MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Procuradoria da República na Paraíba
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA ____ª VARA DA
SEÇÃO JUDICIÁRIA DA PARAÍBA
N° 10015/2013/MPF/PR/PB/VCV
Referência: Inquérito Civil Público n.° 1.24.000.000484/2009-46
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pelo Procurador que ao final
subscreve, com base no procedimento extrajudicial supramencionado (em anexo), vem, com
fulcro nos arts. 37, §4º, 127 e 129, incisos II e III, da Constituição da República; art. 6º, inciso
XIV, alínea f, da Lei Complementar n.º 75/93 e arts. 7º e 17 da Lei de Improbidade n.º
8.429/92, à presença de V. Exa., ajuizar:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ATO
DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
em face de:
JOSÉ RÔMULO CARNEIRO DE ALBUQUERQUE NETO*, CPF
n.º 021.352.054-00, filho de Maria Nilza Coutinho Carneiro de
Albuquerque, nascido aos 08/02/1948, com residência na Av. Tomires
Souto Maior, s/n.º, Centro, Pitimbu/PB, CEP 58.324-000, e
1
ARMANDA FERREIRA DE SOUSA*, CPF n.º 207.373.784-68,
filha de Maria Margarida de Souza, nascida em 23.05.1959, com
residência na Rua Tenente Severino Gomes Pereira, 380, apt. 103,
bloco A, Geisel, João Pessoa/PB, CEP 58.075-602, ou Av. João
Machado, 752, Centro, João Pessoa/PB, CEP 58.013-520,
pelos fatos e fundamentos a seguir delineados:
I – DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL
A presente ação trata da irregular aplicação de recursos financeiros
repassados ao Município de Pitimbu/PB pelo Ministério do Desenvolvimento Social e
Combate à Fome, para aplicação nos Serviços de Proteção Social Básica às Famílias – PAB
FIXO.
Nos termos do artigo 109 da Constituição da República, o fator
determinante para fixar a competência da Justiça Federal é a existência de lesão a bens,
interesses ou serviços da União, de suas entidades autárquicas ou de empresas públicas
federais.
No caso em tela, por envolver recursos provenientes de órgãos da
Administração Pública Federal – valores que estão submetidos à fiscalização, controle e
prestação de contas perante os órgãos repassadores – o Prefeito Municipal, ou quem esteja na
gestão de recursos federais, está sujeito à ação de improbidade na esfera da Justiça Federal de
primeira instância.
Por fim, nos termos da Súmula n.º 208, do Superior Tribunal de Justiça:
“Compete à Justiça Federal processar e julgar prefeito municipal por
desvio de verba sujeita a prestação de contas perante órgão federal”.
II - DA LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO
A legitimidade do Ministério Público para promover ação civil por ato
de improbidade administrativa na defesa do Patrimônio Público é indeclinável, nos exatos
termos dos dispositivos prescritos nos artigos 127 e 129, inciso III, da Constituição da
República.
2
Em reflexo a tais preceitos, observa-se ainda o art. 37 da Constituição
da República que estabelece os princípios reitores da Administração Pública, como sendo
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, sendo imperioso o seu
respeito pelo gestor da res publicae.
Assim, surgiu a Lei de Improbidade Administrativa, Lei n.º 8.429 de
1993, atribuindo ao Ministério Público, ex vi do art. 17 do citado Digesto, a defesa do
PATRIMÔNIO PÚBLICO, mormente visando rechaçar a má gestão de administradores que
tratam a coisa pública como se privada fosse, nomeando apaniguados, desviando verbas,
utilizando-se de materiais públicos em proveito próprio, etc.
De fato, os tribunais superiores de forma unânime afirmam a
legitimidade ministerial, a exemplo dos arestos abaixo colacionados:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA
– IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – (...) 4. Com a promulgação da
Constituição Federal de 1988 houve alargamento do campo de atuação
do Parquet que, em seu art. 129, III, prevê, como uma das funções
institucionais do Ministério Público a legitimidade para promover o
inquérito civil e a ação civil pública para a proteção do patrimônio
público e social, do meio ambiente e de outros direitos difusos e
coletivos. 5. O Ministério Público está legitimado a defender os
interesses transindividuais, quais sejam os difusos, os coletivos e os
individuais homogêneos1. (destacado do original)
AÇÃO CIVIL PÚBLICA – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA –
LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO – VIOLAÇÃO
DOS
PRINCÍPIOS
DA
LEGALIDADE,
MORALIDADE
E
IMPESSOALIDADE – PENALIDADES PREVISTAS NO ART. 12, III,
DA
LEI
8.429/92
–
ADOÇÃO
DO
PRINCÍPIO
DA
PROPORCIONALIDADE, OU ADEQUAÇÃO ENTRE A CONDUTA
DO AGENTE E SUA PENALIZAÇÃO – CABIMENTO – RECURSO
ESPECIAL CONHECIDO – O Ministério Público tem legitimidade
para propor ação civil pública, na hipótese de dano ao Erário.
1
(STJ – RESP 408219 – SP – 1ª T. – Rel. Min. Luiz Fux – DJU 14.10.2002)
3
Obedecido o princípio da proporcionalidade, mostra-se correta a
aplicação das penalidades previstas no art. 12, III, da Lei nº 8.429/92.
