Se desejar a versão impressa das cartilhas, entre em contato com a Secretaria de Educação Especial - MEC Telefones: (061) 323-8240; (061) 410-8651 e (061) 226-8672 FAX: (061) 321-9398 E-mail: [email protected] APRESENTAÇÃO DOS MANUAIS Prezado Professor, O Ministério da Educação e do Desporto/MEC está empenhado em ampliar a oferta de educação às pessoas com deficiência, em parceria com os municípios, tornando realidade os direitos de cidadania garantidos pela Constituição. Para tanto está desenvolvendo, entre outras ações, um amplo trabalho de sensibilização e envolvimento da comunidade escolar e da sociedade em geral pela integração de aluno com deficiência na rede regular de ensino. Você já deve ter visto peças da campanha de integração do aluno com deficiência na rede de ensino pelo rádio, TV jornais ou revistas, com a participação de Renato Aragão e Daniela Mercury, embaixadores do UNICEF no Brasil, convidando a sociedade em geral para participar do trabalho de garantir educação aos alunos com deficiência em nossas escolas. Mas para que isso aconteça, é fundamental que os professores sintam-se apoiados e subsidiados tecnicamente na tarefa de integrar esses alunos no cotidiano da sala de aula. Nesse sentido, foi elaborada essa série de três manuais com o objetivo de facilitar o início desse processo. Sem pretensões de dar conta da complexidade da questão da integração, ou mesmo dos aspectos técnico-pedagógicos e de adequação curricular, esperamos que esse material possa lhe ser de valia no seu processo de capacitação e no trabalho de preparação de . seus alunos, dos pais e de toda a comunidade escolar. Julgamos ser fundamental que você reflita sobre seu papel de educador e sua prática pedagógica, além de obter informações básicas sobre as deficiências. Esperamos que o primeiro manual — lniciando nossa conversa — possa ajudá-lo nesses aspectos. Já o segundo manual - Novos conceitos, novas emoções tem por objetivo ajudá-lo a preparar seus alunos e os pais deles a compreenderem melhor as capacidades e necessidades das pessoas com deficiência. E por fim, o terceiro manual - Com os pés no cotidiano - indica algumas formas de você detectar sinais de prováveis deficiências e favorecer o processo ensinoaprendizagem, considerando as diferenças e deficiências de seus alunos. Todos nós, governo, comunidade, pais, dirigentes e profissionais de educação somos importantes para alcançarmos êxito nesse trabalho, mas com certeza, você professor é o alicerce da construção de uma sociedade democrática que possibilita a educação para todos. A Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação e do Desporto , os dirigentes de Educação Especial das Secretarias Estaduais e Municipais de Educação, as Escolas Especiais, governamentais e não governamentais, são seus parceiros nessa grande jornada. Entre em contato com esses parceiros sempre que você necessitar de orientação técnico pedagógica. Se seu aluno portador de deficiência necessitar de atendimento específico, ele poderá obtê-lo em salas de recursos ou em salas de apoio pedagógico, em turno inverso ao da classe comum, ministrado por professor da educação especial. É importante lembrar que nem todos alunos com deficiência têm condições de integrarem-se em classes comuns. Muitos necessitam do atendimento em classe especial, que se constitui numa das formas de integração. Você poderá contar com a supervisão técnica e pedagógica da educação especial por meio do contato com os mencionados parceiros a fim de garantir o melhor atendimento a seu aluno. Contamos com você e você pode contar conosco. Marilene Ribeiro dos Santos Secretária de Educação Especial do Ministério de Educação e do Desporto Este material só tem sentido porque você, professor , existe e tem disposição de integrar as crianças portadoras de deficiência em sua escola. Nós elaboramos três manuais, que agora você tem em mãos, com o objetivo de ajudá-lo em sua tarefa de atender adequadamente seus alunos portadores ou não de deficiências. O primeiro manual pretende trazer para você uma reflexão sobre a educação, sobre os direitos das pessoas portadoras de deficiência na área educacional e sobre o papel de agente modificador que você tem como professor. Além disso, este manual fornece informações básicas sobre os principais quadros de deficiências. Ao final você encontrará, ainda, endereços úteis e algumas indicações bibliográficas que você, alunos, pais e todas as pessoas interessadas poderão utilizar. O segundo manual tem por objetivo ajudá-lo na tarefa de propor e desenvolver atividades complementares com seus alunos, para que eles tenham uma melhor assimilação das novas informações que receberão por meio da "Turma do Bairro" sobre as pessoas portadoras de deficiência. O terceiro manual apresenta algumas maneiras simples de