A ELIPSE (RE)VISTA ALÉM DOS FOCOS Roniere Leite Soares Universidade Federal de Campina Grande [email protected] Resumo O presente trabalho faz uma retomada discursiva de um elemento imprescindível para a representação de círculos em perspectiva – a elipse, tendo como base uma abordagem que enfatiza um caráter analítico capaz de descrever os elementos constituintes e suas propriedades peculiares, assim como o método de determinação dos eixos maior e menor dessa figura em projeções cônicas. As demonstrações feitas a partir de construções pormenorizadas trazem uma complementação à abordagem textual de tal forma que estas se fundem amplamente na composição das linguagens verbal e não-verbal, visando facilitar o entendimento do ensaio apresentado. Os pontos mais relevantes deste trabalho foram a descrição geométrica da elipse enquanto entidade cônica e a determinação dos eixos em perspectivas com pontos de fuga. Temos a convicção de que o artigo contribuirá para estudantes que necessitam aplicar a elipse encontrada por eixos em construções perspectiva das partes constituintes de peças tridimensionais que contêm furos, rasgos, cilindros, cones e esferas. Palavras-chave: elipse, curva cônica, círculo, perspectiva. Abstract This work is a discursive resumption of an element essential to the representation of circles in perspective - the ellipse, based on an approach that emphasizes an analytical character capable of describing the constituents and their peculiar properties, as well as the method of determining the major and minor axes of this figure in perspective projections. The statements made from construction completion to bring a detailed textual approach so widely that they merge in the composition of languages, verbal and nonverbal, to facilitate the understanding of the essay presented. The most relevant points of this study were the geometric description of the ellipse as an entity and the determination of the conical axes in perspective with vanishing points. We are convinced that the article will help students who need to apply the ellipse axes found by construction perspective of the constituent parts of three-dimensional parts that contain holes, tears, cylinders, cones and spheres. Keywords: ellipse, conic curve, circle, perspective. 1 A elipse fora do contexto perspectivo: conceito e elementos A elipse é uma curva fechada simples gerada a partir da secção plana de um cone circular reto. Esta superfície secante, inclinada, não intercepta a base circular cônica, conforme é mostrado na figura 1. A elipse, de acordo com Calfa (1997, p.34), é a projeção oblíqua de um círculo, e por isso, é demasiadamente utilizada para representar o mesmo em diversos tipos de perspectivas nas várias áreas que usam o desenho como meio de expressão de idéias (FONSECA et al, 1999, p. 67-72 et seq). Figura 1: cone circular reto, plano secante e elipse derivada no tronco de cone Existem vários métodos de construção para elipses. Entre os métodos usuais pelos quais são construídas as formas elípticas podemos citar alguns mais rotineiros que são, entre outros: diâmetros conjugados (BACHMANN, 1976, p. 221), eixos conjugados (RICCA, 1992, p. 327), pontos especiais (MONTENEGRO, 1997, P. 71), pontos ligados por curva francesa (propriedade PF1+PF2=2a ou FG+GE=EC+CF=AB), Método Schooten (RE, 2004, p. 28) e construção por círculos principais (MANFÉ, 2004, p. 31). Contudo, nenhum dos métodos considera a elipse em contexto perspectivo com pontos de fuga. Mesmo levando em conta o fato histórico de um uso demasiado do artifício de representação de círculos em instâncias perspectivas através de elipses, reproduzindo por semelhança, as naturezas geométricas que as geram num complexo processo perceptivo, pode-se afirmar que há, por muitas vezes, uma lacuna estabelecida entre as formas elípticas desenhadas rotineiramente e os aspectos conceituais e matemáticos pertinentes, representados por parte de alguns desenhistas/artistas em profissionais correlatos, acerca também dos elementos e propriedades que dizem respeito a esta importante figura geométrica bidimensional. Isso se constitui como sendo uma mudança de rumo na história da expressão gráfica, a qual trilha passos em direção da substituição da consciência do uso manual ou artesanal pela facilidade dos artefatos, instrumentos automáticos, softwares aplicativos e meios tecnológicos que abdicam da versatilidade artística e de um pensamento humano inerente. Alguns dos fatores que estimularam esta distância entre os aspectos artístico e o científico ao longo dos últimos tempos foram, em parte: o uso de elipsógrafos, utilização de gabaritos, execução de desenhos à mão livre que prescindem de exatidão dos atributos geométricos (forma, tamanho e posição), manejo