE CASO
Trabalho monográfico do curso de pósgraduação“Lato Sensu” em Clínica Médica
e Cirúrgica de Pequenos Animais
apresentado à UCB como requisito parcial
para obtenção de título de Especialista em
Clínica Médica e Cirúrgica de Pequenos
Animais, sob a orientação da Profª. Flávia
Liparisi
Rio de Janeiro, jul. 2009
COLAPSO TRAQUEAL EM CÃO (Canis familiaris)
RELATO DE CASO
Elaborado por Carlos Henrique Lessa de Souza
Aluno do curso de Clínica Médica e Cirúrgica de Pequenos Animais
Foi analisado e aprovado com
Grau: ...........................
Rio de Janeiro, ______ de ________________ de _______.
______________________________________
Membro
______________________________________
Membro
______________________________________
Profª Orientadora Flávia Liparisi
Presidente
Rio de Janeiro, jul. 2009
ii
Dedico este trabalho aos meus pais, amigos
e professores pelo apoio recebido.
iii
Agradecimentos
À minha família, que me incentivou a fazer
este estudo;
À minha orientadora, Profª Flávia Liparisi
que gentilmente prestou seu apoio e
orientação para que este trabalho fosse
concluído;
À proprietária, Sra. Cristina Batista que
autorizou a utilização do seu cão Pirata para
relato deste caso.
iv
RESUMO
SOUZA, Carlos Henrique Lessa de
O presente trabalho relata a ocorrência de um caso de colapso de traquéia em um cão da
raça Poodle Toy, macho, 7 anos de idade, atendido no consultório veterinário Golden Vet
localizado no município de São Gonçalo no estado do Rio de Janeiro. O colapso traqueal
causa principalmente tosse nos animais, sendo esta a principal razão que leva os
proprietários ao veterinário. Neste relato, o diagnóstico foi clínico e a confirmação foi feita
pelo exame radiográfico; a terapia medicamentosa foi adotada e o animal respondeu
favoravelmente ao tratamento.
Palavras-chave: colapso traqueal, cão, tosse.
ABSTRACT
SOUZA, Carlos Henrique Lessa de
This works presents a case of tracheal collapse in a male Poodle Toy dog, 7 years old,
treated at Golden Vet Veterinary, located in the city of São Gonçalo in the state of Rio de
Janeiro. The traqueal collapse causes coughing in animals, being this the main reason that
takes their owners to the veterinarian. In this report, the diagnosis was clinical and the
confirmation was made by radiographic examination; the drug therapy was adopted and the
animal responded favorably to the treatment.
Key words: tracheal collapse, dog, cough.
v
A adversidade desperta em nós capacidades
que, em circunstâncias favoráveis, teriam
ficado adormecidas.
(Horácio)
O degrau de uma escada não serve
simplesmente para que alguém permaneça
em cima dele, destina-se a sustentar o pé de
um homem pelo tempo suficiente para que
ele coloque o outro um pouco mais alto.
(Thomas Huxley)
vi
SUMÁRIO
Página
RESUMO .....................................................................................................................
v
ABSTRACT .................................................................................................................
v
LISTA DE QUADROS ................................................................................................ viii
LISTA DE FIGURAS ..................................................................................................
ix
1. INTRODUÇÃO......................................................................................................
01
2. REVISÃO DE LITERATURA ..............................................................................
02
2.1. Anatomia e Histologia.....................................................................................
02
2.2. Fisiologia .........................................................................................................
03
2.3. Etiofisiopatologia ............................................................................................
05
2.4. Diagnóstico......................................................................................................
07
2.4.1. Histórico e Sinais Clínicos .....................................................................
07
2.4.2. Exame Físico..........................................................................................
08
2.4.3. Exames Complementares .......................................................................
08
2.4.4. Diagnóstico Diferencial .........................................................................
10
2.5. Tratamento.......................................................................................................
10
2.5.1. Tratamento Clínico.................................................................................
10
2.5.2. Tratamento Cirúrgico .............................................................................
13
3. DESENVOLVIMENTO.........................................................................................
15
4. DISCUSSÃO ..........................................................................................................
18
5. CONCLUSÃO........................................................................................................
20
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .........................................................................
21
vii
LISTA DE QUADROS
Página
Quadro 1: Principais drogas utilizadas em cães com colapso de traquéia....................
viii
12
LISTA DE FIGURAS
Página
Figura 1: Formato de uma traquéia normal e de uma colapsada ..................................
05
Figura 2: A – Estrutura normal da traquéia durante o ciclo respiratório;
B – Colapso da traquéia cervical na inspiração; C - Colapso
da traquéia torácica na expiração. ................................................................
