XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" BIODIESEL: UM OLHAR PARA O FUTURO COM BASE NOS 30 ANOS DO PROALCOOL LAURA FERNANDES GARCIA; MARCO ANTÔNIO CONEJERO; MARCOS FAVA NEVES. USP-PENSA, RIEIRÃO PRETO, SP, BRASIL. [email protected] APRESENTAÇÃO ORAL ADMINISTRAÇÃO RURAL E GESTÃO DO AGRONEGÓCIO “BIODIESEL: UM OLHAR PARA O FUTURO COM BASE NOS 30 ANOS DO PROALCOOL” Grupo de Pesquisa: 2- Administração Rural e Gestão do Agronegócio Resumo O presente artigo tem por objetivo central investigar a viabilidade da implantação de um Programa do Biodiesel no Brasil. Para isso será inicialmente realizada uma pesquisa histórica concernente ao Proálcool, dando enfoque às políticas governamentais que balizaram o programa, seus sucessos e insucessos. Em etapa posterior, realiza-se um estudo acerca da competitividade do Subsistema Agroindustrial do álcool hoje no país, de acordo com o modelo elaborado pela Dra. Elizabeth M. M. Q. Farina. Este modelo divide o mercado em quatro ambientes: Competitivo, Tecnológico, Organizacional e Institucional. As duas etapas citadas objetivam estudar, comparativamente às medidas adotadas no Proálcool e à evolução no mercado do álcool combustível, quais são as analogias passíveis de serem feitas com o mercado de biodiesel atualmente. Palavras-chaves: Biodiesel; Competititvidade; Proálcool; Viabilidade. Abstract: The present article has for central objective to investigate the viability of the implantation of a Program of the Biodiesel in Brazil. For this, initially will be realized an historical research of Proálcool, giving approach to the governmental politics that had based the program, its successes and failures. In posterior stage, a study concerning to the competitiveness of the Agro-industrial Subsystem of the alcohol, currently in this country, in accordance with the model elaborated by the Phd. Elizabeth M. M. Q. Farina. This model divides the market in 1 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" four environments: Competitive, Technological, Institucional and Organizacional. The two cited stages focus on the study of, comparativily to the measures adopted in Proálcool and to the evolution in the market of the alcohol, which are the passíveis analogies to be done with the market of biodiesel currently. Key Words: Biodiesel, Competitiviness, Proalcohol, Viability. 1. Introdução Um importante passo no planejamento estratégico de uma empresa de energia é o desenho de diferentes cenários envolvendo o futuro energético do mundo. Jain (2000) afirma que sem levar em consideração as influências ambientais relevantes, uma companhia não consegue desenvolver suas estratégias. Com o passar dos anos, muito se tem dito a respeito do esgotamento das reservas de petróleo e da prejudicial dependência mundial relativamente a esse combustível. De fato, segundo dados da World Coal Institute (2005), aproximadamente 80% da demanda mundial de energia é atendida por recursos fósseis.Além disso, surgem às vistas do mundo o grande potencial de desenvolvimento econômico assumido por países como China e Índia, ambos extremamente populosos, com grandes territórios e conseqüentemente com altos níveis de exigência energética. Outro fator ligado novamente ao petróleo são os preços elevados atingidos por ele e que não fazem menção a uma redução significativa. O continuísmo dos conflitos no Oriente Médio deixa cada vez mais longe o consenso de baixa dos preços. Pode-se dizer que as reservas atuais de petróleo giram entre 950 bilhões e 1 trilhões de barris, as quais, com a manutenção do consumo no nível atual, seriam suficientes para suprir a demanda por mais 41 anos. Além disso, poucas são as regiões produtoras de petróleo e estas, na sua grande maioria, abrigam países que vivem uma instabilidade política. Qualquer anormalidade nestas regiões acaba gerando incertezas que se refletem no preço e na oferta do produto (ENGINEERING AND MINING JOURNAL, 2005). Mais um agravante são os efeitos ambientais causados por tantos anos de utilização do petróleo. Um conjunto de fenômenos extremos da natureza traz à luz a preocupação com meio ambiente, poluição, aquecimento global, emissão de gases do efeito estufa.Assim,em 1992 realizou-se a Conferência das Nações Unidas Sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento no Rio de Janeiro, e em 1997 aprovou-se o Protocolo de Quioto que, de acordo com o Relatório da Organização Nações Unidas, tem o objetivo de, por meio de uma série de medidas e políticas adequadas a cada país, atingir metas como: • O aumento da eficiência energética em setores relevantes da economia nacional; • A proteção e o aumento de sumidouros e reservatórios de gases de efeito estufa (...); • A promoção de formas sustentáveis de agricultura à luz das considerações sobre a mudança do clima; • A pesquisa, a promoção, o desenvolvimento e o aumento do uso de formas novas e renováveis de energia, de tecnologias de seqüestro de dióxido de carbono e de tecnologias ambientalmente seguras, que sejam avançadas e inovadoras. Assunto também constantemente presente nas pautas internacionais, e que em boa parte deriva dos problemas expostos até agora, é o desenvolvimento sustentável. Em 1973, o canadense Maurice Strong lançou o conceito de ecodesenvolvimento, cujos princípios foram formulados por Ignacy Sachs. Para ele, os caminhos que culminariam com o desenvolvimento 2 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" seriam: satisfação das necessidades básicas; solidariedade com gerações futuras; participação da população envolvida; preservação dos recursos naturais e meio ambiente; elaboração de um sistema social que garanta emprego, segurança social e respeito às diferentes culturas; programas de educação.Os debates em torno do ecodesenvolvimento abriram espaço ao conceito de desenvolvimento sustentável e em 1987, a Comissão Mundial da ONU sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento apresentou um documento conhecido por relatório Brundtland. Este diz que “Desenvolvimento sustentável é desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capacidade de as futuras gerações satisfazerem suas próprias necessidades”. Diante do exposto até agora não se mostra muito difícil compreender que existe a necessidade de busca e desenvolvimento de novas fontes de energia que possam “sustentar” o planeta em substituição ao petróleo. Pulando agora para dentro dos limites territoriais brasileiros podemos encontrar no potencial energético do agronegócio do Brasil uma grande vantagem comparativa do país relativamente à grande maioria das nações do mundo. No Brasil, cerca de 43,9% da Oferta Interna de Energia tem origem em fontes renováveis, enquanto que no mundo essa taxa é de 13,6% e nos países desenvolvidos é de apenas 6%. Dessa participação da energia renovável, 14,4 pontos percentuais correspondem à geração hidráulica e 29,4 a biomassa. Os 56,1% restantes da OIE vieram de fontes fósseis e outras não renováveis (MME, 2005). Não raro é ligar a televisão ou abrir os jornais e encontrar notícias sobre o álcool combustível da cana de açúcar, sendo o Brasil um exemplo mundial de sucesso na produção e utilização de um combustível alternativo e sustentável. O Proálcool alcançou êxito rápido e serve como modelo para implantação de novas formas de energia em todo o mundo. É neste contexto que surge a implantação da tecnologia do biodiesel. Surge como uma possibilidade de adoção de novos insumos para a produção de energia utilizando-se de um modelo já consolidado de políticas e ações estratégicas : aquelas adotadas no Proálcool. Os erros foram detectados e alternativas a eles podem ser aplicadas. Os passos certos podem ser repetidos e ainda aperfeiçoados. 2. OBJETIVOS/ METODOLOGIA 2.1 - Objetivos O presente trabalho tem por objetivo central fazer um estudo da competitividade do álcool combustível, analisando-o conforme os ambientes tecnológico, institucional, organizacional e competitivo, de maneira a contribuir com a formulação de um conjunto de possíveis ações estratégicas para a implementação do programa do biodiesel no Brasil. Para que se possa atingir esse objetivo central foi inicialmente realizada uma pesquisa exploratória do mercado de álcool combustível sob a ótica da seqüência de fatos e políticas que conduziram a criação e consolidação do Programa Nacional do Álcool, popularmente conhecido como Proálcool. 