ASPECTOS JURÍDICOS DA FRAUDE DE ENERGIA ELÉTRICA
Érika Wilza Brito de Assis1
RESUMO
A evasão de tributos, o comprometimento do resultado e indicadores das concessionárias, o impacto
na tarifa, tudo isso faz com que as perdas de energia elétrica sejam uma preocupação nacional.
Diante disso, o presente artigo busca abordar os diversos aspectos jurídicos que envolvem a fraude
de energia elétrica, desde as formas de combate, até sua resolução no âmbito do Judiciário,
passando por questões controversas que envolvem o tema. Também serão pontuadas as correlações
existentes entre os diversos ramos do direito e o tema em estudo. Levantar esse debate fazer com
que essa matéria seja difundida no meio jurídico é também uma das vigas mestras do presente
estudo. A pesquisa desenvolve-se basicamente pela análise de diplomas legislativos e
jurisprudências, com apoio na escassa doutrina existente sobre o tema.
Palavras-Chaves: Concessão. Energia Elétrica. Irregularidade
1 INTRODUÇÃO
As perdas não-técnicas de energia elétrica são um dos maiores desafios das empresas
distribuidoras de energia elétrica do Brasil e do mundo. Estas perdas, que também são denominadas
de perdas comerciais, repercutem sob os usuários de duas maneiras principais: uma quando é
realizada a revisão tarifária2, na qual a ANEEL - Agência Nacional de Energia Elétrica permite que
um percentual das perdas das concessionárias seja remunerado na tarifa seguinte 3; a outra quando a
concessionária deve suportar o percentual não incluído na tarifa, o que provoca inevitável reflexo
no serviço, uma vez que a concessionária terá que deixar de aplicar recursos na melhoria das
atividades para direcioná-los ao combate as perdas.
Dentre as várias origens de perdas não-técnicas destacaremos aqui o furto/fraude de
energia elétrica. Nem sempre as variáveis que colaboram ou interferem na elevação do furto/fraude
de energia elétrica estão associadas a fatores diretamente vinculados às concessionárias, muitas
vezes eles são externos às organizações, tais como: baixo nível de renda da população, situação
econômica do país, elevação da carga tributária, ocupação desordenada das cidades, taxa de
1
Concludente do Curso de Bacharelado em Direito do CEUT, Turma 2009.2. Trabalho apresentado para a
obtenção
do título de Bacharel em Direito.
2
As revisões tarifárias são feitas ordinariamente a cada 05 (cinco) anos e têm por objetivo restabelecer o equilíbrio
econômico-financeiro da concessão. As revisões também podem ser solicitadas extraordinariamente pelas
Concessionárias sempre que algum evento provoque significativo desequilíbrio financeiro na concessão. Nesse caso, o
Contrato de Concessão deve ser revisto e auditado para assegurar a justa remuneração. O objetivo é manter intacto o
equilíbrio entre a prestação do serviço e a remuneração.
3
Conforme Resolução 456/2000 da ANEEL.
desemprego, elevação dos índices de criminalidade, inércia na ação policial, falta de agilidade da
justiça, cultura da impunidade e percepção generalizada da população de que o furto/fraude de
energia elétrica não é crime (cultura da fraude).
Essa cultura, que existe em relação ao furto/fraude de energia elétrica, resulta do pouco
conhecimento que a sociedade tem acerca dos prejuízos decorrentes dessas práticas, como:
I- Risco de acidentes. Uma vez que, na maioria das vezes, o fraudador não possui
conhecimento técnico e nem tampouco obedece aos procedimentos de segurança.
II- Evasão de tributos, tais como: ICMS, COFINS, PIS, IRPJ, CSSL. O que acentua a
falta de recursos para aplicação em educação, saúde, segurança pública, transporte, etc. A título de
exemplo, durante o ano de 2006, somente no Estado do Maranhão, a União deixou de arrecadar R$
58.829.708,95 (cinqüenta e oito milhões, oitocentos e vinte e nove mil, setecentos e oito reais e
noventa e cinco centavos); em 2007 esses valores foram de R$ 63.321.835,57 (sessenta e três
milhões, trezentos e vinte e um mil, oitocentos e trinta e cinco reais e cinqüenta e sete centavos)4;
III- Concorrência desleal no mercado, na medida em que o fraudador pode vender seu
produto mais barato;
IV- Elevação da tarifa, provocada pelo descompromisso do fraudador com a
conservação e uso racional da energia elétrica, o que implica em perda de competitividade
econômica do Estado, uma vez que os grandes empreendimentos migram para os locais onde seus
insumos sejam mias baratos;
V- Redução do faturamento das concessionárias, e conseqüentemente da arrecadação; o
que implica em diminuição de recursos a serem investidos na manutenção e melhoria do parque
elétrico.
VI- Comprometimento dos indicadores de continuidade5 das concessionárias,
considerando que as ligações clandestinas, pela sua precariedade, provocam interrupções no
fornecimento de energia elétrica;
VII- Comprometimento do resultado das concessionárias de energia elétrica.
Diante dessa realidade, faz-se necessário o desenvolvimento de ações de combate ao
furto/fraude de energia, tais como: desenvolvimento de novas tecnologias de combate às perdas;
desenvolvimento de ações de inteligência no combate ao furto/fraude de energia, através do
diagnóstico das perdas e de melhores estratégias de detecção e combate; troca das melhores práticas
de combate entre as empresas, buscando sempre constantes inovações; elaboração de campanhas
4
5
Dados estipulados em estudo realizado pela Gerência de Recuperação de Energia da Companhia Energética do
Maranhão - CEMAR, no ano de 2008.
Parâmetros que representam o desempenho de um sistema elétrico. São utilizados para mensuração da continuidade
apurada e análise comparativa com os padrões estabelecidos através dos índices indicados pela ANEEL.
educativas de prevenção; desenvolvimento de programas de eficiência para comunidades de baixa
renda; ação em conjunto com a Polícia; ação em conjunto com o Judiciário; entre outras.
Nesse diapasão, podemos dividir as ações de combate ao furto/fraude de energia elétrica
em três grupos:
I- Solução social;
II- Solução técnica; e
III- Solução legal.
Em face de tudo o que foi acima exposto, este trabalho busca abordar os aspectos
jurídicos da fraude de energia elétrica, desde as soluções propostas para sua erradicação, sobretudo
as soluções legais, passando por sua “descoberta”, através das inspeções/fiscalizações, até sua
resolução no âmbito do judiciário, envolvendo ainda questões ainda não pacíficas sobre o tema.
1.1 Conceitos
Para uma melhor compreensão do presente trabalho faz-se mister elencarmos alguns
conceitos que são de fundamental importância para o tema em apreço.
Perdas não técnicas - São aquelas que ocorrem no repasse aos usuários.
Furto de energia elétrica - Ocorre o furto de energia elétrica quando há conexões
clandestinas, auto-reconexões (ligado direto - LD) e desvios antes da medição6.
Fraude de energia elétrica - A fraude de energia elétrica é caracterizada pela
manipulação dos equipamentos de medição, alterando o valor correto da sua precisão para valores
inferiores aos reais7.
Inspeção - Chama-se inspeção a vistoria técnica realizada no padrão de entrada8 da
unidade consumidora visando detectar a precisão e possíveis defeitos dos equipamentos de
medição, detectar fraudes e/ou desvios de energia e verificar erros de ligação.
Consumo não registrado - Consumo que não foi faturado e, conseqüentemente, não foi
pago, em razão de ter sido camuflado pelo consumidor.
Tarifa - Preço público pago pelo usuário pela prestação do serviço. É fixada pelo valor
da proposta vencedora da licitação e preservada pelas regras de revisão, previstas na lei, no edital e
no contrato, que garantem o equilíbrio econômico-financeiro9 da concessionária. As tarifas poderão
6
7
8
9
Tipificados no artigo 155, III do Código Penal.
Cumpre ressaltar que a fraude de energia elétrica também é um tipo de furto de energia.
Conjunto de instalações composto por caixa de medição, sistema de aterramento, condutores e outros acessórios. O
mesmo deve obedecer a normas técnicas e de segurança.
É o direito à equivalência entre vantagens e encargos estabelecidos entre o Poder Concedente e a Concessionária,
assegurando-se uma justa remuneração pela atividade desenvolvida. Trata-se de garantia dada pelo Poder Concedente
ser diferenciadas em função das características técnicas e dos custos específicos provenientes do
atendimento aos distintos segmentos de usuários, sendo os critérios de preços correspondentes aos
serviços prestados supervisionados e normatizados pela ANEEL. A concessão de qualquer
benefício tarifário poderá ser atribuída a uma classe ou coletividade de usuários dos serviços,
vedado, sob qualquer pretexto, o benefício singular. Matéria contida nos artigos 9° e 13 da lei
8.987/95 e parágrafo único do artigo 35 da lei 9.074/95.
Unidade consumidora - Conjunto de instalações e equipamentos elétricos caracterizado
pelo recebimento de energia elétrica em um só ponto de entrega, com medição individualizada e
correspondente a um único consumidor.
2 DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS
A princípio, realce salientarmos algumas disposições constitucionais que dizem respeito
à competência para a exploração dos serviços de energia elétrica e a possibilidade de sua atribuição
a terceiros, mediante concessão.
A atividade econômica do Estado, só é admitida excepcionalmente, conforme art. 173
da Constituição Federal, reservando-se o exercício estatal para os imperativos da segurança
nacional ou de relevante interesse coletivo, quando a administração atua diretamente, por
reconhecer a essencialidade e necessidade para a coletividade e para o próprio Estado.
