ADOECIMENTO DOCENTE NA REDE FEDERAL DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA EM MINAS GERAIS. UM FENÔMENO POSSÍVEL? Ms. Paulo Roberto Vieira Júnior PUC Minas (PPGED) / CAPES Dra. Maria Auxiliadora Monteiro Oliveira PUC Minas (PPGED) Ms.Flávia Temponi Goes (Instituto Izabela Hendrix) RESUMO: De acordo com a literatura o fenômeno do adoecimento docente tem crescido no Brasil e no mundo. Diversas pesquisas têm investigado este fenômeno nas redes particular, municipal e estadual, da educação básica ao ensino superior. Estas investigações indicam que o referido fenômeno é influenciado pelo cenário capitalista de produção que, em constante transformação, expõe o professor a extensa demanda de atividades e condições de trabalho inadequadas, as quais são geradoras de aumento de produtividade e consequente intensificação do trabalho. Tal cenário, em casos extremos pode até conduzir ao abandono profissional conhecido como a Síndrome de Burnout. Entretanto, inexistem pesquisas, que abordem o tema do adoecimento docente na Rede Federal de Educação Profissional Científica e Tecnológica (RFEPCT). Assim, esta pesquisa quantitativa de caráter exploratório e descritivo teve como objetivos verificar e problematizar se os professores e professoras da referida Rede em Minas Gerais, trabalharam com problemas de saúde e sintomas de doenças nos últimos dois anos. Visa também comparar os resultados entre os sexos, bem como levantar dados para realização de futuras pesquisas sobre a associação entre o trabalho docente e o fenômeno do adoecimento. Para tal, utilizou três questões, de um survey, com 267 professores, dos quais, 90 são professoras. Os dados coletados nessa investigação foram analisados pelo programa SPSS 16.0 for Windows® e baseou-se em tabela de contingência com quiquadrado a 5% de significância. Os resultados desse estudo apontaram que 160 (59.9%) respondentes, trabalharam com problemas de saúde ou sintomas de doenças nos últimos dois anos, contra 107 (41.1%). Desses 160 (59,9%) professores, 44 (16.4%) foram afastados em média (25.3±) dias, com desvio padrão (39.62±). Os problemas e doenças mais relatados por professores e professoras foram: dor de cabeça com 86, estresse com 80, e dores lombares com 55 citações. Os dados apurados apresentaram-se diferentes em relação aos citados por homens e mulheres (p=0.0028). Os dados coletados sugerem que nessa amostra (n=267), tanto homens quanto mulheres sofreram com problemas e sintomas de doenças nos últimos dois anos. Contudo, apenas 44 (16.4%) foram afastados conseguindo manter a saúde evitando o licenciamento. Para compreender tal resultado, recorreu-se ao referencial ergológico, conhecido como ferramenta para análise e transformação do trabalho, no qual valoriza a existência da infinita capacidade do trabalhador para criar novas estratégias e normas de atuação (renormalizações) para enfrentar situações de desconforto no ambiente de trabalho em prol da manutenção de sua saúde. Comparando a rede pesquisada (notadamente em condições de trabalho mais favorável) com as demais (estadual e municipal), pode-se afirmar que, a associação entre as renormalizações promovidas pelos trabalhadores, e as condições de trabalho e salário, pode explicar em parte, as baixas taxas de afastamento apuradas nessa investigação. Destaca-se, a necessidade da realização de mais estudos com essa categoria, visando conhecer e compreender como se manifestam os fenômenos do adoecimento e da construção da saúde docente, na RFEPCT. Além disso, novas investigações contribuirão para minimizar a carência de pesquisas sobre os temas na Rede Federal, e consequentemente, produzir conhecimentos que possibilitem criação de políticas de prevenção e mecanismos de intervenção para o combate ao adoecimento. PALAVRAS-CHAVE: atividade docente; adoecimento; ergologia 1. Introdução De acordo com