ADOECIMENTO DOCENTE NA REDE FEDERAL DE EDUCAÇÃO
PROFISSIONAL CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA EM MINAS
GERAIS. UM FENÔMENO POSSÍVEL?
Ms. Paulo Roberto Vieira Júnior
PUC Minas (PPGED) / CAPES
Dra. Maria Auxiliadora Monteiro Oliveira
PUC Minas (PPGED)
Ms.Flávia Temponi Goes
(Instituto Izabela Hendrix)
RESUMO: De acordo com a literatura o fenômeno do adoecimento docente tem
crescido no Brasil e no mundo. Diversas pesquisas têm investigado este fenômeno nas
redes particular, municipal e estadual, da educação básica ao ensino superior. Estas
investigações indicam que o referido fenômeno é influenciado pelo cenário capitalista
de produção que, em constante transformação, expõe o professor a extensa demanda de
atividades e condições de trabalho inadequadas, as quais são geradoras de aumento de
produtividade e consequente intensificação do trabalho. Tal cenário, em casos extremos
pode até conduzir ao abandono profissional conhecido como a Síndrome de Burnout.
Entretanto, inexistem pesquisas, que abordem o tema do adoecimento docente na Rede
Federal de Educação Profissional Científica e Tecnológica (RFEPCT). Assim, esta
pesquisa quantitativa de caráter exploratório e descritivo teve como objetivos verificar e
problematizar se os professores e professoras da referida Rede em Minas Gerais,
trabalharam com problemas de saúde e sintomas de doenças nos últimos dois anos.
Visa também comparar os resultados entre os sexos, bem como levantar dados para
realização de futuras pesquisas sobre a associação entre o trabalho docente e o
fenômeno do adoecimento. Para tal, utilizou três questões, de um survey, com 267
professores, dos quais, 90 são professoras. Os dados coletados nessa investigação foram
analisados pelo programa SPSS 16.0 for Windows® e baseou-se em tabela de
contingência com quiquadrado a 5% de significância. Os resultados desse estudo
apontaram que 160 (59.9%) respondentes, trabalharam com problemas de saúde ou
sintomas de doenças nos últimos dois anos, contra 107 (41.1%). Desses 160 (59,9%)
professores, 44 (16.4%) foram afastados em média (25.3±) dias, com desvio padrão
(39.62±). Os problemas e doenças mais relatados por professores e professoras foram:
dor de cabeça com 86, estresse com 80, e dores lombares com 55 citações. Os dados
apurados apresentaram-se diferentes em relação aos citados por homens e mulheres
(p=0.0028). Os dados coletados sugerem que nessa amostra (n=267), tanto homens
quanto mulheres sofreram com problemas e sintomas de doenças nos últimos dois anos.
Contudo, apenas 44 (16.4%) foram afastados conseguindo manter a saúde evitando o
licenciamento.
Para compreender tal resultado, recorreu-se ao referencial ergológico,
conhecido como ferramenta para análise e transformação do trabalho, no qual valoriza a
existência da infinita capacidade do trabalhador para criar novas estratégias e normas de
atuação (renormalizações) para enfrentar situações de desconforto no ambiente de
trabalho em prol da manutenção de sua saúde. Comparando a rede pesquisada
(notadamente em condições de trabalho mais favorável) com as demais (estadual e
municipal), pode-se afirmar que, a associação entre as renormalizações promovidas
pelos trabalhadores, e as condições de trabalho e salário, pode explicar em parte, as
baixas taxas de afastamento apuradas nessa investigação. Destaca-se, a necessidade da
realização de mais estudos com essa categoria, visando conhecer e compreender como
se manifestam os fenômenos do adoecimento e da construção da saúde docente, na
RFEPCT. Além disso, novas investigações contribuirão para minimizar a carência de
pesquisas sobre os temas na Rede Federal, e consequentemente, produzir conhecimentos
que possibilitem criação de políticas de prevenção e mecanismos de intervenção para o
combate ao adoecimento.
