UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE ARTES E COMUNICAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS UMA ABORDAGEM DIACRÔNICO-COMPARATIVA DA ABREVIAÇÃO EM DIFERENTES GÊNEROS, SUPORTES E TECNOLOGIAS Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras da UFPE como requisito básico para obtenção do grau de Doutor em Lingüística. Aluna: Fabiana de Souza Silva Orientador: Prof. Dr. Phil. Marlos de Barros Pessoa Recife, maio de 2006. Silva, Fabiana de Souza Uma abordagem diacrônico-comparativa da abreviação em diferentes gêneros, suportes e tecnologias/ Fabiana de Souza Silva.– Recife: O Autor, 2006. 253 folhas: iI., quadros, tab., graf. Tese (doutorado) – Universidade Federal de Pernambuco. CAC. Programa de Pós-Graduação em Letras e Lingüística, 2006. Inclui bibliografia. 1. Lingüística. 2. Diacronia. 3.Abreviação. 4. Gênero textual. I. Título. 801 410 CDU (2.ed.) CDD (22.ed.) UFPE CAC200611 UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBCO CENTRO DE ARTES E COMUNICAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS UMA ABORDAGEM DIACRÔNICO-COMPARATIVA DA ABREVIAÇÃO EM DIFERENTES GÊNEROS, SUPORTES E TECNOLOGIAS BANCA EXAMINADORA: __________________________________ Prof. Dr. Phil. Marlos de Barros Pessoa Universidade Federal de Pernambuco Prof. Dr. Phil. Dermeval da Hora Oliveira Universidade Federal da Paraíba ______________________ Prof. Dr. Antonio Carlos dos Santos Xavier Universidade Federal de Pernambuco ________________________________________ Prof.ª Dr.ª Stella Virgínia Telles de Araújo Pereira Universidade Federal de Pernambuco Prof.ª Dr.ª Virgínia Maria Almoêdo de Assis Universidade Federal de Pernambuco Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras da UFPE como requisito básico para obtenção do grau de Doutor em Lingüística. Ao Profº Luis Antônio Marcuschi, exemplo de homem, profissional, amigo, por ter-me incentivado a prosseguir com transformando realidade. um esse sonho tema, em AGRADECIMENTOS “Há pessoas que nos falam e nem as escutamos; há pessoas que nos ferem e nem cicatrizes deixam; mas há pessoas que simplesmente aparecem em nossa vida e nos marcam para sempre”. (Cecília Meireles) A Deus, único e suficiente Salvador de nossa alma, pelo perdão; A meu pai, Nivaldo Rodrigues da Silva, pela paixão que despertou em nós pelas letras; A minha mãe, Maria Landelina de Souza Silva, pelo real exemplo da autêntica mulher virtuosa; A Landivaldo, Edvânia, David Lucas e Anna Karollinne, pelos inúmeros e inesquecíveis favores prestados; A Patrícia, pelo regresso ao lar; A Jorgevaldo, pela paciência infinita com o meu constante mau humor; A Marylane, por ser espontaneamente minha defensora extra judicial; A Junior, pelas ricas lições bíblicas trocadas em nossas incontáveis noites de insônia; A Betânia, pela honra da sua companhia inefável em nossas viagens em seu carro ao Recife; A Fátima, amiga em todas as horas, por ser minha conselheira sentimental; A Medianeira, por tão carinhosamente ter-me acolhido em seu apartamento no Cordeiro; Ao casal Ravic e Regina Rolim, pelo sorriso que ostento; A UFPB, por conceder-me o afastamento para a capacitação docente; A UFPE, pelo trabalho sério e competente ali desempenhado; A CAPES, pela oportunidade a mim outorgada de realizar minha pesquisa; Ao Prof. Dr. Marlos de Barros Pessoa, orientador incondicional, pelos preciosos ensinamentos ao longo do curso; Ao Prof. Dr. Phd. Dermeval da Hora, professor na graduação, orientador no mestrado, examinador no doutorado, pelo currículo que tenho; À Profª Drª Ângela Dionísio, pelo espaço aberto para mim em seu SPA; Ao Prof. Dr. Luis Antônio Marcuschi, pelos sábios conselhos; A Diva e Eraldo, profissionais e amigos em toda hora; Aos colegas do DLCV, por levarem durante os quatro anos o fardo que era meu; A Drª Margarete Trigueiro, por ter abreviado o meu sofrimento, agilizando o meu divórcio; A Marcos Antonio Mendes de Araújo por, não mais que de repente, ter transformado o meu pranto em riso; Enfim, a todos quantos fizeram parte da minha longa e renhida história rumo ao Doutorado. “Apenas preservando inteligência códex da cultura podemos “felicidade gozar a do a extravagante” prometida pela tela”. Roger Chartier RESUMO O objetivo central deste trabalho é apresentar o uso da abreviação numa perspectiva histórico-comparativa, a fim de provar que a ocorrência desse fenômeno, ao contrário do que se pensa, não é uma criação do texto eletrônico, mas teve início no século VI a.C. devido ao alto custo do pergaminho, material utilizado para a escrita. À luz da teoria dos gêneros textuais, testamos se há maior ou menor uso desse recurso, dependendo do suporte e gênero utilizados, além de outras variáveis sociointerativas, entre elas o propósito comunicativo e o estilo. Analisamos ainda quatro variáveis estruturais, quais sejam: extensão do texto, extensão do vocábulo, classes de palavras e tonicidade da sílaba. Por último, verificamos quatro variáveis, desta vez sociais, a saber: faixa etária, grau de escolaridade, sexo e profissão. O corpus analisado consta de cartas, diários, blogs, e-mails e SMSs. Os dois primeiros gêneros situam-se entre os séculos XVIII e XIX, pertencentes a três Estados da região nordeste: PB, PE e BA. O material correspondente aos gêneros digitais foi coletado de seis provedores da Internet: UOL, IG, TERRA, IBEST, YAHOO e HOTMAIL, além de três empresas de telefonia celular: OI, TIM e CLARO. Observamos que o gênero textual, seguido do propósito comunicativo, determina o estilo do texto, promovendo ou não a ocorrência da abreviação. PALAVRAS-CHAVE: abreviação, gênero, estilo, propósito comunicativo. ABSTRACT The central objective of this work is to present the use of the abbreviation in a perspective comparative-historically, in order to prove that the incident was giving phenomenon, on the contrary of what one thinks, it is not a creation of the electronic text, but it had beginning in the century VI, due to the high cost of the parchment, material used for the writing. By the light of the theory of the textual types, we test a bigger or less use of this resource, depending on the support and type when the communicative purpose and the style were used, besides other variables sociointerativas, between them. We analyse still four structural, what variables be: extension of the text, extension of the word, classes of words and tonicity of the syllable. For last, we check four variables, this time social, knowing: age group, degree of schooling, sex and profession. The analysed corpus consists of letters, diaries, blogs, e-mails and SMSs. The first two types are situated between the centuries XVIII and XIX pertaining to three States of the northeast region: PB, PE and BA. The corresponding material to the digital types was collected of six providers of the Internet: UOL, IG, TERRA, IBEST, YAHOO and HOTMAIL, besides three enterprises of cellular telephony: OI, TIM and CLARO. We notice that the textual type, followed by the communicative purpose, determines the style of the text, promoting or not the incident of the abbreviation. KEY WORDS: abbreviation, type, style, communicative purpose. RÉSUMÉ L'objectif central de ce travail est présenter l'utilisation de l'abréviation dans une perspective histórico-comparativa, afin de prouver que la présence de ce phénomène, dont au contraire se pense, n'est pas une création du texte électronique, mais a eu du début dans le siècle VI, dû au haut coût du parchemin, du matériel utilisé pour l'écriture. À la lumière de la théorie des types littéraux, nous expérimentons une plus grande ou moindre utilisation de cette ressource, dépendant du support et du type utilisés, outre autres variables sociointerativas, entre elles l'intention comunicativo et le style. Nous analysons encore quatre variables structurelles, lequel soient : extension du texte, extension du vocable, classes de mots et tonicité de la syllabe. Finalement, nous vérifions quatre variables, cette fois sociales, à desavoir : bande étaire, degré de scolarité, sexe et profession. Le corpus analysé consiste de lettres, quotidiennes, blogs, e-mails et de SMSs. Les deux premiers types se placent entre les siècles XVIII et XIX, appartenant à trois États de la région nord-est : PB, PE et BA. Le matériel correspondant aux types digitaux a été rassemblé de six fournisseurs de l'Internet : UOL, IG, TERRA, IBEST, YAHOO et HOTMAIL, outre trois sociétés de téléphonie cellulaire : OI, TIM et CLARO. Nous observons que le type littéral, suivant de l'intention comunicativo, détermine le style du texte, promouvant ou non la présence de l'abréviation. MOTS CLÉ: abréviation, type, style, intention comunicativo. LISTA DE QUADROS, GRÁFICOS E TABELAS QUADROS PÁGINA Quadro 1 Quadro 2 Quadro 3 Quadro 4 Quadro 5 Quadro 6 Quadro 7 GRÁFICOS 44 46 78 79 81 125 229 PÁGINA Gráfico 1 Gráfico 2 Gráfico 3 Gráfico 4 Gráfico 5 Gráfico 6 Gráfico 7 Gráfico 8 Gráfico 9 Gráfico 10 Gráfico 11 Gráfico 12 TABELAS 47 162 168 174 180 188 192 198 203 207 212 218 PÁGINA Tabela 1 Tabela 2 202 224 LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS Sr. Dr. lh’ q’ Illmos Exmos verde. kd ligô prosperide VMgde. Itamca. Sta. porq’ impreitro pa. da. juramto. Fazda. cappnia. de poimo. do. ne = / cessro. pagamo. mto. deligca. engenros. Sargto. gde. Des. fundamos. ans. ampo. pr mma va redo pe segdo qm Ant Frz Perra da Sa Doq Offs Segte Pra Re. Pernco. Dezro. Bjs. Ksa. Tbm. Senhor Doutor Lhe Que Ilustríssimos Excelentíssimos Verdade Cadê Ligou Prosperidade Vossa Magestade Itamaracá Santa Porque Empreiteiro para dita Juramento Fazenda Capitania depoimento dito necessário pagamento Muito diligência engenheiros Sargento guarde Deus fundamentos anos amparo por mesma vila reverendo padre segundo quem Antonio Ferraz Pereira da Silva do que ofícios seguinte primeira Recife Pernambuco Dezembro Beijos Casa Também Flo. Hje. Nu. Xopi. Fze. Ñ. Qdo. Msg Cmg Vc Fev Tel +tard D Credt V Cel Sl Cd Bb Mar Cm Spcial Fliz D+ Pq Ds/ kda fce bok t findi dpois cviço td diz ngm krak gral msm aki ksa depre psor mó c abs ch s.sul Land Ed1 Ed 2 + ou Blxinha Falou Hoje No Shopping Fazer Não Quando Mensagens comigo você fevereiro telefone mais tarde de crédito ver celular sala ser de bebê março com especial feliz demais porque de menos sem cada face boca ter fim de semana depois serviço tudo dizer ninguém caraca geral mesmo aqui casa depressão professor maior com abraço chamada shopping sul Landivaldo Edvânia 1 Edvânia 2 mais ou menos belezinha SUMÁRIO INTRODUÇÃO ______________________________________________________ 16 • • • OBJETIVO ______________________________________________________________ 20 HIPÓTESES _____________________________________________________________ 22 METODOLOGIA __________________________________________________________ 22 A) A PESQUISA ____________________________________________________________ 23 B) A SELEÇÃO _____________________________________________________________ 23 b.1) O período _____________________________________________________________ 23 b.2) O local ________________________________________________________________ 24 b.3) O material _____________________________________________________________ 25 b.3.1) Tipologia ____________________________________________________________ 25 b.3.2) A autoria ____________________________________________________________ 29 b.3.3) A amostra (distribuição geográfica e temporal)____________________________ 29 b.3.4) A seleção dos informantes _____________________________________________ 29 C) VARIÁVEIS ANALISADAS ____________________________________________________ 31 c.1) Variáveis sociointerativas ________________________________________________ 32 • Gênero ________________________________________________________________ 32 • Estilo __________________________________________________________________ 32 • Instância de realização___________________________________________________ 33 • Participantes ___________________________________________________________ 33 • Propósito comunicativo __________________________________________________ 33 • Suporte ________________________________________________________________ 33 C.2) VARIÁVEIS ESTRUTURAIS _________________________________________________ 34 • Extensão do texto _______________________________________________________ 34 • Extensão do vocábulo ___________________________________________________ 34 • Classes de palavras _____________________________________________________ 34 • Tonicidade da sílaba_____________________________________________________ 35 C.3) VARIÁVEIS SOCIAIS:______________________________________________________ 35 • Faixa etária_____________________________________________________________ 35 • Grau de escolaridade ____________________________________________________ 35 • Sexo __________________________________________________________________ 35 • Profissão_______________________________________________________________ 36 CAPÍTULO 1 ________________________________________________________ 37 O CONTINUUM FALA/ESCRITA: VERSO E REVERSO DA MESMA MOEDA ____ 37 1.1 O CONCEITO DE LÍNGUA ___________________________________________________ 37 1.2 O CONCEITO DE TEXTO ____________________________________________________ 39 1.3 CONCEITO DE FALA E ESCRITA _____________________________________________ 40 1.4 PERSPECTIVAS DE ANÁLISE ________________________________________________ 43 1.5 O CONTINUUM ENTRE ALGUNS GÊNEROS TRADICIONAIS NA FALA E NA ESCRITA _____ 47 1.6 O CONTINUUM DE GÊNEROS NA COMUNICAÇÃO DIGITAL MEDIADA POR COMPUTADOR 49 CAPÍTULO 2 ________________________________________________________ 52 ABREVIAÇÃO: DA GÊNESE À DISSEMINAÇÃO___________________________ 52 2.1 CONCEITO DE ABREVIAÇÃO ________________________________________________ 54 2.1.1 ABREVIAÇÃO X ABREVIATURA ____________________________________________ 55 2.1.2 A TRADIÇÃO DAS ABREVIAÇÕES: UM POUCO DE HISTÓRIA ______________________ 57 2.1.3 ABREVIAÇÃO E OS SINAIS ABREVIATIVOS ____________________________________ 61 2.1.4 CLASSIFICAÇÃO DAS ABREVIAÇÕES ________________________________________ 62 2.1.5 A ABREVIAÇÃO E AS NOTAS TIRONIANAS OU TAQUIGRAFIA ______________________ 66 2.1.6 A ABREVIAÇÃO E A SIMPLIFICAÇÃO LINGÜÍSTICA ______________________________ 68 2.1.7 A ABREVIAÇÃO NAS GRAMÁTICAS E HOME PAGES _____________________________ 70 CAPÍTULO 3 ________________________________________________________ 85 A ABREVIAÇÃO E AS TECNOLOGIAS: DO MANUSCRITO AO TEXTO DIGITAL_ 85 3.1 O MANUSCRITO __________________________________________________________ 87 3.2 O IMPRESSO ____________________________________________________________ 91 3.3 O ELETRÔNICO __________________________________________________________ 96 CAPÍTULO 4 _______________________________________________________ 104 A ABREVIAÇÃO E OS GÊNEROS TEXTUAIS: DA CARTA AO E-MAIL ________ 104 4.1 ORIGEM DO TERMO ______________________________________________________ 104 4.1.2 TIPO TEXTUAL X GÊNERO TEXTUAL _______________________________________ 104 • Tipo textual____________________________________________________________ 104 • Gênero textual _________________________________________________________ 105 4.1.3 BREVÍSSIMO HISTÓRICO ________________________________________________ 105 4.2 GÊNEROS EMERGENTES X GÊNEROS PREEXISTENTES _________________________ 108 4.2.1 O GÊNERO CARTA _____________________________________________________ 109 4.2.1.1 Definição __________________________________________________________ 109 4.2.1.2 Classificação_______________________________________________________ 110 4.2.1.3 Visão panorâmica __________________________________________________ 114 4.2.1.4 Cartas pessoais X cartas oficiais______________________________________ 116 4.2.2 O GÊNERO DIÁRIO _____________________________________________________ 118 4.2.2.1 Origem ____________________________________________________________ 118 4.2.2.2 Definição __________________________________________________________ 118 4.2.2.3 A tradição dos diários _______________________________________________ 118 4.2.2.4 A classificação dos diários ___________________________________________ 120 4.2.3 O GÊNERO E-MAIL _____________________________________________________ 122 4.2.3.1 Origem ____________________________________________________________ 122 4.2.3.2 Definição __________________________________________________________ 123 4.2.3.3 Características _____________________________________________________ 124 4.2.3.4 A linguagem dos e-mails_____________________________________________ 127 4.2.3.5 E-mails pessoais X E-mails comerciais ________________________________ 129 4.2.4 O GÊNERO SMS ______________________________________________________ 131 4.2.4.1Origem ____________________________________________________________ 131 4.2.4.2 Definição __________________________________________________________ 132 4.2.4.3 Como funciona o SMS_______________________________________________ 133 4.2.4.4 SMS pessoal e empresarial __________________________________________ 134 4.2.4.5 Principais benefícios do SMS_________________________________________ 134 4.2.4.6 Aplicações do SMS Marketing ________________________________________ 135 4.2.5 O GÊNERO BLOG ______________________________________________________ 137 4.2.5.1 Origem ____________________________________________________________ 137 4.2.5.2 Definição __________________________________________________________ 137 4.2.5.3 Como funciona o blog _______________________________________________ 138 4.2.5.4 Blogs pessoais e empresariais _______________________________________ 139 4.2.5.5 A linguagem nos blogs: tá td blz!______________________________________ 139 4.3 A ABREVIAÇÃO E O SUPORTE DE GÊNEROS TEXTUAIS__________________________ 141 4.3.1 DEFINIÇÃO ___________________________________________________________ 142 4.3.2 CATEGORIAS DE SUPORTES TEXTUAIS _____________________________________ 142 4.3.3 SUPORTES CONVENCIONAIS _____________________________________________ 143 4.3.4 SUPORTES INCIDENTAIS ________________________________________________ 143 4.3.5 SERVIÇOS____________________________________________________________ 144 CAPÍTULO 5 _______________________________________________________ 146 ANÁLISE DOS DADOS ______________________________________________ 146 CONSIDERAÇÕES FINAIS ___________________________________________ 238 REFERÊNCIAS _____________________________________________________ 242 INTRODUÇÃO Embora existam ainda em nossos dias opiniões formadas de que estudar a história de uma língua é algo sem sentido, sabemos que é com um olhar voltado para o passado que encontraremos explicações para os processos de variação e mudança da língua. Sem abordagem diacrônica é impossível desvendar as complexidades que cada período de uma língua registra, e mencionar a importância que a documentação correspondente às várias fases da língua representa para o conhecimento desta. Não raras vezes, são os dados concretos de períodos passados que fornecerão elementos para a compreensão de fenômenos que ocorrem no presente. Para tanto, faz-se necessário conhecer não apenas o objeto de estudo, a língua, mas aspectos da sociedade na qual aquela era utilizada como meio de expressão. Afinal, por ser um instrumento de comunicação imprescindível, a língua passa por constante mudança, ocasionando inovações a todo instante em sua própria essência. A rapidez ou a lentidão das mudanças da língua é determinada pela estrutura da sociedade, ou seja, são as condições sociológicas que favorecem o acúmulo e a integral realização da complexa evolução por que passam as línguas no tempo e no espaço (SILVA NETO, 1970, p. 13). Desta forma, diz-se que a evolução se deu no tempo, quando se imitam os modelos do passado, reproduzindo-se os seus modos de dizer; no espaço, quando indivíduos, que estão em estágios lingüísticos diferentes, se interpenetram mutuamente. Assim, a vida social encontra-se em constante oscilação entre a imitação dos antigos e a difusão das inovações. Estas últimas podem ser lentas e complexas, sujeitas a múltiplos e variadíssimos fatores. Entretanto, como lembra Silva Neto (1970), só vingam as inovações que consultam o espírito da evolução. Por isso é que muitas abortam, não passam dos primeiros movimentos: afoga-as o ridículo ou a indiferença coletiva. Com isso, não queremos dizer que inovar implica evoluir, tampouco afirmar que toda evolução resulta em avanços, melhoras. Ou seja, tomando por base o sentido de evolução enquanto processo de desenvolvimento e aperfeiçoamento de um saber, de uma ciência etc (HOUAISS, 2001, p. 1278), podemos assegurar que há inovações que não resultam em evoluções, restringindo-se ao seu sentido de dicionário, ou seja, são apenas coisas novas, novidades, algo que não havia antes e que, por isso mesmo, não indica evolução, uma vez que não houve desenvolvimento ou aperfeiçoamento. Serão as inovações e as imitações observáveis na língua que nortearão nossa pesquisa, em especial aquelas relacionadas às abreviações que, já comuns no século VI a.C., ganham destaque outra vez no século XX, com o texto digital. Assim, buscaremos traçar uma comparação entre as abreviações utilizadas em períodos anteriores e nos dias atuais, analisando as regras utilizadas para abreviar, as siglas correspondentes a cada palavra, os sinais abreviativos, entre outros, a fim de classificarmos em inovações/imitações ou evoluções as abreviações existentes no passado e que se mantiveram até hoje. Como podemos ler em Martins (1996, p.174), as invenções são apenas transformações ou aperfeiçoamentos de coisas anteriormente conhecidas, ou de pedaços de invenções anteriormente tentadas. E acrescenta: os primeiros aviões aspiram a ser monstruosas libélulas ou enormes gafanhotos; os primeiros automóveis parecem muito mais com as carruagens de cavalos do que com os automóveis atuais. Para David Crystal (2001, p.2), é uma ilusão pensar que a cada nova tecnologia o mundo todo se renova por completo. Segundo ele, “novidades podem até acontecer, mas com o tempo percebe-se que não era tão novo aquilo que foi tido como tal”. Ou seja, são novidades com algum gosto do 17 conhecido. Conforme lemos em Todorov (1980), os gêneros simplesmente vêm de outros gêneros. Segundo esse autor, não há gênero novo, mas sim uma transformação de um ou vários gêneros antigos. E essa transformação se dá ou por inversão, ou por deslocamento ou por combinação. No dizer de Xavier (2002, p.66), Não há vácuos invencionistas em toda a história humana, isto é, toda invenção é, via de regra, uma “reinvenção” de outras invenções bem sucedidas; o nada não cria, tudo vai se transformando sob a batuta inventiva da mente humana. Com base nessas informações, faremos uma análise das abreviações enquanto um “legado” do manuscrito ou uma “criação” da era digital, em especial do texto eletrônico1, já que muitas vezes é a ele associada a imputação pelo uso expressivo daquelas. Para tanto, observaremos o número de ocorrência destas nas tecnologias: a manuscrita, a impressa e a digital; testaremos se a ocorrência delas dá-se em todas as classes de palavras; se o fator extensão do vocábulo é relevante para aplicação da regra; se a tonicidade é ou não favorável à abreviação e, por fim, verificar se a economia lingüística é o que rege o uso das abreviações, ou se há outro(s) fator(es) envolvido(s) nesse processo. Assim, a Introdução trará os objetivos, as hipóteses e a metodologia utilizada ao longo do nosso trabalho, bem como as variáveis analisadas, a saber: estruturais (classes de palavra – iremos verificar se o uso da abreviação ocorre independente da classe de palavra: substantivo, adjetivo, advérbio etc, ou se a incidência do fenômeno em estudo é maior em algumas que em outras; extensão do vocábulo - nessa variável, o objetivo da análise será fundamentado no princípio da economia lingüística, que registrará um número de aplicação da regra mais freqüente em palavras polissílabas que em monossílabas, caso seja esse o fator que rege o uso da abreviação; tonicidade da sílaba – com base no princípio da saliência fônica, buscaremos explicações para uma maior freqüência em sílabas tônicas que em átonas, fato já observado em uma primeira análise dos dados; extensão do texto – numa 1 Aqui usamos indistintamente os termos eletrônico, digital ou virtual. 18 primeira observação dos dados, os textos que apresentavam um maior número de linhas (escritas), conseqüentemente traziam um número maior de abreviações que os textos com menos linhas escritas); sociointerativas (estilo – essa variável permitiu-nos dividir os textos em formais e informais, a fim de detectar se o grau de formalidade do texto inibe ou favorece a aplicação da regra; instância de realização – esse fator classifica os textos em privadas (pessoais) e públicas (empresariais). Com base nele, apresentaremos a probabilidade maior de ocorrência da abreviação em um ou outro tipo de texto; propósito comunicativo – ao que parece, os textos cujo objetivo era o de divertir, ao contrário daqueles que objetivavam informar, são mais propensos a usar abreviações dado o teor lúdico; gênero textual – tendo como premissa a tese de que as palavras são selecionadas segundo as especificidades de um gênero (BAKHTIN,1992, p. 312), demonstraremos qual dos gêneros trabalhados apresenta um maior número de abreviações, independente do período de uso; suporte textual – Xavier (2002, p.75) garante que “boa parte da excelência intelectual alcançada pela escrita alfabética ao longo dos séculos deve ser creditada também a evolução dos suportes nos quais ela se abrigou”. A partir dessa informação, iremos verificar se os suportes exercem alguma influência sobre os gêneros, no nosso caso, promovendo a existência de abreviações no texto; e participantes – o fato de haver menos pessoas envolvidas no processo de comunicação favorece o uso de abreviações ao longo da produção textual); e sociais (faixa etária – no que tange aos gêneros por nós analisados, a idade do “produtor do texto” destaca-se como relevante quando o texto abordado é virtual. Buscaremos, pois, demonstrar se é categórico esse resultado ou se também ocorre nos demais gêneros; grau de escolaridade – com base numa primeira observação dos dados, vimos que quanto mais escolarizado o ‘autor’, menos abreviações são notadas em seus textos. Assim, veremos se o inverso também ocorre na utilização desse recurso da língua, a abreviação; sexo – como a literatura aponta as mulheres como mais conservadoras que os homens e mais inovadoras quando se trata de uma variante de prestígio, utilizaremos essa variável a fim de comprovar ou não tais afirmações; e profissão – embora seja considerada relevante na ocorrência de determinados fatores, no uso de abreviações, a profissão, ao menos na primeira observação dos dados, não foi considerada determinante, sendo 19 possível encontrar tal recurso em textos de autores de profissões as mais variadas possíveis). Dedicaremos o Capítulo I ao continuum fala/escrita, por entendermos o processo de abreviação como um recurso da fala interferindo na escrita, visto que muitas formas abreviadas buscam representar a palavra escrita da forma como ela é pronunciada, o que resulta algumas vezes na alteração de grafemas (ex: cadê por kd). Veremos a definição de cada termo, bem como as várias perspectivas de análise, observando como contrapostos os contínuos entre alguns gêneros tradicionais na fala e na escrita, e na comunicação digital mediada por computador. No Capítulo II, iremos tratar da origem das abreviações, o conceito que lhes é pertinente, a sistemática e tradição, sua classificação, o tratamento dado àquelas pelas gramáticas e sites específicos. A relação que há entre a abreviação e o meio (manuscrito, impresso, digital) no qual ela é reproduzida será abordada no Capítulo III. O Capítulo IV trará a abreviatção e os gêneros textuais (emergentes e preexistentes). Veremos o conceito, origem e propagação destes, além da diferença entre gênero e tipo textual. Para tanto, tomaremos como objeto de análise a carta, o e-mail, o diário, o blog e o SMS. Traremos também as implicações do suporte textual e o uso de abreviações, a fim de constatar se há ou não alguma relação entre ambos. Para tanto, traremos a definição de suporte bem como exemplos de suportes convencionais e incidentais. A análise e os resultados serão expressos no Capítulo V. Nele, nossa tarefa será a de corroborar nossas hipóteses testadas, a fim de, em seguida, apresentarmos as constatações da nossa pesquisa que buscou oferecer uma contribuição, ainda que incipiente, para estudiosos da área. Objetivo Este trabalho tem como objetivo analisar um dos aspectos da língua portuguesa, a redução, aqui entendida como todo fenômeno de representação parcial dos vocábulos, seja literal parcial (“p.” por “página”), literal-algarísmica (“m2” por “metro(s) quadrado(s)”), pictográfica realista (“☼” por “sol”, picto- 20 ideográfico simbólica (“♥” por “amor”, “paixão”), numa perspectiva diacrônicocomparativa, a fim de comprovarmos que fenômenos observáveis sincronicamente têm origem e explicação em estados remotos da história da língua; como também que são restritos a uma região ou, por tratar-se de variação da língua, passíveis de observação em outras localidades. E, a partir daí, afirmarmos em que aspectos se podem flagrar inovações e em que outros perpetuam-se usos ou características das abreviações nos gêneros analisados. O aspecto diacrônico diz respeito ao período compreendido entre o século XVIII e o início dos estudos sincrônicos, enquanto o comparativo referese a três Estados da região Nordeste do Brasil, quais sejam Paraíba, Pernambuco e Bahia. Escolhemos o século XVIII como o ponto de partida, por ser a partir desse período que é possível levantar documentos ainda em condições de manusear-se, ao contrário dos séculos anteriores. Atravessamos o século XIX e nos estendemos até o XX pelo surgimento e propagação do texto eletrônico, atual responsável por tamanha divulgação das abreviações nos textos, em especial nos blogs, chats e e-mails2. No que tange aos três Estados selecionados, Paraíba, Pernambuco e Bahia, buscamos traçar um perfil da região Nordeste, a fim de sabermos se havia uma regularidade quanto ao uso das abreviações contidas em cartas produzidas naqueles Estados. A abreviação é uma espécie de redução de uso geralmente circunstancial, variável de obra para obra, de autor para autor, a qual, quando de uso geral, passa à categoria das abreviaturas (HOUAISS, 1983, p.121-122). Buscaremos mostrar onde e quando teve início esse recurso da língua; quais as características que lhe são peculiares, ou seja, as regras e/ou princípios utilizados para abreviar, os símbolos usados para representar a palavra abreviada; quais as pessoas que fazem uso dele e, finalmente, descobrir se o texto eletrônico, seu propagador atual, é responsável pelo surgimento e uso da abreviação, ou se se trata apenas de uma retomada nos séculos XX e XXI de um processo já existente anteriormente. Ainda, tentarmos responder à seguinte questão: se o uso das abreviações tem interferido em diferentes gêneros, uma 2 Observando-se as variáveis formal X informal; público X privado, conforme vemos no capítulo referente à análise. 21 vez que estes são determinados socio-historicamente (BAKHTIN, 1992, p.285,302). Hipóteses Com base em autores como Spina (1977), Acioli (1994), Mendonça (1987), Berwanger (1995) e Martins (1996) e, numa primeira observação do corpus, levantamos para o nosso trabalho sobre as abreviações as seguintes hipóteses: 1. Esse recurso da língua foi larga e amplamente difundido no passado, permeando os mais variados gêneros; ou seja, seu uso, ao que parece, não se restringiu a uma região específica, mas, ao contrário, espraiou-se por diversos locais do país e do mundo; 2. Seus princípios de utilização, apesar de toda mudança lingüística e social, são mantidos ainda hoje, com algumas alterações no que concerne à representação de alguns itens lexicais; 3. O princípio da economia parece ter sido um fator determinante da ocorrência de abreviações, não apenas nos séculos em que teve início, mas também nos dias atuais; 4. O número de ocorrências das abreviações também está ligado ao grau de formalidade do texto, ao gênero textual, ao suporte textual, ao propósito comunicativo e à comunidade discursiva3; 5. Parece haver certa regularidade nas abreviações que permite uma recuperação da palavra abreviada sem muito esforço por parte do leitor, não apenas atualmente, mas em períodos anteriores. Metodologia 3 Uma comunidade discursiva usa mecanismos de participação para uma série de propósitos: para prover o incremento da informação e do feedback; para canalizar a inovação; para manter os sistemas de crenças e de valores da comunidade; para aumentar seu espaço profissional [...] 22 a) A pesquisa A história primeira deste trabalho teve início em julho de 2002, quando do recebimento, da nossa parte, de várias mensagens de texto, via web, anunciadas no nosso celular. O fato de não conhecermos o (a) autor (a) era instigante, contudo, o que nos deixou curiosos, no decorrer do envio dessas, foi o nosso desconhecimento em relação a alguns vocábulos ali registrados: uma das mensagens dizia: “+ TARD TC C VC. BJS”4. De imediato, começamos uma busca por alguém que pudesse decodificar essa linguagem, até então, misteriosa, para nós. No início, não sabíamos se se tratava de abreviação ou sigla; começamos a associá-la a um novo tipo de linguagem dos jovens. Após algumas aulas sobre as referidas mensagens, e já familiarizados com as abreviações, passamos a atribuir a esse novo meio de comunicação – web – o uso daquelas por parte de quem as utiliza. Entretanto, de volta ao ambiente acadêmico, desta vez fazendo o levantamento do corpus com o qual iríamos trabalhar em nossa tese, descobrimos nas leituras não apenas a ocorrência de abreviações, mas também, até certo ponto, um uso acentuado delas em cartas (documentos em geral) escritas no século XVIII. Nasce então a curiosidade e o desejo de sabermos5 o quem, quando, onde, como e por que da origem da abreviação, já que agora tínhamos a certeza de que esse processo não é algo restrito a nossa época e, em particular, ao texto digital. Demos início a nossa pesquisa, que sempre priorizou o feitio diacrônico e também comparativo. b) A seleção b.1) O período 4 Por estarem em maiúsculas, pensamos tratar-se das iniciais do nome do remetente. Segundo Pe. Antonio Vieira, quem não pergunta não quer saber; quem não quer saber quer ignorar. 5 23 Quando do início propriamente dito da pesquisa, vimos que o desejo pelo tema nascera com a incitante mensagem de texto recebida pelo celular e, mais tarde, a constatação das abreviações já em manuscritos do século XVIII. Restaram apenas os impressos. Foi quando optamos então por enveredar por este caminho que nos leva dos textos manuscritos, atravessa os impressos, até chegar aos textos digitais. Sabedores da dificuldade em encontrar um considerável número de textos anteriores ao século XVIII – que estivessem pelo menos em bom estado de conservação6, portanto, passíveis de leitura, optamos por analisar manuscritos do século XVIII, textos impressos do século XIX, e textos digitais dos séculos XX e XXI. b.2) O local Restava o lugar. A escolha não foi difícil. Iríamos utilizar material da Paraíba, cujo corpus pertence à tese defendida em 2003 pela Professora Maria Cristina de Assis Pinto, intitulada Caracterização Lingüística de Cartas Oficiais da Paraíba dos Séculos XVIII e XIX; do Recife, por aqui estarmos cursando o doutorado, trabalhamos com o material do Projeto Ortografia e Pontuação em manuscritos do século XVIII, coordenado pelo Prof. Marlos de Barros Pessoa; e, por fim, o Estado da Bahia, para não só termos um perfil de Estados do Nordeste, como também por sediar aquele Estado um bom banco de dados, organizado pela Profª Tânia Lobo, a saber: Cartas baianas setecentistas, fruto do “Projeto de Pesquisa das Fontes para o Estudo da História da Língua Portuguesa no Brasil”. Assim, preservaríamos a veia diacrônico-comparativa a que se propõe a pesquisa. Há de se ter claro que existem, embora raros, materiais pertencentes a períodos anteriores passíveis de manuseio. 6 24 b.3) O material A princípio, pensamos restringir o material a ser por nós analisado a cartas. Porém, como faríamos um levantamento de textos digitais, vimos que talvez nos desviássemos um pouco do nosso objetivo ao ter de provar, tratando e-mails e outros textos digitais como cartas, que aqueles seriam uma versão moderna dessas. Depois de observarmos que as abreviações não eram específicas desse gênero, mas, ao contrário, estavam presentes nos mais variados gêneros textuais, optamos então - já que é uma das nossas hipóteses - por analisar diversos suportes textuais, a fim de comprovarmos o real uso das abreviações em diferentes gêneros, dentre os quais estão o diário, o blog e o SMS. Dessa forma, teríamos gêneros emergentes e suas contrapartes. b.3.1) Tipologia O material considerado importante para esta pesquisa é derivado de duas instâncias: pública e privada, assim distribuídos: privados • manuscritos públicos privados • impressos públicos privados • digitais públicos Optamos por essas duas instâncias levando em consideração que o estilo formal prima por uma linguagem mais “elaborada”, o que, se não elimina, sem dúvida, inibe o uso das abreviações; enquanto que o estilo informal, mais distenso, por isso menos “rebuscado”, favorece o uso daquelas. Essa divisão 25 engloba tanto as cartas quanto os demais gêneros trabalhados e anteriormente citados, cuja seleção e respectiva distribuição deram-se da seguinte forma: • Buscamos coletar números aproximados de textos dos três Estados, PB, PE, BA, no que diz respeito aos gêneros: diário, blog, e-mail e SMS; • Primamos por manter a maior variedade possível no que tange aos fatores sociais, quais sejam: sexo, faixa etária, grau de escolaridade e profissão; • Preservamos o binômio pessoal (privado) X empresarial (público) em todos os gêneros trabalhados aqui. Dessa forma, o material coletado ficou assim distribuído: profissão jovens escolarização homens profissão adultos escolarização privadas profissão jovens escolarização mulheres profissão adultos escolarização profissão cartas jovens escolarização homens profissão adultos escolarização públicas profissão jovens mulheres escolarização profissão adultos escolarização 26 profissão jovens escolarização homens profissão adultos escolarização privadas profissão jovens escolarização mulheres profissão adultos escolarização profissão diários jovens escolarização homens profissão adultos escolarização públicas profissão jovens escolarização mulheres profissão adultos escolarização profissão jovens escolarização homens profissão adultos escolarização privadas profissão jovens escolarização mulheres profissão adultos escolarização profissão e-mails jovens escolarização homens profissão adultos escolarização públicas profissão jovens escolarização mulheres profissão adultos escolarização 27 profissão jovens escolarização homens profissão adultos escolarização privadas profissão jovens escolarização mulheres profissão adultos escolarização profissão blogs jovens escolarização homens profissão adultos escolarização públicas profissão jovens escolarização mulheres profissão adultos escolarização profissão jovens escolarização homens profissão adultos escolarização privadas profissão jovens escolarização mulheres profissão adultos escolarização profissão SMS jovens escolarização homens profissão adultos escolarização públicas profissão jovens escolarização mulheres profissão adultos escolarização 28 b.3.2) A autoria Quanto à autoria, o material foi classificado em textos autógrafos, isto é, originais manuscritos do próprio punho do autor, e, apógrafos, escritos por outrem, mas que valeriam por autógrafo (HOUAISS, 1983, p.65). Dentre o material com o qual trabalhamos havia 170 autógrafos e 10 apógrafos. b.3.3) A amostra (distribuição geográfica e temporal) O corpus da nossa pesquisa é composto de cartas (dentro desse gênero trabalhamos com subgêneros – carta pessoal, carta ao leitor etc), diários, e-mails, mensagens de texto (SMS) e blogs. Os documentos são pertencentes aos séculos XVIII, XIX, XX e XXI, assim distribuídos: cartas: 30 (XVIII e XIX) Manuscritos: 60 diários: 30 (XX e XXI) cartas: 30 (XIX) Impressos: 60 diários: 30 (XX e XXI) e-mails: 30 (XX e XXI) Eletrônicos: 60 blogs e SMS: 30 (XXI) b.3.4) A seleção dos informantes Sendo inviável, ao menos em alguns casos, apontar fatores sociais como grau de escolaridade e faixa etária, decidimos por agrupar os informantes 29 pela profissão que exerciam, uma vez que este critério não só era possível de identificação no material da BA quanto no da PB e PE, como nos ajudaria a relacionar, de uma só vez, o tipo de cargo que o informante exercia com o grau de formalidade presente (formal X informal) e a implicação desses fatores no uso da abreviação. No corpus da Bahia, segundo Lobo7 (2001), temos a seguinte caracterização sociolingüística dos informantes: juízes ordinários provavelmente brasileiros e possivelmente não formados em leis e, desembargadores, provavelmente portugueses e certamente formados em leis. O material da Paraíba foi disposto por Pinto (2003, p.157-166) em forma de anexo, no qual as informações relativas aos autores/destinatários das cartas, no que tange à profissão, variam de militar escrivão a governador da província, dos quais nós selecionamos8: ⇒Vigário da Vila: 02 ⇒Chefes de polícia: 02 ⇒Juiz Ordinário: 02 ⇒Desembargadores: 02 ⇒Ministro do Reino: 02 O terceiro Estado, Pernambuco, reúne em seu banco de dados informantes cuja escala profissional vai desde Capitães engenheiros a Governadores, Condes etc, assim distribuídos9: ⇒Servidor público: 02 ⇒Major: 02 ⇒Tenente: 02 ⇒Tipógrafo: 02 ⇒Governador: 02 A autora deixa claro que se trata de uma hipótese plausível. Entendemos que quanto maior a variedade de profissão, melhor seria verificar a relação desse fator com o fenômeno estudado. 9 Vale ressaltar que essas informações dizem respeito às cartas. Os demais gêneros têm outra distribuição. 7 8 30 No que tange aos demais gêneros, diário, blog, e-mail e SMS, as profissões dos informantes ocupam um leque que vai de professor a empresário, passando por contadores e advogados (os pessoais). Quanto ao gênero SMS, o caráter oficial/público diz respeito a 3 (três) empresas do ramo da telefonia: TIM, OI , CLARO10. No gênero e-mail, outras 3 (três) empresas, desta vez provedores da Internet, são analisadas: YAHOO, IBEST, UOL11. O gênero blog terá suas amostras coletadas dos seguintes provedores: HOTMAIL, IG, e TERRA12. c) Variáveis analisadas Tomando por base a assertiva que diz serem os gêneros textuais fenômenos socio-históricos e culturalmente sensíveis (MARCUSCHI, 2002), deve-se ter bem clara não só a questão da produção adequada desses como também o uso adequado. Caso contrário, a inobservância das normas sociais relativas aos gêneros pode acarretar problemas. Afinal, a apropriação dos gêneros, como afirma Bronckart (1999), é um mecanismo fundamental de socialização, de inserção prática nas atividades comunicativas humanas. Dessa forma, na produção de cada gênero, há de se considerar a relação entre os aspectos abaixo mencionados: • Natureza da informação ou do conteúdo veiculado; • Nível de linguagem (formal, informal, dialetal, culta etc.); • Tipo de situação em que o gênero se situa (pública, privada, corriqueira, solene etc.); • Relação entre os participantes (conhecidos, desconhecidos, nível social, formação etc.). • Natureza dos objetivos das atividades desenvolvidas. 10 Essas foram as empresas selecionadas por serem as maiores representantes nessa área, ao menos na região Nordeste. 11 A escolha dessas empresas também se deu por causa do elevado número de pessoas (físicas e jurídicas) que as acessam diariamente. 12 A fim de utilizarmos uma amostra a mais variada possível, optamos por acrescentar esses provedores na análise desse gênero digital. 31 Tais indicadores seriam uma espécie de identificação das condições de adaptação comum na produção dos gêneros (MARCUSCHI, 2002). Sendo assim, escolhemos um total de 14 (quatorze) variáveis consideradas importantes para análise do nosso objeto de estudo, dentre as quais 6 (seis) são de ordem sociointerativo, 4 (quatro) de ordem estrutural e 4 de natureza social, respectivamente: c.1) Variáveis sociointerativos • Gênero: Dos gêneros textuais por nós aqui trabalhados – carta, diário, blog, e-mail e SMS – iremos analisar qual deles comporta maior número de abreviação, a fim de sabermos se há ou não uma relação entre o gênero e o processo da abreviação. Assim, começaremos o levantamento dos dados com os documentos do século XVIII, período em que ainda havia um largo uso desse processo por parte de quem escrevia, e estenderemos nossa análise aos dias atuais, quando há um retorno acentuado no que diz respeito ao recurso da abreviação. Partindo do princípio de que os gêneros textuais são fenômenos históricos, profundamente vinculados à vida cultural e social, observaremos se a rapidez13 exigida na escrita dos gêneros digitais faz com que haja ou não uma maior utilização desse fenômeno, já que era esse um dos fatores responsáveis pela sua existência nos períodos anteriores. • Estilo14: Decidimos controlar essa variável, tomando como premissa a existência do estilo em qualquer linguagem15 (POSSENTI 2001, p. 228). Dessa forma, foi possível dividir os textos em formais e informais16, visando com isso à obtenção de um resultado que mostrasse alguma relação da abreviação com o grau de formalidade do texto. Presumimos que, embora não seja determinante, esse fator tem um peso considerável no que se refere 13 É importante lembrar que a rapidez imposta aos usuários é decorrente do “princípio da economia”, que abrange tempo, esforço físico e pulso telefônico quando não é a cabo. 14 Aqui usamos o termo estilo, por entendermos como a escolha que faz o falante das formas lingüísticas do seu discurso. 15 Segundo o autor, nenhuma liguagem é o que é por natureza, mas sim como resultado do trabalho de seus construtores/usuários. 16 Entendemos como estilo informal aquele cujo grau de reflexão sobre as formas empregadas é mínimo; ao passo que é máximo o grau de reflexão no estilo formal. 