Ácido Fólico O ácido fólico tem um papel importante na manutenção da hematopoiese, no processo de síntese do DNA e em diferentes processos metabólicos. É absorvido no intestino delgado e armazenado no fígado, mantendo uma reserva suficiente por um período de 3 a 5 meses. A deficiência está associada à escassez na dieta, a situações que levam ao aumento da ingestão (medicamento), a fármacos, a patologias que interferem no metabolismo e/ou na absorção e aos síndromes de má absorção. A sua avaliação é útil na investigação de anemias, no acompanhamento da terapia de reposição, na avaliação de alcoólicos crónicos, durante a gravidez, nos diferentes síndromes de má absorção e nos distúrbios de absorção pós-cirurgia para obesidade mórbida. A anemia megaloblástica é a principal manifestação clínica da deficiência de ácido fólico. Outras manifestações como doença depressiva, alterações neurológicas e psiquiátricas e fetos com defeitos do tubo neural estão associadas também à sua deficiência. Níveis séricos diminuídos são encontrados também na gravidez (33%), em anemias hemolíticas, em hepatopatias, em neoplasias, em pacientes hemodialisados, no alcoolismo crónico, em alterações intestinais que levam a má absorção e no uso de alguns medicamentos. As drogas podem interferir tanto na sua absorção como no seu metabolismo. O uso de anticonvulsivantes (fenitoína, fenobarbital e primidona), de contraceptivos orais e, mais raramente, o uso de antiácidos e antagonistas do receptor H2 alteram a absorção. O seu metabolismo pode ser alterado por uso de antimicrobianos que levam à diminuíção das bactérias intestinais importantes no processo de metabolização. Os quimioterápios, especialmente o metotrexate e o uso de álcool, também interferem no seu metabolismo. O álcool interfere tanto no metabolismo como na absorção. O uso crónico de anticonvulsivantes leva quase sempre à macrocitose (aumento do MCV), mesmo na ausência de anemia. Ácido Lático Em condições adequadas de oxigenação, a glicose é metabolizada por via aeróbica para a produção de energia. Os produtos de seu metabolismo são convertidos em piruvato, que por sua vez é metabolizado no ciclo de Krebs. Já em condições de hipóxia tecidual grave, o metabolismo aeróbico torna-se incapaz de funcionar e, assim, o piruvato é convertido em ácido láctico, utilizando o metabolismo anaeróbico. O ácido láctico é um ácido com pH 3,9, e, por isso, praticamente todo ele é encontrado na circulação sob a forma de L-lactato. É derivado principalmente do músculo-esquelético, cérebro, rins e eritrócitos. A sua concentração sanguínea depende da taxa de produção nos tecidos e das taxas de metabolização hepática e renal. Cerca de 65% do lactato produzido é usado pelo fígado, especialmente na gliconeogénese. A remoção extra-hepática do lactato ocorre por oxidação na musculatura esquelética e no córtex renal. Com a normalização dos níveis de oxigenação, o lactato acumulado nas células é novamente convertido em piruvato, retornando ao ciclo normal. Os níveis séricos do ácido láctico estão relacionados com a disponibilidade de oxigénio. Na avaliação da oxigenação, a concentração de pO2 indica a captação alveolar pulmonar do O2. A medida da saturação de O2 determina o teor de oxigenação arterial, enquanto o lactato é uma medida sensível e confiável de hipóxia tecidual. Eleva-se precocemente antes que outras alterações clínicas ou gasométricas possam ser detectadas, é por isso considerado um marcador precoce de hipóxia tecidual. SECUNDÁRIA À HIPÓXIA TECIDUAL Choque, hipovolemia, insuficiência ventricular esquerda, infarte agudo do miocárdio, edema pulmonar, estados per e pós- operatórios, cirurgia cardíaca, circulação extracorpórea DISTÚRBIOS METABÓLICOS (PRODUÇÃO EXCESSIVA - DIIMINUIÇÃO DA REMOÇÃO HEPÁTICA) Diabetes mellitus, insuficiência hepática, neoplasias, linfomas, leucemias, intoxicações por drogas (acetaminofeno e salicilatos), etanol, metanol, erros inatos do metabolismo, exercício excessivo e hiperventilação. A acidose láctica pode ter origem na hipóxia tecidual ou pode ocorrer em consequência de outras patologias que levem a alterações metabólicas. Em geral, as etiologias desassociadas da hipóxia apresentam valores menos elevados. Em pacientes com acidose metabólica, uma diferença aniónica elevada sugere o diagnóstico de acidose láctica. É do que se deve suspeitar quando a soma dos aniões menos a soma dos catiões ultrapassa 18 mEq/L. Isso, é claro, na ausência de outras causas que possam levar a uma diferença aniónica, como insuficiência renal, cetonémia importante e intoxicação por metanol. [(Na+ + K+ ) - (Cl-+HCO3-)] > 18 mEq/L Os seus níveis podem estar alterados noutros líquidos orgánicos como líquor e líquidos pleural, ascítico e peritoneal, auxiliando no diagnóstico diferencial entre infecções bacterianas e virícas. Ácido Úrico O ácido úrico é o maior produto do catabolismo das purinas. É armazenado no organismo num pool de alto turnover, sendo oriundo do catabolismo das proteínas da dieta e de fontes endógenas, concentrando-se principalmente no fígado. Cerca de 60% desse é trocado diariamente por formação e excreção concomitantes. O ácido úrico é excretado principalmente por via renal. Apenas uma pequena parcela (1/3) é eliminada por via gastrointestinal. Não existe uma relação directa entre os valores séricos e os valores urinários. Os níveis séricos do ácido úrico são determinados pela relação entre a dieta, a produção endógena e os mecanismos de reabsorção e de excreção. Os mecanismos de reabsorção e de excreção renais são complexos, e podem ocorrer alterações na filtração glomerular, na reabsorção tubular proximal, na secreção tubular e na reabsorção após secreção. Diversos factores como dieta, predisposição genética, sexo, idade, peso, medicamentos, uso de álcool e associação com outras patologias como diabetes mellitus e distúrbios lipídicos podem alterar os valores séricos e levar a um desequilíbrio entre a absorção e a excreção de ácido úrico. Os seus valores sofrem uma variação diurna, com valores mais elevados pela manhã e mais baixos à noite. A hiperuricémia é a forma comum de se definir o aumento da concentração sérica de ácido úrico que ultrapasse os valores de referência. Pode ocorrer por diferentes mecanismos, associados com aumento da produção ou diminuição da excreção renal. Ocorre nas dietas ricas em carnes, especialmente vísceras (fígado e rim), vegetais leguminosos e trigo. Também é encontrada nas dislipidémias, nas anemias hemolíticas, na anemia perniciosa e noutras situações em que há aumento do turnover de ácidos nucleicos (excesso de destruição celular), como ocorre nas neoplasias e no curso de quimioterapia e de radioterapia, especialmente no tratamento de linfomas e de leucemias. A policitemia, o mieloma múltiplo e o infarte agudo do miocárdio extenso podem também aumentar o metabolismo das nucleoproteínas. Alterações da função renal, hipertensão arterial, hipotireoidismo, hiperparatireoidismo, diabetes insipidus, diabetes mellitus, doença de Addison e uso de drogas como salicilatos e alguns diuréticos podem induzir à diminuição da velocidade de excreção de ácido úrico. Portanto, os níveis séricos do ácido úrico podem apresentar-se alterados numa gama de situações clínicas, incluindo a gota. A gota é responsável por apenas 10 a 15% das hiperuricemias. A maioria dos pacientes com gota sofre tanto de superprodução como de hipoexcreção. A gota caracteriza-se clinicamente por hiperuricémia, precipitação de urato monossódico em fluidos biológicos supersaturados e depósito de urato por todo o corpo, com excepção do sistema nervoso central, mas com maior predisposição para articulações, cartilagem periarticular, ossos, bursa e tecidos moles subcutâneos. São comuns ataques recorrentes de artrite, nefropatia e, frequentemente, nefrolitíase. Os depósitos de uratos são responsáveis pelos sinais e sintomas da artrite gotosa, pois levam a uma severa reacção inflamatória no local. Nos rins são descritos três tipos distintos de lesões: a nefropatia gotosa com depósito de uratos no parenquima, o depósito intratubular agudo de cristais de urato e a nefrolitíase. Os homens respondem por cerca de 90% dos casos de gota. Normalmente, ela é classificada como primária quando decorre de um erro metabólico, directamente ligado ao aumento da produção ou à diminuição da excreção, e como secundária quando decorre do aumento do ácido úrico em consequência de outras numerosas etiologias. AUMENTO DA FORMAÇÃO Aumento da síntese de purinas Desordens metabólicas hereditárias Excesso de ingestão de purinas Aumento do turnover de ácidos nucléicos Hipóxia tecidual DIMINUIÇÃO DA SECREÇÃO Idiopática Insuficiência renal crónica Aumento da reabsorção renal Drogas (diuréticos e salicitatos) Intoxicação por chumbo Hipertensão arterial Outras doenças endócrinas A hipouricémia é rara, podendo ser secundária a diferentes situações como uma doença hepatocelular grave, que leva à diminuição da síntese de purina, deficiência da reabsorção tubular de ácido úrico congénita, como no síndrome de Fanconi, ou adquirida, por supertratamento com drogas uricosúricas, na secreção inadequada da hormona antidiurética, na doença de Wilson, na xantinúria, nas intoxicações por metais pesados e nas dietas pobres em purina. A quantidade de ácido úrico presente na urina varia de acordo com o pH: é tanto menor quanto maior for o pH. A excreção urinária de ácido úrico aumentada pode ocorrer isolada ou associada a outros distúrbios metabólicos (com aumento da produção endógena), pelo aumento da ingestão de purinas e pelo uso de drogas uricosúricas, principalmente na fase inicial do tratamento. A diminuição dos níveis urinários de ácido úrico pode estar associada a gota crónica e a uma dieta pobre em purinas. Como já citado, não existe correlação directa entre os níveis séricos e urinários do ácido úrico. A sua avaliação é útil na investigação das litíases renais. Os cristais de ácido úrico são achados frequentes em crianças em fase de crescimento acelerado e noutras situações de aumento do metabolismo de nucleoproteínas. Algumas drogas, como antiinflamatórios, aspirina, vitamina C, além dos diuréticos, podem alterar a sua excreção. Ácido Valpróico O ácido valpróico (valproato de sódio) é utilizado no tratamento das convulsões tónico-clónicas, mioclónicas e atónicas e das ausências. Embora o seu mecanismo de acção não seja totalmente conhecido, acredita-se que actue aumentando a atividade do sistema inibidor, mediado pelo ácido gama-aminobutírico (GABA). A absorção é rápida e completa, com picos séricos entre 1 a 4 horas após a administração oral. As concentrações séricas terapêuticas usuais são de 50 a 100 mg/mL. A sua acção inicia-se cerca de 4 horas após a administração oral, e o estado de equilíbrio normalmente é alcançado num período entre 1 a 4 dias. Cerca de 90% da droga é metabolizada no fígado, e uma grande percentagem (93%) está ligado a proteínas plasmáticas, principalmente à albumina. Por isso, em situações com diminuição proteica, cirrose, uremia e uso de drogas que competem com essa ligação, a taxa de ácido valpróico livre (fração biologicamente activa) pode aumentar. A semi-vida sérica no adulto é de 16 horas, podendo ser prolongada por uso de bebidas alcoólicsa e diminuída pela associação com fenitoína, fenobarbital, carbamazepina e primidona. Com o uso crónico, a semi-vida é reduzida para 12 horas. Em crianças, a semi-vida é de 12 horas. Em recém-nascidos e nas doenças hepáticas em que o metabolismo é reduzido, a semi-vida é prolongada. O ácido valpróico deve ser utilizado com cautela em gestantes, devido aos seus prováveis efeitos teratogénicos. Os efeitos colaterais incluem sedação, distúrbios gástricos, reacções hematológicas (a mais comum é a plaquetopenia), ataxia, ganho de peso, sonolência e coma. Foram descritos casos raros de hepatotoxicidade e pancreatite graves ou fatais. A sua dosagem é de grande utilidade para avaliar os níveis de adesão ao tratamento e detectar as concentrações em níveis tóxicos. Níveis baixos podem ser encontrados por falta de adesão à terapia. Normalmente, a colleita deve ser realizada em pacientes que estejam medicados com o medicamento há pelo menos, 2 a 4 dias, e sempre antes da próxima dose. Entretanto, nos casos de suspeita de intoxicação, a colheita pode ser realizada a qualquer altura. Para facilitar a interpretação, é importante conhecer a hora em que a última dose foi ingerida. Agregação Plaquetária Entre as propriedades das plaquetas estão a manutenção da homeostasia, a adesão à superfície endotelial danificada, a agregação em resposta a uma variedade de estímulos e a secreção de factores de coagulação, vasoconstritores e factores de crescimento após a sua activação. O processo de formação do trombo plaquetário inicia-se com a lesão endotelial. Quando ocorre uma lesão vascular, a matriz colagénea e as proteínas subendoteliais ficam expostas. É nesse local que os receptores de membrana das plaquetas se ligam, resultando na adesão plaquetária, a primeira etapa do processo de formação do trombo plaquetário. Múltiplos agonistas são gerados neste momento. Eles induzem a activação plaquetária, ocasionando alterações nos receptores da glicoproteína (GP) IIb/IIIa e levando a um estado de receptividade à ligação do fibrinogénio. Nessa fase, as plaquetas encontram-se definitivamente activadas. Em seguida, inicia-se o processo de agregação plaquetária, com a ligação múltipla e cruzada do fibrinogénio aos receptores GP IIb/IIIa. As causas de diminuição da agregação plaquetária podem ser congénitas ou adquiridas. Entre as causas congénitas estão a doença de von Willebrand, a trombastenia de Glanzmann e o síndrome de Bernard-Soulier. Todas estas patologias estão relacionadas com defeitos na fase de adesão plaquetária. As plaquetas aderem a superfícies estranhas por meio da ligação das glicoproteínas da sua membrana, tendo como participante indispensável uma proteína plasmática, na verdade um componente do complexo molecular do fator VIII da coagulação chamado fator de von Willebrand. Esse mecanismo pode ser estudado em laboratórios pelo tempo de sangria, teste de adesividade plaquetária, teste de agregação plaquetária com ristocetina, dosagem do co-factor da ristocetina e dosagem do fator VIII. A doença de von Willebrand e a ausência congénita do factor de von Willebrand ou do co-factor da ristocetina fazem com que a agregação seja anormal com todos os estimulantes utilizados usualmente. Na doença de von Willebrand dos tipos IA e IIA, a agregação com a ristocetina é geralmente anormal, mas está aumentada no tipo IIB. A trombastenia de Glanzmann, embora rara, é a principal doença autossómica recessiva que afecta a interacção entre as plaquetas. Caracteriza-se por um prolongamento do tempo de sangria, episódios recorrentes de sangramentos mucocutâneos e ausência de resposta agregante aos estimulantes normais com resultado positivo à ristocetina. Na síndrome de Bernard-Soulier, ocorre ausência de resposta das plaquetas ao factor de von Willebrand; as plaquetas respondem normalmente aos estimulantes usuais, mas sem se agregarem em resposta à ristocetina. Entre as condições adquiridas que causam diminuição da agregação plaquetária, temos o uso de medicações inibidoras, doenças auto-imunes que produzem anticorpos contra as plaquetas, desordens mieloproliferativas, uremia por insuficiência renal, desordens adquiridas do armazenamento de ADP e produtos de degradação da fibrina. Algumas condições podem produzir aumento da agregação plaquetária, como sejam, quadros de hipercoagulabilidade que indicam um risco de acidente vascular cerebral, trombose venosa profunda e outras condições associadas à formação de coágulo. Na avaliação de pacientes com desordens plaquetárias qualitativas, deve ser sempre considerado o estudo da agregação plaquetária, indicado também para os pacientes com sangramento mucocutâneo de natureza prolongada e contagem plaquetária normal. O teste de agregação pode ser utilizado na monitorização de pacientes tratados com antiagregantes plaquetários, como ácido acetilsalicílico e ficlodipina. O teste com ácido araquidónico em vigência do uso dessas drogas resulta na agregação diminuída ou ausente. O quadro a seguir actualiza os resultados da agregação plaquetária nas diversas patologias e com os diferentes agentes agregantes. ADP 1º Fase Glanzmann A Von Willebrand N Bernard- Soulier N Uso de AAs ou N similares PATOLOGIA Adrenalina Ristocetina Colagénio Ácido Araquidónico 2º Fase A N N A N V V V A A N N A N N A V N V A A=Anormal N=Normal V=Variáveis O exame é realizado a partir do plasma do paciente em num instrumento fotóptico denominado agregómetro. O plasma enriquecido em plaquetas é colocado em contato com agentes agregantes. Ocorre, então, a formação crescente de grandes agregados plaquetários, acompanhados de diminuição da turbidez da amostra. A mudança na densidade óptica é transmitida pelo instrumento, em percentagem de agregação. Os agentes agregantes normalmente utilizados no teste são ADP (adenosina difosfato), colagénio, adrenalina, ácido araquidónico e ristocetina. A informação clínica do paciente quanto ao uso de medicamentos de acção plaquetária é importante para se ter certeza de que o resultado observado, caso alterado, será devido a uma desordem qualitativa subjacente. A disfunção plaquetária poderá ser observada nalgumas condições clínicas, como insuficiência renal e desordens mieloproliferativas. Albumina De todas as proteínas séricas, a albumina é a que está presente em maior concentração, correspondendo a cerca de 60% do total de proteínas. É sintetizada exclusivamente pelo fígado, aparecendo primeiro no citoplasma dos hepatócitos como um precursor chamado pré-albumina. A sua semi-vida biológica é de cerca de 3 semanas. Tem um papel muito importante em diversas funções do organismo, como sejam a manutenção da pressão osmótica do plasma e o transporte de substâncias. Por isso, está relacionada fisiopatologicamente às alterações do equilíbrio hídrico e aos mecanismos de desentoxificação do organismo, já que tem a capacidade de fixar substâncias, não só do tipo fisiológico, tais como bilirrubina, magnésio, cálcio e ácido úrico, como também diversos medicamentos, como penicilina e sulfa-penicilinas, entre outros. A hiperalbuminémia é rara e na maioria dos casos indica situações clínicas de desidratação ou hiperinfusão com albumina. Já a hipoalbuminémia é frequente, e pode apresentar-se em consequência de diferentes mecanismos, como diminuição da síntese por lesões hepáticas, má nutrição e síndromes de má absorção, aumento do catabolismo, como na fase de resposta aguda, perdas excessivas, como no síndrome nefrótico, outras lesões renais com perda protéica, disfunção da tiróide, úlcera péptica, alcoolismo crónico, gravidez, hemorragias, queimaduras, perdas intestinais e perdas para espaço interestecial, como ascites e outros derrames volumosos. Nos casos de doenças crónicas como tuberculose e neoplasias, a diminuição ocorre tanto por alteração da síntese como pelo aumento do catabolismo. A queda de albumina pode também estar relacionada a uma rápida hidratação, superhidratação, necrose grave difusa do fígado, hepatite crónica activa e neoplasias. Portanto, essa avaliação é clinicamente importante na verificação das condições nutricionais, no acompanhamento da síntese, do catabolismo e das perdas protéicas. Níveis séricos entre 2,0 e 2,5 g/dL correlacionam-se com a manifestação de edema. Consultar a electroforese das proteínas Aldolase É uma enzima presente em quase todos os tecidos. É composta pelas subunidades A, B e C, que formam quatro isoenzimas, sendo que a subunidade A responde pela maior parcela da aldolase sérica. AAAA BBBB CCCC AAAC predomina nos músculos esqueléticos predomina no fígado predomina no cérebro e noutros tecidos presente nos tecidos, porém em baixa concentração A determinação sérica da aldolase é de grande importância clínica na avaliação das doenças primárias da musculatura esquelética. As maiores elevações são encontradas na distrofia muscular progressiva de Duchenne. Níveis alterados também podem ser observados nas miosites e dermatomiosites. Os seus níveis correlacionam-se com a massa muscular. A perda muscular progressiva faz diminuir os valores por perda da capacidade de síntese; portanto, só se encontram valores alterados nas fases precoces das distrofias, quando a massa muscular se encontra relativamente preservada. Valores normais são encontrados nas patologias musculares de causa neurológica como esclerose múltipla, poliomielite e miastenia gravis. A sua elevação não é específica para doenças musculares. O aumento da aldolase pode ser encontrado no infarte do miocárdio (pico em 24 a 48 horas), hepatites virícas agudas, pancreatite hemorrágica, gangrena, tumores da próstata, neoplasias hepáticas primárias e secundárias, anemia megaloblástica, leucemia granulocítica e em pacientes medicados com fenotiazida. Alfa-1-Antitripsina É uma das proteínas de fase aguda e, como tal, apresenta-se aumentada nas doenças inflamatórias agudas e crónicas, neoplasias, pós-traumas ou cirurgias e durante a gravidez ou terapia com estrogénio. Níveis diminuídos estão associados a deficiência congênita. Na deficiência homozigota, cerca de 10% das crianças desenvolvem hepatopatias importantes, inclusive hepatite neonatal e cirrose. Os adultos tendem a apresentar quadro de enfisema na terceira ou quarta década de vida e quadros de cirrose assintomática, hepatite crónica activa e carcinoma hepatocelular. A doença é sugerida pela ausência da banda alfa-1 na eletroforese (a alfa-1antitripsina representa 90% dessa banda) e confirmada pela dosagem sérica da alfa-1-antitripsina. Nos homozigotos, os níveis séricos