PALAVRAS-CHAVE: atividade docente; adoecimento; ergologia
1. Introdução
De acordo com a literatura o fenômeno do adoecimento docente tem crescido no
Brasil e no mundo. Diversas pesquisas (DELCOR et al., 2004; ESTEVE, 1999; FARIA;
GASPARINI, BARRETO e ASSUNÇÃO, 2005; RACHID, 2009; PAIVA; SARAIVA,
2005; PORTO et al., 2006; SILVANY NETO et al., 2000) têm investigado este
fenômeno nas redes particular, municipal e estadual, em diferentes níveis escolares. As
principais publicações focalizam, preferencialmente, a educação básica e o ensino
superior, nas quais indicam que o adoecimento docente é derivado de uma
multiplicidade de fatores. Estes apresentam como pano de fundo a influencia do cenário
capitalista de produção que está em constante transformação expondo o professor a
extensa demanda de atividades e condições inadequadas de trabalho. Sem dúvidas, estes
fatos geram aumento de produtividade e consequente sobrecarga de trabalho,
desdobrando-se na instalação de doenças de etiologias diversas.
Wisner (1994) afirma que ao longo da carreira docente o trabalhador adquire
doenças que o afastam temporária ou até mesmo definitivamente de sua função. Tais
ações justificam-se pela presença de precárias condições de trabalho, a imposição de
novos papéis atribuídos ao professor, problemas advindos da gestão da atividade
docente, falta de autonomia, aumento das tarefas burocráticas, precária infraestrutura,
insuficiência de materiais didáticos, mercado de trabalho cada vez mais competitivo, o
rápido avanço tecnológico, desvalorização profissional, a constante mudança do perfil
discente, baixos salários e fatores de risco do próprio ambiente, tais como salas de aula
pequenas, excessivo número de alunos, elevado nível de ruídos, violência escolar, entre
outros. (CARLOTTO, 2002; CHARLOT, 2002; CODO, 2006; GOMES, 2002;
NOUROUDINE, 2004; SOUSA NETO, 2005).
Na visão de Esteve (1999) todo esse rol de motivos pode ser reunido em torno de
um sentimento avaliado como mal estar docente. Este expressa a união de vários fatores
sociais e psicológicos presentes no exercício da docência que podem gerar um ciclo
degenerativo e afetar a saúde, a eficácia docente, sua motivação, seu esforço e sua
implicação com o trabalho, além de influenciar sua autoimagem e produzir uma crise de
identidade. A infinidade de condicionantes negativos que incide sobre a categoria
docente tem repercutido em sua saúde física e emocional desdobrando-se na
manifestação de um fenômeno chamado Síndrome de Burnout.
Essa síndrome, investigada a partir da década de 1970, conhecida como
síndrome da “desistência” afeta ainda quem está em sala de aula e permanece no
trabalho. É interessante ressaltar que o Burnout “ocorre em trabalhadores altamente
motivados, que reagem ao stress laboral trabalhando cada vez ainda mais até que entram
em colapso”(CODO, 2006, p 241). Esse esgotamento físico e emocional gera um quadro
de frieza no qual o professor deixa de se envolver com pessoas, problemas e
dificuldades, tornado-se ansioso, melancólico e com baixa autoestima. Esse quadro
repercute sobre o processo ensino-aprendizagem tornando-o completamente inviável,
produzindo conflitos entre o eufórico professor em inicio de carreira e o depressivo
trabalhador da atualidade.
Na pesquisa organizada pelo autor supracitado, durante 2 anos, com 52 mil
professores de escolas públicas, em 144 escolas, nos 27 estados da federação, apurou-se
que, um em cada quatro professores sofre de exaustão emocional, despersonalização e
falta de envolvimento pessoal no trabalho. Tais aspectos caracterizam os três
componentes do conceito multidimensional da Síndrome de Burnout.
Em se tratando de pesquisas que discutam o fenômeno do adoecimento, mal
estar docente ou a manifestação da Síndrome de Burnout na Rede Federal de Educação
Profissional e Científica e Tecnológica, as únicas encontradas são os trabalhos de
Burnier et. al. (2007) e Lima e Silva, (2005). Os resultados destes estudos apontam a
inexistência de relatos sobre o mal-estar entre os professores da educação profissional
contrariando o que acontece na educação em geral.