32 ao uso das abreviações, uma vez que o texto formal tende a seguir a norma padrão, segundo a qual não se deve utilizar abreviações caso não haja necessidade. E, ao fazer uso destas, seguir as regras existentes. • Instância de realização: Dividimos os textos que compõem o corpus, pelo menos os que se prestavam a tal divisão, em privados (pessoais) e públicos (empresariais). Buscaremos verificar se há uma relação direta com essa divisão e o número de ocorrência de abreviação nesses gêneros. Acreditamos que em razão do texto público fazer uso de um vocabulário mais conservador, em geral, já que se destina a pessoas variadas, talvez haja nele um menor número de abreviações, ao contrário do texto pessoal, que se dirige a um público seleto, muitas vezes o próprio autor, que reconhece toda e qualquer abreviação por si utilizada. • Participantes: Quando da correspondência equivalente: 1x1 ou NxN17, no que diz respeito ao número de participantes, o fato de haver uma maior restrição parece determinar o percentual de ocorrência de abreviações. Em outras palavras, se remetente e destinatário são em número igual, há mais chance de aplicar a regra, ou seja, usar abreviações, visto que, em princípio, o autor conhece o léxico e sintaxe daquele para o qual está escrevendo. • Propósito comunicativo: Paralelo ao estilo, este fator mostra-se relevante quanto ao uso das abreviações. Ou seja, os textos que se propõem a divertir o(s) destinatário(s) apresentam uma maior ocorrência de abreviação do que aqueles cuja finalidade é informativa, educativa etc, comprovando a plasticidade da linguagem, no que diz respeito aos usos que dela são feitos. Como afirma Coscarelli (2005, p.121), para melhor atenderem aos seus propósitos, os textos, sejam eles em formato hipertextual ou não, precisam ser diferentes em cada situação de comunicação. Adotando a terminologia usada por Zanotto (2005, p.131-133), classificaremos os propósitos comunicativos em dominantes e secundários, seja o texto lúdico ou informativo. • Suporte: Como veremos, foi com o manuscrito e o respectivo preço elevado do material da escrita que surgiram as abreviações. Essa economia, contudo, inexistente na era do impresso, não foi suficiente para 17 Estes símbolos significam, respectivamente, um para um e muitos para muitos. 33 extinguir o uso delas – as abreviações -, que ainda continuaram, em menor número, por algum tempo. Com o texto virtual, cujo suporte é o computador, há um retorno às abreviações que, embora ressurjam com alterações próprias das novas tecnologias, em muito lembram as utilizadas já nas notas tironianas. Partindo da assertiva de McLuhan, segundo a qual o meio é a mensagem, iremos verificar se o canal é ou não um mero veículo de transmissão, se exerce ou não influência no gênero que veicula. c.2) Variáveis estruturais • Extensão do texto: Iremos verificar o número de abreviações e sua relação com a extensão do texto, a fim de sabermos se o processo é diretamente proporcional, ou seja, quanto maior o texto, sua extensão, mais abreviações se fazem notar. Pudemos ver, numa primeira leitura dos dados, que tanto as cartas do século XVIII quanto os e-mails do século XX e dias atuais fazem uso desse recurso da língua, quer se trate de um texto com mais ou menos de vinte linhas. • Extensão do vocábulo: Por tratar-se de um princípio de economia, é de se esperar que a abreviação seja mais freqüente em vocábulos com mais de uma sílaba. Ou seja, quanto maior a palavra, maior a probabilidade de redução; o que não significa dizer que não haja palavra dissílaba ou monossílaba (que, por exemplo) que não sofra abreviação. É bem verdade também que algumas reduções não se justificavam, visto que apenas uma letra era apagada, como no exemplo: pr (por), plos (pelos), conhecimetos etc. Faremos uma análise do fenômeno, a fim de testarmos a existência ou não de alguma relação que justifique esses resultados. • Classes de palavras: Esta variável nos permitirá estabelecer ligações entre as dez classes de palavras existentes e a ocorrência de abreviações nessas. Dessa forma, será possível afirmar se se abreviam tanto adjetivos, quanto verbos, pronomes, advérbios, substantivos e outros, não só nas cartas e diários, mas também nos blogs, e-mails e SMSs. 34 • Tonicidade da sílaba: Não sabemos de fato se há uma relação de causa estabelecida, mas, dos dados analisados, a incidência das reduções recai, em sua maioria, nas silabas tônicas, quer seja a palavra monossílaba, dissílaba, trissílaba ou polissílaba. c.3) Variáveis sociais18: • Faixa etária: Dentre os fatores sociais analisados, este parece se destacar como mais relevante no processo de redução da palavra, a abreviação. Contudo, não podemos esquecer que essa relação só é determinante nos gêneros digitais. Ao que parece, esse fato se deve à razão de serem os jovens aqueles que mais utilizam as novas tecnologias digitais e, conseqüentemente, a linguagem peculiar. Nos demais gêneros, esse fator parece ocorrer independente da idade do produtor do texto. • Grau de escolaridade: Como não foi possível determinar com precisão o grau de escolaridade dos informantes (remetentes e destinatários), em se tratando dos autores de textos dos séculos anteriores, XVIII e XIX, dividimos estes em mais alfabetizados e menos alfabetizados. Para tanto, não adotamos o conceito de letramento, mas sim a definição de que alfabetizado é aquele que escreve e lê, já que aqui era condição sine qua non19 do nosso objeto de estudo. • Sexo: Embora nas cartas só tenha havido um caso de remetente do sexo feminino, já que não era permitido à mulher o direito de escrever, ficando restrito ao homem essa tarefa, nos demais gêneros, onde foi possível manter uma equivalência quanto ao sexo, vimos que esse fator não é relevante para determinação das abreviações. 18 Dependendo da situação em que se encontrar, a variedade lingüística utilizada por um falante será relativa à sua região de origem, classe social, idade, escolaridade, sexo etc. (MUSSALIM, Fernanda, BENTES, Anna Christina (orgs.), 2005). 19 É verdade que alguns podiam exercer a função de “escritor” e “leitor” da carta para aqueles que não dominavam tais capacidades. No século XVI, existiam os upografeis, pessoas que escreviam por aqueles que não sabiam fazê-lo. Exemplos disso são as narrativas de vida popular que, freqüentemente delegavam a uma pessoa próxima a atividade da escrita. Por exemplo: Uma criança que escreve por seus pais e, no exército, um conscrito mais bem alfabetizado que redige a correspondência de seus colegas (CHARTIER, 2002, p. 92-93). 35 • Profissão: Essa última variável permitirá a observação de como, se é que é possível, a profissão interfere na relação do uso de abreviação, já que há algumas profissões que se servem constantemente desse modo de simplificar a língua, ao contrário de outras que impedem a utilização de abreviações por parte de quem escreve (há proibição nos atos processuais e inadmissibilidade em fichas de declaração e Carteiras de Trabalho e Previdência Social, segundo nos informa o site DJi – índice Fundamental do Direito). 36 CAPÍTULO 1 O CONTINUUM FALA/ESCRITA: Verso e reverso da mesma moeda 1.1 O conceito de língua Tendo em vista que a fala e a escrita são modalidades da língua, há que se ter a priori, antes de adentrarmos esta questão, uma exposição, ainda que embrionária, do conceito de língua que norteia nosso estudo. Para tanto, elegemos alguns autores em consonância com nossa postura teórica a fim de dissipar quaisquer interpretações eivadas de crenças equivocadas sobre esse lado social da linguagem. É fato que a língua não deve ser tratada como uma abstração, extraída de sua realidade socio-histórico-cultural, uma vez que aquela não existe senão no falar dos indivíduos, e o falar é sempre falar uma língua (COSERIU, 1979, p.33). Sob esse prisma, tanto o estruturalismo de Saussure quanto o mentalismo de Chomsky são aqui rechaçados por deixarem de lado o indivíduo, a sociedade, a história e a interação20, priorizando o sistema e menosprezando o discurso21. 20 Marcuschi (2005b) deixa claro que, ainda que de formas diferentes e com conseqüências diversas, hoje é possível ver essas conseqüências. (MARCUSCHI, L.A. Perplexidades e perspectivas da lingüística na virada do milênio. In: LINGUA, LINGUÍSTICA E LITERATURA: revista do Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da Universidade Federal da Paraíba. João Pessoa/Santa Maria: Pallotti. VOL.1, n.3, Dez/2005, 214 p.). 21 A fim de não cometermos injustiça, trazemos à baila a distinção entre langue e parole, feita por Saussure, e a que Chomsky fez entre competência e desempenho, ambas decisivas na história da Lingüística. Vale ressaltar que Coseriu critica as noções de langue e parole, de Saussure. 37 A concepção de língua não como obra acabada, mas como uma atividade ininterrupta, mesmo quando fixada através da escrita, já era defendida por Humboldt (1971) e corroborada por Coseriu (1979), para quem a língua é uma matéria viva e evolutiva, inovada sem cessar pelo homem. Segundo este autor, ao contrário de ser alteração ou deterioração22, a mudança na língua é reconstrução, renovação do sistema, assegurando-lhe continuidade e funcionamento. Acerca das variações e mudanças da língua, destacamos o trecho a seguir: A cada dia aparecem, aos milhares, nos jornais, indicações de todo tipo, aparecem nas ruas, em tabuletas, por toda parte. Não se deve acreditar que se trata de uma forma inferior de linguagem; essas indicações desempenham, na vida, um grande papel e exercem uma sensível influência no desenvolvimento da língua. Desde o século XIX, sobretudo, elas contribuem fortemente para as mudanças do léxico, em vista de suas necessidades peculiares. Não deixam de atuar também sobre a sintaxe, mediante reduções23, obrigatórias, em vista do lugar, do preço e das necessidades de serem lidas de um só golpe de vista; trata-se de um estilo telegráfico de outro gênero, que tem regras obscuras, das quais a principal é fazer 24 o máximo de efeito com o mínimo de palavras . Seguidores dessa visão, consideramos a língua como um jogo de atividades verbais, heterogêneas, interacionais, cognitivas, sociais e históricas interdependentes e interrelacionadas. De acordo com essa perspectiva: A língua apresenta uma organização interna sistemática que pode ser estudada cientificamente, sem se reduzir a um conjunto de regras de boa-formação que podem ser determinadas de uma vez por todas como se fosse possível fazer cálculos de previsão infalível; a língua tem aspectos estáveis e instáveis, ou seja, ela é um sistema variável, indeterminado e não fixo, apresentando sistematicidade e variação a um só tempo; a língua se determina por valores imanentes e transcendentes, de modo que não pode ser estudada de forma autônoma, devendo-se recorrer ao entorno 22 Para Sócrates, a questão da mudança lingüística “é obra de pessoas que não se preocupam com a verdade, mas apenas com a forma de suas bocas; assim, vão modificando as palavras originais até que nenhum ser humano consiga entender o que a palavra significa (FERREIRA, CARRILHO & LOBO et al. 1996, p. 564)”. 23 No capítulo referente à abreviação, nos deteremos com mais profundidade nesse aspecto. 24 BRUNOT, Ferdinand. (1926) La pensée et la langue. 38 e à situação nos mais variados contextos de uso; a língua constrói-se com símbolos convencionais, parcialmente motivados, não aleatórios mas arbitrários; a língua não pode ser tida como um simples instrumento de representação do mundo, como se dele fosse um espelho, pois ela é constitutiva da realidade; a língua é uma atividade de natureza sociocognitiva, histórica e situacionalmente desenvolvida para promover a interação humana; a língua se dá e se manifesta em textos orais e escritos ordenados e estabilizados em gêneros textuais para uso em situações concretas; a língua não é transparente, mas opaca, o que permite a variabilidade de interpretação nos textos e faz da compreensão um fenômeno especial na relação entre os seres humanos (MARCUSCHI, 2000, p.32). Na visão de Coseriu (1979, p. 52), “a língua é um saber falar, saber como se fala numa determinada comunidade e segundo uma determinada comunidade e segundo uma tradição”. Esta, pois, é a visão de língua da qual compartilhamos plenamente. Ou seja, uma concepção de língua como uma atividade social, cujas normas evoluem segundo os mecanismos de autoregulação dos indivíduos e dos grupos em sua dinâmica histórica de interação entre si e com a realidade (BAGNO et al.2002, p. 32). 1.2 O conceito de texto Uma vez que fazemos uso do termo texto em vários momentos da nossa pesquisa, vimos como indispensável – ainda que de forma incipiente – apresentarmos a definição que adotamos para o mesmo, a fim de deixar clara a nossa postura em relação à concepção porque por ora optamos. Tendo como âncora teórica o sociointeracionismo da linguagem, entendemos o texto como uma atividade interacional na qual existe um sujeito social que, numa dada situação, realiza uma atividade verbal com vistas a determinados efeitos. Segundo Koch (1997, p.7): Em sua inter-relação com outros sujeitos, o sujeito planejador/organizador vai construir um texto, sob a influência de uma complexa rede de fatores, entre os quais a especificidade da situação, o jogo de imagens recíprocas, as crenças, convicções, atitudes dos interactantes, os conhecimentos (supostamente) partilhados, as expectativas mútuas, as normas e convenções sócio-culturais. 39 Segundo Zanotto (2005, p. 36), os textos são as unidades de comunicação empírica. São entidades concretas, orais ou escritas, com começo e fim. Desta forma, fica clara a inconsistência do conceito de texto que se restringe a defini-lo como sendo representação gráfica cercada de espaços em branco, muito menos um que o reduza a mero conjunto de frases que apresentam sentido. O texto precisa ser estudado enquanto objeto em processo e não produto finalizado, visto que se trata de uma atividade intencional que o falante, de conformidade com as condições sob as quais o texto é produzido, empreende, tentando dar a entender seus propósitos ao destinatário através da manifestação verbal (KOCH, 1997, p. 22). 1.3 Conceito de fala e escrita Por entendermos a abreviação como um processo de estratégias da língua falada na escrita, ou seja, ‘o falante tenta escrever como fala’(p.ex: kbça por cabeça), vimos, como indispensável, antes de tratarmos do assunto propriamente dito, apresentar algumas considerações acerca do binômio oralidade e escrita já que, em certo sentido, gêneros emergentes (como os por nós aqui estudados, o e-mail e o blog, por exemplo) possibilitam a redefinição de alguns aspectos centrais na observação da linguagem em uso, especificamente a relação entre a oralidade e a escrita. É sabido que a natureza da comunicação escrita foi radicalmente transformada pelo uso da tecnologia digital, ao inserir novos gêneros textuais. Sendo assim, a visão dicotômica de fala/escrita torna-se hoje insustentável, frente à variedade de formas e usos comunicativos em multimeios e suporte eletrônico. Como afirma Marcuschi (2005, p.10), a natureza da escrita que se desenvolve na Internet aflora certa primazia de estratégias orais sobrepondo-se às estratégias da escrita. Ou ainda como salienta Vieira (2005, p. 29), é fato a relavorização da escrita com a introdução da tecnologia eletrônica, independente do que signifique falar/ler/escrever, dos limites oral/escrito e de suas novas funções. A fim de melhor discutirmos essa questão, reunimos neste capítulo estudos com diferentes visões sobre o oral e o escrito. Nesse sentido, veremos 40 quais deles tratam a oralidade como algo informal, quais os que associam a formalidade à escrita, proclamando sua supremacia; e por fim, aqueles que vêem tanto em uma quanto em outra modalidade duas entidades que constantemente se perpassam. Embora tenha sido objeto de estudo de muitos trabalhos em Lingüística, a discussão sobre as relações entre fala e escrita ainda está longe de esgotar a questão, visto que a idéia de escrita como modalidade que requer mais elaboração do que a fala ainda encontra espaços entre estudiosos baseados na crença de que existem características intrínsecas aos textos orais e aos textos escritos. Um dos motivos para a propagação de axiomas desse tipo parece estar relacionado ao realce dado à língua escrita em prejuízo da falada, antes do século XX e, mais acentuadamente, antes do século XIX. Acreditava-se que, ao escrever, no dizer de Sampson (1996, p.8), vestimos nossos trajes lingüísticos de domingo, ponderando e censurando nossas expressões para obter um produto final elaborado. Por outro lado, a língua falada era tida, até meados da década de 60, como de estrutura simples ou desestruturada, informal, concreta e dependente do contexto; em síntese, o lugar do “caos” (FÁVERO, L. et al., 2003). Mesmo sendo preterida pela escrita, a transmissão oral do conhecimento foi por muito tempo privilegiada em detrimento da escrita devido à relutância de alguns intelectuais da Antiga Grécia, como Platão, em aceitar a escrita como uma criação apropriada, embora já se tivessem passado dois séculos e meio do surgimento da “escrita fenícia” (MAN, 2004). Segundo Man, acerca da apropriação do alfabeto, Platão teria afirmado o seguinte: Se os homens o aprenderem, ele irá plantar o esquecimento em seus corações. Para o verdadeiro conhecimento, é necessária a interação, com bons professores. Uma vez que suas palavras estão em um livro, o processo inteiro se rompe (MAN, 2004, p. 251). Olson (1997), citando Bloch (1989), diz que a escrita pode ter papéis muito diferentes em diferentes culturas: “na cultura chinesa a palavra escrita é 41 tida como padrão e as formas orais são consideradas derivadas; na Índia, é justamente o contrário: a forma oral é sagrada, a escrita não inspira confiança.” Ou seja, na opinião de Bloch (1989), o papel da escrita só é entendido quando observada a estrutura da cultura na qual ela foi introduzida. R. Thomas (1989 APUD OLSON, 1997), por exemplo, diz que o domínio da escrita contribuiu menos para as realizações dos gregos do que geralmente se imagina. Afirma ainda que muitos filósofos dos antigos gregos, entre eles Platão, não só preferiam as formas orais como também não confiavam nas formas escritas. Já Horcades (2004, p. 16) diz que a invenção da escrita foi uma das maiores realizações do homem na Terra. Na opinião dele: A escrita possibilitou o acúmulo de conhecimento humano. Antes dela, tudo o que um homem aprendia durante sua vida morria com ele. Depois da invenção da escrita, o conhecimento passou a se acumular e a não se perder, assim, ao nascer, o homem tem a seu dispor toda a experiência e as descobertas de seus antecessores. Convém lembrar que, durante muitos séculos, conforme lemos em Lévy (1993), a escrita foi privilégio de poucos, ficando a alfabetização restrita a grupos eclesiásticos e a nobres. Somente a alguns foram concedidos o acesso e exercício da escrita, criando um ambiente de grande discriminação, onde os muitos que a ignoravam eram controlados pelos poucos que a dominavam. Sendo assim, durante muito tempo, e por que não dizer ainda hoje, tratou-se a questão das relações entre oralidade e escrita como algo dicotômico e estanque, a ponto de se considerar como dois sistemas lingüísticos, duas línguas. Também o fato de, em muitas línguas, a escrita ser relativamente conservadora em comparação com a falada, encaminhou a atenção para a escrita como algo oposto à fala. Entretanto, sabemos que tanto a língua falada quanto a escrita sofrem influência das pressões sociais. E, embora sejamos cientes de que todas as comunidades humanas possuem uma língua falada, e algumas não têm um 42 sistema de escrita, ainda assim, tal constatação não é suficiente para se ignorar o estudo da língua escrita. 1.4 Perspectivas de análise Conforme lemos em Marcuschi (2001, p.34), a partir dos anos 80, porém, houve uma mudança de visão no que concerne ao tratamento da oralidade e da escrita como opostas. Observou-se que as relações entre fala e escrita não são óbvias nem lineares, não podendo postular-se polaridades estritas e dicotomias estanques, já que elas refletem um constante dinamismo fundado no continuum que se realiza entre essas duas modalidades de uso da língua. Devemos, sim, tratar a oralidade e a escrita como imprescindíveis ao ser humano, não confundindo seus papéis e contextos de uso, e não discriminar seus usuários, pois assim como a fala não apresenta propriedades intrínsecas negativas, também a escrita não tem propriedades intrínsecas privilegiadas, sendo um erro demandar preeminência de uma das duas modalidades, já que não podemos assegurar que a fala é superior à escrita – apesar da primazia cronológica indiscutível daquela em relação a esta – nem tampouco que a escrita é superior à fala25 (MARCUSCHI, 2001, p. 22). E, ainda que o homem seja definido como um ser que fala, tal assertiva não implica a superioridade da fala sobre a escrita, nem tampouco sustenta a tese de que a fala é primária e a escrita é derivada. Ambas, segundo Marcuschi (2001, p.17), “são práticas e usos da língua com características próprias, permitindo a construção de textos coesos e coerentes, variações estilísticas, sociais, dialetais, ao contrário do que apregoam alguns lingüistas como Bernstein (1971), Labov (1972) e Halliday (1985) 26”. Segundo a perspectiva das dicotomias, uma das várias tendências de análise da relação fala/escrita, a fala seria o lugar do erro e do caos gramatical 25 Do ponto de vista cronológico, a fala tem uma grande precedência sobre a escrita; do ponto de vista do prestígio social, a escrita é vista como mais prestigiosa que a fala. Trata-se, como salienta Marcuschi (2001, p. 36), de postura ideológica. 26 Para estes, a língua falada e a língua escrita estão divididas em dois blocos distintos, apresentando, cada uma dessas modalidades, características intrínsecas. 43 (redundante, não-planejada, fragmentada, incompleta e pouco elaborada), enquanto a escrita, o lugar da norma e do bom uso da língua (condensada, planejada, não-fragmentada, completa e elaborada). Essa visão, divulgada nos manuais escolares, postula menor complexidade para a fala e maior para a escrita. Mas, como salienta Koch (2000, p.68), essas diferenças nem sempre distinguem as duas modalidades, mesmo porque existe uma escrita informal que se aproxima da fala e uma fala formal que se aproxima da escrita. Ainda: essas características foram sempre estabelecidas tendo por parâmetro o ideal da escrita, levando a uma visão preconceituosa da fala. Ou seja, costuma-se olhar a língua falada “através das lentes de uma gramática projetada para a escrita”, comparando-a a uma linguagem rústica, das sociedades primitivas e das crianças em fase de aquisição (KOCH, 2002, p. 79). O que ocorre, na verdade, é que a fala apresenta características próprias. É necessário considerar as condições de produção27, para que não haja distorção no estabelecimento das relações entre fala e escrita, pois essas são distintas em cada modalidade, como podemos observar no Quadro 1, abaixo: Quadro 1 Fala Interação face a face; Planejamento simultâneo ou quase simultâneo à produção; Criação coletiva: administrada passo a passo Impossibilidade de apagamento; Sem condições de consulta a outros textos; A reformulação pode ser promovida tanto pelo falante como pelo interlocutor; Acesso imediato às reações do interlocutor; O falante pode processar o texto, redirecionando-o a partir das reações do interlocutor; O texto mostra todo o seu processo de criação. 27 Escrita Interação a distância (espaço-temporal); Planejamento anterior à produção; Criação individual; Possibilidade de revisão; Livre consulta; A reformulação é promovida apenas pelo escritor; Sem possibilidade de acesso imediato; O escritor pode processar o texto a partir das possíveis reações do leitor; O texto tende a esconder o seu processo de criação, mostrando apenas o resultado. Fávero et al.(2003, p.74). 44 Sendo assim, podemos concluir que tanto a fala quanto a escrita compreendem um continuum, que vai do mais informal ao mais formal, passando por níveis intermediários. Dessa forma, a informalidade consistiria em uma das possibilidades de realização tanto da fala como da escrita, e não uma característica específica da modalidade oral (FÁVERO, 2003, p.75). Ou seja, não podemos afirmar que a escrita seja mais complexa, mais bem elaborada, mais explicita ou mais autônoma que a fala (BIBER, 1988, p.24). A segunda tendência, a qual Marcuschi denomina visão culturalista, observa muito mais a natureza das práticas de oralidade versus escrita, e vê esta como um avanço na capacidade cognitiva dos indivíduos. Os seguidores dessa visão, Walter Ong (1982), Jack Goody (1977) e David Olson (1977), se voltam para as mudanças operadas nas sociedades onde o sistema da escrita foi introduzido. O maior problema acarretado por essa perspectiva de análise seria a idéia de que as culturas letradas são superiores, por apresentarem raciocínio dedutivo e pensamento abstrato, possíveis graças à escrita, o que sugeriria a supremacia da escrita sobre a fala. Há ainda duas tendências de tratamento da questão da fala e escrita, a da perspectiva variacionista e a sociointeracionista. A primeira, variacionista, além de utilizar um maior rigor metodológico na análise da língua que as duas propostas anteriores, não faz distinção dicotômica ou caracterização estanque, mas, ao contrário, preocupa-se com regularidades e variações lingüísticas distintas. Nessa perspectiva, as diferentes manifestações observadas nas relações entre fala e escrita seriam casos de variação lingüística. Na segunda, sociointeracionista, as relações entre fala e escrita são tratadas dentro da perspectiva dialógica, dentro de um continuum textual sem polaridades estritas, percebendo a língua como fenômeno interativo e dinâmico (v. Quadro 2 abaixo). A preocupação dessa perspectiva está voltada para os processos de produção de sentido, situando-os em contextos sociohistoricamente marcados por atividades de negociação ou por processos inferenciais. Conforme lemos em Zanotto (2005, p. 31), o interacionismo sociodiscursivo privilegia o estudo da língua como um instrumento de interação social, não a língua como sistema ou construto teórico, mas a língua transformada em discurso, viabilizado pelos gêneros de textos. 45 Quadro 2 Perspectiva sociointeracionista Fala e escrita Dialogicidade/Usos estratégicos Funções interacionais/Envolvimento Negociação/Situacionalidade Coerência/Dinamicidade Como se vê no quadro acima, este modelo percebe com mais clareza a língua como fenômeno interativo e dinâmico, voltado para as atividades dialógicas que marcam as características mais salientes da fala e da escrita. Dessa forma, fala e escrita apresentam dialogicidade, negociação, funções interacionais etc. Segundo a perspectiva sociointeracional, não existem características intrínsecas às modalidades oral e escrita, mas decorrentes do modo por que elas são atualizadas em textos. Sendo assim, os estudos que se preocupam em descrever as características da fala e da escrita como modalidades de traços próprios, intrínsecos e inatos tornam-se pouco produtivos, haja vista os fatores externos à língua que contornam, controlam e marcam os modos como ela se realiza. Segundo Assis (2005, p. 219), esses fatores vão desde a tecnologia envolvida – telefone, computador, tevê, lápis, papel, quadro-negro etc. – até os elementos de ordem sociohistórica e subjetiva – o ambiente, os agentes envolvidos, suas relações e papéis sociais, os propósitos comunicativos, entre outros28. Desta forma, o melhor enfoque sobre a relação fala/escrita, segundo a autora, é aquele que se volta para as atividades comunicativas, que surgem emparelhadas às necessidades advindas da vida cultural e social, bem como às inovações tecnológicas que nos cercam. 28 No capítulo referente à análise, veremos o comportamento de cada um desses fatores. 46 1.5 O continuum entre alguns gêneros tradicionais na fala e na escrita Em sua tese intitulada Formação de uma Variedade Urbana e Semioralidade: o caso do Recife, Brasil, Pessoa (2003) descreve em detalhes como se dá o processo da passagem do oral para o escrito. Para ele, a distinção entre oral e escrito se dá num continuum, sendo impossível precisar uma separação rígida. Ainda segundo esse autor, para se compreender claramente a natureza das duas modalidades, deve-se primeiramente compreender que elas se concretizam num medium e numa concepção. O primeiro representa o canal em que as modalidades se realizam; o segundo, a natureza cognitiva de sua organização. Essa distinção já havia sido encontrada nos anos 70, por SÖll (1974), afirma Pessoa. Vejamos a seguir a distribuição desses elementos e sua relação nas passagens das modalidades: Gráfico 1 m A (concepção) oral B fônico (medium = m) o escrito gráfico (m) C D No Gráfico 1 acima, o ponto 0 (zero) representa uma separação teórica entre o oral e o escrito. Ao realizar seu percurso, essa linha deixa separada a parte superior da inferior, onde se encontram o fônico e o gráfico, respectivamente. A linha pontilhada m, representa o medium, e se movimenta em concomitância com o eixo concepcional, mostrando as diversas combinações possíveis e como medium e concepção se inter-relacionam nos diversos tipos de textos produzidos; a linha m se encontra na altura do ponto 0 47 (zero) para indicar apenas sua posição de repouso, perpassando os dois planos mediais, para indicar que serve para os representar. Sendo assim, m pode se manifestar na parte superior ou inferior (fônico ou gráfico, respectivamente) combinada com a concepção à esquerda ou à direita, se se trata de concepção oral ou escrita respectivamente. Então, no quadrante superior A se encontrariam os textos que se realizam como fônicos e são concebidos como orais (uma conversa informal entre dois conhecidos); no quadrante superior B se encontrariam os textos realizados fonicamente e concebidos como escritos (uma conferência); no quadrante inferior esquerdo C se encontrariam os textos realizados graficamente e concebidos como orais (uma carta privada); finalmente, no quadrante D, os textos realizados graficamente e concebidos como escritos (um artigo para publicação). A proposta desse autor destaca a evidência, na perspectiva do medium, da distinção entre oral e escrito, visto que os textos se realizam ou pelo canal fônico ou pelo canal gráfico29. Já na perspectiva da concepção, segundo ele, embora as formas de organização textual sejam diferentes podem se perpassar, fazendo surgir a semi-oralidade, que implica a passagem do oral para o escrito ou vice-versa. Na opinião de Pessoa (2003), devemos nos orientar para a compreensão do que se quer representar através do medium, o que não implica uma prevalência deste sobre a concepção. Nas palavras do autor, oralidade e escrita não são duas entidades separadas, mas que constantemente se perpassam. Por trabalharmos na nossa pesquisa com textos digitais, vimos como imprescindível estender a representação do continuum dos gêneros tradicionais para os gêneros virtuais. Dessa forma, apresentamos a seguir um gráfico que exemplifica como se dá esse continuum no meio digital. 29 Pessoa salienta que o gráfico é filogeneticamente uma representação do fônico, mas essa simetria deixa de existir, visto que há uma alteração na relação de um para um, já que a representação gráfica insiste em um conservadorismo, que não acompanha a evolução dos sistemas. 48 1.6 O continuum de gêneros na comunicação digital mediada por computador Assíncronos Blogs E-mail Interação multilateral Interação bilateral Uso geral de rede Vídeo-conferência ICQ/ IRC/ MUD/ MOO (chats em geral) Síncronos Fonte: Simeon J. YATES (2000) p.237 O Gráfico acima mostra o contínuo para os gêneros virtuais. Ele é construído com base em dois eixos: (a) o eixo da comunicação síncrona versus comunicação assíncrona, ou seja, comunicação que se dá no tempo real (caso da comunicação face a face) e a comunicação escrita (em geral defasada no tempo) e (b) o eixo da comunicação multilateral 30 (de um para muitos, de muitos para um ou de muitos para muitos) e a comunicação bilateral (de um para um). Nele podemos observar que os e-mails são uma comunicação de fato assíncrona, mas podem ser tanto multilateral como bilateral, tendo uma preferência por sua realização inter-individual. Já o uso da rede (WWW), em todas as suas modalidades e gêneros abrigados, está num entrecruzamento que permite enorme variedade de realizações em termos de formalidade, informalidade, relações comunicativas e produção síncrona ou não (MARCUSCHI, & XAVIER, 2004). Os Gráficos 1 e 2 mostram uma relação que elimina a visão dicotômica e ao mesmo tempo mostra que há uma certa diferença entre o ambiente sonoro/impresso e o meio digital. 30 É bem verdade que gêneros tradicionais, como o abaixo-assinado e outros similares, também permitem a comunicação multilateral. 49 A propósito das relações entre a escrita nas novas tecnologias computacionais e a escrita na forma tradicional, Marcuschi (2004, p.63) citando Halliday afirma que, “sob o impacto das novas formas de tecnologia, presenciamos uma nova situação que está desconstruindo toda a oposição entre fala e escrita”. Para esse autor, semelhante ao surgimento dos tipos móveis, com as novas tecnologias da produção escrita pelo computador com os processadores de texto, está surgindo outro passo importante na história da escrita. Segundo ele, em breve será eliminada a distância entre a fala e a escrita. É certo, pois, que a escrita nos gêneros em ambientes virtuais se dá numa certa combinação com a fala, manifestando um hibridismo ainda não bem-conhecido e muitas vezes mal-compreendido. Frente a essas divergências, achamos imprescindível desfazer alguns mitos existentes relacionados à fala e à escrita: 1. A fala apresenta propriedades intrínsecas negativas; 2. A escrita apresenta propriedades intrínsecas privilegiadas; 3. A escrita é estruturalmente elaborada, complexa31, formal e abstrata; a fala, concreta, contextual e estruturalmente simples; 4. A fala é dialogada; a escrita, monologada; 5. A fala varia; a escrita, não; 6. A fala é contextualizada; a escrita, descontextualizada; 7. A fala é implícita; a escrita, explícita. O que ocorre, na verdade, é que, ao contrário do que acontece com o texto escrito, no qual o produtor tem maior tempo de planejamento, sendo-lhe concedida a prática de revisão e outras, o texto falado surge no próprio momento da interação, sendo seu próprio rascunho, no dizer de Koch (2000, p. 69). Em tais situações o locutor muitas vezes sacrifica a sintaxe em favor das 31 No gênero chat é possível desfazer esse mito, a partir da observação dos períodos simples, não tão elaborados e informais. 50 necessidades da interação (op.cit). Como dizem os Parâmetros Curriculares Nacionais: A questão não é falar certo ou errado e sim saber que forma de fala utilizar, considerando as características do contexto de comunicação, ou seja, saber adequar o registro às diferentes situações comunicativas. É saber coordenar satisfatoriamente o que falar e como fazê-lo, considerando a quem e por que se diz determinada coisa. Resumindo tudo o que vimos, temos que: • A fala é uma forma de produção textual-discursiva para fins comunicativos na modalidade oral, sem a necessidade de uma tecnologia além do aparato disponível pelo próprio ser humano; • A escrita é um modo de produção textual-discursiva para fins comunicativos com certas especificidades materiais, e se caracteriza por sua constituição gráfica, embora envolva também recursos de ordem pictórica e outros (MARCUSCHI, 2001, p. 26). Portanto, fica claro que, ao invés de se ter como preocupação maior das pesquisas sobre oralidade e escrita mostrar as características de uma em contraste e oposição à outra, realçando apenas a diferença, deve-se buscar descrever as características comuns à oralidade e à escrita, ao contrário da dicotomia que tenta separar o oral do escrito. Afinal, os achados mais notáveis apontam mais semelhanças que diferenças entre essas duas modalidades de uso da língua; as relações de semelhanças e diferenças não são estanques nem dicotômicas, mas contínuas, e várias das características diferenciais relacionadas a uma das modalidades são propriedades da língua. Ainda, as diferenças entre fala e escrita podem ser vistas na perspectiva não do sistema, mas do uso, ou seja, devem-se levar em consideração os usos do código e não o código. Não esquecendo que as características da fala e escrita não são categóricas nem tampouco exclusivas. Será, pois, a tendência sociointeracionista, que considera as categorias lingüísticas como construídas interativamente e sensíveis aos fatos culturais, a bússola que norteará a nossa embarcação rumo ao caminho das abreviações. 51 CAPÍTULO 2 ABREVIAÇÃO: da gênese à disseminação O fenômeno da abreviação no português brasileiro, apesar de identificado há bastante tempo, foi ainda pouco estudado. Cientes dessa lacuna, e ávidos por tentar reunir ao máximo informações válidas com base na literatura pertinente, demos início a esse estudo, que nada mais é do que fruto de um desejo pelo conhecimento, em especial nesse assunto que ressurge com força visível paralelo ao domínio do mundo digital, o uso das reduções, em específico a abreviação. Neste capítulo, veremos um pouco da história das abreviações existentes na língua portuguesa, sua conceituação, a sistemática do seu uso, sua tradição até os nossos dias, e o tratamento dado pelas gramáticas a esse fenômeno tão antigo, recorrente e notório nas mais variadas camadas sociais, independentemente da faixa etária e do grau de escolaridade do usuário. Antes de tudo, é importante distinguir o conceito de abreviação do conceito de redução morfológica. Esta ocorre de preferência na fala (o que não significa que seja exclusiva dela) e representa níveis diversos de informalidade ou variação (ex: né, tá, pro, pra, cum etc.); aquela é algo que se dá de modo particular na escrita (Sr., Excia., p.ex., cit), muito embora esteja se espraiando na língua oral (tv, cdf, ci, ). Enquanto o processo da abreviação dá-se no nível do fonema, o da redução morfológica ocorre no morfema. Entretanto, em ambos os casos, da abreviação e da redução morfológica, temos exemplos de redução. O que distingue a abreviação da redução é que na primeira a 52 supressão ocorre de forma aleatória, na maioria das vezes, enquanto na redução tem-se geralmente o apagamento de seqüências consideradas afixos. Na abreviação não há mudança de significação na palavra resultante, enquanto que na redução a palavra derivante não mantém o mesmo significado. Queremos salientar também que a nossa pesquisa restringe-se à análise de textos escritos, a fim de ilustrarmos algumas das transformações pelas quais vem passando a língua escrita, muito embora o processo de simplificação lingüística seja algo observável não apenas na escrita, mas também na fala. É comum deparar-nos com a presença quase categórica de algum tipo de redução nos contextos mais inusitados possíveis. A ocorrência desse recurso da língua é tão freqüente que muitas vezes chega a passar despercebido aos nossos olhos. Seja em áreas públicas ou privadas, situações formais ou informais, orais ou escritas, conscientemente ou não, lançamos mão desse processo de simplificação, que visa tão somente à economia lingüística. Basta um olhar mais acurado e logo veremos que o mundo em que vivemos é circunscrito por algum tipo de redução que, ao contrário do que possam pensar alguns, não se limita ao escrito, antes, parece ter origem no oral, expandindo-se então para essa outra modalidade da língua. Exemplo disso é o caso de palavras do tipo cine, mini, foto, entre outras, usadas em lugar de cinema, minissaia, fotografia. Também nomes próprios como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, que têm essas formas preteridas por Sampa, Rio, B.H. As reduções são práticas tão comuns e eficientes que personalidades da história também tiveram seus nomes reduzidos a simples abreviações ou siglas32: ACM, FHC, JK, PC, JA, JQ, entre outros. Também nas esferas política, econômica e social são inúmeras as siglas utilizadas, entre elas: MP, CPI, FARC, IR, CPMF, PIB, IPTU, TIP, TCR, GLS, TIM etc. A fim de visualizarmos melhor a pluralidade de material que comporta em seu texto um número significativo de abreviações, tomemos para análise alguns gêneros, dos mais comuns aos mais específicos: 32 Não podemos esquecer também dos acrônimos, que consiste em uma palavra formada pela inicial ou por mais de uma letra de cada um dos segmentos sucessivos de uma locução, ou pela maioria destas partes (HOUAISS, 2001). 53 1. De natureza pessoal: agendas, diários, cartas, bilhetes, anotações, e-mails e demais gêneros correlatos; 2. De natureza oficial: cartas, parecer, requerimentos, ofícios, atas, folder, RG, CIC, e-mails e demais gêneros virtuais; 3. De natureza profissional: receituário médico, receita de culinária, bula, caderneta, boletim de ocorrência, etiquetas, atestados, manual de instrução etc. Como pudemos observar, são inúmeras e variadas as possibilidades de uso de redução na língua, em especial a abreviação. Cientes disso, restringimos nossa pesquisa à análise desse recurso nos respectivos gêneros: carta, diário, blog, SMS e e-mail. 2.1 Conceito de abreviação A concepção do termo abreviação data, na língua portuguesa, de 1536, como registra o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001). De origem latina, teve suas formas históricas grafadas abreviaçõis (1536), abbreviação (1576). Etimologicamente, abreviação significa diminuição, encurtamento. E ainda (op.cit. p.26) : Abreviação s.f.(1536 FOLG fº 9v) ato ou efeito de abreviar; abreviatura 1 breve notícia; compêndio, síntese 2 FON. FONOL. Fenômeno da passagem de um som, sílaba ou fonema, de longo a breve 3 GRAM representação escrita de uma palavra grafando-se apenas algumas de suas sílabas ou letras; abreviatura 4 GRAM m.q. ABREVIATURA33 (‘redução fixa’) 5 GRAM redução do corpo fônico de uma palavra 1Ato ou efeito de abreviar; abreviação 2 GRAM redução, fixa na língua escrita e de uso geral de uma palavra ou locução (p. ex.: V., por você;) 3 GRAM redução de uma locução a uma sigla (p.ex.:ONU, por Organização das Nações Unidas) 4 GRAM m.q. ABREVIAÇÃO (‘representação’) 5 sinal ou cifra com que se representa uma palavra ou locução (p.ex.: o sinal % representa a locução por cento) 6 EDIT sinal que indica a supressão de letra (s) numa palavra 7 p.ext. qualquer coisa em ponto pequeno; miniatura {o bolo de aniversário era a a. de um castelo} 8 p.ana.exposição sucinta; abreviação, resumo. 33 54 resultando em outra que passa a funcionar como sinônimo da palavra primitiva (p.ex., microcomputador/micro, videocasse/vídeo; cinematógrafo/cine etc.). Segundo o Aurélio (1993), abreviatura s.f. 1 é a representação duma palavra por alguma(s) de suas sílabas ou letras. 2 Sinal ou cifra com que se representa uma palavra. Em Koogan/Houaiss (1999), encontramos uma definição para abreviação e outra para abreviatura, respectivamente: 1. s.f. Ação de abreviar./ Redução literal, geralmente de uso circunstancial e variável de obra para obra, de autor para autor, sobretudo em anotações rápidas para uso próprio: q. (que), apto. ou ap. (apartamento). À medida que se torna de uso geral, entra na categoria das abreviaturas. 2. s.f. Representação de uma palavra por meio de uma ou algumas das suas letras. A partir da peculiaridade ora sugerida por Koogan/Houaiss (1999), faremos a diferença entre elas com base em dados de Houaiss (1983), que engloba as abreviações e as abreviaturas dentro do quadro das reduções. 2.1.1 Abreviação X Abreviatura Antes de apresentar a distinção entre abreviação e abreviatura, Houaiss (Elementos de Bibliologia,1983) denomina de ‘reduções’ “todos os fenômenos de representação literal parcial dos vocábulos – por exemplo, “p.” por “página” - ; de representação literal-algarísmica - por exemplo, “cm3” por “centímetro(s) cúbico(s)” - ; de representação pictográfica realista – por exemplo + por “casa” - ; de representação picto-ideográfico-simbólica – por exemplo “ ” por “morte”, “morto”, “falecido”, “falecida” - ; de representação convencional científica – por exemplo, “♂”, que na técnica da zoologia indica indivíduo do sexo masculino –. 55 A seguir, o autor (op. cit, 1983) representa em forma de gráfico a sistemática das reduções: 1) abreviações braquigrafias34 2) abreviaturas 3) siglas35 4) acrografias reduções 5) símbolos36 ideografias 6) signos 7) sinais 8) ideogramas mistos Finalmente, parte para a definição e distinção entre abreviação e abreviatura, a saber: • abreviações são reduções literais, geralmente de uso circunstancial, variáveis de obra para obra, de autor para autor. Na medida em que se tornam de uso geral, entram na categoria das abreviaturas. • abreviaturas são formas como que fossilizadas e de emprego genérico tão tradicionalizado, que, embora possam acarretar ao leitor ou autor desprevenido certas dificuldades para a sua eventual compreensão, isso não se justifica entre os que estejam, de certo modo, afeitos ao manuseio, uso e jogo dos livros. Do grego braqui = curto e grapheIn = escrever, braquigrafia significa escrever abreviado (ACIOLI, 1994). 35 As siglas incorporaram-se de tal forma ao vocabulário do dia-a-dia, que passaram a sofrer flexões e a produzir derivados (CPIs, peemedebistas etc). 36 O Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial) diferencia símbolo de abreviatura: no caso de “quilograma” o “K” é o símbolo correspondente, uma vez que essa letra sequer faz parte da palavra, não podendo, portanto, fazer parte da sua abreviatura (www.inmetro.gov.br). 34 56 Feita a distinção sugerida pelo autor37, e por nós aqui adotada, a seguir veremos um pouco da tradição das abreviações. 2.1.2 A tradição das abreviações: um pouco de história Segundo Spina (1977), Berwanger (1995) e Martins (1996), as abreviaturas são a chave da interpretação paleográfica dos documentos medievais, devendo, portanto, o paleógrafo ter conhecimento não apenas do vocabulário, grafia e terminologia, mas também das abreviaturas da época do documento. Para Bueno (1963, p.108): O conhecimento dos diversos usos da escrita, de que se serviam os copistas medievais, tais como siglas, abreviaturas, notações, valem muito na decifração dos textos, possibilitando ao crítico o perfeito entendimento do assunto. Ainda: quem não estiver preparado em tais estudos, nunca poderá produzir coisa digna de nome científico. Para Acioli (1994), duas correntes tentam explicar a origem do sistema braquigráfico medieval: a tradicional e a encabeçada pelo paleógrafo alemão Traube. A primeira admite a origem latina desse sistema que, segundo eles, deriva das três diferentes maneiras usadas pelos romanos para abreviar as palavras: as siglas, as notas tironianas e as “Notae Juris”. A segunda tenta provar a origem bíblica das abreviaturas. Em Nomina Sacra, Traube expõe sua teoria afirmando que era costume dos hebreus ocultar os nomes sagrados como sinal de respeito. Assim, quando tinham de escrever um nome sagrado, eles o substituíam por um tetragrama com o intuito de ocultar o nome38. Araújo (1986) classifica as abreviaturas em dois tipos: circunstanciais e tradicionais. As primeiras variam de obra para obra e conforme o conteúdo (são as encontradas em dicionários, vocabulários e glossários); as segundas, segundo o autor, são aquelas de emprego genérico e constante, via de regra se referindo a palavras ou expressões latinas, com raízes na prática manuscritora medieval, independentemente dos vernáculos. 38 O sistema hebreu foi adotado quando da tradução da Bíblia para o grego já com o intuito de abreviar as palavras (ACIOLI, 1994). 