PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE GOIÁS Gabinete do Desembargador Zacarias Neves Coêlho ____________________________________________________________ APELAÇÃO CÍVEL N. 117663-7/188 (200704112307) COMARCA DE GOIÂNIA 1º APELANTE : 2ª APELANTE 1ª APELADA HSBC BANK BRASIL S/A BANCO MÚLTIPLO : 2º APELADO RELATOR ROBERTO SERRA DA SILVA MAIA HSBC BANK BRASIL S/A BANCO MÚLTIPLO ROBERTO SERRA DA SILVA MAIA : DR. MÁRCIO DE CASTRO MOLINARI (Em substituição) RELATÓRIO ROBERTO SERRA DA SILVA MAIA (autor) e HSBC BANK BRASIL S/A BANCO MÚLTIPLO (ré), inconformados com o julgamento proferido pelo juízo de primeiro grau, interpõem apelação, visando à reforma da sentença de fls. 143/152 que julgou parcialmente procedente o pedido de indenização formulado pelo primeiro apelante. A sentença recorrida condenou a ré ao pagamento de R$ 2.000,00 (dois mil reais), a título de indenização pelo dano moral sofrido pelo autor, decorrente do cancelamento, sem prévia comunicação, do crédito relativo ao cheque especial em conta corrente. Por outro lado, restou negado o pedido de devolução da quantia de R$ 1.100,00 (hum mil e cem reais) referente a parte dos proventos do recorrente retida pela instituição financeira para cobrir o débito relativo ao crédito oferecido a título de cheque especial. Esta foi condenada, ainda, ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, fixados em R$ 1.000,00 (hum mil reais). Ac 117663-7/188 (200704112307) 1 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE GOIÁS Gabinete do Desembargador Zacarias Neves Coêlho ____________________________________________________________ Em suas razões recursais (fls. 153/159), o 1º apelante (ROBERTO SERRA DA SILVA MAIA), em síntese, sustenta que houve a retenção indevida do seu salário a fim de cobrir o débito do cheque especial, o que é vedado pela legislação de regência. Nesse sentido, pretende seja majorado o valor indenizatório para não menos de 50 (cinqüenta) salários mínimos, bem como o acréscimo da verba honorária para 20% sobre o valor da condenação. Requer ao final, seja conhecido e provido o recurso de apelação para a majoração do valor da indenização a um patamar condizente com o dano sofrido. Preparo visto a fls. 160. Já a 2ª apelante (HSBC BANK BRASIL S/A BANCO MÚLTIPLO), em suas razões recursais (161/173) alega, em síntese, que a sentença atacada merece reforma, porquanto inexistentes, na hipótese, os requisitos caracterizadores da responsabilidade civil. Defende, que não houve retenção do salário do correntista. O que ocorreu foi a normal e corriqueira prática de usar o valor depositado para saldar o débito existente. Aduz que inexiste o dever de indenizar, já que ausente o ato ilícito, o dano e o nexo causal, afirmando que não se configura a ilicitude, vez que a entrada de valores em conta-corrente é legalmente permitida para amortizar saldo devedor, além do que é prevista em contrato. Diz, ainda, que os danos experimentados Ac 117663-7/188 (200704112307) 2 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE GOIÁS Gabinete do Desembargador Zacarias Neves Coêlho ____________________________________________________________ ocorreram por exclusiva culpa do apelado e que assim sendo, não há que se falar em nexo causal. Ao final, requer o conhecimento do apelo e seu provimento. Preparo visto a fls. 174. Em contra-razões de fls. 177/184 o segundo apelado refutou todos os termos do apelo. A primeira apelada não apresentou contrarazões, embora para tanto devidamente intimada. É, em suma, o relatório. À douta Revisão. Goiânia, 26 de novembro de 2008. DR. MÁRCIO DE CASTRO MOLINARI Relator em substituição A9 Ac 117663-7/188 (200704112307) 3 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE GOIÁS Gabinete do Desembargador Zacarias Neves Coêlho ____________________________________________________________ APELAÇÃO CÍVEL N. 117663-7/188 (200704112307) COMARCA DE GOIÂNIA 1º APELANTE : 2ª APELANTE 1ª APELADA HSBC BANK BRASIL S/A BANCO MÚLTIPLO : 2º APELADO RELATOR ROBERTO SERRA DA SILVA MAIA HSBC BANK BRASIL S/A BANCO MÚLTIPLO ROBERTO SERRA DA SILVA