CONVERSA PARA CATALOGADOR DORMIR: ALGUNS CAMINHOS DO FORMATO MARC [Março/2009] Fernando Modesto A consolidação do MARC 21 como formato universal, marca a evolução e consolidação do mais tradicional formato de intercâmbio bibliográfico para o século 21. Século esse marcado pela inovação da inovação tecnológica, e pelo domínio da ambiência digital. Sob esse aspecto, resumidamente, comenta-se a atual situação do formato MARC, que apesar de “quarentão” segue sobrevivendo às transformações dos suportes documentais, e gozando de boa saúde para a alegria e a tristeza de catalogadores. Recorde-se que a proposta de concepção do MARC 21 teve início na segunda metade da década de 1980, com o documento publicado em 1987: “MARC 21 Specifications for Record Structure, Caracter Sets, and Exchange Media”, como resultado das intenções de unificação dos formatos USMARC, CANMARC e UKMARC. Marta Martinéz García e María Olaran Múgica em “Manual de Catalogación em Formato MARC” (2ª ed. Madrid: ARCO/Libros, 2007), comentam que neste processo de integração, os responsáveis pelo formato UKMARC abandonaram o projeto só retornando década mais tarde, em 2000, quando a British Library toma a decisão de migrar seus registros baseados em UKMARC para o MARC 21. Este fato resulta, em 2002, de novo acordo com os representantes da Library of Congress e a National Library of Canada. O processo da British foi realizado em etapas mediante programas de conversão que mapearam as equivalências entre os formatos. Atualmente, os registros bibliográficos ingleses são originados diretamente no formato MARC 21. Aliás, fato consumado entre vários países da comunidade européia. Parafraseando nosso Guia: “Azelites” da catalogação mundial definiram os princípios de renovação e unificação dos formatos, substituindo seus próprios formatos e influindo na substituição da quase totalidade das variantes do formato MARC. Assim, o formato MARC 21 converte-se em modelo universal. Alguns países se adaptaram diretamente ao padrão (caso do Brasil, por exemplo). Outros introduziram modificações para manter determinadas tradições catalográficas, mas sofrem com um mercado de automação de biblioteca onde sistemas são integralmente baseados no MARC 21. O MARC 21 é uma família de formatos, um conjunto de recursos que servem de ferramenta ao universo bibliográfico. Os cinco formatos do MARC 21 são: l MARC 21 Format for Bibliographic Data (Formato MARC 21 para Dados Bibliográficos), desenhado para codificação de informações bibliográficas de livros e manuscritos, arquivos de computador, material cartográfico, música, publicações seriadas (recursos contínuos), materiais visuais (projetável, bidimensional, kit, artefato tridimensional) e materiais mistos. Os dados bibliográficos incluem normalmente título, nomes, assuntos, notas, dados de publicação e informações referentes á descrição física dos documentos. l MARC 21 Format for Authority Data (Formato MARC 21 para Dados de Autoridade), destinado a informação sobre as formas autorizadas de nomes, assuntos e suas subdivisões que constituem o ponto de acesso dos registros bibliográficos. Incluí também as modalidades ou variações de nomes, assuntos e suas subdivisões que serão utilizadas como referência às formas normalizadas; e que por sua vez proporciona meios para se estabelecer e controlar as interrelações existentes entre os pontos de acesso. l MARC 21 Format for Holdings Data (Formato MARC 21 para Dados de Coleção e Localizações), proporciona informação para localizar e identificar os exemplares de um documento e obter informação sobre a biblioteca depositária (do item). O estado de conservação, procedência, encadernações, forma de acesso eletrônico, volumes de uma publicação seriada (recursos contínuos), são alguns dos dados contemplados pelo formato. Possibilita constituir registros independentes, pois parte dos seus campos podem aparecer embebidos no registro bibliográfico. l MARC 21 Format for Classification Data (Formato MARC 21 para Dados de Classificação), codifica os dados pertencentes á notação de uma classificação numérica. Permite relacionar com os registros bibliográficos ou com os dados de autoridade, desde que o sistema de catalogação solicite validação da classificação no campo correspondente. l MARC 21 Format for Community Information (Formato MARC 21 para Informação Comunitária), permite o processamento