37 57 Conforme encontramos em Man (2004, p.175), o uso de abreviações e múltiplas letras está ligado ao fato de os escribas copistas primarem por encaixar os textos em seus espaços de Procusto39. Contudo, salienta o autor, como não se podia prever onde a linha ia acabar, o ideal dos escribas inevitavelmente estava fadado ao fracasso. Ou seja, bastava olhar para a margem direita e via-se a derrota estética. O uso das abreviaturas, por economia, vem desde a época do Império Romano, conforme vemos em Spina (1977), Houaiss (1983), Berwanger (1995) e Martins (1996). Segundo Bueno (1963): Os calígrafos de todos os tempos, mas de modo especial, os da Idade Média, quer por poupança de espaço porque os pergaminhos escasseavam, quer por economia de tempo, fizeram uso de um completo sistema de abreviaturas, de siglas e de notas tironianas que torna sumamente difícil a leitura de tais manuscritos ainda aos conhecedores de tais recursos taquigráficos, quanto mais aos que só os conhecem por ouvir dizer. Foi a mesma necessidade de economizar pergaminho40, em razão da raridade e conseqüente custo elevado desse material da escrita, que deu nascimento ao sistema de abreviações da Idade Média. Segundo Bueno (1963), antigamente, achava-se que as abreviações da Idade Média não obedeciam à regra alguma, dependendo unicamente do arbítrio e da fantasia de cada um. Contudo, alguns conseguiram estabelecer certa sistematização nesse assunto, entre eles Chassant, cuja obra Paleografia Crítica aborda em primeira mão as regras para uso das abreviaturas. Outro autor, Paoli, discorda em alguns pontos de Chassant e reduz as abreviaturas medievais a duas espécies: • Abreviaturas de sinais gerais: indicam simplesmente a abreviação de uma palavra sem indicar qual o elemento que falta; Segundo o autor, trata-se de um mito grego que forçava os viajantes a caber perfeitamente num leito, para isto esticando ou cortando seus membros. 40 A economia de pergaminho e de papel levou Gutenberg a reduzir o espacejamento, comprimindo mais linhas e economizando espaço na produção da Bíblia de 42 linhas. Dessa forma, ele cortou 5% dos gastos com o material de impressão, fazendo surgir a B42. 39 58 • Abreviaturas de sinais específicos: indicam quais os elementos que faltam na palavra abreviada. As da primeira espécie, de sinais gerais, subdividem-se em duas: abreviaturas por suspensão ou apócope (AP = Apud), e por contração ou síncope (Aia = Anima). As abreviaturas da segunda espécie, de sinais especiais, subdividemse em: sinais de significado fixo (aquelas independentes do lugar onde estiverem colocadas. Ex: o traço (-) colocado em cima da letra indica sempre um M ou N); sinais de significado relativo (as que dependem da letra em que se encontram ou da direção em que estão colocados. Ex: um ponto (.) colocado ao lado e no alto do H: vale Hoc: mas se for colocado em cima do U já valerá Ut); sinais com letras superpostas: D+ = Dicitur; Xc = Cristo. Em Martins (1996), podemos ler que as abreviaturas já eram comuns depois do VI século, aumentando no VII, ampliando ainda mais no IX e proliferando no X. Segundo o autor, no século XI “não há linha sem oito ou dez abreviações”, chegando ao excesso nos séculos XII, XIII, XIV e XV. Um exemplo claro do que foi dito acima pode ser mais bem compreendido a partir do modelo contido em um manuscrito conhecido sob o nome de Virgile d’Asper41, onde o texto é escrito de tal maneira que é necessário sabê-lo de cor para poder lê-lo (Martins, 1996, p.161): Tityre, t.p.r.s.t.f. por: Tityre, tu patulF recubans sub tegmine fagi. Assim, sob esta forma, é representado o primeiro verso das Bucólicas no manuscrito supracitado. Segundo Martins (op.cit.), essas abreviações, onde Esse manuscrito é considerado como do século XI, e está atualmente na Biblioteca Nacional de Paris (MARTINS, Wilson. A Palavra Escrita. 2. ed. São Paulo: Editora Ática, 1996). 41 59 uma ou duas letras iniciais servem para exprimir toda a palavra, recebem o nome de siglas42. Berwanger (1995) revela que houve um modismo em abreviar palavras após o século IX d.C., o que de certa forma vai de encontro ao princípio da abreviatura, segundo vemos em Houaiss (1983), que é abreviar por economia e não por amor da abreviação (op.cit, p. 122). A fim de conceber melhor, ainda que de forma sucinta, a evolução das abreviaturas, fiquemos com a narrativa registrada em Spina (1977) e aqui transcrita em forma de citação: Desde fins da república romana abreviação começou a tornarse complicada, chegando a suscitar – sem que tais medidas surtissem efeito – a intervenção do senado e dos imperadores proibindo o seu emprego. A partir do reinado carolíngio, cujas reformas pedagógicas atingiram também os processos caligráficos, o abuso das abreviaturas começou a saturar os documentos, e a moda degenerou de tal forma que nos séculos XII e XIII várias disposições foram baixadas com o intuito de conter o mal. O abuso começou a diminuir à medida que implantava a utilização da letra cursiva43, que não permitia a profusão das abreviaturas. Contudo, um novo surto no uso das abreviaturas é advindo com o Renascimento, sendo inclusive elaboradas tabelas para leitura das siglas44, conforme Spina (1977) e Berwanger (1995). Tal ressurgimento, segundo Martins (1996), não mais se justifica, uma vez que o processo mecânico de 42 Segundo o autor, as siglas eram usadas não apenas nos manuscritos, mas também nas inscrições lapidares, nas medalhas etc. (MARTINS, 1996). 43 É a escrita corrente. As letras começam a ligar-se umas às outras devido ao desejo de escrever mais depressa e à preguiça de se levantar a mão. Na Escrita Capital, por exemplo, a palavra que era abreviada: q . A Escrita Gótica, por sua vez, era apertada, miúda, muito ligada e com poucas abreviaturas (BERWANGER, Ana Regina. Noções de Paleografia e de Diplomática. 2. ed. Santa Maria: Editora da UFSM. 1995). 44 O dicionário de Adriano Cappelli, Dizionario di abbreviature latine et italiane (3. ed. , Manuali Hoepli), Milão, 1929, dá bem uma medida das dificuldades que a leitura de textos medievais oferece, em razão da pletora das abreviaturas: Cappelli recenseou nada menos de catorze mil sinais abreviativos (SPINA, Segismundo. Introdução à Edótica: crítica textual. São Paulo: Cultrix, Ed. da Universidade de São Paulo, 1977). 60 reprodução e a utilização do papel pelos impressos do século XV estavam resolvidos45. Segundo Houaiss (1983), existem princípios constantes dentro de cada sistema de abreviações, observáveis no passado histórico das existentes em português, e das de base latina, no Ocidente, quais sejam: 1º) evitam-se abreviações iguais para vocábulos diferentes, pois, caso contrário, haveria ambigüidade; 2º) abrevia-se economicamente e não por amor da abreviação; noutros termos, usar da abreviação “pag.” por “pago” é algo sem sentido, pois tipograficamente, ao menos, compor “pag.” é o mesmo que compor “pago”; 3º) abreviam-se palavras freqüentes no corpo da obra, pois de outra forma a abreviação pode tornar-se obscura ou incompreensível, além de ser quase nula a economia que decorre de uma abreviação muito episódica46. 2.1.3 Abreviação e os sinais abreviativos Segundo Acioli (1994, p.46), sinais abreviativos são os traços que indicam que uma palavra está abreviada. Para ela, o conhecimento desses sinais é muito importante na leitura de um documento, embora muitas vezes eles não tenham um valor fonológico especial. Essa autora distingue ainda duas categorias de sinais abreviativos, a saber: • Os gerais: não têm valor fonológico. São eles: ► ponto – o mais antigo sinal abreviativo. Quase sempre acompanha as siglas; ► linha reta – usada nos documentos mais cuidados, sobretudo nos de chancelaria. Vinha sempre sobreposta às letras; Lecoy de la Marche deixa claro que multiplicação das abreviações nos manuscritos medievais se deu, principalmente, por causa da necessidade de economizar pergaminho (MARTINS, Wilson. A Palavra Escrita. 2. ed. São Paulo: Editora Ática, 1996). 46 Segundo o autor, as normas abreviantes, em português, podem ser depreendidas da prática abreviante e de certas observações já com tendências sistemáticas (ACAD, XLVII, 53). 45 61 ► linha curva – também foi utilizada como sinal abreviativo na escrita vulgar, porque oferecia um traçado mais ligeiro; ► traço envolvente – a tendência de cursividade da escrita contribuiu para que o escrivão, sem levantar o instrumento da escrita, envolvesse toda a palavra abreviada. Podia partir da última letra da palavra ou da letra sobreposta. • Os especiais: são os que substituem uma letra ou um agrupamento delas. Derivam-se das notas tironianas e têm valor fonológico. Foram usados na escrita medieval, sendo importante conhecê-los para uma boa interpretação documental. Vejamos: ► 2.1.4 Classificação das abreviaturas47 Conforme encontramos em Spina (1977), Houaiss (1983) e Berwanger (1995), as abreviaturas podem classificar-se em: 1) Abreviatura por siglas→ consiste em representar a palavra pela sua letra inicial: P = Petrus, sendo que o redobro da sigla pode apresentar dois valores: o plural da palavra ou o seu superlativo: AA = Augusti; duas ou mais palavras, Mais adiante veremos que nos gêneros digitais também há certos critérios nas reduções realizadas. 47 62 que pelo sentido formam um todo, podem também reduzir-se às suas iniciais, e nesse caso é utilizado o ponto em cada sigla: C.A. = Caesar Augustus48. 2) Abreviatura por suspensão ou apócope → em que se verifica a supressão de elementos finais do vocábulo, ainda que os paleógrafos as qualifiquem de siglas, remontam também aos gregos e romanos: drt =direito; Imp. = imperator49. 3) Abreviatura por contração ou síncope→ forma-se mediante a supressão de elementos gráficos do meio do vocábulo. A fixação apenas da letra inicial e da final pode, contudo tornar difícil a identificação da palavra: Sr.=senhor; dr = dicitur50. 4) Abreviatura por letras sobrepostas (sobrescritas)→ uma pequena letra é inscrita por cima da abreviatura: rctor = rector; pior = prior; aqa = aqua51. 5) Abreviatura por sinais especiais→ são sinais que se colocam no início, meio ou fim da palavra, significando uma sílaba ou ausência de uma letra: Ds = Deus; ÷ ou % = est (é). 6) Abreviatura por letras numerais→ constitui as abreviaturas de numerações, designativas de quantidades e de marcos cronológicos. Tais abreviaturas, usadas ainda hoje, são de origem romana. Das sete letras maiúsculas de seu alfabeto – I, V, X, L, C, D e M – serviram-se os romanos para indicar respectivamente os números 1, 5, 10, 50, 100, 500 e 1.00052. 7) Letras inclusas→ consistem na inserção de uma letra na outra, ou seja, quando um traço de uma letra serve comumente para outra. Estas letras são chamadas de embebidas. Ex: AN N I = Antonio. 48 A sigla foi o processo mais antigo de abreviação por supressão ou apócope, e seu uso se manteve durante toda a Idade Média; porém, logo no início verificou-se certa tendência para tornar as siglas mais inteligíveis, acrescentando-se a elas outras letras do vocábulo: cl, cler, cleric = clericus; ou ainda sobrepondo-lhes um signo abreviativo (a risca): qn = quando. (SPINA, 1977). 49 Este sistema se desenvolveu consideravelmente a partir da divulgação da escritura carolíngia na Europa (Idem, ibidem). 50 Para obviar a dificuldade, costumavam conservar letras intermediárias, chamadas mesmo características, que favoreciam a intelecção do termo: dgm = dignem. 51 Muito rara entre os romanos, bem como nos documentos da Península Ibérica anteriores ao século XII, generalizou-se a partir dessa época com a escritura visigótica (Op. cit, p. 46). 52 A sucessão das mesmas indicava soma (XXX = 30); mas a sobreposição de uma barra horizontal à letra multiplicava mil vezes o seu valor (ö = 500.000). Daí que ù = M e 6M = um milhão. 63 8) monogramas→ são letras ornamentais que substituem palavras, geralmente nomes próprios, algumas vezes entrelaçadas. Ex: Æ. Houaiss (1983) nos fornece ainda uma relação de abreviaturas de curso corrente na língua portuguesa, excluindo, contudo, como diz o autor, uma imensa galeria de valor restritamente paleográfico, ou seja, sem utilidade corrente nos dias de hoje. As abreviaturas foram relacionadas segundo afinidades temáticas mais ou menos marcadas. São elas: 1) abreviaturas axiológicas→ compreendendo as relacionadas com as fórmulas de tratamento, os títulos nobiliárquicos, profissionais, eclesiásticos e afins, e as ideologicamente associadas: A.M. = Ave Maria (expressão e abreviatura ligadas à igreja católica); V.S. = Vossa Santidade/ Vossa Senhoria; 2) abreviaturas autorais→ de palavras latinas exclusivamente, que antecedem os nomes de autores de obras de arte, na idade moderna, a partir do momento em que o anonimato de regra desapareceu: aet., aetat. → aetate, na idade de; inscrição com que os pintores, de preferência, indicavam em que idade se achava o retratado. 3) abreviaturas bibliológicas→ que se relacionam com as técnicas de remissão, indicação, seccionação, anáfora, dêixis, na estruturação de uma obra escrita: ib., ibid. = ibidem, isto é, no mesmo lugar, lugar como indicativo apenas da obra; op.cit.;opp.citt. = opus citatum; opera citata; obra citada; obras citadas; se se tratar da mesma obra antes citada, reporta-se a op.cit. 4) abreviaturas comerciais, industriais e afins (e algumas esportivas): c/c = conta corrente; p/ = por; p/, pª = para; pg. = pago, pagou. 64 5) abreviaturas crononímicas, relacionadas com a referenciação a tempo e ao calendário: a.C., A.C. = antes de Cristo (evite-se a segunda forma da abreviação, A.C.) 6) abreviaturas forenses, judiciárias, tabelioas, áulicas, cortesãs, eufêmicas (e algumas institucionais): a/c, A/C = aos cuidados; e.c.f. = é cópia fiel 7) abreviaturas médicas, farmacológicas e posológicas: u.e. = uso externo, u.i. = uso interno. 8) abreviaturas musicais, na sua totalidade de origem italiana, mas de curso praticamente geral nas línguas ocidentais: accel. = acelerando; cresc. = crescendo, em crescendo; p. = piano, docemente. 9) abreviaturas náuticas mais correntes, pois que a terminologia própria comportaria muito mais, de curso restrito: BB, B.B = bombordo; s.o.s., S.O.S. = inglês save our soul, quiçá também save our ship, salve nossa alma, salve nosso navio, em apelo de socorro. 10) abreviaturas teatrais, tão-somente as relacionadas com a referência à marcação do cenário: D. = direita; D.A. = direita alta; E.B53. = esquerda baixa. Como não é nossa pretensão apresentar todas as abreviaturas existentes, trazemos apenas dois ou três exemplos de cada tipo, principalmente as mais conhecidas. 53 65 2.1.5 A abreviação e as notas tironianas54 ou taquigrafia Spina (1977) e Berwanger (1995) afirmam que as notas tironianas constituíram um sistema de abreviação, de índole muitíssimo complexa, usado pelos romanos para cópias de livros inteiros ou transcrição de discursos proferidos ao vivo; é um sistema estenográfico, e tido mesmo como a mais antiga forma de taquigrafia na Europa. Martins (1996, p.161) diz que as notas tironianas são simples letras, iniciais ou medianas, empregadas para figurar palavras inteiras ou abreviar a escrita. Inventado por um escravo liberto que pertencia a Cícero, de nome Tiro55, daí a designação de tironiano, esse sistema foi desenvolvido consecutivamente, atingindo o número de 5.000 abreviaturas56. Tiro se servia de tal taquigrafia a fim de registrar, na íntegra, os discursos dos mais famosos oradores de Roma (PAOLI apud BUENO, 1963). Higounet (2003) afirma que o nascimento da estenografia ou taquigrafia moderna se deve ao desejo, nascido na Alta Idade Média e ressurgido na Renascença, de possuir uma escrita tão rápida quanto a fala. Segundo o autor, a necessidade justificou a divulgação. Conforme encontramos em Bueno (1963), as notas tironianas tiveram largo uso e foram mais complicadas na Idade Média. Segundo esse autor, um dos usuários desse sistema foi o papa Silvestre II que, por utilizar esse recurso, ficou conhecido como feiticeiro e cabalista. Durante muito tempo, as notas tironianas foram indecifráveis, mas, em inícios do século XIX, Ulrico Federico Kopp instituiu as leis fundamentais nas As Notae Juris derivaram-se das notas tironianas, entretanto não tiveram a mesma popularidade e por isso tiveram seu uso restrito aos documentos jurídicos (ACIOLI, 1994). 55 Tiro anotava seus discursos através de sinais. 56 Segundo lê-se em Bueno (1963), alguns atribuem a invenção das notas tironianas a outros que não Cícero Tullius Tiro. Suetônio, por exemplo, atribui a Ênio: Vulgares notas Enius primus Mille et centum invenit. Outros, a Sêneca: Sêneca, contracto omnium digestoque et aucto numero, opus effecit in quinque millia...Entretanto, como afirma Bueno (1963, p. 116), todos são unânimes em aceitar Tiro como autor de tal taquigrafia. Para Plutarco: Romae primus Tullius Tiro Ciceronis libertus commentatus est notas... 54 66 quais se baseava esse sistema gráfico57, lançando um “Lexicon tironianum” (contido no II vol. de sua obra capital Palaeographia critica, Mannheim, 1817). Outros estudiosos deram continuidade aos estudos, entre eles: Tardif, Sickel, Schmitz, Traube, Zangomeister, De Vries, Havet e Cipolla (BUENO, 1963, p. 116). Em razão de utilizarem as notas tironianas58 em suas minutas, antes de receberem a designação de “tabeliães”, os oficiais públicos romanos59 chamavam-se notarius60. São exemplos de notas tironianas: H* = Hoc (este); Gi = igitur (por isso); q. = quem; tbem = também; Gª = Erga (para/contra); M’ = Mihi (para mim), etc. Bueno (1963) afirma que as notas tironianas nada possuem de oculto; antes, baseiam-se nas letras do alfabeto maiúsculo romano, cujos sinais são usados em várias posições, representando significados independente em cada uma delas: Signum principale e os Signa auxiliaria. Estes representam uma terminação qualquer da palavra (- Ga = Erga); aquele, geralmente, inicial da palavra (T’= tibi). 57 Esse sistema chegou a ser ensinado nas escolas, sobreviveu até o século X, mantendo inúmeros sinais até bem depois. 58 Essas notas usualmente originavam-se do alfabeto maiúsculo romano, constituindo-se de um “signo principal” (geralmente a letra inicial da palavra) e de “signos auxiliares”, que representam a terminação do vocábulo. (SPINA, 1977). 59 O braquigrafismo era um aspecto importante da escrituralidade medieval e um aspecto importante da competência escribal dos notários (Brocardo & Emiliano, no prelo). 60 N4t~r0ßs, 00, s. ap. m. QUINT. O que escreve por abreviaturas, estenographo ou tachygrapho. § SOD. THEOD. Escrivão, amanuense, escrevente, copista, secretario. (SARAIVA, s/d). 67 2.1.6 A abreviação e a simplificação lingüística Desde os tempos mais remotos, a função precípua da língua é comunicar. Seja o meio sonoro ou impresso/digital, a mensagem deve primar por adequar seu código ao público a que se destina. Assim, o vocabulário utilizado tende a ser mais ou menos seleto; os períodos a variar entre simples e compostos; a ordem oscila entre direta e indireta, e as frases a se estender de curtas a longas, a depender do receptor/destinatátio, visando à brevidade e à clareza. Os procedimentos selecionados e ativados para tornar o texto adequado a seu público são entendidos como processos de simplificação lingüística. Em O século XVIII e a noção de simplificação lingüística, Pessoa (2001) afirma que a Simplificação lingüística é uma habilidade inata dos sujeitos falantes de uma língua de adaptarem seus usos para facilitarem a comunicação com aqueles que por razões diversas teriam dificuldade de compreender certas construções. Mendonça (1987) diz que a simplificação pode ocorrer em dois níveis: a simplificação do código da língua, cuja alteração mudará o texto de acordo com regras lexicais e sintáticas61; e a simplificação da língua, cujo objetivo é o de tornar a proposição o mais clara possível, com um estilo aproximado do informal. No primeiro caso temos uma simplificação gramatical; no segundo, semântica. O século XVIII, conhecido como Século das Luzes, está intimamente ligado à difusão do saber, da alfabetização e da simplificação. É nesse período que um dos fatos relacionados com a simplificação lingüística surge, a proposta 61 Através da substituição de palavras polissílabas por outras menores; de palavras pouco usuais por aquelas que sejam do léxico do leitor; da voz ativa em vez da passiva, e evitar intercalações (MENDONÇA, 1987). 68 de Verney, que sugere uma gramática curta e clara para o estudante, com o objetivo de difundir a língua portuguesa62. Segundo Pessoa (2001), a noção de simplificação lingüística pode ser aplicada em vários contextos. No nosso estudo, aplicá-la-emos aos autores de textos manuscritos, impressos e digitais, cujo propósito é o de dar precisão e objetividade ao texto produzido. Pessoa sugere ainda a inclusão de outros tipos/gêneros textuais na análise do processo de simplificação lingüística. Seguindo suas indicações, iremos tratar essa noção nos gêneros carta, e-mail, diário, blog e SMS, observando os processos de redução que há na língua, em especial a abreviação. Vale destacar aqui a ressalva feita por Mendonça (op.cit.), segundo a qual a sigla e a taquigrafia, embora tomem menos espaço e tempo para escrever, devem ser evitadas, pois as mesmas impossibilitam a decodificação da mensagem por aqueles que desconhecem o conteúdo transmitido de forma abreviada. Segundo a autora, o abuso de siglas serve apenas para separar as pessoas em dois grupos: o dos que dominam a informação e o das que não possuem esse tipo de informação. Para ela, as siglas podem ser um entrave à compreensão textual. Na opinião de Brocado & Emiliano (no prelo), as abreviaturas não devem ser desenvolvidas, respeitando o caráter logográfico que lhes é próprio, e só desenvolvê-las se, e somente se, a sua expansão for absolutamente inequívoca e não resultar de uma conjectura do editor, ainda que determinada pelo contexto lingüístico. Para esses autores, essas são as únicas opções editoriais paleográficas e filologicamente consistentes cujo propósito é o de preservar a configuração estrutural específica da escrituralidade medieval. Segundo eles, as abreviaturas, longe de serem um problema, são apenas um tipo de escrita baseado em princípios diferentes dos das ortografias modernas. Iremos, pois, verificar se os resultados da nossa pesquisa corroboram a visão de Mendonça ou a de autores como Brocado e Emiliano. A fim de atingirmos esse objetivo, iniciaremos uma viagem pelas gramáticas e sites de Internet, observando o que dizem as mesmas quanto ao uso das abreviações. É nesse período que a língua usada na burocracia começa a perder o seu caráter retórico (MENDONÇA, 1987). 62 69 2.1.7 A abreviação nas gramáticas e home pages Como o uso de abreviação está inserido no processo de produção textual, vale investigar também como os gramáticos tratam esse recurso gráfico. Para nossa surpresa, porém, constatamos que nem as gramáticas descritivas63 tampouco as normativas trazem sequer uma linha acerca do processo de abreviação. Apesar de todas, ou quase todas, trazerem em seu sumário uma lista de abreviaturas usadas, lista de abreviaturas de nomes dos autores e outros utilizados, nenhum gramático dedicou em suas históricas páginas um espaço reservado a esse tópico tão antigo e ainda presente em nossos dias. Restounos então partir para uma busca nos sites específicos, a fim de descobrirmos se esses tinham o mesmo comportamento ou ao menos faziam menção do assunto. A seguir, apresentamos o resultado da nossa pesquisa. As abreviações utilizadas na língua revelam, conforme lemos em PUCRS Manual de Redação, o ritmo acelerado da vida moderna, faz com que se economizem palavras e tempo, mediante uma comunicação mais rápida, reduzindo frases, expressões e palavras (pornográfico → pornô; professor → profe; pneumático → pneu etc). No primeiro site que acessamos, www.nilc.icmc.usp.br/, foram encontrados os seguintes critérios para utilização das abreviaturas: • Nos textos escritos, em especial formais, evite ao máximo o uso de abreviaturas. Prefira escrever as palavras por extenso. • Lembre-se de que os acentos existentes nas palavras originais são mantidos nas abreviaturas. • Nem todos os substantivos masculinos aceitam o "o" sobrescrito em seu processo de abreviatura. O "o" sobrescrito deve ser utilizado: 1. Apenas para a redução dos numerais ordinais ("1º") Excetuando-se a Gramática de Eduardo Carlos Pereira, que traz pouca informação sobre o tema. Apenas apresenta uma lista, associando o largo uso das abreviaturas com a ortografia (PEREIRA, 1938). 63 70 2. Opcionalmente, em alguns substantivos masculinos terminados em "o", como: "engº" (engenheiro) ou "Colº" (colégio). 3. Substantivos masculinos terminados em consoante (professor, por exemplo) devem ser reduzidos sem referência ao gênero ("prof."). • O "a" sobrescrito, por sua vez, deve ser obrigatoriamente utilizado sempre que indicar gênero feminino, como em: "2ª" ou "prof.ª" (professora). No que tange à sistemática das abreviaturas, foram encontradas as seguintes normas: 1. Uso de Abreviaturas de Logradouros, Títulos Honoríficos e Nomes Próprios: Recomenda-se que as abreviaturas de títulos honoríficos, profissões, cargos e logradouros como: “Dr.", "Dra.", "Sr.", "Sra.", "D.", "prof.", "eng.", "gen.", "cap.", "R.", "Av.", "Pç.", "Lgo." e "Trav." sejam utilizadas, somente se necessário, diante dos substantivos próprios por elas modificados. Em outros casos, é indicada a escrita da palavra por extenso. Exemplos: • A Dra. nos recomendou um bom remédio. [Inadequado] A Dra. Henriqueta nos deu uma ótima notícia. [Adequado] • O gen. viajou ontem. [Inadequado] O general viajou ontem. [Adequado] 2.Uso de Abreviaturas de Tempo: A maior parte das gramáticas do português recomenda que a abreviatura de horários seja feita por referência explícita à unidade de tempo ("h" e "min"). 71 A forma HH:MM, consagrada pelo uso, é considerada anglicismo, por isso deve ser evitada. A indicação das horas deve ser feita por meio da abreviatura invariável "h" (15 h), e a unidade dos minutos pode ser omitida (14h48) ou expressa pelas abreviaturas, também invariáveis, "m" (14h48m) ou "min" (14h48min). A unidade das horas, sempre que não houver referência aos minutos, deve vir separada do algarismo que a precede por um espaço em branco. Caso contrário, as unidades devem vir imediatamente após os algarismos. Exemplo: • São 2h, estou atrasada. [Inadequado] São 2 h, vamos! [Adequado] • Faltam 5hs34m para o início da prova. [Inadequado] Faltam 5h34min para o fim da viagem. [Adequado] 3.Uso de Abreviatura de Unidade de Medida: • As abreviaturas das unidades de volume são: "l" (litro), "ml" (mililitro), "cl" (centilitro) e "dl" (decilitro). • As abreviaturas das unidades de massa são: "g" (grama), "mg" (miligrama), "kg" (quilograma) e "dg" (decigrama). Exemplo: 1. Comprou 3kgs de carne no mercado ontem. [Inadequado] Comprou 3 kg de carne no mercado ontem. [Adequado] 2. Um galão americano tem 3,785 ls. [Inadequado] Um galão americano tem 3,785 l. [Adequado] 72 Estas abreviaturas também são invariáveis, devem ser escritas com letras minúsculas, e devem vir separadas do algarismo que as precede por um espaço em branco. 4.Uso de abreviatura de distância: As abreviaturas das unidades de distância são invariáveis e escritas da seguinte forma: "m" (metro), "cm" (centímetro), "mm" (milímetro) e "km" (quilômetro). Exemplo: • O carro rodou 243kms em apenas uma hora. [Inadequado] O carro rodou 243 km em apenas uma hora. [Adequado] 5.Uso de abreviatura de nomes de santos: A abreviatura recomendada para Santo e Santa é "S.", e não "Sto." ou "Sta.". Exemplos: • Sou muito devota de Sta. Luzia. [Inadequado] Sou muito devota de S. Luzia. [Adequado] • Sto. Antônio é considerado casamenteiro. [Inadequado] S. Antônio é considerado casamenteiro. [Adequado] No segundo site, www.folhanet.com.br/, podemos resumir a idéia central em estar o uso das abreviações associado à economia de tempo ou de espaço. Daí o fato de a abreviação dever constar apenas da metade ou menos da metade da palavra original, do contrário, é melhor escrevê-la por extenso, o 73 que está de acordo com o que diz Houaiss (1983): não convém abreviar quando o princípio da economia é insignificante. É ressaltado ainda o cuidado com o uso abusivo das abreviações, não devendo estas constar em provas, trabalhos, artigos ou redações, mas apenas em anotações de uso pessoal. Por último, é relacionado o uso constante, por parte dos clientes, das abreviações no Caderno Classificados da Folha da Região com o fato de aqueles visarem à economia de espaço, a fim de pagarem menos (o que nos faz, de certa forma, regressar à época do pergaminho, que, devido ao seu elevado preço, exigia o uso acentuado das abreviações, a fim de economizar o material da escrita, cujo preço era elevadíssimo). Em seguida, são apresentadas regras de uso das abreviações. A regra geral resume-se em: escrever a primeira sílaba e a primeira letra da segunda sílaba, seguidas de ponto abreviativo64. Caso a primeira letra da segunda sílaba seja vogal, escreve-se até a consoante. Exemplos: fut. (futuro). Se a palavra tiver acento gráfico, este será conservado se cair na primeira sílaba. Exemplos: núm. (número). Se a segunda sílaba iniciar por duas consoantes, as duas farão parte da abreviatura. Exemplos: pess. (pessoa). Entretanto, nem todas as palavras seguem a regra geral para abreviatura. Exemplos: a.C. ou A.C. (antes de Cristo), ap. ou apto. (apartamento), bel. (bacharel), btl. (batalhão), cel. (coronel), Cia. (Companhia), cx. (caixa), D. ( digno, Dom, Dona), f. ou fl. ou fol. (folha), ib. ou ibid. (ilidem, da mesma forma), id. (idem, o mesmo), i.e. (isto é), Ilmo. (Ilustríssimo), Ltda. (Limitada), M.D. (Muito Digno), p. ou pág. (página), pp. págs. (páginas), pg. (pago), p.p. (próximo passado), P.S. (pós-escrito = escrito depois), Q.G. (Quartel General), rem. ou remte. (remetente), S.A. (Sociedade Anônima), sv. (serviço), S.O.S. (Save Our Souls = salvai nossas almas), u.i. (uso interno), U.S.A. (United States of America = Estados Unidos), vv. (versos, versículos). É bom lembrar que na flexão de gênero não aparece a desinência “o”, indicativa do masculino nas abreviaturas, como: prof. profª. Sendo, portanto, Os gramáticos tradicionais não admitem flexão em abreviaturas, como: profª (professora), págs. (páginas) (www.folhanet.com.br/). 64 74 errado grafar o masculino assim: profº. Nas abreviaturas de caráter internacional, não se põe o ponto abreviativo: h, kg, km, kw. A última observação: nunca corte a palavra numa vogal, sempre numa consoante. Exemplo: departamento = dep., nunca depa.). Dando seqüência ao assunto, é reservado um espaço para as siglas, consideradas como um tipo especial de abreviatura, e definidas como redução de locuções compostas por substantivos próprios. As siglas/acronímias podem ser formadas: • pelas letras iniciais maiúsculas das palavras que formam o nome como: FGTS = Fundo de Garantia por Tempo de Serviço. • pelas sílabas iniciais de cada uma das palavras que formam o nome, como: EMBRATEL = EMpresa BRAsileira de TELecomunicações. As siglas devem trazer apenas a inicial em letra maiúscula, quando possuírem mais de quatro letras e forem pronunciáveis; nos demais casos, todas as letras devem ser grafadas com caracteres maiúsculos: Exemplos: 1. Unicamp = Universidade de Campinas 2. Senac = Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial 3. CNBB = Conselho Nacional dos Bispos do Brasil 65 Em uma entrevista especial para a Folha de São Paulo, Camargo66 (www.folhadesaopaulo) afirma que as palavras sofrem alterações de forma e de significado no decorrer do tempo, existindo vários processos que dão 65 As abreviaturas ("Av.", por exemplo), mas não as siglas (“FMI”, por exemplo), devem ser seguidas de ponto final. Unidades de medida ("km", "MHz",etc.), elementos químicos ("K" (potássio),etc.) e pontos cardeais e colaterais ("E" (Leste), "NE" (Nordeste), etc.) também dispensam o uso do ponto final. 66 Entrevista concedida em 2004. 75 origem a novos termos, sendo um dos mais comuns entre eles a abreviação ou redução, que, para ela, é resultado da lei do menor esforço. A autora trata a questão da abreviação não apenas como o apagamento e/ou redução de uma ou mais letras, mas sim como um processo de síntese (grifo nosso) do vocábulo. Desta forma, teríamos as seguintes palavras que passaram por esse procedimento na língua portuguesa: “pneu” em vez de “pneumático”; "cinema" em lugar de "cinematógrafo"; "metrô", de origem francesa, é redução de "chemin de fer métropolitain" (estrada de ferro metropolitana); "Quilo" vem de "quilograma"; "Pólio", de "poliomielite"; "Pornô", de "pornográfico"; "Pinda", de "Pindamonhangaba"; "Kombi", de origem alemã, é redução de "Kombinationsfahrzeug" (veículo combinado para carga e passageiros). "Automóvel" convive com sua abreviação "auto", que deu origem à palavra "auto-escola". E continua: caso semelhante ocorre com "motoboy", também formado a partir da abreviação de "motocicleta" ("moto"), à qual se prendeu a redução do estrangeirismo "office boy" ("boy"), vigente entre nós há bastante tempo. Concluindo, Camargo (op.cit.) diz que essas são provas do dinamismo da língua, sempre pronta para incorporar o novo. A abreviação vocabular é considerada um processo produtivo na redução de palavras muito longas. Consiste, segundo informa o site Dudas idiomáticas67, na eliminação de um segmento de uma palavra a fim de se obter uma forma mais curta (otorrinolaringologista → otorrino). Ainda nesse site, a forma abreviada é considerada de uso coloquial, embora em muitos casos passe a fazer parte da língua escrita 67 www.dudasidiomáticas 76 Basílio (2003) diz ser importante fazer a distinção entre redução ou abreviação de derivação regressiva. No primeiro caso, segundo a autora, temse uma palavra formada pela supressão de alguma parte da palavra derivante (a palavra da qual outra deriva), sendo a parte suprimida muitas vezes imprevisível. Para ela, a palavra formada é sinônimo da derivante, tendo apenas seu uso em estilo mais coloquial. São exemplos de redução ou abreviação: boteco por botequim, Sampa, por São Paulo, granfa por grã-fino, delega por delegado. Basílio (op.cit.) apresenta ainda casos de redução em formas compostas, nas quais o todo é representado por uma das partes da composição, sem que haja prejuízo ou mudança da significação global: míni, por minissaia, micro por microcomputador, vídeo, por videocassete, análise por psicanálise. A diferença entre esses dois casos, formas simples e compostas, é que no primeiro a redução é assistemática; no segundo, se faz pelos constituintes da composição. Já a derivação regressiva, segundo a autora, consiste em suprimir uma seqüência fônica tomada como afixo. Nesses casos, afirma Basílio, a palavra resultante não tem o mesmo significado ou uso da palavra derivante. Vejamos: sarampão e sarampo. O ão foi interpretado como sufixo aumentativo formando sarampo, bastando retirar a seqüência ão. Daí surgiu a oposição de significado entre os dois vocábulos, significando sarampão um ataque forte de sarampo. Em uma outra home-page, encontramos mais um esboço sobre nosso objeto de estudo, a abreviação, o qual julgamos relevante para fins de conhecimento da língua portuguesa. Desta vez, a análise é mais limitada, restringindo-se ao vocábulo táxi e derivados. Taxi: de taxímetro (despesa + medidor). Talvez porque estejamos tão familiarizados com os termos taxímetro (aparelho que mede a distância e calcula a quantia a ser paga) e táxi (veículo de aluguel equipado com taxímetro), os detalhes abaixo se tornam necessários: 1. No século XIX eram muito comuns pequenas carruagens de aluguel chamadas cabriolés (duas rodas, um cavalo, conversível), que na França e na Inglaterra se chamava CABRIOLET. 77 2. Na Inglaterra a palavra foi reduzida para CAB, com o mesmo uso. O cocheiro era chamado de CABBY. 3. No fim do século passado inventou-se um aparelho mecânico para possibilitar o pagamento do uso dos cabriolés em função da distância. O aparelho foi chamado de TAXÍMETRO (taximeter). Os cabriolés assim equipados foram chamados de TAXIMETER CAB, depois reduzido para TAXICAB. 4. Continuando o processo de abreviação vocabular, chegamos ao TÁXI. 5. Com o advento do automóvel, a mesma terminologia foi transferida para as “carruagens sem cavalo”. Nos EUA até hoje os termos CAB, TAXICAB e TAXI são usados indistintamente. 6. Como dissemos, o antigo cocheiro era conhecido como CABBY, mas este termo não é mais utilizado, preferindo-se táxi driver. Já no Brasil, o antigo cocheiro virou Chofer de Praça, Chofer de Táxi e hoje são chamados de Motoristas de Táxi ou Taxistas. Há também nas home pages uma série de abreviaturas68 características da Internet, representadas no Quadro 3, a seguir, que significam respectivamente: Quadro 3 Abreviaturas da Internet BTW GA FYI IMHO ILY LOL MSG OTOH RTFM TIA By The Way Go Ahead For Your Information In My Humble Opinion I Love You Laughing Out Loud message On The Other Hand Read The fuck Manual Thanks in Advance A propósito Vá em frente Para a sua informação Na minha humilde opinião Eu te amo Rindo em voz alta Mensagem Por outro lado Leia o maldito do manual Agradecendo antecipadamente As letras maiúsculas são usadas para dar destaque. Se todas elas estiverem em maiúsculas, significa que a pessoa está gritando. Portanto, evite escrever tudo em maiúsculas, a menos que se queira enfatizar um ponto muito importante. 68 78 Algumas abreviações misturam letras e sinais gráficos69 para representar a redução de palavras e expressões70. São exemplos: Quadro 4 Abreviações com letras e sinais gráficos K-Que OBG-Obrigado OK-Tudo bem PQ-Porque Q-Que QQ-Qualquer TB-Também TKS-Obrigado(ing) X-Vez +-Mais --Menos BJS-Beijos + ou--Mais ou menos C/O-Como [ ]-Abraço C/-Com =-Igual ILY-Amo-te LOL-Rir alto(ing) MSM-Mesmo Segundo afirma Béguelin (2004, p.32), os internautas e os usuários do SMS (Short Message Service) para os telefones móveis fazem uso de uma quantidade de inovações gráficas basicamente por exigências externas do tipo: rapidez e falta de espaço na tela. Para a autora, as abreviaturas também estão presentes a fim de que os usuários atinjam o objetivo pragmático de serem breves e rápidos em suas comunicações. Na opinião dela, alguns usuários retomam o que caracteriza silabários micênicos e hititas, entre eles: 1. Utilização de letras ou ideogramas com valor fonético (rebus): U2 = [you too] Y A KELK1??? = [y a quelqu’un] 2. Uso de símbolos acrofônicos: asv? = [age sexe ville?] mdr!!! = [mort de rire] Q = [quoi], [qui] ou [que], por exemplo em: CE Q JE PENSE Para Saussure, só há dois sistemas de escrita: o ideográfico, cuja palavra é representada por um sinal único e estranho aos sons que a compõem; e o fonético, que procura reproduzir a sucessão de sons de uma palavra . 70 Na expressão de Vendryès, a linguagem é um sistema de sinais. Assim como o é a escrita, na expressão de Martins (op.cit, p.24). 69 79 3. Reutilização de fonogramas com valor silábico: CT = [ c´était] 4. Recurso à ideografia: @+ = [a plus] (que se pronuncia “a plus”, forma truncada habitual, em francês coloquial, para “à plus tard” 71). 5. Reciclagem de diversos signos para transformá-los em componentes de ícones: 8-)):-p = signos não-lingüísticos os quais evocam uma pessoa que usa óculos e sorri ou um personagem que mostra a língua, tomados do repertório de smileys ou binettes. (“Emoticón” [algo como “emotivadão” em português] é uma das denominações que se usam em espanhol). Podemos observar também na linguagem da Internet o crescente uso da imagem, o que, de certa forma, nos leva aos códices medievais72, nos quais predominavam as ilustrações, imagens e ornamentações (MIRANDA, 2004). Vale ressaltar, porém, que nesses grande parte das ilustrações não tinha nada a ver com o sentido do texto, servindo, via de regra, como mera decoração. Naquela, as imagens e ícones em movimentos colaboram com a construção do sentido. Ou seja, o hipertexto, modo de enunciação digital, converge VERBO + IMAGEM + SOM = HT. É bem verdade que a iconografia pode existir sem apoio do texto, como este pode subsistir sem aquela, mas, associada ao texto, a imagem constitui uma espécie de traço supra-segmental que marca leituras, suscita apelos, cria modos de realidade que induzem significação no interior de comunidades textuais suficientemente advertidas (NASCIMENTO, 1998, p. 21). Se pudermos estabelecer ligações interessantes entre o texto digital e os manuscritos, veremos que, no primeiro, a imagem possui uma relação privilegiada com o elemento verbal, assumindo um valor primeiro que as “iluminuras” não representavam nos códices, já que se limitavam à função 71 Béguelin (2004, p. 32) afirma que o recurso de abreviações fonográficas é freqüente na língua francesa. 72 Com o advento da imprensa houve a separação do espaço verbal e imagético. 80 decorativa. Por outro lado, os ícones criados e amplamente difundidos no espaço digital, que definem emoções e características de quem os escreve, reconfiguram os sinais diacríticos. Vejamos alguns: Quadro 5 Guia de emoticons73 :-) Sorriso – Alegria ( :+( Assustado – :-x Um beijo Aterrorizado ;-) ou ' -) Piscadinha - :[ ou :)= Vampiro xxx Beijinhos sarcasmo ou brincadeira :-( Triste - Não gostei, |-I ou (- I Adormecido :-X Um beijo caloroso estou triste ou chateado e apaixonado :-I Indiferença |-O Bocejando : - # De lábios selados, guardar em segredo :*) Estou bêbado ou X) Morto |: - | Excessivamente sendo incoerente rígido :-D Risada - Estou rindo % -) Confuso [] abraços :-DDD Estou rindo muito : -e Desapontado 0:) um anjo Conforme lemos em Viana (2000), os emoticons foram desenvolvidos pelo serviço secreto de um país do sudoeste europeu, em 1979, para que apenas pessoas altamente treinadas na arte da decifragem pudessem compreendê-los. Segundo essa autora, a técnica básica desse sistema criptográfico baseava-se na rotação a 270 graus dos caracteres digitados, o que os tornava praticamente impossível de serem lidos por pessoas que não conheciam essa arte74. Atualmente, ressalta Viana, basta criatividade e um pouco de paciência para entendê-los. David Crystal (2005, p. 86), em seu livro intitulado A revolução da linguagem, deixa claro que os smileys (emoticons) indicam a natureza sem fala do veículo que os participantes utilizam, seja em interações por e-mail ou salas de bate-papo. Na opinião dele, 73 74 Abreviaturas de emoções usadas na Internet. Com o fim da Guerra Fria, o uso militar dos emoticons tornou-se obsoleto (VIANA, 2000). 81 Os smileys se expandiram como forma de evitar as ambigüidades e as percepções errôneas que surgem quando se faz a linguagem escrita carregar o peso da fala. Ainda acerca dos emoticons, Oliveira e Paiva (op.cit.) citando Noblia diz que: Como a comunicação mediada por computador é uma comunicação baseada em textos, ao contrário da comunicação face a face, sofre a ausência de indicadores não-verbais (gestos, expressões, olhares, entonação, acento etc.) que normalmente ocorrem quando todos os participantes estão presentes no mesmo ambiente físico. Um paliativo para essa ausência é a “paralinguagem eletrônica” que oferece aos interlocutores os chamados “emoticons” (que tentam reproduzir sentimentos, emoções, risos etc. através de uma combinação de símbolos). Dentre os vários recursos utilizados na linguagem dos gêneros digitais, em especial a redução das palavras, elegemos aqui os mais comuns, a saber: 1. D+ T +++++ Sons das letras associados a símbolos matemáticos. Escrita ideográfica: Demais Até mais 2. Uso de consoantes que têm em sua pronúncia o som de uma vogal: Blz Beleza Kra Cara Msmo Mesmo Q Que Tc Tecer = conversar on-line ou teclar 3. Pq Tb Vc Qdo Uso das consoantes mais sonoras de palavras dissílabas: Por que Qto Quanto Também Hj Hoje Você Hrs Horas Quando Mto Muito 4. Expressões reduzidas a apenas uma palavra: Kolé ou cole Qual é Dukarái Procê Para você Xôtefalá Cume Como é Né Do caralho Deixa eu te falar Não é? 82 Ce Te Ta Tava 5. Interrupção da palavra em sua sílaba tônica, mantendo-se por vezes, a pós-tônica: Você Tâmus Estamos Até Fi Filho Está Po Pode Estava Nó Nossa Pegay 6. Uso de estrato sonoro da língua inglesa Peguei Naum Intaum Baum Saum Entaum 7. Modificação da representação convencional dos sons nasais: Não Vaum Vão Então Daum Dão Bom Estaum Estão São Taum Estão Então Jaum João Soh Lah Eh 8. Marcação das sílabas tônicas com o uso da letra h Só Moh Mó Lá Neh Né É Jah Já Aki 9. K substituindo o dígrafo QU Aqui Tikim Tiquinho Loko Pra 10. Economia na escrita de letras mediais Louco Loca Para Veio Louca Velho Todas as reduções acima apresentadas são motivadas pelos sons das palavras e, mesmo que variem os contextos, o valor semântico é mantido. Assim, mt é sempre muito, vc é você e aki é aqui e não há dificuldade na compreensão por parte dos usuários. No que tange à substituição do ditongo nasal ão pelo um (ex. não ⇒ naum), assim como o uso do h para representar as vogais tônicas (ex.é ⇒ eh), ambos têm sua origem na linguagem telegráfica e permanecem até hoje. Quanto ao uso do K em substituição à letra C e ao dígrafo QU (ex. aqui ⇒ aki), tem-se comprovada a tese da economia, que reduz duas letras a uma só. Vale salientar, contudo, que há ocorrências do fonema /w/ em contextos onde seu uso não implica redução: falou ⇒ falow. Nesse caso, o autor do texto 83 tem como finalidade apenas assinalar seu estilo, já que a marca principal das interações on line é a utilização de um código próprio, que rompa com as normas estabelecidas para a ortografia e a pontuação, fazendo surgir um código irreverente e estiloso75. Convém lembrar que, a depender do gênero, escrever conforme as normas gramaticais pode resultar em erro. Em outras palavras, um ambiente que exige irreverência, velocidade e estilo requer uma linguagem que se coadune com ele. 75 (SANTOS, 2005). 84 CAPÍTULO 3 A ABREVIAÇÃO E AS TECNOLOGIAS: do manuscrito ao texto digital Após mostrarmos que a visão dicotômica da relação entre fala e escrita não mais se sustenta, veremos se há ou não, no que diz respeito ao uso das abreviações, certa diferença entre as tecnologias manuscrita, impressa e digital. Para tanto, dedicaremos algumas linhas deste capítulo ao texto manuscrito, seu significado, sua origem e tradição; ao impresso, seu surgimento e contribuições e, por último, ao digital, sua introdução, importância e impacto na linguagem e vida social, tomando como premissa um dos três aspectos destacados por Crystal (2001), em seu livro “Linguagem e a Internet76”: Do ponto de vista dos usos da linguagem, temos uma pontuação minimalista, uma ortografia um tanto bizarra, abundância de siglas e abreviaturas (grifo nosso) nada convencionais, estruturas frasais pouco ortodoxas e uma escrita semi-alfabética. 77 76 Segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, Internet s.f. (s XX) INF TEL rede de computadores dispersos por todo planeta que trocam dados e mensagens utilizando um protocolo comum, unindo usuários particulares, entidades de pesquisa, órgãos culturais, institutos militares, bibliotecas e empresas de toda envergadura. 77 Não seria o caso aí, de escolha lingüística ou, como salienta Marcuschi (2002), temos, em termos lingüísticos, uma língua escrita não-monitorada, não submetida a revisões, expurgo ou correções. Em outras palavras: uma linguagem em seu estado natural de produção. 85 Quanto a este último, o texto digital, buscaremos identificar e caracterizar alguns gêneros emergentes, em especial o e-mail78, o weblog, e o SMS, a fim de mostrar o efeito dessas novas tecnologias na linguagem, especificamente na escrita, visto que a comunicação em todos os gêneros da mídia digital se dá por essa modalidade da língua. Podemos adiantar, no entanto, que o fato de essa nova tecnologia conseguir reunir várias formas de expressão (texto, som e imagem) em um só meio é responsável por parte do sucesso que esse novo gênero ocupa ao lado do papel e do som, nas atividades comunicativas. A título de exemplo, destaquemos aqui a expressão do ano em 1998: “e”: e-mail (correio eletrônico), e-book (livro eletrônico), e-therapy (terapia virtual), e-business (negócios virtuais), entre outras, que passaram a fazer parte do nosso vocabulário. • A evolução da escrita: uma sinopse As formas de comunicação utilizadas pelo homem ao longo de sua evolução foram as mais variadas possíveis: o homem primitivo utilizava-se de desenhos, hieróglifos, caracteres cuneiformes das civilizações da Mesopotâmia ou, ainda, caracteres ideográficos sino-japoneses. Os materiais utilizados iam de paus, pedras, fios, a tecidos, colares, entre outros, com os quais compunham palavras, frases e expressavam idéias. No mundo ocidental, a comunicação dá-se principalmente através de representação gráfica, cujo principal veículo de transmissão do conhecimento humano é feito por meio do alfabeto. Antes, porém, de chegarmos ao alfabeto, vivenciamos uma verdadeira evolução da escrita, que pode ser assim resumida: 78 Visto que o termo já está sendo dicionarizado dessa maneira, ao menos no Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa não traduzimos, aqui, para “correio eletrônico”. 