você detectar sinais de prováveis deficiências a partir da observação das diferenças individuais de seus alunos, bem como dicas de como lidar e favorecer o desenvolvimento e a aprendizagem de seus alunos portadores ou não de deficiências. Material de Consulta É muito importante que você faça uma leitura geral desses Manuais. É importante também que eles se transformem em seu material de consulta, sempre que for necessário. Em caso de dúvidas - e esperamos que você as tenha - basta procurar a equipe técnica da Secretaria Municipal ou Estadual de Educação, a Secretaria de Educação Especial do MEC, em Brasília ou, ainda, instituições especializadas, como a Sorri Brasil. Caro professor. acreditamos no seu envolvimento e na sua capacidade criativa. Considere, portanto, esses manuais como instrumentos iniciais de trabalho, que você incrementará com sua iniciativa e vivência. Carta ao Professor Brasil século XX, última década. Prezado professor, Se às vezes não é fácil iniciar uma conversa, por certo é ainda mais difícil estabelecê-la à distância. Duas questões nos guiaram para que escrevêssemos esta carta para você. A primeira é a consciência que temos das particularidades e individualidades de cada professor que receberá este material. E a segunda, ao mesmo tempo, é a certeza do interesse comum pelo tema abordado. Se, por um lado, cada professor tem sua individualidade clara e indiscutível, por outro lado, todo professor tem o ponto de vista, as expectativas e os compromissos da profissão. Temos sido envoltos em muitos mitos e distorções. Muitos, irresponsavelmente, nos têm atribuído o fracasso, e outros, alienadamente, nos têm imposto o sucesso. Se não quisermos nos ver nem com a apatia dos que já se sentem vencidos, nem com a inconsciência dos que já se sentem vencedores, como então devemos nos ver? Temos de nos ver e ser vistos como profissionais com responsabilidade e compromisso. Há muito o que realizar em nossa realidade tão carregada de descrença e ingenuidade. O primeiro passo é descobrir nossas potencialidades reais e nos assegurarmos das possibilidades que temos. Ou seja, descobrirmos o que realmente sabemos e fazemos, o que realmente precisamos saber e fazer, e o que podemos vir a saber e a fazer. Poderíamos, neste momento, pensar, ora, já sabemos isso! Porém, é preciso considerar que, às vezes, o que pensamos que somos é o que os outros nos dizem, e que, às vezes, as pessoas que nos vêem podem estar sendo descrentes ou ingênuas. Não vale a pena repensar? Não basta que nos vejamos somente por nossos próprios olhos, nem somente pelos olhos dos outros. Para de fato nos enxergarmos e nos compreendermos, é fundamental aprendermos a desenvolver uma visão ampla e completa, que comporte os pontos de vista individual e coletivo. Vamos fazer um exercício. Partamos de uma idéia comum, uma idéia que cerca todos os professores e todos os que vêem os professores: o professor tem de pensar no aluno! A partir dessa idéia, vamos refletir: para que o professor possa pensar no aluno, é preciso que pense no professor! Mas, pensar no professor somente como professor é ter uma idéia isolada, que restringe os papéis e os acontecimentos de nossa vida e não nos permite vê-la e compreendê-la em toda sua grandeza. Se somos adultos, um dia fomos crianças; se somos pais, um dia fomos filhos, se somos professores, um dia fomos alunos. E mais: a maneira de termos sido crianças, filhos e alunos, influencia o jeito de sermos pais e professores, e essa maneira, por sua vez, influencia o jeito das nossas crianças, filhos e alunos. Somos, na verdade, elos marcados e marcantes, numa cadeia de influências. Isso nos coloca diante de uma incontestável verdade: se o que queremos é promover transformações, precisamos reexaminar o nosso jeito de pensar. Aí sim, estamos perto das condições de criar mudanças. Podemos acreditar que vivemos cumprindo uma determinada sina, e ficamos, assim, submetidos à força do destino. Mas podemos acreditar que nossa vida é fruto da nossa vontade, submetendo, dessa forma, as outras pessoas às nossas idéias e necessidades. Ou seja, estamos nos posicionando ora com impotência, ora com prepotência, diante da vida. Não haverá um espaço mais adequado, situado entre a impotência e a prepotência? Acreditamos que sim. E chamamos este lugar de lugar da real autonomia. Ter autonomia é ter autoridade, e ter autoridade é não ser submisso e não ser autoritário. Ter autonomia é, ter como a própria palavra já diz, ter a qualidade de autor. Na atividade do professor, isso significa que, para exercermos nossa autonomia, é imprescindível que nos tornemos autores das nossas próprias ações. Ser autor da própria ação implica em poder vê-la por inteiro, ou seja, analisá-la em sua amplitude e complexidade. Estamos diante de um intercâmbio de