encontram-se acentuadamente diminuídos ou, mais raramente, ausentes. Nos heterozigotos, os níveis séricos apresentam-se diminuídos em níveis moderados. A alfa-1-antitripsina deve ser investigada em todos os lactentes com complicações hepáticas. Alfa-1-Glicoproteína Ácida Proteína também conhecida como orosomucóide, é sintetizada basicamente no fígado, podendo ser sintetizada, ainda, por leucócitos e por células tumorais. É filtrada em grande quantidade pelo glomérulo, o que acarreta uma semi-vida curta, de cerca de 5 dias. Como uma proteína de fase aguda, grandes concentrações séricas podem ser observadas em processos infecciosos e inflamatórios agudos, durante a gravidez, infarte agudo do miocárdio, mielomas, doença de Hodgkin, neoplasias, traumas, queimaduras e colagenoses. Níveis séricos diminuídos podem ser encontrados em estados de desnutrição, lesões hepáticas graves e patologias com grande perda protéica. Os níveis encontrados nos derrames cavitários podem ser de ajuda no diagnóstico diferencial entre transudados e exsudados. São encontrados níveis baixos nos transudados, elevados nos exsudados e extremamente elevados nos exsudados de origem neoplásica. A sua função biológica ainda não foi bem definida. No entanto, alguns trabalhos indicam uma participação importante no transporte de hormonas e drogas. É um dos melhores marcadores de actividade inflamatória, já que retorna a níveis normais em menos tempo do que as outras proteínas de fase aguda. Alfa-Fetoproteína A alfa-fetoproteína (AFP) é a principal glicoproteína plasmática precoce do feto humano. É sintetizada pelo fígado fetal, os seus níveis elevam-se durante a 14ª semana de gestação, atingindo os índices normais do adulto em 6 a 10 meses após o nascimento. Nos adultos, está presente em níveis baixos, em homens e em mulheres não-grávidas saudáveis. Em pacientes com carcinomas hepatocelulares e tumores testiculares (nãoseminomas), encontram-se níveis elevados. Valores elevados também podem ser encontrados em cerca de 20% dos carcinomas gástricos e pancreáticos e numa pequena percentagem de carcinomas do pulmão e do cólon. Nem sempre as elevações de AFP estão associadas a malignidade. Os níveis podem estar elevados em doenças inflamatórias do fígado, como hepatite viríca, hepatite crónica e cirrose hepática. Níveis altos de AFP também podem estar presentes em doenças inflamatórias intestinais, como a doença de Crohn, e na colite ulcerosa, que também produzem elevações do antígeno carcinoembrionário (CEA). A maior indicação da determinação de AFP é a monitorização do tratamento de carcinomas hepatocelulares e de tumores testiculares (não-seminomas) e das suas recidivas. Após o tratamento, os valores retornam ao normal dentro de 4 a 6 semanas. O aumento após esse período ou a permanência de valores elevados indicam, respectivamente, recidiva e persistência da doença. Os níveis de AFP estão correlacionados ao tamanho do tumor. Nos tumores testiculares, é utilizada em associação com a beta-gonadotrofina coriónica (bHCG), sendo extremamente útil no diagnóstico diferencial. Os seminomas cursam com AFP negativa e bHCG elevada; nos não-seminomas, ambas se elevam. É inútil a sua utilização como rastreamento na população, por causa de significativas elevações em diferentes patologias, benignas e malignas. Consultar Gonadotrofina Coriônica. Alfa-Fetoproteína na Gravidez A alfa-fetoproteína (AFP) produzida pelo feto é transferida para o líquido amniótico por meio da urina fetal. Os níveis no soro fetal estão em concentrações aproximadamente 150 vezes mais baixas do que no líquido amniótico. A AFP também aparece no soro materno por transferência pela placenta ou por difusão através das membranas fetais. Picos acontecem em torno da 32a semana de gestação. Em contraste com os níveis típicos do segundo trimestre, de 10 a 12 mg/mL no líquido amniótico, os níveis no soro materno durante esse mesmo período são de apenas 30 a 35 ng/mL. No segundo trimestre, os níveis de AFP no soro materno aumentam cerca de 15% por semana, enquanto os níveis no líquido amniótico declinam aproximadamente 13% por semana. Em lesões fetais abertas, como espinha bífida e anencefalia, ocorre perda da AFP para o líquido amniótico, elevando os níveis de AFP. No soro materno, a AFP é um teste de triagem para defeitos congênitos fetais como os do tubo neural, espinha bífida, anencefalia e também para a síndrome de Down. A triagem adequada para essas alterações requer um protocolo integrado que envolve exames laboratoriais, ultra-sonografias, médicos obstetras e aconselhamento genético. Uma triagem falso-positiva pode ser provocada por subestimação da idade gestacional, gestação múltipla inesperada ou hemorragia de placenta. As duas razões anteriores podem ser excluídas por meio do exame de ultra-som e pela repetição da avaliação, 1 semana depois. Se tais condições não estiverem presentes, um teste positivo alto indica risco, com probabilidade, aproximadamente, de 1 em 50 de uma anomalia fetal. A combinação da idade materna na data da coleta do sangue e os níveis de AFP irá predizer o fator de risco para a síndrome de Down. O HCG e o estriol são usados freqüentemente para um aumento adicional da precisão da avaliação de risco da síndrome de Down (teste triplo). Consultar Teste Triplo. Amilase As amilases são enzimas que catalisam a hidrólise da amilopectina, da amilose e do glicogênio. A amilase presente no sangue e na urina de indivíduos normais é de origem pancreática (predominantemente forma P) e das glândulas salivares (forma S). A avaliação dos níveis séricos da amilase tem grande utilidade clínica no diagnóstico das doenças do pâncreas e na investigação da função pancreática. Na pancreatite aguda, os níveis de amilase podem alcançar valores de quatro a seis vezes o limite superior de referência, elevando-se em 2 a 12 horas e retornando a níveis normais em 3 a 4 dias. A magnitude da elevação da amilase não se correlaciona com a gravidade da lesão pancreática. Cerca de 20% dos casos de pancreatite aguda podem cursar com valores normais de amilase. Por isso, a dosagem concomitante dos níveis de lipase é importante, permitindo o diagnóstico desses casos. Nos casos que evoluem com formação de pseudocistos, os níveis de amilase continuam elevados por mais tempo. Os abcessos pancreáticos também podem aumentar os níveis séricos da amilase. As pancreatites crónicas cursam com níveis normais ou pouco elevados de amilase. O carcinoma pancreático cursa com níveis normais; a elevação aparece em menos de 5% dos pacientes. Na maior parte dos casos, os níveis de amilase só se elevam quando o tumor provoca a obstrução do ducto pancreático principal. As causas não-pancreáticas de aumento da amilase incluem lesões inflamatórias das glândulas salivares, como parotidite, apendicite aguda, gravidez tubárica rota, úlcera péptica perfurada, trauma pancreático, obstrução intestinal, aneurisma dissecante da aorta, pós-operatório de cirurgias toráxicas e abdominais, queimaduras, doenças do trato biliar, traumas e uso de um grande número de drogas como morfina e derivados. A amilase pode estar elevada também em neoplasias como as pulmonares e as ováricas, e estudos apontam que a elevação se dá à custa da amilase do tipo S. Os níveis urinários de amilase permanecem alterados por períodos mais longos que os séricos. Nos casos de complicação com pseudocisto de pâncreas, a amilase urinária pode permanecer elevada por semanas após os níveis séricos terem retornado ao normal. Nos indivíduos com função renal normal, a proporção entre a clearance de amilase e a creatinina é constante, com valores de referência usuais de 2 a 5%. Na pancreatite, a clearance da amilase está aumentado, e, portanto, a proporção entre a clearance de amilase/creatinina está elevada. Valores acima de 8% são comuns na pancreatite aguda. Valores elevados podem ser encontrados também em queimados, na insuficiência renal e no mieloma múltiplo. Na macroamilasemia, a amilase encontra-se ligada a uma imunoglobulina, e o complexo formado é muito grande para ser filtrado pelos glomérulos, o que leva a uma hiperamilasemia aparente que não indica doença; os valores séricos são muito altos, e os valores urinários, normais. Nesses casos, utilizam-se os resultados da relação entre a clearance de amilase/creatinina para se fazer o diagnóstico diferencial. Isso porque, na macroamilasemia, a relação é muito baixa, ao contrário da relação encontrada na pancreatite aguda. ANCA Os anticorpos anticitoplasma de neutrófilos (ANCA) são auto-anticorpos contra uma serina protease, a proteinase 3. Os ANCA estão associados primariamente à granulomatose de Wegener. São muitas vezes os únicos anticorpos presentes nessa patologia. São encontrados também em quadros de vasculite, poliartrite nodosa microangiopática, poliangeíte microscópica, glomerulonefrite necrotizante microscópica e síndrome de Churg-Strauss. Também podem estar presentes em diversas patologias gastrointestinais e reumáticas, ou após o uso de certas drogas. Quando esses anticorpos são incubados com neutrófilos normais fixados em etanol, podem ser observados dois padrões de imunofluorescência: o citoplasmático (cANCA) e o perinuclear (p-ANCA). O padrão c-ANCA é encontrado em cerca de 85% dos casos de granulomatose de Wegener, e os seus títulos correlacionam-se com a atividade da doença. Em pacientes com vasculite, esses anticorpos são geralmente dirigidos contra a mieloperoxidase, o que leva à visualização do padrão perinuclear (p-ANCA). Esse padrão também pode ser observado na poliartrite nodosa microangiopática, na poliangeíte microscópica, na glomerulonefrite necrotizante microscópica e na síndrome de Churg-Strauss. O padrão p-ANCA deve ser distinguido dos anticorpos antinucleares (ANA). A sua presença pode ser encontrada em doenças intestinais e na artrite reumatóide. Técnicas de imunoblotting ou de ELISA são melhores do que a imunofluorescência por apresentarem maior precisão e por permitirem a identificação dos antígenos alvos associados a esses anticorpos. Enzima Conversora da Angiotensina (ECA) A enzima conversora da angiotensina (ECA) actua na conversão de angiotensina I em angiotensina II, representando um papel importante na homeostase da pressão arterial. É produzida principalmente no pulmão. Embora, a sua medida tenha pouca utilidade no diagnóstico e tratamento da hipertensão arterial, entre as alterações genéticas consideradas como possíveis etiologias das doenças cardiovasculares, a que tem despertado maior atenção é o polimorfismo genético do gene que codifica a ECA. Num grande número de indivíduos, observaram-se diferenças marcantes nos níveis plasmáticos da ECA. Essa variabilidade é efeito de um polimorfismo genético no gene codificante para a enzima. A análise dos níveis de ECA no plasma circulante demonstrou uma associação directa entre os genótipos relativos ao polimorfismo e os níveis da proteína. Dessa forma, indivíduos que apresentam o genótipo DD possuem aproximadamente o dobro da concentração de ECA circulante, em relação a aqueles com genótipo II, enquanto o genótipo DI apresenta níveis intermediários de ECA. O polimorfismo D/I encontra-se correlacionado com 47% da variação total do nível de ECA circulante no plasma. Estudos realizados demonstraram que o genótipo DD está associado à alta incidência de EAM, consistindo num factor de risco independente, aumentando em 2,7 vezes o risco relativo de desenvolver tal patologia. O efeito deletério do genótipo DD pode resultar de uma super expressão da ECA, levando a um aumento local de angiotensina II em regiões vasculares como a circulação coronária, podendo ser considerado como um novo e potente factor de risco para o EAM. A utilização mais frequente do doseamento dos níveis de ECA é no diagnóstico e acompanhamento da evolução da sarcoidose. Os seus níveis, encontram-se elevados em 40-85% dos pacientes adultos com sarcoidose activa e diminuem em resposta à terapia com corticosteróides. Na sarcoidose pulmonar pode estar aumentada no soro e no lavado bronco-alveolar. Não é um marcador específico de sarcoidose, visto que concentrações elevadas podem também ser encontradas noutras patologias pulmonares como enfisema, asma, carcinoma de pequenas células, carcinoma de células escamosas, tuberculose, silicose, abestose e pneumonias. Está elevada, porém, em menor frequência, noutras doenças granulomatosas como a lepra e a tuberculose e noutras patologias como esclerose múltipla, doença de Addison, hepatopatias, hipertiroidismo, doença de Gaucher e ocasionalmente em linfomas não-Hodgkin e no linfoma de Lennert. Níveis séricos diminuídos podem ser encontrados no hipotiroidismo, anorexia nervosa, doença hepática crónica e em diferentes patologias malignas. A determinação da ECA no LCR (líquido cefalo raquidiano) tem particular interesse no diagnóstico da neurosarcoidoise que ocorre em 5% dos pacientes com sarcoidose. Entretanto, a sua utilização é controversa, visto que, níveis elevados podem também ser encontrados na esclerose múltipla, neuro-sífilis e em encefalites virícas. Anticardiolipina A cardiolipina é um fosfolipído aniónico. A maioria dos anticorpos anticardiolipina (ACA) reage cruzadamente com outros fosfolipídos. Devido a esta característica e pela sua maior facilidade de detecção, são utilizados na investigação da presença de anticorpos antifosfolipídos. Assim como os anticorpos anticardiolipina, os anticoagulantes lúpicos (ACL) são também anticorpos antifosfolipídos. Interferem nos procedimentos de screening de coagulação, sendo uma causa comum de prolongamento do aPTT (tempo de tromboplastina parcial ativado). Existem algumas características clínicas comuns aos pacientes com a síndrome de antifosfolipídio (AFL): trombose venosa, trombose arterial, abortos recorrentes e trombocitopenia. Esses anticorpos são hoje reconhecidos como uma das causas mais importantes de hipercoagulabilidade e trombose. Aproximadamente 50% dos pacientes apresentam síndrome AFL primária, isto é, não-associada a doenças sistémicas, enquanto os restantes apresentam a forma secundária. A trombose é a apresentação mais comum da síndrome de AFL, e o local da trombose (arterial ou venosa) pode definir síndromes com diferentes características clínicas e laboratoriais: anticardiolipina (AFL-ACA) - positivo e anticoagulante lúpico (AFL-ACL) - positivo. A prevalência, a etiologia e a conduta desses síndromes, relacionadas porém distintas, são diferentes. A apresentação AFL-ACA é mais comum do que a AFLACL. A relação de prevalência é de 5 para 1. Ambas estão associadas a tromboses, abortos e trombocitopenia. A AFL-ACA está associada a trombose arterial e venosa, inclusive com quadros de trombose venosa profunda e embolia pulmonar, doenças coronárias e cerebrovasculares prematuras. Em contrapartida, o síndrome AFL-ACL é associado mais frequentemente a trombose venosa, que envolve os quadros de trombose venosa periférica, mesentérica, renal, hepática, sistema porta e veia cava. A trombose arterial raramente acontece na síndrome AFL-ACL. A atividade dos ACA em níveis elevados, na presença de ACL, é um fator de risco importante para trombose arterial. Os abortos normalmente acontecem no terceiro trimestre da gravidez e são associados a trombose da placenta. Embora as mulheres com abortos espontâneos periódicos no primeiro trimestre possam ter AFL, outras causas de perda fetal no primeiro trimestre são mais comuns. A contagem de plaquetas pode ser normal ou ligeiramente baixa. Aproximadamente 30% dos pacientes têm contagem de plaquetas abaixo de 100.000/mL durante o curso da doença. Paradoxalmente, esses pacientes ainda apresentam risco para trombose. O tratamento é iniciado quando a contagem de plaquetas se encontra abaixo de 50.000/mL (especialmente quando abaixo de 35.000/mL), por causa do risco aumentado de hemorragia. Os anticorpos anticardiolipina são medidos por testes imunoenzimáticos. A utilização combinada da pesquisa desses anticorpos com o anticoagulante lúpico (ACL) melhora a sensibilidade para a descoberta de anticorpos antifosfolipído. Aproximadamente 60% dos pacientes são positivos tanto para ACL quanto para ACA, e 40% são positivos somente para ACA ou ACL. Podem ser encontrados associados a doenças como lúpus eritematoso sistémico (LES), outras doenças do tecido conjuntivo, infecção pelo HIV e por outros microrganismos, neoplasias e um quadro induzido por drogas. São encontrados numa pequena parcela da população saudável. No LES, a presença do anticorpo anticoagulante lúpico ocorre em cerca de 70% dos casos . Na pesquisa de sífilis, pode levar a uma reação de VDRL falsamente positiva. O diagnóstico de síndrome antifosfolipídico exige a constatação da presença de uma das características clínicas citadas e um teste positivo. Os testes podem ser o do anticoagulante lúpico, os de anticorpos anticardiolipina ou ambos. Consultar Anticoagulante Lúpico. Anticorpos Anti-célula Parietal A pesquisa de anticorpos anti-célula parietal é importante para auxiliar o diagnóstico diferencial da anemia perniciosa e da atrofia gástrica. Anticorpos anti- célula parietal são encontrados em cerca de 90% dos pacientes com anemia perniciosa e em 60% dos casos de atrofia gástrica. A sua presença não se correlaciona com a má absorção de vitamina B12, mas sim com o nível de destruição das células parietais. Não são anticorpos específicos, sendo encontrados em 20 a 30% dos pacientes com doenças auto-imunes e em 16% de pacientes assintomáticos com mais de 60 anos. Podem estar presentes em pacientes com úlcera ou carcinoma gástrico. É possível ocorrer reactividade cruzada entre os anticorpos anti-célula parietal e antitiroideus em pacientes que apresentem concomitância das patologias (tiroidite e anemia perniciosa). Nalguns casos, pode ocorrer um decréscimo nos níveis de anticorpos, decorrente, provavelmente, da diminuição do número de células parietais. Anticorpos anti-célula parietal (ACP) são encontrados em aproximadamente 5% da população saudável. Alguns estudos referem uma alta frequência (90-100%) de ACP na anemia perniciosa. A relação de ACP com as gastrites tipo A (caracterizadas por atrofia da mucosa do fundo gástrico, acloridria, tendência a evoluir para anemia perniciosa e associação com doença endócrina auto-imune) é bem conhecida. O papel patológico dos ACP na anemia perniciosa ainda é obscuro. Nas doenças hepáticas auto-imunes, são encontrados ACP em 100% dos pacientes com cirrose biliar primária, em 75% das hepatites auto-imunes e em 29% dos pacientes com doença hepática crónica. Anticorpos Anticoagulante Lúpico Os anticorpos anticoagulantes lúpicos (ACL) são imunoglobulinas da classe IgG ou IgM. Assim como os anticorpos anticardiolipina (ACA), os anticoagulantes lúpicos fazem parte da família dos antifosfolipídos e interferem nos procedimentos de screening de coagulação que dependem da presença de fosfolipídios. Constituem uma causa comum do prolongamento do tempo de tromboplastina parcial ativado (APTT). Os ACL são espécie-específicos e são neutralizados pela adição de fosfolipídos (plasma rico em plaquetas). São anticorpos muito heterogéneos no que diz respeito às suas características imunológicas e à variação de complexos fosfolipídicos e protéicos que actuam como seu alvo antigénico. Dados recentes sugerem que outras proteínas, como a proteína C, a proteína S e a trombomodulina, são também alvos para ACL. Apesar da sua actividade anticoagulante in vitro, na prática os anticoagulantes lúpicos estão relacionados com manifestações tromboembólicas recorrentes arteriais (menos frequentemente) e venosas, abortos repetidos, e, em certos casos, são encontrados em pacientes hígidos, assim como em diferentes situações clínicas, como doenças auto-imunes, neoplasias, quadros infecciosos virais, bacterianos e parasitários, distúrbios neurológicos e uso de alguns medicamentos. A detecção laboratorial de ACL não deve ser baseada num único teste. Deve-se realizar uma combinação de testes de screening com ensaios para excluir deficiências de factor de coagulação ou a presença de um inibidor de factor, os quais podem dar origem a resultados falso-positivos para ACL. Ou seja, a detecção deve ser realizada em etapas: screening para identificação da alteração; exclusão de déficit de factor, confirmando assim a presença de um inibidor e a caracterização do tipo de inibidor. É importante também a interferência da heparina e dos anticoagulantes orais nos resultados, determinando, portanto, que o teste seja realizado apenas após 2 semanas da suspensão dos anticoagulantes orais e 48 horas após a última dose de heparina. Na avaliação do síndrome antifosfolipídico, alguns dados indicam que os ensaios de ACL predizem com mais segurança trombose, perda fetal recorrente e trombocitopenia do que os ensaios para ACA. Entretanto, aproximadamente 60% dos pacientes são positivos tanto para ACL quanto para ACA, enquanto os 40% restantes são positivos apenas para ACA ou para ACL. Consultar Anticardiolipina. Anticorpos Anti-GAD Os anticorpos antidescarboxilase do ácido glutâmico (anti-GAD), anti-insulina (antiIN) e anti-ilhota (anti-IL) são evidências auto-imunes que predizem o aparecimento de diabetes mellitus insulino-dependente (DMID). Esses anticorpos estão presentes na maioria dos pacientes recentemente diagnosticados como portadores de DMID e em 80% daqueles que irão progredir para esse quadro. Diferenças marcantes são encontradas de acordo com o sexo do indivíduo. Nas mulheres portadoras de DMID, independentemente da idade, o teste apresenta-se positivo em mais de 80%, enquanto nos meninos menores de 10 anos essa taxa diminui para cerca de 50%, atingindo os valores da população diabética feminina nos homens adultos. Resumidamente, a diabetes mellitus permanece