Precedentes do STJ2. (grifado do original)
Constata-se, portanto, que há clara legitimidade do MINISTÉRIO
PÚBLICO FEDERAL para figurar no polo ativo da presente Ação Civil Pública por Ato
de Improbidade Administrativa, sendo poder e dever de atuação do Parquet Federal.
III – DA LEGITIMIDADE PASSIVA
De acordo com a Lei de Improbidade (art. 1º, caput, e parágrafo único,
c/c §§ 2º e 3º), o sujeito ativo de tais atos são os agentes públicos, servidores ou não, que
exerçam, embora transitoriamente ou sem remuneração, seja por eleição, nomeação,
designação, contratação ou por qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato,
cargo, emprego ou função na administração direta ou indireta, em empresa incorporada ao
patrimônio público ou em entidade para cuja criação ou custeio o erário tenha concorrido ou
concorra com mais de cinquenta por cento (50%) do patrimônio ou receita anual. Equipara-se
ao agente público, para os efeitos da Lei, o particular que induzir a prática do ato, que com ele
concorrer ou em razão dele auferir vantagem.
Dessa forma, enquadram-se nas raias da legislação punitiva não só o
servidor, mas, de igual modo, o particular que, de qualquer sorte, tenha concorrido ou se
beneficiado de forma direta ou indireta da conduta praticada à margem do ordenamento
jurídico e em contrariedade às regras resguardadoras dos princípios constitucionais moldados
para a Administração Pública.
Muito objetiva a lição dos Professores ÉLCIO D’ANGELO e SUZI
D’ANGELO:
“O sujeito ativo do ato de improbidade administrativa é o agente
público que, com ou sem auxílio de terceiro, vem a praticar o ato de
improbidade, sendo que o particular que induzir ou concorrer para a
prática do ato de improbidade ou dele beneficiar-se de qualquer
forma, direta ou indiretamente, será considerado sujeito ativo do ato
de improbidade administrativa por equiparação (art. 3º, Lei nº
2 (STJ – RESP 291747 – SP – 1ª T. – Rel. Min. Humberto Gomes de Barros – DJU 18.03.2002)
4
8.429/92).
Aquele que não é servidor ou agente público poderá ser, também,
sujeito ativo do ato de improbidade administrativa, desde que induza
ou concorra para a prática desse ato ou dele se beneficie sob
qualquer forma direta ou indireta (art. 3º da Lei de Improbidade
Administrativa), porém, há que se ressaltar que se não for servidor ou
agente público não poderá perder o cargo ou emprego, uma vez que
as sanções a eles previstas serão outras que não estas, como
decorrência lógica”3
Nesse diapasão, com base nas provas carreadas aos autos, o polo
passivo envolve agentes públicos, porquanto gestores do dinheiro público e responsáveis
pelas transferências dos montantes disponibilizados pela União Federal, por meio do
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, para cumprir obrigações
estritamente municipais, prejudicando diretamente a execução dos objetivos traçados no Plano
de Assistência Social.
IV – DOS FATOS
O Inquérito Civil Público que instrui a presente ação foi instaurado a
partir do Relatório n.º 1160/08, da Controladoria-Geral da União, a fim de investigar diversas
irregularidades na gestão de recursos públicos federais repassados ao Município de
Pitimbu/PB, no exercício de 2007, pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à
Fome.
Ao fim da instrução do referido procedimento, concluiu-se que todas as
irregularidades foram sanadas, à exceção do item 6.4.11, referente à ausência de
documentação comprobatória das despesas executadas com recursos do Piso Básico Fixo.
Inicialmente, importante informar o que é o Piso Básico Fixo.
De acordo com a cartilha elaborada pelo Tribunal de Contas da União
sobre a Assistência Social, que está disponível no sítio eletrônico da Corte de Contas e consta
da mídia em anexo, os recursos são transferidos pelo Fundo Nacional de Assistência Social de
acordo com o Piso.
3 O Princípio da Probidade Administrativa e a Atuação do Ministério Público,LZN Editora, 2003, 1 a. Edição,
pág. 28
5
“os pisos são classificados conforme o nível de complexidade e o tipo
de proteção social que custeiam (básica ou especial). (…).
Para a transferência dos recursos de cofinanciamento federal, pelo
FNAS, são adotados os pisos de proteção social conforme o nível de
complexidade: piso básico fixo, piso básico de transição, piso básico
variável, piso de transição de média complexidade, piso fixo de média
complexidade e pisos de proteção social especial de alta complexidade
I e II.
(...)
Piso básico fixo: custeia exclusivamente o atendimento à família e aos
membros, por meio do Serviço de Proteção e Atendimento Integral à
Família (Paif) e pelas ações complementares ao Programa Bolsa
Família (PBF).
O Piso básico fixo financia as seguintes ações e serviços ofertados nas
unidades dos Cras: entrevista familiar; visitas domiciliares; palestras
voltadas à comunidade ou à família, seus membros e indivíduos;
oficinas de convivência e de trabalho socioeducativo para as famílias,
seus membros e indivíduos; ações de capacitação e inserção
produtiva;
campanhas
socioeducativas;
encaminhamento
e
acompanhamento de famílias e seus membros e indivíduos; reuniões e
ações comunitárias; articulação e fortalecimento de grupos sociais
locais; atividades lúdicas nos domicílios com famílias em que haja
criança com deficiência; produção de material para capacitação e
inserção produtiva, para oficinas lúdicas e para campanhas
socioeducativas, tais como vídeos, brinquedos, materiais pedagógicos
e outros destinados aos serviços socioassistenciais; deslocamento da
equipe para atendimento de famílias em comunidades quilombolas,
indígenas, em calhas de rios e em zonas rurais.
O Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (Paif) integra
a proteção social básica e consiste na oferta de ações e serviços
socioassistenciais de prestação continuada, nos Cras, por meio do
6
trabalho social com famílias em situação de vulnerabilidade social,
com o objetivo de prevenir o rompimento dos vínculos familiares e a
violência no âmbito de suas relações, garantindo o direito à
convivência familiar e comunitária”
Prosseguindo, delineado o piso identificado no presente feito e o seu
objetivo, depreende-se dos autos que, no curso da instrução do feito, a assessoria jurídica do
Município de Pitimbu/PB, observando a manifestação de fls. 152/153, da então secretária de
trabalho e ação social, afirmou ao MPF, em 17.09.2010, que, nos arquivos da Prefeitura, não
havia nenhuma documentação referente ao Piso Básico Fixo (fls. 149/151), atribuindo a
responsabilidade pela ausência de documentos ao gestor público anterior.
No entanto, contradizendo-se, a Prefeitura, por meio da então secretária
de trabalho e ação social, ARMANDA FERREIRA DE SOUSA, ainda em 2008, informou à
Diretoria Nacional de Assistência Social, por meio de um Demonstrativo Sintético Anual da
Execução Físico-Financeira do Sistema Único de Assistência Social (fls. 16/19 do anexo I),
ano de 2007, que foram transferidos para o Município, pelo FNAS, a título de Piso Básico
Fixo, o valor de R$ 49.500,00 (quarenta e nove mil e quinhentos reais), tendo sido gasto, no
âmbito do SUAS, a importância de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais). Ainda, que
existia de saldo a importância de R$ 14.500,00.
Importante frisar que, não obstante a alegação de ausência de
documentos, verifica-se do anexo I ofícios dirigidos ao FNAS/MDS em 2008, fls. 13 e 20, por
meio dos quais a então secretária do trabalho e ação social, ARMANDA FERREIRA DE
SOUSA, afirmou que: “conforme orientações estabelecidas, apresentamos documentação
solicitada devidamente aprovada pelo Conselho Municipal de Assistência Social de
Pitimbu/PB”. Analisando a Ata da reunião realizada pelo Conselho Municipal de Assistência
Social, fls. 14/15 do anexo I, é possível verificar que o ponto enfrentado foi justamente o
demonstrativo financeiro do Sistema Único de Assistência Social referente ao ano de 2007.
De acordo com a Ata, a então secretária, Sra. ARMANDA,
“apresentou gastos realizados em cada Programa, no âmbito da proteção Social Básica e
Especial, configurando saldos existentes em 30 de dezembro de 2007.”. Fechando, no ofício
dirigido ao MPF, em 09.04.2012, fls. 341/343, após ser indagada acerca das contradições,
conforme a seguir exposto, a secretária disse “que os valores informados no Demonstrativo
Sintético Anual de Execução Físico-Financeira do SUAS, referentes ao Piso Básico Fixo do
7
exercício financeiro de 2007, enviado por meio físico em virtude de problemas técnicos na
internet da prefeitura...”.
Percebe-se, portanto, que as informações de interesse, as quais foram
questionadas pelo MPF, estavam à disposição da edilidade, que preferiu sonegá-las. E, ainda
que não estivessem integralmente à disposição da Município, este poderia ter apresentado as
mesmas informações disponibilizadas ao órgão concedente, não se justificando a resposta
negativa apresentada ao MPF. Uma simples leitura dos documentos apresentados e juntados
às fls. 344/361 é suficiente para verificar a existência de comprovantes de despesas.
Questionado, até por questões lógicas, como tais informações foram
prestadas ao órgão repassador dos recursos, já que afirmara que não existiam, segundo o
ofício de 2010 supramencionado, quaisquer documentos na Prefeitura acerca da aplicação dos
recursos destinados ao Piso Básico Fixo, o Município de Pitimbu/PB, por meio da Secretária
do Trabalho e Ação Social, a Sra. ARMANDA FERREIRA DE SOUSA, encaminhou o ofício
de fls. 341/343, mencionado nos parágrafos pregressos, com a documentação comprobatória
de despesas de fls. 344/361, alegando, em síntese, o que se segue:
“(...) o saldo financeiro de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais),
existente na conta corrente de n. 12.492-3, do Piso Básico Fixo
(CEAS/PAIF), foi integralmente transferido para a conta do FPM de
n. 3.375-8.
(...) As despesas efetivamente realizadas no exercício financeiro de
2007 com recursos do Piso Básico Fixo (CEAS/PAIF) que se
encontravam na conta corrente do FPM, correspondem a R$ 9.927,88
(nove mil, novecentos e vinte e sete reais e oitenta e oito centavos).