MAIA : DR. MÁRCIO DE CASTRO MOLINARI (Em substituição) VOTO Presentes os pressupostos subjetivos de admissibilidade, conheço dos recursos. objetivos e Conforme relatado, ROBERTO SERRA DA SILVA MAIA (autor) e HSBC BANK BRASIL S/A BANCO MÚLTIPLO (ré), inconformados com o julgamento proferido pelo juízo de primeiro grau, interpõem apelação, visando à reforma da sentença de fls. 143/152 que julgou parcialmente procedente o pedido de indenização formulado pelo primeiro apelante. Analiso, inicialmente, o recurso interposto pela instituição financeira segunda apelante (HSBC BANK BRASIL S/A BANCO MÚLTIPLO). Pois bem. Não obstante os argumentos tecidos pela recorrente nas suas razões recursais, resta manifesto nos autos que a instituição financeira, sem justa causa, suspendeu o limite disponibilizado ao correntista (1º recorrente) sem prévia ciência deste, Ac 117663-7/188 (200704112307) 1 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE GOIÁS Gabinete do Desembargador Zacarias Neves Coêlho ____________________________________________________________ procedimento que caracteriza ato ilícito, na medida em que impossibilita o devedor de usufruir das vantagens que o crédito lhe assegura, inclusive saldar dívidas pendentes e impedir interrupção dos serviços prestados. Nesse diapasão, força convir que o recorrente não comprovou ter agido com a devida ponderação e cautela exigíveis nas circunstâncias, sobrelevando o fato de que tal procedimento se afigura reprovável com direta repercussão na execução da prestação dos serviços, de modo a responder pelas consequências gravosas suportadas pelo recorrido nos termos do artigo 14 do CDC. “Art. 14 – O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação do serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Por outro lado, impende ressaltar que o cancelamento do limite do cheque em conta-corrente, sem que exista prévia comunicação ao correntista, reveste-se de indiscutível abusividade, malgrado esteja inadimplente em contrato diverso ou mesmo com restrições em seu nome, como ocorre no caso em tela. Importa observar que inobstante a instituição financeira recorrente defenda que houve prévia comunicação ao apelado acerca do cancelamento do crédito relativo ao cheque especial a ele disponibilizado, cujo conteúdo inclusive foi gravado e juntado aos autos a f. 19, verifica-se que o próprio banco, em sede de contestação, transcreve cláusulas do contrato celebrado com o cliente Ac 117663-7/188 (200704112307) 2 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE GOIÁS Gabinete do Desembargador Zacarias Neves Coêlho ____________________________________________________________ recorrido em que consta expressamente que a aludida comunicação deve ser escrita e não por telefone, como alega ter ocorrido. Vejamos: “Capítulo II – item 'B' – cláusula 5: O presente acordo de concessão de limite de crédito em conta corrente feito entre as partes sob este Contrato, poderá ser rescindido no tocante ao cancelamento do limite de crédito em conta corrente concedido pelo Banco ao Cliente nos termos deste capítulo II, item 'B'. Tal rescisão far-se-á pelas partes a qualquer tempo, mediante aviso de uma à outra parte, através de comunicação escrita, com 5 (cinco) dias úteis de antecedência(...).” (f. 36). Assim, reconhecida a culpa da instituição financeira, bem como o nexo causal e o dano, deve ser ela compelida ao pagamento da verba indenizatória a título de danos morais. Neste sentido os seguintes arestos do Superior Tribunal de Justiça: “(...) É abusivo o cancelamento do limite de crédito em contrato de conta corrente vigente, sem que o correntista seja previamente comunicado”.(REsp 621577/RO - Ministra Nancy Andrighi – Terceira Turma - j. 03/08/2004 - DJ 23.08.2004 - p. 236). “COMERCIAL. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO. O limite do crédito aberto em conta-corrente só pode ser reduzido Ac 117663-7/188 (200704112307) 3 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE GOIÁS Gabinete do Desembargador Zacarias Neves Coêlho ____________________________________________________________ mediante aviso prévio ao respectivo titular; à míngua dessa providência, o banco responde pelos danos morais resultantes da devolução de cheque emitido dentro no limite originariamente contratado. Recurso especial conhecido e provido.” (3ª Turma, REsp n. 486.249/RS, Rel. Min. Ari Pargendler, unânime, DJU de 02.06.2003). Ainda: (Decisão Monocrática no Ag 917706-RS – Rel. Min. Aldir Passarinho Junior – DJ de 31/08/2007). Noutro tanto, deixo para apreciar a questão relativa ao valor da indenização fixada pela sentença quando da análise do recurso interposto pelo 1º apelante, em cujas razões consta pedido de majoração da respectiva verba indenizatória, ora combatida pelo banco 2º apelante. Passo à análise do recurso interposto por ROBERTO SERRA DA SILVA MAIA (1º apelante). Verifica-se que o apelante pretende a restituição do valor de R$ 1.100,00 (hum mil e cem reais) relativo a parte de seus proventos indevidamente retidos pela instituição financeira recorrida. É pacífico o entendimento jurisprudencial de que a retenção de salário percebido por correntista, para cobrir saldo negativo em conta corrente constitui pratica de ato ilegal que enseja a indenização por danos morais, porquanto a verba salarial possui natureza alimentar, cuja retenção é vedada nos termos do disposto no artigo 7º, inciso X, da CF. Ac 117663-7/188 (200704112307) 4 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE GOIÁS Gabinete do Desembargador Zacarias Neves Coêlho ____________________________________________________________ Neste toar, ao proteger o salário quis a lei satisfazer a necessidade básica de sobrevivência da parte, que não pode ver retido o seu rendimento, já que se destina, em princípio, à sua subsistência e de sua família. Eis nesse sentido o precedente do Superior Tribunal de Justiça: "DANO MORAL. RETENÇÃO DE SALÁRIO PARA PAGAMENTO DE CHEQUE ESPECIAL. ILICITUDE. Mesmo com cláusula contratual permissiva, a apropriação do salário do correntista pelo banco-credor para pagamento de cheque especial é ilícita e dá margem a reparação por dano moral." (STJ. 3ª T. AgRg no Ag 425113/RS. DJ 30/06/2006, p. 214, RJTJRS vol. 206 p.31. Relator Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS) Assim, não pode a instituição financeira reter os valores depositados na conta corrente do apelado, sob o argumento de que aquele extrapolou o limite do cheque especial. Dessa forma, deve ser reformada a sentença de primeiro grau a fim de condenar a instituição financeira recorrida a devolver a quantia de R$ 1.100,00 (mil e cem reais) injustamente retida para cobrir o débito relativo ao cheque especial do apelante. Já em relação ao pedido de majoração da verba indenizatória, impende ressaltar, por oportuno, que inexistindo critérios objetivos de valoração do dano moral, a fixação da indenização deve se dar segundo o prudente arbítrio do juiz, levando Ac 117663-7/188 (200704112307) 5 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE GOIÁS Gabinete do Desembargador Zacarias Neves Coêlho ____________________________________________________________ em conta a culpa do agente, a extensão do prejuízo causado e a capacidade econômica do causador do dano, sempre com o fito de evitar o enriquecimento sem causa e as compensações inexpressivas que não atendam sua função pedagógica. Neste sentido, a jurisprudência desta Corte: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. .QUANTUM INDENIZATÓRIO. RAZOABILIDADE. RECURSO ADESIVO NÃO CONHECIDO. .... II – A fixação do quantum da indenização por dano moral é conferida ao julgador que, diante do caso concreto, e analisando o dano que o ato ilícito causou na vida da vítima, estabelece, dentro da razoabilidade e proporcionalidade, o valor de uma indenização justa, assim, tendo sido arbitrado valor proporcional aos fatos evidenciados nos autos, deve ser mantido.” (Ap. Cív. nº 105402-5, de Rialma in DJE 14986 de 24/04/2007, Des. João Ubaldo Ferreira). Ressalte-se que o valor da indenização fixado em R$ 2.000,00 (dois mil reais) é ínfimo e desproporcional ao ato ilícito cometido pelo banco, todavia, o valor postulado