Universidade Federal de Ouro Preto Programa de Pós-Graduação Engenharia Ambiental Mestrado em Engenharia Ambiental PROÁGUA Gustavo de Sousa Leite “CARACTERIZAÇÃO, POR ESPECTROMETRIA DE MASSAS, DOS MICROPOLUENTES PRESENTES NO ESGOTO BRUTO E NOS EFLUENTES DE UM SISTEMA DE TRATAMENTO COMBINADO ANAERÓBIO-AERÓBIO.” Dissertação apresentada ao Programa de Pósgraduação em Engenharia Ambiental (Pro-água), da Universidade Federal de Ouro Preto, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre. Área de concentração: Saneamento Ambiental Linha de pesquisa: Técnicas avançadas de cromatografia acoplada à espectrometria de massa. Orientador: Dr. Robson José de Cássia Franco Afonso Co-orientador: Dr. Sérgio Francisco de Aquino Ouro Preto Instituto de Ciências Exatas e Biológicas Universidade Federal de Ouro Preto 2008 ii Agradecimentos Agradeço a Deus, pela oportunidade da realização desse trabalho, e por toda a força concedida nos momentos difíceis. Agradeço à minha mãe Margarida, meu pai Rogério, meu irmão Bruno e minha namorada Débora, as pessoas mais especiais de minha vida, que sempre apoiaram e estimularam meu desenvolvimento como pessoa e como profissional. Exemplos de pessoas justas, batalhadoras e de espírito de aprimoramento incansável. A meus orientadores, Dr. Robson José de Cássia Franco Afonso e Dr. Sérgio Francisco de Aquino, os quais me proporcionaram ensinamentos de inestimável valor, enriquecendo minha formação acadêmica e profissional. A todos os professores da UFOP, por ensinar, durante a graduação e mestrado, as ciências fundamentais, indispensáveis à minha atuação profissional. À querida República Xeque-Mate, minha eterna segunda casa, e meus irmãos xequemateanos, pela eterna amizade, convívio, companheirismo. A meus amigos de Belo Horizonte, companheiros de longas datas, que com suas amizades eternas, contribuíram para que esse caminho fosse menos árduo. Aos companheiros do laboratório: Davi, Aniel, Fernanda e aos alunos de iniciação científica Miriany, Emanuel e Thaísa, pela amizade, ajuda e conhecimentos intercambiados. À fundação Gorceix, pela bolsa de estudos concedida. iii Sumário Resumo..................................................................................................................................xi Abstract................................................................................................................................xii 1. Introdução........................................................................................................................1 2. Revisão biliográfica. .......................................................................................................5 2.1. Tratamento biológico de esgotos...............................................................................5 2.1.1. Processos aeróbios de degradação de matéria orgânica...................................6 2.1.2. Processos anaeróbios de degradação de matéria orgânica...............................7 2.2. Sistemas de tratamento combinado anaeróbio-aeróbio...........................................10 2.3. Impacto ambiental causado por micropoluentes no sistema de esgoto doméstico....13 2.3.1. Produtos de limpeza e higiene pessoal...........................................................15 2.3.2. Fármacos........................................................................................................22 2.4. Monitoramento de micropoluentes em sistemas de tratamento de esgotos................24 2.4.1. Produtos de limpeza e higiene pessoal............................................................24 2.4.2. Fármacos.........................................................................................................26 2.5. Fatores que influenciam a remoção de micropoluentes pelos sistemas de tratamento.................................................................................................................46 2.5.1. Hidrofobicidade e hidrofilicidade...................................................................46 2.5.2. Estrutura química dos micropoluentes............................................................47 2.5.3. População microbiana.....................................................................................48 2.5.4. Idade do lodo...................................................................................................48 2.5.5. Valor de pH.....................................................................................................49 2.5.6. Temperatura do sistema...................................................................................49 2.6. Técnicas de preparo de amostras e análise de micropoluentes...............................49 2.6.1. Técnicas de extração......................................................................................51 2.6.2. Técnicas de separação cromatográfica e detecção por espectrometria de massas...........................................................................................................52 3. Materiais e métodos.......................................................................................................56 3.1. O sistema de tratamento UASB/FBP.......................................................................56 3.1.1. Reator UASB................................................................................................... 56 3.1.2. Filtro biológico percolador............................................................................. 56 3.2. Amostragem............................................................................................................57 iv 3.3. Preparo das amostras e extração dos analitos..........................................................59 3.4. Reagentes, consumíveis e equipamento instrumental.............................................60 3.4.1. Metodologia analítica: aquisição dos espectros totais (fingerprint)................63 3.4.2. Metodologia analítica: detecção de compostos específicos............................65 3.5. 4. Tratamento quimiométrico de dados.......................................................................65 Resultados e discussão................................................................................................. 68 4.1. Análise de similariedade entre as amostras: scores................................................. 68 4.2. Elucidação estrutural de micropoluentes no esgoto doméstico................................71 4.2.1. Íons deprotonados de m/z =-311,1768;-325,1923;-339,1999 e -297,1509......73 4.2.2. Íon deprotonado de m/z = -279,2350...............................................................76 4.2.3. Íon deprotonado de m/z = -281,2493...............................................................78 4.2.4. Íon deprotonado de m/z = -212,0733...............................................................79 4.2.5. Íon deprotonado de m/z = -248,9611...............................................................81 4.2.6. Íon deprotonado de m/z = -199,1728...............................................................82 4.3. Monitoramento dos compostos elucidados no sistema UASB-FBP........................85 4.3.1. Alquilbenzeno sulfonados lineares (LAS) .......................................................85 4.3.2. Demais compostos destacados pela PCA no modo negativo de ionização......86 4.3.3. Compostos destacados pela PCA no modo de ionização positivo...................88 4.4. Compostos-alvo encontrados durante o tratamento biológico de esgotos sanitários.90 4.4.1. Dibutilftalato..……………………………….............................................….91 4.4.2. Bisfenol A……………..……..……….......................................….….........…94 4.4.3. Nonilfenol……………………..…..……….............................…..........……..96 4.4.4. Bezafibrato…………….……….…………..........................…….............…..99 4.5. 5. Análise Crítica........................................................................................................101 Conclusões...................................................................................................................104 6. Sugestões para trabalhos futuros.................................................................................106 7. Referências bibliográficas...........................................................................................107 v Lista de Figuras Figura 2.1 - Diagrama simplificado da degradação aeróbica de carboidratos. Fonte: Von Sperling, 2005........................................................................................................................7 Figura 2.2 - Fluxograma representativo da degradação da matéria orgânica complexa (proteínas, carboidratos e lipídeos). Fonte: Aquino e Chernicharo, 2005a............................9 Figura 2.3 - Esquema de um reator UASB. Fonte: Chernicharo, 2007...............................11 Figura 2.4 - (a) Corte transversal em um FBPs e (b) escoamento dos esgotos e disposição do biofilme no meio suporte. Fonte: Chernicharo, 2001......................................................12 Figura 2.5 - (a) Escória de alto-forno; (b) Donwflow Hanging Sponge; (c) Bloco crossflow 45° e (d) Pedra britada. Fonte: Tavares, 2008..............................................................13 Figura 2.6 - Estrutura química generalizada dos LAS.........................................................16 Figura 2.7 - Etapas do processo de degradação aeróbica do C12-LAS. Fonte: Schöberl (1989)...................................................................................................................................18 Figura 2.8 - Mecanismo proposto para a degradação dos APEOn. Fonte: Langford et al., 2005......................................................................................................................................19 Figura 2.9 - Estrutura química do CA5P1EC. Fonte: Hoai et al., 2004..............................20 Figura 2.10 - Formação de dioxinas a partir do triclosan, e a semelhança estrutural entre o bifenilol e os PCBs. Fonte: Agüera et al., 2005...................................................................22 Figura 2.11 - Principais rotas de fármacos no meio ambiente. Fonte: Billa e Dezzoti, 2003......................................................................................................................................23 Figura 3.1 - Reatores que compõem a ETE experimental em estudo. (a) Reator UASB e (b) FBPs. Fonte: Tavares, 2008............................................................................................57 Figura 3.2 - Filtro biológico percolador, dividido em quatro compartimentos, preenchidos com diferentes meios suportes para crescimento microbiano. Fonte: Tavares, 2008..........57 Figura 3.3 - Fluxograma esquemático do sistema UASB/FBP utilizado como aparato experimental. Fonte: Almeida, 2007a..................................................................................58 Figura 3.4 - Fluxograma das etapas de preparo das amostras, anterior à análise no HPLCMS-IT-TOF...........................................................................................................................60 Figura 3.5 - Montagem utilizada no processo de extração em fase sólida dos micropoluentes das amostras de esgoto................................................................................60 Figura 3.6 - Pré-coluna cromatográfica diretamente acoplada à fonte de ionização por electronspray (ESI)...............................................................................................................61 vi Figura 3.7 - Esquema simplificado do equipamento HPLC-MS-IT-TOF. Adaptado de Shimadzu Corporation, 2007...............................................................................................62 Figura 3.8 - Cromatógrafo líquido acoplado aos espectrômetros Ion-Trap e Time-of-Flight (HPLC-MS-IT-TOF).............................................................................................................64 Figura 3.9 - Representação matricial da operação realizada no cálculo de componentes principais. Fonte: Souza, 2008.............................................................................................66 Figura 4.1 - Primeira e segunda componentes principais da matriz de Scores do modo de ionização negativo................................................................................................................69 Figura 4.2 - Primeira e segunda componentes principais da matriz de Scores do modo de ionização positivo.................................................................................................................70 Figura 4.3 - Relação entre a primeira e a segunda componentes principais da matriz Loadings dos íons gerados nos modo negativo....................................................................72 Figura 4.4 - Relação entre a primeira e a segunda componentes principais da matriz Loadings dos íons gerados nos modo positivo.....................................................................72 Figura 4.5 - Espectros de massas dos íons moleculares deprotonados do modo MS1 (a) m/z=-311,1768; (b) m/z=-325,1923; (c) m/z=-339,1999; (d) m/z=-297,1509; e (e) espectro de massas do modo MS2, comum às quatro substâncias.....................................................74 Figura 4.6 - Fragmentações provenientes dos íons investigados........................................75 Figura 4.7 - Cromatograma específico dos íons de m/z=311,1768; 325,1923; 339,1999 e 297,1509...............................................................................................................................75 Figura 4.8 - (a) Espectro de massas do íon molecular deprotonado, com m/z=-279,2350; (b) espectro de massas dos fragmentos gerados por colisão induzida.................................77 Figura 4.9 - Fragmentação proposta para o íon m/z=-279,2350.........................................77 Figura 4.10 - (a) Espectro de massas do íon molecular deprotonado, com m/z=-281,2493; (b) espectro de massas dos fragmentos gerados por colisão induzida.................................78 Figura 4.11 - Fragmentações propostas obtidas nos experimentos MS2 provenientes do íon m/z= -281,2493....................................................................................................................79 Figura 4.12 - (a) Espectro de massas do íon molecular deprotonado, com m/z=-212,0733; (b) espectro de massas dos fragmentos gerados por colisão induzida.................................80 Figura 4.13 - (a) Espectro de massas do íon molecular deprotonado, com m/z=-248,9611; (b) espectro de massas dos fragmentos gerados por colisão induzida.................................81 Figura 4.14 - (a) Espectro de massas do íon molecular deprotonado, com m/z=-199,1728; (b) espectro de massas dos fragmentos gerados por colisão induzida.................................82 vii Figura 4.15 - Dados sobre as substâncias elucidadas..........................................................84 Figura 4.16 - Comportamento dos LAS durante o tratamento estudado..............................85 Figura 4.17- Perfis de monitoramento dos ácidos graxos láurico, linoléico e oléico, de um ftalato e um composto não identificado, presentes no esgoto doméstico.............................87 Figura 4.18 - Perfis de monitoramento de íons positivos de estruturas não elucidadas 214,0954; 231,1290; 236,0793 e 251,1327, presentes no esgoto doméstico.......................88 Figura 4.19 - Perfis de monitoramento de íons positivos de estruturas não elucidadas 279,1611; 301,1421; 304,3084; 341,0800, presentes no esgoto doméstico.........................89 Figura 4.20 - Perfis de monitoramento de íons positivos de estruturas não elucidadas 399,2561; 413,2709; 421,2469 e 659,1751, presentes no esgoto doméstico.......................89 Figura 4.21 - Estruturas moleculares dos compostos-alvo..................................................91 Figura 4.22 - (a) cromatograma e (b) espectro de massas do dibutilftalato, modo MS1, mostrando o íon molecular do poluente (m/z=277,1494)....................................................92 Figura 4.23 - Perfil da concentração do dibutilftalato relativa à do padrão interno, em diferentes pontos da ETE, onde: A- esgoto bruto (entrada do UASB); B- saída do UASB/entrada do FBP; C1- saída do FBP (conduíte); C2- saída do FBP (pedra britada)...93 Figura 4.24-(a)cromatograma e (b) espectro de massas do íon molecular do bisfenol A..95 Figura 4.25 - Perfil de degradação do bisfenol A no sistema de tratamento de efluentes estudado. A- esgoto bruto (entrada do UASB); B- saída do UASB/entrada do FBP; C1saída do FBP (conduíte); C2- saída do FBP (pedra britada)................................................95 Figura 4.26 - Metabolismo microbiano aeróbio dos alquilfenóis etoxilados. Fonte: Ahel et al., 1994................................................................................................................................97 Figura 4.27 - (a) cromatograma e (b) espectro de massas do nonilfenol............................98 Figura 4.28 - Perfil do comportamento do nonilfenol no sistema experimental UASB-FBP, onde: A- esgoto bruto (entrada do UASB); B- saída do UASB/entrada do FBP; C1- saída do FBP (conduíte); C2- saída do FBP (pedra britada).........................................................98 Figura 4.29 - (a) cromatograma e (b) espectro de massas correspondentes ao bezafibrato..........................................................................................................................100 Figura 4.30 - Comportamento do bezafibrato ao longo do sistema de tratamento de efluentes sanitários em estudo............................................................................................100 viii Lista de Tabelas Tabela 2.1 - Remoção de substâncias presentes em produtos de limpeza e higiene pessoal por diferentes sistemas de tratamento..................................................................................33 Tabela 2.2 - Remoção de fármacos e drogas por diferentes sistemas de tratamento de efluentes, reportada na literatura..........................................................................................35 Tabela 2.3 - Número de substâncias extraídas por cada método, nos trabalhos revisados...............................................................................................................................52 Tabela 2.4 - Utilização de técnicas analíticas para alguns micropoluentes mais freqüentemente encontrados por estudos sobre sistemas de tratamento de esgoto doméstico..............................................................................................................................54 Tabela 3.1 - Dados das amostragens a e fases operacionais do sistema de tratamento de efluentes em estudo..............................................................................................................59 Tabela 3.2 - Substâncias-alvo analisadas no modo MS2 do espectrômetro de massas, e seus íons moleculares, no modo de ionização negativo...............................................................65 Tabela 4.1 - Valores das componentes principais para os íons que se destacaram na análise de PCA.................................................................................................................................73 Tabela 4.2 - Resultados gerados pelo programa Formula Predictor, na busca por fórmulas correspondentes aos íons 311,1768; 325,1923; 339,1999 e 297,1509.................................76 Tabela 4.3 - Possíveis composições elementares das estruturas moleculares referentes ao íon negativo de m/z igual a 279,2350...................................................................................78 Tabela 4.4 - Possíveis composições elementares das estruturas moleculares referentes ao íon negativo de m/z igual a 281,2493...................................................................................79 Tabela 4.5 - Possíveis composições elementares das estruturas moleculares referentes ao íon negativo de m/z igual a 212,0733...................................................................................81 Tabela 4.6 - Possíveis composições elementares das estruturas moleculares referentes ao íon negativo de m/z igual a 248,9611...................................................................................82 Tabela 4.7 - Possíveis composições elementares das estruturas moleculares referentes ao íon negativo de m/z igual a 199,1728...................................................................................83 Tabela 4.8 - Compostos-alvo selecionados para o estudo de comportamento de degradação na ETE..................................................................................................................................91 ix Lista de Notações APCI - Atmospheric pressure chemical ionization APPI - Atmospheric pressure photo ionization BPA - Bisfenol A CePTS - Centro de Pesquisa e Treinamento em Saneamento COV - Carga orgânica volumétrica DBE - Double bond equivalency DBO - Demanda bioquímica de oxigênio DBP - Dibutilftalato DQO - Demanda química de oxigênio ETE - Estação de tratamento de efluentes GC-EI-MS - Gas chromatograph-electron ionization-mass spectrometer GC-MS - Gas chromatograph-mass spectrometer GC-NCI-MS - Gas chromatograph-negative chemical ionization-mass spectrometer HPLC-MS-IT-TOF - High performance liquid chromatograph-mass spectrometer ion trap-time of flight GC-MS-IT-TOF - Gas chromatograph- mass spectrometer ion trap time of flight LAS - Linear alkylbenzene sulfonate LLE - Liquid-liquid extraction MBR - Membrane bioreactor mDa - Milidaltons MRM - Monitoring reaction mode PCA - Principal Component Analysis TAS - Taxa de aplicação superficial Q-TOF-MS - Quadrupole-time-of-flight mass spectrometer SIM - Single ion monitoring SPE - Solid phase extraction TDH - Tempo de detenção hidráulico UASB - Upflow anaerobic sludge blanket UPLC - Ultra-performance liquid chromatography US-EPA - United States Environmental Protection Agency x Resumo Substâncias provenientes de fármacos, produtos de limpeza e de higiene pessoal, após utilizadas, atingem o sistema de coleta sanitário e chegam às estações de tratamento onde são, muitas vezes, apenas parcialmente degradadas. Poucos trabalhos são encontrados na literatura nacional sobre a presença de microcontaminantes orgânicos em esgoto sanitário e sua remoção durante o tratamento biológico de efluentes domésticos. Sendo assim, o presente estudo desenvolveu uma metodologia analítica para identificação e monitoramento dos microcontaminantes presentes no esgoto bruto e nos efluentes de um sistema simplificado de tratamento, que combina reator de leito de lodo anaeróbio de fluxo ascendente (UASB) seguido de pós-tratamento aeróbio em filtro biológico percolador (FBP). Amostras de quatro pontos do sistema de tratamento foram coletadas e, após o preparo por SPE, foram analisadas por cromatográfica líquida acoplada à espectrometria de massas. A análise quimiométrica destacou nove compostos nas amostras, sete das quais tiveram suas estruturas elucidadas e seu comportamento durante o tratamento, estudado (C10-LAS, C11-LAS, C12-LAS, C13-LAS, ácido oléico, ácido linoléico e ácido láurico). Em seguida, outra metodologia é aplicada na busca por substâncias específicas (nonilfenol, bezafibrato, bisfenol A e dibutilftalato), provenientes de produtos de uso rotineiro nos lares e grandes centros urbanos. O perfil comportamental desses microcontaminantes ao longo do tratamento demonstra que a eficiência de remoção do reator anaeróbio é, no geral, baixa, mas foi eficaz na remoção dos ácidos linoléico e oléico. O FBP foi capaz de degradar com grande eficiência outros micropoluentes, como o bisfenol A. Percebe-se também que alguns compostos, como o ácido láurico, são recalcitrantes, não havendo remoção significativa dos mesmos. O comportamento do nonilfenol demonstra, além da ineficácia do sistema em remover o poluente, uma possível síntese do poluente no reator aeróbio. Palavras-chave: esgoto sanitário, espectrometria de massas, HPLC-MS-IT-TOF, microcontaminantes orgânicos, cromatografia líquida, fármacos, produtos de limpeza e higiene pessoal. xi Abstract Pharmaceuticals and personal care products arrive at wastewater treatment plants after disposal, where aren’t completely degraded. There are only a few Brazilian studies which look for those organic micropolutants on the domestic sewage, as well as their removal in effluent treatment systems. This work developed an analytical methodology in order to identify micropolutants in raw domestic sewage and in a simplified biological effluent treatment plant samples, which enclose both anaerobic bioreactor (UASB) and aerobic bioreactor filter. Samples from four points of the treatment were collected and, after SPE preparation, analyzed in a high performance liquid chromatograph coupled mass spectrometer (fullscan mode). Chemometrics analysis draw attention to nine compounds, seven of which had their structures elucidated and their behavior through de treatment were studied (C10-LAS, C11-LAS, C12-LAS, C13-LAS, oleic acid, linoleic acid and lauric acid). In other way, another strategy were applied in order to search for specific substances (nonylphenol, bezafibrate, bisphenol A and dibutylphtalate), which are present in many daily products. The