Nesse contexto, dispõe o art. 20, inciso VIII da nossa Carta Magna, que os potenciais de
energia hidráulica são bens da União. Logo em seguida, autoriza a delegação de serviços. É o que
dispõe o art. 21, inciso XII, alínea “b” da Constituição Federal. In verbis:
Art. 21 - Compete à União:
XII - explorar diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão:
b) os serviços e instalações de energia elétrica e o aproveitamento energético dos cursos de
água, em articulação com os Estados onde se situam os potenciais hidroenergéticos.
Cumpre observarmos que a exploração da energia elétrica envolve não apenas a sua
produção, como também sua distribuição. Com a desverticalização10, os serviços de energia elétrica
foram divididos em três atividades distintas: geração, transmissão e distribuição, todas como
atividades independentes e, por determinação legal, impedidas de serem prestadas pela mesma
de que a concessão não sofrerá, por algum evento, o desequilíbrio na equação econômico-financeira, a ponto de ter a
concessão abalada. Os reajustes tarifários oferecem à concessionária a perspectiva de que, no período entre as revisões
tarifárias, o seu equilíbrio econômico-financeiro não sofrerá corrosão por processo inflacionário.
10
Conceito desenvolvido pelo RESEB (Projeto de Reestruturação do Setor Elétrico Brasileiro), em prática pelo Órgão
Regulador ANEEL. Rege a matéria o §5° do artigo 4°, da Lei 9.074/95, modificado pelo artigo 8° da Medida
Provisória 144, de 10 de dezembro de 2003.
pessoa jurídica. Dessa forma, podemos concluir que a distribuição da energia elétrica é serviço
delegado pela União mediante concessão.
Ainda sobre as concessionárias de serviços públicos e suas características, assim
estabelece o artigo 175 da Constituição Federal. In verbis:
Art. 175 - Incube ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de
concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.
Parágrafo único: A lei disporá sobre:
I- o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter
especial de seu contrato e da sua prorrogação, bem como as condições de caducidade,
fiscalização e rescisão da concessão ou permissão;
II- os direitos dos usuários;
III- política tarifária;
IV- a obrigação de manter o serviço adequado.
Conforme podemos deduzir do citado artigo, lei infraconstitucional irá dispor sobre o
regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, caráter especial de seu
contrato, condições de caducidade e fiscalização, direitos dos usuários, política tarifária, entre
outros. É o que veremos mais adiante.
2.1 Princípios Constitucionais x Fraude de Energia
Sabemos que muitos são os princípios insculpidos em nossa Constituição Federal de
1988, todavia destacaremos aqui apenas os que mais apresentam relevância para o tema em estudo.
I- Princípio do acesso à justiça - art. 5°, inciso XXXV da Constituição Federal. Dispõe
que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.
De um modo geral, poucos comentários temos a tecer sobre o referido princípio. Além
de auto-explicativo, não há grandes controvérsias envolvendo o tema. Sempre que o consumidor de
energia elétrica busca a Justiça por considerar que seu direito foi lesionado ou ameaçado, ainda que
seja comprovadamente um “fraudador” terá o acesso à justiça garantido.
II- Princípio da ampla defesa e do contraditório - art. 5ª, inciso LV da Constituição
Federal. Estabelece que aos litigantes em processo judicial ou administrativo serão assegurados o
contraditório e a ampla defesa.
Nesse sentido, a ANEEL - Agência Nacional de Energia Elétrica, delegatária da União
na competência normativa técnica sobre o setor de energia elétrica, regulou o uso das inspeções
pelas Concessionárias de Energia Elétrica, reconhecendo-lhes o direito de combater a maléfica
prática de fraude, mas impondo-lhes uma série critérios a serem observados para a validade da
inspeção.
A inspeção realizada pela concessionária permite ao consumidor a ampla defesa e o
contraditório. Destacaremos aqui alguns exemplos práticos, disponibilizados ao consumidor durante
o procedimento das fiscalizações e na formatação dos processos administrativos de consumo não
registrado.
Durante a inspeção, o consumidor poderá solicitar o acompanhamento de um técnico
em eletricidade particular. Dessa maneira, o mesmo terá o respaldo de um técnico com
conhecimentos específicos em energia elétrica, que irá acompanhar os inspetores da concessionária
na realização da fiscalização. Apesar de não ser este um procedimento necessário, uma vez que os
inspetores da concessionária realizarão todos os procedimentos conforme determina a ANEEL,
independente do acompanhamento ou não, de um técnico particular, representa mais uma garantia
para o consumidor.
Após a formatação do processo administrativo de consumo não registrado - CNR, o
consumidor é informado acerca da existência do referido processo, dessa forma, o mesmo tem a
possibilidade de apresentar defesa administrativa (recurso) junto à concessionária, além de ainda
poder recorrer à própria ANEEL, conforme artigo 78, parágrafos 1º, 2º e 3º da Resolução 456 da
ANEEL.
Ainda nesse sentido, caso não concorde com aferição realizada pela concessionária em
seu medidor, poderá solicitar aferição11 em Órgão Metrológico Oficial. É o que dispõe o §3º, do
artigo 38 da Resolução 456 da ANEEL, in verbis:
Art. 38- O consumidor poderá exigir a aferição dos medidores, a qualquer tempo, sendo que
as eventuais variações não poderão exceder os limites percentuais admissíveis.
(...)
§3º- Persistindo dúvida o consumidor poderá, no prazo de 10 (dez) dias, contados a partir
do recebimento da comunicação do resultado, solicitar a aferição do medidor por órgão
metrológico oficial, devendo ser observado o seguinte:
I- quando não for possível a aferição no local da unidade consumidora, a concessionária
deverá acondicionar o medidor em invólucro específico, a ser lacrado no ato de retirada, e
encaminhá-lo ao órgão competente, mediante entrega de comprovante desse procedimento
ao consumidor;
II- os custos de frete e de aferição devem ser previamente informados ao consumidor; e
III- quando os limites de variação tiverem sido excedidos os custos serão assumidos pela
concessionária, e, caso contrário, pelo consumidor.
Em síntese, o contraditório é constituído por dois elementos: informação e reação. Sua
configuração é que permite a ampla defesa. Dessa forma, atendidas as premissas estabelecidas pela
regulação, não há que se falar que os procedimentos de inspeção realizados pelas concessionárias
são unilaterais.
Os direitos e garantias individuais são limitadores da atuação administrativa, uma vez
que são automaticamente inconstitucionais todos os atos que atentem contra qualquer princípio
previsto no art. 5° da Constituição Federal. Conclui-se, portanto, que o combate à fraude de energia
não pode implicar em ofensa aos princípios do acesso à justiça e da ampla defesa e do contraditório,
11
Procedimento técnico realizado com a finalidade de verificar a precisão do equipamento de medição de energia
elétrica, observando se o mesmo está em conformidade com os padrões definidos pela ANEEL.
assegurados constitucionalmente. Em sentido contrário, não pode o consumidor socorrer-se destes
princípios para agir de forma não compatível com a adequada utilização do serviço.
2.2 Da Inviolabilidade do Domicílio
Exposta no artigo 5°, inciso XI da Constituição Federal, informa que a casa é asilo
inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em
caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação
judicial.
A referida garantia constitucional traz à baila alguns questionamentos quando
analisamos os procedimentos realizados durante as fiscalizações promovidas pelas concessionárias
de energia elétrica nas unidades consumidoras. Em uma primeira análise, parece haver notória
violação ao referido direito fundamental, quando da realização das inspeções, todavia, para que
possamos melhor compreender as dúvidas que comumente são apresentadas, faz-se mister detalhar
o funcionamento das mesmas.
Após a seleção dos alvos, que, em síntese, podem ser aleatórios, automáticos ou
determinados por um sistema de inteligência, os inspetores da concessionária se deslocam até a
unidade consumidora12 e lá realizam uma vistoria técnica no padrão de entrada, visando detectar a
precisão e possíveis defeitos dos equipamentos de medição, fraudes e/ou desvios de energia e
verificar erros de ligação. Não obstante a vistoria realizada no padrão de entrada, após a autorização
do consumidor mediante assinatura na ficha de inspeção técnica, os inspetores podem ainda fazer
verificações internas no imóvel, visando detectar possíveis problemas nas instalações internas e/ou
desvios embutidos13.
Nesse diapasão, o artigo 37 da Resolução 456 da ANEEL informa que o consumidor
deve assegurar o livre acesso dos inspetores aos locais em que os equipamentos de medição estejam
instalados. In verbis:
Art. 37- A verificação periódica dos medidores de energia elétrica instalados na unidade
consumidora deverá ser efetuada segundo critérios estabelecidos na legislação metrológica,
devendo o consumidor assegurar o livre acesso dos inspetores credenciados aos locais em
que os equipamentos estejam instalados.
Dessa forma, quando a vistoria está sendo realizada no padrão de entrada, não há que se
falar em violação do direito fundamental da inviolabilidade do domicílio, posto que expressamente
12
Unidade consumidora é o conjunto de instalações e equipamentos elétricos caracterizado pelo recebimento de energia
elétrica em um só ponto de entrega, com medição individualizada e correspondente a um único consumidor.
13
Desvios embutidos são aqueles não facilmente detectáveis, instalados antes da medição. São cabos que normalmente
se encontram incrustados em paredes, teto ou solo. Os mesmos criam caminhos mais curtos para a passagem da
energia elétrica, que desvia de seu percurso normal; dessa forma a mesma será consumida, mas não será efetivamente
registrada pelos equipamentos de medição.
autorizado por legislação normativa do setor. Importante ressaltar que para chegar a essa conclusão
foi considerado que os equipamentos de medição (padrão de entrada) estejam instalados na área
externa da residência (externalização da medição), o que é recomendado pela ANEEL e que
veremos com maior detalhe mais adiante.
