em foco Cooperação internacional ●●●●●●●● ●●●●●●●● ●●●●●●●● ●●●●●●●● ●●●●●●●● ●●●●●●●● ●●●●●●●● ●●●●●●●● ●●●●●●●● ●●●●●●●● ●●●●●●●● ●●●●●●●● ●●●●●●●● Contributo para a definição de uma estratégia da cooperação portuguesa para o desenvolvimento no sector da saúde FERNANDO VASCO DA SILVA MARQUES JORGE TORGAL promoção e prevenção da saúde; apoiar a investigação na área da saúde e doenças tropicais; acordar uma intervenção coerente com todos os parceiros; definir mecanismos de coordenação e avaliação simples flexíveis e adequados. São também definidos pressupostos para a intervenção quer na perspectiva do beneficiário, quer na do doador. Considera-se que as formas tradicionais de cooperação (prestação de cuidados emergentes, evacuações para Portugal e prestação directa de cuidados curativos) devem ser integradas no processo mais geral de cooperação para o desenvolvimento. A cooperação é um importante instrumento das relações entre Portugal e os PALOPs e outros países africanos. Nos dias de hoje, à luz dos conceitos de cooperação para o desenvolvimento, a saúde é considerada uma área de intervenção prioritária, pelo que se torna imperioso definir uma estratégia para a intervenção da cooperação portuguesa neste sector. O presente documento representa o contributo dos autores para a definição dessa estratégia. São definidas como orientações estratégicas: promover o reforço do quadro institucional e o desenvolvimento dos recursos humanos; intervir com base epidemiológica; desenvolver os cuidados de saúde primários; centrar esforços na Introdução Fernando Vasco da Silva Marques é chefe de serviço de saúde pública, Departamento de Cooperação para o Desenvolvimento, Instituto de Higiene e Medicina Tropical, Universidade Nova de Lisboa. Jorge Torgal é professor de Saúde Pública, director do Instituto de Higiene e Medicina Tropical, Universidade Nova de Lisboa. Dotar a cooperação portuguesa com uma estratégia de intervenção sectorial para a saúde é fundamental para dar maior coerência à política nacional de cooperação e também para conseguir conjugar, e portanto maximizar, os esforços de todas as entidades, públicas e privadas, que desenvolvem actividades de cooperação e nos sectores afins. VOL. 20, N. o 1 — JANEIRO/JUNHO 2002 O presente texto pretende ser um contributo para a definição da referida estratégia e encontra justificação no facto de o sector da saúde ser considerado prioritário na política de cooperação portuguesa e também porque é um dos sectores em que a intervenção é, por tradição, forte e de grande visibilidade social. 1. Quadro de referência São elementos de referência fundamentais na elaboração da estratégia: (1) as orientações constantes do documento «A cooperação portuguesa no limiar do século XXI», aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.o 43/99; (2) as actuais concepções veiculadas nos grandes fora internacionais sobre a cooperação para o desenvolvimento e o papel da saúde na luta contra a pobreza; e ainda (3) as perspectivas de desenvolvimento para o sector da saúde preconizadas pela OMS, nomeadamente no que se refere ao continente africano. 21 ●●●●●●●● ●●●●●●●● ●●●●●●●● ●●●●●●●● ●●●●●●●● em foco Cooperação internacional • • 1. No documento «A cooperação portuguesa no limiar do século XXI» são referidos os princípios, orientações e objectivos estratégicos para a política da cooperação portuguesa. Destacamos: • • • 22 A necessidade de haver um enquadramento estratégico mais rigoroso (clarificação dos princípios e dos objectivos, precisão na definição das prioridades, enquadramento na política externa e nas novas orientações e concepções teóricas no domínio específico das políticas de desenvolvimento) e a necessidade do envolvimento dos sectores mais directamente empenhados na política de cooperação; A assunção de que a credibilização da política de cooperação passa por caber ao Ministério dos Negócios Estrangeiros a sua definição e orientação e pelo envolvimento, na sua gestão, de todos os ministérios intervenientes; O entendimento de que os cuidados primários de saúde e a educação de base são o melhor garante, a prazo, de um desenvolvimento económico-social sustentado e a aceitação dos modernos conceitos de partenariado (partnership — reciprocidade de vantagens para o país doador e para o recebedor) e de apropriação (ownership — definição pelo país