REVISTA PALAVRA VIVA – A IGREJA DE JESUS CRISTO Apoio didático – Lição 10a UMA HERANÇA HISTÓRICA A Igreja Cristã não esteve sempre dividida por muitas das barreiras e discordâncias que hoje existem. Apesar de perseguições tentarem destruir a igreja primitiva, ela se tornou mais forte a cada onda de ataque. Heresias e divisões a ameaçaram quase desde o seu início, mas a igreja visível permaneceu virtualmente uma até o grande cisma entre o Oriente e Ocidente no século 11. No século 16, outra significativa divisão atingiu a igreja ocidental quando Roma, então centro do poder político e religioso da igreja dominante, excomungou um monge agostiniano chamado Martinho Lutero, recusando a Reforma proposta. No Concílio de Trento (1545-1563) Roma fechou oficialmente as portas para as contribuições teológicas dos reformadores, os quais se esforçavam por corrigir falhas graves que haviam sido desenvolvidas na igreja ao longo dos séculos. As palavras familiares do Credo dos Apóstolos, acima, são um resumo histórico e simples das verdades essenciais professadas pelos primeiros cristãos. Embora essa confissão não seja, certamente, uma produção direta dos doze apóstolos de Cristo, ela consiste em uma declaração resumida dos seus ensinos e está em perfeita harmonia com o espírito do Novo Testamento. Muitos católicos conhecem bem esse credo. E se espantam ao descobrir que os protestantes também o conhecem. Do mesmo modo, alguns protestantes se surpreendem quando ouvem um companheiro evangélico recitá-lo. Quase sempre, os evangélicos ficam até mesmo mais surpresos ao descobrirem que existe um credo antigo que, muito mais do que apenas um documento misterioso e abstrato, é uma viva e vibrante profissão das verdades essenciais cridas por todos os cristãos ao longo dos séculos. Aqui está um ponto de partida universal para a declaração cristã – um credo que expressa as verdades vitais e fundamentais confessadas pelos crentes muito antes da ruptura da igreja visível nos séculos 11 e 16. Entretanto, nem tudo o que precisa ser professado pelos modernos cristãos está contido nele. Por exemplo, esse documento não menciona a graça de Deus na salvação. Também não há nele referência alguma à autoridade das Escrituras. Não obstante tudo isso, ele é um bom começo – um ponto de partida para toda as confissões cristãs históricas – e uma excelente declaração de fé para os momentos de culto comunitário. A confiança viva em Cristo requer uma fé cristã alicerçada tanto na História quanto na experiência presente. A verdadeira confissão não pode existir sem o Novo Testamento e este exige que confessemos nossa fidelidade a Cristo, tanto à sua pessoa como à sua obra. Todos aqueles que confessam seu amor a Cristo precisam compreender isso. “Mas, eu sou um cristão evangélico”, você vai dizer. “Eu não posso confessar fidelidade à ‘santa igreja católica’.” Essa linguagem é inaceitável para mim. Eu creio na igreja bíblica do Novo Testamento e não em uma “santa igreja católica”. Ao longo dos séculos, crentes têm sempre confessado sua fé ao confirmar sua crença na santa igreja católica. É que a palavra católica significa universal,1 antes de ser usada como nome próprio da igreja de Roma. E a igreja de Cristo, em razão de estar espalhada por toda a terra, abrangendo pessoas de todas as origens, tanto sociais quanto étnicas (Ap 5.9), é uma igreja católica (que significa universal). Todos os cristãos de todos os tempos e lugares formam a igreja universal, ou católica, de Cristo. (Adaptado de O Mistério Católico, de John Armstrong [Editora Cultura Cristã], cap.1) © A IGREJA DE JESUS CRISTO Vamos em frente, soldados de Cristo REVISTA PALAVRA VIVA – A IGREJA DE JESUS CRISTO Apoio didático – Lição 10b NOTA HISTÓRICA SOBRE A CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMINSTER Desde julho de 1643 até fevereiro de 1649, reuniu-se em uma das salas da Abadia de Westminster, na cidade de Londres, o Concílio conhecido na História pelo nome de Assembleia de Westminster. Esse Concílio foi convocado pelo parlamento inglês, para preparar uma nova base de doutrina, forma de culto