TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
LICENCIATURA EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS
CAMILA VITORINO DOS SANTOS
CORRELAÇÃO ENTRE EXPOSIÇÃO A PESTICIDA E
O DESENVOLVIMENTO DA LEUCEMIA LINFOCÍTICA
AGUDA INFANTIL (LLA)
São Paulo – SP
2013
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
LICENCIATURA EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS
CAMILA VITORINO DOS SANTOS
CORRELAÇÃO ENTRE EXPOSIÇÃO A PESTICIDA E
O DESENVOLVIMENTO DA LEUCEMIA LINFOCÍTICA
AGUDA INFANTIL (LLA)
Trabalho de Conclusão de Curso
apresentado ao Curso de Licenciatura
em Ciências Biológicas do Instituto
Federal de Educação Ciência e
Tecnologia, Campus São Paulo como
um dos requisitos à obtenção do título
de Licenciado em Ciências Biológicas
Orientador: Profa. Ma. Renata Duarte de Souza Rodrigues
São Paulo – SP
2013
BANCA DE AVALIAÇÃO
____________________________________________
Orientador
Profa. Ma. Renata Duarte de Souza Rodrigues
IFSP/CCT/BIO
____________________________________________
Membro Titular Externo
Profa. Dra. Fernanda Alves Cangerana Pereira
FATEC/GESTÃO AMBIENTAL
____________________________________________
Membro Titular Interno
Prof. Me. Flávio krzyzanowski Junior
IFSP/CCT/BIO
____________________________________________
Suplente Externo
Profa. Dra. Maria Cristina Pires de Brum
PMSP/ Ensino Fundamental II/Ciências
____________________________________________
Suplente Interno
Prof. Dr. Marcos Emerson Junqueira
IFSP/CCT/BIO
São Paulo, 29 de maio de 2013.
A minha mãe que me ensinou a
sempre agir de maneira correta para
conquistar qualquer objetivo, por ser
minha base e transmitir força. Amo
Você.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus, por estar presente em minha vida.
À Profª Ma. Renata Duarte de Souza Rodrigues, pela orientação,
conhecimentos transmitidos, aprendizado, comprometimento, incentivo, paciência e
confiança depositada em mim, principalmente nos momentos mais difíceis durante o
desenvolvimento deste trabalho.
À Profª Drª Fernanda Alves Cangerana Pereira pela oportunidade de
conhecer e realizar o trabalho nessa área de pesquisa, pela transmissão de sábios
conhecimentos e por me incentivar e mostrar que sou capaz de aprender e
prosseguir.
Ao Profº Me. Flávio krzyzanowski Junior pela participação na banca, e pelos
ensinamentos transmitidos e incentivos.
Ao Profº Me. José Otávio Baldinato pelas informações, dicas, e suas
sugestões enriquecedoras fundamentais para construção deste trabalho.
A toda minha família, em especial a minha mãe Maria Vitorino, tia Maria
José, irmã Beatriz e meus padrinhos pelo amor, apoio, incentivo, ajuda e
principalmente a transmissão de pensamentos positivos e força durante todo o
trajeto desta caminhada.
Aos meus amigos Camila Henrique, Daiane Souza, Flávia Ribeiro, Jeferson
Martins, Thayná Moura e Paloma Vieira que estiveram presentes nesse período,
agradeço pelo apoio incondicional, força, incentivo, compreensão em todos os
momentos, muito obrigado pela amizade dentro e fora do IF-SP.
Em especial as minhas amigas Ana Claudia, Claudia Ribeiro e Elaine
Cristina que mesmo distantes sempre me transmite força, carinho, atenção, ajuda,
obrigado pelos anos de amizade e por estarem sempre presente em minha vida,
amo vocês.
A todos os professores do IF-SP e colegas de classe da turma Ciências
Biológicas que contribuíram com minha carreira acadêmica, assim como, pelas
horas de estudo, risadas, trabalhos, aprendizado e experiência vivenciada.
RESUMO
Atualmente, a Leucemia Linfocítica Aguda Infantil (LLA) configura-se como um
problema de saúde pública mundial. É o câncer que ocorre com maior frequência em
crianças e adolescentes menores de 15 anos, representando cerca de 30% das
doenças malignas pediátricas. Estudos relatam a existência de fatores ambientais
possivelmente relacionados com a etiologia da LLA, dentre os quais se encontra a
exposição a pesticidas, que são produtos químicos destinados à prevenção,
destruição ou controle de pragas. Deste modo, o presente estudo apresentou como
objetivo investigar, através de revisão de literatura, a possível correlação entre a
exposição aos pesticidas e o desenvolvimento da leucemia linfocítica aguda infantil
(LLA). Mediante pesquisa nos bancos de dados Medline, Pubmed, Dedalus, BVS,
Bibliomed, IARC/OMS no período de agosto a novembro de 2012, buscou encontrar
estudos publicados nos últimos 7 anos (2005-2011), que relacionassem exposições
aos pesticidas e a LLA. Foram encontrados 70 trabalhos sobre o tema geral de
leucemia e pesticidas. Destes, 59 foram selecionados, dos quais 9 discorriam sobre
a etiologia da LLA; 15 sobre a incidência; 7 eram referentes a classificação e 17
descreviam os pesticidas, sua classificação e seus principais grupos químicos.
Especificamente, 11 artigos relatavam uma associação positiva entre exposição a
pesticidas e o risco aumentado para o desenvolvimento de LLA. De acordo com os
resultados dos estudos epidemiológicos selecionados, a maioria foram do tipo casocontrole e conduzidos nos EUA. Esses estudos indicaram um aumento no risco para
a LLA, com odds ratio (OR) a partir de 2, para pesticidas domésticos pertencentes a
classe dos organofosforados e organoclorados. As fases críticas para a exposição
foram durante a gestação e na primeira infância. A partir dos estudos bibliográficos,
a exposição aos pesticidas foi associada positivamente com o risco para o
desenvolvimento da doença, sendo classificada como um dos principais fatores
ambientais relacionados à etiologia da LLA.
Palavras-chave: leucemia infantil, pesticida, exposição ambiental.
ABSTRACT
The Children's Acute Lymphocytic Leukemia (ALL) is configured as a public health
problem worldwide. It is cancer that occurs most frequently in children and
adolescents younger than 15 years, representing about 30% of pediatric
malignancies. Studies have reported the existence of environmental factors possibly
related to the etiology of ALL, among which is the exposure to pesticides, chemicals
that are intended to prevent, destroy or control pests. Thus, the present study aimed
to investigate through literature review, the possible correlation between exposure to
pesticides and the development of childhood acute lymphoblastic leukemia (ALL). By
searching in the databases Medline, Pubmed, Dedalus, VHL, Bibliomed, IARC/ WHO
in the period August to November 2012, sought to find studies published in the past 7
years (2005-2011), that correlated exposures to pesticides and LLA. We found 70
papers on the general theme of leukemia and pesticides. Of these, 59 were selected,
of which 9 discoursed on the etiology of ALL; 15 on the incidence, 7 were related to
classification and described the 17 pesticides, its classification and its main chemical
groups. Specifically, 11 articles reported a positive association between exposure to
pesticides and increased risk for the development of ALL. According to the results of
epidemiological studies selected, most were case-control, and conducted in the USA.
These studies have indicated an increased risk for ALL, with an odds ratio (OR) from
2 to household pesticides belonging to the class of organophosphates and
organochlorines. Critical phases for the exhibition were during pregnancy and early
childhood. From the bibliographical studies, exposure to pesticides was positively
associated with the risk for developing the disease, classified as one of the main
environmental factors related to the etiology of ALL.