sendo diagnosticado através de critérios clínicos e da determinação sérica de glicose. Os marcadores imunológicos ainda não têm um papel diagnóstico definido. O valor preditivo positivo de um teste isoladamente é baixo na população em geral, mas a combinação de vários marcadores aumenta esse valor, alcançando níveis entre 50 e 60% nalguns estudos. Anticorpos Anti-ilhotas Pancreáticas Anticorpos anti-ilhota (anti-IL), anticorpos anti-insulina (anti-IN) e anticorpos antidescarboxilase do ácido glutâmico (anti-GAD) são evidências auto-imunes que predizem o aparecimento de diabetes mellitus insulino-dependente (DMID). Anticorpos anti-ilhotas demonstram uma reação imunológica contra as células productoras de insulina. Esse teste tem sido utilizado para se prever o aparecimento de diabetes mellitus insulino-dependente (DMID). Chegou-se a essas conclusões após estudarem três grupos distintos de indivíduos: pacientes com DM auto-imune, os seus parentes de primeiro grau e indivíduos normais. Entre 80 a 85% dos pacientes com DMID e 3 a 4% dos parentes de primeiro grau de pacientes portadores de DMID apresentam anticorpos anti-ilhotas, mesmo antes de se mostrarem com aumento da glicemia. A especificidade desse teste para DMID encontra-se entre 96 e 99%. Um resultado positivo em indivíduos normais pode representar um aumento transitório inespecífico ou uma progressão para DMID. Como principal indicação clínica, temos o parentesco em primeiro grau com indivíduos portadores de DMID, para que se possa ter um marcador preditivo do aparecimento da doença. O método usual para se detectar anti-ilhotas é a imunofluorescência indireta. A classe de anticorpos IgG antigliadina (AGA IgG) foi o primeiro marcador sorológico para essa doença. É mais sensível que a classe IgA (AGA IgA), embora seja menos específica. Apesar de o AGA IgA ser mais específico para a DC, 2% dos pacientes com essa patologia têm deficiência selectiva dessa classe de anticorpos. Resultados positivos de AGA IgG e IgA têm sensibilidade de 96% a 100% e especificidade de 96% a 97%. Esses anticorpos também são utilizados na monitorização do tratamento da DC e tendem a diminuir ou a desaparecer com uma dieta livre de glúten. Anticorpos Antiinsulina Os anticorpos anti-insulina (anti-IN), anti-ilhota (anti-IL) e os anticorpos antidescarboxilase do ácido glutâmico (anti-GAD) são evidências auto-imunes que predizem o aparecimento de diabetes mellitus insulino-dependente (DMID). Os anticorpos anti-insulina estão presentes em 50% dos pacientes com DMID no momento do diagnóstico, antes do início da insulinoterapia. A sensibilidade do teste é de 50 a 70%, e ele é mais vezes positivo em crianças e adultos jovens. O doseamento de insulina em presença desses anticorpos é prejudicado, tornandose impreciso para o acompanhamento clínico. Anticorpos Antinucleares Os anticorpos antinucleares (ANA) são encontrados frequentemente numa variedade de doenças reumáticas auto-imunes. São úteis na investigação dessas doenças, auxiliando no diagnóstico de patologias como lúpus eritematoso sistémico (LES), esclerose sistémica progressiva (ESP), doença mista do tecido conjuntivo (DMTC), síndrome de Sjögren (SS), poliomiosite e dermatomiosite. Os ANA podem estar presentes numa pequena percentagem da população aparentemente sã; esta frequência é maior nas mulheres e aumenta com a idade. Segundo a literatura, a positividade entre 20 a 60 anos varia entre percentagens mais altas (13,3%) para títulos baixos e mais baixas (3,3%) para títulos mais elevados. A pesquisa dos anticorpos antinucleares pode ser realizada por diferentes técnicas; a imunofluorescência indireta é a mais utilizada, devido à sua maior sensibilidade, reprodutibilidade e facilidade de execução. A sensibilidade aumenta significativamente quando se utiliza como substrato láminas com células Hep 2 (células de carcinoma de laringe humana), por causa da maior expressão de antígenios na superfície dessas células comparados aos expressos nas células de fígado ou de rins de camundongos, que se utilizavam anteriormente. Em geral, é possível detectar melhor a presença de ANA por associação de três anti-soros isotipos específicos (anti-IgG, anti-IgA e anti-IgM). A pesquisa realizada por essa técnica serve de triagem inicial para a presença de ANA. É normalmente denominada pesquisa de factor antinuclear (FAN) ou ANA (antinuclear antibody). A realização de outras metodologias, tais como as imunoenzimáticas, permite uma avaliação isolada dos diferentes auto-anticorpos, sugeridos pelos padrões de fluorescência encontrados no FAN. A identificação desses ANA permite um diagnóstico mais preciso, e eles podem ser utilizados, em muitos casos, como marcador para uma das diferentes doenças reumáticas auto-imunes. Muitas dessas patologias apresentam um perfil distinto de auto-anticorpos que auxilia o diagnóstico. Fator Antinuclear - FAN Nas pesquisas realizadas por imunofluorescência indirecta, os resultados são expressos em títulos, segundo as diluições empregues. É possível trabalhar utilizando-se como limite títulos de 1/40, que permitem maior sensibilidade, ou de 1/80, que permitem maior especificidade, ou seja, um menor número de falsopositivos. Na prática clínica, são considerados significativos títulos superiores a 1/160. Os resultados com títulos positivos são acompanhados pela descrição do padrão de fluorescência encontrado, que serve como orientação da presença de um antígeno específico e, em alguns casos, como padrão diagnóstico. Em determinadas situações, em especial no LES em actividade, pode ocorrer a observação de mais de um padrão de fluorescência. PADRÕES DE FLUORECÊNCIA PERIFÉRICO HOMOGÊNIO PERIFÉRICO/ HOMOGÊNEO PONTILHADO GROSSO PONTILHADO FINO NUCLEAR NUCLEOLAR CENTROMÉRICO ANTÍGENOS PATOLOGIA RELACIONADAS DNA de dupla hélice ou de hélice LES única, histona e RNA DNA de dupla hélice ou de hélice LES, AR, lúpus induzido por única, histona e RNA drogas DNA de dupla hélice ou de hélice LES única, histona e RNA SM, RNP LES, DMTC SS-A (RO) SS-B (La) SS, LES Proteínas Nucleolares Proteínas de centrómeros ESP Síndrome de CREST O padrão pontilhado, pode também ser referido como padrão salpicado. Outros padrões de fluorescência podem ser encontrados em menor frequência. O pontilhado citoplasmático grosso ou reticular, associado à presença de anticorpos antimitocôndrias em pacientes com cirrose biliar primária; o citoplasmático homogêneo, relacionado a proteínas ribossômicas em pacientes com LES; e o padrão pontilhado fino citoplasmático, que pode estar associado à presença de anticorpos anti-JO-1, anti-PCNA e proteínas da membrana celular, em pacientes com LES, outras patologias do tecido conjuntivo e hepatopatias auto-imunes. Anticorpos Anti-DNA Nativo ou de Dupla Hélice A pesquisa desse anticorpo, realizada por imunofluorescência indirecta, utilizando como substrato a Crithidia luciliae, apresenta boa sensibilidade e alta especificidade. A técnica imunoenzimática, apesar de mais sensível, é menos específica, levando a riscos de resultados falso-positivos (identificação de DNA de hélice única). A sua presença é considerada um marcador para o diagnóstico de lúpus eritematoso sistémico, sendo detectado em 50 a 70% dos casos em actividade. Ao contrário de outros auto-anticorpos, os seus títulos apresentam relação directa com a actividade da doença, sendo extremamente úteis para o acompanhamento da terapia e da reactivação da doença. Quanto maior o título, maior a actividade da doença. Nalguns casos (cerca de 30%), apesar de as evidências clínicas e laboratoriais indicarem lúpus eritematoso sistémico, o anticorpo anti-DNA nativo pode não ser detectado. Acredita-se que, nesses casos, os auto-anticorpos estejam sob a forma de imunocomplexos. Anti-ENA - Auto-anticorpos contra Antígenos Extraídos do Núcleo AUTO-ANTICORPOS CONTRA ANTÍGENOS EXTRAÍDOS DO NÚCLEO SM LES RNP DMTC, LES, ESP, AR e Polimiosite SS-A (Ro) SS, LES, lúpus neonatal e forma cutânea subaguda SS-B (La) SS, LES, lúpus neonatal e forma cutânea subaguda Scl 70 ESP Jo -1 Polimiosite e dermatomiosite O padrão pontilhado, pode também ser referido como padrão salpicado. Outros padrões de fluorescência podem ser encontrados em menor frequência. O pontilhado citoplasmático grosso ou reticular, associado à presença de anticorpos antimitocôndrias em pacientes com cirrose biliar primária; o citoplasmático homogêneo, relacionado a proteínas ribossómicas em pacientes com LES; e o padrão pontilhado fino citoplasmático, que pode estar associado à presença de anticorpos anti-JO-1, anti-PCNA e proteínas da membrana celular, em pacientes com LES, outras patologias do tecido conjuntivo e hepatopatias auto-imunes. Sm Os auto-anticorpos anti-Sm ("Smith") são dirigidos contra ribonucleoproteínas de baixo peso molecular. Estão presentes em 20 a 30% de pacientes de LES, geralmente acompanhados de positividade para outros anticorpos, entre eles o anti-RNP. Em contraste com os auto-anticorpos anti-DNA de dupla hélice, que tendem a apresentar níveis flutuantes em paralelo à actividade da doença, os autoanticorpos anti-Sm não variam muito com o passar do tempo. A sua presença correlaciona-se com o padrão pontilhado grosso na pesquisa de ANA por imunofluorescência indirecta. Podem ser encontrados também, embora mais raramente, noutras doenças do tecido conjuntivo, como a DMTC. É considerado um marcador diagnóstico do LES. A sua positividade noutras patologias que não as do tecido conjuntivo tem sido descrita nalguns estudos que relatam a sua presença em gamapatias monoclonais e uveítes. RNP Os auto-anticorpos anti-RNP são encontrados em altos títulos na doença mista do tecido conjuntivo (DMTC). São úteis como marcadores para a DMTC, já que são detectados em altos títulos em 90% dos pacientes com essa patologia. Podem apresentar-se positivos também, porém com menos frequência, no LES, ESP, SS, artrite reumatóide e polimiosite. Nos pacientes com LES, os auto-anticorpos anti-RNP apresentam-se positivos em cerca de 26 a 40% dos casos, geralmente com outros anticorpos antinucleares também positivos. A sua presença no LES é considerada indício de bom prognóstico, pois indica menor probabilidade de lesão renal. SS-A/Ro - SS-B/La São anticorpos relacionados com uma classe de partículas de ribonucleoproteínas que são compostas por pequenos ácidos ribonucleicos. A detecção de auto-anticorpos SS-A/Ro é possível em aproximadamente 60 a 70% dos pacientes com síndrome de Sjögren, e com menor freqüência, na artrite reumatóide, nas vasculites associadas ao síndrome de Sjögren, noutras doenças do colágeno e em cerca de 5% da população hígida. Estão presentes em 40 a 50% de LES, em quase 100% dos casos de mães com filhos com lúpus neonatal e também nos casos da forma cutânea subaguda do lúpus. A presença de anti-SS-B/La dá-se em 40 a 50% dos casos de síndrome de Sjögren e em 6 a 15% dos casos de LES. No lúpus neonatal, quase sempre são detectados auto-anticorpos SS-A/Ro na mãe. Cerca de 2% de crianças nascidas de mães com auto-anticorpos SS-A/Ro apresentam a patologia. Na maioria das patologias em que se encontram presentes, os anticorpos antiSSA/Ro são identificados com maior freqüência do que os anti-SSB/La. No síndrome de Sjögren, em cerca de 50% dos casos os auto-anticorpos SS-A/Ro estão acompanhados da presença de anti-SS-B/La. Scl 70 Na literatura actual, os anticorpos anti-Scl 70 são identificados como antitopoisomerase I. Estão presentes em 64 a 75% de pacientes com ESP, mas só são vistos, raramente, na síndrome de CREST (calcinoses, dismotilidade esofagiana, fenómeno de Raynaud, esclerodactilia, telangicectasia), em poucos casos de fenómeno de Raynaud primário (10%), na síndrome de Sjögren (5%) e em cerca de 1% dos casos de DMTC e LES. É considerado marcador diagnóstico da ESP. A presença desses anticorpos aumenta em cerca de 17 vezes o risco de desenvolvimento de fibrose pulmonar em pacientes com quadro de esclerodermia. Esse risco implica a necessidade de monitorização mais frequente da função pulmonar. A positividade dos anticorpos anti-Scl-70 não tem valor preditivo para a possibilidade de envolvimento cardíaco, renal ou sobrevida. Já a persistência de auto-anticorpos anti-Scl-70 em pacientes com doença de Raynaud é indicativa da possibilidade de desenvolvimento de esclerose sistémica. JO-1 Anticorpos contra o antigénio Jo-1 (sintetase-1,2-de histidil-tRNA) são encontrados em aproximadamente 30 a 50% dos pacientes adultos com miosites, incluindo polimiosite, dermatomiosite e as síndromes superpostas. Aparecem em cerca de 60% dos casos de miosite e de doença intersticial pulmonar. A presença de anticorpos anti-Jo-1 em pacientes com polimiosite idiopática normalmente é acompanhada de doença grave, tendência a recidiva e mau prognóstico. Na miosite juvenil com presença de anti-Jo-1, as manifestações clínicas e o curso de doença e resposta à terapia são semelhantes à evolução nos adultos. É considerado marcador diagnóstico de polimiosite. Anticentrómero Os anticorpos anticentrómero (AAC) são um subgrupo distinto dos anticorpos antinucleares detectáveis, utilizando como substrato células de cultura de tecidos. Os pacientes com anticentrómero-positivos não apresentam as características mais graves da esclerose sistémica progressiva, como a doença renal. Por isso, a positividade parece indicar um prognóstico mais favorável. São encontrados em cerca de 22% dos pacientes com esclerose sistémica progressiva e estão positivos em cerca de 70% dos casos de síndrome de CREST e em cerca de 12% dos pacientes com cirrose biliar primária, dos quais aproximadamente 50% apresentam características de esclerodermia. Por outro lado, a esclerodermia, sob a forma da síndrome de CREST, está presente em cerca de 4% dos casos de cirrose biliar primária. Os casos de esclerodermia limitados ao síndrome de CREST que cursam com AAC positivo apresentam, com mais frequência, calcinose e telangiectasias. Nestes casos, é menor a ocorrência de fibrose pulmonar intersticial. Os pacientes que apresentam fenómeno de Raynaud e AAC positivo sugerem a possibilidade de desenvolvimento do síndrome de CREST. Anticorpos Antitiroideus As doenças da tiróide de etiologia auto-imune são acompanhadas da presença de auto-anticorpos. A sua determinação está indicada na investigação diagnóstica das tiróidites auto-imunes, principalmente a doença de Hashimoto, doença de Graves, tiróidite pós-parto e mixedema idiopático. Na investigação diagnóstica, recomenda-se a utilização da pesquisa associada de mais de um anticorpo para avaliar, dessa forma, a presença de anticorpos contra os diferentes antígenos. Os anticorpos mais pesquisados são antitireoperoxidase (antiTPO), antitireoglobulina (anti-TRG) e os anticorpos anti-receptores de TSH (TRAB). Os anticorpos antimicrossomais foram durante muito tempo, em associação com os doseamentos das hormonas tiróideias, considerados o padrão para o diagnóstico das tiroidites auto-imunes. Hoje, podem ser substituídos pela pesquisa dos anticorpos antiperoxidase tiroideu. A tireoperoxidase (TPO), principal enzima envolvida no procedimento de síntese de hormona da tiróide, é uma glicoproteína, expressa apenas em células foliculares da tiróide. Ela é o principal antigénio na partícula microssomal da tiróide. Os anticorpos antitireoperoxidase estão presentes em 4 a 9% dos adultos normais, em 57-74% dos pacientes com doença de Graves, em 99-100% dos pacientes com doença de Hashimoto ou mixedema idiopático, em 19% dos casos de tumores diferenciados de tiróide e, raramente, em pacientes com tiróidite subaguda. A prevalência de positividade em pacientes idosos (80 anos) é mais alta nas mulheres (10%) comparadas aos homens (2%). Os anticorpos antitireoglobulina estão presentes em títulos elevados em cerca de 25% dos casos de doença de Graves e em 55% dos pacientes com tiróidite de Hashimoto. Raramente se observam casos em que os anticorpos estão ausentes devido à produção de anticorpos restrita aos linfócitos intratiroideus. Eles podem ser detectados, com menor frequência, noutras patologias auto-imunes, em pacientes com carcinoma de tiróide e em percentagens ainda menores em mulheres e indivíduos idosos hígidos. Geralmente, as amostras apresentam-se positivas para anti -TRG e anti-TPO. A positividade isolada para os anticorpos antitireoglobulina é menos frequente que o achado isolado dos anticorpos antitireoperoxidase. Durante a gravidez, a presença de anticorpos anti-TPO e TRAB pode ser considerada fator preditivo de tiróidite pós-parto. Durante as fases precoces da tiróidite de Hashimoto, encontramos anticorpos antitireoglobulina significativamente elevados e níveis menos elevados de anti-TPO. Tardiamente, os anticorpos anti-TRG podem desaparecer, enquanto os anti-TPO permanecem presentes por muitos anos. Pacientes que apresentam outras desordens auto-imunes, como síndrome de Sjögren, lúpus eritematoso sistémico, artrite reumatóide e anemia perniciosa, podem apresentar anticorpos antitireoglobulina positivos. Outro anticorpo utilizado na investigação clínica das patologias tiroideias são os anticorpos anti-receptores de TSH (TRAB), que podem actuar tanto estimulando como inibindo as funções tiroideias, ligando-se a diferentes epitopos. Encontram-se positivos na doença de Graves e nas tiroidites subagudas. Devido à sua capacidade de atravessar a barreira placentária, podem levar à doença de Graves neonatal por transferência passiva. A positividade do TRAB no soro sugere doença auto-imune em actividade, mas não define o estado funcional da glândula. O ensaio baseia-se na capacidade do soro que contém TRAB de impedir a ligação do TSH. Esse teste também é útil na avaliação de remissões ou recidivas da doença. Antiestreptolisina O Os Streptococcus beta-hemolíticos do grupo A causam infecções clínicas especialmente de orofaringe e pele, endocardites e quadros não-supurativos, como febre reumática e glomerulonefrite aguda. A estreptolisina O é uma das toxinas extracelulares libertadas pelo Streptococcus beta-hemolítico do grupo A. Ela é capaz de induzir o síntese de anticorpos específicos, os anticorpos antiestreptolisina O (ASO), em cerca de 80% das infecções. O uso de antibióticos, corticóides e drogas imunossupressoras pode inibir a produção de ASO. A ASO eleva-se na primeira semana, atingindo valores máximos em 2 a 4 semanas após a infecção estreptocócica e retornando aos valores normais após 6 a 12 meses. A manutenção de títulos de ASO elevados de anticorpos ou a sua elevação em amostras seguidas são indicativas de infecção aguda, reinfecção ou lesões pósestreptocócicas. Apesar de níveis séricos de ASO serem encontrados na maioria dos pacientes com febre reumática e glomerulonefrite pós-estreptocócica, a sua maior indicação é no seguimento de pacientes com febre reumática, já que nesses casos os títulos de ASO se correlacionam melhor com a atividade da doença. Cerca de 80 a 85% dos casos de febre reumática cursam com títulos elevados. Antígeno Carcioembrionário (CEA) O antígeno carcioembrionário (CEA) é normalmente sintetizado e secretado pelas células que revestem o trato gastrointestinal do feto e em pequenas quantidades no adulto. Em situações normais, é eliminado pelo intestino. Em desordens benignas e malignas do trato gastrointestinal, pode ser detectado no sangue circulante. Não é um antigénio órgão-especifico. A detecção no soro associa-se a várias malignidades como as de estômago, pâncreas, gastrointestinais, mama, pulmão e ovário. O antigénio carcioembrionário está presente em doenças benignas como hepatopatias, pancreatites, enfisema pulmonar, doenças benignas da mama, colite ulcerosa, doença de Crohn e pólipo rectal. Níveis mais elevados são encontrados em tabagistas. O CEA é usado na monitorização de tumores gastrointestinais, particularmente no carcinoma colorrectal. Segundo o The National Cancer Institute, o CEA é o melhor método não-invasivo para acompanhamento do carcinoma colorrectal. Níveis pré-operatórios muito altos são prognósticos de altas taxas de recidiva e de baixas taxas de sobrevida. O CEA pode ser usado para monitorizar a eficácia do tratamento, a recidiva da doença local ou metastática. Elevações dos níveis de CEA são maiores nas metástases e menores na recidiva local. Os níveis mais altos são encontrados nas metástases ósseas e hepáticas. No decurso de quimioterapia ou de radioterapia, os níveis séricos podem elevar-se temporariamente. A avaliação pós-operatória deve ocorrer em torno da 4ª semana. A sua avaliação não é recomendada como screening, devido à incidência de elevação de CEA noutras patologias. Cerca de 63% dos pacientes com carcinoma colorretal têm elevações de CEA. As alterações correlacionam-se com o estadiamento do tumor. Apresenta-se alterado em 20% dos pacientes em Duke A, 58% em Duke B e 68% dos casos em Duke C. A avaliação bimensal é recomendada durante os primeiros 2 anos após a cirurgia; nos anos subsequentes, as avaliações podem ser mais espaçadas, até completar 5 anos. Noutros tipos de tumor em que o CEA é detectado, os níveis no pós-operatório podem ser úteis no acompanhamento da terapia e na identificação do aparecimento da doença metastática, especialmente nos carcinomas de mama associados com CA 15-3 e os de pâncreas associados ao CA 19-9. Antimitocôndria A avaliação dos anticorpos antimitocondriais é importante na investigação diagnóstica das doenças hepáticas crónicas, em que está presente em 90% dos casos de cirrose biliar primária, especialmente no diagnóstico diferencial com outras colangites. Os anticorpos antimitocondriais (AMA) podem também estar presentes em 25% a 30% dos casos de hepatite crónica activa e mais raramente noutras doenças hepáticas, como obstrução biliar extra-hepática, hepatite vírica, cirrose de diferentes