profile of those substances in the sewage treatment plant shows that, in general, the anaerobic reactor removal efficiency is low, but capable to remove almost completely oleic and linoleic acids of the effluent. The aerobic bioreactor was capable to degrade with high efficiency some organic pollutants such bisphenol A. It was perceptible that some micropolutants, such as lauric acid, aren’t removed at all, and others, such as nonylphenol may be synthesized over the treatment process. Keywords: domestic sewage, mass spectrometry, HPLC-MS-IT-TOF, organic micropolutants, liquid chromatography, pharmaceuticals, personal care products. xii 1. Introdução Atualmente, com o avanço da tecnologia nas mais diversas áreas do conhecimento humano e com o aumento da variedade de produtos e substâncias desenvolvidos para a melhoria do bem estar das populações e com o crescimento dos centros urbanos, é notável que a quantidade e variedade de novas substâncias poluidoras lançadas nos corpos receptores tenha crescido enormemente. Daughton e Ternes (1999) enfatizam que a identificação e investigação prematuras do potencial poluidor, antes que chegue a níveis críticos, é fundamental para a proteção do meio-ambiente e da saúde humana. Pesquisadores do mundo todo têm observado que alguns contaminantes presentes nos esgotos sanitários em concentrações da ordem de microgramas por litro (μg/L) ou nanogramas por litro (ng/L) exercem efeitos tóxicos sobre animais silvestres e têm o potencial de afetar adversamente a saúde humana. Esses contaminantes, definidos usualmente como micropoluentes (ou microcontaminantes), alusão à reduzida concentração em que se encontram no ambiente, apresentam grande diversidade de natureza química, e provém das mais variadas fontes, tais como fármacos de uso humano (Lee et al., 2005; Radjenovic et al., 2007, Vasskog et al., 2006) ou animal (Daughton e Ternes, 1999) e produtos de limpeza e de higiene pessoal (Agüera et al., 2003; Carballa et al. 2004; Carballa et al., 2005), os quais são introduzidos no meio ambiente via esgoto doméstico, seja ele tratado ou não. Os produtos de limpeza, como detergentes, sabões e desinfetantes, contêm em suas formulações, centenas de diferentes substâncias, como agentes tensoativos, fragrâncias e microbicidas. Os surfactantes são substâncias presentes, principalmente, nas formulações de detergentes e sabões. A degradação incompleta dessas substâncias gera metabólitos passíveis de interferir no funcionamento normal do sistema endócrino de animais (Nimrod e Benson, 1996; Beck et al., 2005). Problemas, já relatados pela literatura, causados pela presença dessas substâncias no meio ambiente incluem o aumento do câncer de mama na população feminina, anormalidades na formação do sistema reprodutivo humano e várias expressões de desordens na vida selvagem, como hermafroditismo, feminização e diminuição da fertilidade (Farré et al., 2007). Esse efeito também é perceptível quando outros grupos de poluentes orgânicos, como estrógenos (Luckachko, 1999; Laganà et al., 1 2004), estrógenos sintéticos (Reis et al., 2006), pesticidas e plastificantes, estão presentes no ambiente (Farré et al., 2007). É grande também a preocupação com a presença de fármacos no meio ambiente. Essas drogas após manufaturadas, descartadas ou administradas e excretadas, chegam às estações de tratamento de esgoto e, muitas delas passam incólumes pelo sistema de tratamento (Bila e Dezotti, 2003). Como substâncias biologicamente ativas, a presença das mesmas no ambiente aquático significa um grande risco para a saúde humana, vegetal e animal (Lee et al., 2005, Farré et al., 2007). Como os estudos nesse campo são recentes, ainda são desconhecidos os efeitos que a presença destes compostos na água pode causar em humanos e organismos aquáticos, mas é prudente que a água potável não deva conter quantidades significativas desses compostos (Kimura et al., 2004). Outro grupo de substâncias que são alvo de discussão são os produtos de higiene pessoal de uso diário. Cremes para a pele e rosto, perfumes, bloqueadores solar, dentifrícios e diversos outros cosméticos, contêm, em suas formulações, várias substâncias químicas que estão presentes no ambiente (principalmente nos esgotos tratados, mas também em águas superficiais) em quantidades significativas. Fragrâncias, desinfetantes, fungicidas e essências, dentre tantas outras, apresentam características bioativas e, quando descartadas no sistema coletor de esgoto doméstico, são transportadas às estações de tratamento de efluente. Durante o tratamento, vários deles não são mineralizados (degradação completa a gás carbônico e água), não são degradados ou sofrem degradação parcial e, por isso, sua presença é detectada em corpos d’água receptores. Embora alguns estudos já relatarem, a mais de 20 anos, a ocorrência no meio ambiente de fármacos, produtos de limpeza e higiene pessoal e outras substâncias classificadas como perturbadores endócrinos, apenas nos últimos 10 anos é que começaram a ser intensificadas as pesquisas nesta área, principalmente nos países europeus e EUA. No Brasil, estudos sobre o tema ‘micropoluentes’ em águas e efluentes ainda são incipientes, e a revisão da literatura mostra que há pouquíssimos trabalhos nacionais publicados abordando a presença de tais contaminantes em efluentes sanitários, em águas superficiais e subterrâneas, bem como seu destino durante os tratamentos de água e esgotos. Efluentes de estações de tratamento de esgoto podem conter uma variedade de compostos orgânicos 2 que foram introduzidos por atividades antropogênicas. Uma vez que o efluente tratado é, muitas vezes, despejado em mananciais de água potável, a poluição desta com microcontaminantes orgânicos é de grande preocupação mundial (Kimura et al., 2004). A utilização de sistemas combinados de tratamento, que empregam reatores anaeróbios seguidos de reatores aeróbios, pode conferir grande viabilidade econômica aos sistemas de tratamento de esgotos. Tal combinação se apresenta como uma opção bastante promissora no Brasil, tanto do ponto de vista econômico, quanto do ponto de vista técnico e de atendimento à legislação ambiental. Em particular, a combinação de reatores UASB com pós-tratamento aeróbio tem encontrado elevada aplicabilidade no Brasil, tendo em vista, principalmente, a sua simplicidade e baixo custo operacional (Von Sperling, 2005). Projetos de pesquisa apoiados pelo PROSAB (FINEP/CNPq/Caixa) ao longo dos últimos anos contribuíram para o avanço desta tecnologia e sua disseminação destes sistemas de tratamento de esgotos no estado de Minas Gerais e no Brasil. Durante as últimas três décadas, o impacto da poluição química nos corpos d’água foi focado quase exclusivamente em macropoluentes (Agüera et al., 2003), o que ocorreu devido aos impactos diretos causados por eles: como a eutrofização de ambientes lênticos ou problemas imediatos de saúde pública. De fato, os sistemas de tratamento combinado são, na maioria das vezes, eficientes na remoção dos macro-poluentes, dos quais se destacam a matéria orgânica biodegradável (DBO), nutrientes (nitrogênio e fósforo) e organismos patogênicos (vírus, cistos e ovos de helmintos). Entretanto, pouco se sabe sobre a eficiência de tais sistemas na remoção de microcontamintes orgânicos. A remoção de compostos químicos advindos de fármacos, produtos de limpeza e de higiene pessoal em sistemas simplificados de tratamento de esgotos é altamente desejável, uma vez que tais sistemas têm grande potencial de serem difundidos, principalmente nas pequenas comunidades, com pouco aporte de recursos financeiros. A remoção de microcontaminantes no tratamento de esgotos melhoraria a qualidade ambiental e diminuiria ainda a pressão sobre as estações de tratamento de água, que muitas vezes captam água contaminada com tais poluentes. 3 Pelo exposto, o presente trabalho tem como principal objetivo desenvolver técnicas analíticas que permitam o monitoramento de micropoluentes orgânicos em esgoto sanitário bruto e nos efluentes de um reator UASB, seguido de pós-tratamento aeróbio com filtros biológicos percoladores (FBP), sistema de tratamento este de grande aplicabilidade às condições geográficas e socioeconômicas do Brasil. Essa pesquisa foi dividida em duas partes principais: a primeira focaliza o monitoramento do esgoto como um todo, durante dez meses, e, através do tratamento quimiométrico de dados em conjunto com a interpretação de espectros de massa, identificar os poluentes majoritários presentes no esgoto, e discutir como ocorre a remoção deles durante o tratamento. A segunda parte trata de identificar, usando cromatografia acoplada à espectrometria de massas, poluentes especificados (compostos-alvo) e monitorar o comportamento deles ao longo do sistema de tratamento. 4 2. Revisão Bibliográfica Esse capítulo trata, primeiramente, da importância do tratamento de esgotos e dos fundamentos do tratamento biológico aeróbio e anaeróbio. Depois é apresentado um sistema combinado (anaeróbio-aeróbio) de tratamento bastante utilizado no país, que consiste de reator de leito de lodo anaeróbio de fluxo ascendente (UASB) seguido de filtro biológico percolador (FBP). Em seguida apresenta-se uma revisão da literatura sobre trabalhos que fizeram uma caracterização mais aprofundada, os quais buscam compostos específicos nos esgotos sanitários, muitas vezes por técnicas cromatográficas acopladas à espectrometria de massas. Estes trabalhos mostram a atual preocupação com os mecanismos de degradação e destino final dessas substâncias. A revisão busca a melhor compreensão dos mecanismos de degradação ou remoção desses compostos quando submetidos ao tratamento de efluentes, para uma avaliação mais realista da eficácia dos sistemas. Finalmente são apresentados os fatores que influenciam na degradação dos poluentes, que podem ser divididos em dois grupos distintos: as características intrínsecas das substâncias, diretamente relacionadas com suas estruturas químicas, e os parâmetros operacionais das ETEs. 2.1. Tratamento Biológico de Esgotos A presença de poluentes no meio ambiente aquático pode trazer efeitos nocivos ao meio ambiente e ao homem, muitos deles ainda não completamente elucidados (Bruchet et al., 2002). Na maioria dos países, incluindo o Brasil, as águas superficiais são uma importante fonte de captação pelas estações de tratamento, as quais abastecem os centros urbanos. Assim, é de grande importância a minimização da poluição das águas naturais pelos efluentes domésticos. Para isso, os efluentes deveriam ser captados e levados às estações de tratamento de esgotos municipais, que utilizam diversas tecnologias para a minimização da poluição ambiental gerada pelas populações das cidades. Para o tratamento biológico de águas residuárias, variados processos estão, hoje, disponíveis, e que podem ser classificados em dois grandes grupos, relacionados com a presença ou ausência de oxigênio durante a degradação biológica. Ambos funcionam através do mesmo mecanismo básico: microorganismos utilizando os poluentes do efluente em suas reações bioquímicas para gerar energia e crescimento celular. A diferença entre eles está na condição ambiental imposta em cada um. Sob condições aeróbias, os 5 compostos orgânicos são oxidados a dióxido de carbono e água, tendo como aceptor final de elétrons, o oxigênio molecular livre. Na ausência de oxigênio molecular (condição anaeróbia), o ambiente se torna redutor, e aceptores de elétrons alternativos são requeridos. Os sistemas aeróbios são mais eficientes na mineralização de compostos aromáticos; já os anaeróbios, de grupos alifáticos de cadeia curta (Aquino, 2004). Os poluentes presentes nos esgotos são usados pelos microorganismos como fonte de energia (doadores de elétrons) ou ainda como aceptores de elétrons (Ex. SO42-, pentaclorofenol, azo-corantes), que os metabolizam e utilizam a energia liberada nesse processo para suas reações bioquímicas de manutenção e reprodução celular. Como subprodutos da degradação aeróbia, produzem dióxido de carbono e água, e sob condição anaeróbia, metano, hidrogênio e dióxido de carbono, gases esses que são liberados na fase líquida do tratamento (Von Sperling, 2005; Chernicharo, 2007). Os reatores biológicos, de maneira geral são ambientes que favorecem as melhores condições para o crescimento dos microorganismos degradadores de matéria orgânica, em termos de pH, temperatura, nutrientes, presença ou ausência de oxigênio, contato da biomassa com o substrato, entre outros. É notado que nos reatores anaeróbios a produção de biomassa é inferior quando comparada aos reatores aeróbios. Isso é explicado pela quantidade de energia liberada por unidade de biomassa em cada um dos processos. Enquanto o anaeróbio libera menos energia, o que implica em menor crescimento da biomassa, o aeróbio libera mais, fazendo com que a multiplicação dos microorganismos também seja superior (Chernicharo, 2007). 2.1.1. Processos Aeróbios de Degradação de Matéria Orgânica Os processos aeróbios são caracterizados pela degradação dos poluentes orgânicos na presença de oxigênio, conforme exemplificado pela equação abaixo: C6H12O6 + O2 CO2 + H2O + Energia Nesse tipo de metabolismo, a matéria orgânica poluidora funciona como fonte de carbono e de energia (doador de elétrons), e o oxigênio é o aceptor final de elétrons, que pode ser introduzido no sistema de maneira natural, muitas vezes caracterizando uma degradação 6 mais lenta; ou de forma artificial, o que aumenta a concentração de oxigênio disponível para as bactérias degradadoras, acelerando a remoção dos poluentes. Em relação à degradação anaeróbia, os processos aeróbios apresentam as seguintes vantagens (Von Sperling, 2005): alta taxa crescimento microbiano; maior estabilidade operacional; maior eficiência na degradação de poluentes; remoção NH4+. Já as desvantagens são (Von Sperling, 2005): maior geração de lodo a ser tratado, que pode acumular metais pesados ou compostos orgânicos; maior consumo de energia, para forçar a introdução artificial de oxigênio nos sistemas. O fluxograma apresentado na Figura 2.1 ilustra este tipo de degradação biológica para carboidratos, como exemplo: Matéria orgânica complexa Carboidratos Liberação de enzimas Compostos de baixo peso molecular Açúcares (ex. glicose) Catabolismo e respiração CO2 e H2O Figura 2.1 - Diagrama simplificado da degradação aeróbica de carboidratos. Fonte: Von Sperling, 2005. 2.1.2. Processos Anaeróbios de Degradação de Matéria Orgânica São sistemas de tratamento de efluentes caracterizados pela degradação seqüencial dos poluentes, na ausência de oxigênio molecular, por um consórcio de microorganismos interdependentes, que utilizam a matéria orgânica como fonte de carbono e energia. Esses processos levam à produção de, principalmente, metano (CH4) e gás carbônico (CO2), de acordo com a equação simplificada: 7 C6H12O6 3CO2 + 3CH4 + Energia Quando comparados aos sistemas aeróbios, os anaeróbios mostram as seguintes vantagens (Von Sperling, 2005): menor geração de lodo; menor consumo energético; produção de metano, o qual pode ser aproveitado como fonte alternativa de energia E também as seguintes desvantagens (Von Sperling, 2005): menor taxa crescimento microbiano; menor estabilidade operacional; menor eficiência de remoção de matéria orgânica, necessitando, geralmente, de uma etapa de pós-tratamento; não remove NH4+; maior sensibilidade a substâncias tóxicas; Produção de H2S, o que causa mau odor na periferia de estação de tratamento, bem como a corrosão de estruturas metálicas da ETE. A degradação anaeróbia requer três grupos principais de microrganismos: fermentativos, acetogênicos e metanogênicos, que coexistem na maioria dos ecossistemas anaeróbios. Esse processo é descrito no fluxograma mostrado pela Figura 2.2: 8 Matéria Orgânica Complexa Carboidratos Proteínas I Lipídios HIDRÓLISE Amino-ácidos, pequenos sacarídeos Ácidos graxos, álcoois -OXIDAÇÃO FERMENTAÇÃO Produtos Intermediários: propionato, (iso) butirato, (iso) valerato II ACETOGÊNESE Hidrogênio Dióxido de carbono Acetato HOMOACETOGENESE III METANOGÊNESE ACETOCLÁSTICA METANOGÊNESE HIDROGENOTRÓFICA Metano Dióxido de carbono Figura 2.2 - Fluxograma representativo da degradação da matéria orgânica complexa (proteínas, carboidratos e lipídeos). Fonte: Aquino e Chernicharo, 2005a. A matéria orgânica complexa é degradada por enzimas produzidas pelas bactérias fermentativas, como celulase, amilase e proteases, em moléculas menores e solúveis. Esses produtos são, então, fermentados, em um primeiro passo, a ácidos graxos de cadeia curta e gases hidrogênio e dióxido de carbono. Os ácidos graxos maiores que acetato são metabolizados a acetato, por bactérias acetogênicas. Por sua vez, H2 e CO2 são convertidos a acetato pela homoacetogenese ou a CH4 e CO2, pela metanogenese hidrogenotrófica. O acetato é convertido a metano e dióxido de carbono através da metanogenese acetoclástica, reação que produz a maior parte do metano gerado nos biorreatores anaeróbios (Aquino et al., 2005b). Apesar de existirem diversas vantagens do tratamento anaeróbio quando comparado ao aeróbio, um dos aspectos que limitam a aplicação da tecnologia anaeróbica é o fato que a concentração da DQO efluente é geralmente muito alta para atender a legislação ambiental 9 em vigor. Sendo assim, é comum a adoção de sistema de pós-tratamento, com a finalidade de remover a matéria orgânica residual, o que aumenta o custo final do tratamento. 2.2. Sistemas de tratamento Combinado Anaeróbio-Aeróbio Os processos de tratamento combinados são caracterizados por unirem ambas as tecnologias anaeróbias e aeróbias para o tratamento de águas residuárias. Hunter et al. (1986) sugerem que o mecanismo mais eficiente para a mineralização da matéria orgânica envolve a alternância entre processos oxidativos (aeróbios) e redutores (anaeróbios). De fato, ao combiná-las, percebe-se certa redução dos custos de implementação do projeto, menor quantidade de energia gasto e menor quantidade de resíduo produzido (lodo a ser disposto). De acordo com Chernicharo (2007), um sistema combinado bastante difundido no Brasil é o que emprega reator de leito de lodo anaeróbio de fluxo ascendente (UASB) seguido de pós-tratamento aeróbio com filtros biológicos percoladores (FBP). O sistema anaeróbio do tipo reator UASB caracteriza-se por apresentar uma zona de digestão, localizada na parte inferior, onde existe uma manta de lodo que é responsável pela digestão anaeróbia e uma parte superior, ou zona de sedimentação (Figura 2.3). Inúmeras vantagens são associadas aos reatores UASB e justificam sua difusão, especialmente em regiões de clima quente, dentre as quais se destacam a pequena área requerida para a construção, a simplicidade e baixo custo operacional e de projeto, consumo energético e produção de lodo inferior a outros sistemas (Chernicharo, 1997). Von Sperling (2005) destaca ainda que a maior eficiência de remoção de DBO em reatores UASB (de 60% a 75%) em relação aos decantadores primários (20% a 35%) empregados em estações de tratamento de esgotos convencionais representa uma grande vantagem na aplicação dessas unidades. 10 Figura 2.3 - Esquema de um reator UASB. Fonte: Chernicharo, 2007. Grande parte da matéria orgânica do esgoto bruto é removida no sistema UASB, mas os efluentes dessas unidades anaeróbias freqüentemente não atendem aos padrões de lançamento de efluentes no meio ambiente, necessitando, portanto de um sistema de póstratamento. Um exemplo pode ser notado no trabalho de Almeida (2007b), que estudou a remoção da DQO efluente de reatores UASB em um sistema de pós-tratamento com filtro biológico percolador (FBP) sob várias condições operacionais. Em todas elas, a DQO manteve-se em concentração em torno de 150mg/L, valor antigamente considerado elevado e inadequado ao lançamento, mas que atende ao padrão de lançamento atual (180mg/L, de acordo com a COPAM-2008). Outro exemplo a ser destacado são os alquilbenzeno sulfonados de cadeia linear (LAS do acrônimo inglês), que são surfactantes de ampla utilização doméstica e industrial, que não são removidos por mecanismos anaeróbios, com seu efluente apresentando alta concentração desses compostos (4,2 a 7,3mg/L) (Tavares, 2008). Uma opção para reator pós-UASB é o filtro biológico percolador (FBP), um reator aeróbio empregado no tratamento de esgotos domésticos e industriais. O princípio de funcionamento de tal reator é a conversão dos poluentes do esgoto por meio de uma 11 biomassa aderida em um meio suporte, os quais são, geralmente, materiais plásticos ou brita. O esgoto é aplicado sob o meio suporte, proporcionando nele, o crescimento de uma diversificada matriz microbiológica, composta por bactérias facultativas, aeróbias, anaeróbias, fungos, algas e protozoários (Tavares, 2008). A aeração no filtro é feita de maneira natural através de aberturas (escotilhas) na lateral do filtro. À medida que o esgoto escoa pelo meio suporte, os poluentes ali presentes são oxidados pelos microorganismos, promovendo a sua estabilização. A Figura 2.4 ilustra o sistema. (a) (b) Figura 2.4 - (a) Corte transversal em um FBPs e (b) escoamento dos esgotos e disposição do biofilme no meio suporte. Fonte: Chernicharo, 2007. O meio de suporte empregado no filtro é fator determinante para sua eficiência. Os materiais usados como meio suporte apresentam como características a elevada área superficial por unidade de volume, baixo custo, elevada durabilidade e porosidade. Desde a década de 60, o material mais difundido para ser empregado como meio de suporte é a pedra britada e a escória de alto forno. Contudo após 1960 um esforço direcionado no desenvolvimento de materiais que otimizariam as características dos meios de suporte resultou no surgimento de materiais plásticos, principalmente os anéis plásticos 12 randômicos e blocos cross-flow (Tchobanoglous et al., 2003). A Figura 2.5 ilustra diversos meios de suporte utilizados nos filtros biológicos percoladores. A B C DB Figura 2.5 - (a) Escória de alto-forno; (b) Donwflow Hanging Sponge; (c) Bloco crossflow 45° e (d) Pedra britada. Fonte: Tavares (2008). 2.3.Impacto Ambiental Causado por Micropoluentes no Sistema de Esgoto Doméstico O esgoto doméstico é constituído principalmente por matéria orgânica biodegradável originária de alimentos (proteínas, carboidratos e lipídeos) – que representa de 60% a 80% da DQO total do esgoto bruto. Os detergentes e sabões também são importantes e estão presentes em concentrações que variam de 7 a 12 mg/L de LAS, representando de 4 a 6% da DQO filtrada do esgoto. Contudo o esgoto contém ainda uma diversidade de outros contaminantes orgânicos, presentes em menores concentrações, como resíduos de fármacos excretados, e ingredientes provenientes de produtos de limpeza e de higiene pessoal. A caracterização desses micropoluentes, é um assunto de interesse em todo o mundo, e mobiliza vários grupos de pesquisa a se empenharem em identificar e quantificar essas substâncias. Nas últimas décadas, a análise de poluentes ambientais esteve focada apenas nos contaminantes majoritários, ou seja, substâncias amplamente conhecidas por suas características de persistência no meio ambiente, bioacumulação e toxicidade e que são definidas pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (US-EPA) como POP’s - poluentes orgânicos persistentes. Recentemente, os micropoluentes têm ganhado a 13 atenção da comunidade científica, pelos prejuízos que causam ou podem causar ao bem estar do homem e ao meio ambiente (Ghiselli, 2006). Uma vez que a remoção desses micropoluentes não é completa nos sistemas de tratamento, eles atingem os corpos receptores, acarretando diversos problemas ambientais. Além da contaminação dos recursos hídricos, microorganismos patógenos, como bactérias, podem adquirir resistência a fármacos –principalmente antibióticos– com os quais entram em contato no meio ambiente, através de alterações e adaptações de seu material genético. Quando utilizado para a eliminação do patógeno em um organismo, a eficiência do medicamento será reduzida. Outro grupo de substâncias que merece atenção especial são os estrogênios: substâncias que apresentam potencial de afetar adversamente o sistema reprodutivo de organismos aquáticos, como por exemplo, a feminização de peixes machos que habitam rios contaminados com efluentes de ETEs (Billa e Dezotti, 2003; Moreira, 2008). Outras substâncias atraem a atenção pela similaridade de sua estrutura química com a de substâncias reconhecidamente perigosas, ou pela possibilidade da conversão delas em compostos tóxicos. O triclosan, agente microbicida presente em xampus, dentifrícios e outros itens de higiene pessoal, é um policlorofenoxifenol, de estrutura semelhante a dioxinas e dibenzofuranos, que é associado a efeitos tóxicos em algas e é apontado por alguns pesquisadores como precursor da formação de várias dioxinas no meio ambiente (Agüera et al., 2003, Kanetoshi et al., 1988). A preocupação com microcontaminantes presentes no esgoto doméstico, provenientes das mais diversas fontes, têm crescido bastante, tendo em vista o número de trabalhos publicados em todo o mundo, sobre o assunto. A comunidade científica atual tem se inclinado, cada vez mais, para o desenvolvimento de métodos analíticos suficientemente sensíveis, com limites de detecção na ordem de μg/L e ng/L, que permitam o monitoramento da presença desses contaminantes em amostras de águas e efluentes. Os efeitos que essas substâncias, e tantas outras em potencial, podem causar no meio ambiente ainda é um assunto controverso, que necessita de estudos mais detalhados. Com o desenvolvimento e aprimoramento de técnicas analíticas mais sensíveis e especificas, estão sendo dados grandes passos para a melhor compreensão destas substâncias e seus impactos ao meio ambiente. 