ações, processo no qual temos tanto o papel de produto como de produtores, influenciando e sendo influenciados. Partimos do pressuposto de que as idéias que cada um de nós tem, a visão particular de mundo que cada um de nós possui, determina as ações que desenvolvemos em nossa atividade profissional. No caso do professor, no contexto da sala de aula. É imprescindível que nos tornemos autores das nossas próprias ações. A partir disso, a ação do professor, tanto no que se refere ao seu planejamento, como a sua atuação efetiva na vivência de sala de aula, é determinada pelo seu jeito de pensar a vida, pela sua visão de mundo, pela leitura que faz da sociedade, da educação, do ensino, do seu papel no trabalho, de si mesmo enquanto cidadão, de seu compromisso com o aluno, da relação professor/aluno. Todas essas idéias, essas concepções, constituem uma verdadeira teoria pessoal, subjetiva, particular, resultado da história de vida de cada um. Considerando os argumentos dessa nossa conversa, precisamos pensar agora nos eixos comuns da nossa história, aqueles que produziram as características que são comuns na nossa atuação profissional. Dissemos que existe a idéia de que o professor deve pensar no aluno. Dissemos, também, que para que o professor pense no aluno, é preciso que pense em si mesmo como professor. Dissemos, ainda, que é preciso pensar que o professor já foi aluno. Sob esse ângulo, pensar nossa história de professor implica em pensar em nossa história de aluno. Exige que nos perguntemos: sob quais condições fomos alunos? Para pensar no aluno, temos que pensar na escola e, para pensar na escola, temos que pensar na sociedade, da qual a escola é parte — assim como a família, a Igreja, os poderes constituídos e os partidos políticos. Então, para pensar na escola que certa vez freqüentamos, temos de pensar no todo. Vivemos em uma cultura que valoriza mais as questões econômicas que as questões sociais. Essa verdade, tão conhecida por todos nós, vem explicar a desvalorização que, em nossa sociedade, se dá às crianças, aos adolescentes, aos idosos, e principalmente aos portadores de deficiência, que não fazem parte da população economicamente ativa, que são considerados "um peso" para o sistema. A ausência da reflexão faz com que passemos a reproduzir, sem perceber, tais valores, sem ao menos nos questionarmos a respeito. Quando refletimos sobre esse processo de absorção e reprodução de valores e de práticas sociais, é importante que nós, professores, nos voltemos para a análise das estratégias que alimentam esse processo, com o qual, consciente ou inconscientemente, a escola vem contribuindo. Como foi a escola em que estudamos? A escola que freqüentamos, em que pesem as diferenças de lugar e de tempo, ocupou nossa memória muito mais do que o raciocínio. Isso significa que essa escola nos cobrou sempre a reprodução e não a produção de idéias. Não precisávamos pensar, mas fazer. Um professor que oferece ao aluno questionários com perguntas e respostas prontas, dá ordens para que se siga certo modelo, ou que exige cópia de textos, pode não estar sequer imaginando que essas práticas estão preparando o aluno para a submissão cognitiva, para a subserviência, ao invés de prepará-lo para um exercício consciente e responsável de cidadania. A escola que freqüentamos valorizava a passividade do aluno, refletida principalmente na exigência do silêncio na sala de aula e na exigência da fidelidade às palavras do professor e do livro didático nas provas. Em suma, fomos "alunos-objeto". Hoje, o que as teorias pedagógicas defendem é que consideremos o aluno como sujeito do processo de construção do seu conhecimento. Ocorre-nos, assim, questionar: é possível pensar que alguma transformação possa se consolidar sem que se trate com seriedade a educação continuada dos professores? Nós acreditamos profundamente na necessidade e importância da educação continuada. Ela é a motivação desse texto e de nossas expectativas. Estabelecer a relação professor/aluno sobre novas bases é tarefa que exige, considerando nossa história, repensarmos ambos os papéis, refletindo sobre a bidirecionalidade e a interdependência que formam as relações pessoais, para que nos fiquem claras as suas conseqüência. Se sabemos que não desejamos possuir, como traço de caráter, nem a prepotência nem o descompromisso, também sabemos que aos nossos alunos não interessa assumir as marcas que se fundem tanto naqueles "acomodados" que "aceitam tudo", pensando que não podem nada, quanto naqueles "desacomodados" que "não aceitam nada", pensando que podem tudo. Para formar um homem "acomodado", um homem "derrotado", é preciso um professor autoritário que se vê não só diferente, mas superior ao aluno, tendendo a apostar na incompetência desse aluno, e sob a alegação da proteção, entregalhe "tudo pronto", delegando apenas a tarefa de memorizar, sem raciocinar. Para formar um homem "desacomodado", é preciso um professor omisso, que sob a alegação da "total confiança" na autonomia do aluno delega-lhe a tarefa de "responsabilizar-se por sua própria aprendizagem". Em ambos os casos, o professor se isenta do ensinar, atribuindo ao aluno a "culpa" do fracasso ou dos problemas da relação ensino/aprendizagem. Para formar um aluno "homem-cidadão", capaz de usufruir dos seus direitos e deveres individuais e coletivos, é preciso um professor "profissional-cidadão", capaz de estimular a consciência crítica e do domínio efetivo do saber. Ele compreende que é de sua responsabilidade e competência socializar esse conhecimento na escola! Cabe ainda a esse professor contribuir para a construção de uma escola de qualidade, para todos, cooperando com o aprimoramento do sistema escolar, no sentido de melhorar o acesso à educação das pessoas com necessidades educativas especiais. Carta a uma Menina Acreditamos que seria interessante refletirmos sobre o texto abaixo à medida que corajosamente sua autora expõe seus medos e dúvidas a respeito da convivência integrada de uma criança com deficiência em sua escola. A autora desta carta é a Diretora do Colégio Jardim de África, de Santander (Espanha), um dos colégios incorporados ao programa oficial de integração da pessoa portadora de deficiência na Espanha. Porém, sua participação na integração da pessoa portadora de deficiência não é de agora. Começou há cerca de dez anos, quando em 1975 criou em seu colégio uma classe de educação especial, plenamente integrada com o resto das unidades normais. Depois começou a história de Míriam. Por isso, sua carta retrata um testemunho particularmente apaixonante. Este texto foi publicado no Boletim Informativo SÍNDROME DE DOWN - Notícias Vol. 2 número 4 - Dezembro 1985 da FUNDACION SÍNDROME DE DOWN DE CANTABRIA Pérez Galdos, 6-B - 39005 Santander, Espanha. Tradução do espanhol: Maria Amélia Vampré Xavier, Vice-Presidente para Relações Internacionais da Federação Nacional das APAEs. Querida Míriam.. Escrevo-te esta carta para contar-te uma coisa que, ainda que hoje possa parecer mentira, aconteceu há alguns anos, mais ou menos os que tens. Não sei se compreenderás minha intenção, mas te asseguro que vou me sentir muito melhor depois de te haver contado... Míriam, sou professora, como sabes. Um dia, cheia de ilusões, pensei que as crianças deveriam ser antes de tudo felizes e que um colégio com certas características poderia conseguir tal objetivo. Pus mãos à obra e abri este Colégio. Tinha um jardim espaçoso e muros altos de pedra onde as crianças iam procurar lagartixas e caracóis para formar "granjas". Teus irmãos mais velhos vieram para este colégio. Certo dia tua mãe comunicou-me com grande esperança que esperava outro filho. Alegrei-me muito pois sou dessas pessoas que pensam que um filho é uma bênção de Deus. Porém, minha alegria não durou muito. Pouco depois, após alguns exames médicos, tua mãe comunicou-me que iria ter "uma criança com problemas". Fiquei tão triste com isso que, quando nasceste, arranjei mil desculpas para adiar o momento de te conhecer. Tua mãe, a quem estimo muito e admiro profundamente, contava-me de progressos e retrocessos, sobretudo de saúde. Ela estava sempre alegre, contigo, totalmente entregue a seu trabalho de estimulação precoce, e a cuidados. Um dia chamou-me ao telefone. Queria falar comigo sobre ti E começa minha verdadeira confissão, Míriam. teus feliz teus aqui Senti terror. Sabia o que tua mãe ia pedir-me. Nunca antes tinha tido no colégio uma criança portadora de síndrome de Down. Desconhecia tudo sobre essa condição. Pensava, pessimista, que uma criança "mongólica" era impossível de ser integrada num grupo de crianças sem deficiências. Receei a reação das outras crianças. Temi, ainda, que a encarregada da classe maternal te repelisse. Tive medo... de tantas coisas! Acreditei, Míriam, que eras incapaz de fazer algo por ti mesma, que eras um ser inútil e desagradável que as outras pessoas iriam repelir. Repito que desconhecia completamente tudo sobre as características de uma criança trissômica. Eu havia feito muito tempo antes integração de crianças com deficiências físicas, mas... com síndrome de Down...! Como eu estava enganada! Quanto aprendi desde o dia que chegaste à classe maternal. A primeira coisa que descobri foi tua grande timidez. Observava-te com freqüência, cheia de curiosidade, analisava tuas reações, esperando encontrar coisas estranhas. Via que as outras crianças, depois da curiosidade inicial e das perguntas de costume ("por que Míriam tem um rosto tão estranho?") tinham deixado de preocupar-se contigo. Nieves, a professora, aceitou-te, com todo o afeto, como uma criança que necessitava