ESCOLA DE COMANDO E ESTADO-MAIOR DO EXÉRCITO ESCOLA MARECHAL CASTELLO BRANCO Ten Cel Inf WALMORÉ DE MORAES LACOURT A competência legal das Organizações Militares de Polícia do Exército na segurança das áreas e instalações sob a administração do Exército Brasileiro Rio de Janeiro 2015 Ten Cel Inf WALMORÉ DE MORAES LACOURT A competência legal das Organizações Militares de Polícia do Exército na segurança das áreas e instalações sob a administração do Exército Brasileiro Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, como requisito parcial para a obtenção do título de Especialista em Ciências Militares. Orientador: Ten Cel Cav Fábio Alexandro Dockhorn de Oliveira Rio de Janeiro 2015 L145c Lacourt, Walmoré de Moraes. A competência legal das Organizações Militares de Polícia do Exército na segurança das áreas e instalações sob a administração do Exército Brasileiro. / TC Inf Walmoré de Moraes Lacourt, ECEME, Rio de Janeiro. 2015. 53 f. : il ; 30cm. Trabalho de Conclusão de Curso - Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, Rio de Janeiro, 2015. Bibliografia: f. 51-53. 1. Polícia do Exército. 2. Poder de Policia. 3. Área sob Administração Militar. I. Título. CDD: 355.2 Ten Cel Inf WALMORÉ DE MORAES LACOURT A competência legal das Organizações Militares de Polícia do Exército na segurança das áreas e instalações sob a administração do Exército Brasileiro Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, como requisito parcial para a obtenção do título de Especialista em Ciências Militares. Aprovado em 30 de março de 2015. COMISSÃO AVALIADORA ________________________________________________________________ FÁBIO ALEXANDRO DOCKHORN DE OLIVEIRA – Ten Cel Cav – Presidente Escola de Comando e Estado-Maior do Exército ________________________________________________________ FERNANDO CÉSAR COSTA DE ALMEIDA – Ten Cel Inf – Membro Escola de Comando e Estado-Maior do Exército _____________________________________________________ TEMÍSTOCLES DA ROCHA TORRES – Ten Cel Inf – Membro Escola de Comando e Estado-Maior do Exército RESUMO As áreas e instalações sob administração do Exército Brasileiro (EB) e os bens a elas agregados compõem uma parcela importante do patrimônio da União, que cabe à Força Terrestre a preservação, a manutenção e a correta utilização. Por sua vez, o Exército se utiliza de seus componentes, em todos os níveis, como fiscalizadores deste patrimônio. Particularmente, nas grandes guarnições militares, onde há um aglomerado de organizações militares, os comandantes dispõem das organizações militares de Polícia do Exército (OMPE), as quais, por seu adestramento e peculiaridades, reúnem ótimas condições para exercerem o papel fiscalizador preventivo nas áreas sob administração militar. Os deveres dos militares frente a este patrimônio vêm especificados, particularmente, nos dispositivos legais vinculados ao ramo do Direito Administrativo, área do Direito que estipula os deveres dos agentes públicos da União. Mas, da mesma forma que impõem deveres, o Direito Administrativo delega poderes ao agente público para que ele possa exercer suas funções. Neste sentido, surge o poder de polícia como uma importante ferramenta da Administração Pública para atingir seus fins de priorizar os interesses da coletividade ante os interesses particulares de cada administrado. Assim, este estudo monográfico buscou apresentar a estrutura que compõem as OMPE e suas competências; os bens da União sob responsabilidade do EB, definindo o que são áreas sob a administração militar e suas adjacências e quem são os entes públicos responsáveis pela sua gestão; os princípios que regem a Administração Pública no Brasil, direcionando-os aos deveres dos agentes públicos e o poder de polícia que lhe é investido e, por fim, concluir sobre a legalidade da atuação da Polícia do Exército nas áreas sob administração militar. Palavras-chave: área sob administração militar; Polícia do Exército; poder de polícia. ABSTRACT Areas and facilities managed by the Brazilian Army and the goods to them embedded make up an important part of the heritage of the Union; it is for the Ground Force the preservation, maintenance and proper use. In turn, the Army uses its components, at all levels, as inspection of this heritage. Particularly in large garrisons where there is a cluster of military organizations, commanders have the military organizations of the military police, which, by their training and peculiarities, meet optimal conditions for exercising preventive oversight role in areas under military administration. The duties of the military front this heritage are developed, particularly in the legal provisions related to the branch of Administrative Law, the area stipulating the duties of public officials of the Union. But, as they impose duties, the Administrative Law empowers the public official so that it can carry out its functions. In this sense, the police power emerges as an important tool of public administration to achieve their goals to prioritize the interests of the community before the particular interests of each run. Thus, this monographic study aimed to present the structure of the military organizations of the military police and make up their skills; the property of the Union under the Brazilian Army responsibility, defining what are the areas under the military administration and its surroundings and who are the public entities responsible for their management; the principles governing public administration in Brazil, directing them to the duties of public officials and the police powers vested him and finally finish on the legality of the actions of the military police in areas under military administration. Keywords: area under military administration; Military Police; police power. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Fig 01 BPE por C Mil A Fig 02 Organograma BPEB LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS Aprov Aprovisionamento Almox Almoxarifado BPE Batalhão de Polícia do Exército BPEB Batalhão de Polícia do Exército de Brasília CF Constituição Federal CF/88 Constituição Federal de 1988 Cia Companhia Cia Esct Gd Companhia de Escolta e Guarda Cia Cmdo Sv Companhia de Comando e Serviços Ch Chefe C Mil A Comando Militar de Área Cmt Comandante CPM Código Penal Militar Cia Pol Companhia de Polícia CTN Código Tributário Nacional DE Divisão de Exército DEC Departamento de Engenharia e Construção DETMil Diretoria de Educação Técnica Militar Dir Diretor EB Exército Brasileiro EC Emenda Constitucional ECEME Escola de Comando e Estado-Maior EME Estado-Maior do Exército EsIE Escola de Instrução Especializada FEB Força Expedicionária Brasileira Fisc Adm Fiscal Administrativo GLO Garantia da Lei e da Ordem Gu Guarnição IG Instruções Gerais IR Instruções Reguladoras LC Lei Complementar Mus Música Nu Ens Núcleo de Ensino OM Organização Militar OMPE Organização Militar de Polícia do Exército PE Polícia do Exército; Policial do Exército Pel Pelotão Pel Adm Pelotão de Administração Pel Com Pelotão de Comunicações Pel Esclt Pelotão de Escolta Pel Gd Pelotão de Guardas Pel Sau Pelotão de Saúde Pel Seg Pelotão de Segurança Pel Sv G Pelotão de Serviços Gerais Pel Trnp Pelotão de Transporte PIC Pelotão de Investigações Criminais RAE Regulamento de Administração do Exército Seç C G Seção de Cães de Guerra Seç Com Soc Seção de Comunicação Social SPU Secretaria de Patrimônio da União UA Unidade Administrativa SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO -------------------------------------------------------------------------- 09 2 A POLÍCIA DO EXÉRCITO ----------------------------------------------------------- 15 2.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS________________________________ 15 2.2 ORGANIZAÇÕES MILITARES DE POLÍCIA DO EXÉRCITO__________ 16 2.3 ESTRUTURA DO BATALHÃO DE POLÍCIA DO EXÉRCITO __________ 17 2.4 AS MISSÕES DA POLÍCIA DO EXÉRCITO_______________________ 19 2.5 PECULIARIDADES__________________________________________ 20 2.5.1 Instrução e Qualificação do Soldado PE________________________ 20 2.5.2 A Seção de Cães de Guerra___________________________________ 22 2.5.3 O Pelotão de Investigações Criminais__________________________ 23 2.5.4 O Pelotão de Escolta ________________________________________ 23 3 AREAS SOB A ADMINISTRÇÃO MILITAR E SUAS ADJACÊNCIAS 25 3.1 OS BENS DA UNIÃO_________________________________________ 25 3.2 ÁREA SOB ADMINISTRAÇÃO MILITAR__________________________ 26 3.3 ÁREAS ADJACENTES À ÁREA SOB ADMINISTRAÇÃO MILITAR_____ 30 3.4 4. RESPONSABILIDADE PELA SEGURANÇA E MANUTENÇÃO DA ÁREA 32 SOB ADMINISTRAÇÃO MILITAR _______________________________ O AGENTE PÚBLICO E O PODER DE POLÍCIA___________________ 35 4.1 PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA_____________________ 35 4.2 O PODER DE POLÍCIA_______________________________________ 39 4.3 OS AGENTES PÚBLICOS_____________________________________ 42 4.4 DEVERES DO AGENTE PÚBLICO______________________________ 44 5 CONCLUSÃO ______________________________________________ 46 9 1 INTRODUÇÃO O Brasil é um Estado democrático que prima pela correta aplicação das leis e pelo bem estar comum. O vasto território que o país ocupa abriga um grande número de riquezas, dentre as quais estão os chamados bens da União. O patrimônio que compõem esses bens deve ser protegido e preservado por toda nação. Neste contexto, o Exército Brasileiro coopera com a fiscalização da correta utilização dos bens da União colocados sob sua guarda. Assim, surge a necessidade da análise da atuação do Exército Brasileiro em ambiente de Poder de Polícia Administrativa. O tema é bastante amplo e complexo, pois envolve aspectos e fundamentos da área jurídica civil e castrense, o que exige uma adequada delimitação para se proceder a um estudo abrangente. Assim sendo, antes mesmo de apresentar a delimitação do tema, é importante destacar algumas constatações que serviram de inspiração para a sua elaboração. O Exército Brasileiro (EB), instituição nacional permanente e regular, assim definida no artigo 142 da Carta Magna do Brasil, foi incorporando uma série de missões peculiares ao longo de sua história, as quais por sua vez, fizeram surgir, no seio do EB, organizações militares (OM) especializadas para o cumprimento de missões tão específicas. Assim, é que, na atualidade, o Exército é composto por diversas OM com as mais variadas constituições, aspecto inerente à extensão e a diversidade do território nacional, bem como a multiplicidade de missões atribuídas a instituição. Dentre estas diversas organizações militares estão os batalhões, as companhias e os pelotões de Polícia do Exército, que por sua natureza e especificidade, estão vocacionados para o exercício das atividades e operações tipo polícia. O Poder de Polícia apresenta diferentes vertentes e, em função desta variação, diferentes atores podem exercê-lo. As definições e competências para o exercício do poder de polícia estão descritas no arcabouço jurídico, o que exige um estudo acurado das leis em vigor. Vinculado aos dois aspectos anteriormente citados, há de se destacar a grande quantidade e extensão de bens públicos, móveis e imóveis, colocados sob a responsabilidade dos militares do exército e sobre os quais devem exercer autoridade a fim de preservar e guardar o patrimônio. 10 Desta forma, do alinhamento das idéias acima expostas, surgiu o assunto a ser abordado neste trabalho, o qual foi traduzido no seguinte título: A Competência Legal das Organizações Militares de Polícia do Exército na Segurança das Áreas e Instalações sob a Administração do Exército Brasileiro. O assunto a ser abordado no presente trabalho está inserido na área do Direito Público, mais especificamente no ramo do Direito Administrativo, pois é este segmento do Direito que regula o exercício das funções dos agentes públicos e suas responsabilidades, cabendo, ainda, uma análise paralela com os preceitos do Direito Penal Militar. Ademais, o assunto se torna relevante por preencher uma lacuna de conhecimento importante na rotina diária das organizações militares do Exército, no que tange a sua atuação para a conservação e guarda do patrimônio da união sob sua tutela. Verifica-se, ainda, que do estudo do tema apresentado, surge o seguinte problema a ser investigado: qual é o ordenamento jurídico que ampara as Organizações Militares de Polícia do Exército (OMPE) nas atividades de manutenção da segurança das áreas e instalações sob a administração do Exército Brasileiro? Neste contexto, as ferramentas mais importantes para serem analisadas são as leis que regem o assunto. Iniciando o estudo a partir da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, foi percorrido um caminho pelas diversas leis que compõem as bases legais da administração pública em consonância com as missões atribuídas às organizações militares e seus agentes. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, particularmente no Título II, estabelece uma série de direitos e garantias fundamentais, os quais se tornaram parte componente e expressiva do chamado Estado de Direito. Assim, os Poderes do Estado são limitados por um ordenamento jurídico embasado na carta magna do país. Porém, este mesmo ordenamento jurídico reputa ao Estado a responsabilidade pela manutenção do interesse público, o qual, em nome da ordem social, deve ter supremacia sobre os interesses privados. Desta maneira, o Estado exerce sua função reguladora da ordem social por meio da aplicação do Poder de Polícia, o qual se define pela concessão de autoridade a determinados agentes da administração pública para limitar liberdades, propriedades e outros direitos individuais garantidos pela constituição. 11 Neste espectro, os militares surgem como membros integrantes da administração pública, responsáveis pelo patrimônio da União sob sua guarda. Fazem parte deste patrimônio, as instalações (aquartelamentos, próprios nacionais, campos de instrução, etc.) e os produtos de defesa (armamento, viaturas, aeronaves, etc.), dentre outros bens móveis e imóveis. A acelerada e desordenada expansão da maioria dos centros urbanos brasileiros, particularmente a partir da década de 1940, fez com que muitas das áreas sob a administração do Exército Brasileiro que, inicialmente foram construídas e/ou estabelecidas em locais isolados, fossem cercadas ou, até mesmo, invadidas por construções e população civil, gerando um grave problema de segurança para sociedade. A dicotomia entre o interesse privado e a responsabilidade dos militares em administrar bens da união servem, em última análise, para o estabelecimento dos objetivos da presente pesquisa. Não obstante, esta pesquisa buscou, com base em pressupostos científicos e dados colhidos através de fontes bibliográficas, constatar, além do ordenamento jurídico que ampara as organizações militares de Polícia do Exército nas atividades de manutenção da segurança das áreas e instalações sob a administração do Exército Brasileiro, a amplitude legal desta atividade. Este objetivo geral foi desmembrado em alguns objetivos específicos, os quais permitiram o encadeamento lógico do raciocínio descritivo apresentado neste estudo. Inicialmente, buscou-se apresentar a constituição geral e a missão das Organizações Militares de Polícia do Exército, de forma que o leitor pudesse se ambientar com as peculiaridades deste tipo de organização militar para o assunto em questão. Para isso, foi consultada a base doutrinária do Batalhão de Polícia do Exército de Brasília (BPEB), bem como utilizada a experiência do autor como Policial do Exército. Cabe explicar que a utilização do BPEB como amostra não probabilística por tipicidade ocorreu haja vista ser a OM, dentre as Organizações Militares de Polícia do Exército, que possui a estrutura mais abrangente e, ainda, por ser de pleno domínio deste pesquisador pela vivência profissional, uma vez que houve a oportunidade de serem exercidas as funções de comandante de pelotão, de comandante de subunidade e de subcomandante. 12 Na seqüência da pesquisa, houve a necessidade de se definir o chamado Poder de Polícia e identificar o ordenamento jurídico que atribui este poder aos integrantes das OMPE. Tais aspectos foram extraídos do estudo acurado das leis que compõem o chamado Direito Administrativo em consonância com o Direito Militar e o Direito Constitucional, seguindo as interpretações de professores e escritores notáveis na área. Outro objetivo específico do estudo foi a definição e identificação das áreas sob a administração militar e suas adjacências. Este objetivo se tornou relevante face ao, já citado, crescimento acelerado e desordenado dos centros urbanos, aspecto que fez com que as áreas militares fossem envolvidas por uma grande quantidade de construções das mais variadas naturezas e acessada por um grande número de transeuntes de toda ordem. Por certo, ficou evidente a necessidade de se caracterizar o ordenamento jurídico que investe aos integrantes das Organizações Militares de Polícia do Exército o Poder de Polícia adequado ao exercício das missões relacionadas à manutenção da segurança nas áreas e instalações sob a administração militar, com o objetivo maior de preservar a Ordem Pública e o Patrimônio da União, sendo esta a hipótese formulada para a pesquisa em questão. Destaca-se, mais uma vez, a relevância do tema, sob a ótica da hipótese formulada, pois, com maior freqüência, tem-se verificado o questionamento da legalidade das ações de elementos da Polícia do Exército no dia-a-dia que, em muitos casos, interferem na rotina das pessoas que circulam nas vias públicas que cruzam as áreas sob a administração militar e, principalmente, suas adjacências. Os desgastes ocorridos no relacionamento dos integrantes da Força Terrestre e da sociedade civil em virtude do conflito dos interesses públicos e privados serão tanto menores quanto maior for o entendimento e esclarecimento de ambos os atores no que concerne ao ordenamento jurídico vigente. Em decorrência do tema escolhido, do problema levantado, da hipótese formulada e dos objetivos propostos, optou-se por proceder a uma pesquisa qualitativa e documental, conduzida por meio de uma análise das leis constitucional e infraconstitucional, particularmente, àquelas relacionadas ao ramo do Direito Administrativo. Neste espectro, foram utilizadas como fonte de estudo algumas das jurisprudências relacionadas às controvérsias provocadas pela ação de integrantes 13 do Exército Brasileiro na manutenção da segurança de áreas sob a administração militar e suas adjacências. Ainda, seguindo a taxonomia preconizada por Vergara (2000), a pesquisa foi descritiva, explicativa e bibliográfica (p. 47). O viés de pesquisa descritiva ficou caracterizado por meio da apresentação do BPEB como amostra fiel das OMPE, explicando a sua organização peculiar e as suas capacidades. A abordagem sobre a dicotomia criada pelo choque entre o principio da supremacia do interesse coletivo sobre o interesse privado e a limitação do direito constitucional à liberdade de ir e vir dos cidadãos caracterizou o viés de pesquisa explicativa no trabalho, pois se buscou mostrar as razões que justificam a referida supremacia. No que tange à pesquisa bibliográfica, foi realizada uma coleta dos dados disponíveis em livros de autores renomados, vinculados aos ramos do Direito Administrativo e do Direito Militar. O objetivo foi levantar os conceitos básicos e estabelecer os vínculos comuns. Ainda, foram importantes fontes de dados as revistas, os artigos e os trabalhos científicos que contemplam a área afeta ao estudo, os quais ampliaram a base científica do trabalho e permitiram conclusões com maior grau de precisão, devido a confirmação dos dados provenientes de fontes diversas. Nessas condições, a gama de dados e informações coletados foram tratados em sua maioria por meio do método da análise de conteúdo e, eventualmente, por meio do método comparativo. A análise de conteúdo foi a principal técnica de tratamento de dados empregada. Foi realizado um estudo pormenorizado dos textos e dados extraídos da bibliografia e documentação consultada, cujo objetivo primordial foi a formulação de novos conhecimentos ou a confirmação de conhecimentos já consagrados. O método comparativo no tratamento dos dados foi empregado, em algumas oportunidades, para que não houvesse a contaminação das conclusões por opiniões ou dados que não sejam imparciais, uma vez foram identificados diferentes interesses relacionados ao tema pelas partes envolvidas. 14 Por fim, conclui-se que o trabalho seguiu a metodologia escolhida, a qual se apresentou coerente e possibilitou atingir o objetivo da pesquisa de forma adequada. 15 2 A POLÍCIA DO EXÉRCITO 2.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS Desde os mais remotos tempos, a manutenção da disciplina nos grandes exércitos exigiu a designação de unidades especiais com essa finalidade. Foi o caso, por exemplo, do ocorrido no acampamento de Tuiutí, durante a Guerra da Tríplice Aliança1, quando o Duque de Caxias2 assumiu o comando das tropas do Exército Brasileiro e designou um batalhão para cumprir a missão de Policia do Acampamento. A Polícia do Exército (PE), na sua forma atual, surgiu com a Força Expedicionária Brasileira (FEB), tropa do Brasil que atuou de forma destacada na Campanha da Itália durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). O embrião inicial da PE foi o Pelotão de Polícia Militar que integrou a 1ª Divisão de Infantaria Expedicionária3, criado por três decretos reservados, assinados em 06 de dezembro de 1943, que instituíram as tropas especiais daquela força militar. A estrutura organizacional do pelotão seguiu a linha do modelo norte-americano do Military Police Platoon4, e por isso a denominação inicial de Policia Militar. A Polícia Militar da FEB foi constituída por dezenove militares do Exército Brasileiro e quarenta e quatro voluntários da Guarda Civil de São Paulo, o que muito facilitou e aperfeiçoou a preparação da tropa, pois estes voluntários já tinham os conhecimentos necessários para o exercício da atividade policial. Durante toda Campanha Militar na Itália, o Pelotão de Polícia Militar atuou com destaque nas missões de controle de trânsito, na segurança de áreas e instalações vitais, na guarda de prisioneiros, além de outras missões de caráter eminentemente policial, ressaltando-se a postura e o profissionalismo de seus integrantes em todas as ações. A fração brasileira de Polícia Militar estava diretamente subordinada ao General Zenóbio da Costa, Comandante da 1ª Divisão de Infantaria Expedicionária, que testemunhou a primazia e a importância das missões cumpridas pelo pelotão. O 1 Grande conflito armado ocorrido na América do Sul no final do século XIX envolvendo de um lado o Paraguai e de outro a aliança formada por Brasil, Argentina e Uruguai. 2 Título de Luiz Alves de Lima e Silva, Patrono do Exército Brasileiro, ícone militar do Período Imperial do Brasil. 3 Grande comando OPERATIVO que formava a base da FEB. 4 Pelotão de Polícia Militar (tradução). 16 resultado desta avaliação foi ampliação do efetivo para uma companhia5, ainda durante o desenrolar da campanha militar da FEB na Itália. Ao retornar dos campos de batalha da Itália, o General Zenóbio da Costa traçou como um de seus grandes objetivos implantar de forma definitiva no EB aquela tropa de elite que tinha sido um exemplo de disciplina e respeito dentro da FEB, denominando-a de Polícia do Exército. Assim, em fins de 1946, o General Zenóbio da Costa orientou e conduziu o processo de criação da 1ª Companhia de Polícia do Exército, por meio do Capitão Evandro Guimarães Ferreira. A companhia foi composta por cerca de 400 homens e foi incorporada à 5ª Região Militar6 em 1947. Desde sua criação, a Polícia do Exército ficou responsável pela guarda de instalações de elevada importância, tais como, dos Palácios Presidenciais, do Ministério da Guerra e das residências dos Generais Ministro da Guerra e Comandante da Zona Militar Leste. Um dos principais objetivos colimados, além da segurança, era a demonstração de disciplinada e austeridade passada pelo soldado PE, a qual impunha e angariava o respeito das autoridades civis e militares que trafegavam pelos Palácios e residências oficiais, bem como, da população em geral. A partir desse embrião, foram sendo ampliadas as organizações militares de Policia do Exército, em todos os níveis, ficando subordinadas ao comandante das Grandes Unidades7 e Grandes Comandos Operacionais8. 2.2 ORGANIZAÇÕES MILITARES DE POLÍCIA DO EXÉRCITO Os pelotões, companhias e batalhões de Polícia do Exército são organizações militares diretamente subordinadas aos Grandes Comandos e Grandes Unidades. A estrutura organizacional básica representativa das Grandes Unidades no Exercito Brasileiro são as Brigadas. De acordo com o Livro Branco de Defesa do Brasil (2012): “A brigada é uma grande unidade formada pela combinação de armas, capaz de cumprir missões de modo autônomo. Normalmente, compõe-se de unidades e subunidades de manobra (infantaria e cavalaria), de apoio de fogo (artilharia de campanha), de defesa antiaérea (artilharia antiaérea), de apoio ao combate (engenharia e comunicações) e de apoio logístico (intendência, saúde e material bélico). As brigadas poderão receber, 5 Unidade militar composta normalmente por três pelotões. À época, esta região estava sediada na cidade do Rio de Janeiro. 7 OM com capacidade de atuação operacional independente, integrada por unidades de combate, de apoio ao combate e de apoio logístico. 8 OM de valor ponderável, constituição variável em unidades e grandes unidades. 