de recursos não bibliográficos que possam ser úteis para uma determinada comunidade. Estabelece uma taxonomia de cinco tipos de registros, relacionados com: um indivíduo, uma organização, um programa ou serviço, um acontecimento, ou outros assuntos que por seu tipo de conteúdo heterogêneo não possa ser agrupado sob um conceito específico. As entidades responsáveis, atualmente, pela manutenção dos formatos MARC 21 são: Library of Congress – LC e National Library of Canada. Como canal de comunicação com o mundo, sobre o padrão, a Library of Congress Network Development and MARC Standards Office mantém uma lista eletrônica denominada MARC Forum, aberta ao recebimento de propostas e sugestões. Há, ainda, o MARBI (Machine Readable Bibliographic Information), vinculado a American Library Association, e a CCM (Canadian Committee on MARC), que atuam como órgãos assessores para as agencias nacionais responsáveis pelo Formato. Aspecto significativo á sobrevivência do formato é sua reação ao surgimento de novos recursos distribuídos em redes eletrônicas e, totalmente, distintas dos suportes e canais tradicionais de armazenamento e distribuição. As características dinâmicas e de instabilidade de muitos destes recursos eletrônicos (conteúdo e forma de acesso) não estão totalmente ajustados às convenções catalográficas existentes. Porém, há ações de ajustamentos neste sentido como, por exemplo, a incorporação (desde meados da década de 1990, no MARC bibliográfico e dados da coleção) do campo 856 que permite localizar e acessar recursos eletrônicos. Desde esse período, a Library of Congress Network Development and MARC Standards Office estabelece um fluxo de trabalho relacionado ao aproveitamento de informações que proporcionam os metadados de análise documental no formato de recursos acessíveis por meio da Internet. Os metadados (que em definição genérica) representam dados sobre dados ou informação sobre informação, fornecem mesmo significado aos registros bibliográficos codificados em MARC (também considerados como metadados). O que, na literatura, é salientado como aplicável a outros padrões projetados para analisar, representar e recuperar através de softwares, os recursos eletrônicos. Essa caracterização do formato realizou-se em duas etapas: Inicialmente, elaborou-se modelo destinado á conversão de dados registrados em MARC para SGML (Standard Generalized Markup Language), e da mesma forma o processo inverso de conversão, de forma a minimizar a perda de dados na transação. Essas operações de conversão se realizam por meio de uma linguagem específica de marcação: DTD (Definição de Tipo de Documento). A partir de 2002 a linguagem SGML é substituída pela linguagem XML (Extensive Markup Language), uma linguagem de marcação mais avançada, e que contribui para estabelecer três grupos de ferramentas MARC: n MARCXML schema. Ferramenta concebida como um modelo flexível de uso segundo as necessidades específicas do bibliotecário ou comunidade usuária em geral. É composto de recursos variados como: esquema de codificação, folhas de estilo, ferramentas de conversão entre MARC e MARCXML, além de programas desenvolvidos pela LC. n MODS (Metadata Object Description Schema). Esquema XML estruturado em um conjunto de elementos bibliográficos, aplicado principalmente em biblioteca, mas que também oferece possibilidade de uso variado no universo documental. Entre outras aplicações, inclui relação de equivalência com o padrão Dublin Core Metadata Elements, versión 1.1 (versão simples dos elementos Dublin Core), permitindo a conversão de um registro DC em MODS e vice-versa. n MADS (Metadata Authority Description Schema). Esquema XML estruturado em um conjunto de elementos destinado ao controle de autoridade, e que pode ser usado para fornecer metadados sobre pessoas, organizações, eventos, e terminologia (termos tópicos, geográficos, gêneros, etc.). O esquema foi criado para servir como um complemento ao MODS. Assim, MADS tem uma relação com o formato MARC 21 de Autoridade, semelhante ao que MODS tem com o MARC 21 Bibliográfico. Ambos transportam dados bibliográficos selecionados do MARC 21. n MARC XML DTD é uma estrutura composta de especificações de cada um dos elementos dos cinco formatos MARC 21, agora como elementos XML. Outra influência sobre o formato MARC é a FRBR (Functional Requirements for Bibliographical