EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DO I TRIBUNAL DO JÚRI DA COMARCA DE SÃO PAULO Autos nº0001875-58.2014.8.26.0052 Consta dos autos do incluso inquérito policial que, no início da madrugada do dia 23 de março de 2014, em apartamento localizado na Rua dos Andradas, nº69, Centro, 9° andar, nesta cidade e comarca de São Paulo, MARLENE GOMES, de alcunha “Mole”, qualificada a fls. 505, FRANCISCA AURILENE CORREIA DA SILVA, de alcunha “Thais”, qualificada a fls. 513, e MARCIA MARIA DE OLIVEIRA, de alcunha “Sheila”, qualificada a fls. 531, previamente ajustadas e unidas pelos mesmos propósitos, agindo com vontade de matar, desferiram vários golpes de instrumento contundente de alta energia (vide laudo pericial a fls. 631) contra Alvaro Pedroso, na região do crânio, causando-lhe os extensos ferimentos descritos no laudo de exame antropológico encartado a fls. 434-435, determinantes de sua morte. Consta, também, que o homicídio foi praticado por motivo torpe, com o emprego de meio cruel e mediante a utilização de recurso que dificultou a defesa da vítima. 1 Consta, ainda, que, após matarem Alvaro Pedroso, MARLENE GOMES, “Mole”, destruiu o cadáver dele, mediante esquartejamento, e em seguida, ela e as denunciadas FRANCISCA AURILENE CORREIA DA SILVA, “Thais”, e MARCIA MARIA DE OLIVEIRA, “Sheila”, ocultaram as várias partes do cadáver já seccionadas, ensacando, de forma fracionada, as pernas, os braços, o tronco, as coxas e a cabeça, bem como tratando de dispensá-las em quatro logradouros distintos desta Capital. Consta, por fim, que MARLENE GOMES, “Mole”, FRANCISCA AURILENE CORREIA DA SILVA, “Thais”, e MARCIA MARIA DE OLIVEIRA, “Sheila”, inovaram artificiosamente o estado de lugar e de coisa, com o fim de induzir a erro a perícia criminal e, portanto, produzir efeito em processo penal. Segundo o apurado, o falecido Alvaro era casado, pai de dois filhos e trabalhava como motorista de ônibus. Ocorre que veio a conhecer a denunciada Marlene, que era prostituta, e com ela passou a ter longo relacionamento amoroso, encontrando-a, com frequência, aos finais de semana. Alvaro nutria sentimento de amor por Marlene, gostava de estar em sua companhia e, não raras vezes, a presenteava, tanto que ela se referia a ele como “Boticário” para as amigas mais íntimas (fls. 552). Dava presentes, inclusive, à filha de Marlene, que desconhecia a situação de prostituta da mãe (fls. 548), achando que ela era vendedora de roupas na região do Bom Retiro. No entanto, Marlene não correspondia ao sentimento de Alvaro. Pouco lhe falava de sua vida particular e desejava continuar se relacionando com outros homens, prostituindose, atividade que lhe era rentável, pois permitia o seu sustento e a compra de entorpecentes para uso próprio. Há informação, inclusive, de que se locupletava da prostituição alheia. 2 Alvaro, então, começou a manifestar a intenção de terminar o enlace com a denunciada Marlene (fls. 254255), todavia, isto a contrariou demais. Afinal de contas, perderia o cliente assíduo, que lhe pagava por seus préstimos libidinosos semanalmente e, amiúde, a presenteava. Via-o como mais uma de suas fontes fixas de renda e não suportou a ideia de viver com um decréscimo de seus ganhos. De tal sorte, Marlene, conhecida por “Mole” no meio do meretrício, resolveu que era chegado o momento de matar Alvaro, de descartá-lo, mesmo após anos de relacionamento. Para tanto, enfurecida e imbuída de motivação torpe, combinou o fato com as amigas e denunciadas Francisca Aurilene, conhecida por “Thais”, e Marcia Maria, conhecida por “Sheila”, ambas prostitutas e igualmente usuárias de entorpecentes, que prontamente aderiram à ideia homicida. Engendrado o assassinato, tudo ocorreu como de costume. Alvaro se encontrou com Marlene no logradouro acima mencionado, no sábado anterior ao crime. Lá consumiram bebidas alcoólicas e, posteriormente, mantiveram relações sexuais. Após, Marlene passou a servir grande quantidade de cerveja a Alvaro, que, bastante alcoolizado (laudo de exame toxicológico a fls. 433), já no início da madrugada do domingo, foi ao toalete do apartamento para banhar-se. Neste momento, as três denunciadas, Marlene, Francisca e Márcia Maria, animadas pela mesma vontade homicida, aproveitando-se da embriaguez da vítima, golpearam-na com instrumento contundente na região do crânio, sucessiva e alternadamente, matando-a. Durante as agressões, feriram, ainda, o tórax e o dorso da mão direita de Alvaro (laudo antropológico a fls. 419). 