2.2 - Procedimentos metodológicos Conforme as orientações do estudo da Selltiz et al. (1965), os objetivos de uma pesquisa podem ser agrupados em três grandes blocos: i) familiarizar-se com o fenômeno de estudo ou conseguir uma nova compreensão deste, de maneira a poder formular um problema de pesquisa mais preciso ou criar novas hipóteses; ii) apresentar precisamente as características de uma situação, um grupo ou um indivíduo específico (com ou sem hipóteses 3 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" específicas iniciais a respeito da natureza de tais características); iii) verificar a freqüência com que algo ocorre ou com que está ligado a alguma outra coisa (geralmente, mas não sempre, com uma hipótese inicial específica); iv) verificar uma hipótese de relação causal entre variáveis. De acordo com o apresentado acima, pode-se dizer que a partir do conhecimento aprofundado do Programa Nacional do Álcool é possível ligá-lo ao atual mercado de biocombustíveis em seus pontos de interesse para a implementação do Biodiesel. A pesquisa exploratória é adequada à compreensão dos acontecimentos do Proalcool na medida em que ela é indicada para casos nos quais é importante identificar cursos relevantes de ação ou obter dados adicionais antes que se possa desenvolver uma abordagem. Ao mesmo tempo, essa pesquisa de natureza exploratória também é qualitativa, e esta se caracteriza por dar maior foco na compreensão dos fatos do que propriamente na sua mensuração (LAZZARINI, 1997). Dentro deste contexto, o atual trabalho fará uso do método de estudos de caso, o qual se propõe a investigar um fenômeno contemporâneo – o Proálcool - dentro do seu contexto real onde os limites entre o fenômeno e o contexto não são claramente percebidos. Isto será feito por meio do uso de múltiplas fontes de evidência como arquivos, documentos, observação etc. (YIN, 1989). A essência de um estudo de caso é que ela tenta esclarecer uma decisão ou um conjunto de decisões: os motivos pelas quais foram tomadas, como foram implementadas e com quais resultados (SCHRAMM, 1971 apud YIN, 1989). No trabalho em questão, o conjunto de decisões, resultados e fluxos gerados serão extraídos do Proálcool para que se possa alcançar o objetivo central de encontrar possíveis aplicações ao caso do Biodiesel. Segundo BONOMA (1985), os estudos de caso se encaixam em situações de alta realidade e baixa integridade de dados onde o fenômeno estudado não pode ser facilmente dissociado do seu contexto real. A abordagem exploratória, com base em dados secundários, deu-se a partir de revisão bibliográfica, levantamento de informações e dados documentais em artigos de revistas especializadas, sites de internet, congressos e seminários, jornais. A análise histórica do Proalcool permitiu que o estudo de caso tenha a seguinte estrutura: • Breve descrição da situação do mercado de álcool combustível anteriormente à implantação do programa; • Motivos que levaram à adoção do programa; • Período de implantação do Proálcool, dando destaque às políticas adotadas pelo governo para que se pudesse viabilizar a produção, estimular o mercado consumidor e adaptar a matriz energética ao novo cenário nacional e internacional do petróleo. Posteriormente, para o estudo da atual situação do álcool combustível,será realizado o já citado estudo de ambientes. Os ambientes analisados serão respectivamente: Institucional, Competitivo e Tecnológico juntamente com os aspectos organizacionais incorporados em todos eles. A etapa final se dedicará a listar as ações estratégicas para a implementação do biodiesel de acordo com as lições aprendidas no Proálcool e com a análise de competitividade proporcionada pela descrição dos quadros de ambientes. 4 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" 3. REFERENCIAL TEÓRICO 3.1 – Economia dos Custos de Transação Esta etapa do presente trabalho tem por objetivo central realizar uma revisão acerca da Nova Economia Institucional, em especial, da Economia dos Custos de Transação, além de detalhar a forma como as duas teorias se ligam e podem ser estendidas a ponto de explicar a organização de sistemas produtivos, separar cada um deles em um conjunto de ambientes e dessa forma realizar um estudo de competitividade do sistema estudado. Vale começar ressaltando que tanto a NEI como a ECT são ambas duas visões derivadas da Teoria da Organização Industrial (OI). De acordo com Bueno (2004), a principal proposição da NEI é que as instituições de uma sociedade se formam por meio de complexos processos de negociação entre indivíduos e grupos de indivíduos, e neste tipo de formação de um “contrato” tentam diminuir os custos de transação existentes. Em sua gênese, a NEI contou com a contribuição de John R. Commons, Knight, e Bernard e Hayek. Foi Ronald Coase, no entanto, quem alicerçou a estrutura que posteriormente seria enriquecida e transformada na Nova Economia Institucional. A base seria uma nova visão da firma, “que passa de um mero depositário da atividade tecnológica de transformação do produto para um complexo de contratos regendo transações internas” (AZEVEDO, 1997). As contribuições quanto à assimetria de informações foram dadas pela construção da “Economia da informação”, estruturada principalmente por George Akerloff, Michael Spence e Joseph Stiglitz. Os autores apontaram para problemas contratuais derivados da premissa básica de uma transação econômica: ela possui dois lados e a informação muitas vezes não é simetricamente distribuída entre ambos. Arrow também contribui ao promover a ligação entre a assimetria de informação e o aparecimento das organizações; Simon sistematiza a racionalidade limitada dos agentes econômicos; Alchian e Demsetz (1972) associam a questão dos direitos de propriedade à gênese da firma. Por fim, Williamson (1975) e Klein et al. (1978) conseguem, ao atribuir dimensões às transações, consolidar a NEI como um paradigma. Williamson contribui principalmente ao introduzir o elemento da especificidade dos ativos. De maneira extremamente simplificada, a NEI tem como ênfase a explicação das diferentes formas organizacionais existentes no mercado e seus diferentes arranjos contratuais mais adaptados a cada uma delas, dando destaque à importância do Ambiente Institucional para a análise de macroinstituições, e das Instituições de Governança, para as microinstituições. De maneira geral, a ligação entre NEI e ECT pode ser feita na medida em que uma transação ocorre: dois agentes (firmas), ao realizarem uma transação econômica, devem pensar em toda e qualquer forma de comportamento oportunista passível de ser assumido pelo outro. Ao fazê-lo, estão recorrendo às restrições informais (costumes, tradições, reputação) e formais (leis, constituições) ditadas pelas instituições, para que assim se possa elaborar um contrato minimizador de riscos e de custos que firma a transação. Tomando como foco agora apenas a Economia dos Custos de Transação, ela tem como premissa básica dois fatores: a racionalidade limitada dos agentes e a possibilidade de que eles assumam comportamento oportunista. No primeiro deles, rejeita-se a hipótese neoclássica de que os agentes econômicos são perfeitamente racionais e maximizadores de lucro. Logo, embora o ser humano aja baseado em sua razão ela não abarca todos os eventos possíveis, o 5 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" que culmina com a geração de contratos incompletos. O oportunismo, já explorado na Economia da Informação, é desenvolvido agora por Williamson em níveis gradativos. Em suma, unindo as idéias de incompletude contratual, oportunismo e racionalidade limitada, “a importância do pressuposto comportamental de oportunismo está na possibilidade de surgimento de problemas de adaptação decorrente da incompletude dos contratos. A racionalidade limitada implica contratos incompletos e, consequentemente, renegociações futuras. O oportunismo implica que as partes podem se aproveitar de uma renegociação, agindo aeticamente e, por conseqüência, impondo perdas à(s) sua(s) contraparte(s) na transação” (FARINA et al., 1997). Já apontados os principais pontos que norteiam NEI e ECT, será agora explorado como estas teorias se prestam a caracterizar a organização de sistemas produtivos como estruturas eficientes de coordenação, as transações associadas e o ambiente institucional de regulação desta forma organizacional. 