um pouco mais dela e não poupou dedicação. Dentro de pouco tempo, brincavas no pátio como todos, te aproximavas para saudar como todos faziam, os papais que vinham buscar alguns companheiros teus. Os pais das outras crianças te acariciavam e ninguém mostrou inconformidade ou estranheza por tua presença no colégio. Hoje, Míriam, cresceste. És aluna do 7º de EGB. Estás na classe da senhorita Dorita. Quando perdeste ontem o ônibus do Colégio e te chamaram pelo altofalante para que subisses a fim de falar com tua mãe ao telefone, eu estava ali. Alfonso, que brincava perto de mim com um grupo de colegas, disse alto: "Estão chamando Míriam. Ela é da minha classe. Quer que vá chamá-la? Não foi preciso, porque vinhas correndo com a blusa saindo da calça e dizias: "Maria Teresa, estou subindo para atender o telefone, pois estão me chamando." "Corre"', disse eu em silêncio. Logo deixaste de lado o telefone e te sentaste junto a mim, no banco de cimento, muito otimista. "Papai vem me buscar para levar-me a um restaurante". Agarraste meu braço e apoiaste nele tua cabeça despenteada. Sentia tuas carícias como prêmio imerecido. Eu que um dia senti terror de admitirte no Colégio...Como é horrível a ignorância. Nunca imaginei que teus afagos fossem tão doces, tua presença tão agradável Nunca poderia crer que ao ver hoje, a ti, a Ana, a Cristina e a David tão felizes, tão normais, tão pessoais, cada um de vós tão diferente um do outro...nunca poderia acreditar que iria receber tanto por tão pouco que fiz. Como vês, Míriam, tinha que contar isto. Agora sinto-me melhor, pois sei que em teu coração não há lugar para o rancor. Descobri, graças a ti e a outras crianças com as tuas características, que uma criança com Síndrome de Down é simplesmente uma criança. Só isso: uma criança maravilhosa e gratificante. Obrigada. Despede-se com um beijo, Maria Teresa Direitos Assegurados Os preceitos constitucionais determinam que o direito à educação das pessoas portadoras de deficiência deverá ser garantido pelo Estado por meio de um "atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino" (artigo 208, Inciso III, da Constituição Federal). O artigo 20, da Lei Federal n.º 7.853, de 1989, que dispõe sobre o apoio às pessoas com deficiência, também explícita que "Ao Poder Público e seus órgãos cabe assegurar às pessoas portadoras de deficiência o pleno exercício de seus direitos básicos, inclusive dos direitos à educação. Além de "A oferta, obrigatória e gratuita, da Educação Especial em estabelecimentos públicos de ensino", bem como "A matrícula compulsória, em cursos regulares de estabelecimentos públicos e particulares, de pessoas portadoras de deficiência capazes de se integrarem no sistema regular de ensino". Preceitos semelhantes aparecem nas Leis Orgânicas de quase todos os municípios. Mas, como você sabe, esses direitos já contemplados nas principais leis brasileiras precisam ser assegurados na prática, por meio de medidas concretas. Uma delas é este trabalho, que pretende fomentar a matrícula de estudantes portadores de deficiências nas escolas públicas, assim como preparar os professores e os alunos para recebê-los de maneira adequada, dentro da política de municipalização da Educação Especial no País. Oportunidades iguais Muitas deficiências podem ser evitadas por meio da prevenção de acidentes, medidas de segurança, vacinação, exames precoces etc, mas não se pode impedir a existência de todas as deficiências. Sempre existirão pessoas portadoras de deficiência. É importante estarmos preparados para oferecer a elas oportunidades iguais e a possibilidade de integração na sociedade. Os direitos das pessoas portadoras de deficiência são os mesmos de todas as pessoas. No entanto, muitas vezes, para exercer esses direitos, as pessoas com deficiência precisam que certas medidas especiais sejam adotadas. Por exemplo, o direito de ir e vir das pessoas com deficiências físicas é cerceado pelas barreiras ambientais, representadas pelas escadas, degraus, calçadas esburacadas, portas estreitas, pisos escorregadios. Por isso, é necessário providenciar rampas, rebaixamento de guias (meio-fios), adaptação de sanitários para comportarem cadeiras de rodas etc. Os portadores de deficiência visual precisam de livros em braile para ler e os portadores de deficiência auditiva precisam de alternativas diferenciadas para estabelecer comunicação, como por exemplo, aparelho de amplificação sonora, legendas nas programações de TV e de intérprete da língua dos sinais para ter acesso à informação e à comunicação. Os portadores de deficiências mentais precisam de atendimento educacional diferenciado para que possam desenvolver todas as suas potencialidades. Desde que essas e outras medidas sejam adotadas, a maioria das pessoas com deficiência, que hoje se encontra à margem