Para Burnier et. al. (2007) isto se justifica, pelo fato desses professores
vivenciarem experiências satisfatórias que lhes possibilitam construir uma prática
docente com características muito particulares, com diferenças em muitos aspectos da
observada na categoria em geral. Tudo isso, de certa maneira, colabora para que seu
desempenho mantenha-se em bom nível e se efetive como fator para promoção da
saúde.
Na referida Rede de ensino, percebe-se alguns fatores que podem ser analisados
como contribuintes para um melhor nível de motivação e consequente realização
docente. Entre eles, destacam-se: a existência de plano de carreira, melhor estrutura
física e maior quantidade de equipamentos, melhores salários, incentivo a formação
continuada (afastamento remunerado das atividades de sala de aula e custeio parcial dos
cursos), melhor nível dos discentes devido a seleção via vestibular, menor carga horária
em sala de aula (máximo de 24 horas) entre outros fatores.
Desta feita, apesar das características muito particulares do trabalho docente na
RFEPCT este artigo pretende de forma geral investigar a existência do fenômeno do
adoecimento docente, na Rede Federal, justificando sua realização pela inconsistência
de estudos com docentes desta modalidade educacional.
2. Referencial teórico
Tendo em vista a sociedade moderna, no qual exigi do trabalhador mais rapidez
e dinamismo em suas funções, as características do trabalho docente têm produzido
diversos impactos para a saúde do professor. Entretanto, antes mesmo de compreender
quais são esses impactos é necessário entender que trabalho é esse. Caracterizá-lo e
compreender quais são suas funções, não é tarefa simples, visto que no tocante ao papel
social e as atribuições historicamente reportadas ao trabalho docente está relacionado a
elementos como complexidade, intensificação, proletarização, profissionalização e
desprestígio social. Elementos que contribuem para a configuração de exagerado
número de funções e uma dificuldade em limitar, quais são as reais e mais importantes
atribuições desse trabalho. (OLIVEIRA, 2005).
Nosella (2005, p. 226), apresenta um viés sobre a complexidade do trabalho
docente ao afirmar que o exercício de um educador, “se refere às competências
específicas adquiridas por uma pessoa, que as transmite a outras, ensinando-as e
treinando-as [...] se refere à responsabilidade na formação integral do cidadão”. Para o
referido autor, o professor deve responsabilizar-se por ensinar a leitura do mundo e não
apenas, a leitura das palavras, evitando posições reducionistas e a reedição de práticas
pedagógicas neutras e desconectadas da realidade envoltas pela complexidade que é
educar.
Esteve (1999, p. 59), discute o trabalho docente, no âmbito da intensificação a
partir das diversas funções ou tarefas realizadas na sala de aula. Por esse prisma
espera-se que na execução do trabalho docente, sejam cumpridos objetivos pedagógicos
e sejam contempladas funções associadas ao ensino e aprendizagem dos discentes
como: manter a disciplina em sala de aula, ser simpático e afetuoso; conseguir atender
um aluno mais adiantado, ter, igual cuidado, com os que aprendem mais lentamente e
estimular a aprendizagem. A expectativa projetada sobre os professores é que consigam:
ocupar-se, individualmente, do desenvolvimento dos alunos; fazer brotar e evoluir sua
autonomia; promover a integração social; conduzir cada indivíduo a se adaptar às regras
do coletivo. Para além devem programar, avaliar, receber os pais, apresentar os
progressos e dificuldades dos filhos e resolver problemas burocráticos, em uma “lista de
exigências que parece não ter fim” produzindo além da complexidade, alto grau de
intensificação.