Por outro lado, o próprio dispositivo constitucional ressalva que ninguém poderá
adentrar o domicílio do indivíduo, se, e somente se, não houver o consentimento do mesmo.
Conforme anteriormente visto, os inspetores somente realizam verificações internas, quando há
expressa autorização do consumidor.
Conclui-se, portanto, que apesar de alguns poucos questionamento no sentido de colocar
em xeque a atuação dos inspetores das concessionárias durante a realização das fiscalizações, desde
que respeitado o direito de inviolabilidade do lar, não há qualquer irregularidade nas mesmas.
3 IMPLICAÇÕES NO DIREITO ADMINISTRATIVO
Inicialmente, faremos algumas considerações sobre serviços públicos, serviços de
utilidade pública, e sua possibilidade de delegação. Segundo a tradicional doutrina, serviços
públicos, propriamente ditos, são os que a Administração presta diretamente à comunidade, por
reconhecer a sua essencialidade e necessidade para a sobrevivência do grupo social, e do próprio
Estado. Serviços de utilidade pública são os que a Administração, reconhecendo a sua conveniência
para os membros da coletividade, presta-os diretamente ou aquiesce que sejam prestados por
terceiros, podendo ainda se dividir em serviços uti singuli e uti universi. Os primeiros são aqueles
prestados a usuários determinados, onde é possível dimensionar quem são os indivíduos que
recebem os serviços e cada prestação, são os que têm por finalidade a satisfação individual e direta
das necessidades dos cidadãos. Os segundos são aqueles onde não há possibilidade de
individualização dos seus beneficiários, são os serviços públicos com caráter de generalidade. Os
mesmos são prestados à coletividade, mas usufruídos apenas indiretamente pelos indivíduos. Dessa
forma, em decorrência de sua própria natureza, os serviços uti universi são impassíveis de serem
delegados.
Nesse sentido, podemos concluir que a distribuição de energia elétrica é serviço de
utilidade pública uti singuli delegado pela União mediante concessão. Neste sentido, cumpre
salientarmos algumas características das concessões.
Segundo doutrina majoritária, a concessão corresponde ao contrato administrativo pelo
qual poder público concedente confere ao concessionário (particular ou outro ente público) os
poderes e deveres que legalmente lhe cabem, para que estes os exerçam em seu lugar, como a
execução remunerada de serviço público, devendo fazê-lo pelo prazo e nas condições
regulamentares e contratuais.
A concessão de serviço público, em sua forma tradicional, é disciplinada pela lei
8.987/95 (lei de concessões) e sua remuneração básica, decorre de tarifa paga pelo usuário. Sua
natureza jurídica é de contrato administrativo, sujeito a regime jurídico de direito público. Diante
disso, e em decorrência da própria natureza jurídica das concessões, as concessionárias possuem
prerrogativas e sujeições próprias do poder público, concernentes à finalidade, procedimento,
forma, cláusulas exorbitantes, mutabilidade, etc.. Nesse sentido, possuem normas próprias,
adequadas à situação específica, buscando sempre o equilíbrio dos contratos (art. 37, inciso XXI da
Constituição Federal c/c arts. 5º e 29, inciso V da Lei 8.987/95). Cumpre observar que as
prerrogativas da concessionária sub-rogam nas prerrogativas da Administração.
Sob esta perspectiva, os atos da concessionária possuem presunção de legitimidade juris
tantum (presunção relativa), uma vez que emanados de um ente que, embora não pertença à
administração, está sob seu comando direto. A idoneidade é característica indispensável do
prestador dos serviços públicos. Além disso, o fato da atividade está sendo exercida por um
particular não a desvirtua de seu caráter público/administrativo, uma vez que está sendo regulada
pela própria Administração, que continua como titular da atividade, pois o poder concedente só
transfere ao concessionário a execução do serviço, continuando titular do mesmo. Corroborando
esse entendimento, temos as jurisprudências que seguem abaixo:
Apelação Cível n° 012.030.129.048
Apelante: Espírito Santo Centrais Elétricas S/A
Apelados: Delson Luiz Barcelos e outra
Relator: Arnaldo Santos Sousa
Tribunal de Justiça do Espírito Santo
PROCESSO
CIVIL.
APELAÇÃO
CÍVEL.
ENERGIA
ELÉTRICA.
FISCALIZAÇÃO. INDÍCIOS DE FRAUDE. PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE
DO ATO ADMINISTRATIVO. DANO MORAL NÃO CARACTERIZADO.
SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO.
1. A atuação regular da concessionária/recorrente no sentido de fiscalizar e notificar
possíveis indícios de fraude no consumo de energia não caracteriza dano moral, já que tal
atividade encontra respaldo na lei.
2. Uma vez que não constam dos autos provas efetivas das irregularidades alegadas pelos
autores/recorridos, não há como desqualificar a presunção de legitimidade que reveste o ato
administrativo.
3. Recurso conhecido e provido para reformar a sentença atacada, julgando improcedente o
pedido constante da exordial e invertendo os ônus das sucumbências.
Conclusão: À unanimidade, dar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator.
Apelação com Revisão n° 1171319009
Relator: Des. Fábio Rogério Bojo Pellegrino
31ª Câmara de Direito Privado
Tribunal de Justiça de São Paulo
Pub. DJ em: 14/08/2008
ENERGIA ELÉTRICA - SERVIÇO PÚBLICO DELEGADO - CONCESSIONÁRIA
DE SERVIÇO PÚBLICO - AUTUAÇÃO ADMINISTRATIVA- PODER DE
POLÍCIA
PRESUNÇÃO
DE
LEGALIDADE
E
LEGITIMIDADE
ADMINISTRATIVAS - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA DO CÓDIGO DE
DEFESA DO CONSUMIDOR - INAPLICABILIDADE - PERICÍA JUDICIAL,
ADEMAIS, QUE COMPROVA FRAUDE
1. Os atos fiscalizatórios de concessionária de serviço público delegado gozam de
presunção de legalidade e legitimidade administrativas. Tal presunção afasta a inversão do
ônus da prova do Código de Defesa do Consumidor, por falta de verossimilhança.
2. A presunção de legalidade e regularidade das autuações administrativas no exercício do
serviço público delegado à concessionária apenas é afastada com prova inequívoca, a cargo
do autuado, de abuso de poder ou irregularidade da concessionária, até porque ao autuado é
atribuída a prática de ilícito com lesão a interesse da coletividade.
3. Prova pericial judicial reforçou a presunção, tornando-a certeza, na medida em que
comprovou a adulteração do medidor de energia, na forma do já constatado
administrativamente pela concessionária.
Não obstante essas prerrogativas, a concessionária possui algumas limitações, tais
como: preço, condições de prestação, sujeição à fiscalização do Poder Concedente, sujeição a
sanções e alteração unilateral dos contratos. Nesse sentido, cumpre observar que a ANEEL Agência Nacional de Energia Elétrica é o ente competente para fiscalizar as concessionárias de
energia elétrica de todo o território nacional.
3.1 Relação Jurídica Concessionária x Concedente
Trata-se de relação regida por um contrato administrativo, que goza de prerrogativas e
sujeições (limitações), possuindo previsão expressa do direito de fiscalizar e aplicar sanções,
sempre após aviso prévio. Nesse contexto, torna-se interessante a discussão acerca da prerrogativa
do particular de exercer o poder de polícia visando à defesa do patrimônio concedido.
Segundo a tradicional doutrina, o poder de polícia é a atividade da Administração
consistente em limitar o exercício dos direitos individuais em benefício do interesse público, dessa
forma, pressupõe o uso da autoridade estatal para impedir ações anti-sociais e garantir a
manutenção do interesse coletivo.
Segundo Mello14:
A atividade conhecida entre nós como polícia administrativa - hoje estudada,
preferentemente sob a designação de “Limitações Administrativas à Liberdade e à
Propriedade” - corresponde à ação administrativa de efetuar os condicionamentos
legalmente previstos ao exercício da liberdade e da propriedade das pessoas, a fim de
compatibilizá-lo com o bem estar social. Compreende-se, então, no bojo de tal atividade, a
prática de atos preventivos (como autorizações, licenças), fiscalizadores (como inspeções,
vistorias, exames) e repressivos (multas, embargos, interdição de atividade, apreensões).
O Art. 31 das leis das concessões (lei 8.987/95) informa que é encargo da
concessionária cumprir e fazer cumprir as normas do serviço e cláusulas contratuais da concessão,
bem como zelar pela integridade dos bens vinculados à prestação do serviço e segurá-los
14
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Serviço Público e Poder de Polícia: Concessão e Delegação. In: Revista
Trimestral de Direito Público, n° 20. São Paulo: Malheiros, 1997. p. 23.
adequadamente. Dessa forma, não seria possível a execução dos serviços concedidos se não
houvesse a possibilidade fática da concessionária de zelar pelos bens que lhe foram delegados.
Conclui-se, portanto, que os atos de poder de polícia que podem ser exercidos pelo
particular delegatário de serviço público devem estar legalmente autorizados e necessariamente
vincular-se ao serviço que lhe foi concedido, sob pena de evidente inconstitucionalidade.