14 Nessa seção é mostrado como substâncias antropogênicas, sintetizadas com o objetivo geral de melhorar a qualidade de vida, atingem o meio ambiente, principalmente o meio aquático, e os efeitos nocivos que a presença deles causa ou pode causar para a sociedade e o meio ambiente. 2.3.1. Produtos de Limpeza e Higiene Pessoal Produtos de limpeza, como detergentes, sabões e desinfetantes, contêm em suas formulações, centenas de diferentes substâncias, como agentes tensoativos, fragrâncias e microbicidas. Ao serem usados, chegam à rede coletora de esgotos, pela qual atingem as ETEs. Os mecanismos de degradação que aí ocorrem não são, em geral, eficientes na mineralização desses compostos, o que resulta na presença deles, bem como seus produtos de degradação, nos corpos receptores. No Brasil e em outros países em desenvolvimento, ainda há o agravante da emissão de esgotos domésticos e industriais em águas superficiais sem qualquer tratamento. Recentemente, a classe de micropoluentes comumente chamados de perturbadores endócrinos, disruptores endócrinos ou ainda agentes hormonalmente ativos, tem ganhado a atenção da comunidade científica, pelos prejuízos que causam ou podem causar para o bem estar do homem e do meio ambiente (Ghiselli, 2006). No caso do esgoto doméstico, as principais fontes desses micropoluentes são os fármacos e produtos da degradação de alguns ingredientes de produtos de limpeza. Como exemplo, os tensoativos alquilfenóis etoxilados (APEOs), presentes em vários produtos de limpeza de uso doméstico, sofrem biodegradação nas ETEs ou no meio aquático, dando origem a compostos como o 4nonilfenol e o 4-octilfenol, os quais apresentam estruturas químicas características capazes de interferir nos sistemas endócrinos de alguns animais (ex. peixes e anfíbios) (Moreira, 2008). Dos constituintes de produtos de limpeza os mais importantes são os agentes tensoativos ou surfactantes. Tais compostos apresentam uma parte hidrofílica e outra hidrofóbica, conferindo, de forma simultânea, afinidade por gorduras e pela água. Essa classe de compostos orgânicos é, em todo mundo, uma das mais sintetizadas, e está presente em vários produtos rotineiramente usados nos lares, como detergentes, sabões e afins. Na indústria, os tensoativos são empregados no processamento de têxteis, mineração, flotação, 15 produção de petróleo, tintas e plásticos, processamento do couro e na agricultura (González et al., 2004). Também são amplamente empregados em produtos com funções higiênicas de cunho doméstico (Tavares, 2008). Os surfactantes sintéticos podem ser classificados em aniônicos, catiônicos, não-iônicos, de acordo com a carga suportada pela estrutura hidrofílica. No entanto, no âmbito ambiental, os mais importantes são os aniônicos e os não-iônicos. Um grupo de surfactante aniônico, os alquilbenzeno-sulfonados de cadeia linear (LAS), merece atenção especial. Essas substâncias estão presentes em amostras de água e solo, uma vez que são os surfactantes aniônicos mais amplamente utilizados - 41% do total de surfactantes aniônicos produzidos no mundo são LAS. (Gonzáles, 2004; Tavares, 2008). Em todo o mundo, o consumo de LAS passa das 3,0 milhões de toneladas anuais, das quais apenas para a América do Sul, se destinaram cerca de 9% desse montante (Tavares, 2008). A utilização do LAS em uma extensa gama de formulações está ligada às seguintes características: grande poder limpante; excelente solubilidade, mesmo em baixas temperaturas; elevado poder espumante; boa biodegradabilidade e baixo custo. Além de o LAS ser o principal ingrediente de formulações de detergentes e produtos de limpeza comerciais, ele também pode ser utilizado, em menor escala, na indústria como agente umectante (indústria têxtil); emulsificante (defensivos agrícolas, fluidos lubrificantes); e coletores (flotação de minerais) (Sánchez-Martinéz et al., 2005). O LAS pode ser definido como uma mistura de diferentes homólogos contendo de 10 a 13 carbonos em sua cadeia alquílica, os quais apresentam percentual de distribuição típico em formulações comerciais de 12,5%, 30%, 33,5% e 24% respectivamente para os homólogos de 10, 11, 12 e 13 carbonos (Tavares, 2008). A Figura 2.6 mostra a fórmula estrutural geral dos LAS. H3C n(H2C) H C (CH2)n' CH3 7≤ n+n’ ≤11 0≤ n,n’≤ 11 SO3- Figura 2.6 - Estrutura química generalizada dos LAS. 16 A remoção desse surfactante se inicia na rede coletora de esgotos, por ação metabólica dos microorganismos ativos no esgoto, adsorção em sólidos e precipitação, na forma de sais de cálcio. Cerca de 50% a 60% do LAS consumido nos domicílios pode ser degradado ainda na rede coletora, dependendo de sua extensão, tempo de residência e atividade dos microorganismos presentes. A digestão anaeróbia, principal mecanismo para o tratamento do lodo gerado em sistemas biológicos, não degrada eficientemente os LAS. Sendo assim, o lodo é uma importante fonte de contaminação ambiental por LAS, permanecendo estes, intactos no meio ambiente durante vários anos, quando tratados apenas anaerobiamente (Berna et al., 1988). Em condições aeróbias, a degradação dos LAS atinge eficiências da ordem de 90%. A degradação primária dos LAS ocorre a partir da substituição do grupo metila das extremidades da cadeia carbônica em um grupo carboxila (ω-oxidação). O composto gerado nesta etapa é um intermediário denominado sulfofenilcarboxilato. Esta molécula é oxidada de forma a promover o encurtamento da cadeia alquílica (β-oxidação), de maneira que o estágio final da degradação (biodegradação última) se procede com a dessulfonação e rompimento do anel aromático (Tavares, 2008). Os produtos finais serão oxidados a substâncias inorgânicas (Schöberl, 1989). A Figura 2.7 ilustra o mecanismo de degradação do C12-LAS. 17 Figura 2.7 - Etapas do processo de degradação aeróbica do C12-LAS. Fonte: Schöberl, 1989. Outro importante grupo de surfactantes são os alquilfenóis polietoxilados (APEOn). Encaixam-se, na classe dos surfactantes não-iônicos, e são amplamente utilizados em vários produtos de utilização comercial e industrial, como detergentes, emulsificantes, agentes dispersantes e solubilizantes (Chen et al., 2005). Essas substâncias interferem no funcionamento normal do sistema endócrino de seres humanos e animais. Conforme salienta Beck et al., (2005), mesmo em baixas concentrações, da ordem de nanogramas por 18 litro, alguns subprodutos da degradação de surfactantes podem promover a hermafroditização de peixes e anfíbios, além de diminuição da capacidade de reprodução e potencial indução de câncer de próstata e mama em seres humanos (Nimrod e Benson, 1996). Apesar de os APEOn serem biodegradáveis, os efluentes das estações de tratamento de esgoto ainda são a principal fonte de contaminação ambiental pelos APEOn, uma vez que sua degradação é parcial e incompleta nos tempos de detenção hidráulica usualmente praticados (Langford et al., 2005). Na estação de tratamento de esgotos a remoção desses compostos surfactantes pode acontecer pela degradação, mas principalmente pela adsorção ao lodo. A Figura 2.8 apresenta um mecanismo proposto para a degradação desses surfactantes. Figura 2.8 - Mecanismo proposto para a degradação dos APEOn. Fonte: Langford et al., 2005. Dentro do sistema de tratamento biológico, em condições aeróbias, ocorre a diminuição da cadeia polietoxilada por oxidação biológica dos APEOn, uma vez que esses grupos 19 apresentam mais carbonos disponíveis do que os grupos alquila, se tornando, então importantes fontes nutricionais para as bactérias. Sendo assim, a degradação desses compostos ocorre em duas etapas: a inicial diminuição da cadeia polietoxilada, o que resulta em intermediários recalcitrantes, como os alquilfenóis mono e dietoxilados, alquilfenóis mono e dicarboxilados e alquilfenóis (Eljertsson et al., 1999), e uma etapa final, que resulta na completa mineralização das substâncias. Essa última etapa ocorre lentamente, devido à presença do anel benzênico e do grupo alquila, à baixa solubilidade em água e à necessidade de enzimas ou população microbiana específicas (Langford et al., 2005). Destaillats et al. (2000) apud Chen et al. (2005) explicam que é possível degradar os APEOn no ambiente aquático, com o uso de radiações de freqüência na faixa de 20 kHz a 1000 kHz, o que levaria ao rompimento da cadeia etoxilada (EO), bem como do anel aromático. Radicais H e OH, gerados pela dissociação térmica de bolhas, reagem com os surfactantes-alvo, degradando-os. Entretanto tal técnica requer equipamentos sofisticados e de alto custo, bem como procedimentos operacionais complexos, inviabilizando esse tipo de tratamento (Ying et al., 2002). Os produtos carboxilados de degradação dos alquilfenóis polietoxilados (CAPECs), que contém de cinco a oito átomos de carbono no grupo alquila, são metabólitos presentes em grande concentração no ambiente aquático, uma vez que se mostram persistentes aos tratamentos. Segundo Ding et al., (1998) e Corcia et al., (1998) tais compostos permanecem por até cinco meses após sua geração (degradação dos nonilfenóis polietoxilados) e contabilizam entre 60% e 63% do total de produtos de degradação presentes em corpos receptores de descarte de estações de tratamento de efluentes. Da classe dos CAPECs, são mais comuns os carboxialquilfenóis mono e dietoxicarboxilados (respectivamente CAP1ECs e CAP2ECs). A Figura 2.9 ilustra a estrutura do ácido 4-(4’carboxi-2’-metil-2’-butil) fenoxiacético, de cinco átomos de carbono no grupo alquila (CA5P1EC). Figura 2.9 - Estrutura química do CA5P1EC. Fonte: Hoai et al., 2004. 20 Produtos de higiene pessoal de uso diário, como sabonetes, perfumes, dentifrícios e cosméticos, contêm, em suas formulações, diversas substâncias químicas. Fragrâncias, desinfetantes, fungicidas e essências, dentre tantas outras, apresentam características bioativas e, quando descartadas no sistema coletor de esgoto doméstico, são transportadas às estações de tratamento de efluente. Durante o tratamento, vários deles não são mineralizados, ou sofrem degradação parcial e são eliminados em corpos receptores, fazendo com que estejam presentes no ambiente, ainda que em baixas concentrações. O triclosan (2,4,4’-tricloro-2’-hidroxidifenil éter) é um composto muito usado como agente antimicrobiano na fabricação de dentifrícios, xampus, sabonetes e cosméticos. Estruturalmente, se agrupa na classe dos policlorofenoxifenóis, apresentando estrutura similar (Figura 2.10) às dibenzo-p-dioxinas policloradas (PCDDs) e dibenzofuranos policlorados (PCDFs), compostos reconhecidos por apresentarem toxicidade. Segundo Kanetoshi et al. (1988), o triclosan pode ser considerado um dos precursores de PCDDs, e Orvos et al. (2002) se referem a esse composto como tóxico para algas. Outro antimicrobiano de aplicação diversificada é o bifenilol, usado na confecção de desinfetantes, fungicidas, preservativos, e intermediário para a fabricação de corantes. Segundo Agüera et al. (2003), o triclosan e o bifenilol podem sofrer ação da radiação ou calor, e serem conseqüentemente convertidos em dioxinas e bisfenóis policlorados hidroxilados (OH-PCBs), substâncias que apresentam alto grau de toxicidade. A Figura 2.10 apresenta uma proposição de reação de síntese de compostos tóxicos a partir do triclosan, mostrando a semelhança estrutural entre o bifenilol e os OH-PCBs: 21 Cl Cl Cl O HO O Triclosan Cl O Cl /h Cl O Cl O Cl Cl O Cl Cl O Cl Dioxinas OH OH n(Cl) Bif enilol (Cl)n PCBs Figura 2.10 - Formação de dioxinas a partir do triclosan, e a semelhança estrutural entre o bifenilol e os PCBs. (Fonte: Agüera et al., 2005). 2.3.2. Fármacos A preocupação com a presença de fármacos no meio ambiente tem se tornado cada vez maior. Várias classes de drogas, receitadas ou não pelos profissionais da área de saúde, incluindo antiinflamatórios, antiepilépticos, ß-bloqueadores e antibióticos são despejados nos sistemas de tratamento de esgotos dos centros urbanos, via excreção humana, via processos de manufatura da indústria farmacêutica e também via disposição de produtos não usados ou com o prazo de validade expirado (Petrovic et al., 2006). A degradação desses fármacos é, muitas vezes, incompleta e ineficiente, e os efluentes são lançados nos corpos receptores, contaminando o meio ambiente aquático. Como exemplos de drogas comumente encontradas no meio-ambiente podem ser citados o diclofenaco, fluoxetina e claritromicina, usados como analgésico, antidepressivo e antibiótico, respectivamente. A presença dessas substâncias causa sérios impactos no ambiente natural e nos organismos em que nele vivem. Como essas drogas são substâncias biologicamente ativas, a presença dos mesmos no ambiente aquático significa um grande 22 risco para a saúde humana, vegetal e animal (Lee et al., 2005). A Figura 2.11 mostra as principais maneiras pelas quais fármacos podem contaminar o meio ambiente, desde sua produção/aplicação até a estação de tratamento de água. Figura 2.11 - Principais rotas de fármacos no meio ambiente. Fonte: Billa e Dezzoti, 2003. Vasskog et al. (2006) mostram dados do consumo de antidepressivos, drogas que se apresentam em concentrações cada vez maiores nos sistemas de tratamento. Na Noruega, o consumo dessas substâncias aumentou em 320% na última década, crescimento esse que também é percebido em toda a Europa. Juntamente com o aumento na utilização dessas drogas, aumentou também o interesse em métodos analíticos focados na análise delas, principalmente em amostras biológicas como sangue, urina e cabelos. Apesar dos efeitos à saúde provocados pelo consumo de fármacos via ingestão de água potável contaminada ainda não estarem completamente elucidados, o princípio da precaução estabelece que tais substâncias devam estar ausentes da água distribuída para a população (Kimura et al., 2004). A exposição de seres a contraceptivos lançados em corpos receptores gera anomalias e deterioração em seus sistemas reprodutivos, até mesmo a feminização de peixes machos (Damstra et al., 2002). Folmar et al. (2000) relatam que, 23 dependendo do tempo e dose que foram expostos, essas substâncias promovem câncer de mama, testículo e próstata, ovários policísticos, redução da fertilidade masculina e alterações na produção de ovos. Jørgensen et al. (2000) relatam que a presença dos antibióticos no meio ambiente promove a resistência bacteriana às próprias drogas, principalmente quando expostas a baixas concentrações e durante tempo prolongado. Diversos estudos foram conduzidos e constataram o desenvolvimento de colônias bacterianas resistentes a antibióticos em hospitais (Kolár et al., 2001), águas de subsolo (Mckeon et al., 1995) e sedimentos marinhos (Wu, 1995). 2.4. Monitoramento de Micropoluentes em Sistemas de Tratamento de Esgotos O que se pretende nessa seção é apresentar estudos realizados por diferentes grupos de pesquisa relacionados ao monitoramento de microcontaminantes em sistemas de tratamento de esgoto sanitário. A maioria desses estudos não apresenta dados fundamentais a respeito das condições operacionais das plantas de tratamento de esgoto, o que dificulta uma análise crítica sobre as eficiências de remoção dos micropoluentes. Quando citadas, tais condições de operação foram incluídas nessa revisão. Todos os estudos aqui revisados mostram a crescente preocupação internacional com os níveis de micropoluentes, bem como o efeito prejudicial causado pela presença deles no meio ambiente. Com isso, pode ser percebida a importância de diferentes técnicas cromatográficas acopladas à espectrometria de massas para o rastreamento dessas substâncias em águas residuárias domésticas e outros compartimentos ambientais. Entretanto, essas técnicas devem ser aprimoradas e adaptadas, para que os micropoluentes já conhecidos possam ser detectados, cada vez mais, em menores concentrações, bem como auxiliar na elucidação de diversas outras substâncias desconhecidas, que possam apresentar algum potencial poluidor. 2.4.1. Produtos de Limpeza e Higiene Pessoal González et al. (2004), por meio de técnicas de extração e cromatografia, puderam constatar a presença de surfactantes e compostos hormonalmente ativos em alta concentração, em águas residuárias brutas e tratadas de diversas estações de tratamento de 24 esgoto, e em sedimentos e águas marinhas, na região da Catalunha, nordeste da Espanha, onde existem, além da contribuição do esgoto doméstico, várias indústrias responsáveis pelos despejos de surfactantes, como indústrias têxteis e curtumes. Os compostos estudados foram: alquil benzeno sulfonados de cadeia linear (LAS), dietanol amidas de cocos (CDEAs), nonilfenóis etoxilatos, nonilfenóis carboxilados (NPECs), e seus produtos de degradação, quer sejam, 4-nonilfenol (NP) e 4-octilfenol (OP). A pesquisa utilizou cartuchos de extração em fase sólida para o isolamento e concentração das substâncias, bem como a técnica de HPLC-MS, a qual, para a detecção de LAS, NPECs, NP e OP foi realizada sob condições de ionização negativa, enquanto que para a detecção de nonilfenóis polietoxilados (NPEOs), sob condições de ionização positiva. Os resultados mostraram que no esgoto bruto, as concentrações de NPEOs variaram na faixa de 60 a 190 μg/L, ao passo que nos efluentes, essa concentração reduziu-se para a faixa de 2,8μg/L a 6,6μg/L, o que corresponde à uma eliminação primária de, aproximadamente, 95%. O NP foi encontrado, no esgoto bruto, em concentrações que variaram de 0,2μg/L a 18μg/L, sendo que no efluente tratado a concentração média foi de 5μg/L. A eliminação de LAS e CDEAs variou de acordo com a estação de tratamento estudada. Em uma das ETEs, que contava com tratamento secundário biológico, o nível de remoção superou os 85%, ao passo que foi de apenas 56% (para CDEAs) a 30% (para LAS) em estações de tratamento de efluentes que contavam apenas com o tratamento primário (decantação). LEE et al. (2005), utilizaram extração em fase sólida seguida por GC-MS na busca de vários micropoluentes em afluentes e efluentes de estações de tratamento de esgoto do Canadá. Nas estações monitoradas o NP estava presente no afluente na faixa de 2,7μg/L a 25μg/L, ao passo que no efluente a faixa de concentração era de 0,32μg/L a 3,21μg/L. Outros poluentes encontrados foram o octilfenol (OP), o bisfenol A (BPA) e o triclosan (TCS), presentes nos afluentes em concentrações médias de 3,08μg/L, 1,28μg/L e 1,35μg/L, respectivamente, bem como no efluente, em concentrações médias iguais à 0,06μg/L, 0,18μg/L e 0,14μg/L, respectivamente. Lee et al. (2005) também detectaram o npropil parabeno, em concentrações médias de 0,73μg/L e 0,01μg/L, nos afluente e efluente, respectivamente. Essa substância, que faz parte da formulação de cosméticos e conservantes, apresenta atividade estrogênica, e é suspeita de causar câncer de mama. 25 Um desinfetante comumente utilizado em hospitais, lavanderias e usinas de processamento de alimentos, o 2-fenilfenol, também foi detectado por LEE et al. (2005), nas amostras de afluente (concentração média de 2,58μg/L) e efluente (concentração média igual a 0,05 μg/L). Agüera et al. (2003) desenvolveram métodos cromatográficos para a identificação e quantificação de triclosan e bifenilol em águas residuárias municipais, lodos de sistemas de tratamento e sedimentos marinhos. Esses compostos são anti-sépticos, caracterizados pela elevada toxicidade a bactérias, usados na agricultura, indústria e nos lares. Os compostosalvo das amostras foram concentrados por extração em fase sólida e analisados por HPLCMS, equipado com um analisador Ion Trap e ionização no modo negativo. Além disso, os autores usaram um GC-MS em dois diferentes modos de operação: ionização por elétron (GC-EI-MS) e ionização química negativa (GC-NCI-MS), a qual usava metano como gás reagente. Ambas técnicas puderam detectar os poluentes em níveis de ppb (μg/L), e que a técnica de GC-NCI-MS mostrou-se mais eficiente para a quantificação do triclosan, uma vez que foi possível detectá-lo em níveis de ppt (ng/L). Foi determinada a presença de triclosan na faixa de 0,8 a 37,8 μg/L nas águas residuárias estudadas, ao passo que não foi percebida a presença de bifenilol nas amostras estudadas. O comportamento dos almíscares sintéticos galaxolida e tonalida, substâncias utilizadas na fabricação de perfumes como fragrâncias e fixadores, foi avaliado em diferentes sistemas de tratamento por Carballa et al. (2004, 2005 e 2007). Testes de remoção por coagulaçãofloculação mostraram eficiência entre 50% e 70%, e por flotação, de 35% a 60%. Os compostos foram monitorados em uma estação de tratamento de efluentes, onde já nos tratamentos primários (coagulação-floculação e flotação), foram removidos com eficiência na faixa de 30% a 50%, respectivamente. A eficiência de remoção total desses compostos chegou a 90%, após passarem por um reator de digestão anaeróbia. 2.4.2. Fármacos Lee et al. (2005) analisaram os fármacos, ibuprofeno, ácido salicílico, gemfibrozil, naproxeno, cetoprofeno, diclofenaco e indometacina, por GC-MS, em sistema de tratamento de esgotos do Canadá. As amostras eram derivatizadas pela reação com ácido pentafluoropropionil, após passarem pelo processo de extração em fase sólida. Estas 26 substâncias foram consistentemente detectadas por GC-MS nos afluentes e efluentes amostrados, em concentrações que variaram de 3 a 7μg/L. Kimura et al. (2004) examinaram, em diversos reatores aeróbio de membrana submersa (MBR), operados em escala piloto, seis fármacos, dentre eles o ibuprofeno e o diclofenaco, substâncias usadas no combate à febre e no alivio de dores. A detecção foi feita por GC/MS após os compostos serem extraídos em cartuchos em fase sólida e derivatizados com brometo de pentafluorobenzila. Os autores concluíram que o ibuprofeno foi facilmente removido no reator aeróbio de membranas uma vez que a concentração do mesmo foi reduzida de várias centenas de ng/L a aproximadamente 10ng/L, em um tempo de detenção hidráulica (TDH) de nove horas, aproximadamente. Esses dados mostram que o ibuprofeno está presente em grandes concentrações, mas que é prontamente biodegradável, ao passo que o diclofenaco foi de mais difícil degradação. Resultados semelhantes, que atestam a persistência do diclofenaco em outros sistemas de tratamento biológicos de águas residuárias, foram relatados por Buser et al., (1998a) e por Zwiener et al., (2000). Outro estudo realizado no mesmo tipo de reator biológico foi o de Radjenovic et al. (2007), que compararam a eficiência de dois reatores aeróbios diferentes na remoção de diversos fármacos. Os autores estudaram um reator aeróbio de membrana submersa (MBR), em escala de laboratório, e um sistema de lodos ativados (CAS) da estação de tratamento Rubi, localizada na região da Catalunha, Espanha. A referida estação, que recebe efluentes domésticos, industriais e hospitalares, conta com tratamento preliminar (desarenador e gradeamento), primário (decantação) e secundário (biológico). As amostras coletadas do sistema real e de bancada foram concentradas pelo processo de extração em fase sólida e analisadas por HPLC-MS, o qual contava com um espectrômetro de massas do tipo triplo quadrupolo, equipado com interface do tipo electronspray, sendo a análise realizada nos modos de ionização positivo e negativo. Os resultados revelaram a presença de 22 dos 31 fármacos pesquisados no afluente da estação. Os fármacos encontrados em maior concentração (faixa de μg/L) foram os analgésicos e antiinflamatórios (naproxeno, ibuprofeno, cetoprofeno, diclofenaco, e acetaminofeno), os reguladores de lipídeos (gemfibrozil e bezafibrato), o β-bloqueador atenolol, e o diurético hidroclorotiazida. Os autores concluíram que o MBR, no geral, degrada os fármacos detectados com maior 27 eficiência, e que algumas dessas substâncias, como a carbazepina, passaram incólumes por ambos os sistemas de tratamento. Petrovic et al. (2006) desenvolveram uma técnica de cromatografia líquida de ultraperformance (UPLC) acoplada à detectores de espectrometria de massas (quadrupole e time-of-flight - Q-TOF-MS), os quais possibilitaram a varredura e confirmação de vinte e nove padrões de fármacos de diversas classes, como analgésicos e antiinflamatórios, drogas psiquiátricas e agentes anti-úlceras, em efluentes de estações de tratamento de esgotos. A análise de amostras reais de estações de tratamento de esgoto pela metodologia desenvolvida encontrou resíduos de fármacos, como diclofenaco (0,25µg/L no afluente e 0,32µg/L no efluente), acetaminofeno (5,4 µg/L no afluente e 2,1 µg/L no efluente) e cetoprofeno (0,23 µg/L no afluente e 0,20 µg/L no efluente), dentre outros. Huerta-Fontela et al. (2007) também utilizaram cromatografia líquida de ultra performance (UPLC-MS-MS) para a análise simultânea de quinze drogas estimulantes em águas, dentre elas cocaína, compostos relacionados à anfetamina, LSD, nicotina e cafeína. A análise de amostras reais, coletadas em diversas estações de tratamento de efluentes situadas no nordeste da Espanha, revelou a presença, tanto nos afluentes quanto nos efluentes, de cocaína e seus metabólitos, MDMA (“ecstasy”), e anfetamina. A cocaína, juntamente com seu metabólito benzoilegonina, foi encontrada em 85% das amostras de afluentes e em 69% de efluentes. Outras drogas controladas, como o MDMA, foram encontradas em 30% dos afluentes e 23% dos efluentes, e os resultados mostraram que a eficiência de remoção do MDMA foi de apenas 15%. As substâncias não-controladas (nicotina, cafeína, e seus respectivos metabólitos) foram encontradas em todas as amostras, e os autores salientam que essas drogas são um importante problema ambiental nos centros urbanos. Vasskog et al. (2006) utilizaram extrações em fase sólida (cartucho de estireno e divinilbenzeno) e líquido-líquido (pentano), seguidas de HPLC-MS (triplo quadrupolo, modo MRM, ionização por electronspray), e encontraram cinco drogas antidepressivas (citalopram, paroxetina, sertralina, fluvoxamina e fluoxetina) em concentrações que variaram de 0,5ng/L a 612ng/L, durante o monitoramento de uma estação de tratamento de efluentes em Tromsø, Noruega. A eficiência de remoção das drogas foi, em média, igual a 49%. 