Na opinião de Gomes (2002), a realização de funções administrativas, como
preencher diários, emitir relatórios, lançar notas e participar de conselhos de classe,
somadas à elaboração de avaliações ao longo das etapas, entrega e correção de provas e
trabalhos, tem papel decisivo, na intensificação do trabalho docente. O desgaste gerado
pelo excessivo número de tarefas é potencializado, pelas precárias condições salariais da
grande maioria de professores, que os leva a dobrar o número de aulas e,
consequentemente, trabalhar em mais de uma escola, para melhorar as condições de
vida pessoal e familiar. Esse conjunto de fatores, ainda é influenciado pelas constantes
mutações sofridas pela educação no qual seus objetivos são, constantemente, marcados
pela imprevisibilidade de acontecimentos; individualidade discente e variedade cultural
que caracteriza o cenário escolar. (OLIVEIRA, 2005).
Segundo Gomes (2002, p. 22), essa intensificação é produto de um sistema
educativo que tem “produzido novos desafios para o magistério, em face da rapidez das
novas demandas sociais”. Além de ministrar sua(s) disciplina(s), os professores devem
promover atividades relativas aos temas transversais: sexualidade, meio ambiente,
educação para o trânsito, voto consciente, consumo, qualidade de vida, uso de drogas,
noções de higiene, homofobia, racismo, prevenção de doenças etc. Essas exigências
desdobram-se
na
promoção
de
debates
sobre
esses
temas
nos
projetos
político-pedagógicos, que somadas ao excessivo número de atribuições, próprias ao
conteúdo específico das disciplinas lecionadas, promovem a intensificação da carga de
trabalho, e que se forem mal administradas, poderão impactar a saúde do professor.
O trabalho docente, entendido enquanto atividade humana não pode ser
simplificado ou totalmente antecipado por normas. Visto que, a complexidade da
atividade docente e a infinidade das ações desempenhadas pelos professores
transcendem o elevado rol de prescrições de toda ordem que cerca sua execução. Nessa
direção, a partir do quadro exposto, pode-se afirmar que todas as definições elencadas
relativas às funções do trabalho docente serão insuficientes para antecipar sua real
dimensão.
Assim sendo, qualquer proposta para definição das atribuições da atividade
docente, por mais extensa que se apresente, sempre implicará um sentido de
incompletude, ainda que ressaltada a sua importância e relevância social, pois a sala de
aula é o espaço do imprevisto, da ação humana repleta de suas particularidades. Tendo
em vista as prescrições relativas ao trabalho docente, é no âmbito da sua realização que
o professor vivencia um debate de normas, que segundo a abordagem ergológica, o
levará a realizar escolhas que o mobilizarão em busca da saúde nos espaços de trabalho.
(SCHWARTZ, 2001; 2007). A ergologia é uma disciplina do pensamento humano que
analisa o trabalho como atividade humana, na qual o trabalhador age na conformidade
de seus valores, sua dimensão ética e seus conhecimentos para buscar saídas em prol da
saúde. Baseado na complexidade e na intensificação relativa a atividade docente e no
impacto que esses elementos podem gerar para a saúde dos professores e professoras da
RFEPCT é que foram gerados os objetivos dessa pesquisa.
3. Objetivos
Amparado por esses elementos e em virtude da ausência de pesquisas sobre os
temas saúde/adoecimento na RFEPCT, o objetivo dessa pesquisa foi verificar e
problematizar se professores e professoras trabalharam com problemas de saúde e
sintomas de doenças nos últimos dois anos na RFEPCT em Minas Gerais e, comparar os
resultados, bem como subsidiar novas pesquisas sobre o tema.
4. Metodologia
Esta investigação constituiu-se de revisão bibliográfica e pesquisa quantitativa
de caráter analítico e descritivo. É importante ressaltar que esse estudo integra a
Pesquisa do Observatório Docente realizada pelos Núcleos: FaE/UFMG, PUC Minas e
CEFET/MG, sob o fomento da CAPES/INEP, e está incumbido de analisar a existência
ou não, do fenômeno do adoecimento docente na RFEPCT.