06
Figura 3: Palpação da traquéia cervical para verificar alterações nos
anéis cartilaginosos ......................................................................................
16
Figura 4: Radiografia demonstrando o colapso da traquéia torácica (setas
vermelhas). Observar a diminuição do diâmetro em relação à porção
cervical (setas amarelas) ..............................................................................
16
Figura 5: Aplicação do aerossol utilizando-se um espaçador artesanal .......................
17
ix
1. INTRODUÇÃO
O colapso traqueal é uma doença respiratória crônica, degenerativa e
incapacitante na qual os anéis cartilaginosos da traquéia diminuem sua rigidez e colabam
parcial ou totalmente durante o ciclo respiratório. Tanto a porção cervical quanto a torácica
podem estar envolvidas. Os principais sinais clínicos são irritação traqueal, tosse, dispnéia
e, em alguns casos, alterações cardiopulmonares, hepáticas ou nas vias aéreas superiores
(JOHNSON, 2000; ETTINGER et al., 2004; HEDLUND, 2005; MAROLF, 2007).
A etiologia deste processo é desconhecida sendo provavelmente
multifatorial; ocorre a substituição da cartilagem hialina por fibrocartilagem e fibras
colágenas além de uma diminuição de sulfato de condroitina e glicosaminoglicano,
acarretando uma incapacidade dos anéis cartilaginosos em manter a conformação normal
durante o ciclo respiratório (JOHNSON, 2000; ETTINGER et al., 2004; MAROLF, 2007).
A patologia é normalmente diagnosticada com base nos sinais clínicos e nos
achados radiográficos cervicais e torácicos porém, a fluoroscopia ou a broncoscopia são os
exames mais sensíveis para detectar tal anomalia (JOHNSON, 2000; FERIAN et al., 2004;
CANOLA & BORGES, 2005; HEDLUND, 2005)
O tratamento do colapso traqueal pode ser clínico ou cirúrgico. O tratamento
clínico é feito através do fornecimento de medicamentos e alterações na rotina do animal
sendo, porém, paliativo e não curativo. A cirurgia é indicada para animais refratários aos
1
medicamentos ou para aqueles com redução de 50% ou mais no diâmetro luminal da
traquéia (SUN et al., 2008; GIBSON, 2009).
Este trabalho tem por objetivo demonstrar, através de um relato de caso e
revisão literária, a importância do diagnóstico e a eficiência do tratamento clínico em um
cão com colapso de traquéia.
2. REVISÃO DE LITERATURA
2.1. ANATOMIA E HISTOLOGIA
A traquéia é um tubo flexível, cartilaginoso e membranoso, que se estende
da saída da laringe, ao nível da segunda vértebra cervical, até sua bifurcação em brônquios
principais direito e esquerdo, imediatamente dorsal à base do coração, no quarto ou quinto
espaço intercostal. A parte da traquéia que está localizada no pescoço é designada como
cervical, e a parte que está localizada dentro da cavidade torácica é designada como
torácica (HARE, 1986; HEDLUND, 2005).
No cão a traquéia é formada por 42 a 46 placas cartilaginosas em forma de
“C”, intercalados por um ligamento anular fibroelástico. A porção dorsal da traquéia, livre
de cartilagem, é composta de mucosa, tecido conjuntivo e músculo traqueal (HARE, 1986;
ETTINGER et al., 2004; HEDLUND, 2005).
2
O suprimento sanguíneo da traquéia é feito pelas artérias tireóidea cranial e
caudal e, próximo à sua bifurcação, pela artéria broncoesofágica. O retorno venoso é feito
pelas tributárias da veia jugular, veia tireóidea caudal e veia broncoesofágica. A drenagem
linfática é feita para os nodos linfáticos cervicais profundos, mediastinal cranial,
retrofaríngeo medial e traqueobrônquico. Os nervos laríngeo recorrente e vago suprem a
inervação parassimpática e as fibras simpáticas e inibidoras originam-se do gânglio
cervical médio e do tronco simpático (ibid).
A parede da traquéia, de dentro para fora, é composta principalmente pelas
lâminas mucosa, submucosa, musculocartilaginosa e adventícia. A lâmina mucosa é
recoberta por um epitélio cilíndrico pseudo-estratificado contendo numerosas células
caliciformes; a lâmina submucosa é rica em fibras elásticas possuindo também adipócitos e
glândulas tubulares submucosas que se abrem no lúmen; a lâmina musculocartilaginosa é
composta por placas cartilaginosas hialinas, tecido fibroelástico e pelo músculo traqueal; a
adventícia é uma lâmina de tecido conjuntivo que se une à lâmina musculocartilaginosa e
com o tecido conjuntivo circundante à traquéia (HARE, 1986; GRANDAGE &
RICHARDSON, 1998).