etiologias, hepatite induzida por drogas e neoplasia hepática. São encontrados em baixos títulos em cerca de 1% de adultos saudáveis e em doenças auto-imunes. Os níveis de anticorpos não se correlacionam com a gravidade e o tempo de evolução da doença, nem definem o prognóstico. Os AMA desaparecem aproximadamente 1 mês após o transplante hepático e diminuem com o uso de ciclosporina como tratamento. O diagnóstico da cirrose biliar primária deve-se basear nos achados clínicos, laboratoriais e histológicos. Aproximadamente 4% de pacientes com cirrose biliar primária têm esclerodermia, frequentemente como síndrome de CREST. Além disso, às vezes é encontrada reactividade para AMA nalguns pacientes com síndrome de CREST ou esclerodermia difusa, na ausência de doença hepática. Diferentes antigénios são encontrados na membrana mitocondrial, fazendo com que existam diferentes tipos de anticorpos antimitocondriais. A identificação dos diferentes tipos (M1, M2, M3, M4, M5, M6, M7, M8 e M9) é possível com o uso de antigénios recombinantes em ensaio imunoenzimático e permite um diagnóstico específico dos AMA. A cirrose biliar primária está relacionada a M2, e o tipo M9 pode ser encontrado em membros saudáveis da família. Os dos diferentes tipos restantes correlacionam-se com outras patologias, como doenças do colágeno (M5) e hepatite induzida por drogas (M6). A imunofluorescência indirecta usando células HEp-2 é 100% sensível e específica para identificação de AMA total. Antimúsculo Liso Os anticorpos antimúsculo liso (AML), ou (f-actina) são encontrados na maioria dos pacientes com hepatite crónica auto-imune. Em geral, a ausência de AML e anticorpos antinucleares são argumentos para o diagnóstico de formas não autoimunes de hepatites crónicas. Nas hepatites víricas crónicas, eles podem ser detectados em títulos mais baixos em cerca de 10% dos casos. Podem ser encontrados em aproximadamente 2% dos adultos normais, porém sempre em baixos títulos. A presença de anticorpos antinucleares pode interferir, levando à positividade com títulos baixos. Títulos elevados são característicos da hepatite crónica auto-imune. Quando presentes noutras patologias, normalmente apresentam-se com títulos baixos, <1/80. Cerca de 50% dos pacientes com cirrose biliar primária apresentam AML. Com menor frequência são encontrados nas uveítes, nas hepatites induzidas por drogas, na alopécia, na doença hepática alcoólica, nas neoplasias, na hipertensão pulmonar primária e transitoriamente em hepatites agudas e outras infecções víricas, incluindo mononucleose infecciosa. A sua presença não tem valor preditivo para o desenvolvimento de doença hepática. O diagnóstico deve ser sempre acompanhado da avaliação de outros anticorpos como os anticorpos antinucleares e do perfil hepático. O achado isolado de AML não tem significado clínico. Apoliproteína A-I A apolipoproteína A (ApoA) é um dos principais componentes da lipoproteínas de alta densidade (HDL). Os seus dois componentes principais são a Apo-A-I e a ApoA-II. A Apo-A-I é constituída por 245 aminoácidos e representa cerca de 75% da Apo-A nas HDL. É sintetizada no fígado e no intestino e responsável pela activação de uma enzima envolvida na esterificação do colesterol no plasma. O colesterol esterificado pode então ser removido dos tecidos extra-hepáticos e células periféricas e transportado até o fígado, para então ser metabolizado e excretado. A Apo-A-II representa cerca de 20% da Apo-A nas HDL. É constituída por 154 aminoácidos, e o seu papel fisiológico ainda é pouco conhecido. Valores da Apo-A-I elevam-se durante a gravidez, na doença hepática e na administração de estrogénios. Valores diminuídos são encontrados na colestase, na septicémia, na cirrose hepática aguda, em pacientes que consomem insulina, na aterosclerose e nos casos de deficiências hereditárias. A avaliação da Apo-A-I tem sido apontada como um bom parâmetro preditivo de risco de doença coronária. Os seus níveis são inversamente proporcionais ao risco de doença coronária prematura. Valores elevados de Apo-A-I (HDL) e baixos de Apo-B (LDL) correlacionam-se com baixo risco aterogénico. Avaliação da Função Gonadal DISTÚRBIOS DA REPRODUÇÃO FEMININA Puberdade Precoce A puberdade precoce caracteriza-se por aceleração da velocidade de crescimento, desenvolvimento das mamas e crescimento de pelos pubianos. Pode ser classificada como puberdade precoce verdadeira (dependente de GnRH), indicando activação precoce do eixo hipotalámico-hipofisário-gonadal, ou pseudopuberdade precoce (independente de GnRH), quando o aumento das hormonas esteróides ocorre sem o estímulo das gonadotrofinas. Ambas as condições podem estar relacionadas a doenças graves, sendo necessária cuidadosa anamnese, exame clínico e métodos de diagnóstico por imagem para descartar doenças do SNC, como tumores, traumatismo craniano ou encefalite, ou mesmo massa pélvica ou abdominal. A avaliação hormonal deve incluir função tiroideia (TSH, T4L), esteróides (estradiol, testosterona, progesterona, sulfato de deidroepiandrosterona (S-DHEA), androstenediona e 17 hidroxiprogesterona), FSH, LH, HCG e teste LH-RH. Na puberdade precoce verdadeira, os valores de LH, FSH e estrógenos são compatíveis com maturidade sexual, enquanto valores elevados de estrogénios e baixos de FSH e LH são geralmente observados na presença de tumores secretores de estrogénios. Níveis elevados de HCG podem ser indicativos de teratoma ou de disgerminoma do ovário. Níveis elevados de 17-hidroxicorticosteróides, progesterona e androgénios adrenais confirmam o diagnóstico de hiperplasia adrenal por deficiência de 21-hidroxilase, enquanto o aumento do 11-desoxicortisol indica hiperplasia adrenal por deficiência de 11-hidroxilase. Suspeita-se de adenoma ou carcinoma do córtex adrenal quando o S-DHEA e/ou a androstenediona estão aumentados. Um aumento na testosterona sugere precocidade de origem ovariana. Outros testes úteis no diagnóstico da precocidade sexual são a ultra-sonografia dos ovários, a ressonância magnética (RM), a tomografia computadorizada (TC) ou a ultra-sonografia das adrenais, a determinação da idade óssea e RM ou TC de crânio. Amenorréia É definida como a ausência de menstruação por 3 meses ou mais em mulheres que já menstruaram anteriormente. Podem também ser consideradas amenorréicas as mulheres nas quais a menarca não ocorreu até os 16 anos, independentemente da presença ou ausência de caracteres sexuais secundários. Segundo Speroff, as causas de amenorréia podem ser classificadas em quatro grupos (compartimentos): CLASSIFICAÇÃO ETIOLÓGICA DA AMENORRÉIA AMBIENTE GRUPO IV SNC - HIPOTÁLAMO *GnRH-TRH GRUPO III HIPÓFISE ANTERIOR *TSH, FSH, LH, PROLACTINA GRUPO II OVÁRIO *ESTROGÊNIOS *PROGESTERONA *ANDROGÊNIOS GRUPO I ÚTERO, CERVICE E VAGINA Stress Aumento de Peso Distúrbios Psicológicos Exercícios físicos Tumor Hipofisário Insuficiência hipofisária Síndrome de Sheeham Perimenopausa Síndrome de Resistência Ovárica Insificiência Ovárica Anormalidades Cromossómicas Anomalia do Ducto de Müller Testículo Feminilizante Síndrome de Asheeman Amenorréia e infertilidade podem ser os primeiros sintomas de disfunção tiroidéia. Em casos de hipotiróidismo, o aumento de TSH induz a hiperprolactinémia. Infertilidade Ocorre em 15% dos casais, e 50% dos casos devem-se a problemas na mulher. Dessas, 40% não ovulam, 10% têm fase lútea inadequada, 40% têm anomalias tubáricas e 10% têm factores cervicais ou tiroideios. Embora a causa da insuficiência não seja encontrada na maioria das mulheres, ela pode resultar de anomalias dos eixos hipotalámico-hipofisário ovárico, tiroideio ou adrenal. A avaliação laboratorial de não ovulação deve incluir FSH, LH, prolactina e progesterona. Em presença de sinais e sintomas de disfunção tiroideia ou de hiperandrogenismo, deve-se fazer avaliação de hormonas tiroideias, do S-DHEA e da testosterona. As disfunções da fase lútea podem ser avaliadas pelo doseamento de progesterona, cujos níveis de 10.000 pg/mL ou mais, 5 a 10 dias antes do período menstrual seguinte, descartam uma fase lútea inadequada. A biópsia de endométrio realizada 2 a 3 dias antes da menstruação é útil no diagnóstico. Hirsutismo O aumento do crescimento de pelos (hirsutismo) ocorre por aumento da produção de androgénios (ováricos ou adrenais) ou aumento da sensibilidade da pele aos andrógenios circulantes. Mais de 90% das pacientes têm ovários poliquísticos ou hirsutismo idiopático. A avaliação hormonal deve incluir testosterona, androstenediona e S-DHEA. A sensibilidade da pele aos androgénios é modulada pela enzima 5-alfa-redutase, que converte a testosterona em deidrotestosterona, a hormona mais activa no crescimento dos pelos. O síndrome do ovário poliquístico envolve o eixo hipotálamo-hipófise-ovário e adrenal. Esses pacientes cursam com o aumento da produção de estrógenios e androgénios, evidenciado pelo aumento dos níveis circulantes de testosterona, androstenediona, deidroepiandrosterona, S-DHEA, 17-hidroxiprogesterona e estrona. Deve-se avaliar ainda FSH, LH e hormonas tiroideios. A prolactina tende a estar ligeiramente elevada. DISTÚRBIOS DA REPRODUÇÃO MASCULINA Hipogonadismo/ Infertilidade O hipogonadismo masculino ou infertilidade pode ser classificado como prétesticular, testicular ou pós-testicular. As causas pré-testiculares (hipogonadismo secundário) são geralmente hipotalámicas ou hipofisárias, podendo ser congénitas ou adquiridas. As alterações hipotalámicas congénitas são mais frequentes do que as hipofisárias, e podem causar apenas puberdade atrasada ou hipogonadismo hipogonadotrófico idiopático. No geral, o crescimento progride sem sinais puberais e com testículos muito pequenos. A deficiência gonadotrófica hipofisária adquirida é mais frequente que a hipotalámica e, geralmente, causada por tumores. A disfunção eréctil ou impotência pode ser uma manifestação precoce, bem como a deficiência da hormona de crescimento (HGC). Tumores secretores de prolactina também podem causar sintomas de disfunção eréctil e infertilidade, uma vez que o aumento de prolactina suprime a produção de GnRH. Outras causas de hipogonadismo pré-testicular são: hipotiroidismo, síndrome de Cushing e cirrose alcoólica. As causas testiculares (hipogonadismo primário) podem ser congénitas ou adquiridas. As causas congénitas incluem síndrome de Klinefelter, criptorquidismo e hipoespermatogénese idiopática. As causas de insuficiência testicular adquiridas mais frequentes são orquite (que pode ser causada pela parotidite) e traumatismo físico. Outras causas são radiação e agentes antineoplásicos. As causas pós-testiculares devem-se geralmente ao bloqueio funcional ou à obstrução mecânica do transporte do esperma ou alterações funcionais do esperma. As manifestações clínicas incluem distribuição anormal de pelos faciais e corporais, distribuição anormal e diminuição da massa muscular, distribuição anormal da gordura corporal, aumento da proporção envergadura/altura ou diminuição da proporção tronco/membros inferiores, diminuição do volume testicular, diminuição ou ausência de olfacto e ginecomastia. É necessário investigar o desenvolvimento físico e a idade da puberdade, as alterações de líbido, disfunção eréctil, infertilidade e dificuldades conjugais relacionadas com o desempenho sexual. A síndrome de Kallmann caracteriza-se por ausência ou diminuição de olfacto, cegueira para cores, agenesia renal, surdez neurossensorial, fenda labial ou palatina, diminuição ou ausência das características sexuais secundárias em homens e testículos pequenos. No hipogonadismo devido à hiperprolactinemia, os pacientes podem apresentar galactorréia, disfunção eréctil e diminuição da líbido. A síndrome de Klinefelter após a puberdade caracteriza-se por aparência tipo eunuco, testículos firmes e pequenos, ginecomastia, azoospermia e por vezes atraso mental. A avaliação laboratorial inclui os doeamentos séricas de testosterona, LH, FSH, prolactina e SHBG. No hipogonadismo primário, a testosterona sérica encontra-se baixa, com altos níveis de LH e FSH. No hipogonadismo secundário, a LH e a FSH encontram-se também diminuídos. A patologia hipofisária pode ser distinguida da patologia hipotalámica por meio de testes dinâmicos da função endócrina. O teste de estímulo com GnRH avalia a reserva de gonadotrofinas. O aumento da FSH e da LH após o teste indica patologia hipotalámica. No hipogonadismo primário (LH e FSH elevadas), um cariótipo alterado com genótipo masculino e azoospermia sugere síndrome de Klinefelter. O hipotiroidismo e a hiperprolactinemia podem ser excluídos com dosagens séricas de TSH e de prolactina, respectivamente. A pesquisa de tumores deve ser realizada com tomografia computadorizada e ressonância magnética. Infertilidade Geralmente, o único sinal de infertilidade é a incapacidade de engravidar a parceira. O paciente pode ter história de criptorquidismo e infecção do trato genito-urinário. O espermograma continua a ser o teste mais valioso na investigação da infertilidade masculina.Testes especiais como anticorpos antiespermatozóides, interação com o muco cervical e testes de penetração do esperma só devem ser realizados após os exames de triagem. A azoospermia pode ocorrer devido a obstrução bilateral, ejaculação retrógrada ou ausência congénita dos vasos deferentes ou das vesículas seminais. Exames radiológicos dessas estruturas auxiliam o diagnóstico. Disfunção Eréctil A disfunção eréctil é um síndrome complexo que envolve factores arteriais, venosos, sinusoidais, neurológicos, hormonais, bioquímicos, sociais e psicológicos. É definida como a incapacidade de obter uma erecção longa durante o tempo suficiente para uma relação plenamente satisfatória. Geralmente, ocorre uma disfunção eréctil parcial, mais frequentemente do que uma falta completa de rigidez do pénis. A perda de erecção antes da ejaculação é a queixa mais comum. A disfunção eréctil pode ser classificada como fisiológica ou funcional. Uma disfunção neurogénica envolve incapacidade de iniciar a erecção devido à ausência dos neurotransmissores endógenos, e pode ser causada por diabetes, doenças da medula espinal, lesões da cauda da medula espinal, polineuropatia, mielopatia e esclerose múltipla, entre outras. Determinados medicamentos, estados de ansiedade e o uso de bebidas alcoólicas também podem acarretar problemas. Drogas que atuam no SNC ou no pico adrenérgico da ansiedade podem causar diminuição do fluxo sanguíneo do pénis, assim como drogas anti-hipertensivas (betabloqueadores, tiazidas, metildopa), cimetidina e alguns antilipémicos. O alcoolismo de longa duração e a cirrose hepática podem prejudicar os mecanismos de condução nervosa intrapenianos e acarretar atrofia testicular ou ginecomastia. A segunda classificação é baseada nas desordens vasculares. As principais causas são arteriosclerose, síndrome de Leriche, outras obstruções vasculares, microangiopatia, síndromes anginosas, insuficiência cardíaca congestiva e priapismo. A disfunção vascular pode ser arterial, venosa ou mista. Na disfunção arterial, não ocorre o enchimento do corpo cavernoso. Estes casos geralmente são provocados por hipertensão, diabetes, dislipidemias, angina e tabagismo. Na disfunção venosa, o corpo cavernoso não consegue reter o sangue, e isso deve-se, normalmente, a traumas ou à idade. As causas endócrinas da disfunção eréctil incluem a deficiência de testosterona por doença hipofisária ou testicular, o excesso de estrogénio e a hiperprolactinemia. Outras causas são o hipertiroidismo, o hipotiroidismo e o síndrome de Cushing. A avaliação laboratorial, portanto, deve incluir glicemia de jejum, perfil lipídico, avaliação hepática, renal e da tiróide, bem como doseamentos de prolactina, testosterona livre, LH e FSH. Prostatite O termo prostatite inclui inúmeras condições como prostatites bacterianas agudas e crónicas, não-bacterianas e prostatodinia. Nas prostatites bacterianas agudas, o início é abrupto, com febre e infecção do trato urinário, sintomas irritativos e obstrutivos, dor lombar baixa ou no períneo, astenia, mialgia e artralgia. Geralmente, ocorre em pacientes jovens por bacilos Gram-negativos. O exame simples de urina geralmente revela piúria, indicativa de infecção urinária, e, à cultura, o Gram-negativo encontrado com mais frequência é Escherichia coli. A prostatite bacteriana crónica ocorre em pacientes mais velhos, com infecção urinária de repetição, geralmente por Gram-negativos. Muitos desses pacientes apresentam cálculos na próstata, o que facilita a cronicidade da infecção. A coleta após massagem prostática é aconselhável nesses casos. O tipo mais comum de prostatite é a não-bacteriana, geralmente causada por Chlamydia trachomatis, Ureaplasma urealyticum e Trichomonas vaginalis. Neoplasias Os tumores testiculares são raros e representam menos de 1% das mortes por cancro nos homens. Apesar da baixa prevalência, em alguns países é a neoplasia mais comum em homens entre os 29 e os 40 anos de idade. A maioria dos tumores testiculares (95%) é formada por células germinativas e divide-se em seminomas e não-seminomas. Entre os tumores não-seminomatosos estão o carcinoma de células embrionárias coriocarcinoma e o teratoma, que normalmente metastatizam por vias linfática e hemática, além de serem resistentes à radioterapia. As metástases dos tumores seminomatosos são, normalmente, apenas por via linfática, para linfonodos regionais, retroperitoneais, mediastinicos e supraclaviculares, e são sensíveis à radioterapia. Quarenta por cento dos tumores de células germinativas são formados por componentes seminomatosos e não-seminomatosos, mas a presença de qualquer componente não-seminomatoso classifica-o como tal. O sinal clínico mais comum da apresentação do tumor de testículo é o intumescimento indolor do órgão, que pode tornar-se doloroso por hemorragias no interior da neoplasia ou após traumatismos. Outros sintomas que podem ser encontrados são disúria, perda de peso, feminilização, ginecomastia e diminuição da libido. Paralelamente à realização de exames de imagem, os marcadores tumorais são de grande auxílio no diagnóstico desses tipos de cancro. A determinação sérica da hormona gonadotrófica coriónica (HCG) e de alfafetoproteína (AFP) é importante na investigação diagnóstica, especialmente se o método utilizado dosear o HCG total e a fracção beta livre. A presença de níveis aumentados de AFP indica a existência de um componente não-seminomatoso no tumor de testículo. Num estudo de pacientes com tumores não-seminomatosos, os níveis séricos de HCG e da fração beta livre estavam aumentados em 60% e em 40-70% dos casos, respectivamente. Apesar de poucos tumores seminomatosos estarem associados ao aumento de HCG, níveis elevados (acima de 5.000 UI/L) estão ligados à presença de tumor não-seminomatoso. A avaliação conjunta dos dois analítos aumenta o valor preditivo dos testes em relação à dosagem isolada, pois permite a detecção de aproximadamente 90% dos tumores não-seminomatosos. Na investigação de seminoma, os níveis séricos de HCG estão aumentados somente em 7 a 16% dos pacientes, e os valores são inferiores a 200 UI/L. Porém, quando se utiliza a dosagem da fração beta livre, 20 a 50% dos pacientes com seminoma apresentam níveis séricos aumentados, mostrando a importância de se dosear essa fracção. Nesses casos, é necessário realizar o exame histológico do material de punção testicular para diferenciar seminomas de não-seminomas. Existem ainda os tumores testiculares de células de Sertoli ou células de Leydig, que geralmente são benignos. Não existe um consenso entre os mais de 40 ensaios existentes hoje no mercado para as determinações de HCG ou das moléculas relacionadas. Variações entre os resultados encontrados entre ensaios são comuns, especialmente se a dosagem de HCG é para a investigação de gestações complicadas com aborto espontâneo, préeclâmpsia, doença trofoblástica, síndrome de Down ou neoplasias do testículo, da bexiga ou do ovário. Essas variações entre os resultados de HCG devem-se ao facto de que várias formas da molécula de HCG podem estar presentes no sangue e na urina de gestantes e de indivíduos com tumores: molécula de HCG intacta, fraccionada, hiperglicosilada, hipoglicosilada, sem a extensão C-terminal, sub-unidade livre, subunidade grande, sub-unidade beta livre, sub-unidade beta livre fraccionada e a fracção beta core. Muitas dessas sub-unidades são produtos de diferentes etapas de degradação do HCG que fazem parte de um processo de desativação da molécula. No início de uma gestação normal, a principal forma de HCG encontrada no sangue é a não-fraccionada, que aumenta exponencialmente no primeiro trimestre de gravidez. Em pacientes com cancro de testículo ou doença trofoblástica, as principais formas de HCG encontradas têm sido o HCG fraccionado e a fracção beta livre, que é indicada como o melhor marcador tumoral para o cancro de testículo. A metodologia que utiliza a associação HCG fraccionada, HCG não-fraccionada e fracção beta livre é a que melhor se aplica para a dosagem de HCG, seja na investigação de gravidez ou de cancro. A maioria das neoplasias de próstata é de adenocarcinomas, detectados quando se acha um nódulo de consistência difusa, por meio do toque retal. Em geral, o paciente não apresenta, até então, queixas clínicas. Alguns pacientes manifestam obstrução do trato urinário ou disfunção eréctil. O screening com dosagem do antigénio específico da prostata (PSA) tem facilitado, juntamente com o toque retal, o diagnóstico mais precoce. Perante as alterações desses parâmetros, exames complementares, como o ultra-som trans-rectal e a biópsia da próstata, tornam-se necessários para o diagnóstico. AVALIAÇÃO LABORATORIAL Hormona Folículo-Estimulante (FSH) É uma hormona glicoproteica produzida pela hipófise e secretada de forma pulsátil, podendo ser doseada em pool. Eleva-se nas deficiências do ovário e testicular (hipogonadismo primário). É indicado no diagnóstico da menopausa. Encontra-se diminuída nas doenças hipotalámicas e hipofisárias, excepto em casos de tumores produtores de gonadotrofinas, quando se encontra elevada. Pode elevar-se também em casos de comprometimento da espermatogénese. A relação LH/FSH maior do que 2 pode sugerir o diagnóstico de ovário poliquístico. É útil também na avaliação da puberdade precoce. Hormona Luteínica (LH) É uma hormona glicoproteica produzida pela hipófise e secretada de forma pulsátil, podendo ser doseada em pool. O doseamento seriado é indicado no diagnóstico da ovulação. Eleva-se no hipogonadismo primário e encontra-se diminuída nas doenças hipotalámicas e hipofisárias, excepto em casos de tumores produtores de gonadotrofinas, quando se apresenta elevada. A sua relação com FSH é valorizada no diagnóstico do síndrome do ovário poliquístico. É útil também na avaliação da puberdade precoce. Testosterona É uma hormona esteróide androgénica secretada pelos ovários e gandulas suprarenais na mulher e pelos testículos nos homens. É útil no diagnóstico do hipogonadismo masculino, bem como na avaliação da puberdade. Na mulher, é indicado na avaliação do hirsutismo e da virilização. A testosterona circula ligada à SHBG (globulina ligada às hormonas sexuais), com uma pequena fracção que circula na forma livre. 