e governo eclesiástico que devia servir para a Igreja do Estado nos três reinos. Em um sentido, a ocasião não foi propícia. Já começara a luta entre o parlamento e o rei, Carlos I, e durante as sessões do concílio o país foi agitado pela revolução em que o rei perdeu a vida e Cromwell tomou as rédeas do governo. Em outro sentido, a ocasião foi oportuna. Os teólogos mais eruditos daquele tempo tomaram parte nos trabalhos da Assembleia. A Confissão de Fé e os Catecismos foram discutidos ponto por ponto, aproveitando-se o que havia de melhor nas Confissões já formuladas, e o resultado foi a organização de um sistema de doutrina cristã baseado na Escritura e notável pela sua coerência em todas as suas partes. O Parlamento não conseguiu o que almejava quando nomeou os membros do Concílio. A Confissão de Fé foi aprovada, mas por apenas poucos meses a Igreja Presbiteriana foi nominalmente a Igreja do Estado na Inglaterra. A Confissão de Westminster foi a última das confissões formuladas durante o período da Reforma. Até agora tem havido na história da Igreja somente dois períodos que se distinguiram pelo número de credos ou confissões que neles foram produzidos. O primeiro pertence aos séculos quarto e quinto, que produziram os credos formulados pelos concílios ecumênicos de Nicéia, Constantinopla, Éfeso e Calcedônia; o segundo sincroniza com o período da Reforma. Os símbolos do primeiro período chamam-se “credos”, os do segundo “confissões”. Uma comparação entre o Credo dos Apóstolos, por exemplo, e a Confissão de Westminster mostrará a diferença. O Credo é a fórmula de uma fé pessoal e principia com a palavra “Creio”. A Confissão de Westminster segue o plano adotado no tempo da Reforma, é mais elaborada e apresenta um pequeno sistema de teologia. Esse sistema é conhecido pelo nome de Calvinismo, por ser o que João Calvino ensinou, e foi aceito pelas Igrejas Reformadas, que diferiram das Luteranas. A utilidade de uma Confissão de Fé evidencia-se na história das Igrejas Reformadas ou Presbiterianas. Sendo a Confissão de Westminster a mais perfeita que elas conseguiram formular, serve de laço de união e estreita as relações entre os presbiterianos de todo o mundo. Os Catecismos especialmente têm servido para doutrinar a mocidade nas puras verdades do Evangelho. No tempo em que se reuniu a Assembleia, e por muito tempo antes, todos sustentavam a necessidade da união da Igreja e do Estado, e originalmente havia no Capitulo que trata do Magistrado Civil uma seção ensinando essa necessidade. Ao © A IGREJA DE JESUS CRISTO Vamos em frente, soldados de Cristo formar-se a Igreja Presbiteriana nos Estados Unidos da América do Norte, em 1788, essa seção foi omitida, pois ali quase todos entendiam que a Igreja devia estar livre de toda a união com o Estado, sendo cada um livre e independente na esfera que lhe pertence. Em 1887, ou quase cem anos mais tarde, a Igreja geralmente chamada Igreja do Norte eliminou a última parte da Seção IV do Capítulo XXIV, que dizia: “O viúvo não pode desposar nenhuma parente carnal de sua mulher nos graus de parentesco em que não possa desposar uma das suas próprias parentes, nem a viúva poderá casar-se com um parente carnal de seu marido nos graus de parentesco em que não possa casar-se com um dos seus próprios parentes”. O Sínodo do Brasil, organizado em 1888, fez igual eliminação. No ano 1903 a mesma Igreja do Norte dos Estados Unidos fez outras emendas importantes1 e também acrescentou mais dois capítulos à Confissão de Fé.2 John M. Kyle A Confissão de Fé de Westminster, Editora Cultura Cristã 1 As duas seções que foram modificadas rezam do modo seguinte: “As obras feitas pelos não regenerados, embora sejam, quanto à matéria, coisas que Deus ordena e em si mesmas louváveis e úteis, e embora o negligenciá-las seja pecaminoso e ofensivo a Deus, não obstante, em razão de não procederem de um coração purificado pela fé, elas não são feitas devidamente – segundo a Palavra – nem para um fim justo – a glória de Deus – ficam aquém do que Deus exige e não podem preparar homem algum para receber a graça de Deus” (Capítulo XVI. Seção VII). “Nosso Senhor Jesus Cristo é o único cabeça da Igreja, e a pretensão de qualquer homem ser vigário de Cristo e cabeça da Igreja, é contrária à Escritura nem tem base alguma na História e é uma usurpação que desonra a nosso Senhor Jesus Cristo” (Capítulo XXV. Seção VI). 