Nº 1 - 4 de Julho de 2014 4 de Julho: O grande encontro A arte de estar com os outros V A homenagem a Luis Miguel Cintra começa hoje com a inauguração da exposição na Escola D. António da Costa. Amanhã haverá Um dia de encontro, na Casa da Cerca e, durante a próxima semana, o curso Conversa para cinco dias e um ciclo de cinema com longas-metragens, documentários e registos de espectáculos da Cornucópia. êm de todos os cantos do Mundo, do País, de todos os pontos cardeais e coordenadas GPS. Trazem cenários, adereços, figurinos, talismãs, desenhos de luz e de som, esquemas, orçamentos, planos de viagem, laptops, smartphones, auriculares, livros, rebuçados, uma muda de roupa por dia, garrafas de vinho, saca-rolhas (sim, há quem ande com um no bolso, para o caso de ser preciso), vêm com textos decorados, gestos em partitura, dossiers de produção, instrumentos musicais, um brilho nos olhos e um nervoso miudinho. Vêm para uma festa, um ritual que se repete todos os anos, um encontro que atrai todos estes corpos e objectos, desejos, interesses e vontades. Trazem o que têm para dar: teatro, música, dança, cinema, fotografia, pintura, escultura, filosofia, estética, política, sentido crítico. E o desejo de estarem uns com os outros. Vêm como são, alguns fingem, outros não sabem o que são, muitos não sabem que estão a fingir. Pouco interessa. Vêm todos, como que a um chamamento mágico, uma frequência que não se ouve, atraídos por esse silêncio misterioso, uma ideia que não é possível definir. Vêm para partilhar aquele instante em que estamos diante uns dos outros, prontos para começar. Levi Martins En t r e v i s ta com L u i s M i g u el C i n t r a Como é que um encenador e actor organiza uma exposição? O trabalho de um encenador, tal como o trabalho dos actores, é efémero, portanto não permite fazer nenhuma exposição. É uma exposição mais dos trabalhos da Cristina [Reis]. O que pensei foi que se fizesse uma espécie de condução da exposição, um texto que ligasse e comentasse as imagens, haveria uma espécie de exposição do meu ponto de vista sobre aquilo que fui fazendo. Era como se estivesse a fazer uma mise-en-page do meu discurso. As imagens servem para apoiar aquilo que eu estou a dizer e vice-versa. Que ponto de vista conduziu estas escolhas? Foi um ponto de vista que as pessoas se calhar nunca tiveram da minha parte, porque é muito íntimo. Sem problema em expor quais foram as coisas de que gostei, as de que não gostei, por que é que cheguei aqui, quais foram as dificuldades... Não tenho nenhum problema em expor-me. Estamos neste mundo para comunicarmos uns com os outros numa base honesta. Viciar a comunicação e fazer com que seja toda feita através de uma imagem, que é uma impostura que a pessoa faz a si própria ou aos outros – por não querer que os outros vejam os seus podres –, é uma coisa que não faz qualquer espécie de sentido. O prazer é expor mesmo tudo. O que podemos esperar de Um dia de encontro? Eu já estive em muitos debates e detesto. Acho que as pessoas se escudam atrás da formalidade da própria organização do debate e das intervenções para só dizerem o que lhes convém. Fazer figura. Queria ver se conseguia que fizéssemos menos figura. Tentei juntar um grupo que não é necessariamente representativo da profissão inteira, com pessoas um pouco soltas com quem me dou relativamente bem, pessoas que respeito e que creio que também me respeitam, portanto talvez seja possível uma conversa. E a conversa é sobre quê? No fundo, uma espécie de balanço – que, para mim, vai ser o Festival todo. O que é que valeu a pena fazer, o que é que difere entre a altura em que comecei a fazer teatro e actualmente. Olhar para o passado a pensar no presente e no futuro? Uma coisa que me obceca, e que acho que é o assunto principal do debate, é: será que as pessoas ainda podem ter um projecto, um objectivo naquilo que estão a fazer? Aos mais novos é uma das coisas que tenciono perguntar. Será que ainda há espaço para fazer o que nós fizemos? Será que querem? A sensação que me dá é de que estamos tão entalados pelas condições de produção e pela maneira da sociedade funcionar que se calhar não temos de ter um projecto, temos de ter é energia e esperteza para encon- trar o furo por onde possamos continuar a existir. E isso pode ser que gere uma maneira de estar diferente e interessante. Não parto com a ideia de que agora é pior do que era anteriormente, portanto não queria voltar aos mesmos assuntos. Espero que as pessoas não caiam nisso. E que não caiam na reivindicação. Uma coisa que já se sabe que toda a gente reivindica é mais dinheiro para o teatro. Quais são os principais objectivos da Conversa para cinco dias? Eu sempre