a literatura o fenômeno do adoecimento docente tem crescido no Brasil e no mundo. Diversas pesquisas (DELCOR et al., 2004; ESTEVE, 1999; FARIA; GASPARINI, BARRETO e ASSUNÇÃO, 2005; RACHID, 2009; PAIVA; SARAIVA, 2005; PORTO et al., 2006; SILVANY NETO et al., 2000) têm investigado este fenômeno nas redes particular, municipal e estadual, em diferentes níveis escolares. As principais publicações focalizam, preferencialmente, a educação básica e o ensino superior, nas quais indicam que o adoecimento docente é derivado de uma multiplicidade de fatores. Estes apresentam como pano de fundo a influencia do cenário capitalista de produção que está em constante transformação expondo o professor a extensa demanda de atividades e condições inadequadas de trabalho. Sem dúvidas, estes fatos geram aumento de produtividade e consequente sobrecarga de trabalho, desdobrando-se na instalação de doenças de etiologias diversas. Wisner (1994) afirma que ao longo da carreira docente o trabalhador adquire doenças que o afastam temporária ou até mesmo definitivamente de sua função. Tais ações justificam-se pela presença de precárias condições de trabalho, a imposição de novos papéis atribuídos ao professor, problemas advindos da gestão da atividade docente, falta de autonomia, aumento das tarefas burocráticas, precária infraestrutura, insuficiência de materiais didáticos, mercado de trabalho cada vez mais competitivo, o rápido avanço tecnológico, desvalorização profissional, a constante mudança do perfil discente, baixos salários e fatores de risco do próprio ambiente, tais como salas de aula pequenas, excessivo número de alunos, elevado nível de ruídos, violência escolar, entre outros. (CARLOTTO, 2002; CHARLOT, 2002; CODO, 2006; GOMES, 2002; NOUROUDINE, 2004; SOUSA NETO, 2005). Na visão de Esteve (1999) todo esse rol de motivos pode ser reunido em torno de um sentimento avaliado como mal estar docente. Este expressa a união de vários fatores sociais e psicológicos presentes no exercício da docência que podem gerar um ciclo degenerativo e afetar a saúde, a eficácia docente, sua motivação, seu esforço e sua implicação com o trabalho, além de influenciar sua autoimagem e produzir uma crise de identidade. A infinidade de condicionantes negativos que incide sobre a categoria docente tem repercutido em sua saúde física e emocional desdobrando-se na manifestação de um fenômeno chamado Síndrome de Burnout. Essa síndrome, investigada a partir da década de 1970, conhecida como síndrome da “desistência” afeta ainda quem está em sala de aula e permanece no trabalho. É interessante ressaltar que o Burnout “ocorre em trabalhadores altamente motivados, que reagem ao stress laboral trabalhando cada vez ainda mais até que entram em colapso”(CODO, 2006, p 241). Esse esgotamento físico e emocional gera um quadro de frieza no qual o professor deixa de se envolver com pessoas, problemas e dificuldades, tornado-se ansioso, melancólico e com baixa autoestima. Esse quadro repercute sobre o processo ensino-aprendizagem tornando-o completamente inviável, produzindo conflitos entre o eufórico professor em inicio de carreira e o depressivo trabalhador da atualidade. Na pesquisa organizada pelo autor supracitado, durante 2 anos, com 52 mil professores de escolas públicas, em 144 escolas, nos 27 estados da federação, apurou-se que, um em cada quatro professores sofre de exaustão emocional, despersonalização e falta de envolvimento pessoal no trabalho. Tais aspectos caracterizam os três componentes do conceito multidimensional da Síndrome de Burnout. Em se tratando de pesquisas que discutam o fenômeno do adoecimento, mal estar docente ou a manifestação da Síndrome de Burnout na Rede Federal de Educação Profissional e Científica e Tecnológica, as únicas encontradas são os trabalhos de Burnier et. al. (2007) e Lima e Silva, (2005). Os resultados destes