1973 – 2013. ENTRE A BONANÇA E TEMPESTADE. CONTRIBUTO PARA A HISTÓRIA DA SAÚDE NAVAL Comunicação apresentada pelo académico Rui Rodrigues de Abreu, em 12 de Março Em jeito de preâmbulo, permitam-me recordar o Vol. XXVII, das MEMÓRIAS desta Academia, de 1997. Volume dominado por três comemorações acorridas nesse ano: Os 75 anos da Travessia Aérea do Atlântico Sul, os 500 anos da Viagem de Vasco da Gama e o Bicentenário da Criação do Hospital da Marinha. Esta efeméride deu origem a três comunicações ocorridas no mês de Outubro: No dia 2, o Académico Emérito CALM MN REF Félix António apresentou a intitulada Hospital da Marinha – Bosquejo Histórico; a 14, o então Director do Hospital da Marinha, hoje CALM MN REF Costa Rebelo apresentou Hospital da Marinha – Perspetivas Futuras e finalmente na semana seguinte, a 21, foi a vez do director do Serviço de Saúde, CALM MN Matthioli Mateus apresentar a última comunicação deste ciclo: O Serviço de Saúde Militar – Sua Evolução e Bases Conceptuais para um Novo Modelo. Papel de relevo, inovação científica e contributos para a História da Medicina em Portugal, do hospital da Marinha, quer do ponto de vista do prestígio profissional que vários médicos navais alcançaram no país e no estrangeiro, quer das Instituições Médicas de Ensino e investigação que nele tiveram origem, está inequivocamente demonstrado na comunicação do Dr. Félix António. No momento actual recomenda-se a sua releitura como obrigatória a quem se interesse não só pela História da Marinha, mas também pela História da Medicina Portuguesa. Ou mesmo pela história pátria neste momento doloroso em que vivemos sob curadoria… A segunda comunicação traça um panorama da altura, de um hospital de média dimensão, bem equipado do ponto de vista tecnológico, governável, com uma boa rendibilidade, privilegiando o sentido de proximidade e familiaridade 1 RUI RODRIGUES DE ABREU com os seus utentes, com diferenciação médica atestada, lugares de chefia preenchidos por concurso público, baseados na competência técnica e … sem listas de espera! Quando à terceira comunicação, pena foi que as últimas autoridades da tutela não tenham tido tempo para ler com atenção o texto. Teriam decerto decidido de outra maneira… Durante a minha vida de Marinha passei por várias Unidades e Serviços. Era médico da Flotilha de Draga-minas aquando da sua extinção. Fui Chefe do Serviço de Saúde do finado G1EA, quando terá sido porventura a Unidade militar com maior número de efectivos dos três ramos: cerca de 2.500 homens! Assisti, anos mais tarde, convidado e comovido, às cerimónias do seu encerramento, o seu abate como unidade. Passei 16 anos da minha vida no Hospital da Marinha. No passado mês de Agosto de 2012, mais precisamente a 12, o Hospital da Marinha, Instituição com, a venerável idade de 215, funcionando há 206 anos naquele mesmo edifício, o que o torna uma das decanas da Marinha e o decano dos Hospitais Militares, foi extinto! Tal processo decorreu sem comoção de maior no meio naval. Eventualmente terá estado um belo dia de Verão e de praia! O defunto não teve direito a sentido velório nem honras fúnebres …Sic transit glória mundí! O que não deixa de me magoar, evitando o verbo indignar hoje demasiado usado e abusado com outros com outros fins, já que por lá ficaram restos de minha vida, momentos bons e menos bons, um pequeno serviço médico criado de raiz, o nome numa placa e um retrato oficial! Ainda tenho esperança que a Marinha, a título de póstumo, mas ainda a tempo, recorde à Pátria e a quem de direito o que Portugal deve ao Hospital da Marinha! Entremos então no tempo do tema que nos propusemos apresentar. Não obstante o título, começo um pouco antes. Em 1960, travando o País uma guerra sustentando três frentes, com a presença reforçada de Médicos e Enfermeiros da Marinha, nos três teatros operacionais, em Cabo Verde e vários navios da República, a marinha estende a sua acção médica à família naval. Numa primeira fase com “Casa de Saúde do Alfeite” e posteriormente com o acesso às consultas do H.M., e finalmente, 2 1973-2013. ENTRE A BONANÇA E A TEMPESTADE … anos depois, com a criação da Enfermaria para familiares – vocacionada para o sexo feminino – no Hospital, após o encerramento da “Casa de Saúde”. Recordo, para a assistência mais jovem ou para os que nunca, conscritos, passaram pelas fileiras, que nesses anos o poder vigente permitia a entrada para a Marinha de cinco, repito cinco médicos por ano. Distribuídos pelo Quadro Permanente e SMO – a Reserva Naval, criada em 1956. No caso de 1971, ano do meu ingresso, entraram quatro médicos, todos do meu curso, para os QP e o quinto também do meu curso da Faculdade de Lisboa, cumpriu o SMO no Gil Eanes… A extensão das consultas das várias especialidades médicas ou cirúrgicas à família naval, demonstrou no curto prazo a necessidade de reforço da guarnição médica do H. M… Desembarcaram então alguns Oficiais MN de vários navios em comissão nos Açores e Cabo Verde ingressando ou regressando ao Hospital. Até 1983, na grande maioria dos casos, os médicos do Hospital de Marinha, com especial incidência dos mais novos, acumulavam funções nos hospitais Civis de Lisboa ou em Santa Maria. Acumulações superiores autorizadas que permitiam por um lado uma diferenciação médica exigente e permanente nos vários campos das especializações, um treino constante com a traumatologia e urgências médicas ou cirúrgicas nos Bancos de S. José ou Santa Maria, com um movimento incomparavelmente superior em relação com a modesta frequência deste tipo de situações (felizmente) ocorridas no S. urgências do H. M., que dispunha de Médico de Serviço – Oficial subalterno – cuja diferenciação poderia até não ser clínica, e de uma mini-equipa de urgência em regime de chamada: cirurgiões, anestesistas, ortopedistas, enfermeiros/as do Bloco Operatório e técnicos auxiliares de diagnóstico. Funcionava! Havia sempre o resguardo de situações mais complexas, terem uma cadeia de evacuação bem definida. Esta situação foi-se mantendo até quase finais dos anos oitenta. Nos “dias de cons 3