Artigo Original
Avaliação vocal e auto-percepção da desvantagem
vocal (VHI)após laringectomia fronto-lateral
Vocal evaluation and voice handicap (VHI) self-perception
after frontolateral laryngectomy
RESUMO
Introdução: as alterações vocais decorrentes da laringectomia
fronto-lateral (LFL) podem causar impacto na qualidade de vida.
Objetivo: avaliar as características vocais e a auto-percepção da
desvantagem vocal de pacientes submetidos à LFL com reconstrução pelo retalho do esterno-hióideo. Pacientes e método: foi
realizada a avaliação prospectiva de 12 pacientes, com idade
média de 66,5 anos, submetidos à LFL com reconstrução pelo
retalho do esterno-hióideo. Seis pacientes (50%) foram submetidos à radioterapia pós-operatória, com dose média de 6006cGy. A
avaliação da voz dos pacientes foi realizada através da avaliação
perceptivo-auditiva da voz, com a escala GIRBAS. A desvantagem
vocal foi mensurada através da aplicação do questionário VHI,
sendo que quanto maior for a pontuação, pior a desvantagem
vocal. As amostras foram apresentadas de forma cego-aleatória
para três fonoaudiólogos com experiência superior a três anos com
disfonias decorrentes do tratamento oncológico. Resultados: um
total de 83% dos pacientes apresentou disfonia, sendo 42% de
grau severo. A rugosidade estava presente em 100% dos casos. O
pitch foi considerado adequado em 58% da amostra e a ressonância foi julgada como laringofaríngea em 67% dos pacientes. A autopercepção de desvantagem vocal foi referida de impacto discreto
nos três domínios e, em relação à pontuação global, foi observado
pior impacto no grupo de pacientes com disfonia de grau grave e
moderado. Conclusão: constatamos disfonia de grau severo,
porém, com impacto discreto nos domínios avaliados pelo VHI.
Esses resultados reforçam a indicação de avaliações com
múltiplos enfoques, onde o diagnóstico não seja apenas do clínico
especialista, mas, também, do paciente. O VHI é uma ferramenta
utilizada internacionalmente que viabiliza a avaliação do ponto de
vista do paciente.
Débora dos Santos Queija1
Alessandra Sampaio Ferreira2
Juliana Godoy Portas2
Rogério A. Dedivitis, MD3
Elio Gilberto Pfuetzenreiter Júnior4
Nataniele Patrícia Bohn5
Ana Paula Brandão Barros6
ABSTRACT
Introduction: the vocal changes resulting from the frontolateral
laryngectomy (FLL) can cause impact on the quality of life.
Objective: to evaluate the vocal characteristics and the voice
handicap (VHI) self-perception after FLL with reconstruction with
sternumhyoid muscle flap. Patients and methods: we performed
the prospective analysis of 12 patients, whose average age was
66.5 years-old, undergoing FLL with reconstruction with
sternumhyoid muscle flap. Six patients (50%) were submitted to
adjuvant radiation therapy whose average dose was 6006cGy. The
vocal evaluation of the patients was done through the perceptual
analysis with the GIRBAS scale, whereas the voice handicap was
measured through the VHI questionnaire. The higher the score, the
worse the voice handicap. The vocal samples were presented in a
blind way to 3 Speech-Language Pathologists with experience
longer than 3 years in dysphonia due to the oncological treatment.
Results: a rate of 83% of the patients presented dysphonia, being
42% in severe grade. The roughness was observed in 100% of the
cases. The pitch was considered adequate in 58% and the
resonance was laryngopharyngeal in 67% of the patients. The
impact of the voice handicap self-perception was considered mild in
the three domains. Regarding the global score, the worst impact
was observed in the group of patients with moderate to severe
dysphonia. Conclusion: the dysphonia grade was severe.
However, its impact on the domains evaluated by the VHI was mild.
Those results indicate the evaluation under multiple enfoques.
Thus, the diagnosis should not be performed exclusively by the
specialist clinician, but by the patient himself, as well. The VHI is a
toll internationally employed that allows performing the evaluation
under the patient point of view.
Key words: neoplasm of the larynx; dysphonia; quality of life.
Descritores: câncer de laringe; disfonia; qualidade de vida.