estudos apontam a inexistência de relatos sobre o mal-estar entre os professores da educação profissional contrariando o que acontece na educação em geral. Para Burnier et. al. (2007) isto se justifica, pelo fato desses professores vivenciarem experiências satisfatórias que lhes possibilitam construir uma prática docente com características muito particulares, com diferenças em muitos aspectos da observada na categoria em geral. Tudo isso, de certa maneira, colabora para que seu desempenho mantenha-se em bom nível e se efetive como fator para promoção da saúde. Na referida Rede de ensino, percebe-se alguns fatores que podem ser analisados como contribuintes para um melhor nível de motivação e consequente realização docente. Entre eles, destacam-se: a existência de plano de carreira, melhor estrutura física e maior quantidade de equipamentos, melhores salários, incentivo a formação continuada (afastamento remunerado das atividades de sala de aula e custeio parcial dos cursos), melhor nível dos discentes devido a seleção via vestibular, menor carga horária em sala de aula (máximo de 24 horas) entre outros fatores. Desta feita, apesar das características muito particulares do trabalho docente na RFEPCT este artigo pretende de forma geral investigar a existência do fenômeno do adoecimento docente, na Rede Federal, justificando sua realização pela inconsistência de estudos com docentes desta modalidade educacional. 2. Referencial teórico Tendo em vista a sociedade moderna, no qual exigi do trabalhador mais rapidez e dinamismo em suas funções, as características do trabalho docente têm produzido diversos impactos para a saúde do professor. Entretanto, antes mesmo de compreender quais são esses impactos é necessário entender que trabalho é esse. Caracterizá-lo e compreender quais são suas funções, não é tarefa simples, visto que no tocante ao papel social e as atribuições historicamente reportadas ao trabalho docente está relacionado a elementos como complexidade, intensificação, proletarização, profissionalização e desprestígio social. Elementos que contribuem para a configuração de exagerado número de funções e uma dificuldade em limitar, quais são as reais e mais importantes atribuições desse trabalho. (OLIVEIRA, 2005). Nosella (2005, p. 226), apresenta um viés sobre a complexidade do trabalho docente ao afirmar que o exercício de um educador, “se refere às competências específicas adquiridas por uma pessoa, que as transmite a outras, ensinando-as e treinando-as [...] se refere à responsabilidade na formação integral do cidadão”. Para o referido autor, o professor deve responsabilizar-se por ensinar a leitura do mundo e não apenas, a leitura das palavras, evitando posições reducionistas e a reedição de práticas pedagógicas neutras e desconectadas da realidade envoltas pela complexidade que é educar. Esteve (1999, p. 59), discute o trabalho docente, no âmbito da intensificação a partir das diversas funções ou tarefas realizadas na sala de aula. Por esse prisma espera-se que na execução do trabalho docente, sejam cumpridos objetivos pedagógicos e sejam contempladas funções associadas ao ensino e aprendizagem dos discentes como: manter a disciplina em sala de aula, ser simpático e afetuoso; conseguir atender um aluno mais adiantado, ter, igual cuidado, com os que aprendem mais lentamente e estimular a aprendizagem. A expectativa projetada sobre os professores é que consigam: ocupar-se, individualmente, do desenvolvimento dos alunos; fazer brotar e evoluir sua autonomia; promover a integração social; conduzir cada indivíduo a se adaptar às regras do coletivo. Para além devem programar, avaliar, receber os pais, apresentar os progressos e dificuldades dos filhos e resolver problemas burocráticos, em uma “lista de exigências que parece não ter fim” produzindo além da complexidade, alto grau de intensificação. Na