dos benefícios que a sociedade pode oferecer, poderá conviver na comunidade, tornando-se cidadãos produtivos e felizes. Por uma Escola Integradora A Escola, depois da família, é o espaço primeiro e fundamental para o processo de socialização da criança. A atual política educacional brasileira inclui, em suas metas, a integração de crianças e jovens portadores de deficiência na escola regular, com apoio de atendimento educacional especializado, quando necessário. A pessoa portadora de deficiência, no seu processo de socialização, pode incorporar as crenças da sociedade e desenvolver uma auto-imagem de pessoa incapaz. A oportunidade de convívio com pessoas não portadoras de deficiência torna possível uma vida de normalidade para o portador de deficiência, que pode se perceber como uma pessoa capaz e se desenvolver em todos os aspectos. A segregação vivenciada pelas pessoas com deficiência, em conseqüência da não aceitação e da dificuldade de crianças e adultos em lidar e conviver com o portador de deficiência, acontece também por causa da desinformação generalizada da sociedade a respeito das deficiências. Sabe-se que quanto mais cedo se estabelecer essa integração, tanto melhor e mais fácil será para crianças com deficiência como para não portadores de deficiência experimentarem positivamente essa convivência. Contudo, não é simples de se conseguir um contexto efetivo de integração. O desconhecimento e o conseqüente medo por parte das pessoas é um obstáculo às situações onde as pessoas portadoras de deficiência possam conviver com as demais. Uma das idéias e práticas mais disseminadas por nós é a concepção da Educação Especial como sinônimo de atendimento especializado, em local especial às pessoas com deficiência. São conseqüências de desinformação e "medos", as seguintes idéias • • • só algumas pessoas portadoras de deficiência podem beneficiar-se da educação; outros portadores de deficiência poderiam apenas ser "treinados" a executar tarefas simples e básicas; os portadores de deficiência são pessoas tão "especiais" que exigem professores especializados, escolas especiais, conteúdos e métodos especiais, porque aprendem (quando aprendem) por "mecanismos" diferentes. Na verdade, embora haja os alunos com deficiência que de fato necessitam de medidas especiais, a grande maioria tem condição de ser atendida em escolas ou classes comuns. Há uma gradação dessas necessidades especiais. É Imprescindível o Envolvimento dos Profissionais No entanto, estamos cientes de que as experiências de integração de crianças portadoras de deficiência no ensino são ainda incipientes, e merecem uma reflexão tanto sobre o seu processo de implantação quanto sobre seus resultados. Além disso, é imprescindível o envolvimento de profissionais de áreas interligadas como saúde e ação social, bem como dos pais e comunidade em geral. Faz-se necessário, também, para um aprofundamento dessas práticas e para uma maior eficácia das mesmas, um trabalho de sensibilização do corpo docente, discente e dos funcionários da rede de ensino, acrescido de um programa de capacitação e aprimoramento profissional. Assim, é fundamental um trabalho com os que dirigem e atuam no sistema de ensino, bem como com os pais que têm crianças atendidas nas escolas. Um trabalho que tenha como objetivo modificar posturas e atitudes com relação à freqüência de crianças com deficiências nessas unidades, bem como difundir informações corretas sobre o tema. É importante ressaltar que um trabalho desses, de preparação das escolas para aceitarem crianças com deficiências, contribui para um melhor atendimento às crianças em geral e também para o desenvolvimento de ações de prevenção e detecção precoce de deficiências. Como a Educação Especial pode apoiar você e seu aluno com deficiência Professor, se tiver alguma dúvida ou dificuldade no decorrer de suas atividades com os alunos portadores de deficiência, entre em contato com a Educação Especial de seu município ou de seu estado, nas Secretarias de Educação. A Educação Especial, como parte integrante da educação geral, constitui-se num conjunto de recursos pedagógicos e de serviços de apoio que facilitem a aprendizagem de todos os alunos com necessidades educativas especiais, inclusive daqueles com deficiência. Assim sendo, você pode e deve solicitar orientação e apoio para a melhoria de seu fazer pedagógico com esse alunado, bem como verificar se seu aluno com deficiência está também recebendo atendimento exclusivo em "salas de recursos" ou em "salas de apoio específico", em turno inverso ao da classe comum. Informações Básicas sobre as Deficiências Estes são alguns dados para você saber um pouco mais sobre as pessoas portadoras de deficiência. E também conhecer os diversos tipos, características e causas mais comuns das deficiências. No