28 Bruchet et al. (2002) identificaram mais de 240 diferentes substâncias presentes em águas residuárias brutas e já tratadas. Dentre elas, foram encontradas, através de GC-MS, drogas como a nicotina e cafeína, ftalatos (empregados como plastificantes) e etinil estradiol (hormônio sintético presente em contraceptivos). A planta estudada conta com os seguintes tratamentos: gradeamento e caixa de areia, decantamento primário, lodos ativados e clarificação final. Os autores relatam que no geral, a estação apresenta boa eficiência de remoção dos micropoluentes e, somado ao efeito de diluição do corpo receptor, não é observado o efeito deteriorativo ambiental. Destacam-se as eficiências de remoção do hormônio 17β-estradiol (70%), da cafeína (99,5%) e estrona (60%). Por outro lado, alguns compostos, como a nicotina, não foram removidos. Segura et al. (2007) utilizaram a técnica de HPLC-MS-MS (triplo quadrupolo) para a quantificação de seis antiinflamatórios (sulfametoxazol (SMX), trimetoprim (TRI), ciprofloxacina (CIP), levofloxacina (LEV), azitromicina (AZI) e claritromicina (CLA)) nos afluentes e efluentes da estação de tratamento de esgotos de Montreal, Canadá, a qual trata o efluente doméstico correspondente a uma população de 1,8 milhões de habitantes. A estação, a maior planta de tratamento primário da América do Norte, conta com gradeamento, coagulação e sedimentação dos sólidos suspensos. Os autores fizeram as etapas de concentração das amostras e clean-up pela técnica de extração em fase sólida seguida de análise em HPLC-MS pela técnica de electronspray em modo positivo. O resultado das análises mostrou a presença de todos os compostos-alvo, tanto no afluente como no efluente da estação de tratamento, com destaque para a CLA, a qual apresentou uma concentração no efluente igual a 263ng/L (remoção de apenas 42,1%). Em relação aos outros compostos, os que apresentaram maior remoção foram a CIP (66,6%) e a LEV (60,0%) e o SMX (52,9%). Os demais compostos apresentam remoção inferior a 50%. Yang et al. (2006) utilizaram um espectrômetro de massas do tipo ion trap (IT) com ionização por electronspray (ESI) em modo positivo para quantificar em amostras de esgoto os antibióticos anidroeritromicina (ETM) e tilosina (TLS). A amostragem foi feita nas estações de tratamento de esgotos de Drake (DWRF) e de Mulberry (MWRF), ambas localizadas nos Estados Unidos. A primeira trata aproximadamente 50.000 m3/d enquanto a segunda trata 9.600 m3/d de esgoto sanitário e industrial. Em ambas estão presentes as etapas de pré-tratamento e clarificações primária, intermediária e secundária (processo de 29 lodos ativos). O sistema DWRF apresenta o processo de cloração, enquanto que no sistema MWRF, o processo de desinfecção dos esgotos tratados é feito por radiação ultravioleta. As amostras foram concentradas por extração em fase sólida e os resultados mostraram a presença de ETM e TLS nos afluentes e efluentes de ambas as estações, com exceção da tilosina, a qual não foi detectada no efluente da estação MWRF. Considerando as concentrações médias, a remoção de ETM e TLS no sistema de lodos ativados foi de 66% e 72% para os sistemas ETM e TLS, respectivamente. Considerando-se o pós-tratamento por oxidação, observou-se que os processos de cloração e de radiação ultravioleta apresentaram eficiências de remoção semelhantes, de 50 a 56%. Um trabalho realizado em dez estações de tratamento de esgoto do Rio de Janeiro (Stumpf et al., 1999) demonstra a detecção de reguladores de lipídeos, antiinflamatórios e metabólitos de fármacos nos esgotos brutos e tratados. Alguns dos fármacos estudados foram os ácidos acetilsalicílico, clorifíbrico e fenofíbrico; e os antiinflamatórios ibuprofeno, diclofenaco, cetoprofeno, naproxeno, indometacina e cetoprofeno. As análises das amostras foram feitas por GC-MS, após as etapas de extração em fase sólida (cartuchos C-18) e derivatização. Os resultados mostraram que a eficiência de remoção para compostos individuais variou de 12% a 90%, e que as concentrações das drogas nos efluentes variaram de 0,1 µg/L a 1 µg/L. A eficiência de remoção de alguns fármacos presentes em lodo de sistemas de tratamento anaeróbio foi avaliado por Carballa et al. (2007). Os autores estudaram a influência da temperatura e do tempo de detenção do lodo, para os seguintes compostos: carbamazepina (anti-epiléptico); ibuprofeno, naproxeno e diclofenaco (antiinflamatórios); sulfametoxazol e roxitromicina (antibióticos); iopromida (meio de contraste para raios-x); e estrona, 17βestradiol e 17α-etinilestradiol (estrógenos). A pesquisa mostrou que o tratamento anaeróbio apresentou elevada eficiência na remoção de antibióticos, estrógenos e do antiinflamatório naproxeno. A eficiência de remoção dos demais antiinflamatórios e do meio de contraste situou-se na faixa de 20% a 60%, ao passo que o anti-epiléptico carbamazepina não foi removido durante o tratamento. Os autores verificaram ainda que, de forma geral, a remoção dos compostos não foi afetada pela temperatura ou pela idade do lodo no reator anaeróbio. 30 O processo de degradação desses mesmos compostos foi analisado por Carballa et al. (2004) ao longo de um sistema de tratamento na região da Galícia (noroeste da Espanha). O tratamento primário removeu parcialmente o 17β-estradiol (eficiência de 20%), enquanto que o tratamento aeróbio (lodos ativados) promoveu uma importante remoção de todos os compostos (entre 35% e 75%), com a exceção da iopromida. A concentração de estrona aumentou ao longo do tratamento, por causa da oxidação parcial do 17β-estradiol nos tanques de aeração. Carballa et al. (2005) também avaliaram a eficiência na remoção de alguns fármacos pelos processos de coagulação-sedimentação e flotação. A eficiência de remoção do diclofenaco (composto altamente lipofílico) se mostrou próxima a 60% nos ensaios de coagulação-sedimentação, e independente da temperatura do sistema, da dose ou do tipo de coagulante usado. Entretanto a remoção dos compostos hidrofílicos (diazepan e naproxeno) foi maior que 75% e se mostrou dependente desses parâmetros. A carbamazepina (composto neutro, que combate a epilepsia) e ibuprofeno (antiinflamatório de características ácidas) não foram removidos em quaisquer condições. Os ensaios de flotação mostraram remoção de diazepan próximas a 50%, de diclofenaco na faixa de 20% a 45%, e com menor eficiência, a remoção de carbamazepina (20% a 35%), ibuprofeno (10% a 25%) e naproxeno (10% a 30%). As maiores eficiências de remoção dos compostos estudados foram obtidas na temperatura de 25°C, e a remoção de compostos neutros se mostrou maior em amostras com alto teor de lipídeos. Ternes (1998) investigou a ocorrência de resíduos de drogas (antiepilépticos, betabloqueadores e outras usadas em tratamentos psiquiátricos) em estações de tratamento de esgotos da Alemanha. Foram coletadas amostras de 49 estações de tratamento de esgoto, todas as quais contavam com os seguintes tratamentos: clarificação primária, aeração com adição de cloreto ferroso e clarificação secundária. Os dados mostram que a média de remoção das drogas superou os 60% mas que a remoção incompleta nos sistemas de tratamento, fez com que 80% das drogas fossem detectadas em pelo menos um efluente das 49 ETEs estudadas. As concentrações dos fármacos nos efluentes chegaram a 6,3μg/L (carbamazepina). O mesmo estudo verificou hormônio femininos como o 17-β estradiol (E2) e estrona (E1), encontrados nos afluentes em concentrações médias iguais a 0,009μg/L e 0,016μg/L, respectivamente. As concentrações médias do estradiol e da estrona encontradas no efluente foram, respectivamente, iguais a 0,002μg/L e 0,005μg/L. 31 A análise de artigos, publicados por vários grupos de pesquisa em todo o mundo, possibilitou a compilação das Tabelas 2.1 e 2.2. Nelas, encontram-se as concentrações de uma variedade de micropoluentes citados, nos afluente e efluente de sistemas de tratamento de esgoto, bem como a eficiência do tratamento na remoção dos mesmos. Conforme mostram as tabelas supracitadas, a maioria dos estudos não detalha os sistemas de tratamento ou as condições operacionais utilizados, o que dificulta a sistematização das informações, bem como uma análise crítica da eficiência em certo tipo de sistema em degradar determinado composto. A maior parte dos compostos relatados são oriundos de fármacos, destacando, pela alta concentração em esgoto bruto, o ibuprofeno (17,8μg/L), o acetaminofeno (18,0μg/L) e a cafeína (23,1μg/L), esta última presente também em bebidas como refrigerantes, café e chás. Dos contaminantes oriundos de produtos de limpeza destacam-se os LAS, os APEOs e os NPECs que estão presentes nos esgotos brutos em concentrações de 96ng/L a 453μg/L para o LAS, 1,68 μg/L a 14,6μg/L para os APEOs, e 84,12μg/L para os NPECs. 32 Tabela 2.1 - Remoção de substâncias presentes em produtos de limpeza e higiene pessoal por diferentes sistemas de tratamento. Substâncias Utilizadas em Produtos de Limpeza e Higiêne Pessoal Concentração Concentração Média Média no Afluente no Efluente da ETE da ETE % Remoção Tipo de Tratamento Referências 2-hidroximetoxibenzofenona (protetor solar) 1,6μg/L <0,1μg/L >93%% Lodos ativados Bruchet et al., 2002 Triclosan (agente microbiano) 17,95(2) 10,73(2) 40,20% Digestão aeróbia Agüera et al., 2003 Bifenilol (agente microbiano) Não detectado Não detectado Não disponível Digestão aeróbia Agüera et al., 2003 TCC (agente microbiano) 12±15ng/L 84±110ng/L 0% Não disponível Sapkota et al., 2006(1) DCC (agente microbiano) 0,4±0,7ng/L 1,2±1,8ng/L 0% Não disponível Sapkota et al., 2006(1) TetraCC (agente microbiano) Não detectado Não detectado Não disponível Não disponível Sapkota et al., 2006(1) Galaxolida (fragrância) Não disponível Não disponível 30% a 50% Tratamento primário Carballa et al., 2005 Tonalida (fragrância) Não disponível Não disponível 30% a 50% Tratamento primário Carballa et al., 2005 CDEA (dietanolamida de coco) 40,18μg/L 13,04μg/L 67,54% Primário e/ou secundário(3) Gonzáles et al. , 2004 1-Amostras coletadas de nove diferentes estações de tratamento; 2-Valor correspondente à média das concentrações de triclosan, nos meses de abril a julho de 2002; 3 - Seis diferentes ETEs, das quais uma conta apenas com tratamento físico-químico e as outras, possuem tratamento biológico secundário; 4 - Valores médios, correspondentes a oito diferentes estações de tratamento. 33 Tabela 2.1 - Remoção de substâncias presentes em produtos de limpeza e higiene pessoal por diferentes sistemas de tratamento (continuação). Substâncias Utilizadas em Produtos de Limpeza e Higiêne Pessoal LAS Nonilfenol NPEC NPEO Octilfenol Bisfenol A Concentração Concentração Média Média no Afluente no Efluente da ETE da ETE Não disponível 96ng/mL % Remoção Tipo de Tratamento Referências Não disponível Não disponível Sánchez-Martinez et al., 2005 453,2μg/L 144,8μg/L 68,05% Prim.e/ou secund.(3) Gonzáles et al. , 2004 6950μg/L 126μg/L 98,2% Lodos ativados Bruchet et al., 2002 (3) 1,68μg/L 0,65μg/L 61,31% Prim.e/ou secund. Gonzáles et al. , 2004 14,6μg/L(4) 0,70μg/L(4) 95,21% Não disponível Lee et al., 2005 84,12μg/L 37,73μg/L 55,15% Prim.e/ou secund.(3) Gonzáles et al. , 2004 27,3μg/L 9,96μg/L 63,52% Prim.e/ou secund.(3) Gonzáles et al. , 2004 1,02μg/L 1,06μg/L 0,00% Prim.e/ou secund.(3) Gonzáles et al. , 2004 3,8μg/L(4) 0,06μg/L(4) 98,42% Não disponível Lee et al., 2005 1,28μg/L(4) 0,18μg/L(4) 85,94% Não disponível Lee et al., 2005 3,0mg/L 1,5mg/L 50% Não disponível Dorn et al., 1987 Não disponível 4 μg/L Não disponível Não disponível Teurneau, 2004 1-Amostras coletadas de nove diferentes estações de tratamento; 2-Valor correspondente à média das concentrações de triclosan, nos meses de abril a julho de 2002; 3 - Seis diferentes ETEs, das quais uma conta apenas com tratamento físico-químico e as outras, possuem tratamento biológico secundário; 4 - Valores médios, correspondentes a oito diferentes estações de tratamento. 34 Tabela 2.2 - Remoção de fármacos e drogas por diferentes sistemas de tratamento de efluentes, reportada na literatura. Fármacos e Drogas 17αetinilestradiol 17β-estradiol Concentração Média no Afluente da ETE 0,005μg/L Concentração Média no Efluente da ETE Não disponível % Remoção Tipo de Tratamento Referências Não disponível Não disponível Ternes et al., 1999 Não disponível 0,001μg/L Não disponível Não disponível Ternes et al., 1999 Não disponível 0,009μg/L Não disponível Não disponível Ternes et al., 1999 <0,5ng/L a 10ng/L <0,2ng/L a 2,2ng/L 70,4% Não disponível Johnson et al., 2000 Não disponível 0,2ng/L a 7ng/L Não disponível Não disponível Desbrow et al., 1998 Não disponível 0,3ng/L a 1,7ng/L Não disponível Não disponível Baronti et al., 2000 4,5ng/L 0,015μg/L 2ng/L Não disponível 55,6% Não disponível Não disponível Não disponível Larsson et al., 1999 Ternes et al., 1999 Não disponível 0,06μg/L Não disponível Não disponível Ternes et al., 1999 0,021μg/L Não disponível Não disponível Não disponível Ternes et al., 1999 <0,5ng/L a 17ng/L <0,5ng/L a 7,0ng/L 54,5% Não disponível Johnson et al., 2000 Não disponível 2,7ng/L a 48ng/L Não disponível Não disponível Desbrow et al., 1998 1,1ng/L 0,5ng/L 54,5% Não disponível Larsson et al., 1999 0,010μg/L 0,003μg/L 70,0% Lodos ativados Bruchet et al., 2002 35 Tabela 2.2 - Remoção de fármacos e drogas por diferentes sistemas de tratamento de efluentes, reportada na literatura (continuação). Fármacos e Drogas Concentração Média no Afluente da ETE Concentração Média no Efluente da ETE % Remoção Tipo de Tratamento Referências 3,4metilenedioximetamfetamina ("ecstasy") 0,049μg/L 0,041μg/L 16,3% Não disponível Huerta-Fontela et al., 2007 3,4metilenedioxietamfeta mina (MDEA) 0,028μg/L Menor que limite de quantificação 100,0% Não disponível Huerta-Fontela et al., 2007 18,0μg/L 0,07μg/L / 0,29μg/L 99,6% / 98,4% MBR / lodos ativados Radjenovic et al., 2007 <0,05μg/L a 19,5μg/L (5,4μg/L) <0,05μg/L a 6,2μg/L (2,1μg/L) 61,1% Não Disponível 190g/dia 36,1g/dia 81% Clarificação primária, aeração com adição de cloreto ferroso e clarificação secundária 35ng/L 20ng/L / 05ng/L / 28ng/L 42,9% / 85,7% / 20% HMBR / CMBR / lodos ativados Kimura et al., 2004 0,11μg/L 0,03μg/L / 0,08μg/L 71,8% / 27,7% MBR / lodos ativados Radjenovic et al., 2007 1,00μg/L 0,85μg/L / 0,66μg/L 15% / 34% filtro biológico/lodos ativados 70g/dia 34,3g/dia 51% Clarificação primária, aeração com adição de cloreto ferroso e clarificação secundária Acetaminofeno Ácido acetilsalicílico Ácido Clorifíbrico Petrovic et al., 2006 Ternes, 1998 Stumpf et al., 1999 Ternes, 1998 36 Tabela 2.2 - Remoção de fármacos e drogas por diferentes sistemas de tratamento de efluentes, reportada na literatura (continuação). Fármacos e Drogas Ácido Fenofíbrico Concentração Média no Afluente da ETE 0,40μg/L Concentração Média no Efluente da ETE 0,38μg/L / 0,22μg/L 60g/dia % Remoção Tipo de Tratamento Referências 06% / 45% filtro biológico / lodos ativados Stumpf et al., 1999 21,6g/dia 64% Ternes, 1998 70ng/L 10ng/L / 20ng/L / 40ng/L 85,7% / 71,4% / 42,9% Clarificação primária, aeração com adição de cloreto ferroso e clarificação secundária HMBR / CMBR / lodos ativados 25,0ng/L 6,86μg/L 6,3ng/L / 17,65ng/L 0,14μg/L 74,8% / 29,4% 98% MBR / lodos ativados Não disponível Radjenovic et al., 2007 Lee et al., 2005 0,015μg/L 100,0% Não disponível 1,50μg/L Menor que o limite de quantificação 0,52μg/L / >1,35μg/L 65,5% / <10% MBR / lodos ativados Huerta-Fontela et al., 2007 Radjenovic et al., 2007 <0,05μg/L a 1,00μg/L (0,23μg/L) <0,05μg/L a 1,20μg/L (0,28μg/L) 0% Não disponível Petrovic et al., 2006 <0,07μg/L a 0,45μg/L (0,16μg/L) <0,07μg/L a 0,30μg/L (0,14μg/L) 12,5% Não disponível Petrovic et al., 2006 135ng/L 80,0ng/L 40,7% Segura et al., 2007 0,810μg/L 0,216μg/L 73,3% Gradeamento, coagulação e sedimentação Não disponível Ácido Mefenâmico Ácido Salicílico Amfetamina Atenolol Kimura et al., 2004 Azitromicina Benzoilegonina Huerta-Fontela et al., 2007 37 Tabela 2.2 - Remoção de fármacos e drogas por diferentes sistemas de tratamento de efluentes, reportada na literatura (continuação). Fármacos e Drogas Concentração Média no Afluente da ETE 21,6g/dia Concentração Média no Efluente da ETE 0,91g/dia / 11.15g/dia % Remoção Tipo de Tratamento Referências 95,8% / 48,4% MBR / lodos ativados Radjenovic et al., 2007 1,2μg/L 0,88μg/L / 0,6μg/L 27,0% / 50,0% filtro biológico/lodos ativados Stumpf et al., 1999 310g/dia 52,7g/dia 83% Clarificação primária, aeração com adição de cloreto ferroso e clarificação secundária Ternes, 1998 70,1μg/L 0,3μg/L 99,5% gradeamento e caixa de areia, decantamento primário, lodos ativados e clarificação final Bruchet et al., 2002 23,134μg/L 4,356μg/L 81,2% Não disponível 230ng/L 300ng/L / 250ng/L 0,0% / 0,0% MBR / lodos ativados Huerta-Fontela et al., 2007 Radjenovic et al., 2007 <0,10μg/L a 0,95μg/L (0,40μg/L) <0,10μg/L a 0,60μg/L (0,36μg/L) 10% Não Disponível Petrovic et al., 2006 120g/dia 111,6g/dia 7% Ternes, 1998 0,041μg/L 0,019μg/L 53,7% clarificação primária, aeração com adição de cloreto ferroso e clarificação secundária Não disponível Bezafibrato Cafeína Carbamazepina Cetamina Huerta-Fontela et al., 2007 38 Tabela 2.2 - Remoção de fármacos e drogas por diferentes sistemas de tratamento de efluentes, reportada na literatura (continuação). Fármacos e Drogas Concentração Média no Afluente da ETE 0,08μg/L Concentração Média no Efluente da ETE 0,05μg/L 320ng/L 10ng/L / 20ng/L / 290ng/L 1,8μg/L 0,15μg/L / 0,87μg/L 0,15μg/L a 0,96μg/L (0,23μg/L) 0,20μg/L a 0,75μg/L (0,20μg/L) 0,59μg/L 0,31μg/L / 0,18μg/L Ciprofloxacina 315ng/L Citalopram % Remoção Tipo de Tratamento 38% não disponível 96,9% / 93,8% / 9,38% HMBR / CMBR / lodos ativado Referências Lee et al., 2005 Kimura et al., 2004 91,9% / 51,5% MBR / lodos ativados 13,0% não disponível 47,5% / 69,5% filtro biológico/lodos ativados 105ng/L 66,6% gradeamento, coagulação e sedimentação Segura et al., 2007 256,7ng/L 151,1ng/L 41,1% não disponível Vasskog et al., 2006 Claritromicina 475ng/L 275ng/L 42,1% gradeamento, coagulação e sedimentação Segura et al., 2007 Cocaína 0,079μg/L 0,017μg/L 78,5% não disponível Huerta-Fontela et al., 2007 Diazepam Não disponível 0,033μg/L Não disponível não disponível Ternes et al., 2001 Cetoprofeno Radjenovic et al., 2007 Petrovic et al., 2006 Stumpf et al., 1999 39 Tabela 2.2 - Remoção de fármacos e drogas por diferentes sistemas de tratamento de efluentes, reportada na literatura (continuação). Fármacos e Drogas Diclofenaco Concentração Média no Afluente da ETE 0,17μg/L Concentração Média no Efluente da ETE 0,11μg/L 50ng/L % Remoção Tipo de Tratamento Referências 35% Não disponível Lee et al., 2005 40ng/L / 40ng/L / 70ng/L 20% / 20% / 0% HMBR / CMBR / lodos ativados Kimura et al., 2004 2,8μg/L 0,35μg/L / 1,4μg/L 87,4% / 50,1% MBR / lodos ativados Radjenovic et al., 2007 <0,05μg/L a 0,50μg/L (0,25μg/L) <0,05μg/L a 0,50μg/L (0,32μg/L) 0% Não disponível Petrovic et al., 2006 0,80μg/L 0,73μg/L / 0,20μg/L 09% / 75% Filtro biológico/lodos ativados Stumpf et al., 1999 Não disponível 200ng/L a 370ng/L Não disponível Não disponível Buser et al., 1998 100g/dia 31g/dia 69% Ternes, 1998 150ng/L 49,1ng/L / 114ng/L 67,3% / 23,8% Clarificação primária, aeração com adição de cloreto ferroso e clarificação secundária MBR / lodos ativados Radjenovic et al., 2007 <0,10μg/L a 0,25μg/L (0,13μg/L) <0,10μg/L a 0,28μg/L (0,15μg/L) 0% Não Disponível Petrovic et al., 2006 0,09μg/L a 0,35μg/L (0,22μg/L) 0,04μg/L a 0,12μg/L (0,08μg/L) 63,6% Cloração ou UV Yang et al., 2006 Não disponível Não disponível 2,5μg/L 2ng/L a 4ng/L Não disponível Não disponível Não disponível Não disponível Hirsch et al., 1999 Xiao et al., 2001 24ng/L a 188ng/L 0,43ng/L a 18ng/L 91,3% Não disponível Baronti et al., 2000 Eritromicina Estriol 40 Tabela 2.2 - Remoção de fármacos e drogas por diferentes sistemas de tratamento de efluentes, reportada na literatura (continuação). Fármacos e Drogas Estrona Etinil estradiol Concentração Média no Afluente da ETE 0,04μg/L Concentração Média no Efluente da ETE Não disponível % Remoção Tipo de Tratamento Referências Não disponível Não disponível Ternes et al., 1999 0,027μg/L 0,009μg/L 66,7% Não disponível Ternes et al., 1999 Não disponível 0,003μg/L Não disponível Não disponível Ternes et al., 1999 <0,5ng/L a 38ng/L <0,5ng/L a 54ng/L 0% Não disponível Johnson et al., 2000 20ng/L a 132ng/L 2,5ng/L a 82,1ng/L 62,65% Não disponível Baronti et al., 2000 Não disponível 6,4ng/L a 29ng/L Não disponível Não disponível Xiao et al., 2001 5,8ng/L 0,5ng/L 91,4% Não disponível Larsson et al., 1999 0,020μg/L 0,0025μg/L 0,008μg/L 0,0014μg/L 60% 44% Lodos ativados Lodos ativados Bruchet et al., 2002 Bruchet et al., 2002 10g/dia 6,7g/dia 33,0% Ternes, 1998 1,37ng/L 0,83ng/L 39,4% Clarificação primária, aeração com adição de cloreto ferroso e clarificação secundária Não disponível Vasskog et al., 2006 2,23ng/L 0,26ng/L 88,3% Não disponível Vasskog et al., 2006 Fenazona Fluoxetina Fluvoxamina 41 Tabela 2.2 - Remoção de fármacos e drogas por diferentes sistemas de tratamento de efluentes, reportada na literatura (continuação). Fármacos e Drogas Gemfibrozil Glibenclamida Hidroclorotiazida Concentração Média no Afluente da ETE 0,26μg/L Concentração Média no Efluente da ETE 0,19μg/L 3,8μg/L % Remoção Tipo de Tratamento Referências 27,0% Não disponível Lee et al., 2005 0,4μg/L / 2,3μg/L 89,6% / 38,8% MBR / lodos ativados Radjenovic et al., 2007 0,37μg/L 0,31μg/L / 0,2μg/L 16,0% / 46,0% filtro biológico/lodos ativados Stumpf et al., 1999 50g/dia 15,5g/dia 69% Ternes, 1998 58,0ng/L 30,6ng/L / 32,2ng/L 47,3% / 44,5% Clarificação primária, aeração com adição de cloreto ferroso e clarificação secundária MBR / lodos ativados Radjenovic et al., 2007 6,50μg/L 2,19μg/L / 1,54μg/L 66,3% / 76,3% MBR / lodos ativados Radjenovic et al., 2007 6,77μg/L 0,310μg/L 95% Não disponível Lee et al., 2005 0,50μg/L 0,01μg/L / 0,01μg/L / 0,01μg/L 98% / 98% / 98% HMBR / CMBR / lodos ativados Kimura et al., 2004 0,04μg/L / 3,12μg/L 99,8% / 82,5% MBR / lodos ativados Radjenovic et al., 2007 <0,15μg/L a 1,05μg/L (0,27μg/L) 50% Não Disponível Petrovic et al., 2006 0,30μg/L / 0,10μg/L 22% / 75% 17,8μg/L Ibuprofeno <0,15μg/L a 1,20μg/L (0,54μg/L) filtro biológico/lodos ativados 0,38μg/L 0,002μg/L a 0,081μg/L 250g/dia Stumpf et al., 1999 Não disponível 1,000μg/L a 3,300μg/L 25,0g/dia 97,7% 90% Buser et al., 1999 Clarificação primária, aeração com adição de cloreto ferroso e clarificação secundária Ternes, 1998 42 Tabela 2.2 - Remoção de fármacos e drogas por diferentes sistemas de tratamento de efluentes, reportada na literatura (continuação). Fármacos e Drogas Concentração Média no Afluente da ETE 0,28μg/L Concentração Média no Efluente da ETE 0,18μg/L 0,11μg/L % Remoção Tipo de Tratamento Referências 36% Não disponível Lee et al., 2005 0,06μg/L / 0,08μg/L 46,6% / 23,4% MBR / lodos ativados Radjenovic et al., 2007 1,00μg/L 0,27μg/L / 0,17μg/L 71% / 83% filtro biológico/lodos ativados Stumpf et al., 1999 15g/dia 3,75g/dia 75% Ternes, 1998 1,6μg/L 0,37μg/L 76,9% Clarificação primária, aeração com adição de cloreto ferroso e clarificação secundária Não disponível Ternes et al., 2000 4,3μg/L 0,66μg/L 84,7% Não disponível Ternes et al., 2000 7,5μg/L 0,75μg/L 90,0% Não disponível Ternes et al., 2000 100ng/L 40ng/L 60,0% Segura et al., 2007 0,30μg/L 0,12μg/L / >27μg/L 58,7% / <10% Gradeamento, coagulação e sedimentação MBR / lodos ativados Metoprolol 380g/dia 64,6g/dia 83% Mevastatina <0,15μg/L a 1,25μg/L (0,55μg/L) <0,15μg/L a 0,85μg/L (0,35μg/L) 36,4% Indometacina Iomeprol Iopamidol Iopromida Levofloxacina Clarificação primária, aeração com adição de cloreto ferroso e clarificação secundária Não Disponível Radjenovic et al., 2007 Ternes, 1998 Petrovic et al., 2006 43 Tabela 2.2 - Remoção de fármacos e drogas por diferentes sistemas de tratamento de efluentes, reportada na literatura (continuação). Fármacos e Drogas Concentração Média no Afluente da ETE 2,76μg/L Concentração Média no Efluente da ETE 0,82μg/L 150ng/L % Remoção Tipo de Tratamento Referências 70% Não disponível Lee et al., 2005 0,00ng/L / 20,0ng/L / 50,0ng/L 100% / 86,6% / 66,7% HMBR / CMBR / lodos ativados Kimura et al., 2004 0,51μg/L / 0,13μg/L 15% / 78% filtro biológico/lodos ativados 0,08μg/L / 1,76μg/L 99,3% / 85,1% MBR / lodos ativados Radjenovic et al., 2007 49,5g/dia 66% Clarificação primária, aeração com adição de cloreto ferroso e clarificação secundária Ternes, 1998 0,1μg/L 0,1μg/L 0% Lodos ativados Bruchet et al., 2002 13,1μg/L 2,67μg/L 79,6% Não disponível 0,45μg/L 0,03 μg/L / 0,34 μg/L 94,0% / 23,8% MBR / lodos ativados Huerta-Fontela et al., 2007 Radjenovic et al., 2007 14,24μg/L 5,932μg/L 58,3% Não disponível 5,30ng/L 0,93ng/L 82,4% Não disponível Huerta-Fontela et al., 2007 Vasskog et al., 2006 39,0ng/L 230ng/L 4,02μg/L / 3,67μg/L 21,2ng/L / 87,9ng/L 89,7% / 90,6% 90,8% / 61,8% MBR / lodos ativados MBR / lodos ativados Radjenovic et al., 2007 Radjenovic et al., 2007 Stumpf et al., 1999 0,60μg/L Naproxeno 11,8μg/L 75g/dia Nicotina Ofloxacina Paraxantina Paroxetina Pravastatina 44 Tabela 2.2 - Remoção de fármacos e drogas por diferentes sistemas de tratamento de efluentes, reportada na literatura (continuação). Fármacos e Drogas Concentração Média no Afluente da ETE Concentração Média no Efluente da ETE % Remoção <0,10μg/L a 0,38μg/L (0,12μg/L) <0,10μg/L a 0,52μg/L (0,14μg/L) 0% 520g/dia 20,8g/dia 63,0ng/L 22,3ng/L / 26,9ng/L <0,05μg/L a 0,85μg/L (0,50μg/L) Ranitidina Sertralina Propanolol Propifenazona Sulfametoxazol Tilosina Tipo de Tratamento Referências Não disponível Petrovic et al., 2006 96% Clarificação primária, aeração com adição de cloreto ferroso e clarificação secundária Ternes, 1998 64,6% / 42,7% MBR / lodos ativados Radjenovic et al., 2007 <0,05μg/L a 0,45μg/L (0,20μg/L) 60% Não Disponível Petrovic et al., 2006 0,30μg/L 0,02μg/L / 0,17μg/L 95% / 42,4% MBR / lodos ativados Radjenovic et al., 2007 2,1ng/L 1,5ng/L 28,6% Não disponível Vasskog et al., 2006 450ng/L 178ng/L / 200ng/L MBR / lodos ativados Radjenovic et al., 2007 <0,15μg/L a 0,96μg/L (0,45μg/L) <0,15μg/L a 0,80μg/L (0,40μg/L) Não Disponível Petrovic et al., 2006 120ng/L Gradeamento, coagulação e sedimentação Segura et al., 2007 255ng/L Não disponível 300ng/L a 1500 ng/L Não disponível Hartig et al., 1998 Não disponível 0,06μg/L a 0,18μg/L (0,12μg/L) 0,4μg/L não detectado a 0,06μg/L (0,03μg/L) Não disponível Desinfecção por cloração ou UV Hirsch et al., 1999 60,5% / 55,6% 11,1% 52,9% Não disponível Não disponível 75,0% Yang et al., 2006 45 2.5. Fatores que Influenciam a Remoção de Micropoluentes Pelos Sistemas de Tratamento A remoção dos micropoluentes das águas residuárias durante o tratamento se dá por mecanismos abióticos (como adsorção, volatilização) e/ou bióticos (Cirja et al., 2008). A contribuição desses fatores está intrinsecamente relacionada às propriedades físicoquímicas do poluente e dos parâmetros de operação da estação de tratamento, sendo então aspectos de grande relevância para a mineralização ou a remoção física desses compostos. A literatura mostra que a adsorção e a biodegradação são os dois mais importantes processos, e estão diretamente correlacionados à disponibilidade dos substratos aos microorganismos degradadores de matéria orgânica (Clara et al., 2004; Joss et al., 2005). A degradação abiótica é o grupo de processos de remoção em que os microorganismos não estão envolvidos, como volatilização, oxidação por substâncias inorgânicas (como oxigênio e cloro gasosos, e os íons Fe3+ e SO42-) e hidrólise química. Tais processos se demonstraram menos eficientes quando comparados à biodegradação (Soares et al., 2006). As principais características intrínsecas dos micropoluentes que afetam sua remoção nas estações de tratamento são listadas abaixo. 