Keywords: childhood leukemia, pesticide, environmental exposure.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1: Processo de hematopoiese normal . .......................................................... 16
Figura 2: Alteração na formação dos leucócitos . ..................................................... 18
Figura 3: Estrutura química dos piretróides . ............................................................. 26
Figura 4: Estrutura química dos organosfosforados ................................................. 27
Figura 5: Estrutura química dos organoclorados. ...................................................... 28
Figura 6: Resultados encontrados e utilizados no estudo ........................................ 30
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Alterações genéticas em leucemia linfocítica de precursor B.................... 20
Tabela 2: Incidência de leucemia infantil . ................................................................. 21
Tabela 3: Fatores de risco associados à LLA ........................................................... 22
Tabela 4: Classificação dos agrotóxicos .................................................................. 24
Tabela 5: Classificação toxicológica dos agrotóxicos ............................................... 25
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 12
2 REVISÃO DE LITERATURA ................................................................................. 15
2.1 CÂNCER ................................................................................................................ 15
2.2 LEUCEMIAS ........................................................................................................... 15
2.2.1 Hematopoiese ................................................................................................. 15
2.2.2 Classificação .................................................................................................. 18
2.2.3 Leucemia Linfocítica Aguda Infantil (LLA) ................................................... 19
2.2.4 Epidemiologia e Incidência da LLA .............................................................. 21
2.3 FATORES DE RISCO E LLA ....................................................................................... 22
2.3.1 Pesticidas........................................................................................................ 23
3 MATERIAL E MÉTODOS ...................................................................................... 28
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO .............................................................................. 30
5 CONCLUSÃO ........................................................................................................ 37
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 38
12
INTRODUÇÃO
Atualmente, o câncer é considerado como um dos principais problemas de
saúde pública mundiais, sendo responsável por cerca de 12% das causas de mortes
a cada ano (GUERRA; GALLO; MENDONÇA, 2005).
Os diferentes tipos de tumor podem ser classificados segundo sua origem
em: sarcomas, quando derivados do tecido conectivo ou de células musculares;
carcinomas, quando provenientes do tecido epitelial; e neoplasias hematopoiéticas e
linfóides. As leucemias diferem dos demais cânceres por serem derivadas das
células hematopoiéticas (ALBERTS et al., 2010).
Sabe-se que as leucemias compreendem um grupo heterogêneo de
doenças, apresentando-se de forma variável quanto ao tipo histológico, sexo, etnia,
localização primária do tumor e idade (INCA, 2008; COUTO et al., 2010; INCA,
2012).
A leucemia linfocítica aguda infantil (LLA) é o câncer que ocorre com maior
frequência em crianças e adolescentes menores de 15 anos. É uma neoplasia que
acomete o sistema hematopoiético, mais especificamente os leucócitos, resultando
na proliferação clonal de células imaturas por diferenciação anormal, substituindo as
células sanguíneas normais (COUTO et al., 2010). Nos países ocidentais, esta
doença representa cerca de 80% dos casos de leucemia em crianças, tendo uma
incidência anual de 30-40 casos por milhão (SOLDIN et al., 2009; BAILEY et al.,
2010; TURNER; WIGLE; KREWSKI, 2010).
A LLA ainda apresenta etiologia pouco conhecida, porém acredita-se que os
fatores
genéticos
e
ambientais
desempenhem
um
papel
importante
no
desenvolvimento da doença (BAILEY et al., 2010).
Os primeiros sinais e sintomas da LLA estão relacionados à anemia,
neutropenia e trompocitopenia ou presença de infiltração leucêmica extra-medular.
Os principais locais detectados clinicamente são linfonodos, baço, fígado, sistema
nervoso central (SNC) e pele (BRUNNING et al., 2001; FARIAS, 2010).
Diversos estudos relatam a existência de fatores que possivelmente estão
relacionados com a etiologia das leucemias na infância, tais como: fumaça do
cigarro; consumo do álcool e drogas durante na gravidez; crianças portadoras de
Síndrome de Down; Síndrome de Bloom; Anemia de Fanconi; infecções; alto peso
13
ao nascer, como por exemplo, superior a 4 kg; exposição à radiação ionizante;
hidrocarbonetos e pesticidas, principalmente os de uso doméstico (SOLDIN et al.,
2009; FERREIRA 2010; TURNER; WIGLE; KREWSKI, 2010).
O termo agrotóxico, também conhecido popularmente como pesticida,
venenos, defensivos e remédios, são utilizados para produtos químicos ou mistura
de substâncias destinadas à prevenção ou destruição direta e indireta ou controle de
quaisquer pragas prejudiciais na produção, elaboração, armazenagem, transporte ou
comercialização de alimentos (FERREIRA, 2010; INCA, 2010).
Esses produtos são amplamente utilizados na agricultura, na pecuária, no
tratamento de madeira, no armazenamento de grãos e sementes, na produção de
flores, no combate a piolhos e outros parasitas no homem e como agentes de
controle de vetores nos programas de saúde pública (BRASIL, 1997; INCA, 2010).
Os efeitos nocivos dos pesticidas ao meio ambiente e a saúde humana,
variam de acordo com sua composição, assim como sua toxicidade. Muitos podem
se acumular no ar, água e solo permanecendo por um longo período e causando
intoxicações agudas, subagudas e crônicas em humanos. Desse modo, o uso
dessas substâncias deve ser corretamente orientado pelos órgãos nacionais e
internacionais, respeitando a legislação vigente e a saúde de todos os consumidores
(DAMS, 2006; INCA, 2010).
De acordo com estudos recentes, há uma possível correlação entre
exposições aos pesticidas e o desenvolvimento da LLA (RUDANT; CLAVEL;
RIVARD, 2009; RULL et al., 2009; WARD et al., 2009; WIGLE; TURNER; KREWSKI,
2009; BAILEY et al., 2010; TURNER; WIGLE; KREWSKI, 2010; VINSON et al.,
2011). Esses estudos indicam que as exposições podem ser um fator de risco
elevado para as crianças, pois estas são mais vulneráveis que os adultos,
principalmente no período da gestação e na primeira infância.
A vulnerabilidade e os tipos de exposições das crianças às substâncias
químicas são decorrentes de suas características fisiológicas. Estas ingerem maior
quantidade de água, alimentos e ar do que o adulto e, desta forma, tem maior
probabilidade de absorver os pesticidas presentes no ar, solo, água e alimentos
(MELLO-DA-SILVA; FRUCHTENGARTEN, 2005).
O Brasil está no ranking dos dez principais países consumidores de
agrotóxicos (INCA, 2010). Segundo Sistema Nacional de Informações TóxicoFarmacológicas (SINITOX) vinculada à Fundação Oswaldo cruz (FIOCRUZ), no país
14
foram registrados, no primeiro trimestre de 2010, um total de 90.064 casos de
intoxicação humana por agente tóxico, sendo 5.463 casos de agrotóxico de uso
agrícola, o equivalente a 5,29% e 2.213 casos de uso doméstico com 2,14%
(FIOCRUZ, 2010). Com relação aos tipos de intoxicações, no Brasil as agudas são
mais
frequentes,
sendo
a
maioria
dos
casos
por
inseticidas
(73%
de
organofosforados, piretróides e carbamatos), raticidas (15,3%) e herbicidas (9,7%)
(OGA, 2003).
Assim, percebe-se a relevância do tema para a saúde pública e justifica-se a
importância da realização de mais estudos como o presente, que objetiva investigar,
através de revisão de literatura, a relação entre a exposição aos pesticidas e o
desenvolvimento da leucemia linfocítica aguda infantil (LLA), bem como definir o
grau e a natureza dessa associação.
15
2 REVISÃO DE LITERATURA
2.1 CÂNCER
A palavra câncer vem do grego karkínos, que quer dizer caranguejo e foi
utilizada pela primeira vez por Hipócrates, o pai da medicina que viveu entre 460 e
337 a.C (INCA, 2010).
Atualmente, os termos câncer ou neoplasia são atribuídos a um conjunto de
doenças que apresentam como principais características: a elevada atividade celular
proliferativa que desobedece aos limites normais da divisão celular; e a capacidade
de invasão e colonização de regiões normalmente formadas por outras células,
processo denominado metástase (PINHO, 2005; ALBERTS et al., 2010).
2.2 LEUCEMIAS
As leucemias são caracterizadas como doenças malignas dos glóbulos
brancos do sangue, os chamados leucócitos, os quais apresentam um descontrole
nos mecanismos fisiológicos de proliferação e maturação celular, decorrentes de
uma ou mais mutações. Em geral, possuem origem desconhecida e têm como
principal característica o acúmulo de células jovens anormais na medula óssea, os
blastos, que substituem as células sanguíneas normais (FERREIRA, 2010;
ALBERTS et al., 2010).
Porém, para compreender como ocorre esse processo proliferativo anormal,
torna-se necessário definir primeiramente o processo fisiológico, conhecido como
hematopoeise.
2.2.1 Hematopoiese
A hematopoeise também denominada hematopoese e hemopoese, é um
processo contínuo responsável pela formação, desenvolvimento e maturação das
células sanguíneas (leucócitos, eritrócitos e plaquetas), encontradas na medula
óssea vermelha, conforme apresenta a Figura 1 (CARVALHO, 2008; PERINI; SILLA;
ANDRADE, 2008; FERREIRA, 2010).