Em contrapartida, são responsabilidades que o Poder Concedente tem perante suas
Concessionárias, objetivando a adequação dos serviços concedidos: regulamentar o serviço
concedido e fiscalizar permanentemente sua prestação; aplicar as penalidades cabíveis; intervir na
prestação dos serviços; extinguir as concessões; homologar reajustes e proceder à revisão tarifária;
cumprir e fazer cumprir as disposições regulamentares do serviço e as cláusulas contratuais da
concessão; zelar pela boa qualidade do serviço; receber, apurar e solucionar reclamações e queixas
dos usuários; estimular o atendimento da qualidade e produtividade; preservar e conservar o meio
ambiente; incentivar a competitividade e estimular a formação de associações de usuários para
defesa dos interesses relativos aos serviços. Tudo conforme disposição do artigo 29 da lei 8.987/95.
Em face do que foi acima exposto, podemos concluir que ao poder concedente cabe
legislar e fiscalizar a concessão, aplicando, quando necessário, as penalidades em que a delegatária
incorrer. Por equivalência, à Concessionária cabe a prestação do serviço adequado e a estreita
observância à regulação do setor.
3.2 Relação Jurídica Concessionária x Usuário
O contrato que rege a relação jurídica entre concessionária e usuário não goza de
prerrogativas que lhe revista a condição de instrumento administrativo. Tal contrato é regido pelo
direito privado, uma vez que se trata de uma relação especial de venda de energia. Dessa forma,
algumas características são peculiares a este contrato: embora de adesão, é também sinalagmático,
uma vez que impõe obrigações recíprocas.
A concessionária deve prestar um serviço adequado, disponibilizar informações aos
usuários e responsabilizar-se por possíveis danos causados, por sua vez, aos usuários dos serviços
públicos delegados cumpre a utilização adequada dos serviços, o pagamento da contraprestação
tarifária, bem como a repressão ao uso irregular. Também deve o usuário ser responsabilizado civil
e penalmente pela utilização indevida da energia elétrica.
No que tange aos deveres dos usuários, a lei de concessões públicas acabou por
incumbir os usuários no dever de cooperar com a fiscalização da atividade concedida, impondo-lhe
obrigações como a de observância às normas do poder concedente e a de contribuir para a
preservação dos bens delegados. É o que dispõe o art. 7° da lei de concessões, in verbis:
Art. 7°- Sem prejuízo do disposto na Lei n° 8.078, de 11 de setembro de 1990, são direitos
e obrigações dos usuários:
(...)
IV- levar ao conhecimento do poder público e da concessionária as irregularidades de que
tenham conhecimento, referentes ao serviço prestado;
VI- contribuir para a permanência das boas condições dos bens públicos através dos quais
lhes são prestados os serviços.
É bem interessante quando a própria lei de concessões estabelece como uma das
obrigações do usuário cientificar o poder público e a concessionária, de irregularidades que tenha
conhecimento. Quando estamos lidando com consumidores que fraudam ou furtam energia elétrica,
é mais comum observamos no cotidiano a indiferença dos demais usuários. Estes costumam
considerar que o problema do furto/fraude de energia é única e exclusivamente das concessionárias,
sobretudo porque não têm conhecimento dos diversos prejuízos decorrentes dessas práticas.
Acharmos, enquanto consumidores, que nada temos a ver com o vizinho que furta ou frauda a
energia elétrica, é pensamento demasiadamente individualista, uma vez que, se o fraudador não
paga pelo que consome, alguém paga. E esse alguém somos nós: eu, você e toda a coletividade.
Ainda sobre o dever dos usuários, assim estabelece o artigo 3° da Resolução 456 da
ANEEL, in verbis:
Art. 3°- Efetivado o pedido de fornecimento à concessionária, esta cientificará ao
interessado quanto à:
I- obrigatoriedade de:
(...)
b) instalação, pelo interessado, quando exigido pela concessionária, em locais apropriados
de livre e fácil acesso, de caixas, quadros, painéis ou cubículos destinados à instalação de
medidores, transformadores de medição e outros aparelhos da concessionária, necessários à
medição de consumos de energia elétrica e de demandas de potência, quando houver, e à
proteção destas instalações.
(...)
Conclui-se, portanto, que é dever do consumidor de energia elétrica proteger as
instalações (padrão de entrada) constantes em sua unidade consumidora, bem como manter as
mesmas em locais apropriados e de livre e fácil acesso.
Cumpre observar que a preferência por locais de livre e fácil acesso, também
denominada de externalização da medição15, faz parte de uma série de medidas adotadas com a
finalidade de facilitar o processo de leitura e faturamento dos consumidores, além de possibilitar
uma melhor fiscalização dos aparelhos de medição.
4 ASPECTOS REGULATÓRIOS
15
Vide Resolução 258/2003 ANEEL que trata especificamente do assunto.
O serviço de fornecimento de energia elétrica é regulamentado por algumas leis e
resoluções, que, conforme anteriormente visto, irão dispor sobre o regime das empresas
concessionárias de serviços públicos, caráter especial de seu contrato, condições de caducidade e
fiscalização, direitos dos usuários, política tarifária, entre outros.
Nesse sentido, é importante destacar que as agências reguladoras são instituições criadas
por lei, normalmente sob a forma de autarquia em regime especial, que têm como objetivo regular e
fiscalizar serviços concedidos pelo Poder Público, visando sempre à defesa dos interesses do
consumidor para que receba serviços adequados, eficazes e com preço justo.
Destacaremos aqui os dispositivos legais que são de maior relevância para o presente
estudo.
4.1 Lei de Concessões - Lei 8.987/1995
A lei 8.987/95, que regulou o artigo 175 da Constituição Federal, trouxe em suas
disposições um conjunto de preceitos que devem ser respeitados pelo particular executor do serviço
público. A principal premissa estabelecida na lei de concessões é o conceito de que toda concessão
ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado, em conformidade com o que rege o art.
6°, in verbis:
Art. 6°- Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno
atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta Lei, nas normas pertinentes e no
respectivo contrato.
§1°- Serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade,
eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das
tarifas.
§2°- A atualidade compreende a modernidade das técnicas, do equipamento e das
instalações e a sua conservação, bem como a melhoria e expansão do serviço.
(...)
Cumpre observar que o citado dispositivo encontra-se em perfeita harmonia com o
Código de Defesa do Consumidor, o que nos leva a crer que, quando da redação do mesmo, tenha o
legislador se voltado quase que exclusivamente ao consumidor. Não obstante isso, eles são de
grande importância para o presente estudo, uma vez que revelam alguns dos limites a que está
submetido o ente privado delegatário do serviço público: segurança, generalidade, cortesia,
eficiência, etc.. Nesse sentido, será ilegal qualquer ato praticado pelo concessionário que não se
coadune com as condições de prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários.
De modo contrário, cabe ao usuário respeitar as normas do poder concedente e
contribuir para a permanência das boas condições dos bens públicos através dos quais lhes são
prestados os serviços, obrigações que, conforme anteriormente visto, lhe foram impostas também
pela Lei 8.987/95, em seu artigo 7°.
Ainda nesse contexto, vale à pena ressaltar que a modicidade tarifária é que enseja a
efetiva possibilidade de acesso e utilização do serviço público de energia elétrica pela população,
concorrendo para a universalização do serviço público de energia elétrica.
4.2 Resolução 456/2000 ANEEL
A ANEEL - Agência Nacional de Energia Elétrica tem natureza jurídica de autarquia
sob regime especial, vinculada ao Ministério de Minas e Energia, criada pela lei 9.427 de 26 de
dezembro de 1996, que tem, entre outras, as atribuições de regular e fiscalizar a geração,
transmissão, distribuição e a comercialização de energia elétrica, defendendo o interesse do
consumidor; mediar os conflitos de interesses entre os agentes do setor elétrico e entre estes e os
consumidores; conceder, permitir e autorizar instalações e serviços de energia; garantir tarifas
adequadas e justas; zelar pela qualidade dos serviços; adequar os investimentos necessários ao
setor; assegurar a universalização dos serviços. A ANEEL substituiu o Departamento Nacional de
Águas e Energia Elétrica - DNAEE, extinto pela lei 9.427/96.
A lei 9.427/96, que instituiu a Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL, em seu
artigo 2º assim estabeleceu:
Art. 2º - A Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL, tem por finalidade regular e
fiscalizar a produção, transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica, em
conformidade com as políticas e diretrizes do Governo Federal.
Aí está fixada a competência da ANEEL, como único órgão governamental com
atribuições para definir as condições gerais de fornecimento de energia elétrica. Diante dessa
missão, a ANEEL editou algumas Resoluções com a finalidade de regulamentar o setor elétrico,
dentre elas, a que mais se destaca é a Resolução 456 de 29 de novembro de 2000.
Nesse sentido, destacaremos aqui os artigos da Resolução 456/2000 que representam
maior relevância para o presente estudo e que ainda não foram comentados neste trabalho.
Assim dispõe o artigo 36, in verbis:
Art. 36- Os lacres instalados nos medidores, caixas e cubículos, somente poderão ser
rompidos por representante legal da concessionária.
Parágrafo único. Constatado o rompimento ou violação de selos e/ou lacres instalados pela
concessionária, com alterações nas características da instalação de entrada de energia
originariamente aprovadas, mesmo não provocando redução no faturamento, poderá ser
cobrado o custo administrativo adicional correspondente a 10% (dez por cento) do valor
líquido da primeira fatura emitida após a constatação da irregularidade.
Extrai-se do citado dispositivo legal, que somente a concessionária está autorizada a
violar os lacres constantes nos medidores, quando o particular assim o faz, age de forma não
compatível com a adequada utilização do serviço, uma vez que deixa de observar determinações
expressas na legislação competente. Nesse sentido, podemos caracterizar essa inobservância por
parte do consumidor como procedimento irregular (de um modo geral, são procedimentos
irregulares todos aqueles realizados em descumprimento de norma relativa ao setor). Cumpre
observar que as obrigações pertinentes ao consumidor previstas na Resolução 456/2000 da ANEEL
são transpostas ao contrato de adesão enviado ao usuário16.