Para coleta de dados utilizou um survey, enviado para o email de 267 professores
efetivos, 177 (66.2%) homens, sendo 90 (33.8%) mulheres, no qual cada sujeito acessou
o questionário em ambiente virtual, por meio de um link exclusivo ou mediante
preenchimento de documento impresso. Os respondentes dessa pesquisa estavam
lotados em 42 unidades dos Institutos Federais e do CEFET-MG, espalhados pelo
território de Minas Gerais. Ressalta-se que essa pesquisa foi autorizada pelos Diretores
das Instituições que forneceram os endereços eletrônicos dos professores para futuro
contato. A devolução dos questionários ocorreu entre abril e junho de 2013.
Foram analisadas as respostas das seguintes questões: 38.1- Você já trabalhou
com problemas de saúde, nos últimos dois anos? 38.2- Em caso afirmativo, que
sintomas, doenças ou problemas você vivenciou? E a questão 39- Você esteve afastado
(a) / licenciado (a), nos últimos anos, por motivo de doença? Por quanto tempo?
Esclarece-se que nas questões, 38.1 e 38.2, as opções de resposta eram “sim” e “não”.
No caso de resposta afirmativa, na questão 38.2, os docentes puderam escolher entre
oito opções: dor de cabeça, estresse, dores lombares, insônia, problemas
ósteomusculares, problemas respiratórios, problemas no aparelho fonador, problemas
cardiovasculares, podendo assinalar várias respostas. E na questão 39, o docente
indicou, o número de dias que ficou afastado.
Os dados foram armazenados e tabulados pelo programa SPSS 16.0 for
Windows®. O controle do erro de digitação foi feito por dupla digitação dos dados. Os
dados brutos receberam tratamento para checagem de possíveis diferenças. Foram
realizadas análise descritiva e comparativa e tabela de contingência com quiquadrado a
5% de significância.
5. Desenvolvimento
Esta investigação foi realizada com 267 professores, de um total de 334
respondentes, taxa de devolução de (79,94%), dos quais, 177 (66.2%) homens e (33.8%)
90 mulheres (Tabela 1).
Tabela 1- Número de professores da Rede Federal de Educação Técnica por sexo.
Sexo
Masculino
Feminino
N
177 (66.2%)
90 (33.8%)
Idade
41± 3
38± 4
Tx de devolução
79,94%
A maioria dos professores 160 (59.9%) afirmou ter trabalhado com problemas de
saúde ou sintomas de doenças, nos últimos dois anos, enquanto 107 (41.1%) afirmaram
não ter vivenciado nenhum problema (Tabela 2).
Tabela 2- Você já trabalhou com problemas de saúde nos últimos dois anos?
Sim
Não
160
59.9%
107
41.1%
Entre as doenças vivenciadas por professores e professoras nos últimos dois anos
destacaram-se: dor de cabeça com 86 (32.2%), o estresse com 80 (32.2%) e a insônia
com 55 (20.5%) ocorrências.
Os problemas menos evidenciados foram:
ósteomusculares 36 (13.4%), respiratórios e aparelho fonador 21 (7.9%) e problemas
cardiovasculares 10 (3.7%) citações (Tabela 3).
Tabela 3- Doenças ou problemas vivenciados pelos docentes nos últimos dois anos.
Problemas e Doenças
n= 267
Dor de cabeça
86
32.2%
Estresse
80
29.7%
Dores lombares
55
20.5%
Insônia
38
14.2%
Problemas respiratórios
21
7.9%
Problemas no aparelho fonador
21
7.9%
Problemas cardiovasculares
10
3.7%
Foi possível escolher mais de uma alternativa dentre as opções ofertadas.
Na comparação entre os grupos, professores e professoras indicaram maiores
incidências em três problemas ou sintomas. Entre os homens a dor de cabeça teve 51
(30.5%) registros, enquanto 35 (38.8%) entre as mulheres, quanto ao estresse 50
(29.9%) homens citaram-no, 30 (33.3%) mulheres, dores lombares, 37 (22.2%) homens
e 18 (20.0%) mulheres (Tabela 4). De acordo com os homens a insônia teve 26 (15.6%)
incidências, enquanto 12 (13.3%) para mulheres. Os problemas ósteomusculares
acometeram 19 (11.3%) homens, e 17 (18.9%) mulheres, problemas cardiovasculares 9
(5.4%) homens e uma mulher, problemas respiratórios 7 (4.2%) homens, e 14 (15.5%)
mulheres. Por fim, 7 (4.2%) homens tiveram problema no aparelho fonador, enquanto
13 (14.4%) mulheres (Tabela 4).