3.2 - Organização Industrial e Competitividade de SAG’s Inicia-se apresentando a noção do que se entende por sistema agroindustrial (SAG). Segundo Zylbersztajn (2000), o estudo dos sistemas agroindustriais “vai desde o desenho de políticas públicas até arquitetura de organizações e formulação de estratégias corporativas”. O autor afirma ainda que o SAG, “embora com diferentes vestimentas e enfoques, apresentam como denominador comum a percepção de que as relações verticais de produção ao longo das cadeias produtivas devem servir de balizador para a formulação de estratégias empresariais e políticas públicas”. É desta série de relações verticais presentes no sistema que emergem os custos de transação e é entre elas que se firmam uma série de contratos. As instituições participam do processo ao delimitar o ambiente no qual ocorrem as transações e este mecanismo de regulação comportamental interfere de forma decisiva na definição dos objetivos das organizações e na escolha das estruturas de governança. No caso dos sistemas agroindustriais,cada característica inerente ao produto agrícola implica a necessidade de adaptações contratuais. Uma particularidade da cana de açúcar, por exemplo, é a proximidade entre a região de plantio e a de beneficiamento já que a cana não pode percorrer grandes distâncias depois de cortada. Isso facilita a associação entre produtores rurais e as usinas que por isso podem firmar contratos de longo prazo. Podem existir ainda diferentes formas organizacionais dentro de um mesmo SAG, formando subsistemas ou sub-SAGs. No caso do foco de análise deste trabalho tem-se, de forma abrangente, o SAG da cana-de-açúcar e “dentro” dele dois principais sub-SAGs: o do álcool e o do açúcar. Fator importante também para a organização eficiente dos sistemas é a base tecnológica envolvida e suas possibilidades de evolução. A tecnologia e a organização são variáveis de decisão a serem tomadas simultaneamente, onde uma condiciona a outra (WILLIAMSON, 1985: 87). Além disso, as regras do jogo competitivo e as instituições que regulam os negócios privados em cada país também determinam as formas organizacionais adotadas, as formas de coordenação do sistema e a adoção de estruturas de governança diferentes. Assim como acontece com os sub-SAGs da cana de açúcar, na maioria dos casos existem grandes diferenças estratégicas dentro de um mesmo SAG. Isso acontece porque existe uma segmentação deste último de acordo com a qualidade e diferenciação de produtos dentro de um mesmo SAG. Um exemplo ilustrativo deste fato é o de que o álcool, por 6 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" exemplo, ao ser encarado como substituto da gasolina (a despeito do crescimento e difusão da tecnologia flex-fuel) está sujeito às flutuações de preço do petróleo, o que naturalmente não afeta de forma direta os preços do açúcar. Logo, a especificidade de ativos dentro de um mesmo SAG exige diferentes estruturas de governança para que se possa obter um processo eficiente de coordenação do sistema. Outro fator que condiciona o leque de estratégias competitivas são as restrições institucionais vigentes, mesmo as específicas a cada produto. Tomando-se novamente o álcool como exemplo, ao se considerar a hipótese de que o governo, objetivando reduzir a pressão inflacionária, fixasse o preço do álcool em um patamar inferior ao vigente, isso forçaria a indústria alcooleira a adotar novas estratégias que voltassem a tornar sua produção viável. As inovações tecnológicas também estão constantemente presentes no aparato competitivo. O desenvolvimento da indústria de equipamentos agrícolas, da indústria química, o avanço da biotecnologia dentre outras formas de avanço tecnológico também acabam por afetar diretamente os custos, a produtividade, a concorrência fazendo com que pesquisa e desenvolvimento tenham uma estreita relação com o avanço dos sistemas agroindustriais. Outro fator chave para a eficiência de um SAG é a sua capacidade de adaptação às mudanças de cunho competitivo. No entanto, de acordo com Farina et al. (1997), “a velocidade do ajustamento a um ambiente em mudança constante não depende só das decisões de caráter individual e privado. Também as instituições e organizações existentes, que provêm suporte financeiro, tecnológico, legal e de informações para que esse ajustamento ocorra, determinam a capacidade de resposta de um sistema”. De acordo com o exposto até agora, delineia-se um conjunto de variáveis de análise relevantes para a análise de sistemas agroindustriais que podem ser agrupadas em quatro ambientes: Ambiente Organizacional, Ambiente Institucional, Ambiente Competitivo, Ambiente Tecnológico. No presente trabalho foram analisados três deles: Institucional, Tecnológico e Competitivo do sub-SAG do álcool. Os aspectos organizacionais foram incorporados nas análises destes três ambientes devido à sua íntima relação com fatores listados em cada um deles e que não puderam ser dissociados. 4 – RESULTADOS 4.1 - Antecedentes do Proalcool A primeira etapa desta apresentação dos resultados dedica-se a descrever de maneira sucinta a situação de mercado do álcool combustível anteriormente ao Programa Nacional do Álcool (Proalcool). Os principais pontos são apresentados a seguir: • 1925: testes utilizando álcool adicionado à gasolina; pequena produção; • 1938: lei nº 737- obrigatoriedade de adição do álcool à gasolina; • 1939: início da 1ª Guerra Mundial – crise de abastecimento de derivados do petróleo; plano emergencial para a produção de álcool dedicado à mistura com gasolina (2%); • 1945: fim da Guerra, normalização do abastecimento – abandono do álcool falta de uma política definitiva desacredita o setor; • Utilização da mistura de álcool como válvula de escape para excedentes de produção de cana de açúcar; • Números do setor sucroalcooleiro: 216 unidades produtivas; 42 mil trabalhadores diretos e indiretos; produção de etanol: 600 milhões de litros por safra (ÚNICA, 2004), pouca preocupação com a tecnologia de produção; 7 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" • • Anos 70: alta dependência mundial em relação ao petróleo; No Brasil (1973): participação relativa do petróleo na matriz energética = 42,8%; dependência externa frente ao petróleo = 76,9% (Paixão); petróleo envolvido em 98% de todo o transporte; • 1973-1974: Guerra árabe-israelense – preços do petróleo sobem 322% de US$ 2,24 (janeiro de 73) para US$ 10,95 (janeiro de 74); • Importações no Brasil passam de 11% para 23%; • Ernesto Geisel, Shigeaki Ueki, Lamartine Navarro e um conjunto de usineiros se unem e em 1974 desenvolvem um projeto objetivando adicionar 20% de álcool à gasolina. • 1975: a vazão de recursos destinados ao petróleo passam de US$ 600 milhões para mais de US$ 22 bilhões Serão listadas agora as principais ações governamentais que nortearam o desenvolvimento do programa. O programa foi separado em 3 fases, sendo elas basicamente a de início, auge e declínio do Proálcool. 