2.5.1. Hidrofobicidade e Hidrofilicidade Muitos dos micropoluentes encontrados no esgoto apresentam características hidrofóbicas, que é a característica principal ao se considerar a adsorção pelo lodo dos sistemas de tratamento biológico (Garcia et al., 2002). Assim, após serem adsorvidos, os micropoluentes são removidos no processo de retirada de excesso de lodo dos sistemas biológicos (Cirja et al., 2008). A adsorção de substâncias orgânicas pode ser estimada usando valores de Kow (coeficiente de partição octanol-água), que reflete o equilíbrio de um soluto nas fases orgânica (hidrofóbica, no caso o lodo), e aquosa (hidrofílica): quanto maior for essa constante para determinado composto, maior o potencial de ele ser encontrado adsorvido. Carballa et al. (2004) estudou a remoção de alguns fármacos que apresentam características hidrofóbicas (ex: diazepan, diclofenaco), e concluiu que ela se dá principalmente pela adsorção desses compostos no lodo presente no biorreator. A 46 eficiência de remoção variou entre 40% e 60%. A adsorção ainda é mais evidente em um tratamento primário que objetivava a remoção de gorduras, onde as propriedades hidrofóbicas dos micropoluentes levaram à remoção de até 50%. Em um estudo posterior (Carballa et al., 2005), foram comparadas as eficiências de remoção de compostos apolares (galaxolida e tonalida) com as de fármacos de características mais polares (diclofenaco, ibuprofeno, diazepan e carbamazepina). Foi concluído que a alta adsorção dos compostos mais apolares levou a uma remoção até de 70%, ao passo que não foi observada qualquer diminuição de concentração dos compostos mais polares (carbamazepina e ibuprofeno). 2.5.2. Estrutura Química dos Micropoluentes A estrutura química e a composição elementar de um composto influenciam grandemente suas taxas de remoção durante o tratamento (Cirja et al., 2008). É notável que estruturas complexas, presentes, por exemplo, em alguns fármacos (cetoprofeno e naproxeno), apresentem baixas eficiências de remoção, sobretudo em sistemas de tratamento convencionais (Kimura et al., 2005). A presença de anéis aromáticos nas estruturas dessas substâncias as torna recalcitrantes ao tratamento, principalmente aqueles que empregam metabolismo anaeróbio. Assim também acontece com moléculas que contêm átomos de cloro (diclofenaco, ácido clorifíbrico) (Kimura et al., 2005) ou grupos nitro ligados a anéis aromáticos (Andreozzi et al., 2006). No geral, a estrutura química de um poluente é um bom indício sobre sua degradabilidade ou persistência no meio ambiente. Um composto simples, como por exemplo, uma cadeia alquílica curta, é passível de ter uma boa remoção por um sistema de tratamento. Por outro lado, compostos mais complexos ou que contenham grupos tóxicos (halogênios, por exemplo) persistem em solução ou adsorvidos no lodo, seja como derivados ou metabólitos incompletamente degradados (Cirja et al., 2008), que podem apresentar até mesmo maior risco ambiental do que o poluente do qual foram sintetizados. Como exemplo, os LAS que apresentam longas cadeias alquídicas são preferencialmente encontrados adsorvidos no lodo, enquanto os homólogos menores desse surfactante aniônico se posicionam em maior concentração no efluente (Terzic et al., 2005). 47 2.5.3. População Microbiana A natureza da população microbiana é uma importante variável na remoção dos compostos orgânicos nos sistemas de tratamento. Bactérias heterotróficas (Rhodococcus erythropolis) foram isoladas do lodo ativado de sistemas de tratamento por Yoshimoto et al. (2004) que concluíram que essa espécie é capaz de degradar rapidamente altas concentrações (100mg/L) de estrógenos naturais e sintéticos. O gênero Novosphingobium é conhecido por incluir várias espécies capazes de assimilar compostos resistentes à biodegradação (Koh et al., 2008). As espécies Rhodococcus equi e Rhodococcus zopfi foram pesquisadas por Yabuuchi et al. (1990), que mostraram rápida degradação do estrógeno etinil estradiol (estradiol a 100mg/L para 1/100 de atividade específica, em 24 horas). Koh et al. (2008) enfatizam que a cultura de cepas conhecidas por degradarem poluentes recalcitrantes e a introdução delas em sistemas de tratamento de efluentes pode reduzir a emissão dessas substâncias no meio ambiente. Conhecendo a diversidade microbiana e melhorando a atividade degradadora, pode-se chegar à completa mineralização de uma gama de poluentes que ainda são despejados via ETEs. No entanto, ainda são necessários estudos que visam os mecanismos de degradação e identificação de metabólitos, visando estabelecer novos processos e características do tratamento a serem aplicados nas ETEs. 2.5.4. Idade do Lodo Vários estudos atestam a importância da idade do lodo suficientemente alta para a remoção dos micropoluentes das águas residuárias (Terzic et al., 2005; Ivashechkin et al., 2004, Kloepfer et al., 2004), bem como para o crescimento e diversificação da comunidade microbiana. O aumento da idade acarreta a diminuição de lodo que necessita ser retirado do sistema; logo uma maior quantidade de micropoluentes de baixa polaridade permanece para degradação, o que aumenta a eficiência da planta de tratamento (Byrns, 2001). Além disso, em idades de lodo avançadas, a possibilidade de mutação genética e adaptação dos microorganismos são maiores, fatores importantes para a assimilação, e conseqüente degradação, de compostos orgânicos persistentes pelos microorganismos. Outro aspecto importante é quando se tem a idade do lodo avançada é que microorganismos mais específicos em remover compostos de difícil degradação podem se desenvolver adaptar melhor (Koh et al., 2008). 48 2.5.5. Valor de pH O potencial hidrogeniônico do meio a ser tratado interfere na eficiência, uma vez que influencia o metabolismo dos microorganismos (pH ótimo para as atividades enzimáticas microbianas), bem como a solubilidade dos micropoluentes. Dependendo dos valores de pKa (log da constante de acidez Ka) e das estruturas, os poluentes podem existir em diferentes estados de protonação no meio aquático, o que influencia na solubilização dos mesmos. Valores baixos de pH ocasionam boas taxas de remoção de micropoluentes de caráter ácido, uma vez que favorece a protonação e, conseqüentemente, a adsorção no lodo (Cirja et al., 2008). 2.5.6. Temperatura do Sistema A variação climática e temperatura ambiente afeta na remoção dos poluentes pelas ETEs. O aumento da temperatura acelera a atividade e crescimento microbiano, bem como diminuiu o tempo para o equilíbrio químico na adsorção pelo lodo ser estabelecido (Ten Hulscher e Cornelissen, 1996 apud Cirja et al., 2008). O estudo de Lapara et al. (2001) demonstrou também que altas temperaturas é um fator que pressiona o desenvolvimento seletivo da comunidade bacteriana, aumentando, portanto, a biodegradação dos poluentes. Nakada et al. (2006) observaram que a diferença na remoção de estradiol em diferentes estações do ano no Japão chega a 17% (70% de remoção no inverno, contra 87% no verão). Ternes et al. (1998) observaram que a remoção de estradiol em uma estação de tratamento de efluentes da Alemanha (média de 2ºC durante o período de amostragem) é de 64%, enquanto no Brasil (média de 20º durante a amostragem) a remoção desse estrógeno chega a 99,9%. Koh et al. (2008) observam que a variação na temperatura pode ter efeitos significantes na remoção de poluentes dos efluentes, e estudos mais aprofundados são necessários para discriminar a influência da variação de temperatura, de outros fatores, como a atividade microbiana por exemplo. 2.6. Técnicas de Preparo de Amostras e Análise de Micropoluentes Recentemente, a comunidade científica se alertou para os problemas decorrentes da presença de poluentes de origem antropogênica no meio ambiente. Assim, houve grande crescimento no desenvolvimento de novas técnicas analíticas e protocolos para a extração, identificação e quantificação dos mesmos em amostras ambientais (Barceló, 2007). O 49 desenvolvimento de técnicas inovadoras de extração e concentração dos compostos, que substituem a tradicional extração líquido – líquido (LLE), combinadas à análise em equipamentos de alta resolução, como os cromatógrafos gasosos acoplados à espectrômetros de massas (GC-MS), têm fortemente contribuído para o rastreamento de poluentes no meio-ambiente, em concentrações na faixa de μg/L. Segundo Barceló (2007), a dificuldade da determinação multicomponente de contaminantes orgânicos ambientais é dificultada pelo maior número de compostos a serem monitorados, e a demanda por equipamentos de grande sensibilidade. A cromatografia fornece uma ferramenta única para análises desse tipo, uma vez que as matrizes são extremamente complexas e contêm muitas classes diferentes de compostos em quantidades variadas. As maiores dificuldades encontradas nesses trabalhos são a separação entre as matrizes e contaminantes de interesse, o alcance de baixos limites de detecção e a identificação dos micropoluentes desconhecidos. Tradicionalmente, a utilização de equipamentos GC-MS nessa área é preferencial e rotineira desde os anos setenta (Barceló, 2007). Nos últimos vinte anos, a ciência da química analítica ambiental se tornou mais exigente, procurando por quantidades cada vez menores de uma crescente gama de novas substâncias emergentes, incluindo substâncias termo-instáveis, incapazes de serem analisadas em cromatógrafos gasosos. Então surgiu, no campo da análise ambiental, a necessidade de técnicas que fundiam a cromatografia líquida à espectrometria de massas (LC-MS), que foi aplicada, inicialmente a regiões altamente contaminadas, uma vez que os instrumentos apresentavam altos limites de detecção ou quantificação. Essas novas capacidades analíticas ampliaram a área do conhecimento ambiental, bem como descentralizaram as preocupações dos cientistas, focados apenas no pequeno conjunto dos macropoluentes, voltando a pesquisa, também, para os micropoluentes. Cabe destacar que o início de qualquer procedimento analítico de contaminantes ambientais envolve etapas de purificação e concentração das amostras, as quais visam a diminuição de interferências das matrizes, bem como a detecção mais eficaz dos compostos de interesse pelos equipamentos analíticos utilizados. 50 2.6.1. Técnicas de Extração As técnicas de extração e concentração de micropoluentes podem ser agrupadas em dois grupos principais, extração líquido-líquido e extração em fase sólida (SPE). Na extração líquido-líquido, determinado volume de amostra aquosa (ex. 500 mL) é colocado em contato com alíquotas de solvente imiscível em água (ex. 3 alíquotas de 50 ml de acetato de etila) em um funil de extração e agitada por determinado tempo. Após o tempo de agitação a mistura heterogênea é deixada em repouso e a fase orgânica recuperada. Por sua vez, a extração em fase sólida consiste em passar certo volume de amostra (ex. 500 mL) através de um cartucho que contém uma substância adsorvente com capacidade de remover da fase aquosa o composto de interesse. Existem diversos tipos de adsorvente, os quais se diferenciam pela polaridade e, conseqüentemente, pelas substâncias que se ligam ao meio suporte que os constitui. Após a passagem da amostra aquosa, utiliza-se então um solvente orgânico (ou combinação de vários, em diferentes proporções) para eluir (ou dessorver) o contaminante de interesse do cartucho de extração. A Tabela 2.3 mostra que aproximadamente 67% dos artigos revisados para a elaboração desse trabalho utilizaram a extração em fase sólida (SPE) associadas a procedimentos de clean-up. De fato, tal técnica é consolidada no preparo de amostras ambientais, pela sua alta eficiência de recuperação, facilidade de operação e uso de pequenos volumes de solventes orgânicos. 51 Tabela 2.3 - Número de substâncias extraídas por cada método, nos trabalhos revisados. Número de Substâncias % de Utilização Técnica de Extração 1 Extraídas e Detectadas da Técnica Extração líquido-líquido (LLE) 19 12,1 Extração em fase sólida (SPE) 106 67,5 Outras2 32 20,4 Total 157 100 1-Número que engloba o número de vezes que os analitos aparecem na totalidade dos artigos revisados. 2-Dentre outras técnicas de extração encontram-se a extração assistida por ultra-som, micro extração em fase sólida, headspace estático e extração por purge-and-trap. Após a extração e concentração, os extratos orgânicos são então analisados, geralmente, em cromatógrafos a gás ou de fase líquida acoplados a espectrômetros de massas. A característica química do microcontaminante definirá qual das técnicas será apropriada para sua análise. 2.6.2. Técnicas de Separação Cromatográfica e Detecção por Espectrometria de Massas Das diversas técnicas analíticas existentes para a determinação de fármacos, produtos de limpeza e de higiene pessoal, destacam-se àquelas que empregam cromatógrafos de fase líquida ou de fase gasosa acoplados a detectores de massas, os quais oferecem seletividade, sensibilidade e robustez para as análises ambientais. A técnica de cromatografia gasosa é utilizada na análise de substâncias termoestáveis e voláteis ou passíveis de derivatização (que consiste na reação da amostra com um reagente específico, resultando em um derivado de maior volatilidade). No cromatógrafo a gás, a fase móvel é um gás que arrasta a mistura de micropoluentes através da coluna cromatográfica onde a separação dos compostos é feita com base no ponto de ebulição e na diferença das afinidades dos analitos com a fase estacionária da coluna. Por sua vez, o cromatógrafo de fase líquida é usado na separação de analitos menos voláteis, ou que podem ou não sofrer degradação quando submetidos a altas temperaturas. Solventes líquidos (fase móvel) transportam os analitos através de uma coluna cromatográfica, onde ocorre a separação pelas diferenças das afinidades dos analitos entre 52 a fase estacionária, que caracteriza a coluna, e a fase móvel. Em ambas as técnicas, após a separação na coluna cromatográfica, os compostos são detectados separadamente e quantificados, em detector específico. Dentre os detectores para a cromatografia destaca-se o espectrômetro de massas. A espectrometria de massas é, de fato, uma poderosa técnica analítica, que se encaixa em pesquisas de substâncias orgânicas de qualquer natureza, desde pequenas moléculas, como metano e ácidos de cadeia curta, a enormes proteínas. Existem diversos analisadores de massa, que são basicamente sistemas capazes de separar, com base nas relações entre a massa e a carga (m/z) dos contaminantes, os íons formados pelos analitos durante uma etapa de ionização. Os espectros de massas geram informações úteis sobre a massa molecular e a estrutura dos analitos, podendo ajudar na elucidação de compostos desconhecidos. A sensibilidade da técnica, a formação de aglomerados (ou adducts) com íons de tampões, amostra e fase móvel, e as fragmentações geradas dependerão da fonte de ionização das amostras, que variam de acordo com o modelo do equipamento utilizado. Em sistemas de cromatografia de fase gasosa os sistemas espectrometria de massas mais usados são ionização por elétrons (EI) e ionização química (CI). Os sistemas de ionização mais difundidos em cromatografia de fase líquida são a ionização por elétron spray (ESI) e a ionização química à pressão atmosférica (APCI), as quais são escolhidas de acordo com as propriedades físico-químicas dos analitos, principalmente polaridade e acidez, sobre ionização positiva ou negativa (Barceló, 2007). O uso de sistemas de fragmentações consecutivas dos íons formados (MS/MS) é importante em casos onde alguns compostos sofrem co-eluição. Logo as fragmentações de íons gerados nesses equipamentos ajudam na identificação inequívoca dos compostos. A Tabela 2.4 apresenta as técnicas de detecção utilizadas nas pesquisas dos micropoluentes encontrados com maior freqüência nos trabalhos revisados. 53 Tabela 2.4 - Utilização de técnicas analíticas para alguns micropoluentes mais freqüentemente encontrados por estudos sobre sistemas de tratamento de esgoto doméstico (% em relação ao total de artigos revisados). CLASSE Fármaco Produto de limpeza Produto de higiene pessoal MICROPOLUENTE MÉTODO DE DETECÇÃO E QUANTIFICAÇÃO (%) GC-MS LC-MS Ácido Clorifíbrico Cetoprofeno Diclofenaco Eritromicina Gemfibrozil 75 50 66,7 0 75 25 50 33,3 100 25 Ibuprofeno Indometacina Naproxeno Nonilfenol LAS Bactericidas Bifenilol Fragrâncias Corantes 66,7 75 80 50 0 85 0 100 100 33,3 25 20 50 100 15 100 0 0 A partir da análise dos dados apresentados na Tabela 2.4, percebe-se que a técnica de GCMS é preferencial na análise de micropoluentes em águas residuárias, em relação à LC-MS. A técnica de cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de massas esbarra em algumas limitações, como a necessidade de os compostos estudados serem voláteis, ou passíveis de reações de derivatização, o que impede que substâncias de maior massa molar sejam analisadas. A técnica de LC-MS é muito mais abrangente, uma vez que possibilita a análise de compostos não-voláteis e de massa molar maior, mas se depara com um número maior de variáveis para sua operação. Algumas delas são as energias de ionização e do gás de colisão, tempos de acumulação iônica, rígido controle de temperatura para a dessolvatação da amostra, fluxo bem definido para o gás de secagem da amostra, posição entre a agulha de ionização e o orifício de entrada da amostra, entre outros. Essas dificuldades geram a necessidade de técnicos com maior grau de especialização para operar esse tipo de equipamento de análise instrumental. Bobeldijk et al. (2001) cita que a cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de massas é amplamente utilizada nas pesquisas de micropoluentes apolares desconhecidos. A identificação é, então, realizada pela comparação dos espectros de massas da amostra com 54 bibliotecas ou pela interpretação de padrões de fragmentação. Já para compostos semipolares e polares, são utilizados cromatógrafos líquidos acoplados a espectrômetros de massas em série (tandem LC-MS/MS), mas a inexistência de bibliotecas de massas para essa técnica dificulta a elucidação dos compostos desconhecidos. 55 3. Materiais e Métodos 3.1. O Sistema de Tratamento UASB/FBP A área de estudo está localizada na Estação de Tratamento de Esgotos Arrudas da cidade de Belo Horizonte, Minas Gerais, onde se situa o Centro de Pesquisa e Treinamento em Saneamento (CePTS) da UFMG. O sistema de tratamento de esgotos investigado consiste de um reator de leito de lodo anaeróbio de fluxo ascendente (UASB), seguido de um reator aeróbio do tipo filtro biológico percolador (FBP), como unidade de pós-tratamento, ambos dimensionados para o tratamento de esgotos de uma população correspondente a 500 habitantes. Os esgotos afluentes ao sistema são provenientes do tratamento preliminar da ETE Arrudas, composto por unidades de gradeamento e desarenação. 3.1.1. Reator UASB O reator UASB (Figura 3.1a), construído em escala piloto, possui dimensões de 4,5m de altura e diâmetro de 2,50m, com um volume útil de 22,1m³. Durante o projeto, tal reator foi operado nas seguintes condições: vazão de 2,88m³/h, tempo de detenção hidráulica de aproximadamente 7 horas, velocidade ascensional de 0,65m/h e carga orgânica volumétrica de 1,74 kgDQO/m³.d (Almeida et al., 2007a). 3.1.2. Filtro Biológico Percolador Os efluentes do reator UASB eram encaminhados para um filtro biológico percolador (Figura 3.1b), dividido em quatro compartimentos, cada qual preenchido com um diferente material suporte (Figura 3.2): aparas de conduíte corrugado (diâmetro de 1”), pedra britada, anéis plásticos e o sistema Downflow Hanging Sponge (DHS). Nessa pesquisa, foi avaliada apenas a degradação do esgoto que percola por dois deles: o revestido com pedra britada e o com aparas de conduíte corrugado, ambos dispostos aleatoriamente em seus devidos compartimentos. As dimensões do FBP são: diâmetro igual a 2,10m e altura, 2,50m. Cada compartimento apresenta, então, 0,86m² de área e volume correspondente a 2,16 m³. O efluente do reator UASB era despejado no FBP através de um braço rotativo motorizado, e o efluente de cada compartimento do filtro era lançado em decantadores secundário para a retenção de biomassa que escapa do FBP (Almeida et al., 2007a). 56 (a) Reator UASB (b) Filtro Biológico Percolador e Decantadores Figura 3.1 - Reatores que compõem a ETE experimental em estudo. (a) Reator UASB e (b) FBPs. Fonte: Tavares, 2008. Figura 3.2 - Filtro biológico percolador, dividido em quatro compartimentos, preenchidos com diferentes meios suportes para crescimento microbiano. Um braço giratório despeja o efluente do reator UASB a ser tratado. Fonte: Tavares, 2008. 