Tabela 4- Comparação entre os principais problemas de homens e mulheres
Características
Masculino
Feminino
N
177
%
90
%
Dor de cabeça
51
30.5
35
38.8
Estresse
50
29.9
30
33.3
37
22.2
18
20.0
Insônia
26
15.6
12
13.3
Problemas cardiovasculares
9
5.4
1
1.1
Problemas respiratórios
7
4.2
14
15.5
Problemas no aparelho fonador
7
4.2
13
14.4
Problemas ósteomusculares
19
11.3
17
18.9
Dores lombares
X2 de Pearson para comparação entre homens e mulheres. p = 0,0028 , grau de significância estatística (<
0,05)
Quanto aos afastamentos, dos 177 homens, 26 (14.7%) se licenciaram nos
últimos dois anos, contra 151 (85.3%) que não foram afastados. Das 90 professoras, 18
(20.0%) foram afastadas, contra 72 (80.0%) que não foram licenciadas de suas
ocupações. A média de dias de afastamento foi (25,2±) com desvio padrão (39,6±).
Tabela 5-Você já esteve afastado (a) nos últimos dois anos, por motivo de
doença? Por quanto tempo?
Feminin
Masculino
o
Total
Dias afastados
17
N
7
9
%
2
Sim
6
14.7
15
Não
1
267
%
0
%
dp
1
20.
16.5
8
0
44 39,6±
7
85.3
2
80.0
223 83.5
média
25.2±
Importante registrar que o impacto gerado pelo afastamento dos docentes por
motivo de doença desdobra-se para várias direções, sendo que o principal deles está
diretamente associado ao cotidiano desses trabalhadores e ao seu convívio social e
familiar. Outro resultado desse processo de afastamento da sala de aula é a paralisação,
mesmo que momentânea, das atividades pedagógicas, fato de afeta diretamente a
qualidade dos processos educacionais. Outro transtorno é a mudança na rotina escolar,
com necessidades de alteração de horários, reposição de aulas e contratação de
professores temporários, que no caso da (RFEPCT) pode demandar muito tempo devido
a morosidade dos processos de contratação. De maneira geral, o fenômeno do
adoecimento docente, precisa ser encarado a partir de uma perspectiva multidisciplinar
visto que é um problema que transcende a área de saúde, tornando-se correlato aos setor
de gestão de pessoal e segurança no trabalho.
Os dados encontrados nesta pesquisa, referentes a problemas de saúde e
sintomas de doenças relatados pelos docentes, deixa indícios de que o trabalho realizado
na Rede Federal pode produzir o fenômeno do adoecimento, apesar de haver condições
de trabalho satisfatórias e bem distintas, se comparado as redes municipal e estadual de
ensino. (DELCOR et al., 2004; NORONHA; ASSUNÇÃO; OLIVEIRA, 2008). De
acordo com esses autores o adoecimento docente é resultado de exposição a severas
condições de trabalho, como: salas de aula com excessivo de alunos, alto nível de
ruídos, violência escolar, baixos salários entre outros fatores e que tem sido vivenciado
pelos professores nos últimos 20 anos, influenciado diretamente, pelo modelo capitalista
que produção, que introduziu na educação processos de gerenciamento e controle
aumentando as exigências de uma atividade de trabalho que por essência é envolta por
alto grau de complexidade e exigência intelectual. Apesar dos fatores citados não
apresentarem-se como comuns na (RFEPCT), entende-se que existam outros elementos
que influenciem o fenômeno do adoecimento associados ao trabalho desses professores.