16
Figura 1: Processo de hematopoiese normal- Fonte Adaptado: HITZLER, J. K; ZIPURSKY, A., 2005.
p.14.
O sistema hematopoiético inicia-se com um precursor celular comum
indiferenciado conhecido como célula-tronco hematopoiética (CTH) pluripotente ou
HSCs (Hematopoietic Stem Cells) ou unidade formadora de colônias (UFC), a qual
possui como características a capacidade de auto-renovação e de diferenciação em
células progenitoras multipotentes com linhagens específicas, responsáveis pela
manutenção e proteção do organismo (CARVALHO, 2008; PERINI; SILLA;
ANDRADE, 2008).
Em um processo de hematopoiese normal é necessário que a célula-tronco
hematopoiética pluripotente seja estimulada por uma proteína-sinal específica ou por
células que produzem essas proteínas. Estas proteínas são conhecidas como
citocinas e fatores de crescimento, ambos secretados pelas células presentes no
estroma da medula óssea e responsáveis por regular a proliferação, diferenciação e
17
a apoptose de células imaturas, assim como a atividade funcional de células
maduras (ABBAS; LICHTMAN; PILLAI, 2008; ALBERTS et al., 2010; JUNQUEIRA;
CARNEIRO, 2011).
Em
seguida,
aparecem
as
células
progenitoras
multipotentes
que
apresentam grande capacidade mitótica e são responsáveis pelas características
morfológicas
das
linhagens
específicas
das
células
sanguíneas
maduras
(JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2011).
Existem dois tipos principais de células progenitoras multipotentes, as
mielóides e as linfóides. As primeiras originam principalmente as células precursoras
das linhagens mielóide, eritróide, megacariócito e monócito; enquanto as segundas
originam as células precursoras dos linfócitos (CARVALHO, 2008; PERINI; SILLA;
ANDRADE, 2008; JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2011).
Além das citocinas e dos fatores de crescimento citados acima, as células
hematopoiéticas também precisam ser estimuladas por sinais extracelulares
conhecidos como mitógenos. Estes não estimulam apenas a proliferação, mas
também atuam na diferenciação, migração e sobrevivência celular, bem como, na
resposta imune, aumentando substancialmente a produção de novos tipos celulares
individuais (ABBAS; LICHTMAN; PILLAI, 2008; CARVALHO, 2008; PERINI; SILLA;
ANDRADE, 2008; ALBERTS et al., 2010).
Assim, interações anormais que ocorram durante a hematopoese e no
controle de proliferação, diferenciação e maturação das células podem ocasionar as
leucemias (DREYFUSS; OLIVEIRA, 2008). Nessa condição patológica, o organismo
torna-se incapaz de reparar uma mutação. A célula alterada, chamada blasto,
começa a multiplicar-se desordenadamente, provocando uma proliferação celular
inadequada e com ausência de apoptose, resultando no processo de mostrado na
Figura 2 (SOLDIN et al., 2009; FERREIRA, 2010).
Uma vez formadas, as células leucêmicas chegam ao sangue e podem
facilmente infiltrar-se nos órgãos linfoides periféricos (ALBERTS et al., 2010).
18
Figura 2: Alteração na formação dos leucócitos resultando em células indiferenciadas. Fonte:
Adaptada de: JUNQUEIRA, L. C; J. CARNEIRO, 2011. p. 238.
2.2.2 Classificação
As leucemias são classificadas nos seguintes grupos de acordo com o tipo
celular envolvido e o grau de maturação celular em: Leucemia Linfóide ou Mielóide
Aguda (LLA ou LMA) e Leucemia Linfóide ou Mielóide Crônica (LLC ou LMC). As
primeiras apresentam células indiferenciadas e as segundas, células diferenciadas,
respectivamente (MINASI, 2009; FERREIRA, 2010).
Essa classificação está baseada em dois critérios estabelecidos pelo grupo
French-American-British
(FAB)
e
pelo
World
Health
Organization
(WHO)
(BRUNNING et al., 2001).
O grupo FAB baseia-se na morfologia e na imunofenotipagem das células B,
19
T e precursores ou citogenético (t[9;22], t[4;11]; t[1;19]; t[12;21]) das células
leucêmicas, o que está de acordo com os parâmetros do grupo European Group for
Immunophenotyping Leukaemia - EGIL (BRUNNING et al., 2001; QUIXABEIRA;
SADDI, 2008; PELISSARI, 2009; FERREIRA, 2010).
De acordo com a morfologia das células citadas acima, as leucemias agudas
são classificadas em L1, L2, L3. Para tanto, são utilizados como base quatro
variáveis observadas ao microscópio óptico: o diâmetro celular, a forma do núcleo, o
número e a protuberância dos nucléolos, a quantidade e aspecto do citoplasma
(MINASI, 2009; HAMID, 2011). Na classificação baseada em imunofenotipagem, as
células B são divididas em: pró-B, B precursora ou pré-B; Pré-B e B-maduro. Por
vez, as células de linhagem T são dividas em três grupos de acordo com seus níveis
de maturação: pré-T, intermediário e maduro (BRUNNING et al., 2001; MINASI,
2009; PELISSARI, 2009; FERREIRA, 2010).
Para a Organização Mundial de Saúde (World Health Organization- WHO), a
imunofenotipagem está associada à genética nos parâmetros clínicos, morfológicos
e citoquímicos utilizados pela classificação FAB. Em seu diagnóstico, considera a
quantidade de blastos sendo maior ou igual a 20% (BORTOLHEIRO, 2006) e divide
a LLA em dois grandes grupos, a saber: leucemia linfocítica aguda de precursor B e
leucemia linfocítica aguda de precursor T (BRUNNING et al., 2001; PELISSARI,
2009).
2.2.3 Leucemia Linfocítica Aguda Infantil (LLA)
A LLA é uma neoplasia que acomete principalmente a linhagem do precursor
das células B, sendo responsável por 80% dos casos de leucemia em crianças
menores de seis anos (BRUNNING et al., 2001).
O termo Leucemia Aguda na infância (IL) refere-se a um grupo de leucemias
caracterizadas pelo diagnóstico de LLA ou LMA, durante os primeiros anos de vida
da criança (EMERENCIANO; KOIFMAN; POMBO-DE-OlIVEIRA, 2007; FERREIRA,
2010).
A LLA é considerada uma doença heterogênea, caracterizada por diferentes
anormalidades genéticas com alterações estruturais, como por exemplo, mutações
pontuais, deleções, translocações e cromossômicas tais como hiperdiploidia e
20
haploidia (BRUNNING et al., 2001; FERREIRA, 2010; TURNER; WIGLE; KREWSKI,
2010).
As principais anormalidades genéticas associadas com os precursores B da
LLA estão distribuídas da seguinte maneira: hiperdiploidia < 50, hiperdiploidia > 50,
hipodiploidia, translocações e pseudodiploidia (BRUNNING et al., 2001).
Estas anormalidades citogenéticas são fundamentais e usadas no
prognóstico em geral, pois a detecção das alterações gênicas possibilita à conduta
terapêutica
adequada
a
criança,
o
que
está
relacionado
na
Tabela
1
(HAMERSCHLAK, 2008).
Tabela 1: Alterações genéticas em leucemia linfocítica de precursor B.
Subtipo
t (9;22) (q34;q11.2)
Alteração Genética
BCR/ABL
Frequência
3-4%
Prognóstico
Desfavorável
t (4;11) (q21;q23)
AF4/MLL
2-3%
Desfavorável
t (1;19) (q23;p13.3)
PBX/E2A
6% (25% de pré-B-LLA) Desfavorável
t (12;21)(p13;q22)
TEL/AML1
16-29%
Favorável
Hiperdiploidia > 50
20-25%
Favorável
Hipodiploidia
5%
Desfavorável
Fonte: BRUNNING et al., 2001. p.113.
Na LLA, os fatores como hiperdiploidia > 50 e a translocação (12;21) estão
associados ao bom prognóstico e são as alterações cromossômicas mais relevantes
correspondendo 25% dos casos (MESQUITA, 2009; FERREIRA, 2010).