3-Alfa-Androstenediol Glicuronídeo (3-Alfa-Diol) É o principal metabolito da deidrotestosterona. Nos casos de aumento da actividade da 5-alfa-reductase, ocorre aumento tanto da DHT quanto dos seus metabolitos. É importante no diagnóstico do hirsutismo idiopático, encontrando-se aumentado mesmo com níveis normais de testosterona. Estrona Provém principalmente da conversão periférica da androstenediona. É útil na avaliação dos tumores feminilizantes e da menopausa, bem como na avaliação da puberdade e do síndrome do ovário poliquístico. Estradiol (17-Beta-estradiol) É o estrogénio mais potente produzido pelas gonadas. Na mulher, é produzido pelos folículos ováricos, e nos homens, pelas células de Leydig e por conversão periférica da testosterona. É útil no diagnóstico da puberdade precoce e dos tumores feminilizantes no homem. No hipogonadismo feminino, encontra-se em níveis baixos, apesar de grande superposição com valores normais. No hipogonadismo masculino, dependendo da etiologia, os valores podem estar normais ou elevados. Nos tumores feminilizantes no homem (supra-renais ou testiculares) produtores de estrogénio, o estradiol estará elevado. Estriol O estriol é produzido pela placenta a partir da conversão do sulfato de deidroepiandrosterona produzido pela supra-renal fetal. Por isso, o seu doseamento é útil na avaliação da integridade feto-placentária. Os seus valores elevam-se gradualmente durante a gestação normal. O seu doseamento seriado é utilizado como um marcador no acompanhamento das gestações de alto risco, visto que sua queda indica sofrimento fetal. Progesterona É um esteróide secretado pelas gonadas e glândulas supra-renais. É o principal marcador da ovulação. Para essa avaliação, devem ser colhidas amostras seriadas. A principal indicação desse doseamento é o diagnóstico de ciclos anovulatórios e a disfunção da fase lúctea. Testosterona Livre A testosterona livre é responsável pelo efeito metabólico da testosterona, uma vez que não sofre a influência dos níveis de SHBG. É importante no diagnóstico do hipogonadismo masculino e do hirsutismo feminino. Androstenediona É um androgénio produzido pelas supra-renais e gónadas. Útil na avaliação do hiperandrogenismo (hirsutismo, acne), no acompanhamento da hiperplasia congénita de supra-renal, tumores virilizantes de supra-renal e ovário. Deidrotestosterona (DHT) Provém da transformação periférica de testosterona no homem e da androstenediona na mulher, pela ação da 5-alfa-redutase. É útil na avaliação do hirsutismo feminino, sugerindo maior conversão periférica. Também é útil nas avaliações do defeito da 5-alfa-redutase, nos casos de pseudo-hermafroditismo masculino, quando as concentrações de DHT são desproporcionalmente baixas em relação às de testosterona. Eleva-se também na hiperplasia congénita da supra-renal e nos carcinomas do ovário e adrenais. Durante a gestação, grandes quantidades são produzidas pela placenta. Globulina Ligada às Hormonas Sexuais (SHBG) É uma glicoproteína sintetizada pelo fígado. A sua função é transportar as hormonas sexuais. É útil na avaliação complementar do hiperandrogenismo, uma vez que a sua elevação pode levar ao aumento dos níveis de testosterona total mas não dos de testosterona livre. Várias circunstâncias alteram seus valores, como estrógenios e hormonas tiroidéias (hipertiroidismo). Tamoxifen, fenitoína e cirrose hepática elevam os níveis de SHBG. Já os androgénios, os glicocorticóides, a hormona de crescimento, o hipotiroidismo, a obesidade e a acromegalia cursam com níveis diminuídos de SHBG. Avaliação Dinâmica da Função Endócrina Muitas patologias endócrinas podem ser diagnosticadas por meio dos doseamentos dos níveis hormonais sérios ou urinários, em condições basais. Contudo, o doseamento isolado das hormonas nem sempre permite a distinção entre o normal e o patológico. Os valores de normalidade tão alargados para concentrações séricas de algumas hormonas tornam imprecisa a interpretação de valores individuais se o valor normal prévio para determinado paciente for desconhecido. Por exemplo, uma concentração sérica de tiroxina (T4) no limite máximo para a população em geral pode estar associada a hipertiroidismo num paciente cuja concentração, usualmente, estaria no limite mínimo da faixa de normalidade. Além disso, há pequenos níveis de disfunção endócrina que podem estar compensados em condições basais. Portanto, os níveis séricos de cortisol podem estar normais em pacientes com insuficiência adrenocortical parcial devido ao aumento de secreção de corticotrofina (ACTH). No diagnóstico de alterações parciais dos mecanismos de controlo endócrinos, podemos utilizar três tipos de testes funcionais: doseamentos hormonais seriados, doseamentos de várias hormonas e testes de reserva endócrina e retro-controlo endócrino. Todos os três são da máxima importância no diagnóstico, mas podem sofrer a influência de inúmeros factores que tornariam sua interpretação bastante complexa. Doseamentos Hormonais Seriados Nalgumas circunstâncias, a variação de secreção hormonal reflecte processos pouco compreendidos de exacerbação ou de remissão de patologias. Dessa forma, doseamentos seriados dos níveis de cálcio e PTH (paratormona) por períodos prolongados podem ser necessárias para diagnóstico de hiperparatiroidismo. Outras condições clínicas, como o síndrome de Cushing, podem apresentar o mesmo padrão de exacerbação/remissão. Noutras circunstâncias, a variação na secreção hormonal endócrina resulta de alterações rítmicas como uma secreção pulsátil ou um ritmo circadiano básico. A perda do ritmo circadiano de secreção de cortisol pode ser um sinal precoce de síndrome de Cushing. O ritmo circadiano da secreção hormonal pode ser alterado por inúmeros factores, como distúrbios do sono, drogas, doenças psiquiátricas e stres. A demonstração de uma variação diurna normal pode ser uma boa evidência de normalidade na sua função. No entanto, a sua ausência não indica necessariamente uma doença endócrina primária. Na verdade, alterações desse ritmo circadiano indicam a necessidade de testes diagnósticos adicionais. Doseamento de várias Hormonas Como o sistema endócrino funciona basicamente sob retro-regulação, o doseamento de várias hormonas (T4 e TSH, cálcio e PTH, testosterona e LH ) permite uma avaliação dos níveis individuais. Por exemplo, uma vez que a faixa de normalidade do T4 é ampla, os níveis de determinado paciente poderiam cair para a metade e ainda permanecer na faixa normal. Nesse caso, contudo, uma concentração de T4 próxima aos limites mínimos normais, associada a elevados níveis de TSH, indica o estadio inicial de uma falência tiroidiana compensada. Conforme observamos na tabela a seguir, baixos níveis de ambos os pares hormonais apontam deficiência da hormona trófica (ex: insuficiência hipofisária no caso de TSH e T4). Altos níveis da hormona-alvo com baixos níveis da hormona trófica sugerem secreção autónoma do órgão-alvo (ex: adenomas adrenais hiperfuncionantes inibindo a secreção de ACTH). ALTO NÍVEL DA HORMONA DA GLÂNDULA BAIXO NORMAL ALTO Secreção autónoma de hormonas tróficas ou resistência à acção hormonal da glândula alvo NORMAL BAIXO Normal Insuficiência Hipofisária Secreção autónoma do órgão alvo Elevados níveis dos pares hormonais são compatíveis com os mecanismos de várias doenças. A secreção autónoma de uma hormona trófica pode ser tópica ou ectópica. Por exemplo, o síndrome de Cushing pode resultar da secreção hipofisária de ACTH ou da secreção de ACTH por tumores pulmonares. Outra possibilidade é a secreção de factores liberados a partir de tumores em órgãos periféricos, causando hipersecreção de hormonas hipofisárias, como por exemplo a acromegalia resultante da secreção ectópica de fatores liberadores da hormona de crescimento. Por outro lado, essa elevação combinada da hormona trófica e da hormona da glândula-alvo pode dever-se à resistência da acção da hormona da glândula-alvo. Essa resistência pode ser herdada (como nos casos de defeito de receptor de androgénios que causam resistência à acção da hormona e resultam em níveis elevados de LH e de testosterona), ou adquirida (como no caso de resistência insulínica da obesidade, que pode levar a hiperinsulinismo e hiperglicemia). Elevação de TSH e T4 pode indicar tanto secreção autónoma de TSH quanto à resistência da acção da T4. Contudo, doenças em estadio inicial podem tornar necessárias informações adicionais por meio de testes dinâmicos. Testes da Função Endócrina Os testes dinâmicos baseiam-se em estímulo ou em supressão da produção hormonal. Testes de Estimulação São utilizados na suspeita de hipofunção endócrina para avaliar a capacidade de reserva de síntese e secreção hormonal. Esses testes são realizados de duas maneiras: 1) Administração de uma hormona trófica para testar a capacidade do órgão-alvo de aumentar a produção hormonal. Essa hormona pode ser um factor liberador hipotalámico, como o TRH, ou uma hormona hipofisária, como o ACTH. Nesses casos, a capacidade do órgão-alvo é avaliada pelo doseamento dos níveis hormonais séricos - nos exemplos citados, o TSH e o cortisol. 2) Estimulação da secreção de uma hormona trófica endógena ou factor estimulador e medição do efeito desses estímulos antiestrogénicos em nível hipotalámico, diminuindo o retro-controlo negativo e causando um aumento na secreção de gonadotrofinas, que pode ser seguido por ovulação e/ou aumento na formação de esteróides gonodais. Testes de Estimulção mais Frequentes ÓRGÃO/ SISTEMA Hipotálamo-hipófise Hipófise Tiróide Supra Renal Gónadas Ilhotas Pancreáticas Paratiróide Balanço Hídrico Metabolismo do Cálcio ESTÍMULO Hipoglicemia Metirapona Levodopa Anginina Citrato de clomifeno Exercício Restrição hídrica RTH LHRH CRF GHRH TSH Pentagastrina Cálcio Certrosina Metirapona Mudança de postura HCG Glicose PTH Vasopresina Sobrecarga de Cálcio RESPOSTA GH e ACTH (cortisol) ACTH (cortisol e 11-desoxicortisol) GH GH Gonodotrofinas GH Vasopresina TSH e prolactina Gonodotrofinas ACTH (cortisol) GH Captação de iodo radiotaivo Calcitonina Calcitonina Cortisol Cortisol e 11 desoxicortisol Renina e aldosterona Testosterona Tolerância a glicose e libertação de insulina AMPc e fósfatos urinários Concentração urinária Cálcio Urinário Testes de Supressão São utilizados em casos de suspeita de hiperfunção endócrina. Como nos testes de estimulação, são utilizadas hormonas exógenas ou factores reguladores conhecidos para avaliar a inibição da produção hormonal endógena, por exemplo, a administração de glicocorticóide (dexametasona) a pacientes com suspeita de síndrome de Cushing para avaliar a capacidade de inibição da secreção do ACTH e portanto da síntese adrenal de cortisol. A falência da supressão nesses testes indica a presença de secreção autónoma da hormona da glândula-alvo ou de hormonas tróficas (hipofisárias ou ectópicas) que não estão sob retro-regulação normal. Testes de Supressão Mais Frequentes ÓRGÃO/ SISTEMA Hipotálamo-hipófise Tiróide Supra-renal Ilhotas Pancreáticas ESTÍMULO Glicose Dexametasona T4 Dexametasona Salina Clonidina Jejum RESPOSTA GH ACTH (cortisol) Captação de iodo radiotaivo Cortisol Renina e aldosterona Noradrenalina plasmática Glicose e insulina Interpretação dos Testes Funcionais São a melhor avaliação dos distúrbios endócrinos leves, como por exemplo o teste de estímulo com cortrosina para diagnosticar a insuficiência adrenocortical parcial com secreção de cortisol basal normal. Os testes dinâmicos também são úteis na determinação do defeito patogénico, tal como o estímulo com LHRH para diagnosticar se o hipogonadismo hipogonadotrófico ocorre em consequência de insuficiência hipofisária ou hipotalámica. Em pacientes com síndrome de Cushing, a supressão da produção de cortisol em resposta a altas doses de dexametasona sugere hipersecreção hipofisária de ACTH, uma vez que tumores adrenais ou secreção ectópica de ACTH não respondem ao teste de supressão. A principal dificuldade na interpretação dos testes é a definição adequada do que seja resposta normal em indivíduos normais que apresentam outras patologias. Por exemplo, os atletas têm uma resposta aumentada do ACTH e do cortisol ao estímulo com cortrosina. Além disso, inúmeros factores influenciam a resposta de um teste funcional, como idade, sexo, fumo, uso de determinadas drogas, obesidade, desnutrição, insuficiência renal crónica, cirrose hepática e outras patologias associadas. Por exemplo, a resposta do TSH ao estímulo com TRH diminui em homens com mais de 60 anos. Citamos ainda a resposta sub-normal do GH ao estímulo de hipoglicemia induzida por insulina e a administração de arginina e de levodopa em pacientes obesos, que normalizam após o retorno ao peso ideal. Por outro lado, pacientes com desnutrição grave, insuficiência renal crónica ou cirrose hepática costumam ter níveis de GH basal elevados, que não respondem à supressão ou respondem com um aumento paradoxal após sobrecarga de glicose. Na avaliação da baixa estatura, a realização de dois testes aumenta a sensibilidade de 80 para mais de 90%. Várias doenças psiquiátricas estão associadas a testes dinâmicos da função endócrina, alterados na ausência de patologia endócrina específica. A mais frequente é a depressão. Pacientes com depressão primária grave não apresentam supressão adequada do cortisol, após administração de dexametasona, normalizando essa resposta após o tratamento da depressão. Em 20% dos pacientes com doença psiquiátrica aguda, são encontradas concentrações elevadas de T4 e T4 livre sem evidência clínica de tireotoxicose. A resposta do TSH ao TRH apresenta-se subnormal ou ausente em cerca de 25% dos pacientes psiquiátricos sem doença tiroidéia, principalmente em casos de depressão unipolar ou bipolar. O uso de drogas também interfere nos testes dinâmicos. Glicocorticóides em doses farmacológicas, progestagénios, teofilina e cloropromazina bloqueiam a resposta do GH aos estímulos usuais. A ingestão crónica e excessiva de álcool diminui a resposta da prova de supressão do cortisol à dexametasona. O uso de levodopa, de dopamina e de aspirina em altas doses bloqueia a resposta do TSH ao TRH. A fenitoína aumenta a captação celular e o metabolismo do T4, levando a baixos níveis de T4 livre, além de diminuir em 50% a resposta do TSH ao TRH. Portanto, a avaliação da função tiridéia é prejudicada principalmente quando nos encontramos diante de um paciente com uso dessa droga com níveis baixos de T4 e TSH normal. Deve ser considerada, ainda, a possível necessidade de estímulos repetidos para a obtenção de uma resposta normal. Por exemplo, pacientes com hipogonadismo hipogonadotrófico por doença hipotalámica com resposta subnormal do LH ao estímulo com LHRH podem normalizar a resposta ao teste após 1 semana de administração diária de LHRH. Esse protocolo permite a distinção entre hipogonadismo hipotalámico e hipofisário. Para melhor compreensão das provas funcionais, a figura acima esquematiza a regulação da secreção das hormonas hipofisárias por intermédio de hormonas hipotalámicas estimulantes e inibidores. Os Testes Mais Frequentes Estimulação da Hormona de Crescimento A maioria dos autores considera normal uma resposta superior a 7 ng/mL, embora outras escolas admitam valores > 10 ng/mL. - Após Exercício Colher a amostra basal em repouso, submeter o paciente a 20 minutos de exercício. Colocá-lo em repouso durante 10 minutos antes da colheita da amostra, após esforço. Aproximadamente 10% dos pacientes normais deixam de responder a esse estímulo. Portanto, a baixa resposta não faz o diagnóstico de deficiência de GH. A sua realização está contra-indicada nas doenças sistémicas nas quais o esforço possa desencadear ou agravar o quadro. - Após Clonidina Colher amostras nos tempos: basal, 60, 90 e 120 minutos. O paciente deverá permanecer deitado durante toda a prova e por mais 1 hora após a colheita da amostra de 120 minutos, prevenindo os efeitos da hipotensão causada pela droga. A pressão arterial deve ser monitorizada durante toda a prova. - Após Insulina São realizadas os doseamentos da GH e da glicemia nos tempos: basal, 30, 60, 90 e 120 minutos. É indispensável a monitorização médica contínua devido ao risco de hipoglicemia. A informação obtida nessa prova não parece superior à obtida com outros testes de libertação de GH. A sua realização é contra-indicada em pacientes com história de crises convulsivas, cardiopatias, insuficiência renal ou hepática, hipocortisolismo, em gestantes ou no uso concomitante de algumas drogas como hipoglicémicos orais e betabloqueadores. Para que o teste seja considerado válido, deve ocorrer queda da glicemia a valores abaixo de 40 mg/dL ou aparecimento de sinais clínicos de hipoglicemia. - Após Piridostigmina (Mestinon) Colher amostras para doseamento de GH nos tempos: basal, 60, 90 e 120 minutos. A sua realização é contra-indicada em pacientes com história de asma brônquica, diarréia e cólica intestinal. - Após TRH Colher amostras para doseamento de GH nos tempos: basal, 30 e 60 minutos. Em indivíduos normais, não ocorre aumento dos níveis de GH, enquanto em muitos acromegálicos pode ocorrer um efeito paradoxal da droga com aumento da secreção de GH. Essa resposta não apresenta a mesma uniformidade que a resposta anormal à administração de glicose por via oral. A sua realização é contraindicada em pacientes com história de hipertensão arterial, doenças cerebrovasculares e glaucoma. Supressão da Hormona de Crescimento - Após Glicose São realizados os doseamentos de GH e de glicemia nos tempos: basal, 30, 60, 90, 120 e 180 minutos. Nos indivíduos normais, ocorre diminuição dos níveis de GH até valores inferiores a 2 ng/mL. Nos acromegálicos, pode ocorrer uma resposta paradoxal, com elevação dos níveis de GH. - Após Parlodel São realizados os doseamentos de GH nos tempos: basal, 60, 120, 180, 240 e 360 minutos. Indicado para determinar a possível resposta dos pacientes portadores de tumores produtores de GH à terapêutica medicamentosa com bromoergocriptina, devendo ocorrer queda expressiva (50% dos níveis basais). Estimulação da Prolactina - Após TRH São realizados os doseamentos de prolactina nos tempos: basal, 30 e 60 minutos. A pressão arterial deve ser monitorizada, pois pode ocorrer elevação dos níveis da PA. Em mulheres normais, deve ocorrer aumento de pelo menos três vezes o valor basal, enquanto nos homens se espera um aumento de pelo menos duas vezes o valor basal. Níveis elevados no doseamento basal e uma resposta reduzida ou ausente sugerem a presença de tumor, embora esse padrão de resposta não seja suficiente para diagnosticar ou excluir a possibilidade de prolactinoma. Níveis diminuídos no doseamento basal, com resposta baixa, são um achado raro, excepto quando associados à falência precoce da lactação no síndrome de Sheeham. Supressão da Prolactina - Após Parlodel Dosear a prolactina basal (8:00) e a cada 2 horas em quatro amostras (10,12,14 e 16 horas). Indicado para determinar a possível resposta dos pacientes portadores de tumor produtor de prolactina à terapêutica medicamentosa. Espera-se uma queda do nível basal de mais de 50% após 4 horas. Estimulação da Hormona Tireotrófica - Após TRH É realizado o doseamento do TSH nos tempos: basal, 30 e 60 minutos, e se necessário, 90 e 120 minutos. Normalmente ocorre um pico de TSH entre 20 a 30 minutos após a administração do TRH. O incremento de TSH é de cinco a quinze vezes o nível basal, variando com o sexo (maior em mulheres) e com a idade (menor em idades avançadas). Em pacientes com hipotiroidismo primário, o TSH parte de valores basais altos, eleva-se mais ainda e não se normaliza aos 60 minutos. Já no hipotiroidismo secundário por deficiência hipofisária, o TSH encontra-se em níveis inferiores no doseamento basal e não responde ao TRH. No hipotiroidismo hipotalámico, a resposta do TSH ao TRH é tardia, registando-se elevação gradual do TSH até 60 minutos. Nos pacientes com hipertiroidismo, a secreção do TSH encontra-se bloqueada pelo excesso de T3 eT4, não havendo resposta ao estímulo com o TRH. Estimulação das Gonadotrofinas Hipofisárias - Após LHRH São realizados os doseamentos de LH e de FSH nos tempos: basal, 15, 30 e 60 minutos. Em homens, ocorre um aumento de LH de duas a dez vezes o nível basal, e o aumento de FSH é de metade a duas vezes esse nível. Nas