Alguns problemas detectados nesta investigação estão em consonância com os
achados por (GRILLO, PENTEADO, 2005; REIS et al., 2006; VIANELLO, 2006).
Esses autores identificaram que a categoria docente vivencia: problemas nas cordas
vocais, disfunções articulares, circulatórias e distúrbios psicológicos, entre os quais o
estresse, que estão associados ao trabalho docente. Nessa pesquisa o estresse foi citado
por 80 (29.7%) docentes, problema evidenciado em outras investigações, e que está
diretamente vinculado a experiências vividas no trabalho docente, além de ser avaliado
como desencadeador de outros males. (PORTO et al., 2006)
Sobre os efeitos do estresse no trabalho docente Trigo, Teng e Hallak (2007),
observaram que a categoria docente é cotidianamente exposta a prolongados níveis de
estresse, experimentando carga horária excessiva e conflitos interpessoais com diversos
atores da comunidade escolar, situações que podem desencadear dor de cabeça,
distúrbios psicológicos e provocar quadros de exaustão emocional que podem culminar
com processos de diminuição do sentimento de realização pessoal, afastamento das
relações interpessoais, queda de produtividade e por fim, até abandono da profissão
como comprovado por Codo (2006).
Dados dessas pesquisas estão em sintonia com os resultados apresentados na
presente investigação, pois também apresentou, entre os vários problemas vivenciados
pelos docentes, dor de cabeça com incidência de 86 (32.2%) ocorrências. Apesar de não
haver como associar, diretamente, estresse e dor de cabeça, os relatos dos professores
indicam que essa é uma queixa constante podendo se desdobrar em sua associação.
Em relação ao aparelho fonador, Grillo e Penteado (2005) e Vianello (2006)
afirmam que a categoria docente possui maior tendência de desenvolver problemas
neste segmento corporal se comparado a outras profissões. Esses problemas são
desencadeados por inadequada e excessiva utilização da voz, que se materializam no
aparecimento de: pólipos, desgaste das pregas vocais e rouquidão, sendo potencializado
por fatores ambientais: poluição sonora, demasiado número de alunos em sala, poeira e
excessiva carga de trabalho.
Em relação á comparação entre os sexos, no que tange ao aparelho fonador,
encontrou-se 13 (14.4%) reclamações de professoras e 7 (3.9%) dos homens, o que
segundo Grillo e Penteado (2005) e Vianello (2006), pode ser explicado, pelo timbre de
voz menos potente, tido como elemento desencadeador dos desgastes e dos
adoecimentos nesta ferramenta de trabalho. Os resultados do presente estudo mostraram
uma incidência maior de queixas das professoras quando comparado aos homens, o que
está em acordo com a literatura.
Quanto ao número de afastamentos ou licenciamentos, 160 (59.9%) docentes
relataram ter vivenciado problemas nos últimos anos, contudo, apenas 44 (16,5%) dos
(n=267) estiveram afastados, com tempo médio de (25,2±) dias. Os achados dessa
pesquisa realizada na (RFEPCT) indicam a possibilidade de que o baixo índice de
afastamentos esteja associado às satisfatórias condições de trabalho da categoria o que
justificaria em parte, o fato de que dos 267 respondentes, apenas 44 (16.5%) foram
licenciados de suas ocupações, apesar de 160 (59.9%) professores terem reclamado de
problemas ou sintomas de doença nos últimos dois anos.
Outra perspectiva para analisar o contraste entre o alto número de queixas dos
professores e o coeficiente inferior de afastamento, deve-se, de acordo com a ergologia,
a produção de estratégias para manutenção e construção da saúde. (SCHWARTZ, 2000;
2001; 2007). Para Trinquet (2010) seguidor da perspectiva ergológica, existe uma
capacidade infinita dos trabalhadores de produzir novas normas, de (re) criar o meio em
que vivem, de se adaptar a condições de trabalho inadequadas, em um movimento
constante de luta pela sobrevivência, que os faz mobilizar recursos intelectuais, físicos e
psicológicos na busca pela saúde, investidos na atividade de trabalho para lidar com as
infidelidades do meio. Essas infidelidades no espaço escolar evidenciam-se quando
ocorre falha em recurso tecnológico, um inusitado ato de indisciplina discente, um
conflito com gestores, desvalorização da carreira, entre outras causas.