A hiperdiploidia > 50 consiste na anormalidade cromossomal numérica com
n=51 a 65 cromossomos que é determinado pelo estudo cariotípico ou pela análise
de conteúdo de DNA por citometria de fluxo. Aproximadamente 85% das crianças
portadoras
desse
tipo
de
ploidia
podem
ser
curadas
com
tratamentos
quimioterápicos (EMERENCIANO, 2006; MINASI, 2009; FERREIRA, 2010).
A translocação cromossômica t(12;21)(p13;q2) é resultante da fusão entre
os genes TEL no cromossomo 12 e AML1 no cromossomo 21, promovendo o
rearranjo
TEL/AML1
mais
frequente
na
LLA
(BRUNNING
et
al.,
2001;
EMERENCIANO; KOIFMAN; POMBO-DE-OLIVEIRA, 2007; MINASI, 2009; FARIAS,
2010). A translocação está associada com baixa contagem de leucócitos e há
evidências de que TEL/AML1 ocorre durante o período de pré-natal decorrente de
uma mutação. (EMERENCIANO, 2006; EMERENCIANO; KOIFMAN; POMBO-DEOLIVEIRA, 2007; MESQUITA 2009; FARIAS, 2010).
21
2.2.4 Epidemiologia e Incidência da LLA
Nos países desenvolvidos e em desenvolvimento, a LLA é o câncer infantil
mais comumente diagnosticado em crianças menores de 15 anos, correspondendo a
cerca de 80% dos casos e representando 30% de todas as neoplasias (SALLAN,
2006; WARD et al., 2009; WIGLE; TURNER; KREWSKI, 2009; BAILEY et al., 2010;
TURNER; WIGLE; KREWSKI, 2010).
A incidência da LLA é mais elevada entre crianças de 0 a 4 anos de idade,
de etnia branca e do sexo masculino (BRUNNING et al., 2001; BAILEY et al., 2009;
TURNER; WIGLE; KREWSKI, 2010).
Nos Estados Unidos, a taxa de incidência da LLA na infância é de 3 a 4
novos casos a cada ano por 100.000 crianças menores de 15 anos, com pico de
incidência por volta de 2-5 anos de idade (BELSON; KINGSLEY; HOLMES, 2007).
Na Inglaterra, anualmente são diagnosticados cerca de 400 novos casos de
LLA e o número de óbitos chega a 100 (SHAH; COLEMAN, 2007).
Na França, a incidência anual de LLA alcança 43,1 casos por milhão
(RUNDANT et al., 2007; SOLDIN et al., 2009).
No Brasil, as estimativas publicadas pelo INCA para o ano de 2012 relatam
que as leucemias atingiram 4.540 homens e 3.940 mulheres (INCA, 2008; MINASI,
2009; INCA, 2011). A Tabela 2 mostra a incidência de LLA em diferentes países por
milhão.
Tabela 2: Incidência de leucemia infantil em países desenvolvidos e em desenvolvimento.
Registro
Linfomas
Casos totais
Leucemia
Casos
diagnosticados
LLA
42,8
Dinamarca (1983-1991)
11,8
53
Austrália (1982-1991)
13,3
49,9
39,9
Suécia (1983-1989)
12,9
48,7
40,1
Inglaterra (1981-1990)
11,2
40,8
32,8
Japão (1980-1992)
10,6
38,5
22,6
Bulgaria (1980-1989)
18,4
33,2
18,5
11
25,4
16,0
27,1
8,3
2,6
Índia Mombaim (1980-1992)
Ibadan Nigéria
Fonte: Adaptado de: EDEN, 2010. p. 287.
22
A incidência apresentada nos diferentes países está relacionada com
inúmeros fatores como: individuais (sexo, etnia, fatores socioeconômicos, idade);
tumor (extensão, local primário, morfologia e biologia) e sistema de saúde
(rastreamento, registro de câncer de base populacional, facilidade de diagnóstico e
tratamento, qualidade do tratamento e acompanhamento). Essas informações são
fundamentais e podem influenciar no registro e prognóstico da LLA (INCA, 2008;
EDEN, 2010; INCA, 2010).
2.3 FATORES DE RISCO E LLA
A patogênese da LLA parece envolver alguns fatores ambientais e
genéticos, como mostrado na Tabela 3 (BELSON; KINGSLEY; HOLMES, 2007;
BAILEY et al., 2009; FERREIRA, 2010; TURNER; WIGLE; KREWSKI, 2010).
Alguns destes fatores estão mais estabelecidos, como por exemplo, a
predisposição genética que ocorre na síndrome de Down (WIGLE; TURNER;
KREWSKI, 2009; EDEN, 2010; TURNER; WIGLE; KREWSKI, 2010; VINSON et al.,
2011) e para o desenvolvimento da anemia Fanconi, exposição a radiação
eletromagnética, ionizante, assim como, exposição ocupacionais a agentes químicos
benzeno e pesticidas (MINASI, 2009; INCA, 2010).
Tabela 3: Fatores de risco associados à LLA
Fatores Ambientais
Radioterapia
Exposições Nucleares
Exposição intra-uterina à radiação
Uso de drogas inibidoras da topoisomerase II
Exposições a hidrocarbonetos: benzeno
Pesticidas
Consumo de álcool, cigarros e drogas
durante a gestação.
Fatores Genéticos/ Familiar
Gêmeo de paciente com LLA
Irmão de paciente com LLA
Anemia Fanconi
Neurofibromatose
Síndrome de Down
Síndrome de Bloon
Síndrome Schwachman
Síndrome de Noonan
Síndrome de Willis e Lindal
Fonte: Adaptado de BELSON; KINGSLEY; HOLMES (2007. p. 139-141) e MINASI (2009. p. 3-4).
Entre os fatores ambientais, os pesticidas podem provocar alterações
celulares e moleculares, tais como, aberrações cromossômicas, estresse oxidativo,
alterações de sinalização celular ou mutações, afetando as células hematopoiéticas
(VINSON et al., 2011).
23
2.3.1 Pesticidas
Pesticida é nome popular de agrotóxico, que abrange um grupo heterogêneo
de produtos químicos desenvolvidos para combater uma variedade de pragas
indesejáveis, como também para controlar o crescimento da vegetação (MILIGI et
al., 2006; METAYER; BUFFLER, 2008; INCA, 2010).
Historicamente, o uso de pesticidas data de aproximadamente 500 a.C.,
tendo sido primeiramente utilizado o enxofre. Porém, sua utilização na agricultura
como agrotóxico teve início em 1920, época em que pouco se conhecia sobre sua
toxicidade (FERREIRA, 2010; INCA, 2010).
Em 1939, o suíço Paul Muller descobriu o primeiro pesticida moderno o
dicloro-difenil-tricloroetano (DDT) que seria utilizado em escala mundial. Surgiram
também os inseticidas organofosforados, os herbicidas fenóis, os carbamatos e os
organoclorados (MILIGI et al., 2006).
Após a Segunda Guerra Mundial e com a explosão demográfica da
população, o crescimento da demanda por alimentos aumentou, resultando na
intensificação da cultura em terras mais férteis e na expansão dessas fronteiras
agrícolas com o objetivo de aumentar e melhorar a produtividade e elevar a
eficiência econômica (BRITO; GOMIDE; CÂMARA, 2006; LOPES et al., 2011). Com
isso, a utilização de pesticidas de diferentes classes se tornou necessária, sendo a
principal estratégia de combate e prevenção às pragas no setor agropecuário
(COUTINHO et al., 2005).
Quanto à classificação, os pesticidas são divididos de acordo com o grupo
químico ao qual pertencem e o tipo de ação (natureza da praga controlada), como
mostra a Tabela 4 (COUTINHO et al., 2005; MILIGI et al., 2006; INCA, 2010).
Segundo a Fundação Nacional de Saúde (FUNASA), esta forma de
classificar os agrotóxicos é importante para o diagnóstico das intoxicações e para a
adoção de tratamento específico (INCA, 2010).
24
Tabela 4: Classificação dos agrotóxicos quanto a sua ação e o grupo químico.
Tipo de Ação (Classe)
Inseticidas
(Controle de insetos, larvas e
formigas)
Grupos químicos
Organofosforados
Carbamatos
Piretróides sintéticos
Produtos/substâncias
Azodrin, Malathion, Parathion.
Furadan, Carbaryl, Lannate
Decis, Piredram, Karate.
Fungicidas
(Combate de fungos)
Ditiocarbamatos
Organoestânicos
Maneb, Mancozeb, Dithane.