Quando os lacres dos medidores, caixas e cubículos são rompidos por pessoa que não
seja representante legal da concessionária, ainda que este procedimento não provoque redução no
faturamento do consumidor, a concessionária esta autorizada a cobrar custo administrativo adicional
na fatura emitida após a constatação da irregularidade. Não obstante isso, se o citado procedimento
irregular ocasionar redução no faturamento, será gerado um processo administrativo de consumo
não registrado.
Aduz o artigo 72, in verbis:
Art. 72 - Constatada a ocorrência de qualquer procedimento irregular cuja responsabilidade
não lhe seja atribuível e que tenha provocado faturamento inferior ao correto, ou no caso de
não ter havido qualquer faturamento, a concessionária adotará as seguintes providências:
I- emitir o “Termo de Ocorrência de Irregularidade”, em formulário próprio, contemplando
as informações necessárias ao registro da irregularidade, tais como:
a) identificação completa do consumidor;
b) endereço da unidade consumidora;
c) código de identificação da unidade consumidora;
d) atividade desenvolvida;
e) tipo e tensão de fornecimento;
f) tipo de medição;
g) identificação e leitura(s) do(s) medidor(es) e demais equipamentos auxiliares de
medição;
h) selos e/ou lacres encontrados e deixados;
i) descrição detalhada do tipo de irregularidade;
j) relação da carga instalada;
l) identificação e assinatura do inspetor da concessionária; e
m) outras informações julgadas necessárias;
II- solicitar os serviços de perícia técnica do órgão competente vinculado à segurança
pública e/ou do órgão metrológico oficial, este quando se fizer necessária a verificação do
medidor e/ou demais equipamentos de medição;
III- implementar outros procedimentos necessários à fiel caracterização da irregularidade;
IV- proceder à revisão do faturamento com base nas diferenças entre os valores
efetivamente faturados e os apurados por meio de um dos critérios descritos nas alíneas
abaixo, sem prejuízo do disposto nos arts. 73, 74 e 90:
(...)
§ 2º Comprovado, pela concessionária ou consumidor, na forma do art. 78 e seus
parágrafos, que o início da irregularidade ocorreu em período não atribuível ao atual
responsável, a este somente serão faturadas as diferenças apuradas no período sob
responsabilidade do mesmo, sem aplicação do disposto nos arts. 73, 74 e 90, exceto nos
casos de sucessão comercial.
§ 3º Cópia do termo referido no inciso I deverá ser entregue ao consumidor no ato da sua
emissão, preferencialmente mediante recibo do mesmo, ou, enviada pelo serviço postal com
aviso de recebimento (AR).
§ 4º No caso referido no inciso II, quando não for possível a verificação no local da unidade
consumidora, a concessionária deverá acondicionar o medidor e/ou demais equipamentos
16
Nos postos de atendimento da CEMAR, se encontra disponível ao consumidor, a Resolução 4456/2000 da ANEEL.
de medição em invólucro específico, a ser lacrado no ato da retirada, e encaminhar ao órgão
responsável pela perícia.
O retrotranscrito dispositivo estabelece os critérios e requisitos que devem ser
obedecidos pelas concessionárias para a validade das inspeções, além de critérios que devem ser
observados durante a revisão do faturamento, para o cálculo do consumo não registrado 17. Daí a
extensão do artigo.
Cumpre destacarmos o inciso III do citado artigo. Como exemplo prático de outros
procedimentos adotados pelas concessionárias visando à fiel caracterização da irregularidade, temos
a utilização de fotografias das irregularidades18. Durante a inspeção técnica, ao ser constatado
algum procedimento irregular, este é registrado através de fotografias, o que contribui para
comprovação material do ilícito. Estas fotografias irão compor o processo administrativo e mais
adiante, conforme seja o caso, servir como prova em processo judicial.
Outro aspecto importante para destacarmos no presente estudo é referente à
denominação que comumente é dada à cobrança de consumo não registrado, qual seja multa.
Conforme estabelece o artigo 73 da resolução 456/2000, apenas um percentual de no máximo 30%
poderia assim ser classificado. Uma vez que, como conceitua o próprio dispositivo legal, o mesmo é
referente a custo administrativo19.
Art. 73- Nos casos de revisão do faturamento, motivada por uma das hipóteses previstas no
artigo anterior, a concessionária poderá cobrar o custo administrativo adicional
correspondente a, no máximo, 30 % (trinta por cento) do valor líquido da fatura relativa à
diferença entre os valores apurados e os efetivamente faturados.
Ainda sobre a cobrança de consumo não registrado realizada pelas concessionárias,
cumpre destacarmos o período de cobrança retroativa. O mesmo poderá ser de, no máximo, cinco
anos, conforme Ofício n° 502/2004 - DR/ANEEL (Ref. fls. 19 do Parecer nº 158/2004 PF/ANEEL), que informa que nas “Condições Gerais de Fornecimento de Energia Elétrica”
constam rotinas, critérios e providências, no âmbito administrativo, conforme art. 72 da Resolução
456 de 2000, para a análise e caracterização “da ocorrência de qualquer procedimento irregular cuja
responsabilidade não lhe seja atribuível”, ou seja, procedimento do consumidor (ação), mediante
fraude, artifício, ardil (irregular), que tenha provocado (dano) e conseqüentemente faturamento
inferior ao correto; ou não ter havido qualquer faturamento. Neste caso, o prazo máximo de
cobrança retroativa será limitado a 05 (cinco) anos.
17
18
19
Vide anexo contendo exemplo de alguns documentos que compõem os processos administrativos de CNR das
concessionárias de energia elétrica. Anexo A: Modelo de documentos utilizados pela CEMAR.
Vide anexo contendo exemplo de Processo de CNR. Anexo B: Modelo de Processo de CNR utilizado pela LIGHT.
Segundo a procuradoria jurídica da ANEEL, a natureza jurídica do custo administrativo é de cláusula penal, por
trata-se de descumprimento das obrigações contratualmente assumidas pelo consumidor. No Judiciário, prevalece o
entendimento de que o custo administrativo é multa e, por isso, necessita obedecer ao princípio do contraditório e
ampla defesa.
O referido ofício é aplicado em analogia com o estipulado no artigo 76, inciso II da
Resolução 456, que determina prazo prescricional de cinco anos conforme estabelecido no artigo 27
da lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor). Esse limitante também é utilizado em
consonância com o Código Civil Brasileiro, que ao tratar da prescrição, limita em 05 anos o período
de cobrança.
Nesse sentido, recentemente a ANEEL sumulou o entendimento de que sempre que não
for possível determinar o momento exato em que começou a irregularidade, o período de cobrança
deve se limitar a seis meses.20
5 IMPLICAÇÕES PENAIS
Em conformidade com o Código Penal Brasileiro temos como qualificar duas formas de
“subtração” de energia: furto simples e furto qualificado, também chamado de furto mediante
fraude. Incorre no delito todo aquele que subtrair para si ou para outrem coisa alheia móvel,
equiparando-se a energia elétrica a essa condição.
O furto simples está previsto no art. 155, §3° do código Penal e ocorre quando há
ausência de contrato e conexão direta. Tomemos com exemplo quando é detectada uma ligação
direta sem passar pelo medidor de energia, a qual pode ser visualizada sem dificuldades.
O furto qualificado ou furto mediante fraude está previsto no art. 155, §3° c/c §4°,
inciso II do Código Penal. Na prática, ele ocorre quando há uma infração contratual, quando o
usuário “frauda” a concessionária. Utilizemos como exemplo quando é detectado um desvio
embutido na parede, que não pode ser detectado com facilidade, sendo necessários exames
detalhados por parte dos inspetores.
Nesse contexto, cumpre observar que o furto/fraude de energia elétrica, não é apenas
um delito penal, constitui também uma infração contratual e afronta os deveres impostos ao usuário,
uma vez que implica na utilização inadequada do serviço e na falta de pagamento da
contraprestação devida por ele. O indivíduo que furta energia elétrica não está lesando apenas a
concessionária, ele está prejudicando toda a sociedade.
Corroborando esse entendimento, temos as seguintes jurisprudências do Tribunal de
Justiça do Estado de Minas Gerais:
Apelação Criminal nº 1.0132.05.000694-0/001
Apelante: Roque Nunes
Apelado: Ministério Público do Estado de Minas Gerais
Relator: Des. Eduardo Brum
20
Súmula 09/2009 da ANEEL. Publicada no D.O. em 30.04.2009.
APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO DE ENERGIA ELÉTRICA. CRIME
CONFIGURADO. CONDENAÇÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.
O furto consiste na subtração de coisa móvel para si ou para outrem, com o fim de
apoderar-se dela de modo definitivo. Toda energia economicamente utilizável e suscetível
de incidir no poder de disposição material e exclusiva de um indivíduo pode ser incluída,
mesmo do ponto de vista técnico, entre as coisas móveis.
(...) Uma vez comprovada a alteração do relógio-medidor e a subtração, mostram-se
despiciendas as comparações feitas pelo apelante referentes ao consumo de energia antes e
depois da denúncia.
(...) Vistos etc., acorda, em Turma, a 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado
de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos
julgamentos e das notas taquigráficas, em negar provimento, à unanimidade.
Apelação Criminal nº 1.0223.04.153468-4/001
Apelante: Henrique Viana de Araújo
Apelado: Ministério Público do Estado de Minas Gerais
Relator: Des. Eli Lucas de Mendonça
PROCESSO PENAL. FURTO DE ENERGIA. AUTORIA E MATERIALIDADE
COMPROVADAS. CONDENAÇÃO MANTIDA.