Um exemplo dessa perspectiva é o estudo realizado por Vieira Júnior e Santos
(2011), que amparados pela análise ergológica da atividade de trabalho descobriram seis
professores de ensino básico, que jamais foram afastados de suas atividades por motivo
de adoecimento. Segundo esses autores, baseado na ergologia, os educadores
entrevistados, possuem uma capacidade subjetiva de renormalizar, que por meio de
ações singulares permitem a produção de estratégias de enfrentamento para manutenção
da saúde no seu dia-a-dia, que produz confronto com as infidelidades do meio e as
condições de trabalho adversas.
6. Conclusões
O fenômeno do adoecimento docente amplamente descrito no Brasil em todos os
níveis educacionais e nas diversas redes de ensino. tem sofrido nas últimas décadas com
o aumento da intensificação, precarização e desvalorização do trabalho dos professores,
que vivenciam na atualidade, a responsabilidade por gerir um trabalho altamente
complexo, que exige de seu executor elevado grau de envolvimento físico e intelectual
que pode gerar desgastes emocionais e depreciação de seu estado geral de saúde.
Entretanto, em relação a estudos na RFEPCT nota-se uma lacuna na literatura,
principalmente quando o objeto de investigação é o adoecimento de professores. Assim,
o objetivo desse artigo foi verificar se os docentes desta rede trabalharam doentes nos
últimos anos, além de comparar os tipos de problemas de saúde vivenciados por
professores e professoras.
Baseado nesses resultados percebe-se que houveram queixas da categoria
relacionadas ao fenômeno do adoecimento. Houve relatos de todos os problemas ou
sintomas indicados no instrumento de coleta. Contudo, faz-se necessário a realização de
pesquisas mais aprofundadas para compreender a que, as causas dos afastamentos estão
relacionadas, e quais os motivos condicionam os professores para suportarem trabalhar
doentes ou com sintomas de doenças.
Quanto aos resultados dessa pesquisa, nota-se acordo com os achados na literatura,
pois evidenciaram que a maior parte desta população trabalhou com problemas de saúde
nos últimos dois anos. Entretanto, o fato de não se afastarem com frequência do trabalho
por motivo de doenças, apesar de relatarem vivenciar diversos problemas de saúde e
sintomas nos últimos dois anos, justifica a necessidade de mais pesquisas. O fato de
vivenciarem melhores condições de trabalho poderá estar influenciando esses
resultados?
Ou estariam conjuntamente, criando estratégias e processos de
enfrentamento como mecanismos de defesa para não se afastaram de suas atividades
como alerta o referencial ergológico? Para a ergologia esse movimento de resistência é
explicado pela infindável capacidade criativa do trabalhador em lutar pela vida e pela
saúde nos espaços laborais e sempre produzir novas normas de atuação, as chamadas
renormalizações.
Ficou comprovado que existem diferenças entre as formas de adoecimento de
professores e professoras. Contudo, é preciso compreender os motivos pelos quais
professores e professoras vivenciam os problemas, como se comportam e como
produzem estratégias de enfrentamento para evitar o adoecimento, e se esse em algum
ponto se associa ao trabalho docente. Por fim, sugere-se analisar outras variáveis como:
subjetividade, condições de trabalho, nível salarial, intensificação da atividade docente,
assédio moral, uso das Tecnologias de Informação e Comunicação, taxas de
absenteísmo entre outros fatores. A expectativa gerada por esses ensaio é que sirva de
ponto de referencia para realização de outros estudos com essa população, e possam
contribuir para levantar aspectos ainda obscuros no tocante à atividade docente e o
fenômeno do adoecimento de professores e professoras da (RFEPCT) em Minas Gerais,
visando criar estratégias de promoção da saúde, objetivando a melhoria nas condições
de vida dos professores no trabalho e fora dele.
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