4.2 - Primeira fase do Proalcool • 14 de novembro de 1975: início do Programa Nacional Álcool; • Crise no mercado internacional de açúcar liberação da cana para a produção de álcool; • Molas propulsoras do Proálcool situação internacional do petróleo, dependência externa de energia e crise da economia açucareira • Objetivos de adição de 22% de álcool à gasolina – aproveitamentto da capacidadde instalada açucareira. Incentivos governamentais (Farina, 1998): • Prazo de amortização de 12 anos com 3 anos de carência; • Financiamentos na área industrial de 80 a 90% com juros nominais de 15% ao ano para produtores do Norte e Nordeste e 17% para produtores do Centro-Sul; • 100% de investimento financiado no setor agrícola com 7% de juros anuais sem correção monetária; compra garantida de álcool anidro produzido pela Petrobrás; • Ênfase na produção de álcool hidratado a partir de 1979, dada a segunda elevação abrupta dos preços do petróleo. • Aumento do preço interno da gasolina álcool comparativamente 25% mais barato • Baixo custo de álcool da cana: aproveitamento da capacidade ociosa de destialarias (38%); ganho de produtividade agrícola: 46,48 em 60 57,18 ton/ha em 70; • Crescimento da aérea destinada a cana: 32%; Essa primeira fase gerou resultados: a safra de 1977-1978 teve um crescimento de 664 mil m³ para 1,5 milhões de m³. Já em 1978, o país dava início à exportação do álcool para os Estados Unidos e Japão e os conflitos no oriente Médio em 1979 fizeram com que o preço do barril de petróleo alcançasse US$60 incentivando ainda mais o prolongamento do Proalcool. Outro efeito do programa já pode ser notado nesta primeira fase: entre 1975 e 1979, o número de usinas de açúcar instaladas no país praticamente não se alterou enquanto que, neste mesmo período, o CNA aprovou 166 projetos de construção de destilarias, a ampla maioria produzindo álcool a partir da cana de açúcar (PAIXÃO). O investimento necessário para sustentar esse brutal crescimento foi de, em média, US$ 2 116 milhões sendo que quase 75% destes foram gastos públicos (DATAGRO/CENAL/SDR, 1994) 8 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" Em termos de quantidade produzida, enquanto o álcool experimentou um crescimento de 530% em sua produção entre os anos de 75 e 80, neste mesmo período o açúcar ficou com pouco mais de 30%. 4.3 - Segunda fase do Proalcool Na segunda fase, novas decisões foram tomadas frente ao segundo choque do petróleo. Segue o conjunto de fatos e ações governamentais deste período: • Preços do petróleo a US$ 30/barril na primeira metade da década de 80; • O governo e a Anfavea assinam um protocolo de comprometimento das montadoras em investir na tecnologia de desenvolvimento de carros movidos exclusivamente a álcool; • fixação do preço do álcool em 64,5% o preço da gasolina; • redução do IPI para carros movidos a álcool; • estabelecimento de nova meta de produção: 10,7 bilhões de litros a partir da safra de 1985/1986 ( Pamplona,1984); • 1986: 567 destilarias somam uma capacidade produtiva em torno de 16 milhões de m³ de álcool; • Desenvolvimento em regiões não tradicionais: Mato Grosso do Sul, Goiás, Paraná, Santa Catarina e região Norte; • Incentivos à industria automobilística: redução da Taxa Rodoviária Única, isenção de ICMS, acesso a toda tecnologia desenvolvida pelas estatais; • Problemas técnicos nos motores de explosão interna, distribuição e armazenamento de álcool rapidamente contornado pelo Proálcool; • Evolução da produção de veículos a álcool: 30% do total de automóveis em 1980-1981; 88% em 1983; 94,4% em 1984 e 96% em 1986; • Propaganda governamental: “este pode usar que não vai faltar”; • Alianças com postos de gasolina: obrigatoriedade da venda de álcool; • Controle de preços: manutenção de estoques estratégicos; • Expansão de destilarias autônomas produção dissociada do açúcar dá sensação de maturidade ao álcool prospecção de novos empresários para o ramo 4.4 - Terceira fase e Declínio do Proalcool No final de 1983, a Comissão Nacional de Energia aprova nesse ano uma nova meta de produção de 14,3 bilhões de litros. Dois anos depois, o governo comemora o bom resultado dos investimentos despendidos no Proálcool: gerou-se mais de um milhão de empregos diretos e indiretos; atingiu-se a produção de onze bilhões de litros; foram obtidos benefícios ambientais decorrentes da menor poluição trazida pelo álcool relativamente à gasolina. No entanto, na segunda metade da década de 80 um conjunto de fatores contribuiu para o que o sucesso não se estendesse por mais tempo. Sejam eles: • redução brusca dos recursos públicos investidos na expansão do programa; • recuperação dos preços internacionais do açúcar; • queda dos preços do barril de petróleo: US$ 35,00 em 1980 para US$15,00 em 1988 desmotivam a produção alcooleira. Em 1986, ainda que com uma produção em 12 bilhões de litros não é possível suprir a demanda, mesmo depois de consumidos os estoques estratégicos que eram mantidos. Inicia-se um processo de desconfiança por parte do consumidor que já começa a surtir efeitos na venda de carros a álcool. Em 1988, a participação caiu para 88,4%, em 1989 para 61% e em 1990, 9 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" 19,9%. A imagem do setor foi ainda mais prejudicada quando da falta de álcool no final de 1989, principalmente devido à realocação das usinas para produção de açúcar. Não há uma data definida que marca o fim do Proálcool. Acontece um declínio gradual do programa devido aos fatores internos e externos anteriormente citados. O álcool, desde que entrou na matriz energética brasileira em 1975, sofreu uma série de mudanças ao longo do tempo, tanto no que se refere a fatores endógenos ao subsistema agroindustrial do álcool, como aqueles exógenos, referentes ao mercado no qual ele está inserido. Nesta fase do presente trabalho, será realizada uma distribuição dos fatores endógenos e exógenos entre os quadros de Ambiente Institucional, Tecnológico e Competitivo conforme o modelo de competitividade de Farina et al. (1997). 4.5 - Ambiente Competitivo Graças à evolução tecnológica e gerencial do subsistema agroindustrial do álcool o Brasil é hoje, no que se refere ao mercado mundial, imbatível em termos de custos de produção de etanol e açúcar a partir da cana. Para se ter uma idéia, no lançamento do Proalcool cada metro cúbico de álcool custava US$ 850,00 (ROUSSEFF. D., 2005). Hoje, este custo é inferior a US$ 200,00. A competitividade frente aos combustíveis fósseis pode ser verificada numericamente. Em janeiro de 2003, valores de custo do etanol hidratado situaram-se entre R$ 0,523 e R$ 0,482 por litro, claramente competitivos frente aos derivados do petróleo, cujos preços nas refinarias têm se situado pouco acima de US$0,20 por litro. Contando que, o preço do álcool deve ser de 70% do preço da gasolina para haver uma paridade de troca, tem-se aqui uma situação favorável ao álcool e que tende a se manter tendo em vista que o setor canavieiro passa por um período contínuo de evolução o qual ainda promete se prolongar. Além disso, há ainda as constantes flutuações nos preços do petróleo. Tratando agora do mercado internacional, estimativas do período de 2000 a 2002 indicam uma produção total mundial de etanol em torno de 33 milhões de m³ ao ano, 19 milhões de m³ para fins combustíveis. O Brasil está em primeiro lugar na produção total com 13,5 milhões de m³ (2003), seguido dos Estados Unidos, com 6,5 milhões de m³ e China com 3 milhões de m³. Comparativamente, enquanto a produção brasileira não conta com subsídios por parte do governo, de forma tal que os preços praticados são de mercado, nos Estados Unidos e União Européia há grandes subsídios, de diferentes naturezas, que acabam por dificultar uma avaliação mais precisa dos custos reais de produção. Nos Estados Unidos chegou-se a um custo de produção de US$ 0,33 por litro de etanol anidro (2003), utilizando como insumo a glucose de milho e desconsiderando subsídios estaduais e federais (Dakota do Norte). Para plantas maiores em que há ganhos de escala produtiva chegou-se a US$ 0,29 por litro. Na Europa, têm-se como principais insumos o trigo e a beterraba e a mensuração do custo é ainda mais difícil do que nos Estados Unidos devido à complexidade dos sistemas de subsídios ao produtor. Estimam-se custos em torno de US$ 0,50 por litro de álcool anidro para plantas produtivas de tamanho médio. No Brasil, os custos de produção do álcool da cana de açúcar são de aproximadamente US$ 0,15 por litro. Pode-se ainda analisar alguns dados relativos a tecnologia. A partir de estimativas de redução destes custos, concluiu-se que os custos alcançados hoje no Brasil não chegariam a ser batidos nem em 2020, mesmo admitindo um extenso desenvolvimento com custos de biomassa previstos para o hemisfério Norte. 