opinião de Gomes (2002), a realização de funções administrativas, como preencher diários, emitir relatórios, lançar notas e participar de conselhos de classe, somadas à elaboração de avaliações ao longo das etapas, entrega e correção de provas e trabalhos, tem papel decisivo, na intensificação do trabalho docente. O desgaste gerado pelo excessivo número de tarefas é potencializado, pelas precárias condições salariais da grande maioria de professores, que os leva a dobrar o número de aulas e, consequentemente, trabalhar em mais de uma escola, para melhorar as condições de vida pessoal e familiar. Esse conjunto de fatores, ainda é influenciado pelas constantes mutações sofridas pela educação no qual seus objetivos são, constantemente, marcados pela imprevisibilidade de acontecimentos; individualidade discente e variedade cultural que caracteriza o cenário escolar. (OLIVEIRA, 2005). Segundo Gomes (2002, p. 22), essa intensificação é produto de um sistema educativo que tem “produzido novos desafios para o magistério, em face da rapidez das novas demandas sociais”. Além de ministrar sua(s) disciplina(s), os professores devem promover atividades relativas aos temas transversais: sexualidade, meio ambiente, educação para o trânsito, voto consciente, consumo, qualidade de vida, uso de drogas, noções de higiene, homofobia, racismo, prevenção de doenças etc. Essas exigências desdobram-se na promoção de debates sobre esses temas nos projetos político-pedagógicos, que somadas ao excessivo número de atribuições, próprias ao conteúdo específico das disciplinas lecionadas, promovem a intensificação da carga de trabalho, e que se forem mal administradas, poderão impactar a saúde do professor. O trabalho docente, entendido enquanto atividade humana não pode ser simplificado ou totalmente antecipado por normas. Visto que, a complexidade da atividade docente e a infinidade das ações desempenhadas pelos professores transcendem o elevado rol de prescrições de toda ordem que cerca sua execução. Nessa direção, a partir do quadro exposto, pode-se afirmar que todas as definições elencadas relativas às funções do trabalho docente serão insuficientes para antecipar sua real dimensão. Assim sendo, qualquer proposta para definição das atribuições da atividade docente, por mais extensa que se apresente, sempre implicará um sentido de incompletude, ainda que ressaltada a sua importância e relevância social, pois a sala de aula é o espaço do imprevisto, da ação humana repleta de suas particularidades. Tendo em vista as prescrições relativas ao trabalho docente, é no âmbito da sua realização que o professor vivencia um debate de normas, que segundo a abordagem ergológica, o levará a realizar escolhas que o mobilizarão em busca da saúde nos espaços de trabalho. (SCHWARTZ, 2001; 2007). A ergologia é uma disciplina do pensamento humano que analisa o trabalho como atividade humana, na qual o trabalhador age na conformidade de seus valores, sua dimensão ética e seus conhecimentos para buscar saídas em prol da saúde. Baseado na complexidade e na intensificação relativa a atividade docente e no impacto que esses elementos podem gerar para a saúde dos professores e professoras da RFEPCT é que foram gerados os objetivos dessa pesquisa. 3. Objetivos Amparado por esses elementos e em virtude da ausência de pesquisas sobre os temas saúde/adoecimento na RFEPCT, o objetivo dessa pesquisa foi verificar e problematizar se professores e professoras trabalharam com problemas de saúde e sintomas de doenças nos últimos dois anos na RFEPCT em Minas Gerais e, comparar os resultados, bem como subsidiar novas pesquisas sobre o tema. 4. Metodologia Esta investigação constituiu-se de revisão bibliográfica e pesquisa quantitativa de caráter analítico e descritivo. É importante ressaltar que esse estudo integra a Pesquisa do Observatório Docente realizada