final deste manual, apresentamos uma breve bibliografia, na qual você encontrará outras informações. Quem são as Pessoas Portadoras de Deficiência? São aquelas que apresentam significativas diferenças físicas, sensoriais intelectuais, decorrentes de fatores inatos ou adquiridos, de caráter temporário permanente" (Política Nacional de Educação Especial). Segundo dados Organização Mundial da Saúde, 10°70 da população de todo país, em tempo paz, é constituída por pessoas portadoras de algum tipo de deficiência. ou ou da de Como as deficiências se distribuem? Tipos de deficiências % Mental 5,0 Física 2,0 Auditiva 1,5 Visual 0,5 Múltiplas 1,0 Total 10 Tipos de Deficiências Deficiência Física É uma variedade de condições não sensoriais que afetam o indivíduo em termos de mobilidade, de coordenação motora geral ou da fala, como decorrência de lesões neurológicas, neuromusculares e ortopédicas, ou ainda, de más-formações congênitas ou adquiridas. Deficiência Visual É a redução ou perda total da capacidade de ver com o melhor olho e após a melhor correção ótica. Manifesta-se como cegueira ou visão reduzida. Deficiência Auditiva É a perda total ou parcial, congênita ou adquirida, da capacidade de compreender a fala através do ouvido. Manifesta-se como surdez leve/moderada, surdez severa/profunda. Deficiência Mental Caracteriza-se por registrar um funcionamento intelectual geral significativamente abaixo da média, oriundo do período de desenvolvimento, concomitante com limitações associadas a duas ou mais áreas da conduta adaptativa ou da capacidade do indivíduo em responder adequadamente às demandas da sociedade, nos seguintes aspectos: comunicação, cuidados pessoais, habilidades sociais, desempenho na família e comunidade, independência na locomoção, saúde e segurança, desempenho escolar lazer e trabalho. É importante não confundir o portador de deficiência mental com o doente mental. Deficiência Múltipla É a associação, no mesmo indivíduo, de duas ou mais deficiências primárias (mental/visual/auditiva/física), com comprometimentos que acarretam atrasos no desenvolvimento global e na capacidade adaptativa. As causas das deficiências As deficiências podem acontecer por vários fatores, antes, durante ou depois do nascimento. Nós abordaremos apenas os fatores mais freqüentes: Causas pré-natais: Podem acontecer por alterações de genes ou cromossomos, ou por fatores ambientais ligados à saúde da gestante. Podemos citar, como exemplo, a síndrome de Down (trissomia do cromossomo 21); erros inatos do metabolismo (fenilcetonúria, hipotireoidismo congênito); microcefalia Vera; hidrocefalia; infecções na gravidez (rubéola, toxoplasmose, sífilis, AIDS); desnutrição da gestante; problemas clínicos como hipertensão, diabetes, alcoolismo, fumo, uso de remédios tóxicos, drogas, exposição a radiações etc. Causas perinatais: Prematuridade, pós-maturidade, baixo peso ao nascer, problemas no parto (partos demorados, circular de cordão, parto pélvico); icterícias graves por incompatibilidade sangüínea; infecções; hemorragia cerebral; fototerapia. Causas pós-natais As principais causas são: desnutrição infantil; privação de afeto e de estímulo. infecções do sistema nervoso central e periférico , (meningites, encefalites); traumatismos em geral causados por acidentes domésticos, de trânsito, de trabalho, por armas, queimaduras, quedas; convulsões freqüentes e sem controle médico; intoxicação por drogas, medicamentos e radiações; tumores, traumas acústicos, fatores emocionais, medicações tóxicas para o ouvido etc. Principais quadros de deficiências Síndrome de Down Caracteriza-se por várias alterações físicas (olhos amendoados, nariz achatado, estatura baixa, mãos e pés pequenos, prega única palmar), podendo haver cardiopatia associada. Os portadores dessa deficiência apresentam deficiência mental em grau variado. Fenilcetonúria A criança nasce aparentemente normal, mas por uma deficiência metabólica pode vir a se tornar deficiente mental, com comportamento hiperativo, agressivo e de fácil irritabilidade. É possível detectar o problema no nascimento com o "teste do pezinho" e assim oferecer tratamento adequado (dieta pobre em fenilalanina), que se estende até a adolescência. Hipotireoidismo congênito A criança já nasce com algumas alterações da glândula tireóide e sinais clínicos como pele seca e áspera, cabelos e unhas quebradiços, face inchada, distância maior entre a base do nariz e a boca. Se não receber logo a medicação necessária (hormônio tireoidiano), ela apresentará atraso no crescimento e deficiência mental. É possível detectar o hipotireoidismo no nascimento, com o "teste do pezinho" ou por dosagem sangüínea de T4. Microcelafia Vera É uma doença genética que, por problemas na fontanela, impede o crescimento do cérebro. A cabeça é sempre