beneficiário dos seus objectivos e prioridades), este último considerado a mais importante condição para o sucesso da reforma do sector da saúde em África (WHO, 1996); • • O apoio que a cooperação portuguesa deve dar ao processo de integração regional que os PALOPs já iniciaram; Os objectivos gerais da cooperação até 2015 (propostos pela OCDE e pelos quais Portugal é co-responsável) e que são a redução para metade da população mundial que vive em pobreza extrema (menos de 1 USD/dia), educação primária generalizada, eliminação da discriminação das mulheres na educação primária e secundária, redução da mortalidade infantil (abaixo dos 5 anos) em dois terços e da mortalidade à nascença em três quartos, acesso universal, através de cuidados de saúde primários, à saúde genética; Os objectivos específicos a curto prazo mais relacionados com a saúde, nomeadamente «reforçar a democracia e o Estado de direito», «reduzir a pobreza, promovendo as condições económicas e sociais das populações mais desfavorecidas, bem como desenvolver as infra-estruturas necessárias ao nível da educação», e «promover o diálogo e a integração regionais»; As prioridades no sector da saúde, nomeadamente a criação de infra-estruturas e serviços de saúde, incluindo, em particular, a assistência materno-infantil, o planeamento familiar e a luta contra as doenças endémicas e epidémicas, a promoção do acesso generalizado da população a cuidados de saúde e a ênfase dada à formação de quadros locais e à actuação de agentes portugueses no terreno, bem como à oportunidade que representa a capacidade e experiência portuguesas no que toca à investigação na área da medicina tropical. Em síntese, de tudo o que é dito releva que a trave mestra da política da cooperação portuguesa é a cooperação para o desenvolvimento, que tem em conta as opções dos países beneficiários, o princípio da parceria e a necessidade de promoção de uma melhor coordenação internacional da ajuda ao desenvolvimento (PIC, 2001). Esta política visa um progresso duradouro e equitativo. Centra-se na luta contra a pobreza, intervém nos sectores da educação, saúde e agricultura e dá especial relevância à formação e ao apoio à capacidade administrativa do Estado de forma a aproveitar da melhor maneira todos os meios já existentes ou que venham a ser criados. 2. Os actuais pontos de vista internacionais consideram que a intervenção em saúde em África deve ser orientada por novas concepções da relação entre saúde, pobreza e desenvolvimento e pelos consensos estratégicos sobre a intervenção em saúde criados no seio da OMS/ África pelos Estados membros. Calcula-se em mais de mil milhões o número de pessoas que foram excluídas dos benefícios do desenvolvimento económico e dos avanços ocorridos na saúde humana durante o século XX. Estima-se que 1300 milhões de pessoas vivem em pobreza absoluta, com um rendimento menor do que USD 1 por dia, e quase metade da população mundial vive com menos de USD 2 por dia. Os indicadores disponíveis apontam para que o número de pessoas a viver na pobreza absoluta continua a aumentar (WHO, 1999). A má saúde dos pobres é evidente. Os que vivem em extrema pobreza têm cinco vezes mais possibilidades de morrer antes dos 5 anos de idade. A possibilidade de morrer de parto em algumas áreas subsarianas é de 1 em 12, sendo na Europa de 1 em 4000 (WHO, 1999). A concepção económica clássica diz que a saúde decorre do desenvolvimento económico. Hoje surge REVISTA PORTUGUESA DE SAÚDE PÚBLICA Cooperação internacional forte evidência empírica de que o sentido de causalidade é o contrário (Blomm e Canning, 2000). Na verdade, no contexto saúde/doença e pobreza, a doença reduz a poupança familiar, a capacidade de aprender, a produtividade e a qualidade de vida, criando e perpetuando a pobreza. Os pobres, por sua vez, estão expostos a maiores riscos pessoais e ambientais, têm menor acesso à informação e são menos capazes de acederem a cuidados de saúde (WHO, 1999). Esta nova forma de olhar para o problema assume que uma população doente dificilmente iniciará um processo de desenvolvimento económico. Então a saúde pode prevenir a pobreza ou ser um caminho para sair dela. Assim (Bloom e Canning, 2000): • • • • Populações saudáveis são mais produtivas. Os trabalhadores são física e mentalmente mais capazes e perdem menos dias de trabalho por doença