INTRODUÇÃO
O diagnóstico precoce do câncer de laringe pode proporcionar
a melhor preservação das funções laríngeas. A radioterapia e a
cirurgia conservadora são opções de tratamento para pacientes com carcinomas glóticos iniciais, com boas taxas de cura1,2.
A técnica de laringectomia fronto-lateral (LFL) é utilizada para o
tratamento de tumores glóticos3, porém, com a retirada do
tumor, há necessidade da reconstrução da região ressecada
para que o resultado funcional promova adequada respiração,
deglutição e voz.
Com o objetivo de facilitar a vibração e/ou aproximação das
estruturas remanescentes, várias técnicas de reconstrução têm
sido utilizadas ao longo dos anos4, sendo opção o retalho
bipediculado do músculo esterno-hióideo com pericôndrio
externo da cartilagem tireóide5. A reconstrução da laringe é
utilizada para a melhora vocal, prevenção da aspiração e
função respiratória adequada6. Esse conjunto de fatores
1) Especialista em Voz. Fonoaudióloga do Serviço de Reabilitação de Voz, Fala e Deglutição, Hospital Heliópolis, São Paulo e do Hospital Ana Costa, Santos. Bolsista Capes do Curso de
Pós-Graduação em Ciências da Saúde do Hospital Heliópolis, São Paulo.
2) Fonoaudióloga do Serviço de Reabilitação de Voz, Fala e Deglutição, Hospital Heliópolis, São Paulo.
3) Doutor em Medicina pelo Curso de Pós-Graduação em Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina; Docente
do Curso de Pós-Graduação em Ciências da Saúde do Hospital Heliópolis, São Paulo. Chefe do Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital Ana Costa, Santos.
4) Mestrando do Curso de Pós Graduação do Hospital Heliópolis, São Paulo.
5) Acadêmica do Curso de Enfermagem da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade Metropolitana de Santos – UNIMES, Santos.
6) Doutor em Ciências pelo Curso de Pós-Graduação do Hospital do Câncer A.C. Camargo da Fundação Antônio Prudente; Chefe do Serviço de Reabilitação de Voz, Fala e Deglutição do
Hospital Heliópolis, São Paulo e do Hospital Ana Costa.
Instituições: Curso de Pós-Graduação em Ciências da Saúde e Serviço de Reabilitação de Voz, Fala e Deglutição do Hospital Heliópolis HOSPHEL, São Paulo; e Serviços de Cirurgia de
Cabeça e Pescoço e de Fonoaudiologia do Hospital Ana Costa.
Correspondência: Rua Cônego Xavier, 276 – 5º andar, 04231-030 São Paulo SP. E-mail: [email protected]
Recebido em: 02/04/2007; aceito para publicação em: 14/05/2007; publicado on line em: 10/06/2007.
Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v. 36, nº 2, p. 95 - 99, abril / maio / junho 2007
95
contribui para uma produção vocal mais satisfatória à medida
que o tecido remanescente seja suficiente para a emissão de
uma voz com mínimo esforço e mais próxima do natural.
Em estudo de 54 pacientes que foram submetidos à LFL com
reconstrução com retalho monopediculado cranialmente, os
resultados funcionais foram insatisfatórios devido à presença
de incompetência glótica em 81% dos casos, hiperfunção das
estruturas supraglóticas, vibração irregular das estruturas
laríngeas, acarretando tempo máximo fonatório reduzido e
qualidade vocal com características de rouquidão, soprosidade
e/ou tensão7. Em outra série, observou-se a preservação da
voz em 86% dos pacientes e tempo máximo fonatório variando
de 4 a 8 segundos8.
Foi comparada a função vocal de 27 pacientes com T1a glótico
submetidos à LFL, sendo 14 com reconstrução com retalho de
mucosa de falsa prega vocal e 13 sem reconstrução da prega
vocal. A análise vocal foi baseada na extração do tempo
máximo fonatório e na avaliação objetiva, através de medidas
acústicas antes e um ano após a cirurgia. Verificou-se menor
incidência de granuloma no pós-operatório e melhores
resultados vocais nos pacientes que receberam reconstrução.
A avaliação objetiva demonstrou melhora nas medidas de
freqüência com o passar do tempo de pós-tratamento9. Na
avaliação dos mecanismos fonatórios após a LFL com e sem
reconstrução de mucosa de falsa prega vocal antes da cirurgia,
após um ano e após dois anos de cirurgia, os resultados
demonstraram que as estruturas supraglóticas participaram do
fechamento laríngeo e da produção vocal em 80% dos casos,
com participação da mucosa da falsa prega vocal em 54%10.