2.2. FISIOLOGIA
As narinas, a cavidade nasal, a faringe, a laringe, a traquéia, os brônquios e
os bronquíolos são responsáveis por conduzir o ar inspirado do meio externo para os
3
alvéolos pulmonares e em sentido oposto na expiração. Estas estruturas são denominadas
como espaço morto anatômico porque não há trocas gasosas nessas vias. O movimento do
ar é possível graças a um gradiente de pressão formado entre o meio externo e os pulmões
(ROBINSON, 2004).
Segundo HARE (1986), a composição da traquéia possui algumas sutilezas
capazes de suprir determinadas exigências:
a) As placas cartilaginosas conferem rigidez à estrutura impedindo que a
traquéia entre em colapso quando os pulmões se expandem.
b) A expansão da traquéia, para acomodar aumentos no volume de ar
durante a respiração, é possível devido: à existência de cartilagem hialina dotada de certa
flexibilidade inerente; às placas cartilaginosas que são incompletas em sua porção dorsal; à
lâmina mucosa que possui pregas longitudinais; e à considerável quantidade de tecido
elástico na submucosa.
c) As partículas finas de matéria estranha admitidas durante o processo de
inspiração são capturadas no muco pegajoso secretado pelas glândulas traqueais e células
caliciformes e depois removidas pela ação do batimento dos cílios.
d) A cartilagem que fornece a rigidez à traquéia está presente na forma de
placas mantidas juntas por ligamentos fibroelásticos sendo, portanto, uma estrutura flexível
que dá margem para os movimentos da cabeça e do pescoço.
4
2.3. ETIOFISIOPATOLOGIA
A etiologia do colapso de traquéia é desconhecida sendo provavelmente
multifatorial, mas podendo incluir fatores genéticos, nutricionais, anormalidades
neurológicas e degeneração da matriz cartilaginosa. A cartilagem hialina é substituída por
fibrocartilagem e fibras colágenas, ocorrendo também uma diminuição de sulfato de
condroitina e glicosaminoglicano; com isto, os anéis cartilaginosos ficam menos rígidos e
perdem sua capacidade de manter a conformação traqueal normal durante o ciclo
respiratório. O colapso traqueal geralmente afeta toda a traquéia, embora a porção cervical
ou a torácica possa estar isoladamente envolvida. Os anéis cartilaginosos geralmente
colapsam em uma direção dorsoventral (Figura 1) (JOHNSON, 2000; ETTINGER et al.,
2004; MAROLF, 2007).
Figura 1: Formato de uma traquéia normal e de uma colapsada.
Fonte: Adaptado de Animal HealthCare Center, 2009
No processo inspiratório, a pressão intrapleural negativa expande o lúmen
da via aérea intratorácica, enquanto a pressão luminal na porção cervical torna-se negativa.
5
Então, a traquéia cervical tende a se colapsar durante a inspiração. Por outro lado, durante
o processo expiratório, a pressão intrapleural aumenta, tornando-se positiva e podendo
conduzir ao colapso torácico da traquéia em cães predisponentes (Figura 2) (ETTINGER et
al., 2004; SUN, 2008).
Figura 2: A – Estrutura normal da traquéia durante o ciclo respiratório. B – Colapso da
traquéia cervical na inspiração. C – Colapso da traquéia torácica na expiração.
Fonte: Ferian et al., 2004
A traquéia colapsada dispara o processo da tosse e aumenta o esforço
respiratório tornando maior a pressão intratorácica e fazendo com que a mucosa de um
lado da parede da traquéia entre em contato com o lado oposto causando ferimento. Uma
agressão crônica conduz a um processo inflamatório e a uma descamação epitelial que
podem interromper a limpeza mucociliar e causar hiperplasia glandular aumentando a
secreção respiratória. Essas secreções tendem a se acumular na traquéia devido a
interrupção da limpeza mucociliar agravando ainda mais a tosse e o colapso traqueal. Uma
vez estabelecido o ciclo vicioso, a desordem pode ser considerada progressiva
(JOHNSON, 2000; MAROLF, 2007).
6
2.4. DIAGNÓSTICO
2.4.1. HISTÓRICO E SINAIS CLÍNICOS
O colapso de traquéia é uma doença reconhecidamente de cães de raças
pequenas ou miniaturas (por exemplo: Poodles Toy, Yorkshire Terriers, Lulus da
Pomerânia, Malteses, Chihuahuas, Shih Tzus, Lhasa Apsos) associada com a flacidez e o
achatamento dos anéis cartilaginosos. Não há predisposição sexual e a maioria dos animais
é de meia idade quando os sinais clínicos são notados; entretanto, com menos de um ano
de vida os animais podem ser diagnosticados com esta condição (NELSON, 1998;
JOHNSON, 2000; ETTINGER et al., 2004; HEDLUND, 2005).