própria e/ ou de familiares; Uma população saudável, com maior longevidade, tende a investir mais nas suas capacidades, já que também é maior a expectativa de tirar daí proveito. Há aumento da escolaridade, da produtividade e dos rendimentos. A boa saúde aumenta a atenção das crianças na escola e as suas capacidades cognitivas; A maior longevidade leva as pessoas a procurarem salvaguardar o futuro. Aumenta a poupança, o que aumenta o investimento. Também uma força de trabalho saudável e escolarizada atrai o investimento; Concomitantemente, surgem dividendos demográficos. Nos países em desenvolvimento verificaram-se quebras muito acentuadas das taxas de mortalidade materna, infantil e de fertilidade. O aumento inicial de jovens dependentes traduziu-se num posterior aumento da VOL. 20, N. o 1 — JANEIRO/JUNHO 2002 população activa. O rendimento per capita aumentou e o mesmo se passou com o mercado de trabalho. A saúde leva a uma maior e melhor distribuição do bem-estar, aumentando o capital humano e social. Sai-se assim de um ciclo vicioso e entra-se num ciclo virtuoso. Análises económicas recentes mostram que a saúde (medida pela esperança de vida) é um bom preditor do subsequente desenvolvimento económico (Bloom e Canning, 2000). 3. Recentemente, a OMS traçou as grandes orientações para a instauração de uma política de saúde para todos na região africana para o século XXI , fruto da experiência acumulada em África e das novas formas de olhar para o desenvolvimento. Essas orientações são um quadro de referência importante para a elaboração de políticas de saúde nacionais e nele se apontam quatro grandes orientações estratégicas (OMS, 2000): • • Criar e gerar ambientes favoráveis à saúde: trata-se de apontar a promoção de ambientes saudáveis no lar, locais de trabalho e comunidade e preconizar medidas que passam pelo ambiente político e jurídico, pela responsabilização das comunidades, pelo emprego e segurança social, educação, saneamento do meio, alimentação e habitação. Trata-se de desenvolver uma atitude pró-activa de todos os sectores da sociedade; Reformar os sistemas de saúde, inspirando-se nos princípios dos cuidados de saúde primários: trata-se de criar sinergias entre todos os subsistemas de forma a garantir a equidade e pôr à disposição da população um conjunto mínimo de serviços de saúde. Desenvolver os cuidados primários de saúde aponta para a utilização da experiência ante- • • rior, para a cooperação técnica entre países, para a construção de parcerias, para a escolha de um conjunto mínimo de serviços e para a sua gestão descentralizada; Responsabilizar as populações e assegurar-lhes um suporte a nível individual, familiar e comunitário: implica assumir que os cuidados prestados ao nível da família são vitais e que os indivíduos, as famílias e as comunidades têm um papel determinante a desempenhar na promoção e gestão da saúde. Implica também reconhecer o papel das empresas, ONGs e sociedade civil na promoção do apoio social, cabendo aos governos facilitar a organização e trabalho dos principais actores; Criar as condições necessárias à participação e à liderança das mulheres no desenvolvimento sanitário e permitir-lhes que beneficiem dele: implica reconhecer o papel da mulher como primordial na promoção da saúde e na prestação de cuidados no seio da família e da comunidade e pugnar para que as mulheres obtenham uma representação equilibrada nos centros de decisão e gestão nos planos político, administrativo e técnico. 2. Estratégia para o sector da saúde O grande objectivo estratégico a considerar na intervenção da cooperação portuguesa no sector da saúde é o desenvolvimento do sistema de saúde dos países beneficiários, como meio de estes serem capazes de sustentar a luta pela saúde, contra a doença, de forma cada vez mais autónoma. Este objectivo geral norteia-se por uma perspectiva de cooperação para o desenvolvimento, mas não exclui, antes integra, as clássicas acções de cooperação virada para a interven- 23 Cooperação internacional ção directa no caso de problemas emergentes, como catástrofes ou eclosão de epidemias, ou para a prestação de cuidados a doentes com patologias graves, para as quais não existem soluções no país e que requerem ou a evacuação para Portugal ou o envio de equipas médicas especializadas. Propomos, como grandes orientações estratégicas