No exercício financeiro de 2008 foram ainda pagos com os recursos
do Piso Básico Fixo (CREAS/PAIF) que, conforme anteriormente
afirmado se encontravam na conta corrente do FPM, o total de R$
2.250,00 (dois mil, duzentos e cinquenta reais), conforme cópias dos
empenhos e recibos ora anexados (DOC. 03 – Comprovantes de
Despesas 2008).”
Ocorre que, apesar de ter recebido R$ 49.500,00 (quarenta e nove mil e
quinhentos reais) do FNAS, para o custeio das despesas de atendimento dos serviços do PAIF
8
(Programa de Atenção Integral à Família) e do CRAS (Centro de Referência de Assistência
Social), e de ter transferido a quantia de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais) para a conta do
FPM, a Prefeitura comprovou, às fls. 347/360, apenas a execução de R$ 9.927,00 (nove
mil, novecentos e vinte e sete reais), no exercício de 2007, e de R$ 2.250,00 (dois mil,
duzentos e cinquenta reais), referente ao exercício de 2008.
A fim de identificar a destinação dos valores do Piso Básico Fixo
(PAB), transferidos para a conta do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), no mês
subsequente à transferência, bem como se a destinação estava de acordo com as normas que
disciplinam o programa, toda a documentação bancária e a de comprovação dos gastos foram
encaminhadas à Analista de Contabilidade desta Procuradoria da República, a qual concluiu o
seguinte:
“Mesmo que os valores do PAB Fixo tenham se misturado aos do
FPM, seria possível comprovar o gasto por meio da documentação
comprobatória das despesas, ou seja, notas de empenhos, notas fiscais,
etc. Porém, apenas com as cópias dos cheques emitidos a partir da
conta do Fundo de Participação dos Municípios, não foi possível
identificar a aplicação dos supracitados recursos.
(…)
Ante o exposto, cumpre informar a V. Exª que foi comprovado, pela
Prefeitura de Pitimbu/PB, apenas o valor de R$ 9.927,88, em 2007 e
R$ 2.250,00, em 2008, do montante de R$ 35.000,00, repassado da
conta bancária PAB Fixo para conta do FPM.”
Dessa forma, em relação à diferença de recursos, no importe de R$
22.822,12 (vinte e dois mil, oitocentos e cinte e dois reais e doze centavos), não houve
qualquer comprovação de que teria sido aplicada nas finalidades do PAB Fixo.
A liberação de verbas públicas em desacordo com as normas
pertinentes, aplicando o montante repassado em finalidade diversa, acarreta dilapidação do
patrimônio público em detrimento de outros projetos prioritários, que não são executados por
falta de recursos.
Deve-se destacar que os pisos de proteção social, que variam conforme
9
o nível de complexidade, consoante destacado no início, são valores de cofinanciamento
federal, transferidos pelo FNAS, em complemento aos financiamentos estaduais, municipais e
do Distrito Federal, destinados ao custeio dos serviços e das ações socioassistenciais
continuadas.
Para o recebimento dos recursos do FNAS, os municípios devem
observar a instituição e o funcionamento de Conselho de Assistência Social; a instituição e o
funcionamento de Fundo de Assistência Social, devidamente constituído como unidade
orçamentária; a elaboração de Plano de Assistência Social; e a comprovação orçamentária de
recursos próprios destinados à assistência social, alocados nos respectivos fundos de
assistência social, conforme se observa do art. 30 da Lei n.º 8.742/93 e do art. 5º do Decreto
n.º 7.788/2012, que regulamenta a referida lei:
Decreto lei 7.788/2012:
Art. 5o São condições para transferência de recursos do FNAS aos
Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - a instituição e o funcionamento de Conselho de Assistência Social;
II - a instituição e o funcionamento de Fundo de Assistência Social,
devidamente constituído como unidade orçamentária;
III - a elaboração de Plano de Assistência Social; e
IV - a comprovação orçamentária de recursos próprios destinados à
assistência social, alocados em seus respectivos fundos de assistência
social.
Parágrafo
único. O
planejamento
das
atividades
a
serem
desenvolvidas com recursos do FNAS integrará o Plano de Assistência
Social, na forma definida em ato do Ministro de Estado do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome.
Em que pese ser o Decreto 7.788 de 2012, este ato normativo revogou
o Decreto 1.605/1995, que, em seu art. 5º e seguintes, também regulamentava a aplicação dos
recursos, de forma que não houve inovação na matéria. Nesse sentido, o entende federativo
deveria observar o correto emprego dos recursos de acordo com as normas que disciplinam a
10
matéria:
Art. 4o Os recursos repassados pelo FNAS destinam-se ao:
I - cofinanciamento dos serviços de caráter continuado e de programas
e projetos de assistência social, destinado ao custeio de ações e ao
investimento em equipamentos públicos da rede socioassistencial dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
II - cofinanciamento da estruturação da rede socioassistencial dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluindo ampliação e
construção de equipamentos públicos, para aprimorar a capacidade
instalada e fortalecer o Sistema Único da Assistência Social - SUAS;
III - atendimento, em conjunto com os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios, às ações assistenciais de caráter de emergência;
IV - aprimoramento da gestão de serviços, programas, projetos e
benefícios de assistência social, por meio do Índice de Gestão
Descentralizada - IGD do SUAS, para a utilização no âmbito dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, conforme legislação
específica;
V - apoio financeiro às ações de gestão e execução descentralizada do
Programa Bolsa Família pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos
Municípios, por meio do Índice de Gestão Descentralizada do
Programa Bolsa Família - IGD, conforme legislação específica;
VI - pagamento, operacionalização, gestão, informatização, pesquisa,
monitoramento e avaliação do benefício de prestação continuada e de
renda mensal vitalícia; e
VII - atendimento das despesas de operacionalização que visem
implementar ações de assistência social.