O sinal clínico característico mais encontrado em cães com colapso traqueal
é uma tosse paroxística facilmente induzida descrita como grasnido seco. Cães também
engasgam e fazem força para vomitar no intuito de limpar secreções respiratórias, o que
pode ser confundido com transtornos digestivos ou corpo estranho traqueal ou esofágico
(FERIAN et al., 2004).
Os sinais clínicos do colapso traqueal progridem com a idade e incluem
ruídos respiratórios anormais, dispnéia, intolerância ao exercício, cianose e síncope. Estes
sinais são mais críticos em animais obesos e são agravados por alergias respiratórias,
infecções das vias aéreas, compressão traqueal externa pela utilização de coleiras,
excitação, calor, umidade, exercício, ao se alimentar, ou beber (JOHNSON, 2000).
7
2.4.2. EXAME FÍSICO
Os cães com colapso traqueal geralmente gozam de boa saúde embora
aproximadamente a metade sofra por algum grau de obesidade. Dependendo do estado de
ansiedade e da angústia respiratória do momento, a coloração da mucosa pode variar de
normal a cianótica. A maioria dos animais com colapso de traquéia possuem uma
sensibilidade traqueal acentuada e a palpação resulta em uma tosse seca de natureza
paroxística. A palpação da traquéia na região cervical pode revelar anéis cartilaginosos
macios e achatados nos casos graves (JOHNSON, 2000; ETTINGER et al., 2004).
A auscultação pode localizar ruídos respiratórios anormais e identificar uma
valvulopatia mitral. Bulhas cardíacas anormais podem estar associadas a cardiopatia
intercorrente. A eletrocardiografia pode revelar arritmia sinusal, evidênciar cor pulmonale
ou aumento de tamanho do ventrículo esquerdo. A hepatomegalia é evidenciada numa
grande porcentagem de animais com colapso de traquéia e pode ser resultante de uma
congestão venosa devido a cor pulmonale ou a uma alteração gordurosa (HEDLUND,
2005).
2.4.3. EXAMES COMPLEMENTARES
Os testes laboratoriais geralmente são normais em cães com colapso
traqueal a não ser que haja enfermidade concomitante. O estudo
8
hematológico é
importante
para
avaliar
desordens
sistêmicas
tais
como
broncopneumonia,
hiperadrenocorticismo ou hipotireoidismo que podem comprometer o sucesso do
tratamento (HEDLUND, 2005).
Radiografias laterais da região cervical e torácica são diagnósticas em
aproximadamente 60% a 84% dos animais com colapso de traquéia. Como esta anomalia é
dinâmica, ou seja, a traquéia cervical sofre colabamento na inspiração enquanto a torácica,
na expiração, os filmes devem ser feitos tanto na inspiração quanto na expiração para
avaliação de toda a traquéia (FERIAN et al., 2004; CANOLA & BORGES, 2005).
A avaliação radiográfica estática é insuficiente para o diagnóstico do
colapso em muitos cães, principalmente quando a porção torácica está envolvida. Nestes
casos, a fluoroscopia pode ser útil pois permite uma avaliação dinâmica do movimento da
traquéia (HEDLUND, 2005).
A ultrassonografia pode ser utilizada para detectar o colapso da traquéia
pois permite a avaliação dinâmica de alteração em seu formato durante o ciclo respiratório.
Esta técnica é limitada ao diagnóstico do colapso da porção cervical sendo também de
difícil visualização devido a interface ar-tecido dentro da traquéia (EOM et al., 2008).
A broncoscopia fornece o diagnóstico definitivo do colapso de traquéia,
avalia a severidade do processo, caracteriza o local do colapso (cervical ou torácico),
detecta o grau de lesão da mucosa, e permite a coleta de material para avaliação citológica
e microbiológica. Os riscos para a realização deste procedimento estão associados a
9
necessidade de anestesia geral; além disto, alguns animais com sensibilidade traqueal
severa podem desenvolver uma tosse incurável após a broncoscopia (JOHNSON, 2000).