O consumo de energia elétrica desviada do medidor é subtração tipificada como ilícito
penal nos termos do § 3º do art. 155 do CP.
(...) Ao que se vê, o apelante praticou o crime descrito no § 3º do art. 155 do CP. Isto
porque consumiu energia elétrica sem registro no medidor, em prejuízo da companhia
energética. Assim procedendo, subtraiu a energia fornecida pela concessionária em proveito
próprio e em prejuízo para a CEMIG.
Tal conclusão se extrai da prova técnica, indispensável para o reconhecimento do delito de
furto de energia elétrica - art. 155, § 3º, do CP, f. 10/11, que constatou ausência dos
selos/lacres externos da tampa da caixa, bem como a adulteração dos selos/lacres de
aferição do aparelho medidor de KWh.
Ainda que assim não fosse, in casu, a prova pericial estaria suficientemente suprida pela
prova oral colhida, especialmente as declarações do funcionário da CEMIG.
(...) Vistos etc., acorda, em Turma, a 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado
de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, em
rejeitar preliminar e dar provimento parcial.
Apelação Criminal nº 1.0290.99.004701-8/001
Apelante: José Miguel
Apelado: Ministério Público do Estado de Minas Gerais
Relator: Desª. Beatriz Pinheiro Caires
APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO DE ENERGIA ELÉTRICA ("GATO").
AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. CONFISSÃO.
(...) O consumo de energia elétrica desviada do medidor é subtração tipificada como ilícito
penal, nos termos do § 3º do art. 155, do CP.
(...) Vistos etc., acorda, em Turma, a 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado
de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos
julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, em negar provimento.
Diante de tais fatos, policiais de alguns estados já estão recebendo treinamento contra o
furto de energia. O curso de capacitação integra o Programa Nacional de Combate ao Furto de
Energia Elétrica, desenvolvido pela ANEEL. O Rio de Janeiro foi o primeiro Estado a participar do
Programa e terá o treinamento ministrado pelo Instituto de Segurança Pública do Estado e pela
Secretaria de Energia, Indústria Naval e Petróleo, em convênio com a ANEEL e as concessionárias
Light e Ampla, que operam no Estado. Esperamos que em breve, policiais de todos os Estados do
território nacional possam contar com esse treinamento, o que garantiria uma melhor estrutura na
fiscalização e combate ao furto/fraude de energia elétrica.
5.1 Delegacia de Defesa dos Serviços Delegados - DDSD
Criada em 06.02.2002 no Estado do Rio de Janeiro, a Delegacia de Defesa dos Serviços
Delegados tem como objetivo planejar ações contra adulteração de combustíveis e fraudes de
energia e de telecomunicações.
A Delegacia é pioneira no país e os profissionais trabalham em conjunto com
laboratórios técnicos e órgãos fiscalizadores. Apesar da criação da especializada, as Delegacias
Distritais continuam com a competência concorrente para atuar e proceder nos casos de registros de
furto ou fraude de energia.
Esperamos que a criação de Delegacias como essa seja disseminada por todo o país, o
que possibilitará uma melhor fiscalização e conseqüente melhora dos serviços prestados ao
consumidor.
5.2 Departamento de Investigações Sobre o Crime Organizado - DEIC
Situado no Estado de São Paulo, o Departamento possui uma Delegacia especializada
em investigar e combater crimes contra o patrimônio; trata-se da Terceira Delegacia da Divisão de
Investigações sobre Crimes Contra o Patrimônio.
Dentre suas atribuições podemos pontuar o combate ao furto de fios elétricos; combate
ao furto de energia e outros que tenham como vítimas empresas concessionárias de serviço público;
combate a outras fraudes relacionadas à prestação de serviços públicos concedidos.
Sua estrutura é formada por delegados, escrivães e investigadores de polícia, com apoio
policial do GARRA, helicópteros da Polícia Civil, Distritos Policiais, Polícia Militar e demais
unidades da Divisão de Investigações sobre Crimes contra o Patrimônio.
O Departamento possui uma metodologia de trabalho que busca inserir as empresas
vítimas no processo de combate aos ilícitos, criando, junto com as mesmas, um grupo estável de
combate às irregularidades. Procura, ainda, inserir outros órgãos públicos no processo, além de
direcionar esforços para os ilícitos que causam maior impacto social e oferecer treinamentos
específicos de policiais especializados junto às empresas afetadas.
O ideal seria a existência do DEIC, especializado no combate a crimes contra o
patrimônio, sobretudo no combate ao furto/fraude de energia elétrica, em cada um dos estados
brasileiros, todavia apenas o Estado de São Paulo trabalha com essa estrutura. Nesse sentido,
cumpre ressaltar que em decorrência da política de organização judiciária e policial ser feita em
nível estadual, de forma que cada Estado possui autonomia para organizar sua estrutura judiciária e
investigativa, podemos encontrar em outros estados brasileiros órgãos com a sigla DEIC, tais como
Rio Grande do Sul e Maranhão, todavia estes não possuem as mesmas atribuições e composição do
Departamento de São Paulo.
6 CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - CDC
Criado em 1990, o Código de Defesa do Consumidor surgiu, basicamente, da
necessidade de obtenção de igualdade entre aqueles que eram naturalmente desiguais: consumidor e
fornecedor.
Com a Constituição Federal de 1988, que incluiu a defesa do consumidor no plano da
política constitucional, aparecendo no texto maior, entre os direitos e garantias fundamentais (art.
5°, inciso XXXII da Constituição Federal), ficou evidente a preocupação do legislador constituinte
com as atuais relações de consumo e com a necessidade de tutelar o hipossuficiente (mais fraco).
Sendo um dispositivo recheado de valores constitucionais, o Código de Defesa do
Consumidor é considerado uma das leis mais democráticas editadas até os dias atuais no
ordenamento jurídico brasileiro. A imperatividade de suas normas tem por escopo proteger o
consumidor, na tentativa de alcançar uma realidade social mais justa, em conformidade com o
princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, uma das vigas mestras do Código de
Defesa do Consumidor.
Nesse contexto, passaremos a analisar as relações e implicações do Código de Defesa
do Consumidor e a fraude de energia elétrica, sobretudo no que diz respeito aos direitos e deveres
do consumidor de energia.
Inicialmente cumpre-nos ressaltar que o codex consumerista somente se aplica àqueles
que se enquadram no artigo 2º do referido dispositivo legal. Dessa forma, apenas as pessoas físicas
ou jurídicas que adquirem ou utilizam produtos ou serviços como destinatários finais estarão
amparadas pelo Código de Defesa do Consumidor. É importante observarmos que o conceito de
consumidor21 adotado pelo Código foi exclusivamente de caráter econômico, ou seja, levando-se
em consideração tão-somente o personagem que no mercado de consumo adquire bens ou então
contrata a prestação de serviços, como destinatário final, pressupondo-se que assim age com vistas
21
Segundo disposição da ANEEL, em seu artigo 2º, inciso III, consumidor é toda pessoa física ou jurídica, ou
comunhão de fato ou de direito, legalmente representada, que solicitar a concessionária o fornecimento de energia
elétrica e assumir a responsabilidade pelo pagamento das faturas e pelas demais obrigações fixadas em normas e
regulamentos da ANEEL, assim vinculando-se aos contratos de fornecimento, de uso e de conexão ou de adesão,
conforme cada caso.
ao atendimento de uma necessidade própria e não para o desenvolvimento de outra atividade
negocial.
Em face do acima exposto, podemos concluir que o Código de Defesa do Consumidor
se aplica às relações de consumo existentes entre concessionárias de energia elétrica e usuário.
Feitos os esclarecimentos acima, passaremos a analisar algumas responsabilidades
imputadas ao usuário de energia elétrica. Não obstante as garantias que lhe são asseguradas pelo
CDC, o consumidor deverá cumprir com os seus deveres, sob pena de não mais fazer jus a essas
benesses, uma vez que, conforme anteriormente visto, o contrato que rege a relação jurídica entre
concessionária e usuário é gerido pelo direito privado e impõe obrigações recíprocas. Nesse sentido,
a própria Resolução 456/2000 trouxe em seus artigos algumas responsabilidades do consumidor.
Destacaremos aqui algumas delas. Artigos 104 e 105, in verbis:
Art. 104- O consumidor será responsável por danos causados aos equipamentos de medição
ou ao sistema elétrico da concessionária, decorrentes de qualquer procedimento irregular ou
de deficiência técnica das instalações elétricas internas da unidade consumidora.
Art. 105- O consumidor será responsável, na qualidade de depositário a título gratuito, pela
custódia dos equipamentos de medição da concessionária quando instalados no interior da
unidade consumidora, ou, se por solicitação formal do consumidor, os equipamentos forem
instalados em área exterior da mesma.
Parágrafo único. Não se aplicam as disposições pertinentes ao depositário no caso de furto
ou danos provocados por terceiros, relativamente aos equipamentos de medição, exceto
quando, da violação de lacres ou de danos nos equipamentos, decorrerem registros
inferiores aos corretos.
Como podemos facilmente concluir dos artigos retro transcritos, qualquer procedimento
irregular que provoque danos aos equipamentos de medição, terá a responsabilidade imputada ao
consumidor, por isso mesmo, o consumidor é responsável por tais equipamentos, devendo zelar
pelo seu bom funcionamento. É importante ressaltar o parágrafo único do artigo 105, que isenta da
responsabilidade do consumidor danos ou furtos provocados por terceiros, salvo quando tais atos
beneficiam o consumidor fazendo com que sejam registrados consumos inferiores aos de fato
utilizados. Essa ressalva deixa claro que, muito mais do que punir o consumidor por sua conduta
inadequada, a cobrança de consumos não registrados é tão somente a recuperação de valores
referentes à kW que foram consumidos sem a devida contraprestação financeira. Ainda que o
consumidor não tenha tido uma responsabilidade direta no incorreto registro do consumo, foi
beneficiado por tal ato. Nestes casos, não deverá ocorrer cobrança de custo administrativo.