3.2. Amostragem Um litro de amostra foi coletado de cada um dos pontos de amostragem, de maneira pontual, mensalmente, no período de fevereiro de 2007 a janeiro de 2008, exceto no mês de junho de 2007. A Figura 3.3 ilustra o sistema de tratamento de efluentes e os pontos de 57 coleta de amostras. Bombas peristálticas acopladas diretamente aos pontos de amostragem coletavam amostras de esgoto bruto (ponto A), efluente do reator UASB (ponto B) e os efluentes dos compartimentos do FBP preenchidos com as aparas de conduíte (ponto C1) e com a pedra britada (ponto C2). As amostras foram armazenadas em frascos de polipropileno e congeladas a -20°C, a fim de preservá-las até o momento da filtração e extração. O filtro biológico percolador operou, durante as campanhas de amostragem, com duas diferentes taxas de aplicação superficial, a fim de atender os parâmetros necessários para o estudo de Almeida (2007b). Nos períodos de fevereiro a maio de 2007, e novembro de 2007 a fevereiro de 2008, a taxa de aplicação superficial foi igual a 10m3/m2.d, enquanto no período de julho a outubro de 2008, 15m3/m2.d. A Tabela 3.1 mostra a data de coleta das amostras e as condições operacionais de cada um dos reatores biológicos. Ponto de amostragem do efluente do reator UASB (B) Ponto de amostragem do esgoto bruto (A) Ponto de amostragem do efluente final (C1 e C2) – após decantador Tratamento preliminar Reator UASB Filtro biológico percolador Figura 3.3 - Fluxograma esquemático do sistema UASB/FBP utilizado como aparato experimental. Fonte: Almeida, 2007a. 58 Tabela 3.1 - Dados das amostragens a e fases operacionais do sistema de tratamento de efluentes em estudo. Campanha da Coleta Data da Coleta TAS (m3/m2.d) COV (KgDBO/m3.d) 1 28/2/2007 10 0,24 2 12/3/2007 10 0,24 3 9/4/2007 10 0,24 4 21/5/2007 10 0,24 5 23/7/2007 15 0,4 6 13/8/2007 15 0,4 7 15/10/2007 15 0,4 8 19/11/2007 10 0,24 9 10/12/2007 10 0,24 10 14/1/2008 10 0,24 11 18/2/2008 10 0,24 3.3. Preparo das Amostras e Extração dos Analitos Após serem descongeladas, as amostras foram filtradas em membrana de fibra de vidro (diâmetro de poros igual a 0,45μm), a fim de remover todo o material particulado proveniente da estação de tratamento, evitando, assim, entupimentos nas tubulações do equipamento de análise por partículas. Volumes iguais a 300 mL de cada amostra passaram em cartuchos de extração em fase sólida do tipo C18 (3mL, 500mg), utilizando um manifold e bomba de vácuo, em fluxo de 5mL/min. Em seguida, os compostos foram eluídos dos cartuchos com duas diferentes soluções: 3mL da solução A (n-hexano:diclorometano-1:4) e 5mL da solução B (metanol:diclorometano-9:1). Os eluatos foram secados com nitrogênio gasoso, e a amostra foi reconstituída com metanol, para o volume de 1,0mL. Em 200μL dessa solução, foram adicionados 100μL de uma solução de fenolftaleína (1mg/L, padrão interno) e a mistura foi diluída em metanol, para o volume final de 1,0mL. O fluxograma dos procedimentos de 59 pré-tratamento e extração das amostras é mostrado na Figura 3.4, e a Figura 3.5 ilustra o aparato utilizado na extração em fase sólida. 300mL de amostra Filtração em membrana 0,45μm Extração SPE (C-18) Eluição com 3mL de A +5 mL de B Secagem (N2) Reconstituição com metanol Adição de padrão interno e diluição Figura 3.4 - Fluxograma das etapas de preparo das amostras, anterior à análise no HPLCMS-IT-TOF. Figura 3.5 - Montagem utilizada no processo de extração em fase sólida dos micropoluentes das amostras de esgoto. 3.4. Reagentes, Consumíveis e Equipamento Instrumental Água ultra-pura foi adquirida através de um sistema de troca iônica (TKA Wasseraufbereitungssysteme, Alemanha). Metanol grau HPLC (Vetec, Rio de Janeiro, Brasil) foi usado como modificador de polaridade da fase móvel e para a eluição dos 60 compostos adsorvidos nos cartuchos de extração em fase sólida. Na eluição, também foram utilizados n-hexano grau HPCL (Vetec) e diclorometano grau HPLC (Vetec). Para a extração e clean-up das amostras, foram usados um manifold (Phenomenex), cartuchos C18-E (Strata, Phenomenex), e para a separação cromatográfica, foi utilizada uma pré-coluna C18 (4,0cm x 3,0mm x 3,2µm, Phenomenex). A secagem dos cartuchos e das amostras foi realizada com nitrogênio (White Martins - Praxair). Para a análise dos compostos, utilizou-se um cromatógrafo líquido de alta performance acoplado a um espectrômetro de massas híbrido (HPLC-MS-IT-TOF), o qual consome nitrogênio líquido (White Martins – Praxair) como gás de nebulização e secagem, e argônio (99,9999% de pureza, White Martins - Praxair) para a colisão induzida e diminuição da energia cinética dos íons. O cromatógrafo líquido de alta performance consiste em um sistema Prominence, equipado com bombas binárias, modelo LC-20AD (Shimadzu Corp., Quioto, Japão) e um amostrador automático modelo SIL 20AC (Shimadzu Corp). O volume de amostra injetado foi de cinco microlitros, e o fluxo da fase móvel igual a 0,2mL min-1. As fases móveis utilizadas foram (A) água e (B) metanol, adotando-se o seguinte gradiente: de 0% de B a 80% de B em 5 minutos; 80% de B isocrático- por 7 minutos; de 80% de B a 100% de B em 10 minutos; 100% de B por 8 minutos. No lugar de uma coluna cromatográfica convencional, utilizou-se apenas uma pré-coluna C-18 (Phenomenex), ligada diretamente à interface do equipamento, para a separação dos analitos analisados (Figura 3.6). Figura 3.6 - Pré-coluna cromatográfica diretamente acoplada à fonte de ionização por electronspray (ESI). 61 A interface entre o HPLC e o espectrômetro de massas consiste em uma fonte de ionização por electronspray (modo negativo: -3,5 kV; modo positivo: +2,5kV); fluxo de gás nebulizador- N2- igual a 1,5L/min; pressão do gás de secagem - N2 - igual a 100 kPa e temperatura do CDL igual a 200°C). O tempo de acumulação iônica no octapolo foi definido como 10ms. Os espectros MS e MS/MS foram adquiridos simultaneamente nos modos negativo e positivo de ionização, na faixa de 90 m/z a 1000 m/z, para o modo fullscan, e experimentos MS2 com colisão induzida por argônio, para a obtenção de fragmentações, foram feitos subseqüentemente. Para a busca de compostos previamente especificados (compostos-alvo) e elucidação estrutural, foi utilizado o modo MS2 (sem colisão induzida por argônio), com a faixa de m/z otimizada para cada um dos íons monitorados, o que aumenta a sensibilidade instrumental, necessária nesse caso, uma vez que os compostos-alvo estão presentes em pouca quantidade nas amostras. Para a aquisição de dados do espectrômetro de massas, foi utilizado o programa de computador LabSolutions/LCMS Real Time Analisys (versão 3.41, Shimadzu Corporation). As predições das fórmulas moleculares foram realizadas usando-se o programa Formula Predictor (versão 1.12, Shimadzu Corporation) e os cálculos para as massas exatas foram realizados com o programa Accurate Mass Calculator (versão 1.12, Shimadzu Corporation). A análise de componentes principais foi realizada usando os programas Multivariate Analysis (versão 1.3), Minitab (versão 14.13, Minitab Inc.) e Microsoft Excel (versão 11.0, Microsoft Corporation). Fluxo Interface ESI Bomba A Fase móvel A Misturador Pré-coluna LCMS-IT-TOF Bomba B Injetor Automático Fluxo Fase móvel B Figura 3.7 - Esquema simplificado do equipamento HPLC-MS-IT-TOF. Adaptado de Shimadzu Corporation, 2007. 62 O modo MS2 do espectrômetro de massas pode ser utilizado de duas formas diferentes, com relação à colisão induzida por argônio (CID). Quando é feita uma análise com esse parâmetro desligado, a câmara do Ion Trap não é preenchida com argônio. Nesse modo, o operador seleciona o íon molecular (ou íons moleculares) de interesse, o qual é, por rádiofreqüência, separado dos demais nesse analisador de massa e é então lançado ao Time-ofFlight para medição de seu tempo de vôo e subseqüente detecção. Tal estratégia é conhecida como “seleção do íon precursor”. Por outro lado, em experimentos MS2 com a colisão por argônio habilitada, o íon selecionado é separado da mesma forma como explicado anteriormente. Entretanto, antes da extração para o Time of Flight, um fluxo pulsante de argônio altamente energético é bombardeado no Ion Trap, com o intuito de conduzir colisões no íon precursor, que se fragmenta caracteristicamente, de acordo com sua estrutura molecular específica. Os fragmentos são usados, então, pelos analistas na tentativa da elucidação da fórmula molecular de um composto desconhecido, ou como método de confirmação estrutural, dentre outras aplicações. 3.4.1. Metodologia Analítica: Aquisição dos Espectros Totais (fingerprint) Os experimentos foram executados com a faixa de obtenção dos espectros de 90m/z a 1000m/z, simultaneamente nos modos negativo e positivo de ionização. Os espectros das amostras foram obtidos em modo contínuo e processados pelo programa LabSolutions/LCMS Real Time Analisys. As massas das moléculas protonadas (modo positivo) e desprotonadas (modo negativo) foram determinadas e utilizadas como dado de entrada no programa Formula Predictor, como base para o cálculo de todas as composições elementares dos micropoluentes desconhecidos. Os parâmetros configurados para os cálculos foram C: 0 a 50, H: 0 a 100, N: 0 a 20, O: 0 a 20, F: 0 a 20 e P: 0 a 3. O parâmetro ligações duplas equivalentes (DBE), que informa sobre a aromaticidade e insaturações das estruturas, foi configurado como -0,5 a 50 (valores padrão). Como é grande a quantidade de substâncias presentes nos extratos de amostras de esgoto domestico, uma análise de componentes principais dos espectros foi realizada utilizando os softwares Multivariate Analysis e Minitab. Apenas as relações massa/carga que obtiveram o valor da primeira componente principal (PC1-principal component 1) maior ou igual a 0,05 foram selecionados para a interpretação dos espectros e tentativa de elucidação da 63 fórmula molecular e estrutural. A Figura 3.8 mostra o cromatógrafo líquido acoplado a espectrômetros de massas utilizados para essa pesquisa. Figura 3.8 - Cromatógrafo líquido acoplado aos espectrômetros Ion-Trap e Time-of-Flight (HPLC-MS-IT-TOF). Para os íons de estruturas desconhecidas, o programa Formula Predictor realizou o cálculo das percentagens de isótopos teóricos para todas as possíveis composições elementares, e as comparou com as obtidas experimentalmente. Para diminuir ainda mais a quantidade de fórmulas possíveis para tais compostos e se chegar mais facilmente a uma conclusão da fórmula molecular exata, foram feitos experimentos MS2 e os fragmentos obtidos foram levados em consideração pelo programa para o cálculo. O erro aceitável entre os valores de m/z teóricos e experimentais para todos os compostos foi fixado como 50mDa. De posse de algumas fórmulas possíveis para cada uma das massas, a composição elementar foi pesquisada em bancos de dados, como Merck Index e NIST, a fim de se chegar a uma fórmula molecular ou estrutura química plausível para cada um dos íons. Alguns compostos não puderam ser identificados com precisão, mas detalhes das possíveis estruturas foram obtidos e são citados. 64 3.4.2. Metodologia Analítica: Detecção de Compostos Específicos Os compostos bezafibrato, bisfenol A, dibutilftalato e nonilfenol foram selecionados para uma análise semi-quantitativa, calculando-se as concentrações relativas a um padrão interno (fenolftaleína) e, assim, acompanhar a degradação que ocorre no sistema de tratamento de efluentes domésticos UASB-FBP. Para isso, foram executados experimentos em um cromatógrafo líquido de alta performance acoplado a um espectrômetro de massas híbrido (LC-MS-IT-TOF), no modo MS2, os quais focalizaram a análise apenas nos íons correspondentes aos compostos pré-selecionados. Foram realizados experimentos MS2 com o parâmetro de fragmentação habilitado, mas os resultados se mostraram insatisfatórios, provavelmente pela baixa concentração dos poluentes nas amostras. A Tabela 3.2 mostra as relações m/z utilizadas para cada um dos compostos. SUBSTÂNCIA RELAÇÕES m/z UTILIZADAS NO MODO MS2 Nonilfenol 219,1731 Dibutilftalato 277,1494 Bezafibrato 360,1063 Bisfenol A 227,1060 2 Tabela 3.2 - Substâncias-alvo analisadas no modo MS do espectrômetro de massas, e seus íons moleculares, no modo de ionização negativo. 3.5. Tratamento Quimiométrico de Dados As técnicas de estatística convencionais, muitas vezes não são suficientes para fornecer as informações necessárias sobre um conjunto de amostras, principalmente quando existe um número grande de informações, como é o caso dos espectros de massas. Ao se comparar espectros fullscan de diversas amostras, obtém-se um número muito grande de dados (nesse estudo, a compilação dos dados obtidos na análise de todas as amostras gerou uma matriz composta por 40 colunas e 586 linhas), o que dificulta a percepção de conclusões. Usando técnicas estatísticas avançadas, denominadas métodos quimiométricos, é possível comparar essas amostras, de forma a se chegar a conclusões sobre o comportamento de uma amostra, ou um grupo de amostras, em relação às outras. O tratamento quimiométrico dos dados reduz o número de variáveis e, então, a matriz original é utilizada na construção 65 de gráficos de duas ou três dimensões, mais simples de serem analisados, através dos quais se obtém conclusões em relação à similaridade amostral. No presente trabalho, o método quimiométrico utilizado foi a Análise por Componentes Principais (PCA), técnica exploratória, uma vez que as conclusões sobre as amostras são tiradas de dados coletados (no caso, espectros fingerprint coletados pelo espectrômetro de massas). A Análise por Componentes Principais consiste em reorganizar os dados provenientes das amostras em um sistema de eixos conveniente e simplificado para a análise dos dados. As n-variáveis originais geram “n-componentes principais”, vetores que as representam e são obtidos em ordem decrescente de máxima variância. Isso quer dizer que a primeira componente principal detém mais informações estatísticas do que a segunda componente principal, que por sua vez, traz consigo mais informação estatística do que a terceira componente principal, e assim por diante. Geralmente, o que é feito é tomar para a análise de dados apenas a primeira e a segunda componentes principais, as quais, muitas vezes, detêm mais de 90% das informações estatísticas, reduzindo o número de variáveis e simplificando, assim, a análise. O gráfico que se obtém plotando a primeira componente principal e a segunda componente principal fornece, estatisticamente, uma janela privilegiada estatisticamente para a observação dos pontos no espaço n-dimensional (Souza, 2008). Na PCA, a matriz original é convertida em um produto de duas matrizes: a matriz de Scores, associada à relação existente entre as amostras, e a matriz de Loadings, associada à relação existente entre as variáveis (Neto e Moita, 1998). Na forma matricial, representa-se a Equação 1: X= S*LT (Equação 1) sendo X a matriz original, S a matriz dos Scores e LT a matriz dos Loadings transposta, como ilustrado na Figura 3.9. Figura 3.9 - Representação matricial da operação realizada no cálculo de componentes principais. Fonte: Souza, 2008. 66 Onde “a”, representado em linhas, são as amostras na matriz S de Scores e “v”, representado em colunas, são as variáveis da matriz L de Loadings. “CP” são as componentes principais. Em síntese, tem-se: o gráfico de Scores fornece uma relação entre as amostras; o gráfico de Loadings fornece uma relação entre as variáveis; na maioria dos casos, duas a três componentes principais representam mais de 90% das informações estatísticas e torna a análise simplificada. Nesse estudo, a análise de componentes principais foi, em um primeiro momento, usada para julgar a importância das variáveis originais escolhidas (Loadings-relações m/z) quando suas duas primeiras componentes principais são combinadas linearmente, destacando os íons mais relevantes do ponto de vista estatístico. Posteriormente, a matriz dos Scores foi calculada e analisada, de forma a agrupar as amostras com características espectrométricas semelhantes e perceber como se agrupam de acordo com o ponto amostral do sistema de tratamento de efluentes em que foram coletadas. 67 4. Resultados e Discussão 4.1. Análise de Similariedade Entre as Amostras: Scores A análise de componentes principais, através da matriz de Scores, fornece informações sobre a semelhança entre as amostras, no que diz respeito às suas composições químicas. As Figuras 4.1 e 4.2 ilustram gráficos plotados pela primeira componente principal versus a segunda componente principal da matriz de Scores, respectivamente dos modos negativo e positivo de ionização. A matriz de Scores do modo negativo (Figura 4.1) mostra que as amostras referentes ao efluente do filtro biológico percolador (C1 e C2) se agrupam, indicando que, durante todo o período de amostragem, a composição do efluente final permaneceu praticamente constante. Além disso, é possível concluir que não houve qualquer diferença significativa provocada pelos diferentes meios de suporte no FBP As amostras coletadas nos pontos A (esgoto bruto) e B (efluente do reator UASB) não se agruparam uniformemente no gráfico, o que demonstra que a composição química dessas amostras não é uniforme, apresentando variações significativas entre elas. A matriz de Scores do modo positivo (Figura 4.2) não revelou qualquer agrupamento aparente entre as amostras, relacionado ao ponto do sistema de tratamento em que foram coletadas. 68 Amostras (S cores) - Modo de Ionização N egativo 14 Pontos de Cole ta A B A - Novembro 2007 B - J aneiro 2008 12 C1 C2 PC1 (71,99%) 10 B - A bril 2007 A - Outubro B2007 - Novembro 2007 B - Dez embro 2007 A - J aneiro 2008 8 B - A gos to 2007 B - M aio 2007 A - A gos to 2007 B - Outubro 2007 6 A - Dez embro 2007 C 1- Novembro A - J2007 ulho 2007 A- A A -bril 2007 M aio 2007 B - Fevereiro 2007 A - Fevereiro 2007 C 2- Novembro 2007 4 B - M arço 2007 B - J ulho 2007 gos2007 to 2007 CC2-2-MAaio C 1- Outubro C 2-2007 J ulho 2007 C 1- M aio 2007 2 1CA2Fevereiro A bril 2007 2007 C 2- Outubro 2007 CC11bril 2007 C J ulho 2007 C 1-C M arço 2007 C 1- Dez embro 2007 embro 2Fevereiro 2007 AC-2M Dez arço 2007 2007 2- 2008 M arç o 2007 C 1-CJ2aneiro JCaneiro 2008 C 1- A gos to 2007 0 -5,0 -2,5 0,0 2,5 PC2 (12,85%) 5,0 7,5 Figura 4.1 - Primeira e segunda componentes principais da matriz de Scores do modo de ionização negativo. 69 Amostras (S cores) - Modo de Ionização Positivo 12 C 1- Novembro 2007 P o nto s de C o leta A B C1 C2 A - Novembro 2007 C 2- Novembro 2007 B - Novembro 2007 10 A - Outubro 2007 B - Outubro 2007 C 2- Outubro 2007 C 1- J aneiro 2008 PC1 (58,46%) B - J aneiro 2008 B - Dez embro 2007 8 C 1- Outubro 2007 A - Dez embro 2007 A - A gos to 2007 C 1- Dez embro 2007 6 C 2- J aneiro 2008 B - A gos to 2007 C 2- Dez embro 2007 A - J aneiro 2008 4 C 2- A gos to 2007 A - A bril 2007 A - M aio 2007 B - A bril 2007 A - J ulho 2007 C 1CC2007 2AM1bril 2arço B -Fevereiro MCA aio 2007 C2007 A2007 bril2007 2007 B - Fevereiro 2007 2-- M aio 2007 arço C 2- J A ulho 2007 -MFevereiro 2007 -M 1-2007 arço 2007 CB22007 1M2007 aio 2007 BFevereiro -arço JCCulho CC12007 1- JAulho gos to 2007 2 -2,0 -1,5 -1,0 PC2 (10,48%) -0,5 Figura 4.2 - Primeira e segunda componentes principais da matriz de Scores do modo de ionização positivo. 70 4.2. Elucidação Estrutural de Micropoluentes no Esgoto Doméstico A análise fullscan nos modos negativo e positivo das amostras de esgoto revela um grande número de substâncias químicas, comprovando a complexidade dessa matriz ambiental. Uma vez que a identificação de todos os poluentes presentes é demasiadamente complexa, esse trabalho se limitou ao estudo das substâncias que se destacam dentre as demais nas amostras, ou seja, aquelas que durante a análise espectrométrica, geraram melhores respostas instrumentais. Assim, após adquiridos os espectros de cada amostra, o tratamento quimiométrico dos dados foi realizado, como uma ferramenta fundamental para a seleção dos poluentes mais determinantes na distinção das amostras. Através do resultado da análise de PCA, foram considerados como relevantes para a identificação os íons com valor da primeira componente principal maior ou igual a 0,05. As relações bidimensionais entre os valores das primeira e segunda componentes principais, dos íons do modo negativo são mostradas na Figura 4.3 e do positivo na Figura 4.4 (Loadings). Nelas podem ser notados densos agrupamentos de pontos, que representam as relações m/z semelhantes em todas as amostras. Os íons que se encontram destacados dos demais são os mais relevantes, logo, são os alvos da tentativa de elucidação estrutural. De posse das relações m/z desses íons, foram realizados experimentos MS2, a fim de obter fragmentações que auxiliariam o programa computacional a calcular as possíveis estruturas do poluente. A Tabela 4.1 relaciona esses íons com seus respectivos valores de componentes principais calculadas na análise quimiométrica de dados. Relações m/z (Loadings) - Modo Negativo de Ionização 0,7 311,17 0,6 PC1 (71,99%) 0,5 325,19 339,20 0,4 297,15 0,3 0,2 279,23 281,25 248,96 0,1 0,0 -0,6 -0,4 317,08 112,99 298,16 226,98 299,26 313,17 297,16 318,09 280,24 253,22 327,18 283,27 353,21 282,25 255,23 277,22 299,15 239,07 265,15 341,19 375,29 341,20 635,17 327,19 311,46 309,17 325,49 309,16 273,09 277,21 397,23 297,26 367,23 391,29 297,46 213,08 331,10 353,06 327,17 313,16 635,18 155,00 183,01 284,27 421,23 389,27 227,20 174,98 295,22 200,17 307,20 323,19 311,52 300,26 353,20 256,24 278,22 279,14 254,22 283,26 281,12 339,51 563,51 384,94 559,48 441,25 381,24 295,23 339,36 475,35 636,18 355,18 250,15 241,22 228,95 399,35 325,35 325,55 325,73 311,70 312,18 325,34 337,20 311,32 311,33 329,24 323,18 311,47 341,18 281,53 279,51 279,18 277,13 274,09 269,24 269,25 267,21 258,03 281,40 279,38 278,24 279,13 277,91 278,13 278,19 278,21 277,19 274,10 274,90 275,07 275,10 276,89 277,08 277,09 277,11 270,22 271,23 272,08 272,09 269,08 269,10 269,11 269,21 266,15 267,11 267,12 267,13 267,15 267,18 267,19 258,04 258,54 259,03 259,04 259,10 259,96 260,10 261,06 261,07 261,10 263,08 263,09 263,10 257,17 257,18 255,07 255,18 252,20 252,91 252,92 251,19 283,15 283,07 283,08 283,10 283,11 283,12 282,07 282,11 282,12 282,13 281,26 281,13 280,25 279,25 279,20 279,22 279,15 277,20 273,10 283,14 254,90 251,20 283,13 297,27 249,96 564,51 560,48 544,97 485,28 441,26 411,11 637,19 696,49 339,37 299,57 299,25 298,15 297,47 242,08 243,20 241,19 239,18 223,07 197,96 186,98 194,99 520,91 537,49 513,31 477,35 469,29 439,81 431,07 431,08 425,26 423,15 417,32 409,26 392,29 389,28 389,30 379,83 377,20 378,20 368,23 365,23 356,08 355,20 354,21 296,94 295,24 294,98 293,19 285,24 637,18 340,21 341,15 341,16 300,14 299,16 299,19 298,26 299,12 299,13 299,14 297,67 297,31 297,28 251,16 251,17 251,18 250,14 249,06 249,07 249,16 249,17 248,08 241,21 241,05 241,06 241,07 241,18 239,19 239,20 239,17 236,92 239,06 233,03 233,15 235,04 235,05 235,17 227,98 226,99 225,19 223,17 225,17 214,94 215,01 215,02 215,35 215,68 216,01 219,17 220,15 221,07 221,08 221,09 214,92 213,19 213,51 214,02 213,09 213,10 213,16 212,99 213,00 213,01 213,02 213,07 210,97 211,06 212,07 205,04 205,05 207,01 207,04 208,97 208,98 199,30 199,41 199,42 199,46 199,59 197,97 198,04 197,03 197,15 183,02 183,12 177,07 177,08 178,07 163,06 164,02 168,08 169,06 169,07 170,07 171,14 174,92 174,94 123,01 109,00 576,13 576,63 517,30 494,97 503,07 476,35 450,80 454,21 456,82 463,33 464,33 437,19 437,20 437,21 437,22 431,05 431,06 425,25 421,33 422,23 417,33 417,58 418,09 418,33 421,20 421,22 417,08 409,97 400,35 399,18 394,98 397,22 389,31 390,12 390,82 390,83 383,16 381,22 381,23 378,84 376,30 376,22 371,17 373,28 375,20 368,24 369,17 367,10 367,20 367,21 367,22 356,18 356,86 357,16 357,17 365,18 356,07 355,17 354,22 354,06 296,14 296,15 296,23 296,24 295,16 293,20 293,21 294,19 290,14 291,08 291,10 291,16 293,10 286,95 287,07 287,08 287,16 288,12 289,09 289,10 285,09 285,10 339,52 339,57 297,29 297,30 241,20 240,07 222,08 213,18 381,25 376,29 295,15 295,13 293,18 289,12 236,91 214,93 214,07 369,18 355,19 355,06 225,18 209,09 295,14 311,31 309,28 335,23 333,22 333,09 330,24 329,27 329,23 328,18 318,97 315,25 313,22 345,22 343,97 313,15 311,27 310,18 307,16 307,18 307,19 301,25 308,87 309,15 337,21 338,19 336,33 337,18 337,19 334,01 335,17 335,18 335,19 335,22 333,13 333,14 333,15 332,07 331,11 332,01 330,25 330,29 329,12 329,13 328,14 328,15 327,14 327,15 327,16 324,18 324,19 324,22 324,23 319,19 319,20 319,22 319,23 319,86 320,14 320,19 320,22 321,15 321,16 321,18 321,19 321,20 322,16 323,02 323,17 319,09 318,19 317,24 317,38 317,44 317,61 316,13 316,87 314,88 315,12 315,13 314,14 314,15 345,28 346,29 349,15 349,17 351,17 351,18 351,21 344,98 342,58 343,14 343,15 343,16 343,17 343,18 342,14 342,15 342,16 342,18 341,17 313,12 313,13 313,14 310,15 310,16 303,10 303,11 303,14 303,23 304,16 305,14 305,16 305,21 306,15 307,14 307,15 301,09 301,10 301,16 301,23 300,15 300,20 308,06 308,07 308,13 308,14 308,15 329,28 329,29 319,10 319,11 314,16 342,19 325,48 332,03 328,17 323,22 323,20 329,26 323,21 329,25 -0,2 0,0 PC2 (12,85%) 212,08 199,17 0,2 0,4 Figura 4.3 - Relação entre a primeira e a segunda componentes principais da matriz Loadings dos íons gerados nos modo negativo. Relações m/z (Loadings) - Modo Positivo de Ionização 0,7 236.07 0,6 PC1 (58,46%) 0,5 0,4 301.14 0,3 341.08 659.17 399.25 0,2 214.09 231.12 279.16 413.27 251.13 237.08 421.24 302.15 660.17 288.29 273.16 304.30 273.17 381.30 335.22 393.21 579.30 280.16 381.73 401.26 403.74 458.33 481.27 379.28 272.26 327.23 432.28 437.24 331.21 337.70 476.31 535.40 342.08 386.33 400.26 325.21 353.27 316.32 349.18 284.33 601.44 557.41 379.25 388.26 310.20 343.30 170.10 447.77 268.11 362.20 357.23 491.37 238.07 389.25 305.16 401.73 338.22 677.37 349.19 359.72 537.88 564.36 513.38 550.63 301.15 581.91 623.45 445.29 320.10 515.87 559.89 352.25 340.18 315.69 423.27 520.33 425.75 344.23 579.93 603.92 601.94 232.12 297.06 406.28 332.33 335.21 321.24 505.31 215.10 267.16 259.15 564.82 542.81 633.34 428.24 268.10 359.71 379.72 391.28 384.21 493.85 377.23 699.38 382.22 414.28 304.27 420.33 300.19 408.31 425.29 279.12 279.13 289.29 293.17 406.22 579.42 569.32 677.87 463.30 483.32 357.24 423.75 360.20 347.21 315.16 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288.27 295.22 291.18 295.23 402.24 401.27 404.22 401.75 405.24 328.23 326.38 336.22 329.20 327.21 329.18 3 333.16 27.20 660.18 482.32 669.96 655.86 498.79 474.31 371.17 365.19 689.49 465.28 497.01 496.68 502.01 482.00 496.32 478.32 655.85 362.70 657.37 461.30 482.28 460.80 371.19 368.32 319.22 317.20 429.31 326.22 565.33 469.36 513.39 472.29 469.79 163.03 265.14 423.74 467.77 354.27 342.09 645.46 357.20 357.21 518.33 516.33 472.33 317.19 252.13 357.19 357.70 469.80 432.27 319.23 318.08 562.36 560.37 540.35 652.42 472.30 358.20 538.36 513.87 361.21 317.17 567.31 358.21 345.22 252.05 514.34 350.19 470.28 516.30 305.30 279.17 441.30 377.25 521.31 450.35 218.13 609.35 435.24 385.27 422.24 305.15 303.16 385.20385.19 492.31 246.12 586.83 379.71 307.18 223.10 606.39 582.39 437.21 382.30 305.26 247.16 247.14 626.43 602.43 558.41 450.36 394.30 584.38 307.19 611.83 245.10 384.71 375.24 721.90 595.38 380.23 419.26 524.36 609.36 489.31 307.17 521.32 433.28 438.79 312.21 385.30 439.27 409.31 387.33 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486.36 486.59 485.94 485.97 486.04 486.05 486.31 485.33 452.98 453.24 452.35 452.37 451.37 451.61 452.24 452.25 452.27 451.25 451.13 451.14 451.19 451.20 451.22 450.30 450.23 449.63 449.29 449.31 449.32 448.28 448.29 448.31 449.18 449.21 449.22 445.20 445.28 444.62 444.79 445.08 445.11 444.27 443.30 443.77 442.56 443.26 442.33 442.20 441.33 441.31 440.91 441.23 441.26 440.36 440.34 439.32 439.77 440.23 440.26 440.32 439.29 439.30 439.24 438.38 438.75 438.78 438.26 437.79 438.20 437.25 436.60 436.61 436.80 422.69 423.23 423.24 422.21 422.23 421.75 409.22 409.23 409.24 409.26 408.34 408.68 409.20 396.23 396.24 396.26 396.27 396.28 396.29 395.27 395.28 395.24 394.76 395.18 394.24 394.28 394.18 394.19 392.32 392.61 392.62 392.64 392.65 392.75 393.18 393.19 392.28 392.15 392.13 391.29 391.33 391.68 391.26 391.22 391.19 390.68 390.73 390.26 390.18 390.21 390.22 388.71 389.08 388.24 387.30 387.25 387.19 387.21 387.22 386.28 386.29 386.30 386.31 386.32 386.21 386.23 385.66 386.11 386.12 386.16 386.17 386.18 386.19 385.24 384.74 384.75 384.77 385.16 384.30 384.25 384.27 384.28 383.66 383.83 383.98 384.17 384.18 384.19 383.24 383.27 383.16 383.17 383.18 382.24 382.25 382.27 382.28 381.31 381.72 381.28 381.29 381.22 380.73 381.18 381.19 380.32 380.33 380.26 380.20 380.21 379.20 379.21 379.22 378.29 378.30 378.31 378.32 378.33 379.15 378.21 378.22 378.23 378.24 377.76 376.34 377.21 376.20 376.21 376.22 376.23 376.24 376.25 376.26 376.27 376.28 376.29 375.32 314.19 314.16 313.24 313.68 313.18 312.25 312.27 312.36 313.13 312.22 312.23 312.15 312.19 310.24 310.26 310.29 310.31 311.15 311.17 311.18 309.24 309.25 310.13 310.14 310.15 310.16 310.18 307.23 307.24 306.18 306.19 306.20 306.22 306.25 305.18 287.18 288.13 288.14 288.16 288.19 287.13 287.14 286.31 286.32 286.18 286.09 286.10 286.14 286.15 285.17 284.62 283.28 284.11 284.12 284.13 284.14 284.15 284.16 284.17 284.29 284.30 283.09 282.20 282.13 282.14 282.15 282.16 281.24 281.13 280.18 280.25 280.28 281.08 279.45 279.46 279.23 279.31 248.12 248.13 245.15 245.11 244.12 244.26 242.14 242.28 243.11 243.12 243.13 243.16 242.12 241.10 240.12 240.14 240.18 239.14 238.08 237.19 235.17 235.18 234.12 234.13 234.14 235.12 230.08 230.09 230.11 227.12 228.11 228.12 228.27 229.10 227.08 226.13 226.17 226.25 226.11 225.07 224.17 223.12 223.13 224.12 222.06 222.10 222.11 221.10 221.11 221.12 219.14 219.16 219.17 219.19 220.10 220.11 219.10 218.03 218.09 218.10 218.11 218.12 217.09 435.27 435.80 436.22 436.25 436.27 436.28 436.29 434.76 435.20 435.22 434.26 434.28 434.29 434.30 433.30 433.31 433.32 433.33 434.20 434.22 433.21 433.22 432.74 420.70 420.30 420.31 419.30 419.69 420.20 420.21 420.25 420.26 420.27 419.19 417.69 418.24 418.27 418.28 418.29 418.30 418.31 417.28 417.29 417.18 416.69 415.29 415.32 415.69 415.78 416.19 416.20 416.22 416.23 416.24 415.21 414.70 414.77 414.78 414.29 413.97 414.19 414.20 413.69 413.23 413.24 413.25 413.21 411.30 412.19 412.20 412.21 412.26 412.30 412.70 412.74 412.75 413.19 411.20 411.22 411.23 411.24 411.26 410.18 410.19 410.21 410.23 0,1 0,0 -0,10 -0,05 0,00 0,05 PC2 (10,48%) 0,10 0,15 0,20 Figura 4.4 - Relação entre a primeira e a segunda componentes principais da matriz Loadings dos íons gerados no modo positivo de ionização. 