2 Considerando a conveniência de exprimir claramente a doutrina da Igreja a respeito do Espírito Santo, das Missões e do amor de Deus para com todos os homens, a igreja americana acrescentou os seguintes capítulos: Capítulo XXXIV. Do Espírito Santo – I. O Espírito Santo é a terceira pessoa da Trindade, procedente do Pai e do Filho, da mesma substância e igual em poder e glória, e devese crer nele, amá-lo, obedecê-lo e adorá-lo, juntamente com o Pai e o Filho, por todos os séculos (Mt 3.16,17; Mt 28.19; 2Co 13.13; Jo 15.26; Jo 16.13,14; Jo 17.24; Jo 16.14). II. É Ele o Senhor e Doador da vida, presente em toda parte na natureza, e é a fonte de todos os pensamentos bons, desejos puros e conselhos santos que se encontram nos homens. Por ele os profetas foram levados a falar a Palavra de Deus, e todos os autores da Sagrada Escritura foram inspirados a registrar de um modo infalível a disposição e a vontade de Deus. A dispensação do Evangelho foi-lhe entregue de um modo especial. O Espírito Santo prepara o caminho para o Evangelho, acompanha-o com seu poder persuasivo e recomenda a sua mensagem à razão e à consciência dos homens, de maneira que os que rejeitam a oferta misericordiosa, ficam não somente sem desculpa, mas também culpados de terem resistido ao Espírito Santo (Rm 8.2; Gn 1.2; Sl 139.7; Jo 16.13,14; 2Pe 1.19-21; Jo 14.16; Jo 16.7-11; At 7.51-53). III. O Espírito Santo, o qual o Pai prontamente dá a todos os que lho pedirem, é o único agente eficaz na aplicação da redenção. Ele convence os homens do pecado, leva-os ao arrependimento, regenera-os pela sua graça, e persuade-os e habilita-os a abraçar Jesus Cristo pela fé. Ele une todos os crentes a Cristo, habita neles como seu Consolador e Santificador, dá-lhes o espírito de adoção e de oração, e cumpre neles todos os graciosos ofícios pelos quais eles são santificados e selados até ao dia da redenção (Lc 11.13; At 1.5; At 5.32; Jo 16.8; At 2.37,38; Tt 3.4-7; At 8.29,37; 1Co 12.13; 1Co 3.16,17; Rm 8.15; Ef 4.30). IV. Pela presença do Espírito Santo nos seus corações, todos os crentes, estando intimamente unidos a Cristo, a Cabeça, estão assim unidos uns aos outros na Igreja, que é seu corpo. Ele chama e unge os ministros para o seu santo ofício, prepara todos os outros oficiais da Igreja para o seu trabalho especial e concede vários dons e graças aos demais membros. Ele torna eficazes a Palavra e as ordenanças do Evangelho. Por Ele a Igreja será preservada e aumentada até cobrir a face da terra; será purificada, e, afinal, tornada perfeitamente santa na presença de Deus (Ef 1.22; Ef 1.23; At 20.28; 1Co 12.11; Ef 5.27). Capítulo XXXV. Do Amor de Deus e das Missões – I. Em seu amor infinito e perfeito – e tendo provido no pacto da graça, pela mediação e sacrifício do Senhor Jesus Cristo, um caminho de vida e salvação suficiente e adaptado a toda a raça humana decaída como está – Deus determinou que a todos os homens esta salvação de graça seja anunciada no Evangelho (Jo 3.16; 1Tm 4.10; Mc 16.15). II. No Evangelho Deus proclama o seu amor ao mundo, revela clara e plenamente o único caminho da salvação, assegura vida eterna a todos quantos verdadeiramente se arrependem e creem em Cristo, e ordena que esta salvação seja anunciada a todos os homens, a fim de que conheçam a misericórdia oferecida e, pela ação do seu Espírito, a aceitem como dádiva da graça (Jo 3.16; Jo 14.6; At 4.12; 1Jo 5.12; Mc 16.15; Ef 2.4,8,9). III. As Escrituras nos asseguram que os que ouvem o Evangelho e aceitam imediatamente os seus misericordiosos oferecimentos, gozam os eternos benefícios da salvação; porém, os que continuam impenitentes e incrédulos agravam a sua falta e são os únicos culpados pela sua perdição (Jo 5.24; Jo 3.18). IV. Visto não haver outro caminho de salvação a não ser o revelado no