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ceo
Ano 9. Nº 28. 2014
Perfil
Por que Artur Grynbaum
investe pesado na expansão
do Grupo Boticário
Case
Cidade da Polícia, o inovador
complexo investigatório do RJ
Ensaio
Investir nas fortalezas dos
líderes é o modo mais eficaz
de desenvolvê-los
Opinião
A produtividade brasileira
e nossas empresas
Entrevista
Paulo Matos, da Fiat, e os
oito elementos da inovação
Personalidade
O valor da diversidade,
por Eduardo Giannetti
Brasil
CEO Brasil é uma publicação da PwC Brasil
Conselho Editorial
Fernando Alves, Henrique Luz, Otavio Maia, Jorge Manoel, Carlos Iacia,
João Cesar Lima e Carlos Sousa.
Editora-executiva: Márcia Avruch.
Projeto Gráfico
Wolff Olins
Projeto Editorial
Estação – Direção de Arte: Adriana Campos; Texto: Eugênio Melloni,
Sandra Regina da Silva e Sílvio Anaz; Diagramação: Tamy Ponczyk;
Revisão: Marcia Menin; Foto da capa: Cordel Imagens;
Produção gráfica: Regina Garjulli; Impressão: Ipsis.
Copyright: PricewaterhouseCoopers – Brasil
CEO Brasil é uma publicação trimestral
A PricewaterhouseCoopers – Brasil não se responsabiliza pelas opiniões de terceiros
publicadas nesta revista.
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Piti Reali
editorial
O empresário Artur Grynbaum,
CEO do Grupo Boticário, cujo
faturamento anual é cerca de
R$ 8 bilhões, tem um tripé de crenças:
apostar em nosso mercado, no potencial
do Brasil e em nossa capacidade de
execução. Ele garante que, enquanto
puder apoiar-se nisso, continuará a
fazer movimentos arrojados, assim
como mais investimentos para
aproveitar as oportunidades de
expansão geradas pelo país.
compensar, ou corrigir, seus pontos
fracos, e sim uma visão inovadora que
busca potencializar suas fortalezas.
É sempre uma satisfação ver um
empresário brasileiro comprometido
com a inovação e o crescimento,
principalmente quando o ambiente
econômico se mostra menos
convidativo. Grynbaum, personagem
de nosso Perfil, não parece ser,
entretanto, caso isolado nesta revista.
Várias seções a seguir discorrem sobre
inovação de alguma forma.
Em Pesquisa, a 10ª Pesquisa de Líderes
Empresariais Brasileiros da PwC,
referente a 2014, revela que nossos
CEOs colocaram a inovação de produtos
e serviços como a prioridade número
um para aumentar suas receitas nos
próximos 12 meses e que efetivamente
se preparam para isso com investimento
em tecnologia e big data.
Comecemos pela seção Entrevista, que
conta com a participação de Paulo Matos,
executivo de planejamento estratégico
e inovação da Fiat Chrysler Latam.
Matos descreve os oito elementos que
fizeram dessa subsidiária da montadora
italiana sinônimo de inovação, além de
detalhar a cultura questionadora que se
desenvolveu lá dentro.
Nosso Case mostra o trabalho da PwC
Brasil no novo complexo da Polícia Civil
fluminense, conhecido como Cidade
da Polícia. Trata-se de um cluster de
delegacias e pessoal especializado que,
com aproveitamento de sinergias e
infraestrutura compartilhada, aumenta
a eficácia das investigações.
Fernando Alves
Sócio-presidente da PwC Brasil
No Ensaio, dois sócios da PwC, o
britânico Andy Woodfield e o brasileiro
João Lins, explicam por que a melhor
metodologia de desenvolvimento de
lideranças não é a tradicional, que tenta
A discussão em Opinião é sobre um tema
que exalta ânimos, com o providencial
empurrão da revista The Economist: a
produtividade da economia brasileira.
O presidente da Amcham, Gabriel Rico,
e o economista Naercio Menezes, do
Insper, apontam as mais variadas raízes do
problema e propõem possíveis soluções.
O Artigo é de autoria de Ivan de Souza,
sócio da Strategy&, e ele discorre sobre
a enorme diferença que faz, para uma
empresa, formular uma estratégia pura e
simples ou elaborá-la depois de identificar
as capacitações distintivas da organização.
Em Tendência, convidamos o especialista
em gestão de riscos naturais Moacyr
Duarte, da Universidade Federal do Rio
de Janeiro, a escrever sobre o
real estágio da defesa civil no país
e nossa capacidade de lidar com
fenômenos como enchentes e secas.
Por fim, Personalidade traz o
economista Eduardo Giannetti da
Fonseca, provocador compulsivo
de reflexões no mundo executivo,
com seus livros e palestras. Aqui, ele
defende, com o próprio exemplo, o
valor da diversidade de conhecimentos,
em um desafio aos que cultuam o foco.
Boa leitura!
editorial ceo 1
Cordel Imagens
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Perfil. Artur Grynbaum, descendente de judeus
poloneses, CEO e sócio do Grupo Boticário, de
cosméticos, está acelerando os investimentos em
expansão em um momento econômico em que boa
parte das empresas recua. Além de ter caixa para
aproveitar a oportunidade e do sangue empreendedor
que corre em suas veias, ele sempre se lembra de uma
lição familiar: “Meu pai ensinou que enfrentar coisas
novas faz parte da vida e não se deve ter medo”.
Na CEO nº 28
Divulgação
Divulgação Insper
A tecnologia é fator
dominante para
93%
dos líderes
brasileiros
81%
dos líderes
mundiais
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Opinião. A redução drástica do desemprego no Brasil parece
ter criado espaço para que outro assunto fundamental ocupasse
o centro do debate econômico: a produtividade. O presidente
da Amcham, Gabriel Rico, representante das empresas, e o
economista Naercio Menezes, do Insper, debatem as maneiras de
aumentá-la rapidamente.
Pesquisa. Cerca de 40% dos
CEOs brasileiros estão preocupados
com as mudanças nos gastos e nos
comportamentos dos consumidores e
93% apontam a tecnologia como vertente
dominante das mudanças. Quase metade
de nossos líderes (45%) crê que o caminho
do crescimento passa por inovação em
produtos e serviços.
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2 ceo
Tendência. Se o risco de desastres
ambientais, como grandes enchentes e
secas, é maior e mais imprevisível, como
escreve o especialista Moacyr Duarte, da
Universidade Federal do Rio de Janeiro,
o país está mais bem preparado para
gerenciá-lo hoje, mas precisa evoluir.
Personalidade. O economista Eduardo Giannetti
fala sobre sua estratégia transdisciplinar para abordar
as grandes questões da humanidade, que relaciona
conhecimentos tão distintos quanto filosofia,
antropologia, psicologia e neurociência; ele mostra o valor
da diversidade em um ambiente que cultua o foco.
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Divulgação Fiat
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Cordel Imagens
Divulgação Coppe–UFRJ
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Expertise PwC
Ensaio. Como desenvolver líderes de maneira eficaz?
A experiência da PwC mostra que fortalecer seus pontos
fortes é uma abordagem muito mais bem-sucedida do que
a de corrigir pontos fracos.
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Case. Conheça o trabalho da PwC na Cidade da Polícia, um
complexo de 14 delegacias da Polícia Civil do Rio de Janeiro que
aumenta sua eficácia na investigação dos mais diversos crimes.
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Entrevista. Paulo Matos, o executivo responsável pela
já célebre estratégia de inovação da subsidiária brasileira
da Fiat, detalha os oito blocos construtores da inovação
em sua empresa e ressalta a importância de haver uma
mentalidade de questionamento permanente.
Artigo. Ivan de Souza, sócio da Strategy&, apresenta as
capacitações diferenciadoras que constituem o passo anterior à
formulação de uma estratégia corporativa. Uma empresa costuma
ter três ou quatro delas. Quais são as de sua organização?
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ceo 3
perfil
Artur Grynbaum tem
foco no longo prazo
O CEO e sócio do Grupo Boticário explica o que lhe dá coragem
para acelerar investimentos na expansão de seu negócio em um
momento em que boa parte das empresas age de maneira mais
defensiva e conservadora
Descendente de judeus poloneses, Artur Grynbaum diz ter
o empreendedorismo correndo em suas veias. As provas são
irrefutáveis: trabalhou, desde pequeno, nas lojas de confecção
do pai e do tio e nem havia alcançado a maioridade quando
ingressou n’O Boticário, fábrica de seu cunhado Miguel
Krigsner, bioquímico farmacêutico de formação.
Foi só em 2008 que Grynbaum tornou-se sócio e presidente do
Grupo Boticário, mas ele logo mostrou a que veio, fazendo os
negócios crescerem quando todos pisavam no freio em razão
da crise financeira mundial – o grupo investiu R$ 650 milhões
nos últimos quatro anos, principalmente em infraestrutura, e
também desenvolveu e lançou novas marcas no mercado.
Isso revela uma de suas principais características de liderança:
o compromisso com uma visão de longo prazo.
Solteiro, Grynbaum é ainda um empresário ativista. Entre
outras posições ocupadas, foi membro fundador do Instituto
Brasileiro de Varejo (IBV) e presidente da Associação Brasileira
de Franchising (ABF) por quatro anos e hoje é vice-presidente
da Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal,
Perfumaria e Cosméticos (Abihpec). “Acredito que seja assim
que se desenvolvem os setores e um país economicamente
forte”, explica.
4 ceo perfil
Bem-humorado durante a entrevista à CEO Brasil, Grynbaum
só mudou o tom duas vezes: ao comentar sobre a perda do
pai, há alguns anos, e ao mencionar o processo de substituição
de pessoas que precisou fazer no Grupo Boticário, batizado
internamente de “Redesenho”.
Herança empreendedora
“A família do meu pai foi uma das poucas que escaparam
inteiras do nazismo na Polônia – fugiram meu avô, minha avó e
os quatro filhos. Isso aconteceu graças ao meu pai, que era um
dos líderes da Resistência local e comandava a família naquele
momento, apesar de muito jovem.
Vieram para a Bolívia, o único país da América Latina que
aceitava imigração judaica e onde estava a família da minha
mãe, também de origem polonesa. Meus pais se conheceram,
casaram-se e tiveram minhas duas irmãs. Eu fui o primeiro
membro da família nascido no Brasil, depois que eles se
mudaram para Curitiba.
Minha família é marcada por uma trajetória de reconstruções.
Reconstruiu a vida na Alemanha, depois na Bolívia e, então,
em Curitiba – sempre no comércio. Meu pai nos ensinou que
enfrentar coisas novas faz parte da vida de uma pessoa e não se
deve ter medo.
Cordel Imagens
Artur Grynbaum
CEO e sócio do Grupo Boticário
perfil ceo 5
“A parceria com o Miguel [Krigsner] é uma história incomum:
iniciou-se com cunhados que se davam bem, evoluiu para uma
sociedade e, depois, para uma sucessão. Eu tive de dar o dobro
de provas da minha capacidade, todos os dias, porque muitos
achavam que eu tinha ‘costas quentes’”
Tive infância boa, não faltava nada: educação, inclusive de
idiomas, muito esporte, a família por perto. Como a família
possuía algumas lojas de confecção, os assuntos dos negócios
misturavam-se facilmente com os da casa e, aos 8 anos, eu já
ia trabalhar em uma das lojas.
O início n’O Boticário
“Quando ingressei n’O Boticário, era uma indústria iniciante em
franchising e que construía a marca; não havia como antever,
naquela época, que a empresa se transformaria no que é hoje.
Aos 9 anos, fui promovido a ‘porteiro’, função de grande
responsabilidade. Quando o movimento da loja aumentava
muito, na época das festas de fim de ano, eu era o porteiro que
coordenava a entrada e a saída de clientes, para caberem todos
lá dentro. Aos 12 anos, veio outra promoção: passei a ser office
boy, em troca de um aumento de mesada.”
A parceria com o Miguel [Krigsner] é uma história incomum:
iniciou-se com cunhados que se davam bem, evoluiu para uma
sociedade e, depois, para uma sucessão. O Miguel começou a
namorar minha irmã poucos anos depois de abrir sua farmácia
de manipulação. Eu era adolescente e, toda vez que tinha
alguma indisposição com meu pai ou meu tio na nossa loja de
confecções, dizia ao Miguel que queria trabalhar com ele.
Na base, mix de estudo e prática
“Com 16 anos, eu não sabia se prestaria vestibular. Durante o
tempo em que ficaria na faculdade, eu conseguiria abrir umas
cinco ou seis lojas e, quando meus amigos terminassem seus
cursos, eu já estaria lá na frente, com um negócio montado.
Achava que, com a prática, tinha aprendido quase tudo o que
precisava saber de administração: comprar, vender, cuidar do
estoque, montar equipe de vendas, fazer pagamentos etc.
Então, em 1986 veio o Plano Cruzado [plano econômico para
estabilizar a economia] e exigiu uma reformulação delicada
n’O Boticário, que precisou redefinir metas. O Miguel trouxe
um diretor financeiro do mercado, Bernardo Fedalto, a quem
o departamento comercial se subordinava, e necessitava de um
assistente financeiro. O Miguel pediu meu passe a meu pai, em
caráter provisório. Fui trabalhar com meu cunhado no espírito
de ajudar, mas acabei me apaixonando pela empresa.
Minha mãe respondeu com um sonoro ‘não’ a essa ideia,
justificando que conhecimento era a única coisa que os pais
dão aos filhos e ninguém lhes pode tirar. ‘Um médico pode
virar comerciante, mas um comerciante não pode virar
médico’, argumentou. Ela estava certa, como vi depois.
A educação é importante, em relação à técnica e aos valores.
Após minha formatura, quis ter um negócio próprio e o Miguel
propôs que eu realizasse esse sonho comprando 8% do capital
d’O Boticário. Meu pai me emprestou o dinheiro. Quando,
poucos anos depois, um terceiro sócio saiu, comprei mais ações
e cheguei a meus 20% atuais; o Miguel tem 80%.”
Aos 17 anos, já n’O Boticário, prestei vestibular para
processamento de dados e fui aprovado. E, como o curso era
à noite, decidi fazer administração de dia, na Faculdade de
Administração de Empresas (FAE) de Curitiba. A rotina era
puxada: de manhã a primeira faculdade, à tarde O Boticário
e à noite a segunda faculdade. Em seis meses, abandonei
processamento, vendo que não era aquilo que eu queria, mas
em administração me graduei, em 1991. Mais tarde, fiz um
MBA em finanças no Ibmec.
Se fizesse uma faculdade mais renomada, em outro lugar, não
teria a possibilidade de unir teoria e prática como fiz. Não sou
um rebelde à Steve Jobs quanto à educação formal, mas, em
minha trajetória, a experiência prática fez toda a diferença.”
6 ceo perfil
Várias experiências em um só lugar
“A fábrica não é meu foco principal, apesar de eu sempre
ter a curiosidade de entender como funciona. Gosto é do
franchising, de vendas, de finanças. Quero circular e fazer
perguntas. Fiz de tudo: carreguei caixa, cuidei de documentos
bancários, controlei os caixas das lojas.
Sem sair d’O Boticário, pude ter várias experiências. Dadas
as adversidades dos planos econômicos do Brasil até 1994, e
com nosso ousado modelo de crescimento por franchising, era
como se, de tempos em tempos, eu tivesse uma empresa nova
para administrar.”
Dois chefes na vida
“Tive apenas dois chefes, mas de grande impacto. Bernardo
Fedalto foi o primeiro. Dava-me bastante liberdade para fazer
tudo e nunca me deu muitas respostas. Dizia para eu ir buscá-las.
E isso nunca foi uma dificuldade para mim.
Cordel Imagens
A visão de longo prazo como diferencial
Sendo filho de um líder da Resistência à ocupação
nazista da Polônia na Segunda Guerra, é natural
que Artur Grynbaum tenha uma visão de longo
prazo. Sob sua batuta, o Grupo Boticário tem esse
grande diferencial. “Em 2012, o grupo estruturou
um plano estratégico para nortear as ações de
sustentabilidade da organização pelos 12 anos
seguintes, até 2024. Nossos pilares e objetivos
foram definidos de olho nos desafios do presente e
do futuro”, contou o executivo.
São três os pilares estratégicos do grupo, que
serão desdobrados em ações com execução no
curto, médio e longo prazos: matéria-prima e
embalagens (ciclo de vida de produtos e logística
reversa), canais de venda (revendedores e pontos
de venda) e ecoeficiência (tanto em unidade
produzida como na cadeia ampla).
Um símbolo dessa visão de longo prazo é o centro
de pesquisa e inovação do grupo, considerado um
dos mais avançados do mundo, que reúne 230
pesquisadores em 8 mil m² e tem capacidade de
desenvolvimento de 2 mil produtos ao mesmo tempo.
Depois, tive – e tenho – o Miguel como chefe. Nós dois sempre
fomos muito complementares: o Miguel gosta muito de
marketing, de produto e de fábrica; eu me encanto mais com
finanças e vendas.