para a intervenção da cooperação portuguesa, as seguintes: 1. Promover o reforço do quadro institucional a todos os níveis nas óptica da gestão, dos sistemas de apoio à decisão, da organização e da dotação de meios; 2. Apoiar o desenvolvimento de recursos humanos numa perspectiva de formação, de capacitação e de sustentabilidade (ensinar a resolver), de forma a promover uma autonomia progressiva dos beneficiários; 3. Intervir com base epidemiológica (doença na comunidade e seus factores condicionantes) sobre as principais causas de morbimortalidade ou sobre os grupos vulneráveis ou de risco, nomeadamente mulheres, crianças e idosos, e procurar que os programas de combate a essas causas se transformem em elementos nucleares em torno dos quais deverão ser estruturados os diferentes projectos de cooperação e a organização geral dos serviços; 4. Privilegiar os cuidados de saúde primários, concentrando os esforços no desenvolvimento dos serviços de saúde, de forma a garantir o acesso de toda a população aos cuidados essenciais, assumindo como segunda prioridade o desenvolvimento das especialidades básicas hospitalares; 5. Centrar grandes esforços na promoção da saúde e prevenção da doença não só por parte do 24 sector da saúde (vacinação e educação para a saúde), mas também integrando o esforço de outros sectores, nomeadamente educação e saneamento do meio, como poderosos instrumentos de melhoria dos níveis de saúde das populações; 6. Apoiar a investigação na área da saúde e doenças tropicais; 7. Acordar uma intervenção coerente com todos os parceiros nacionais e internacionais e com as estruturas e organizações dos países beneficiários; 8. Definir mecanismos de coordenação, monitorização e avaliação adequados simples e flexíveis, quer no âmbito de cada projecto, quer de âmbito global. Para além deste enquadramento, a intervenção da cooperação portuguesa, numa visão integrada e integradora, deve pressupor, em simultâneo, uma leitura em pelo menos duas grandes vertentes que se interpenetram: a vertente do beneficiário e a do doador. 2.1 Vertente do beneficiário Nesta vertente preconizamos o princípio da apropriação (ownership) pelo que a nossa intervenção deverá enquadrar-se, preferencialmente, nas prioridades e objectivos do país beneficiário (PIC, 2001). Isto obriga a considerar as necessidades e os problemas de saúde dos países beneficiários, bem como as estratégias e os programas definidos para os resolver e, na sua ausência, à necessidade imperiosa de contribuir para a sua definição. De um modo geral, podemos dizer que os perfis epidemiológicos dos países beneficiários são semelhantes, sendo agravados nos casos em que houve recentemente conflitos armados. É relevante um conjunto de doenças evitáveis, transmissíveis ou ligadas ao meio ambiente e aos modos de vida. Destacam-se as doenças evitáveis pela vacinação (sarampo, poliomielite, tétano, parotidite e tuberculose), o paludismo, as infecções respiratórias agudas e as doenças diarreicas, fundamentalmente pela morbilidade e mortalidade que provocam nas faixas etárias mais jovens, e as DST/ SIDA. A malnutrição é também uma importante causa de morbimortalidade. As elevadas taxas de fertilidade e natalidade agem negativamente na saúde das mães e das crianças. São emergentes a hipertensão arterial, as doenças cárdio-vasculares e a insuficiência renal crónica. As deficientes condições ambientais (água potável e saneamento do meio) e a fraca capacidade da população para se envolver na resolução dos problemas de saúde são um obstáculo a essa resolução. Aos problemas de saúde juntam-se as dificuldades próprias aos serviços de saúde, quer a nível dos equipamentos e dos recursos humanos que são escassos para as necessidades, quer ao nível da organização e funcionamento de todo o sistema de saúde e sectores associados (farmácia e medicamentos). A falta de recursos de toda a natureza, de capacidades de administração e organização e de coordenação dos diferentes sectores da sociedade e da ajuda externa comprometem as políticas, mesmo quando bem definidas. É também evidente a dificuldade que estes países têm em prestar cuidados de reabilitação e promover a integração social dos seus doentes crónicos ou dos deficientes. 