6 17 conforme a necessidade, frações de aviação do Exército, guerra eletrônica, inteligência eletrônica, operações psicológicas, operações especiais, de unidade antiaérea, além de apoio de veículo aéreo não tripulado (VANT).” (BRASIL, Ministério da Defesa, 2012, p.115) Atualmente, o Exército Brasileiro é composto por 27 brigadas. Os pelotões de Polícia do Exército estão entre as diversas organizações militares que compõem as brigadas, sendo eles responsáveis, responsáveis, prioritariamente, por prestarem o apoio especializado tipo polícia9 às operações em tempo de paz e de guerra. No que tange aos grandes comandos em tempo de paz, destacam destacam-se as Divisões de Exército (DE), que enquadram as brigadas. Atualmente, a Força Terrestre estre possui sete Divisões. As companhias de Polícia do Exército são as subunidades orgânicas das DE, sendo responsáveis por prestarem o apoio especializado tipo polícia aos seus comandos enquadrantes, da mesma forma que os pelotões de Polícia do Exército em suas brigadas. A Força Terrestre, que está distribuída em todo território nacional, é dividida em oito Comandos Militares de Área (C Mil A). A maioria desses comandos possui batalhões de polícia do exército sob seu comando. Fig 01 – BPE por C Mil A Fonte: o autor 2.3 ESTRUTURA DO BATALHÃO DE POLÍCIA DO EXÉRCITO Os batalhões de PE, de uma maneira generalista, apresentam uma mesma organização quanto às unidades e às pequenas frações que os compõem. 9 As operações tipo polícia têm como objetivo proporcionar segurança à tropa, às autoridades, às instalações, aos serviços essenciais, à população e às vias de transportes, entre outros aspectos. As 18 estruturas se diferem apenas no que concerne ao efetivo de soldados e a quantidade de companhias de polícia. Por exemplo, enquanto o 1º Batalhão de Polícia do Exército, sediado no Rio de Janeiro, tem cerca de 600 soldados e tem duas companhias de polícia, o BPEB, sediado em Brasília, tem em torno de 1300 componentes, divididos em três companhias de polícia. Cabe salientar, que apesar desta variação de efetivos, todas OMPE tem a mesma formação profissional e composição de capacidades para o cumprimento das suas missões em seus respectivos níveis. Dentre as organizações militares de Polícia do Exército, a que possui o maior efetivo e que dispõem das capacidades implantadas em todos os níveis é o BPEB, fatores que o credenciam como a melhor amostra a ser analisada dentro do universo OMPE. ORGANOGRAMA - BPEB Comandante Subcomandante 1ª Seção 1ª Cia PE (04 Pel PE) 2ª Seção 3ª Seção Presídio Gu Nu Ens 2ª Cia PE 3ª Cia PE (04 Pel PE) (04 Pel PE) Seç Com Soc 4ª Seção / Fisc Adm Cia Esct Gd Cia Cmdo Sv 02 Pel Gd PIC Pel Adm Pel Esct Pel Com Pel Seg Seç CG Pel Trnp Pel Sau Pel Sv G Almox Aprov Banda Mus Fig 02 - Organograma BPEB Fonte: o autor De forma comum a qualquer organização militar do EB, o comando do batalhão é composto por seu comandante, subcomandante e estado-maior. O estado-maior da OM, por sua vez, possui as seções de pessoal, de inteligência, de operações e de administração de material e patrimônio. 19 O subcomandante e o estado-maior são os responsáveis pelo planejamento e assessoramento ao comandante, a quem cabe as decisões finais. No que tange a composição das subunidades, o batalhão possui uma Companhia de Comando e Serviço (Cia Cmdo Sv), uma Companhia de Escolta de Guarda (Cia Esct Gd) e três Companhias de Polícia (Cia Pol). Na Cia Cmdo Sv estão enquadradas as frações que dão suporte à atividade fim, tais como Pelotão de Transporte, Comunicações e Saúde, dentre outros. A CCSv enquadra, ainda, o Pelotão de Investigações Criminais (PIC), uma fração peculiar dos Batalhões de Polícia do Exército responsável pelas atividades ligadas à função de polícia militar judiciária, tais como perícias e investigações criminais, bem como pela guarda de presos militares à disposição da justiça comum e militar e presos civis à disposição da justiça militar recolhidos ao presídio militar existente na OM. A Cia Esct Gd é composta por três Pelotões de Guarda e um Pelotão de Escolta, o qual engloba os motociclistas militares do batalhão responsáveis pela condução de escoltas de comboios militares e civis. A Seção de Cães de Guerra (Seç CG) está subordinada, também, a Cia Esct Gd, sendo responsável pelo adestramento de cães e preparação de cinófilos para o apoio aos pelotões de polícia por ocasião de seu emprego. As Cia Pol são compostas por quatro Pelotões de Policia, os quais estão aptos ao desempenho de todas as missões do batalhão, particularmente, o controle de trânsito, o policiamento de áreas e instalações militares e Operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO)10. 2.4 AS MISSÕES DA POLÍCIA DO EXÉRCITO As missões que as OMPE realizam estão especificadas em diversos documentos. Para fins deste estudo, serão extraídas algumas das missões elencadas na Base Doutrinária dos BPE (QO: 0732-31-0), documento de acesso restrito emitido pelo Estado-Maior do Exército, Órgão de Direção Geral. 10 Operação militar conduzida pelas Forças Armadas, de forma episódica, por decisão do Presidente da República, em área previamente estabelecida e por tempo limitado, com o propósito de assegurar o pleno funcionamento do estado democrático de direito, da paz social e da ordem pública. (BRASIL, Exército Brasileiro, Estado-Maior do Exército, Manual de Fundamentos EB20-MF-10.103 Operações, 2014, Glossário, Parte II, não paginada). 20 Assim sendo, destacam-se as seguintes missões para a polícia do exército, dentre outras: - fazer cumprir normas, planos e ordens relativos, particularmente, ao controle de trânsito (militar e civil), a proteção da propriedade, das instalações, das atividades e do pessoal, assim como a garantia de sua segurança física, na área de sua responsabilidade; - manter a ordem e a disciplina; - executar o controle da circulação do pessoal (militar e civil); - proporcionar limitada segurança terrestre às instalações do Posto de Comando, bem como a segurança pessoal do Comando da Organização Militar que o enquadra e de autoridades civis, quando determinado; e - proporcionar apoio de investigação criminal e realizar perícias criminais e de trânsito, na área de sua responsabilidade. 2.5 PECULIARIDADES 2.5.1 Instrução e Qualificação do Soldado PE O EB adota um sistema padronizado de instrução básica e de qualificação do soldado brasileiro, regulados em documentos chamados de Programa-Padrão. A instrução básica é aquela que todo soldado deve receber para saber se conduzir com segurança nas operações no amplo espectro 11. Já a instrução de qualificação é que vai diferir a função que cada soldado irá exercer no âmbito de sua OM e no curso das operações. Neste contexto, é que os soldados da PE recebem uma instrução individual peculiar para o cumprimento de suas missões específicas, a qual os habilita à atividade policial. As capacidades desenvolvidas no âmbito das OM são exploradas diariamente pelos soldados, que atuam, frequentemente, em vias públicas fora dos muros do aquartelamento, atuando em prol de toda família militar. Assim, matérias como policiamento de trânsito, patrulhamento ostensivo, segurança de autoridades, fundamentos jurídicos, gerenciamento de crise e negociação, investigação policial e perícia criminal e garantia da lei e da ordem são 11 O espectro dos conflitos, que varia desde a paz estável até o conflito armado/guerra, passando pela paz instável e pela crise [...] (BRASIL, Exército Brasileiro, Estado-Maior do Exército, Manual de Fundamentos EB20-MF-10.103 Operações, 2014, p. 3-2). 21 alguns dos assuntos peculiares que compõem o cabedal de conhecimento adquirido pelo Policial do Exército. O aprendizado e a prática diária garantem um elevado nível de adestramento do soldado da PE. Por meio dos assuntos ministrados nas matérias supracitadas, são desenvolvidas e aprimoradas as competências para controlar o trânsito por meio de gestos e sinais, fiscalizar viaturas civis e militares, realizar a abordagem de pessoas e proceder à revista de suspeito, realizar a abordagem e a busca em uma casa, realizar a segurança física de instalações, participar da segurança pessoal de autoridades, auxiliar na condução de autos de prisão em flagrante delito, apoiar as negociações com ou sem reféns, apoiar uma investigação e/ou uma perícia criminal, realizar uma interdição de área, utilizar material de emprego militar especial (tonfas, cassetetes, escudos, algemas, etc), entre tantas outras. Um dos principais objetivos do desenvolvimento dessas competências é aumentar a segurança e contribuir para a manutenção da ordem pública, particularmente, nas áreas militares e seus arredores. Cabe salientar que o desenvolvimento de todas essas competências, exige o aprendizado do arcabouço jurídico que ampara a atuação do militar em cada caso específico. Outro aspecto que corrobora para a elevada competência dos integrantes das OMPE para exercício de suas missões é a condução do Curso de Policial do Exército para subtenentes e sargentos. Os Núcleos de Ensino existentes nos batalhões de PE são responsáveis pela condução do curso sob a supervisão da Diretoria de Educação Técnica Militar (DETMil). Os alunos do curso são os subtenentes e os sargentos que servem nas organizações de Policia do Exército e, durante cerca de 10 semanas, são preparados para as funções de adjunto de pelotão e comandante de grupo de PE, explorando detalhadamente cada assunto pertinente ao exercício de suas funções a frente de suas frações. Por fim, para caracterizar a excelência da capacitação dos militares da PE para a condução de suas atividades, a DETMil aprovou, em 2013, o Curso de Especialização de Polícia do Exército para Oficiais. Destacam-se os seguintes aspectos dos requisitos comuns descritos no perfil profissiográfico do concludente do curso, aprovado pela Portaria Nr 243-EME, de 10 de dezembro de 201312, 12 BRASIL, Exército Brasileiro, Estado-Maior do Exército, Portaria Nr 243-EME, Brasília, 2013. 22 demonstrando o perfeito alinhamento com o estágio atual de prontidão da Força Terrestre: O Curso de Especialização de PE habilita o Oficial de Infantaria a chefiar homens nas missões de PE, em operações de guerra, operações de amplo espectro (guerra convencional e assimétrica), em operações de guerra não convencional e operações de não-guerra, evidenciando direção, equilíbrio emocional, liderança, apresentação, disciplina, organização e zelo, atributos essenciais ao Oficial do Exército Brasileiro. O concludente do Curso deverá sempre manter seu autoaperfeiçoamento e acompanhar as constantes transformações que ocorrem no Brasil e no mundo, visando à ampliação da sua cultura geral e profissional. Ressaltam-se, também, os requisitos específicos descritos no mesmo documento supracitado: O oficial concludente do Curso de Especialização de PE deve ser capaz de participar de missões e operações características de PE, utilizar o armamento e demais equipamentos de dotação, participar de segurança e proteção de autoridades, adestrar a tropa em atividades inerentes às missões de PE, adequar os planejamentos aos meios disponíveis e agir nas diversas situações operacionais, obedecendo aos dispositivos legais vigentes no País ou área de operações. No desempenho de suas funções, o Comandante da Companhia e o Comandante do Pelotão de PE devem ter grande conhecimento técnicoprofissional, aliado a um comportamento pautado por uma conduta correta e adequada, para cada situação específica, evidenciando os atributos como objetividade, responsabilidade, sensibilidade, meticulosidade e adaptabilidade, requisitos basilares para o bom desenvolvimento dos trabalhos para os quais está capacitado a desenvolver. Está capacitado a agir, de forma acertada e oportuna, em situações que estejam em seu nível de conhecimento, sem depender de ordem de seu superior hierárquico, conciliando a iniciativa com a disciplina intelectual, no que tange ao bom cumprimento das ordens e missões. Os núcleos de ensino dos batalhões de polícia do exército conduzem, ainda, diversos estágios e cursos ao longo do ano de instrução, com o objetivo de aprimorar os integrantes das OMPE, tais como, estágios de segurança de autoridades, estágio motociclista militar, estágio de combate corpo-a-corpo, entre outros. Desta forma, pode-se constatar a elevada capacitação dos policiais do exército, em todos os níveis, e a plena competência para conduzirem suas atividades. 2.5.2 A seção de cães de guerra Um meio nobre que as OMPE possuem para o cumprimento de suas missões é a Seção de Cães de Guerra (Seç CG). Nesta fração, cães e cinófilos13 são 13 Soldado da PE especializado na condução de cães-de-guerra. 23 preparados para o policiamento de pessoal, para as ações de controle de distúrbios e para o faro de drogas e explosivos. Os cães empregados nestas atividades são selecionados desde o nascimento, sendo preparados desde os primeiros momentos para o exercício de uma atividade específica. Atualmente, o BPEB e o 2º BPE possuem centros de reprodução destinados à seleção e distribuição destes animais. Da mesma forma, os cinófilos que irão conduzir os animais são selecionados dentre os soldados da organização militar. Estes são submetidos a um curso de condução de cães, tornando-se especialistas no emprego do animal nas atividades policiais. A capacidade operativa das seções de cães de guerra tem sido constantemente testada na atualidade, pois com o advento dos grandes eventos no Brasil, tais como, a Copa das Confederações e a Visita do Papa Francisco, ambas ocorridas em 2013, estas frações participaram, ativamente, do esquema de segurança estabelecido, atingindo pleno êxito quando empregadas. 