mulheres, o aumento de LH é de três a quatro vezes o nível basal na fase folicular e mais acentuado na fase lúctea, enquanto o aumento de FSH é de metade a duas vezes o basal. Estimulação Hipotálamo-Adreno-Hipofisária - Após Insulina Esse teste avalia o estímulo de ACTH e de cortisol. São realizados doseamentos de ACTH e de cortisol nos tempos: basal, 30, 60 , 90 e 120 minutos. Para que o teste seja considerado válido, devem ocorrer queda da glicemia para valores abaixo de 40 mg/dL ou o aparecimento de sinais clínicos de hipoglicemia. É indispensável a monitorização médica contínua, devido ao risco de hipoglicemia. Esta prova deve ser precedida da prova de estímulo com ACTH, e só devem ser submetidos a ela os pacientes com estímulo positivo. Normalmente, o ACTH aumenta três vezes ou mais em relação ao nível basal, devendo exceder 150 ng/mL. O cortisol eleva-se a valores superiores a 200 ng/mL. - Após Cortrosina O teste de estimulação do cortisol - estimulação rápida com cortrosina simples. São realizadas os doseamentos de cortisol nos tempos: basal, 30, 60 e 90 minutos. A ausência de resposta do cortisol ao estímulo com cortrosina estabelece o diagnóstico de insuficiência adrenocortical parcial em pacientes com secreção de cortisol basal normal. Níveis de cortisol iguais ou superiores a 200 ng/mL, em qualquer ponto da prova, indicam função adrenal normal. Avaliação Hipofisária Total São realizados doseamentos de TSH, prolactina, LH, FSH, cortisol, GH e glicose nos tempos: basal, 30, 60 minutos. Os doseamentos de FSH, GH, cortisol e glicose devem ser realizados também aos 90 minutos. A resposta de cada sector (tireotrófico, gonadotrófico, corticotrófico ou lactotrófico), bem como as contra-indicações, devem ser avaliadas isoladamente, como já foi descrito anteriormente. Betacaroteno O caroteno é um precursor lipossolúvel da vitamina A encontrado em gorduras, folhas e vegetais amarelos. Uma pequena porção do caroteno é absorvida pelo intestino, contribuindo para a cor amarela do soro. Com a participação das gorduras e dos sais biliares, a maior parte do caroteno é normalmente convertida em retinol no trato intestinal. A hipercarotenemia, isto é, a elevação do nível de caroteno, caracteriza-se por pigmentação amarela da pele, sem nenhuma mudança na cor da esclerótica, causada por ingestão excessiva de alimentos ou de complexos vitamínicos ricos em caroteno. O indivíduo também pode apresentar prurido e perda de peso. A doença é geralmente benigna e é tratada com mudanças na dieta. Valores diminuídos indicam ingestão insuficiente ou má absorção. O doseamento de caroteno é mais frequentemente utilizado como prova de triagem para a síndrome de má absorção e no diagnóstico diferencial de hiperbilirrubinemia Beta-2-Microglobulina A beta-2-microglobulina é uma pequena molécula presente na superfície das células nucleadas, principalmente linfócitos, que está relacionada com HLA (Human Leucocyte Antigen). A sua presença é necessária para a inserção da molécula de HLA na membrana celular, além de estabilizar a cadeia pesada do HLA. Ela parece actuar na regulação da função dos leucócitos, mas isso ainda não foi suficientemente definido. Está, normalmente, presente no plasma, urina e líquor. É libertada durante o processo de renovação das membranas celulares. Por ser uma proteína pequena, é filtrada pelos glomérulos. No entanto, a maior parte é reabsorvida e degradada pelas células epiteliais tubulares dos túbulos proximais. Por isso, a concentração plasmática de beta-2-microglobulina é um bom índice da taxa de filtração glomerular. É descrito um aumento progressivo dos valores normais acompanhando a idade. Níveis séricos elevados podem ocorrer em diversas patologias inflamatórias, como hepatites, artrite reumatóide, lúpus eritematoso sistémico, SIDA, sarcoidose e em pacientes com leucemias, linfomas e alguns tumores sólidos e patologias que cursam com a diminuição da filtração glomerular. Níveis urinários elevados podem ser encontrados em pacientes com desordens renais tubulo-intersticiais, como intoxicação por metais pesados, drogas quimioterápias, aminoglicosídeos, infecções urinárias altas e rejeição a transplantes. Relatos recentes apontam a beta-2-microglobulina como o melhor marcador de prognóstico no mieloma múltiplo. Bilirrubina A bilirrubina é o principal produto do metabolismo do heme da hemoglobina. Cerca de 70% da bilirrubina são provenientes da destruição de eritrócitos velhos, 15% provêm de fontes hepáticas, e o restante é proveniente da destruição de células vermelhas defeituosas na medula óssea e nos citocromos. A hemoglobina é metabolizada no baço e no sistema reticuloendotelial, dando origem à biliverdina, que é reduzida a bilirrubina pela enzima biliverdina redutase. Essa bilirrubina recém-formada circula no sangue ligada à albumina sérica (forma não-conjugada). É transportada pelo sistema porta até o fígado, onde penetra no hepatócito por dois mecanismos distintos: difusão passiva e endocitose. Uma vez dentro do hepatócito, a bilirrubina desliga-se da albumina e forma um complexo protéico com as chamadas proteínas Y e Z. Logo depois, liga-se a um outro complexo chamado ligandina. É então transportada para o retículo endoplasmático liso, onde se forma um substrato da enzima glicuronil transferase, dando origem a um diglicuronídeo conjugado (mono- e triglicuronídeos também são formados). A bilirrubina, agora já conjugada, é transportada até a membrana celular. Na face oposta aos sinusóides e próxima aos canalículos biliares, ela é excretada directamente. Só consegue ultrapassar a membrana quando conjugada. Através dos canalículos biliares, alcança o trato intestinal, onde é metabolizada pelas bactérias da flora intestinal, formando os urobilinogénios. A maior parte dos urobilinogénios é absorvida e novamente excretada pelo fígado, e uma pequena fracção é excretada pelos rins. Existem portanto dois tipos de bilirrubina circulantes - a conjugada (bilirrubina directa) e a não-conjugada (bilirrubina indirecta). No entanto, existe um terceiro tipo de bilirrubina, chamada de bilirrubina delta, do tipo conjugada de reacção rápida e ligada à albumina permanentemente por uma reacção covalente. Pelas técnicas tradicionais, a bilirrubina delta era incluída nos resultados da bilirrubina directa (conjugada) e na bilirrubina total. Por estar fortemente ligada à albumina, a bilirrubina delta não é excretada pelos rins e permanece elevada por muitor tempo, na verdade, por períodos correspondentes à semi-vida da albumina (cerca de 19 dias), mesmo após a resolução da obstrução ou do período agudo da lesão hepática. Isso pode levar a falsas interpretações. Entretanto, actualmente, os métodos automatizados de última geração, especialmente a tecnologia de química seca, já separam a fracção delta, que não é incluída em nenhuma das demais frações, nem mesmo no valor da bilirrubina total. Acompanhando os mecanismos envolvidos no metabolismo da bilirrubina, é possível correlacionar o aumento de seus níveis séricos com alterações de uma dessas etapas. Os níveis séricos da bilirrubina não-conjugada (bilirrubina indirecta) são determinados pela velocidade de produção e pela velocidade de remoção dessa bilirrubina da circulação. Os distúrbios que alteram a capacidade de depuração do fígado estão ligados à captação e/ou conjugação hepática. Os aumentos de bilirrubina indirecta não levam ao aumento da bilirrubina na urina. Os níveis séricos da bilirrubina conjugada (bilirrubina directa) são determinados pela capacidade de excreção da bilirrubina pelo fígado, ou seja, pela integridade fisiológica do hepatócito e da permeabilidade das vias biliares intra e extrahepáticas. Patologias que alterem essas funções cursam com aumento da bilirrubina directa, e muitas vezes da bilirrubina indirecta, e com a presença de bilirrubina na urina. Anemias hemolíticas (hereditárias e adquiridas, reabsorção extravascular, eritropoiese ineficaz. Alterações da Síndrome de Gilbert, drogas, acidose metabólica e Captação estados carenciados com hipoalbuminémia. Alteração da Síndrome de Cligler-Najjar (tipos 1 e 2: deficiência Conjugação da actividade da glicuronil transferase total e parcial, respectivamente). Inibição da glicuronil transferase por fármacos, especialmente em recém nascidos. Alterações da Síndrome de Dubin-Johnson, síndrome de Rotor, excreção colestase intra-hepática recorrente benigna, icterícia recorrente da gravidez, colestase por fármacos, icterícia pós-operatória, quadros de comprometimento da função hepática, como hepatites e cirrose. Obstruções das vias Lesões parciais ou completas dos ductos biliares por biliares estenose, cálculos ou tumores. Produção excessiva Brucelose A brucelose é uma zoonose, e a forma humana é causada por uma das quatro espécies: Brucella melitensis, a causa mais comum em todo o mundo, adquirida pelo contacto com cabras, carneiros e camelos; Brucella abortus, adquirida por contacto com bois; Brucella suis, adquirida por contacto com porcos; e Brucella canis, adquirida por contacto com cães. O contágio dá-se pelo contacto com a pele ou por ingestão de secreções contaminadas por esses animais. Tais bactérias mantêm-se viáveis em solo seco por cerca de 40 dias, e no caso de solo húmido esse prazo é ainda maior. São destruídas pela pasteurização e fervura, mas resistem ao congelamento. A contaminação relacionada com a ocupação profissional, como é o caso de agricultores, veterinários, processadores de carne, são a fonte mais frequente. Na população em geral, a fonte mais comum de contaminação é a ingestão de leite e derivados não-pasteurizados e o consumo de carne crua. Pode ser transmitida de pessoa a pessoa, pela placenta e durante a amamentação, e são citados casos raros de contaminação por actividade sexual. A infecção pode distribuir-se amplamente pelo organismo, causando lesões praticamente em qualquer órgão, com mais frequência no coração, ossos e articulações, aparelhos respiratório, gastrointestinal e geniturinário, globo ocular, pele, sistema nervoso central e sistema endócrino. O quadro clínico inicial é comum a outras doenças febris. O período de incubação dura em média de 1 a 3 semanas, podendo, em alguns casos, durar vários meses. A multiplicação intracelular do microrganismo ocorre nos gânglios linfáticos e sistema reticuloendotelial. A gravidade do quadro é variável, podendo apresentarse desde uma forma leve a grave. O quadro apresenta sintomas comuns como febre, mialgia, cefaléia, anorexia, artralgia e lombalgia. O exame clínico pode ser pouco expressivo ou apresentar linfadenopatia, hepatoesplenomegalia, dor à palpação da coluna vertebral, dor abdominal e outras manifestações. O diagnóstico é feito mediante a associação de história compatível com probabilidade de infecção, sinais clínicos e deteccção de anticorpos por reacções de aglutinação (com ou sem cultura positiva de sangue e tecidos). O diagnóstico é de grande importância no período pré-natal, pois pode levar à morte fetal. Os antigénios bacterianos têm a capacidade de induzir a formação de anticorpos específicos, inicialmente da classe IgM e logo após das classes IgG e IgA . Esses anticorpos aparecem a partir da segunda semana da doença, com picos entre a terceira e sexta semanas. Títulos maiores ou iguais a 1/160 são considerados significativos quando encontrados numa região não-endémica. Em áreas endémicas e em profissionais de alto risco de contaminação, são considerados significativos títulos iguais ou acima de 1/320. Títulos altos de IgM indicam infecção aguda; altos títulos de IgG, infecção em actividade; quando mais baixos, podem significar infecção antiga. Recomenda-se a análise com intervalo de 2 semanas na avaliação dos casos duvidosos: variações de quatro vezes o título anterior são sugestivas de infecção aguda. Reacções com títulos baixos podem ser encontradas em pacientes vacinados contra a febre tifóide. Podem ser encontradas reações cruzadas por infecção por outras bactérias e após reacções intradérmicas, com antigénios de Brucella BTA O carcinoma da bexiga é um dos tipos de tumor de maior incidência na Europa. Afecta principalmente homens entre 50 e 70 anos de idade, fumadores e pessoas expostas a substâncias químicas, como tintas, couro e borracha. Segundo as estatísticas, 1 em cada 5 pacientes diagnosticados com este tipo de carcinoma tem expectativa de vida de cerca de 5 anos. No entanto, se o diagnóstico for precoce, a taxa de sobrevida nesse mesmo período sobe de 20 para 94%. Entre os sinais clínicos de carcinoma da bexiga, o mais frequente é a hematúria, mas outros sintomas - como aumento da frequência urinária, dor pélvica e suprapúbica, obstrução urinária e micro-hematúria, podem também manifestar-se. Aproximadamente 80% dos tumores da bexiga são de células de transicão e estão restritos, na sua maioria, à superfície mucosa, podendo ser resolvidos por meio de ressecções trans-uretrais. A detecção precoce do carcinoma da bexiga é essencial para se aumentar a sobrevida de pacientes portadores da entidade mórbida. A recorrencia desse tumor pode dar-se em cerca de 50% dos pacientes tratados, o que torna essencial a monitorização a longo prazo. A observação da recorrência do tumor em pacientes com diagnóstico prévio de carcinoma da bexiga tem sido feita por meio de cistoscopia, podendo ser suplementada, nalguns casos, pela citologia de amostra da urina ou do raspado da bexiga. Entretanto, no que diz respeito à monitorização, a citologia é um exame sensível para os tumores pouco diferenciados (alto grau) e pouco sensível para os bem diferenciados (baixo grau). Por esse motivo, têm-se procurado outros testes de maior sensibilidade que possam suplementar ou mesmo substituir os exames existentes. O teste ideal para o diagnóstico e a monitorização de pacientes com carcinoma da bexiga deve ser rápido, de fácil realização, além de possuir sensibilidade e especificidade altas. Estudos recentes mostraram que a detecção do BTA (bladder tissue antigen) é significativamente mais sensível do que a citologia, não importando o estadio ou o grau do tumor da bexiga. O antigénio do tumor da bexiga reconhecido pelos anticorpos no teste BTA foi inicialmente isolado da urina de pacientes com neoplasia da bexiga confirmada histologicamente. Não é reconhecido na maioria dos indivíduos normais e em pessoas com outras patologias do aparelho urinário. A especificidade do teste mostrou-se equivalente à da citologia em indivíduos normais. Além de ser um teste não invasivo que utiliza como material apenas uma pequena amostra isolada de urina, estudos comprovaram que o BTA é significativamente mais sensível do que a citologia, sejam quais forem o estadio ou o grau do tumor. CA 125 O CA 125 é uma glicoproteína de alto peso molecular (>200 kD), de papel fisiológico ainda desconhecido, presente em diferentes condições benignas e malignas, sendo útil especialmente no acompanhamento dos carcinomas do ovário. A concentração sérica do CA 125 é superior a 35 U/mL em aproximadamente 80% das mulheres com carcinoma do ovário, 26% das mulheres com tumores benignos de ovário e em 66% de pacientes em condições não-neoplásicas, inclusive o primeiro trimestre da gravidez, fase folicular do ciclo menstrual, endometrioses, miomas uterinos, salpingites agudas, tuberculose pélvico-peritoneal, cirrose hepática, pancreatites e inflamações do peritoneu, do pericárdio e da pleura. Outros carcinomas não-ováricos podem elevar os níveis de CA 125 como os de endométrio, pâncreas, pulmão, mama e gastrointestinais. Sómente cerca de 3% das mulheres saudáveis têm concentração sérica de CA 125 acima de 35 U/mL, e apenas 0,8%, acima de 65 U/mL. Os níveis séricos correlacionam-se com o tamanho e o estadiamento do tumor. Em pacientes com carcinoma limitado ao ovário (estadio I), apenas 50% se apresentam positivas. Já 90% dos pacientes com carcinoma de ovário disseminado (estadios II, III e IV) apresentam concentrações séricas acima de 35 U/mL. A combinação da avaliação do CA 125 com o exame pélvico e a avaliação por ultrasom transvaginal aumenta a sensibilidade e a especificidade do exame como teste de triagem para o carcinoma do ovário. É útil também no diagnóstico diferencial de massas do ovário palpáveis. Quanto mais altos os níveis de CA 125, maior a probabilidade da sua associação ao carcinoma do foro ginecológico. O CA 125 é usado no acompanhamento dos carcinomas do ovário, na avaliação de lesões residuais, monitorização de recidivas e resposta à terapia. Na avaliação do aparecimento de metástases, tem a capacidade de detectar 75% dos casos. É útil também como marcador prognóstico. Um resultado negativo não exclui a presença da doença. Os valores diminuem em torno de 3 semanas após a conduta terapêutica. Os níveis de CA 125 após a primeira etapa de quimioterapia ajudam a formulação do prognóstico. Pacientes com diminuição acima de 50% nas concentrações de CA 125 têm sobrevida de cerca de 2 anos em 45% dos casos, comparada com a previsão de 22% nos pacientes que apresentam diminuição do CA 125 inferior a 50%. Elevações acima de 60 U/mL, após o primeiro ciclo de quimioterapia, sugerem reincidência do tumor. CA 15-3 O antigénio CA 15-3 é uma glicoproteína presente no epitélio mamário, detectada em análises imunoenzimáticas utilizando-se anticorpos monoclonais específicos. Elevações das concentrações séricas do CA 15-3 podem ser encontradas em creca de 23% dos pacientes com carcinoma primário da mama e em cerca de 40 a 50% dos pacientes com metástases. Apenas 23% dos pacientes com doença precoce apresentam elevação da concentração do CA 15-3, e cerca de 16% dos pacientes com doença benigna da mama apresentam valores alterados. A sua utilização está indicada no acompanhamento da recorrência do carcinoma da mama, monitorização de metástases e também para monitorização da resposta à terapia. Os valores do CA 15-3 correlacionam-se com a extensão e o estágio da lesão. Entretanto, na prática, essa correlação é melhor observada na progressão do que na regressão. São encontrados percentadens de positividade com valores acima de 25 U/mL em 5% dos pacientes no estadio I, 29% no estadio II, 32% no estadio III e 95% no estadio IV. As pacientes que desenvolvem doença metastática têm aumento de CA 15-3, que pode preceder de 2 a 9 meses os sinais clínicos. As probabilidades de progressão são respectivamente 52%, 85% e 96% para 1, 3 e 6 meses após um teste positivo. A probabilidade de não-progressão após um teste negativo é de 91%. O CA 15-3 é mais sensível do que o CEA para monitorização de recidiva, e os dois marcadores devem ser utilizados em conjunto. Um aumento de 25% nos níveis séricos do CA 15-3 indica progressão do carcinoma em 95% dos pacientes. Uma diminuição de 25% dos níveis séricos do CA 15-3 está associada a resposta à terapia. Variações menores do que 25% são, frequentemente, associadas a doença estável. Uma elevação nos níveis de CA 15-3 pode acontecer nas primeiras semanas de tratamento e não deve ser confundida com falha terapêutica. Valores de CA 15-3 elevados correlacionam-se com a presença de metástase óssea, mas valores normais não excluem a possibilidade de sua existência. Utilizando-se como limite (cut-off) 26 U/mL, o CA 15-3 prediz recidivas em menor período de tempo do que os métodos radiológicos e os critérios clínicos. Como a maioria dos marcadores tumorais disponíveis, o CA 15-3 não pode ser utilizado como teste de rastreio na população em geral. Pode estar presente noutras patologias malignas do pâncreas, pulmão, ovário e fígado. Valores alterados podem ser encontrados numa pequena parcela da população hígida (2 a 5%), geralmente em concentrações baixas, bem próximas aos valores superiores de referência. Pacientes com condições benignas como hepatites crónicas, cirrose hepática, sarcoidose, tuberculose e lúpus eritematoso sistêmico podem apresentar concentrações séricas acima de 40 U/mL. CA 19-9 O CA19-9, assim como o CA 242 e o CA 50, são marcadores tumorais de carcinoma colorrectal e pancreático. Estes três marcadores possuem um epítopo em comum, que os caracteriza como marcadores de carcinoma gastro-intestinal. O CA 19-9 (antígeno carboidrato 19-9) é uma glicoproteína do tipo mucina, de alto peso molecular (> 400 kD), que possui uma estrutura siálica originada do antigénio do grupo sanguíneo Lewis. Consequentemente, não se expressa nos indivíduos Le (a-, b-), levando a resultados falso-negativos em pessoas com esse perfil, aproximadamente 6% da população. É sintetizado normalmente pelas células dos ductos do pâncreas e da vesícula biliar humana e pelo epitélio gástrico, do cólon, endometrial e salivar. A concentração sérica do CA 19-9 encontra-se elevada em pacientes com carcinoma de pâncreas (80%), carcinoma hepatocelular (67%), carcinoma gástrico (40 a 50%) colorretal (30%) e alguns pacientes com carcinoma de mama (15%). Condições benignas como pancreatite e icterícia podem levar ao aumento dos níveis séricos (18%). A maioria dos pacientes com pancreatite tem valores séricos abaixo de 75 U/mL (96%). Os níveis séricos podem apresentar-se alterados também em pacientes com doenças como cirrose hepática, doenças intestinais inflamatórias e em condições auto-imunes como artrite reumatóide (33%), lúpus eritematoso sistémico (32%) e esclerodermia (33%). A baixa sensibilidade e especificidade e a falta de opções de tratamento impedem o uso de CA 19-9 como teste de triagem para carcinoma do pâncreas. Os níveis do CA 19-9 são úteis para avaliar a recidiva do tumor e a presença de metástases. A principal indicação para a utilização do CA 19-9 está na preparação para a conduta cirúrgica. Basicamente, todos os pacientes que apresentam valores séricos maiores do que 1.000 U/mL têm um tumor maior que 5 centímetros de diâmetro, e