Brestan, Hokko Suzu.
Dicarboximidas
Bipiridílios
Glicina substituída
Derivados do ácido
fenoxiacético.
Dinitrofenóis
Triazina
Orthocide, Captan.
Paraquat, Reglone, Diquat.
Roundup, Glifosato, Direct
Tordon, 2,4-D, 2,4,5-T1
Herbicidas
(Combate a erva daninha)
Bromofenoxim,Dinoseb,DNOC.
Stopper, Sinerge, Ametron.
1
A mistura de 2,4-D com 2,4,5-T representa o principal componente do agente laranja, utilizado como
desfolhante na Guerra do Vietnã. Fonte: Adaptado de INCA, 2010.
Além das classes apresentadas na tabela acima, existem outras
importantes como os raticidas, acaricidas, nematicidas e molusquicidas (DAMS,
2006; INCA, 2010).
Muitos agrotóxicos apresentam mais de um tipo de ação, por exemplo, o
inseticida organofosforado “Parathion” é usado também como acaricida e o
carbamato “Furadan”, também utilizado no combate contra nematoides (INCA,
2010).
Devido a sua alta estabilidade química, persistência, bioacumulação por
longos períodos no meio ambiente, e no tecido adiposo humano, desencadeando
efeitos nocivos à saúde, certos pesticidas foram proibidos nos países desenvolvidos
e em desenvolvimento há mais de trinta anos. Dentre estes se encontra o DDT, o
clordano e os bifenilos policlorados (PCBs), pertencentes ao grupo dos
organoclorados (METAYER; BUFFLER, 2008; WARD et al., 2009; FREGUGLIA;
MOURA-ANDRADE; TORNISIELO, 2010).
No Brasil, a portaria nº 329 de 02 de setembro de 1985 proibiu em todo
território nacional, a comercialização, o uso e a distribuição dos produtos agrotóxicos
organoclorados destinados à agropecuária, sendo revogada, pela portaria nº 424 de
07 de novembro de 1985, a permissão de sua comercialização, uso e distribuição
apenas em caráter emergencial a critério da Secretaria Nacional de Defesa
Agropecuária do Ministério da Agricultura (BRASIL, 1985). Embora a proibição esteja
em vigor desde 1985, ainda são encontrados resíduos desses compostos em
diversos produtos (FREGUGLIA; MOURA-ANDRADE; TORNISIELO, 2010).
25
Por determinação legal, os agrotóxicos também são classificados quanto a
sua classe toxicológica apresentando em seu rótulo uma faixa colorida indicando
seu poder tóxico, aspecto importante e fundamental para o conhecimento dos efeitos
agudos para a saúde, como mostrado na Tabela 5. No Brasil, a classificação
toxicológica está a cargo da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA),
órgão de controle do Ministério da Saúde (BRASIL, 1997; ANVISA, 2011).
Tabela 5: Classificação toxicológica dos agrotóxicos
Classe
Classe I
Classe II
Classe III
Classe IV
Toxicidade
Extremamente tóxico
Altamente Tóxico
Medianamente Tóxico
Pouco Tóxico
Cor da faixa
Vermelha
Amarelo
Azul
Verde
DL 50 (mg/kg)
<5
5-50
50-500
50-5000
DL= Dose letal capaz de matar uma pessoa adulta. Fonte: Adaptado de: ANVISA (2011. p.10) e
SAVOY (2011. p.91).
A toxicidade dos agrotóxicos também está relacionada quanto à forma de
exposição que pode ser pela absorção através das vias digestiva, respiratória,
dérmica ou por contato ocular, podendo desenvolver intoxicação aguda, subaguda e
crônica (DAMS, 2006; INCA, 2010).
As intoxicações agudas e crônicas por pesticidas têm crescido nos últimos
anos. Essas intoxicações não são apenas um reflexo de uma relação simples entre o
produto e a pessoa exposta. Outros fatores participam de sua determinação como os
relacionados
às
características
químicas
e
toxicológicas
do
produto,
as
características do indivíduo exposto e as condições de exposição ou condições
gerais do trabalho (BRASIL, 1997).
Assim, os efeitos nocivos da exposição a pesticidas têm sido considerados
como uma das condições potencialmente associadas ao desenvolvimento do câncer,
por sua possível atuação como iniciador do tumor (METAYER; BUFFLER, 2008;
INCA, 2010). Dentre os grupos químicos classificados como possivelmente
cancerígenos pela Internacional Agency for Research on Cancer (IARC), estão
alguns tipos de inseticidas (organoclorados, organofosforados, carbamatos e
piretróides) e herbicidas (glifosato), utilizados na agricultura e no ambiente
doméstico. Essas substâncias são assim classificadas por serem capazes de
provocar
malformações
congênitas,
efeitos
neurológicos
e
imunológicos,
desencadeando o câncer (INCA, 2010; VINSON et al., 2011; CREMONESE et al.,
2012).
26
Os piretróides são populares porque são eficazes contra uma variedade de
pragas agrícolas e domésticas. Foram introduzidos no mercado na década de 1970
e pertence a uma classe de pesticidas de origem botânica, o piretro, que é extraído
das flores
de
espécies
crisântemo (OGA, 2003).
Chrysanthemum cinerariaefolium,
conhecida
como
A atividade biológica dos piretróides é dependente da
estrutura química (Figura 3) e configuração estérica (SILVERIO et al., 2012).
Figura 3: Estrutura química dos piretróides, Bifentrina e Permetrina. Fonte: SILVÉRIO et al., 2012.
p.2052.
A toxicidade dos piretróides está baseada na taxa de isômeros presentes,
podendo ser, pelo menos quatro isômeros, cada um com atividades biológicas
diferentes. Os isômeros cis demonstram uma toxicidade mais elevada em relação ao
trans e o carregador não polar aumenta a toxicidade de ambos isômeros (SANTOS;
AREAS; REYER, 2007). Seus efeitos nocivos à saúde relacionam-se as vias de
absorção, em grande parte oral e pequena quantidade por dérmica, apresentando
36% na absorção gástrica. (OGA, 2003; INCA, 2010).
Os inseticidas organofosforados contém, sem exceção, um átomo central de
fósforo pentavalente ao qual está ligada a um átomo de oxigênio ou enxofre
mediante ligação dupla, como mostrado na figura 4. São rapidamente hidrolisados,
tanto no meio ambiente, como nos meios biológicos, sendo altamente lipossolúveis
(OGA, 2003; COUTINHO et al., 2005).
27
Figura 4: Estrutura química do organosfosforado parathion. Fonte: ANVISA, 2012. p. 4.
Após
serem
absorvidos,
seus
produtos
de
biotransformação
são
rapidamente distribuídos por todos os tecidos do corpo através da corrente
sanguínea, principalmente no fígado e formam produtos menos tóxicos e mais
polares, que posteriormente são eliminados facilmente do organismo, principalmente
pela via renal (OGA, 2003; INCA, 2010).
Há relatos de que exposições a estas substâncias podem desencadear
mudanças na AchE, assim como, na atividade Bu-chE acarretando no acúmulo
excessivo desse neurotransmissor nas sinapses nervosas, levando a uma série de
efeitos graves como a estimulação descontrolada do sistema nervoso. Isso ocorre
porque esta enzima (AchE) não realiza a hidrólise da acetilcolina produzindo colina e
o ácido acético (OGA, 2003; RULL et al., 2009; INCA, 2010). Logo, supõe-se que
essas mudanças podem estar associadas com o desenvolvimento do tumor,
desempenhando um papel na proliferação e diferenciação das células leucêmicas
(RULL et al., 2009). Também alguns compostos organofosforados estão associados
com baixo peso e/ou mortalidade neonatal elevada, como as malformações
congênitas durante o período intra-uterino (OGA, 2003). Assim, os efeitos adversos
à saúde humana associada à exposição aos organofosforados estão relacionados
com
a
neurotoxicidade,
a
imunotoxicidade,
a
desregulação
endócrina,
carcinogênese e alterações no desenvolvimento da criança (ANVISA, 2012).
É
importante
ressaltar
que
alguns
produtos
organofosforados
são
classificados pela IARC, assim como, pela EPA (Environmental Protection Agency)
como possivelmente cancerígenos (INCA, 2010).