§ 1o Os recursos de que tratam os incisos I, IV e V do caput serão
transferidos, de forma regular e automática, diretamente do FNAS
para os fundos de assistência social dos Estados, do Distrito Federal e
11
dos Municípios, independente de celebração de convênio, ajuste,
acordo, contrato ou instrumento congênere, observados os critérios
aprovados pelo CNAS, à vista de avaliações técnicas periódicas,
realizadas pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à
Fome.
§ 2o Os recursos de que tratam os incisos II e III do caput poderão ser
transferidos, de forma automática, diretamente do FNAS para os
fundos de assistência social dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, independente de celebração de convênio, ajuste, acordo,
contrato ou instrumento congênere, conforme disciplinado em ato do
Ministro de Estado do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.
§ 3o Os recursos de que trata o inciso VI do caput serão repassados
pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome
diretamente ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, por meio
de celebração de termo de cooperação ou outro instrumento definido
em ato conjunto do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à
Fome e do Presidente do INSS.
§ 4o Os recursos de que trata o inciso I do caput também poderão ser
utilizados pelos entes federados:
I - para pagamento de profissionais que integrarem equipes de
referência, nos termos do art. 6º-E da Lei nº 8.742, de 1993; e
II - para capacitação de recursos humanos e desenvolvimento de
estudos e pesquisas essenciais à execução de serviços, programas e
projetos de assistência social.
§ 5o O FNAS poderá repassar recursos destinados à assistência social
aos entes federados por meio de convênio, ajuste, acordo, contrato ou
instrumento congênere, sendo vedado ao convenente transferir a
terceiros a execução do objeto do instrumento.
Art. 5o São condições para transferência de recursos do FNAS aos
12
Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - a instituição e o funcionamento de Conselho de Assistência Social;
II - a instituição e o funcionamento de Fundo de Assistência Social,
devidamente constituído como unidade orçamentária;
III - a elaboração de Plano de Assistência Social; e
IV - a comprovação orçamentária de recursos próprios destinados à
assistência social, alocados em seus respectivos fundos de assistência
social.
Parágrafo
único. O
planejamento
das
atividades
a
serem
desenvolvidas com recursos do FNAS integrará o Plano de Assistência
Social, na forma definida em ato do Ministro de Estado do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome.
Art. 6o Os recursos transferidos do FNAS aos fundos dos Estados,
Distrito Federal e Municípios serão aplicados segundo prioridades
estabelecidas em planos de assistência social, aprovados por seus
respectivos conselhos, observada, no caso de transferência a fundos
municipais, a compatibilização com o plano estadual e o respeito ao
princípio da equidade.
(…)
Art. 10. Os recursos de que trata o inciso I do caput do art. 4o
poderão ser repassados pelos fundos estaduais, municipais e do
Distrito Federal para entidades e organizações que compõem a rede
socioassistencial,
observados
os
critérios
estabelecidos
pelos
respectivos conselhos, o disposto no art. 9º da Lei nº 8.742, de 1993, e
a legislação aplicável.
Verifica-se, portanto, das normas, que os recursos transferidos pelo
FNAS aos Fundos Estaduais, Municipais e do Distrito Federal serão aplicados conforme as
prioridades definidas nos planos de assistência social aprovados pelos respectivos Conselhos,
o que não ocorreu no Município de Pitimbu/PB.
13
Ainda sobre o tema e como forma de espancar quaisquer dúvidas acerca
da matéria, o Tribunal da Contas da União, no acórdão n.º 2809/2009, determinou à Secretaria
Nacional de Assistência Social do MDS, que:
“adote as medidas necessárias junto aos municípios identificados na
auditoria, estendendo-se aos demais municípios que porventura se
encontrem na mesma situação, para que demonstrem a efetiva
instituição e funcionamento do fundo municipal de assistência social,
como
unidade
orçamentária,
contemplando
nos
respectivos
orçamentos todos os recursos destinados à política de assistência
social (serviços, programas e projetos), inclusive os recursos
financeiros liberados pelo FNAS, nos termos estabelecidos na Lei nº
4.320/1964, e legislação complementar, em cumprimento ao disposto
no art. 30, caput e parágrafo único, da Lei nº 8.742/1993, no art. 6º do
Decreto nº 1.605/1995 [atualmente, Decreto 7.788, de 15/8/2012, art.
