LITERATURA/LITTÉRATURE Orlando Cardoso : “João de Barros, um Cortesão em Terras de Litém” Daniel Lacerda x-exilado em França, Alemanha e Holanda, refractário da guerra colonial, o leiriense Orlando Cardoso, poeta, jornalista e contista, acaba de editar esta nova brochura1 na qual põe em destaque a ligação do conhecido historiador, e literato da Renascença portuguesa, com a região de Pombal. João de Barros (1496 ?1570) refugiou-se com efeito na pacatez da sua quinta da Ribeira de Litém ao deixar a direcção da Casa da Índia em Lisboa, depois de exercer o cargo de Feitor desde 1533 (p. 18). E, após algumas inquietações por parte da censura inquisitorial, se extinguiu em 1570, longe da Corte, onde gozara do privilégio raro de amigo do rei D. João III. Esta brochura de abordagem fácil, concebida com uma intenção didáctica, além de descrever de modo vivo o trajecto biográfico do E LATITUDES n° 3 - juillet 98 personagem,antes do desencadeamento da perseguição à vida intelectual portuguesa após a morte do rei em 1557, detém-se sobre os aspectos mais salientes da importante obra do historiador ao serviço de D. João III. Desta o autor salienta as Décadas da Ásia , que deixou incompletas, mas, baseadas numa honesta preocupação documental e dada a sua intenção moral, lhe mereceram o epíteto de Cícero português. O período áureo da acção dos navegadores e a dministradores dos territórios sob tutela portuguesa tiveram em J. de Barros um vate enaltecedor à medida desse período marcante da história lusitana. Esta publicação inclui ainda uma breve antologia e a bibliografia essencial para se estudar a figura ímpar do renascentista, reconhecida em Roma entre as mais célebres da época (cf. p. 23). Na sua obra Ropica Pnefma (Mercadoria Espiritual), que O. Cardoso diz inspirada do “Elogio da Loucura”, onde Erasmo caustivava os excessos e contradições da igreja católica, J. de Barros abordou a questão dos cristãos-novos de modo indirecto e afeiçoado aos rigores censoriais da época. O malogrado especialista do chamado “marranismo” português I. S. Révah - cuja bibliografia rara O.Cardoso cita muito oportunamente - pode assim colher nela informação acerca das concepões da minoria judaica portuguesa submetida ao catolicismo, de outro modo matéria interdita. O. Cardoso sobreleva também que nesta obra mal conhecida “João de Barros reflecte a ideologia antinobiliárquica e anticlerical dos Humanistas, e até certas correntes mais radicais do Humanismo, como a expressa na Utopia de Tomás Morus”. Por aqui o leitor se dá conta que retirará da leitura deste singelo documento uma informação clara e segura sobre uma das mais ricas e exemplares figuras de homem de pena e de acção, como era apanágio dessa época, cujos escritos nos lançam no interior da mais rica fase do nosso passado 1 Orlando Cardoso, João de Barros, Um Cortesão em Terras de Litém, Meirinhas Pombal, ed. Colégio João de Barros, 1997, 72 p. Outras obras publicadas : Trinta Dias em Maio ( poesia), Lisboa, ed. Escritor, 1991; O Espanto da Lua (contos), Lisboa, Escritor, 1993; Fora das Margens (contos), Lisboa, Escritor, 1995. Depois de ter dirigido o Jornal de Leiria durante vários anos, O. Cardoso assumiu recentemente a direcção de O Correio de Pombal. 77