Já os inseticidas organoclorados são derivados do petróleo e apresentam-se
em estruturas cíclicas, conforme mostrado na figura 5. Têm volatilidade limitada,
entretanto as partículas suspensas no ar podem ser inaladas e/ou ingeridas ou
absorvidas (BRASIL, 1997; OGA, 2003).
28
Figura 5: Estrutura química dos inseticidas organoclorados.
Fonte: http://www.scielo.br/img/revistas/qn/v30n1/27f06.gif. Acesso em 25 mai. 2013.
Estes compostos químicos são pouco solúveis em água, mas bastante
solúveis em solventes orgânicos, o que os torna mais tóxicos e de apreciável
absorção cutânea. Também podem ser absorvidos pelo trato digestivo, respiratório e
pela pele. Foram amplamente utilizados na agricultura, assim como na saúde
pública, para o controle de vetores de doenças endêmicas, como a malária. Porém,
por apresentarem bioacumulação e persistência durante muitos anos no meio
ambiente e tecido adiposo, sua proibição em muitos países entrou em vigor a partir
de 1970 (BRASIL, 1997; OGA, 2003; INCA, 2010).
Dentre os tipos de inseticidas organoclorados (DDT, Clordano, metoxicloro)
os bifenilos policlorados (PCBs) também se tornaram comuns contaminantes
ambientais após a Segunda Guerra Mundial. Essas substâncias são consideradas
pela IARC como possivelmente carcinogênicas a saúde humana, ocasionando
perturbações no sistema imunológico, alterações sanguíneas e apresentando-se
como um grande fator de risco para o desenvolvimento da LLA (WARD et al., 2009).
3 MATERIAL E MÉTODOS
O presente estudo foi realizado através de revisão literatura no período de
agosto a novembro de 2012, com estudos científicos publicados nos últimos 7 anos
(2005-2011) que relatassem exposições a pesticidas e a LLA. Foi conduzido por
meio de pesquisa nas seguintes Bases de Dados:
- Lilacs: coordenada pela Bireme, possui estudos na área da Saúde
publicados desde 1982 nos países da América Latina e do Caribe. Disponível em:
29
http://bases.bireme.br;
- Medline: uma base de dados da literatura internacional da área médica e
biomédica. Possui trabalhos científicos de mais de 4000 revistas publicadas nos
Estados Unidos e em outros 70 países. Disponível em http://regional.bvsalud.org/
- Dedalus: banco de dados bibliográficos da Universidade de São PauloUSP. Apresenta informações sobre os acervos e registros das bibliotecas do
Sistema Integrado de Bibliotecas da USP (SIBi/USP);
- Scielo (Scientific Electronic Library Online): biblioteca digital disponível em
http://www.scielo.org/;
- Bibliomed: portal brasileiro que objetiva a informação, educação
desenvolvimento
da
tecnologia
em
saúde.
Disponível
em
http://www.bibliomed.com.br/;
-
BVS:
Biblioteca
Virtual
em
Saúde:
disponível
em
http://regional.bvsalud.org/;
Também foram consultadas as informações de monografias realizadas pela
IARC (International Agency for Research on Cancer), agência interdisciplinar
responsável por pesquisa na área do câncer. Disponível em http://www.iarc.fr.
Como critérios de busca para identificar estudos publicados em português
que relatassem uma possível associação dos pesticidas e a LLA, foram utilizados os
seguintes descritores: leucemia e pesticidas, leucemia linfoblástica, leucemia
linfoblástica aguda, leucemia linfoblástica aguda na infância. Para selecionar os
estudos publicados em inglês foram utilizadas as seguintes palavras-chave: leukemia
and pesticides, lymphoblastic leukemia, acute lymphoblastic leukemia, childhood acute
lymphoblastic leukemia.
Como critérios de inclusão foram adotados todos os artigos que analisaram
a possível correlação entre exposição à pesticidas e o desenvolvimento de LLA.
Como
critérios
de
exclusão
foram
desconsiderados
estudos
que
identificaram a exposição entre pesticidas em crianças com Síndrome de Down,
linfoma não-Hodgkin (LNH), LMA e outras neoplasias.
30
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Mediante pesquisa nas bases de dados citadas acima, foram encontrados
70 estudos sobre o tema geral leucemia e pesticidas. Destes, foram utilizados
apenas 59, os quais atendiam aos critérios de inclusão e exclusão, propostos para o
presente estudo, sendo 38 deles publicados em português e 21 publicados em
inglês.
Dos 59 artigos selecionados, 9 discorriam sobre a etiologia da LLA; 15
sobre a incidência da LLA no Brasil e em outros países do mundo; 7 relatavam a
classificação da LLA; e 17 descreviam os pesticidas, sua classificação e seus
principais grupos químicos. Especificamente em relação à exposição entre
pesticidas e LLA, foram encontrados 11 estudos realizados em diferentes países
como Austrália, Brasil, França e Estados Unidos, como mostrado na
Figura 6. Dentre esses 11 estudos, 7 eram epidemiológicos do tipo casocontrole e 4 de revisão de literatura.
38
21
Língua
Portuguesa
Língua
Inglesa
17
Pesticidas
15
70
59
Leucemia e
Pesticidas no
geral
Estudos
selecionados
Incidência
de LLA
11
Exposição a
pesticida e
LLA
9
7
Classificação
da LLA
Figura 6: Resultados encontrados e utilizados no estudo.
Etiologia
da LLA
31
De maneira geral, os recentes estudos epidemiológicos encontrados
demonstraram uma associação positiva entre a exposição a pesticida e neoplasias
hematopoiéticas em crianças, principalmente leucemias e linfomas (MENEGAUX et
al., 2006; POMBO-DE-OLIVEIRA; KOIFMAN, 2006; RUDANT et al., 2007).
Um estudo realizado na França, no período de 1995-1999, com 280 crianças
casos e 288 controles tinha como objetivo identificar a relação entre exposição a
pesticida do tipo residencial, de jardim e pediculose e a LLA. Assim, foi encontrada
uma associação positiva com uma razão de chance de OR=1,8 (1,2-2,8 a 95%Cl)
para o uso materno de inseticidas em casa durante a gravidez, bem como na
infância com OR=1,7 (1,1-2,4 a 95% Cl). Para o uso de inseticidas de jardim foi
encontrado OR=2,4 (1,3-4,3 a 95% Cl) e para o inseticida fungicida OR=2,5 (1,0-6,2
a 95% Cl) durante a infância. Também foi observado um risco aumentado para a
LLA quanto à utilização de inseticidas pediculose durante a gestação, apresentando
OR=2,0 (1,1-3,4 95% Cl) (MENEGAUX et al., 2006).
Segundo os autores do estudo, os resultados encontrados para a exposição
residencial foram consistentes com achados publicados anteriormente, mas quanto à
utilização de shampoos para tratamento de pediculose era necessária uma nova
investigação para elucidar a possível relação existente entre eles.
No Brasil, um estudo de caso-controle realizado no período de janeiro de
1999 a julho de 2005, investigou um total de 642 crianças das regiões nordeste,
sudeste, sul e do planalto central, com idades compreendidas entre 0 e 21 meses. O
objetivo desse trabalho foi associar fatores de risco ambientais, exposição materna
durante a gravidez e LLA. Diante das exposições ambientais analisadas, o uso de
pesticida doméstico foi associado positivamente durante a gestação com OR
ajustada=2,18 (1,53-2,13 a 95%CI) e o aumento do risco da LLA. De acordo com os
autores do estudo, os resultados não apontaram diferenças estatisticamente
significantes com relação às características demográficas brasileiras. Apenas
destacaram que a região que apresentou maior incidência de casos (57,32%) foi a
sudeste, onde a população tinha uma maior facilidade de acesso aos cuidados da
saúde. Também salientaram que a educação materna e a distribuição de renda
podiam refletir o ambiente social vivenciado pelos participantes, pela falta de
conhecimento sobre a exposição em geral e sobre os fatores de risco a saúde,
aumentando o risco para LLA nos descendentes
KOIFMAN, 2006).