substitutivo de elipses por falsas elipses ou ovais regulares (UBRIG, 2006, p.18), interpretação equivocada de que os eixos elípticos são colineares às diagonais dos quadriláteros em perspectiva, assim como a popularização dos recursos computacionais que facilitam a criação de elipses. O uso indiscriminado de elipses em situações naturais de perspectivas pode gerar equívocos de aplicação que abrangem, entre outros cuidados, a inclinação e posição do eixo maior, ângulo do eixo maior formado com o eixo menor, relação proporcional entre diâmetros maior e menor da elipse, assim como seus tamanhos em relação ao diâmetro real do círculo que serve de base construtiva, em verdadeira grandeza. Nosso intento neste trabalho é, a priori, apresentar as partes geométricas que formam uma elipse, conforme mostram a figura 2 e a tabela 1, a fim de estabelecer diferenciações conceituais a serem aplicadas conscientemente na elipse que seja, a posteriori, utilizada em situações de desenhos com pontos de fuga. Dessa forma, é possível unir os aspectos artístico e prático, descompromissados muitas vezes com a técnica, aos precisos e modernos processos tecnológicos e computacionais. Para tanto, delineou-se uma revisão bibliográfica diluída no texto, de modo que o traçado das elipses se tornou possível pela determinação sequencial de duas variáveis: o eixo maior e o eixo menor (BALDAM, 2007, p. 86). Figura 2: Elipse e seus elementos constituintes As medidas exemplificativas da figura 2 foram determinadas com o objetivo de ilustrar numericamente as diferenças entre os elementos, estabelecendo assim as implicações decorrentes da proporção escolhida entre os dois eixos (maior e menor). Assim, tendo como exemplo uma elipse que tem 02 (duas) unidades de medida para o diâmetro do eixo menor e 04 (quatro) unidades de medida para o diâmetro do eixo maior, podemos considerar inicialmente que, de acordo com a figura 2, derivam-se automaticamente algumas unidades expostas na tabela 1. Vemos ainda na figura 2 que a determinação dos focos E e F se dá por intermédio do raio OA ou OB, com centro em C e em D. Os respectivos eixos maior e menor AB e CD são perpendiculares entre si. Temos então as seguintes dimensões consequentes: Tabela 1: Valores de demonstração encontrados a partir da elipse horizontal na figura 2 AB CD eixo maior eixo menor ø círculo maior 4 ø círculo menor 2 OE=OF Semidistâncias focais OE=c; OF=c Segmentos de Retas EF FG+GE EC+CF OD1=OD2 distância focal soma de distâncias = 4 soma de distâncias = 4 Diretrizes 1 e2 EF=2c FG+GE=EC+CF = eixo maior EC+CF=FG+ GE = AB D = a /c 4 4 2,30940107 1,73205081 3,46410162 2 A excentricidade é uma relação matemática fracionária que existe entre a semidistância focal (c) e o semieixo maior (a). Ela varia de 0 a 1. Quando c=0, a elipse equivale a um círculo e quando c=1, esta se reduz a um segmento de reta igual ao eixo maior da elipse. Ainda com base na figura 2, distinguimos na segunda tabela: Tabela 2: Pontos fixos e excentricidade E foco 1 2 2.1 Pontos Fixos F O A, B, C e D foco 2 centro focal vértices Excentricidade: e = c/a c = OE = OF a=OA=OB e 1,73205081 2 0,8660254050 Representações elípticas em perspectivas com pontos de fuga Perspectiva com um ponto de fuga Começamos por demonstrar, à luz de Gill (1975, p. 42), um exemplo em perspectiva com um só ponto de fuga na qual o observador determina linhas divergentes a partir de uma posição estática “O”, da qual o cone de visão será ampliado em face de um círculo colocado à sua frente. Essa posição, nos casos aqui apresentados, é alinhada com o centro do círculo em verdadeira grandeza (VG), cujos pontos determinam uma linha perpendicular à Linha de Terra (LT). Assim, teremos o centro da elipse alinhado consequentemente com ambos os pontos mencionados e a extensão desta linha vertical dará origem ao segmento de reta “O”PF. Essa é a limitação de nosso trabalho. Consideremos o quadro geometral onde, resumidamente, um diedro reto formado pela interseção entre os planos horizontal (PH) e vertical (PV) é estabelecida pela Linha de Terra (LT). A distância perpendicular entre o Ponto de Fuga (PF) e entre a linha de terra representa a altura do ponto observatório ao solo, ou seja, a distância ortogonal do ponto divergente ao plano horizontal. Temos ainda o segmento do ponto observador “O” à “LT” horizontal, o qual representa a menor distância do olho humano ao plano vertical. Para este exemplo, de acordo com a figura 3, consideremos o ponto observatório “O” alinhado ao ponto de fuga único “PF”. Figura 3: Elipse construída em perspectiva com um ponto de fuga Observemos que, no caso da figura 3, o segmento de reta AB delimitou os limites do cone de visão que projetam o círculo em perspectiva, fazendo com que o eixo maior da