2.5.3 O Pelotão de Investigações Criminais (PIC) O PIC é uma fração administrativamente enquadrada pela Cia Cmdo Sv, mas com canal técnico de vinculação à Seção de Inteligência e, por muitas vezes, recebendo demandas diretamente do comandante da OM, pois neste pelotão estão incorporados os peritos criminais do batalhão. O PIC é composto por um Grupo de Criminalística, um Grupo de Investigações Criminais e por um Grupo de Carceragem. O pelotão tem capacidade em pessoal e material para conduzir perícias grafodocumentoscópicas, papiloscópicas, em armamentos e munições, em locais de crime contra vida, em locais de crime contra o patrimônio, em incêndios, em explosões, em acidentes de tráfego, entre outras possibilidades. Os peritos estão sendo preparados, atualmente, na Escola de Instrução Especializada do Exército Brasileiro (EsIE), por meio do Curso de Perícia e Investigação Criminal Militar. O principal objetivo do curso é capacitar oficiais e sargentos a assessorar os Comandantes das OMPE na elucidação de ilícitos no âmbito do Comando Militar de Área, produzir provas técnicas para a Justiça Militar, e assessorar os encarregados de Inquérito Policial Militar, quando solicitado. 24 2.5.4 O Pelotão de Escolta (Pel Esct) O Pel Esct é composto por motociclistas militares das OMPE. As principais missões da fração são realizar a escolta de comboios militares e civis e colaborar no policiamento de vias públicas. O principal objetivo de emprego da fração é aumentar a segurança nas vias públicas quando do deslocamento de grandes comboios militares ou de material que possa colocar em risco a população civil. No que tange às autoridades civis, os motociclistas são empregados em um quadro de cooperação com a Polícia Federal, aumentando a grau de segurança a que é submetida à autoridade específica. Os motociclistas são empregados, secundariamente, no controle de circulação das vias públicas e patrulhamento de áreas militares, ampliando a capacidade de atuação do elemento a pé e a mobilidade dos elementos motorizados embarcados em viaturas. O material de emprego militar da fração é bastante peculiar, visando a proteger ao máximo a integridade do motociclista militar em virtude da atividade de elevado risco que executa. O uniforme reforçado e os acessórios de segurança se fazem de vital importância para garantir ao motociclista confiança na condução de sua missão. A motocicleta utilizada, em sua maioria, é a Harley-Davidson modelo Police, a qual apresenta todas as características e acessórios necessários à atividade de escolta motorizada em via pública. Outras motocicletas têm sido adaptadas e empregadas nas escoltas, tais como, as motocicletas Honda dos modelos Transalp e XRE, o que tem garantido maior flexibilidade e adaptabilidade das escoltas e patrulhamentos nos grandes centros urbanos. 25 3 ÁREA SOB ADMINISTRÇÃO MILITAR E ADJACÊNCIAS 3.1 OS BENS DA UNIÃO Os bens da União compõem parcela significativa do patrimônio nacional, englobando os bens móveis e imóveis que o Estado tem por responsabilidade preservar para o benefício coletivo da sociedade. O Código Civil Brasileiro assim define bens da União: Art. 98. São públicos os bens do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem. (BRASIL, 2002) Na mesma lei, estão definidos os bens da União quanto à finalidade. Art. 99. São bens públicos: I - os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças; II - os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias; III - os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoal, ou real, de cada uma dessas entidades. (BRASIL, 2002) No que tange aos bens da União, a CF/88 assim prescreve: Art. 20. São bens da União: [...] II - as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e construções militares, das vias federais de comunicação e a preservação ambiental, definidas em lei; (BRASIL, 1988) [...] Cabe ainda citar o art. 1º do Decreto-Lei n. 9.760, de 05 de setembro de 1946, que dispõe sobre os bens imóveis da União: Art. 1º. Incluem-se entre os bens imóveis da União: [...] i) os arsenais com todo o material de marinha, exército e aviação, as fortalezas, fortificações e construções militares, bem como os terrenos adjacentes, reservados por ato imperial; (BRASIL, 1946) [...] As definições dos bens móveis e imóveis da União estão descritas nos artigos 79 e 82 do Código Civil e assim transcritas no Regulamento de Administração do Exército (RAE) 14: Art. 52. Os bens patrimoniais da União classificam-se em: 1) Bens imóveis - o solo com a superfície e tudo quanto o homem incorporar permanentemente ao mesmo, de modo que não se possa retirar sem destruição, modificação ou dano; 14 BRASIL. Decreto Nr 98.820, de 12 de janeiro de 1990. Aprova o Regulamento de Administração do Exército (RAE) – (R-3). p. 38. 26 2) Bens móveis - os que podem ter movimento ou que podem ser removidos por força alheia. Assim, pode-se constatar um alinhamento correto quanto à definição dos bens da União desde a Carta Magna do Brasil, perpassando pelas leis subordinadas, até chegar aos regulamentos castrenses. Com base nestas legislações, pode-se constatar que os quartéis e o material de emprego militar nele guardado, os hospitais militares com todo material hospitalar nele instalado, os próprios nacionais residenciais15 e os campos de instrução, entre outras áreas e materiais militares, são considerados bens da União. 3.2 ÁREA SOB ADMINISTRAÇÃO MILITAR Após o entendimento de quais bens são da União, há que se caracterizar aqueles que estão jurisdicionados ao Exército e que implicações a administração deles traz à Força. Inicialmente, cabe à Secretaria de Patrimônio da União (SPU) delegar a responsabilidade pela guarda e pelo uso dos bens da União a qualquer ente da administração pública, o que é feito por meio de um Termo de Entrega e Recebimento. Após a lavratura do referido termo, a jurisdição sobre o bem passa para o órgão que o recebeu, conforme previsto no Decreto-Lei Nr 9.760, de 05 de setembro de 1946: Art. 79. A entrega de imóvel para uso da Administração Pública Federal direta compete privativamente à Secretaria do Patrimônio da União - SPU. (Redação dada pela Lei nº 9.636, de 1998) § 1º A entrega, que se fará mediante termo, ficará sujeita a confirmação 2 (dois) anos após a assinatura do mesmo, cabendo ao S.P.U. ratificá-la, desde que, nesse período tenha o imóvel sido devidamente utilizado no fim para que fôra entregue. § 2º O chefe de repartição, estabelecimento ou serviço federal que tenha a seu cargo próprio nacional, não poderá permitir, sob pena de responsabilidade, sua invasão, cessão, locação ou utilização em fim diferente do que lhe tenha sido prescrito. (BRASIL, 1946) O Exército Brasileiro, órgão componente da Administração Pública Federal direta, segue este rito para o recebimento, particularmente, dos bens imóveis da União. Depois de recebido o bem imóvel, o EB lhe atribui uma destinação conforme previsto na Portaria Nr 513, de 11 de julho de 2005, que aprova as Instruções Gerais para a utilização do patrimônio imobiliário jurisdicionado ao Comando do Exército (IG 10-03): 15 Imóveis destinados à moradia dos militares em atividade na Força. 27 Art. 2º Os bens imóveis da União sob jurisdição do Comando do Exército destinam se à utilização em finalidade militar pela Força Terrestre, precipuamente, ou em finalidade complementar. § 1º O uso em finalidade militar objetiva: I - a edificação e instalação de organização militar (OM); II - a utilização como área ou campo de instrução, atracadouro ou porto e campo de pouso; III - a utilização como residência (Próprio Nacional Residencial) do militar em atividade na Força; IV - a preservação histórica, cultural ou ambiental; e V - a edificação de instalações de natureza social, cultural, desportiva, recreativa e religiosa motivada pela necessidade de assistência à tropa, administrada diretamente pelo Exército. § 2º O uso em finalidade complementar objetiva: I - apoiar as demais forças singulares, forças auxiliares, órgãos públicos e entidades civis de reconhecido interesse militar; II - prestar serviços, cuja exploração não recomende o empenho de efetivos militares; e III - otimizar o emprego do patrimônio imobiliário para gerar receitas financeiras que serão revertidas em benefício da Força. (EXÉRCITO BRASILEIRO, 2005) Assim, estão apresentados os aspectos legais que caracterizam a entrega de bens imóveis da União à jurisdição do EB, passando estas áreas a serem tratadas, genericamente, como áreas sob a administração militar. Assim, as áreas militares são bens patrimoniais militares de uso especial, sujeitos a um regime administrativo especial.16 Porém, por suas características especiais, as áreas sob a administração militar devem ser demarcadas, de forma que qualquer cidadão possa identificar seus limites e entenda as restrições que por ventura possam advir dessa delimitação. Para cumprir a finalidade acima mencionada, o Departamento de Engenharia e Construção (DEC), do EB, expediu a Portaria Nr 03-DEC, de 13 de outubro de 2009, que aprovou as Normas para Cercamento de Imóveis sob a Jurisdição do Exército (N 50-02), a qual estabelece: Art. 3º Os imóveis que se encontram sob a jurisdição do Exército devem ser demarcados e cercados por meios adequados, de modo a ficar com os limites constantes dos Títulos de Propriedade ou do Termo de Entrega e Recebimento perfeitamente definidos e materializados, permitindo ao administrador fiscalizar, nas melhores condições, o imóvel que lhe está entregue e, também, dirimir quaisquer dúvidas com os confrontantes. (EXÉRCITO BRASILEIRO, 2009) As demarcações das áreas sob jurisdição do EB deverão ser realizadas como definido no artigo quinto das supracitadas normas: Art. 5º Na materialização dos limites constantes do título de propriedade, que devem estar perfeitamente definidos na planta respectiva, utilizar-se-ão os seguintes itens: 16 Direito Ambiental em evolução, Nr 2, Vladmir P. Freitas (org)/Curitiba, 2000, pag. 16. 28 I - marcos para assinalar pontos importantes ou pontos de mudança de direção (de inflexão do perímetro) ou para materialização de alinhamentos. Deverão ser empregados marcos de concreto ou de pedra com forma de paralelepípedo, bem como as medidas e especificações descritas no ANEXO A. Na implantação dos mesmos será observado o contido nas Instruções Reguladoras para a Execução do Levantamento Topográfico de Áreas Patrimoniais (IR 50-08); II - cercas para complementar os limites estabelecidos pelos marcos, em princípio, nas áreas vizinhas a locais de média densidade de população, objetivando restringir a entrada de pessoas ou animais. Tipos de cercas a serem empregadas: [...] III - muros em áreas próximas a locais de alta densidade de população ou quando, pelas características da organização militar (OM) que ocupa o imóvel, for necessário vedar a entrada ou mesmo impedir vistas para o seu interior. Os muros poderão ser de alvenaria (de tijolo ou de pedra) ou de placas de concreto pré-fabricadas encaixadas em pilares de concreto; e IV - placas de identificação colocadas em locais bem visíveis, de maior movimento externo e junto aos limites (cercas, muros, marcos etc.). Será adotado o modelo constante do ANEXO C, podendo, conforme o caso, ser utilizado outro, mediante prévia aprovação da DPatr, sendo o espaçamento ideal entre as placas de 100 (cem) metros, podendo ser maior ou menor de acordo com as necessidades. (EXÉRCITO BRASILEIRO, 2009) As demarcações que caracterizam os limites da área sob administração militar são de relevante importância, pois estas áreas estão, em sua maioria na atualidade, envolvidas por aglomerados urbanos, sendo entrecortadas por vias públicas que são utilizadas, diariamente, pela população. Carros e motos particulares, transporte público e pessoas a pé circulam constantemente por muitas das áreas que são de responsabilidade da autoridade pública militar. Esse aspecto torna mais complexo o conceito de área sob administração militar, o que tem levado muitos juristas renomados a discutirem sua amplitude. Em estudo muito bem realizado, o Capitão do Quadro Complementar de Oficiais Heber Lima Neves, quando exercendo a função de Assessor Jurídico do Comando Militar do Planalto, apresentou definições muito bem embasadas. O Cap HEBER apresentou em seu estudo, publicado na Revista Direito Militar, Nr 34, de Março/Abril de 2002, as seguintes definições, resumidamente: a) Áreas essencialmente militares para os locais onde se exerçam as atividades essencialmente bélicas de preparação das