Ainda no campo das responsabilidades do consumidor, cumpre destacarmos o dever que
tem o usuário com o uso racional da energia elétrica. Tema em grande destaque não apenas no
contexto nacional, como também mundial, a conservação da energia preocupa gestores públicos e
ambientalistas. É sabido que já se iniciou uma grande busca por fontes alternativas de energia, tais
como a eólica e a solar, uma vez que as tradicionais fontes estão cada vez mais escassas e os
potenciais hidroelétricos estão diminuindo com o passar dos anos. Nesse diapasão, quando estamos
tratando de usuários que se utilizam de artifícios para não pagarem o que efetivamente consomem,
facilmente podemos concluir que os mesmos não terão compromisso com a conservação e uso
racional dessa energia, uma vez que não pagam por ela.
Não obstante as responsabilidades imputadas ao consumidor, a Resolução 456/2000
também trouxe alguns deveres para as concessionárias. Artigo 95, in verbis:
Art. 95- A concessionária é responsável pela prestação de serviço adequado a todos os
consumidores, satisfazendo as condições de regularidade, generalidade, continuidade,
eficiência, segurança, atualidade, modicidade das tarifas e cortesia no atendimento, assim
como prestando informações para a defesa de interesses individuais e coletivos.
Tal dispositivo resume com objetividade as responsabilidades da concessionária,
estando em perfeita harmonia com a lei de concessões e com o próprio Código de Defesa do
Consumidor.
6.1 Princípio da Boa-Fé Objetiva
O princípio da boa-fé é um dever de comportar-se lealmente em todas as fases do
negócio jurídico, ou seja, tanto nas preliminares quanto na formação e execução deste. Os
doutrinadores, ao tratarem da boa-fé, afirmam que esta se divide em objetiva e subjetiva; esta diz
respeito a dados psicológicos, leva em conta a intenção do agente; enquanto aquela se relaciona
com elementos externos, isto é, um dever de agir de acordo com as normas expressas. Essa boa-fé
objetiva decorre também dos princípios gerais do Direito.
Cumpre observar que a boa-fé envolve o direito, abrangendo-o, traçando-lhe limites ou,
então, impondo o dever-direito de se exercitar as pretensões e as prestações segundo os ditames
desta. Por esse princípio, as cláusulas devem ser interpretadas segundo as normas da dinâmica do
direito, de acordo com o que é usual e compatível com a época, com as circunstâncias e com o bom
senso.
No sistema brasileiro das relações de consumo, houve opção explícita do legislador pelo
primado da boa-fé. Com a menção expressa do artigo 4º, inciso III do CDC à boa-fé e equilíbrio nas
relações entre consumidores e fornecedores, como princípio básico das relações de consumo, além
da proibição das cláusulas que sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade (artigo 51, IV do
CDC), as relações de consumo estão informada pelo princípio geral da boa-fé, que deve reger toda e
qualquer espécie de relação de consumo.
O dever de atuar com boa-fé se dirige em primeiro lugar ao devedor, com o mandado de
cumprir sua obrigação, atendo-se não só à letra, mas também ao sentido da relação obrigacional
correspondente e na forma que o credor possa razoavelmente esperar. Em segundo lugar, dirige-se
ao credor, com o mandado de exercer o direito que lhe corresponde, atuando segundo a confiança
depositada pela outra parte. Por último, dirige-se de forma dinâmica a todos os participantes da
relação jurídica em questão, para que conduzam com uma consciência proba.
É importante ressaltar que para uma aplicação justa de normas e cláusulas contratuais
deve-se observar a conduta do agente, a qual deve estar em consonância com o princípio da boa-fé
objetiva que exige um comportamento de bom cidadão, razoavelmente diligente, que deve agir com
consciência, probidade e honestidade.
Prevalece na doutrina que o princípio da boa-fé objetiva possui como pressuposto a
fidelidade de cada um dos contratantes à palavra dada, de modo a não corromper ou abusar da
confiança nele depositada pela outra parte, já que esta forma a base necessária de todas as relações
humanas e jurídicas.
Deste modo, conclui-se que aos consumidores que fraudam a energia elétrica não
socorre o princípio da boa-fé objetiva. Estes não mantiveram fidelidade à palavra dada,
corrompendo a confiança neles depositada pelos fornecedores de energia elétrica.
6.2 Suspensão do Fornecimento de Energia Elétrica Decorrente de Furto/Fraude de Energia x
Continuidade do Serviço Público
Quando analisamos o Código de Defesa do Consumidor em sintonia com o estudo que
estamos desenvolvendo, um dos artigos do CDC que mais geram interpretações controversas é o
artigo 22, que trata da continuidade do serviço público. In verbis:
Art. 22 - Os órgãos públicos, por si ou por suas empresas, concessionárias, permissionárias
ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços
adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.
Parágrafo único - Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas
neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos
causados, na forma prevista neste Código.
Para que melhor possamos compreender as divergências existentes com relação ao
tema, teceremos alguns comentários referentes à continuidade dos serviços públicos.
A primeira dúvida a ser desfeita diz respeito ao conceito de essencialidade. É sempre
muito complicado investigar a natureza do serviço público, para tentar caracterizar, neste ou
naquele, o traço da sua essencialidade. Com efeito, já vimos anteriormente que a distribuição de
energia elétrica é serviço de utilidade pública uti singuli. Não obstante isso cumpre observar que o
mesmo passa por uma gradação de essencialidade, o que torna mais razoável sustentar a imanência
do requisito da essencialidade em todos os serviços prestados pelo poder público, diretamente ou
mediante concessão.
Partindo do suposto de que o serviço de fornecimento de energia elétrica é essencial,
resta discorrer sobre a exigência legal da sua continuidade. Essa exigência, contida no artigo 22,
deve ser entendida no sentido de que não podem deixar de ser ofertados a todos os usuários, vale
dizer, prestados no interesse coletivo. Ao revés, quando estiverem em causa interesses individuais,
de determinado usuário, a oferta de serviço pode sofrer solução de continuidade, se não forem
observadas as normas administrativas que regem a espécie.
Nesse sentido, a lei de concessões (lei 8.987/95), em seu artigo 3°, não caracteriza como
descontinuidade do serviço público a sua suspensão ocasionada por inadimplemento do
consumidor, ressalvado o interesse da coletividade. In verbis:
§ 3o Não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção em situação de
emergência ou após prévio aviso, quando:
I - motivada por razões de ordem técnica ou de segurança das instalações; e,
II - por inadimplemento do usuário, considerado o interesse da coletividade.
Apesar da existência de um ou outro posicionamento doutrinário que defende que em
obediência ao princípio da continuidade dos serviços públicos, a concessionária de energia elétrica
estaria impedida de promover a suspensão do fornecimento de consumidores inadimplentes,
pacifica-se na doutrina o entendimento de que a gratuidade não se presume e que as concessionárias
de serviço público não podem ser compelidas a prestar serviços ininterruptos se o usuário deixa de
satisfazer suas obrigações relativas ao pagamento. Do contrário, seria admitir, de um lado, o
enriquecimento sem causa do usuário e, de outro, o desvio de recursos públicos por mera
inatividade da concessionária.
Ainda nesse sentido, quando se analisa a ausência de pagamento pelo fato do
consumidor haver fraudado, além da patente irregularidade, resta configurado verdadeiro
locupletamento ilícito do faltoso em desfavor dos demais usuários.
Se a concessionária está vinculada pelo dever de fornecer o serviço nos termos do
disposto no artigo 22 do CDC, impõe-se que o usuário do serviço prestado efetivamente contribua
para a permanência das boas condições dos bens através dos quais lhe são prestados os serviços
(artigo 7°, inciso VI da Lei 8.987/95).
Corroborando esse entendimento, temos os seguintes posicionamentos jurisprudenciais:
Apelação nº 035.04.0043883
Relator: Des. Rômulo Taddei
Terceira Câmara Cível
Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo
PROCESSO
CIVIL.
DOCUMENTO
NOVO.
AÇÃO
ANULATÓRIA.
CONSTATAÇÃO DE OCORRÊNCIA DE VIOLAÇÃO A MEDIDOR DE ENERGIA
ELÉTRICA. QUEDA ABRUPTA DO CONSUMO. ELEVAÇÃO APÓS A
SUBSTITUIÇÃO DO MEDIDOR. IRREGULARIDADE CONFIGURADA.
CANCELAMENTO DO DÉBITO. IMPOSSIBILIDADE DO PEDIDO. RECURSO A
QUE SE DÁ PROVIMENTO PARCIAL. SENTENÇA PARCIALMENTE
REFORMADA.
1. É admitida a apresentação de prova documental na fase recursal, desde que não
caracterizada a má-fé e observado o contraditório.
2. De acordo com o art. 397, do CPC são documentos novos aqueles “destinados a fazer
prova de fatos ocorridos depois de articulados, ou para contrapô-los aos que foram
produzidos nos autos.”
3. Constatada a ocorrência de violação do medidor de energia elétrica, corroborada pela
queda abrupta de consumo em determinado período e a conseqüente elevação após a
substituição do medidor, não se pode dar guarida à pretensão de cancelamento do débito,
proveniente do consumo irregular de energia.