10 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" Outros dois fatores de contribuição para o incremento da competitividade do álcool brasileiro são: aproveitamento dos resíduos da cana e a relevância das questões ambientais. Pode-se esperar para os próximos 10 anos a implantação de sistemas produtores de etanol adicional com a hidrólise e fermentação do bagaço e da palha cana. Além disso, praticamente toda a energia térmica e cerca de 95% da energia elétrica usada nas usinas são geradas no processo produtivo da própria usina por meio de sistemas de co-geração a bagaço. Isso torna ainda mais baixos os custos de produção, já que o pagamento de 12 kWh/ton cana de energia elétrica e 330 kWh/ton cana de energia térmica despenderia onerosos esforços financeiros. O bagaço atualmente gerado na moagem da cana equivale a 11 milhões de toneladas de óleo combustível, sendo que 1/4 da palha, se recolhidos, seriam responsáveis pela produção de 3,2 milhões de toneladas de óleo (MCT, 2001). Os custos desses resíduos no Brasil são menores que os de biomassa encontrados em outros países. O segundo fator citado se configura como uma questão constantemente em pauta, principalmente após as regulamentações do Protocolo de Quioto: as causas ambientais. Quando instituído, o Proalcool visava apenas reduzir gastos com importações de petróleo e evitar perdas com os baixos preços do açúcar. Logo que passou a ser percebida praticamente como trunfo de marketing a favor do programa, a redução da poluição nas grandes cidades proporcionada pelo álcool passou a ser apontada como justificativa para sua expansão. Ao realizar um balanço energético completo, que avalia os resultados líquidos no ciclo inteiro de produção do álcool, a conclusão foi a de que o etanol produzido a partir da cana de açúcar é muito superior a qualquer outra tecnologia para produzir combustível de biomassa do mundo relativamente à razão energia renovável obtida/energia fóssil usada e ainda pelo altíssimo coeficiente de redução das emissões de GEE. Nos EUA, hoje a relação de energias não chega a atingir 1,4 enquanto que no Brasil a média é de 8,3 (CADERNOS NAE, 2004). A cada 14 milhões de m³ de etanol que são produzidos anualmente, há uma redução de aproximadamente 30,1 milhões de toneladas de CO2 equivalente. A despeito das vantagens comparativas apresentadas, todos os agentes envolvidos com questões logísticas afirmam que há necessidade de investimentos na área. Para o abastecimento do mercado interno as necessidades são menores, mas para que o Brasil entre como uma potência exportadora a Petrobrás avaliou que alguns itens ainda exigem investimentos. 4.6 - Ambiente Institucional No estudo do Ambiente Institucional serão estudadas basicamente as “regras do jogo”, ou seja, o conjunto de leis, costumes e outros fatores exógenos à produção que regem o mercado em que se insere o etanol. Em primeiro lugar, há que se destacar a enorme importância da cana de açúcar no Brasil. Ela é cultivada em mais de 5 milhões de hectares, distribuída em todas as regiões do país. A produção em 2004/2005 atingiu o volume de 380 milhões de toneladas, um quarto da produção mundial, movimentou cerca de R$ 40 bilhões gerando 2,35% do PIB e exportou US$3,5 bilhões. Historicamente, especialmente em decorrência do PNA, tem-se que entre 1975 e 1985, datas de implantação e auge do programa respectivamente, a produção de cana dobrou de 120 para 240 milhões de toneladas (ÚNICA (2005), JORNALCANA (2005), FNP (2005) e SECEX (2005)). O sistema produtivo envolve hoje 308 usinas que têm em média 70% de terras próprias. Ao longo destes 70 anos de implantação do PNA houve uma mudança nos pólos regionais: o nordeste experimentou uma redução relativa da produção e deu lugar ao Centro11 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" Sul. Atualmente, o Estado de São Paulo produz sozinho cerca de 60% da cana do país. Devese destacar que os controles governamentais de cota de produção e exportação, tabelamento de preços e concessão de subsídios à produção e a movimentação tanto para o açúcar quanto para o etanol foram eliminadas em um regime de transição iniciado em meados dos anos 90 e concluído em 2002. Atualmente o governo apenas define o teor de etanol na gasolina, situado na maior parte dos últimos anos entre 20 e 24% (CADERNOS NAE,2004). De acordo com dados do Departamento do Açúcar e Álcool do Ministério da Agricultura, a capacidade instalada de produção de etanol no Brasil é da ordem de 15,5 milhões de m³. O produto é vendido nos quase 28 mil postos de distribuição em todo o Brasil. Segundo dados da Bolsa de Mercadorias e Futuros de São Paulo, em 2003 havia uma movimentação mensal média de 4 mil contratos futuros de álcool anidro, correspondendo a mais de 34 milhões de reais transacionados. A evolução desses contratos de longo prazo é um incrível salto, já que antes do início do Proálcool praticamente não existia nem mesmo mercado de exportação. Dado que o etanol reduz brutalmente as emissões de GEE, esta passa a ser uma razão muito forte para o aumento da importância dada ao etanol brasileiro nos mercados externo e interno, especialmente frente aos avanços no sentido da implementação do Protocolo de Quioto. Os aspectos institucionais relacionados serão estudados a seguir. As atividades de produção e industrialização da cana de açúcar são regulamentadas por um conjunto de leis e o impacto ambiental envolvido é individualmente controlado por 50 instrumentos regulatórios. A seguir são listados alguns deles: • Lei 4771/65: obrigatoriedade de reflorestamento e proteção das águas, definições de áreas de preservação ambiental; • Lei 7803/89: conceito de “reserva legal” – 20% de área reflorestada; • Cronograma de redução gradual das áreas de queimada; • Legislação restrita quanto a transformações genéticasindefinida, complexa e burocrática projetos inviabilizados pela demora de avaliação das propostas. Quanto ao consumo de etanol do Brasil tem-se que nos últimos 12 anos, até o ano de 2002, este ficou relativamente estável em torno de 12 milhões de m³. A mudança ocorreu no tipo de álcool consumido: enquanto que na década de 80, atingiu-se 96% das vendas totais de veículos a álcool hidratado, na década de 90 essa porcentagem se aproximava de zero. No entanto, o volume total de vendas de veículos passou de 600-800 para 1200-1800 mil unidades, trazendo uma compensação na demanda devido ao álcool anidro misturado à gasolina em teores de 20 a 25%. Com a introdução dos carros flex-fuel, o volume de vendas crescentes desde o seu lançamento em 2003 e já atingindo 69% do total de vendas de carros até outubro de 2005, a matriz energética para fins combustíveis tende a sofrer algumas alterações. O mecanismo de controle assumido pelo consumidor faz com que o mercado se regule de forma a tornar os preços mais competitivos e, nessa dinâmica, o álcool leva vantagem por não estar sujeito a variações internacionais e ainda por ter chances significativas de diminuir seus custos de produção por meio de avanços tecnológicos. Outra vantagem advinda da demanda crescente por veículos flex-fuel é que para que a mistura entre álcool hidratado e gasolina não se torne bifásica é necessário que a gasolina tenha um teor mínimo de etanol, aumentando a quantidade demandada de ambos os tipos. Considerando-se então crescimento da frota, venda de veículos novos, tecnologia bicombustível, e 26% de álcool anidro na gasolina (um pouco acima da realidade atual), 12 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" calcula-se que em 2013 a demanda de etanol no mercado interno seria de 22,04 Mm³ sendo 9,4 anidro, 11,54 hidratado e 1,1 destinado a outros fins (Caderno NAE, 2004). Externamente, o cálculo da demanda é mais difícil já que deve-se considerar as políticas agrícolas internas a cada país, seu grau de comprometimento com as metas traçadas pelo Protocolo de Quioto, suas barreira à entrada do etanol brasileiro.Nos Estados Unidos, por exemplo, a barreira colocada ao álcool brasileiro é praticamente intransponível já que o imposto de importação é de US$0,54/galão, mais 2,5% de impostos ad valorem. Uma avaliação recente do Instituto de Economia Agrícola (IEA) indica uma demanda total de cerca de 66 milhões de m³ de etanol em 2010. Um estudo da Datagro, que considera um cenário mais conservador, calcula que o Brasil poderia participar do mercado externo com cerca de 4,4 milhões de m³ anuais em 2013. A Câmara Setorial da Cadeia Produtiva de Açúcar e Álcool considerou fatores como deficiência na exportação e chegou à participação de 2,2 a 3,2 milhões de m³ de etanol por ano entre 2010 e 2015. No quesito geração de empregos, tem-se que em 2004/2005 foram oferecidos, para uma