5º, inciso II] e nos itens 5.3 e 5.4 da NOB/SUAS, aprovada pela
Resolução CNAS nº 130/2005; e
advirta os municípios identificados na auditoria, estendendo-se aos
demais municípios que porventura se encontrem na mesma situação,
sob a possibilidade de suspensão do repasse dos recursos do FNAS, na
hipótese de não restar comprovada a efetiva instituição e
funcionamento do fundo municipal de assistência social, como unidade
orçamentária, contemplando nos respectivos orçamentos todos os
recursos destinados à política de assistência social (serviços,
programas e projetos), inclusive os recursos financeiros liberados pelo
FNAS, em cumprimento ao disposto no art. 30, caput e parágrafo
único, da Lei nº 8.742/1993, no art. 6º do Decreto nº 1.605/1995
[atualmente, Decreto 7.788, de 15/8/2012, art. 5º, inciso II] e nos itens
5.3 e 5.4 da NOB/SUAS, aprovada pela Resolução CNAS nº
130/2005;”
Os autos revelam, portanto, que, além da aplicação em finalidade
diversa, mediante a transferência irregular dos recursos do PAB FIXO para a conta do FPM e
da não comprovação da aplicação dos recursos do programa em suas finalidades, houve a
14
prestação de informações falsas quando do preenchimento do Demonstrativo Sintético Anual
da Execução Físico-Financeira do SUAS (fls. 16/19 do Anexo I).
Em que pese a alegação da então secretária municipal de que os valores
informados no demonstrativo sintético “não implicam na assertiva de que foram efetiva e
totalmente gastos no referenciado exercício financeiro de 2007...”, esta não se sustenta. Ora
Exa., trata-se de uma prestação de contas, que, necessariamente, deve especificar os gastos
realizados em razão do programa. A então secretária municipal foi taxativa ao declarar no
aludido demonstrativo que foram gastos R$ 35.000,00 no âmbito do SUAS (fl. 17 do anexo
I). Acrescentou, naquela oportunidade, que ações desenvolvidas na área de assistência social
estariam apresentando “um retorno satisfatório por parte da população assistida em nossos
serviços...” (fl. 19 do anexo I). Não há como ignorar a inveracidade das informações
prestadas.
Continuando, nos termos do demonstrativo, o Município de
Pitimbu/PB informou o gasto de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais) com o custeio das
despesas do PAB FIXO, no exercício de 2007. No entanto, conforme destacado, apenas o
valor de R$ 9.927,88 (nove mil, novecentos e vinte e sete reais e oitenta e oito centavos) foi
efetivamente comprovado.
Muito embora a ausência de indícios acerca do enriquecimento ilícito
dos demandados ou de terceiros, a má gestão dos recursos públicos federais transferidos à
edilidade acarretou prejuízos à sociedade, que se serve dos trabalhos das equipes do PAIF Programa de Atenção Integral à Família e dos CREAS - Centros de Referência da Assistência
Social, incidindo nas normas que definem os atos de improbidade administrativa.
Agindo desta maneira, o gestor municipal aplicou verba pública em
finalidade diversa da prevista nas normas pertinentes, bem como, com a direta participação da
então secretária municipal do trabalho e ação social, apresentou informações inverídicas ao
MDS à título de prestação de contas. Ainda, também com o auxílio da então secretária
municipal, apresentou informações inverídicas ao MPF ao afirmar que não se encontravam
nos arquivos municipais dados acerca da aplicação dos recursos recebidos pela edilidade.
O direto envolvimento do então gestor público resta demonstrado a
partir das informações prestadas pela Sra. ARMANDA FERREIRA DE SOUSA às fls.
341/343. Segundo a demandada “por determinação do gestor público municipal emanada do
15
Of. 020/SETRAS de 13.12.2007, o saldo financeiro de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais),
existente na conta corrente de n. 12.492-3, do Piso Básico Fixo (CEAS/PAIF), foi
integralmente transferido para a conta do FPM DE N. 3.375-8....”.
Ainda no tocante às informações prestadas por meio do ofício de fls.
341/343, não procede a assertiva de que teria informado ao MDS, quando do preenchimento
do demonstrativo sintético, que o valor teria sido retirado, que o montante teria saído da conta
vinculada, vez que seria a única forma de prestar as informações. Uma simples leitura do
demonstrativo, fls. 16/19 do anexo I, é suficiente para concluir que no campo “recursos
financeiros gastos no âmbito do SUAS” foi incluído o valor de R$ 35.000,00. Também não
consta nenhuma observação ou ressalva no demonstrativo a confirmar a justificativa ora
destacada e apresentada ao MPF.
A apresentação de dados e informações que não correspondiam à
realidade tinha como finalidade omitir a verdadeira destinação dos recursos e frustrar a
apuração dos fatos pelo Ministério Público Federal, indo de encontro às regras de publicidade,
essencial à fiscalização dos atos públicos, além de violar os princípios que regem a
administração pública.
Diante do exposto, conclui-se que o ex-gestor público, ora demandado,
aplicou, em finalidade diversa, recursos públicos repassados pelo Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Também, em conjunto com a então secretária
municipal de trabalho e ação social, apresentou dados inverídicos ao concedente, quando do
preenchimento do demonstrativo sintético anual de execução físico-financeira do Sistema
Único de Assistência Social, e, da mesma forma, omitiu informações ao Ministério Público
Federal.
V – DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS
A Constituição Federal dispõe em seu artigo 37, § 4.°, in verbis:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos
Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
(...)
16
§ 4º. Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão
dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade
dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas
em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.
A fim de dar concreção a essa norma constitucional, veio a lume a Lei
n.º 8.429/92, que dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos, no caso de
improbidade no exercício do mandato, cargo, emprego ou função na administração direta,
indireta ou fundacional, ou entidade que receba subvenção, benefício ou incentivo, fiscal ou
creditício de órgão público.