(POMBO-DE-OLIVEIRA;
32
Outro estudo de casos-controle realizado na França no período de 20032004 teve como objetivo investigar o papel da exposição aos pesticidas na etiologia
de doenças hematopoiéticas na infância, sendo estas: leucemia, linfoma,
neuroblastoma e tumores cerebrais. Para tanto, foram selecionadas 646 crianças
portadoras de LLA (casos) e 1681 controles e feita à comparação do uso de
pesticidas domésticos entre mães de crianças portadoras de LLA e mães de
crianças com linfomas. Entre as primeiras, foi registrado o uso significativo de
pesticidas OR=2,2 (1,8-2,6 a 95% a CI) comparadas às segundas. Também foi
identificada uma associação significativa quanto à exposição materna aos pesticidas
durante a gravidez e o aumento do risco para LLA para: os inseticidas com OR=2,1
(1,7-2,5 a 95%CI), o uso de inseticida em animal de estimação com OR=2,0 (1,5-2,5
a 95%CI) e os herbicidas com OR=1,5 a (1,0-2,2 a 95%Cl), todos utilizados pela
mãe durante a gestação. Além disso, foi analisada a exposição paterna aos
pesticidas domésticos e associada positivamente com risco de LLA durante o prénatal com OR= 1,5 (1,2-1,8 a 95%Cl). Quanto ao local da residência dos pais (rural,
semi-rural, e urbano) no momento do diagnóstico da LLA, não foram observadas
diferenças significativas entre os casos avaliados e os controles, todos com OR= 1,1
(0,9-1,4 a 95%Cl). Assim, pelos resultados apresentados, a conclusão do estudo
mostrou que, independente do subtipo leucêmico, o uso de pesticida residencial
pelas mães pode ter um papel na etiologia da LLA e que a exposição pré-natal pode
ser uma janela de vulnerabilidade fetal (RUDANT et al., 2007).
Essa vulnerabilidade na idade fetal e também durante os primeiros anos de
vida
pode
ser
explicada
pelo
fato
desses
serem
períodos
cruciais
no
desenvolvimento da criança. No primeiro caso, alguns agentes químicos podem
cruzar com facilidade a barreira placentária ou mesmo interferir no desenvolvimento
de importantes sistemas corporais, como por exemplo, o nervoso e afetar
diretamente a diferenciação cortical, a migração neuronal, a sinaptogênese e a
mielinização (MELLO-DA-SILVA; FRUCHTENGARTEN; 2005). No segundo caso,
as vias de biotransformação e metabolismo do organismo da criança não estão
completamente desenvolvidos do nascimento até os primeiros meses. Isso pode
tornar a criança incapaz de metabolizar e excretar muitos agentes tóxicos por e, no
caso de uma exposição continuada ou crônica, estes podem ser acumulados em
órgãos ou tecidos, como ossos e células adiposas. Os efeitos decorrentes da
exposição crônica também podem aparecer de forma tardia, acarretando em danos
33
irreversíveis a criança, como o desenvolvimento de tumor ou paralisia (BRASIL,
1997; MELLO-DA-SILVA; FRUCHTENGARTEN, 2005).
Uma revisão sistemática baseada em estudos publicados durante os anos
de 1987-2007 identificou 12 estudos de caso-controle, que apresentaram estimativas
de risco sobre a exposição à pesticida residencial e leucemia infantil (METAYER;
BUFFLER, 2008). Destes 12 estudos epidemiológicos, 6 relataram uma associação
significativa entre o uso de inseticida doméstico ou de jardim e a LLA, com
estimativas de risco OR=1,5 a 2,5 durante as janelas de tempo pré-natal, gravidez e
infância, assim como, para o uso de herbicidas. Outros estudos baseados em um
pequeno número de crianças expostas ao pesticida específico para o combate de
moscas (mosquiticida), indicaram um risco aumentado de 3 a 4 vezes para a LLA.
Bailey et al. (2010) realizaram um estudo que procurou identificar quais os
tipos de pesticidas profissionais utilizados no combate a pragas em torno das casas
e no jardim de famílias australianas, no período anterior e durante a gravidez e na
infância. Para tanto, entre os anos de 2003 e 2007, avaliaram 1.258 crianças com
idade inferior a 15 anos, 388 delas com diagnóstico de LLA e 870 como controles. A
análise entre exposição à pesticida ao redor da casa e no jardim revelou uma
associação significativamente positiva para o risco de LLA nos seguintes períodos:
antes da gravidez com OR=1,9 (0,83-1,69 a 95%Cl), durante a gestação OR=1,30
(0,86-1,97 a 95%Cl) e após nascimento OR=1,24 (0,93-1,65 a 95%Cl). Quanto ao
tipo de pesticida, o que apresentou estimativas elevadas foi o pesticida para cupins
com OR=2,06 (0,88-4,84 a 95% Cl) antes da gestação e OR=2,43 (0,96-6,11 a 95%
Cl) durante a gravidez.
De acordo com os autores, na Austrália há um número limitado de produtos
químicos aprovados para o tratamento de cupins. Estes incluem deltametrina,
permetrina e bifentrina que são pertencentes aos inseticidas piretróides. Também é
usado o cloropirifos, que é um organofosforado e o fipronil, que é um fenilpirazóis.
Destes produtos químicos, a bifentrina, a permetrina e o finopril são classificados no
Grupo C como possivelmente cancerígenos para os seres humanos pela Agência de
proteção ambiental dos Estados Unidos- Environmental Protection Agency (EPA).
Outro estudo do tipo caso-controle realizado na Califórnia por Rull et al.
(2009), com base em 213 casos de LLA e 268 controles, analisou a existência de
correlação entre a distância de aplicação dos pesticidas agrícolas às residências e o
risco para a LLA, assim como, categorizou os riscos para a doença relacionados aos
34
grupos de pesticidas e propriedades físico-químicas. Todos os participantes eram
menores de 10 anos, sendo 33% (70 casos) inferior a 3 anos e 38% (81 casos) com
idade entre 3-4 anos. Os efeitos das exposições foram avaliados durante o primeiro
ano de vida e tempo de vida da criança, desde nascimento até o momento do
diagnóstico. Quanto à aplicação de pesticidas em áreas próximas às residências, foi
constatado que a exposição pode ter ocorrido dentro da própria residência, aspecto
que pode estar relacionado com a presença e persistência de agrotóxico no
ambiente. Com relação ao risco para o desenvolvimento de LLA e o tipo de pesticida
exposto, foram encontrados valores moderados, sujeitos ao tempo de vida e
exposição à fumigação com razão de chance 1,7 (1,0-3,1 a 95% Cl) e OR= 1,5 (0,92,4 a 95% a Cl) para inseticidas, enquanto os herbicidas apresentaram OR=1,3 (0,82,3 a 95% a Cl) e os inseticidas apresentaram OR=1,2 (0,7-2,2 a 95% a Cl), para o
primeiro ano de vida das crianças.
Em relação às propriedades físico-químicas, foi relatado um risco elevado
para alta exposição aos azóis fungicidas com OR=2,1 (0,8-5,4 a 95%Cl) e risco
elevado de exposição moderada aos fenóis clorados OR=2,0 (1,0-3,8 a 95%Cl),
organosfosforados OR=1,6 (1,0-2,7 a 95%Cl) e triazinas OR= 1,9 (1,0-3,7 a 95% a
Cl). Os efeitos tóxicos de certos pesticidas, como os organofosforados, identificados
neste
estudo
incluem
estresse
oxidativo,
interrupção
e
inibição
da
acetilcolinesterase, contudo pouco se sabe sobre o papel desses efeitos sobre a
LLA. Há evidências de que os efeitos decorrentes da exposição a essas
substâncias, inibem a capacidade da enzima acetilcolinesterase (AchE) ou
butirilcolinesterase (Bu-chE), que regulam a acetilcolina encontrada no tecido
nervoso, na junção neuromuscular e nos glóbulos vermelhos (BRASIL, 1997; RULL
et al., 2009; INCA, 2010).
Soldin et al. (2009) realizaram durante o período de 2005-2008, um estudo
de base populacional de casos-controle com a população americana de Washington.
O objetivo da investigação foi identificar a associação entre exposições a pesticida
de uso doméstico e o risco de LLA. Como sujeitos foram incluídos crianças
diagnosticadas com a LLA e suas mães, sendo 41 pares de casos e controles (mãefilho), ordenados por idade, sexo e município de residência. Os métodos de análise
foram através da coleta da urina e de um questionário ambiental adaptado
especificamente pelo Grupo de Oncologia Infantil, no qual buscaram identificar
questões sociodemográficas, história médica, o bairro e as características de origem,
35
história de tabagismo ativo e passivo, consumo de álcool, componentes nutricionais,
ocupacionais e exposições de domicílios dos pais durante o período do pré-natal.