moagem de 380 milhões de toneladas de cana-de-açúcar, 3,6 milhões de empregos, sendo 1 milhão diretos e 2,6 milhões de indiretos. Com os ganhos de tecnologia previstos estima-se uma perda em ambos. No que concerne às características do emprego, pode-se apontar determinantes a duração da safra (6 a 8 meses) e o nível tecnológico agrícola. Alta sazonalidade implica empregos temporários, alta rotatividade, dificuldades de treinamento e consequentemente baixos salários. O avanço de tecnologia neste caso tem dois lados. De um, o aumento da mecanização na agricultura reduz o nível de emprego. A introdução da colheita mecânica, quando completada, pode levar a uma redução de 50 a 60% dos empregos diretos na área. Por outro lado, melhorias genéticas trazem uma redução do período da entressafra, levando a um decréscimo de empregos temporários, mas gerando outros de melhor qualidade, remuneração e estabilidade. O aumento da demanda interna e externa pode ponderar os dois lados da questão: irão ser gerados mais empregos para suprir essa demanda, compensando a mecanização enquanto a diminuição da sazonalidade aumenta os salários. Historicamente, pode-se dizer que o Proálcool ajudou a reverter a migração para as áreas urbanas e melhorou a qualidade de vida em muitas localidades. Hoje, tomando por base a produção de petróleo no Brasil, a geração de empregos por unidade de energia é quatro vezes maior no carvão, 3 vezes na energia hidroelétrica e 150 vezes com o etanol. 4.7 - Ambiente Tecnológico A implantação da produção de álcool em larga escala no Brasil, levando o combustível ao status de peça chave na matriz energética brasileira, fez com que grandes avanços tecnológicos se voltassem pra a agroindústria da cana. De acordo com os Cadernos do Núcleo de Assuntos Estratégicos (2004), a primeira ênfase foi voltada para o crescimento da produtividade. Em etapa posterior, o enfoque passou a ser a eficiência da conversão de sacarose em açúcar, com grandes acréscimos de rendimento no processo fermentativo e na extração. Depois disso a biotecnologia ganhou destaque, contribuindo com o desenvolvimento de novas variedades de cana de açúcar, proporcionando grandes reduções nos custos. Após 1985, a atenção voltou-se para o gerenciamento da produção agroindustrial. Os resultados dessas melhorias podem ser vistos na tabela a seguir, que compara mudanças de diversos fatores da indústria canavieira relativamente ao avanço alcançado entre os anos de 1975 e 2000. Tabela: Indicadores de produtividade da Agroindústria Canavieira no Brasil, 1975/2000 13 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" Indicador Variação Produtividade Agrícola 33% Teor médio de Sacarose na cana 8% Eficiência na conversão sacarose a etanol 14% Produtividade na Fermentação (m³ etanol/ m³ reator-dia) 130% Conversão agroindustrial média 172% Fonte: Macedo, I.C.; Commercial Perspectives of Bioalcohol in Brazil, 2000. A evolução de produtividade não aconteceu apenas relativamente à produção de cana por hectare, mas também na sua qualidade, revelada pelo teor de sacarose. Em termos quantitativos, um indicativo da produtividade de litros de álcool produzido por hectare de cultivo mostra a evolução desta agroindústria: de 4,2 litros/hectare em 1980 para 6.35 litros/hectare atualmente (UNICA, 2005). Além disso, seguindo a tendência de mecanização, foram desenvolvidas geneticamente variedades de cana adaptadas ao manejo das colheitadeiras mecânicas. Já o processamento industrial da cana não traz grandes possibilidades de avanço, pois já se encontra praticamente em sua maturidade plena. Para se ter uma idéia, os processos de tratamento do caldo e destilação possuem, no Centro-Sul, uma média de eficiência de 99,2% e 99,6% respectivamente (CTC, 2004). A biotecnologia, já citada, também foi fator de suma importância para o incremento da produtividade, mesmo em áreas menos favoráveis (CTC, 2004). Nos anos 80, quase metade da área com cultivo de cana em São Paulo era ocupada com uma única variedade. Hoje, a partir de programas como o da Coopersucar, o da Rede Interuniversitária de Desenvolvimento do Setor Sucroalcooleiro, do Instituto Agronômico de Campinas e a da Canavialis, empresa privada relativamente nova no Brasil, existem cerca de 550 variedades cultivadas em todo país, sendo que as 20 principais ocupam 70% da área.Um ponto importante a destacar é o fato de que, comparativamente a países como Austrália, África do Sul, Colômbia e Maurício, o produtor brasileiro é mais receptivo e rápido para adotar novas variedades de cana de açúcar. A facilidade de criação de variedades adaptadas a praticamente qualquer condição edafoclimáticas traz grandes possibilidades de crescimento da produção. De acordo com dados da Embrapa, existem aproximadamente 100 milhões de hectares aptos à expansão da agricultura de espécies de ciclo anual. Portanto, a expectativa de aumento na produção não deve encontrar limitações nesse sentido, já que apenas 2% dessas áreas já seria suficiente para esse aumento. Outro fator de incremento na competitividade e redução nos custos do álcool é o fato de que, segundo a DEDINI (2003), a indústria brasileira de equipamentos para produção de álcool e co-geração de energia é praticamente 100% nacionalizada. O advento da difusão da tecnologia flex-fuel também foi de grande valia para a nova inserção do álcool na matriz energética brasileira. Em março de 2003, foi lançado pela Volkswagen o primeiro veículo flex-fuel no Brasil e a partir de então, as vendas cresceram vertiginosamente, principalmente devido ao aumento do poder de escolha do consumidor. A participação dos veículos movidos à álcool e flex-fuel no total das vendas de veículos leves evoluiu da seguinte maneira: 7% em 2003; 26% em 2004; e 53% até o mês de novembro de 2005. 14 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" 5 – CONCLUSÃO/ ANÁLISE DE RESULTADOS: AÇÕES ESTRATÉGICAS PARA O PROGRAMA NACIONAL DO BIODIESEL (PROBIODIESEL) É possível realizar uma analogia entre a implantação da cadeia do biodiesel e aquela que ocorrida no Proálcool desde os fatos que antecederam a adoção deste último. Como dito na revisão histórica, o fato de as políticas serem inicialmente utilizadas sem qualquer compromisso de longo prazo, como ocorreu com a decisão tomada de implantação de usinas dedicadas à produção de álcool no início da década de 40 e seu posterior abandono em decorrência da normalização do fornecimento de gasolina após a guerra (em 1945), foi um erro que não deve ser cometido novamente. Para a implantação do biodiesel devem ser realizadas políticas de longo prazo, com metas a serem atingidas periodicamente para que o combustível não seja desacreditado logo no início de sua adoção, posto que isto levaria a uma rejeição inicial por parte dos consumidores, que necessitariam por isso de um incentivo maior para o retorno do consumo. Políticas de longo prazo proporcionam credibilidade. Uma boa medida já foi fixada neste sentido pelo governo: determinou-se pela lei 11.097/2005 um percentual mínimo autorizativo de mistura de biodiesel ao diesel comum de 2% de 2005 a 2007; sequencialmente um mesmo percentual de 2008 a 2012,mas nesta etapa já em caráter obrigatório e de 2013 em diante o percentual foi elevado para 5%, também em caráter obrigatório. Segundo dados do Grupo Coimex, para abastecer o mercado nacional com o B2 (2% de mistura) há necessidade de 780 milhões de litros de combustível e quando a mistura passar a 5% o potencial mercadológico é de 2 bilhões de litros. Necessário agora é efetuar uma fiscalização rigorosa de cumprimento destas determinações, tendo em vista que o estabelecimento delas é elemento necessário, mas não suficiente. Incentivo para a implementação do biocombustível pode também ser citado como a evolução dos custos produtivos atingidos pelo etanol dado que uma das grandes barreiras colocadas aos biocombústíveis é seu custo de produção elevado. A experiência com o Proálcool pode provar que a partir do momento que são desprendidos recursos, pesquisa, desenvolvimento e tecnologia em prol de um objetivo comum, esta barreira se não eliminada, pode ser ao menos minimizada.O álcool agora não apenas é competitivo, mas impossível de ser alcançado por uma gama enorme de países pelo menos durante mais 20 anos. Em termos quantitativos pode-se apresentar a tabela a seguir, apresentada em seminário pela Ministra das Minas e Energia, Dilma Roussef em novembro de 2005, que mostra a evolução do setor: Quadro 1 – Evolução do Proalcool durante os 30 anos de existência 1975 – Lançamento do Proálcool 2005 – 30 Anos Depois Ceticismo com relação a utilização de combustíveis alternativos. Maior receptividade para novos combustíveis. Consumidor temia pelo desabastecimento. Tecnologia Flex-Fuel: Consumidor não Conseqüência: desvalorização do carro à teme eventual desabastecimento e valoriza álcool. os veículos com a nova tecnologia. Álcool é subsidiado em um regime de preços A produção hoje não conta com subsídios tabelados. e os preços praticados são livres. Demanda pelo combustível é função direta da frota (parque circulante). Veículo Flex-Fuel é um meio de autoregulação para o mercado. 