Nas palavras de Nicolau Dino de Castro e Costa Neto:
“Os tipos correspondentes à improbidade administrativa estão
divididos em três categorias separadas por linhas demarcatórias
débeis e, por vezes, imperceptíveis. Assim, na Lei 8.429/92, o art. 9º,
elenca os atos de improbidade que implicam enriquecimento ilícito; o
art. 10 dedica-se aos atos de improbidade que causam prejuízo ao
erário e o art. 11 reporta-se aos atos de improbidade que atentam
contra os princípios da Administração Pública. Todos os três
dispositivos legais citados encerram, no caput, tipos genéricos,
dedicando os incisos à especificação de algumas condutas, a título
exemplificativo, como revela o emprego do vocábulo notadamente.”4
Tais sanções, “primus” independem das demais de natureza criminal
e/ou administrativa. Neste caminho, a jurisprudência do SUPERIOR TRIBUNAL DE
JUSTIÇA esclarece que:
“Os atos de improbidade administrativa definidos nos arts. 9, 10 e 11,
da Lei nº 8.429/92, acarretam a imposição de sanções previstas no
art. 12, do mesmo diploma legal,
às
quais
são aplicadas
independentemente das sanções penais, civis e administrativas. Tais
sanções, embora não tenham natureza penal, revelam-se de suma
gravidade, pois importam em perda de bens e de função pública, ou em
pagamento de multa e suspensão de direitos políticos, todos aplicados
4
em “Improbidade Administrativa: Aspectos materiais e processuais”, na obra Improbidade Administrativa –
10 anos da Lei n. 8492/92, Ed. Del Rey, 2003, pg. 347
17
no âmbito de uma ação civil...” (REsp. 150329/RS - Relator Ministro
VICENTE LEAL - Publ. no DJ de 05/04/1999, PG: 00156).
Naturalmente, caso a caso, as penalidades são aplicadas de maneira
cumulativa ou não.
O Procurador da República NICOLAO DINO DE CASTRO E
COSTA NETO, acima citado, informa a não cumulatividade obrigatória das sanções
previstas na Lei 8.429/92, o que está expresso no art. 12 em razão da nova redação conferida
pela Lei n.º 12.120/2009:
“A gênese das sanções correspondentes à improbidade administrativa
está no próprio art. 37, §4º, da Constituição da República, o qual
estabelece que a prática de tais atos importará a suspensão de direitos
políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o
ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei.
Advirta-se, desde logo, que as sanções previstas no art. 12 têm
natureza civil, lato sensu, não se tratando de promoção de
responsabilidade penal.
Vários aspectos merecem ser ponderados nesta oportunidade.
Inicialmente, considerando o extenso rol de sanções, é de se observar
que a aplicação das mesmas está subordinada aos princípios da
mínima intervenção estatal e da proporcionalidade. Vale dizer, as
penas podem ser aplicadas cumulativamente ou não, a depender das
situações concretas sujeitas à apreciação judicial.”5
As condutas dos réus guardam perfeito enquadramento nos tipos
correspondentes à improbidade administrativa, o que será objeto da análise a seguir.
Apesar do prejuízo ao erário, conforme demonstrado acima,
configurando o enquadramento no art. 10 da lei em epígrafe, pode o agente incorrer em dois
ou mais atos de improbidade administrativa capitulados nos artigos 9, 10 ou 11 da Lei n.º
8.429/92, fazendo-se necessário o estudo dos demais tipos correspondentes à improbidade
administrativa. Para ilustrar essa passagem, Emerson Garcia diz:
5 ob.cit, pág. 364/365
18
“À luz dessa situação e objetivando viabilizar a correta tipificação dos
atos de improbidade, deve-se observar que, com raras exceções, as
figuras constantes do art. 9º prevêem o enriquecimento ilícito do
próprio agente público, sendo o dano ao patrimônio público, em
alguns casos, mera conseqüência do mesmo. Nas figuras do art. 10,
por sua vez, regra geral, é o terceiro que se enriquece ilicitamente, o
que fez com que o dano ao patrimônio público fosse erigido à
categoria de principal parâmetro de adequação típica dessa espécie de
ato de improbidade, pois a tipologia dos atos de improbidade
constante da Lei nº 8.429/92 é direcionada, essencialmente, à conduta
dos agentes públicos – os quais, neste caso, não buscaram se
enriquecer, mas, primordialmente, causar danos ao patrimônio
público, com o paralelo enriquecimento de terceiros”.6
O art. 10, caput, dispõe que “Constitui ato de improbidade
administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa ou culposa, que
enseja perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou
haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente:”
Quanto à tipologia do art. 10 da Lei n.º 8.429/92, dispõem Emerson
Garcia e Rogério Pacheco Alves:
“....agindo com dolo ou culpa (leve, grave ou gravíssima), sofrerá o
agente político as sanções cominadas, não havendo previsão legal de
um salvo-conduto para que possa dilapidar o patrimônio público com
a prática de atos irresponsáveis e completamente dissociados da
redobrada cautela que deve estar presente entre todos aqueles que
administram o patrimônio alheio.”