Evangelho, e visto que, conforme o usual método da graça divinamente estabelecido, a fé vem pelo ouvido que atende à Palavra de Deus, Cristo comissionou a sua Igreja para ir por todo o mundo e ensinar a todas as nações. Todos os crentes, portanto, têm por obrigação sustentar as ordenanças religiosas onde já estiverem estabelecidas e contribuir, por meio de suas orações e ofertas e por seus esforços, para a dilatação do Reino de Cristo por todo o mundo (Jo 14.6; At 4.12; Rm 10.17; Mt 28.19,20; 1Co 4.2; 2Co 9.6,7,10). © A IGREJA DE JESUS CRISTO Vamos em frente, soldados de Cristo REVISTA PALAVRA VIVA – A IGREJA DE JESUS CRISTO Apoio didático – Lição 10c UMA HERANÇA HISTÓRICA A AUTORIDADE DA CONFISSÃO DE FÉ E DOS CATECISMOS Pessoas há que estranham adotar a Igreja Presbiteriana uma Confissão de Fé e Catecismos como regra de fé, quando sustenta sempre ser a Escritura Sagrada sua única regra de fé e de prática. A incoerência é apenas aparente. A Igreja Presbiteriana coloca a Bíblia em primeiro lugar. É ela só que deve obrigar a consciência. É também princípio fundamental da Igreja Presbiteriana que toda autoridade eclesiástica é ministerial e declarativa; que todas as decisões dos concílios devem harmonizar-se com a revelação divina. A consciência não se deve sujeitar a essas decisões se forem contrárias à Palavra de Deus. Ainda outro princípio da mesma Igreja é que os concílios, sendo de homens falíveis, podem errar, e muitas vezes têm errado. Suas decisões, portanto, não podem ser recebidas como regra absoluta e primária de fé e prática; servem somente para ajudar na crença ou na conduta que se deve adotar. O supremo juiz de todas as controvérsias, em matéria religiosa, é o Espírito Santo falando na e pela Escritura. Por esta, pois, devem-se julgar toda e qualquer decisão dos concílios e toda e qualquer doutrina ensinada por homens. Admitir-se a falibilidade dos concílios não é depreciar a autoridade da Confissão de Fé e dos Catecismos para aqueles que de livre vontade os aceitem. Admitindo tal, a Igreja somente declara que depende do Autor da Escritura, e recebe a direção do seu Espírito na interpretação da Palavra e nas fórmulas de aplicar suas doutrinas. A Igreja Presbiteriana sustenta que a Escritura é a suprema e infalível regra de fé e prática; e também que a Confissão de Fé e os Catecismos contêm o sistema de doutrina ensinado na Escritura, e dela deriva toda a sua autoridade e a ela tudo se subordina. É justamente porque cremos que a Confissão de Fé e os Catecismos estão em harmonia com a Escritura, nossa regra infalível, que os aceitamos. Não existem, pois, na Igreja Presbiteriana, duas regras de fé, mas uma só, suprema e infalível. As outras fórmulas são subordinadas e falíveis, necessárias para a pureza, governo e disciplina da Igreja. Assim a experiência de muitos séculos o tem demonstrado. John M. Kyle A Confissão de Fé de Westminster, Editora Cultura Cristã © A IGREJA DE JESUS CRISTO Vamos em frente, soldados de Cristo REVISTA PALAVRA VIVA – A IGREJA DE JESUS CRISTO Apoio didático – Lição 10d VERDADE COM PROPÓSITOS Em 1562, Frederico III do Palatinado Eleitoral, um opulento estado do Sacro Império Romano (pense na Alemanha), ordenou a preparação de um novo catecismo para o seu território. O novo catecismo deveria preencher três funções: (1) ser um recurso para ensinar às crianças, (2) ser um guia para pregadores, e (3) ser uma forma de unidade confessional entre as facções protestantes do Palatinado. Frederico queria um catecismo unificador que evitasse rótulos teológicos e fosse claramente enraizado nos textos das Escrituras. Para isso, ele reuniu uma equipe de professores de teologia e ministros (juntamente com o próprio Frederico) para elaborar um novo catecismo. Embora o catecismo fosse verdadeiramente um trabalho de equipe (incluindo Caspar Olevianus, que costumava ser considerado um coautor do catecismo, mas agora é visto simplesmente como um membro valioso da comissão), há pouca dúvida que o principal autor foi Zacarias Ursino. Ursino, um professor na Universidade de Heidelberg, nasceu em 18 de julho de 