pelos Núcleos: FaE/UFMG, PUC Minas e CEFET/MG, sob o fomento da CAPES/INEP, e está incumbido de analisar a existência ou não, do fenômeno do adoecimento docente na RFEPCT. Para coleta de dados utilizou um survey, enviado para o email de 267 professores efetivos, 177 (66.2%) homens, sendo 90 (33.8%) mulheres, no qual cada sujeito acessou o questionário em ambiente virtual, por meio de um link exclusivo ou mediante preenchimento de documento impresso. Os respondentes dessa pesquisa estavam lotados em 42 unidades dos Institutos Federais e do CEFET-MG, espalhados pelo território de Minas Gerais. Ressalta-se que essa pesquisa foi autorizada pelos Diretores das Instituições que forneceram os endereços eletrônicos dos professores para futuro contato. A devolução dos questionários ocorreu entre abril e junho de 2013. Foram analisadas as respostas das seguintes questões: 38.1- Você já trabalhou com problemas de saúde, nos últimos dois anos? 38.2- Em caso afirmativo, que sintomas, doenças ou problemas você vivenciou? E a questão 39- Você esteve afastado (a) / licenciado (a), nos últimos anos, por motivo de doença? Por quanto tempo? Esclarece-se que nas questões, 38.1 e 38.2, as opções de resposta eram “sim” e “não”. No caso de resposta afirmativa, na questão 38.2, os docentes puderam escolher entre oito opções: dor de cabeça, estresse, dores lombares, insônia, problemas ósteomusculares, problemas respiratórios, problemas no aparelho fonador, problemas cardiovasculares, podendo assinalar várias respostas. E na questão 39, o docente indicou, o número de dias que ficou afastado. Os dados foram armazenados e tabulados pelo programa SPSS 16.0 for Windows®. O controle do erro de digitação foi feito por dupla digitação dos dados. Os dados brutos receberam tratamento para checagem de possíveis diferenças. Foram realizadas análise descritiva e comparativa e tabela de contingência com quiquadrado a 5% de significância. 5. Desenvolvimento Esta investigação foi realizada com 267 professores, de um total de 334 respondentes, taxa de devolução de (79,94%), dos quais, 177 (66.2%) homens e (33.8%) 90 mulheres (Tabela 1). Tabela 1- Número de professores da Rede Federal de Educação Técnica por sexo. Sexo Masculino Feminino N 177 (66.2%) 90 (33.8%) Idade 41± 3 38± 4 Tx de devolução 79,94% A maioria dos professores 160 (59.9%) afirmou ter trabalhado com problemas de saúde ou sintomas de doenças, nos últimos dois anos, enquanto 107 (41.1%) afirmaram não ter vivenciado nenhum problema (Tabela 2). Tabela 2- Você já trabalhou com problemas de saúde nos últimos dois anos? Sim Não 160 59.9% 107 41.1% Entre as doenças vivenciadas por professores e professoras nos últimos dois anos destacaram-se: dor de cabeça com 86 (32.2%), o estresse com 80 (32.2%) e a insônia com 55 (20.5%) ocorrências. Os problemas menos evidenciados foram: ósteomusculares 36 (13.4%), respiratórios e aparelho fonador 21 (7.9%) e problemas cardiovasculares 10 (3.7%) citações (Tabela 3). Tabela 3- Doenças ou problemas vivenciados pelos docentes nos últimos dois anos. Problemas e Doenças n= 267 Dor de cabeça 86 32.2% Estresse 80 29.7% Dores lombares 55 20.5% Insônia 38 14.2% Problemas respiratórios 21 7.9% Problemas no aparelho fonador 21 7.9% Problemas cardiovasculares 10 3.7% Foi possível escolher mais de uma alternativa dentre as opções ofertadas. Na comparação entre os grupos, professores e professoras indicaram maiores incidências em três problemas ou sintomas. Entre os homens a dor de cabeça teve 51 (30.5%) registros, enquanto 35 (38.8%) entre as mulheres, quanto ao estresse 50 (29.9%) homens citaram-no, 30 (33.3%) mulheres, dores lombares, 37 (22.2%) homens e 18 (20.0%) mulheres (Tabela 4). De acordo com os homens a insônia teve 26 (15.6%) incidências, enquanto 12 (13.3%) para mulheres. Os problemas ósteomusculares acometeram 19 (11.3%) homens, e 17 (18.9%) mulheres, problemas cardiovasculares 9 (5.4%) homens e uma mulher, problemas respiratórios 7 (4.2%) homens, e 14 (15.5%) mulheres. Por fim, 7 (4.2%) homens tiveram problema no aparelho fonador, enquanto 13 (14.4%) mulheres (Tabela 4). Tabela 4- Comparação entre os principais problemas de homens e mulheres Características Masculino Feminino N 177 % 90 % Dor de cabeça 51 30.5 35 38.8 Estresse 50 29.9 30 33.3 37 22.2 18 20.0 Insônia 26 15.6 12 13.3 Problemas cardiovasculares 9 5.4 1 1.1 Problemas respiratórios 7 4.2 14 15.5 Problemas no aparelho fonador 7 4.2 13 14.4 Problemas ósteomusculares 19 11.3 17 18.9 Dores lombares X2 de Pearson para comparação entre homens e mulheres. p = 0,0028 , grau de significância estatística (< 0,05) Quanto aos afastamentos, dos 177 homens, 26 (14.7%) se licenciaram nos últimos dois anos, contra 151 (85.3%) que não foram afastados. Das 90 professoras, 18 (20.0%) foram afastadas, contra 72 (80.0%) que não foram licenciadas de suas ocupações. A média de dias de afastamento foi (25,2±) com desvio padrão (39,6±). Tabela 5-Você já esteve afastado (a) nos últimos dois anos, por motivo de doença? Por quanto tempo? Feminin Masculino o Total Dias afastados 17 N 7 9 % 2 Sim 6 14.7 15 Não 1 267 % 0 % dp 1 20. 16.5 8 0 44 39,6± 7 85.3 2 80.0 223 83.5 média 25.2± Importante registrar que o impacto gerado pelo afastamento dos docentes por motivo de doença desdobra-se para várias direções, sendo que o principal deles está diretamente associado ao cotidiano desses trabalhadores e ao seu convívio social e familiar. Outro resultado desse processo de afastamento da sala de aula é a paralisação, mesmo que momentânea, das atividades pedagógicas, fato de afeta diretamente a qualidade dos processos educacionais. Outro transtorno é a mudança na rotina escolar, com necessidades de alteração de horários, reposição de aulas e contratação de professores temporários, que no caso da (RFEPCT) pode demandar muito tempo devido a morosidade dos processos de contratação. De maneira geral, o fenômeno do adoecimento docente, precisa ser encarado a partir de uma perspectiva multidisciplinar visto que é um problema que transcende a área de saúde, tornando-se correlato aos setor de gestão de pessoal e segurança no trabalho. Os dados encontrados nesta pesquisa, referentes a problemas de saúde e sintomas de doenças relatados pelos docentes, deixa indícios de que o trabalho realizado na Rede Federal pode produzir o fenômeno do adoecimento, apesar de haver condições de trabalho satisfatórias e bem distintas, se comparado as redes municipal e estadual de ensino. (DELCOR et al., 2004; NORONHA; ASSUNÇÃO; OLIVEIRA, 2008). De acordo com esses autores o adoecimento docente é resultado de exposição a severas condições de trabalho, como: salas de aula com excessivo de alunos, alto nível de ruídos, violência escolar, baixos salários entre outros fatores e que tem sido vivenciado pelos professores nos últimos 20 anos, influenciado diretamente, pelo modelo capitalista que produção, que introduziu na educação processos de gerenciamento e controle aumentando as exigências de uma atividade de trabalho que por essência é envolta por alto grau de complexidade e exigência intelectual. Apesar dos fatores citados não apresentarem-se como comuns na (RFEPCT), entende-se que existam outros elementos que influenciem o fenômeno do adoecimento associados ao trabalho desses professores. Alguns problemas detectados nesta investigação estão em consonância com os achados por (GRILLO, PENTEADO, 2005; REIS et al., 2006; VIANELLO, 2006). Esses autores identificaram que a categoria docente vivencia: problemas nas cordas vocais, disfunções articulares, circulatórias e distúrbios psicológicos, entre os quais o estresse, que estão associados ao trabalho docente. Nessa pesquisa o estresse foi citado por 80 (29.7%) docentes, problema evidenciado em outras