apenas 5% dos pacientes desse grupo apresentam tumores ressecáveis. Porém, 50% dos pacientes pré-tratados com CA 19-9 abaixo de 1.000 U/mL apresentam tumores ressecáveis. Outros estudos têm mostrado que a maioria dos pacientes com concentração maior do que 300 U/mL apresenta tumores irressecáveis. Apesar da sensibilidade diagnóstica do CA 19-9 para tumores do pâncreas ser maior do que a de outros marcadores, o diagnóstico precoce realizado por meio do seu uso tem sido bem limitado. Ou seja, a capacidade diagnóstica em casos iniciais é muito baixa. O CA-19-9 é utilizado na monitorização de carcinomas gastrointestinais, especialmente do pâncreas. É descrito como menos eficiente do que o CEA como marcador de carcinomas colorretais. O doseamento do CA 242 está indicada no acompanhamento de tumores pancreáticos e colorretais. Valores elevados de CA 242 são encontrados em 5 a 33% dos pacientes com doença benigna do cólon, estômago, fígado, pâncreas e vesícula biliar; 68 a 79% de pacientes com carcinoma do pâncreas; 55 a 85% de pacientes com carcinoma colorretal e 44% dos pacientes com carcinoma gástrico. O CA 242 é supostamente menos eficiente do que o CA 19-9 e o CA 50 na detecção do carcinoma pancreático. Níveis elevados de CA 50 são encontrados em até 46% das doenças benignas do pâncreas, em 35 a 38% das patologias benignas do trato biliar e em 22 a 59% das patologias do fígado. Apresenta-se elevado entre 80 a 97% dos pacientes com carcinoma do pâncreas. No carcinoma do cólon, a frequência varia de 19% nos estadios mais iniciais até 73% nos estadios mais avançados. Este marcador encontra-se elevado no carcinoma de esófago (41 a 71%), estômago (41 a 78%), trato biliar (58 a 70%) e hepatocelular (14 a 78%). Cálcio No adulto, cerca de 98% do cálcio está localizado nos ossos, principalmente sob a forma de hidroxiapatita, uma rede composta por cálcio e fósforo. O restante, cerca de 2%, encontra-se no fluído extracelular e noutros tecidos, principalmente no músculo esquelético. O ião cálcio está entre os principais componentes minerais do organismo e desempenha um papel fundamental na mineralização óssea. Tem importância vital em vários processos fisiológicos, como o da coagulação sanguínea, a transmissão dos impulsos nervosos, a manutenção do mecanismo de contracção e relaxamento muscular esquelético e cardíaco, as activações enzimáticas, a regulação das glândulas endócrinas e exócrinas e a manutenção da integridade e da permeabilidade da membrana celular, principalmente em relação ao mecanismo de troca sódio /potássio. É absorvido de forma activa no duodeno e no jejuno superior. Cerca de 10 a 20% do cálcio consumido é absorvido. A absorção é estimulada principalmente pela vitamina D (estimula a absorção intestinal e a mineralização óssea), pelo meio ácido, pela hormona de crescimento e por uma dieta rica em proteínas. A relação cálcio/fósforo também é um factor importante na regulação da absorção. Coeficientes elevados levam à formação de complexos de fosfato de cálcio insolúveis. O pH alcalino, o teor de gordura do bolo alimentar e o cortisol inibem a absorção. A manutenção do equilíbrio dos níveis de cálcio no organismo envolve diferentes órgãos: intestino delgado, rins e esqueleto. Os seus níveis são regulados por diferentes hormonas: pela paratormona (que aumenta a reabsorção tubular e a mobilização do cálcio ósseo), por hormonas derivados do metabolismo da vitamina D3 e pela calcitonina (que actuam sobre a reabsorção óssea e nos túbulos renais). Outras hormonas que afectam o metabolismo do cálcio, mas que não têm a sua secreção alterada pelas alterações das concentracções do ião, são as hormonas tireoidéias, do crescimento, glicocorticóides adrenais e esteróides. Basicamente, os valores do cálcio dependem das taxas de absorção intestinal, reabsorção óssea e perda renal. Concentrações anormais do cálcio ósseo indicam distúrbios na função das glândulas paratiróides, doenças ósseas, neoplasias, síndrome de má absorção ou desnutrição, deficiência de vitamina D, excesso de antiácidos contendo cálcio e doenças renais. Actualmente, grande relevo tem sido dado à complementação de cálcio, especialmente nas mulheres após a menopausa, como meio de retardar ou evitar as manifestações de osteoporose. A excreção do cálcio dá-se principalmente por via urinária, e uma pequena parcela pela transpiração. A determinação do cálcio urinário é útil para o acompanhamento das terapias de reposição, nas investigações de litíase renal e no seguimento de patologias que envolvem o metabolismo do cálcio, como nas doenças ósseas primárias e metastáticas, intoxicação por vitamina D, hipercalciúrias idiopáticas, sarcoidoise e doenças da paratiróide. O cálcio encontra-se no soro ou no plasma de três formas diferentes: 1. A forma fisiologicamente activa de cálcio livre e ionizado, que corresponde a 50% do cálcio total (difusível). 2. Em forma de complexos com outros iões, que correspondem a 5% do cálcio total (difusível). 3. Os 45% restantes, que se apresentam ligados a proteínas plasmáticas, especialmente à albumina (não-difusível). A distribuição dessas formas está directamente ligada ao pH do fluido extracelular e à concentração de proteínas. A acidose aumenta o cálcio ionizado, e a alcalose diminui a sua concentração. Já o aumento de proteínas leva a um aumento do cálcio ligado e também do cálcio total. O cálcio ionizado mantém os seus níveis fisiológicos, ou seja, a sua concentração é constante e independente do cálcio ligado. Portanto, a avaliação do cálcio ionizado é útil nalgumas situações clínicas, como distúrbios ácido-base, nos quais o cálcio ionizado está alterado sem que haja alteração do cálcio total. Esta situação pode ocorrer na hemodiálise, nas septicémias, mielomas, cirrose, transfusões, plasmaférese, distúrbios cardiovasculares, insuficiência renal e no diagnóstico do hiperparatiróidismo. Consultar Cálcio Ionizado. Cálcio Ionizado O cálcio é o quinto elemento mais comum no corpo humano. A distribuição desse elemento no corpo abrange três compartimentos: esqueleto (98%), tecidos moles e sangue (2%). No plasma, o cálcio está presente de três formas distintas: ligado à proteína, livre ou ionizado e formando complexos (principalmente com fosfato, bicarbonato e citrato). Aproximadamente 40% do cálcio plasmático está ligado de forma reversível às proteínas, e qualquer alteração na quantidade de proteína que se liga ao cálcio altera a quantidade de cálcio total. Cerca de 20% do cálcio ligado à proteína está ligado também à globulina. Em pacientes com mieloma múltiplo, a globulina em alta concentração pode ligar-se a uma grande quantidade de cálcio, provocando um aumento da quantidade de cálcio total. A quantidade de cálcio ionizado presente no plasma é de 50% do cálcio total. Apenas 10% do cálcio formam complexo com aniões. Além da concentração de proteína, o balanço ácido-base também pode afetar a fração ionizada. A alcalose causa redução na fracção de cálcio iónico circulante, e a acidose, aumento. Num estado de acidose crónica, por exemplo, os níveis séricos normais de cálcio total podem ocultar um aumento na concentração de cálcio ionizado. Portanto, os níveis séricos normais de cálcio ionizado são importantes na manutenção do metabolismo dependente de cálcio. O nível sérico de cálcio ionizado controla, por exemplo, a secreção de hormonas das paratiróides. Níveis baixos de cálcio ionizado estimulam a secreção de hormonas da paratiróide, e os níveis altos suprimem essa secreção. Finalmente, a determinação de cálcio ionizado é um indicador melhor do estado de cálcio plasmático do que o cálcio total, por ser metabolicamente activo e melhor regulado pelas hormonas reguladoras de cálcio Cálculo Renal A análise físico-química do cálculo renal é de grande importância clínica na orientação preventiva da calculose. São avaliados os aspectos macroscópicos, como tamanho, cor, forma, consistência, além da análise bioquímica, na qual são identificados os elementos presentes. Os elementos frequentemente encontrados são oxalato de cálcio, ácido úrico, fosfato de magnésio e, mais raramente, cistina. TIPO DE CÁLCULO ÁCIDO ÚRICO CISTINA FOSFATO de MAGNÉSIO OXALATO OXALATO OU FOSFAFTO DE CALCIO CONDIÇÃO Hiperglicemia, Hiperparatiroidismo, Hipertiroidismo, Acidose tubular renal, etiologia desconhecida (comum), intoxicação por vitamina D Deficiência tubular renal Infecção por Proteus ssp e outras infecções das vias urinárias Anestesia com metaxiflurano, deficiência de vitamina B6 Gota, distúrbios linfoprolifarativos Capacidade Total de Fixação de Ferro A capacidade total de fixação do ferro sérico ou TIBC (Total Iron-Binding Capacity) representa uma estimativa aproximada de todas as proteínas transportadoras de ferro, em especial da transferrina. O teste consiste na adição de ferro em excesso ao soro, tentando a saturação das proteínas. A seguir, todo ferro excedente, nãoligado às proteínas é retirado, e logo após o ferro sérico é avaliado. Como a transferrina não é a única proteína fixadora de ferro, a avaliação da capacidade de fixação do ferro não representa exactamente a capacidade de fixação da transferrina. Entretanto, por ser a transferrina a maior proteína transportadora do ferro, a avaliação da capacidade total de fixação do ferro no soro representa de forma significativa a sua capacidade de ligação ao ferro. A anemia por deficiência de ferro é caracterizada por queda na concentração de ferro, aumento do TIBC e diminuição da saturação de transferrina. O TIBC do soro está aumentado na deficiência de ferro e diminuído na anemia por doenças crónicas. A redução da capacidade de fixação está associada à diminuição dos níveis séricos da transferrina. O inverso também acontece: níveis elevados de transferrina são seguidos pela elevação da capacidade de fixação do ferro. Na hepatite, ocorre um aumento da libertação da transferrina pela necrose do hepatócito, levando a um aumento da capacidade de combinação do ferro. CAPACIDADE TOTAL DE FIXAÇÃO DO FERRO AUMENTADA DIMINUÍDA Anemia ferropriva Síntese protéica diminuída Período da Infância Desnutrição grave Gravidez Neoplasias Hepatites e Insuficiência hepática Hemocromatose Anticontrceptivos orais Nefropatias Carbamazepina É um fármaco antiepiléptico importante, utilizado no tratamento de crises convulsivas simples e complexas, parciais e generalizadas no adulto, e também no tratamento da nevralgia do trigémio, nevralgia glossofaringea e outras nevralgias como as neuropatias diabéticas. A carbamazepina é um composto tricíclico relacionado quimicamente com a imipramina (antidepressivo tricíclico). A acção antiepiléptica é diminuir o fluxo de sódio e de cálcio nos neurónios hiperexcitáveis. Uma redução da transmissão sináptica excitatória explicaria a sua acção sobre as nevralgias. A doseamento é importante para avaliar a eficácia do tratamento e impedir os efeitos tóxicos por meio da manutenção dos níveis séricos do range terapêutico. A concentração sérica terapêutica usual é de 4 a 12 mg/mL. Normalmente, alcançase um estado de estabilidade em 3 a 4 dias. Após a administração oral, a absorção é lenta e apresenta grandes variações individuais, atingindo o pico sérico em horas. A metabolização faz-se por via hepática, apresentando uma farmacocinética própria, com a capacidade de induzir as enzimas hepáticas responsáveis pela sua clearance (auto-indução). A clearance da carbamazepina aumenta com o tempo, e as enzimas estão completamente induzidas em cerca de 4 a 6 semanas, ocorrendo então o aumento da clearance e a consequente diminuição da semi-vida do fármaco, que cai de 25 a 40 horas para 15 a 25 horas, depois da auto-indução. Como o metabolismo é hepático, qualquer alteração da função hepática leva ao aumento da concentração sérica do fármaco. Cerca de 85% da carbamazepina está ligada às proteínas. A carbamazepina apresenta um metabolito activo que é potencialmente tóxico - a carbamazepina 10,11 epóxido, que deve ser avaliado nos pacientes com sinais de intoxicação que apresentem níveis séricos normais da carbamazepina. Há a possibilidade de ocorrência de efeitos colaterais, como nistagmo, cefaléia, ataxia, visão dupla e, menos frequentemente, rash (erupção) cutâneo. Podem também ocorrer reacções hematológicas, sendo a mais comum a leucopenia. Em casos raros, regista-se a ocorrência de formas graves, como anemia aplástica, trombocitopenia e agranulocitose. Também podem surgir reacções de hipersensibilidade, incluindo síndrome de Steven Johnson, hiponatremia, especialmente em idosos, osteomalácia e efeitos sobre a condução cardíaca. O uso em mulheres no primeiro mês de gestação aumenta o risco de defeitos na formação do tubo neural. A carbamazepina aumenta o metabolismo do ácido valpróico, clonazepam, teofilina e warfarina. A sua concentração pode ser aumentada pelo uso concomitante de cimetidina, isoniazida, eritromicina, lítio, fluoxetina e ácido valpróico. Possui ainda um efeito antidiurético, reduzindo as concentrações da hormona antidiurética. Podem ser encontrados frequentemente níveis baixos, por falta de adesão ao tratamento. O uso de outras drogas anticonvulsivantes (politerapia) como fenobarbital, fenitoína e primidona pode diminuir a concentração sérica da carbamazepina sem levar a crises convulsivas. Normalmente, a colheita deve ser realizada em pacientes que estejam a fazer o medicamento há pelo menos 2 dias, e sempre cerca de 1 hora antes da próxima dose. Entretanto, nos casos de suspeita de intoxicação, pode ser realizada em qualquer momento. Para facilitar a interpretação, é importante conhecer o horário da última dose ingerida. Ceruloplasmina A ceruloplasmina é uma glicoproteína produzida pelo fígado, responsável pelo transporte de 80 a 95% do cobre plasmático. É uma proteína de resposta de fase aguda, migrando na região alfa-2-globulina na electroforese das proteínas. Normalmente não é visível, mas apenas nas situações que levam a grandes elevações séricas. A sua principal utilização clínica é no diagnóstico diferencial entre várias doenças hepáticas e na doença de Wilson, que é classicamente acompanhada pela diminuição dos níveis séricos da ceruloplasmina. É uma doença autossómica recessiva, em que ocorre diminuição da capacidade de ligação do cobre à ceruloplasmina, resultando no aumento dos níveis de cobre livre no plasma e nos tecidos, especialmente fígado e cérebro. Outras patologias que levam a lesão hepática grave, desnutrição, síndrome nefrótica e enteropatias com perda de proteínas podem cursar com níveis diminuídos de ceruloplasmina. Níveis excessivos de zinco na dieta podem levar a um bloqueio da absorção intestinal de cobre, levando inicialmente a uma diminuição dos níveis de ceruloplasmina. O período necessário à eliminação do zinco supera o bloqueio à absorção do cobre, seguindo-se a um aumento do cobre sérico e da ceruloplasmina. Apresenta-se elevada em diferentes distúrbios que levam à reacção da fase aguda, como: carcinomas, leucemias, doença de Hodgkin, traumas, obstrução biliar, gravidez, intoxicação por cobre, uso de contraceptivos orais, fenitoína e terapia com estrogénios. Chlamydia O género Chlamydia compreende bactérias Gram-negativas desprovidas de motilidade, que se classificam nas espécies trachomatis, pneumoniae e psitacci. Incapazes de sintetizar o seu próprio DNA, são parasitas intracelulares obrigatórios de células eucarióticas, completando o seu ciclo de multiplicação em 48 a 72 horas. As espécies trachomatis e pneumoniae são reconhecidas como patogénios humanos, e a psitacci é reconhecida primariamente como patogénio animal. A psitacci infecta aves, bovinos e ovinos e pode desencadear em humanos uma doença respiratória por exposição ao material infeccioso (geralmente fezes de aves infectadas). A Chlamydia trachomatis possui 20 sorotipos diferentes já identificados. Os sorotipos L1,L2e L3 são responsáveis pelo síndrome linfogranulomatoso venéreo; os A, B, Ba e C são frequentemente associados ao tracoma, e os de D a K estão ligados a outras manifestações sexualmente transmitidas, sendo que os sorotipos D, E e F são os mais frequentes. A infecção por C. trachomatis pode perdurar por muitos anos de forma assintomática nos indivíduos infectados não-tratados. As infecções causadas por Chlamydia trachomatis incluem: o Linfogranuloma venéreo - doença sistémica, sexualmente transmissível, causada por determinados serotipos da espécie; - o Tracoma - traduz-se por uma conjuntivite crónica que pode levar à cegueira. O contágio ocorre por transmissão directa, pessoa a pessoa; - as Infecções do trato genital - incluem cervicite, doenças inflamatórias pélvicas, uretrites, epididimite e proctite. Nos homens, cerca de 50% dos casos de uretrite não-gonocócica são causadas por Chlamydia trachomatis. Nas mulheres, 30% dos casos manifestam-se sob a forma de cervicite; porém, as infecções assintomáticas ocorrem em mais da metade dos casos e, em consequência, muitas não são detectadas; as Infecções neonatais - 60% das crianças nascidas de mães infectadas poderão contaminar-se no momento do parto, e 18 a 50% podem desenvolver a doença, nos primeiros dias de vida, uma conjuntivite; posteriormente, num período médio de 3 meses, em 3 a 15% poderá ocorrer uma pneumonia associada ou não à conjuntivite, com alteração do estado geral da criança. Cerca de 30% das pneumopatias em recém-nascidos são causadas por Chlamydia trachomatis. Nos homens, a C. Trachomatis é responsável por cerca de 50% dos casos de uretrite não-gonocócica e ainda por maior percentagem de uretrites pósgonocócicas. É a principal causa de epididimite em homens sexualmente activos acima dos 35 anos de idade. Nos casos assintomáticos, pode ser diagnosticada ao encontrar-se piúria ou queixa de disúria sem causa aparente. A infecção uretral é comum nas mulheres. Casos de piúrias sintomáticas ou assintomáticas sem causa aparente ou de cistites com cultura negativa são altamente sugestivos de uretrite por Chlamydia trachomatis. O endométrio é o órgão mais frequentemente infectado, e a maioria dos casos é assintomática. Além de causar uretrites, cervicites, endometrites e doença inflamatória pélvica nas mulheres, a infecção pode evoluir com complicações. As mais frequentes são a infertilidade (fibrose das trompas de Falópio), a gestação ectópica e, menos frequentemente, o chamado síndrome de Fitz-Hugh-Curtis (peri-hepatite). Estudos realizados entre estas pacientes com quadros de infertilidade por lesões tubáricas e gravidez ectópica demonstraram positividade três vezes maior para os anticorpos contra a C. trachomatis do que na população normal. As infecções do trato genital por Chlamydia trachomatis são consideradas as principais causas das doenças sexualmente transmissíveis na Europa e nos Estados Unidos, onde cerca de 3 a 4 milhões de casos são relatados por ano. Os índices de transmissão do agente patogénico, são superiores aos da gonorréia e da sífilis, e a sua ampla distribuição geográfica são preocupantes, justificando o uso de métodos diagnósticos sensíveis e rápidos para a sua identificação. Vários métodos estão disponíveis para a detecção de Chlamydia trachomatis em amostras de material biológico: coloração histológica, cultura de células, imunofluorescência e métodos imunoenzimáticos. Todos apresentam, porém, restrições de sensibilidade ou especificidade, ou exigem um tempo prolongado para a conclusão do diagnóstico. Até alguns anos, por apresentar alta especificidade, a cultura de células Maconkey era considerada o teste padrão para o diagnóstico da infecção por Chlamydia trachomatis. Apesar de sua alta especificidade, a cultura apresenta algumas restrições, como o longo tempo para obtenção do resultado e o facto de detectar apenas bactérias vivas. Portanto, o resultado pode ser prejudicado por situações inadequadas de colheita, armazenamento e/ou transporte, o que diminui a sua sensibilidade em cerca de 70 a 80%. Outra técnica utilizada para a detecção de Chlamydia trachomatis era a imunofluorescência directa por anticorpos monoclonais específicos. Estsa técnica apresenta uma sensibilidade maior do que a cultura, tendo entretanto a desvantagem de apresentar reacções cruzadas, o que diminui a sua especificidade. Os métodos imunoenzimáticos ou de imunofluorescência indirecta para a pesquisa de anticorpos séricos, respectivamente, das classes IgG e IgM são menos sensíveis e menos específicos do que os métodos citados acima, além do facto de não permitirem a identificação das diferentes espécies do género Chlamydia nem serem capazes de detectar anticorpos anti-Chlamydia pneumoniae. A reacção em cadeia da polimerase (PCR) é um método de especificidade e sensibilidade altas, que utiliza a amplificação do ácido nucléico da Chlamydia (DNAalvo), permitindo a sua detecção mesmo em concentrações ínfimas, da ordem de 1 a 10 microrganismos por mililitro de material biológico. Técnicas de PCR e de captura híbrida são os métodos de escolha para o diagnóstico da infecção por C. trachomatis. Podem ser realizadas em amostras endocervicais e uretrais colhidas com swabs, acondicionadas em tubos apropriados e também em amostras de urina (primeiro jacto). Devemos porém ressaltar que a metodologia de reacção em cadeia da polimerase pode se apresentar inconclusiva, especialmente na pesquisa em materiais endocervicais e uretrais. Isso ocorre em cerca de 5% dos casos analisados por PCR, pela presença de factores inibidores que interferem na reacção, inibindo a actividade enzimática. Ainda não se tem a certeza da origem desses inibidores. Acredita-se que se devam à presença de contaminantes bacterianos ou fúngicos. Citomegalovírus O citomegalovírus (CMV) é membro do grupo dos beta-herpesvírus. Hoje, é reconhecido como um patogénio que afecta todas as faixas etárias, tendo caráter endémico