2.2 Vertente do doador Nesta vertente são de considerar as características dos projectos e os instrumentos para a intervenção. A escolha de projectos a promover e a apoiar deve levar em conta, entre outras, para além do seu REVISTA PORTUGUESA DE SAÚDE PÚBLICA Cooperação internacional mérito técnico intrínseco, as seguintes características: (1) integrarem-se na estratégia da cooperação portuguesa e nas prioridades e procedimentos dos beneficiários; (2) terem uma entidade promotora credível; (3) actuarem sobre um problema relevante, ou de saúde ou de serviços de saúde; (4) serem capacitantes dos recursos humanos e das organizações dos beneficiários e/ou preferencialmente executados por recursos dos próprios; (5) anteciparem resultados evidenciáveis. Será avisado não escolher um grande número de projectos, mas antes concentrar esforços naquilo que é estratégico e determinante para a melhoria dos níveis de saúde do país beneficiário. Consideram-se como principais instrumentos para a intervenção a assistência técnica, o envio de profissionais, a formação (concessão de bolsas de estudo ou estágios), o apoio à construção de instalações e equipamentos e donativos em espécie, a prestação de cuidados médicos especializados em Portugal e a constituição de parcerias com outros promotores (ONGs, autarquias, universidades, institutos e outros). A assistência técnica, para além do seu carácter substantivo, deverá também constituir-se como oportunidade de formação, o que implica uma atenção especial e uma perspectiva pró-activa e integrada na preparação das missões. O envio de profissionais prestadores de cuidados (isolados ou em equipa) não deve assumir uma natureza singular. Preferencialmente, estas missões devem decorrer de um projecto de natureza institucional, integrado no plano de actividades da instituição a que os profissionais pertencem, ser continuadas no tempo e visar objectivos bem definidos. Estas missões, independentemente da sua natureza, nunca devem perder de vista o VOL. 20, N. o 1 — JANEIRO/JUNHO 2002 apoio simultâneo que devem dar à consolidação de processos organizativos, gestionários e formativos a nível local. A formação é um instrumento importante na intervenção da cooperação portuguesa, em que a língua se assume como um factor de discriminação positiva e de reforço das relações com os PALOP. A formação é também uma peça fundamental para a sustentabilidade das intervenções e determinante para o sucesso de uma política de desenvolvimento dos recursos humanos da saúde, elemento estratégico no cumprimento dos objectivos de saúde dos diferentes países e da região africana (OMS, 1998). Para aumentar a eficiência da formação há que garantir uma articulação entre programas e projectos de forma a não repetir conteúdos e a transmitir uma visão integrada da intervenção em saúde. As três grandes preocupações nesta área, falta de capacidade instalada para formar, pertinência da formação e fuga de cérebros, pressupõem, entre outras medidas, que se escolham formadores experientes, que se preste atenção à adequação dos programas, que se dê apoio preferencial à formação de formadores locais e à formação in loco ou em países com realidades semelhantes. Deve explorar-se a possibilidade de apoiar a organização dos PALOPs entre si para efeitos de formação e reconhecer-se a necessidade da articulação com o sector da educação. A dotação em instalações e equipamentos e os donativos em espécie requerem procedimentos aparentemente simples e por isso são instrumentos muito utilizados. No entanto, quando se tomam opções nesta área, importa acautelar um conjunto de questões, sob pena de nos confrontarmos com um grande desaproveitamento do investimento feito. Entre outras, citamos a necessidade de garantir a existência de recursos humanos que permitam uma utilização mínima e adequada, quer de instalações, quer de equipamentos, e, no caso destes últimos, perceber quais as possibilidades de manutenção e de substituição em caso de avaria, de ser dada especial atenção à elaboração dos planos funcionais e à concepção arquitectónica dos projectos, de forma a garantir-se a adaptação às características locais, e de serem assegurados os mecanismos de distribuição de consumíveis, de medicamentos e de outros donativos. A prestação de cuidados médicos especializados em Portugal é um processo tradicional de ajuda que supera a inexistência de alguns serviços ou de técnicas de ponta nos países beneficiários. Para aumentar o