Quinze pacientes com T2 de laringe submetidos à laringectomia com reconstrução de retalho miofacial de platisma foram
analisados antes e após a cirurgia. A função fonatória foi
analisada através de vídeo-estroboscopia e análise vocal
subjetiva e objetiva. Os resultados demonstraram boa coaptação glótica e qualidade vocal aceitável no pós-operatório11.
No estudo da produção vocal de 69 pacientes submetidos a
laringectomias parciais (50 LFL e 19 hemilaringectomia), os
resultados vocais foram melhores no grupo submetido à
hemilaringectomia, pois as cirurgias maiores receberiam
reconstrução de maior porte, garantindo que as estruturas
remanescentes e sua respectiva reconstrução não sofram
tanto o efeito da fibrose e, assim, as vozes têm características
mais grave e rouca, o que justifica o melhor aceite social
quando comparada às vozes mais tensas e ásperas, resultado
das LFL12. Em estudo retrospectivo da função vocal de 25
pacientes submetidos a diferentes tipos de laringectomias
parciais (oito LFL, nove LFL ampliadas, seis hemilaringectomias e duas subtotais), houve predomínio da fonação supraglótica. O pitch foi adequado e a qualidade vocal não apresentou
relação com a fenda fonatória13.
Embora a análise vocal faça parte da avaliação do resultado
funcional do tratamento, a qualidade da voz engloba componentes psicossociais, físicos e emocionais que, muitas vezes,
podem ficar comprometidos após a cirurgia. O impacto poderá
variar de acordo com a demanda vocal, o estilo de vida e os
valores pessoais de cada paciente.
Em 1997, foi publicado o questionário Voice Handicap Index –
VHI (Índice de Desvantagem Vocal) e sua respectiva validação
americana, uma ferramenta que quantifica as conseqüências
psicossociais das alterações vocais14. Esse questionário foi
validado para a língua portuguesa15. O questionário foi criado
com o intuito de conhecer a desvantagem vocal dos indivíduos
que apresentavam distúrbios vocais. Os distúrbios de voz
poderiam ter um impacto devastador no funcionamento diário e
na qualidade de vida dos indivíduos e poucos instrumentos
tentavam avaliar tal questão. Esse questionário permite ainda
caracterizar a necessidade do uso da voz ativamente e
possibilita a auto-classificação da voz como atividade de fala.
A qualidade de vida (QV) de 10 pacientes submetidos à
cordectomia, 11 à LFL com reconstrução de Tucker e oito à
96
cricohioidopexia (CHP) foi estudada. Os pacientes responderam aos questionários UW-QOL e o VHI, com bons resultados
de QV. No questionário da UW-QOL, foram observadas
melhores pontuações para as cirurgias menores, respectivamente, para cordectomia, LFL e CHP. Em relação ao VHI, foi
verificada desvantagem vocal discreta para os três domínios e
desvantagem moderada para o escore global nas três cirurgias16.
O impacto da laringectomia na QV de 14 laringectomizados
totais e 16 laringectomizados parciais (LFL com reconstrução a
esterno-hióideo bipediculado) foi analisado. Os pacientes
responderam ao questionário QLQ-C30 e o H&N35 da EORTC,
que avaliam a QV e ao Beck Depression Inventory
Questionnaire, que rastreia depressão. Os dois grupos tiveram
boas pontuações em relação à QV e não foi rastreado depressão17.
O objetivo desse estudo foi avaliar as características vocais e a
auto-percepção da desvantagem vocal de pacientes submetidos à LFL com reconstrução pelo retalho bipediculado do
esterno-hióideo
CASUÍSTICA E MÉTODO
Esse estudo prospectivo avaliou 12 pacientes submetidos à
LFL, com reconstrução pelo retalho bipediculado do esternohióideo, tratados no Hospital Ana Costa, Santos e na Irmandade
da Santa Casa da Misericórdia de Santos. O critério de inclusão
para admissão no estudo foi tempo mínimo três meses do
término do tratamento oncológico. Os critérios de exclusão
foram: doença em atividade, outras cirurgias na região da
cabeça e pescoço e história pregressa de alterações neurológicas, pela possível interferência desta na fisiologia da deglutição
e da comunicação oral.