elipse gerado no PV tenha sido derivado da reta secante contida em AB (no PH), mas não de um dos diâmetros do círculo. A base poligonal irregular a partir da qual se gera a projeção elíptica é um trapézio equilátero, quadrilátero este que possui apenas um par de lados opostos paralelos. Temos também os casos em que a linha de terra inclinada, tanto à esquerda como à direita de “O”, permite o mesmo procedimento usado na figura 3 para determinação das elipses, de acordo como nós observamos na figura 4. Neste caso experimental, houve uma mudança simultânea de posição do quadro geometral e do objeto em relação ao observador. Isso se deu pela rotação do eixo central, sempre perpendicular à LT. Há uma conservação do paralelismo de dois dos lados do quadrado com a linha de terra, permanecendo ainda uma colinearidade do ponto O com os centros circunferenciais. Assim, estabelece-se uma linha ortogonal em relação à linha de terra. Como no caso anterior, a tangência estabelecida pelas projetantes cônicas determinam o segmento máximo do campo visual nos limites dos círculos. Esse princípio de traçado determina o eixo maior da elipse. Figura 4: Elipses feitas em perspectivas com pontos de fuga deslocados e planos oblíquos 2.2 Perspectiva com dois pontos de fuga Como a elipse é uma figura bidimensional, novamente haveremos de considerar apenas uma das faces de um cubo, a superior, que neste caso nos serve de referência para compreensão do que ocorre de maneira análoga nas outras faces cúbicas. Assim, não há necessidade de demonstração com três pontos de fuga, pois o uso de dois destes é suficiente para estabelecer o que acontece com as duas dimensões em situações quaisquer com três pontos de fuga. Na figura 5, a base poligonal, em posição superior, a partir da qual se gera a projeção elíptica é um trapezóide (PENTEADO, 1977, p. 211), quadrilátero este que é resultado da projeção cônica de um quadrado, em posição inferior, e tem por característica morfológica a ausência de um par ou de dois pares de lados opostos paralelos. Figura 5: Elipse construída em perspectiva com dois pontos de fuga Para o eixo menor, restabelecemo-lo ampliadamente na figura 6 a partir do ponto M, pertencente a elipse, ligando-o por uma perpendicular X que cruza o eixo maior AB no ponto P e que cruza o arco de raio OB (centro em O) no ponto E. Por este último é traçado um segmento EO, ligando-o ao centro da elipse desejada. Este segmento EO é interceptado no ponto L por uma reta WM, perpendicular a EP, que parte do ponto M. A distância OL é o raio do eixo menor da elipse. É traçado o arco LX, determinando o eixo menor OX. Estabelecidos os eixos maior e menor, traça-se a elipse. Este método para determinação do eixo menor, exposto no parágrafo anterior e descrito na figura 6 foi (re)descoberto pelo aluno Danny Viscaino, da escola secundária High Mount, através do trabalho de Carnoy (1912, apud VELOSO, 1998). Figura 6: Elipse ampliada em função da determinação do eixo menor OX 3 Conclusão A utilidade desta comunicação é enxergar a elipse a partir de um ponto de vista mais técnico, introduzindo seus elementos formadores e conceitos geométricos capazes de dar, posteriormente, subsídios mínimos para a aplicação consciente desta figura em círculos aplicados em perspectivas cônicas. Para isto, aplicou-se a elipse com um ponto de fuga e com dois pontos de fuga, usando-se os eixos maior e menor para o traçado definitivo da mesma. O experimento comprovou a eficácia do método quando se tem um ponto observatório alinhado com os centros do círculo inicial e da elipse derivada. Este alinhamento, perpendicular à linha de terra, é imprescindível para o sucesso dos casos apresentados, mesmo no caso em que a LT é oblíqua. Verificou-se que as linhas divergentes que partem do observador e tangenciam o círculo são as linhas que delimitam a projeção do eixo maior da elipse, determinando seus tamanhos e posições no quadrilátero irregular (acima da LT) derivado do círculo inscrito num quadrado (abaixo da LT). Referências ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10520: informação e documentação – citações em documentos. Rio de Janeiro, 2002. 7p. ____ . NBR 6023: informação e documentação – Referências – Elaboração. Rio de Janeiro, 2002. BACHMANN, Albert; FORBERG, Richard; Desenho Técnico. Porto Alegre-RS: Ed. Globo - MEC, 1976. 340 p. BALDAM, Roquemar de Lima; COSTA, Lourenço. AutoCAD 2006: utilizando totalmente. 4. ed. São Paulo: Érica, 2007. 428 p. CALFA, Cel Prof Humberto Giovanni; ALMEIDA, Cel ME Luiz Abreu de; BARBOSA, Cel ME Roberto Carvalho; Desenho Geométrico Plano. 2. ed. Volume 2, Tomo II. Rio de Janeiro-RJ: Biblioteca do Exército Editora, 1997. 216 p. CARNOY, Joseph. 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