muito pequena e a correção pode se dar cirurgicamente. A criança apresenta retardo no desenvolvimento neuropsicomotor. Hidrocefalia Devido à má formação do cérebro ocorre um acúmulo de líquido que ocasiona um aumento do perímetro cefálico. Se não for imediatamente corrigido com cirurgia, pode acarretar atraso no desenvolvimento e deficiência mental. Paralisia Cerebral É uma síndrome caracterizada pela alteração da coordenação dos movimentos, do tônus muscular e da permanência de reflexos primitivos. Pode ou não haver deficiência mental associada. É um quadro de intensidade variável, dependendo da extensão e localização da lesão. Spina Bífida É ocasionada pela má formação congênita da coluna vertebral. E ao ser corrigida cirurgicamente, provoca lesão medular. Dependendo da altura dessa lesão, há normalmente um quadro de paraplegia (perda de movimento e sensibilidade dos membros inferiores). Pode ou não haver deficiência mental associada. Distrofia Muscular Progressiva É uma doença congênita e hereditária, que se caracteriza pela perda progressiva da força muscular e dos movimentos. Catarata É um problema no cristalino, que o torna opaco e impede a entrada de luz no olho. Varia da cegueira total até a visão subnormal. Pode aparecer no nascimento ou no decorrer da vida, por causa de traumas, doenças, ferimentos. É corrigida cirurgicamente. Glaucoma Congênito Caracteriza-se por um aumento da pressão intraocular e do globo ocular, com dor, lacrimejamento e fotofobia. O tratamento é cirúrgico e deve ser realizado o mais cedo possível. Conjuntivite É uma infecção do globo ocular. Se não for tratada pode lesar a córnea e reduzir a visão em graus variados, podendo causar até a cegueira. Tracoma Trata-se de infecção da córnea, que se torna opaca. Vai da perda progressiva da visão até a cegueira. Pode ser tratada por medicamentos e medidas higiênicas. Os primeiros sintomas são lacrimejamento, irritação e prurido. Deficiência Auditiva Condutiva Caracteriza-se pela redução da acuidade auditiva, por problemas do ouvido externo ou do ouvido médio, causados por acúmulo de cera, otites e outras doenças. Nesses casos, as perdas auditivas podem ser temporárias ou de grau leve ou moderado. As crianças com esse tipo de problema sempre aprendem a falar, mas podem falar errado ou ter dificuldades na escola por não escutarem bem. Surdez Neurossensorial É ocasionada por problemas no ouvido interno, causados por doenças infecciosas, traumas de parto, remédios ototóxicos etc. Dependendo da gravidade da lesão, as perdas auditivas podem variar do grau leve ao profundo. Quando essa deficiência ocorrer antes da aquisição da linguagem, a criança terá dificuldades de comunicação. O uso do aparelho de amplificação sonora individual, dependendo do caso, poderá ser um instrumento de auxílio. Oportunidades Iguais Muitas deficiências podem ser evitadas por meio da prevenção de acidentes, medidas de segurança, vacinação, exames precoces etc, mas não se pode impedir a existência de todas as deficiências. Sempre existirão pessoas portadoras de deficiência. É importante estarmos preparados para oferecer a elas oportunidades iguais e a possibilidade de integração na sociedade. Os direitos das pessoas portadoras de deficiência são os mesmos de todas as pessoas. No entanto, muitas vezes, para exercer esses direitos, as pessoas com deficiência precisam que certas medidas especiais sejam adotadas. Por exemplo, o direito de ir e vir das pessoas com deficiências físicas é cerceado pelas barreiras ambientais, representa das pelas escadas, degraus, calçadas esburacadas, portas estreitas, pisos escorregadios. Por isso, é necessário providenciar rampas, rebaixamento de guias (meio- ~ fios), adaptação de sanitários para comportarem cadeiras de rodas etc. Os portadores de deficiência visual precisam de livros em braile para ler e portadores de deficiência auditiva precisam de alternativas diferenciadas para estabelecer comunicação, como por exemplo, aparelho de amplificação sonora, legendas nas programações de TV e de intérprete da língua dos sinais para ter acesso à informação e à comunicação. . O que você pode fazer? Remova e/ou incentive a retirada de barreiras ambientais em geral e nas escolas em particular; • • • • • • • Apóie e lute por serviços públicos de reabilitação e habilitação de pessoas portadoras de deficiência; Apóie e lute pela implantação de atendimento educacional especializado para estudantes portadores de deficiências; Apóie e lute por programas de profissionalização de pessoas portadoras de deficiência; Apóie e lute pelo maior acesso de pessoas portadoras de deficiência no mercado de trabalho, solicite a inclusão desse assunto na pauta de seu sindicato; Apóie medidas e programas que combatam os preconceitos; Não admita discriminação. Evite a superproteção.