tropas da Força, tais como os quartéis e os campos de instrução; b) Áreas de interesse militar para os locais onde, apesar de não serem desenvolvidas atividades bélicas específicas, a Força tem interesse em manter a proteção do patrimônio e do pessoal, tais como as vilas habitacionais militares e vias públicas terrestres adjacentes aos aquartelamentos; 29 c) Áreas de apoio militar para locais onde são desenvolvidas atividades de apoio as atividades de preparo e emprego da Força, tais como hospitais, colégios militares e centros tecnológicos; e d) Áreas eventualmente militares para locais, públicos ou privados, utilizados em caráter temporário por forças militares para o seu emprego, tais como ginásios e escolas utilizados como alojamentos para apoio ao pleito eleitoral. Para efeito deste estudo, torna-se relevante o conceito de área de interesse militar, pois estas áreas se configuram nas adjacências das áreas sob administração militar, que, em muitas guarnições militares, é o alvo de fiscalização da PE. Atualmente, muitos juristas, inclusive no âmbito da justiça militar, divergem na forma de se definir área sob administração militar, o que tem gerado conflito em questões judiciais, particularmente no que tange a qual esfera da justiça caberia a competência para julgar os crimes cometidos. Os conflitos advêm da definição dos crimes militares previstos no Código Penal Militar (CPM), no qual vários delitos são caracterizados por serem cometidos em áreas sob a administração militar. Art. 9º Consideram-se crimes militares, em tempo de paz: [...] II - os crimes previstos neste Código, embora também o sejam com igual definição na lei penal comum, quando praticados: [...] b) por militar em situação de atividade ou assemelhado, em lugar sujeito à administração militar, contra militar da reserva, ou reformado, ou assemelhado, ou civil; [...] III - os crimes praticados por militar da reserva, ou reformado, ou por civil, contra as instituições militares, considerando-se como tais não só os compreendidos no inciso I, como os do inciso II, nos seguintes casos: [...] b) em lugar sujeito à administração militar contra militar em situação de atividade ou assemelhado, ou contra funcionário de Ministério militar ou da Justiça Militar, no exercício de função inerente ao seu cargo; (BRASIL, 1969) Pode-se ver que a definição de um local como sujeito à administração militar não se trata de uma questão sem relevância, mas sim de um fator de relevância para o bom desempenho das funções relacionadas com a servidão militar. Neste contexto, verifica-se a situação atual de permeabilidade das áreas sob administração militar, associada ao envolvimento das áreas militares por aglomerados urbanos, obrigando as autoridades militares a estenderem a fiscalização e manutenção da segurança para as áreas adjacentes aos bens imóveis sob sua responsabilidade. O objetivo maior desta elasticidade de fiscalização está intimamente ligado à segurança pública, uma vez que na maioria das instalações 30 militares estão armazenados armamentos e materiais que colocariam a população em risco se manipulados por pessoas imperitas ou com interesses escusos. Assim, torna-se vital entender até onde, legalmente, podem se estender as adjacências das áreas sob administração militar. 3.3 ÁREAS ADJACENTES À ÁREA SOB ADMINISTRAÇÃO MILITAR O primeiro arcabouço legal que precisa ser analisado para o entendimento das adjacências de uma área sob a administração militar é o Decreto-Lei n. 3.437, de 17 de julho de 1941, que assim prescreve: Art. 1º. Na 1ª zona de 15 braças (33 metros) em torno das fortificações nenhum aforamento de terreno será concedido e nenhuma construção civil ou pública autorizada, considerando-se nulas as propriedades por ventura existentes, sem ônus para o Estado. Art. 2º. Na 2ª zona de 600 braças (1.320 metros) observar-se-á o seguinte: a) nenhum novo aforamento de terreno será concedido; b) nenhuma construção ou reconstrução será permitida fora dos gabaritos determinados pelo Ministério da Guerra que poderá também promover a desapropriação do imóvel, se necessitar do terreno as obras da Organização da Defesa da Costa; c) qualquer construção ou reconstrução em andamento, ou já autorizada, será sustada, para cumprimento do disposto na letra anterior.(BRASIL, 1941) Aliado ao mencionado decreto, é importante observar o parecer expedido pelo Excelentíssimo Senhor Procurador da República Luis Cláudio Pereira Leivas endereçado ao Tribunal Regional Federal da 2ª região17: O Ministério Público entende que EXCLUSIVAMENTE DENTRO DA ÁREA DE SERVIDÃO MILITAR DE 1.320,00 METROS À VOLTA DOS QUARTÉIS E ESTABELECIMENTOS MILITARES, A AUTORIDADE CASTRENSE TEM O DIREITO CONSTITUCIONAL DE EXERCER O PATRULHAMENTO E AS MEDIDAS DE SEGURANÇA, INCLUSIVE DE POLÍCIA ADMINISTRATIVA, NECESSÁRIAS AO ACAUTELAMENTO E PROTEÇÃO DAS GUARNIÇÕES; EQUIPAMENTOS; INSTALAÇÕES; AQUARTELAMENTOS; MATERIAL E PESSOAL, BEM COMO DE TRANSEUNTES, EVITANDO PROBLEMAS DE RESPONSABILIDADE CIVIL. Ora, A FORÇA ARMADA pode fazer policiamento ostensivo de trânsito na Área de Servidão Militar, pois essa atribuição integra o instituto e faz parte da DEFESA MILITAR PREVENTIVA DAS INSTALAÇÕES E EQUIPAMENTOS, À DISTÂNCIA; 63. Assim sendo, o Ministério Público Federal se manifesta pelo CONHECIMENTO DO RECURSO VOLUNTÁRIO E DA REMESSA DE OFÍCIO, REFORMANDO-SE PARCIALMENTE A R. SENTENÇA para : A) Assegurar à Força Armada o exercício dos direitos decorrentes da Servidão Militar nessa área que, mantendo a distância de 1.320,00 metros externa e paralelamente aos limites dos Próprios Nacionais, os circunscreve, inclusive de fiscalização do trânsito; 17 BRASIL. Tribunal Regional Federal da 2º Região. Apelação cível Nr 1999.51.01001231.4, Relator: Desembargador Raldênio Bonifácio Costa. In: Diário Oficial da Justiça, Brasília, p. 190-2, 01 nov. 2006. 31 [...] C) Garantir a aplicação de sanções de trânsito pela Força Armada em outras áreas, temporariamente, quando em missões de segurança; deslocamentos de autoridades e interdições temporárias de trânsito (batedores, bloqueios, cortejos etc); Corroborando com os dispositivos legais apresentados, destacamos o postulado elaborado pelo Cap Heber no conceito de área de interesse militar, como sendo “os locais em que Força Militar tem interesse devido aos aspectos de proteção referente ao patrimônio sob sua responsabilidade e seu pessoal, mormente, quanto aos aspectos disciplinares”. Acrescenta, ainda, que nestas áreas “não são desenvolvidas atividades bélicas específicas, mas atividades de proteção devido à importância que estas áreas têm para o desempenho das funções constitucionais da Forças Armadas”.18 Verifica-se, pois, que as adjacências de uma área sob a administração militar podem se estender por uma distância correspondente a 1320 metros da respectiva área, sendo justificável o exercício da servidão militar de controle desta adjacência em virtude da necessidade/obrigação da autoridade pública militar de prover a segurança do patrimônio e a manutenção da ordem pública. É fato que não há consenso na distância acima mencionada entre os juristas, como mostra transcrição do pedido de Argüição de Incompetência do ilustre Parquet exarado pela Promotora Najla Nassif Palma19: Com efeito, ao considerar como legal a atuação das Forças Armadas em atividades de policiamento em um raio de 1.320 metros à volta dos estabelecimentos castrenses (alcance da maior peça de artilharia da época, em 1.708), tendo em vista a grande proximidade de inúmeras unidades militares a áreas de risco com elevada criminalidade, estaríamos impondo aos militares, sem o devido respeito aos ditamos constitucionais, a obrigação de policiar áreas dentro de comunidades carentes e importantes vias públicas, dentre as quais a Avenida Brasil. Ao sentir deste Órgão Ministerial, como regra geral, não parece adequado ajustar as históricas referências do instituto da servidão militar à atual configuração urbanística da cidade do Rio de Janeiro. Contudo, não há outro dispositivo legal que defina melhor a extensão da área necessária à segurança dos aquartelamentos que o Decreto-Lei n. 3.437, de 17 de julho de 1941, que permanece em vigor. 18 Artigo publicado na revista Direito Militar, Nr 34, Março/Abril, 2002, pag. 24. BRASIL. Ministério Público Militar. Autos de 174/11, Promotora de Justiça Militar Najla Nassif Palma. Rio de Janeiro, 13 de março de 2012. 19 32 A partir do entendimento do que vem a ser uma área sob a administração militar e quais são suas adjacências, cabe verificar de quem é a responsabilidade pelas citadas áreas. 3.4 RESPONSABILIDADE PELA SEGURANÇA E MANUTENÇÃO DA ÁREA SOB ADMINISTRAÇÃO MILITAR A Portaria Nr 03-DEC, de 13 de outubro de 2009, que aprovou as Normas para Cercamento de Imóveis sob a Jurisdição do Exército (N 50-02), define no “Art. 14 Compete ao Cmt, Ch, Dir de OM zelar pela correta utilização e emprego dos imóveis sob sua carga, respondendo pessoalmente pelas irregularidades que ocorrerem”. O Regulamento de Administração do Exército (RAE) especifica no seu Art. 3º que a Administração do Exército é parte integrante da Administração Federal, e a ela se subordina segundo normas legais 20. Segundo o mesmo regulamento anteriormente citado, o Cmt, Ch ou Dir de uma OM é o agente da administração investido da autoridade legal para administrar, empregar, instruir e disciplinar sua OM21, cabendo-lhes participar da administração do patrimônio público. Todos os bens patrimoniais sob gestão de qualquer OM do EB pertencem à União, sendo este patrimônio composto pelo conjunto de todos os bens, valores, direitos e obrigações vinculadas à determinada OM e pecuniariamente mensuráveis. As OM do EB se constituem em órgãos públicos, sendo chamadas para fins da Administração do Exército de Unidades Administrativas (UA), as quais estão estruturadas para o exercício da administração própria e possuem competência para gerir bens da União, assim definido no RAE22: Art. 54. As providências para a manutenção dos bens patrimoniais, sejam móveis ou imóveis, são da responsabilidade da Unidade Administrativa que mantém sua guarda, obedecidas as prescrições contidas nos regulamentos e normas pertinentes. Assim, verifica-se que o agente público, no âmbito da Administração do Exército, que é responsável pela gestão do patrimônio da União distribuído entre cada uma de suas OM é o seu respectivo Cmt, Ch ou Dir em todos os níveis, o qual 20 BRASIL. Decreto Nr 98.820, de 12 de janeiro de 1990. Aprova o Regulamento de Administração do Exército (RAE) – (R-3). p. 10. 21 Ibidem, p. 9. 22 Ibidem, p. 38. 33 se vale dos seus subordinados, como agentes executores diretos ou indiretos, para exercer sua função administrativa. O parecer expedido pelo Excelentíssimo Senhor Procurador da República Luis Cláudio Pereira Leivas endereçado ao Tribunal Regional Federal da 2ª região caracteriza os aspectos acima mencionados23: ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. FORÇAS ARMADAS. ATRIBUIÇÕES. FISCALIZAÇÃO DO TRÂNSITO EM BENS PÚBLICOS FEDERAIS, OBJETO DE SERVIDÃO MILITAR. ART. 142, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. LEI COMPLEMENTAR Nº 97/99. ART. 24, INC. V, DO CÓDIGO NACIONAL DE TRÂNSITO. RESOLUÇÃO SMTR N.º 842, DO SECRETÁRIO MUNICIPAL DE TRÂNSITO. 1- Ao fiscalizar o trânsito nas ruas e avenidas da Vila Militar, o Exército exerce sua atribuição constitucional de defesa do patrimônio que lhe é afetado, assegurando a proteção de seu pessoal e de transeuntes, evitando inclusive alegações de responsabilidade civil, uma vez que tais logradouros possuem a natureza jurídica de bens públicos federais, regularmente adquiridos, sujeitos à disciplina do instituto da servidão militar. 2- Todos os bens e direitos reais federais gozam da proteção constitucional, que deve ser argüida, na espécie, a favor da União, sendo lícita e de base constitucional qualquer atividade fiscalizatória ou de polícia administrativa das Forças Armadas, garantindo-se a segurança e a integridade dos Próprios Nacionais, das vias que os integram, atravessam ou são contíguas, dos funcionários e de transeuntes, no raio de 1.320,00 metros à volta dos estabelecimentos castrenses, decorrente do instituto da servidão militar. 3- É inequívoca a observância do papel das Forças Armadas outorgado pelo art. 142 da Lei Maior e regulamentado pela Lei Complementar 97/99, bem como sua participação na ordem democrática, no âmbito de seu destino constitucional, estando plenamente integradas ao Poder Civil, nos projetos comuns de interesse da sociedade. 4- A força armada pode fazer policiamento ostensivo de trânsito na Área de Servidão Militar, pois essa atribuição integra o instituto e faz parte da defesa militar preventiva das instalações e equipamentos, à distância, não se ferindo, assim, a Resolução SMTR nº 842, do Secretário Municipal de Trânsito, nem tampouco se contrariando o dispositivo do inciso V, do artigo 24, do Código Nacional de Trânsito. 