4. O desvio de energia elétrica, seguido do inadimplemento do consumo apurado
constituem atos lesivos à sociedade e ao bem comum, que deve ser repudiados pelo
judiciário, pena de encorajar-lhe o ilícito e o conseqüente comprometimento dos serviços
públicos.
5. Recurso a que se dá provimento parcial, para reformar em parte a sentença recorrida.
Apelação Cível nº 338597
Relator: Des. Jayro dos Santos Ferreira
Nona Câmara Cível
Tribunal de Justiça Do Estado do rio de Janeiro
O medidor fraudado decorre de iniciativa do consumidor, que, talvez, sufocado pelo preço
da energia elétrica, pensa, como tábua de salvação, em recorrer a esse meio incorreto, para
poder continuar a utilizar-se dessa fonte, que, hoje, é necessária a própria vida.
(...) Na hipótese de fraude comprovada, pode o consumidor ser compelido a pagar a
diferença, apurada em perícia técnica competente, durante o período provável de ilicitude.
(...) É preciso que do julgador sejam afastados quaisquer preconceitos, quer contra o
fornecedor, quer contra o consumidor.22
Nesse contexto, são relevantes os comentários de Fábio Amorim da Rocha quando
esclarece que razões de ordem técnica e de segurança, casos fortuitos e de força maior, que são
excludentes clássicas da responsabilidade, podem justificar a interrupção do serviço do mesmo
modo que a falta do pagamento da remuneração do usuário autoriza a suspensão da entrega da
energia elétrica, porque afrontaria a qualquer mente civilizada a idéia de que quem compra e não
paga possa ter direito a continuar recebendo a mercadoria adquirida. Não seria crível, que uma lei
garantisse mesmo aos que continuam eternamente inadimplentes, um serviço gratuito. Se assim
fosse, melhor seria usufruir do serviço sem efetuar o pagamento, posto que o artigo 22 do Código
de Defesa do Consumidor garantiria a continuidade.
O que precisamos compreender é que a continuidade prevista no Código de Defesa do
Consumidor deve ser entendida como garantia de fruição do serviço pela coletividade, sendo esta
entendida como a sociedade beneficiária da energia. Dessa forma, a continuidade não pode ser
avaliada individualmente, uma vez que a suspensão do fornecimento de usuários específicos em
nada afeta a continuidade do fornecimento de energia aos demais consumidores que honraram com
sua contraprestação contratual. Nesse sentido, a coletividade, a sociedade beneficiária, em nada foi
atingida.
22
Fonte: www.networkeventos.com.br/download/palestras
Em seu artigo 90, inciso I, a Resolução 456/2000 da ANEEL autoriza a suspensão do
fornecimento de energia elétrica quando verificada a ocorrência de procedimentos irregulares. In
verbis:
Art. 90- A concessionária poderá suspender o fornecimento, de imediato, quando verificar a
ocorrência de qualquer das seguintes situações:
I - utilização de procedimentos irregulares referidos no art. 72;
As normas descritas acima demonstram claramente que é possível à concessionária, a
prática de atos repressivos, nos quais o direito de fruição dos serviços pelo usuário pode ser tolhido
em prol do combate à prática de irregularidades. Nesse sentido, assim se posicionou o Superior
Tribunal de Justiça:
Recurso Especial nº 806.985 - RS (2006/0002443-0)
Recorrente: AES Sul Distribuidora Gaúcha de Energia S/A
Recorrido: Marlene Flores da Silva
Relator: Ministro Herman Benjamin
ADMINISTRATIVO. SUSPENSÃO DO FORNECIMENTO DE ENERGIA
ELÉTRICA. INADIMPLEMENTO. POSSIBILIDADE. IRREGULARIDADES NO
MEDIDOR. FATURAMENTO DAS DIFERENÇAS.
1. O Superior Tribunal de Justiça já se posicionou no sentido de que é lícito à
concessionária interromper o fornecimento de energia elétrica se, após aviso prévio, o
consumidor permanecer inadimplente no pagamento da respectiva conta (Lei n. 8.987⁄95,
art. 6º, § 3º, II). Precedentes.
2. O disposto no art. 6º, § 3º, II, da Lei n. 8.987⁄95, ao explicitar que, na hipótese de
inadimplemento do usuário, a interrupção do fornecimento de energia não caracteriza
descontinuidade do serviço, afasta qualquer possibilidade de aplicação dos preceitos ínsitos
nos arts. 22 e 42 da Lei n. 8.078⁄90 (Código de Defesa do Consumidor).
3. O fato de o caso dos autos tratar de débitos apurados unilateralmente pela empresa
concessionária ante suposta fraude em medidor de energia elétrica e em virtude de valores
decorrentes de diferenças de consumo não modifica as conclusões acima indicadas.
Evidentemente que o consumidor que frauda medidor tem intenção de que o real consumo
de energia por ele realizado seja camuflado, normalmente com o fim de pagar menos do
que seria efetivamente devido. Portanto, não há dúvida quanto à existência de energia
consumida que não fora quitada. Seria um contra-senso o entendimento de que é permitida
a suspensão de energia por consumo ordinário não-pago, e de que não é permitida na
hipótese de consumo que não foi pago em razão de ter sido camuflado pelo consumidor.
4. Recurso especial provido.
Por fim, cumpre observar que a jurisprudência supracitada veio para ratificar o
entendimento já difundido entre os poucos doutrinadores que trabalham o tema, e mais, tornou uma
realidade prática o disposto no parágrafo único do artigo 95 da Resolução 456/2000 da ANEEL que
dispõe que não se caracteriza como descontinuidade do serviço a suspensão do fornecimento
efetuada nos termos dos artigos 90 e 91 da Resolução, tendo em vista a prevalência do interesse da
coletividade.
7 CONCLUSÃO
Em face dos diversos entendimentos legais, doutrinários e jurisprudenciais transcritos,
fica demonstrada a legalidade dos procedimentos de inspeções realizados nas unidades
consumidoras, quando atendidos os normativos regulatórios. Também fica evidenciado que o
Judiciário pode contribuir de forma significativa para o combate à fraude de energia elétrica.
Nesse sentido, esperamos que a criação de Delegacias Especializadas no combate ao
furto/fraude de energia, a exemplo do que já ocorre em alguns poucos estados brasileiros, se torne
uma realidade em todo o território nacional, uma vez que tal estrutura auxiliaria o trabalho das
concessionárias e melhoraria a qualidade do serviço prestado ao consumidor.
Assim sendo, e considerando que a redução das perdas interessa a todas as
concessionárias, a própria ANEEL e a sociedade como um todo, uma vez que, não obstante o dever
e a necessidade de cada um para com a conservação da energia, os prejuízos decorrentes do não
recebimento da energia elétrica fornecida contribuem para dificultar que as concessionárias
atendam satisfatoriamente seus consumidores, entendemos que essa matéria deve ser amplamente
difundida.
Cumpre ressaltar a plena legitimidade e juridicidade do poder-dever conferido às
concessionárias de serviço público de energia elétrica para suspender o fornecimento na hipótese de
prática de infrações previstas na legislação especial. Nesse sentido, não é detento de direito líquido
e certo a receber continuadamente o serviço de energia elétrica, o consumidor que possui dívidas
decorrentes de faturas de consumo não registrado (consumo que não foi pago em razão de ter sido
camuflado pelo consumidor), transgredindo assim, a norma que disciplina a prestação do serviço.
De outro lado, reafirmamos que todo e qualquer procedimento realizado pelas
concessionárias deve ser com estrita observância do direito positivo e dos direitos e garantias
fundamentais, constitucionalmente asseguradas. O consumidor, até mesmo por ser a parte
hipossuficiente da relação, deve ser respeitado e ter seus direitos e prerrogativas obedecidos.
Por mais que ainda subsistam questões controversas envolvendo o presente tema,
doutrina e jurisprudência têm evoluído significativamente, o que nos leva a acreditar que se trata
apenas de uma questão de tempo para que as idéias e posicionamentos levantados neste trabalho
sejam largamente disseminados, tornando algumas discussões pacíficas.
ASPECTS JURIDICALS OF THE ELECTRIC POWER’S FRAUD
Érika Wilza Brito de Assis23
ABSTRACT
23
Concluding of the course of bachelor of in right of the CEUT. Group 2009.2. Work presented for the attainment of
the heading of Bachelor in Law.
The evasion of taxes, the impairment of the result and indicators of the concessionaire,
the impact on the tariff, it causes the loss of electric power is a national concern. The present article
seeks to approach the various juridical aspects involving the electric power’s fraud, since the forms
of combat, by its resolution within the judiciary, through controversial issues involving the subject.
Will also scored the correlations between the various branches of law and subject of study. Raise
this debate to ensure that the matter is distributed in the legal environment is also a master of the
beams of this study. The research is carried out mainly by analysis of legislation and jurisprudence,
with little support in existing doctrine on the subject.
KEY WORDS: Concession. Power’s Fraud. Irregularity
REFERÊNCIAS
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GOMES, Darcílio Augusto. Para Conhecer o Setor Elétrico Brasileiro - Glossário Técnico
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NASCIMENTO, Armando de Souza. Possibilidade de Suspensão de Fornecimento de Energia
Elétrica por Fatura de Consumo Não Registrado, Artigo apresentado à Faculdade Getúlio
Vargas - FGV, como requisito para a obtenção do grau de MBA em Gestão de Negócios de Energia
Elétrica. São Luis: Maio, 2009. 16p.
ANEXO A: Modelo de Documentos do Processo Administrativo de CNR - CEMAR
ANEXO B: Modelo de Processo de CNR - LIGHT
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