72 Tabela 4.1 – Valores de Loadings das componentes principais para os íons que se destacaram na análise de PCA. MODO DE IONIZAÇÃO m/z POSITIVO PC1 PC2 +236,0793 +301,1421 +214,0954 +231,1290 +279,1611 +341,0800 +659,1751 +399,2561 +413,2709 +251,1327 +421,2469 +304,3084 0,684454 -0,10349 0,107077 0,325568 0,004969 -0,29972 0,230528 -0,04727 -0,03919 0,215602 -0,03948 -0,00819 0,205420 0,051045 -0,31461 0,191686 -0,07503 0,00456 0,152769 -0,06818 -0,01583 0,140356 -0,06933 -0,06802 0,105705 -0,00692 0,123154 0,097037 -0,02281 0,026246 0,068685 -0,06424 -0,01464 0,059467 -0,04944 -0,08046 PC3 m/z NEGATIVO PC1 PC2 PC3 -311,1768 -325,1923 -339,1999 -297,1509 -279,2350 -281,2493 -212,0733 -248,9611 -199,1728 0,641947 0,438636 0,387058 0,287925 0,149664 0,101099 0,093873 0,088545 0,073619 -0,25577 -0,10195 0,338495 -0,37763 0,437155 0,409953 0,08235 0,020879 0,271134 0,084932 -0,65209 0,076965 0,306287 -0,03529 -0,11074 0,162711 -0,13383 0,187697 Para cada um dos íons destacados na análise de PCA, foi feita a tentativa de elucidação estrutural através do programa Formula Predictor. Para isso, foram inseridos os valores exatos das massas calculadas, além dos seguintes parâmetros fixados como: C: 0 a 50, H: 0 a 100, N: 0 a 20, O: 0 a 20, F: 0 a 20 e P: 0 a 3, DBE: -0,5 a 50 (faixa padrão do equipamento). Através desses cálculos, são geradas fórmulas elementares possíveis para cada um dos compostos desconhecidos. Em seguida, estruturas químicas para cada uma das fórmulas resultantes foram pesquisadas nas bases de dados NIST e Merck Index. As elucidações estruturais correspondentes a cada um dos íons destacados são mostradas abaixo. 4.2.1. Íons Deprotonados de m/z = -311,1768; -325,1923; -339,1999; -297,1509 Os íons negativos com os quatro maiores valores de PC1 apresentam valores de m/z iguais a -311,1768; -325,1923; -339,1999 e -297,1509. Experimentos MS2 com colisão induzida por argônio desses íons foram feitos, com o intuito de se obter os padrões de fragmentação, e se revelaram iguais aos quatro íons. Os espectros de massa desses íons, nos modos MS1 MS2 , são mostrados na Figura 4.5. 73 4.0 311.1768 (a) 3.0 2.0 1.0 0.0 50.0 75.0 4.0 3.0 (b) 100.0 125.0 150.0 175.0 200.0 225.0 250.0 275.0 300.0 325.0 350.0 375.0 m/z 325.1923 2.0 1.0 0.0 25 1.5 50 75 100 125 150 175 200 225 250 275 m/ 339.1999 (c) 1.0 0.5 0.0 300.0 325.0 350.0 375.0 400.0 425.0 450.0 475.0 500.0 297.1509 1.00 (d) 0.75 0.50 0.25 0.00 50.0 1.25 1.00 75.0 100.0 125.0 150.0 175.0 200.0 225.0 250.0 275.0 300.0 325.0 350.0 375.0 m/z 183.0105 197.0260 (e) 0.75 0.50 0.25 0.00 50.0 75.0 100.0 125.0 150.0 175.0 200.0 225.0 250.0 275.0 300.0 325.0 350.0 375.0 m/z Figura 4.5 - Espectros de massas dos íons moleculares deprotonados do modo MS1 (a) m/z=-311,1768; (b) m/z=-325,1923; (c) m/z=-339,1999; (d) m/z=-297,1509; e (e) espectro de massas do modo MS2, comum às quatro substâncias. O software utilizado revelou que, para os quatro íons, a relação isotópica entre o íon molecular e seu isótopo acrescido de duas unidades de massa atômica (M-H+2) é característica da presença de um átomo de enxofre (aproximadamente 4%). O espectro 74 m/z resultante de experimentos MS2 com colisão induzida a argônio mostra um fragmento de massa exata igual a m/z -183,0167 (fórmula calculada igual a C8H8SO3-), bem como um fragmento de m/z -197,0274 (C9H10SO3-), possivelmente resultados da fragmentação de diferentes isômeros de cadeia (Figura 4.6). O cromatograma específico dessas substâncias (Figura 4.7) revela que essas substâncias não foram completamente resolvidas pela précoluna cromatográfica. n(H2C) H3C H C (CH2)n' CH3 SO3- Figura 4.6 - Fragmentações provenientes dos íons investigados. 1.75 1.50 1.25 297.1509 311.1768 325.1923 339.1999 1.00 0.75 0.50 0.25 0.00 5.0 5.5 6.0 6.5 7.0 7.5 8.0 8.5 9.0 Figura 4.7 - Cromatograma específico dos íons de m/z=311,1768; 325,1923; 339,1999 e 297,1509. A relação isotópica e os fragmentos característicos resultantes dos experimentos MS2, foram inseridos no programa Formula Predictor, que calculou as possíveis fórmulas moleculares referentes aos íons desconhecidos. O resultado é mostrado na Tabela 4.2. 75 Tabela 4.2 - Resultados gerados pelo programa Formula Predictor, na busca por fórmulas correspondentes aos íons 311,1768; 325,1923; 339,1999 e 297,1509. Íon Deprotonado m/z=311,1768 Fórmula Proposta (M) C20 H24 O3 C13 H28 O8 C17 H28 O3 S Íon m/z medido m/z calculado Diferença (mDa) [M-H] - 311,1768 311,1653 11,5 [M-H] - 311,1768 311,1711 5,7 [M-H] - 311,1768 311,1686 8,2 Íon Deprotonado m/z=325,1923 Fórmula Proposta (M) C21 H26 O3 C18 H30 O3 S Íon m/z medido m/z calculado Diferença (mDa) [M-H] - 325,1923 325,1809 [M-H] - 325,1923 325,1843 Íon Deprotonado m/z=339,1999 11,4 8,0 Fórmula Proposta (M) C19 H32 O3 S C15 H32 O8 C22 H28 O3 [M-H] [M-H] [M-H] - 339,1999 339,1999 339,1999 339,1999 339,2024 339,1966 0,0 -2,5 3,3 C12 H36 O8 S [M-H] - 339,1999 339,2058 -5,9 Íon m/z medido m/z calculado Diferença (mDa) Íon Deprotonado m/z=297,1509 Fórmula Proposta (M) C16 H26 O3 S C15 H32 O8 C22 H28 O3 Íon [M-H] [M-H] [M-H] - m/z medido m/z calculado Diferença (mDa) 297,1509 297,1509 297,1509 297,1530 297,1496 297,1555 -2,1 1,3 -4,6 A busca por essas fórmulas nos bancos de dados disponíveis resultou na elucidação das mesmas. As quatro correspondem a homólogos de LAS, de 11, 12, 13 e 10 átomos de carbono na cadeia alquídica (C11-LAS, C12-LAS, C13-LAS e C10-LAS, respectivamente). 4.2.2. Íon Deprotonado de m/z = -279,2350 O íon negativo que, na análise de PCA, obteve o quinto maior valor entre as PC1, apresentou m/z=-279,2350. Os espectros de massas, resultantes de experimentos MS1 e MS2 (com fragmentação por colisão induzida) estão apresentados na Figura 4.8. 76 279.2350 1.00 (a) 0.75 0.50 0.25 255.2340 0.00 100 200 300 400 500 600 700 800 900 m/z 3. 2. 261.2139 (b) 2. 1. 1. 0. 0. 250. 252. 255. 257. 260. 262. 265. 267. 270. 272. 275. 277. 280. 282. 285. 287. Figura 4.8 - (a) Espectro de massas do íon molecular deprotonado, com m/z=-279,2350; (b) espectro de massas dos fragmentos gerados por colisão induzida. O espectro de massas gerado pelo experimento MS2 mostra a perda de uma molécula de água (18,021 u.m.a) através da colisão induzida. Essa fragmentação é também observada por Kerwin et al. (1995), que cita que em ácidos graxos com até duas insaturações, a fragmentação principal é a perda de água do grupo carboxila. A fragmentação proposta é representada na Figura 4.9. Figura 4.9 - Fragmentação proposta para o íon m/z=-279,2350. O programa Formula Predictor calculou, apenas com os dados supracitados, as possíveis estruturas moleculares para o composto, mostradas na Tabela 4.3. 77 m/ Tabela 4.3 - Possíveis composições elementares das estruturas moleculares referentes ao íon negativo de m/z igual a 279,2350. FÓRMULA (M) ÍON m/z MEDIDO m/z CALCULADO DIFERENÇA (mDa) C11 H30 N5 O3 [M-H] - 279,2350 279,2276 7,4 C12 H33 N4 O P [M-H] - 279,2350 279,2319 3,1 C16 H30 N3 O [M-H] - 279,2350 279,2316 3,4 C14 H35 N O2 P [M-H] - 279,2350 279,2333 1,7 C18 H32 O2 [M-H] - 279,2350 279,2330 2,0 Após a busca nos banco de dados disponíveis, a última fórmula mostrada na Tabela 4.3 (C18H32O2) foi selecionada, correspondente ao ácido linoléico. 4.2.3. Íon Deprotonado de m/z = -281,2493 Um dos íons a serem identificados apresenta relação massa/carga igual a -281,2493. A Figura 4.10 mostra os espectros obtidos nas análises. 2.5 2.0 281.2493 (a) 1.5 1.0 0.5 0.0 275 276 277 278 279 280 281 282 283 284 285 286 287 288 289 m/z 1.25 1.00 (b) 263.2322 0.75 0.50 0.25 110.07 267.1988 0.00 110 120 130 140 150 160 170 180 190 200 210 220 230 240 250 260 m/z Figura 4.10 - (a) Espectro de massas do íon molecular deprotonado, com m/z=-281,2493; (b) espectro de massas dos fragmentos gerados por colisão induzida. O espectro mostrado na Figura 4.10b mostra fragmentos com m/z iguais a -110,0751 (fragmento não identificado); -263,2322 (referente a perda de água) e -267,1988 (referente a perda de um fragmento CH2), de acordo com a Figura 4.11. 78 O O- -H2O -CH2 - O O O- Figura 4.11 - Fragmentações propostas obtidas nos experimentos MS2 provenientes do íon m/z=-281,2493. Através desses dados, o programa calculou as possíveis fórmulas para o composto. Com os parâmetros-padrão estabelecidos, o calculo feito pelo software resultou em 10 compostos, mostrados na Tabela 4.4. Tabela 4.4 - Possíveis composições elementares das estruturas moleculares referentes ao íon negativo de m/z igual a -281,2493. FÓRMULA (M) ÍON m/z MEDIDO m/z CALCULADO DIFERENÇA (mDa) C13 H36 N3 O S [M-H] - 281,2493 281,2506 -1,3 C14 H37 N O2 P [M-H] - 281,2493 281,2489 0,4 C18 H34 O2 [M-H] - 281,2493 281,2486 0,7 C12 H35 N4 O P [M-H] - 281,2493 281,2476 1,7 C16 H32 N3 O [M-H] - 281,2493 281,2473 2,0 C15 H38 O2 S [M-H] - 281,2493 281,2520 -2,7 C15 H40 P2 [M-H] - 281,2493 281,2532 -3,9 C15 H39 P S [M-H] - 281,2493 281,2437 5,6 C11 H32 N5 O3 [M-H] - 281,2493 281,2432 6,1 C12 H34 N4 O3 [M-H] - 281,2493 281,2558 -6,5 Uma extensa busca foi feita nos bancos de dados, que encontrou a fórmula C18H34O2 como a ideal, a qual caracteriza o ácido oléico. 4.2.4. Íon Deprotonado de m/z = -212,0733 O ânion de relação massa/carga -212,0733 foi destacado na análise de PCA. O resultado das análises referente a ele são apresentados na Figura 4.12. 79 4.0 (a) 3.5 212.0733 3.0 2.5 2.0 226.9790 1.5 1.0 199.1709 0.0 200.0 205.0 210.0 7.0 6.0 241.1805 213.0751 0.5 215.0 220.0 225.0 230.0 235.0 240.0 m/z 325.0 m/z 148.1165 (b) 5.0 4.0 3.0 2.0 1.0 0.0 50.0 75.0 100.0 125.0 150.0 175.0 200.0 225.0 250.0 275.0 300.0 Figura 4.12 - (a) Espectro de massas do íon molecular deprotonado, com m/z=-212,0733; (b) espectro de massas dos fragmentos gerados por colisão induzida. O espectro de massas no modo MS1 mostra que vários outros íons estão presentes no espectro do íon pré-selecionado. Provavelmente, isso ocorre devido à cromatografia não satisfatória nesse instante, uma vez que esses íons podem estar relacionados a outros compostos que, eventualmente, não foram resolvidos apenas com a pré-coluna usada nos experimentos. A Figura 4.12b mostra que a fragmentação do íon molecular resultou apenas no fragmento de m/z 148,1165. O software de cálculo estrutural indica que esse fragmento pode equivaler à estrutura do fragmento C8H4O3-, característico da classe dos ftalatos. Em relação ao cálculo da estrutura por completa, o programa não retornou qualquer fórmula quimicamente possível: foram propostas nove fórmulas (Tabela 4.5) e a pesquisa feita nos bancos de dados não retornou resultado positivo sobre qualquer uma delas. Essas observações levam a crer que esse composto é da classe dos ftalatos, ou um subproduto de degradação deles. Entretanto não foi possível apenas com a presente técnica, desvendar a estrutura dessa substância por completo. 80 Tabela 4.5 - Possíveis composições elementares das estruturas moleculares referentes ao íon negativo de m/z igual a 212,0733. FÓRMULA (M) ÍON m/z MEDIDO m/z CALCULADO DIFERENÇA (mDa) C9 H4 N2 O3 P2 [M-H] - 212,0733 212,0751 -1,8 C7 H2 N5 O2 P2 [M-H] - 212,0733 212,0737 -0,4 C5 H7 N3 O3 P3 [M-H] - 212,0733 212,0789 -5,6 C13 H N O3 P [M-H] - 212,0733 212,0717 1,6 4.2.5. Íon Deprotonado de m/z = -248,9611 Um dos compostos destacados na análise de PCA apresenta m/z exata igual a -248,9611. Seus espectros, resultados das análises nos modos MS1 e MS2 são apresentados na Figura 4.13. 1.0 (a) 0.7 248.9611 0.5 0.2 0.0 200. 205. 210. 215. 220. 225. 230. 235. 240. 245. 250. 255. 260. 265. 270. 275. 280. 285. 290. 295. m/ 154.9736 2.0 (b) 1.5 152.9787 1.0 204.9694 0.5 112.9905 0.0 50.0 75.0 100.0 125.0 150.0 175.0 200.0 225.0 250.0 275.0 m/z Figura 4.13 - (a) Espectro de massas do íon molecular deprotonado, com m/z=-248,9611; (b) espectro de massas dos fragmentos gerados por colisão induzida. As fragmentações observadas no modo MS2 serviram como dados de entrada no programa Formula Predictor, o qual gerou os seguintes resultados como prováveis fórmulas elementares (Tabela 4.6). 81 Tabela 4.6 - Possíveis composições elementares das estruturas moleculares referentes ao íon negativo de m/z igual a 248,9611. FÓRMULA (M) ÍON m/z MEDIDO m/z CALCULADO DIFERENÇA (mDa) C9 H4 N2 O3 P2 [M-H] - 248,9611 248,9624 -1,3 C7 H2 N5 O2 P2 [M-H] - 248,9611 248,9611 0,0 C5 H7 N3 O3 P3 [M-H] - 248,9611 248,9627 -1,6 C13 H N O3 P [M-H] - 248,9611 248,9621 -1,0 C8 H3 N4 O2 P S [M-H] - 248,9611 248,9642 -3,1 C4 H6 N5 O2 P2 S [M-H] - 248,9611 248,9645 -3,4 C6 H9 N2 O P3 S [M-H] - 248,9611 248,9576 3,5 C12 H2 N3 P2 [M-H] - 248,9611 248,9651 -4,0 C10 H6 N O P2 S [M-H] - 248,9611 248,9573 3,8 A pesquisa pelas estruturas correspondentes às fórmulas foi realizada nos bancos de dados disponíveis, entretanto nenhuma delas gerou um resultado satisfatório. Portanto, conclui-se que as informações disponíveis não foram suficientes para a elucidação estrutural dessa substância. 4.2.6. Íon Deprotonado de m/z = -199,1728 O valor de m/z de um dos íons destacados na análise de PCA foi determinado como sendo igual a -199,1728, e os espectros resultantes das análises espectrométricas nos modos MS1 e MS2 são ilustrados na Figura 4.14. 199.1728 (a) 5.0 0.0 50.0 75.0 100.0 125.0 150.0 175.0 200.0 225.0 250.0 275.0 300.0 325.0 350.0 375.0 m/z 175.0 200.0 225.0 250.0 275.0 300.0 325.0 350.0 375.0 m/z 133.0662 1.0 (b) 0.5 0.0 50.0 75.0 100.0 125.0 150.0 Figura 4.14 - (a) Espectro de massas do íon molecular deprotonado, com m/z=-199,1728; (b) espectro de massas dos fragmentos gerados por colisão induzida. Inserindo as informações espectrométricas do íon molecular, bem como a fragmentação observada na Figura 4.14b no programa Formula Predictor, obtiveram-se, como resultado, apenas duas fórmulas elementares possíveis, de acordo com a Tabela 4.7. Não foi possível 82 predizer, entretanto, a fórmula elementar exata para o fragmento gerado na colisão induzida por argônio, de m/z igual a -133,0662. Tabela 4.7 - Possíveis composições elementares das estruturas moleculares referentes ao íon negativo de m/z igual a 199,1728. FÓRMULA (M) ÍON m/z MEDIDO m/z CALCULADO DIFERENÇA (mDa) C10 H22 N3 O [M-H] - 199,1728 199,1690 3,8 C12 H24 O2 [M-H] - 199,1728 199,1704 2,4 A busca por essas fórmulas nos bancos de dados da NIST e Merck Index indicou a estrutura como o ácido láurico (C12H24O2). A tentativa de elucidação estrutural dos micropoluentes destacados pela análise de componentes principais no modo de ionização positiva não gerou nenhum resultado quimicamente possível. As estruturas do modo de ionização negativa estão apresentadas na Figura 4.15. 83 NOME DO FÓRMULA MASSA MOLAR COMPOSTO MOLECULAR EXATA (u.m.a) C10-LAS C16H25SO3H 298,1603 C11-LAS C17H27SO3H C12-LAS C18H29SO3H 326,1916 C13-LAS C19H31SO3H 340,2072 ÁCIDO LÁURICO C12H2402 ESTRUTURA 312,1759 O 200,1776 OH ÁCIDO LINOLEICO C18H32O2 280,2402 282,2589 ÁCIDO OLEICO C18H34O2 FTALATO N.A. 213,0811 N.A. N.A. 249,9689 N.A. SUBSTÂNCIA DESCONHECIDA Figura 4.15 - Dados sobre as substâncias elucidadas. N.A. – não se aplica. 84 4.3. Monitoramento dos Compostos Elucidados no Sistema UASB-FBP Uma vez conhecida a estrutura dos compostos destacados na análise de PCA, é de interesse conhecer como esses poluentes se comportam durante o tratamento pelo qual foram submetidos. Para isso, foram feitos gráficos boxplot, de cada ponto de coleta, em relação a cada um dos poluentes. 4.3.1. Alquilbenzeno Sulfonados Lineares (LAS) O comportamento dos LAS identificados na ETE é mostrado na Figura 4.16. 8 3 C 1- Nov embro 2007 4 C 2- Nov embro 2007 5 C 1- Nov embro 2007 6 C2- Nov embro 2007 C 1- Nov embro 2007 7 2 1 0 Origem A B C1 C2 C10-LAS A B C1 C2 C11-LAS A B C1 C2 C12-LAS A B C1 C2 C13-LAS Figura 4.16 - Comportamento dos LAS durante o tratamento estudado. Através da análise da Figura 4.16 observa-se comportamento similar de todos os poluentes durante o tratamento. A biodegradação anaeróbia não é efetiva para remover esses poluentes, que se concentra no lodo presente no reator UASB. Por outro lado, a etapa aeróbia é capaz de degradar e remover de maneira eficaz o LAS do efluente sanitário, nas condições operacionais da ETE em estudo. A degradação aeróbia dos LAS inicia com a formação de carboxilados sulfofenílicos como intermediários da biodegradação, resultando, então na perda de atividade interfacial e de toxicidade em organismos presentes no meio ambiente. A biodegradação prossegue com a clivagem do anel aromático e a completa conversão do LAS e intermediários em 85 substâncias inorgânicas (H2O, CO2, Na2SO4) e a incorporação de seus constituintes à biomassa dos microorganismos (Tavares, 2008). Tavares (2008) pesquisou a degradação dos LAS no mesmo sistema de tratamento aqui estudado, resultados dos quais estão de acordo com os apresentados pela autora, que usou o método analítico de substâncias ativas ao azul de metileno para quantificar os LAS presentes em amostras afluentes e efluentes ao reator UASB. A autora acrescenta que o aumento de concentração de LAS após o reator UASB seria devido à superestimação das concentrações dos surfactantes aniônicos pelo método por ela utilizado, uma vez que o mesmo está sujeito a interferentes presentes na própria amostra. Uma vez que esse aumento de concentração foi percebido também na análise por cromatografia líquida acoplada à espectrometria de massas aqui apresentada, e tendo em vista que esse método é seletivo aos LAS e está livre das interferências supracitadas, outros fenômenos parecem explicar essa observação. Hipoteticamente, pensa-se que o lodo presente no reator UASB, uma vez já saturado desses surfactantes, libera, por lixiviação, esses compostos em seu efluente, o que culminaria, então no aumento da concentração de LAS observado. O estudo de Berna et al. (1988) cita ainda que é observada a degradação anaeróbia parcial do LAS, no entanto, usando-se os tempos de detenção hidráulica normalmente empregados nos reatores UASB (sete a nove horas) a degradação desses compostos não é significativa. 4.3.2. Demais Compostos Destacados Pela PCA no Modo Negativo de Ionização O perfil de degradação dos demais micropoluentes identificados no modo negativo de ionização pode ser visto na Figura 4.17. 86 1 C1- Outubro 2007 B- Outubro 2007 A- Outubro 2007 C2- Outubro 2007 2 B- Agosto 2007 3 A - Nov embro 2007 Data 4 C1- Fev ereiro 2007 B- Maio 2007 5 C1- Fev ereiro 2007 6 0 Origem A Á d ci o lá B C 1 C2 i co ur A Ác i do lin o B C1 C2 ic o le A id Ác o o B C1 C 2 ic o le F l ta at o o nã A i n de t if B C1 C2 do ic a o Nã A i n de t if B C1 C2 do ic a Figura 4.17- Perfis de monitoramento dos ácidos graxos láurico, linoléico e oléico, de um ftalato e um composto não identificado, presentes no esgoto doméstico. O ácido láurico, ou ácido dodecanóico, mostrou-se recalcitrante durante o tratamento combinado, uma vez que as medianas das concentrações relativas permaneceram praticamente constantes após os tratamentos anaeróbio e aeróbio. O ácido láurico é suspeito de apresentar propriedades bactericidas e, sendo tóxico às bactérias presentes no sistema de tratamento, a sua passagem incólume pelo sistema é explicada. O material de preenchimento dos filtros biológicos percoladores não provocou diferença significativa na remoção do composto. O ácido oléico está presente em cosméticos como sabonetes, bronzeadores e protetores solares, ao passo que o linoléico é encontrado em carnes e produtos lácteos. Esses compostos parecem não serem tóxicos aos microorganismos degradadores de matéria orgânica, uma vez que o perfil de degradação indica biodegradabilidade nos reatores anaeróbio e aeróbio. O ftalato e o composto não identificado se mostraram recalcitrante ao tratamento, tendo em vista que suas medianas se mostraram praticamente constantes. 87 4.3.3. Compostos Destacados Pela PCA no Modo de Ionização Positivo Os íons monitorados pelo espectrômetro de massas no modo positivo não puderam ter suas estruturas elucidadas, uma vez que o software de identificação retornou inúmeros resultados possíveis. No entanto, foi possível traçar o perfil de cada um deles no sistema de tratamento em questão. Esses perfis são mostrados nas Figuras 4.18, 4.19 e 4.20. 9 8 7 6 B- Abril 2007 5 B- A bril 2007 4 3 2 1 0 Origem A B C1 C2 214,0954 A B C1 C2 231,1290 A B C1 C2 236,0793 A B C1 C2 251,1327 Figura 4.18 - Perfis de monitoramento de íons positivos de estruturas não elucidadas 214,0954; 231,1290; 236,0793 e 251,1327, presentes no esgoto doméstico. 88 7 6 5 4 3 2 1 0 Origem A B C1 C2 279,1611 A B C1 C2 301,1421 A B C1 C2 304,3084 A B C1 C2 341,0800 Figura 4.19 - Perfis de monitoramento de íons positivos de estruturas não elucidadas 279,1611; 301,1421; 304,3084; 341,0800, presentes no esgoto doméstico. 4 1 B- Outubro 2007 A- Janeiro 2008 A- Julho 2007 2 A - Janeiro 2008 3 0 Origem A B C1 C2 399,2561 A B C1 C2 413,2709 A B C1 C2 421,2469 A B C1 C2 659,1751 Figura 4.20 - Perfis de monitoramento de íons positivos de estruturas não elucidadas 399,2561; 413,2709; 421,2469 e 659,1751, presentes no esgoto doméstico. 