Para a caracterização da voz e o índice de desvantagem vocal,
os pacientes foram submetidos à avaliação perceptivo-auditiva
e responderam ao questionário VHI. Para a análise perceptivoauditiva, foram registradas amostras vocais da emissão
sustentada da vogal /a/ gravada na intensidade e freqüência
habitual, contagem de números de 1 a 10 e trecho de fala
encadeada com o paciente em pé com distância fixa de 15 cm
entre a boca do falante e o microfone profissional da marca
Shure®. Para a análise perceptivo-auditiva, utilizou-se a escala
GIRBAS18. No momento do julgamento da rugosidade, a
amostra foi também caracterizada em rugosa com predomínio
de rouquidão e rugosa com predomínio de aspereza, devido às
características intrínsecas do resultado vocal esperado para
esse tipo de cirurgia. O pitch foi julgado como adequado, grave
ou agudo e a ressonância, como equilibrada, laringofaríngica,
faríngea ou hipernasal. Para a avaliação do tempo máximo
fonatório, foi utilizado um cronômetro profissional da marca
Cássio® e o paciente foi orientado a inspirar e emitir a vogal /a/
sustentada prolongada três vezes, sendo considerado o maior
tempo.
Para quantificar a desvantagem vocal, os pacientes responderam ao VHI15, questionário composto por três domínios:
funcional, físico e emocional, cada domínio contendo 10
questões que variam de zero a quatro, sendo zero a melhor
pontuação e quatro a pior pontuação. O valor da pontuação dos
domínios é determinado pela somatória das respostas dadas
pelos pacientes e a pontuação total é definida pela somatória
dos três domínios, podendo variar de 0 a 120. Assim, quanto
maior a pontuação, pior é a desvantagem vocal. Pontuações de
0 a 40 indicam impacto discreto ou ausência de impacto; de 41 a
60, impacto moderado; e, de 61 a 100, impacto severo19.
As amostras vocais foram apresentadas para três fonoaudiólogos com experiência superior a cinco anos em disfonias
decorrente de tratamento oncológico. A análise foi feita por meio
de consenso após três apresentações das amostras vocais.
A análise estatística consistiu de distribuição de freqüência para
as variáveis categóricas e as medidas de tendência central e de
variabilidade para as variáveis numéricas. Foi analisada a
associação entre as diferentes formas de avaliação.
Tabela 2. Características perceptivo-auditiva da voz (n=12).
Variáveis
RESULTADOS
Participaram 12 pacientes, com idade média de 66,5 anos. O
tempo decorrido do término do tratamento oncológico ao
momento da investigação variou de quatro meses a 10,5 anos.
Seis pacientes foram submetidos à cirurgia exclusiva como
forma de tratamento e seis pacientes foram submetidos à
radioterapia pós-operatória com dosagem média de 6006cGy
(tabela 1).
Tabela 1 – Número, porcentagens e medidas de pacientes segundo
características demográficas e clínicas (n=12).
Grau da disfonia
Categorias
Freqüência
ausente
2 (17)
discreta
2 (17)
moderada
Rugosa
3 (25)
grave
5 (42)
ausente
0
discreta
5 (42)
com predomínio de rouquidão moderada
Variável
Categoria
Freqüência ou medidas
Gênero
Masculino
10 (83)
Feminino
2 (17)
Mín. - máx.
43-88
Mediana
70
Média±dp
66,5±12,6
1b
8 (67)
Idade
T
5 (42)
grave
2 (17)
ausente
6 (50)
Rugosa
discreta
1 (8)
com predomínio de aspereza
moderada
3 (25)
2
4 (33)
grave
2 (17)
N
0
12 (100)
ausente
11 (92)
M
0
12 (100)
Tratamento
Cirurgia exclusiva
6 (50)
discreta
1 (8)
moderada
0
Soprosidade
Cirurgia e radioterapia 6 (50)
Reconstrução
Bailey
Dose de radioterapia (cGy) Mín.-máx.
12 (100)
Mediana
6000
Média±dp
6006±1102
Tensão
Mín.: mínimo; Máx.: máximo; dp: desvio padrão.
A avaliação perceptivo-auditiva demonstrou disfonias de grau
severo em 42% dos pacientes com predomínio de rugosidade
(rouquidão e aspereza) e tensão. A ressonância foi classificada
como laringofaríngea em 67% dos pacientes (tabela 2).
Em relação às medidas temporais, o tempo máximo fonatório
variou de 5,1 segundos a 12 segundos com média de 7,85
segundos, abaixo do esperado.
O VHI indicou desvantagem vocal de grau leve ou ausência de
impacto para todo o grupo. A média dos três domínios não foi
maior que 14,5 pontos e o VHI global apresentou pontuação
média de 25,41±14,88.
A tabela 3 demonstra associação entre a percepção do clínico
em relação à qualidade vocal e à auto-percepção do paciente
da desvantagem vocal. Quando os fonoaudiólogos julgaram a
voz como disfônica moderada e severa, o paciente referiu
também pior desvantagem vocal para o domínio funcional,
físico e global (tabela 3).
Em relação à auto-classificação da demanda vocal, sete
pacientes referiram necessitar da voz para a conversação
diária e cinco referiram necessitar da voz para o exercício da
profissão. Não foi observada diferença em relação à autopercepção da desvantagem vocal e às diferentes demandas
vocais. Quanto à caracterização da voz para atividade de fala,
dois pacientes classificaram-se como quietos, quatro como
conversadores e seis como muito conversadores.
Ao comparar os grupos de pacientes quieto, conversador e
muito conversador, não observamos relação direta entre o
perfil de auto-classificação do pacientes em relação à atividade
de fala e o impacto da alteração vocal. A desvantagem vocal foi
discreta em todos os domínios independente da classificação
de atividade de fala (tabela 4).
0
grave
5000-7020
Pitch
ausente
4 (33)
discreta
3 (25)
moderada
4 (33)
grave
1 (8)
adequado
7 (58)
grave
2 (17)
Agudo
3 (25)
adequada
3 (25)
laringofaríngea 8 (67)
Ressonância
Posterior
1 (8)
Tabela 3 – Associação entre o grau da disfonia e a desvantagem vocal
referida pelo paciente (n=12).
Variáveis
VHI funcional
VHI físico
Categorias G3 (n=5) G2 (n=3) G1 (n=2) G0 (n=2)
3-19
3-5
2-2
Mediana
Mín.-máx. 6-17
10
10
4
2
Média±dp
11±4
10,6±8
4±1,41
2±0
9-25
2-14
6-9
Mín.-máx. 9-10
Mediana
19
18
8
7,5
Média±dp
18±8,4
17,3±8
8±8,4
7,5±2,1
0-8
1-2
2-2
VHI emocional Mín.-máx. 1-4
VHI global
Mediana
3
4
1,5
2
Média±dp
2,8±1,3
4±4
1,5±0,7
2±0
12-52
6-21
10-13
32
13,5
11,5
Mín.-máx. 23-51
Mediana
29
Média±dp
31,8±11,3 32±20
13,5±10,6 11,5±2,1
VHI: Voice handicap index; G3: disfonia grave; G2= disfonia moderada;
G1: disfonia discreta; G0: Ausência de disfonia; Mín.: mínimo; Máx.:
máximo; dp: desvio padrão.
97
Tabela 4. Associação entre as pontuações do questionário VHI e a
auto-classificação da voz como atividade de fala (n=12).
Variáveis Categorias Quieto
Conversador
Muito conversador
(n=4)
(n=6)
3-10
2-19
7,5
8
Média±dp 10±9,8
7±3,5
8,5±6,5
VHI
Mín.-máx. 9-30
2-18
6-25
físico
Mediana
12,5
14
Média±dp 19,5±14,8
11,2±6,8
14,8±7,8
Mín.-máx. 0-4
1-4
1-8
2,5
2
Média±dp 2±2,8
2,5±1,2
3±2,5
VHI
Mín.-máx. 12-51
6-32
10-52
global
Mediana
22,5
26
20,7±10,8
26,5±15
(n=2)
VHI
Mín.-máx. 3-17
funcional Mediana
VHI
emocional Mediana
10
19,5
2
31,5
Média±dp 31,5±27,5
VHI: Voice handicap index; Mín.: mínimo; Máx.: máximo; dp: desvio
padrão.