investigações, e que está diretamente vinculado a experiências vividas no trabalho docente, além de ser avaliado como desencadeador de outros males. (PORTO et al., 2006) Sobre os efeitos do estresse no trabalho docente Trigo, Teng e Hallak (2007), observaram que a categoria docente é cotidianamente exposta a prolongados níveis de estresse, experimentando carga horária excessiva e conflitos interpessoais com diversos atores da comunidade escolar, situações que podem desencadear dor de cabeça, distúrbios psicológicos e provocar quadros de exaustão emocional que podem culminar com processos de diminuição do sentimento de realização pessoal, afastamento das relações interpessoais, queda de produtividade e por fim, até abandono da profissão como comprovado por Codo (2006). Dados dessas pesquisas estão em sintonia com os resultados apresentados na presente investigação, pois também apresentou, entre os vários problemas vivenciados pelos docentes, dor de cabeça com incidência de 86 (32.2%) ocorrências. Apesar de não haver como associar, diretamente, estresse e dor de cabeça, os relatos dos professores indicam que essa é uma queixa constante podendo se desdobrar em sua associação. Em relação ao aparelho fonador, Grillo e Penteado (2005) e Vianello (2006) afirmam que a categoria docente possui maior tendência de desenvolver problemas neste segmento corporal se comparado a outras profissões. Esses problemas são desencadeados por inadequada e excessiva utilização da voz, que se materializam no aparecimento de: pólipos, desgaste das pregas vocais e rouquidão, sendo potencializado por fatores ambientais: poluição sonora, demasiado número de alunos em sala, poeira e excessiva carga de trabalho. Em relação á comparação entre os sexos, no que tange ao aparelho fonador, encontrou-se 13 (14.4%) reclamações de professoras e 7 (3.9%) dos homens, o que segundo Grillo e Penteado (2005) e Vianello (2006), pode ser explicado, pelo timbre de voz menos potente, tido como elemento desencadeador dos desgastes e dos adoecimentos nesta ferramenta de trabalho. Os resultados do presente estudo mostraram uma incidência maior de queixas das professoras quando comparado aos homens, o que está em acordo com a literatura. Quanto ao número de afastamentos ou licenciamentos, 160 (59.9%) docentes relataram ter vivenciado problemas nos últimos anos, contudo, apenas 44 (16,5%) dos (n=267) estiveram afastados, com tempo médio de (25,2±) dias. Os achados dessa pesquisa realizada na (RFEPCT) indicam a possibilidade de que o baixo índice de afastamentos esteja associado às satisfatórias condições de trabalho da categoria o que justificaria em parte, o fato de que dos 267 respondentes, apenas 44 (16.5%) foram licenciados de suas ocupações, apesar de 160 (59.9%) professores terem reclamado de problemas ou sintomas de doença nos últimos dois anos. Outra perspectiva para analisar o contraste entre o alto número de queixas dos professores e o coeficiente inferior de afastamento, deve-se, de acordo com a ergologia, a produção de estratégias para manutenção e construção da saúde. (SCHWARTZ, 2000; 2001; 2007). Para Trinquet (2010) seguidor da perspectiva ergológica, existe uma capacidade infinita dos trabalhadores de produzir novas normas, de (re) criar o meio em que vivem, de se adaptar a condições de trabalho inadequadas, em um movimento constante de luta pela sobrevivência, que os faz mobilizar recursos intelectuais, físicos e psicológicos na busca pela saúde, investidos na atividade de trabalho para lidar com as infidelidades do meio. Essas infidelidades no espaço escolar evidenciam-se quando ocorre falha em recurso tecnológico, um inusitado ato de indisciplina discente, um conflito com gestores, desvalorização da carreira, entre outras causas. Um exemplo dessa perspectiva é o estudo realizado por Vieira Júnior e Santos (2011), que amparados pela análise ergológica da atividade de trabalho descobriram seis professores de ensino básico, que jamais foram afastados de suas atividades por motivo de adoecimento. Segundo esses autores, baseado na ergologia, os educadores entrevistados, possuem uma capacidade subjetiva de renormalizar, que por meio de ações singulares permitem a produção de estratégias de enfrentamento para manutenção da saúde no seu dia-a-dia, que produz confronto com as infidelidades do meio e as condições de trabalho adversas. 