Funções e papéis da tecnologia Alexandre Thomaz Vieira Sabemos dos vários benefícios que a tecnologia pode gerar no trabalho pedagógico com o aluno, seja em atividades de programação de rotinas e processos; como de organização, registro, acesso, manipulação e apresentação de informações com aplicativos; além das atividades de simulação de experimentos relacionados com as ciências naturais e sociais; de comunicação e acesso à base de dados via e-mail e Internet. Sabemos também que esse trabalho só se concretiza quando o professor domina os conceitos e as práticas relacionadas com a tecnologia, transpondo-os para o seu trabalho pedagógico e aplicando-os no cotidiano da sala de aula. Mas o grande problema em foco da gestão escolar é saber como a tecnologia pode ser um grande aliado da equipe de direção e coordenação da escola. Porém, antes de tentarmos equacionar esse problema, precisamos fazer algumas reflexões sobre a natureza dessa questão. Conhecimento não é dado nem informação, embora ambos estejam relacionados. A confusão entre dado, informação e conhecimento gera enormes gastos de tempo e dinheiro em projetos que nem sempre são adequados para uma certa instituição. O sucesso ou o fracasso organizacional depende, muitas vezes, em saber de quais deles precisamos, com quais contamos e o que podemos fazer com cada um. Por isso, embora possa parecer que essas diferenças sejam claras vamos analisar as distinções entre elas. Os dados são conjuntos de fatos distintos e objetivos, relativos a eventos. Exemplificando a partir do contexto escolar: se um aluno tem sua nota de História registrada em um sistema que armazena dados e informações, essa nota pode ser considerada um dado. O que significa isso? Esse dado não revela aspectos 1 fundamentais para tentar interferir educacionalmente nesse resultado, por exemplo: por que ele tirou essa nota, como ele se dedicou ao estudo dessa disciplina, se tem dificuldade de ler e interpretar o que lê, se buscou aprender a respeito consultando os livros dessa disciplina que estão disponíveis na escola, e assim por diante. Ou seja, a nota de modo isolado, como dado, não consegue ajudar a prever o que ocorrerá com o aluno, ao se tomar essa ou aquela atitude pedagógica, nem mesmo a escolher quais as condutas que têm maior probabilidade de ajudá-lo a melhorar seu desempenho. Já a informação, na forma de documento ou de uma comunicação audível ou visível, é uma mensagem. Como acontece com qualquer mensagem, normalmente ela tem um emitente e um receptor. O objetivo de uma informação é o de influir na maneira de quem a recebe, de interpretar alguma coisa em decorrência do impacto que ela lhe ocasiona. No entanto, para ser considerada informação a mensagem precisa ser aceita pelo receptor, pois se ele a julgar desprovida de sentido, ela não será considerada. Para que dados transformem-se em informações, é preciso que se acrescente significado. Entre as formas importantes de fazer esse salto de dado para informação, podemos mencionar: - Contextualização: tendo em vista o contexto em que os dados se inserem, podemos entender qual a finalidade de conhecer esses dados. Por exemplo, se os alunos de uma determinada classe tiram, com freqüência, notas baixas de Língua Portuguesa, pode-se deduzir o porquê de ser importante registrar as notas dessa classe ao longo do tempo. - Categorização: conhecemos as unidades de análise ou os componentes essenciais dos dados. Prosseguindo com o exemplo que analisamos acima, poderíamos coletar as notas de Língua Portuguesa das demais classes da 2 mesma série da escola. Nesse caso, a unidade de análise reside no conjunto de notas de L. P. dos alunos da série X da escola Y. - Cálculo: os dados podem ser analisados matematicamente ou estatisticamente. Prosseguindo com exemplo, podemos calcular o porcentual de alunos que não conseguiu nota 5, nota 7 e assim por diante, bem como fazermos comparações entre as notas do diurno com o noturno, ou da classe cujo professor é A com aquela em que o professor é B. - Correção: dados errados, ou pouco confiáveis, são eliminados. - Condensação: os dados podem ser organizados em tabelas, em resumos, de modo mais conciso. Por exemplo, podemos simplesmente dizer que no mês de maio, todos os alunos tiraram nota superior a 5 em L.P. Computadores podem ser grandes aliados dos gestores na transformação de dados em informações. No entanto, raramente podem ajudá-los no que se refere ao contexto que permite dar um sentido aos dados; ficam também para nós a função de definir os aspectos relativos à categorização, ao cálculo e à condensação dos dados. O conhecimento tem caráter humano e é mais amplo, mais profundo e bem mais rico do que os dados e as informações. Quando nos referimos a indivíduos, podemos falar que são esclarecidos, informados e que têm conhecimentos sobre um determinado assunto, o mesmo não se pode dizer de manuais e livros. Esses últimos podem estar repletos de informações, mas não de conhecimentos, ou seja, para produzir conhecimento é necessário que haja mente(s) que trabalhe(m). Além de incorporar experiências, valores, informações contextualizadas, insights, conhecimentos pressupõe que o conhecimento proporcione uma estrutura capaz de avaliar e incorporar novas experiências e informações. 3 Enfim, conhecimentos derivam de informações, da mesma maneira que informações, derivam de dados. A capacidade de transformar informação em conhecimento não pode ser realizada por uma máquina, sem a interferência da mente humana, isto é, tal capacidade é exclusivamente humana. Para que tal transformação ocorra deve haver: - Comparação: informações relativas a uma situação - o que se observou sobre a evolução da notas de L.P. de uma classe ao longo de um ano -, sendo comparadas a outras situações conhecidas, por exemplo, dados da mesma série ao longo dos últimos três anos. Ou seja, busca-se entender como essas informações se relacionam com outras? - Conseqüências: para agir em relação ao fato que nos preocupa - o rendimento de L. P., por exemplo -, é preciso tomar uma série de decisões com base na análise dessas informações. Quer dizer, é importante saber: essas informações são úteis na tomada de decisão? - Conexões: quais as relações desse novo conhecimento com o conhecimento já acumulado? - Conversação: o que as outras pessoas pensam dessa informação? Assim, para serem gerados novos conhecimentos faz-se necessário realizar ações sobre as informações disponíveis em um dado momento e contexto. As ações criadoras de conhecimento — comparação entre informações , conexões entre informações e outros conhecimentos, conversação — são realizadas por seres humanos, individualmente e nas interações que eles estabelecem com os demais. Embora obtenhamos dados a partir de registros e informações, de mensagens, os conhecimentos têm origem em indivíduos. 4 Contudo, existe uma outra possibilidade para a obtenção de conhecimento aplicado nas organizações escolares, que é o estudo e a análise de suas rotinas. Quando, por exemplo, adotamos algum novo procedimento ou realizamos alguma mudança na estrutura ou no perfil das pessoas que atuam em uma dada função, estamos transferindo conhecimento aplicado (experiência) ao modo de funcionamento de nossas organizações escolares. Dessa forma, é possível aprendermos algo relevante com base em rotinas organizacionais incorporadas às escolas. Então, se pretendemos ter um ambiente com tecnologia em que o conhecimento possa fluir constantemente, temos que criar condições para que um determinado conhecimento possa ser acessado, seja por meio de relações diretas (presenciais ou virtuais) entre pessoas que os detêm — simplesmente porque trabalham juntas, no mesmo ambiente, ou a partir de reflexões que realizam a respeito de rotinas e procedimentos já estruturados em uma instituição escolar. A criação de um ambiente informatizado, que tenha como objetivo gerenciar dados e informações para permitir a criação e melhoria de conhecimento sobre os processos da escola requer de nossa parte, muito bom senso. Há pontos importantes que poderão nos ajudar a decidir a respeito de projetos dessa natureza: - Começar pela organização das informações que são consideradas as mais relevantes. - Iniciar com um projeto-piloto limitado a um ponto bem determinado, deixando que iniciativas adicionais sejam estabelecidas a partir de novas demandas. - Trabalhar em múltiplas frentes simultaneamente (tecnologia, organização, cultura). 5 - Não adiar a implementação dos estudos relativos a aspectos que temos a certeza de que são problemáticos, pois em pouco tempo, poderá ser tarde demais. - Conquistar, o mais rapidamente possível, o envolvimento de toda a organização. A criação de ambientes informatizados na organização para apoio à gestão do conhecimento deverá considerar os processos pelos quais são feitas as trocas de informação e a cultura de colaboração existente. Organizações internamente muito competitivas ou que apresentem um elevado grau de isolamento entre os funcionários, terão mais dificuldade de criar um ambiente de troca. A prática de trabalho dos professores, geralmente isolada nas salas de aula, dificulta sobremaneira a criação de uma cultura de colaboração. Por