2.4.4. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
O colapso de traquéia deve ser diferenciado de outras causas que provocam
tosse crônica e desconforto respiratório tais como síndrome braquicefálica, tonsilite,
colabamento laríngeo, paralisia ou paresia laríngeas, obstrução traqueal ou laríngea,
bronquite, traqueobronquite, pneumonia, alergias, verminoses cardíacas, falha cardíaca
congestiva, hipoplasia traqueal, estenose traqueal e neoplasias traqueais. Entretanto, várias
condições cardiopulmonares podem coexistir com o colapso traqueal ou agravar os sinais
clínicos em cães predisponentes (JOHNSON, 2000; ETTINGER et al., 2004; HEDLUND,
2005).
2.5. TRATAMENTO
2.5.1. TRATAMENTO CLÍNICO
A terapia clínica é considerada o tratamento de escolha para pacientes com
colapso de traquéia e a cirurgia deve ser reservada para aqueles que não a respondem
10
satisfatoriamente (SUN et al., 2008). O tratamento clínico é sintomático e paliativo, não
curativo (GIBSON, 2009).
No planejamento do tratamento clínico é de grande importância tentar
identificar o evento disparador do colapso para suprimir ou quebrar o ciclo patológico
vicioso. No caso de paciente obeso, a redução de peso deve ser instituída e, condições que
levam à obesidade tais como hipotireoidismo, hiperadrenocorticismo ou diabetes mellitus
devem ser controladas. Recomenda-se a restrição de exercícios e outros eventos que
causem a excitação do animal. O paciente deve ser mantido em um ambiente livre de
fumaça e outros agentes irritantes ou alérgenos respiratórios. As coleiras devem ser
banidas ou substituídas por peitorais (SUN et al., 2008; GIBSON, 2009).
Normalmente os cães afetados são tratados com uma combinação de
antitussígenos, broncodilatadores, antiinflamatórios corticosteróides, antibióticos e
sedativos (Quadro 1) (GIBSON, 2009).
Os antitussígenos podem reduzir a irritação crônica ou o dano do epitélio
traqueal. O controle da tosse também permite a resolução de outros problemas associados
com esta condição e retarda o ciclo de autodestruição que ocorre com o colapso de
traquéia. Os agentes butorfanol e hidrocodona são muito eficazes no controle dos sintomas
podendo, porém, desenvolver efeitos colaterais tais como: sedação excessiva, anorexia e
constipação (JOHNSON, 2000; ETTINGER et al., 2004; FERIAN et al., 2004).
11
Drogas
Dosagem
Antitussígenos
Butorfanol
0,05-0,1 mg/kg; VO; QID ou TID
Dextrometorfano
2,0 mg/kg; VO; QID ou TID
Hidrocodona
0,25 mg/kg; VO; QID ou BID
Broncodilatadores
Albuterol
0,02-0,05 mg/kg; VO; TID ou BID
Aminofilina
6-10 mg/kg; VO, IM ou EV; TID
Clenbuterol
0,8 mcg/kg; VO; BID
Teofilina
5,0 mg/kg; VO; QID ou TID
Corticosteróides
Dexametasona
0,5-2,0 mg/kg; EV na emergência
Fluticasona
250 mcg/animal; BID
Prednisona
0,5-1,0 mg/kg; VO; BID
Antibióticos
Amoxicilina + Clavulanato
10,0-20,0 mg/kg; VO; BID
Cefalexina
15,0-30,0 mg/kg; VO; BID
Enrofloxacina
2,5-5,0 mg/kg; VO; BID
Sulfametoxazol + Trimetoprima
15,0-30,0 mg/kg; VO; BID
Sedativos
Acepromazina
0,05-0,1mg/kg; EV, IM ou SC
Butorfanol
0,1-0,8 mg/kg EV
Diazepam
0,2-0,6 mg/kg EV
Quadro 1 – Principais drogas utilizadas em cães com colapso de traquéia.
Fonte: Viana, 2007
Os broncodilatadores não agem sobre a traquéia, porém, reduzindo o
espasmo das vias aéreas de menor calibre e diminuindo a pressão intratorácica, há uma
redução da tendência do colapso das vias aéreas de maior calibre. Ocorre também uma
melhora na depuração mucociliar e redução da fadiga diafragmática. Os agentes
aminofilina, teofilina, albuterol e clenbuterol são os mais freqüentemente utilizados
(ETTINGER et al., 2004).
A inflamação traqueal ou laríngea e doenças brônquicas crônicas são
geralmente tratadas com corticosteróides como a prednisona, porém, o uso prolongado
pode promover infecções, ganho de peso, retenção de sódio e ansiedade causando um
12
estresse adicional ao sistema respiratório. Inalantes para cães, similar ao usado para
humanos asmáticos, podem ser úteis no fornecimento de corticosteróide enquanto
minimizam os efeitos colaterais (JOHNSON, 2000).