Eu, como chefe, replico lições dos dois. Com o Fedalto aprendi
a fazer muito mais perguntas do que dar respostas. Percebi
quão bom é ter a liberdade de executar e ocupar um espaço
que está para ser ocupado. Com o Miguel pude aprender toda
a questão de produto, além de valores como o de ouvir o
coração e fazê-lo pesar nas decisões.
Ser parente do Miguel é bom, mas não facilitou em nada
minha carreira. Eu tive de dar o dobro de provas da minha
capacidade, todos os dias, porque muitos achavam que eu
tinha ‘costas quentes’.”
Profissional e sem abrir o capital
“Apesar de a empresa ser de controle familiar, não temos ‘vagas’
familiares. As pessoas da família podem se candidatar a ocupá-las,
mas não há garantia de que consigam, porque vai depender da
competência. Atualmente, fora nós dois, há na empresa duas
filhas do Miguel e minha irmã, que é dentista e atende no centro
de promoção à saúde instalado na fábrica no Paraná.
A empresa familiar foi, por muito tempo, percebida como
ineficiente. Eu discordava, discordo e discordarei disso sempre.
Para mim, o controle familiar não afeta nada a gestão, muitas
vezes até ajuda; é a gestão familiar que causa problemas.
perfil ceo 7
Não temos nada contra abrir o capital, mas conseguimos
crescer por outros meios e não há problemas de sucessão no
curto prazo que justifiquem a abertura. Eu brinco que, no
fundo, já tenho um pouco o capital aberto, porque o franchising
implica ter parceiros de negócio, com a diferença de que eles
não colocam só dinheiro, mas também trabalho.”
Do reembolso postal ao franchising
“A expansão territorial do grupo começou nos anos 1980.
Vendíamos, por reembolso postal, para diversas lojas que
revendiam nossos produtos, porque não queríamos ter um
departamento de análise de crédito. Aí partimos para lojas
exclusivas. A primeira loja assim foi no aeroporto Afonso Pena,
em Curitiba, e sua relação conosco era exclusivamente a de
revendedora dos produtos.
Chegamos a ter 1.100 pontos de venda no Brasil, entre lojas
mistas e exclusivas, mas, em 1986, abolimos as lojas mistas,
em busca de maior qualidade, e o número caiu para 830.
Começamos, então, a abrir mais lojas com o sistema de
franchising e uma série de serviços ‘embarcados’. Hoje, temos
cerca de 3.800 lojas do grupo, incluindo todas as marcas,
sendo 3.673 d’O Boticário, com grande capilaridade.”
A sucessão
“Antes do Plano Real, a inflação chegava a 70% ao ano no Brasil
e a questão toda de um negócio era saber não perder valor e
ter um retorno maior. Depois, em 1995, sob o impacto da
estabilização da moeda, pensamos em longo prazo e elaboramos
um ‘Redesenho’, mais suave que a reengenharia em voga.
Mexemos radicalmente na forma de gerir o negócio
internamente, de fazer o contato com os franqueados, de a
mercadoria chegar até eles. Nas lojas, tiramos todos os balcões,
aumentando o acesso do consumidor. Pilotei esse projeto desde
o início; foi a semente do que veio a ser o Grupo Boticário.
Na implantação disso, virei diretor financeiro e o Fedalto,
vice-presidente. Minha vida exclusivamente como
diretor financeiro durou nove meses – o profissional
contratado para dirigir a área comercial não permaneceu
na função e eu a acumulei. No dia 22 de fevereiro de 2002,
fui nomeado vice-presidente d’O Boticário, e aí iniciamos a
sucessão, com data não definida, para que eu pudesse assumir
a presidência executiva, o que acabou acontecendo em 2008.
Como queríamos dar um novo passo a um processo de
governança melhor, decidimos pela criação de um conselho
de administração, composto também de pessoas externas.
O papel do conselho é o de dar a visão da empresa e o meu é o
de pavimentar o caminho para que depois nossos parceiros
[os franqueados] venham conosco.”
O processo de sucessão nas franquias
“Utilizamos o conselho para mostrar aos franqueados que
eles deveriam fazer processos de sucessão, com o Miguel
indo para a presidência do conselho e eu ficando como
presidente-executivo. Essa iniciativa deu origem a nosso
programa de sucessão de franqueados, que foi o primeiro
do mundo.”
Cordel Imagens
Mexemos muito na organização inteira, por dois anos, com
muitas substituições de pessoas. Hoje, com a bagagem
adquirida, vejo que deveria ter sido em um período mais curto,
evitaria sofrimento das partes, mas é fácil ser juiz de videoteipe.
Sou um defensor de mexidas grandes, e preferencialmente
quando se está bem, porque nos permitem olhar com a cabeça
erguida para o horizonte, e não para o chão, preocupados em
não cair no buraco.
8 ceo perfil
Expansão orgânica
“Optamos por ter um crescimento orgânico desenvolvendo
novas marcas, porque o que imaginávamos de conceitos não
se traduzia em marcas já existentes, nem dentro nem fora
da empresa. Preferimos partir de uma folha em branco e
desenvolver internamente.
Um pouco de sofrimento
“Em 2012, com tantas novidades lançadas, aumentou a
complexidade do nosso negócio. Passamos de uma vida mono
– monomarca, mononegócio, monocanal, monossite – para
uma multi. Não acredito em crescimento sem um pouco de
sofrimento, muito trabalho e investimento.
Em 2010, criamos o Grupo Boticário, holding das unidades
de negócios. Isso nos deu a plataforma adequada, entendida de
maneira transparente pelos fornecedores, os grandes parceiros
que são os franqueados, revendedoras e consumidores.”
Tanto acredito nisso que, no complexo ano em que todos
tiraram o pé do acelerador, 2008, foi quando investimos
R$ 170 milhões na ampliação da capacidade fabril e na
construção de um novo centro de distribuição, em Registro
[interior paulista].
O conselho de William Conway
“Abrimos uma frente de possíveis capturas de oportunidades
de negócios que não fossem relacionadas só com cosméticos.
Como o William Conway [cofundador e co-CEO do fundo
Carlyle] estava vindo para cá e queria conhecer nossa empresa,
nós o recebemos e conversamos bastante sobre oportunidades
no Brasil, sobre a empresa e sobre modelos de gestão. Ao final
do encontro, fui acompanhá-lo até a porta da fábrica, ele me
puxou pelo braço e disse: ‘Vou lhe dar um conselho:
não venda esta empresa nem para nós, nem para ninguém’.
Eu dei risada, mas isso me deixou pensativo. Acho que ele se
referiu ao fato de que O Boticário não é só um bom negócio,
mas é um negócio peculiar e que precisa manter-se assim.
Desde os anos 1990, antes do boom do mercado [de private
equity], empresas e fundos de fora já vinham conversar
conosco, demonstrando interesse em comprar participações.
Para testar se isso melhoraria nosso desempenho, fizemos uma
experiência, vendendo 2% do capital para o BRZ Investimentos
[ex-IGP, que depois o revendeu ao Banco Votorantim] e
dando-lhe assento no conselho. Nada mudou e recompramos a
participação. Não temos interesse em ter sócios.”
Grupo Boticário
4 unidades
de negócios:
Presente em
7 países:
O Boticário, Eudora,
Brasil, Portugal,
quem disse, berenice?
Estados Unidos,
e The Beauty Box
Japão, Angola,
No Brasil, são
Venezuela
e Paraguai
3.837 pontos
de venda de suas
marcas, em
1.750 municípios
Maior rede
O Boticário
R$ 4,6 bi
R$ 5,5 bi
R$ 6,9 bi
2010
2011
2012
O Boticário, Eudora, quem disse,
berenice? e The Beauty Box
O Boticário
7.000
O Boticário
Faturamento
anual
O salto recente
Em 2012 foi igual: com toda a complexidade do cenário
econômico, destinamos R$ 650 milhões em investimento ao
novo centro de pesquisa e inovação – um dos mais modernos
do mundo –, à nova fábrica de produtos de maquiagem, à
ampliação da nossa capacidade de armazenamento, ao início
da fábrica e centro de distribuição na Bahia, à ampliação da
capacidade do centro de Registro.
R$ 8 bi
colaboradores
diretos e mais
de 22.000
indiretos
de franquias do
Brasil em número
de lojas e em
faturamento,
com O Boticário
1º programa
de sucessão familiar
em franquias do
mundo, “O Futuro
em Nossas Mãos”, Portfólio de
lançado
9.000
em 2010
produtos
de beleza,
disponíveis por
e-commerce
2013
perfil ceo 9
Tenho um tripé de crenças, que consiste em apostar
no nosso mercado, no potencial do Brasil e na nossa
capacidade de execução. Enquanto eu tiver esse tripé,
farei movimentos arrojados e aproveitarei as oportunidades
de crescimento. Sei que preciso constantemente dotar a
empresa de capacidade para atender às minhas expectativas
e à velocidade de crescimento que queremos; é muito
investimento, mas ele volta.”
Experimentação ousada em marcas
“Uma das grandes vantagens de ter capital fechado é que nos
permitimos ousar. Não lançamos nossas novas marcas pelo
processo tradicional – lançar uma marca de cada vez e ajustá-la
por quatro anos antes de partir para a próxima. Se fosse assim,
a primeira marca seria de 2010 e a terceira, perto de 2020.
Fizemos tudo numa tacada, criando Eudora, The Beauty Box,
quem disse, berenice? e Skingen entre 2011 e 2012.
Quando monto um negócio em determinada velocidade,
não posso achar que 100% dele vai sair perfeito. Então,
no caso da marca Skingen, confirmamos que os produtos
para pele, baseados em estudos no laboratório de biologia
molecular que temos há tempos, são muito bons, mas o canal
de comercialização, que era quase uma butique da pele, não
correspondeu. Achamos melhor voltar atrás nesse caso.
Eu não tenho problema com isso; é aprendizado.
Quem quiser surfar a onda só quando estiver formada será
sempre um seguidor. Para ser inovador, é preciso sair antes
da onda, correndo o risco de ela não virar. Nós temos o
DNA inovador. O ensinamento é o de que, se uma ideia não
funcionar, deve-se ter humildade para reconhecer.”
Grynbaum por Grynbaum
“Considero tudo como experiência e não tenho medo de erro, só
precisa ser corrigido rapidamente. Sou um líder cujas palavras
e ações coincidem. Almoço todos os dias no refeitório com todo
mundo. E faço o que tem de ser feito, mesmo que doa na carne.
Também ouço bastante e gosto de circular, inclusive nas
pontas. Minha paixão é a lojinha. Em minha opinião, uma
organização como a nossa tem de funcionar de fora para
dentro, ouvindo a ponta para produzir melhor.
Eu me considero acessível, não existem temas proibidos e
estou aberto para conversar. É claro que há hierarquia, mas
o franqueado, por exemplo, tem total liberdade de me ligar e
eu encaminho o assunto para a caixinha correta. Temos um
modelo de governança que inclui a ‘informalidade’, para nunca
precisarmos passar 30 e-mails para a troca de uma lâmpada.
Temos processos e análises, mas há situações que exigem uma
rápida tomada de decisão. Agilidade, para mim, é fundamental.
Pessoalmente, sempre gostei muito de esportes, mas com
17 anos tive uma luxação na rótula e minha carreira esportiva
parou por aí. Eu não era profissional, mas fui da seleção
paranaense de futebol de salão. Hoje virou hobby: se não
consigo jogar duas ou três vezes por semana e somente uma,
sei que vou ficar o resto da semana lamentando.
Uma cronologia
1969
• Artur Grynbaum nasce
em Curitiba (PR), filho de
imigrantes poloneses
Divulgação
1992
• Forma-se em
administração
e economia pela
Faculdade de
Administração
de Empresas (FAE)
de Curitiba
2002
• Assume o cargo de
vice-presidente-executivo
1986
1995
2005
• Ingressa n’O Boticário,
empresa de seu cunhado
Miguel Krigsner, para atuar
como assistente financeiro
• Pilota o “Redesenho” da
empresa, com o objetivo de
traçar um planejamento de
longo prazo; ao completá-lo, é
promovido a diretor financeiro
• Ocupa a presidência
da Associação Brasileira de
Franchising (ABF), por dois
mandatos consecutivos, onde
permanece até 2008
10 ceo perfil
“Alguns podem me achar maluco, mas um negócio se
aprende pela ponta; é onde se materializa tudo o que é
feito lá atrás. A mensagem feita lá atrás é testada nos
30 ou 60 segundos na loja, na frente do consumidor”
Atividade física, para mim, é fundamental, porque é uma
forma de extravasar, de soltar o estresse. Também gosto muito
de cinema e da boa gastronomia.”
Divulgação
Conselhos aos jovens
“Se fosse dar um único conselho aos jovens gestores, eu diria
que eles não podem ter medo de sujar as mãos trabalhando na
operação, porque esse é o meio correto de aprender sobre um
negócio. Eu aprendi trabalhando nas lojas. Quando minhas
sobrinhas vieram dizendo que queriam trabalhar aqui, elas
foram fazer um treinamento para serem consultoras de loja.
Alguns podem me achar maluco, mas um negócio se aprende
pela ponta; é onde se materializa tudo o que é feito lá atrás.
A mensagem feita lá atrás é testada nos 30 ou 60 segundos na
loja, na frente do consumidor.
Um segundo conselho diz respeito à superficialidade do
conhecimento que vemos hoje. A informação rápida é o lado
bom da internet, mas está ficando tudo muito raso. Então,
quem se aprofundar terá mais eficiência.
O terceiro conselho é óbvio, mas poderoso: ser humilde,
interagindo com todo mundo. A melhor informação muitas
vezes vem da pessoa que você menos imagina. Fale com todos,
trate todos como importantes, porque eles o são. Eu aprendi
muito com consultora de loja, com auxiliar de laboratório.
Sempre estive disposto a ouvir e a interagir.
Um quarto e último conselho é o de que o jovem sempre
busque diferenciar-se. Faculdade, MBA e internet milhares têm,
não bastam mais como diferenciais. Eu, como empregador,
quero saber o que a pessoa entrega a mais. Por exemplo,
valores e caráter são fundamentais; boa capacidade de
raciocínio e geração de soluções também. Quero ao meu lado
indivíduos que sejam capazes de empreender, em produtos,
processos, modelos de negócio.” n
Divulgação
Com a falta de tempo, o que sobrou para mim foi a corrida,
porque com um par de tênis na mala dá para correr nos
intervalos, seja na rua, seja numa esteira. Acabei criando
grupos de amigos de corrida. Com um desses grupos, faço uma
viagem por ano para algum país para disputar uma prova –
como uma meia maratona ou 10 quilômetros. Também vamos
para outro país e conhecemos uma cidade correndo.
2011
2008
• Assume a presidência
d’O Boticário
2012
• Cria o Grupo Boticário, com a
proposta de atuação multinegócios
• Eleva a empresa à posição
de maior franquia do Brasil,
em número de lojas e em
faturamento, segundo
ranking da ABF. Apresenta
três novas unidades de
negócios: quem disse,
berenice?, The Beauty
Box e Skingen (a última é
descontinuada mais tarde)
Divulgação
2010
2013-2014
• Recebe o título
“Executivo de Valor”, do
jornal Valor Econômico, por
dois anos consecutivos
Divulgação
• Lança a marca Eudora, nova
unidade de negócios do
grupo; é nomeado segundo
vice-presidente da Abihpec,
a entidade da indústria de
cosméticos, com mandato
até 2015; é eleito “Líder na
Economia Verde” do grupo de
líderes empresariais Lide
perfil ceo 11
opinião
O desafio brasileiro
de aumentar
a produtividade
A baixa produtividade de nossas empresas é apontada como um
dos principais responsáveis pelo fraco crescimento do PIB brasileiro.
Ao que tudo indica, o assunto finalmente entrou na pauta nacional.
Agora, é preciso definir as soluções possíveis, como se faz neste debate
Estudos do Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (Ipea) mostram que a produtividade
brasileira, salvo no setor agropecuário e na indústria
extrativa, não cresce de maneira sustentada desde
o final dos anos 1970. Mais alarmante ainda é o
fato de que, entre 2000 e 2009, a produtividade
do trabalho declinou no setor industrial – a queda
anual média foi de 0,4% e, se considerada apenas a
indústria de transformação, o recuo chegou a 0,8%.
Dados do Conference Board, organização que
reúne 1,2 mil empresas em 60 países e se dedica
a pesquisas e treinamentos, revelam que, em
2013, os colaboradores de empresas brasileiras
registraram a mais baixa produtividade entre
os países latino-americanos. Eles produziram
uma média de US$ 10,80 por hora trabalhada,
enquanto, na Argentina, essa média foi de
US$ 13,90 e, no México, alcançou US$ 16,80.