15 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" Custo de produção era cerca de US$ 850,00/ m3 Custo de produção está abaixo de US$ 200,00/ m3 Produtividade agrícola: Produtividade agrícola: Média Brasil: 74,29 ton/ ha Média Brasil: 47,78 ton/ ha São Paulo: 61,50 ton/ ha São Paulo: 83,54 ton/ ha (Fonte: IBGE, Secretaria de Agricultura de (Fonte: MAPA) SP) Questões ambientais, embora presentes, não Questões ambientais estão presentes e exerciam influência na comunidade exercem influência significativa na internacional definição de políticas energéticas Aspectos importantes para a ação O maior problema hoje é: governamental: Preço e Garantia de Adulteração / Sonegação Tributária Abastecimento Inexistência de mercado de exportação Perspectivas de comercialização por meio de contratos de longo prazo e em bolsa de valores Fonte: MME, 2005. Essa evolução significativa dos custos de produção delineiam uma possibilidade para que o mesmo seja feito para os biocombustíveis que utilizem como matéria prima a soja, o dendê, a mamona entre outros. Um dos grandes problemas enfrentados pelos biocombustíveis produzidos a partir dos insumos citados acima é o elevado custo de oportunidade assumido por eles frente à produção do combustível. No caso do dendê por exemplo, de acordo com os Cadernos NAE (2004), o custo de produção é baixo, equivalente ao diesel mineral sem impostos, mas o custo de oportunidade do óleo torna necessário um subsídio direto mais elevado que o da soja. Já a mamona parece assumir caráter viável quando do aumento da produção, dado que o produto possui alto valor, mas mercado reduzido.Os ganhos de escala proporcionados poderiam viabilizar a produção de combustível.O mesmo não acontece com a soja e o dendê, que já contam com mercados amplos. A solução encontrada é semelhante a do Proálcool, ao menos no estágio inicial de inserção no mercado: políticas de subsídios. Em termos quantitativos, de acordo com uma avaliação preliminar promovida pelo Núcleo de Assuntos Estratégicos em 2004 previu que os subsídios necessários seriam de US$ 0,74, US$ 0,13 e US$ 0,30 para respectivamente mamona, soja e dendê.A estimativa no entanto foi feita com o petróleo a US$ 24/barril. A cotação do barril pela OPEP em 26/05/2006 foi, no entanto, US$63,91. A flutuação deste preço faz cair bruscamente o valor dos subsídios. Esse requisito (oferecimento de subsídios pelo governo) para que os preços não sejam passados aos consumidores é grande alvo de críticas. Vale ressaltar no entanto, que devem ser consideradas as externalidades positivas como meio ambiente local, clima global, geração e manutenção de emprego e balanço de pagamentos. Outro ponto a ser aproveitado como exemplo positivo e de sucesso foram as diversas alianças firmadas entre diferentes agentes econômicos envolvidos com o sistema alcooleiro. Assim como feito à época podem ser firmados acordos com fabricantes de automóveis e postos de gasolina. Com os primeiros, devem-se firmar acordos diferentes daqueles do Proálcool, dado que com a mistura de biodiesel ao diesel mineral não é necessária nenhuma alteração no motor. Dessa forma, uma providência cabível neste sentido seria estimular as montadoras a realizarem trabalhos de marketing que visem os pontos positivos dos 16 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" biocombustíveis, a possibilidade da misturas sem prejuízo para o motor e mesmo um selo como os colocados nos eletrodomésticos, informando que aquele veículo, ao ser abastecido com qualquer biocombustível, está proporcionando benefícios ao meio ambiente. O incentivo seria promovido pela redução do Imposto sobre Produtos Industrializados. Já com os postos de gasolina, pode-se estabelecer uma cota mínima de biodiesel a ser comercializada, também com uma sinalização clara de que há este tipo de combustível à venda. Dessa forma, o fácil acesso pode disseminar o consumo com maior facilidade além de firmar a idéia na mente do consumidor. No caso de teores de mistura que exijam mudanças de motor, ou mesmo da adoção pura, a tecnologia deve ser plenamente desenvolvida antes de sua inserção no mercado para que problemas como os ocorridos com os carros movidos somente a álcool não voltem a acontecer. A reincidência de um problema como este pode causar ainda mais rejeição inicial por parte dos consumidores do que aquela ocorrida com o álcool. No mesmo sentido, os consumidores devem ser claramente informados a respeito de quaisquer mudanças ou não do desempenho do veículo sob pena mais uma vez de rejeição. O consumidor de forma alguma pode se sentir enganado a respeito da qualidade do produto que consome. Outro acerto foi aquele que culminou com uma parceria entre iniciativa pública e privada quanto ao desenvolvimento da tecnologia. Toda a tecnologia desenvolvida pelas estatais era então compartilhada para que o que o setor privado a utilizasse. O mesmo deve ocorrer com o biodiesel, mas a via terá de ser de mão dupla: tanto o desenvolvimento tecnológico promovido pelas estatais como pelas privadas deverá ser transmitido ao outro. Para isso propõe-se uma fusão entre os dois setores para o desenvolvimento da tecnologia, já que a criação de um órgão fiscalizador geraria custos de transação altos e desnecessários. A fusão poderia acontecer por meio da divisão do trabalho em etapas seqüenciais, em que uma não pode prosseguir sem o desenvolvimento daquela imediatamente anterior. O mecanismo, é claro, não é perfeitamente eficiente, já que como dito, a racionalidade dos agentes é limitada e o oportunismo quase sempre encontra brechas. Mas essa seria uma oportunidade de integração importante que estimularia a distribuição dos investimentos entre o estado e a iniciativa privada, desonerando a máquina estatal de um gasto como o ocorrido no Proálcool. As lições aprendidas com o programa e que não devem ser repetidas emergem do final, quando uma seqüência de fatores culminam com o abandono gradual do programa. Um primeiro erro a ser corrigido para a aplicação do caso biodiesel pode ser encontrado no fato de o Brasil ter investido esforços produtivos para fins de exportação do álcool, antes que tanto a própria produção como também o mercado e o programa tivessem atingido maturidade plena. Logo, no caso do biodiesel, deve-se salientar que o foco é o abastecimento do país. A exportação passível de ser feita e na qual deve-se investir é a de tecnologia, tanto aquelas já desenvolvidas como a do álcool, como as que ainda estão se desenvolvendo como as do biodiesel dos mais diversos insumos (pinhão manso, mamona, girassol, amendoim, gergelim, canola, dendê, soja, algodão, babaçu, biomassa, óleos reciclados, entre outros) mas não do produto em si. Além disso, os planos foram ambiciosos demais e não puderam se sustentar. O segundo equívoco foi referente aos investimentos do governo. Eles aconteceram de forma intensa e curta, de forma que em pouco tempo o Estado não se via mais em condições de sustentá-lo. Os recursos públicos foram reduzidos bruscamente e a crise foi inevitável. Assim, pode-se corrigir o erro realizando investimentos menores porém contínuos. Volta aqui a questão dos planos de longo prazo: os planos de investimentos menores (em valor monetário por vez), além de mais críveis pela sociedade e são sustentáveis por parte do governo e se configuram como investimentos