As inflamações ou infecções pulmonares devem ser tratadas com
antibióticos observando, se possível, os resultados de cultura e antibiograma (FERIAN et
al., 2004).
O sulfato de condroitina pode ser utilizado na tentativa de melhorar o aporte
de água para o interior das células permitindo melhor atividade cartilaginosa da traquéia
durante as trocas de pressão de ar nos pulmões (SAITO, 2009).
Os pacientes em crise respiratória aguda que apresentem agitação intensa,
angústia respiratória e cianose devem ser colocados em um ambiente calmo e receber
suprimento de oxigênio. Uma combinação de acepromazina e butorfanol pode ser utilizada
para diminuir a tosse e aliviar a angústia respiratória na maioria dos casos. Em casos mais
severos uma traqueostomia pode ser necessária (JOHNSON, 2000; ETTINGER et al.,
2004; FERIAN et al., 2004).
2.5.2. TRATAMENTO CIRÚRGICO
A cirurgia é recomendada para todos os cães com sinais clínicos moderados
a severos, que possuem uma redução de 50% ou mais do lúmen traqueal e que são
refratários à terapia medicamentosa; porém, os cães que apresentam colapso ou depressão
13
de laringe, cardiomegalia generalizada e doença pulmonar crônica são pobres candidatos
ao procedimento cirúrgico (GIBSON, 2009).
A utilização extraluminal de próteses traqueais tem por objetivo dar
sustentação estrutural às cartilagens e ao músculo traqueal, preservando ao máximo o
aporte sangüíneo e a inervação da laringe e da traquéia. As próteses são de polipropileno e
podem ser em forma de anéis individuais ou em espiral. Esta técnica está limitada à
traquéia cervical e a uma pequena porção proximal da torácica; e os pacientes com menos
de 6 anos de idade respondem melhor ao tratamento do que os mais idosos. A principal
complicação que pode surgir é a paralisia laríngea devido à lesão do nervo laríngeo
recorrente durante a cirurgia, sendo necessária uma traqueostomia permanente em alguns
casos. Os sinais clínicos poderão permanecer se o colapso das vias aéreas progredir acima
ou abaixo da prótese ou nas vias aéreas inferiores (colapso bronquial) (HEDLUND, 2005;
SUN et al., 2008; GIBSON, 2009).
A endoprótese (stent) é uma alternativa cirúrgica que possui a vantagem de
ser minimamente evasiva e a possibilidade de tratamento do colapso torácico. Os stents
que menos causam problemas atualmente são os confeccionados com uma liga de níquel e
titânio conhecida como nitinol. As complicações estão relacionadas com a migração ou o
colapso da endoprótese, desenvolvimento de infecções e fatores que desestabilizam o
aparato mucociliar, podendo agravar os sinais clínicos. É importante salientar que após a
epitelização e incorporação do stent na via aérea, sua remoção é de difícil realização e,
14
ocorrendo algum problema, o paciente perde a oportunidade de reparação cirúrgica (LEE et
al., 2007; SUN et al., 2008; GIBSON, 2009)
3. DESENVOLVIMENTO
Um cão da raça Poodle Toy, macho, 7 anos e 8 meses de idade foi atendido
em abril de 2009 no Consultório Veterinária Golden Vet em São Gonçalo, RJ. A
proprietária relatou que o animal apresentava uma tosse seca paroxística que perdurava por
vários minutos e só melhorava quando o animal era massageado na região abdominal. Os
episódios de tosse ocorriam em diversos locais e momentos não sendo possível associá-los
a uma causa específica. Ao exame físico o animal estava com normotermia, mucosas
normocoradas e bom escore corporal. O animal estava bastante agitado apresentando,
devido ao estresse da manipulação, taquicardia e taquipnéia prejudicando parcialmente a
auscultação cardiopulmonar. Quando a traquéia cervical foi massageada (Figura 3), o
paciente apresentou a tosse descrita pela proprietária. Foi então solicitado um exame
radiográfico das regiões cervical e torácica cujo resultado foi um colapso parcial da
traquéia torácica (Figura 4) e uma bronquite leve.
15
Figura 3: Palpação da traquéia cervical para verificar alterações nos anéis cartilaginosos
(Autoria Própria)
Figura 4: Radiografia demonstrando o colapso da traquéia torácica (setas vermelhas).
Observar a diminuição do diâmetro em relação à porção cervical (setas amarelas).
Fonte: PCA – Centro de Diagnóstico Veterinário, 2009.