de 50 (cinqüenta) salários mínimos, mostra-se exagerado. Logo, observando-se os princípios atinentes à matéria, entendo razoável a majoração da condenação para R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Noutro tanto, em relação ao pedido de majoração da sentença na parte relativa à fixação da verba honorária, a meu ver, com razão o apelante, porquanto a sentença condenatória Ac 117663-7/188 (200704112307) 6 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE GOIÁS Gabinete do Desembargador Zacarias Neves Coêlho ____________________________________________________________ implica em arbitramento dos honorários advocatícios nos termos do disposto no artigo 20, § 3º do CPC, o que faço em 20% do valor da condenação. Ao teor do exposto, conheço de ambos os recursos, dou provimento ao primeiro, para condenar a instituição financeira a devolver a quantia de R$ 1.100,00 (mil e cem reais) retida para pagamento do saldo devedor do cheque especial do correntista, corrigida desde a indevida retenção pelo INPC e com juros de 1% desde a citação, bem como majorar a condenação por danos morais para R$ 5.000,00 (cinco mil reais), com correção nos moldes assinalados pela sentença. Em face do caráter condenatório da sentença, procedo a sua alteração para fixar a verba honorária em 20% do valor da condenação (art. 20, § 3º do CPC), a ser suportada unicamente pelo Réu (art. 21, parágrafo único - CPC). Por outro lado, nego provimento ao segundo apelo, nos termos da fundamentação expendida. É como voto. Goiânia, 16 de dezembro de 2008. DR. MÁRCIO DE CASTRO MOLINARI Relator em substituição A9 Ac 117663-7/188 (200704112307) 7 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE GOIÁS Gabinete do Desembargador Zacarias Neves Coêlho ____________________________________________________________ APELAÇÃO CÍVEL N. 117663-7/188 (200704112307) COMARCA DE GOIÂNIA 1º APELANTE : 2ª APELANTE 1ª APELADA HSBC BANK BRASIL S/A BANCO MÚLTIPLO : 2º APELADO RELATOR ROBERTO SERRA DA SILVA MAIA HSBC BANK BRASIL S/A BANCO MÚLTIPLO ROBERTO SERRA DA SILVA MAIA : DR. MÁRCIO DE CASTRO MOLINARI (Em substituição) EMENTA: APELAÇÕES CÍVEIS. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. DEPÓSITO DE SALÁRIO USADO PARA COBRIR SALDO DEVEDOR EM CONTA CORRENTE. CANCELAMENTO UNILATERAL DE CONTRATO DE CHEQUE ESPECIAL. DEVOLUÇÃO DE CHEQUE. QUANTUM INDENIZATÓRIO. HONORÁRIOS. 1 – Ao reter salário percebido por correntista, para cobrir saldo negativo em conta corrente, o banco pratica ato ilegal que enseja a indenização por danos morais. 2 Configura prejuízo o cancelamento unilateral de contrato de concessão de limite em contacorrente, mormente quando, em razão disso, houve devolução de cheque emitido pelo correntista. 3 - Cabível indenização por danos morais, cujo valor deve levar em conta os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, porquanto inexistindo critérios objetivos de valoração do dano moral, a sua fixação devese levar em conta a culpa do agente, a extensão do prejuízo causado e a capacidade econômica do causador do dano. 4 – A verba Ac 117663-7/188 (200704112307) 1 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE GOIÁS Gabinete do Desembargador Zacarias Neves Coêlho ____________________________________________________________ honorária deve ser fixada nos termos do artigo 20, § 3º do CPC quando a sentença é condenatória. ACÓRDÃO VISTOS, relatados e discutidos os presentes autos acordam os integrantes da Quarta Turma Julgadora da 2ª Câmara Cível do egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, POR UNANIMIDADE DE VOTOS, EM CONHECER DE AMBOS OS RECURSOS PARA DAR PROVIMENTO AO PRIMEIRO E NEGAR PROVIMENTO AO SEGUNDO, nos termos do voto do RELATOR. VOTARAM com o RELATOR, os Desembargadores ALAN S. DE SENA CONCEIÇÃO e ALFREDO ABINAGEM. Presidiu a sessão O Desembargador GILBERTO MARQUES FILHO. PRESENTE o ilustre Procurador de Justiça, Dr. VALDIR LARA CARDOSO. Custas de lei. Goiânia, 16 de dezembro de 2008. GILBERTO MARQUES FILHO. Presidente DR. MÁRCIO DE CASTRO MOLINARI Relator em substituição A9 Ac 117663-7/188 (200704112307) 2