sucesso desta intervenção é necessária uma adequada organização do processo de selecção dos doentes, da capacidade de oferta dos hospitais portugueses e do apoio directo aos doentes e seus familiares, quer durante a estada em Portugal, quer após o repatriamento. A constituição de parcerias é de extrema importância, pois permite intervir com mais recursos, por vias mais diversificadas, suscitar sinergias e assegurar melhores resultados. Entende-se que a maior parte das intervenções, embora apoiadas pela cooperação portuguesa, deverão ser executadas por entidades que estejam aptas para tal. A intervenção em parceria com organizações não governamentais, municípios e outras entidades, públicas ou privadas, deve ser estimulada, sendo que a escolha de parceiros deve fazer-se segundo critérios que valorizem a experiência em lidar com a área ou com o problema em causa e a credibilidade técnica e gestionária. Devem também ser exploradas parcerias com organizações internacionais, nomeadamente Banco Mundial, OMS, UNICEF, UE e OCDE. A constituição de parcerias exige a criação de mecanismos de coordenação expeditos, quer a nível da 25 Cooperação internacional cooperação portuguesa, quer a nível local, eventualmente através das delegações técnicas de cooperação, cuja criação estava prevista nas grandes opções do Plano para 2001. Esta coordenação deve funcionar regular e permanentemente, de forma a acompanhar as várias intervenções em curso, a introduzir correcções atempadas em processos que estejam a revelar-se inadequados e a contribuir para a avaliação dos diferentes projectos e para a preparação de intervenções futuras. Bibliografia BLOMM, D. E.; CANNING, D. — The health and wealth of nations. Science. 287 : 5456 (2000) 1207. INSTITUTO DA COOPERAÇÃO PORTUGUESA — Programa integrado da cooperação portuguesa (PIC) 2001. Lisboa : Instituto da Cooperação Portuguesa, 2001. LEI n.o 30 — B/2000. DR I Série, supl. 299 (2000-12-29) — Grandes opções do Plano para 2001. RESOLUÇÃO do Conselho de Ministros n. o 43/99. DR I Série-B 115 (99-05-18) 2636-2655 — Aprova o documento de orientação estratégica «A cooperação portuguesa no limiar do século XXI». OMS — Estratégia regional de desenvolvimento de recursos humanos para a saúde : relatório do director regional. Copenhaga : Comité Regional Africano, 1998 (AFR/ RC48/10). OMS — Bureau Regional de l’Afrique — Politique de la santé pour tous dans la region africaine pour le 21ème siècle : agenda 2020. Genéve : Bureau Regional de l’Afrique, [2000] (AFR/RC50/8 Rev). WHO — Poverty and health : report by the director-general. Copenhagen : World Health Organization, 1999 (EB;105/5). WHO — UN special initiative on Africa : the health dimension. Copenhagen : World Health Organization, 1996 (Press Release; WHO/18). 26 Summary CONTRIBUTION TO A STRATEGY FOR PORTUGUESE HEALTH COOPERATION FOR DEVELOPMENT Cooperation is a very important instrument for the relationship between Portugal and African countries, specially those who have Portuguese as their official language. Nowadays, accordingey to the new development cooperation concepts, health is a priority mean on absolute poverty struggle. Therefore it is urgent to define a strategy for Portuguese health cooperation for development. This article is the authors’ contribution to that definition. Our framework has three main insights: general Portuguese cooperation strategy and policy, international concepts about development and fighting against poverty and WHO health strategy for Africa. The cooperation strategy for health fundamental axis are: institutional support; human resources development; epidemiologic based intervention; primary health care development and support in a community base; priority for health promotion and health prevention; health and tropical diseases investigation support; building of a coherent partnership with all organisations; keeping a simple, adequate and flexible coordination, monitoring and evaluation process. In order to improve the strategy it is also important to think about donor and beneficiary conditions. We assume that the traditional cooperation activities (patient evacuations to Portugal and catastrophe and emergency aid, and missions for direct health care delivery) must be integrated in the general developing cooperation strategy for health. REVISTA PORTUGUESA DE SAÚDE PÚBLICA