16
O tratamento prescrito foi de uma associação de Sulfametoxazol com
Trimetoprima (Bactrim®) BID por 10 dias, Albuterol (Aerojet Spray®) BID por 14 dias,
Fluticasona (Flixotide® 250 mg) BID durante 7 dias e SID por mais 7 dias. A aplicação do
Albuterol e da Fluticasona foi realizada aspergindo-se duas vezes o fármaco em um
espaçador artesanal (Figura 5) e fazendo o animal inalar durante 30 segundos.
Figura 5: Aplicação do aerossol utilizando-se um espaçador artesanal.
(Autoria Própria)
Após 20 dias a proprietária relatou que o paciente havia melhorado bastante
e que os episódios de tosse só reapareciam quando o animal estava muito excitado ou
quando comia de forma muito rápida. A traquéia cervical ainda apresentava sensibilidade,
pois com a palpação a tosse era deflagrada.
17
A proprietária foi alertada que a melhora foi terapêutica porém, não
definitiva e, para evitar uma progressão dos sintomas, o animal deveria ficar longe de
ambientes com poeira ou fumaça, não deveria ficar muito excitado ou estressado, coleiras
ou enforcadores deveriam ser evitados e, caso o animal voltasse a apresentar os sintomas
de tosse, a terapia com o broncodilatador (Albuterol) deveria ser novamente instituída.
Iniciou-se o fornecimento de um nutracêutico (Condromax®) à base de
sulfato de condroitina na tentativa de uma regeneração cartilaginosa da traquéia. Este
medicamento não foi aplicado inicialmente devido à sua possível ineficácia na presença de
tratamentos com corticosteróides descrita em sua bula. Após dois meses o paciente
apresentava-se estável porém, a sensibilidade acentuada da traquéia cervical havia
desaparecido pois não foi possível provocar a tosse mesmo com uma palpação vigorosa.
Um novo exame radiográfico seria necessário para comprovar a eficácia deste tratamento,
porém, não foi realizado por razões financeiras.
4. DISCUSSÃO
Houve concordância, no caso relatado, com a anamnese descrita por Nelson
(1998), Johnson (2000), Ettinger et al. (2004) e Hedlund (2005), que descreveram o
colapso traqueal como uma doença freqüentemente descrita em cães de raças pequenas ou
miniaturas, tendo o Poodle Toy, a raça do paciente relatado, uma alta predisposição. A
18
meia idade em que os sinais clínicos foram notados no paciente em questão também
coincide com o relato daqueles autores.
A tosse paroxística descrita pela proprietária coincide com o sinal clínico
característico mais encontrado em cães com colapso de traquéia relatado por Ferian et al.
(2004); essa tosse também foi facilmente induzida no exame físico, palpando-se a traquéia
cervical, já que o paciente apresentava uma sensibilidade local acentuada, conforme
descrito por Johnson (2000) e Ettinger et al. (2004).
Concordando com Ferian et al. (2004) e Canola & Borges (2005), o exame
radiográfico lateral da região cervical e torácica mostrou-se eficiente no auxílio diagnóstico
deste relato porém, apenas o colapso traqueal torácico foi evidenciado porque, sendo esta
anomalia dinâmica, certamente o animal estava expirando no exato momento radiográfico.
Hedlund (2005) aponta a fluoroscopia como um método diagnóstico melhor
que a radiografia para detectar colapsos traqueais principalmente quando a porção torácica
está envolvida. Entretanto, neste relato, a radiografia foi suficiente para detectar o colapso
da traquéia torácica.
A broncoscopia não foi realizada no paciente pois o exame radiográfico foi
conclusivo e, concordando com o que foi descrito por Johnson (2000), para evitar submetêlo aos riscos anestésicos e a possíveis traumas traqueais inerentes ao procedimento.
A terapia clínica utilizada foi uma combinação de broncodilatador,
antiinflamatório corticosteróide e antibiótico conforme relato de Gibson (2009). Não
houve, porém, a necessidade de utilização de antitussígenos ou sedativos.
19
O sulfato de condroitina foi fornecido diariamente e o paciente obteve, após
dois meses, uma melhora considerável na sensibilidade da traquéia. Saito et al. (2008)
relataram a utilização deste fármaco como uma opção possível e de alta eficácia no
tratamento ao longo prazo dos distúrbios cartilaginosos traqueais. Um estudo mais
aprofundado seria necessário para verificar se a melhora da sensibilidade foi proveniente
da utilização deste medicamento ou ocorreu pela interrupção do ciclo vicioso da tosse
obtido inicialmente com a utilização dos outros fármacos.
5. CONCLUSÃO
O colapso de traquéia é uma patologia respiratória, de natureza
desconhecida, que se não for bem diagnosticada e tratada pode levar o animal a óbito. O
tratamento medicamentoso deve ser instituído preferencialmente e a abordagem cirúrgica
reservada apenas aos pacientes não responsivos ao tratamento ou com colabamentos mais
graves.