fui muito avesso a cursos, porque não sou capaz de organizar o pensamento de maneira a transmitir ensinamentos. O que penso fazer é despertar a sensibilidade das pessoas para todos os problemas que se põem na actividade teatral, servindo-me do meu exemplo como termo de comparação. Começará pela formação: que formação é que eu tive, fiquei contente, não fiquei contente, o que é que espero que os actores tenham como formação... Que caminho é que uma pessoa pode prosseguir se quiser ser actor, cenógrafo, encenador... Depois terá a ver com a produção – creio, por exemplo, que as pessoas não têm a noção de como a produção está tão relacionada com a própria criação artística. Em determinadas condições de produção não é possível fazer determinadas coisas. E não é só por causa do dinheiro, é por causa da atmosfera que se gera, as relações de trabalho que existem, etc.. Também falaremos sobre em que consiste o trabalho dos actores, o trabalho de construção dos espaços, a iluminação e por aí em diante. Parece-me que pode ser útil para outros construírem o seu próprio caminho. Joaquim Benite: exposição permanente I naugurada a 5 de Dezembro de 2013, a exposição Joaquim Benite: teatro e cidadania mantém-se patente no antigo espaço da Livraria do Teatro Azul. A mostra inclui fotos biográficas do fundador do Festival, bem como dos diversos espaços teatrais que criou em Almada. Faz também parte desta exposição uma montagem de registo vídeo de alguns dos mais marcantes espectáculos dirigidos por Joaquim Benite. A partir de hoje esta montagem inclui ainda uma longa entrevista com o fundador da CTA, sobre as origens e o desenvolvimento do Festival de Almada, com legendas em inglês. No opúsculo de distribuição gratuita distribuído nesta mostra, Sebastiana Fadda aponta Joaquim Benite como “um pensador culto e, sobretudo, um fazedor de rara lucidez e vontade obstinada”. A crítica de teatro de origem italiana salientou em Benite o empenho “em questões tão contundentes como AGENDA de amanhã Colóquio Um dia de Encontro 10h30 e 14h30 | Casa da Cerca exposição de artes plásticas Transfigurações de Manuel Vieira 18h30 | Galeria do TMJB música na esplanada Trio banana 23h00 | Escola D. António da Costa Espectáculos de Rua Charme romeno 20h30 | Rua Cândido dos Reis Espectáculos de sala Branca de Neve Restaurante da Esplanada Hoje Pratos do dia – Massa com camarão – Ossobuco Sobremesa – Mousse – Arroz doce – Semi-frio de iogurte – Fruta da época Amanhã 15h00 | Fórum Romeu Correia Pratos do dia 18h30 | Teatro Municipal Maria Matos - Arroz negro - Duchuveteh Canções i comentários E se nos metêssemos ao barulho?! 19h00 | Pátio Prior do Crato Testamento 21h30 | Culturgest Cais Oeste 21h30 | Teatro Municipal Joaquim Benite Almada de Quarentena 24h00 | Casa da Cerca Sobremesa – Mousse – Arroz doce – Semi-frio de iogurte – Fruta da época a formação de novos públicos, a descentralização, e a responsabilidade do Estado em fomentar a Cultura como direito e para proveito de todos os cidadãos”. Joaquim Benite “foi um homem de teatro completo, que soube transformar o mundo que lhe coube em vida, e moldá-lo no mundo que pôde, quis e conseguiu construir, mudando a configuração e os rumos do teatro em Portugal”. Entre os numerosos prémios e distinções com que foi agraciado, foi-lhe atribuído o grau de Comendador da Ordem do Infante D. Henrique; os graus de Cavaleiro e Oficial da Ordem das Artes e das Letras de França; e o grau de Comendador da Ordem do Mérito Civil de Espanha. Selfaria Faça como a Joana e a Quica, que se fotografaram com o cão da CTA, o Ad hoc, e ganhe convites duplos para o Festival. Todos os dias a Selfie vencedora sairá aqui. Envie-nos a sua Selfie Festival de Almada para [email protected]. À mesa com Carlos Gil Zamora C arlos Gil – que tem Zamora de apelido, nasceu em Barcelona, e vive entre Bilbau e Madrid – é dramaturgo, actor, e director da revista de teatro Artez. O seu percurso profissional, descreve-o da seguinte forma: “era um canastrão como actor, não tinha talento para encenar, por isso acabei como crítico”. Fomos às sardinhas à Cova Funda – e saiu-nos o tiro pela culatra. Não no que toca às sardinhas, nem pequenas, nem grandes, anafadas quanto baste. A questão é que fomos à procura do senhor Adelino, provecto assador de peixe cacilhense, e saiu-nos um (simpático) Albino, novo proprietário do estabelecimento, cuja foto publicamos, com o Carlos, para a posteridade. Cacilhas engalanou-se para receber o Festival, que lá começa amanhã. Palheta ilimitada Este ano começa bem: o primeiro espectáculo de rua era tudo em pelota... Não há direito! Com a crise que aí anda, se a moda pega, vai ser um fartote na poupança em figurinos...