A análise das características (sexo, educação materna, etnia, idade da mãe,
casos de câncer na família materna e paterna) entre casos da doença e os controles
não apresentou diferenças estatisticamente significativas, quanto ao risco para a
LLA, bem como o tabagismo e consumo de álcool durante o pré-natal. Entretanto,
houve diferença significativa no valor de P (0,01) quanto à renda familiar dos casos e
dos controles, onde 82% (32 controles) apresentavam boa condição socioeconômica
contra 19 (53% casos).
De acordo com a análise dos questionários, quando comparadas às mães
crianças com LLA e as mães dos casos controle, 33% das primeiras relataram o uso
de inseticidas para controle de pragas em animais de estimação durante o período
pré-natal, contra 14% das segundas, com valor significativo de P(0,02). Adicionando
a esses dados, os encontrados nos resíduos de pesticidas da urina dos
participantes, foi observada uma associação significativa quanto à exposição a
pesticida de combate a erva daninha, com valor significativo de P (0,04).
Em relação aos resíduos encontrados na urina de mães e crianças, o
composto mais encontrado foi dimetil-tiofosfato (DMTP) detectado em 99% das
amostras. Essa substância química pertence à classe do organofosforados, já
explicados anteriormente.
Wigle, Turner e Krewski (2009) em um trabalho de meta-análise realizado
mediante pesquisa na base de busca MEDLINE (1950-2009) avaliaram estudos
sobre a exposição profissional dos pais a pesticida e a ocorrência de leucemia
infantil. Esta meta-análise incluiu 31 estudos, sendo 26 do tipo caso-controle e 5
estudos de coorte. Foram encontradas associações positivas entre a exposição
ocupacional paterna e o aumento do risco para a LLA aos inseticidas OR= 1,43
(1,06-1,92 a 95%Cl), herbicidas OR=1,25 (0,94-1,66 a 95%Cl) e fungicidas OR=1,66
(0,87-3,17 a 95%Cl), assim como, para a exposição ocupacional materna, na qual foi
observado um aumento no risco no período pré-natal aos inseticidas OR= 2,72
(1,47-5,04 a 95%Cl) e herbicidas OR= 3,62 (1,28-10,3 a 95%Cl).
Na mesma época, outro estudo de meta-análise, apontou que dentre os 17
estudos relacionados com exposição
a pesticidas residenciais e LLA, 8
apresentaram associação positiva e aumento significativo no risco de leucemia
infantil, tendo mais relevância no período gestacional. A razão de chance foi 1,54
36
(1,13-2,11 a 95%CI) para pesticidas não especificados, inseticidas OR=2,05 (1,802,32 a 95%Cl) e herbicidas OR=1,61 (1,20-2,16 a 95%Cl) (TURNER; WIGLE;
KREWSKI, 2010).
Acerca dos resultados apresentados acima, as associações positivas entre a
exposição dos pais a inseticidas e herbicidas, principalmente da mãe durante o
período gestacional, podem provocar alterações na contagem de leucócitos,
comprometer
a
diferenciação,
proliferação
e
sobrevivência
das
células
hematopoiéticas e deixar a criança mais suscetível à LLA (EMERENCIANO, 2006;
EMERENCIANO; KOIFMAN; POMBO-DE-OLIVEIRA, 2007; EDEN, 2010).
Em outro estudo de meta-análise realizado no período de 1960 a março de
2008, nove de onze estudos encontrados relataram pelo menos uma associação
significativa entre exposição a pesticidas domésticos e leucemia infantil. Dentre as
associações significativamente positivas encontradas, dois estudos indicaram
exposição aos inseticidas durante a gravidez com uma razão de chance de 2,2 (1,52,1 a 95%CI) e OR=1,8 (1,1-2,8 a 95%CI), assim como para herbicidas com OR=2,5
(0,8-7,2 a 95%CI). Também foi observado que para a maioria dos estudos, foram
encontradas diferenças significativas quanto à exposição materna de inseticidas de
uso interno, apresentando as seguintes razões de chance para o risco de leucemia
infantil OR=3,8 (1,4-13 a 95%CI), OR=3,0 (1,6-5,7 a 95%CI), OR=2,1 (1,7-2,5 a
95%CI), OR=1,8 (1,3-2,4 a 95%CI) e OR=2,1 (1,3-3,5 a 95%CI). Neste estudo, ficou
evidente que a principal via de exposição aos pesticidas inseticidas e herbicidas foi
através do uso doméstico das mães durante a gestação, aumentando o risco para o
desenvolvimento da doença (RUDANT et al., 2009).
Por fim, é válido destacar um estudo de base populacional de casos-controle
realizado por Ward et al. (2009) na Califórnia, no período de 2001-2006, que incluiu
184 casos de LLA e 212 controles entre crianças de 0 a 7 anos de idade, pareados
por data de nascimento, sexo, raça, e etnia hispânica. O objetivo dessa investigação
foi examinar o risco de leucemia na infância à exposição residencial a produtos
químicos organoclorados persistentes (PCBs). Para tanto, foi utilizado como
indicador da exposição aos pesticidas à poeira presente no tapete da sala. Foram
identificados vários tipos de compostos bifelinos policlorados (PCBs) e observado
um risco elevado para a LLA com uma razão de chance 1,97 (1,22-3,17 a 95%Cl),
perante exposição a qualquer tipo desse pesticida. Houve uma amostra na qual não
37
foi especificada, que apresentou um risco de quase três vezes para a LLA OR= 2,78
(1,41-5,48 a 95% CI), com uma associação positiva significativa.
Quando analisados seis tipos específicos de PCBs identificados na poeira,
quatro apresentaram uma associação positiva com aumento de risco para a LLA,
sendo PCB-118 com OR=1,78 (0,91-3,47 a 95%Cl), PCB-138 OR=2,06 (1,18-3,59 a
95%Cl), PCB-153 OR=1,67 (1,06-2,63 a 95%Cl) e PCB-170 OR=2,05 (0,99-4,26 a
95%Cl). Quanto aos outros compostos químicos organoclorados encontrados na
poeira do tapete, o DDT, DDE, clordano, metoxicloro e pentaclorofenol não foram
associados com risco aumentado para a LLA.
Nos
dias
atuais,
os
níveis
dos
inseticidas
PCBs
têm
diminuído
consideravelmente, mas ainda é possível encontrar resíduos misturados com outras
substâncias. Lugares fechados e com pouca ventilação podem ser um grande
contribuinte para a exposição das crianças a esses compostos, pois normalmente
estão protegidos da degradação da luz solar, umidade e bactérias permanecendo
por mais tempo no local e aumentando o fator de risco para a LLA (MELLO-DASILVA; FRUCHTENGARTEN, 2005; WARD et al., 2009).
5 CONCLUSÃO
A leucemia linfocítica aguda infantil (LLA) é o câncer mais comum em
crianças menores de 15 anos e sua etiologia é pouco compreendida. Apresenta
incidência elevada nos países desenvolvidos, com pico entre crianças de 2-5 anos
de idade, principalmente em meninos de etnia branca. Essa incidência aumentou
significativamente após a Segunda Guerra Mundial, sugerindo que as exposições
ambientais ou mudanças no estilo de vida podem desempenhar um papel etiológico.
Dentre os fatores de riscos associados à doença, encontra-se a exposição
aos pesticidas, que são produtos químicos amplamente utilizados pela população,
com o objetivo de eliminar algum tipo de praga indesejável. Outrossim, são
substâncias químicas que acarretam vários efeitos perigosos e graves ao organismo
humano, dentre os quais as intoxicações relacionadas a sua composição química e
a forma de exposição ao composto.
Diante do objetivo proposto para o presente trabalho e dos resultados
encontrados nos estudos selecionados, sugere-se que a principal via de exposição
aos pesticidas acontece pela exposição materna durante a gestação ou pelas
38
crianças na infância. Dentre os tipos de pesticidas utilizados e relacionados com o
risco aumentado para o desenvolvimento de LLA, encontram-se os inseticidas
residenciais que possuem sua principal ação contra insetos, larvas, formigas
presentes, principalmente em ambientes domésticos.
Dessa maneira, o conhecimento produzido no presente estudo contribuiu
para ratificar um dos fatores relacionados com a etiologia da LLA e abrir
questionamentos para que outros trabalhos sejam realizados para elucidar como os
mecanismos dos pesticidas atuam sobre a etiologia da LLA.
39
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Camila_Santos - Licenciatura em Ciências Biológicas