Através do caso relatado, conclui-se que a terapia medicamentosa aliada ao
correto manejo foram adequados para assegurar o bem-estar do animal e a redução
significativa dos sinais clínicos; entretanto, é necessário um estudo mais aprofundado para
se entender a etiologia desta doença em cães na tentativa de se obter a sua cura definitiva.
20
REFEFÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANIMAL HEALTHCARE CENTER. Site construído e mantido por Animal
HealthCare Center. Disponível em: <http://www.animalhealthcare.com/handouts/dogs/
collapsing_trachea.htm>. Acessado em: 23 jun. 2009.
CANOLA, J.C.; BORGES, N.C. Compressão traqueal como método auxiliar no
diagnóstico radiológico do colapso de traquéia cervical. Brazil Journal of Veterinary
Research and Animal Science, v.42, n.6, p.414-418, 2005.
EOM, K.; MOON, K.; SEONG, Y.; OH, T.; YI, S.; LEE, K.; JANG, K.
Ultrasonographic evaluation of tracheal collapse in dogs. Journal of Veterinary
Science, v.9, n.4, p.401-405, 2008.
ETTINGER, S. J.; KANTROWITZ, B.; BRAYLEY K. Doenças da traquéia. In:
ETTINGER, S.J.; FELDMAN, E.C. Tratado de Medicina Interna Veterinária. 5.
ed., Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004, v.2, Cap. 126, p.1096-1112.
FERIAN, P.E.; TÔRRES, R.C.S.; MELO, E.G.; SILVA, E.F. Colapso de traquéia em
cães. Medvep, v.2, n.8, p.253-259, 2004.
GIBSON, A. Tracheal collapse in dogs: to ring or to stent?. Irish Veterinary Journal,
v.62, n.5, p.339-341, 2009.
GRANDAGE J., RICHARDSON, K. Sistema respiratório – Anatomia funcional. In:
SLATTER, D. Manual de Cirurgia de Pequenos Animais. 2. ed., São Paulo: Manole,
1998, v.1, Cap. 49, p.835-853.
HARE, W.C.D. Sistema respiratório geral. In: GETTY, R. Anatomia dos Animais
Domésticos. 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1986, v.1, Cap. 8, p.108-135.
HEDLUND, C. S. Cirurgia do sistema respiratório superior. In: FOSSUM, T.W.
Cirurgia de Pequenos Animais. 2. ed., São Paulo: Roca, 2005, Cap. 30, p.716-726.
JOHNSON, L. Tracheal collapse. Diagnosis and medical and surgical treatment.
Veterinary Clinics of North America: Small Animal Practice, v.30, n.2, p.12531266, 2000.
LEE, S.G.; KIM, M.J.; HYUN, C. Management of refractory tracheal collapse in a dog
using self-expanding intraluminal prosthesis. Journal of Animal and Veterinary
Advances, v.6, n.4, p.490-495, 2007.
21
MAROLF, A.; BLAIK, M.; SPECHT, A. A retrospective study of the relationship
between tracheal collapse and bronchiectasis in dogs. Veterinary Radiology &
Ultrasound, v.48, n.3, p.199-203, 2007.
NELSON, A.W. Sistema respiratório inferior. In: SLATTER, D. Manual de Cirurgia
de Pequenos Animais. 2. ed., São Paulo: Manole, 1998, v.1, Cap. 53, p.936-968.
ROBINSON, N.E. Visão geral da função respiratória: ventilação pulmonar. In:
CUNNINGHAM, J.G. Tratado de Fisiologia Veterinária. 3. ed., Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2004, Cap. 44, p.481-491.
SAITO, T. B.; NAGAI, M.Y.D.O; ITO, A.M.; HEADLEY, S.A. Utilização de sulfato
de condroitina em cães com colapso traqueal: Um relato de caso. Disponível em:
<http://www.labyes.com.ar/espanol/info/sulfato_condroitina_caninos_colapso_traqueal
.pdf>. Acessado em 05 jun. 2009.
SUN F.; USÓN, J.; EZQUERRA, J.; CRISÓSTOMO, V.; LUIS, L.; MAYNAR, M.
Endotracheal stenting therapy in dogs with tracheal collapse. The Veterinary Journal,
v.175, n.2, p.186-193, 2008.
VIANA, F.A.B. Guia Terapêutico Veterinário. 2. ed. Minas Gerais: Editora CEM,
2007.
22
Download

em clínica médica e cirúrgica de p