DISCUSSÃO
A preservação das funções básicas da laringe (respiração,
proteção das vias aéreas inferiores durante a deglutição e a
fonação) é o principal objetivo do tratamento oncológico após a
cura. Entretanto, nem sempre é possível contemplar todos
esses aspectos de forma igualitária. Nas cirurgias parciais de
laringe, a reconstrução glótica, seja ela qual for, tem o objetivo
de preservar e manter a estabilidade dos tecidos remanescentes e privilegiar, sempre que possível, a eficiência fonatória.
Portanto, a reconstrução é um fator chave para o fechamento
glótico para um melhor resultado vocal4. Em contraponto, no
estudo de uma série de laringectomias parciais, a voz foi
melhor quando a fonte sonora era localizada na supraglote12.
As características dos resultados funcionais são fatores
importantes na avaliação do sucesso da cirurgia parcial de
laringe. Para avaliar os resultados funcionais de determinado
tratamento, é necessário o controle de muitas variáveis, como
tamanho e homogeneidade da amostra em relação ao
estadiamento do tumor, extensão da cirurgia, tipo de reconstrução e combinação do tratamento (cirurgia, radioterapia e/ou
quimioterapia). Em nosso estudo, consideramos a amostra
homogênea, desde que todos os pacientes foram operados
pela mesma equipe de cirurgiões e todos pacientes foram
submetidos ao mesmo tipo de reconstrução.
Para a análise vocal, foi realizada a avaliação perceptivoauditiva por meio da escala GIRBAS, para facilitar a identificação dos parâmetros analisados e a comparação dos resultados
do estudo com o que já foi descrito na literatura. Nessa
amostra, 83% das vozes eram disfônicas, com predomínio do
grau severo. A qualidade vocal foi rugosa com predomínio de
rouquidão em 100% dos pacientes e rugosas com predomínio
de aspereza em 50% dos casos. A tensão estava presente em
67% da amostra analisada. Esses resultados são compatíveis
com o que já foi descrito anteriormente, respeitando a variabilidade do ajuste e o comportamento das estruturas vibrantes7,12,17.
Em nossa amostra, foi observado que, embora todas as vozes
fossem classificadas como disfônicas, a desvantagem vocal
percebida e referida pelo paciente foi discreta, mesmo no grupo
de pacientes com alteração grave. Analisando de forma mais
específica, o domínio físico (maiores pontuações quando
comparado com o funcional e emocional) parece refletir de
forma clara a dificuldade do ponto de vista orgânico da
produção vocal. Por outro lado, a alteração vocal parece não
interferir na vida do paciente do ponto de vista emocional
(menores pontuações quando comparado aos domínios físico
e funcional). Acreditamos que, embora a voz tenha função
indiscutível no dia-a-dia das pessoas, a experiência do
98
diagnóstico do câncer modifica a percepção e, provavelmente,
também as expectativas dos pacientes que sobrevivem ao
câncer e esses resultados estão de acordo com outros estudos16,17.
Outro fator que pudemos observar foi a concordância entre a
percepção do clínico e do paciente. Quando a disfonia foi
caracterizada de grau moderado ou severo, o paciente também
fez maior pontuação, indicando maior perturbação em relação
ao domínio avaliado. Todavia, quando avaliamos o grau de
desvantagem em relação à auto-classificação da demanda
vocal, os resultados ficaram embaraçados de ser interpretados,
justificado pelo fato de que os pacientes que se julgaram como
quietos referiram maior desvantagem do que os pacientes
extremamente conversadores.
Sabemos que a avaliação dos resultados funcionais é importante para a análise dos resultados do tratamento oncológico e
posterior discussão de propostas de modificação do tratamento
para obtenção de melhor função remanescente. Contudo,
estudos recentes enfatizam a importância da avaliação da autopercepção do paciente em relação à sua disfunção e nossos
resultados permitem concordar com essa afirmativa.
CONCLUSÃO
Constatamos disfonia de grau severo, porém, com impacto
discreto nos domínios avaliados pelo VHI. As vozes são
julgadas com grau de severidade pior pelo clínico do que pelo
paciente e esses dados reforçam a indicação de avaliações
com múltiplos enfoques, onde o diagnóstico não seja apenas do
especialista, mas também do paciente. O VHI é uma ferramenta
utilizada internacionalmente que viabiliza a avaliação do ponto
de vista do paciente.
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Páginas 95-99 - Sociedade Brasileira de Cirurgia de Cabeça e