confiáveis, atraindo mais uma vez a iniciativa privada.As 17 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" altas e baixas promovidas em boa medida pelas oscilações da injeção de recursos públicos desacreditam facilmente mercados incipientes. O terceiro, mais ligado à situação da década de 70, foram os motivos de adoção do programa. Como ele se fixava na crise de determinado suprimento, eram grandes as chances de que quando esta passasse, o consumo normal do combustível fóssil se retomasse. E foi isso mesmo o que ocorreu. A motivação agora deve ser e é um pouco diferente: ela também tem ligações com o esgotamento das reservas de petróleo, mas deve também se centrar na questão ambiental acordada no Protocolo de Quioto, e a conscientização deve ocorrer no sentido de uma reformulação benéfica da matriz energética nacional. Dentre todas as medidas citadas até agora, talvez a mais importante seria referente ao estabelecimento, por parte do governo, de preços mínimos para a comercialização do biodiesel, preço este naturalmente superior ao do diesel mineral. Isso aconteceria principalmente tendo em vista viabilizar a produção do biocombustível, dados seus altos custos ao produtor tanto monetários como de oportunidade. Assim, além dos subsídios governamentais, o consumidor arcaria com parte dos custos, contribuindo em parte com os benefícios ambientais proporcionados. Para tanto, faz necessário a categorização do biodiesel enquanto um combustível, e não um produto agrícola, de maneira a permitir a interferência governamental. Esse mesmo problema é enfrentado pelo álcool combustível. Portanto, um erro que não pode ser repetido. Segue abaixo quadro resumo das principais propostas para a implementação do biodiesel: Proálcool Probiodiesel Políticas implantadas sem qualquer compromisso de Longo Prazo crise de abastecimento Políticas de longo prazo, com metas préestabelecidas credibilidade: lei 11.097/2005 Evolução dos custos de produção Estímulo ao investimento em tecnologia de produção altos custos do biodiesel Política de subsídios para implementação da cadeia do álcool Política de subsídios inicial para cobertura dos custos de oportunidade Alianças com as montadoras alterações no motor Alianças com as montadoras trabalhos de marketing Alianças com postos Alianças com postos cotas mínimas de venda de biodiesel com sinalização clara Tecnologia de alteração dos motores dos veículos desenvolvida parcialmente Tecnologia plenamente desenvolvida antes de lançamento no mercado informações completas ao consumidor Obrigatoriedade de compartilhamento da tecnologia estatal ao setor privado Desenvolvimento tecnológico divisão do trabalho (público e privado) em etapas seqüências: prevenção contra comportamento oportunista Investimentos em importação antes do amadurecimento completo do programa Foco no abastecimento interno; exportação apenas de tecnologia Recursos públicos investidos de forma intensa e de curta sustentabilidade descrédito de mercados incipientes Investimentos públicos menores e contínuos incentivos à entrada da iniciativa privada Flutuação de preços Estabelecimento de preços mínimos para a comercialização do biodiesel 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 18 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" < www.sociendadedigital.com.br>. AKERLOF, George (1970) – “The Market for Lemons: Quality Uncertainty and the Market Mechanism” – The Quarterly Journal of Economics – Vol. 84(3): 488-500. ARROW, K.J. “Moral Hazard”(1968) in Arrow, K.J. “Thhe economicc of Information”. Harvard Univ. Press. 1984 AZEVEDO, P.F. (1997) “ Comercialização de Produtos Agroindustriais” In: Batalha, M.O. (Cood.). Gestão Agroindustrial. São Paulo : Editora Atlas, Vol. 1 BONOMA, T. V. Case research in marketing: opportunities, problems and a process. Journal of Marketing Research, Chicago, v. XXII, p. 199-208, may 1985. CADERNOS NAE - Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República – Mudança do Clima. Brasília: Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica, no 2, v. 1, 2004. COASE, R. H. (1937). The Nature of the Firm. Economica , Vol. 4, November COASE, R. The problem of social cost. Journal of Law and Economics, vol. 3, pp 1-44, 1960. FAGUNDES, Jorge. “ Economia Institucional : Custos de transação e Impactos sobre política de defesada Concorrência” FARINA, E. M. M. Q.; AZEVEDO, P. F.; SAES, M. S. M. Competitividade: mercado, Estado e organizações.São Paulo: Singular, 1997. GOLDBERG, R.A. “Agribusiness Coordination : A Systems Approach to the Wheat, Soybean, and Florida Orange Economies “. Division of Research. Graduate School os Business an Administration. Harvard Univ., 256 p. (1968) GOLDEMBERG, J. Energia, meio ambiente e desenvolvimento. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo – Edusp, 1998, 234p. HAYEK, F. “The Use of Knowledge in Society”. American Economic Review, 35, Sep-1945. KLEIN, P & Shelanski, H. “Empirical Research in transaction Cost Economics”, mimeo (1994). LAZZARINI, S.G. Estudos de Caso para Fins de Pesquisa: Aplicabilidade e Limitações do Método. In: FARINA et. al. (Coord). Estudos de Caso em Agribusiness. São Paulo: ed. Pioneira, p. 9-23, 1997. MALHOTRA, N.K. Pesquisa de Marketing: uma orientação aplicada. 3ª ed. Porto Alegre: Bookman, 2001, 719p. MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA – MCT. Diversos documentos. Disponível em: <http://www.mct.gov.br/clima>. Acesso em Janeiro/2005. NAÇÕES UNIDAS NO BRASIL: Protocolo de Quioto à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima; disponível no em <www.onubrasil.org.br/doc_quioto.php>. NASCIMENTO, César Augusto Oller: “Concentração e centralização de capitais na agroindústria brasileira na década de 1990: o caso do setor sucroalcooleiro” – Dissertação de mestrado- Universidade Federal de São Carlos, 2001. NASTARI, P. M., “Etanol de Cana de Açúcar: o combustível de hoje”; apresentação realizada no Seminário “Proalcool- 30 anos depois”- OESP- Agência Estado –ÚNICA, 2005. NORTH, D. C. Custos de Transação, Instituições e Desempenho Econômico. Rio de Janeiro: Instituto Liberal, 1994. PAIXÃO, M., “O Proálcool Enquanto uma Política Energética Alternativa: uma resenha crítica”. PROALCOOL 30 ANOS; Reportagem especial do jornal “O Estado de S. Paulo”; disponível em < www.estadao.com.br/ext/especial/proalcool>. 19 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" PROÁLCOOL E SEU DESENVOLVIMENTO; por Manoel Ruiz; disponível em ROCHA, Jr., Weimar Freire. “Análise do Agronegócio da Erva-Mate com o enfoque da Nova Economia Institucional e o uso da matriz estrutural Prospectiva”. 2001. 133p . Tese ( Doutorado) - Engenharia de Produção da Universidade Federal de ROUSSEFF, D., “Proalcool- 30 anos Depois”; apresentação realizada no Seminário “Proalcool- 30 anos depois”- OESP- Agência Estado –ÚNICA, 2005. Santa Catarina SCHERER, F.M. “Industrial Market Strusture and Economic Performance”. USA: Houghton Mifflin Company, 2ª ed., 1990 SELLTIZ, C.; JAHODA, M.; DEUTSCH, M., COOK, S. M. Métodos de pesquisa das relações sociais. São Paulo: Herder, 1965. STIGLITZ, Joseph E. (1990) – Peer Monitoring and Credit Markets – World Bank Economic Review, vol. 4(3), pp. 351-366. WILLIAMSON, O. E. Comparative Economic Organization: The Analysis of Discrete Structural Alternatives. Administrative Science Quarterly, 36 (June) WILLIAMSON, O. E. Transaction Cost Economics and Organization Theory. Institutional and Corporate Change WILLIAMSON, O.“Strategizing, economizing and economic organization”. Strategic Management Journal, 12: 75-94, 1991. YIN, Robert K. Case study research: design and methods. 6. ed. s.l, Sage Publications, 1989. ZYLBERSZTAJN, D. et al. Economia & Gestão dos Negócios Agroalimentares. São Paulo: Pioneira, 2000 ZYLBERSZTAJN, Decio (Coordenadores). Competitividade no agribusiness brasileiro. São Paulo: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada/USP. 1998. ZYLBERSZTAJN, Decio. Estruturas de governança e coordenação do agribusiness: uma aplicação da Nova Economia das Instituições. 1995. 238p. Tese (Livre-Docência) – Departamento de Administração, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Universidade de São Paulo, São Paulo. 20 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural