PARTE 5 NEUROCIÊNCIA DAS FUNÇÕES MENTAIS Capítulo 18 Pessoas com História As Bases Neurais da Memória e da Aprendizagem Clique nas setas verdes para avançar/voltar ou ESC para retornar ao menu geral Os experimentos de Karl Lashley com seu labirinto. A. O rato acaba chegando ao ponto de término, entrando cada vez menos nos “becos sem saída” do labirinto. B. Cada área colorida representa uma lesão bilateral no cérebro de um animal. C. O número de erros aumenta proporcionalmente à proporção de córtex cerebral lesado. Representação artística de um pesadelo. De Henry Fuseli (1781) O Pesadelo, óleo sobre tela, Detroit Institute of Arts, EUA. A operação dos sistemas de memória pode ser esquematicamente representada por uma sequência de etapas, a partir da entrada de um evento novo, proveniente do ambiente externo ou mesmo da mente do indivíduo. O fisiologista russo Ivan Pavlov (1849-1936) criou o conceito original de condicionamento clássico, observando que um cão que salivava somente ao abocanhar o alimento (acima), passava a salivar também quando um estímulo inócuo (uma luz, por exemplo) era associado ao alimento (no meio), e até mesmo quando a luz lhe era apresentada sem o alimento (abaixo). B. O americano Edward Thorndike (1874-1949) empregou outro conceito importante: o de condicionamento operante, observando que gatos motivados pela visão do alimento (acima e no meio) eram capazes de associar comportamentos e assim aprender a abrir as portas da gaiola. O paciente HM (à direita), em foto tirada cerca de 20 anos após ser submetido à remoção cirúrgica bilateral das porções mediais do lobo temporal, que incluiriam o hipocampoA e regiões adjacentes (áreas em vermelho, em A). Ressonância magnética realizada recentemente, entretanto, mostrou que a região posterior do hipocampo (setas vermelhas no nível 2, em B) foi preservada. O estudo dos sintomas apresentados por HM permitiu concluir que o hipocampo está envolvido especificamente com os processos de consolidação da memória explícita. A memória ultrarrápida pode ser detectada por experimentos simples como o ilustrado em A. O indivíduo vê um painel com 12 letras projetadas durante poucos segundos, e é solicitado a evocá-las em ordem. Não lembra mais do que sete. Depois vê um painel semelhante, mas é solicitado a evocar uma linha de cada vez. Neste caso, mostra que armazenou as 12 letras, sem se dar conta disso. No experimento em B o indivíduo ouve um tom repetido, sob registro do seu magnetoencefalograma. A um tom discrepante de ocorrência aleatória, aparece um campo magnético correspondente, considerado a expressão neural desse tipo de memória. As múltiplas relações entre a memória operacional, os demais tipos de memória, o pensamento e o comportamento. Observar que as informações não se transferem necessariamente em sequência, mas em paralelo entre os diferentes tipos de memória. Lesões no córtex cerebral provocam diferentes déficits da memória operacional, evidenciando os seus componentes: visuoespacial (no hemisfério direito, em laranja e amarelo), fonológico (no hemisfério esquerdo em azul) e executivo (em verde nos dois hemisférios). No teste de Wisconsin, o sujeito é solicitado a agrupar as cartas como achar melhor, sem conhecer o critério de agrupamento (cor, forma ou número). O psicólogo o informa a cada tentativa se acertou ou errou, e mede o número de tentativas ou o tempo que ele leva para descobrir o critério e terminar a tarefa. Neste teste de comparação de amostras com retardo (A-D), o macaco deve apontar o cartão verde (em D), que não cobria o amendoim na exposição anterior (B). Alguns neurônios do córtex pré-frontal (E1), registrados durante o experimento, disparam mais nos períodos de visualização da pista, enquanto outros (E2) são mais ativos durante o período de retardo, sugerindo que possam estar mantendo “viva” a informação de posição dos cartões coloridos, em relação ao amendoim. Neste experimento, comparou-se o desempenho de macacos normais com o de animais submetidos ao resfriamento bilateral (uma “lesão” reversível) do córtex pré-frontal ou do córtex parietal (A). Os macacos com resfriamento pré-frontal cometiam mais erros no teste de comparação de amostras com retardo (B), e apresentavam maior tempo de reação para escolher o cartão certo (C). No labirinto radial de oito braços (A), o rato deve encontrar os braços que contêm alimento. A memória operacional comumente é avaliada pela curva decrescente do número de erros a cada sessão, o que indica que o animal vai aprendendo a evitar os braços que não contêm alimento, entre o início da sessão e o seu final. No labirinto aquático de Morris (B), o rato aprende a localizar a posição da plataforma submersa em relação ao ambiente, isto é, aos objetos situados em torno. Neste caso, o experimentador geralmente mede o tempo gasto entre o ponto inicial e a plataforma. Novamente, a curva decrescente atesta a aprendizagem baseada na memória operacional espacial. Neste experimento, um rato tem um eletródio permanentemente implantado no cérebro, e o pesquisador registra a atividade dos neurônios do hipocampo enquanto o animal se movimenta entre os dois compartimentos de teste, cujo acesso é controlado por uma porta. C. A frequência de PAs que cada neurônio dispara é codificada por cores (amarelo para as menores frequências, vermelho para as maiores) e relacionada à posição na caixa de teste. O neurônio ilustrado em C1 dispara quando o rato passa por um canto do primeiro compartimento, e a resposta mantém-se mesmo quando a porta se abre e o rato pode passar ao outro compartimento. O neurônio em C2, por outro lado, dispara apenas quando o animal passa ao segundo compartimento. A. O hipocampo é uma estrutura alongada que se situa no lobo temporal medial. Na frente dele está a amígdala, cuja posição é mostrada no corte B. Na figura em A, amígdala e hipocampo estão mostrados projetados na superfície lateral do encéfalo, mas na verdade posicionamse na face medial. Um corte menos inclinado (C) permite — com maior ampliação (D) — visualizar as regiões vizinhas e funcionalmente relacionadas ao hipocampo. O quadro em C representa a ampliação em D. O hipocampo se comunica com grande número de regiões do SNC. A maioria dos aferentes chega, na verdade, ao córtex entorrinal (A), sendo este o elo de transmissão para o hipocampo (B). As fibras hipocampais eferentes (B) projetam para diversas regiões corticais, e também para estruturas subcorticais como o hipotálamoA (corpos mamilares) e o tálamoA (núcleo mediodorsal). O físico Albert Einstein (A) foi caricaturado por centenas de artistas em todo o mundo, como David Levine (B) e Steven Harris (C). Seu rosto se tornou tão bem fixado em nossa memória que o reconhecemos até nas caricaturas mais simplificadas. Mesmo pacientes com lesões podem declarar que conhecem a sua face, embora sem saber de quem se trata. Foto e caricaturas extraídas de Albert Through the Looking Glass (1998). Hebrew University of Jerusalem, Israel. Um programa de computador acende os círculos em ordem aparentemente aleatória, e o sujeito deve apertar o botão correspondente a cada vez (A). Como a ordem dos estímulos não é realmente aleatória, o indivíduo aprende o padrão inconscientemente, o que é atestado pela curva decrescente do tempo que leva para apertar o botão depois de cada estímulo (B). O papel modulador da amígdala sobre a memória dá-se “intermediando” a ação de hormônios e dos estímulos emocionais sobre a consolidação dos arquivos de memória. A foto de baixo mostra a posição da amígdala no lobo temporal medial. Dentre os circuitos da memória, o hipocampo apresenta posição central, já que é o encarregado de “distribuir” os engramas para as demais regiões que os vão arquivar de modo mais duradouro. As conexões do hipocampo com as regiões corticais estão representadas em vermelho, e as conexões subcorticais em verde. A amígdala, modulador emocional da memória, está representada à parte. No esquema, para simplificar, só as regiões e circuitos principais estão indicados. Esquema representando o córtex temporal anterior como polo de convergência (hub), das informações relativas a uma cena ou evento de memória, que seriam aí reunidas para a sua apresentação à consciência (evocação).