86 • Pictografia: do latim “pictus”, pintado; “grafe” (do grego), descrição. Essa escrita era usada pelo homem primitivo para fixar nas paredes das cavernas seus principais feitos; • Ideografia: Fixação das idéias através dos símbolos. Signos convencionais correspondentes a determinadas expressões e que sugerem idéias; • Fonetismo: As figuras lidas evocavam seu sentido primitivo acrescido da expressão sonora. Pássaro, ao invés de representar apenas rapidez, adquiria o valor sonoro de ave. Ou seja, equivaliam ao som79. • Silábica: O fonetismo sugeriu a decomposição da palavra em sílaba, ou seja, conjunto de sons. Quando a escrita tinha dificuldades em encontrar uma representação para determinada palavra, separava-a em duas, três ou mais sílabas, com um desenho para cada uma. • Alfabeto: Palavra composta com os nomes das principais letras gregas alfa e beta. Sistema de sinais que exprimem os sons elementares da linguagem. De origem fenícia, passou à Grécia e depois a Roma. No nosso caso, apenas no século I a.C. surge o alfabeto latino completamente constituído com suas vinte e três letras (HIGOUNET, 2003). 3.1 O manuscrito Certamente não é uma novidade afirmar que as maiores obras religiosas, literárias, artísticas e até mesmo cientificas da humanidade foram redigidas de próprio punho pelos seus autores, foram obras “manu scriptæ”, manuscritas. Todas que foram editadas antes do aparecimento da imprensa 79 Processo semelhante ocorre nas cartas enigmáticas, onde o símbolo do sol mais o do dado representa a palavra soldado. 87 como a Bíblia, a Ilíada e a Odisséia, e mesmo depois que a imprensa já tinha sido inventada por Gutenberg. Queremos com isso dizer – aprofundando o assunto – que foram as mãos a parte do corpo por excelência do homem através das quais ele revelou o pensamento humano nas grandes obras do pensamento e da arte humana, concebidos pelo cérebro e realizados através da escrita manual, da pintura, da escultura, do desenho. Em seu “Elogio da mão”, Henri Focillon escrevia que “l’esprit fait la main, la main fait l’esprit” e afirma a essencialidade da mão humana, desde o gesto mais simples ao gesto oratório, que o torna mais convincente, mais plausível, mais veemente. E afirma, a certa altura, que aqueles que se expressam concomitantemente com a palavra e com os gestos manuais “conservaram com vivacidade essa dupla poética... que traduz com exatidão um estado antigo do homem, a recordação dos seus esforços para inventar um mundo inédito” (HENRI FOCILLON, Vie des Formes, p.104 apud WILSON MARTINS, A palavra escrita, p.18). Durante séculos, como afirma Roman (2000), a comunicação escrita foi feita por manuscritos ou processos artesanais de entalhe, gravação e impressão de caracteres em pergaminhos preparados a partir do couro de animais. Segundo o autor, durante a Idade Média, copiavam-se principalmente documentos e textos religiosos. 80 A princípio, conforme encontramos em Martins (1996, p.93), manuscrito é o texto escrito à mão, seja qual for o instrumento auxiliar, seja qual for a matéria que o receba. Nessas condições, seriam manuscritos todas as “inscrições” feitas em papel ou em pedra, marfim, bronze ou mármore. Entretanto, esse nome é reservado aos “manuscritos” em papel, papiro ou pergaminho; aos demais, o nome de gravura ou de escultura. Dessa forma, a palavra “manuscrito” evoca sem dubiedade a idéia da folha de papel, de papiro ou de pergaminho, escrita à mão, e até, visto que nem sempre são sincrônicos os progressos técnicos e os Um copista levava em média 100 dias para produzir um exemplar de uma obra (ROMAN, Artur Roberto. Chega de papel! O correio eletrônico e a comunicação administrativa nas empresas). 80 88 progressos vocabulares, a folha de papel datilografada, quando ela representa o “original” vindo das mãos do escritor. Também o Dictionnaire de Furetière refere dois sentidos à palavra “manuscrit”: “livro ou obra escrita à mão” e “o original de um livro, o texto do Autor sobre o qual ele foi impresso” (CHARTIER, 2002, p.96). Assim considerado, o “manuscrito” visa ao texto escrito à mão, qualquer que seja o instrumento auxiliar, seja qual for a matéria que o receba, como foi dito acima. Estendemos, então, o conceito de manuscrito, também, ao texto digital, visto que será aqui tomado apenas o original, vindo das mãos do escritor81. O primeiro mito que deve ser desfeito aqui é o da substituição simples da cultura manuscrita pela impressa. Prova real de que tal afirmação não passa de uma idéia errônea é o fato de ter aquela alcançado tamanha importância quando da época da impressão. Segundo Chartier82 (2002, p.84), a manutenção do manuscrito deu-se até o século XIX e mesmo no século XX. A publicação manuscrita, afirma o autor, mantém a ambigüidade do próprio termo “escritor”, compreendendo aquele que copiou o livro, bem como aquele que compôs o texto. Este fato deve-se à constatação de um mesmo livro conter textos de autores e, até mesmo, gêneros diversos. Nos séculos XV e XVI a publicação manuscrita é reforçada a fim de controlar a própria forma dada pelos autores às suas obras e, principalmente, devido à consciência aguda e infeliz das corrupções introduzidas pela imprensa, conforme podemos ler em Chartier (2002, p.85). A partir do século XVI, os papéis manuscritos abundam em freqüência e atingem um nível tal de importância que é raro um inventário após o falecimento que não os contenha. Tamanha é a valia de um manuscrito que os exemplares de apresentação oferecidos aos príncipes ou aos grandes tinham suas cópias impressas preteridas (CHARTIER, 2002, p.83-86). Será, portanto, nesses termos, com essa restrição e especificidade, que usaremos ao longo do nosso trabalho a definição do tema. 82 O autor destaca a oposição radical entre print culture e scribal culture. 81 89 Havia, em plena época da impressão, uma “comunidade do manuscrito”, no dizer do autor, cujo desejo era o de subtrair ao acesso público um saber precioso, uma literatura escolhida, livrando-a dos riscos de corrupção e profanação trazidas pela imprensa. Em sua obra A evolução da escrita, Horcades (2004) afirma que os possuidores de livros manuscritos tinham preconceito contra os livros impressos, chegando, em algumas cidades, a proibirem a entrada dos impressores. Tal decisão era tomada por poderosos escribas e calígrafos, que alcançavam facilmente seu objetivo, já que as cidades eram cercadas por muros e guardadas por portões. Os manuscritos abarcavam um número considerável de abreviaturas, das quais uma parte das sílabas, e às vezes todas as letras da palavra, exceto a primeira, eram suprimidas. Vejamos a quantidade das abreviações advindas dos manuscritos: • Um z pela conjunção e; • uma espécie de 3 ou de 9 pela partícula cum ou a partícula francesa com, e pelo final de certas palavras: te3 ou te9 = tecum; neq3 = neque; • o q com a parte inferior cortada por um traço em forma de cruz para significar quam ou quod; • o sinal 4 correspondente ao latim rum: nostro4 = nostrorum; quo4 = quorum etc; • a freqüente supressão de certas letras, substituídas por um pequeno traço horizontal, chamado til (em latim: titulus; em francês: titre; em espanhol: tilde), colocado sobre a palavra assim abreviada: nre por notre; bos por bons; Dns por Dominus, que até o século V só se aplica a Deus, mas no século VI começa a ser aplicada a qualquer deus83 (MARTINS, 1996, p.161). Nos manuscritos mais antigos, o m ou o n, no final das linhas, era designado por um pequeno traço horizontal: C ou por um s deitado ( ), só ou No século VI se deixa de abreviar o título dominus pela sigla D, passando a abreviatura DMS ou DNS, que a princípio era designativa apenas do Senhor Deus (MAURICE PROU, Manuel de palèographie, p.49). 83 90 acompanhado de dois pontos, um superior e outro inferior. A palavra est (do verbo esse), representada por este sinal: ÷, indicava uma antiguidade de setecentos a oitocentos anos. No século IX, o ille era abreviado para ill, e a letra n servia de abreviação para os nomes de homens desconhecidos (MABILLON APUD MARTINS, 1996). As abreviações de per, de pro e de prœ eram distinguidas da seguinte forma: per era representada por um p cuja perna era cortada por um traço; pro, por um p com a cabeça cortada por um traço; e prœ por um traço superior que não chega a tocar a letra. Vimos, pois, que as abreviações tiveram origem nos manuscritos e se estenderam até os nossos dias. 3.2 O impresso Com o advento da imprensa, muito foi facilitada a transmissão de textos e a produção de livros em série. O INCUNÁBULO é um termo técnico que designa os livros impressos até 1500, embora, segundo Svend Dahl, nos países do norte europeu, os incunábulos durassem até 1550. A maior parte dos incunábulos que ascendeu a centenas de milhares foi impressa em pergaminho. Dentre os principais caracteres que denunciavam a autenticidade de um incunábulo, estava a quantidade de abreviações que esses continham. Segundo John Man (2004: 219), esse nome latino incunabula - os “cueiros” - foi adotado pelos historiadores em muitas das línguas mais faladas, significando “infância” da revolução impressa. Algumas vezes, afirma o autor, essa expressão adquiria uma singular forma espúria, incunabulum, ou um equivalente local: “prensa do berço” (em alemão ”Wiegendruck”); e “livros do período do berço” (em japonês“yoran-ki-bom” e “in-kyu-na-bu-ra”). As edições PRINCEPS: Há um questionamento em torno do verdadeiro significado do termo. Segundo Martins (1996, p. 164), abusa-se do emprego dessa palavra para designar “indeterminadamente” as primeiras edições de manuscritos e as primeiras edições em geral. Rouveyre, citado por Martins, 91 afirma que a palavra deve ser “reservada aos clássicos impressos no segundo período do século XV”. Assim, todas as edições princeps são incunábulos. Durante algum tempo, os impressos continuaram imitando os manuscritos, gerando até certa dificuldade para distinguir se determinado livro era impresso ou manuscrito, como no caso da Bíblia. A Bíblia de 42 linhas, de Gutenberg, é um exemplo: nela, a técnica das rubricas impressas não permitia distinguir as maiúsculas utilizadas das pintadas à mão (MAN, 2004, p.198). Era costume que os impressores, ao imprimirem os livros, deixassem em branco o lugar das primeiras letras e outros espaços onde os copistas iam desenhar e ornamentar as letras e fazer outros desenhos. O desenvolvimento da prensa mecânica por Gutenberg, em 1448, revolucionou os processos de composição, possibilitando a impressão mecânica de textos, bem como sua reprodutibilidade. Com esse avanço, o livro deixa de ser o local onde se escondia o conhecimento e passa a ser o meio de divulgá-lo84. É bem verdade que os preços dos livros impressos foram uma das razões por que os manuscritos não foram substituídos prontamente (MAN, 2004, p.221). Segundo Chartier (2002, p.85), a desconfiança diante do livro impresso e a preferência pela publicação manuscrita está ligada ao fato de, nesta, ter-se um maior controle do texto, bem como de sua circulação e interpretação. Para muitos, na expressão do autor, a imprensa é vista como triplamente corruptora: deforma a letra dos textos, alterados pelos erros de tipógrafos inábeis; destrói a ética desinteressada da República dos textos entregando as composições dos humanistas, dos poetas ou dos eruditos a livreiros cúpidos e desonestos; oblitera a verdadeira significação das obras propondo-as a leitores ignorantes, incapazes de compreendê-las corretamente. Brocado & Emiliano (no prelo) acrescentam ainda que a edição de um manuscrito medieval, por exemplo, faz sempre violência ao texto na sua materialidade paleográfica e gráfica original, promovendo a substituição de Os primeiros livros impressos por Gutenberg, entre 1442 e 1455, formam cerca de 100 exemplares da Bíblia. 84 92 caracteres manuscritos por caracteres impressos, bem como o desenvolvimento de abreviaturas e a normalização da capitalização que nada mais são do que processos de transliteração, cujo resultado inevitável e efetivo dá-se na transferência de um código de escrita para outro, segundo os autores, baseado em regras e convenções distintas. Conforme se lê em Man (2004, p.250), a imprensa foi vista inicialmente pelo catolicismo como uma dádiva divina85, mas logo depois assumiu contornos satânicos. Ainda: no Islã, cuja tradição védica acredita que “a verdade está presa a palavras vivas de pessoas autênticas”, a imprensa foi satânica durante quatrocentos anos, até que um perigo maior a relegou a uma posição inferior. Para os muçulmanos, segundo Robinson (APUD MAN 2004, p.251) a impressão “atacava aquilo que tornava o conhecimento algo digno de confiança, o que dava a ele valor e autoridade. Desta forma, toda a autoridade desaparece, e a vontade de Deus torna-se indeterminada, já que não há a transmissão autorizada nem a memória. Na expressão de Lutero, a imprensa era ”o mais alto e mais extremista ato da graça de Deus, por onde a tarefa do Evangelho é levada adiante”. John Foxe (Livros dos Mártires, 1563) fez o seguinte comentário acerca da escrita: “Para dominar seu exaltado adversário, o Senhor começou a trabalhar para Sua Igreja não com a espada e o escudo, mas com a impressão, a escrita e a leitura. Se o papa não abolir o conhecimento e a imprensa, a imprensa pode em curto tempo expulsá-lo”. Ao contrário do que se poderia imaginar, o impresso não surgiu com sua personalidade própria. Martins (1996, p. 167) assegura que o “texto” impresso procurou instintivamente continuar o manuscrito, em vez de substituílo. E acrescenta: a imprensa não só imita o mais fielmente possível o manuscrito, como também tentou uma conciliação impossível com o copista manual. Segundo Horcades (2004), os grandes incentivadores da criação de livros foram os reis e a Igreja. Esta, para que suas doutrinas e fundamentos ficassem impressos a fim de propagarem a prática religiosa. Aqueles, para terem seus nomes registrados e documentados, dando continuidade no poder aos seus descendentes. 85 93 Ainda segundo o autor (1996, p.168), o próprio tipo de impressão era fundido em moldes que imitavam os caracteres manuscritos, embora alcançassem uma regularidade natural que permitia distingui-los das letras traçadas à mão. Destacamos na cultura gráfica as escritas dos poderes – monárquico, eclesiástico e municipal – cuja produção engloba registros ou recenseamentos, e também cartazes colocados nas portas das igrejas; e os escritos do cotidiano e do privado, contendo livros de contas, de razão, cartas, bilhetes etc (GOMEZ, 1998). A história das relações entre manuscrito e impresso incluem também as anotações marginais de textos manuscritos em obras impressas, especificamente no século XVI. Tais anotações dizem respeito, principalmente, às anotações de professores e estudantes, às dos eruditos e, também, dos profissionais, dentre eles médicos e cirurgiões (CHARTIER, 2002, p.94-95). Além dessas anotações marginais, no século XVIII, os objetos impressos destinados a sujeitar e acolher a escrita manuscrita daqueles que a utilizam têm multiplicadas as suas cópias pelas práticas editoriais. Exemplo disso são os almanaques ingleses ou as agendas italianas, que traziam ambos folhas em branco para que seus usuários ali pudessem expressar suas reações e anotar seus afazeres (BRAIDA, 1998). Vale ressaltar que a imitação dos manuscritos pelos impressos se estende, segundo Svend Dahl (1933), a pormenores de ordem material ou circunstancial que não mais se justificavam no momento em que a imprensa e o papel vinham automaticamente resolver os problemas que os tinham provocado. Essa imitação, conforme encontramos em Martins (1996, p.174), é explicável a partir de duas circunstâncias diferentes: a primeira, de ordem psicológica, consiste no fato de que dificilmente o homem inventa qualquer coisa de inteiramente novo. Ainda segundo o autor, as invenções são apenas transformações ou aperfeiçoamento de coisas anteriormente conhecidas. Essas influências são observadas nos primeiros impressos, onde a permanência dos caracteres materiais do manuscrito é prolongada até que a 94 nova invenção se desse conta das enganadoras similitudes que a prendiam ao manuscrito. A segunda circunstância, desta vez de ordem econômica, é que os manuscritos ganharam, nos primeiros tempos, um extraordinário prestígio, passando a gozar da mesma consideração de que tinham usufruído os rolos de papiro em face dos primeiros livros de pergaminho, ou, nos tempos modernos, os livros feitos em prensa manual diante dos que são compostos à máquina. A imitação resultou, então, em grande parte, do favor alcançado pelo manuscrito na concorrência com os primeiros impressos. Na verdade, temos hibridações das diferentes formas do escrito, como observa Chartier (2002, p.83). Ou seja, havia manuscritos copiados a partir de uma obra impressa como também impressos que continham formulários cujos espaços em branco deviam ser preenchidos à mão. Segundo o autor, exemplos desses objetos mistos eram, na Espanha de Felipe II, os questionários enviados aos corregedores a fim de colher as informações necessárias para as Relaciones Geográficas e, em várias dioceses do Sul da França, as certidões de casamento utilizadas nos séculos XVI e XVII, conforme ritual ali praticado. Quanto às intervenções manuscritas no original, essas dizem respeito às formas gráficas, às convenções ortográficas, à pontuação ou à própria organização do texto, buscando normalizar a língua impressa e, conseqüentemente, assegurar uma maior correção às edições (TROVATO, 1991 e 1998; RICHARDSON, 1994). Exemplo disso, portanto das relações entre manuscrito e impresso, pode ser visto em um exemplar da edição de 1676 de Hamlet, em 1740, quando da substituição na pontuação impressa do texto, feita pelo ator que desempenhava o papel de Hamlet, por uma pontuação manuscrita totalmente diferente da primeira, considerada rudimentar. Segundo Chartier (2002, p.99100), tal substituição trouxe uma verdadeira interpretação do texto. 95 3.3 O eletrônico Vimos até agora as mudanças causadas com a grande revolução do livro, desde a passagem do papiro ao pergaminho até a invenção de Gutenberg. Passemos, pois, às transformações/revoluções promovidas pela informática. A primeira colocação a ser feita aqui é a distinção entre texto eletrônico e hipertexto. Para tanto, adotamos a visão de Antonio Carlos Xavier (2002), em sua tese de doutorado O Hipertexto na Sociedade da Informação: A Constituição do Modo de Enunciação Digital, na qual ele afirma que: Texto eletrônico não é necessariamente Hipertexto. Um texto que exista originalmente em celulose, uma vez transportado para superfície digital, não passa a ser automaticamente um Hipertexto. Antes se transforma em um texto eletrônico, i.e., o texto impresso disponível na Web por programas que o codificam em linguagem html. Uma vez incluso na rede mundial, dotado de hiperlinks e acrescido de outros modos enunciativos (ícones, imagens, som) aquele texto inicialmente impresso passa a ser, então, um Hipertexto. Segundo Cavalcante (2004, p.164), o termo hipertexto surgiu em meados dos anos 60 criado por Theodore Nelson para exprimir a idéia de escrita/leitura não linear em um sistema de informática. Para a autora, a história do hipertexto apresenta dois momentos: a primeira e a segunda geração. O primeiro momento, situado em meados da década de cinqüenta, visa ao acúmulo de informações; o segundo momento, compreendido em meados da década de oitenta86, busca a incorporação de recursos hipermidiáticos a estes sistemas e à popularização da informática e da Internet. Em Leitura, texto e hipertexto, Antonio Carlos Xavier (2004, p.171) define hipertexto como Uma forma híbrida, dinâmica e flexível de linguagem que dialoga com outras interfaces semióticas, adiciona e acondiciona à sua superfície formas outras de textualidade. 86 A fim de sermos mais precisos, informamos que foi em 1991 que Tim Banmer Lee inventou o navegador para web, tornando a relação PC X usuário mais amistosa. 96 Na opinião do autor, “o hipertexto exige do seu usuário muito mais que mera decodificação das palavras que flutuam sobre a realidade imediata”. Na visão dele, “o hipertexto reúne condições físicas de materializar a proposta paulofreiriana até às últimas conseqüências”. Em artigo intitulado A escrita e seus dispositivos, disposto no site www.educ.fc.ul.pt, afirma-se que “a ruptura que o texto digital traz à escrita apresenta-se como sendo a sua própria libertação relativamente descentrada e heterogênea”. A autora desse artigo cita Pierre Lévy para afirmar que o novo dispositivo determina uma escrita diferente, descentrada e heterogênea. Contudo, diz Lévy, há um “inexistente impacto da tecnologia”, visto que uma visão do hipertexto eletrônico já havia sido apresentada de forma embrionária em ensaios anteriores. Em entrevista concedida ao Jornal do Brasil87, Chartier afirma que as coisas não mudaram muito depois de Gutemberg: a idéia de um livro com páginas, numeração, índice, capa, surgiu com a primeira revolução – da passagem do rolo ao códex - , libertando o leitor para escrever ao mesmo tempo em que lê, fato impossível quando se segurava o rolo com as duas mãos. Para este historiador francês, as principais mudanças trazidas pelo computador se resumem a três, quais sejam: a leitura descontínua, a leitura hipertextual e a leitura tematizada. Na tela do computador se organiza geralmente a partir de temas. Os textos eletrônicos são consultados mais como banco de dados do que como obra. Com isso, há uma tendência à fragmentação, porque perde-se a referência à obra completa, como início, meio e fim. Outra coisa interessante desse suporte é o hipertexto, que oferece a oportunidade para o leitor de romper com a ordem seqüencial do texto impresso e praticar uma leitura particular, que continuamente introduz textos dentro de outros textos. Acerca da leitura descontínua que o hipertexto apresenta, Xavier (2004, p.174-175) faz o seguinte comentário: “a inovação trazida pelo texto eletrônico 87 www.jb.com.br (jbonline.terra.com.br/destaques/bienal/entrevista). 97 está em transformar a deslinearização88, a ausência de um foco dominante de leitura, em princípio básico de sua construção”. O hipertexto não é particularmente novo. A invenção do conceito é atribuída a Vannevar Bush, que nos anos cinqüenta propôs uma máquina Memex89, cujas informações científicas poderiam ser procuradas de forma hipertextual. O hipertexto é uma espécie de texto multi-dimensional no qual trechos de texto se intercalam com referências a outras páginas. O texto digital desencarna o texto para promover uma escrita virtual, liberta de todos os constrangimentos de clausura e sucessividade90, ao contrário do que faz o livro. No site www.onlinebook.com afirma-se que o texto eletrônico deu forma nova às histórias contadas, colocando nelas imagens, cores, sons e até viagens paralelas através dos links. Ao contrário de muitos que se mostram hostis aos meios eletrônicos, o site apresenta uma lista contendo inúmeras vantagens que surgiram com o texto digital: • O leitor tem condições de ampliar o tamanho da letra (utilizando a ferramenta tamanho da fonte); • Pode fazer anotações ao longo do texto; • Aumenta a velocidade de circulação da informação; • Dá retorno mais rápido (podendo ser enviado por e-mail, por exemplo) e • Possui maior alcance, chegando aonde não existem livrarias, democratizando a informação. Segundo o referido site, por ser distribuído em formato digital, o texto eletrônico não tem custo de impressão, distribuição e, acima de tudo, o risco de ficar mofando nas prateleiras das livrarias. Segundo Xavier (op.cit.), dizer que o hipertexto é deslinearizado não equivale a dizer que ele seja um conjunto de enunciados justapostos aleatoriamente, um mosaico de frases randômicas. O que o hipertexto ou qualquer outro tipo de texto não pode é subverter os níveis de organização das línguas naturais (sintaxe, semântica, pragmática). 89 Em 1598, Agostino Ramelli apresentou uma roda de livros, denominada nora, onde cada calha contém um livro aberto. Desta forma, o leitor pode passar rapidamente de um texto a outro com a ajuda de engrenagens descritas com detalhe por Ramelli. 90 www.educ.fc.ul.pt (Acessado em março de 2005). 88 98 Após cinco séculos de hegemonia, a onipotência do papel está em xeque, segundo afirma Roman (2000). Para ele, o ano de 1976 marcou o início da era dos bits com o surgimento da Internet, permitindo-nos vivenciar uma nova revolução, na qual os átomos estão sendo substituídos pelos bits. Na visão de Roman (op.cit.), a função precípua do papel e da palavra escrita foi a de ampliar a capacidade de memorização. Atualmente, na era dos bits, essa função é feita com muito mais eficiência pelos discos rígidos dos computadores. Conforme lemos em Chartier (1999), o texto eletrônico foi capaz de realizar o sonho de universalidade dos saberes, das informações e dos julgamentos expressos no ideal de Kant: De que cada um fosse ao mesmo tempo leitor e autor, que emitisse juízos sobre as instituições de seu tempo, quaisquer que elas fossem e que ao mesmo tempo, pudesse refletir sobre o juízo emitido pelos outros. Chartier afirma também que algumas idéias pensadas pelo filósofo francês Condorcet, no século XVIII, foram reintroduzidas com o surgimento do texto eletrônico: uma língua de signos, de métodos que permitissem captar a relação entre os objetos e as operações do conhecimento. No dizer de Manguel (1997), no texto eletrônico91, temos apenas uma transposição do livro para a tela onde, semelhantemente aos rolos de papiro, precisamos rolar o texto, sugerindo uma leitura linear do texto. Segundo Calvino (1988), os livros não vão desaparecer, mas a informação que contêm começa a ter seu suporte alterado, o que requer um novo tipo de autor, leitor e linguagem apropriados. Também Xavier (op.cit.) afirma que, embora o hipertexto seja dotado da economia de escrita/leitura revolucionária, não tem por usurpação o lugar e a relevância do livro impresso. Autores como McLuham (1967), Eisentsein (1979), Landow (1992) afirmam que estamos vivendo apenas não uma revolução mas uma evolução, que teve início com a transição do manuscrito para o impresso e, atualmente, a passagem do impresso para o digital. 91 Essa afirmação não pode ser aplicada ao hipertexto. 99 Segundo Levacov afirma em seu artigo Os novos paradigmas do texto eletrônico92, o mundo de Gutenberg encontra-se em colapso. A tecnologia industrial da impressão está cedendo lugar para as novas tecnologias e formas de comunicação, afetando nossa relação com a informação e com o próprio texto. Para a autora, todos os tipos de trabalhos – que lidam com dados simbólicos, textuais, numéricos, visuais e auditivos – têm de adequar-se ao texto digital. Face a essas mudanças sociais e culturais trazidas com o desenvolvimento mais amplo e rápido da comunicação a distância, propiciadas pelas redes eletrônicas, Santaella (2001) propõe três tipos de leitor93: • o contemplativo: leitor de livros. Aquele que se retira para o gabinete para o ato da leitura, comumente representado nas pinturas do século XVII e XVIII; • o movente: leitor do jornal, da revista, do folhetim...que lê na rua, no ônibus, no metrô..., o típico leitor das metrópoles aceleradas; • o imersivo: o leitor do nosso tempo, da sociedade da informação, assim denominado por seus profundos mergulhos no mar dos hipertextos e hipermídias presentes nas páginas da Web. Chartier (2000) considera plenamente justificável a coexistência de múltiplos leitores, afinal, novas tecnologias estão transformando o meio de produção dos livros e de reprodução dos textos, modificando conseqüentemente a relação dos leitores com a cultura escrita, desde a Antiguidade até os textos eletrônicos deste século. Exemplo disso foi poeticamente colocado por Xavier (op.cit.): assim como no período das grandes navegações as naus e esquadras tomavam, às vezes, destinos inesperados causados por fenômenos climáticos nos oceanos durante a viagem, os hiperlinks funcionam como fenômenos da natureza do 92 www.facom.ufba.br/ A definição do que seja um leitor eficiente, que pode circular com tranqüilidade no mundo da escrita, muda necessariamente à medida que a presença da escrita é cada vez mais intensa na sociedade (FERREIRO, 2001). 93 100 hipertexto que podem ser controlados- não acionados – pelos hipernavegadores. As mudanças ocorridas no meio social e nos suportes em que os textos são dados exercem diretamente influências no ato da leitura, o que nos leva a reformular alguns conceitos até então cristalizados, entre eles o de leitura e de texto94. Assim, a leitura tem sua atuação ampliada do campo verbal para outros campos: visual, sonoro, plástico; passando a ser um processo associativo que promove a interação escrita e imagem (MACHADO, 1999). Desta forma, os avanços das tecnologias midiáticas e hipermidiáticas levam-nos à emergência de três olhares conflituosos em relação à revolução do texto eletrônico, a saber: • O olhar dos apocalípticos: os quais profetizam a extinção do livro e, conseqüentemente, das práticas leitoras do texto impresso; • O olhar dos otimistas: aqueles que acreditam na perpetuação do livro apesar dos significativos avanços das tecnologias midiáticas e hipermidiáticas; • O olhar daqueles que não acreditam nem na hegemonia dos livros em relação às mídias e hipermídias, nem na extinção desses causada pela supremacia dessas tecnologias. Ao que nos parece, nos próximos decênios teremos a coexistência, nas palavras de Chartier (1997), entre as duas formas do livro – o eletrônico e o impresso – e os três modos de inscrição e de comunicação de textos: o manuscrito, o impresso e o eletrônico. Para o autor, o fato de cada forma de publicação de texto escrito corresponder a expectativas e usos específicos assegura-nos, provavelmente, as diferentes modalidades de transmissão da escrita. Assim sendo, salienta 94 Na era da informação tudo é texto. Um slogan político ou publicitário, um anúncio visual sem nenhuma palavra, uma canção, um filme, um gráfico, um discurso oral que nunca foi escrito, enfim, os mais variados arranjos organizados para informar, comunicar, veicular sentidos são texto. O texto não é, pois, exclusividade da palavra (MACHADO, 1999). 101 ele, uma história de longa duração do livro só pode ser uma história da cultura escrita em suas diferentes materialidades e usos. Graças aos novos instrumentos eletrônicos, afirma Siano (1990), as fronteiras entre realidade e interioridade são abatidas. Besen (2002), citando Chartier, diz que este detecta três tipos de ruptura promovidas pelo texto eletrônico: 1. Livros, revistas, jornais, cada um destes suportes possui seu caráter específico. Com o texto eletrônico, diversas classes de texto são lidas em um mesmo suporte; 2. Com o texto eletrônico, o leitor pode consultar não só textos, mas também imagens e som. Além de ter acesso aos documentos utilizados pelos pesquisadores; 3. A questão do copyright, do direito autoral, é bastante afetada. O texto passa a ser móvel, o leitor pode intervir, recortar etc. Para Besen (2002), os textos tradicionais são obras singulares, enquanto o texto eletrônico é instável. Na opinião de Chartier, a realidade virtual é apenas mais um passo na história da escrita e não sinônimo do fim do livro ou da literatura95. Dessa forma, o discurso desse autor caracteriza-se pela cientificidade, sendo isento de visões catastróficas ou utópicas. Bagno (2002, p.33-34) diz que “a comunicação eletrônica via Internet vem tornando cada vez mais difícil a delimitação entre o que, tradicionalmente, só era admitido na língua falada e o que era cobrado na língua escrita”. Na visão do autor, há uma mescla cada vez maior entre os gêneros textuais, além da proliferação de novos gêneros. Para esse autor, o advento do processador de textos aboliu a relativa estabilidade de um registro escrito tradicional, cedendo lugar a uma exibição dinâmica na tela, na qual o texto escrito pode ser editado, revisado, reformatado ou deletado, com grande facilidade, sem deixar nenhum vestígio de qualquer alteração. No ponto de vista de Bagno: 95 MELLO, Eunnice Homem de. Navegar é preciso: Ler também é preciso. 2003. 102 O conceito de texto escrito se torna profundamente diferente: ele é somente uma dentre uma série de transformações, algumas das quais podem ser executadas automaticamente por ferramentas de autocorreção ou por verificadores ortográficos. Esse autor diz ainda que é preciso estudar detalhadamente os efeitos que essas mudanças tecnológicas trazem para os aprendizes, bem como as transformações que incidem sobre as formas e usos dos textos escritos. Em suma: embora não existam indícios suficientes que comprovem o desaparecimento do papel (enquanto suporte) do meio da sociedade contemporânea, é certo que a nossa relação com ele, muito em breve, terá mudanças irreversíveis. Vimos, pois, o surgimento das abreviações nos textos manuscritos, sua conservação nos textos impressos e, finalmente, sua propagação nos textos digitais, atuais divulgadores desse tipo de redução da língua. 103 CAPÍTULO 4 A ABREVIAÇÃO E OS GÊNEROS TEXTUAIS: da carta ao e-mail 4.1 Origem do termo Etimologicamente, o termo gênero vem do latim gnus, ris ‘nascimento, descendência, origem, raça, tronco; descendente, rebento, filho’. Derivado do grego génos, eos ‘id.’; provavelmente esse vocábulo, em português e em espanhol, como julga Corominas, terá como étimo o plural genra, que, posteriormente, ao se tornar singular, é tomado como de 2ª declinação *genrum (HOUAISS, 2002) . 4.1.2 Tipo Textual X Gênero Textual Face à confusão entre uso e definição dos termos tipo textual e gênero textual, vimos como relevante, antes de discorrermos sobre o tema propriamente dito, apresentar uma definição concisa e clara, capaz de mostrar as diferenças com nitidez. Para tanto, baseamo-nos em autores como Douglas Biber (1988), John Swales (1990), Jean-Michel Adam (1990), Jean Paul Bronckart (1999) e Marcuschi (2002), que defendem posição similar à por nós adotada. • Tipo textual designa uma espécie de construção teórica definida pela natureza lingüística de sua composição. Ou seja, abrange um conjunto limitado 104 de categorias teóricas determinadas por aspectos lexicais, sintáticos, relações lógicas, tempo verbal. Em geral, abrangem categorias do tipo: narração, argumentação, exposição, descrição e injunção. • Gênero textual refere os textos materializados que encontramos em nossa vida diária e que apresentam características sócio-comunicativas determinadas pelo canal, estilo, conteúdo, composição e função. Ao contrário dos tipos textuais, os gêneros são praticamente ilimitados: carta comercial, carta pessoal, carta eletrônica, bate-papo virtual, bilhete, telefonema, entre outros. 4.1.3 Brevíssimo histórico Partindo do princípio de que a comunicação verbal supõe a existência de gêneros do discurso, e que estes são instrumentos para agir em situações de linguagem, faz-se necessária a análise de suas características no processo ensino/aprendizagem, servindo como instrumento para o leitor identificar e reconhecer a diversidade de textos com os quais tem contato, ampliando, assim, a capacidade de manejar toda a gama heterogênea dos gêneros do discurso, tanto orais quanto escritos. Desde Platão e Aristóteles, é possível observar um interesse pela noção de gênero: primeiro, quando da distinção entre poesia e prosa; depois, com a diferença entre lírico, épico e dramático; por último, com a oposição feita entre tragédia e comédia (BRANDÃO, 2001, p. 257). Segundo a autora, a classificação dos discursos também é um legado da Retórica Antiga, que reconhecia nesses três tipos: o deliberativo, dirigido a um auditório a quem se aconselha ou dissuade; o judiciário, no qual o orador acusa ou se defende; e o epidítico, cujo discurso elogia ou repreende os atos do cidadão. Assim, o estudo dos gêneros, longe de ser algo novo e atual, surgiu entre os antigos e vem sendo retomado com força total desde os anos 60, junto com a Lingüística de Texto, a Análise Conversacional e a Análise do Discurso 105 (MARCUSCHI, 2002, p.3). A inovação, segundo Tomachevski (1965), é substituir a classificação lógica por uma classificação pragmática e utilitária que leve em conta unicamente a distribuição do material nos quadros definidos, já que a distinção é sempre histórica, justificada para um dado tempo. O critério de classificação nos é tão intrínseco e necessário que, sem ele, nossa apreensão dos enunciados produzidos seria provavelmente prejudicada, ficando submersos pela diversidade absoluta, frente à impressão caótica que as regularidades sintáticas certamente não compensariam (ADAM, 1990). Como afirma Bakhtin (1992, p.302), a comunicação verbal seria quase impossível se não existissem os gêneros do discurso e se não os dominássemos, ou se tivéssemos de criá-los pela primeira vez no processo da fala; ou ainda se tivéssemos de construir cada um de nossos enunciados. Entretanto, sabemos que cada esfera de utilização da língua elabora tipos relativamente estáveis, sendo a adoção de um gênero de discurso uma escolha determinada em função da especificidade de uma esfera dada da troca verbal, como salienta o autor. Para ele, desde o início somos sensíveis ao todo discursivo, aprendendo a moldar nossa fala às formas do gênero e, ao ouvir a fala do outro, sabendo de imediato, bem nas primeiras palavras, pressentir o gênero, adivinhar o volume (a extensão aproximada do todo discursivo), a dada estrutura composicional, prever o fim. É com Bakhtin também que encontramos a distinção entre os gêneros de discursos primários (simples) e gêneros de discursos secundários (complexos). Os primeiros (conversa de salão, conversa sobre temas cotidianos ou estéticos, carta, diário íntimo, bilhete etc.) constituídos pelos da vida cotidiana, mantêm uma relação imediata com as situações nas quais são produzidos; os segundos (romance, editorial, tese, palestra, anúncio, livro didático etc.) presentes nas circunstâncias de uma troca cultural mais complexa e relativamente mais evoluída, repousam sobre instituições sociais e tendem a explorar e a recuperar os discursos primários. Para Schneuwly (1993), que retoma os conceitos de gêneros primários e secundários formulados por Bakhtin, aqueles são espontâneos, enquanto esses, não. 106 Em meio à heterogeneidade dos textos com os quais nos defrontamos no campo da linguagem, afirma Brandão (2001), torna-se necessária sua identificação, organização e ordenação visando a um melhor entendimento, donde a adoção gêneros de discurso que correspondam às necessidades peculiares das mais variadas situações de interação social. Para Charles Bazerman (2005), a maioria dos gêneros tem características de fácil reconhecimento que sinalizam a espécie de texto que são. Segundo ele, essas características estão intimamente relacionadas com as funções principais ou atividades realizadas pelo gênero. Convém lembrar que um gênero não é uma forma fixa, cristalizada de uma vez por todas e que, portanto, deve ser tratado como um bloco homogêneo. Ao contrário, os gêneros do discurso, como afirma Bakhtin (1992), se comparados às formas da língua, são muito mais mutáveis, flexíveis. Os gêneros são marcados pela heterogeneidade e pela interdiscursividade, não são categorias taxonômicas para identificar realidades estanques (MARCUSCHI, 2002, p.3). Para Bronckart (2000), qualquer espécie de texto pode atualmente ser designada em termos de gênero e que, portanto, todo exemplar de texto observável pode ser considerado como pertencente a um determinado gênero. Segundo o autor, os gêneros são instrumentos de adaptação e participação na vida social e comunicativa, o que torna interessante o trabalho com eles. Afinal, como observa Bakhtin (1992), ao falarmos, servimo-nos sempre dos gêneros do discurso. Bazerman (2005) afirma que para chegarmos a uma compreensão mais profunda de gêneros precisamos compreendê-los como fenômenos de reconhecimento psicossocial que são parte de processos de atividades socialmente organizadas. Segundo o autor, “gêneros são tão-somente os tipos que as pessoas reconhecem como sendo usados por elas próprias e pelos outros”. Mais: “gêneros são o que nós acreditamos que eles sejam, isto é, são fatos sociais sobre os tipos de atos de fala que as pessoas podem realizar e sobre os modos como elas os realizam”. Na opinião dele, “os gêneros emergem nos processos sociais em que pessoas tentam compreender umas 107 às outras suficientemente bem para coordenar atividades e compartilhar significados com vistas a seus propósitos práticos”. Por fim, Oliveira e Paiva (op.cit) define gêneros como sistemas discursivos complexos, socialmente construídos pela linguagem, com padrões de organização facilmente identificáveis, dentro de um continuum de oralidade e escrita, configurados pelo contexto socio-histórico que engendra as atividades comunicativas. 4.2 Gêneros emergentes x gêneros preexistentes Neste tópico apresentaremos os gêneros em estudo, quais sejam, carta, diário, blog, e-mail e SMS, suas respectivas definições, origens, características, classificações e funções, a fim de melhor entendermos a relação entre eles e o uso das abreviações. São várias as polêmicas que giram em torno da originalidade, fascínio e função dos gêneros emergentes no meio digital, dentre eles o e-mail e o blog. Parte delas parece estar ligada ao fato de ser necessário rever conceitos tradicionais, bem como repensar a relação com a oralidade e a escrita, já que, ao que parece, pela importância dada à introdução da escrita eletrônica, estamos caminhando em direção a uma cultura eletrônica. Por depender totalmente da escrita, esta se torna aspecto central da tecnologia digital, apesar da integração, nesse meio, de imagens e som. São várias as formas textuais advindas da escrita eletrônica, que tendem a certa informalidade e a uma menor monitoração e cobrança pela fluidez do meio e pela rapidez do tempo (MARCUSCHI, 2002, p.12). Alguns dos gêneros virtuais nos permitem observar, na expressão de Crystal (2001, p.170), a linguagem em seu estado mais primitivo; como também a notável versatilidade lingüística visível entre as pessoas comuns, particularmente os jovens. O que há são estratégias da língua falada nessas novas formas de escrita, dentre elas a produção de enunciados mais curtos. Esse fato faz da escrita digital uma escrita mais amigável e mais próxima da fala, o que permite 108 uma maior interação entre fala e escrita. Na visão de Crystal (2005, p.90), a comunicação mediada por computador não é idêntica à fala ou à escrita, mas exibe certas propriedades seletivas e adaptáveis presentes em ambas. Para ele, temos não uma linguagem falada que foi escrita, mas uma linguagem escrita que foi empurrada em direção à fala, conforme vimos no Capítulo 1. No que tange às abreviações, a escrita em alguns gêneros faz largo uso delas, sendo boa parte artificial, e por isso passageira. Outras, se firmam e vão sendo reconhecidas como próprias do meio, segundo Marcuschi (2001, p. 35). Na opinião de Halliday (1996, p. 354), o impacto das novas formas de tecnologia está desconstruindo toda a oposição entre fala e escrita, visto que nos gêneros do meio virtual a escrita se dá numa certa combinação com a fala, manifestando, na expressão de Marcuschi (2001, p.36), um hibridismo ainda não bem conhecido. Para esse autor, está se constituindo um novo formato de escrita numa relação mais íntima com a oralidade do que a existente. Conforme aludido anteriormente, faremos a exposição dos gêneros aqui analisados, iniciando com a origem de cada um, sua definição, classificação e breve histórico, a fim de nos familiarizarmos e melhor entendermos a função deles na sociedade e na nossa vida. 4.2.1 O gênero carta 4.2.1.1 Definição96 Empréstimo antigo e latinizado do grego Khárt‘s, o termo carta s.f.(1254 cf.IVPM), charta97, ae ou carta, ae, ‘folha de papiro preparada para receber a escrita; folha de papel (feito antigamente da entrecasca do papiro)’, significa mensagem, manuscrita ou impressa, a uma pessoa ou a uma 96 O gênero carta surgiu como carta comercial no início do século XVII e só após os meados daquele século se tornou privado (MARCUSCHI, 2004). 97 Carta ou charta tinha o caráter de documento e ganhou difusão na Idade Média (PESSOA, 2002). 109 organização, para comunicar-lhe algo 2 p.ext. tal mensagem, fechada num envelope, geralmente endereçado e freqüentemente selado 3 m.q. DIPLOMA (‘documento oficial’) 4 JUR documento, título probatório ou aquisitivo de direitos <c. de crédito> 5 documento (título, atestado, autorização) passado por autoridades civis, militares etc. <c. de recomendação> 6 SP carteira de motorista (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa). 4.2.1.2 Classificação Ainda em Houaiss (op.cit.) são registradas várias locuções do vocábulo carta, por nós aqui apresentadas em forma de classificação98, a saber: • Carta aberta: carta que se dirige publicamente a alguém através dos órgãos de imprensa; • Carta avocatória: JUR ordem de juiz de instância superior para que o de instância inferior lhe remeta os autos do processo; • Carta batimétrica: CART mapa em que o fundo do mar é representado por curvas contínuas de profundidade; • Carta branca: 1 carta de baralho sem figura 2 autorização que se confere a alguém para agir do modo que julgue melhor; plenos poderes; • Carta celeste: ASTR representação, em superfície plana, de determinada região da esfera celeste; • Carta circular: a que é endereçada, simultaneamente, a vários destinatários; • Carta citatória: JUR P mandado de citação; • Carta comendatícia: ECLES ver COMENDATÍCIA; • Carta constitucional: JUR m.q. CONSTITUIÇÃO; • Carta credencial: DIPL carta de um governo soberano a outro que apresenta um diplomata que o representará; • Carta de á-bê-cê: m.q. CARTA DO ABC; • Carta de abono: JUR 1 documento de garantia da solvabilidade de alguém até certo limite 2 a que atesta a idoneidade de uma pessoa; • Carta de adjudicação: JUR documento que assegura judicialmente a transferência dos bens adjudicados ao adjudicatário; 98 Embora seja extensa a lista, a finalidade da mesma é tornar pública a variedade desse gênero para todos quantos desejarem saber. 