5- Apelação e remessa necessária parcialmente providas, reformando-se parcialmente a r. sentença a quo, para que a atuação da Força Armada só se verifique na forma e meios constitucionais, assegurando-se-lhe o exercício dos direitos decorrentes da Servidão Militar na área em questão, mantendo a distância de 1.320,00 metros externa e paralelamente aos limites dos Próprios Nacionais, inclusive na fiscalização do trânsito, garantindo a validade da Resolução SMTR nº 842, do Secretário Municipal de Trânsito, convalidando os atos administrativos praticados, garantindo-se, outrossim, a aplicação de sanções de trânsito pela Força Armada em outras áreas, temporariamente, quando em missões de segurança. Porém, existem entendimentos diferentes entre os juristas no que tange ao assunto, particularmente, quando na análise do patrimônio em questão ocorre a necessidade da definição de área sob a administração militar, conceito, como 23 BRASIL. Tribunal Regional Federal da 2º Região. Apelação Cível. Relator: Desembargador Federal Raldênio Bonifácio Costa. In: Diário da Justiça, 01 de novembro de 2006, p.190-2. 34 anteriormente mencionado, que enseja interpretações por falta de definição clara na legislação. Mas, independente de qualquer interpretação, é juridicamente definida e inquestionável a responsabilidade do agente da administração militar perante o patrimônio público sob sua guarda. 35 4 O AGENTE PÚBLICO E O PODER DE POLÍCIA 4.1 PRINCIPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA O Direito Administrativo é “o conjunto harmônico de princípios jurídicos que regem os órgãos, os agentes e as atividades públicas tendentes a realizar concreta, direta e imediatamente os fins desejados pelo Estado” 24 , sendo que os princípios fundamentais que regem a administração pública estão expressos no Art. 37 da CF/88, assim descritos: Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência [...] (BRASIL, 1988) Segundo CAVALCANTE FILHO25, os princípios da legalidade (a Administração só pode fazer exatamente aquilo que a lei manda ou determina), da impessoalidade (o administrador público não é dono da coisa pública, mas sim mero gestor), da moralidade (as decisões do administrador público devem ser justas, honestas, de boa-fé, respeitando os direitos dos administrados e a separação entre o público e o privado), da publicidade (dever geral do administrador de tornar público todos seus atos administrativos) e da eficiência (as ações do administrador devem se pautar pelos binômios qualidade-rapidez e custo-benefício na consecução das metas estipuladas) são os ditos princípios explícitos, por estarem escritos de forma clara e centralizada na Constituição Federal. Porém, existem outros princípios da Administração Pública dispersos ao longo do texto constitucional e, por isso, ditos implícitos, tais como, “o princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado, o princípio da finalidade, o princípio da razoabilidade, o princípio da proporcionalidade, o princípio da motivação, o princípio do devido processo legal e da ampla defesa, o princípio do controle judicial dos atos administrativos, o princípio da responsabilidade do Estado por atos administrativos e o princípio da segurança jurídica”26. No que tange aos chamados princípios implícitos, existem divergências entre os diversos doutrinadores do Direito Administrativo, os quais, por vezes, somam alguns 24 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 29. 25 CAVALCANTE FILHO, João Trindade. Roteiro de Direito Constitucional. 3ª ed. Brasília: Gran Cursos, 2010. p. 245. 26 BANDERA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 13ed. São Paulo: Ed. Malheiros, 2000. p. 95. 36 e subdividem outros. Neste contexto, BLANCHET27 apresenta, além dos já citados, outros princípios de grande importância para o presente estudo, como, por exemplo, a responsabilidade patrimonial. Dentre os diversos princípios implícitos da Administração Pública, tem especial interesse para este estudo o dito princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, por vezes chamado, por alguns autores, de princípio da finalidade ou, simplesmente, princípio do interesse público. Na Lei n. 9.784, de 29 de janeiro de 1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado aparece destacado no caput Art. 2º: o Art. 2 A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência. (BRASIL, 1999) [grifo nosso] O princípio da supremacia do interesse público sobre o privado garante ao Estado a autoridade necessária para poder fazer valer o interesse da coletividade sobre os interesses de cada indivíduo em particular, preservando a ordem e a segurança social, mesmo que para isto tenha que restringir algumas das garantias individuais. Nesse sentido, CARVALHO FILHO28 assim destaca: O indivíduo tem que ser visto como integrante da sociedade, não podendo os seus direitos, em regra, ser equiparados aos direitos sociais. Vemos a aplicação do princípio da supremacia do interesse público, por exemplo, na desapropriação, em que o interesse público suplanta o do proprietário; ou no poder de polícia do Estado, por força do qual se estabelecem algumas restrições às atividades individuais. Nas palavras de MEIRELLES, enquanto o Direito Privado guarda a igualdade das partes nas relações jurídicas, o Direito Público assenta na prevalência dos interesses coletivos sobre os individuais. O autor ressalta, ainda, que “sempre que entrarem em conflito o direito do indivíduo e o interesse da comunidade há que se prevalecer este, uma vez que o objetivo primacial da Administração é o bem comum”.29 Assim, os indivíduos que compõem a sociedade têm que ter o discernimento de que a subordinação de um interesse particular ao interesse coletivo visa, tão 27 BLANCHET, Luiz Alberto. Curso de Direito Administrativo. Curitiba: Juruá Editora. 1998. p. 35. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 15. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 23. 29 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 27. ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 47. 28 37 somente, a um bem maior para si mesmo, uma vez que a Administração Pública visa à harmonização das relações em coletividade em um sistema democrático e constitucional. Atualmente, existem correntes doutrinárias modernas que têm promovido um amplo debate em torno da chamada “desconstrução” do princípio da supremacia do interesse público, cujo objetivo maior é a comprovação da necessidade da manutenção deste princípio pela Administração Pública para limitar os interesses particulares em prol da coletividade. Mas, fica evidente que o debate surge em face da má aplicação do citado princípio pelo administrador público que, por vezes, banaliza sua utilização. Nesta conjuntura, DANIEL SARMENTO, um dos autores que alimenta o supracitado debate, afirma em sua obra “Interesses públicos versus interesses privados: desconstruindo o princípio da supremacia do interesse público”, que “a desvalorização total dos interesses públicos diante dos particulares pode conduzir à anarquia e ao caos geral, inviabilizando qualquer possibilidade de regulação coativa da vida humana em comum”.30 Em suma, o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado é vital para a manutenção da organização e segurança de uma sociedade justa e ordeira. Porém, este princípio tem que ser vinculado a outros princípios da Administração Pública, notadamente, os da legalidade, razoabilidade e proporcionalidade, para que as decisões tomadas pela autoridade pública estejam, realmente, em acordo com o que é de interesse coletivo e preservem, quando adequado, as garantias individuais que caracterizam o Estado Democrático de Direito. No que tange às normas castrenses, vale destacar que o Art. 107 do RAE cita o principio da supremacia do interesse público sob o privado, regulando que “a responsabilidade dos agentes da administração decorre do princípio da prevalência total do interesse público ou coletivo sobre o particular” 31 . Mas, a Administração Pública e os entes que a compõem necessitam de “ferramentas” que lhes possibilitem cumprir o dever de garantir a satisfação do interesse público ante o privado. Assim, surgem os poderes da Administração 30 SARMENTO, Daniel. Interesses Públicos versus Interesses Privados: desconstruindo o princípio de supremacia do interesse público. 2ª tiragem. Editora Lúmen Júris. Rio de Janeiro, 2007, pag. 28. 31 BRASIL. Decreto Nr 98.820, de 12 de janeiro de 1990. Aprova o Regulamento de Administração do Exército (RAE) – (R-3). p. 59. 38 Pública, que são definidos por CARVALHO FILHO como sendo o “conjunto de prerrogativas de direito público que a ordem jurídica confere aos agentes administrativos para o fim de permitir que o Estado alcance seus fins” 32. Destaca-se que o dito poder se confunde com o dever do administrador público, pois este tem a obrigação de exercê-lo em nome da coletividade, não lhe cabendo faculdade para o exercício de tal poder, assim posto por BANDEIRA DE MELLO 33: [...] as prerrogativas que nesta via exprimem tal supremacia (do interesse público sobre o interesse privado) não são manejáveis ao sabor da Administração, porquanto esta jamais dispõe de “poderes”, sic et simpliciter. Na verdade, o que nela se encontram são “deveres-poderes”, como a seguir se aclara. Isto porque a atividade administrativa é desempenho da “função”. Tem-se função apenas quando alguém está assujeitado ao dever de buscar, no interesse de outrem, o atendimento de certa finalidade. Para desincumbir-se de tal dever, o sujeito de função necessita manejar poderes, sem os quais não teria como atender à finalidade que se deve perseguir para a satisfação do interesse alheio. Assim, ditos poderes são irrogados, única e exclusivamente, para propiciar o cumprimento do dever a que são jungidos; ou seja: são conferidos como meios impostergáveis ao preenchimento da finalidade que o exercente de função deverá suprir. Assim sendo, MEIRELLES define os poderes administrativos como sendo o poder vinculado (aquele que é exercido com base na lei, sem possibilidade de interferência da vontade administrativa), discricionário (aquele que permite ao administrador escolher entre as opções viáveis a que mais se vincule ao interesse público), hierárquico (aquele que promove a organização de subordinação entre agentes públicos), disciplinar (aquele que a prerrogativa estatal de impor deveres, proibições e sanções), regulamentar (aquele que garante a edição de normas complementares às leis, definindo alcance e modo de execução) e, finalmente, o poder de polícia (aquele que condiciona a liberdade e a propriedade, ajustando-as aos interesses coletivos) 34. Sem desvincular a importância de qualquer um dos poderes da Administração Pública do seu executor, sabendo que há uma interdependência entre eles, para efeito deste estudo se torna essencial a análise do chamado poder de polícia. 32 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 12. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 38. 33 BANDERA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 13ed. São Paulo: Ed. Malheiros, 2000. p. 68. 34 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 19ª ed. São Paulo: Ed. Malheiros, 1994. p. 100. 39 4.2 O PODER DE POLICIA O poder de polícia é um dos poderes da Administração Pública que se encontra definido na Lei Nr. 5.172 de 25 de outubro de 1966, Código Tributário Nacional, que em seu art. 78 estabelece o seguinte conceito: Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos. Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder. (BRASIL, 1966) CAIO TÁCITO, afirma em seu artigo “Princípio de Legalidade e Poder de Polícia”, publicado na Revista de Direito Administrativo da Fundação Getúlio Vargas, que “o poder de polícia é, em suma, o conjunto de atribuições concedidas à Administração para disciplinar e restringir, em favor do interesse público adequado, os direitos e as liberdades individuais” 35. Ou seja, é por meio do poder de polícia que a Administração Pública atua para evitar qualquer tipo de dano à coletividade, agindo por meio de ações limitadoras das liberdades individuais que seguem os princípios da legalidade, da razoabilidade e da proporcionalidade, entre outros. A abrangência do poder de polícia do Estado se estende a todas as áreas do interesse público, como destaca CAVALCANTI em sua obra, afirmando que este poder “inclui todas as restrições impostas pelo poder público aos indivíduos, em benefício do interesse coletivo, saúde, ordem pública, segurança, e ainda mais, os interesses econômicos e sociais” 36. Também, para o bom entendimento da necessidade do exercício do poder de polícia pelo Estado e de sua finalidade, cabe destacar a definição clássica de LAUBADÈRE citada por CRETELLA JÚNIOR37: O poder de polícia ensina LAUBADÈRE, define-se pelo fim que tem em mira e que é o de assegurar a tranqüilidade (ausência de risco de desordem), a 35 TÁCITO, Caio. O princípio de legalidade e Poder de polícia. Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro, Nr 227, jan.-mar. 2002. p. 39-45. 36 CAVALCANTI, Themistocles Brandão. Curso de Direito Administrativo. 3ª ed. Rio de Janeiro: Ed Livraria Freitas Bastos, 1954. p. 127. 37 CRETELLA JÚNIOR, José. Curso de Direito Administrativo. 6. ed. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1981, p. 598. 40 segurança (ausência de risco de acidentes) ou a salubridade pública (ausência do risco de moléstias). Como se pode ver, o poder de polícia é bastante amplo, atingindo as mais variadas áreas da sociedade. Este aspecto incitou ao surgimento de vários sistemas para classificar o poder de polícia em função de suas atribuições. No Brasil, foi adotado o chamado sistema jurídico ou francês, assim explicado de forma sintética por ANDRADE 38 : Pelo sistema jurídico, à polícia compete prevenir os crimes e evitar que os criminosos fujam à ação da Justiça; e, ainda, auxiliá-la na colheita dos indícios e provas do crime. No primeiro caso, temos a polícia administrativa; e, neste a polícia judiciária. [...] No Brasil, prepondera o sistema jurídico ou francês tendo à polícia a dupla função – administrativa e judiciária. Esta, porém, não passa da fase preparatória da instrução penal, cabendo às autoridades policiais as providências preliminares de natureza urgente, coligir os elementos de prova, tomar medidas que impeçam a fuga do criminoso, ou ocultação de coisas e pessoas, e o desaparecimento de circunstâncias que possam interessar à ação da Justiça. Do acima exposto, depreende-se a existência no âmbito da Administração Pública brasileira de um poder de polícia administrativo, vinculado as ações preventivas, e um poder de polícia judiciária, atrelado às ações repressivas. Estes aspectos ficam definidos por CAVALCANTI 39 da seguinte forma: As medidas repressivas caracterizam-se melhor pela sua íntima subordinação às determinações legais, e isto porque elas importam, quase sempre, na aplicação de penalidades cuja legitimidade depende de uma determinação expressa de lei. As medidas preventivas, pelo contrário, embora importem em restrição à liberdade individual, não são de molde a ferir direitos essenciais, acarretando, quase sempre, uma pequena restrição em benefício do interesse público. Assim, compilando o que concerne ao poder de polícia administrativo, destacase a definição expressa por CRETELLA JÚNIOR 40 : A polícia administrativa ou preventiva incumbe, em geral, a vigilância, proteção da sociedade, manutenção da ordem e tranqüilidade públicas, bem assim, assegurar os direitos individuais e auxiliar a execução dos atos e decisões da Justiça e da Administração. Destacam-se, ainda, em relação ao assunto, os aspectos descritos por BANDEIRA DE MELLO 41 : 38 ANDRADE, Ivan Moraes de. Polícia Judiciária. 2ª ed. Rio de Janeiro: Ed. Forense. 1958. p. 49. CAVALCANTI, Themistocles Brandão. Curso de Direito Administrativo. 3. ed. Rio de Janeiro: Ed Livraria Freitas Bastos, 1954. p. 128. 40 CRETELLA JÚNIOR, op. cit., p. 605. 41 BANDERA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 13ed. São Paulo: Ed. Malheiros, 2000. p. 708. 39 41 Resumidamente, pode-se dizer que a polícia administrativa propõe-se a salvaguardar os seguintes valores: a) de segurança pública; b) de ordem pública; c) de tranqüilidade pública; d) de higiene e saúde pública; e) estéticos e artísticos; f) históricos e paisagísticos; g) riquezas naturais; h) moralidade pública; i) economia popular. Já em relação à polícia judiciária CRETELLA JÚNIOR 42 assim se posiciona: A polícia judiciária tem por fim efetuar a investigação dos crimes e descobrir os agentes, procedendo à instrução preparatória dos respectivos processos e organizar a prevenção da criminalidade, especialmente da criminalidade habitual. Por meio das supracitadas definições relacionadas à divisão do poder de polícia, pode-se concluir que há uma estreita relação no funcionamento de ambas. Enquanto a polícia administrativa procura preservar os bens, patrimônio e a ordem, entre outros aspectos, valendo-se de ações preventivas, a polícia judiciária investiga os agentes que burlaram as medidas preventivas e cometeram atos ilícitos, encarregando-se de entregá-los aos competentes órgãos do Poder Judiciário. Porém, mesmo havendo a divisão acima citada do poder de polícia, este poder administrativo tem características comuns que são a discricionariedade, a autoexecutoriedade e a coercibilidade. A discricionariedade no exercício do poder de polícia significa que a administração depõe de certa liberdade de atuação para definir seus atos, os quais devem ser pautados na oportunidade e conveniência, estabelecendo o motivo dentro dos limites legais a fim de proteger o interesse da coletividade 43. O que caracteriza o poder de polícia como tendo autoexecutoriedade é “a prerrogativa de praticar atos e colocá-los em imediata execução, sem dependência à manifestação judicial” 44 , tudo com o objetivo e foco de realizar a necessária proteção de qualquer tipo de interesse coletivo. Ainda, o poder de polícia apresenta como característica própria a coercibilidade, que se traduz na possibilidade do emprego de medidas coativas, que poderão, em uma escala de crise, chegar até o emprego da força para que se faça valer a autoridade da Administração Pública sob os administrados em prol da manutenção dos interesses coletivos. Salienta-se que a imposição coercitiva dos atos de polícia independe de prévia autorização judicial, mas estará sujeita a 42 CRETELLA JÚNIOR, José. Curso de Direito Administrativo. 6. ed. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1981, p. 593. 43 VICENTE, Paulo; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Administrativo Descomplicado. 21ª Ed. São Paulo: Método, 2013. p. 255. 44 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 15. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 74. 42 verificação posterior quanto à legalidade, que poderá culminar com uma anulação de ato e a reparação ou indenização do particular em caso de comprovado excesso ou desvio de poder 45. Entendido o poder de polícia estatal, as suas subdivisões e características, o passo seguinte vem a ser definir quem é o agente executor ou aquele que tem a prerrogativa de exercer o poder de polícia na Administração Pública Federal. Surge, então, a necessidade de compreensão de quem são os agentes públicos. 4.3 OS AGENTES PÚBLICOS Inicialmente, ressalta-se que a expressão agente público é bastante ampla, sendo definida por CAVALCANTI FILHO como “todos aqueles que exercem alguma função pública (estatal); todos os que, a qualquer título, atuam em nome do Estado” 46 . A Lei Nr 8.429, de 2 de junho de 1992, que dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional e dá outras providências, assim define o agente público: Art. 2° Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior. (BRASIL, 1992) O artigo supracitado faz menção a todos os agentes de qualquer um dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, ou seja, engloba “desde as mais altas autoridades da República, como os Chefes do Executivo e os membros do Poder Legislativo, até os servidores que executam as mais humildes tarefas, todos se qualificam como agentes públicos, vinculados que estão aos mais diversos órgãos estatais” 47. Em virtude da amplitude do conceito, existem formas variadas de classificar os agentes públicos. Uma divisão didática, que busca guardar as semelhanças entre os agentes públicos de forma que sejam agrupados de maneira relativamente 45 VICENTE PAULO, Marcelo Alexandrino. Direito Administrativo Descomplicado. 21ª Ed. São Paulo: Método, 2013. P. 258. 46 CAVALCANTE FILHO, João Trindade. Roteiro de Direito Constitucional. 3ª. ed. Brasília: Gran Cursos, 2010. p. 248. 47 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 15. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 487. 43 homogênea, é a classificação em agentes políticos, agentes particulares colaboradores e servidores públicos. A classificação de agentes políticos envolve aqueles que “exercem as funções de direção do Estado, integrando a estrutura constitucional (central) de cada um dos poderes” 48 . São eles os Chefes do Executivo e seus auxiliares e os membros do legislativo, entre outros. Os agentes particulares colaboradores são aqueles que, “embora sejam particulares, executam certas funções especiais que podem se qualificar como públicas, sempre como resultado do vínculo jurídico que os prende ao Estado” 49 , como, por exemplo, os jurados, as pessoas convocadas para serviços eleitorais e os titulares de ofício de notas de registros não oficializados. Porém, a classificação que engloba a maioria dos agentes públicos é a de servidor público. Esta categoria diz respeito aos agentes que se vinculam ao Estado por uma relação permanente de trabalho e recebem a sua remuneração dos cofres públicos. Alguns autores classificam os agentes públicos que se enquadram nesta definição como agentes administrativos. São características inerentes aos servidores públicos a profissionalidade, a definitividade e a relação jurídica de trabalho. Por ser uma categoria de grande contingente, tanto qualitativo quanto quantitativo, a categoria dos servidores públicos apresenta, também, algumas subdivisões didáticas. Para efeito deste estudo, seguiu-se a divisão em servidores públicos civis e militares. A distinção entre os dois grupos é dada pela CF/88, que nos artigos de 39 a 41 registra as regras aplicáveis aos servidores públicos civis, e pela EC Nr 18/98, que define o grupo dos militares dos Estados, Distrito Federal e Territórios, e dos militares das Forças Armadas, integrantes da União Federal. Nas palavras de CARVALHO FILHO 50 : A despeito da alteração introduzida pela EC/98, que substituiu a expressão “servidores públicos civis” por “servidores públicos” (Título II, Capítulo VII, Seção II arts. 39 a 41) e da eliminação da expressão “servidores públicos militares”, substituída por “Militares dos Estados, Distrito Federal e Territórios” (Seção III, mesmos Capítulo e Título, art. 42), com a inclusão dos militares federais no Capítulo das Forças Armadas (Título V, Capítulo II, 48 CAVALCANTE FILHO, João Trindade. Roteiro de Direito Constitucional. 3ª. ed. Brasília: Gran Cursos, 2010. p. 248 49 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 15. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 489. 50 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 15. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 492. 44 arts. 142 e 143), o certo é que, em última análise, todos são servidores públicos lato sensu, embora diversos os estatutos jurídicos reguladores, e isso porque, vinculados por relação de trabalho subordinado às pessoas federativas, percebem remuneração como contraprestação pela atividade que desempenham. Do exposto, pode-se constatar que os integrantes do EB, como militares integrantes de uma das forças singulares que compõem às Forças Armadas brasileiras, são agentes públicos, inseridos no grupo dos servidores públicos, que apesar de regidos por estatutos próprios, detém os mesmos poderes e os mesmos deveres de qualquer agente público da União. Assim, surgem os próximos pontos a serem explorados, quais sejam, os deveres dos agentes públicos. 4.4 DEVERES DO AGENTE PÚBLICO Como já visto anteriormente, os agentes públicos são dotados de poderes específicos, tais como o poder de polícia, para que possam exercer suas funções públicas e atingir o objetivo maior de garantir os interesses coletivos como um todo, buscado a manutenção de uma sociedade harmônica, organizada e justa. Paralelamente aos poderes dos agentes públicos estão os deveres administrativos que visam a assegurar que a atuação dos referidos agentes ocorra efetivamente em benefício do interesse público e sob controle direto e indireto do povo 51. Os deveres administrativos são: o poder-dever de agir, o dever de eficiência, o dever de prestar contas e o dever de probidade. O poder-dever de agir se traduz em dizer que os poderes administrativos delegados a um agente público são irrenunciáveis, havendo a obrigatoriedade de seu exercício por quem o detém. Vinculado ao mesmo dever, salienta-se que “a omissão do agente, diante de situações que exigem sua atuação, caracteriza abuso de poder, que poderá ensejar, inclusive, responsabilidade civil da administração pública, pelos danos que porventura decorram da omissão ilegal” 52. 51 VICENTE PAULO, Marcelo Alexandrino. Direito Administrativo Descomplicado. 21ª Ed. São Paulo: Método, 2013. p. 219. 52 VICENTE PAULO, Marcelo Alexandrino. Direito Administrativo Descomplicado. 21ª Ed. São Paulo: Método, 2013. p. 220. 