Record). Modelo conceitual de dados bibliográficos baseado em metodologia conhecida como “entidade-relacionamento”, aplicada na construção de bases de dados relacionais. Esse modelo aprovado pelo Comitê Permanente da Seção de Catalogação da IFLA. Apresenta quatro níveis de representação bibliográfica: Obra, expressão, Manifestação e Item (documento). Entre seus objetivos principais está o de estabelecer acordo com as agencias bibliográficas nacionais sobre os dados bibliográficos mínimos aceitáveis na composição do registro. A revisão das ISBDs, iniciadas desde 2002, busca estabelecer uma norma catalográfica coerente com as recomendações da FRBR. Com a mesma intenção, organismos como OCLC e a Library of Congress, Agencias Bibliográficas da Austrália e de outros países, realizam estudos comparativos sobre a adequação de seus catálogos com as recomendações da FRBR. As análises empreendidas têm estabelecidos níveis elevados de correlação existentes entre o formato MARC 21 e a FRBR. Outro acontecimento de repercussão no universo catalográfico mundial relacionado com a normativa bibliográfica se refere aos encontros internacionais da UBCIM (IFLA Universal Bibliographic Control and Internacional MARC Core Activity) e UDT (Universal DataFlow and telecommunications Core Activity). O resultado destes acontecimentos foi o acordo ICABS (IFLA-CDNL Alliance for Bibliographic Standards) estabelecendo novo projeto bibliográfico proposto pela National Library of Autralia, Library of Congress, British Library, Koninklijke Bibliotheek, Deutsche Bibliothek, e Biblioteca Nacional de Portugal. Inúmeros documentos e textos atestam os trabalhos desenvolvidos e de como a catalogação vai se orientando no atual cenário mundial. Segundo Martinéz e Olaran, a colaboração entre a IFLA e a CDNL (Conferência de Diretores de Bibliotecas Nacionais), estabelece em seus preceitos iniciais três objetivos para cuja execução se define uma série de ações, que resumidamente contemplam: u Objetivo (1) – Manter, promover e harmonizar as normas e conceitos existentes relacionados com o controle bibliográfico e de recursos. · u Objetivo (2) – Desenvolver estratégias para o controle bibliográfico e de recursos, de forma a também impulsionar a adoção de novos acordos. · u Ações: Desenvolvimento das ISBDs; Aperfeiçoamento das FRBR; Apoio ao projeto FRANAR (Funcional Requirements of Authority Numbering and Records); Promover o uso do UNIMARC; Avanços no uso do MARC 21 e seus derivados em XML; Cooperar na implantação do protocolo Z39.50, com o acesso remoto a informação ZING e seus serviços de busca web e recuperação baseado em XML. Ações: Apoiar o projeto VIAF (Virtual International Authority File); Metadados e esquema de metadados baseados em XML. Objetivo (3) – Impulso ao arquivamento de longo prazo de recursos eletrônicos. · Ações: Conhecimento dos requisitos e condições necessárias para arquivamento dos recursos eletrônicos; Pesquisar sobre métodos e normas para a migração e emulação dos recursos; Preservação de publicações acessíveis via web; Estabelecimento de diretrizes para a preservação de conteúdo digital. Em realidade, o formato MARC e as normas catalográficas internacionais encontram-se submetidas a uma contínua transformação. Isto é decorrente do fato de que o insumo informação, processado e reelaborado por estes sistemas bibliográficos, encontra-se em contínua evolução. A incidência dos avanços tecnológicos sobre os documentos, catálogos e canais de difusão da informação obrigam uma revisão e aprimoramento do ferramental bibliográfico de tratamento e organização do conhecimento. Talvez não sintamos, no Brasil, a intensidade das discussões e alterações que afligem o trabalho catalográfico mundial. Porém, as mudanças são certas, e a mobilização da comunidade se faz necessária. É importante estruturar e formatar regionalmente grupos de trabalho para assimilar novas posturas de atuação e desempenho dos serviços técnicos. Bem como, mudar a mentalidade generalizada de se “fazer” catalogação de forma isolada. O melhor do formato MARC não é o seu uso individualizado e cerrado entre quatro paredes. O melhor do formato MARC está na sua aplicação cooperativa, que gera o catalogo coletivo para a coletividade de usuários. Na era das redes eletrônicas, das redes sociais, e da inteligência coletiva. A moderna Biblioteconomia sempre esteve embebida.