isso, há necessidade do gestor planejar a existência de momentos de troca de experiências entre professores e funcionários. A implementação de um sistema de organização e disseminação de informações na escola torna-se bem mais fácil quando a cooperação já faz parte da cultura escolar. Nesse sentido, os tópicos abaixo apresentam algumas considerações importantes sobre o problema: - Pensar a organização por inteiro, isto é, como um sistema. - Construir e facilitar a construção de grupos que aprendem a partir de sua prática. - Concentrar-se em questões de desenvolvimento pessoal - Levar em conta a cultura organizacional existente. - Criar estruturas organizacionais menos hierárquicas e mais autoorganizadoras. 6 Além do problema da cultura organizacional existente e dos objetivos sobre a gestão das tecnologias de informação (TI) de uma escola, é importante que se tenha uma visão mais estruturada sobre os ingredientes-chave para implementação eficaz de sistemas nas escolas. A tabela abaixo mostra alguns dos principais pontos, os quais estão divididos em três fases muito relevantes: 1) criação do contexto para a TI; 2) desenho de sistemas de TI; 3) instalação do sistema de TI que vai ser utilizado. Ingredientes-Chave Alinhamento FASE UM Criação do Contexto para a TI Visão alinhada com objetivos da escola/organização FASE DOIS Desenho de um Sistema de TI Em consonância com os objetivos da escola Comprometimento Alto comprometimento e apoio da direção e das lideranças Que seja compreendido por seus usuários e facilite as rotinas de trabalho adotadas pela escola Domínio Conhecimento geral do sistema de TI relacionado com as atividades nas quais será utilizado. Elaborado para facilitar o domínio pelos usuários FASE TRÊS Instalação e Uso do Sistema de TI Operação do sistema de acordo com os objetivos Os usuários utilizam o sistema porque o aceitam bem. Os usuários dominam o sistema O quadro resume os principais pontos e fases a serem considerados durante um processo de implementação de novas tecnologias nas organizações. Quanto maior o projeto, maior a necessidade de estudo e planejamento por parte dos seus responsáveis, principalmente dos gestores, cuja sinalização é fundamental para que o projeto seja efetivamente aceito. 7 Conforme foi analisado anteriormente, a produção de uma informação, a partir de dados, envolve uma clara intenção daquele que produz a informação. Quando um sistema é implementado em culturas organizacionais previamente estabelecidas, a forma pela qual as informações são organizadas e produzidas interage com a cultura já existente, criando situações que resultam em sintonia e reforço ou em dissonância e oposição. Tudo isso aponta para a necessidade de clareza e coesão da equipe sobre os objetivos pretendidos pela organização. Questões: 1 - A partir dessa pequena introdução podemos nos perguntar: quais informações são relevantes na melhoria do processo de gestão escolar, em seus vários aspectos: administrativo, pedagógico, pessoal, relativo aos pais dos alunos, dos materiais consumíveis, das instalações, dos recursos didáticos disponíveis, da avaliação, etc? 2 - Que dados precisamos para produzir tais informações? Onde esses dados são gerados? Quem são os responsáveis por gerá-lo? Como podemos ter acesso a essas pessoas e a esses dados? Como estruturá-los por meio das novas tecnologias? Como facilitar o acesso aos demais membros da comunidade escolar? Qual o nível de segurança e controle de acesso a ser implementado? 3 - Após respondermos a algumas dessas questões para um determinado projeto de melhoria sobre o acesso e a organização de informações, é que devemos pensar na tecnologia necessária para a obtenção das informações ou dos resultados pretendidos. Nesse momento, surgem novas questões sobre os sistemas de informação em estudo: os usuários do sistema têm clareza dos objetivos ou do projeto político-pedagógico da escola? 8 4 - Como os objetivos da escola se relacionam com o sistema de informação em estudo? 5 - A formatação do sistema facilita sua utilização? O processo de implantação está coerente com as expectativas e benefícios esperados pelos usuários? Sugestão de leituras: DAVENPORT, T. & PRUSAK, L. Conhecimento empresarial: como as organizações gerenciam o seu capital intelectual. Métodos e aplicações práticas. Rio de Janeiro: Campus, 1998. WALTON, R.E. Tecnologia de Informação: o uso de TI pelas empresas que obtêm vantagem competitiva. São Paulo: Atlas, 1993. Este texto foi produzido para o curso Gestão Escolar e Tecnologias. VIEIRA, A. Funções e Papéis da Tecnologia. São Paulo, PUC-SP, 2004. 9