110 • Carta de aforamento: JUR escritura pela qual se constitui a enfiteuse; carta de foro; • Carta de afretamento: MAR m.q. CARTA PARTIDA; • Carta de alforria: HIST documento que concedia liberdade ao escravo; • Carta de arrematação: título de propriedade que recebe o rematante de bens vendidos em leilão; • Carta de condução: P carteira de motorista; • Carta de correntes: CART mapa que delineia as direções, extensões e velocidades das correntes oceânicas; • Carta de corso: JUR MAR ant. m.q.CARTA DE MARCA; • Carta de crédito: ECON JUR autorização de um banqueiro ou comerciante a seu correspondente, para que ponha a disposição de um terceiro determinada soma de dinheiro dentro de certo prazo; • Carta de emancipação: JUR título de aquisição de capacidade civil plena antes de completada a maioridade (21 anos); • Carta de fiança: JUR documento no qual alguém se obriga solidariamente pelo pagamento de dívida ou obrigação de outrem; • Carta de foro: JUR m.q. CARTA DE AFORAMENTO; • Carta de instrução: MAR documento especial do Estado Maior da Armada, ou de comandante de teatro marítimo de operações, que fixa missão e garante iniciativa a oficial subordinado; • Carta de marca: JUR MAR ant.autorização escrita dada por Estado beligerante para que particulares armem seus navios por sua conta e ataquem o inimigo; carta de corso, licença de corso; • Carta de marear: CART MAR ant.m.q. CARTA NÁUTICA; • Carta de Mercator: CART m.q. CARTA REDUZIDA; • Carta de navegação: CART MAR m.q. CARTA NÁUTICA; • Carta de partilha: JUR carta ou título expedido aos herdeiros, para haveres do casal ou herança jacente à parte que lhes pertence; formal de partilha; • Carta de piloto: MAR documento que autoriza alguém a exercer as funções de piloto do navio; • Carta de prego: MAR carta fechada que, contendo determinações, é entregue ao comandante de um navio e só deve ser aberta por ele em momento determinado durante a viagem; • Carta de privilégio: JUR documento que outorga um privilégio ou uma concessão; • Carta de reconhecimento: CART a que é elaborada a partir de reconhecimentos topográficos, sem muita precisão; • Carta de saúde: MAR ant.documento que, passado a um navio, declara o estado sanitário do porto de partida; 111 • Carta de ventos: CART mapa no qual se indicam os ventos predominantes e os dias em que sopram ou outros, com previsões que cobrem períodos que vão de alguns meses a um ano; • Carta de vinhos: relação dos vinhos disponíveis num restaurante ou bar; • Carta dimissória: ECLES carta em que um prelado autoriza outro a conferir ordens sacras a um seu diocesano; letra dimissória _tb. se diz apenas dimissória; • Carta do abc: livro em que se aprendem as primeiras noções de leitura; carta de á-bê-cê, cartilha; • Carta estratégica: MAR MIL mapa ou carta geográfica us. para estudo e solução de problemas estratégicos; • Carta fora do baralho: fig. pessoa que perdeu sua força, influência ou prestígio; • Carta geográfica: CART GEO representação plana da distribuição dos fenômenos geográficos na superfície da Terra; mapa; • Carta geológica: CART GEOL representação espacial de informações geológicas, como rochas, estruturas, depósitos minerais e localidades fossilíferas, feita nos cortes cartográficos do padrão internacional; • Carta geral: MAR mapa que abrange grande extensão da superfície terrestre (um continente, um oceano etc.); • Carta hidrográfica: CART MAR representação de região hidrográfica, indicando costas, ilhas, baixios, correntezas etc. importantes para a navegação; • Carta isófota: ASTR carta de uma região do céu com indicação das isófotas; • Carta magna: JUR m.q. CONSTITUIÇÃO; • Carta náutica: CART MAR mapa elaborado para navegação, contendo geralmente maior parte de representação de trechos de mar do que de terra; carta de navegação; • Carta orobatimétrica: CART OCN mapa que representa o relevo submarino; • carta partida: MAR documento de contrato de fretamento de navio mercante; carta de afretamento [Antigamente rasgava-se o documento em duas metades, cada uma ficando com uma das partes contratantes, unindo-se apenas no fim da viagem.] • Carta patente: 1 JUR carta representada pelo título de privilégio de invenção. cf. carta de privilégio 2 JUR título oficial de uma concessão de privilégio para o funcionamento de bancos, companhias de seguros, financeiras etc. 3 MIL documento em que se define, para o oficial das forças armadas seu posto na hierarquia e o quadro a que pertence. • Carta plana: CART carta em que as medidas dos graus dos paralelos extremos são iguais às do paralelo médio. • Carta polar: CART carta em que o círculo máximo tangencia um dos pólos da Terra. 112 • Carta precatória: JUR carta que um juiz dirige a outro, de circunscrição diferente, para que este faça inquirição de testemunha, citação ou outros atos jurídicos necessários para que o primeiro juiz tenha condições de julgar. tb. se diz apenas precatória. • Carta reduzida: CART carta semelhante à carta plana, mas onde os paralelos se afastam à medida que a latitude aumenta; carta de Mercator. • Carta régia: carta que, sem passar pela chancelaria (‘ministério’), um monarca dirige diretamente a uma autoridade. • Carta revocatória ou revogatória: DIPL JUR carta enviada de um governo a outro, encerrando a missão do diplomata que o representava. • Carta rogatória: 1 JUR carta em que se faz a requisição de atos processuais que devem ser realizados em território estrangeiro 2 JUR carta enviada de um país para outro (ger. por via diplomática), solicitando o cumprimento, no território deste último, de determinado ato 3 ECLES carta em que paroquianos de uma diocese pedem a sagração de um eclesiástico. tb. se diz apenas rogatória. • Carta rumada: MAR ant. carta em que os ventos são indicados a partir de um ponto central, para operações de tirar o rumo. • Carta sinóptica: MAR carta de previsão do tempo, em que se registram direção e força dos ventos, estado do mar, temperatura, umidade etc. • Carta testamentária: JUR instrumento que contém as disposições de última vontade, feitas por testamento cerrado ou particular. • Carta testemunhal: ECLES m.q. COMENDATÍCIA. • Carta topográfica: CART m.q. PLANTA TOPOGRÁFICA. Para Bazerman (2005), “à medida que mais temas e transações, de forma reconhecível, inserem-se nas cartas, o gênero, em si, se expande e especializa”. Segundo ele, dessa maneira é que tipos distintos de cartas se tornaram reconhecíveis e passaram a ser tratados diferentemente. Existem, também, vários subgêneros do gênero carta99: carta pedido, carta resposta, carta pessoal, carta do leitor e carta de opinião (CANESTRARO & OLIVEIRA, 2003). No nosso estudo, no entanto, restringiremos nossa análise aos subgêneros carta do leitor e carta pessoal. 99 Para Bazerman (2005), as cartas desempenharam um papel no surgimento de gêneros distintos: o primeiro artigo científico, a patente, o relatório dos acionistas, os relatórios internos das empresas e as formas de registros regularizando correspondências internas das empresas. 113 4.2.1.3 Visão panorâmica Em artigo intitulado Da carta a outros gêneros textuais, Pessoa (2002) afirma que a carta é um dos gêneros textuais mais importantes para a história das línguas. Segundo ele, as cartas eram utilizadas pelos letrados e estadistas, desde a Antiguidade, com o objetivo de se manterem informados. Bazerman (2005) afirma que as cartas precederam o aparecimento de documentos públicos mais visíveis, tais como cartazes, manifestos e panfletos sediciosos. Segundo esse autor, as cartas não somente forneceram o meio para o desenvolvimento de gêneros importantes do direito, do governo e da política, mas também dos vários instrumentos de dinheiro e crédito que medeiam os sistemas modernos bancários e financeiros. Para ele, o jornal, a revista científica e o romance, principais tipos de escrita que surgiram na cultura impressa, parecem ter alguma conexão com a carta. O gênero carta procura estabelecer uma comunicação por escrito com um destinatário ausente, identificado no texto por meio do cabeçalho100. A estrutura da carta reflete-se claramente em sua organização espacial: cabeçalho, que explicita local e data da produção, os dados do destinatário e a forma de tratamento empregada para estabelecer o contato; corpo, onde a mensagem e a despedida são desenvolvidas, incluindo saudação101 e assinatura102, que introduz o autor no texto. Também a escolha do estilo de escrita que será empregado nesse gênero é regida por alguns fatores como grau de familiaridade e papel social hierárquico entre os interlocutores. Ou seja, se o destinatário for um desconhecido ou uma pessoa que ocupa um nível superior, chefe ou diretor, o texto apresenta-se no estilo formal. 100 Conforme lemos em Canestraro & Oliveira (2003). A arte de escrever cartas enfatizou a saudação, identificando e conferindo respeito aos papéis sociais e às posições de emissor e receptor, colocando ambos dentro de relações sociais institucionalizadas (MURPHY APUD BAZERMAN, 2005). 102 Segundo Marcuschi (2002, p.30), um gênero pode não ter uma determinada propriedade e ainda continuar sendo aquele gênero. O autor dá o exemplo da carta pessoal, que continua sendo uma carta mesmo que a autora tenha esquecido de assinar o nome no final e só tenha dito no início: “querida mamãe”. 101 114 Tais afirmações corroboram a tese de que diz ser ‘a sintaxe de quem escreve sensível à proximidade psicológica do leitor103. Ou seja, um mesmo gênero (uma carta) pode estar sendo escrito para dois destinatários e a proximidade ou intimidade de quem vai receber a carta influi na forma lingüística em geral usada pelo seu autor. Dessa forma, quanto mais distante for o leitor pretendido, maior a complexidade sintática do texto escrito. Essa tese também é partilhada por Marcuschi (2002, p.20). Para ele, a variação na relação emissor-receptor, no caso de uma carta, pode interferir na seleção lexical: uma carta pessoal a um amigo versus uma circular a toda uma comunidade. Para Bazerman (2005), a carta, com sua comunicação direta entre dois indivíduos dentro de uma relação específica em circunstâncias específicas, parece ser um meio flexível no qual muitas das funções, relações e práticas institucionais podem se desenvolver. Segundo esse autor, a riqueza e a multiplicidade das práticas antigas de escrever cartas conferiram a esse gênero uma poderosa força comunicativa dentro da antiga Igreja cristã104. Em se tratando da tipologia, as cartas podem ser constituídas por diferentes tipos textuais: narração, argumentação, descrição, explicação e injunção, cujas funções de linguagem são diversas: expressiva, apelativa e informativa105. Bazerman (2005) afirma que até meados do século XX, nos Estados Unidos, os principais documentos de patentes mantiveram o formato de uma carta. Esse gênero permite ainda a concretização de atos de fala diversos, quais sejam: pedido, cobrança, intimação, prestação de contas, agradecimento, notícias de familiares, propaganda e outros, se diferenciando em intenções e formas de realização, circulando em diferentes áreas de atividades, com funções comunicativas várias. Quanto à escolha da pessoa do discurso – 1ª pessoa do singular, do plural ou 3ª pessoa -, esta varia de acordo com a intenção do autor, resguardando a especificidade do texto106. 103 Watson (apud MARTLEW, 1983). À medida que a Igreja se expandiu, unindo muitos povos, as cartas se tornaram importantes para manter a burocracia e os laços da comunidade (CONSTABLE APUD BAZERMAN, 2005). 105 Canestraro & Oliveira, 2003. 106 Canestraro & Oliveira, 2003. 104 115 Mesmo diante de tantas variações funcionais que são associadas ao gênero carta (carta de amor, carta comercial, carta de recomendação, cartas pessoais, convites, solicitações, cartas de reclamação), ‘o espaço interno da carta está aberto para os mais variados tipos de comunicação’107. Dessa forma, uma carta de amor pode conter uma recomendação; uma carta pessoal, um convite, e assim por diante. Conforme se lê em Paredes Silva (1996, p. 5), a configuração típica desse gênero textual é dada pelo formato externo108, que compreende cabeçalho, data, assinatura e algumas expressões formulaicas freqüentes em suas seções iniciais e finais. Uma carta pode ser escrita com vários propósitos e, também, alcançar o mesmo propósito utilizando diferentes meios, a saber: escolhas lexicais, variando de expressões formulaicas de polidez a modalizações, que abrangem atenuadores ou acentuadores da força ilocucionária (PAREDES SILVA, 1996). Tal visão está de acordo com o pensamento de Bakhtin (1992, p. 312), segundo o qual ‘selecionamos as palavras segundo as especificidades de um gênero’. Mais: ao escolher a palavra, partimos das intenções que presidem ao todo do nosso enunciado, e esse todo intencional é sempre expressivo (idem, ibidem). É com base nessa assertiva que iremos analisar o gênero carta e seus subgêneros carta de leitor e carta pessoal, bem como sua relação com o uso acentuado ou não das abreviações, a fim de sabermos se, de acordo com o estilo, informante e propósito comunicativo, o uso desse recurso de linguagem decresce ou não no referido gênero. 4.2.1.4 Cartas pessoais X cartas oficiais 107 Wilson, 2000. Para Bazerman (2005), mesmo um documento de significado legal geral como a Carta Magna (1215) segue os princípios da escrita de cartas, a começar pela saudação que define posições sociais e busca a boa vontade: “John, by the Grace of God, king of England, lord of Ireland...”. 108 116 Inicialmente, faz-se necessária a distinção entre dois tipos básicos de carta: a correspondência oficial e/ou comercial e a carta pessoal. Esta é por nós utilizada a fim de estabelecermos contato com parentes, amigos, namorados e outros. Nesse tipo de carta predomina o uso de uma linguagem mais distensa, menos elaborada, mais coloquial, uma vez que a relação que existe entre remetente e destinatário é de intimidade considerável. Outra marca desse tipo de carta é que aquele que a escreve, o remetente, é também quem a assina. Pessoa (2002) diz que no século XVI as cartas pessoais eram poucas, e guardavam um certo teor público. Segundo ele, na Antiguidade e na Idade Média a carta enquanto escrito espontâneo e de natureza pessoal não tinha essa denominação, havendo para esse fim o termo litterae, de tradição latina. Entretanto, afirma ele, no século XVIII ela ganha um novo significado, passando a se constituir numa espécie de telefone da época, revelando uma língua mais natural e mais próxima do cotidiano, influência direta do movimento romântico daquele período. Quanto às oficiais/comerciais, estas geralmente nos são enviadas por poderes políticos ou empresas privadas109. Ao contrário das pessoais, esse tipo de carta apresenta uma língua padronizada110, via de regra, escrita num nível formal, mais tenso, elaborado, visto que a relação remetente/destinatário não apresenta grau algum de intimidade entre os participantes. Ainda que venham assinadas por uma pessoa física, o emissor é uma pessoa jurídica111. Segundo Stowers (apud BAZERMAN, 2005), as cartas evoluíram de usos formais e oficiais para incluir expressões de preocupação pessoal e, posteriormente, mensagens particulares112. Segundo Bazerman (2005), a carta comercial no início deu conta da comunicação necessária. Contudo, ressalta o autor: a necessidade crescente de uma eficiente manutenção dos registros e arquivos gerados pela correspondência em 109 Multas de trânsito, mudanças de endereço e telefone, propostas para aquisição de cartões, entre outras. 110 Geralmente elas iniciam por “Vimos por meio desta...”. 111 Órgão público ou empresa privada 112 Na Inglaterra, algumas famílias registraram suas vidas e sua época em cartas que projetaram as particularidades e personalidades dos correspondentes. 117 expansão levou ao desenvolvimento de formulários impressos, memorandos, relatórios, circulares e outros gêneros. 4.2.2 O gênero diário 4.2.2.1 Origem A palavra diário foi registrada pela primeira vez no Oxford English Dictionary, durante o Renascimento113 (OLIVEIRA, 2004). Segundo o dicionário Houaiss da língua portuguesa (2001), a entrada do termo diário na língua portuguesa deu-se no ano de 1744. Derivada do latim diarǐum, ii, o vocábulo diário significava “pagamento de um dia, registro escrito de memória que se faz cada dia”. 4.2.2.2 Definição Conforme podemos ver em Houaiss (2001), diário, substantivo masculino114, significa 1 escrito em que se registram os acontecimentos de cada dia 2 periódico que se publica todos os dias; jornal. Ainda: obra em que o autor relata cronologicamente fatos ou acontecimentos do dia-a-dia, consigna opiniões e impressões, registra confissões e/ou meditações etc. 4.2.2.3 A tradição dos diários Oliveira (op.cit.) descreve o gênero diário como sendo “um fenômeno cultural” que se estabelece desde tempos remotos e tem seus primeiros 113 114 Segundo Oliveira (2004), a tradição do diarismo remonta a muitos séculos antes. Há também a forma de adjetivo registrada nos dicionários. 118 aparecimentos vinculados a uma natureza pública e comunitária, exemplificados, por exemplo, pelas tábuas de argila encontradas recentemente na Suméria, datadas de 3000 a.C. aproximadamente. Segundo essa autora, o conceito de diário tem sido erroneamente associado à idéia de uma narrativa de cunho íntimo, escrita geralmente por mulheres, embora a gênese e a prática diarística apontem para tipos e funções variadas de diários. Para Margo Culley (1985), a razão de ser dessa associação está ligada ao fato de, no século XIX, com a divisão das esferas pública e privada, os aspectos relacionados à vida privada terem se tornado do domínio de mulheres. Culley afirma ainda que, no final desse mesmo século, nos Estados Unidos, os diários faziam parte do conjunto de normas de etiqueta usado na educação de garotas, sendo então associados “à gentileza e a regras de bom comportamento das adolescentes da época115”. Embora estejam estreitamente relacionados à noção de privado, os diários surgiram primeiramente como documentos públicos, escritos para preencher funções comunitárias, sendo de forma colaborativa compostos por muitos autores (SHARYN LOWENSTEIN et all, 1994). Segundo Lowenstein (1994), a tradição de diários era construída por e para comunidades, o que representa a visão que diretamente contradiz a limitada noção de diário enquanto “pessoal” em vez de “social”. No que concerne ao caráter privado do diarismo, seu surgimento ocorre no século X no oriente, precisamente no Japão, com as mulheres da corte de Heian, cuja prática compreendia a manutenção de livros de cabeceira (pillow books) privados. Mas é ao escritor inglês Samuel Pepys116 que é atribuído o marco dos diários pessoais. Somente no final do século XIX é que se pôde falar no diário como o “livro do eu”. Em Era uma Vez o Tempo – Diário V, Fernando Aires (1999), afirma que o diário é, de todos os gêneros, o que mais se aproxima do tempo cronológico, visto que seu autor procura fixar instantes acontecidos, 115 Ainda hoje, século XXI, os diários íntimos pessoais estão associados a adolescentes do sexo feminino. 116 Segundo Oliveira (2004), Pepys é considerado escritor modelo do gênero. 119 referenciando-os através de uma data, que contém o ano, o mês, o dia e às vezes a hora. Para ele, as referências temporais explícitas são uma das características fundamentais da escrita diarística. Segundo esse autor, ao contrário das memórias, o diário não tem obrigação de continuidade, podendo o diarista fazer interrupções e escrever o que quiser na ordem em que desejar. Ou seja, não precisa se preocupar com a coerência de um enredo ou com a lógica da narrativa. Mikhail Bakhtin (1992), em Estética da Criação Verbal, considera o diário como um gênero discursivo de tipo primário por este estar inserido num contexto de comunicação verbal espontânea. Segundo ele, o diário enquanto estilo íntimo revela uma fusão entre locutor e destinatário, sendo muitas vezes o diarista o próprio destinatário. Em Cadernos de Lanzarote II, José Saramago (1997) usa as seguintes palavras para definir diário: Escrever um diário é como olhar-se num espelho de confiança, adestrado a transformar em beleza a simples boa aparência ou, no pior dos casos, a tornar suportável a máxima fealdade. Segundo o autor, ninguém escreve um diário para dizer quem é. A título de exemplo, elegemos um excerto de “O Amanuense Belmiro”, de Cyro dos Anjos, onde o personagem Belmiro faz o seguinte resumo do diário: Venho da rua oprimido, escrevo dez linhas, torno-me olímpico. Dessa forma, o autor revela o caráter ‘maqueador’ que o diário possui, ao conter em suas linhas apenas atos heróicos. 4.2.2.4 A classificação dos diários Há várias classificações que traçam o perfil da tradição do diarismo, revelando as diversas funções desempenhadas pelos diários. Entre os pesquisadores do assunto, destacamos três, a saber: Robert A. Fothergill, conceituado pesquisador inglês, que propõe ter o modelo de diário íntimo evoluído a partir de quatro formas de proto ou pré-diários: diários públicos, diários de viagem, diários de registro pessoal - análogos aos livros comunitários (commonplace books) – e diários de consciência ou espirituais; 120 Thomas Mallon, estudioso inglês, classifica os diários em sete tipos: diários de cronistas, viajantes, peregrinos, criadores, apologistas confessores e prisioneiros; por último, Ronald Blythe, autor inglês, cujo critério de classificação utilizado se baseia no posição dos autores dos diários. Esse pesquisador classifica os diários em 13 tipos: o diarista como testemunha, o diarista apaixonado, o diarista e o casamento difícil, o diarista na vila, o diarista como naturalista, o diarista doente, o diarista na loja, o diarista na guerra, o diarista como artista, diários e realeza, o diarista em rota, o diarista em desespero, o diarista e a morte. Na nossa pesquisa, apenas destacaremos de forma sucinta, a classificação de Fothergill, embora não seja a única sobre a gênese dos diários, como vimos acima. • Diários públicos: esta categoria é considerada tão antiga quanto a própria escrita. Essa noção está ligada à tradição de escrita comunitária117. Segundo Lowenstein, livros e recordações de registros contábeis antigos, registros domésticos romanos chamados Commentarii, crônicas chinesas do ano 56 d.C., entre outras, são exemplos da função de cronicar e manter um registro. • Diários de viagem: esta categoria agrupa relatos de experiências de diaristas em torno de viagens. Não tão comuns nos séculos XV e XVIII, esses diários refletiam as viagens de caráter exploratório ou não, informando sobre a geografia específica, fauna e flora, terreno, curiosidades sobre os povos nativos, bem como o sentimento associado a cada uma das experiências. • Diários de memória pessoal (commonplace books): esta terceira categoria está relacionada com os diários de memória pessoal, análogos aos commonplace books (livros de família). Esse tipo de diário é considerado um ancestral dos diários de leitura, quotas, observações, notas e desenhos feitos por pessoas letradas. Por ser rara e cara a publicação de livros, esse tipo de diário foi muito útil no trabalho de estudantes. Dentre as pessoas de renome que se utilizaram dessa prática encontra-se o pintor Leonardo da Vinci, que 117 Função que hoje é desempenhada pelos jornais. 121 manteve os cadernos de anotações por 40 anos, e Dostoievski, com três cadernos enquanto escrevia Crime e Castigo. • Diários de consciência ou espirituais: esta é a última forma de pré-diários classificados por Fothergill. Segundo Mallon, a prática desses diários começou no século XVI entre o clero reformado de East Anglia118, que tinha como preocupação minimizar o sentimento de culpa relacionado à fé em Deus. A prática de escrever diários119, ressalta Mallon, tornou-se muito comum enquanto meio de auto-examinação e auto-punição, tanto entre católicos, Metodistas quanto entre os protestantes. 4.2.3 O gênero e-mail Frente às tecnologias emergentes nos meios de comunicação, vemonos obrigados a, ao menos, ter noção do que vêm a ser gêneros como e-mail, blog, Short Message Service (SMS) etc. Afinal, o homem é um “ser social”, e a sociedade, por sua vez, está cada vez mais informatizada. Segundo Levacov (1996), um número crescente de atividades sociais tem-nos feito sentir o impacto da mídia digital. Para ela, todas essas tarefas precisam adequar-se a esse novo referencial. Vejamos, pois, a trajetória de alguns desses vários recursos utilizados com o advento da informática, a começar pelo mais antigo de que dispõe a Internet, o e-mail. 4.2.3.1 Origem 118 Grupo secreto que reunia dissidentes da Rainha Elizabeth (OLIVEIRA, 2004). Schiwy (1996) preparou uma relação contendo as propostas mais comuns a todos quantos mantêm um diário: alargar a autoconsciência; explorar a identidade pessoal; ter um confidente; colocar sentimentos e emoções sobre o papel; criar senso de continuidade em nossas vidas; preservar a memória de pessoas, eventos, de nós mesmos; lutar contra a descontinuidade, mudança, perda e angústia; explorar impulsos criativos; capturar idéias para estórias, poemas e outros projetos; recordar e explorar sonhos; celebrar graças e sucessos; engajar-se em um diálogo com o mundo em torno de nós; descobrir o que é sagrado em nossas vidas; aprofundar nossas jornadas espirituais; relembrar membros familiares e amigos queridos; arrumar pensamentos e clarear idéias; esquadrinhar o desejo do inconsciente, entre outras. 119 122 Conforme lemos em Oliveira e Paiva (2004), o e-mail surgiu em 1971, quando do envio da primeira mensagem de um computador para outro, feita por Ray Tomlinson, utilizando o programa SNDMSG120 que acabara de desenvolver. Segundo Tomlinson, o primeiro uso do correio em rede anunciou sua própria existência. Ao contrário do que temos hoje, a extensão do e-mail era relativamente curta – não ultrapassava algumas linhas – e sua recepção era muito lenta. Segundo Assis (2002, p.194), ler ou responder a e-mails na década de 70 demandava esforço e, sobretudo, paciência: (...) o texto simplesmente era despejado na tela ou fora, na impressora, e nada separava as mensagens. Além disso, para se chegar à última mensagem, era preciso passar obrigatoriamente por todas novamente. Para muitos operadores, o único meio de ler o correio era ligar o teletipo e imprimir metros e metros de texto (....) Também não havia ainda a função Responder (Reply), o que obrigava o usuário a começar uma nova mensagem sempre que o interesse fosse responder a uma mensagem recebida. 4.2.3.2 Definição Do inglês electronic mail, “correio eletrônico”, o e-mail é uma forma de comunicação escrita, normalmente assíncrona121, que possibilita remessa/troca de mensagens entre usuários do computador, suporte desse gênero. O termo e-mail está sendo empregado, segundo Zanotto (2005, p.110), com três sentidos. Para esse autor, dependendo do contexto, o e-mail pode significar gênero de texto, endereço eletrônico ou sistema de transmissão da mensagem eletrônica (ou canal). Oliveira e Paiva (2004) assim define o e-mail: Além do SNDMSG, Tomlinson também desenvolveu o READMAIL para sua leitura. Em alguns casos a remessa de mensagens entre os interlocutores pode variar de um tempo mínimo (quando ambos estão em conexão on-line) a defasagem de dias, semanas e meses, a depender dos usuários. Há casos onde a resposta nunca chega, o que dá a impressão de o destinatário não ter recebido ou não querer responder. 120 121 123 Um gênero eletrônico escrito, com características típicas de memorando, bilhete, carta, conversa face a face e telefônica, cuja representação adquire ora a forma de monólogo ora de diálogo e que se distingue de outros tipos de mensagens devido a características bastante peculiares de seu meio de transmissão, em especial a velocidade e a assincronia na comunicação entre usuários de computadores. Por apresentar características semelhantes às das cartas, Yates (2000) questiona se os e-mails não seriam novas versões de meios já estabelecidos (como as cartas pessoais), no que tange ao formato textual bem como aos diferentes níveis de linguagem. O e-mail foi considerado uma ameaça aos correios tradicionais e às cartas escritas, visto que esse gênero não acompanha as mudanças da sociedade moderna, na qual a filosofia que impera é a de que “tempo é dinheiro”. Sendo assim, o e-mail seria uma forma de comunicação rápida e eficiente, que evita desperdício de tempo e gastos com servidor. 4.2.3.3 Características A noção de e-mail está associada à idéia de endereço, daí conter obrigatoriamente122 todas as informações necessárias para enviar uma mensagem para alguém: 1. Endereço do remetente: automaticamente preenchido; 2. Endereço do receptor: deve ser inserido (quando não for uma resposta); 3. Possibilidade de cópias: a ser preenchido, visível ou não ao receptor; 4. Assunto: deve ser preenchido; 5. Data e hora: preenchimento automático; 6. Corpo da mensagem com uma saudação, texto e assinatura. Os endereços utilizados no e-mail possuem duas partes separadas pelo sinal @ (arroba): a identificação do usuário (user name) vem à esquerda 122 Ao contrário da carta, que pode deixar de conter algum dos dados do endereço e mesmo assim chega ao destinatário, no e-mail a troca ou ausência de um caracter impossibilita o envio da mensagem ou, caso exista algum outro semelhante, irá para outro interlocutor. 124 do símbolo; o que está à direita, denominado domínio, identifica o provedor ao qual o usuário tem acesso. Ex: [email protected] . QUADRO 6 e-mail como endereço eletrônico fasousi Nome @ Arroba Nome ou abreviatura do nome do proprietário da caixa de correio Símbolo com o sentido de “em” (lugar em que); designa o endereço do provedor bol. Nome do servidor Identificação da máquina encarregada de receber e enviar as mensagens com. Organização Br País Abreviatura que indica o tipo de organização à qual pertence o endereço (comercial, governamental, organizacional). Abreviatura de duas letras que indica o país a que pertence o endereço Adaptado de ZANOTTO, Normelio. E-mail e carta comercial: estudo contrastivo de gênero textual. Rio de Janeiro, RJ: Lucerna; Caxias do Sul, RS: Educs, 2005. Os programas de e-mail apresentam alguns comandos básicos123: Send – envia uma mensagem ou arquivo; Reply – responde a uma mensagem usando as informações de endereçamento contidas no cabeçalho da mensagem recebida; Delete – apaga uma mensagem; Forward – envia uma mensagem recebida para outro usuário124. Ex: From: [email protected]; To: [email protected]; CC:[email protected],[email protected], [email protected]; Subject (assunto da mensagem): coisas de doutorando Message (mensagem): Olá, colegas! A fim de que a mensagem seja enviada de forma correta, os campos devem ser preenchidos corretamente. A ordem do cabeçalho, entretanto, pode variar de sistema para sistema. 124 Segundo Marcuschi (2002), uma característica interessante do e-mail é a de possibilitar, aos interagentes, a troca entre: a) um emissor e um receptor; b) um emissor e vários receptores simultaneamente, e c) vários remetentes e um receptor ou vários remetentes para vários receptores (esta última é mais difícil e pouco usual). 123 125 Imaginem o que me aconteceu dessa vez! O CD no qual estavam gravados todos os meus dados foi roubado, junto com minha bolsa, hoje pela manhã, na hora em que eu vinha para a universidade. Pode?! Fabiana Vários autores destacam a informalidade, a inobservância de algumas regras ortográficas – há uma escrita que procura representar a palavra como ela é pronunciada, por exemplo: kd por cadê, blza por beleza; além da objetividade – geralmente não há torneios para dizer o que se pretende, tornando o texto curto e enxuto; e a ausência de pré-seqüências como algumas das características do e-mail - não há uma ordem a ser seguida: ao mesmo tempo em que se responde à mensagem, já se fala de outros tópicos, retoma algo dito, quebrando qualquer linearidade padrão. Em tese, as mensagens enviadas por e-mail são invioláveis e protegidas. Contudo, algumas precauções devem ser tomadas a fim de dificultar o acesso a pessoas que tentam violar as correspondências alheias, entrando em sua caixa postal, lendo seus e-mails etc: • Evitar senhas não seguras: seu login ao contrário (ex: fasousi – login, isuosaf – senha); formadas apenas por números (ex: 191281). Para evitar tais constrangimentos: • Procure mesclar letras maiúsculas e minúsculas (ex: fAsOUsI); • Alterne letras e números (ex: fd110204); • Substitua O por 0 (zero), E por 3 e L por 1 (ex: car1os3duardo). Além desses cuidados, Oliveira e Paiva (op.cit.) chama a atenção para um vírus conhecido por Senil125 que, não podendo ser contido sequer pelo Norton, afeta em maior grau os que nasceram antes de 1965: Segundo a autora, o humor faz circular na Internet piadas desse tipo relacionadas aos principais enganos na utilização do correio eletrônico (OLIVEIRA E PAIVA, 2004). 125 126 ► O vírus senil faz com que você 1. Envie o mesmo e-mail duas vezes; 2. Envie e-mail em branco; 3. Envie para a pessoa errada; 4. Envie de volta para a mesma pessoa que o enviou a você; 5. Esqueça de atachar os textos; 6. Aperte o “ENVIAR” antes de terminar a mensagem. 4.2.3.4 A linguagem dos e-mails Em artigo intitulado “A linguagem dos Chats Desafia os Newbies”, Viana (2000) salienta que a rapidez da comunicação via chat ou e-mail permite uma fluência maior da linguagem, quase com a mesma rapidez da fala. Segundo a autora, nesses ambientes as palavras foram abreviadas até o ponto de se converterem em uma, duas ou no máximo três letras (não=n, sim=s, de=d, que=q, também=tb, cadê=kd, tc=teclar, porque=pq, aqui=aki, acho=axo, qualquer=qq, mais ou mas=+). Além da “economia” lingüística que há, ressalta ela, houve um extermínio da pontuação e da acentuação126, remetendo-nos não à etimologia das palavras, mas à fonética delas (é=eh, não=naum). Na visão de Viana (op.cit.), os internautas, ao contrário de estarem “escrevendo errado”, parecem estabelecer um processo no qual as mensagens são encurtadas a ponto de serem expressas com o menor número de caracteres possível. Autores há que consideram o e-mail, igual à carta, variando a linguagem a depender do destinatário: a linguagem empregada na comunicação entre dois amigos tende a ser menos criteriosa e mais despojada. Já a comunicação entre pessoas cujo grau de intimidade entre elas é baixo ou nulo tende a apresentar uma maior formalidade na linguagem. Tal pensamento corrobora a idéia de Marcuschi (2002), segundo a qual as escolhas lingüísticas A origem “imperialista” do não uso de acentos em mensagens eletrônicas está no fato de as primeiras plataformas de computadores, chamadas UNIX, suportarem apenas os primeiros 127 caracteres, e os acentos e a cedilha começam a partir do número 128. Além disso, toda economia era preciosa antigamente, já que os computadores tinham o disco rígido muito menor e a transmissão era muito mais demorada (VIANA, 2000) 126 127 sofrem interferências dependendo dos interagentes. Para esse autor, uma carta pessoal a um amigo difere de uma circular a toda uma comunidade. A diferença entre a carta e o e-mail se dá, conforme lemos nos sites www.ircmail.net, www.tche.br/e-mail.html, www.e- dimensao.com.br/divulgacao/midiawe./correioeletronico em relação à distância: no primeiro, o interlocutor está, via de regra, distante; no segundo, o destinatário pode estar na mesma empresa na qual trabalha o remetente. Na opinião desses autores, o fator rapidez é mais relevante que a distância na transmissão das mensagens, o que ocasiona uma linguagem marcada por abreviações que, para eles, são típicas desse novo gênero e não ocorrem no seu correlato, a carta. Oliveira e Paiva (op.cit.) destaca a possibilidade de transmissão de vários tipos de dados (textos diversos, imagem, som e vídeo) como a grande inovação do correio eletrônico. Nesses sites vimos que o e-mail apresenta certo estreitamento de fronteiras entre a oralidade e a escrita, o que propicia formas comunicativas próprias, misturando signos verbais, sons, imagens e formas em movimento. Ainda segundo informações contidas nesses sites, os e-mails apresentam a forte presença da oralidade, espontaneidade e palavras abreviadas. Segundo Jonsson (1997): As mensagens eletrônicas podem partilhar as propriedades da carta tradicional, mas podem partilhar as propriedades do telefonema ou a comunicação face a face. Conseqüentemente, os e-mails transgridem os limites entre as noções tradicionais de comunicação oral e escrita. Dentre as inúmeras vantagens oferecidas aos usuários pelo serviço de e-mail, podemos destacar: • Pode ser enviado a qualquer hora e lugar; • Dispensa a ida aos correios para postar a correspondência; • Além de poder ter qualquer extensão, o e-mail transmite mensagens, imagens e programas, que podem ser copiados para o computador; • Atualmente, existem vários sites que oferecem um endereço eletrônico grátis: www.bol.com.br, www.ig.com.br etc. 128 Talvez uma das maiores especificidades do e-mail seja permitir o imbricamento e encadeamento de mensagens anteriores, gerando a pronta reconstrução e recuperação da correspondência completa. Para Assis (2002, p. 130), manisfesta-se, com o imbricamento e o encadeamento, Um novo tipo de dialogicidade, na medida em que ali se flagra uma dinâmica de alternância de turnos, garantida quer pela inserção de partes da mensagem a que se responde no e-mail - resposta, quer pela permanência, nesse e-mail (providenciada pelo computador), da mensagem a que se responde, quer, ainda, pela própria organização dada ao e-mail-resposta, que, em termos de ordenação de informações, procura obedecer à seqüência de demandas da mensagem a que se responde (...) 4.2.3.5 E-mails pessoais X E-mails comerciais Vimos acima a origem do gênero e-mail, seu conceito, características e finalidades. Agora, vejamos a dimensão desse recurso de que dispõe o usuário da Internet e sua funcionalidade. Entendemos, para fins de análise, como e-mail pessoal aquele que funciona como correspondência entre pessoas físicas, podendo ser de uma para várias simultaneamente ou, como se dá mais comumente, de uma só pessoa para outra ou ainda de uma instituição para uma pessoa física. Já o e-mail comercial é aquele utilizado apenas entre pessoas jurídicas, ou empresas, melhor dizendo, não havendo a participação de uma pessoa física apenas, quer se trate de remetente ou destinatário. Na área empresarial, o e-mail tornou-se uma ferramenta de comunicação indispensável e parece ter conseguido substituir e redimensionar a diversidade de práticas comunicativas antes existentes, tais como a circular, o ofício e o memorando.Uma pesquisa realizada pela Federação e Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp/Ciesp) demonstrou que, de l.700 indústrias paulistas, 83% empregam o e-mail. A explicação para o sucesso 129 desse gênero está ligada ao fato de ele ser mais eficaz, diminuir o emprego de papel e acelerar o trabalho. Segundo dados da Veja (2000), a mensagem eletrônica é dinâmica e informal, devendo ser concisa e sem enrolação. Entretanto, salienta, a ausência de cerimônia não dispensa tratamentos de respeito e cortesia: Ao iniciar um texto, por exemplo, é de bom-tom referir-se sempre ao destinatário pelo nome, em vez de despejar direto as informações. Para despedir-se, ao final da redação, usar um “atenciosamente” ou “cordialmente”, tradicionais de cartas e fax, é mais elegante. Deixe as abreviações127 e os “emoticons” (aqueles desenhos feitos com sinais gráficos para demonstrar emoções para os colegas mais chegados) e evite escrever em letras maiúsculas, que soam como se você estivesse gritando em vez de falar. O correio eletrônico faz circular desde correntes e piadas de amigos até solicitações do chefe, relatórios de subordinados, contratações, decisões de compra e venda entre outras (Veja: 2000). Com o objetivo de não desperdiçar tempo respondendo a tudo, tampouco lendo todo tipo de “lixo eletrônico”, algumas empresas estão adotando regras que monitoram o uso do correio128: • Seja conciso e só envie mensagens que tenham utilidade. Não ajude o colega a perder tempo com bobagem; • Não mande arquivo muito “pesado” sem antes pedir permissão. Muitos computadores acabam travando quando o recebem; • Se você não sabe se o arquivo é “pesado”, peça ao suporte de informática de sua empresa para avaliar o tamanho; • Nunca espalhe piadas, correntes ou boatos. Além de entulhar lixo na caixa postal alheia, você pode congestionar o sistema; 127 Mais uma vez vemos a relação feita entre o uso de abreviações e a informalidade do texto, ou a intimidade entre os locutores, fatores decisivos para a freqüência baixa ou elevada desse recurso da língua nos textos de e-mails. 128 Algumas empresas filtram o conteúdo das mensagens de seus funcionários, a fim de bloquear conteúdos obscenos ou racistas, além de bloquear sites inadequados e endereços de bate-papo (Veja: 2000). 130 • Só use o comando “responder a todos” quando sua réplica for realmente do interesse geral; • Confira o destinatário correspondência à pessoa errada; da mensagem. Isso evita enviar • Não armazene mais que 150 e-mails. Seu terminal profissional não é arquivo morto; • O caminho mais curto da comunicação nem sempre é um e-mail. Muitas vezes um telefonema resolve e é mais rápido; • Evite mensagens com fofocas, intrigas ou bastidores sobre colegas e chefias; • Jamais envie mensagens com conteúdo pornográfico, machista, racista ou discriminatório; • Fuja de grosserias como dar cantadas pelo correio eletrônico; • Só imprima mensagens realmente importantes. Para que desperdiçar papel se você tem tudo eletrônico? • Apesar de ser mais informal que uma carta ou fax, nada substitui a educação e a cortesia. Mantenha certa formalidade no trato profissional; • Responda às mensagens relevantes em até 24 horas. Se não der, acuse o recebimento e prometa novo contato – e cumpra o prometido; • Não remeta e-mail quando estiver nervoso. A agressão por escrito é mais forte, duradoura e difícil de consertar; • A segurança de privacidade de um e-mail é zero. Faça a você mesmo a seguinte pergunta: e se uma cópia fosse parar no quadro de avisos? Em caso de dúvida, não mande. É fato, pois, que, ávidas em atender às necessidades de seus clientes, ansiosas por um atendimento rápido, simples e confiável, as empresas implementaram a informatização na comunicação administrativa. Com essa tomada de decisão, houve um ganho considerável de agilidade no fluxo de comunicação, como também um enxugamento no que diz respeito à parafernália utilizada, pois o correio eletrônico dispensa papéis, carimbos, vistos e assinaturas. 4.2.4 O gênero SMS 4.2.4.1Origem 131 Diferenciação é um fator significante para o sucesso no mundo competitivo atual. Um dos potentes veículos que provê essa diferenciação é o SMS, considerado pelo mercado como uma “revelação” dentre os provedores de serviços. Segundo a Internet Sercomtel, o SMS proporciona conveniência e flexibilidade, possibilitando a comunicação por dispositivo sem fio, como uma extensão do computador, sem a necessidade de portar diversos aparelhos, já que o serviço pode ser integrado em um só: o celular (terminal móvel, na terminologia do site). 4.2.4.2 Definição SMS é uma abreviação do inglês e quer dizer Short Message Service. Ou seja, a sigla SMS significa: Serviço de Mensagens Curtas. Segundo o freeSMSpt, esse é o nome da tecnologia que permite aos celulares digitais enviar e receber mensagens de texto para outros celulares ou ambientes web. De acordo com esse site, o SMS também é conhecido por outros nomes: torpedo, sms, mensagem curta, mensagem de texto etc. A fim de evitar que os usuários desse serviço se sentissem tentados a escrever mais do que é devido, ficou estipulado que uma mensagem não poderia levar mais do que 160 caracteres129, o que traduzido significa não mais que 140 bytes, aos quais são acrescidos mais 30 bytes do espaço ocupado pelo cabeçalho130. Conforme lemos no site telemóveis.com, devido a essa medida de economia nasceu a tão falada linguagem abreviada de SMS que, segundo eles, tantas dores de cabeça tem dado aos professores de 2º grau por esse mundo afora, visto que muitos alunos têm transferido essa linguagem usada no celular para os textos produzidos em sala de aula, “infringindo” a linguagem exigida pela escola, a padrão. O êxito das mensagens entre os jovens tem sido tão grande que, segundo afirma Benedito (2003), essa geração já está sendo chamada de geração das teclas ou a “geração do polegar”. Vale ressaltar que, Podendo, inclusive, ser menor conforme o serviço da operadora. A VIVO, por exemplo, permite a mensagem com no máximo 150 caracteres sem acentuação (freesmspt). 130 Se levarmos em conta os MMS, mensagens multimídia mais “pesadas” devido à integração de som, imagens ou animações (cujo limite estabelecido é de 30Kb), o “peso” das SMS tornase leve para qualquer rede (Telemóveis.com). 129 132 segundo lemos em Crystal (2005, p.91), o fato de os mais jovens abreviarem palavras nas suas mensagens, seja através das técnicas de rébus (b4 = before), seja através de indicações fonéticas (thx = thanks), ou através de abreviações (imho = in my humble opinion), não é novo ou fundamental. Segundo ele, as pessoas vêm usando abreviações há gerações, e os jogos de rébus há muito são encontrados em revistas de palavras cruzadas. 4.2.4.3 Como funciona o SMS No site Sercomtel encontramos as instruções para se informar como enviar mensagens de texto do celular. Segundo eles, trata-se de um serviço simples, prático e fácil. Vejamos: a. Verifique se o seu aparelho possui o serviço de mensagem de texto; b. Se o seu telefone está categorizado para enviar e receber mensagens; c. Se, no local em que você está, o seu celular está recebendo o sinal digital; d. Celulares pré-pago precisam possuir qualquer valor maior que zero em crédito e estar dentro do prazo de validade de 90 dias da última recarga; e. Celulares pós-pago precisam estar com as faturas dentro do prazo de vencimento sem corte. Após certificar-se de que todos os passos estão corretos, você escreve a mensagem no seu celular e envia para o número que deseja131. O site www.sapo.pt informa que, se o celular estiver desligado, o(s) SMS(s) que é destinado fica guardado pela operadora, mas, assim que o celular for ligado, a mensagem será entregue. Contudo, se o celular permanecer desligado por um período superior a 48 horas ou estiver numa zona sem cobertura de rede, o SMS não será entregue. As informações detalhadas para envio de mensagem de texto devem ser conhecidas no manual do aparelho celular. 131 133 Quanto ao valor cobrado pelo serviço SMS, a cobrança ocorre somente no celular que envia a mensagem. Clientes pós-pagos têm a cobrança em conta, e clientes pré-pagos têm as mensagens descontadas dos seus créditos. O custo por mensagem enviada é tarifado de acordo com as operadoras, podendo variar de R$ 0,13 a R$ 0,19 centavos para clientes pós-pago132, e de R$ 0,30 centavos para clientes pré-pago, independente do número de mensagens enviadas. Esses valores estão livres de adicional de chamadas e deslocamento, caso o cliente esteja fora de sua área de registro, ou seja, em roaming digital. 4.2.4.4 SMS pessoal e empresarial As necessidades de comunicação têm sido muitas e hoje, na Era da comunicação e da Informação, comunica-se mais em menos tempo e por um preço cada vez mais reduzido. A função das mensagens escritas foi um grande avanço nos telemóveis. Dentre as muitas vantagens que esse serviço apresenta, está a de não se perder tempo falando; mandar-se do lugar onde estiver e à hora que se desejar. As SMS estão surgindo como uma nova mídia para apoiar as ações de relacionamento das empresas com os clientes, servindo como um canal de comunicação ágil para encaminhar informações curtas para grupos de pessoas que não estão à frente do computador (http:www.centroatl.pt/titulos/soluções/imagens/). Segundo informações contidas nesse site, uma das grandes vantagens do SMS como canal de comunicação é a sua abrangência, visto que atualmente são mais de 57 milhões de aparelhos celulares, um número quase três vezes maior que o número de usuários que têm acesso à Internet no Brasil. 4.2.4.5 Principais benefícios do SMS 132 Quanto maior o número de mensagens enviadas, menor o valor cobrado. 134 Partindo do princípio de que a economia, seja de tempo ou de dinheiro, é a mola-mestra das tecnologias digitais, elencamos algumas vantagens ao se utilizar esse gênero que, pela própria natureza, abriga uma escrita abreviada. • Comunicação em tempo real: a mensagem aparece na tela do celular poucos instantes após o envio; • Novo consumidores; canal de comunicação sinaliza inovação para os • Agilidade: o canal de voz é ineficiente quando uma mesma informação precisa ser transmitida para mais de uma pessoa; • pessoal; Comunicação personalizada e segmentada: o celular é uma mídia • Menos intrusivo: não é necessário interromper uma reunião para ler um SMS; • Economia: um SMS é mais barato que uma ligação para celular, principalmente se for interurbana; • Interatividade: possibilidade promoções, pesquisas de opinião etc; de resposta do cliente para 4.2.4.6 Aplicações do SMS Marketing A seguir, apresentamos um resumo de como o SMS pode ser utilizado em diferentes áreas da empresa, a fim de estabelecer um contato direto com clientes. 1. Para retornar o contato de um cliente ou para encaminhar o pedido de um cliente para a equipe externa (vendas, manutenção etc.); 2. Pode substituir o canal de voz nos casos em que a informação a ser transmitida precisa ser rápida e precisa; 3. Pode ser utilizado para divulgar lançamentos de produtos e serviços, novas condições de pagamento e promoções que estimulem a compra por impulso; 4. Perfeito para personalizar o relacionamento com os clientes e enviar alertas sobre saldos de milhagens e prêmios conquistados com o programa de fidelidade; 5. Pode ser utilizado, em um primeiro contato, para lembrar vencimentos de pagamento. As empresas que utilizam esse novo canal de comunicação têm obtido bons resultados quando combinam de forma adequada com os canais de voz e 135 a Internet133. A seguir, apresentamos um quadro contendo as abreviaturas mais triviais que o gênero SMS apresenta: Quadro 8 Lista das abreviaturas mais utilizadas e seus significados no SMS - Menos; () abraços; + Mais; + - Mais ou menos; = igual; Bjs beijos; c/ com c/o como icq falamos no icq ily ou ilu I Iove you (amo-te) k quê lol a rir alto (laughing out loud em inglês) msg mensagem msm mesmo ň não obg obrigado p/ para pq porque q que +trd – mais tarde =mente - igualmente qq qualquer Rotfl rolling on the floor laughing (rebolar de riso no chão); tb também; tks ou thx thanks (obrigado); x vez; :-) sorrindo; (-: também a sorrir; :) sorrindo sem nariz; :’) chorar a rir; :-() rir de boca aberta; 8-) sorrindo com óculos; [:-) a sorrir com walkman (a ouvir música); ;-) piscar olhos; :-* beijo :-( triste; :’-( a chorar; :-{} espanto; 4E, 4ever – for ever 1mmt – um momento Como pudemos observar, semelhante ao e-mail, a linguagem do SMS é marcada pela presença de abreviações, sejam elas representadas por letras ou ideogramas com valor fonético (ex: ILY = I LOVE YOU), através de símbolos acrofônicos (ex: rotfl = rolar de rir no chão), de fonogramas com valor silábico (ex: tb = também), com recursos à ideografia (ex: +- = mais ou menos), ou ainda com a reciclagem de diversos signos para transformá-los em componentes de ícones134 (ex: 8-) = sorrir com óculos). Como salienta Béguelin (2004), a eficácia dessas tendências ideográficas, silabográficas ou acronímicas serve tão somente para desmitificar a idéia de que o único progresso possível na evolução dos sistemas de escrita 133 O Centro de Controle da Varig, o Centro de Integração Empresa Escola do RS (CIEE RS), A Ipiranga, A Catho Online e a Cimpor são algumas das empresas que utilizam o SMS. 134 Os ícones mais comuns nos e-mails também são os mais utilizados nas mensagens de texto. Em ambos há uma mescla de texto e imagem, onde muitas vezes apenas a imagem compõe o texto: ☺ ou , significando respectivamente “estou alegre” e “estou triste”. 136 se daria através do princípio fonológico. Segundo a autora, devemos levar em consideração os objetivos pragmáticos do sistema gráfico, a fim de tentarmos avaliar a sua adequação. 4.2.5 O gênero blog135 4.2.5.1 Origem O termo weblog foi inventado em dezembro de 1997 pelo teórico americano Jorn Barger, e em agosto de 1999, com a utilização do software Blogger da empresa do norte-americano Evan Willians, os blogs foram concebidos como uma alternativa popular para a publicação de textos on-line (KOMESU, 2004). 4.2.5.2 Definição Blog é a simplificação de Web log ou Weblog, sendo log um diário de bordo136. A definição de blog não é algo consensual, segundo o site sapo, ouvindo-se muitas vezes a expressão “Diário virtual” para descrever o que seria um blog. Há, contudo, variadíssimas definições de blog, dentre as quais selecionamos algumas: • Um diário na web137; • Um jornalzinho, ou diário, mantido on-line para que outras pessoas possam ver também138; 135 Ao contrario do diário tradicional, é grande a presença de homens que escrevem nesse gênero. 136 O interessante é que, segundo Evan Williams, um dos criadores da ferramenta Blogger, esta não foi pensada para a criação de blogs ou diários digitais. Entretanto, foi nessa produção que ela se tornou amplamente empregada (UOL, 2001). 137 (http//www.blog-se.) 138 Ta-Na.Net.- Redirecionador de Sites e Sistema de Blog. 137 • Uma página web atualizada freqüentemente, composta por pequenos parágrafos apresentados de forma cronológica139; • Um registro cronológico e freqüentemente atualizado de opiniões, emoções, fatos, imagens ou qualquer outro tipo de conteúdo que o autor quiser disponibilizar; • Página pessoal da Internet que tem mecanismos de interação e permite manter conversas entre grupos140. 4.2.5.3 Como funciona o blog Em um ensaio sobre blog, Luis Antonio Giron141 salienta que ninguém tem de saber linguagem ASP, PHP ou a já anciã HTML para que possa publicar em um blog. Para o autor, a ferramenta revela-se tão fácil quanto um programa de e-mail sediado na web. O uso de um blog assemelha-se ao envio de uma mensagem instantânea para toda a web: você escreve sempre que tiver vontade e todos que visitarem seu blog terão acesso ao que você escrever (Ta-Na. Net – Redirecionador de Sites e Sistema de Blog). O blog é definido ainda como um espaço onde o usuário expressa o que quiser na atividade da (sua) escrita, podendo escolher imagens e sons para compor o texto que será veiculado pela Internet (KOMESU, 2004). O conteúdo e tema dos blogs variam de assuntos que vão desde piadas, diários, notícias, poesia, fotografias, até o que a imaginação do autor permitir. Há pessoas que associam a idéia de blog a uma espécie de diário de adolescente na Internet, e assim sequer chegam a conhecer o que é de fato esse espaço de notícias, análises e debate. É bem verdade que existem alguns onde predominam idéias e sentimentos do autor, são os blogs pessoais. Mas há também aqueles que permitem a grupos de trabalho ou até empresas a troca de comunicação mais simples e organizada, a fim de discutir projetos e apresentar soluções. Ou seja, alguns blogs são essencialmente voltados para a diversão; outros, para trabalho, e outros fazem uma mistura de ambos. 139 Blogger.com. br observatorioultimosegundo.ig.com.br 141 www.digestivocultural.com/ 140 138 4.2.5.4 Blogs pessoais e empresariais No início eles não iam além de “diários on-line” publicados na web, geralmente, criados por adolescentes. Entretanto, a idéia começou a atrair pessoas em todo o mundo, o que gerou uma enorme diversidade de temas, distribuídos em basicamente três tipos de blogs: • Privado: somente o criador do blog pode colocar mensagem nele; • Grupo: mais de uma pessoa pode postar mensagens. O criador do blog controla quem participa; • Público: qualquer pessoa pode postar mensagens. O blog é gerenciado pela equipe do provedor142. Frente à demanda inesperada, blogs com notícias jornalísticas, científicas e informações úteis à sociedade foram oferecidos a cidadãos e empresas, que têm já definidos os propósitos, ou seja, sabem o que pretendem apresentar/aprender, e o que ou quem querem atrair. A própria imprensa viu-se atraída pelo novo gênero, e resolveu incluir um blog em suas publicações tradicionais. Há também blogs cuja finalidade é gerenciar o conhecimento em instituições como escolas, jornais e empresas (http://www.blogger.com.br). Sendo assim, o trabalho com esse novo gênero textual pode criar oportunidades reais de ensino e aprendizagem entre os seus usuários. 4.2.5.5 A linguagem nos blogs: tá td blz! 142 No caso do IG, o serviço de blog é o Blig. 139 Geralmente a linguagem utilizada no blog está diretamente relacionada com o seu propósito e/ou com o estilo lingüístico de seu criador. Ou seja, um blog de cunho científico apresenta, via de regra, uma linguagem de acordo com o tema abordado e o público leitor. Já um blog criado por um adolescente retrata uma linguagem com um código bastante particular, caracterizado por abreviações e pela utilização de novas formas de escrever velhos termos, gerando senão uma imitação, pelo menos uma espécie de inovação nas abreviações outrora existentes. No primeiro caso, temos vocábulos como beleza, porque, tudo, você, também e não que sofreram drásticas reduções e passaram a ser escritos, respectivamente, blz, pq, td, vc, tb e ň. No segundo caso, temos palavras do tipo não, falou, então, até, é e né que, ao contrário das citadas anteriormente, sofreram acréscimo de um elemento em sua forma original e passaram a ser escritas naum, falow, entaum, ateh, eh, neh143. Mas não parou aí. O uso de formas escritas apresentando marcas da oralidade é outro aspecto observado na linguagem utilizada nesse novo gênero, em especial pelos adolescentes. É bem verdade que há aqueles que escrevem utilizando uma linguagem mais formal, fazendo uso de acentos e pontuação, mas o que predomina é a presença de uma escrita abreviada, aproximada da pronúncia, uma espécie de semi-oralidade. Diante desse fato, surge um dilema de se corrigir ou não a grafia de tais palavras. Segundo o site www.saladeaula, alguns professores de Língua Portuguesa de colégios de São Paulo defendem que a formalidade deve ser preservada, uma vez que o conteúdo é acessado pelos mais variados públicos. Na opinião deles, quando se tratar de um texto de pesquisa, o estilo formal deve ser preservado. Porém, quando o conteúdo for informal e restrito ao grupo, a escrita utilizada pode ser a que apresenta as particularidades do texto cibernético. Na visão do lingüista Bagno, os adolescentes devem expressar-se livremente, já que não é nesse contexto que eles irão aprender ortografia e gramática. Para Bagno, o blog nasceu com os jovens e o espaço desse gênero deve ser reservado para os adolescentes (www.saladeaula.com.br). Na opinião de Crystal (2005, p. 92), deve-se ensinar às crianças que as abreviações nas O caso de falow foge à regra, uma vez que a palavra não sofreu nem redução nem acréscimo de elemento em seu conjunto. Já o ateh, o eh e o neh passaram a representar o sinal gráfico do acento com a letra h. 143 140 mensagens de texto, onde o espaço é pequeno e a rapidez um fator crítico, desempenham uma função útil, mas não em outros lugares. 4.3 A abreviação e o suporte de gêneros textuais Partindo do princípio de que todo gênero tem um suporte, e de que este determina a distinção que o gênero recebe, achamos imprescindível definir e analisar, ainda que em linhas gerais, os suportes textuais. Convém destacar também que, segundo Chartier (1994, 1997), a leitura que fazemos dos textos é afetada pelo suporte. Isto equivale a dizer que não lidamos cognitivamente com os textos de igual modo em suportes diversos. Ou seja, embora o conteúdo não seja afetado pelo suporte, contudo a nossa relação com ele o é. Em outras palavras: a depender do suporte, um mesmo texto pode ser identificado como um gênero diferente. Vejamos o seguinte texto: “Marcos, estou com saudades. Quando puder, me liga. Te amo. Meu novo número é 81 3241 5678. Fabiana” Se colocado em cima do bureau da referida pessoa (Marcos), o texto pode ser lido como um bilhete; se recebido pela secretária eletrônica, passa a ser um recado; entregue em formulário próprio pelos correios, é um telegrama; já em um outdoor, pode ser interpretado como uma declaração de amor. Como afirma Marcuschi (2003), o conteúdo não muda, mas o gênero é sempre identificado na relação com o suporte. Iremos pesquisar neste capítulo se os gêneros têm preferências, não se manifestando na indiferença a suportes. Ou seja, se o gênero exige um suporte especial. Assim, buscaremos responder se os suportes interferem ou não na forma de interpretar, compreender os conteúdos expressos nos gêneros. 141 4.3.1 Definição Embora seja ainda embrionária a discussão acerca dos suportes textuais, sabemos que a definição a ser adotada não deve ser aquela registrada nos dicionários: DOC base física (de qualquer material, como papel, plástico, madeira, tecido, filme, fita magnética etc) na qual se registram informações impressas, manuscritas, fotografadas, gravadas etc (HOUAISS, 2001, p. 2643). Marcuschi (2003) entende como suporte de um gênero textual “um lócus físico ou virtual com formato específico que serve de base ou ambiente de fixação do gênero materializado como texto”. Para ele, suporte de um gênero é “uma superfície física em formato específico que suporta, fixa e mostra um texto” 144 Segundo esse autor, o suporte não deve ser confundido com o contexto nem com a situação, nem com o canal em si, nem com a natureza do serviço prestado. Vejamos a seguir um exemplo que diferencia gênero de suporte e outros. Escolhemos a carta pessoal para ilustrar a cadeia que é estabelecida num contínuo nem sempre discreto: Carta pessoal (GÊNERO) papel-carta(SUPORTE) tinta (MATERIAL DA ESCRITA) correios (SERVIÇO DE TRANSPORTE)... Marcuschi lembra ainda que o suporte não é neutro e que o gênero não fica indiferente a ele. Por exemplo, não é qualquer gênero que aparece num outdoor, pois esse é um suporte para certos gêneros, afirma ele. O suporte, ressalta o autor, é imprescindível para que o gênero circule na sociedade e deve ter alguma influência na natureza do gênero suportado. 4.3.2 Categorias de suportes textuais 144 Ao afirmar que um suporte é uma superfície fixa, estamos supondo que ele deve ser algo real; dizer que ele tem um formato específico é admitir que os suportes não são informes nem uniformes; por fim, assegurar que o suporte serve para fixar e mostrar o texto implica associar a ele a função básica de fixar o texto, tornando-o acessível para fins comunicativos. 142 Em princípio, toda superfície física pode funcionar como suporte. Prova disso é que na antiguidade a circulação de textos escritos nos chegava em suportes textuais os mais variados: iniciaram nas paredes interiores de cavernas, nos vasos de barro, túmulos, pedrinhas, tabuletas, no papiro, pergaminho, papel145 e, modernamente, nos outdoors e ambiente virtual da Internet. 4.3.3 Suportes convencionais Entendam-se por suportes convencionais, típicos ou característicos aqueles que foram desenhados com a função específica de serem suportes. Com base nessa definição, passemos a alguns desses suportes e suas características: a) Livro: é um suporte maleável, com formatos definidos pela própria condição em que se apresenta (capa, páginas, encadernação etc.). Comporta os mais diversos gêneros que se queira, ou em outros casos um só gênero. b) Jornal: todos concordamos que é um suporte com muitos gêneros (cartas do leitor, anúncios fúnebres, previsões meteorológicas, horóscopo, notícias, editoriais, charges etc). c) Telefone: trata-se aqui de um suporte para gêneros orais (também escritos, no caso do telefone celular, que comporta as mensagens de texto). d) Tela do computador: suporte dos gêneros digitais (e-mail, blog, chat etc.), tem sido preterida por uns, em geral amantes do livro, e preferida por outros, marujos do oceano cibernético. 4.3.4 Suportes incidentais 145 A folha de papel é o suporte mais comum de todos e, no nosso caso, é o suporte utilizado para as cartas manuscritas e diários. 143 Os suportes incidentais são assim denominados por serem meios casuais e que emergem em situações especiais ou até mesmo corriqueiras. Sendo assim, ao falarmos em suporte no sentido estrito, referimo-nos aos convencionais (supracitados) e não aos incidentais. Vejamos alguns exemplos: a) Pára-choques e pára-lamas de caminhão: é um suporte de gêneros especiais como frases e provérbios; b) Roupas: embora não traga de maneira sistemática textos, as camisetas são suportes de gêneros vários como provérbios, poemas, canções, propagandas; c) Corpo humano: apesar de não ser um suporte convencional, cada vez mais vem aumentando o uso de textos curtos, tatuagens e slogans como formas de protestos; d) Paredes: aqui generalizamos todo tipo de parede (casas, edifícios, universidades etc). Muitas vezes ocorre uma superposição, por abrigarem em si outros tipos de suportes (um quadro de avisos, por exemplo); e) Muros: ainda que não tenham sido convencionados para a finalidade de suporte, os muros têm a cada dia registrado um crescente aumento no que diz respeito ao número de gêneros nele ancorados (propagandas, inscrições, publicidades e pichações). Quanto à criação/utilização de novos suportes para a escrita, Xavier (2002, p.92) afirma que estes Operam, fundamentalmente, sob a égide da soma sinérgica e não sob a lógica da substituição ou subtração absoluta de uma pela outra. A existência concomitante por séculos do papiro e do pergaminho, assim como do pergaminho com o livro impresso ilustram muito bem isso. A tecnologia de “escrituração” mais viável do ponto de vista técnico, econômico e social tende a prevalecer como tecnologia mais eficaz para um dado momento histórico. 4.3.5 Serviços 144 Os exemplos aqui arrolados não devem ser classificados em suportes convencionais nem tampouco em suportes incidentais. Trata-se de casos de serviços em função da atividade comunicativa: • Correios: é mais um meio de transporte ou um serviço que um suporte; • Mala-direta: no geral veicula gêneros diversos, tanto da publicidade quanto da comunicação entre empresas e clientes destas; • Software: tratado por uns como suporte, por outros como gênero, na função de correio eletrônico o e-mail é um serviço que engloba os mais variados gêneros (propagandas, ofícios, bilhetes, cartas comerciais, relatórios etc.). Apresentada a distinção entre tipo e gênero textual, e feita a descrição minuciosa de cada gênero aqui trabalhado, apresentaremos a seguir o capítulo referente à análise dos dados. 145 CAPÍTULO 5 ANÁLISE DOS DADOS Vimos, nos capítulos precedentes, a origem e a tradição das abreviações, a sua relação com as tecnologias manuscrita, impressa e digital; o suporte (o papel, o computador, o telefone celular) e os gêneros textuais, bem como a influência de fatores sociointerativos, estruturais e sociais, quanto ao maior ou menor uso delas por parte dos que as utilizam. Resta-nos agora uma discussão acerca da atuação desses fatores em conjunto, a fim de melhor compreendermos como se dá, nos dias atuais, a ocorrência da abreviação nos gêneros por nós aqui estudados, quais sejam: email, SMS e blog, além dos tradicionais (diários e cartas), tentando traçar uma ponte entre as abreviações do século em que estamos, XXI, com as de séculos anteriores, XVIII, XIX, XX. Visando obter uma melhor compreensão do fenômeno em estudo, a apreciação dos dados foi feita primeiro com as variáveis sociointerativas, depois com as variáveis estruturais e, por último, com as sociais. Contudo, essa ordem não é inalterável ou a mais indicada, apenas uma forma de tornar menos extensa e intrincada a leitura. Passemos, pois, à análise propriamente dita. 146 • 1. Das variáveis sociointerativas Gênero: Dentre todas as variáveis aqui analisadas e por nós classificadas como sociointerativas, essa foi a que demonstrou exercer maior influência quanto ao uso acentuado ou não de abreviações. Conforme havíamos mencionado no início deste trabalho, selecionamos 5 (cinco) gêneros para compor o material a ser analisado, a saber: carta, e-mail, diário, blog e SMS. Quisemos com essa escolha traçar um paralelo entre os gêneros emergentes e as suas contrapartes. Dessa forma, pusemos o e-mail ao lado da carta tradicional, visto que aquele compartilha semelhanças com essa, dentre elas: abertura, saudação e fechamento146; o blog, como alguns afirmam e o próprio nome diz, em muito lembra o diário tradicional: nele, o autor registra diariamente os fatos que ocorrem em sua vida, ainda que alguns não mereçam destaque; finalmente, o SMS, gênero da telefonia digital, que despertou interesse pelo tema desta tese. Poderíamos abarcar outros tantos gêneros, mas devido ao caráter da pesquisa, restringimo-nos aqui aos anteriormente citados, considerando-os como uma amostra suficiente para nosso estudo. Afinal, como afirma Bakhtin (1992), “à medida que a esfera da atividade humana se desenvolve e fica mais complexa, o repertório de gêneros do discurso vai diferenciando-se e ampliando-se”. Podemos adiantar, contudo, citando aqui as palavras de Rodrigues (2005, p.166), que Cada gênero tem seu campo predominante de existência (seu cronotopos), onde é insubstituível, não suprimindo aqueles já existentes. Por exemplo, o romance polifônico não acabou nem limitou a existência de outras variantes de romance, o e-mail pessoal não extinguiu a carta, o comentário e o artigo (artigo assinado) não excluíram o editorial, o telefonema não acabou com a existência da conversa. Cada novo gênero aumenta e influencia os gêneros de determinada esfera e o seu desaparecimento se dá pela ausência das condições sociocomunicativas que o engendraram (por exemplo, a conversa de salão). 146 Convém ressaltar que outros autores, a exemplo de Vera Lúcia Menezes de Oliveira e Paiva, percebem no e-mail traços comuns a outros gêneros como o memorando, o bilhete, a conversa face a face e a interação telefônica (MARCUSCHI, L. A. & XAVIER, A.C, p. 2004). 147 Os resultados obtidos para essa variável apontam a carta147 e o blog como os dois maiores responsáveis pela produção de abreviações, seguidos do SMS, e-mail e diário. Vale ressaltar, porém, que as cartas são as primeiras colocadas por estarem situadas em um período em que a tradição das abreviações ainda era muito forte, séculos XVIII e XIX148, embora a necessidade precípua de economizar o material da escrita já tivesse sido em muito reduzida com o surgimento do papel. Em segundo lugar, o blog é o gênero que mais apresenta abreviação em seu texto. Convém lembrar que esse número aumenta à medida que o autor é de uma faixa etária menor, ou seja, mais jovem. O gênero SMS, terceiro na quantidade de abreviações, é utilizado por falantes jovens e adultos, de ambos os sexos, e também por empresas. O fator decisivo para a presença de abreviações nesse gênero é a quantidade de caracteres permitida ao usuário por mensagem enviada. Embora em menor número, os SMS’s empresariais também lançam mão de abreviações nas mensagens endereçadas aos seus clientes. O último gênero da lista, o diário tradicional, tem duas razões, a priori, para fazer uso de abreviações: primeiro, manter em segredo alguns nomes e/ou fatos que não devem ser de conhecimento público; a segunda, semelhante aos manuscritos em pergaminho, está ligada ao espaço oferecido pelo papel no qual o autor faz suas anotações. Vejamos a seguir o primeiro gênero analisado e seu comportamento no processo de abreviação: A CARTA Conforme podemos observar na Carta 01, a seguir, o número de abreviações utilizadas em cartas do século XVIII é bastante considerável, chegando a apresentar abreviações desde a saudação (ex.: Snor’), ao longo de toda a mensagem, se estendendo até o fechamento. Fato interessante e que merece destaque é a presença, muitas vezes, da forma abreviada convivendo 147 De um total de 450 cartas, apenas 2 não apresentam abreviações em seu texto, o que equivale a um percentual de 0,44% de cartas que não fazem uso de abreviações. 148 As cartas do século em que estamos, que foram por nós analisadas (pessoais e oficiais), apresentam um número resumidíssimo de abreviações quando comparadas com as dos séculos anteriores. 148 com a forma padrão (cf. linhas 7 e 29, respectivamente), ou seja, nãoabreviada, o que nos permite inferir que não era só a necessidade de abreviar que levava o autor a escrever dessa forma, mas a tradição ou o puro prazer de usar abreviações. Da abertura ao fechamento, usava-se abreviação. Em algumas cartas, havia casos onde sequer uma linha escapava desse processo de redução. Curioso é o fechamento quase categórico nessas cartas: Guarde Deus a Vossa Majestade por muitos anos para amparo de seus vassalos que era escrito da seguinte forma: Gde. Ds a VMgde. Mtos. ans. pa. ampo. de seus vassalos. Também o mês e o local eram escritos de forma abreviada: Re. de Pernco. 18 de Dezro de 1703 (em lugar de Recife de Pernambuco, 18 de dezembro de 1703). A Carta 02, uma carta ao leitor, traz um número bem menor de abreviações se comparada à Carta 01. Naquela as abreviações se resumem apenas aos pronomes e formas de tratamento. A Carta 03 pertence ao subgênero carta pessoal e, semelhante à Carta 02, restringe as abreviações às formas de tratamento e a uma forma no fechamento (P.S), além de um se escrito s’. As Cartas 04 e 05, da Bahia e da Paraíba, respectivamente, ambas do século XIX, são oficiais. Nelas a ocorrência de abreviações é visivelmente maior, sendo possível observar exemplos desde a abertura até o fechamento. A partir desses dados, percebemos uma estreita relação entre o gênero trabalhado e sua situação sócio-histórica na sociedade, visto que a depender do contexto, o mesmo gênero pode sofrer alterações de ordens várias. 149 Carta 01149(Oficial) Corpus do Projeto Textos Brasileiros dos Séculos XVIII e XIX 1703 Pella carta junta veio a conta q’. / deraõ a VMgde. os oficeaes da camara / de Itamca. das Ruinas do forte de Sta. Cruz da mesma Barra . e tendo eu / a mesma noticia, asssim q’. chegueý a / este governo, fuý ver aquella Fortal = / leza, a qual acheý acabada na altu = / ra do cordaõ, execpto o Portal, q’. esta = / va ainda por comessar. Acheý o / Balluarte da parte da Barra . huã / face delle arruinada no chaõ, e a ou = / tra, quazi na mesma forma; e porq’. / Se me dizia, q’. a Ruina poderia Ser / cauzada por culpa do impreitro. le = / veý dous mestres pedreiros, pa. ex = / aminarem a da. obra, e lhe mandeý / dar juramto., e ordeneý ao Provedor / da Fazda. Real desta cappnia., lhe tomas = / se o Seu de poimo., oqual vaý incluzo / com esta, e mandeý derribar o do. Ba / luarte, para Se tornar a levantar logo, e nelle Se anda trabalhando, por / Ser o q’. tem esta fortalleza mais ne = / cessro. pa. a defença daquella Barra, / pa. o por capaz de nelle poder labo = / rar a arthelharia. O pagamo. des = / ta reedeficaçaõ, ordenará VMgde. Se / Se ha de fazer por conta da sua Real / fazda. Se por conta do impreitro. / por q. assim o assenteý com elles, pa. com / brevidade Se acabar esta obra, em q. / Se fica trabalhando com todo o cui = / o cuidado. A principal cauza da Ru = / ina desta fortalleza foý a incapacida = / de do Sitio, emq. Se fundou e o pouco / fundmo. q’ Se lhe fez, sem grade nem / estacaria, principioandose os alicerces / em huã area pouco Segura, e com pe = / dra, naõ mto. grande. E Sem embargo de / q’. concidero alguã culpa ao impreitro. / por naõ fazer deligca. por segurar melhor / a obra, maýor me parece a dos engenros. / q’. lhe concentiraõ; pois o impreitro. po = / deria ignorar o como devia Segurala. / E os engenros. não devem concentir em / Semelhantes erros. Mostrando de / pois o tempo as Ruinas, q’. ameaça- / vaõ esta Fortalleza, por cauza do mar / q’. lhe vinha chegando, mandaraõ os / Engenros. fazer huã pequena ( ilegível ) / ou Arcen, por aquella parte / por onde / o mar a cometia, e vendo eu q’. nem / isto era bastante, pa. a Segurança da / da. Fortalleza, com o parecer do Sargto. / e os engenros., e de alguãs pessoas pra = / ticas, mandeý fazer huã estacada / por fora da fortalleza alguã couza / distante della, com quantidade de / pedra sequa; por ver Se por este / meýo arrimava o Mar a ( ilegível ) para / a parte da Fortalleza, e Livralla de / q’. o mar lhe naõ chegasse. e conforme / as noticias q’. tenho, vaý Surtindo effei / to este Remedio; porq’. me dizem vaý a = / reando, como queriamos. Com tudo isso / isso, naõ me parece ficar ainda Segura, / por q’. assim, como o mar arruinou / huã fortalleza de pedra, e Cal, milhor / arruinarâ esta pedra sequa q’. Se lhe / botou, em apodrecendo a estacada, e por tempos tornarâ a arruinar a / Fortalleza, q’. he Sem duvida, q’. Se o / mar lhe chegar com força, como fez / no Balluarte arruinado, a arruinarâ / toda; porq’. naõ conhecerlhe a fir = / meza q’. devia ter. O Impreiteýro Se / me defende com os engenros. e eu Se / elles foraõ vivos, lhes tornâra ( ilegível ) culpa. / porq’. Se os fundamos. naó podiaõ Ser / milhores, escuzàraõ de dar principio / a huã Fortalleza taõ grande q’. tem / custado mais de oitenta mil cruzados / e naõ Seý Se Se acabarâ com trinta, Sen / do bastante pa. aquelle Sitio qual / quer fortalleza de mto. menos custo. / Por Se atalhar â Ruína da da. Fortal = / leza, tenho posto, e poreý todo o cuidado, / e nem a vista do engenro., nem a mi = / nha lhe faltarâ, Se isto for bastante / pa. Se lhe remediar. Mo. alta, e Real Pessoa de / VMgde. gde. Des. mtos. ans. pa. ampo. de / Seus vassallos . Re. de Pernco. 18 de / Dezro. de 1703 149 Os termos abreviados vêm destacados na cor verde. 150 Carta 02150 (Ao leitor) Anno XXVII Sabado 4 de Janeiro de 1851. N.3 Correspondencia. AO PUBLICO Acabo de ser informado por pessoa de/minha intima e sincera amisade, que Sr./Dr. Pedro Autran da Malta e Albuquerque/acha-se sentido e queixoso contra mim, por/lhe haverem dito, que uma asquerosa e im-/moral correspondencia, que em avulso espa-/lharam contra S. S. Fôra impressa na mi-/nha typographia. Esta gratuita imputação, he tão inexacta/que me escusaria de responder; mas para/que tire do Sr. Dr. Autran, que tão traçoei-/ra e vilmente foi offendido, qualquer juizo/injusto, sem duvida, a meu respeito, des-/afio a esse ou esses calumniadores, que pro-/vem a vil e baixa imputação. Sinto, que o/sr. Dr. Autran só menos por momento acre-/ditasse, que um pai de familia consentiria/ que em sua typographia se imprimisse em/avulso que não respeitou o mais sagrado da/familia; sem embrago desculpo, e peço a S./S., que acreditando na minha sincera pala-/vra, atire para longe imputação que só ini-/migos meus o fariam acreditar. Eu vi esse asqueroso avulso – e mal pu-/de findar sua leitura, he impresso em ty-/pographia 10, não sou eu só que tenho typographia;/e para mais convencer peço a quem quer/que seja esse anonimo, que em honra a ver-/dade declare se foi em minha typographia/impresso o dito avulso. Tenho regeitado muitos impressos até/contra inimigos politicos, quando nelles se/involvem a honra ou o sagrado das familias;/a pouco tempo regeitei um impresso contra/o Sr. Dr. Francisco João Carneiro da Cunha,/e como consentia um contra o Sr. Dr. Au-/tran, em que não se respeitava a honra nem/amisade? Para tal não se presta a minha typogra-/phia; e sinto que haja ainda duvida a res-/peito. Sou pai de familia e sei avaliar o apreço/da honra, peço justiça porque tenho direito a ella. Recife, 3 de janeiro de 1851. Ignacio Bento de Layola. Carta 3 (Pessoal) Meo caro Conselheiro. São inexpressiveis os sentimentos de meo coração e eu não tenho expressões para manifestar lhe os meos agrade cimentos. Aqui chegou meo marido que narrou me a conferencia que teve com Vossa Excelencia e outra cousa eu não tinha á esperar de sua antiga amizade, que nos lisongeamos de saber retribuir. No dia 31 seguiremos para sua heroica provincia aonde espero receber e comprir fielmente suas ordens. Alli, como em qualquer lugar, bencinho será sempre um dos seos mais de- dicados amigos e leal soldado, eu só lhe peço que veja em mim a personificação da— gratidão. O nosso amigo Doutor Guimarães lh’entregará um pequeno volume com charutinhos de fumo que colhi no meo quintal: queria desculpar-me. Abraço lhe com muitas saudades e amizade, á Sinhá e as meninas sua amiguinha sempre. Maria Constança. 27 de Dezembro de 1888. Bencinho não lhe escreve porque está fóra. P.S.Não s’esqueça do Daltro. 150 Os termos abreviados nas cartas 2 e 3 vêm destacados em azul claro e verde escuro, respectivamente. 151 Carta 4151 (Oficial) 151 Os termos abreviados na carta 4 vêm sublinhados, semelhantemente à carta 5 a seguir. 152 Carta 5 (Oficial) Fato curioso, e que nos chamou a atenção, é a diferença visível quanto ao número de abreviações existentes nas cinco cartas aqui exemplificadas. A título de exemplo, destacamos as cartas 2 e 3 como aquelas que pouco ou quase nenhum uso de abreviações fazem, embora sejam ambas do século XIX, período em que estão situadas também as cartas 4 e 5. Ávidos por descobrirmos o(s) fator(es) responsáveis por tal diferença, observamos que aquelas, cartas 2 e 3, além de impressas, têm o jornal como suporte; enquanto 153 as cartas 1, 4 e 5 são manuscritas e utilizam o papel carta como suporte. Assim, decidimos analisar, a seguir, a influência ou não desses suportes utilizados (jornal, papel carta, tela do computador, entre outros), bem como a tecnologia predominante (manuscrita, impressa etc), a fim de atribuirmos a esses fatores o peso que lhes cabe no uso de abreviações. O BLOG Dentre os gêneros digitais aqui tratados, o blog foi o que mais uso fez de abreviações ao longo do texto. Seja para ganhar habilidade na hora de exercer a escrita eletrônica, seja para delimitar a linguagem de um grupo (a exemplo das gírias), ou mesmo por qualquer outra razão, o fato é que, quando pessoal e de autoria de jovens, principalmente, a abreviação é algo intrínseco ao texto produzido pelos usuários desse gênero. Vale salientar que, pelo fato de serem os de cunho pessoal, cujos autores são jovens, os que mais abreviações apresentam, os demais (blogs oficiais/públicos) não estão excluídos, tampouco aqueles cujos autores são adultos. Há apenas uma redução no que diz respeito ao uso das abreviações, fato que parece estar ligado a razões do tipo desconhecimento por parte do usuário, ou ainda, opção por escrever sem abreviar, principalmente aqueles que primam por uma maior clareza do texto. Conforme revela o Blog 01, abaixo, (Blog – www.sistersss.zip.net), a blogueira152, Ig utiliza abreviações em todo o seu texto, não restando uma linha sequer sem registrar a ocorrência desse recurso da língua. No site www.comunidadebrasileira, encontramos um comentário a respeito das abreviações utilizadas no gênero blog que afirma estarem os jovens inaugurando uma nova Língua Portuguesa, bizarra, e só compreensível entre os integrantes de galeras. Segundo esse site, os jovens tentam reproduzir na escrita nuances possíveis apenas na fala. Dentre as abreviações encontradas, algumas já estão cristalizadas e outras, como fze por fazer, aos poucos vão se inserindo no léxico do blogueiro. 152 Esse termo refere-se ao autor de páginas de blog. 154 Segundo Marcuschi (2002), “quando dominamos um gênero textual, não dominamos uma forma lingüística e sim uma forma de realizar lingüisticamente objetivos específicos em situações sociais particulares”. É o que fazem as autoras supracitadas quando adequam/moldam a sua linguagem ao gênero por elas utilizado, a fim de se identificarem naquela comunidade (no caso, a dos blogueiros). BLOG 1 A típica frase do diário tradicional “Querido diário” está, não tão lentamente, sendo substituída por registros os mais variados possíveis 155 encontrados no seu gênero correlato, o blog. Entretanto, algumas das parafernálias que compunham o cenário do diário tradicional, entre elas figurinhas, fotos e outros, mantêm seu lugar garantido nas páginas eletrônicas dos blogs, como pode ser visto acima. O SMS Embora não tenhamos dados que comprovem a estreita relação que há entre esse gênero e o telegrama, vimos neste o correlato do SMS, que funciona como as mensagens telegrafadas: curtas e com abreviações representar palavras e sinais. A propósito, primeiras para no telegrama colocava-se um “h” no lugar do acento agudo (ex. é ⇒ escrevia-se eh); lugar de “vg” em vírgula; “pf” no lugar de um ponto, e o “vão” visando economia de palavras à que, virava “vaum”, necessariamente, implicava economia de dinheiro153. Conforme já aludido, esse gênero impõe àquele que dele faz uso, um número restrito de caracteres (letras e sinais) que varia de 150 a 160. Dessa forma, caso o conteúdo a ser escrito seja longo, restará ao que escreve a opção de escrever abreviadamente, ou enviar mais de uma mensagem, o que implicará gastar mais tempo e pagar mais dinheiro pelo número de mensagens enviadas. Aqui também não há, ainda, uma padronização quanto à forma abreviada, variando esta de autor para autor e, às vezes, no próprio autor. É o caso de você, também, que, beijo, que ora aparecem abreviadas ora escritas na forma 153 (SANTOS, 2005). 156 padrão. É bem verdade que já existem listas de abreviaturas mais utilizadas pelos internautas (cf. Quadro 4) nesse e em outros gêneros afins. Resta-nos tão-somente familiarizar-nos com elas e navegar no ciberespaço. A SMS acima traz abreviadamente a seguinte mensagem: Kd vc q ñ ligô?Bjs., que escrita na forma tradicional (melhor dizendo, em outro gênero) seria: Cadê você que não ligou? Beijos. É visível a economia que o usuário desse gênero faz ao utilizarse de uma escrita que mostra traços próprios da oralidade, ao buscar escrever da forma como se pronuncia, dispensando não raras vezes o uso de vogais, semelhante à escrita semítica. O E-MAIL Este foi o quarto, dentre os gêneros aqui estudados, a apresentar abreviação em seus textos. Por tratar-se de um gênero virtual, cuja escrita apresenta um hibridismo entre o oral e a escrita, fica visível a presença de abreviações ao longo de suas mensagens, principalmente aquelas que já estão praticamente enraizadas no léxico dos internautas. De modo semelhante aos demais gêneros virtuais, a possibilidade de se ter aqui uma escrita síncrona, bastando que ambos estejam on-line, como nos chats, faz com que haja uma maior rapidez no ato de escrever, a fim de manter uma aparente sintonia com o destinatário, no que diz respeito ao tempo gasto para se responder a um email. É bom lembrar que, quanto mais tempo conectado à rede, maiores serão os gastos com o serviço de telefonia, ao menos nos casos em que não se dispõe do serviço de conexão a cabo. Esse fator pode ser decisivo na hora de se usar abreviação, visando à economia de tempo. Vejamos o exemplo a seguir: 157 E-mail 01 Data: De: Assunto: Para: Sun, 17 Apr 2005 21:18:20 -0300 (ART) Ver detalhes do contato fotos "fabiana souza silva" vixe!!! tomara mesmo q. vc. ou vcs. venham, vou adorar!!!!!!!!!!!!!! menina, mas q. historia foi aquela c.fulano??!! estou besta!!vais continuar c. ele assim mesmo?? já disse a Bet??bom, mas acho q. vc. conseguirá administar com sua ironia e seu humor refinado.aH!! q. historia eh essa de sucesso meu aqui? quem te disse isso? fiquei curiosa.teve um bom domingo??eu tive um otimo fim de semana, sozinha a minha moda, cinema, praia, um dvd, papos c. a família154. um beijão O DIÁRIO155 154 Aqui, o informante reduz as formas que, você, vocês e com a, respectivamente, q, vc, vcs e c. 155 Os termos abreviados vêm sublinhados em outra cor. 158 Como mencionado anteriormente, esse gênero, o último aqui relacionado, faz uso das abreviações em dois momentos: quando da necessidade de manter sob sigilo de outrem termos, nomes, expressões e outros que só convêm ao autor saber de que se trata; ou ainda, quando o espaço físico deixado pela página na qual serão registrados os fatos daquele dia obriga o autor a resumir a narrativa como um todo, ou se optar pela descrição minuciosa, ali escrever as palavras de forma abreviada (ver 18/09/05, acima). Esses são os principais fatores responsáveis pela existência da abreviação nesse gênero. Pode-se registrar hoje um maior número de abreviações no diário tradicional por influência, talvez, da escrita abreviada que se usa no meio digital. Assim, o autor faria uma simples transferência de código, utilizando o “internetês” no lugar do código comum, a língua “indicada” pelos gramáticos. A fim de melhor visualizarmos a ocorrência da abreviação em cada um dos gêneros supracitados, apresentamos abaixo um gráfico que revela, em termos de porcentagem, a relação entre o fenômeno em estudo e o gênero tratado: Gráfico 01 A abreviação e os gêneros 100 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0 Cartas E-mail Blog Diário SMS 159 O Gráfico 01 acima aponta a carta como o gênero responsável pelo maior uso de abreviações em seu texto, 98,93%. Em segundo lugar, vem o blog, com 70%; o SMS fica em terceiro com 65%; em quarto, o e-mail com 50% e, por último, o diário, com 33% de aplicação de abreviações. Um dado crucial que não pode ser esquecido é o período156 em que estão situados esses textos. Esse fator é aqui determinante quanto ao maior uso de abreviações no gênero. Ou seja, no gráfico exibido há um cruzamento de dados, no qual a carta só obteve esse percentual por estar situada nos séculos XVIII e XIX157, quando ainda predominava o uso de abreviações nesse gênero. Afinal, a variação cultural, como diz Marcuschi (2002), deve trazer conseqüências significativas para a variação de gêneros. Não podemos, pois, desconsiderar esse dado, a fim de evitarmos um falseamento nos resultados. 2.O estilo Para Bakhtin (1992), o estilo está indissoluvelmente ligado ao enunciado e a formas típicas de enunciados, isto é, aos gêneros do discurso. Segundo o autor, todo enunciado possui um estilo individual, mais perceptível em uns gêneros (os literários, por exemplo) e menos em outros (documentos oficiais), que requerem formas padronizadas. Na opinião dele, as palavras evocam uma profissão, um gênero, uma época, um grupo social e um “contexto” ou “contextos” onde vivem. Também Possenti (2001, p.245) assegura que certas escolhas158 são condicionadas uniformemente pelas circunstâncias. Assim, afirma o autor, o léxico utilizado por alguém que atinge seu dedo com um martelo não é o mesmo quando esse tem anunciada a morte de sua mãe. Partindo dessa premissa, dividimos os textos em formais e informais, e obtivemos os seguintes resultados: aqueles que utilizam um estilo mais elaborado, rebuscado, apresentam menos abreviações em sua escrita; ao 156 Se desconsiderarmos esse fator, teremos um falseamento nos resultados. Vale salientar que esses valores independem da porção textual. 158 Essas escolhas referem-se ao estilo adotado. 157 160 passo que os de estilo mais espontâneo, distenso, são detentores de mais abreviações. Segundo Possenti (2001, p.244): Mesmo sem nenhuma pretensão estética, a forma redobra o conteúdo: isto é, para assuntos triviais, uma forma informal, para assuntos mais “elevados”, uma forma socialmente mais valorizada. Aqui também cabe uma ressalva quanto aos números revelados: no gênero carta, mesmo aquelas que primam por um estilo padrão, o uso das abreviações independe desse fator. Como afirmou Bakhtin (op.cit.), as mudanças históricas dos estilos da língua são indissociáveis das mudanças que se efetuam nos gêneros do discurso. Nos demais gêneros, a ocorrência da abreviação está diretamente ligada ao estilo, ou seja, quanto mais informal, mais abreviação, e o inverso também. Segundo Bakhtin, as variações estilísticas possuem natureza social e não individual, refletindo as tendências sociais de uma época e de um grupo social. Para o autor, o estilo é pelo menos duas pessoas ou, mais precisamente, uma pessoa mais seu grupo social na forma de seu representante autorizado, o ouvinte – o participante constante na fala interior e exterior de uma pessoa (p.13). Também é Bakhtin quem afirma que selecionamos as palavras em função da pessoa do interlocutor, e esta: variará se se tratar de uma pessoa do mesmo grupo social ou não, se esta for inferior ou superior na hierarquia social, se estiver ligada ao locutor por laços sociais mais ou menos estreitos (pai, mãe, marido etc). Para o autor, selecionamos as palavras segundo as especificidades de um gênero. Com base nessa assertiva, inferimos que, a depender do gênero, tem-se um maior ou menor grau de formalidade e, conseqüentemente, maior ou menor número de abreviações. Vejamos como se dá o uso da abreviação quando cruzado com a variável estilo: 161 Gráfico 2 Abreviação e Estilo 100 80 60 Formal 40 Informal 20 0 Diário Blog Carta SMS E-mail Como demonstra o Gráfico 2, o processo de abreviação está ligado ao fator estilo, sendo o informal favorável ao surgimento dele, enquanto o formal, de certa maneira, inibe o uso de abreviações. A explicação parece estar ligada ao valor que alguns termos lingüísticos recebem quando avaliados socialmente. Possenti citando Gumperz (1968, p.220) diz que: Uma escolha do indivíduo entre alternativas possíveis num evento lingüístico particular pode revelar seu passado familiar e sua pretensão social, pode identificá-lo... como polido, grosseiro...e pode mesmo indicar se ele quer parecer amistoso ou distante, familiar ou diferente, superiosr ou inferior. Segundo afirma Possenti (2001, p.231), certas formas lingüísticas são consideradas mais ou menos elegantes, mais ou menos chulas, mais ou menos poéticas, mais ou menos exatas. No caso em estudo, a abreviação é considerada deselegante em um texto formal. Pelos resultados obtidos, os gêneros e-mail, blog, SMS e diário apresentam um número maior de abreviações quando o estilo utilizado é o informal. Aqui mais uma vez o gênero carta não apenas foge a essa regra, mas vai de encontro a ela: aquelas cujo texto era escrito em um estilo formal apresentam mais abreviações que as elaboradas em estilo informal. De novo o fator época é decisivo no que tange à ocorrência ou não de abreviações. 162 Segundo Bakhtin, cada época e cada grupo social têm seu repertório de formas de discurso na comunicação socioideológica. Aplicamos essa afirmação ao uso acentuado de abreviações nos séculos XVIII e XIX. A seguir, apresentamos exemplos de cada gênero trabalhado nos dois estilos, formal e informal. Vejamos: CARTA 6: Estilo Formal Corpus do Projeto Textos Brasileiros dos Séculos XVIII e XIX 1731 Snr’. Pella frota deste anno dei conta aVMgde. / dos excessos e demazias deq’ uzava D. Antonio / Domingos camaraõ Gouernador dos Indios pa. q’/ Sendo VMagde. seruido mandasse deuaçar do Seu / proçedimento pello Ouuidor desta capitania. Depois disso mepedio lça pa. hir acapitania do ce / ara q’ dista desta mais de 200 Legoas a onde foi fazer / nas Madeyras dos Indios as ( ilegível ) declaradas / na cartajunta de Leonel deAbreu Lima capam. / mor da da. capitania nomeado por VMagde. q’ proxi / mamte. hauia tomado posse daquelle Gouerno deq’ / me paresseu ha de dar boa conta. Fora da da. reprezentasaõ fes outras demazias / pellos caminhos emhuma Aldeya tirou hũ Me / çionario e por outro, eporrezaõ dos referidos proçe / dimentos dei orden ao do. capam. mor pa. oprender ca / zo q’ lâ o achasse.Pare siame q’ Sendo VMagde. seruido deuia orde/ nar ao ouuidor da mesma capitania do cearâ de / va saçe do procedimento do do. Camaraõ eq’a da. / deuassa sejunte aq’ ca se tirar noq’VMagde. / mandarâ Rezoluer oq’for seruido. Recife de / Pernambuco 2 deAbril de1731 CARTA 7: Estilo informal159 Papae, O Doutor Tavares aqui esteve para dar-lhe o seguinte recado do Marinho: que não tem podido ap- parecer-lhe pelas muitas occupações que tem tido e que nesta semana que começa iria sem falta a sua casa. Disse mais que o Martinneo vendeu a fazenda grande que possuía em São Paulo, mas que não é a que se limita com a de Vossa Mercê. Nada mais disse. Do filho amigoPedro. Rio, 22 de Dezembro de 1890. 159 As formas abreviadas na carta acima estão escritas em itálico. 163 Conforme dissemos anteriormente, era de se esperar que a Carta 6, redigida em estilo formal, apresentasse menos abreviações que a carta 7, elaborada em estilo menos formal. Entretanto, basta deter-nos na saudação da 1ª carta que logo percebemos a utilização de uma forma de tratamento – Senhor – escrita de forma abreviada – Snr – a que segue todo o texto, excetuando duas linhas – 3 e 5, as abreviações são encontradas com freqüência em todo o corpo da carta, mesmo em se tratando de uma carta oficial, cuja redação é feita em estilo formal. A segunda carta, uma carta pessoal, cujo estilo é menos formal e, exatamente por isso traria mais formas abreviadas, surpreende-nos ao apresentar da saudação ao fechamento apenas duas formas abreviadas, das quais uma é um pronome - Vossa Mercê- e a outra, uma forma de tratamento, amigo. BLOG 3: Estilo formal Vantagem: complementando o jornal Qualquer matéria sempre fica bem maior do que o espaço disponível. Muita coisa que seria interessante para os leitores acaba cortada. O blog atua como um complemento à coluna. No blog, publico a versão original do artigo, sem cortes, com todas aquelas informações mais detalhadas que não couberam no jornal, como sites das organizações citadas ou declarações ipsis litteris dos entrevistados. Por isso, seria impossível pensar minha coluna separadamente do blog. Para começar, fui convidado para escrever a coluna por causa do trabalho no blog. É no blog que faço minha prépauta online e debato a futura coluna com os leitores. E, por fim, o blog acolhe tudo o que não coube, ou não foi apropriado para publicação no jornal impresso. (http://www.liberallibertariolibertino.blogspot.com/) Blig: Provedor da IG BLOG 4: Estilo informal quarta-feira, 14 de julho de 2004 ola pessoal passei hj so pra dar um oi pq amanha tem aula cedinhu !!!tenhu q acordar as 6:30 pra me arrumar e ir estudar né... ne vou por imagem... bjao. ate o findi!!! http://farejador.ig.com.br/banner.cgi?url=http:%2F%2Fmaya_love.weblogger.com.br%2 F&returl Blig: Provedor da IG. 164 Como podemos ver, ao contrário do blog 3, redigido em estilo formal, e por isso mesmo não traz em suas nove linhas sequer uma abreviação, o blog 4, cujo estilo é informal, em suas três linhas, comporta cinco abreviações, o que representa uma média de quase duas formas abreviadas por linha, a saber: bj, pq, q, bjão e findi, significando: beijo, porque, que, beijão e fim de semana, respectivamente. SMS 2: Estilo informal Boa noite! Tudo bem com vc? Vc está melhor? Pq vc não responde?Saudades! Bjs! (M, A, +E, auditor, RE)160 SMS 3: Estilo formal Oi, seus creditos irao inspirar no dia 12/02 e voce nao podera originar mais chamadas. Para poder continuar falando normalmente insira novos creditos (Oi, 07.02.05) TIM INFORMA: cliente TIM TDMA pode enviar TIM Torpedos gratis para outro celular TIM nos dias 22 e 23/01. Aproveite, envie quantos TIM Torpedos quiser. (TIM 18/01/05) No mes de Maio, faça uma surpresa para sua mae ! Envie Torpedo do celular e mostre que voce nao esquece quem sempre lembra de voce. Apenas R$ 0,33/msg. (CLARO 07/05/05) Semelhante aos blogs 3 e 4, as SMSs 2 e 3, acima, também registram a ocorrência de abreviações, e maior incidência destas, se o estilo utilizado for o informal, ou menos formal. Das três SMSs formais, apenas uma traz um vocábulo abreviado (msg por mensagem), enquanto que são constatadas cinco abreviações em uma única SMS informal, o que corrobora nossa tese. São elas: vc, pq, bjs, significando você, porque e beijos. 160 O M diz respeito ao sexo Masculino; o A corresponde à faixa etária Adulto, e o +E indica o grau de escolaridade do autor, no nosso caso informa que a pessoa é formada. A profissão vem escrita por extenso. A cidade do informante vem representada pela sigla correspondente, nesse caso é Recife. 165 E-MAIL 2: Estilo formal De: Adicionar endereço Para: [email protected], Assunto: Plano de Desenvolvimento Institucional - Data: Wed, 25 May 2005 12:03:22 -0300 Caros Colegas, Solicitamos que nos enviem, com a maior brevidade possível, informaçoes sobre a revisão do tempo restantte para suas aposentadorias, cargo atual (Assistente I, Adjunto IV...) e maior titulação. Tais informaçoes têm por objetivo traçar o perfil das necessidades docentes do DLCV nos próximos anos, em especial no triênio 20052008. Conto com sua colaboração, Prazo. Sexta-feira dias 27/05 Atenciosamente W E-MAIL 3: Estilo informal Wed, 18 May 2005 14:29:27 -0300 (ART) Data: De: Ver detalhes do contato Assunto: Re: vou sim Para: "fabiana souza silva" <[email protected]> diga a junior q. se ele nao roncar darei a ele o prazer de compartilhar o quarto com ele e terei o privilegio de dormir c. ele no meu quarto, sera portanto, uma troca de privilegios. venham mesmo daremos muitas risadas.já marcou a qualificaçao? e fatima tens noticias dela?? um abs Eu Mais uma vez, aqui, repete-se a regra que diz serem os textos informais favoráveis à abreviação, e os formais não favoráveis. Nos e-mails acima, apenas o 3, de estilo informal, traz em suas linhas a ocorrência de 166 formas abreviadas (q, c, abs, para que, com e abraços), ao contrário do 2, onde forma alguma é escrita abreviadamente, salvo a sigla DLCV (Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas). DIÁRIO 2: Estilo informal DIÁRIO 3: Estilo formal161 Por último, o estilo informal utilizado no diário 2 vem ratificar o que dissemos no início: gêneros cujo estilo é informal favorecem o uso de abreviações, ao contrário dos formais, como nos mostra o diário 3. Aqui, é possível observar no diário 3 a presença de abreviaturas (Art. para Artigo), ou seja, formas cristalizadas, e não abreviações, que seriam variáveis de texto para texto, de autor para autor. 161 É interessante observar que ao estilo formal estão associadas às abreviaturas, enquanto que as abreviações ao estilo informal. 167 2. Instância de realização Essa variável está intimamente ligada à anterior, mais parecendo uma extensão daquela, visto que geralmente os textos de caráter pessoal, em tese, fazem uso de um estilo informal, enquanto os de caráter oficial primam por um estilo predominantemente formal. Levando-se em consideração que as condições de intimidade entre remetente/destinatário levam a uma situação de maior ou menor informalidade (PRETI, 2003), esperávamos que os textos oficiais, via de regra dirigidos a mais de um destinatário, favorecessem menos que os de cunho pessoal no que diz respeito ao uso de abreviações, uma vez que naqueles é mantido um maior distanciamento entre os produtores do texto que nos de natureza pessoal. Nossos resultados corroboraram essa tese, apresentando um percentual maior de abreviações para os textos pessoais em detrimento dos textos oficiais, excetuando-se aqui, mais uma vez, o gênero carta que, ao contrário dos e-mails, blogs, diários e SMS’s, e independentemente do volume de palavras, contém mais abreviações quando são de caráter oficial, ao menos as dos séculos XVIII e XIX, é o que nos mostra o Gráfico 3, abaixo: Gráfico 3 Abreviação e Instância de realização 100 Pública 50 0 Privada Diário Blog SMS Carta E-mail Como é possível observar, excluindo o gênero carta, todos os demais – e-mail, blog, diário e SMS -, são unânimes no uso predominante de abreviação quando o texto é pessoal e não oficial. Esses resultados corroboram as nossas hipóteses e estão de acordo com a literatura pertinente. Observemos alguns dos trechos selecionados nos gêneros estudados: 168 CARTA 8: Instância pública CARTA 9: Instância privada Bahia 23 de Março de 1888 Excelentissimo amigo e Senhor Conselheiro João Alfredo Correia d’Oliveira Esta será entregue a Vossa Excelência por meo particular amigo Doutor Joaquim Simões (ilegível) e Silva, que vai a essa côrte pleitear uma justa causa. Peço-lhe que o attenda, certo de que elle é um de meos melhores amigos. Refiro-me ao que já escrevi a Vossa Excelencia em cartas pelo correio. Disponha do (ilegível) amigo affeiçoado Inocencio Marques de Araújo Goes Enquanto a carta pública se restringe a abreviar pronomes e formas de tratamento (Dr., V. Sª), além do verbo guardar (Gde), a carta 9, tipo privada (pessoal), abrevia nomes (amigo affeiçoado), pronomes (Vossa Excelência) e conectores (que). 169 BLOG 4: Instância privada [Segunda-feira, Fevereiro 28, 2005] fala aih gentiiiiiiii... blxinha162?? esperu q xim... hihiih... cmg tah td certinhu.. keh diz... td otiminhuuu... pow... mt tempu q ngm poxta aki neh?? krak meu... abandonu gral du broguinhuuuu... bom... intaum to eu aki poxtandu neh... hehehhe... nem tenhu nenhuma 9da10 naum... pra variah um pokinhu... hihihi... axu q eh ixu genti...bjuxxx da Ra.... Por As Mina Du IG às [9:09 PM] http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=312ENO001 BLOG 5: Instância pública at 11:19 PM 12/11/2005 Kkkkk...... 162 O site comunidade brasileira diz que a troca de letras como o s, ss e ç pelo x busca representar a ingenuidade de uma criança que está aprendendo a falar. 170 Nesta variável, que ora denominamos Instância de realização, fica comprovada a influência exercida pelos gêneros do tipo privado (pessoal) quanto ao uso de abreviações. Basta compararmos os blogs 4 e 5 e vemos que no segundo, de tipo público, não há uma abreviação que seja em suas seis linhas. Vale salientar que esse blog, de teor lúdico, é escrito por um informante jovem, conseqüentemente menos escolarizado, estudante, ou seja, posssui todos os pré-requisitos para se usarem com mais freqüência abreviações. Basta lermos o início da mensagem, na qual são utilizadas letras para representar uma gargalhada (KKKKK), mas logo em seguida, ao dar início ao anúncio, classificado pelo blogueiro como sendo oficial, sequer uma abreviação é registrada, a fim de que se dê maior credibilidade à notícia. Ao passo que no primeiro, privado, com apenas quatro linhas, existem dezesseis abreviações, o que corresponde a uma média de quatro por linha. Semelhantemente, os SMSs privados apresentam uma média de duas abreviações por mensagem. Já os públicos apresentam apenas uma abreviação em três mensagens analisadas, qual seja: fev para fevereiro. SMS 4: Instância pública Oi, sua fatura no valor de 95,11 reais tem vencimento em 11/FEV/2005. Fique atento. Com sua conta esteja em debito automatico, desconsidere este aviso. (Oi, 10/02/05) TIM Informa: faça sua recarga atraves do seu proprio celular pelo * 244. Mais informações acesse o site www.timnordeste.com.br ou atendimento TIM *144. (TIM, 07/03/05) A partir de 22/02 sua Secretaria Claro tera mudanças. Para ouvir recados recebidos ate 21/2, ligue * 1077. Para saber todas as mudanças ligue gratis * 2077 (CLARO, 21/02/05) SMS 5: Instância privada Ei ta com o tel desligado meu bem. Vou fazer uma prova + tard te ligo bjos (M, A, +E, Empresário, BA). Saudade d vc linda! (M, A, +E, Comerciante-PB). Cheguei agora. Estou sem credt. Pode me v agora? Sim ou não? (M, A, +E, ContadorRE). 171 E-MAIL 4: Instância pública De: Y Para: Z Assunto: Re: confirmação de participação Data: Thu, 2 Dec 2004 09:07:45 -0200 Prezado(a) Professor(a) Acusamos o recebimento da sua confirmação e estamos encaminhando sua resposta para o setor competente. Atenciosamente, Coperve E-MAIL 5: Instância privada Data: Tue, 15 Mar 2005 09:50:51 -0300 (ART) De: X Assunto: olá Para: "fabiana souza silva" <[email protected]> pois eh, c. ainda estou sem computador, tenho q. esperar as oportunidades e assim vou dando noticias aos poucos.agora mesmo estou na UFSC na sl. de minha orientadora e posso usar o computador, entao a cada dia agendo nomes pra escrever ou responder.a mensagem q. vc. mandou deve ter sido vista p. meninas o cel. ficou c. elas.e aí melhor da infecçao e mais disposta, tomara q. sim. Um abraço 172 DIÁRIO 4: Instância pública DIÁRIO 5: Instância privada163 163 Nesse caso, a abreviatura P/ (para) foi registrada, além do sinal de + representando a conjunção mas. 173 O comportamento observado nos gêneros anteriores não é diferente com o diário e o e-mail, qual seja: quando se trata de um gênero tipo pessoal, a probabilidade de haver abreviações é muito maior do que se o gênero for do tipo oficial, conforme nos mostram os e-mails 5 e 4, respectivamente. O e-mail 4, oficial, não contém uma abreviação em todo o seu texto, ao passo que o email 5, pessoal, traz nove abreviações. Quanto aos diários, é possível afirmar que, quando estes são oficiais, as palavras não são escritas de forma abreviada, ao contrário do pessoal. Outro destaque que damos é à presença de abreviaturas, ou seja, formas já cristalizadas e padronizadas, de uso geral, em vez de abreviações, que seriam de ordem pessoal, e por isso variáveis. 4. Participantes Esse terceiro fator, como veremos a seguir, demonstra que, como já havíamos colocado em nossas hipóteses, os textos que apresentavam uma correspondência entre o número de participantes favorecem o surgimento de abreviações no corpo da mensagem. Essa relação é ainda mais estreita nos gêneros digitais, e-mail, blog e SMS, onde membros de uma mesma comunidade virtual, cujos interesses são comuns em um dado momento, partilham um conjunto de valores, objetivos, normas e interesses, assim como uma história, costumes e instrumentos (ERICKSON, 1997). Em nosso caso, temos a ocorrência de abreviação como um costume comum e partilhado entre os autores dos textos, que as utilizam com o interesse de ganhar tempo na elaboração da mensagem escrita. Os resultados estão expressos no Gráfico 4 a seguir: 174 Gráfico 4 Abreviação e Participantes 100 1XN 50 0 1X1 Diário Blog SMS Carta E-mail De acordo com o Gráfico 4, acima, tanto os gêneros tradicionais – carta e diário – quanto os digitais – e-mail, blog e SMS – registram um número maior de abreviação quando há uma correlação quanto ao número de participantes envolvidos no processo. A fim de melhor entendermos a relação entre o uso de abreviação e o número de participantes, selecionamos exemplos de cada um dos gêneros aqui estudados. Vejamos: 175 CARTA 10: Participantes 1X1 CARTA 11: Participantes: 1XN Anno de 1829 Diario de Pernambuco Segunda Feira 5 de Janeiro. Bem longe d’entreter opiniaõ contraria / áquella, que sempre entretive do Thezou- /reiro, e mais agentes do Loteria Publica em / favor do Seminario de Olinda, notto porem / que que se naõ tenha publicado huma Lista Ge- / ral, empreça, porque em realidade quem ar- / riscou o seu dinheiro, e na melhor fé, quer / taõbem na mesma boa fé, ter hum dezenga- / no em forma. Eu ví Srs. Redactores, quei- / xumes contra o Thezoureiro, que precedeo / o actual, e naõ me atrevo a dizer, que fos- / sem bem fundados, mas se assim he, elles / taõbem revertem agora sobre o Sr. Martino. Sou Srs. Redactores. 176 A Carta 10, acima, inserida na categoria 1X1, quanto ao número de participantes, traz abreviações desde a saudação até o fechamento. O mesmo não ocorre na carta 11, cujo destinatário é em número maior que um e registra apenas três ocorrências de abreviações, todas formas de tratamento, especificamente Sr(s). De igual modo, o blog 6, abaixo, cuja relação é 1XN, não traz uma abreviação sequer. Já o blog 7, a seguir, endereçado a apenas um receptor, tem suas dezoito linhas “recheadas” de abreviações. BLOG 6: Participantes: 1XN 22/07/2004 11:42 http://fumado_cefeteq.blig.ig.com.br/ Atenção !!! Por motivos de força maior, o blig não esta mais sendo atualizado todo "dia” (madrugada). Seguem os motivos: 1º- o blig agora não permite mais de uma atualização por dia (ou madrugada). 2º- Estou sem telefone em casa(brigas constantes com a telemar). 3º- Por mais incrivél que possa parecer, eu estou trabalhando (aliás, estou postando da agência onde trabalho.). E por falar em trabalho, se vocês quiserem me visitar, ou se interessarem em se inscrever na agência. Ai vai uma propagandazinha!!! (A logo abaixo fui eu que fiz.) BLOG 7: Participantes: 1X1 http://www.mininas_tpm.blogger.com.br/ Terça-feira, Abril 26, 2005 to mó triste ultimamente e ainda sei bem o por quê...td começou com uma paixão q to sentindo e não sei se queria ta assim......ele é um cara lindo, fofo, me agrada mto msm, mas ta foda, pois ele ta afim de outra amiga minha e ela tbm ta mo afim dele só q nenhum dos dois ta sabendo q to afim dele então isso não impede q eles se aproximem, pois eles nem sabem disso......só q eu me peguei com mto ciúme deles no domingo qdo fomos a casa dele e lá vi q to a fim msm........ Antes disso td eu tbm aprontei com uma amiga q não merecia o q fiz com ela....cara amo mto aquela garota e ela sabe qto é importante na minha vida, mas eu fiz uma cagada com ela sem querer e td por ter ouvido errado as palavras dela momentos q ninguém consegue explicar mto menos eu........queria não ter feito o q fiz, mas não posso voltar no tempo e concertar meus erros falei com ela, mas ela me ignora como se eu fosse uma estranha......assim ta foda e ainda por cima ta chegando época de prova e desavenças nunca são boas pra ninguém muito menos na época de prova.......td por causa de um menino q eu nem tava ligando pra ele e ele muito menos pra mim, mas acabou acontecendo e já não sei o q dizer........só queria pedir desculpas outra vez.....só sei q queria ta com alguém pra me consolar e me acalmar nesse momento triste q me encontro................ Bjos e até mais Ju 177 Também nos SMSs (ver SMS 6 e 7) e e-mails (ver e-mails 6 e 7) a relação é inversamente proporcional. Ou seja: quanto maior o número de receptores, menor o número de abreviações. Sequer uma forma abreviada aparece quando o SMS tem um número plural de receptores (cf.SMS 6). Já os com um só destinatário possuem mais de uma abreviação por mensagem (cf. SMS 7). SMS 6: Participantes: 1XN Chegaram os NOVOS papeis de paredes do incriveis! Exclusivos para clientes CLARO. Acesse agora Portal Claro do navegador web do celular e escolha o seu! (CLARO, 11/04/05) TIM INFORMA: Megatim Torpedos. Aproveite a promoção ate 30/04 e compre 300 torpedos a R$ 9,90. Você paga menos de 4 centavos por torpedo enviado (TIM 18/01/05) Coloque os eu Oi no ritmo da MTV, chegou o portal TONS MTV exclusivo para clientes Oi, são mais de 500 tons para animar o toque do seu Oi (Oi, 03/04/05) SMS 7: Participantes 1X1 Nao. Estou indo p Goiana c o coral. Amanha te ligo (F, J164, +E, Empresária-PB) Se puder, ligue pra mim. O seu cel n~ atende. (F, A, +E, Professora - PB) Essa placa deve c d outro Estado q no site do Detran daqui não consta nada. Tem q saber qual o estado pra poder olhar o site (M, J, +E, Servidor Publico – PB) Bom dia bb! (M, A, +E, Auditor - RE) No caso dos e-mails, fizemos questão de pegar tanto aquele cujo número de participantes era igual quanto o de número plural de receptores de um mesmo informante, visando explicitar o fenômeno. Dessa forma, quando o autor do e-mail dirige-se a mais de um destinatário (ver e-mail 6, a seguir), não usa ou ao menos evita usar abreviação; enquanto que as utiliza quando o receptor é uma só pessoa, conforme vemos no e-mail 7, abaixo. Aqui, o F é o símbolo utilizado para o sexo Feminino, e o J diz que a pessoa está inserida na classe dos Jovens. 164 178 E-MAIL 6: Participantes: 1XN Data: Thu, 24 Mar 2005 20:02:54 -0300 (ART) De: W Assunto: novo telefone Para: D Olá amigos! já tenho telefone em Floripa. eh 48 232-1148, se precisarem de alguma coisa eh só ligar. Feliz Páscoa Um abraço, Z E-MAIL 7: Participantes: 1X1 Wed, 23 Mar 2005 20:21:17 -0300 (ART) Data: De: Ver detalhes do contato Assunto: Re: Depoimento emocionado de Luiz Fernando Veríssimo Para: "fabiana souza silva" <[email protected]> Adorei!!!!!!!!!!!!!! já soube q. conversou bastante com nosso ídolo, me conta tudo, vai.... por aqui tudo ótimo bjos É interessante observar que, de acordo com os exemplos acima, emails 6 e 7, a depender do número de participantes, o autor do texto utiliza um maior ou menor número de abreviação. No caso desse remetente, a mesma pessoa nos dois e-mails, temos uma ocorrência explicitamente maior de abreviações quando o número de participantes é igual, ou seja, 1X1, e menor quando não há uma correlação entre eles, nesse caso um remetente para vários destinatários. 179 DIÁRIO 6: Participantes: 1X1 No gênero diário, a regra permanece: quando escrito para uma só pessoa, o número de abreviações é superior àquele cujo destinatário é em número plural, como demonstra o diário 7, no qual a única forma abreviada é nº, além da sigla FG-5 . No diário 6, as formas mais, para e Santa foram reduzidas a +, p/ e Sta, respectivamente. DIÁRIO 7: Participantes: 1XN 180 6. Propósito comunicativo Seguindo a sugestão dada por Thomas Erickson (1997), quando da observação do discurso on-line, escolhemos a variável Propósito Comunicativo como sendo a quarta analisada em nosso trabalho, a fim de estabelecer a relação existente, se é que há, entre o uso de abreviação e o propósito a que se destina o texto. Estendemos aos gêneros carta e diário o cruzamento com esse fator, uma vez que entendemos que não há texto ou discurso neutro, sem objetivo, sem propósito. Em outras palavras, quando o locutor busca produzir um efeito dentre os admissíveis, tem que escolher em meio aos disponíveis, tem que “trabalhar” a língua a fim de impetrar o efeito desejado (POSSENTI, 2001, p.215). Como já dito anteriormente, acreditamos que os textos cujo propósito é informar apresentam menos abreviações do que os textos em cuja redação há uma escrita com menor grau de informatividade e maior teor lúdico em seu discurso. Denominamos como lúdicos aqueles textos que visam mais ao divertimento que a qualquer outro objetivo. No Gráfico 5, abaixo, temos demonstrado o comportamento da abreviação quando relacionada ao propósito comunicativo do produtor do texto: Gráfico 5 Abreviação e Propósito Comunicativo 100 Informar 50 0 Divertir Diário Blog SMS Carta E-mail 181 Conforme observamos, há uma retenção praticamente categórica do uso das abreviações quando o texto possui um propósito único ou primordial de informar, o que não elimina a existência de abreviações em si. Em contrapartida, aqueles cuja temática gira em torno de um discurso lúdico, com caráter de diversão, apresentam mais abreviações em suas mensagens. Esses dados ratificam o que diz Possenti (2001, p. 259) citando Gumperz (1982) acerca da escolha da linguagem em detrimento da situação: O falante é considerado capaz de variar não só segundo o contexto, o que é relevante, mas segundo seus objetivos (grifo nosso), embora não necessariamente esteja consciente desse fato. Dentre os gêneros selecionados aqui, todos os da esfera digital corroboram essas afirmações. Daqueles ditos tradicionais, a carta foi o único que não obedeceu à regra, utilizando abreviações independentemente do propósito a que se prestava, informar ou divertir. Mais uma vez é mister lembrarmos que estas estão situadas nos séculos XVIII e XIX, período em que a tradição no uso de abreviações ainda era mantida. Os exemplos a seguir nos dão uma noção clara de como o uso de formas abreviadas está ligado diretamente com o propósito comunicativo do autor do texto: Se observarmos as cartas a seguir, veremos uma maior ocorrência de formas abreviadas na Carta 12, e um número bem menor na Carta 13, embora se trate de um texto lúdico. A razão para tal acontecimento se deve ao fato de ser essa impressa e não manuscrita, como aquela. Ou seja, a depender da tecnologia utilizada (manuscrita, impressa ou digital), teremos um maior ou menor uso de abreviações. 182 CARTA 12: Propósito informativo Illmo e Exmo Sr General Prezide. emais Sres Deputados. Passe do que constar. Re. em Iunta de 14 de Outubro de 1794 N 1o (ilegível) LuRoy Coelho da Sa. Dizem os admenistradores actuaes doContracto / dos Dizimos Reaes desta Capitania quesendo publico que a / Real Iunta admenistrou estemesmoContracto alguns / annos antes d’ arremataçaõ quefizeraõ seusConstituintes / e que parabem desua Iustiça lhes heprecizo queesta Re= / al IuntadaFazenda lhemande dar porCertidaõ / se o Engenho Uboca sito na FregueziadeSerinhaem per= / tencente aos Religiozos Carmelitas dareforma Toroni= / eapagou Dizimo do açucar quefez, aquantidade deCaixas, / earrobas querecebeo aReal Fazenda, easim mais a / copia daprimeiraCondiçaõ do Termo dasua aremataçaõ. P. aV. Excia. e Mces. Sejaõ ser= / vidos mandar aos Suppes. aCertidaõ E. R. Mces. CARTA 13: Propósito lúdico Paris— 13 de Janeiro 79. Presado João Alfredo, Espero que esteja muito melhor; n’este caso e se puder sahir, venha jantar hoje conosco ás 7 horas en famille. Os Penêdos são as unicas pessôas estranhas como estão de passagem para o Sul, me fazem o obsequio de nos dar algumas horas para estarmos juntos. Sempre. Primo e Amigo affeiçoado Nioac. Corroborando nossa hipótese, os demais gêneros seguem a mesma regra: se o texto é escrito com um propósito lúdico, e não informativo, tem-se um uso acentuado de abreviações, conforme nos mostram o blog, SMS e-mail e diário, cujo propósito não é primordialmente informativo. BLOG 8: Propósito informativo Parâmetros novos O professor Jay Rosen, da Escola de Jornalismo da Universidade de Nova York e um dos participantes da reunião na Universidade de Harvard, publicou um rascunho de sua apresentação no qual segue a mesma linha desenvolvida por este Observatório "Blogs surfaram no tsumani", para afirmar que a cobertura da tragédia asiática mostrou que os repórteres amadores podem ter um papel essencial na informação pública, especialmente em situações de calamidade. Isto foi reconhecido até pela 183 grande imprensa e acabou contribuindo para tornar anacrônica a dicotomia entre blogs e jornalismo. Começa a surgir um consenso de que o problema não é o diploma ou o registro, mas sim a credibilidade. E é neste sentido que apareceram alguns dados novos, como por exemplo, o depoimento do dublê de jornalista/blogueiro Christopher Allbritton, que ficou famoso por ter ido por conta própria a Bagdá, em 2003, para cobrir a invasão americana pelo seu blog Back to Bagdá. Em entrevista à revista Wired, Allbritton admitiu que no começo do seu trabalho no Iraque a emoção pessoal falava mais alto, mas, quando começou a ser lido por 25 mil visitantes diários em seu blog, ele sentiu necessidade de ser muito mais preciso nas informações porque senão suas reportagens deixariam de ser confiáveis. O blogueiro de Bagdá não é o único e nem o primeiro jornalista que começa a descobrir que a busca de novos parâmetros de credibilidade não está nas reuniões de diretoria dos jornais e televisões, mas entre os leitores, ouvintes, navegadores e espectadores. São eles que detêm a chave do enigma que jornalistas e o público devem decifrar. BLOG 9: Propósito lúdico [Segunda-feira, Outubro 18, 2004] GALERINHA!!! Por motivos de força maior!! Eu to pregui de postar o meu blog!!! Hehehe] só to aki pra avisar vcs q eu postei fotos novas no meu flog!! Entrem lá!!! Www.clauvillaca.fotoblog.uol.com.br por C v M de o * 10:41 pm www.clauvillaca.zip.net SMS 8: Propósito informativo Oi, sua fatura no valor de R$ 80, 90 reais tem vencimento em 11/MAR/2005. Fique atento. Com sua conta esteja em debito automático, descons (Oi, 07/03/05). Promoção Natal e Claro. Cadastro confirmado. Você escolheu ganhar R$ 600 de bônus em 24 parcelas. Insira créditos todo mês para ganhar. CLARO que você tem mais (CLARO, 14/04/05). SMS 9: Propósito lúdico Karoll vc é 1 ds minhas melhores amigas continue sempre assim te adoro Kiss. (F, J, -E, Estudante-PB) Uma conclusão: gosto de vc; um desejo: estar com vc; um voto: suas felicidade; uma ideia: ter vc perto d mim; um sonho: vc me querer; uma emoção: meu 1 beijo c/ vc; um dia longo: te amando; um pedido: q vc me ame; um objetivo: conquistar vc; um ciúme: so d vc; um medo: d te perder; um aviso: estou t esperando.(M, J, E, Estudante-PB) 184 E-MAIL 7: Propósito informativo Data: Sun, 6 Mar 2005 11:46:55 -0300 Assunto: En: proposta dedução no IRPF - v amos lutar! De: Para: Adicionar endereço "fabianasouzasilva" <[email protected]> Assunto: proposta dedução no IRPF - vamos lutar! Caros colegas, Considerando o arrocho a que vimos sendo submetidos historicamente e o desgoverno na aplicação das verbas arrecadadas pelos tributos, venho refletindo há muito sobre propor um projeto que nos dê um "pequeno refresco no bolso”. Ganhamos pouco e ainda "pagamos para trabalhar", pois não temos auxílio transporte, paletó, assessoria, etc etc etc como recebem os senhores Deputados que elegemos para nos representar. Por isso, estou encaminhando uma sugestão de texto abaixo que pode ser "bombardeada" sobre os deputados em Brasília (IRPF é Federal), para que torçamos por um efeito similar ao que houve com a sem-vergonha lei pretendida pelo Sr. Severino Cavalcante. * Acesse o site da Câmara dos Deputados: http://www.camara.gov.br/internet/faleconosco * Em "Escolha o assunto", selecione "Participação Popular". * Em "Participação Popular", selecione "Sua proposta pode virar Lei". * Em "Sua proposta pode virar Lei", selecione "Ouvidoria Parlamentar". * Em "Ouvidoria Parlamentar", selecione "Entre em contato". * Em "Escolha o assunto", selecione "Deputados". * Em "Escolha o assunto", selecione "Solicitar". Em seguida preencha o formulário e encaminhe nossa proposta. Texto sugerido: Senhores Deputados, Em função dos gastos operacionais do exercício da função de Professor do Ensino Superior, que implica aquisição continuada de livros, equipamentos de informática (incluindo upgrade), assinaturas de periódicos e de associações acadêmicas, proponho a criação de dispositivo de abatimento mensal de 15% sobre o valor dos vencimentos numa rubrica como "gastos operacionais da docência superior" nas regras do IRPF, a partir do ajuste 2006. 185 E-MAIL 8: Propósito Lúdico Data: De: Wed, 27 Apr 2005 10:35:35 -0300 (ART) Adicionar endereço Assunto: Vida Para: "Fabiana Souza" <[email protected]> Oi, Recebi esta msg de uma amiga e achei tão linda e importnte q resolvi q vcs precisavam conhecê-la.Karla, Josivan, Rachel e Wilavia, sinto muita saudade de vcs !!Rafa recebi essa msg de Thereza!!Karenina, Kd vc??? Saudades!!Liana, mostra p tua mãe!!E beijos a todos !!! Mi DIÁRIO 7: Propósito informativo 186 DIÁRIO 8: Propósito Lúdico165 7. Suporte Como já havíamos mencionado no início do nosso trabalho, são três as tecnologias aqui estudadas: a do manuscrito, a do impresso, e a do digital. À primeira correspondiam como suporte da escrita os papiros e os pergaminhos, até que chegasse o papel, material utilizado a partir da sua descoberta pelos chineses, e que veio baratear a escrita, já que seu antecedente, o pergaminho, apresentava um preço muito elevado. Na era do impresso, o papel já estava difundido o bastante para que todos quanto dele faziam uso tivessem seus escritos divulgados sem maiores despesas. 165 Neste caso, a palavra quarta é substituída pelo ordinal 4ª, a preposição para por P/, a conjunção mas por +, a expressão mais ou menos, por + ou -, e a conjunção quando reduzida a qdo. 187 A era digital surgiu anunciando o fim do papel, uma vez que tudo a partir dela seria arquivado em memórias virtuais. Assim, a razão que fizera com que surgissem as abreviações, qual seja, o elevado preço do material da escrita, o pergaminho, na era do impresso e do digital, já não tem mais razão de ser. Entretanto, mesmo com a propagação do papel e a alta tecnologia da tela do computador e do telefone celular (suporte das mensagens de texto), as abreviações não tiveram sua extinção decretada. Ao contrário, se pudemos notar uma redução destas no impresso, o mesmo não ocorre no digital, que parece fazer com que as abreviações ressurjam com tamanho destaque, a ponto de provocar não só interesse e curiosidade, mas também polêmicas166. O mais notável de tudo é que, dentre todos os sinais, símbolos e siglas, sem esquecer os emoticons, muitos deles têm semelhanças com os sinais abreviativos utilizados nos pergaminhos e inscrições latinas datadas do século II a.C. A partir dessas informações, vimos como imprescindível a inclusão da variável Suporte no processo em estudo, a fim de comprovarmos ou não a relação dos meios utilizados e a ocorrência da abreviação. Após analisarmos os dados, obtivemos os seguintes resultados: o material que corresponde à tecnologia manuscrita, no nosso caso as cartas, cujo suporte é o papel, apresenta mais abreviações que os da tecnologia impressa (embora aqui também o suporte utilizado seja o papel) e da digital, havendo nesta última uma retomada daquelas. De suma importância é ressaltar aqui o fato de ter sido o volume de exemplos e a porção de textos analisados distribuídos de forma igualitária o que descarta a hipótese de possível má distribuição da amostra. No Gráfico 6, a seguir, temos expressos os valores correspondentes ao processo da abreviação e sua relação com o suporte: Visto que alguns pais associam o uso da escrita abreviada a algum tipo de desvio de comportamento que necessariamente prejudica o desempenho do filho nas relações sociais, principalmente na escola, professores há que defendem o uso da abreviação em seu “habitat” natural, ou seja, na linguagem da tela; sendo porém preservada a forma padrão das palavras em suas atividades acadêmicas. 166 188 Gráfico 6 Abreviação e Suporte 100 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0 Papel Celular Computador É visível o papel que o suporte exerce quanto ao maior ou menor uso de abreviações nos textos produzidos. Como já era esperado, o meio impresso, mesmo tendo o papel como suporte, no caso das cartas e diários, é aquele que menos favorece o surgimento de abreviação: de um total de 60 textos, apenas os que contêm pronomes de tratamento registram abreviações, o que equivale a um total de 10%, uma vez que das dez classes de palavras existentes, apenas uma é abreviada. Em seguida vem o digital, que engloba o computador e o celular, com 50% de ocorrências em 180 textos, contra 95% de abreviações em 60 textos manuscritos, meio por natureza propiciador do surgimento de abreviações. Vale ressaltar que, embora o suporte aqui seja o papel, semelhante ao caso dos impressos, a tecnologia manuscrita prevalece, fazendo surgir mais abreviações que no impresso. Ou seja, o fator determinante para um maior uso de abreviações não é apenas o suporte, mas também a tecnologia utilizada. Entendemos como tecnologia, processos, métodos, meios e instrumentos utilizados em domínios da atividade humana (cf. HOUAISS, 2001, p. 2683). No nosso caso, trata-se da escrita. De um total de 300 textos, 153 apresentam abreviações. Esses resultados permitem-nos inferir que, tanto na tecnologia manuscrita quanto na digital, onde há uma relação direta da mão com o texto, ao contrário da tecnologia impressa, a 189 recorrência ao uso de formas abreviadas é visivelmente maior, já que a necessidade de economizar tempo leva a uma simplificação lingüística. Observemos os exemplos abaixo: PAPEL – CARTA: Corpus do Projeto Textos Brasileiros dos Séculos XVIII e XIX 1729 Sor. He VMagde. Seruido por ordem de 14 de / Dezembropassado q’ eu mande Logo dar premçi/pio a caza da camara, e cadeya desta vila do Re/çife, com o dinheiro depozitado q’ Remanesseo do / Subçidio Lançadopa.hú molhe q’ aqui Se fes, eo’q / faltaçe pa. ella Seempuzeçe por finta ou como me/lhor paresese, e mais Suaue ao Pouo, e eu o con/cordasce com os offes. da camara. Em execusaõ desta ordem fica esta obra posta / apregaõ pelos mesmos offes. da camara, pa. Sea/ Rematar o qm. mais barato afizer, por opontamtos. / feitos pelos offes. emginheiros, como Se costuma / praticar nas obras de VMagde. pelaplanta q’oz mesmos emginheiros hauiaõ feito deq’ dei conta / a VMagde. E pelo q’ tenho comferido /com os dtos. offes. da camara o dinheiro q’ faltar Se / tirarâ por huma finta, aqual eide procurar Se / Safeita com igualdade poçiuel, eq’ emtudo Sefas/sa esta obra com a aRecadassaõ nessesa. e com abre/uidade poçiuel pela neçeçide. q’ ha della, deq’ dou com/ta a VMagde. Recife dePernambuco 21 de Mayo / de1729 DuarteSodre Pereira O primeiro suporte que destacamos é o papel-carta que, como aludido antes, substituiu o pergaminho, principal responsável pelo surgimento de abreviações. Como podemos observar na carta acima, o uso de formas abreviadas é tão corrente que apenas uma linha não registra alguma redução. É mister, porém, lembrar que quando as cartas, fossem pessoais, oficiais, ou ao leitor, eram impressas e não manuscritas, as formas abreviadas se restringiam a abreviaturas, ou seja, formas padronizadas, de uso geral e que, na maioria das vezes, eram pronomes e formas de tratamento. Os demais gêneros, blogs, e-mails, SMSs e diários têm comportamento similar, embora os suportes sejam a tela do computador, o telefone celular e o papel, respectivamente. Contudo, há uma presença maior de abreviações nos gêneros cujo suporte é o computador, visto que a própria linguagem utilizada nesse suporte prima por uma redução. Se atentarmos para o próprio nome dos gêneros que dele fazem uso, perceberemos que todos têm 190 seu nome abreviado ou associado a uma sigla – BLOG (de weblog), e-mail (de electronic mail), CHAT (de chatter), WEB (de world wide web), entre outros. A busca por economizar tempo (e dinheiro), a fim de se alcançar uma escrita mais rápida, leva os usuários desses gêneros, e também do SMS, a escreverem de forma abreviada, elevando o número de simplificações lingüísticas nesses suportes. TELA DO COMPUTADOR: Data: De: Tue, 19 Apr 2005 11:55:18 -0300 (ART) Adicionar endereço Assunto: Livro Para: "Fabiana Souza" <[email protected]> Oi, Fabiana sei q vc é super ocupada + gostaria de te pedir um favor muito grande, vc teria como me conseguir o seguinte livro: Princípios de Lingüistica Geral, Ed. Vozes, Autor: Mattoso Câmara.Por que eu me comuniquei com outra profª e ela me disse p começar a ler esse livro o mais breve possível, pois ela me disse q poderia me orientar por onde eu devo ca,minhar p entrar no mestrado.Se não for incomodo lhe poedir isso pq eu não tenho acesso a nenhuma biblioteca e caso vc consiga eu tiro uma xerox eu leio logo e te devolvo. Vc é quem diz, tá Ok? Agradecendo antecipadamente, M TELEFONE CELULAR: A) q deus cm a sua imensa sabdoria, trag-lhe paz, alegria e principalmnt mta flicidad, pos vc merec, pq e mto “spcial” fliz ano novo...! q em 2004 vc reali (sic) seus sonhos (m, a, +e, balconista-pb). B) Seu celular tem 1 ligacao perdida de 08388034663, 08/05, 18:20. CLARO 191 C) ,,,, .*. ( , ”) (“ ,) (‘)==() () (‘) ,,,, .*. ( , ”) (“ ,) (‘)==() ((‘) ,,, *. ( ‘X’ ,) (‘)==() (‘) Um bjo p/ vc! Assim como nos e-mails e nos blogs, a presença de uma escrita abreviada, com sinais e símbolos, além da utilização de emoticons para exprimir os sentimentos do autor do texto, nos SMSs também encontramos uma escrita híbrida, que se utiliza de vários recursos, entre eles letras com valor fonético, signos transformados em ícones, bem como o recurso à ideografia numa tentativa de simplificar ao máximo os elementos da escrita. Pudemos observar claramente esse fato, ao analisarmos os exemplos a, b e c acima. No exemplo c, o usuário do SMS utiliza apenas sinais do teclado para criar imagens que dispensam o uso de palavras que, quando são utilizadas, sofrem abreviações (bjo por beijo; p/ por para; vc por você). • Das variáveis estruturais 1. Extensão do texto Nos gêneros tradicionais, a carta e o diário, foi possível observar que, naquelas, tanto as que continham mais ou menos que dez linhas traziam em si alguma abreviação, quer na abertura, saudação ou fechamento. E mais: algumas tinham esse recurso de forma diretamente proporcional, ou seja, quanto maior o tamanho do texto, maior o número de abreviações nele contidas. Esse fator é comum às cartas de RE, PB e BA. Quanto ao gênero 192 diário, é visível a relação que há entre a extensão do texto e a probabilidade de nele ocorrerem abreviações. Atribuímos a essa constatação o fato de ser limitado, espacialmente falando, o local reservado para o autor fazer suas anotações diárias, o que o leva a ou resumir os fatos, ou narrá-los sem cortes, mas com palavras escritas de forma abreviada. No que concerne aos gêneros digitais, o SMS é aquele que, por natureza, delimita ao usuário o número de caracteres de que este pode dispor em seu texto – de 150 a 160, incluindo acentuação e pontuação -. Assim sendo, o autor da mensagem de texto vê-se obrigado a fazer uso de um maior número de abreviações, a fim de poder dizer, em poucas linhas (caracteres), aquilo que certamente despenderia mais palavras. Em seguida vêm os blogs e e-mails, ambos pessoais, já que estes, quando oficiais, contêm bem menos abreviações em si. Convém lembrar também que esses dois últimos gêneros citados, em geral, são menos extensos quando apresentam um caráter privado, e não público, o que talvez favoreça, em parte, o número reduzido de abreviações, uma vez que a mensagem em si já é curta, abreviada. O fenômeno da abreviação fica mais bem visualizado a partir dos números fornecidos pelo Gráfico 7: Gráfico 7 Extensão do Texto 100 90 80 70 60 até dez linhas mais de dez linhas 50 40 30 20 10 0 carta diário blog sms e-mail 193 Podemos concluir, pelos números expressos, que os autores dos gêneros carta, blog e e-mail fazem uso de abreviações quer tenha o texto mais de dez ou até dez linhas. Em outras palavras, independente da extensão do texto, neles haverá abreviação. No que concerne aos dois outros gêneros, quais sejam: diário e SMS, se o texto ultrapassa as dez linhas, a probabilidade de usar abreviações tende a aumentar. Ou seja, quanto maior o texto do diário ou do SMS, mais reduções as palavras sofrerão. Vejamos alguns exemplos: CARTA 14 (até 10 linhas) 1745 Illmo e Exmo Snor A planta que semeapresenta Com o despaxo de V. Exa Rubrica / da com asua Rubrica, aqual planta pertense O Rdo pe Ga-‘briel de Malagrida Messionario Apostolico por Em execução / nava de Igarassû naõ se Excedendo ao Risco daplanta e perfil / aprezentado acho naõ ter forma de hospicio, nem Comvento/ p’q’ careça de Igreja e Claustro e só acho ser hum Edeficio / de Casas Ordinárias ao uso do Pay, e he oq’ posso informar a V. Exª. Re a 15 de Ag.to de 1745. Fr: Estevão do Loretto JorgEAntunes. 194 CARTA 15 (mais de 10 linhas) 1759 Illmo. e Exmo. Sn’r. Aesta Igreja cathedral de Pernco. pertence o Espolio; q’ ficou, pr. / morte do Exmo. Bispo da mesma D. Fr. Luiz de Sta. Thereza; como Bis- / po Regular, q’ era Religiozo professo da Reforma descalsa carmelitana / q’he falecido, sem testamto: no cazo q’. tivesse Indulto Apostolico para / testar em tal cazo hê herdeira àSua Igra. deq’ sou indigno SuceSsor. E / como tal, devo procurar o tal espolio, tal, equal elle seja, mto., ou pouco. E por / iSso, quà nesta Provedoria, tenho procurado, a parte da sua côngrua, / que tinha vencido em sua vida, enaõ tinha cobrado. Agora àvizo ao meu Procurador; para q saiba de V.Exa. / o como sehade haver na materia, pois me fez reparo, dizer-me na frota / pasada, q’ de ordem de V.Exa. fora ver os Pontificaes do dito Exmo. Prelado, / para se comprarem por conta de Sua Mage. qdo. elles, e tudo oq’ lhe / pertencia, por Dirto. hê da Sua Igra. como Sua herdeira de q’. oBispo / actual tem a administraçaõ: E Se os Pontificaes deste Prelado, e todo o / Seu espolio, qual elle seja; hê desta Igra. olindea, juntamte. reparei / em Se me dizer, Se mandaraõ comprar, ou Se compraraõ para oBispo / de Angro, qdo. São desta Igra: e como taes, devo solicitar todo o espolio / como pte legma. a quem pertence. O Exmo. Bsipo falesceo, na caza deD. Antonia Ma / riana Thereza Salgado, veuva, de Anto. (ilegível) Sua parenta; q’ / terâ em arrecadaçam odito espolio; poes bem terâ sabido; q’ naõ po / podia Ser herdeira de Seu Tio Bispo Religiozo proffesso doCarmo descalço. Os moveis q’ aqui consta, pelos familiares; q’ S.Exa. Le- / vou da qui para Lisboa saõ os do rol junto; dos quaes, os q’ ficaram / por sua morte, enaõ constar legitimamte q’ tivesse desposto em vida, / como podia fazer, ou Se despendessem noseu funeral: tudo omais q’ / restar, pertence a esta Igra. Tam bem hê certo, q’ Sua Exa. naõ tinha divida algúas / porq’ Supposto tiveSse contas com a dita Sua parenta; hê certo tam / bem, q’ jâlhe naõ devia couza alguma; porq’tudo tinha jâ Satisfei- / to com aSua chegada a Lisboa: Porem Seligitimamte. constasse dealgúa / devida certa; citada apte naõ hâ duvida, q’ o espolio a devia pagar. Isto hê o q’ eu alcanço; porem poderâ haver outra couza / em contrario; por iSso tudo Sugeito à acertada desposiçaõ de V.Exa. fiz / nesta àrrecadaçaõ por entender, q’ aiSso sou obrigado em consciencia / em nome desta Igra. q’ taõ indignamte. administro. V.Exa. rezolverâ / o q’ for Servido. Deus gde. a V.Exa. ms anns . Olinda 12 de Março de 1759 De VExa. Illmo. Exmo. Sor. Thome Joachim da Costa Se. Capelaõ mto. (ilegível) Corte Real do Conso. de S. Mage. fidelíssimo Seu Bispo de Olinda Secretario de Estado do Ultramar. SMS: (mais de 10 linhas) Não te considero d+ pq tudo q é d+ sobra, e tudo q sobra é resto. Mas te considero d - pq tudo o que falta é raro, assim como vc. Parabéns!(F, A, auxiliar de enfermagem - PB). (menos de 10 linhas) Não vo ligar pq to s/credito, + to vivo!(M, A, servidor público – PB ·). 195 BLOG: (mais de 10 linhas) 15/11/2005 12:45...começando outro blog depois d mto tempo...primeiro post eh sempre uma merda, eu nunca sei oq escrever, mas jah q a Poleti insistiu, aki estou eu..alias,eu soh fiz outro blog pq vc praticamente mandou, vc gosta d ficar fuçando na minha vida neh sua vaca uahuahauhauhauhauhauahbom, fim d semana,pra variar, sai com a Mary e com a Li pra beber, mas dessa vez eu naum fikei bebada, milagre! Hihihi ontem eu passei o dia td assistindo filmes q eu jah tinha visto pelo menos umas 2 vezes e comendo pipoca... foi mto bom hihih e hj eu naum fiz nada.. to tomando coragem pra fazer uns trabalhos da escola, mas falta vontade........ aaahhhhhh eu qro férias!huuummmm num tem mais nada pra escrever eu acho.. num to inspirada hj..bom, esse post eh pra POleti linda....bjus miga, to com mta saudade viw, te adoro demais!bjusss pra tds!e antes q alguem fale sobre o blog gótico, eu coloquei esse soh por causa da cor tah Diego seu inutil! Uhauahauhauaha BLOG: (menos de 10 linhas) Postado por .:: Comentários (1) <#Srta.K#> às 13:53:26 nossa hoje eu to na maior depre, terminei com o rafa , aki em ksa tah um merda eu naum aguento +, eh muita pressao em cima de uma pessoa só. preciso de ajuda, agora vamos ver quem sao meus verdadeiros amigos. o jogo começo.....xau xau!!!! E-MAIL: (menos de 10 linhas) Data: De: Tue, 19 Apr 2005 11:55:18 -0300 (ART) Adicionar endereço Assunto: Saúde Para: "Fabiana Souza" <[email protected]> Oi!!! obrigada pelas mensagens. e vc. c. está? melhorou? espero que sim. em recife vou ficar trocendo p. tudo dar certo em sua cirurgia. um abraçao M 196 E-MAIL:(maisde10linhas) Data: Tue, 19 Apr 2005 11:55:18 -0300 (ART) De: M Assunto: Vídeo Para: "Fabiana Souza" <[email protected]> Adicionar endereço Oi gente, Um video q meu irmão me mostrou e q eu achei MUITO bom, por isso estou compartilhando com vcs, espero q vcs gostem (espero, kkkkk) Naum deixem de visitar meu gigafoto (aproveitando p vender o meu Jabá, hehehe) www.mch.gigafoto.com.br E p quem tem Orkut vejam essa comunidade qo meu amigão Rafael (Obrigada Rafa) fez p mim, kkkkk, http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=6094676 Mi DIÁRIO: (mais de 10 linhas) 197 (menos de 10 linhas) 2. Extensão do vocábulo Para nossa surpresa, melhor dizendo, contrariando nossas expectativas, a freqüência de abreviações em textos digitais ou tradicionais está longe de apresentar uma relação direta com o tamanho da palavra. Os dados nos revelaram que palavras polissílabas, trissílabas, dissílabas e monossílabas são impiedosamente abreviadas, chegando algumas delas a conter apenas uma de suas letras, como é o caso de que, não, de, escritas q, ñ, d. Fato oposto a esse acontece nas cartas dos séculos XVIII e XIX, nos Estados da PB, PE e BA, onde algumas palavras, em geral polissílabas contendo mais de dez letras, apagam duas ou apenas uma delas, contrariando o princípio da abreviação, que é abreviar por economia. Um dado que achamos relevante nos nossos resultados diz respeito ao apagamento de a palavra recair quase categoricamente sobre as vogais. A esse respeito, no site www.duplipensarnet167 há um artigo intitulado O erro de português entre a retórica e a dialética, publicado por Ana Flávia L. M. 167 Acessado em 10. 03. 2005. 198 Gerhardt, que trata exatamente dessa questão. Segundo Gerhardt, esse fenômeno é particularmente interessante, visto que reflete a capacidade da nossa mente de selecionar em figura as consoantes das palavras, restando ao fundo as vogais, já que nas reduções estas são quase todas suprimidas, ficando resguardadas apenas as consoantes. Para a autora, pouca atenção é dada às vogais quando lemos uma palavra. Segundo ela, isso se deve ao fato de ser o restante da palavra recuperável a partir do acervo léxico contido em nossa memória. É exatamente isso que ocorre nas mensagens digitais de um modo geral: nelas são resguardados apenas os caracteres fundamentais à leitura. Na visão de Gerhardt relacionado a isso está o fato de que, numa perspectiva histórica acerca da evolução dos sistemas de escrita, a compreensão da linguagem ser feita de sons acarretar a invenção pelos sumérios, há cinco mil anos, da escrita silábica, feita apenas de consoantes, que provavelmente foram os sons que eles isolaram em princípio, sem dar conta ainda de que elas formavam contínuos junto com as vogais. Nossos dados corroboraram essa afirmação, tanto nos gêneros digitais- e-mail, blog, SMS - quanto nos tradicionais – carta e diário. Vejamos o Gráfico 8 a seguir: Gráfico 8 Abreviação e extensão do vocábulo 100 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0 monossilabo dissilabo trissilabo polissilabo 199 Vale lembrar que os resultados exibidos no Gráfico 8 são específicos de determinados vocábulos, ou seja, os monossílabos apresentam 80% de abreviação se as palavras registradas forem de, que, não, com, por etc; os dissílabos, com 70% de ocorrência, são em geral beijo, você, cadê, porque etc; em seguida, os trissílabos, 50%, beleza, saudade; por último os polissílabos felicidade, eternamente, realidade, entre outras, com 30% de redução. Observemos alguns exemplos coletados: BLOG: Hotmail Domingo, Julho 17, 2005 Parei de mexer com templates da trabalho d+.... To mexenu gora com meu flogao. Como vcs deve ter percebido nem o template é feito por mim... É feito por um de meus parceiros. Bom vou ficano por aki mes. orkut: http://www.orkut.com/Profile.aspx?uid=14476506332741090473 msn: [email protected] flogao: www.flogao.com.br/wevertonvm Postado por _WeVeRToN_ •Segunda-feira, Junho 20, 2005• E-MAIL: De: "B M" Para: "Fabiana Souza" <[email protected]> Assunto: Recife Data: Tue, 18 Oct 2005 11:54:03 -0200 Ver detalhes do contato Fa, tudo bem c/ vc? E a saúde? Marquei com A para nos encontrarmos na próxima quarta feira ( dia 26). às 9 horas. Vc vai querer ir tbém? É esse o dia da abertura do seminário sobre Hipertexto? Qualquer coisa, me avise. Bjos grandes, B 200 SMS Não tem pressa, mas vc q sabe...Se quiser fique a vontade (F, A, +E;Enfermagem, PB). Nunca conseguirei ser 100% mas sou o homem q te ama muito! (M, A, +E, Auditor, RE) Vejo vc a noite? Eta! (M, A, +E, Auditor, RE) Já consegui p vc. Minha colega ficou de me entregar sábado qdo então lhe passo. (F, A, +E; Enfermagem, PB). DIÁRIO168: Aqui os termos abreviados são para, com, mais, mas, escritos p/, c/, e +, respectivamente. Este último representa tanto o advérbio quanto a conjunção. 168 201 3. Classes de palavras A gramática registra em suas prescritivas páginas a existência de dez classes de palavras na língua portuguesa, quais sejam: artigo, substantivo, adjetivo, verbo, advérbio, conjunção, preposição, interjeição, numeral e pronome. Nos nossos dados, dentre todos os gêneros aqui tratados, apenas duas não apresentam abreviação: artigo e interjeição. Esta última praticamente inexiste em nosso corpus; a primeira é categórica na manutenção da forma original, não apresentando um caso sequer de abreviação. Atribuímos a esse fato a razão de, em estando no singular, não haver possibilidade de ser apagado o único elemento/letra que compõe essa classe; quando no plural, não fazer sentido o registro apenas da marca de plural (s) sem o seu antecedente o ou a, um ou uma. Das demais classes, os pronomes e/ou formas de tratamento são os que apresentam um maior número de redução em suas formas, quer seja o gênero uma carta do século XVIII ou um blog ou email dos dias atuais. Em segundo lugar, vêm os advérbios terminados no sufixo mente, cuja ocorrência de abreviação é de aproximadamente 95%. Vale ressaltar que esses números correspondem ao gênero carta, situado nos séculos anteriores. Os demais gêneros, compreendidos nos séculos XX e XXI, raramente fazem uso de advérbios desse tipo e, quando o utilizam, ao menos nos blogs e SMSs, aplicam o mesmo princípio utilizado nas cartas: escreve-se a palavra até o início do sufixo e subtrai-se o en, colocando-se o te sobrescrito169 (ex: atualmte). Em terceiro lugar estão as preposições (de, para, com, escritas d, pra, p, c) e conjunções (porque, para que, que, respectivamente, porq, pq, para q, q) com mais de 90% de aplicação de abreviação. As outras classes restantes, numeral, adjetivo, verbo e substantivos, apresentam exemplos vários, cujas formas já possuem até siglas para as abreviações. Os numerais, no gênero carta, são abreviados em sua maioria (ex: primro por primeiro). Nas cartas, o único verbo abreviado era o guardar, praticamente categórico quando utilizado 169 Esse recurso é específico dos séculos XVIII e XIX. 202 no fechamento da carta (Deus guarde a Vossa Senhoria por muitos anos, escrito, Ds gde a V Sª p mtos ans). Nos gêneros digitais, esse número é bem maior, visto que quase todos os verbos têm ao menos uma de suas vogais suprimida (bjar, brink, dxou, gstar por beijar, brincar, deixou, gostar). A última classe, a dos substantivos, também registra um número elevado de abreviações, tanto nas cartas quanto nos demais gêneros (ksa, bjo, blza, fds, significando casa, beijo, beleza, fim de semana). É interessante observar que, na grande maioria, as palavras que têm suas formas abreviadas, assim o fazem levando em consideração o fato de consoante e vogal partilharem semelhanças em seus sons, o que leva à assimilação de um deles, prevalecendo a consoante. A Tabela 1 abaixo nos dá uma visão acerca do fenômeno da abreviação e sua ocorrência nas classes de palavras. 203 TABELA 1170 ABREVIAÇÃO E CLASSES DE PALAVRAS C S B Verbo Pronome Substantivo171 Preposição Conjunção Advérbio Gde;expda; P.(peço); a T (tenha);R da(registrada); eg ERM(esper a receber mercê);Ra(r espondida); Responda; mde(mande ); Reqr(requer ); ta (tenha); Exmos;Illm os; qm; VExa;SExa; Srias;Sr; VMage;SM age;Dmo; VM(Vossa Mercê);Vmc es;Rmo;Rd a o;VS ;V.S;V ia .S ;Snr;VV as SS ;ql;q;da qla;aqles;qt o; nd(nada); ;diligas;conseqa;testas;novbro;corr(corregedor);novbro;C orra(correia);preste;Oliva;Solddo;anns;Vigrro;V.(vila);Igno ;7bro;Desembgor;Glv(Gonçalves);Probide;tito(título);liv.;o rd(ordens);regulamto;a(anos);Faze;Cide;Cavti;Albuq;Bam ;G.Na;comdo;offo;Intero;Bandra;escram;procedimto;ofl;N ovbr;Ouv;Ignio;Cavte;testas;dizmo;verde;mamangpe;sub dtos;nececide;JoaqmRibro;Go;XerTava; Carno Carvl; Sza;Raimdo Soas;Camra; sentimtos;secretro;rivalide;verde;testos;circunstas;authori de;Prezds;Anto;regmto;preze(presente);Alfes;Presid;Ord enças;Corel;fama;Figrdo;Sz;Come Gal;Presça; Offal;texto;Segda fra; Respta;Frz(Ferraz);falecimo;Almda;Brto;Maxdo;Pera;Fort a;Campa Deq;plo;pr;pa; p(para/por);p’; d’;pla;p/;visto q’ Pm;p’q’;por q;pa q;paraq’;em qto;pr tanto;os;p’t anto;enqto; p.isso; Comodamte;tbem;mto; Baste; m; mta; Inteiramte; Certamte; Somte; Pessoalmte; Esteriormte; Juntamte; Atualmte; Violentamte; Igualmte; Qdo; Qto; Finalmte; Dificultosamte; Interinamte; Justamte; Livremte; Felizmte, Energicamte; Especialmte; Principalmte; Judiciosamte; Unicamte; Relativamte; Imediatamte; Baste; Desgraçadamte; Infelizmte; animosamte; involuntariamte; ingenuamte; respectivamte; semanariamte; igualmte; unicamte; manifestamte; juntamte; publicamte; diariamte; anualmte; casualmte; Adro; v; a;dv;to;vo;t a; eta;sj; tava Flo(falou);fz e(fazer);diz (dizer);to; vo;axu; Vc; vcs;eta; q(que);toda (toda); MTV;PF;TDMA;msg;min;tel;Sms; bjsss; cviço; bjs; bj;cel;bb;Credt;fut;fds;pe;fisio;saud; hj;h;fev;mar;blza; bb(bebê) p/(para);p(por) ;c(com);s(sem ); (de); D+ (demais); d- (de menos);tb; Obg; Cmg (comigo);td s (todos);vcs; q; td (tudo) Vc; vcs; q; Gent; ksa; xopi; bjss; bjao; findi; blzinha; 9da10 (novidades); bju P (para); (de); q; Q(que);pq(p orque);+(m as); (do Dq Q; pq; +; Aki; tbm; hje; mt; pokinhu; qdo;; Msm(mesm o) Sl (sala); cel (celular) bjos; msg (mensagem); C (com);p (por); p (para) Pq (porque); + (mas); c (como) Kd N (nos);q (que) Msg (mensagem); art. (artigo);OAB; nº (número); R.C.(Roberto Carlos);rem (remédio); comp (computador) P (para); (com) E D V (vimos); t (telefonamo s) d c Numeral lPra;segd a;primra; po.;pa;se gº; Adjetivo Obide;intro; do;Sta;obro ;supe(auplic ante);grde;o rdinro;neria s;ma(mesm a);qlqr; grde;pp.;obr gdo; verdadra;br co; Qdo (quando); ñ (não) 170 Como mencionado anteriormente, e por questão de economia de espaço, não exibimos na Tabela 1 acima as classes dos artigos e das interjeições, já que não há registros das mesmas em nossos dados. As letras C, S, B, E e D, na coluna à esquerda, significam Carta, SMS, Blog, E-mail e Diário, respectivamente. 171 Embora a classe dos substantivos seja a que maior número traz de formas abreviadas, contudo essa relação é menor quando comparada à proporção. Ou seja, de 100 (cem) substantivos, 50 (cinqüenta) são abreviados; enquanto que esta proporção é bem maior com os pronomes, especificamente os de tratamento. Neste caso, a probabilidade de a forma ser abreviada é de quase 99%. 204 4. Tonicidade da sílaba Em uma primeira observação do corpus, os dados apontavam para maior incidência de abreviações em cujas sílabas recaía a tonicidade. Essa constatação era ainda maior no gênero carta. Analisados agora também os gêneros digitais, email, blog e SMS, vimos que há uma manutenção dessa regra, sendo as sílabas tônicas as que mais abreviações contêm, o que não implica dizer que as pretônicas ou postônicas não registrem casos de abreviação. Entretanto, percebemos uma estreita ligação dessa variável com o fato de haver na sílaba tônica um partilhamento de traços comuns à vogal e à consoante, o que, como já mencionado anteriormente, levaria ao apagamento da vogal, em geral facilmente recuperável pelo leitor. Dessa forma, podemos inferir que a responsável pela abreviação não é a tonicidade em si, mas o princípio da economia que, nesse contexto, leva o autor a simplificar a escrita, escrevendo apenas uma letra em vez de duas, quaisquer que sejam os gêneros utilizados. Os resultados obtidos estão expressos no Gráfico 9 a seguir: Gráfico 9 Abreviação e a Tonicidade das sílabas Pré-tônica Tônica Pós-tônica 205 Segundo o princípio da saliência fônica, proposto por Naro e Lemle (1976), a mudança lingüística primeiramente atinge as palavras nas quais o grau de saliência fônica entre a forma antiga e a forma nova é menor, e só depois se instala onde esta é maior. Segundo esses autores, a mudança segue uma escala de saliência fônica que, no nosso caso, atinge primeiro as palavras cuja saliência entre as formas existentes é menor. Por exemplo, palavras como porque → porq; beleza → blza; de → d - são mais facilmente abreviadas que outras do tipo mesmo → msm; também → tbm; deve → dv; ser → c, comigo → cmg, mensagem → msg. Nessas últimas formas, o leitor tem de fazer um maior esforço para recuperar qual palavra foi abreviada, e para isto nem sempre apenas o contexto resolve, mas um domínio amplo no vocabulário das abreviações. Aquelas permitem ao leitor uma “decodificação” mais rápida e fácil, visto que o princípio que rege a abreviação leva em conta uma escrita que se aproxime ao máximo da fala, daí abreviar as palavras utilizando somente as letras que representam o som. Em outras palavras, quando o falante diz ou pronuncia bebê, apenas ouvimos o som do fonema /b/, e por isso abrevia-se a palavra escrevendo somente as consoantes bb, já que a vogal e tornase totalmente dispensável. Assim também acontece com porq, d, q, kd e outros, onde praticamente todas as vogais são suprimidas e mantêm-se apenas as consoantes que representam o som da pronúncia, como no caso de cadê, que tem sua consoante original alterada de c para k, com o único propósito de reduzir, abreviar a palavra, já que de duas letras ca, passa-se a escrever apenas uma, k, que reproduz o mesmo som das duas outras. Vejamos os textos: BLOG: :: Enviado por Pam-Pam - 13:15:26 :: Nossa, quanto tempu em gente, estou morrendu di saudadis di v6, eh ja entramos de ferias, as minhas estao muito legais, estou me divertindu muito. Entaum eh issu pessual logo logo estou de volta com td. 206 E-MAIL: Mon, 14 Nov 2005 11:04:24 -0300 (ART) Data: "M C" Mais informações De: Assunto: Foto Para: <[email protected]>, Oi, Olha o vicio gente, kkkk, nova foto do meu fotoblog, visitem... Bjus p todos, Mi SMS Eu queria c a lágrima q brota em c us ollhos, escorre em sua fac e chega até a sua bok (F, J, -E, Estudante, PB). Quando disserem q vc é uma droga ñ ligue pois em kda esquina vai t sempre alguém viciado em vc! (F, J, -E, Estudante, PB). 207 DIÁRIO: 208 • Das variáveis sociais 1. Faixa etária Dos gêneros tradicionais, foi possível constatar um uso variável quanto à aplicação de abreviação por parte de quem escreve. Como nas cartas analisadas, quer fossem do século XVIII ou XIX e dos Estados da Paraíba, Pernambuco ou da Bahia, só havia autores adultos, podemos afirmar que, nesse primeiro gênero, não só jovens, se é que estes a utilizavam, mas também, e principalmente, os adultos lançavam mão desse recurso sem restrição alguma. No segundo gênero trabalhado, o diário, a prática da abreviação está, ao contrário da carta, diretamente relacionada com a idade do autor. Ou seja, quanto mais jovem for a pessoa que escreve o diário, maiores são as chances de nele aparecerem abreviações. Ao passo que as pessoas mais adultas utilizam menos esse recurso da língua. Quando se trata de gênero digital, é consenso – as pesquisas estão aí para corroborarem nossos resultados – que o uso da abreviação é maior quando o autor (de e-mail, blog e SMS) se trata de um jovem. É certo também que este fato não exclui os adultos da lista de “usuários de abreviações”, apenas os coloca entre aqueles que menos as utilizam. Ao que nos consta, segundo registra a literatura pertinente, semelhantemente às gírias, as abreviações são utilizadas com o objetivo primeiro de ser ágil, economizando tempo ao escrever (digitar) e, segundo, formar uma espécie de linguagem dos internautas, já conhecida e denominada de internautês. Dessa forma, as pessoas que utilizam tal estilo demonstram assim pertencerem à determinada comunidade discursiva, uma vez que partilham objetivos em comum, entre eles, o tipo de escrita utilizada. Esse fenômeno é facilmente observável em e-mails e, sobremaneira, nos SMSs, onde a relação entre abreviação, idade dos usuários e grau de intimidade entre eles está fortemente explicitada em quatro tipos: 1. Se se trata de uma pessoa mais velha que escreve para uma mais nova, temos mais abreviações; 2. Se ocorrer o inverso, uma mais nova escrever para uma mais velha, menos abreviações serão utilizadas; 209 3. Se ainda as pessoas envolvidas no texto/discurso são jovens, certamente haverá uma maior ocorrência de formas abreviadas, sendo constatado também o inverso; 4. Se dessa vez as pessoas forem mais velhas, automaticamente recorre-se menos a esse recurso da língua. Tal comprovação permite-nos inferir que no primeiro caso se dá uma busca por demonstrar ser a pessoa mais velha conhecedora desse novo tipo de escrita, largamente utilizada pelos mais jovens, o que a leva a usar abreviações em seu texto; no segundo caso, por temer não ser compreendido em sua escrita, o jovem evita usar a abreviação quando o destinatário é uma pessoa mais velha. Nos terceiro e quarto casos, como ambos são da mesma faixa etária, tem-se um maior uso de abreviações por jovens, já que estes “falam” a mesma língua, utilizam o mesmo código, no caso em estudo, a forma abreviada, ou um decréscimo em sua ocorrência, uma vez que não é prática comum entre os mais velhos escrever utilizando abreviações ao longo de seus textos. A fim de melhor compreendermos o que foi dito, ilustramos os resultados com o Gráfico 10, abaixo, que traz a relação entre o uso de abreviações e a faixa etária do informante. Gráfico 10 Abreviação e faixa etária Adultos 100 80 60 40 20 0 Carta E-mail Jovens Blog SMS Diário Pelos dados apresentados, pode-se concluir que o gênero carta faz uso de abreviações independentemente da faixa etária do autor. Quanto aos demais gêneros, há uma unanimidade quanto aos resultados: em sendo o autor do diário, 210 blog, e-mail ou SMS pertencente à classe dos jovens, provavelmente sua mensagem lançará mão de abreviações. Se, porém, este pertencer à classe dos adultos, possivelmente serão encontradas menos formas reduzidas, menos abreviação. Vejamos os exemplos abaixo: CARTA 16 (autor adulto) 1765 Illmo. e Exmo Snr Vou agradecer aV.Exa. a honra, q’ mefez naPro/curaçaõ, que me mandou patomar parte no baptismo do filho, q’ nascesse / aos Illmos, e Exmos Snres Condes deVilla Flor. Ecom effeito no dia 10 de Fevereiro de 1765 tive os credi-/tos delevar daSagrada fonte do baptismo em Nome deVExea, / como seu verdadeiro Padrinho, no Oratorio do SeuPalacio, ao Innocen- / te Menino, o Exmo. e Illmo. Snr’ D. Antonio de Populo, filho / dos ditos Snres. Condes Copeiros Mores, funçaõ muito plauirvel / com assistencia da nobreza da terra, que muito gostoza sabe obze-/quiar a o seu taõ benemerito Governador, eCapam General, unica bo- / nança que o ceo mandou aPernambuco: e se nutre o afilhado vigorosamte. Bejo as maos AV.Exea por tanto me honrar / no seuServo com este, e com os mais favores que espero das Liberaes / maõs de V.Exea; a quem Ds Gde ms anns pafelicide da nossa / Monarchia. Olinda 30 de Mco de1765 Illmo e Exmo. Snr Conde deOeyros F. Bispo dePernambuco. De VExa. Servo mto. obrigo. e fiel capelaõ e (ilegível) 211 CARTA 17 (autor jovem) BLOG: (autor jovem) Postado por <#Srta.K#> às 20:43:41 .:: Comentários (1) Eu amo o Inuyasha mais não é só desse anime q eu gosto aki vai a foto de mais um personagem que eu acho perfeito ele é do Yu-Yu-Hakusho... Seu nome...Seu nome é Shuchi Minamino no mundo dos homens no Makai ele é o Incrivel Kurama Youko BLOG: (autor adulto) O que há de errado com a lã? “A maioria das pessoas não sabe que as ovelhas criadas para produção de lã são freqüentemente mutiladas sem nenhum tipo de anestésico, transportadas por milhares de quilômetros suportando condições climáticas extremas, com pouco acesso à água e alimentação, e abatidas enquanto totalmente conscientes.” -- extraído do folheto “What's Wrong With Wool” da PETA - People for the Ethical Treatment of Animals. Para saber mais, faça o download aqui. 11:19 PM 12/11/2005 212 E-MAIL: (autor adulto) Data: De: Sat, 12 Nov 2005 18:40:14 +0000 (GMT) "M" Ver detalhes do contato Assunto: Raiva nada! Para: "fabiana souza silva" <[email protected]> deve ter sido esquecimento, mesmo! espero q o eco já tenha se recuperado. qto as orientaçoes acho q vc nao precisa delas, sinceramente. eu essa semana escrevi um bocado, mas de ontem a tarde p. cá parei, esgotou. qdo eh q vc aparece? hj vi valeira, ela perguntou por vc um abraço M E-MAIL: (autor jovem) Data: De: Mon, 17 Oct 2005 12:15:41 -0300 (ART) "M C" Ver detalhes do contato Assunto: Foto Nova Para: "Fabiana Souza" <[email protected]>, Oi Gente, Pra quem gosta de fotoblog uma foto nova nas paradas, advinha quem está comigo Priscila ... é vc mesma !!! Hehehehe, e nem adianta reclamar viu???!!!! Kaká realmente o vício tomou conta de mim, existe escapatória ???? Bjus a todos, Mi 213 DIÁRIO: (autor jovem172) 172 As formas registradas vêm sublinhadas. 214 DIÁRIO: (autor adulto173) 173 O autor utiliza Cap. e + ou – para capítulo e mais ou menos. 215 2. Grau de escolaridade Conforme mencionamos no capítulo da metodologia, essa variável dividiu os informantes em mais escolarizados e menos escolarizados, já que as cartas que compõem o material da Paraíba e do Recife não deixavam claro o nível de escolarização dos autores, ao contrário das cartas da Bahia. Após uma detalhada observação dos corpora da nossa pesquisa, foi possível concluir que, no gênero carta, o uso de abreviações ocorre independentemente do grau de instrução do autor desta, o que nos autoriza afirmar que esse fator não exerce influência alguma quanto ao uso ou não de abreviações no referido gênero. Quanto ao diário, percebese uma discreta ligação no que diz respeito ao maior ou menor registro de formas abreviadas quando o autor tem mais ou menos instrução. Ou seja, nossos resultados apontam para menos abreviações quando se é mais escolarizado, e mais abreviações nos textos cujos autores têm menos tempo de estudo. De certa forma, o grau de escolaridade nesse gênero está diretamente relacionado com a idade do autor, o que implica dizer que aqueles que mais uso fazem de abreviações nesse gênero são os que menos idade têm. Essa mesma observação foi constatada nos gêneros digitais, e-mails, blogs e SMS. Ou seja, as pessoas que apresentavam um maior grau de escolaridade registravam menos abreviações em seus textos, e o inverso também. Aqui mais uma vez a faixa etária está ligada ao tempo de estudo do autor, apontando os mais jovens, no nosso caso menos escolarizados, como os que usam mais abreviações nos referidos gêneros. A seguir, apresentamos os resultados obtidos na nossa pesquisa, cruzando a variável grau de escolaridade com o fenômeno em estudo, a abreviação. Confira o Gráfico 11 a seguir: 216 Gráfico 11 Abreviação e grau de escolaridade 100 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0 Mais Escolarizados Menos Escolarizados Conforme nos revelam os números do Gráfico 11, em todos os gêneros aqui analisados – carta, diário, e-mail, blog e SMS -, os informantes que possuem mais instrução, ou seja, são mais escolarizados, usam menos formas abreviadas em suas mensagens, ao contrário daqueles que têm menos instrução, sendo menos escolarizados. Estes não apenas as utilizam como as fazem com uma freqüência bem maior, sendo praticamente categórico o uso de reduções em seus textos. Confira os exemplos a seguir: 217 CARTA 18 (informante mais escolarizado174) Como a própria carta revela, o autor da mesma é Desembargador e Ouvidor da Comarca, e provavelmente formado em leis, segundo lemos em Tânia Lobo (2001, p.8). 174 218 CARTA 19 (informante menos escolarizado175) 175 O autor dessa carta é lavrador de algodão, o que provavelmente indica que tem pouca escolarização. 219 E-MAIL: (mais escolarizado) De: "R C" Para: "Fabiana Souza" <[email protected]> Assunto: Relatório Data: Sat, 5 Nov 2005 06:05:13 -0800 Ver detalhes do contato Oi, Fabiana Adorei os e-mails. Você conseguiu abrir aquele de Gramado e Canela, e os outros? também? A respeito do relatório para enviar ao orientador, é a partir de setembro de 2004? Porque nesse caso colocaríamos o do Gelne e o do CBLA, não é? Eu nem sabia que ainda tinha de fazer isso!!! Ah! Depois me envia o teu endereço do MSN, e a foto do Bronckart? (desculpe o abuso), mas é a curiosidade. Abraços, R E-MAIL: (menos escolarizado) De: "j s" Para: Fabiana Assunto: Eu estou aqui. Data: Tue, 29 Nov 2005 00:51:29 +0000 Adicionar endereço Oi, Fabiana. Espero q vc nao passe mau novamente pois brevimente estarei ai vc tem q espera por me. Quanto as eu enviei domingo depois q acabamos de conversa, mais algum erro ouve q nao chegou ate o seu email. Beijos e abracos,,,,,,,,,,,,,,, J S. 220 SMS: (mais escolarizado) Obrigado por ter plantado o amor em meu coração! Voltou a ser uma terra fértil! Amo vc de verdade!!!(M, A, +E, Auditor – RE) (menos escolarizado) Quero lhe desejar mais um dia dos prof, e sei q vou voltar a lhe desejar isso durante anos pois existem pessoas nesse ramo qualidade e competência mais (sic) a sinhora e vovo não são assim, hoje vc pode estar cansada de estudar, mas, amanha a sua gloria sera dada graças a sua perfeição de ensino e a sua inteligencia d aprende o q ñ sabe com facilidade. Parabéns!(F, J, -E, estudante – PB) DIÁRIO: (informante mais escolarizado176) 176 A única abreviação diz respeito ao nome da pessoa, que tem escrito apenas a inicial P. 221 DIÁRIO (informante menos escolarizado177) BLOG: (mais escolarizado) 12/11/2005 22:25E AGORA, DONA GLOBO? Sem Brasil na Sul-Americana, emissora exibe filmes Com a eliminação dos clubes brasileiros da Copa Sul-Americana de futebol, a Rede Globo terá de rearranjar sua grade de programação. No vácuo deixado pela competição, a emissora vai exibir filmes. Será esse o começo da já famosa programação de fim-de-ano? Hoje a festa é sua, hoje a festa é nossa... 177 Aqui, as formas com, para, mais e demais são reduzidas a c/, p/, + e d+, respectivamente. 222 BLOG:(menos escolarizado) sábado, 12 de novembro de 2005 Gente vou deixar uma perguntinha respondam nos coments oq primeiro pras meninas se vocês tivessem andando na rua e derrepente vissem o Inuyasha, o Mirok, Kouga, Narak e o eshomaru andando na rua oq vcs fariam? A)Agarraria ele B)Começaria a passar mal e desmaiaria C)tiraria uma foto D)sairia pulando e beijando ele E)pediria um autografo F)fingiria q não fiu E ql deles seria? A)Mirok B)Inuyasha C)Seshomaru D)Kouga E)Narak Bom e agora pros meninos, se vocês tivessem andando na rua e derrepente vissem a Sango, a in, a Ayame, a Kagome, e a Kagura na rua andando na rua oq vcs fariam? A)Ficaria sem reação B)Tiraria uma foto C)Daria um beijo nela D)pediria um autografo E)fingiria que não viu F)Seguiria ela pelo resto do dia E qual delas seria A)Sango B)Rin C)Ayame D)Kagura Postado por <#Srta.K#> às 20:43:41 3. Sexo De acordo com a literatura pertinente - Fisscher (1958), Labov (1966), Trudgill (1974), Guy (1981), Oliveira (1982), Paiva (1986) e Silva (1997) - as mulheres, em geral, são mais conservadoras quanto à utilização de formas ditas padrão, enquanto os homens detêm a liderança do uso de formas não-padrão. 223 Contudo, afirmam as pesquisas que envolvem essa variável social, quando as formas inovadoras são consideradas de prestígio, não-estigmatizadas, cabe às mulheres uma maior representação no que tange ao uso daquelas. O fenômeno abordado em nossa pesquisa aponta um maior número de abreviações por parte dos homens, enquanto as mulheres fazem menos uso desse recurso. Esse resultado parece estar ligado ao fato de ser a abreviação uma forma não-padrão, embora não seja de todo estigmatizada, o que faz com que as mulheres sejam mais cautelosas ao as utilizarem em seus textos. Esses dados, é verdade, referem-se aos gêneros digitais – e-mail, blog, SMS – e não aos tradicionais – carta e diário. Nestes, temos duas posições para a abreviação: se se trata de diário, predominantemente escrito por mulheres, estas lideram o uso de formas abreviadas; se, porém, o gênero é carta, os homens são os que mais abreviações utilizam. Vale lembrar que, das quase quinhentas cartas estudadas aqui, tanto as de RE, as da PB quanto as da BA, apenas uma é de autoria feminina, o que obviamente faz com que os homens dominem a liderança. Dessa forma, fica clara a idéia de que nos gêneros tradicionais a variável sexo é irrelevante no que se refere ao uso de abreviações, enquanto que, nos gêneros digitais, ela é determinante, ao menos nos nossos dados. Observe o Gráfico 12 a seguir: Gráfico 12 Abreviação e Sexo 100% 90% 80% 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% Carta E-mail Blog Masculino SMS Diário Feminino 224 De acordo com o Gráfico 12, o sexo feminino lidera o uso de abreviações quando se trata dos gêneros diário (já que estas escrevem mais que os homens) e blog; empatam se o e-mail for o gênero utilizado, e perdem por uma maioria esmagadora, se a análise se restringe ao gênero carta, ao menos nas por nós aqui analisadas. Resumindo, temos: duas vitórias para o sexo masculino – carta e SMS; duas para o sexo feminino – diário e blog, e um empate no gênero e-mail. Observemos os exemplos: CARTA 20 (informante do sexo masculino) 1745 Illmo e Exmo Snor A planta que semeapresenta Com o despaxo de V. Exa Rubrica / da com asua Rubrica, aqual planta pertense O Rdo pe Ga-‘briel de Malagrida Messionario Apostolico por Em execução / nava de Igarassû naõ se Excedendo ao Risco daplanta e perfil / aprezentado acho naõ ter forma de hospicio, nem Comvento/ p’q’ careça de Igreja e Claustro e só acho ser hum Edeficio / de Casas Ordinárias ao uso do Pay, e he oq’ posso informar a V. Exª Re a 15 de Ag.to de 1745. Fr: Estevão do Loretto JorgEAntunes. CARTA 21 (informante do sexo feminino) 16 de Agosto de 1897 — Chamonix Meu prezado Senhor João Alfredo Sabendo do grande golpe porque acabão de passar não posso deixar de vir dizerlhes já toda a parte que o Principe e eu tomamos em sua tão grande dôr! Que Deus lhes dê toda a resignação e coragem nes(?)cessarias e creião-me sempre sua amiga muito(?) e muito de coração Isabel Condessa d’Eu 225 DIÁRIO: (sexo feminino) É possível observar uma forma abreviada para a preposição por (P/), e uma substituição da palavra mil pelo numeral 1000, o que representa duas reduções utilizadas pela informante em um dia de anotação. No diário masculino, as anotações que o informante faz em dois dias registram apenas a substituição da palavra mais, pelo respectivo símbolo: +, como podemos conferir abaixo: 226 DIÁRIO: (sexo masculino) 227 SMS: (sexo masculino) Kd vc? Tudo q vejo lembro de vc! Eu te amo de verdade!(M, A, +E, Auditor – RE) SMS: (sexo feminino) Bom, tentei resistir, mas acabei beijando muuuuuuuuuuuuito. Foi legal, menos ter q mentir em casa.(F, A, +E, Empresária – PB) E-MAIL: (sexo feminino) De: "M" Para: "Fabiana Souza" <[email protected]> Assunto: Relatório Data: Sat, 5 Nov 2005 06:05:13 -0800 Ver detalhes do contato E aí, garota? como estás?? quais sao as novidades pessoenses, tesianas, familiares, ecosportense, enfim... como vai a vida. estou bem e com muitos prazos p cumprir; depois de uma otima orientaçao c X, acho q minha tese adquiriu a cara definitva, já nao era sem fim... no mais p relaxar tenho ido ao cinema e olhado pro mar. um grande abraço M E-MAIL: (sexo masculino) Data: De: Mon, 10 Oct 2005 18:35:06 -0300 (ART) "M A" Ver detalhes do contato Assunto: O paraíso existe !!!!!! Para: [email protected] Amor, Depois que passei algumas horas no sítio com vc, fica difícil ir lá e não tê-la por perto. Morro de saudades. Infelizmente hoje não vai dar para nos vermos, mas amanhã tiraremos o atraso. bjs Teu gordinho!!!! Segue a foto de um lugar que é um paraíso qdo vc está lá 228 BLOG:(sexo feminino) Sexta-feira, Outubro 07, 2005 OIe galeraaaaaaaaa...como vaum meus queridos bjokeiros???? mta gente pedindo atualizaum..aki estou... me desculpem galera.. sabe como eh.. nao eh mto facil arrumar tempo.. mas pra voces eu arrumo.. claro... novamente.. obrigada pelos emails... elogios..pedidos... e tudo mais Muitos e Muitos Beijos da Boquinha!!! BaBaDo E ApRoVaDo PoR ».¥.LaRyBoQuInHa.¥.», em Sexta-feira, Outub (sexo masculino) Enviado: 22/set/05 19:48 Quote único dia do ano q falto.. ai povo se rebela contra psor, mó zueira, num fizeram nada claro q valeu a pena dormir até 11h inves de acordar as 6h, mah tinha q ser bom só hoje, né? ai q f**a.. devolveram prova hoje tb.. q eu quero saber q eu tirei. me estressei agora. 4. Profissão Possenti (2001, p.219-220) diz que “cada locutor se apodera da língua segundo sua situação social, os papéis que exerce etc”. Sendo assim, resolvemos verificar a validade dessa afirmação cruzando a variável profissão com a ocorrência da abreviação, a fim de ratificar as palavras do autor, pois, segundo ele: A língua não se apresenta a todos da mesma maneira, a ordem da aquisição, de certas estruturas não é idêntica em todos os falantes, e a utilização da linguagem é freqüentemente capaz de distinguir um locutor do outro. No intuito de obtermos resultados satisfatórios, equivalemos o número de textos por nós aqui coletados (cartas: 60, diários: 60;e-mails: 20, blogs:20, SMSs:20), ao número de profissão exercida pelos informantes. No gênero carta, elas variam de Vigário da Vila, Chefe de Polícia, Juiz ordinário a Ministro do Reino, nas da Paraíba; desembargadores-ouvidores ou juízes ordinários, nas cartas da BA; servidor público, major, tenente, tipógrafo, nas de RE. Os diários comportam estudantes, professores e outros. Já os e-mails, blogs e SMSs incluem contadores, advogados, empresários, doutores, estudantes, bibliotecários, técnicos de enfermagem, gerente de venda e servidor do INSS. De acordo com os resultados, essa variável não exerce qualquer influência que seja quanto ao uso ou não de 229 abreviações nos textos de seus autores. No banco de dados da Paraíba, de um total de 203 cartas existentes, apenas uma, escrita por José Bonifácio de Andrada e Silva, então Ministro do Reino e dos Negócios Estrangeiros, não registra sequer um caso de abreviação em suas linhas178. As demais são categóricas em utilizarem esse processo de redução, desde a abertura até o fechamento. É o que vamos ver na Tabela 2 a seguir: Tabela 2 Abreviação e as profissões GÊNEROS carta e-mail X (PB) X (PB) X (PB, BA) X (PB) PROFISSÕES Vigário da Vila Chefe de Polícia Juiz ordinário Ministro do Reino Desembargadoresouvidores Servidor público Major Tenente Tipógrafo Estudantes Professores Contadores Empresários Bibliotecário Técnicos enfermagem Gerente de venda Servidor do INSS blog diário SMS X (PB, BA) X (PB) X (PB) X (PB) X (PB) X X (PB) X (PB) X X (PB) X X (PB) X (PB) X X X (BA) X (RE) X (RE) X (RE) X (RE) de X X X X (RE) X (BA) X (PB) X (PB) X (PB) X (PB) X (PB) Pelos dados exibidos na Tabela 2 acima, os autores de cartas, diários, emails, blogs e SMSs, dos Estados da Paraíba, Pernambuco e Bahia, quer se trate de estudantes, contadores, Juizes, empresários ou qualquer uma outra profissão das Ao que parece, a posição social ocupada pelo autor dessa carta, advinda da profissão que ele exerce, faz com que não haja em seu texto a presença de abreviações, uma vez que o documento é considerado uma Ordem Real. 178 230 acima mencionadas, utilizam em maior ou menor quantidade formas abreviadas nas mensagens produzidas. Esses resultados nos autorizam a afirmar que o fenômeno da abreviação ocorre independente da profissão que o autor do gênero analisado exerça. Vejamos: CARTA 21 (Rei de Portugal) 1747 Dom João porgraça de Deos Rey / de Portugal edos algarves daqm edalem mar em / Africa senhor de Guiné etc Faço Saber avos / governador ecapitaõ General da capitania de / Pernambuco q’ vendosse a representaçaõ q’ me fize / raõ os ofeçiais da camara da cidade deolinda na / carta deq’ com esta sevosremete copia emq’ pedem / seja servido mandar q’ os Padres da comp.ª en / sinem Teologia como o fazem na B.ª emais / collegios assim naquella cidade como na villa do Recife damesma maneira q’ praticaõ / ençinar Filosofia. Mepareceo ordenarvos / informeis com vosso parecer Ouvindo o Reitor / da Companhia edeclarando senadita cidade / deolinda ou Recife ha alguma escola deRe / legiaõ. ElRey nosso Snr.’ omandou por Tome / Josachim da Costa corte Real epello P.e Antonio / Freire de Andrade Henrriq. Comselheiros do Seo / cons.’ Vltramarino eSepassou por duas vias, Luis / Manoel afiz emlisboa adesasseis deDezembro de / mil seteçentos quarenta e seis o Secretario Ma / noelCaetano Lopes de Lavre afez escrever = Tome / Joachim daCosta corte Real = Ant: Fr. DeAndrade 231 CARTA 22 (juiz ordinário) 232 CARTA 23 (governador) SMS Oi, Fa! Tudo bem? Liberou meu cel hoje. (F, A, -E, Promotora de vendas – PB) Cheguei bem. Boa noite! Amo vc! Bjs! (M, A, +E, Auditor – PE) Revelaste as fotos? Talvez eu vá aí amanhã, depende da quantidade de cviço q aparecer! + se eu for eh dpois do almoço. (M, A, +E, Servidor Público – PB) Vc foi? (F, A, +E, Professora – PB) Desculpe a demora p responder sua msg, não esqueci de vc. Por enquanto não tenho outras novidades, e vc?Estou sentindo falta das nossas saídas.Bj.(F, A, +E, Empresária–PB) 233 E-MAIL: (PROFESSORA) Data: De: Thu, 6 Oct 2005 00:03:33 +0000 (GMT) "M" Ver detalhes do contato Assunto: Correndo atrás das borboletas... Para: "fabiana souza silva" <[email protected]> lindo, lindo, Fabiana!! só podia mesmo ser a mágica simplicidade de Quintana. e aí como vc está?? espero que bem. bem, já aluguei o flat, uma maravilha: criei coragem e agora vou tb experimentar a beleza de morar perto do mar. um abraço M E-MAIL: (FONOAUDIÓLOGA) Data: De: Tue, 4 Oct 2005 20:14:00 -0300 (ART) "M C" Ver detalhes do contato Assunto: Foto Para: [email protected], Oi, Gente nova foto no fotolog (tô viciada mesmo), atenção especial (Dri, Jailane e Eunice) cês tão lá, qdo vcs puderem dêem uma passadinha lá... Recadinho p Chelzinha, ei menina add o meu fotolog no teu... Bjus a tds tô esperando os comentários, Mi BLOG: (estudante) 15/11/2005 12:58 Bom gente naum tenhu muito oq escrever...só q estou vivendo um amor impossivel...ele gosta de mim e eu gosto dele mais naum podemos fikar junto...espero q isso um dia melhore pois naum vou conseguir viver assim...beijokas !!! enviada por BIA 234 DIÁRIO: (estudante) 235 DIÁRIO: (Técnico de enfermagem) Após tudo o que vimos neste capítulo, entendemos como necessário apresentar um esquema geral, compreendendo todas as variáveis analisadas em conjunto com o fenômeno da abreviação, visando um melhor entendimento por parte do leitor. Em linhas gerais, pois, temos o seguinte quadro sinóptico: 236 QUADRO 7 A ABREVIAÇÃO X VARIÁVEIS ANALISADAS Variáveis sociointerativas Gênero: Carta (0) Diário (0) E-mail(0) Blog(0) SMS(0) Estilo: Formal (-) Informal (+) Instância de realização: Pública(-) Privada(+) Participantes: 1X1(+) 1XN(-) Variáveis estruturais Extensão do texto: até 10 linhas(0) + de 10 linhas(0) Variáveis sociais Faixa etária: Jovem(+) Adulto(-) Extensão do vocábulo: Monossílabo(0) Dissílabo(0) Trissílabo(0) Polissílabo(0) Classes de palavras: Artigo(-) Substantivo(0) Adjetivo(0) Verbo(0) Advérbio(0) Pronome(0) Numeral(0) Preposição(0) Conjunção(0) Interjeição(-) Tonicidade da sílaba: Pré-tônica (0) Tônica (0) Pós-tônica (0) Escolaridade: - escolarizado(+) + escolarizado(-) 0 - Sexo: Masculino (0) Feminino (0) Profissão: Estudante(0); Professor(0); Auditor(0); Governador(0); Aux. de enfermagem(0); Servidor do INSS(0); Fonoaudióloga(0); Promotor de vendas(0); Empresário(0); Bibliotecário(0); Desembargador(0); Juiz ordinário(0); Chefe de polícia(0), Vigário da vila(0). Propósito comunicativo: Informativo(-) Lúdico(+) Suporte: Papel (-) Telefone celular (+) Computador (+) TOTAL + Legenda: sinais para a importância da variável no processo da abreviação: + (maior ocorrência), (menor ocorrência), 0 (irrelevância). Pelo Quadro 7, acima, concluimos que, no cômputo geral, os fatores sóciointerativos são mais proeminentes no processo da abreviação; os fatores sociais são menos salientes, e os estruturais, irrelevantes. 237 CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao longo deste trabalho, levantamos algumas discussões no intuito de demonstrar que: 1. a abreviação, aqui entendida como representação de uma palavra por meio de uma ou algumas de suas letras, é um recurso da língua que teve origem nos idos do século VI antes de Cristo, proliferou no século X, estendendo-se até nossos dias, não sendo, pois, uma criação da era digital, como pensam alguns e, ao contrário do que muitos acreditam, sua utilização é muito menor hoje que em períodos anteriores da história da língua; 2. embora seja um fenômeno da língua, e por isso não foge às incessantes variações por que ela passa, a abreviação manteve alguns princípios de uso (abreviar por necessidade), adaptando outros; 3. o princípio da economia, seja de natureza lingüística ou financeira, continua sendo fator determinante quando do uso da abreviação nos dias hodiernos; 4. é evidente o fato de que os gêneros digitais aqui analisados guardam muitas semelhanças com os gêneros orais conversacionais, dentre elas: períodos simples e curtos, frases nominais, frases truncadas, marcas de envolvimento, presença de marcadores conversacionais, entre outras características da oralidade, o que, a nosso ver, favorece o surgimento da abreviação; 238 5. dentre os fatores de ordem sociointerativa aqui analisados, o gênero textual é aquele que atua como ‘carro-chefe’ na ocorrência da abreviação, determinando um maior ou menor uso desse recurso da língua. Atrelados a esse fator estão o estilo, a instância de realização, os participantes, o propósito comunicativo e o suporte. Dos gêneros tradicionais por nós trabalhados, a carta destacou-se como aquele que registra maior número de abreviações, sendo fundamental lembrar que tal fato se deve ao período no qual aquela foi escrita, ou seja, séculos XVIII e XIX, época em que a abreviação era bastante divulgada. Outra ressalva a ser feita diz respeito à tecnologia utilizada, ou seja, se a carta era manuscrita ou impressa, já que na primeira esse processo de redução chegou ao excesso. O inverso, porém, ocorria se a tecnologia utilizada fosse a impressa, restando apenas as abreviaturas correspondentes aos pronomes e às formas de tratamento. O estilo, por sua vez, está diretamente ligado ao propósito comunicativo, à instância de realização do texto e aos participantes. Em outras palavras, se o autor do texto – seja uma carta, um e-mail, um blog ou SMS – elabora um documento pessoal, e não oficial, ou melhor, privado e não público, a tendência é fazer uso de um maior número de abreviações ao longo de sua produção textual, principalmente se o propósito primeiro da mensagem for apenas divertir, o que não ocorre, ou se ocorre é em menor número, em texto público e/ou de caráter oficial, que pela própria natureza exige uma linguagem mais rebuscada. Dentro dessa ‘cadeia’ está o participante que, em sendo alguém de maior proximidade ou intimidade, mesmo que de posição social hierarquicamente mais elevada, permitirá ou induzirá o autor do texto a escrever de maneira mais distensa, menos formal. O último dos fatores sociointerativos, o suporte, também altera a natureza da leitura, levando o autor do texto a adequar sua produção às normas daquele locus, seja ele digital ou não; 6. no que concerne aos fatores estruturais – extensão do texto, extensão do vocábulo, classes de palavras e tonicidade da sílaba – constatamos a não relevância dos mesmos no processo de redução das palavras. Ou seja, a abreviação atinge tanto substantivos quanto 239 verbos, adjetivos e até mesmo preposições. É bem verdade que algumas dessas classes detêm um maior número de reduções, o que, porém, não elimina a ocorrência destas nas demais. De forma semelhante, seja o texto curto ou longo, a palavra monossílaba ou polissílaba, átona ou tônica, a abreviação atua de forma igualitária nos mesmos; 7. em se tratando de fatores de ordem social, quais sejam: faixa etária, grau de escolaridade, sexo e profissão, pudemos observar certa ligação entre eles e o fenômeno em estudo: quando diz respeito aos gêneros digitais – o e-mail, blog, e SMS – há um maior registro de abreviações por parte de quem escreve se esse for jovem, e o inverso também. O grau de escolaridade e a profissão do produtor do texto, no entanto, não exercem influência no uso ou não da abreviação. Ou seja, o fato de ser menos ou mais escolarizado não inibe a utilização do recurso em pauta, bem como exercer a profissão de estudante, auditor de contas, Professor Doutor ou outra ocupação qualquer, indicando que a abreviação não é uma variável por completo estigmatizada, sendo por essa razão usada indiscriminadamente por homens e mulheres. As reflexões feitas no decorrer deste trabalho tiveram como objetivo primordial analisar, numa perspectiva diacrônico-comparativa, um dos aspectos da língua portuguesa, a redução, especificamente a abreviação, a fim de constatarmos a existência e origem desse fenômeno em períodos remotos da língua, particularmente os séculos XVIII e XIX até os dias atuais. Para tanto, fizemos um recorte de três Estados da região Nordeste, a saber: Paraíba, Pernambuco e Bahia, no intuito de comparar o comportamento do fenômeno em estudo, a abreviação, descrevendo suas aplicações e implicações na sociedade, tendo em vista que toda alteração nesta provoca inevitavelmente alterações de ordem lingüística. Embora de forma lacunosa, buscamos responder a algumas questões que têm inquietado professores de língua portuguesa, particularmente, e pais de alunos, de maneira especial, quanto às razões que levam alunos de séries variadas a utilizarem, não apenas em seus espaços digitais, mas também nos textos tradicionais, cujo suporte é a folha de papel, recursos de simplificação lingüística, 240 dentre eles a abreviação, fazendo-nos repensar aspectos centrais na relação entre a oralidade e a escrita. Para tanto, elegemos a teoria sociointerativa como o construto teórico capaz de explicar socio-historicamente processos de produção de sentido e processos inferenciais. Assim, buscamos comprovar a relação entre os fatores lingüísticos e sociais, considerando que aqueles são sensíveis aos fatores culturais, não podendo ser estudados isoladamente. Certamente a discussão por nós levantada não encerra aqui, mesmo porque as línguas se encontram em constante processo de mudança, todavia, procuramos reunir pontos de vista os mais diversos, visando atingir uma possível resposta para as muitas indagações aqui levantadas. Resta-nos a perspectiva de termos conseguido, de alguma forma, contribuir com dados reais da língua, instigando pesquisadores da área a desenvolverem estudos adicionais. 241 REFERÊNCIAS: ACIOLI, Vera Lucia Costa. A escrita no Brasil Colônia: Um guia para leitura de documentos manuscritos. Editora Universitária. Fundação Joaquim Nabuco. Editora Massangana. Recife. 1994. ADAM, J-M. Eléments de linguistique textuelle – théorie et pratique de l’analyse textuelle. Liède: Mardaga. 1990. AIRES, Fernando. Era uma vez o tempo – Diário V.Lisboa, Salamandra. 1999. Visto em home-page: http://web.ipn.pt/literatura/letras/recen061.htm. ARAUJO, Emanuel. A construção do livro. 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