1534, no que hoje é a Polônia, mas, na época, fazia parte da Áustria. Ursino foi o principal arquiteto do Catecismo de Heidelberg, baseando muitas das perguntas e respostas em seu próprio breve catecismo, e, em menor medida, no seu catecismo maior. O Catecismo de Heidelberg reflete as convicções teológicas de Ursino (firmemente protestante, com tendências calvinistas) e seu espírito caloroso e conciliatório.1 Esse novo catecismo foi publicado pela primeira vez em Heidelberg (a principal cidade do Palatinado), em janeiro de 1563, tendo passado por várias revisões nesse mesmo ano. O Catecismo foi imediatamente traduzido para o latim e o holandês, e logo depois para o francês e o inglês. Além da Bíblia, O Peregrino de John Bunyan e A Imitação de Cristo de Tomás de Kempis, o Catecismo de Heidelberg é o livro de maior circulação no mundo. Desde a sua publicação em 1563, o Catecismo de Heidelberg tem sido utilizado em dezenas de idiomas e é amplamente elogiado como o catecismo mais devocional e mais amado da Reforma.2 Como a maioria dos catecismos, o Catecismo de Heidelberg é em grande parte um comentário sobre três temas: o Credo Apostólico, os Dez Mandamentos e a Oração do Senhor. A estrutura de Heidelberg, no entanto, é original de duas maneiras. Primeiro, a estrutura geral se encaixa no padrão de salvação encontrada no livro de Romanos. Depois de duas perguntas introdutórias, o Catecismo trata do sofrimento humano (Perguntas 3-11), a libertação do homem (12-85) e, finalmente, a resposta do homem (86-129) – ou para colocá-lo de forma mais memorável: culpa, graça e gratidão. Segundo, as 129 perguntas e respostas do Catecismo de Heidelberg são divididas em 52 Dias do Senhor. Além de tornar mais fácil pregar a partir do Catecismo (um de seus propósitos originais), essa divisão também torna o Catecismo conveniente para as devoções familiares dominicais ou para a reflexão catequética pessoal semanal. As boas novas que quase esquecemos, Kevin DeYoung, Editora Cultura Cristã © A IGREJA DE JESUS CRISTO Vamos em frente, soldados de Cristo REVISTA PALAVRA VIVA – A IGREJA DE JESUS CRISTO Apoio didático – Lição 10e O FIM SUPREMO DO HOMEM Catecismo Maior de Westminster Pergunta 01: “Qual é o fim supremo e principal do homem? Resposta: “O fim supremo e principal do homem é glorificar a Deus( Rm 11.36; 1Co 10.31) e gozá-lo para sempre”( Sl 73. 24- 26; Jo 17. 22- 24). a) Glorificar a Deus: Sintética e esquematicamente, é o reconhecimento humano, mental e expressivo, da indiscutível e absoluta soberania do Criador, único merecedor da veneração e louvor da criatura. A glória devida ao supremo Senhor pode ser ativa e passiva: Ativa, aquela procedente da ação consciente, segundo a expressão da vontade do homem, e adquire significado lógico ou simbólico. O voltar-se deliberada e irrestritamente, em adoração, para o Senhor da vida, significa ato volitivo de: Glorificar (doxazo) a Deus, conferir-lhe a glória devida, honrá-lo, adorá-lo, exaltá-lo, cultuar-lhe o nome, submeter-se à sua autoridade, ser-lhe propriedade exclusiva, servi-lo incondicionalmente. Glorificação conscientemente ativa, quando a inteligência humana submete-se, serviçalmente, ao seu augusto Rei. Passiva, a estampada na natureza inanimada e animada. Toda criação Deus a formou para sua própria glória, conforme o curso natural do universo e a peculiaridade de cada coisa, de cada ser. Ao homem, porém, Deus o criou não somente para ser-lhe glória estética passiva, mas, e principalmente, expressar-lhe honra e adoração racionais. Tal liturgia existencial emana de sua condição de “imago Dei” e de sua capacitação para receber, reter e externar conhecimentos revelados. Para glorificá-lo intelectiva e espiritualmente, o Criador o fez à sua semelhança. A posição privilegiada do homem, criatura extremamente exaltada por Deus, ressalta-se com nitidez no conjunto geral dos seres criados. As Escrituras pintam o quadro do mundo recémcriado assim: Paisagem de fundo e moldura: a natureza física e biológica. No meio, em cores mais vivas e exuberantes: o Jardim do Éden com plantas ornamentais e frutíferas, animais domésticos e selvagens. No centro do jardim, ressaltado, evidenciado e honrado, o homem, figura eminente, proeminente, racional, emocional e espiritual; em si mesmo, clímax da criação, e por si, glória maior do Criador. Tudo Deus fez, especialmente o homem, para sua própria glória. Podemos, pois, sustentar que “o fim principal de toda criação é glorificar a Deus e louvá-lo para sempre”: “Os céus proclamam a glória de Deus e o firmamento anuncia as obras das suas mãos”(Sl 19.1). Para o homem, o louvor a Deus, além de ser um requisito natural, é um dom da graça e um privilegiado dever. b) “Gozá-lo para sempre”: Eterna comunhão da criatura com o Criador, a condição permanente do filho na companhia de seu Pai, no estado em que foi criado e sob constante zelo, proteção e direção paternos. A queda desfez o gozo da filiação divina, acabou com a felicidade do lar original, onde a unidade prevalente era: Deus- © A IGREJA DE JESUS CRISTO Vamos em frente, soldados de Cristo Marido-esposa-filhos. A salvação em Cristo, reconciliando o pecador com o Salvador, restaura o homem à condição de filho de Deus, conferindo-lhe paternidade divina, dando-lhe uma santa e gozosa fraternidade na casa do Pai: relativamente aqui e absolutamente na eternidade. Esquecer não se deve que o homem é um ser muito complexo: composto do material e do espiritual; do irracional e do racional; do cognitivo e do instintivo; do transitório e do eterno; do destinado ao pó e do ordenado aos céus. Com a queda, um elemento perturbador, o pecado, entrou na natureza humana, complicando ainda mais o que já era muito complicado. Agora podemos dizer, referindo-nos ao salvo em Cristo, que o homem é, simultaneamente, santo e pecador: santo por justificação e pecador por natureza. Espiritual e psicologicamente o homem oscila hoje, a partir de si mesmo, entre Deus e o ego; entre o ego e o tu(pessoa íntima, interativa); entre o ego e o outro(pessoa menos íntima). A centralização em Deus fica-lhe extremamente difícil; somente a graça restaura-lhe a comunhão com Deus. DE IMAGEM DE DEUS À IMAGEM DE SI MESMO O homem, segundo as Escrituras, veio à existência trazido pelas mãos de Deus para ser instrumento da vontade do Criador, servi-lo e cultuá-lo com todas as suas forças e potencialidades: inteligência, razão, memória, dons, criatividade, produtividade, liderança e espiritualidade. A autossuficiência, o egocentrismo e a egolatria são desvios decorrentes da queda. O tentador induziu o ser humano a deslocar o centro controlador de sua vida do Criador para a criatura. Sem a bússola divina a humanidade perdeu-se. Aquele que antes se voltava para o Senhor, voltou-se para si mesmo, ensimesmou-se, sensualizou-se, materializou-se, endeusou-se. Impotente, insuficiente, inábil e incapaz de gerir-se, torna-se vítima da malignidade pessoal e alheia, tem seu mecanismo de orientação danificado, desorienta-se, fica à deriva, angustia-se. Os sentidos, bases falsas de seus rumos vitais e comportamentais, dão-lhe imensas alegrias sensuais e lhe causam sofrimentos insuportáveis. GLORIFICAR A DEUS De Deus procede todo a benignidade, plena na semente original e rudimentar na humanidade reprovada. O Criador honrou e glorificou o homem( Sl 8), criando-o à sua imagem e semelhança( Gn 1.27), conferindo-lhe majestade e grandeza, dotandolhe incríveis poderes, todos, porém, limitados aos propósitos divinos. O pecado afasta a criatura de seu Criador e o conflita com o semelhante. Em Cristo, porém, os eleitos são regenerados e reconciliados com Deus. Agora, na pessoa do Filho, o Pai diz a cada redimido: “Tu és meu filho amado, tua vida me dá prazer”. Cada regenerado em Cristo torna-se uma glória para o Salvador e uma honra ao seu nome. Glorificar a Deus significa dedicar-lhe submissão, obediência, respeito, adoração e serviço, virtudes dos agraciados com a redenção. O servo de Cristo é perene glorificador de Deus. A harmonia consistente e permanente entre o Redentor e os redimidos é a forma mais viva e existencial de adoração e louvor. Quem pode dizer pelo Espírito: “Já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim”( Gl 2.20), este voltou a ser imagem e semelhança de Deus, entrou no gozo eterno de seu Senhor. © A IGREJA DE JESUS CRISTO Vamos em frente, soldados de Cristo GOZÁ-LO PARA SEMPRE Receber as bênçãos de Deus e ser-lhe bênção é gozá-lo aqui, no tempo que se chama hoje, e na eternidade. Aquele em quem o Espírito habita experimenta o permanente gozo de estar em Cristo, servi-lo ativamente e alegrar-se nele incondicionalmente. Deus se compraz com os seus eleitos, aqueles que estão em seu Filho amado Jesus Cristo e o servem dia e noite. Cristo vive no gozo do Pai, à sua destra no trono da realeza trinitária; nós vivemos no do Filho, à sua direita, sob sua proteção, misericórdia e graça. A ideia subjacente à afirmação catecismal: “Glorificar a Deus e gozá-lo para sempre”, é a de um filho, na cultura patriarcal, que não abandona o seu pai, não quebra a unidade do clã, não aborrece e nem entristece a sua família, não procede como os dois filhos da parábola em que um abandona o pai, o mais novo, e outro menospreza o irmão. No sistema tribal, as realizações pessoais, paterna e filial, derivavam da interação consistente entre pai e filho; um, galardão do outro. Deus nos criou para vivermos com ele. O pecado nos separou. Cristo nos reconciliou. Somos agora, os reconciliados: um com o Filho como ele é um com o Pai. Voltamos, pois, pela mediação do Messias, ao gozo da comunhão com Deus na fraternidade dos santos. O crente verdadeiro, pois, glorifica a Deus e o goza para sempre. Não há poder capaz de arrancá-lo dos braços de Cristo. A glória de Deus foi vista na face de Moisés, no rosto de Cristo, nos semblante dos apóstolos; sentida no gemido dos mártires e no testemunho de todos os cristãos autênticos. O filho é a alegria do pai, que se vê na pessoa de seu herdeiro; cada filho, no entanto, deve honrar e dignificar o seu pai. Assim somos e assim devemos ser, como filhos, para o nosso Pai celeste. SANTIFICAÇÃO Pergunta 75: “Que é santificação? Resposta: Santificação é a obra da graça de Deus, pela qual os que Deus escolheu antes da fundação do mundo para serem santos, são, nesta vida, pela poderosa operação do Espírito Santo, aplicando-lhes a morte e a ressurreição de Cristo, renovados no homem interior, segundo a imagem de Deus( Ef 1.4; 1Co 6.11; 2Ts 2.13; Rm 6.4-6; Fp 3.10; Ef 4.23-24), tendo os germes do arrependimento que conduz à vida e de todas as outras graças salvadoras implantadas em seus corações(At 11.18; 1Jo 3), e tendo essas graças de tal forma excitadas, aumentadas e fortalecidas( Jd 20; Ef 3.1619; Cl 1.10-11), que eles morrem cada vez mais para o pecado e ressuscitam para novidade de vida( Rm 6.4,6,14)”. SANTIDADE DE DEUS Deus é santo nos seguintes absolutos atributivos, entre outros: 01- Bondade absoluta: na divindade não houve, não há e não haverá o mínimo sinal ou vestígio de maldade. O bem é a sua essência e seu objetivo; o bom é a marca de seus atos e de suas obras. Por causa de sua intrínseca bondade, a fidelidade, a honestidade e a sinceridade são lhe qualidades indissociáveis. A bondade divina é ilimitada: ele é © A IGREJA DE JESUS CRISTO Vamos em frente, soldados de Cristo benigno, paciente, tolerante e longânimo. 02- Moralidade absoluta: Deus é um ser moral; suas palavras, atos e obras são revestidos de profunda moralidade. Ele é o limite da perfeição. Contradições éticas não se verificam em Deus. Jesus Cristo, que revelou o Pai ao mundo, agiu sempre coerentemente com a dignidade de sua própria pessoa, normatizou seu comportamento segundo os parâmetros mandamentais das Escrituras: veracidade, obediência, amor incondicional a Deus e ao próximo. O Filho do Homem jamais foi pego em qualquer ilícito. Ninguém jamais o acusou de erros e pecados: foi realmente um cidadão terrestre e celeste sem mácula. Por ele se conclui que Deus, a quem revelou aos homens, é moralmente imaculado. 03- Deus é absolutamente outro. A distância entre o Criador e a criatura é imensurável. O universo de Deus não se identifica, por natureza e essência, com o do homem. Compreendendo a insignificância do ser humano e a magnificência divina, Isaías escreveu: “Porque os meus pensamentos não são os vossos pensamentos, nem os vossos caminhos os meus caminhos, diz o Senhor; porque, assim como os céus são mais altos do que a terra, assim são os meus caminhos mais altos que os vossos caminhos e os meus pensamentos mais altos do que os vossos pensamentos”(Is 55.8-9). O homem, na condição de criatura, é frágil e falível; sujeito à falência moral. Deus, no entanto, é inerrante, verdade no que é e verdadeiro no que fala e faz; nele não há mentira( Nm 23. 19; Hb 6. 18). Ele é santo em si mesmo. Santidade lhe é atributo real, essencial. Ele não peca nem pode pecar, por ser infenso ao pecado, inatacável pelo mal, estruturalmente incorruptível. O pecado entrou no céu, derrubou anjos, mas não atingiu a divindade em virtude de sua perfeição, santidade, imaculabilidade e inatacabilidade. Em suma: Deus é absoluta e incorrompivelmente santo. Santidade é um de seus atributos, que o faz completa e distintamente outro. SANTIDADE NO HOMEM O homem, frágil, corruptível, falível, torna-se, por natureza, maculável e efetivamente maculado. A santidade, não lhe sendo qualidade natural, não se lhe constitui fonte causal de incorruptibilidade. Nenhum ser humano pode ser chamado de “sua santidade”, pois somente torna-se “santo” pela misericórdia de Deus mediante a eleição e a vocação em Cristo Jesus. Embora separado e adotado como filho, ele continua sujeito a falhas morais e espirituais, isto é, pecador. O escolhido é santo no sentido de “separado para Deus” de entre os demais seres humanos. Santo, portanto, em se tratando do servo de Cristo, não significa estar puro moralmente, mas selecionado pelo Pai para pertencer ao Filho, que não veio chamar justos, mas pecadores ao arrependimento. A santificação do eleito tem origem exclusivamente na graça salvadora: Primeiro, na eleição da livre iniciativa de Deus. Segundo, na santidade do Criador e Redentor: “sede santos por eu sou Santo”. A santidade de Deus gera a santidade de seus “santos”, aqueles que estão vinculados a ele por intermédio de seu Filho. Terceiro, pela obra santificadora do Espírito Santo, agindo interna e externamente no crente por decisão do Pai e ordenação do Filho. Os não eleitos poderão ter seus deuses, clamarem a eles, penitenciarem-se perante seus ícones, serem abstinentes sexuais e praticantes de rigorosos preceitos morais e, em nome da crença, exercerem extensiva e intensiva caridade, mas santos não serão, e muito menos santificados; pois santificação não é prática caritativa, não é © A IGREJA DE JESUS CRISTO Vamos em frente, soldados de Cristo fé iconólatra, não é exercício extático ou dom extra- sensório. Santificação é a interação cada vez mais intensa entre Salvador e salvo, entre o membro e a comunidade dos eleitos, obra da graça por meio do Espírito Santo, sistemática e contínua conscientização do regenerado de seu novo estado em Cristo Jesus, de seus compromissos com Deus, de seu dever inalienável de servo de Cristo, de sua gratidão progressiva, expressa na adoração ao seu Salvador, de sua necessidade, como criatura, de submissão ao Criador e prostração diante da Majestade divina, de sua obrigação impostergável de testemunhar Jesus Cristo e anunciar o Evangelho redentor. Sem reconciliação com Deus não há santificação; e o mesmo Deus que reconcilia, santifica: a geração, a regeneração e o crescimento são obras da graça de Deus. Ser santo, pois, é ser tomado por Cristo da bastardia absoluta e transformado em filho de Deus, coerdeiro de Cristo. Santo e santificar-se são decorrências da eleição e consequências da inserção na comunhão dos redimidos, produzindo a harmonização interna e a harmonia externa com o irmãos, Sendo assim, conclui-se que santificação inexiste fora do corpo de Cristo, não sendo jamais um meio de salvação ou de ingresso na comunhão dos santos. Não se santifica para salvar-se; O salvo santifica-se por ser regenerado. Catecismo Maior de Westminster, Comentado por Onézio Figueiredo Fonte: http://migre.me/eKpKj © A IGREJA DE JESUS CRISTO Vamos em frente, soldados de Cristo