3 A trinca de mulheres empregou meio cruel para o homicídio, porquanto agrediu a cabeça da vítima diversas vezes, violentamente, causando-lhe várias lesões extensas, com afundamento da face, fratura e fragmentação dos ossos da face, inclusive da mandíbula (laudos a fls. 434-435 e fls. 615-632 e relatório odonto-legal a fls. 436-439), tudo de forma a impingir em Alvaro intenso e desnecessário sofrimento. Ademais, por estarem em superioridade numérica e por terem se aproveitado do estado etílico acentuado de Alvaro, é de se reconhecer que agiram as denunciadas de forma a dificultar qualquer chance de defesa da vítima. Há mais. Não satisfeitas com a barbárie homicida que haviam acabado de protagonizar, Marlene, Francisca e Márcia Maria decidiram destruir o cadáver de Alvaro e, depois, ocultar as partes dele, o que fizeram com requintada maldade. Marlene passou, então, a esquartejá-lo em diversas partes, com instrumentos cortante e corto-contundente, quiçá uma serra (laudo de exame antropológico a fls. 419, item 5.2). Consumado o esquartejamento, as três denunciadas colocaram no interior de sacos plásticos de cor opaca as diversas partes do cadáver já seccionadas, ocultando-as. Em seguida, colocaram alguns dos sacos no interior de carrinhos de mão, adrede preparados para o transporte do material, a revelar a clara premeditação do assassinato. Em continuidade, no final da madrugada, as agentes rumaram a quatro logradouros distintos desta Capital, onde dispensaram os sacos plásticos com os restos mortais de Alvaro, com a finalidade de ocultá-los. Na esquina da Rua Sabará x Rua Sergipe, no bairro de Higienópolis, deixaram as duas pernas e os dois braços. Na Rua Coronel José Eusébio, altura do nº137, dispensaram o tronco. Na Rua da Consolação, altura do nº1906, deixaram as duas coxas e, na Praça da Sé, dispensaram a cabeça. 4 Agiram, por derradeiro, as denunciadas com claro intuito de embaraçar as investigações, de forma a ludibriar a perícia criminal, inovando artificiosamente o estado de coisa e de local. Isto porque, durante o esquartejamento, Marlene, contando sempre com a solicitude de Francisca e Márcia Maria, seccionou os dez dedos das mãos de Alvaro, deles extirpando, estrategicamente, as falanges mediais e distais (fotografias a fls. 38 e fls. 93), sem as quais foi impossível obter as impressões digitais da vítima para sua identificação (conclusão papiloscópica a fls. 24). Além disso, toda a pele do tronco da vítima foi retirada, fazendo com que se parecesse com um amontoado de carne (fotografias a fls. 669 e fls. 671). Tal ação e as condutas de separar o tronco da cabeça e extirpar as falanges mediais e distais dos dedos das mãos, somadas, contribuíram sobremodo para dificultar a identificação da vítima (vide parte final do item - considerações periciais e conclusões – do laudo pericial de levantamento de local, encartado a fls. 703). Por fim, não bastasse a inovação artificiosa havida no cadáver da vítima, as denunciadas trataram de espalhar os restos mortais de Alvaro, devidamente ensacados, por quatro locais distintos da cidade, com o evidente propósito de turbar as investigações e o trabalho da perícia. Tanto é assim que, enquanto as demais partes do corpo foram encontradas no dia 23 de março p.p., a cabeça somente foi encontrada no dia 27 de março, na Praça da Sé, nas imediações do Tribunal de Justiça, com certo atraso, porquanto já em estado de putrefação (laudo antropológico a fls. 434). 5 Diante do exposto, denuncio MARLENE GOMES, de alcunha “Mole”, FRANCISCA AURILENE CORREIA DA SILVA, de alcunha “Thais”, e MARCIA MARIA DE OLIVEIRA, de alcunha “Sheila”, como incursas no artigo 121, §2º, incisos I, III e IV, no artigo 211 e no artigo 347, parágrafo único, estando os delitos combinados entre si na forma do artigo 69, todos do Código Penal, requerendo, recebida e autuada esta, sejam elas citadas para oferecer resposta escrita, seguindo-se a instrução nos termos dos artigos 406-412, do Código de Processo Penal, ouvindo-se as testemunhas abaixo mencionadas, até decisão de pronúncia e final condenação pelo Egrégio Tribunal do Júri. Rol: 1. Antonio Carlos Cândido Araújo – Delegado de Polícia - requisitar 2. Jesselene Nascimento Pedroso Oliveira (filha da vítima) – fls. 258 3. David Nascimento Pedroso (filho da vítima) – fls. 256 4. Fabio Almeida de Oliveira - fls. 254 5. Edir José Pinheiro Negrão – fls. 271 6. Testemunha Sigilosa – fls. 388 7. Paula Ballotti – policial civil – fls. 573 – requisitar 8. Celio Barros Leite – policial civil – fls. 573 – requisitar São Paulo, 21 de julho de 2014. _______________________________ Tomás Busnardo Ramadan 13° Promotor de Justiça do I Tribunal do Júri da Capital 6