89 O comportamento dessas substâncias no sistema de tratamento mostra, de maneira geral, a possível síntese dos mesmos nos reatores. Todos os compostos apresentaram maior concentração dos pontos C1 e/ou C2, em relação ao B, o que indica que esses íons são sintetizados no filtro biológico percolador. Assim sendo, é provável que sejam subprodutos de degradação de outros compostos, não completamente mineralizados pela ETE. 4.4. Compostos-Alvo Encontrados Durante o Tratamento Biológico de Esgotos Sanitários Quatro amostras, cada uma coletada em um dos pontos do sistema de tratamento (mês de janeiro de 2008), foram analisadas no modo MS2 do espectrômetro de massas, objetivandose encontrar alguns micropoluentes previamente selecionados (Tabela 4.8 e Figura 4.21), e avaliar como se comportam durante o tratamento pelo qual foram submetidos através de uma análise semi-quantitativa (quantificação relativa ao padrão interno). Os compostos dibutilftalato, bisfenol A, nonilfenol e bezafibrato foram escolhidos como os compostosalvo para essa pesquisa, uma vez que são freqüentemente reportados na literatura, seja devido ao potencial risco decorrente da exposição (ex. bezafibrato), à elevada concentração com que ocorrem nas águas naturais (ex. bisfenol e nonilfenol) ou à freqüência com que ocorrem em matrizes ambientais (ex. dibutilftalato). Apenas as amostras coletadas em janeiro de 2008, as quais foram escolhidas ao acaso, foram analisadas neste estudo, devido ao curto período de tempo para finalização do presente projeto de pesquisa e indisponibilidade integral do instrumento analítico. A cada uma delas foi adicionada a mesma quantidade de um padrão interno, a fim de corrigir as eventuais variações de resposta instrumental entre as diferentes amostras. Uma vez que o resultado dessa correção (quociente da divisão da área do analito pela área do padrão interno) é diretamente proporcional à concentração daquele analito em um dado instante do tratamento; logo, através dele, é possível acompanhar a variação da concentração do poluente ao longo do tratamento, caracterizando uma análise semiquantitativa. Para cada uma das substâncias pesquisadas nesse experimento, apresenta-se aqui, a caráter ilustrativo, o cromatograma e espectro de massas apenas da amostra, que foi coletada no ponto A (esgoto bruto) no mês de janeiro de 2008. Isso foi feito, uma vez que os perfis 90 obtidos são semelhantes para outras amostras (coletadas em outros pontos e em outros meses). Tabela 4.8 - Composto-alvo selecionados para o estudo de comportamento de degradação na ETE. Amostra Dibutilftalato Bisfenol A Nonilfenol Bezafibrato A-Janeiro 2008 100,0% 100,0% 15,35% 100,0% B-Janeiro 2008 93,10% 84,10% 34,90% 81,93% C1-Janeiro 2008 79,31% 7,630% 100,0% 34,67% C2-Janeiro 2008 55,17% 8,272% 98,60% 38,05% Substância Dibutilftalato Bisfenol A Nonilfenol Bezafibrato Estrutura Molecular Figura 4.21- Estruturas moleculares dos compostos-alvo. 4.4.1. Dibutilftalato O dibutilftalato é uma substância amplamente utilizada na indústria. Dentre suas principais aplicações, destacam-se os ramos de tintas para impressoras, adesivos, cosméticos, como o esmalte para unhas, e plastificante para polímeros, sobretudo o PVC, sendo essa a utilização responsável por 75% de seu consumo. A literatura reporta que o dibutilftalato está associado ao desenvolvimento anormal do sistema reprodutivo humano (Colon et al., 2000) e disfunções metabólicas no fígado, coração, cérebro, além de afetar o nível de lipídeos no sangue (Bell et al., 1982). Esses efeitos adversos justificam a preocupação com o seu comportamento durante o tratamento de efluentes domésticos, bem como a eliminação desse poluente do meio ambiente. O espectro de massas do dibutilftalato é mostrado na Figura 4.22, e a Figura 4.23 demonstra o comportamento da substância ao longo do sistema de tratamento em estudo. 91 3.5 277.1494 3.0 (a) 2.5 2.0 1.5 1.0 0.5 0.0 0.0 2.5 5.0 7.5 10.0 12.5 15.0 17.5 9.0 8.0 (b) 277.1494 7.0 6.0 5.0 4.0 3.0 2.0 1.0 0.0 279.1471 272.5 275.0 277. 280.0 285.2031 282.5 285.0 287. 290.0 292.5 295.0 297. 300.0 302.5 305.0 Figura 4.22 - (a) cromatograma e (b) espectro de massas do dibutilftalato, modo MS1, mostrando o íon molecular do poluente (m/z=277,1494). Os outros íons referem-se a compostos não identificados, que coeluiram com o dibutilftalato ao longo da cromatografia. Através da análise do cromatograma e do espectro de massas percebe-se que vários outros poluentes coeluiram juntamente com o composto-alvo. Certamente, o uso de uma coluna cromatográfica adequada promoveria uma melhor separação entre o dibutilftalato e as demais substâncias que com ele coeluem, contribuindo para a redução do efeito supressivo da matriz ambiental. 92 m/z Degradação do dibutilftalato ao longo do tratamento 100,00% 90,00% 80,00% 70,00% 60,00% 50,00% 40,00% 30,00% 20,00% 10,00% 0,00% A-Janeiro 2008 B-Janeiro 208 C1-Janeiro 2008 C2-Janeiro 2008 Figura 4.23 - Perfil da concentração do dibutilftalato relativa à do padrão interno, em diferentes pontos da ETE, onde: A- esgoto bruto (entrada do UASB); B- saída do UASB/entrada do FBP; C1- saída do FBP (conduíte); C2- saída do FBP (pedra britada). O perfil de degradação do dibutilftalato ao longo do tratamento indica baixa eficiência do sistema na remoção desse poluente. Apenas 20,69% da concentração do poluente que entrou no sistema foi removido pelo FBP com leito em conduíte (ponto C1) e 44,83% com o leito em pedra britada (C2). O tratamento anaeróbico demonstrou-se, também, pouco eficiente, uma vez que promoveu a redução de apenas 6,90%. Uma hipótese válida é que o dibutilftalato, supostamente presente nas aparas de conduíte, poderia ser lixiviado e incorporar-se ao esgoto tratado, o que aumentaria a concentração desse poluente nesse ponto do tratamento, contribuindo, assim, para a percepção errônea de menor remoção quando comparado ao filtro preenchido com pedra britada. O baixo percentual de remoção observado demonstra que o sistema em estudo não é eficaz na degradação do dibutilftalato, permitindo que o mesmo chegue aos corpos receptores nos quais os efluentes desse sistema são lançados. Uma vez que é uma substância de potencial risco à saúde e ao meio ambiente, suspeita de provocar danos ao sistema endócrino de seres a ela expostos (ex. anfíbios e peixes) por um longo período de tempo e baixa concentração, é preocupante que existam corpos d’água potáveis que contenham esse poluente, mesmo em baixas concentrações. 93 4.4.2. Bisfenol A O bisfenol A é uma substância orgânica amplamente utilizada na indústria de transformação. Produtos contendo essa substância estão disponíveis no mercado mundial a mais de cinco décadas, e suas utilizações são inúmeras, as quais abrangem a síntese de poliésteres, polissulfonas, policetonas, policarbonatos (utilizados na fabricação de artigos esportivos, lentes, dispositivos eletrônicos, CD’s e DVD’s), garrafas e resinas epóxi (revestimento de enlatados), antioxidante em plastificantes e já foi usado como fungicida. A produção mundial de bisfenol A em 2003 foi estimada em dois milhões de toneladas (Lang et al., 2008). Esse poluente apresenta baixa toxicidade (DL50 igual a 3250mg/Kg para ratos), entretanto, a longo prazo, interfere no sistema endócrino, onde mimetiza hormônios naturais dos organismos, causando efeitos adversos, como doenças cardiovasculares, diabetes tipo 2 e obesidade, e anomalias nas enzimas do fígado, e até mesmo desenvolvimento de câncer (principalmente câncer de mama e próstata), quando acontece exposição por tempo prolongado (Lang et al., 2008, West et al., 2001). É conhecido que o bisfenol A pode ser lixiviado da camada plástica que existe nas latas de alimentos e de artefatos de policarbonato quando lavados com produtos ácidos ou líquidos a altas temperaturas, levando à exposição humana via oral, respiratória ou cutânea (Lang et al., 2008). O cromatograma no modo MS2, bem como o espectro de massas do íon molecular do poluente são mostrados na Figura 4.24, enquanto o perfil de remoção do bisfenol A é ilustrado na Figura 4.25. 94 6.0 227.1060 5.0 (a) 4.0 3.0 2.0 1.0 0.0 0.0 9.0 2.5 5.0 7.5 10.0 12.5 15.0 17.5 (b) 8.0 227.1060 7.0 6.0 5.0 4.0 3.0 2.0 1.0 0.0 220.0 222.5 225.0 227.5 230. 232.5 235.0 237.5 240.0 242.5 245.0 247.5 250.0 252. 255.0 257.5 260.0 262.5 265.0 m/z Figura 4.24 - (a) cromatograma e (b) espectro de massas do íon molecular do bisfenol A. O cromatograma mostra aparentemente que não houve co-eluição do bisfenol A com qualquer outro composto de relação m/z semelhante, indicando que a cromatografia realizada apenas usando a pré-coluna é satisfatória na análise desse composto. O espectro de massas mostra a presença de picos de intensidade menor que a do íon referente ao poluente. Provavelmente, esses picos decorrem do ruído causado pela matriz complexa das amostras de esgoto. Degradação do bisfenol A durante o tratamento 100,0% 90,0% 80,0% 70,0% 60,0% 50,0% 40,0% 30,0% 20,0% 10,0% 0,0% A-Janeiro 2008 B-Janeiro 208 C1-Janeiro 2008 C2-Janeiro 2008 Figura 4.25 - Perfil de degradação do bisfenol A no sistema de tratamento de efluentes estudado. A- esgoto bruto (entrada do UASB); B- saída do UASB/entrada do FBP; C1saída do FBP (conduíte); C2- saída do FBP (pedra britada). 95 O tratamento anaeróbio se demonstrou pouco eficaz na eliminação do poluente (15,9%), ao passo que a degradação aeróbia reduziu a concentração de bisfenol A em 92,37% e 91,73%, respectivamente para o filtro preenchido com pedra britada e aparas de conduíte. A pequena diferença no percentual de degradação entre as duas seções do filtro biológico percolador (1,0%) indica que o material de preenchimento não influencia na remoção do poluente. Da mesma forma, West et al. (2001) reportam a rápida biodegradabilidade aeróbia do poluente (60% da concentração inicial reduzida, em oito dias) em testes de escala em laboratório, e Dorn et al. (1987) reporta que a mineralização do bisfenol A atingiu 50% no período de quatro dias, em amostras reais de efluentes e seus corpos d’água receptores. Uma vez comprovada a rápida biodegradação do bisfenol A em um sistema aeróbio de tratamento, é de se esperar que o descarte de efluentes não deva ser uma fonte tão importante dessa substância quanto alimentos enlatados e artefatos de plástico, os quais incluem esse plastificante em sua formulação. De qualquer forma, organismos que entram em contato com o bisfenol A continuamente e em baixas concentrações são susceptíveis aos seus efeitos adversos. 4.4.3. Nonilfenol O nonilfenol é um composto orgânico pertencente ao amplo grupo dos alquilfenóis. É produzido como subproduto da produção de surfactantes polietoxilados, usados na manufatura de lã, metais, plásticos, pesticidas, alguns detergentes e cosméticos. Por definição, os surfactantes são substâncias que apresentam, em sua estrutura molecular, uma cadeia alquídica (fração apolar) e uma fração polar, característica que confere ampla distribuição da substância em um sistema de tratamento de efluentes e no meio ambiente: a fração polar possibilita a solubilização em águas residuais e em corpos receptores, enquanto a fração apolar permite o acúmulo em sedimentos no leito de rios e no lodo dos sistemas de tratamentos biológicos. Um dos precursores do nonilfenol, o nonilfenol polietoxilado, é degradado prontamente ao atingir o sistema biológico de tratamento de efluentes. O mecanismo de degradação desse surfactante sob condições aeróbias (Figura 4.26) implica a oxidação da função álcool a 96 ácido carboxílico, seguido pela clivagem de unidades de ácido acético da fração etoxilada (Teurneau, 2004). A completa mineralização do nonilfenol, incluindo a quebra de seu anel aromático, foi reportada por Ying et al. (2002) como acontecendo apenas em condições aeróbias. Figura 4.26 - Metabolismo microbiano aeróbio dos alquilfenóis etoxilados. Adaptado de: Ahel et al., 1994. O nonilfenol, bem como outros alquilfenóis etoxilados, interfere no sistema endócrino de animais e seres humanos expostos a eles no meio ambiente, principalmente em rios que continuamente recebem o efluente de ETEs (Ahel et al., 1994; Moreira, 2008). 97 O cromatograma e espectro de massas do íon molecular do nonilfenol gerados nesse experimento são ilustrados na Figura 4.27, e a Figura 4.28 mostra o perfil desse poluente ao longo do tratamento estudado. 1.75 219.1731 (a) 1.50 1.25 1.00 0.75 0.50 0.25 0.00 0.0 2.5 4.5 7.5 10.0 12.5 15.0 17.5 219.1731 5.5 5.0 5.0 (b) 4.0 3.5 3.0 2.5 2.0 1.5 1.0 0.5 0.0 217.5 220.0 222.5 225.0 227.5 230.0 232.5 235.0 237.5 m/z Figura 4.27 - (a) cromatograma e (b) espectro de massas do nonilfenol. Perfil do nonilfenol durante o tratamento 100,00% 90,00% 80,00% 70,00% 60,00% 50,00% 40,00% 30,00% 20,00% 10,00% 0,00% A-Janeiro 2008 B-Janeiro 208 C1-Janeiro 2008 C2-Janeiro 2008 Figura 4.28 - Perfil do comportamento do nonilfenol no sistema experimental UASB-FBP, onde: A- esgoto bruto (entrada do UASB); B- saída do UASB/entrada do FBP; C1- saída do FBP (conduíte); C2- saída do FBP (pedra britada). 98 A cromatografia, realizada apenas com uma pré-coluna, foi capaz de separar o nonilfenol (tempo de retenção igual a 6,0min) de outras substâncias presentes na amostra, como mostra o cromatograma da Figura 4.27. O espectro de massas indica a presença de outros picos, provavelmente provenientes do ruído instrumental, elevado quando a matriz da amostra é demasiadamente complexa, como é o caso do esgoto doméstico. O perfil de comportamento do nonilfenol indica, em um primeiro momento, a ineficácia do sistema em degradar esse composto. Percebe-se a síntese do poluente ao longo do tratamento, uma vez que o nonilfenol é um sub-produto da degradação de nonilfenóis polietoxilados presentes no esgoto doméstico. O efluente do reator UASB mostrou-se com concentração superior ao esgoto bruto (aumento de, aproximadamente, 127%). O efluente do FBP apresentou-se com o valor mais elevado do poluente dentre os pontos monitorados. Não houve diferença significativa entre as remoções promovidas pelos filtros biológicos percoladores preenchidos com os diferentes materiais (1,4%). De fato, Teurneau (2004) e Ying et al. (2002) citam que, em condições anaeróbias, ocorre a progressiva diminuição da cadeia do nonilfenol etoxilados, e conseqüente produção de nonilfenol. Entretanto, segundo Ying et al. (2002), Soares et al. (2003), e Teurneau (2004) em condições aeróbias, o nonilfenol é completamente mineralizado a gás carbônico e água, ocorrendo, inclusive, o rompimento do anel benzênico. Logo, era de se esperar uma diminuição da concentração relativa nos pontos C1 e C2, em relação ao efluente do UASB, o que não ocorre, segundo a Figura 4.28. Como a matriz do esgoto é demasiadamente complexa, uma hipótese que poderia explicar o fato mostrado é a ocorrência de uma significativa supressão do sinal nas amostras com elevada concentração de matéria orgânica (esgoto bruto e efluente do reator UASB), fenômeno não muito acentuado nas amostras de efluente tratado (pontos C1 e C2). 4.4.4. Bezafibrato O bezafibrato é uma droga usada no tratamento da diabetes e hiperlipidemia, doença caracterizada pelo aumento da concentração de lipídeos no sangue, ajudando a reduzir os níveis de lipoproteínas de baixa densidade (LDL) e triglicerídeos, e elevar o nível de lipoproteínas de alta densidade (HDL). Com isso, a retirada de colesterol da corrente sanguínea é favorecida, controlando a concentração lipídica no organismo. A interferência nos mecanismos enzimáticos do fígado é o principal efeito colateral observado em 99 pacientes que utilizaram essa droga (Radjenovic et al., 2007). O cromatograma e espectro de massas característicos do íon molecular negativo do bezafibrato são mostrados na Figura 4.29, e a Figura 4.30 ilustra o comportamento do bezafibrato presente no esgoto doméstico, desde o momento em que atinge a ETE até o descarte no corpo receptor. 1.4 1.3 1.2 1.1 1.0 0.9 0.8 0.7 0.6 0.5 0.4 0.3 0.2 0.1 (b) 360.1063 380.0863 369.1669 347.5 350.0 352.5 355.0 357.5 360.0 362.5 365.0 367.5 370.0 372.5 375. 377. 380.0 Figura 4.29 - (a) cromatograma e (b) espectro de massas correspondentes ao bezafibrato. Degradação do bezafibrato ao longo do tratamento 100,00% 90,00% 80,00% 70,00% 60,00% 50,00% 40,00% 30,00% 20,00% 10,00% 0,00% A-Janeiro 2008 B-Janeiro 208 C1-Janeiro 2008 C2-Janeiro 2008 Figura 4.30 - Comportamento do bezafibrato ao longo do sistema de tratamento de efluentes sanitários em estudo. 100 m/z A eliminação do bezafibrato pelo sistema de tratamento se mostrou parcialmente eficaz, com a diferença média entre o afluente e efluente final igual a 64%. O tratamento anaeróbio promoveu a redução de 18,07% da droga presente no esgoto afluente à estação. A diferença entre as remoções promovidas pelos FBP preenchidos com pedra britada e conduíte não se mostrou significativa. Radjenovic et al. (2007) reportam que o bezafibrato foi um dos fármacos que apresentou maior concentração na entrada do sistema de uma estação estudada (21,6g/dia), e sua remoção foi de 48,4%, em um sistema de lodos ativados. Acredita-se que o mecanismo da remoção do bezafibrato de águas residuais em sistemas de tratamento biológico acontece pela adsorção no lodo. É provável que a presença de cloro, dois anéis aromáticos e um grupo nitro adjacente a eles em sua estrutura, torne essa molécula altamente estável e tóxica aos microorganismos, o que explicaria a considerável resistência à degradação microbiana. 4.5. Análise Crítica Em um primeiro momento, experimentos no modo fullscan no modo negativo foram realizados, objetivando a aquisição de um espectro total (fingerprint) das amostras. Com esse resultado aliado a uma análise de componentes principais (PCA), foi possível a seleção dos íons de maior relevância nas amostras, os quais foram selecionados para a identificação estrutural, através de seus íons moleculares. Ainda mais, experimentos MS/MS foram realizados para gerar fragmentos dos compostos e auxiliar na elucidação das estruturas dos poluentes presentes nas amostras. Finalmente, as composições elementares resultantes foram buscadas nos bancos de dados Merck Index e NIST. A informação precisa das massas, aliada aos íons produzidos nos experimentos de fragmentação MS2 no equipamento HPLC-MS-IT-TOF possibilitou a elucidação de estruturas de poluentes presentes em um sistema simplificado de tratamento de esgotos, se mostrando uma ferramenta poderosa e de importante aplicabilidade no campo da análise ambiental. 101 Posteriormente, foram feitas análises no modo MS2, objetivando analisar qualitativamente, em uma amostra de esgoto bruto, a presença de alguns compostos-alvo que, segundo a literatura, podem ser encontrados no esgoto bruto e em águas superficiais. Os seguintes compostos foram buscados: nonilfenol, bisfenol A, dibutilftalato e bezafibrato. Esse tipo de análise é seletiva e sensível o bastante para se detectar compostos presentes na complexa matriz que é o esgoto doméstico, em concentrações muito reduzidas. A separação cromatográfica realizada nesse estudo foi realizada apenas com uma précoluna, a qual efetivamente conseguiu discriminar algumas substâncias, diminuindo, assim, a quantidade de substâncias a serem ionizadas pela interface electronspray e amenizando o efeito supressivo da matriz ambiental carregada, facilitando a detecção dos íons relevantes. Apesar de uma separação cromatográfica realmente efetiva ser desejável para facilitar ainda mais a detecção e análise espectrométrica, o trabalho de desenvolver tal método é demasiadamente laborioso, tendo em vista a quantidade inumerável de compostos presente nas amostras. Ainda mais, tal metodologia se faz desnecessária, uma vez que o espectro de massas de alta resolução é capaz de identificar separadamente substâncias que apresentem relações m/z muito próximas, mesmo que não estejam sequer pouco discriminadas. Com o intuito de corrigir os efeitos de supressão de sinal espectrométrico pela matriz complexa, o uso de um padrão interno, adicionado às amostras anteriormente à analise foi realizada. Entretanto, o ideal é que o padrão interno utilizado para normalizar o sinal dos analitos apresente resposta o mais semelhante possível ao dos mesmos (motivo pelo qual são usados, como padrão interno, compostos deuterados), característica que a substância utilizada como padrão interno nesse estudo certamente não apresenta, mas que, mesmo assim, foi válida para a análise semi-quantitativa. Além do mais, seria interessante também a aquisição de padrões dos compostos estudados, para a finalidade de comparar o espectro de uma substância desconhecida, por exemplo, com a de um padrão de substância a qual é suspeita, para a confirmação estrutural definitiva. Algumas limitações intrínsecas à técnica devem ser levadas em consideração. A necessidade de se escolher um parâmetro de relevância, no caso, o destaque quando realizado um teste quimiométrico de componentes principais, deixa de lado a análise de 102 vários outros íons, potencialmente correspondentes a outros micropoluentes. Outro fator importante é que devido às diferentes respostas do sistema instrumental aos diferentes analitos, áreas maiores e, conseqüentemente, o destaque na análise de PCA, não implicam, necessariamente, em maiores concentrações. Isso significa que um analito pode apresentar uma estrutura que implicará em um sinal de grande intensidade no cromatograma, mas não necessariamente ele está em maior concentração do que outro composto que não apresenta boa resposta no detector. Ainda mais, a interface utilizada restringe a análise a compostos facilmente ionizáveis, excluído, então, compostos de baixa polaridade, que poderiam ser analisados em interfaces do tipo APCI ou APPI, ou ainda utilizando-se um sistema GCMS/TOF. 103 5. Conclusões O presente trabalho teve como foco principal o desenvolvimento de uma técnica analítica que combina a cromatografia líquida de alta performance e espectrometria de massas de alta resolução para a pesquisa sobre micropoluentes encontrados em um sistema de tratamento de efluentes domésticos simplificado. Os resultados aqui obtidos possibilitaram a identificação de micropoluentes provenientes das mais diversas fontes: desde fármacos como o bezafibrato, ao bisfenol A, substância utilizada na manufatura de artefatos de plástico, todas de uso rotineiro nos grandes centros urbanos. A partir da identificação dos poluentes em várias etapas do tratamento e empregando-se a adição de um padrão interno como método semi-quantitativo, foi possível traçar o comportamento dos micropoluentes ao longo do sistema e perceber o efeito de diferentes reatores biológicos (UASB e FBP) sobre eles. A falta de padrões de cada uma das substâncias não permitiu mensurar as concentrações de cada um dos micropoluentes de interesse. De um modo geral, os procedimentos analíticos desenvolvidos (amostragem, extração por SPE e análise por LC-MS-IT-TOF) se mostraram eficientes, tanto na pesquisa por compostos desconhecidos, quanto por compostos pré-selecionados. A elevada sensibilidade do equipamento instrumental aliada à sua alta seletividade, ambas obtidas pela configuração dos espectrômetros de massas em série, possibilitaram a análise satisfatória dos poluentes apenas com o uso de uma pré-coluna cromatográfica. No entanto, o uso de uma coluna de maior comprimento certamente facilitaria a aquisição dos espectros de massas pelo equipamento e a interpretação dos espectros pelo analista. Ainda mais, o método desenvolvido possibilita a análise qualitativa e semi-quantitativa de toda a gama de substâncias polares que possam estar presente em águas residuárias de qualquer natureza, tratadas ou não, desde que adaptado para elas. Uma vez percebendo que os reatores biológicos anaeróbio e aeróbio combinados ainda não são suficientes para a total remoção de vários micropoluentes recalcitrantes presentes nos 104 efluentes domésticos, é possível concluir que chegam ao meio ambiente nos corpos d’água receptores, atingindo e prejudicando os seres vivos e até o ser humano, que com eles entram em contato, mesmo que em doses reduzidas e constantemente. Futuras pesquisas direcionadas por esse estudo podem acarretar na inclusão de parâmetros de lançamento para vários micropoluentes na legislação ambiental brasileira, ou até mesmo no banimento de algumas dessas substâncias dos processos de manufatura de objetos ou produtos utilizados no dia-a-dia das grandes metrópoles. Para isso, se fazem necessários estudos adicionais para o completo conhecimento dos riscos referentes à exposição crônica a eles. Mesmo na incorporação de novas substâncias a produtos de consumo, é importante conhecer os mecanismos de toxicidade e degradação nas ETE’s. 105 6. Sugestões Para Trabalhos Futuros Para futuros trabalhos, sugere-se o estudo de outros poluentes presentes no sistema (antiinflamatórios, antibióticos, perturbadores endócrinos), pré-selecionados por outros critérios, como a toxicidade, por exemplo. O uso de técnicas como GC-MS, que possui uma biblioteca de espectros bem definida, facilitaria a identificação de uma maior gama de micropoluentes, sendo aplicável para ampliar o conhecimento nessa área. Uma vez definidas algumas substâncias-alvo, pesquisas quantitativas poderiam ser desenvolvidas, através da aquisição de padrões e o uso do modo MS2. A comparação do perfil de remoção de certos micropoluentes entre diferentes sistemas de tratamento de efluentes poderia ser feita, baseando-se nas metodologias aqui aplicadas, o que seria aplicável na decisão de implantação de ETEs. 106 7. Referências Bibliográficas AGÜERA A., FERNÁNDEZ-ALBA A. R., PIEDRA L., MÉZCUA M., GÓMEZ M. J. Evaluation of triclosan and biphenylol in marine sediments and urban wastewaters by pressurized liquid extraction and solid phase extraction followed by gas chromatography mass spectrometry and liquid chromatography mass spectrometry. Analytica Chimica Acta, v. 480, p.193–205, 2003. AHEL, M., HRSAK, D., GIGER, W. Aerobic transformation of short-chain alkylphenol polyethoxylates by mixed bacterial cultures. Archives of Environmental Contamination and Toxicology, v.26, p.540-548, 1994. ALMEIDA, P. G. S., DUTRA, P. R., MONTEIRO, T. A. S., OLIVEIRA, J. M., CHERNICHARO, C. A. L. 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