12 ceo opinião
Empresários, economistas e técnicos do governo
expõem a complexidade do problema ao apontar
vários fatores como responsáveis pelos fracos
resultados na produtividade brasileira. A revista
inglesa The Economist recentemente aventou uma
possível explicação cultural para o problema: o
trabalhador brasileiro, segundo ela, talvez não
goste tanto assim de trabalhar.
Para debater o desafiador tema, CEO Brasil
convidou um representante do meio empresarial,
Luiz Gabriel Rico, CEO da Câmara Americana de
Comércio, a Amcham Brasil, e um economista,
Naercio Aquino Menezes Filho, professor do Insper.
Segundo ambos, o fato de as práticas de gestão
estarem defasadas nas empresas brasileiras
contribui significativamente para a baixa
produtividade registrada, assim como a distância
entre as empresas e as universidades.
A seguir, os dois convidados de CEO Brasil
propõem explicações e soluções para o problema.
Por que só agora a produtividade
brasileira ganhou os holofotes?
Naercio Aquino Menezes Filho: Entre os
economistas acadêmicos, esse sempre foi
um tópico importante de pesquisa, porque a
produtividade é um dos principais fatores que
influenciam o crescimento de um país no longo
prazo. Foram a mídia e a sociedade em geral
que só despertaram para a importância da
produtividade mais recentemente, assim como
só recentemente se deram conta da relevância
da educação.
Creio que a explicação para isso é que a sociedade
brasileira sempre esteve mais preocupada com
questões de curto prazo, como inflação, câmbio
e políticas industriais. Acredito que isso ocorra
devido principalmente ao lobby dos setores que
mais ganham com a flutuação dessas variáveis.
Luiz Gabriel Rico: Nos últimos anos, o Brasil
conseguiu crescer absorvendo mão de obra
e reduzindo desemprego, mas esse processo
chegou a seu limite. De agora em diante, se não
aumentarmos a produtividade, o país não cresce.
Daí a ênfase recente na produtividade.
“Nos últimos anos, o Brasil conseguiu
crescer absorvendo mão de obra e
reduzindo desemprego, mas esse
processo chegou a seu limite. De agora
em diante, se não aumentarmos a
produtividade, o país não cresce”
Gabriel Rico
(PIM-IBGE) ou o valor da transformação
industrial (PIA-IBGE). Além disso, existem vários
deflatores disponíveis, como o deflator implícito do
PIB e os deflatores específicos para cada setor.
Agora, isso não é um problema em si; acontece
a mesma coisa com a inflação e com a pobreza.
Temos é de aprender a lidar com os vários
indicadores e compará-los.
Na verdade, isso sempre deveria ter estado em
nosso foco. Não estava porque o Brasil focou por
muito tempo a questão do emprego, um problema
que agora foi atenuado.
Rico: A questão da mensuração da
produtividade é um debate constante; ela varia
conforme o modelo e a fonte de informação.
Independentemente da metodologia utilizada
para medi-la, no entanto, temos de nos
concentrar no que é evidente: o crescimento da
produtividade é fundamental para o país.
No meio empresarial há a máxima de que
aquilo que não se mede não se melhora.
Mas as muitas métricas de produtividade
existentes não atrapalham na hora de
focar o que melhorar?
Menezes: De fato, há diferentes formas de
medir a produtividade. Em primeiro lugar,
alguns usam a produtividade do trabalho, que
inclui o efeito do capital, e outros mencionam
a produtividade total de fatores (PTF), que
exclui esse efeito. Depois, podemos medir
a produtividade usando a produção física
Os salários avançam mais do que a
produtividade do trabalho na indústria.
Por que há o descompasso?
Rico: O país viveu nos últimos anos uma política
distributivista, em que foram concedidos
aumentos salariais sempre acima da inflação por
meio de negociações e dissídios. Isso acumulado
ao longo de anos leva a um aumento da massa
salarial significativo, acima da inflação e acima da
produtividade. Esse fator é acelerado, ainda, pelos
aumentos do salário mínimo, que igualmente
foram acima da inflação e da produtividade.
opinião ceo 13
Divulgação
Luiz Gabriel Rico
Presidente da Câmara Americana de
Comércio, a Amcham Brasil
Desconstruindo Rico
Desde 2008 à frente da Câmara Americana de Comércio,
a Amcham Brasil, Rico tem vasta experiência em liderança
e gestão, com uma carreira bem-sucedida em empresas
internacionais. Entre outros, ocupou cargos em instituições
como Editora Abril, na qual foi vice-presidente-executivo,
Kibon, ligada à Unilever, Listel Listas Telefônicas e Grupo
Totalcom, da área de comunicação.
O aumento da massa salarial realmente
impulsiona o consumo e o crescimento, mas o
problema é que, no médio e longo prazos, essa
equação é finita.
Olhando para o exterior, nos países que
dão saltos de produtividade, quais são os
fatores mais relevantes?
Menezes: Para aumentar a produtividade,
conhecem-se seis passos fundamentais: (1) aumentar
a qualidade da educação pública, (2) investir
pesadamente em infraestrutura, (3) elevar os gastos
em pesquisa e desenvolvimento para aumentar a
inovação, (4) promover a concorrência nos mercados
internos, (5) fazer políticas industriais horizontais,
que incentivem as empresas a exportar e ganhar
mercados externos, e (6) aproximar as universidades
das empresas privadas.
Rico: Prefiro olhar para o Brasil: aqui, para aumentar
a produtividade, temos de resolver questões relativas
à carga tributária, aos encargos trabalhistas e à
própria atuação da Justiça do Trabalho.
Ainda há a considerar a baixa qualificação da
mão de obra, os altos salários comparados com os
padrões internacionais e a falta de investimentos
recentes na melhoria dos processos produtivos.
14 ceo opinião
O que explica o fato de o Brasil ter
produtividade inferior à de países com
problemas similares de infraestrutura e
burocracia e economias menos fortes?
Menezes: A meu ver, o grande problema no
Brasil está nas práticas gerenciais atrasadas que
permeiam todos os setores. Pesquisas mostram que
o gerenciamento na indústria brasileira está entre
os mais antiquados do mundo. Nossas empresas
só sobrevivem porque não há concorrência
internacional, as tarifas de importação são elevadas
e elas vivem de favores do governo.
Além disso, a qualidade da educação é baixa e as
políticas de incentivo à inovação são ineficientes.
Pelo fato de as universidades estarem distantes das
empresas, temos muita produção científica que não
é comercializada pelas companhias brasileiras.
Rico: A proteção às empresas nacionais tende
a levar a certo comodismo. O protecionismo
existe porque o ambiente de negócios é hostil,
porque falta competitividade como um todo à
economia brasileira. Para atacar esse problema,
a Amcham defende a abertura de mercado e a
negociação de acordos internacionais amplos
com mercados grandes, como Estados Unidos,
União Europeia e toda a América Latina. Esses
acordos encorajam as empresas brasileiras,
pois elas têm mais chances de exportar.
Com a abertura, as empresas brasileiras serão
obrigadas a elevar sua produtividade, a investir
na inovação de processos e produtos, uma vez que
terão concorrência no mercado interno.
Por que alguns setores de nossa economia
têm desempenho bem pior do que outros?
Menezes: Há alguns problemas de mensuração
da produtividade setorial, porque os deflatores
utilizados podem ter uma influência grande no
cálculo do valor adicionado em termos reais
ao longo do tempo. Ainda assim, pode haver
diferenças entre os setores, dependendo da
inserção internacional das firmas, das tarifas de
importação que protegem os setores e que variam
entre eles (de acordo com o poder de lobby
de cada um) e da importância da tecnologia
específica a cada setor.
Qual é a relação entre
produtividade e inovação?
Menezes: A produtividade está intimamente
ligada à inovação, tanto que os setores mais
inovadores são os que têm maiores ganhos de
produtividade. Os ganhos de produtividade
provocam redução de custos, que pode ser
repassada ao preço para o consumidor, se houver
concorrência no setor, ou aumentar o lucro.
Rico: Sem inovação e sem incorporação de novas
tecnologias, a produtividade fica comprometida
no médio e longo prazos em qualquer setor. Além
disso, se uma empresa não inova, ela vai ter a
concorrência da que inova, e isso compromete
não só sua produtividade, mas também
sua competitividade. Ela pode até manter a
produtividade elevada no curto prazo, porém a
competitividade vai por água abaixo.
Rico: O Brasil começa a ter uma produtividade
cada vez mais uniforme – em um patamar baixo.
Ou seja, isso se dá pela perda da produtividade
da indústria e não porque os outros setores
estão subindo. É algo bem preocupante e fica
evidente pela perda que temos nas exportações
de produtos manufaturados.
Um olhar diferente sobre a produtividade do trabalho
Recentemente, a PwC fez uma pesquisa em 11 países, incluindo o Brasil, para saber onde estavam os
profissionais mais adaptáveis. Cruzou informações sobre os profissionais disponíveis na rede social
LinkedIn, como quantidade de promoções e mudanças de emprego, com informações sobre empregadores
da base de dados PwC Saratoga, como flutuação do número de vagas e produtividade declarada. O
resultado foi desconfortável para nós: a força de trabalho brasileira se mostrou pouco flexível a mudanças
de função e a aprender habilidades novas, ao contrário do que se pensa.
Poucos o percebem talvez, mas a adaptabilidade tem impacto direto sobre a produtividade do trabalho
no dinâmico mercado atual. No estudo, a PwC estima que uma melhor combinação entre competências
de colaboradores e requisitos de empresas poderia gerar cerca de R$ 25 bilhões anuais em ganhos de
produtividade para a economia brasileira. De outro lado, a incompatibilidade entre pessoas e cargos
tem um custo direto de R$ 140 milhões ao ano em gestão de pessoas. Não à toa, o tema é uma grande
preocupação de nossos CEOs e talvez explique um pouco da defasagem gerencial citada na conversa
entre Gabriel Rico, da Amcham, e Naercio Menezes, do Insper. Acrescente-se, contudo, que a baixa
capacidade de adaptação não é responsabilidade exclusiva dos profissionais; os recrutadores também
têm sua parcela de culpa, assim como a educação.
Em nosso estudo, foram analisados 11 países: além do Brasil, Alemanha, Austrália, Canadá, China,
Singapura, Estados Unidos, França, Holanda, Índia e Reino Unido. O Brasil ficou em nono lugar no
ranking de capacidade de se adaptar ao dinamismo do mercado de trabalho e o primeiro colocado
foi a Holanda. Calculamos que, se os profissionais dos 11 países pesquisados pela PwC fossem tão
adaptáveis quanto os holandeses, abertos a novas competências, a economia mundial ganharia o
equivalente a R$ 282 bilhões anuais em produtividade. Não é pouco.
Para ler a pesquisa Adaptar para Sobreviver, acesse http://www.pwc.com.br/pt/publicacoes/
servicos/consultoria-negocios/hrs-linkedin-14.jhtml.
opinião ceo 15
A revista The Economist cita o setor
agrícola brasileiro como exemplar
em ganhos de produtividade após a
desregulamentação nos anos 1990.
A desregulamentação é o caminho?
Menezes: Sim, a desregulamentação é
importante para aumentar a produtividade,
porque aumenta a concorrência. O setor
agrícola é um exemplo de grande aumento de
produtividade real, devido à interação entre
a pesquisa acadêmica da Embrapa e o setor
privado. Além disso, a liberalização comercial
também aumentou a produtividade, ao acentuar
a concorrência internacional e eliminar os
produtores ineficientes.
Rico: Quando deixou de existir a garantia
governamental de compra da produção agrícola
por um preço mínimo e a agricultura passou a
contar apenas com o mercado, houve um grande
investimento do setor em tecnologia. Assistimos
então ao contínuo crescimento da produtividade
na agricultura, que se tornou absolutamente
competitiva em relação a qualquer país no mundo.
A competitividade em nossa agricultura só não
é maior porque o custo da logística no Brasil a
joga para baixo. Desregulamentar significa fazer
as forças do mercado atuarem e dar espaço para
que haja investimento em tecnologia, com o
empresário tendo confiança em atuar. Esse é o
salto que precisamos dar na indústria agora.
“A proteção às empresas nacionais
tende a levar a certo comodismo.
O protecionismo existe porque o ambiente
de negócios é hostil” Gabriel Rico
É realista a expectativa de grandes
aumentos de produtividade?
Menezes: A produtividade cresce em torno
de 1% a 3% ao ano nos chamados países de
fronteira, como Estados Unidos, que estão sempre
avançando com o uso de novas tecnologias. Nos
países mais atrasados, como o Brasil, ela deveria
avançar mais do que isso, porque o mero acesso
às melhores técnicas produtivas já nos permitiria
grandes saltos de produtividade em relação ao
que temos. No entanto, nossas empresas não têm
incentivos para adotar as melhores técnicas para
fabricar seus produtos.
Rico: Claro que é muito mais difícil elevar a
produtividade quando você já tem altos índices
de produtividade. Mas, no caso do Brasil, a
possibilidade de crescermos a altas taxas é
realmente muito grande, ainda que não seja fácil.
A produtividade do Brasil em notas de 1 a 10, segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI)
disponibilidade
e custo de mão
de obra
5,4
ambiente
macroeconômico
5,5
disponibilidade
e custo de
capital
infraestrutura
e logística
3,5
ambiente
microeconômico
6,7
4,5
3,6
tecnologia
e inovação
educação
2,6
Fonte: Pesquisa Competitividade Brasil, de 2013, da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
16 ceo opinião
peso
dos tributos
2,4
Divulgação Insper
Naercio Aquino Menezes Filho
Professor titular do Insper e coordenador
de seu Centro de Políticas Públicas
Desconstruindo Menezes
Professor titular do Insper e coordenador de seu Centro
de Políticas Públicas (CPP), Menezes tem doutorado em
economia pela Universidade de Londres, com mestrado e
graduação, também em economia, pela Universidade de
São Paulo. Suas especialidades são educação, mercado de
trabalho, distribuição de renda, produtividade, tecnologia
e desemprego.
“A desregulamentação é
importante para aumentar a
produtividade, porque aumenta
a concorrência” Naercio Menezes
O que pode ser feito imediatamente pelo
governo para impactar a produtividade?
Menezes: Melhorar a qualidade da educação
com políticas de meritocracia, premiando os
melhores professores, escolas e alunos, é algo
que pode ser imediato. Idem para aproximar as
universidades das empresas, com agências que
façam essa intermediação.
Dá para aumentar a concorrência nos mercados
internos rapidamente, reduzindo as tarifas de
importação. Também é factível fazer políticas
industriais mais horizontais, que sejam avaliadas
de maneira rigorosa e que possam excluir delas
as empresas que não alcancem metas específicas.
Eu acrescentaria a elevação da poupança pública,
para aumentar os investimentos em infraestrutura
e reduzir os custos de transporte. Outras medidas
são simplificar a estrutura tributária, que é muito
complicada e impede o crescimento das firmas
pequenas e médias, e facilitar abrir e fechar
empresas para ampliar a concorrência.
Rico: A Amcham defende medidas que visem
a melhoria do ambiente de negócios no país
em três eixos. No primeiro eixo, é preciso
racionalizar o gasto público, fazer uma reforma
tributária que simplifique a forma de pagar
impostos no Brasil, atualizar a legislação
trabalhista sem reduzir os direitos dos
trabalhadores, atualizar também a lei que rege as
licitações e compras públicas, fortalecer o corpo
técnico das agências reguladoras.
No segundo eixo, propomos aumentar a inserção
do Brasil na cadeia global de valor, negociando
acordos comerciais especialmente com os Estados
Unidos, a União Europeia e a América Latina.
O terceiro eixo é o do aumento da produtividade
em si, que passa por simplificar e incentivar a
criação de startups, fomentar novos polos de
inovação no Brasil, modernizar o registro de
patentes, aproximar universidades e empresas,
criar mecanismos que facilitem o investimento em
tecnologia e na melhoria dos processos produtivos
e melhorar a qualificação da mão de obra com o
fortalecimento do ensino médio profissionalizante
e da área de ciências exatas no ensino superior. n
opinião ceo 17
pesquisa
CEOs do Brasil
priorizam
a inovação
O rearranjo econômico global, com revitalização
das economias mais maduras, faz com que 45%
dos líderes nacionais priorizem a inovação de
produtos e serviços, um aumento de 16 pontos
percentuais sobre o último levantamento, e se
preparem mais efetivamente para isso
As nuvens negras que haviam
se instalado sobre as economias
europeias e norte-americana desde
o cataclismo econômico-financeiro
de 2008 estão se dissipando e já se
percebem sinais de prosperidade. Os
executivos que definem as estratégias
de suas corporações veem um novo
arranjo na economia global, com os
mercados mais maduros em processo
de revitalização e as economias
emergentes perdendo velocidade.