6. Conclusões O fenômeno do adoecimento docente amplamente descrito no Brasil em todos os níveis educacionais e nas diversas redes de ensino. tem sofrido nas últimas décadas com o aumento da intensificação, precarização e desvalorização do trabalho dos professores, que vivenciam na atualidade, a responsabilidade por gerir um trabalho altamente complexo, que exige de seu executor elevado grau de envolvimento físico e intelectual que pode gerar desgastes emocionais e depreciação de seu estado geral de saúde. Entretanto, em relação a estudos na RFEPCT nota-se uma lacuna na literatura, principalmente quando o objeto de investigação é o adoecimento de professores. Assim, o objetivo desse artigo foi verificar se os docentes desta rede trabalharam doentes nos últimos anos, além de comparar os tipos de problemas de saúde vivenciados por professores e professoras. Baseado nesses resultados percebe-se que houveram queixas da categoria relacionadas ao fenômeno do adoecimento. Houve relatos de todos os problemas ou sintomas indicados no instrumento de coleta. Contudo, faz-se necessário a realização de pesquisas mais aprofundadas para compreender a que, as causas dos afastamentos estão relacionadas, e quais os motivos condicionam os professores para suportarem trabalhar doentes ou com sintomas de doenças. Quanto aos resultados dessa pesquisa, nota-se acordo com os achados na literatura, pois evidenciaram que a maior parte desta população trabalhou com problemas de saúde nos últimos dois anos. Entretanto, o fato de não se afastarem com frequência do trabalho por motivo de doenças, apesar de relatarem vivenciar diversos problemas de saúde e sintomas nos últimos dois anos, justifica a necessidade de mais pesquisas. O fato de vivenciarem melhores condições de trabalho poderá estar influenciando esses resultados? Ou estariam conjuntamente, criando estratégias e processos de enfrentamento como mecanismos de defesa para não se afastaram de suas atividades como alerta o referencial ergológico? Para a ergologia esse movimento de resistência é explicado pela infindável capacidade criativa do trabalhador em lutar pela vida e pela saúde nos espaços laborais e sempre produzir novas normas de atuação, as chamadas renormalizações. Ficou comprovado que existem diferenças entre as formas de adoecimento de professores e professoras. Contudo, é preciso compreender os motivos pelos quais professores e professoras vivenciam os problemas, como se comportam e como produzem estratégias de enfrentamento para evitar o adoecimento, e se esse em algum ponto se associa ao trabalho docente. Por fim, sugere-se analisar outras variáveis como: subjetividade, condições de trabalho, nível salarial, intensificação da atividade docente, assédio moral, uso das Tecnologias de Informação e Comunicação, taxas de absenteísmo entre outros fatores. A expectativa gerada por esses ensaio é que sirva de ponto de referencia para realização de outros estudos com essa população, e possam contribuir para levantar aspectos ainda obscuros no tocante à atividade docente e o fenômeno do adoecimento de professores e professoras da (RFEPCT) em Minas Gerais, visando criar estratégias de promoção da saúde, objetivando a melhoria nas condições de vida dos professores no trabalho e fora dele. Referências BURNIER, Suzana ET al. 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