45 O dever de eficiência, erigido à categoria de princípio constitucional administrativo pela EC 19/199853, impõe ao agente público a obrigação de trabalhar no mais elevado patamar de qualidade, atuando de forma a atender características como perfeição técnica, coordenação, economicidade e controle, entre outros aspectos. O dever de prestar contas é a obrigação do agente público de demonstrar que os interesses do povo sob sua gestão estão preservados, caracterizando a conservação constante dos bens públicos. Por fim, o agente público tem o dever de probidade que concerne, basicamente, à sua conduta no exercício de suas funções, se pautando pela ética, honestidade e boa-fé. O não cumprimento de tal dever caracteriza os chamados atos de improbidade administrativa. Entenda-se por ato de improbidade administrativa todos os atos provenientes de agentes públicos que atentem contra o erário, o patrimônio público e os princípios e parâmetros da ordem moral e constitucional. No que tange às normas militares, quando se fala em improbidade, é importante salientar o “Art. 112. A isenção de culpa, quando for o caso, só caberá ao responsável que tenha adotado providências adequadas e oportunas e de sua alçada para evitar o prejuízo ou dano” 54. 53 Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte 54 BRASIL. Decreto Nr 98.820, de 12 de janeiro de 1990. Aprova o Regulamento de Administração do Exército (RAE) – (R-3). p. 61. 46 5 CONCLUSÃO O objetivo geral deste trabalho abordou uma apreciação do poder de polícia atribuído às Organizações Militares de Polícia do Exército nas atividades de manutenção da segurança das áreas e instalações sob administração militar, dando ênfase aos bens da União jurisdicionados ao Exército Brasileiro e seguindo a luz do ordenamento jurídico pátrio existente. A pesquisa foi baseada na consulta as leis existentes sobre o assunto e na realização de uma pesquisa bibliográfica e documental sobre o assunto. Neste contexto, foi constatado que as Organizações Militares de Polícia do Exército estão subordinadas às Grandes Unidades, aos Grandes Comandos Operativos e aos Comandos Militares de Área, estando diretamente submetidas à autoridade de um oficial general, o qual se configura em um comandante militar com mais de trinta anos de serviços prestados à Força Terrestre e com grande experiência administrativa. Constatou-se, também, que os integrantes das OMPE recebem um adestramento peculiar para executar as missões de policiamento ostensivo, controle de trânsito, segurança de autoridades e instalações, dentre outras. Para isso, as competências necessárias são desenvolvidas em todos os níveis. Os oficiais e praças das OMPE realizam o Curso de Policial do Exército, no qual aprendem e aprimoram os conhecimentos técnico-profissionais necessários ao desempenho de suas funções como comandantes de frações de PE. Os cabos e soldados das OMPE, por sua vez, são instruídos nos quartéis e conduzidos em operações por militares capacitados, como acima citado. Verificouse, ainda, que nos programas de instrução dos soldados de PE constam matérias que os habilitam ao exercício da função policial, sendo que estão plenamente capacitados a conduzirem ações em vias públicas em consonância com os princípios legais vigentes e agindo de forma acertada e oportuna. Ademais, os integrantes das OMPE são dotados de materiais de emprego militar específicos destinados ao exercício da atividade policial, tais como sinalizadores de trânsito, armamentos não-letais e cães-de-guerra, dentre outros. Destaca-se, ainda, que as OMPE possuem em seu organograma frações peculiares, tais como o PIC e o Pel Esct, que permitem a condução de perícias criminais em 47 apoio à polícia judiciária militar, quando necessário, e aumentam a amplitude de atuação de suas demais peças de manobra. Assim, pode-se constatar que as OMPE são importante meio de fiscalização das áreas militares, principalmente, naquelas onde estejam inseridos os patrimônios da União sob responsabilidade da autoridade militar do EB. Esta fiscalização tem caráter preventivo, tendo o intuito, não só, de dissuadir às pessoas malintencionados de descumprirem os ditames legais, mas, também, de identificar prontamente os casos de inobservância das leis, limitando, assim, a ocorrência de possíveis danos, ou mesmo, evitando que aconteçam. Neste ínterim, ficou evidente que todas as organizações militares e o material nelas armazenado fazem parte do patrimônio da União, cabendo ao seu comandante, chefe ou diretor a responsabilidade direta, frente à Administração Pública Federal, pela guarda, preservação e correta destinação do respectivo bem. Porém, para que sejam viáveis a guarda, a preservação e a correta destinação dos bens supracitados, não basta ser realizada apenas uma segurança intramuros das OM. A expansão e o crescimento desordenado dos centros urbanos fizeram com que as áreas militares fossem entrecortadas por vias públicas de toda ordem. Calçadas e ruas passaram a tangenciar os muros das OM, permitindo uma intensa circulação de civis em torno das instalações militares, na quais, diariamente, são desenvolvidas atividades bélicas. Paralelamente, ao problema acima mencionado, surge a falta de exatidão na compreensão do que vem a ser uma “área sob administração militar”, chegando a ser classificada como um termo jurídico indefinido, ou seja, deixando ao jurista ou legislador a interpretação da definição quando da ocorrência de um caso concreto. Mas, independente da definição jurídica, o fato é que o fluxo de civis nas áreas sob administração militar apresenta duas principais vertentes de risco. A primeira é para o próprio cidadão, pois, pelas características das atividades militares, é natural que ocorra em áreas militares a manipulação de armas de fogo e explosivos e a circulação de viaturas de grande porte e pouca mobilidade, entre outras ameaças a segurança dos transeuntes. A segunda é a facilidade para que pessoas com interesses escusos se aproximem demasiadamente das instalações militares e possam praticar atos ilícitos, tais como, furto de armamentos e vandalismos, entre outros, os quais se tornam uma ameaça à sociedade como um todo. 48 Desta forma, houve a necessidade de se expandir a segurança para o entorno das OM, cabendo a utilização do preconizado no Decreto-Lei Nr 3.437, de 17 de julho de 1941, ainda em vigor, como referência para a caracterização da amplitude a ser data à periferia das OM, sendo sustentada a distância de 1320 metros dos muros do aquartelamento. Mesmo havendo questionamentos por parte da própria Justiça Militar a respeito desta extensão, não há outro estatuto que melhor defina esta área. Neste ponto, cabe salientar o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado preconizado pela Administração Pública, o qual justifica a autoridade atribuída aos agentes do Estado para fazerem valer o interesse da coletividade sobre os interesses de cada individuo em particular, a fim de preservar a ordem pública e a segurança nacional. Assim, os militares como agentes públicos que o são, inseridos na categoria de servidores públicos, por serem agentes do Estado vinculados a este por uma relação de trabalho e remuneração, devem seguir o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado no exercício de suas funções. Para que este princípio seja preservado pela autoridade militar encarregada de um patrimônio da União, a Administração Pública concede a seu agente o poder de polícia. O poder de polícia, definido na Lei Nr 5.172, de 25 de outubro de 1966, garante ao agente público autoridade para limitar ou disciplinar direito, interesse ou liberdade em razão de interesse público ligado à segurança, à ordem, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade, entre outros aspectos. O poder de polícia quando exercido em caráter preventivo, ainda que em algumas circunstâncias se torne coercitivo, é chamado poder de polícia administrativa. O poder de polícia administrativa vinculado ao EB está definido em algumas leis, tais como, a Lei do Serviço Militar (Lei Nr 4.375/ 64 e o Decreto Nr 57.654/ 66), a Lei que instituiu as atividades de fiscalização previstas no Sistema Nacional de Armas (Lei Nr 10.826/ 03 e Decreto Nr 5.123/ 04), o decreto que aprova o Regulamento para Fiscalização de Produtos Controlados (Decreto Nr 3.665/ 00), a Lei Nr 10.683/ 03 que determina a segurança das instalações presidenciais e o Decreto Nr 4.332/ 02 que permite a segurança nas viagens presidenciais. Entretanto, uma série de situações e algumas legislações infraconstitucionais vêm ampliando o leque de atribuições das Forças Armadas, agregando outras tarefas, tais como, a segurança de eventos internacionais, a garantia do processo eleitoral, a garantia da 49 infra-estrutura crítica nacional, controle de trânsito em escoltas e áreas sob a jurisdição militar e no apoio a defesa civil. Particularmente, em relação ao controle de trânsito e policiamento ostensivo em áreas sob administração militar não há amparo legal explícito. Mas, como apresentado no desenvolvimento deste trabalho, existem juristas, que por meio de seus pareceres, caracterizam a legalidade e necessidade desta atividade nas áreas militares com o objetivo maior de manter e preservar o patrimônio e a ordem. O agente da administração no EB, ou seja, todos aqueles que participam da administração do patrimônio público, são agentes públicos investidos de deveres. Estes deveres impõem ao agente a necessidade de ser eficiente, trabalhando com perfeição técnica e economicidade; o exercício da função sem omissão, a título de ser responsabilizado civilmente por danos que por ventura ocorram; a demonstração pública de cuidado dos bens sob sua responsabilidade; e, ainda, exercer sua função com ética, honestidade e boa-fé. Desta forma, é que, novamente, se destaca as OMPE como ferramenta essencial nas mãos dos Cmt militares a que estão subordinadas, pois estes podem, por meio de uma tropa especializada na atividade policial e dotada de material de emprego militar adequado, exercer sua função de agente público e administrador militar, conciliando suas obrigações administrativas com uma tropa capacitada para a atuação em vias públicas. É o exercício do poder de polícia administrativa que garante a PE trabalhar de forma preventiva na segurança das áreas sob administração militar onde estejam atuando, inviabilizando, desta maneira, a ocorrência de inúmeros ilícitos. E, na hipótese de durante o ato de fiscalização ser observado o comedimento de infrações, os PE são instruídos e preparados para atuar repressivamente, em acordo com seu programa de instrução e com as prerrogativas consignadas pelo poder de polícia administrativa. O fato de não haver um amparo legal explícito para as atividades de controle de trânsito e policiamento ostensivo em áreas sob administração militar, apesar de reconhecidamente necessárias e aceitas por muitos juristas e plenamente justificável dentro dos ditames do Direito Administrativo brasileiro, exige que as ordens expedidas para tal atuação, sigam os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, e que, seguindo o poder discricionário que lhe compete, o ordenador seja coerente com o efeito que se deseja atingir. Em outras palavras, as 50 limitações e restrições impostas devem interferir ao mínimo na rotina dos transeuntes, limitando-se exclusivamente as ações que se fizerem necessárias para a preservação da ordem pública, manutenção da segurança e preservação do patrimônio público. Por fim, faz-se necessário, por parte deste autor, com a devida vênia a qualquer opinião em contrário, externar a sugestão de que o Comando do Exército, por meio do Ministério da Defesa e em consonância com as demais Forças, empreguem os esforços de seus agentes especializados em Direito para a elaboração de um projeto de lei que especifique a atividade de segurança das áreas e instalações sob a administração militar, de forma similar as leis já existentes que vinculam o poder de polícia administrativa ao EB, buscando, desta forma, proteger todos os agentes administrativos da esfera militar de interpretações diversas dos juristas quando da ocorrência de fatos concretos. O Exército Brasileiro, como instituição inserida na esfera da Administração Pública Federal, é detentor de uma parcela significativa do patrimônio da União, particularmente os bens voltados para a segurança nacional, o que impõem à Força a responsabilidade de envidar, dentro dos limites legais, todos os esforços para a preservação e a correta utilização deste patrimônio, com o objetivo maior de garantir os interesses da nação brasileira. __________________________________________ WALMORÉ DE MORAES LACOURT – Ten Cel Inf 51 REFERÊNCIAS ABNT. Associação Brasileira de Normas Técnicas. Informação e documentação – numeração progressiva das seções de um documento escrito – apresentação (ABNT NBR 6024:2003). Rio de Janeiro: ABNT, 2003. 3 p. ANDRADE, Ivan Moraes de. Polícia Judiciária. 2. ed. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1958. BERNARDES, Guilherme Langaro. Poder de Polícia do Exército. 2010, 302f. Dissertação (Mestre em Ciências Militares) - Escola de Comando e Estado-Maior do Exército. 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