Depreende-se do dispositivo acima que o prejuízo ao erário foi
derivado de condutas ilícitas e conscientes, ofensivas aos princípios que norteiam a
administração pública. Neste ponto, “é importante frisar que a noção de dano não se
encontra adstrita à necessidade de demonstração da diminuição patrimonial, sendo inúmeras
as hipóteses de lesividade presumida na legislação”.7
6 Op. cit. pag. 253
7 Op. cit. pag. 261.
19
Insta salientar que a técnica adotada pelo legislador na Lei n.º 8.492/92,
permite, segundo Emerson Garcia, uma autonomia entre os incisos e o caput dos dispositivos.
A enumeração, contudo, não é taxativa, o que se infere da própria indeterminação de alguns
conceitos.
De acordo com a doutrina, o legislador se fez valer de duas técnicas ao
elaborar a lei, utilizando-se, primeiramente, de conceitos jurídicos indeterminados,
apresentando-se como instrumento jurídico adequado ao infindável da criatividade e o poder
de improvisação humano; a segunda técnica foi utilizada na formação de diversos incisos, que
facilitam a compreensão dos conceitos indeterminados veiculados no caput.
Nesse sentido, os atos de improbidade praticados pelo então gestor
público e pela ex-secretária municipal enquadram-se no art. 10, XI, e art. 11, caput, e
inciso I, da Lei n.º 8.429/92:
Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão
ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje
perda
patrimonial,
desvio,
apropriação,
malbaratamento
ou
dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º
desta lei, e notadamente:
(...)
XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas
pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação
irregular;
(...)
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra
os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que
viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade
às instituições, e notadamente:
I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso
daquele previsto, na regra de competência;
(...)
20
As ações dos agentes públicos minuciosamente descritas retratadas nos
documentos que instruem a presente demanda, por si só, já evidenciam a prática de
improbidade administrativa.
Isto porque os atos expostos até aqui demonstram o desvirtuamento da
finalidade pública subjacente à atuação dos agentes públicos com desvio de finalidade,
consistente na não observância das normas que regem as matérias, bem como na prestação de
informações inverídicas quando diante do dever legal de apresentar os dados necessárias à
atuação dos órgãos.
Por fim, insta salientar que a enunciação meramente exemplificativa
adotada pela Lei n.º 8.429/92, diferentemente da legislação penal, revela que cabe ao
magistrado se ater à causa petendi, não havendo ilogicidade a aplicação de um dispositivo
diverso do invocado na inicial. Assim, estando devidamente apontadas as causas de pedir
próxima e remota, balizada está a atuação do magistrado. Neste sentido, Rogério Pacheco
Alves:
“Deste modo, em resumo, é preciso distinguir: quanto à causa petendi,
há uma estreita vinculação entre a inicial e a prestação jurisdicional,
não podendo o juiz aplicar uma sanção por fato não descrito pelo
autor. Neste passo, a congruência há de ser absoluta, sob pena de
indesculpável inquisitorialismo, como também injustificável violação
ao princípio constitucional da ampla defesa. Quanto ao pedido
sancionatório, por ser genérico, não há que se falar em adstrição,
bastando a narrativa do fato caracterizador de improbidade para que o
magistrado aplique as sanções mais adequadas ao caso, não se
devendo olvidar que tal aplicação é, em princípio, cumulativa.”8
VI – DOS PEDIDOS
Em face do exposto, requer o Ministério Público Federal:
a) a notificação dos demandados para se manifestarem por escrito,
querendo, no prazo de 15 (quinze) dias, e que, após tal prazo, em juízo
de
admissibilidade,
seja
recebida
a
presente
ação,
dando
prosseguimento regular, nos termos dos §§ 7º e 9º do art. 17, da Lei n.°
8 Op. cit. pág. 718.
21
8.429/92;
b) a citação dos demandados para, querendo, apresentarem peça
contestatória, no prazo de lei, sob pena de revelia (art. 319, do CPC);
c) a notificação da União, por meio do Procurador-Chefe da
Advocacia-Geral da União no Estado da Paraíba, localizada na Av.
Maximiano Figueiredo, n.º 404, Centro, João Pessoa/PB, CEP n.º
58.013-470, para ingressar no polo ativo da presente lide civil
pública, na condição de litisconsorte (arts. 17, §3º da Lei n.º 8.429/92
(Improbidade Administrativa) e 6º da Lei n.º 4.717/65 (Ação Popular);
AO FINAL DA INSTRUÇÃO
d) a condenação dos demandados nas sanções previstas no art. 12,
II, da Lei n.º 8.429/92, nos termos da inicial;
e) subsidiariamente, condenação no art. 12, III, da Lei n.° 8.429/92;
f) a condenação dos demandados nas despesas processuais.
Protesta o Parquet, ainda, por todos os meios de prova admitidos em
direito, notadamente provas testemunhais.
Dá-se à causa o valor de R$ 22.822,12 (vinte e dois mil, oitocentos e
cinte e dois reais e doze centavos).
João Pessoa/PB, 25 de setembro de 2013.
VICTOR CARVALHO VEGGI
Procurador da República
*Todas as informações de caráter pessoal foram retiradas em obediência ao artigo 9º, inciso
III, da Portaria PGR/MPF nº 918, de 18 de dezembro de 2013, que instituiu a Política
Nacional de Comunicação Social do Ministério Público Federal.
22
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JOSE ROMULO CARNEIRO DE ALBUQUERQUE NETO e outro