18 ceo pesquisa
Essa mudança de expectativas foi
registrada pela 10ª Pesquisa de Líderes
Empresariais Brasileiros, derivada
da 17ª Pesquisa Anual Global com
CEOs, sondagem realizada com 1.344
executivos em 68 países pela PwC. A
notícia poderia ser ruim para o Brasil,
como uma das principais economias
emergentes do planeta, mas não
necessariamente o é. Como tem
reflexos nas perspectivas dos líderes
empresariais mundiais, injetando-lhes
um nível maior de otimismo em relação
ao futuro, acaba por beneficiar os
negócios brasileiros.
Mesmo diante de um ambiente
doméstico mais desafiador, 30%
dos líderes brasileiros creem que a
economia vai crescer nos próximos
12 meses (ante 27% em 2013),
58% apostam em estabilidade (dois
pontos percentuais a mais que no ano
anterior) e apenas 13% acreditam que
a situação vai piorar. Reduziu-se o
pessimismo do último levantamento,
portanto, quando 18% previam a piora.
Em um horizonte ampliado de três
anos, 33% dos CEOs brasileiros
esperam maior crescimento da receita.
Se, de um lado, isso representa queda de
sete pontos percentuais na comparação
com o resultado de 2013, eles vêm
tomando as medidas para proteger-se.
Por exemplo, tanto quanto as lideranças
empresariais dos mercados mais
maduros, os executivos brasileiros
acreditam agora que a inovação
em produtos e serviços consiste na
principal oportunidade de expansão de
seus negócios – a opção de aumentar a
participação nos mercados em que já
atuam caiu para a segunda posição.
Além disso, os CEOs brasileiros
mostram-se particularmente atentos
a duas tendências: 93% apontam os
avanços tecnológicos como vertente
determinante (ante 81% em todo o
mundo) e 75% citam o deslocamento
do poder econômico global (ante 59%
no mundo). Apenas as mudanças
demográficas, foco de 60% dos
líderes globais, ainda não recebem
tanta atenção aqui (só 48% dos CEOs
brasileiros as mencionam).
Essas tendências não são novidade –
vêm aparecendo nos levantamentos
anteriores –, mas os líderes
entrevistados da pesquisa de 2014
reconhecem que o ritmo em que
evoluem acelerou-se. Dois exemplos?
Se o telefone levou 76 anos para chegar
a 50% dos lares norte-americanos,
o smartphone alcançou a mesma
capilaridade em menos de 10 anos.
E, se no Reino Unido de hoje 19% dos
consumidores são nativos digitais,
em 2020 eles já serão 61%.
Os CEOs estão se dando
conta do aumento da
velocidade das mudanças,
como prova o fato de que,
hoje, os nativos digitais
são apenas 19% dos
consumidores do Reino
Unido e, em 2020, eles
serão 61%
Eles estão preocupados com
a desaceleração econômica
78%
dos líderes
brasileiros
65%
dos líderes
mundiais
Esses fatores devem levar à formação
de um ambiente de negócios
completamente diferente, acreditam
os executivos. Tendem a transformar
a maneira como as pessoas vivem e
trabalham, bem como a relação das
corporações com seus stakeholders.
Isso traz oportunidades de inovação
e crescimento, cada vez mais
percebidas pelos CEOs. Eles também
estão se dando conta de que essas
oportunidades só poderão ser
aproveitadas se houver uma adequada
preparação de suas empresas para isso.
pesquisa ceo 19
Estados Unidos ganham importância,
por Fernando Alves
O que vai acontecer nos próximos 12 meses? Entre os
líderes brasileiros entrevistados em nossa pesquisa, o corte
de custos continua a ser a principal iniciativa, mas está em
queda: 58% informaram que pretendem adotar medidas
com esse objetivo em um prazo de 12 meses, ante 71% na
pesquisa anterior, o que significa uma redução de 13 pontos
percentuais. O recuo é mundial, mas bem menor lá fora:
64% em 2014 ante 70% em 2013.
Para os próximos 12 meses, as alianças estratégicas e
joint ventures estão no radar de uma quantidade maior de
executivos brasileiros. Um total de 40% confirmou que
recorrerá a essa prática – nos últimos 12 meses, 33% dos
brasileiros tomaram a mesma iniciativa.
40%
dos CEOs brasileiros
estão preocupados com
as mudanças nos padrões
de gastos e comportamentos
dos consumidores.
Em 2013, o percentual
era de apenas 13%
Percebemos ainda uma reviravolta nas apostas brasileiras em
relação ao crescimento econômico. Isso é observado no salto
que os Estados Unidos deram como mercado-alvo favorito
das empresas brasileiras.
Em clara recuperação econômica, os Estados Unidos foram
mencionados como alvo preferencial de quase metade dos
líderes do país (45%), enquanto, em 2013, não apareciam
nem entre os três primeiros lugares, então ocupados por
China, Alemanha e Reino Unido. Em 2014, o segundo
mercado-alvo dos brasileiros foi o México, com 23% do total
de escolhas, e a China apareceu como a terceira mais indicada,
apontada por 18% dos entrevistados.
Preparar as empresas
Um total de 40% dos CEOs brasileiros
revela-se preocupado com os riscos
que as mudanças nos gastos e no
comportamento dos consumidores
podem representar, o que é um salto
em relação à pesquisa anterior, quando
essa preocupação atingia 13% dos
entrevistados, embora ainda não seja
um percentual tão elevado quanto o da
amostra global, de 52%.
Quase metade dos CEOs brasileiros
entrevistados (45%) acredita que
o caminho do crescimento está em
desenvolver novos produtos e serviços,
enquanto, no mundo todo, essa é
a aposta de 35% dos consultados.
Como comparação, no ano passado, o
desenvolvimento de novos produtos e
serviços era o caminho de crescimento
apontado por 25% dos executivos
globais e por 29% dos brasileiros.
20 ceo pesquisa
O que se nota é que as lideranças
brasileiras estão à frente quando se
considera transformar intenção em ação,
pelo menos em 2014: 33% dos CEOs do
Brasil já começaram ou até concluíram
as mudanças planejadas para tornar suas
empresas mais inovadoras; no mundo,
esse percentual é de 27%.
Se isso for esmiuçado, verifica-se
que pouco mais da metade dos CEOs
brasileiros (53%) enxerga a preparação
no sentido de usar e gerenciar o big data
(ante 28% no mundo), enquanto 45%
estão redefinindo seus investimentos em
tecnologia de modo geral (um indicador
que cai para 35% na amostra mundial).
Reestruturar-se pela
redução de custos
Ao questionamento sobre quais
atividades de reestruturação os líderes
entrevistados iniciaram nos últimos 12
meses, a iniciativa mais apontada foi a
implementação de medidas visando a
redução de custos. Entre os executivos
globais, 76% relataram ter adotado a
prática – o mesmo percentual verificado
entre os líderes empresariais dos Brics.
Confiança no crescimento
A pesquisa da PwC perguntou aos líderes empresariais quais dessas
oportunidades de crescimento eles devem perseguir nos próximos 12 meses
Brasil
Brics
Global
inovação de
produtos e serviços
45%
40%
participação maior
nos mercados
existentes
33%
30%
novos mercados
geográficos
15%
14%
novas joint ventures
ou alianças
estratégicas
fusões e aquisições
sem resposta
12%
11%
3%
9%
8%
1%
5%
7%
8%
1%
25%
35%
Entre os executivos brasileiros, a
propensão a cortar despesas é ainda
maior: foi apontada por 78% do
total. Em relação à pesquisa anterior,
observa-se que a adoção da prática
permaneceu praticamente estável entre
os executivos mundiais – 77% dos
consultados relataram sua opção no
ano passado –, mas avançou bastante
entre os Brics (apenas 62% dos líderes
do bloco reportaram sua adoção em
2013 e 71% dos CEOs do Brasil).
Preservar os colaboradores e a
função social da empresa
No que diz respeito à gestão do capital
humano, a pesquisa de 2014 da PwC
revela que a principal opção entre
os líderes consultados é a de manter
intocado o quadro de colaboradores.
Essa alternativa foi a mais indicada
pelos executivos globais (29% do
total) e, principalmente, pelos líderes
brasileiros (33%).
Vale destacar que a opção de
incrementar o quadro de colaboradores
em até 5% foi uma alternativa indicada
por 25% dos executivos globais e por
20% dos brasileiros.
Isso se mostra em consonância com a
crença dos líderes brasileiros de que
a empresa tem um papel social. Foi
de 88% o percentual de entrevistados
que declararam: “Satisfazer as
necessidades da sociedade, além
daquelas dos investidores, clientes e
funcionários, e proteger os interesses
das gerações futuras é importante
para meu negócio”.
33%
dos executivos
brasileiros apostam
na ampliação do
faturamento em
um período de
três anos (eram 40%
em 2013)
Na amostra mundial, esse percentual
foi significativamente menor: 75%. A
preocupação em informar o impacto
total das atividades da empresa, e não
apenas o impacto financeiro, como
forma de pavimentar o sucesso de
longo prazo também foi externada por
88% dos CEOs brasileiros, ante 74%
dos líderes globais.
pesquisa ceo 21
Mudam os obstáculos externos percebidos
A sondagem realizada pela PwC com os CEOs brasileiros mapeou, como faz tradicionalmente,
as principais ameaças a seus negócios vislumbradas no cenário político-econômico e, na escala de
preocupações dos entrevistados, houve uma mudança significativa.
Se, em 2013, o principal temor eram as incertezas ou a volatilidade do crescimento econômico,
indicado por 67% dos CEOs do Brasil e por 81% dos líderes globais, em 2014, três outros itens se
apresentaram quase empatados:
• Excesso de regulação – apontado por 78% dos executivos brasileiros e por 72% dos líderes globais.
• Resposta do governo ao déficit fiscal e encargos da dívida – indicada por 80% dos CEOs brasileiros e
71% dos globais.
• Contínua lentidão ou crescimento negativo no desenvolvimento das economias – segundo 68% dos
líderes brasileiros e 70% dos executivos globais.
Em relação aos dirigentes brasileiros especificamente, as preocupações quanto ao aumento da carga
tributária foram particularmente grandes: 85% dos CEOs brasileiros manifestaram-se assim, ante 70%
dos executivos globais. Mesmo entre os líderes das economias emergentes dos Brics, esse percentual
é inferior – 71%. Além disso, 83% de nossos CEOs se dizem preocupados com o aumento dos custos
trabalhistas nos mercados em crescimento e 78% apontam o suborno e a corrupção como ameaças ao
aumento das receitas.
A maior dor de cabeça dos executivos brasileiros na comparação com seus pares dos Brics e do
restante do mundo parece ser, no entanto, a inadequação da infraestrutura básica. No Brasil, esse
tema desperta temores em 88% dos profissionais, ante um indicador de 60% na amostra dos Brics e
apenas 47% dos líderes globais.
Planos de curto prazo
(um ano) devem reduzir-se
eles são
15%
do planejamento
total
devem
cair para
3%
22 ceo pesquisa
Estender o horizonte
do planejamento
A 10ª Pesquisa de Líderes Empresariais
Brasileiros ainda evidenciou que
nossos executivos querem esticar seu
horizonte de planejamento. Planos de
três anos são a maioria hoje – para 48%
dos entrevistados – e devem continuar
a sê-lo na mesma proporção. Mas o
planejamento de um ano, assinalado
por 15% dos entrevistados, deve ser
reduzido idealmente para 3%, enquanto o
planejamento de cinco anos deve subir de
28% para 30% e o de mais de cinco anos,
de 10% para 18%.
Inquietações
Duas inquietações estão impedindo que
os CEOs brasileiros avancem mais em
suas transformações: a incerteza sobre
como converter seus achados em inovação
sistemática e o temor de que uma nova
tecnologia surja e anule seus esforços.
Cerca de 45% dos líderes brasileiros
consideram a velocidade das mudanças
tecnológicas uma ameaça a suas
perspectivas de crescimento, um
aumento significativo em relação
ao registrado na pesquisa anterior,
quando esse percentual era de 31%.
Diga-se que, na amostra mundial, o
percentual também cresceu, passando
de 42% para 47%.
Como eles vão reestruturar-se
Os líderes entrevistados pela PwC apontaram as atividades de reestruturação que suas empresas
iniciaram nos últimos 12 meses; no Brasil, a redução de custos se destaca (em %)
Brasil
Brics
Global
78 76 76 33 29 34 10 20 25 13 18 21 13 9 17 15 15 17
iniciativa de
redução de
custos
nova aliança
estratégica
ou joint
venture
terceirização
de processo
de negócios
ou função
Ficou mais evidente que optar pelo
“lado errado” ao embarcar em uma
nova tendência tecnológica pode
resultar em sérias consequências.
Alguns entrevistados também mostram
desconhecimento em relação à
utilização dos dados coletados em
suas estratégias de big data. n
Para ler a pesquisa de líderes
da PwC, acesse http://www.pwc.com.
br/pt/ceo-survey-brazil/index.jhtml
e, para aprofundar-se em inovação,
confira o link http://www.pwc.com.br/
pt/publicacoes/servicos/consultorianegocios/inovacao-revolucionariacrescimento.jhtml.
fusão ou
aquisição
no mercado
doméstico
fusão ou
aquisição
internacional
internalização
de um
processo de
negócios ou
função antes
terceirizados
8 13 15
0 12 13
saída de uma
empresa
ou de um
mercado
significativo
finalização de
uma aliança
estratégica
ou joint
venture
A preocupação em
informar o impacto total
de suas atividades, a fim
de pavimentar o sucesso no
longo prazo, foi externada
por 88% dos líderes
brasileiros, ante 74%
da amostra mundial
A tecnologia é fator
dominante de mudança para
93%
dos líderes
brasileiros
81%
dos líderes
mundiais
pesquisa ceo 23
Divulgação Fiat
Paulo Matos
Executivo de planejamento estratégico
e inovação da Fiat Chrysler Latam
entrevista
Inovação é
a chave para a
sobrevivência
24 ceo entrevista
Há 23 anos na Fiat, o engenheiro Paulo
Matos está à frente da área de planejamento
estratégico e inovação da Fiat Chrysler na
América Latina. Diretamente envolvido na
implementação do destacado modelo de gestão
da inovação da companhia, ele esclarece seus
pilares e enfatiza a importância de haver uma
“rede articulada de pessoas”
Quando a Fiat se instalou no
Brasil, nos anos 1970, veio com
o Fiat 147, que era um carro
inovador por ser ultraeconômico
em época de crise do petróleo.
Houve até um anúncio em que ele
percorria os 14 quilômetros da
ponte Rio-Niterói com um litro
de gasolina. Mas sua reputação de
inovadora é recente. Por quê?
Como a empresa mudou o status?
O lançamento do Uno, na década
de 1990, com o desenvolvimento de
produto e estratégia de marketing
locais, foi o início da trajetória até
chegar ao posicionamento de inovação
atual, em que investimos ativamente
em inovar. O fato de o foco ter mudado
nesse tempo, da exportação de veículos
para a Europa, antes, para um esforço
concentrado na operação brasileira,
agora, contribuiu para isso – hoje, a
Fiat é considerada a montadora mais
brasileira que há, porque é muito
próxima do mercado.
A seu ver, inovar é principalmente
lançar produto novo?
Para nós, o foco é o de inovação do
modelo de negócio, o que nos faz olhar
o tempo todo para nosso negócio em
busca de novas oportunidades. Os
lançamentos de produtos são parte disso,
é claro. Nosso último lançamento, por
exemplo, foi a Strada, picape com cara de
automóvel, que pode ser usada no dia a
dia na cidade e no fim de semana no sítio
e também levar alguma carga. Mas os
exemplos de inovação vão muito além.
Costumamos dizer que nossa primeira
inovação foi o fato de a subsidiária se
instalar em Minas Gerais, em 1976,
quando todas as outras montadoras
se concentravam em São Paulo. Uma
inovação na abordagem ao mercado
é nossa Fiat Live Store (veja quadro na
página 28), na medida em que constitui
uma nova maneira de fazer contato com o
consumidor. A Fiat também inovou como
pioneira na participação nas redes sociais
no Brasil, utilizando-as para manter o
relacionamento com o cliente.
Nos processos, nossa inovação é muito
marcada pela preocupação com a
ecologia: a Fiat foi a primeira montadora
a ser certificada com o ISO 14001, há
quase 20 anos, e faz reciclagem de água,
reaproveitamento de material etc.
Na manufatura especificamente, nosso
processo de melhoria contínua vem
desse posicionamento de inovação,
assim como o programa Boas Ideias e
Soluções (BIS), segundo o qual pode-se
premiar com um carro o colaborador cuja
ideia proporcione uma vantagem para a
empresa – lucro ou economia.
Outros fatores muito importantes foram
contar com uma estrutura local e não mais
restringir a operação apenas a produto.
entrevista ceo 25
Qual a importância da
universidade corporativa da Fiat
no Brasil para esse viés inovador?
É total. O Isvor, que ganhou a forma de
universidade corporativa em 2008, é
que nos dá toda a sustentação para a
inovação, seja formando pessoas para
inovarem, seja apoiando os projetos com
conhecimento. Sempre que instalamos
uma atividade que põe as pessoas para
inovar, o Isvor está envolvido.
Lembrando que buscamos inovar
no modelo de negócio, precisamos
conseguir que ninguém fique fechado
dentro de sua torre. O pessoal de
compras não pode olhar só para novos
fornecedores; o pessoal de manufatura
não pode preocupar-se apenas com
processos; o pessoal de produto e
marketing não pode concentrar-se só no
produto. Do contrário, um modelo de
negócio não consegue uma articulação.
Então, temos de formar as pessoas e
expô-las a essas ideias.
É o Isvor que tem toda a estrutura
para fazer isso, ministrando cursos
e organizando debates a respeito de
inovação e modelos de negócio.
O Isvor ainda mantém publicações e um
canal de comunicação com a liderança,
em que levanta regularmente tópicos
relacionados com inovação e “provoca”
o tema dentro da empresa.
A nova geração de profissionais que
chega à Fiat vem da universidade
com a semente da inovação?
O que as universidades mais avançadas
estão pregando em relação à inovação é a
formação em T, ou seja, aprofundam-se
nos assuntos de determinado curso, mas
também começam a promover
uma interdisciplinaridade.
Isso casa muito bem com o que é
preciso para que uma pessoa seja
inovadora em uma empresa como a
Fiat. Independentemente da área de
formação, a pessoa tem de falar com
interlocutores das demais áreas da
companhia, aliando o conhecimento
técnico e profundo com a capacidade de
promover o diálogo transversal; isso é
fundamental para ter inovação.
Um exemplo de instituição de ensino
que adota essa linha é a Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG), cuja
escola de engenharia está prestes a
lançar uma disciplina de inovação.
Fomos até convidados a participar
dessa construção baseada em
interdisciplinaridade, transversalidade
e inovação dentro das organizações.
Elevados orçamentos de pesquisa e
desenvolvimento (P&D) garantem
liderança em inovação? Uma
pesquisa de 2006 da então Booz &
Company, atual Strategy&, mostrou
que as empresas mais inovadoras
têm orçamentos mais enxutos.
Investimento em tecnologia é
fundamental para fazer inovação,
e o orçamento é necessário nesse caso.
Mas inovação não é só isso.
Na Fiat, boa parte das inovações
talvez não tenha dependido de um
grande esforço de P&D, e sim de uma
articulação interna entre os atores.
Alinhados com o mercado, soubemos
sintonizar o pessoal de marketing, de
finanças, de produto e de design.
“Na Fiat, boa parte das inovações talvez não
tenha dependido de um grande esforço de P&D,
e sim de uma articulação interna entre os atores.
Alinhados com o mercado, soubemos sintonizar
o pessoal de marketing, de finanças, de produto
e de design”
26 ceo entrevista
“Nosso modelo de
gestão da inovação
leva em conta oito
elementos. Se eles
estiverem bem
resolvidos, sabemos
que a inovação
funcionará bem”
Jay Rao e Joseph Weintraub,
especialistas do Babson
College, dos Estados Unidos,
elaboraram um modelo que
reúne os elementos-chave que
estruturam uma cultura de
inovação. A Fiat tem esses blocos
construtivos de inovação?
Sim, nosso modelo de gestão
da inovação leva em conta oito
elementos que são importantes para
a inovação acontecer dentro da
empresa, os tijolinhos que constroem
a base de nosso processo de inovação.
O primeiro é a organização – como
estamos organizados para alavancar a
inovação, incluindo o grupo central e
pivôs nas diversas áreas.
O segundo é o conjunto de processos
e metodologias para dar suporte aos
projetos. Quando alguém precisa fazer
uma abordagem mais inovadora, há
processos e métodos mais robustos para
gerar ideias e filtrá-las.
O terceiro tijolinho é a plataforma de
suporte intranet, que recolhe ideias das
várias áreas.
A questão da imagem e comunicação,
sobre como comunicar e falar
de inovação com o conselho de
administração, o corpo gerencial,
analistas de mercado e operários,
é o quarto bloco construtivo.
Há ainda a formação das pessoas,
em sexto lugar, onde entra a
universidade corporativa.
O sétimo tijolo são as métricas e a
avaliação, ou como medir e como
estamos caminhando.
Em oitavo e último lugar, aparecem
as redes de colaboração, internas
e externas, para gerar inovação.
As externas podem envolver
universidades, fornecedores, clientes.
Se esses oito pilares estiverem bem
resolvidos, sabemos que a inovação
funcionará bem.
Alguns creem que as empresas
dão pouca atenção ao que envolve
pessoas na inovação, até por serem
questões mais difíceis de medir.
Como é isso na Fiat?
Evitamos ficar só na retórica com as
pessoas. Além dos oito tijolos que nos
servem de ferramentas, temos, em meu
modo de ver, dois elementos-chave
de gestão da inovação: resultado da
inovação e cultura da inovação.
Algo só é inovação se traz resultado
para a empresa. Se hoje eu falo que
determinada picape de cabine dupla,
adventure, é inovadora, é porque ela
trouxe resultado para a empresa,
conquistou a liderança do mercado,
tem boa margem de lucratividade.
O quinto tijolo é a estratégia objetiva,
ou o que queremos de inovação para
a empresa e de qual tipo.
Desconstruindo Paulo Matos
Mineiro de Itabira, Paulo Márcio Bragança de
Matos é graduado em engenharia mecânica pela
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG),
mestre em administração, pós-graduado em
gestão de negócios e tecnologia da informação
pela Fundação Getulio Vargas (FGV) e tem
especialização em engenharia automotiva pela
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
Matos ingressou na Fiat no Brasil em 1991,
na área de engenharia de produtos, quando
participou do processo de consolidação do polo
de fornecedores estabelecido em Betim (MG).
No cargo atual, de executivo de planejamento
estratégico e inovação da Fiat Chrysler Latam,
o engenheiro participou de vários projetos e
iniciativas, com destaque para a condução dos
projetos do Fiat Mio e do conceito Uno Ecology,
além de ter se envolvido na implementação do
modelo de gestão da inovação da empresa.
Matos mantém ligação direta com a universidade.
Ele é professor das disciplinas de estratégia,
desenvolvimento de produtos e gestão de projetos
do Centro Universitário Una e da Fundação Dom
Cabral e, ainda, professor convidado da UFMG.
entrevista ceo 27
Divulgação Fiat
Fiat Live Store
Inovadora plataforma
de imersão da Fiat
Fiat Live Store:
case premiado em Cannes
A Fiat Live Store, projeto lançado no
segundo semestre de 2013, foi o único
case brasileiro premiado na segunda
edição do Innovation Lions, do Festival
de Publicidade de Cannes, que enfatiza
a inovação na comunicação. A Fiat
ficou com um Leão de inovação, ao
lado de um case norte-americano e um
francês; o Grand Prix foi para a Rússia.
A plataforma Fiat Live Store (“loja
ao vivo”), montada em um estúdio
de cerca de 600 metros quadrados
em Betim (MG) em parceria com
a AgênciaClick Isobar, permite ao
consumidor uma experiência de
imersão, como se ele estivesse dentro
do carro. Depois de preencher um
curto cadastro ou se conectar pelo
Facebook, o cliente escolhe um modelo.
Do estúdio, um especialista, usando
um headset equipado com câmera de
alta resolução (que fica na altura
28 ceo entrevista
dos olhos dele) e microfone, mostra
em um carro real o que o consumidor
pede e tira as dúvidas que surgirem.
“A pessoa que está à frente do produto
vai explicando características, atributos
e também exibe filmes. Assim, o
cliente pode mergulhar no produto”,
explica Paulo Matos, executivo de
planejamento estratégico e inovação da
Fiat Chrysler Latam.
Ao todo, a Fiat recebeu cinco Leões
no festival de 2014, o que demonstra
que a inovação da empresa se
estende à publicidade. Além do
prêmio de inovação, a Fiat Live Store
proporcionou um Leão de Bronze em
Mídia. Os demais conquistados foram
um Leão de Prata na categoria Rádio,
pela campanha “Vem pra rua”; um
Leão de Bronze na categoria Marca
& Conteúdo, pelos filmes Contos da
Rua; e outro de Bronze na categoria
Jornal, pela campanha “Não faça a
maquiagem e dirija”.
Quanto a uma cultura para a
inovação, é preciso criá-la e, de fato,
mexer com cultura organizacional
é complicado. Na Fiat, precisamos
ficar o tempo todo falando de inovar,
para embutir essa ideia na cabeça
das pessoas, porque inovação tende
a ser algo etéreo e abstrato, ou “algo
para P&D cuidar”. E não é assim;
todo mundo tem de fazer inovação,
exatamente como deve cuidar de
qualidade e excelência operacional.
Se trazemos resultado, começamos
a criar cultura; e, se criamos cultura,
trazemos resultado.
Na Fiat, temos projetos voltados para
fomentar a cultura da inovação e
também precisamos ter projetos voltados
para os resultados da inovação. São duas
alavancas para garantir que as pessoas
façam a inovação funcionar.
“Talvez o que mais
explique a inovação
na Fiat seja o fato de
estarmos o tempo todo
abertos a questionar
as coisas e nos
articular para isso,
quebrando barreiras
e paradigmas”
Então, o senhor considera sua
cultura corporativa inovadora?
Sim, temos a cultura da inovação,
segundo a qual se fica o tempo todo
questionando tudo e se diz “não basta
fazer, tem de fazer diferente”. Isso nos dá
a justificativa para sermos mais abertos
e mais ágeis do que muitas empresas.
Mas a cultura de uma empresa tem
vários vieses. A Fiat no Brasil tem uma
cultura de controle de custos que é bem
importante e veio de quando o Belini
[Cledorvino Belini, atual presidente do
grupo para a América Latina] assumiu a
direção da Fiat, em 2004.
Vocês usam design thinking?
Sim! Um engenheiro, como eu, até
pode achar desestruturada a forma de
os designers pensarem e abordarem um
problema. Mas não é. O Isvor faz um
esforço grande em relação ao design
thinking e acredito que já trabalhávamos
nessa linha até antes de ter a escola.
Por exemplo, quando estávamos
lançando o novo Uno, pusemos o
olhar para o cliente antes do olhar
para o produto. Fizemos uma pesquisa
antropológica e etnográfica com o
público-alvo para poder sustentar todo o
desenvolvimento do projeto. O Fiat Mio
também foi algo nessa linha.
Aliar tecnologia, negócios e
fatores humanos com factibilidade,
viabilidade e desejabilidade é um
jeito extremamente interessante de
desenvolver um produto, mas não é
fácil. Isso porque, à medida que vai
crescendo, a Fiat no Brasil precisa de
mais processos e metodologias, que
nem sempre são tão fluidos como
requer a proposta do design thinking.
É um desafio diário.
Talvez o que mais explique a inovação
na Fiat, de tudo o que eu falei, seja o
fato de estarmos o tempo todo abertos a
questionar as coisas e nos articular para
isso, quebrando barreiras e paradigmas.
É uma rede bem estabelecida que faz isso
e, sem ela, o todo não funciona.
O senhor já afirmou que “inovar
não é questão de vontade ou
capacidade, mas de sobrevivência”.
Não há exagero?
Não. No mundo, há vários exemplos de
empresas que estão morrendo porque
deixaram de ter a capacidade de inovar,
perderam o timing de uma mudança no
mercado – seja de uma tecnologia, seja
de um comportamento. Ficar parado hoje
equivale a andar para trás.
O que falta à inovação da Fiat?
Se olharmos nossa arquitetura de
inovação, veremos que ainda há um
longo caminho a percorrer; não temos
tudo pronto. Eu costumo dizer que
meu objetivo estratégico, na área da
gestão da inovação, vai aparecer daqui
a cinco anos, quando a Fiat não mais
precisará de um Paulo Matos para
tocar sua inovação.
O que falta à inovação do país?
Os desafios são vários. Por exemplo,
ainda temos problemas no nível das
universidades, na formação do tipo de
profissional inovador de que precisamos,
com um approach mais de inovação de
negócios do que de inovação tecnológica.
A interação entre startups e grandes
empresas também consiste em um
desafio enorme. E o planejamento do
futuro, por sua vez, é o desafio crucial; o
governo federal deve criar uma agenda
de longo prazo para o Brasil. n
entrevista ceo 29
ensaio
Uma revolução
da liderança
Abordagem da PwC para o desenvolvimento de líderes
enfatiza seus pontos fortes em vez de buscar corrigir
suas fraquezas
Como sua empresa trabalharia com um líder
que é bom estrategista, mas deixa a desejar na
gestão de operações? Como muitas organizações
insistem em tentar corrigir os pontos fracos de
seus líderes, possivelmente ela não pouparia
esforços para melhorar suas habilidades
operacionais, sem se preocupar com sua
capacidade estratégica.
O que essas empresas não sabem é que, assim,
estão perdendo valiosas oportunidades de
avanço na capacidade de liderança e nos
negócios de modo geral. Já foi comprovado
que as organizações tornam-se mais eficientes
quando priorizam a exploração dos pontos fortes
naturais de seus líderes.
A maneira de mudar esse panorama é
transformar radicalmente a forma de lidar com
aspectos fortes e fracos dos líderes: trata-se
de deixar que os líderes sejam eles mesmos,
aproveitando o que há de melhor e único em
cada um, como diz Andy Woodfield, sócio da
PwC do Reino Unido.
30 ceo ensaio
A obsessão corporativa em minimizar os
pontos fracos dos líderes e adequá-los ao que
está previsto na descrição de cargo tende a
mediocrizá-los. Como precisam agir como atores
que tentam cumprir um papel predeterminado,
em um esforço compensatório, eles deixam de
oferecer à organização o que têm de melhor.
Na avaliação de João Lins, sócio da PwC Brasil e
líder da consultoria de gestão do capital humano,
são muitas as empresas brasileiras que focam os
pontos fracos dos líderes; boa parte delas não se
deu conta da importância de trabalhar mais as
forças do que as vulnerabilidades de seus gestores.
Três fatores explicariam isso. O primeiro é
que a psicologia positiva – sobre a qual se assenta
a proposta de enfatizar as fortalezas de cada
um – é uma ciência recente, que começou a se
estruturar nos anos 1990, assim como é recente
sua aplicação no campo do desenvolvimento
de lideranças.
“Concentrar-se nos pontos fortes de seus líderes
torna a organização mais inovadora. Um ambiente
que dá segurança aos líderes para serem autênticos
permite que novas ideias surjam”
Andy Woodfield
O segundo fator diz respeito à superação de
um paradigma profundamente arraigado nas
metodologias tradicionais de liderança, segundo
o qual a ação de desenvolvimento de pessoas
deve ser corretiva e incidir principalmente sobre
os pontos fracos. Como a prática de enfatizar as
fortalezas questiona essa abordagem, é natural
que sofra resistência e leve um tempo para ser
assimilada e adotada.
O terceiro fator relaciona-se diretamente
com peculiaridades do ambiente corporativo
brasileiro. Segundo Lins, muitas das empresas
do país ainda não venceram desafios de gestão de
pessoas próprios do século 20, já resolvidos em
mercados mais maduros, como o aprimoramento
de competências básicas de planejamento e
gerenciamento de projetos e de processos. Então,
elas precisam lidar com esses desafios e com os
do século 21 simultaneamente.
Dos anos 1960 para o século 21
Nos anos 1960, o estudioso Peter Drucker foi
um dos pioneiros dessa visão de obter maior
produtividade explorando as fortalezas e não
investindo em melhorar as fraquezas dos gestores
– “perda de tempo”, segundo ele. Mas a visão
ganhou força, realmente, nos últimos anos.
No começo dos anos 2000, um estudo do
instituto de pesquisas Gallup sinalizou a
revitalização da abordagem. Seus pesquisadores
perguntaram a cerca de 200 mil trabalhadores
de 36 empresas do mundo, espalhados em quase
8 mil unidades de negócios, se eles tinham
oportunidade, diariamente, de fazer o que
sabiam de melhor. As respostas mostraram que
as unidades de negócios cujos colaboradores
tinham a oportunidade de usar seus pontos
fortes registravam maior produtividade, maior
fidelidade do cliente e menor rotatividade de
mão de obra. Em comparação, aquelas em que
essa percepção não existia ou era muito baixa
mostravam-se bem menos robustas e poderosas.
Mudou a psicologia
Historicamente, a psicologia focou deficiências,
desordens, fraquezas e outros aspectos negativos
do comportamento das pessoas, mas isso começou
a mudar na década de 1990. Foi quando a
chamada “psicologia positiva” procurou inverter
essa lógica, consolidando-se como uma nova
ramificação da ciência.
Desenvolvida principalmente por Martin
Seligman, diretor do Centro de Psicologia
Positiva e professor da Universidade da
Pensilvânia, dos Estados Unidos, a psicologia
positiva é o estudo científico dos pontos fortes e
virtudes que fazem os indivíduos e comunidades
prosperarem. Mostrando que, em 44 mil
artigos publicados em periódicos científicos de
psicologia, mais de 99% focavam deficiências
humanas de todos os tipos, como depressão,
raiva, medo e codependência, e menos de 1%
abordava virtudes, como inspiração, sabedoria,
coragem e esperança, Seligman concluiu:
trabalhar exclusivamente com as fraquezas
pessoais empobrece a abordagem psicológica.
Claire Horgan, consultora da PwC do Reino Unido
e especialista em psicologia positiva, explica que
o cérebro humano, para garantir a sobrevivência,
acostumou-se a focar os aspectos negativos:
quando nossos pontos negativos são enfatizados,
reagimos de maneira defensiva, como se fôssemos
ameaçados. Contrariamente, quando os aspectos
positivos são enfatizados, outra área do cérebro,
responsável pelas atividades racionais e lógicas,
é ativada, o que facilita abrir-se a algo fora de sua
zona de conforto.
ensaio ceo 31
Marcus Buckingham e Donald O. Clifton, que
fizeram a análise da pesquisa do Gallup, deram
um passo além ao concluir que não basta as
organizações se acomodarem ao fato de cada
colaborador ser diferente; elas precisam saber
capitalizar essas diferenças, implementando
mudanças na maneira de selecionar, avaliar,
desenvolver e encaminhar a carreira de cada um
com base em seus pontos fortes.
Para quem se assusta com o tamanho potencial
dessa transformação, Woodfield destaca que o
segredo é não tentar fazê-la de uma única vez.
Por exemplo, uma primeira mudança deve
ocorrer na forma de pensar da empresa; não
é necessária uma mudança estrutural, e sim
filosófica: a organização passa a ver cada
colaborador como um profissional único e a
enfatizar seus potenciais específicos.
Três vantagens
Quando exige de um líder que ele cumpra
exclusivamente o que está previsto para seu
cargo em detrimento de seus talentos naturais,
a empresa praticamente o obriga a agir como
um ator. Isso tem consequências perniciosas
para a organização, destacando-se, entre elas,
o bloqueio de seu potencial criativo, a maior
dificuldade em retê-lo e o aumento do esforço
necessário para colocar profissionais qualificados
nos cargos de liderança.
A criatividade é chave em um universo
corporativo que se move cada vez mais pela
inovação. Se desenvolver líderes com foco
em seus pontos fracos inibe a criatividade,
concentrar-se em seus pontos fortes torna a
organização mais inovadora, na análise de
Woodfield. Isso porque um ambiente que dá
segurança aos líderes para serem autênticos
permite que novas ideias surjam. “É apenas
quando podem ser elas mesmas que as pessoas
liberam ideias e talentos”, diz.
A criatividade é chave em um universo
corporativo que se move cada vez mais pela
inovação. Se desenvolver líderes com foco
em seus pontos fracos inibe a criatividade,
concentrar-se em seus pontos fortes torna
a organização mais inovadora
Um feedback que melhore
o desempenho de fato
A transformação do paradigma de
desenvolvimento de líderes requer uma mudança
em relação ao instrumento de feedback formal.
O sistema de avaliação de uma organização, que
hoje costuma enfatizar o que os líderes têm feito
de errado em 90% do tempo, deve transferir
sua ênfase para os pontos fortes. “Feedbacks
negativos, sobre deficiências, não ajudam”,
pondera Woodfield.
O sócio da PwC britânica advoga uma
alteração radical nessa postura. “Se a intenção
for realmente fazer as pessoas melhorarem
o desempenho, o caminho é explorar suas
fortalezas e singularidades.”
Lins concorda com a necessidade de mudança
de ênfase nos processos de avaliação brasileiros.
“O desenvolvimento de lideranças atualmente
enfatiza muito os pontos negativos, quando
deveria destacar as fortalezas”, afirma. Mas isso
não quer dizer que se vai tolerar a ineficiência.
32 ceo ensaio
Cordel Imagens
João Lins
Sócio da PwC Brasil e líder da consultoria
de gestão do capital humano
Diversidade de pontos fortes na equipe,
por João Lins
O século 21, marcado pelo aumento da complexidade,
determinou o fim do “cavaleiro solitário”. Não existem
mais heróis corporativos capazes de resolver todos os
problemas; atualmente as empresas buscam times de gestão
que consigam conduzir os negócios ao sucesso com uma
liderança integrada e coordenada.
Essa nova lógica do trabalho gerencial em equipe, em vez
de individual, favorece a ênfase nas fortalezas dos gestores,
contanto que haja uma diversidade destas.
Da mesma forma que a diversidade de ideias é considerada
essencial para todas as equipes, a diversidade de
fortalezas é fundamental para todos os times de líderes
em organizações que visam o sucesso. É fácil de entender:
quando os pontos fortes dos líderes variam, eles se
complementam e naturalmente compensam as eventuais
fraquezas. Isso leva não apenas ao equilíbrio da equipe de
líderes, mas a seu fortalecimento.
Claire Horgan, consultora da PwC do Reino
Unido, destaca que a abordagem de fortalecer
os pontos fortes não significa ignorar situações
como comportamentos inadequados e baixo
desempenho, e sim pede um novo tipo de
tratamento para esses problemas. “Identificados
os potenciais únicos de cada um, deve-se
entender o contexto em que os problemas estão
acontecendo e tentar ajudá-lo a partir daí; a
solução pode ser a reconfiguração das tarefas ou
até uma redistribuição”, comenta a consultora.
A implementação na prática
Como se traduz a abordagem que enfatiza as
fortalezas dos líderes na prática? Os programas
de desenvolvimento de lideranças devem ser
desenhados com essa premissa, o que implica
utilizar ferramentas e exercícios que abandonem
o foco nas deficiências dos profissionais e
priorizem a identificação e o reforço de seus
pontos fortes. n
ensaio ceo 33
tendência
Avanços e retrocessos da
gestão de riscos naturais
praticada no Brasil
Por Moacyr Duarte
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
Mudanças climáticas que geram excessos de chuva e seca
representam desafios cada vez maiores para o país, porque
sua incerteza aumentou muito; houve evolução nas etapas de
prevenção e preparação, e também na qualidade dos profissionais
e das tecnologias da área, mas ainda há muito por fazer
As mudanças climáticas tão noticiadas na atualidade
estão trazendo desafios novos e cada vez mais
complexos para governos, pessoas jurídicas e físicas
do Brasil. Desde o último quarto do século 20, o país
teve um progresso notável na maneira em que atua
diante de desastres naturais, mas, ainda assim, o
perigo está à espreita e é dinâmico.
As áreas de seca, por exemplo, não se limitam mais ao
semiárido nordestino; registramos recentemente seca
em nível grave na Amazônia e no Rio Grande do Sul
e, este ano, no Sudeste e em parte do Centro-Oeste.
A ameaça das enchentes continua presente, porque
boa parte das construções originais do território
nacional ainda é considerada irregular; ao cruzar
a quantidade de pessoas vivendo em encostas com
o potencial de chuva nessas regiões, conclui-se
que basta chover acima de um limite para que
haja desmoronamentos.
O passado explica nossos problemas, a maioria
dos quais deve sua raiz à forma de ocupação do
solo brasileiro. Os colonizadores portugueses se
interiorizaram a partir dos cursos d’água – o que
facilitava o deslocamento, sinalizava terra fértil e
garantia que ninguém morreria de sede, entre outras
razões. Como resultado, muita gente instalou-se ao
longo desses cursos.
34 ceo tendência
Do futuro ainda não sabemos, mas a esperança é
que a defesa contra desastres naturais seja uma
política de Estado e não de governo, e que seja célere
e ininterrupta, independentemente do partido que
estiver no comando do país.
Uma vez que a defesa civil esteja estabelecida
tecnicamente em um planejamento geral, suas
metas, objetivos, diretrizes e prazos não podem
ser cambiados, nem áreas em situação de maior
risco, preteridas por razões da política; além
de imprópria, essa conduta, ainda frequente,
é incompatível com o grau de desenvolvimento
do sistema econômico brasileiro.
A evolução
Vivemos ao longo do século 20 enchentes de
grandes proporções e nossa tradição sempre foi
reagir ao que acontecia. Logo após as grandes
enchentes nas décadas de 1930 e 1960 e em 1976,
para citar algumas, vislumbramos investimentos
em obras e retirada da população das áreas
consideradas de risco, porém, com o passar do
tempo, o tema era abandonado.
No final dos anos 1980, passamos a ter estudos e
estratégias de forma mais regular e sistemática,
que atingissem toda a população de risco como
recomendado. O Brasil começou a pensar em um
sistema nacional de defesa civil e definiu que os
Divulgação Coppe–UFRJ
Moacyr Duarte
Especialista em riscos naturais e
coordenador do Grupo de Análise de Risco
Tecnológico e Ambiental, da Coppe-UFRJ
Desconstruindo Moacyr Duarte
O doctor in Science Moacyr Duarte é pesquisador
sênior e coordenador do Grupo de Análise de Risco
Tecnológico e Ambiental (Garta), do Instituto Alberto
Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa em
Engenharia (Coppe), ligado à Universidade Federal
do Rio de Janeiro (UFRJ), e consultor de várias
empresas na área ambiental, além de governos.
Duarte é considerado um dos maiores especialistas
brasileiros em prevenção de riscos naturais e em
operações emergenciais para resgatar vítimas, e
também estuda riscos gerados pelas organizações.
desastres naturais requerem um tratamento em
quatro etapas, que são prevenção, preparação,
resposta e reconstrução, em vez de apenas resposta
e reconstrução.
Quando o atual modelo foi estabelecido, houve
progresso, principalmente no mapeamento de riscos
naturais. Passamos a fazer nosso dever de casa em
termos de prevenção e preparação. No entanto,
no início desta década, as questões relativas aos
estudos de mudanças climáticas lançaram sobre o
assunto um nível de incerteza muito maior.
Os projetos da área, de obras de engenharia a
assentamentos de população, sempre se basearam
em projeções de alterações climáticas feitas com
base em séries históricas, incluindo análises de
vento, ponto máximo de nível d’água, ponto
máximo de estabilidade que a encosta pode ter etc.
Só que essas variáveis não mostram mais ser tão
longevas quanto foram nas seis primeiras décadas
do século 20, em que nada contrariava os estudos.
Os entendimentos foram colocados em xeque.
Os brasileiros conscientizaram-se disso, por
exemplo, na trágica enchente da região serrana do
Rio de Janeiro, em 2011, quando até condomínios
de bom padrão construídos em áreas consideradas
estáveis foram atingidos. Tanta chuva em tão pouco
tempo foi a prova cabal da brutal incerteza que nos
cerca hoje em termos de riscos de desastres naturais.
O que é preciso mudar?
O aumento da incerteza requer inovação e ousadia.
Em primeiro lugar, precisamos enxergar o sistema
de defesa civil não como o único responsável pela
gestão das fases dos desastres de que falamos. As
fases iniciais de desastres, prevenção e preparação,
não cabem só no orçamento de defesa civil; a defesa
contra desastres naturais deve ser uma política dos
municípios, dos governos estaduais e de todo o
Poder Executivo, não a ação de uma secretaria.
A defesa civil obrigatoriamente atravessa
fronteiras, porque costuma envolver deslocamento
e realocação de populações e realização de obras
de infraestrutura referentes a circulação hídrica,
drenagem e estabilidade das encostas.
Desde que o noticiário começou a publicar
ocorrências naturais como “o maior dos últimos 50
anos” ou “o mais intenso em 70 anos”, com medidas
nunca antes registradas, a complexidade passou a
outro nível, completamente distinto.
tendência ceo 35
Outro desafio diz respeito à competência técnica
instalada em cada município. Cidades com
complexidade especialmente alta do ponto de
vista geológico, geomorfológico e hidrológico nem
sempre dispõem de quadros técnicos para fazer
frente a isso e elaborar recomendações preventivas.
Na verdade, somente a União pode regular e
organizar as fases iniciais do processo de defesa
civil, de acordo com o que as legislações estaduais
e municipais permitirem. Os estudos para evitar
desastres têm de ser financiados pelos estados
e pela União.
Se formos ocupar ecossistemas ainda não
habitados, precisamos ter estudo prévio
de quanto tal ocupação pode ser uma
ameaça sob certas condições climáticas
Também devemos predefinir as ações que
serão tomadas para a gestão de todas as fases,
em todos os níveis, com uma estrutura que
funcione ininterruptamente e seja mantida
independentemente da troca de governos.
Essa melhoria teve início com a aquisição das
imagens de satélite, passou pela ampliação da
rede de coleta de dados e incluiu a integração e
informatização dessa rede, o que permitiu que
os dados ficassem disponíveis. Um problema a
enfrentar é que não existe homogeneidade no
agronegócio de norte a sul – em alguns locais, ainda
há produtores rurais que fazem uma exploração
desenfreada de madeira da floresta e destroem
mananciais, quando não usam mão de obra escrava.
Setores de atividade impactados
A defesa civil eficaz beneficia a economia. Quando
aumentamos a previsibilidade dos fenômenos
naturais, no curto e médio prazos, o agronegócio,
por exemplo, experimentou boa evolução nas
últimas décadas, pois, com base nas informações,
pôde fazer ajustes nas plantações e poupar recursos.
Entre outras atividades, o transporte de bens e
serviços depende da precisão climática. Em muitas
porções do país, notadamente nas estradas vicinais
por onde escoa parte enorme da produção, as
condições são absolutamente inadequadas ao
clima e às possibilidades de desastres. Todo ano,
o escoamento da soja sofre com isso.
Grandes enchentes mais frequentes
No Brasil, a estimativa é que a frequência de enchentes aumente quatro vezes
Fonte: Estudo coordenado por Yukiko Hirabayashi, do Instituto de
Inovação em Engenharia da Universidade de Tóquio, no Japão,
publicado na revista Nature Climate Change.
36 ceo tendência
Provável tempo de retorno da enchente
5-25 anos
25-50 anos
250-500 anos
Atores e recursos
Idealmente, a União deve ser a organizadora
das diretrizes da gestão de riscos naturais, com
capacidade de agir no território nacional; as
universidades e o meio acadêmico atuam como
repositórios dos estudos técnicos, da elaboração das
metodologias, dos protocolos de ação e das análises
dos dados; e agentes estaduais e municipais, como
Defesa Civil, Corpo de Bombeiros e, em alguma
medida, Polícia Militar, são os operadores do sistema.
Esse é o conjunto que pode planejar, acompanhar e
executar o necessário para que haja baixo prejuízo e
perda de vidas nos desastres naturais.
seus impostos regularmente para financiar a gestão
de riscos naturais.
A participação de organizações não governamentais
(ONGs) e da iniciativa privada é bem-vinda, mas não
obrigatória. O dever de atores privados nesse campo
se limita a respeitar as normas ambientais e pagar
A incerteza progressiva das alterações climáticas
exige mais investimento em tecnologia e
na formação de cientistas, além de maior
entendimento dos sensores.
O processo que lida com os desastres naturais
deve incluir a busca da estabilidade da malha
viária, em prol da estabilidade da produção e
da geração de empregos. É uma questão social
também, indiretamente, pois, quando há problemas
na circulação da colheita, o prejuízo impacta os
trabalhadores tanto quanto os patrões.
Um setor de particular impacto dos desastres
naturais é o ecoturismo, que vem abrindo frentes
de negócios no Brasil. Nossa grande preocupação
com o ecoturismo – atividade que é justa e
parece promissora em nosso país – é o que ele
pode causar em alguns locais, como a destruição
de manguezais, os cortes em barrancos,
os desvios de nascentes d’água e práticas
de contaminação de mananciais.
Para preocupações nesse sentido, a legislação
evoluiu bastante de 2000 para cá. Com algumas
tragédias pontuais ocorridas, ficou claro que, se
formos ocupar ecossistemas ainda não habitados
– como é o objetivo da atividade de ecoturismo
–, deve haver um estudo prévio de quanto tal
ocupação pode ameaçar as pessoas sob certa
condição climática. Se, sob fortes chuvas, a ameaça
for grande em determinado local, isso tem de levar
ao impedimento de que se construam pousadas
ali, por exemplo, como poderia ter sido feito na
área de encosta de Petrópolis, Teresópolis e Nova
Friburgo, devastada na grande enchente de 2011,
ou em Angra dos Reis, na virada do ano 2009
para 2010, quando uma pousada foi soterrada por
Quanto aos recursos, já existem grandes modelos
computacionais que preveem as probabilidades
de ocorrência dos diversos status do tempo, como
seca e chuva, mas ainda há um esforço para
diminuir o território que cada previsão engloba,
uma vez que é difícil tomar medidas necessárias
para uma quadrícula de 10 mil quilômetros
quadrados, especialmente nos casos de relevo
acidentado, como no Rio de Janeiro, em São Paulo
e em Minas Gerais.
uma avalanche. Note-se que, nesse caso, a área
que desabou era intocada; o movimento de solo e
rocha foi fruto da carga de chuva e da característica
do local. A geologia e a geomorfologia da Serra
do Mar, por exemplo, favorecem a ocorrência de
deslizamentos e movimento de solo e rocha.
Bonito (MS) e Fernando de Noronha (PE)
são exemplos de locais do Brasil com limites
claramente estabelecidos de habitabilidade de
seus ecossistemas. Há restrições no número de
embarcações que podem descer o rio, nas pousadas
instaladas, no fluxo de turistas; tudo tem de ser
compatível com a quantidade de recursos naturais.
Superar fronteiras e interesses eleitorais
Evoluímos muito na gestão de riscos naturais do
final dos anos 1980 para cá; já temos quadros
técnicos capacitados e acesso a informações e
tecnologias. Precisamos agora é de uma estrutura e
um planejamento de longo prazo que independam
de fronteiras e de ventos políticos. Só assim
enfrentaremos bem a complexidade atual. Nunca
mais será possível ter a segurança de antes, quando
veredictos certeiros eram dados após o estudo de
uma série de 15 anos de dados hidrológicos e
de chuvas em determinada região. n
Entre as pesquisas mais recentes da PwC sobre
mudança de clima, acesse http://www.pwc.com.
br/pt/publicacoes/servicos/consultoria-negocios/
low-carbon-economy-2013-2014.jhtml.
tendência ceo 37
Marcos Queiroz
Ronaldo Valiño e Fernando Corrêa
Respectivamente sócio e gerente
sênior da PwC Brasil
case
Inovação no
combate ao crime
Conheça o projeto Cidade da Polícia,
que reuniu 14 delegacias especializadas
no subúrbio do Rio de Janeiro,
proporcionando infraestrutura integrada
e sinergias para facilitar a investigação
criminal pela Polícia Civil do Estado
1.500
pessoas circulam
na Cidade da
Polícia,
entre policiais,
prestadores
de serviços e
visitantes
A PwC Brasil participou de um projeto que pode
mudar o modelo de gestão da segurança pública
do Brasil: a Cidade da Polícia. Inaugurado
em setembro de 2013 pelo governo do Estado
do Rio de Janeiro, esse complexo policial de
66 mil metros quadrados reuniu, em um bairro da
capital, 14 delegacias especializadas e três áreas
administrativas da Polícia Civil, como forma de
aumentar a eficácia das investigações.
Agora, encontram-se juntos desde o Esquadrão
Antibombas até a Delegacia Fazendária, passando
por Defesa do Consumidor, Proteção ao Meio
Ambiente, Roubos e Furtos, Combate às Drogas,
Crimes de Informática, Capturas etc.
Os dois conceitos que serviram de pilares a esse
cluster de segurança pública são inovação e
38 ceo case
integração. “A Cidade da Polícia foi concebida
para proporcionar integração entre as delegacias
especializadas, aumentando sua eficiência,
melhorando a qualidade do serviço prestado à
população e propiciando a criação de um ambiente
altamente inovador para a segurança pública do
Estado”, explica Fernando Corrêa, gerente sênior
da PwC Brasil e responsável pela gestão integrada
do projeto, que recebeu investimentos de cerca de
R$ 175 milhões do governo fluminense.
A reunião das delegacias especializadas da
Polícia Civil em um único local permite a adoção
de um modelo operacional caracterizado pelo
aproveitamento de sinergias, como explica Ronaldo
Valiño, sócio da PwC Brasil. Essa característica
se manifesta, por exemplo, no uso ordenado e
compartilhado de serviços, como a central de
flagrantes e de inquéritos. Também se verifica
maior agilidade na troca de informações entre as
delegacias e, consequentemente, maximizam-se os
resultados das investigações.
Circulam na Cidade da Polícia cerca de 1.500 pessoas
por dia, entre policiais, prestadores de serviços e
visitantes. Algumas instalações são de uso comum,
entre elas o restaurante, o heliponto e as que servem
para treinamento, como o estande de tiro – o primeiro
da América Latina a ter o padrão do FBI, a polícia
federal dos EUA – e a cidade cenográfica que simula
Brito nota, no entanto, que os desafios gerados pelo projeto
também foram significativos para a Polícia Civil fluminense.
Um dos principais foi mudar a mentalidade dos policiais, que
não estão acostumados a observar a relação entre seu trabalho
e fatores econômicos associados a ele, como os custos. “Um ano
depois, continuamos a enfrentar esse desafio, mas hoje considero
que já temos uma corporação atuando com maior produtividade
e eficiência, levando em conta aspectos tanto econômicos como
operacionais”, afirma Brito.
uma comunidade. Uma prefeitura administra o
complexo, como em um campus universitário.
“Acredito que não haja nada parecido com a Cidade
da Polícia no mundo, considerando suas dimensões
e os valores envolvidos”, atesta Flávio Brito,
diretor administrativo e financeiro da Polícia Civil do
Rio de Janeiro.
O processo
A PwC Brasil foi a encarregada do planejamento
e da implantação da gestão integrada do projeto
por quase três anos, no período entre agosto de
2011 e fevereiro de 2014, envolvendo cerca de 20
de seus profissionais no empreendimento. Entre
os principais trabalhos executados pela firma de
consultoria destaca-se a definição de rotinas de
operação. “A atividade da Polícia Civil tem um
caráter fortemente processual. Se é feita, por
exemplo, a apreensão de uma arma, é necessária
uma sequência de ações bem específica para que
ela entre na Cidade da Polícia”, exemplifica Corrêa.
O cuidado com a logística de utilização do
espaço da Cidade da Polícia é outro exemplo de
trabalho desenvolvido pela PwC Brasil. Essa etapa
envolveu a definição de fluxos e rotinas para o
funcionamento do restaurante, das lanchonetes,
das vagas de estacionamento e do heliponto,
considerando especificações como o fato de as
delegacias funcionarem ininterruptamente.
Marcos Queiroz
Governo fluminense vê mais policiais na atividade-fim
e uma nova mentalidade
O diretor administrativo e financeiro da Polícia Civil do Rio de Janeiro,
Flávio Brito, afirma que, com o desenho adotado para o projeto da
Cidade da Polícia, foi possível direcionar policiais que antes estavam
envolvidos com o serviço administrativo para as atividades-fim de
suas delegacias. “A Cidade da Polícia está nos proporcionando ganhos
importantes no que se refere aos recursos humanos e à logística, graças
ao compartilhamento da infraestrutura”, explica.
Flávio Brito
Diretor administrativo e financeiro
da Polícia Civil do Rio de Janeiro
“Tratou-se de um projeto complexo por seu
gigantismo, pelo desafio constante aos envolvidos
de pensar de maneira integrada e buscar sinergias
fora de sua atividade habitual, e por englobar o
segmento ‘segurança pública’, que não tem uma
cultura de gestão consolidada”, explica Corrêa.
Os desafios puderam ser superados, segundo
Valiño, graças a uma eficiente interação entre
a Polícia Civil e a Casa Civil do Estado do Rio
de Janeiro. “Todo o trabalho foi feito com
envolvimento direto da Polícia Civil do Rio de
Janeiro”, afirma o sócio da PwC Brasil.
Aposta no sucesso
Embora muito recente, a Cidade da Polícia já
vem sendo tratada como um caso de sucesso pelo
governo do Rio de Janeiro, por ter aumentado
a produtividade e a eficiência econômica e
operacional (veja quadro acima).
Simbolicamente, esse sucesso é percebido na
mudança do bairro do Jacarezinho, onde se
localiza o cluster, que faz a ligação entre a zona
norte e o centro carioca. Hoje pacífico, ele era,
até um passado recente, marcado por tiroteios
frequentes entre traficantes rivais e operações
policiais em uma de suas principais avenidas. n
case ceo 39
Cordel Imagens
Ivan de Souza
Strategy& Managing Director,
Global Clients and Markets
artigo
Quais são suas
capacitações
diferenciadoras?
Por Ivan de Souza
Strategy&
Gigantes multinacionais do mercado lembram o que muitas empresas
têm esquecido: o passo anterior ao da elaboração da estratégia é a
identificação das capacitações estratégicas da organização. Isso requer
compreender e explorar as capacitações internas que lhes propiciam
ser vencedoras – que, em geral, são três ou quatro –, em vez de focar
apenas as oportunidades externas
40 ceo artigo
É essencial entender quais pontos fortes
da empresa são reconhecidos por seus
colaboradores internos e externos
Há cerca de seis anos, um grupo supermercadista
líder do mercado norte-americano via-se com um
grande desafio: aumentar o faturamento dentro
e fora de seu país. A solução foi encontrada no
resgate de suas capacitações estratégicas, que
consistiam em oferecer os menores preços do
mercado, aplicados a uma enorme variedade de
produtos – de alimentos a eletrônicos – e com foco
em consumidores que buscam produtos acessíveis,
mas com marcas reconhecidas.
Isso levou o grupo em questão a reconhecer as
capacitações diferenciadoras que sustentavam
sua identidade de preços baixos. Eram três:
possuir uma cadeia de suprimentos que lhe dava
vantajosas condições comerciais, ter um modelo de
loja particularmente eficiente no aproveitamento
dos espaços internos e saber encontrar imóveis
em áreas que se tornam atraentes para um grande
fluxo de consumidores.
Esses três principais diferenciais encontrados
pela empresa recuperariam rapidamente a
competitividade e os resultados almejados.
Em 2009, o grupo voltou a crescer naturalmente,
e de maneira inesperada: naquele mesmo ano,
registrou aumento de 5,1% nas vendas das lojas
com mais de 12 meses de funcionamento e
apresenta desempenho ascendente.
O exemplo citado evidencia o que muitas empresas
têm esquecido nestes tempos de mudança frenética:
para negócios bem-sucedidos, o passo anterior ao da
construção de um plano estratégico é a identificação
das fortalezas internas que não podem ser copiadas
ou melhoradas pelos concorrentes.
A pergunta-chave de qualquer organização, portanto,
deve ser: “Em que consistem nossas capacitações
estratégicas?”. Somente com o reconhecimento
(e a potencialização) de suas capacitações naturais
uma empresa poderá estabelecer um diferencial
competitivo capaz de fazê-la vencer no mercado.
Compreensão deve ser profunda
Por mais intuitivo que pareça, identificar as
próprias capacitações consiste em um processo
desafiador para qualquer gestor, uma vez que
as organizações estão acostumadas a tomar
decisões de investimento baseadas mais no
aproveitamento de oportunidades externas
do que em capacitações internas.
Para enxergar essas competências, é necessário
que a empresa tenha lentes internas e
externas rigorosas. Uma vez compreendidas e
absorvidas pela organização, essas capacitações
diferenciadoras podem facilitar a escolha, no
mercado, das oportunidades que melhor se ajustem
ao perfil da empresa.
As capacitações naturais não são necessariamente
específicas. Não se trata de dominar determinado
canal de distribuição ou de um grupo de pessoas,
portanto. Se uma organização possuir boa
capacitação de gerenciamento de diferentes canais,
isso lhe permitirá assumir um novo canal ainda
inexplorado com grande probabilidade de êxito.
De modo análogo, se uma empresa tiver uma
competência extraordinária para fazer crescer sua
rede em uma cidade, esse diferencial a tornará uma
forte candidata a ter sucesso na entrada em outros
mercados. Sua capacitação não se resume a ser forte
apenas naquela praça.
É essencial que a organização interprete bem
suas capacitações e descubra todo o potencial
delas. Essa iniciativa proporcionará não apenas a
melhoria e a expansão dos negócios já existentes,
mas a possibilidade de ingressar em novos
negócios e/ou em novos mercados.
artigo ceo 41
O surgimento da Strategy&
A Strategy& é a nova marca da anterior Booz & Company, que
passou a integrar o network de firmas PwC em abril de 2014.
Com 100 anos de experiência em solucionar os mais complexos
problemas dos clientes e uma equipe formada por estrategistas
práticos, a Strategy& agora soma sua expertise aos 150 anos
de história da PwC no mundo, marcados por alta capacidade
técnica e relacionamentos de longo prazo.
A Strategy& já nasce com uma história rica, herdada da Booz
& Company, como a criação do sistema de contratos dos
filmes de Hollywood, a fusão das ligas nacional e americana
de futebol americano e o resgate que evitou a falência da
Chrysler Corporation.
Também integra esse acervo uma série de inovações
desenvolvidas pela empresa nas últimas décadas, como a
elaboração dos conceitos de capital humano e de ciclo de vida
do produto, o gerenciamento da cadeia de suprimentos, a
customização inteligente e a estratégia focada em capacitações,
que é tema deste artigo.
Identificação passo a passo
O processo de identificação das capacitações
diferenciadoras começa com análises qualitativas
e quantitativas, que incluem conversas com os
profissionais mais experientes dentro da empresa
e também com os clientes e fornecedores, ou
seja, as lentes internas e externas mencionadas
anteriormente.
Nas conversas internas, busca-se entender como
os processos são realizados e os fatores que
efetivamente têm produzido bons resultados ao
longo do tempo, na visão dos colaboradores. Além
disso, procura-se extrair uma leitura clara do
que as pessoas na organização reconhecem como
as fortalezas da empresa. Nas conversas com os
clientes e fornecedores, por sua vez, o objetivo
é identificar e conhecer a visão externa sobre os
setores nos quais a companhia se destaca.
Os dois tipos de conversa devem dar origem a
uma visão das qualidades que tornam a empresa
bem-sucedida em pelo menos parte do negócio.
Essa visão deve ser complementada por uma análise
de todo o portfólio de produtos da empresa
e também por um benchmarking setorial.
42 ceo artigo
Vale dizer que não é incomum os colaboradores
apresentarem dificuldades em identificar aspectos
positivos relevantes para o negócio. Isso requer
autocrítica e disciplina, reforçando a relevância
do olhar externo, da análise do portfólio e do
benchmarking setorial.
Feita a análise, parte-se para a etapa de discussão
de cenários estratégicos. Essencialmente,
discute-se qual é a dinâmica dos mercados em que
a empresa atua ou pensa em atuar e, com uma
visão mais realista, comparam-se esses mercados
com as capacitações identificadas na companhia.
Esse é o momento em que a empresa procura
entender de que maneira ela pode ter sucesso
nesses mercados e quais seriam os melhores
modelos estratégicos para alcançar esse objetivo.
Estudos mostram que cada indústria costuma
contabilizar dez capacitações essenciais,
enquanto dada empresa denomina três ou
quatro delas como prioritárias. Em outras
palavras, um processo eficaz de identificação de
capacitações distintivas costuma trazer à tona
aproximadamente três elementos para ter sucesso
em determinado mercado.
O importante é focar os movimentos da empresa em
fatores que a diferenciam no mercado, estejam eles
voltados para pessoas ou para processos.
É claro que sua empresa deve atender a um mínimo
de desempenho positivo nas dez capacitações
obrigatórias da indústria em que atua. Isso significa
que, se você for um varejista, precisa ter uma
competência mínima em compras. A pergunta a ser
respondida em relação a essas capacitações setoriais
não distintivas, porém, deve ser outra: “Alguma delas
pode ser um fator destrutível para o valor de minha
empresa?”. Uma resposta afirmativa não é aceitável.
Coerência no longo prazo
Todas as corporações em expansão contínua
têm um desafio permanente a vencer: manter a
coerência entre os investimentos de longo prazo
e suas capacitações diferenciadoras. Casos de
gigantes multinacionais ilustram isso à perfeição.
No começo dos anos 2000, uma grande
multinacional do setor de consumo, voltada para
produtos de beleza e cosméticos, enfrentava queda
nos preços de suas ações após um ambicioso plano
de expansão que fracassou no final da década de
1990. A empresa vendia produtos em uma ampla
variedade de categorias, como fraldas, produtos
de limpeza para roupas, saúde e beleza, cuidados
femininos, bebidas, alimentos e farmacêuticos.
O melhor caminho para a execução e a competitividade
passa pela identificação e valorização das capacitações
estratégicas e diferenciadoras da organização, assim
como pela elaboração de estratégias que estejam
relacionadas com as fortalezas corporativas
Para enfrentar o problema, o CEO da organização
dedicou-se a escolher os negócios em que a empresa
continuaria presente e aqueles que abandonaria.
Para tanto, aprofundou-se no que seriam as
capacitações estratégicas e diferenciadoras da
companhia: fornecer produtos confiáveis, eficientes
e com preços razoáveis que atendessem às
necessidades de cuidar de pessoas e lares.
As três principais competências da empresa
para alcançar essa meta, destacadas pelo CEO,
foram o desenvolvimento de tecnologias e produtos
inovadores, as ações globais de marketing que
comunicavam os principais benefícios de seus
produtos e o apoio às atividades de pesquisa
e desenvolvimento.
Em outro caso de negócio em expansão contínua,
uma das maiores fabricantes de bebida do mundo
aprendeu com seus erros a importância de manter
a coerência entre seus investimentos de longo prazo
e suas competências.
As três principais capacitações identificadas por
essa organização foram a força de suas marcas
(que reúnem alguns dos mais icônicos produtos
no mundo), seu poder de distribuição de produtos
no varejo e sua rede mundial de fornecedores
e distribuidores.
Com a identificação dessas competências, a empresa
focou os investimentos em uma pequena linha de
produtos adequados a suas capacitações inatas.
Tomaram-se várias decisões com base na
identificação dessas capacitações principais, como
a redução do portfólio de produtos – os produtos
farmacêuticos e os alimentícios, que necessitavam
de ações regionais de marketing, por exemplo,
foram descartados.
A recompensa da implementação
Manter-se fiel às capacitações estratégicas é
difícil, mas proporciona recompensas inequívocas,
e uma delas é referente à implementação. Um
dos maiores desafios de uma organização não é
desenhar a estratégia, e sim executá-la.
Também se priorizou o desenvolvimento ou a
aquisição de segmentos de produtos que seriam
beneficiados pelas capacitações inatas da
empresa. Isso levou à aquisição de um grupo bem
estabelecido no mercado.
No entanto, o grau de dificuldade de implementar
o planejamento é bastante reduzido quando
a empresa foca suas atividades e esforços nas
competências diferenciadoras embutidas em suas
pessoas, processos, sistemas e cultura.
Um dos resultados da implementação da estratégia
foi a alta das ações da organização: seu preço
triplicou em cinco anos. A taxa de sucesso comercial
dos novos produtos lançados pela empresa, por sua
vez, hoje está entre 50% e 60%, ante 15% em 2000.
A identificação das capacitações diferenciadoras
deve preceder toda e qualquer estratégia e ser
priorizada no aproveitamento de toda e qualquer
oportunidade externa, independentemente de o
tempo ser de turbulência ou de calmaria. n
artigo ceo 43
Cordel Imagens
Eduardo Giannetti da Fonseca
Economista, cientista social e escritor
44 ceo personalidade
personalidade
Transdisciplinar
por estratégia
Economista e cientista social de formação, Eduardo Giannetti
da Fonseca transita por campos tão distintos quanto filosofia,
antropologia, psicologia e neurociência para tratar de grandes
questões da humanidade; ele mostra o valor da diversidade
em um ambiente que ainda cultua o foco
Em 1995, Eduardo Giannetti da Fonseca trabalhou no
Banco Garantia, berço de alguns dos profissionais mais
capacitados e competitivos da cena executiva brasileira.
“Achava que era possível conciliar a inserção profissional
em uma grande empresa com minha atividade autoral e
de pesquisa.” Não era; a experiência durou uma semana,
até ele, simbolicamente, tentar ler um livro na mesa de
operações. “Bastou eu abrir o livro para me olharem como
a um extraterrestre”, relembra, divertido, o renomado
economista e pensador.
De fato, em um universo corporativo orientado pelo foco,
não havia espaço para atuar de maneira transdisciplinar
e integrada. No entanto, isso mudou muito nos últimos
20 anos, com a ascensão da inovação e de seus requisitos, como
a diversidade e a visão periférica, e tende a continuar mudando.
“Hoje cada vez mais pessoas já entendem que dois movimentos
têm de acontecer ao mesmo tempo: a divisão e especialização
do trabalho intelectual e também a integração e síntese do que
foi perdido”, comenta Giannetti.
A trajetória do economista ilustra bem o espaço que a
multidisciplinaridade vem ocupando na sociedade – e na
economia. “Na escola, ao ler Os Irmãos Karamazov, vi que
queria pertencer a um mundo em que ideias diversas são
formuladas, questionadas e discutidas, mas fui estudar
economia para não depender financeiramente do meu pai,
o que provavelmente aconteceria naquela época”, conta.
Então, ele se graduou em economia e em ciências sociais
pela Universidade de São Paulo e foi fazer doutorado na
Universidade de Cambridge, Inglaterra. “Descobri que os
grandes economistas dos séculos 18 e 19 eram filósofos –
Adam Smith, Karl Marx, John Stuart Mill; então, percebi
que, como economista, eu poderia incorporar outras áreas
do conhecimento que ficaram compartimentalizadas.”
Chancelado pelos sete anos em que lá atuou e com essa
visão, Giannetti voltou ao Brasil disposto a construir uma
carreira diversificada e bem-sucedida.
Tornou-se professor de economia da Universidade de São
Paulo e do Insper e, com os livros Vícios Privados, Benefícios
Públicos?, de 1994, e As Partes & o Todo, de 1995, ganhou
dois prêmios Jabuti. Seu diferencial estratégico? Giannetti
trata a economia mais pela vertente das ciências humanas e
da ética do que pela da engenharia e da matemática.
Foi essa visão transdisciplinar e integrada, em vez do foco,
que o levou a tocar em ideias que o universo corporativo
nunca incluiu seriamente em sua agenda, e talvez devesse,
como a felicidade, o consumismo, o futuro e a desigualdade,
entre outras.
Felicidade
Em 2002, Giannetti começou a falar em felicidade, em um
livro homônimo, no qual caminhou da filosofia à economia
por meio de diálogos entre quatro personagens ficcionais.
O economista garante que o tema mantém sua relevância,
apesar da vulgarização da felicidade em nossa sociedade.
“Descobri que os grandes economistas
dos séculos 18 e 19 eram filósofos e
percebi que poderia incorporar outras
áreas do conhecimento”
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“Quando as novas tecnologias [das mídias sociais] suscitam
nas pessoas a vontade de colocar a própria felicidade na
vitrine, isso cria um mal-estar; entra-se em uma espécie
de corrida armamentista da felicidade exibida”
“Felicidade virou clichê de marketing; poucos conceitos são
tão abusados pela fúria mercadológica quanto esse”, pondera
o pensador. “Porém o fato é que as duas acepções de felicidade
nos importam, tanto o ‘estar feliz’, que é um estado de ânimo
circunstancial, como o ‘ser feliz’, que é um grau de realização
e satisfação com a vida em seu conjunto. O que traz satisfação
momentânea para uma pessoa e o que torna uma vida humana
bem vivida?” A seu ver, essas perguntas continuarão a exigir
respostas enquanto houver vida.
Sem generalizações, Giannetti observa que a cobrança
contemporânea de que as pessoas sejam felizes pode estar,
paradoxalmente, contribuindo para que se sintam infelizes.
“Quando as novas tecnologias [das mídias sociais] suscitam
nas pessoas a vontade de colocar a própria felicidade na
vitrine, isso cria um mal-estar; entra-se em uma espécie de
corrida armamentista da felicidade exibida.”
Consumismo
Giannetti também se preocupa com o consumismo. Muitas
das pessoas que atingem um patamar de renda que lhes permite
satisfazer suas necessidades e ter acesso a bens materiais
conseguem perceber que há outros fatores mais importantes na
vida, mas algumas, no afã de se mostrarem bem posicionadas
na sociedade, geram uma verdadeira corrida armamentista do
consumo, que se torna um problema-chave da atualidade.
O economista explica que não se trata de uma questão de renda
monetária, que é apenas uma parte da renda total. “É lógico
que, se a renda monetária não for minimamente satisfatória,
ela compromete o resto. Mas, a partir de certo ponto, outros
componentes não monetários tendem a tornar-se dominantes,
como o modo em que se usa o tempo”, esclarece. A partir de
um nível de renda, quando a pessoa já satisfez as necessidades
elementares, ela passa a preocupar-se mais com sua renda
relativa à de seus pares do que com a absoluta.
É nesse momento que muitos começam a fazer uma
comparação permanente de seu estilo de vida com o de
um grupo de referência. Então, instala-se uma competição
por bens posicionais, cujo valor não está ligado à satisfação
que os bens lhes proporcionam diretamente, mas ao que
sinalizam deles para os outros.
46 ceo personalidade
Há dois grandes perigos nessa corrida armamentista, segundo
Giannetti. Um é o da inevitável frustração psicológica, uma
vez que não é possível todos serem vencedores em uma
competição por bens posicionais. “Sempre teremos ganhadores
e perdedores provisórios, pois é uma disputa cíclica, que não
termina.” Além da frustração psicológica, observa-se ainda
a ameaça às condições de vida no planeta. “Existe um limite
externo para essa corrida armamentista, que é aquele imposto
pelos recursos ambientais. Hoje o consumo de eletricidade nos
Estados Unidos só com ar-condicionado, por exemplo, supera
todo o consumo de energia elétrica do continente africano.”
Felizmente, o maior poder de consumo não impulsiona níveis
crescentes de felicidade, segundo estudos sérios. “Todas
as evidências mostram que, a partir de certo patamar de
renda, acréscimos monetários não se traduzem em aumento
de felicidade, o que é uma excelente notícia para quem se
preocupa com o meio ambiente.”
Futuro
Giannetti vê como inevitável repensar o padrão de vida
ocidental devido ao impacto dele no futuro do planeta. “A não
ser que se prefira aprender pelo caminho bem mais doloroso
da catástrofe, em que situações extremas começam a se repetir
e nos forçam a algum tipo de solução emergencial.”
Para o economista, resolver a questão ambiental passa
por combinar inovações tecnológicas, transformação
comportamental e mudança dos preços relativos.
“Tem de haver uma precificação do impacto ambiental das
nossas escolhas, como produtores e consumidores. Por
exemplo, é preciso comparar o custo real de produção de um
quilowatt-hora gerado por uma usina termoelétrica a carvão
com o de uma eólica ou solar, incluindo no cálculo de ambos a
emissão de CO2 associada.”
Não adianta deixar a mudança acontecer naturalmente.
“A [companhia aérea] British Airways deu a seus passageiros
a alternativa de, ao comprar o bilhete, adquirir o crédito de
carbono correspondente às emissões do percurso, e a adesão
foi de apenas 3% dos passageiros. Por isso, os voos têm de ficar
mais caros, para reduzir a demanda e diminuir a emissão.
É mudando os preços relativos que se mudam as escolhas.”
Cordel Imagens
“Na imensa maioria dos casos,
a condição social da família em
que a pessoa tem a sorte – ou o
azar – de nascer predetermina
tudo o que ela pode fazer com sua
vida. Não podemos aceitar isso”
A mensuração da riqueza das nações também precisa ser
repensada nesse contexto, conforme Giannetti. “O índice
Produto Interno Bruto (PIB) é extremamente limitado, parcial
e até mesmo enganoso. A vida pode estar piorando com o PIB
crescendo. Se você vai a pé a seu local de trabalho, isso é ótimo,
mas não aumenta o PIB; se você vai de carro, o PIB aumenta,
mesmo que isso aumente o efeito estufa e lhe cause estresse,
provocando uma eventual sobrecarga do sistema de saúde.”
Há tentativas de trocar o PIB pela FIB, que seria a Felicidade
Interna Bruta dos países, e Giannetti as vê como algo positivo.
“Saber se as pessoas estão tendo mais contatos pessoais
gratificantes, melhores relações com os amigos e familiares,
mais esperanças na vida são coisas que ainda estão fora do
âmbito objetivo das questões econômicas, mas não deveriam.
São condições muito reais e importantes de avaliar.” Para o
economista, esse bem-estar subjetivo é parte fundamental da
realidade em que as empresas atuam, tanto ou mais quanto
o bem-estar objetivo mostrado pelos indicadores atuais.
Desigualdade
Em se tratando do Brasil, a melhoria do bem-estar subjetivo
passa por uma questão crítica: a equidade de oportunidades.
“O que é fundamental para a sociedade é que os indivíduos
tenham uma dotação inicial que lhes permita fazer escolhas
e alcançar seus objetivos e sonhos. O Brasil está muito longe
de dar uma dotação inicial mínima a seus cidadãos; falta um
mínimo de equidade de oportunidades”, diz Giannetti. “Na
imensa maioria dos casos, a condição social da família em que a
pessoa tem a sorte – ou o azar – de nascer predetermina tudo o
que ela pode fazer com sua vida. Não podemos aceitar isso.”
O pensador deixa claro que equidade de oportunidades não é
sinônimo, de modo algum, de igualdade de resultados. Para ele,
impor igualdade de resultados é desrespeitar a legitimidade de
escolhas que os indivíduos fazem sobre a vida que querem ter.
“Nem todo mundo está disposto a fazer enormes sacrifícios em
nome de um ganho econômico, por exemplo, e quem o está não
pode ser privado do resultado ao final disso”, argumenta. “Uma
vez garantida a paridade inicial, a desigualdade que vem depois
é até bem-vinda, porque reflete talentos, escolhas e esforços.” n
personalidade ceo 47
Reflexões multidisciplinares
sobre economia e negócios
Suicídio empresarial
“Marx dizia que o trabalhador assalariado só se sente ele mesmo quando
não está trabalhando. Isso, que Marx condenava corretamente do ponto
de vista ético, percebe-se hoje que é um prejuízo enorme também do
ponto de vista empresarial. A explicação é simples: uma empresa estará
desperdiçando ativos tão fundamentais quanto a autonomia, a criatividade
e o envolvimento de um profissional se ele não se sentir ele mesmo
enquanto estiver trabalhando ali. Se uma empresa não souber propiciar
aos que nela atuam um ambiente que suscite esse engajamento, essa
inovação, essa disposição de fazer um pouco melhor o que se faz, ela estará
cometendo um verdadeiro suicídio empresarial.”
É a sociedade, não o governo
“O Brasil precisa repensar se almeja alcançar taxas
de crescimento mais elevadas. Isso não é uma escolha
do governo; é uma escolha que a sociedade faz e que
milhões de decisões descentralizadas tomadas por
famílias e por empresas acabam tendo como resultado
final agregado.”
Estado patrimonialista
“Há algo profundamente errado na relação entre Estado e sociedade
no Brasil. Infelizmente, parte do empresariado brasileiro é tutelada
pelo Estado; depende de crédito subsidiado, de contratos com
o governo, de benefícios tributários, de tarifas de importação
protecionistas. O Estado brasileiro utiliza muito seus meios,
instrumentos e poder para manter o empresariado sob controle
econômico e político. Para a massa da população, tem o bolsa família
e, para a elite empresarial, o bolsa BNDES, o ‘bolsa empresário’.”
Valor do amanhã
“Não há uma resposta final e conclusiva sobre quanto vale a pena sacrificar o
presente em benefício do futuro ou quão recomendável é sacrificar o futuro
em benefício do presente. É uma tensão que permeia cada dia de nossa vida e
precisamos reavaliar presente e futuro em cada situação por que passamos”.
Crescimento e poupança
“O Brasil tem a vocação do crescimento, mas não
a da poupança. Isso não dá certo; acaba gerando
inflação ou crise de balança de pagamento. Não se é
obrigado a crescer mais. Se achamos o sacrifício muito
grande e não estamos dispostos a abrir mão neste
momento para melhorar depois, não tem problema.
É perfeitamente aceitável se resignar a um nível
menor de crescimento e de consumo futuro.”
48 ceo personalidade
Publicações
Confira em
http://www.pwc.com.br/pt/estudos-pesquisas
O futuro do trabalho –
Impactos e desafios para as organizações no Brasil
Em 2017, trabalhadores da linha de montagem de uma fábrica vietnamita
usarão sensores para medir seu humor, sua capacidade de concentração e
seu ritmo de trabalho. Em 2019, um médico situado na China realizará uma
cirurgia em um paciente em Gana. Em 2021, carros serão licenciados para
rodar sem motorista em alguma cidade. Essas três projeções são um aperitivo
do relatório da PwC que reúne pesquisas com profissionais de recursos
humanos e com 10 mil pessoas na Alemanha, na China, nos Estados Unidos,
na Índia e no Reino Unido sobre como o ambiente de trabalho deve evoluir.
Três cenários são traçados e as possibilidades mostram-se tão surpreendentes
quanto a de a área de RH ser transacional e quase inteiramente terceirizada.
Conectando gerações –
Como transmitir a gestão de uma empresa
familiar para a próxima geração
Os riscos nunca pareceram tão grandes quanto na
passagem do bastão dos negócios dos baby boomers para
a geração do milênio. Isso é o que mostram entrevistas
da PwC com mais de 200 líderes de empresas familiares
de 21 países. Os três obstáculos que precisam ser
superados para que a transição tenha sucesso são: o
choque de gerações em si, a falta de credibilidade dos
jovens herdeiros e as falhas de comunicação entre pais e
filhos. Entre as outras preocupações mencionadas estão
a escala e as competências.
Capital project and infrastructure spending –
Outlook to 2025
Os investimentos em infraestrutura devem crescer
consistentemente na próxima década na América
Latina, atingindo o equivalente a US$ 557 bilhões
por ano por volta de 2025. Três países – Brasil, Chile
e Colômbia – tendem a puxar o aumento, segundo a
pesquisa da PwC, e o Brasil sozinho deve responder por
US$ 300 bilhões. As indústrias que mais contribuirão
para o desempenho brasileiro são as extrativas (petróleo
e gás, combustíveis alternativos, metais e não metais, na
mesma proporção) e os transportes (investimentos em
metrô devem subir de US$ 15 bilhões anuais em 2010
para US$ 38 bilhões em 2025).
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