em todo o mundo e levando a graves lesões congénitas. A infecção pelo CMV causa um grande espectro de manifestações clínicas, variando de evoluções assintomáticas e infecções sublínicas a quadros de maior gravidade, dependendo da condição imunológica do paciente. Quando sintomática em pacientes imunocompetentes, geralmente evolui com um quadro semelhante ao de mononucleose, com febre, linfadenopatia, alterações hematológicas (leucopenia e trombocitopenia) e, muitas vezes, com sinais e sintomas hepáticos, pulmonares, gastrointestinais ou neurológicos. A transmissão pode dar-se por via transplacentária, respiratória, oral, venérea, por intermédio do aleitamento, de transplante de órgãos ou transfusão sanguínea. O antigénio pode ser detectado a partir da 4ª semana que se segue à infecção (período de incubação). Na fase aguda, o vírus pode ser identificado em diferentes secreções corporais. Os anticorpos da classe IgM aparecem logo no início da fase aguda, e os da classe IgG, uma semana mais tarde. Assim como no herpes simples e nos demais vírus do grupo herpes, a infecção pode permanecer latente por toda a vida ou evoluir com episódios de reactivação. Depois da primoinfecção, o vírus mantém-se de forma latente, com a virémia persistente porém em níveis baixos. Os anticorpos desenvolvidos mantêm-se positivos por toda a vida (IgG). Em situações que levem à diminuição da condição imunológica, pode ocorrer a replicação viral com reactivação do quadro. A infecção pelo CMV apresenta maior significado clínico nas mulheres grávidas, em recém-nascidos (infecção congénita), nos imunossuprimidos, como os casos de pacientes transplantados, portadores de neoplasias, pós-operatório de cirurgia cardíaca, em curso de grandes agressões infecciosas e nos indivíduos com SIDA. Normalmente, em indivíduos saudáveis, há dificuldade de correlacionar a infecção por CMV ao episódio clínico da doença, pois a presença de anticorpos (IgG) específicos para CMV tem uma prevalência muito alta (>60% da população de adulto), e como já citado, as manifestações clínicas da infecção são muito variadas. Embora o isolamento do vírus seja ainda considerado o melhor, outras técnicas estão a ser desenvolvidas para a avaliação da virémia, que por ser intermitente, exige exame de amostras consecutivas para permitir um diagnóstico mais seguro. A colheita deve ser comparada entre amostra da fase aguda e da fase de convalescença. Isto quer dizer que devem ser colhidas com 10 a 14 dias de intervalo. A presença de anticorpos heterófilos e de factor reumatóide pode levar a resultados falso-positivos dos anticorpos IgM. Nos casos neonatais, a transferência transplacentária pode também induzir a falsa positividade. As pesquisas geralmente baseiam-se na presença de CMV (particularmente das inclusões virais). Aumentos significativos dos anticorpos IgG CMV específicos por IFI ou EIA sugerem, mas não comprovam, infecção aguda ou reactivação de uma infecção por CMV. Anticorpos de baixa avidez fazem a distinção entre a resposta imune primária e a reactivação da infecção por CMV (caracterizada por alta avidez de IgG). O teste de avidez de anticorpos é um procedimento laboratorial que permite estimar o período aproximado em que ocorreu a infecção.Percentagens de avidez inferiores a 30% sugerem que a infecção ocorreu há menos de 2 meses. Percentagens superiores a 40% sugerem que a infecção ocorreu há mais de 3 meses e que os anticorpos IgM, caso presentes, são residuais e desprovidos de significado clínico.O achado de percentagens entre 30% e 40% é considerado indeterminado, já que não permite a definição do período provável da infecção. Quando a avaliação está a ser realizada em grávidas, o tempo de gestação deve ser considerado. Anticorpos IgM específicos para CMV podem ser detectados em adultos por Enzima imunoensaio (EIA), em ambas as infecções de CMV nas infecções primárias, em cerca de 93 a 100% dos casos, e nas infecções reactivadas, em aproximadamente 40% dos casos. Porém, a resposta de IgM pode estar reduzida ou ausente em pacientes imunocomprometidos com infecção activa. A maioria dos pacientes com SIDA (95%) já é seropositiva para CMV antes da infecção pelo HIV ser diagnosticada. Manifestações do sistema nervoso central e periférico causadas pela infecção por CMV são muito raras. Entretanto, nos casos de SIDA, comumente são diagnosticadas encefalites por CMV. Os índices dos anticorpos CMV podem ser usados para diferenciar síntese intratectal da infiltração da barreira hematoencefálica pelo CMV. Os métodos mais rápidos, sensíveis e específicos para diagnóstico de CMV são os de biologia molecular, a reacção em cadeia da polimerase (PCR) e a captura híbrida, especialmente em recém-nascidos infectados congenitamente, em amostras de medula óssea, análise de órgão sólidos para transplante, pacientes imunocomprometidos, indivíduos imunocompetentes com infecção activa e dadores de sangue. A evolução da PCR quantitativa para CMV tem monstrado que CMV DNA em líquor é mais elevado em pacientes com CMV relacionado à polirradiculopatia do que nos que sofrem de encefalites, e que a quantificação do CMV pode ser útil na monitorização da terapia antiviral. Sendo assim, os métodos moleculares para a detecção do vírus são importantes aliados para identificar os pacientes com alto risco de desenvolvimento da doença. Neste sentido, a qualificação da carga viral para o CMV pela técnica de reações em cadeia de polimerase ou pela captura híbrida permite a definição da virémia e a monitorização da terapêutica. - Microscopia eletrónica do Citomegalovírus CK Total A creatinoquinase (CK), também chamada de creatina-fosfoquinase (CPK), é uma enzima com vasta distribuição tissular, que desempenha importante papel regulador no metabolismo intracelular dos tecidos contrácteis. Está presente principalmente no músculo estriado, no tecido cardíaco e no cérebro. Na electroforese, podem ser identificadas três isoenzimas, pela sua origem, e também de forma numérica, de acordo com a migração na eletroforese. A CK-BB CK-1 - é a forma encontrada no cérebro; a CK-MB - CK-2 - é encontrada no miocárdio e a CK-MM - CK-3 - é encontrada no músculo estriado. A CK-MM está habitualmente presente no soro. AUMENTO MÚSCULO ESQUELÉTICO MIOCÁRIO CÉREBRO ESTÔMAGO, ÍLIO E CÓLON CK - BB% CK - MB% CK - MM% 0 1 97-98 96 1 22 2a3 0 99 77 0 4 Também podem ser encontradas outras formas, ditas isoenzimas variantes. Não estão habitualmente presentes em indivíduos hígidos e não possuem tecido de origem determinada. As duas maiores variantes conhecidas são denominadas macro-CK, tipos 1 e 2. A macro-CK do tipo 1 é formada pela CK-BB, ou raramente pela CK-MB, que se liga a uma imunoglobulina G ou A (raramente) dando origem a macrocomplexos que correm electroforeticamente entre CK1 e CK2. É comum a sua presença em idosos, especialmente em mulheres. A do tipo 2 parece ser um complexo da CK mitocondrial, presente em pacientes que apresentam um quadro de metástases tumorais ou outras enfermidades de alta gravidade. Apesar de não serem doseadas, pois não existem ainda evidências de sua importância clínica, a sua presença poderá, em alguns casos, afectar a análise da CK-MB, interferindo no resultado final. A sua maior utilização está no diagnóstico das lesões e doenças do músculo esquelético e no enfarte agudo do miocárdio. Encontra-se marcadamente elevada na distrofia muscular de Duchenne, com elevações que variam de 20 a 200 vezes o limite superior da normalidade, exercício físico intenso, polimiosite, dermatomiosites, miosites, miocardites, traumas musculares, injeções intramusculares recentes e após crises convulsivas. Valores muito elevados são encontrados também nas rabdomiólises, inclusive nas que têm como causa a intoxicação por uso de cocaína. Também pode encontrar-se elevada noutras situações, como acidente vascular cerebral, embolia, enfarte e edema pulmonar, após cardioversão com múltiplos choques, tosse grave, trabalho de parto, quadros de mixedema - hipotiroidismo, nas neoplasias da mama, próstata e trato gastrointestinal, e noutras neoplasias em estado avançado, no período pós-operatório imediato e na ingestão de grandes quantidades de bebidas alcóolicas. Os seus níveis séricos podem estar diminuídos em situações nas quais ocorra perda de massa muscular, nas hepatopatias alcoólicas, na gravidez ectópica, nas doenças do tecido conjuntivo, na artrite reumatóide, em pacientes idosos e acamados e na terapia com esteróides. O repouso nocturno diminui os níveis séricos de CK em 10 a 20%. No enfarte agudo do miocárdio (EAM), a CK total aumenta nas primeiras 4 a 6 horas após o início do quadro, apresentando um pico entre 18 a 24 horas e permanecendo alterada por 48 a 72 horas após o episódio. A CK total pode estar normal no período precoce pós-enfarte, quando a CK-MB já começa a elevar-se. Os valores da CK podem aumentar entre 3 a 20 vezes os valores normais, dependendo da localização e da extensão da área afectada. Os valores de referência para a CK total é bastante ampla, variando com a idade, estatura, actividade física e volume de massa muscular. No momento da interpretação do resultado, isto deve ser levado em conta, pois alguns pacientes podem ter, habitualmente, valores muito baixos, fazendo com que, nalguns casos, mesmo estando dentro dos limites superiores de referência, já represente uma elevação da CK total, na fase inicial do EAM. CK-MB Uma das isoenzimas da CK total, a CK-MB é considerada a análise de referência para comparação com outros marcadores de lesão miocárdica. Para o seu doseamento, utiliza-se um método no qual um anticorpo específico inibe a isoenzima MM e a fração restante corresponde basicamente à MB. O seu doseamento deve ser sempre acompanhado do doseamento de CK total. Para avaliar melhor os resultados obtidos, pode-se avaliar o índice obtido pela divisão de CK-MB/CK total x 100, que indica a percentagem de aumento da CK-MB em relação à CK total. Normalmente, a CK-MB representa 5 a 6% da CK total. Percentagens acima desses valores são indicativos de origem miocárdica e associados a doença. Índices superiores a 25% são raros, exigindo que se avaliem as interferências no método, tais como a presença de CK 1 e 2. É muito importante realizar a colheita de uma amostra de sangue logo no início dos sintomas, quando os valores ainda estarão normais. Dessa maneira, servirão como valores basais para estabelecer o ponto de partida da curva de acompanhamento. The National Heart, Lung and Blood Institute recomenda a realização do doseamento da CK total e da CK-MB em períodos de 6 a 8 horas, durante as primeiras 24 horas após o episódio. Para estabelecer uma curva adequada de acompanhamento, outros autores recomendam a colheita das amostras numa sequência de 0-3-6-12 horas, seguida de doseamentos seriados cada período de 6 a 8 horas. A evolução clássica da CK-MB durante a curva de dosagens seriadas é fundamental para o diagnóstico de enfarte do miocárdio. O aumento inicial ocorre entre 3 a 8 horas após o início dos sintomas, atingindo o seu pico entre 12 a 24 horas e declinando até a normalidade em 48 a 72 horas. Entretanto, o diagnóstico de doença miocárdica deve-se pautar por um conjunto de achados clínicos, alterações no electrocardiograma e dos marcadores bioquímicos cardíacos como CK, CK-MB, troponina, mioglobina, entre outros. Cerca de 10 a 15% dos pacientes - geralmente indivíduos com diminuição da massa muscular - evoluem com a CK-MB elevada mas com a CK total normal. Os valores encontrados no doseamento da CK-MB correlacionam-se com o tamanho da área enfartada. Entretanto, apesar de altamente sensível, o doseamento é incapaz de detectar pequenas áreas de necrose. Esta é a importância da realização de curvas evolutivas de mais de um marcador bioquímico para auxiliar o diagnóstico e o acompanhamento de possíveis complicações como o reenfarte. Algumas outras lesões da musculatura cardíaca que não o enfarte do miocárdio levam ao aumento dos níveis séricos da CK-MB, como as miocardites, cardiomiopatias, cirurgia cardíaca de revascularização, troca de válvulas e intervenções de defeitos congénitos. Outras condições que podem levar ao aumento da CK MB incluem dermatomiosite, distrofia muscular de Duchenne e a rabdomiólise. Nestes casos, os valores costumam elevar-se menos e não se comportam em curva crescente como no enfarte do miocárdio. Clearance da Creatinina A função renal normal depende da integridade de quatro aspectos da fisiologia renal: o fluxo sanguíneo, a filtração glomerular, a função tubular e a permeabilidade das vias urinárias. O rim tem como função básica a conservação de fluídos, ou, por outras palavras, a concentração da urina. Além dessa função básica, possui três importantes papéis, que são a depuração de substâncias tóxicas, a manutenção do equilíbrio hidroeletrolítico interno e a produção de hormonas. A função geral do rim pode ser avaliada pela clearance (depuração) renal de uma determinada substância. Por definição teórica, a clearance é o volume de plasma a partir do qual uma determinada substância pode ser totalmente depurada (eliminada) na urina numa determinada unidade de tempo. Esse processo depende da concentração sérica, da taxa de filtração glomerular e do fluxo plasmático renal. É calculado a partir dos valores sérico e urinário da substância e do volume urinário em 24 horas, sendo corrigido em relação à superfície corporal. A clearance de moléculas pequenas não-ligadas à proteína que são filtradas livremente pelos glomérulos, e não são secretadas ou reabsorvidas pelo sistema tubular, como a inulina, fornece uma avaliação fiel da taxa de filtração glomerular. Na prática, a clearance de creatinina é a escolhida para a avaliação da função renal. A sua excreção não é influenciada pela dieta e é filtrada livremente pelos glomérulos. Entretanto, além da secreção glomerular, há também uma secreção tubular activa que é contrabalançada por um mecanismo de reabsorção tubular. Assim, é possível utilizar a clearance de creatinina para avaliar adequadamente a taxa de filtração glomerular, sendo um índice precoce da avaliação da função renal superior à avaliação sérica isolada dos níveis de uréia e de creatinina. Além de avaliar a função renal, são úteis também para o acompanhamento da evolução da lesão renal e da resposta a terapêuticas. A taxa de filtração glomerular é maior nos homens do que nas mulheres, já que os homens possuem uma massa renal maior. Durante a gravidez, a taxa de filtração aumenta em torno de 50%, retornando ao normal após o parto. Encontra-se diminuída nos recém-nascidos e nas crianças até 5 meses de idade, por uma imaturidade anatomofisiológica dos glomérulos. Os níveis da taxa de filtração glomerular começam a diminuir progressivamente a partir da meia-idade, em consequência da arterionefroesclerose, que leva à diminuição progressiva do número de glomérulos. A clearance estará diminuído quando aproximadamente 50% dos nefronios estiverem lesados, indicando comprometimento da filtração glomerular. A colheita de sangue deve ser realizada em jejum ao final da colheita da urina de 24 horas para a correlação dos níveis séricos e urinários. Clearance = Creatinina na urina (mg/dL) x Vol. (mL/min) / Creatinina no soro (mg/dL) Clearance Corrigida = Clearance x Factor (corrigida pela superfície corporal, calculada em função do peso e da altura). Cloro O cloro é o anião de maior concentração no meio extracelular e desempenha o principal papel na manutenção da neutralidade electroquímica do líquido extracelular, incluindo o plasma. A maior parte do cloro ingerido é absorvido, e o excesso é eliminado pelos rins. Existe uma discreta diminuição dos níveis séricos no período pós-prandial, por aumento da formação de ácido (HCl) pelas células parietais gástricas. Na maioria das vezes, a sua concentração é afectada pelas mesmas condições que afetam a concentração do sódio. O cloro sérico encontra-se aumentado na desidratação, nas perdas excessivas de bicarbonato por perdas gastrointestinais baixas, na acidose tubular renal, na insuficiência renal aguda, na alcalose respiratória, na excessiva reposição do íão por hidratação venosa ou alimentação parenteral, nas situações de hiperfunção adrenocortical, nalguns casos de hiperparatiroidismo primário e na intoxicação por salicilatos. O cloro sérico apresenta-se diminuído na hidratação acentuada, nas perdas excessivas de cloro por via gastrointestinal, na cetoacidose diabética, na acidose metabólica, nas nefropatias comperdas de sódio, no desvio do meio extracelular para o intracelular, como o que ocorre na acidose respiratória compensada e na alcalose metabólica. A hipocloremia é observada também na síndrome de Batten (defeito de reabsorção); na crise de addison e na secreção inapropriada da ADH hormona antidiurética. A determinação da concentração do cloro no suor é indicada na investigação da fibrose cística, onde se encontra aumentada. A excreção urinária está diminuída nas situações de grandes perdas gastrointestinais, diminuição da ingestão de sal na dieta, período de retenção prémenstrual, sudorese excessiva, hiperfunção adrenocortical, retenções hídricas, nos diferentes tipos de edema e na diabetes insipidus. A excreção urinária está aumentada nas situações de uso de diuréticos, aumento da ingestão de sal na dieta, diurese pós-menstrual, diurese maciça de qualquer etiologia, doença túbulo-intersticial, depleção de potássio e insuficiência adrenocortical. Colesterol Total É um esterol encontrado em todos os tecidos animais. Desempenha importantes funções fisiológicas, incluindo a síntese de ácidos biliares, vitamina D, hormonas esteróides e constituintes da dupla camada das membranas celulares. O colesterol está presente na parede intestinal, proveniente de três fontes: dieta, secreção biliar e intestinal e células. Alimentos de origem animal, em especial carne, gema de ovos, frutos do mar e lacticínios, aumentam a quantidade de colesterol na dieta. Praticamente todo o colesterol presente no intestino encontrase na forma livre, não-esterificado. Todo o colesterol esterificado proveniente da dieta é rapidamente hidrolisado pelas esterases secretadas pelo pâncreas no intestino delgado. Cerca de 30 a 60% do colesterol da dieta e do intestino são absorvidos. O colesterol total apresenta-se aumentado na hipercolesterolemia primária e secundariamente no síndrome nefrótico, no hipotiroidismo, na diabetes mellitus, na cirrose biliar primária e na hipoalbuminemia. Níveis baixos podem ser encontrados na desnutrição e no hipertiroidismo. A doença arterial coronária relaciona-se, em proporção direta e duplicada, com níveis de colesterol séricos. Diferentes estudos corroboram a hipótese de que cada 1% de redução dos níveis de colesterol está associado à queda de 2% de risco de doença arterial coronária. O doseamento isolado de colesterol necessita de jejum, visto que os valores de referência foram obtidos com jejum de 12 horas. Em pacientes que apresentem valores alterados em relação aos desejáveis para a idade, recomenda-se a validação com a repetição do doseamento dentro de um intervalo mínimo de 7 dias e máximo de 2 meses. Têm sido observadas variações sazonais do colesterol. Por exemplo, níveis séricos são mais elevados no outono e no inverno e mais baixos no verão e na primavera. Alguns factores podem interferir, como a postura antes e durante a colheita, stres e ciclo menstrual. Consultar Perfil Lipídico. Colinesterase É uma enzima cujo papel fundamental é a regulação dos impulsos nervosos através da degradação da acetilcolina na junção neuromuscular e na sinapse nervosa. Existem duas categorias de colinesterases: a acetilcolinesterase (colinesterase verdadeira), que é encontrada nos eritrócitos, no pulmão e no tecido nervoso; e a colinesterase sérica, sintetizada no fígado, também chamada de pseudocolinesterase. A sua determinação é útil na avaliação e no acompanhamento de pacientes com intoxicação por organofosforados (inseticidas) que inibem a colinesterase eritrocitária e diminuem os níveis da colinesterase sérica. A colinesterase sérica está diminuída nas doenças parenquimatosas hepáticas (hepatites virícas, cirrose), na insuficiência cardíaca congestiva, nos abscessos e neoplasias. Os níveis baixos persistentes nos cirróticos têm sido apontados como marcador de mau prognóstico. Valores diminuídos também são encontrados em estados de desnutrição, infecções agudas, anemias, enfarte do miocárdio e dermatomiosite. Diversas drogas como estrogénios, testosterona e contraceptivos orais também podem interferir nos níveis da colinesterase sérica. A colinesterase pode estar aumentada em pacientes obesos, em diabéticos e no síndrome nefrótico. Contagem de Addis A contagem de Addis é realizada em amostras de urina de 12 ou 24 horas e permite caracterizar valores mais precisos dos elementos anormais presentes na urina, como aumento de eritrócitos e leucócitos e aumento das taxas de excreção de cilindros, que podem surgir em quantidades pequenas demais para serem detectadas numa amostra de urina aleatória de um exame de rotina. A contagem é realizada no sedimento por meio de leitura microscópica em câmara de Neubauer. É útil quando há suspeita de glomerulonefrite subclínica. São encontrados valores elevados principalmente nos quadros de hematúria e nas glomerulonefrites, em que apresentam um papel prognóstico. Coombs Directa O teste de Coombs directa é um exame que permite a identificação da presença de anticorpos fixados sobre as hemácias. Técnicamente, baseia-se no facto de que os anticorpos que recobrem as hemácias podem ser identificados pela adição de anticorpos antigamaglobulina humana. Quando positivo, ou seja, quando indica a presença de anticorpos aderidos às hemácias, formam-se pontes entre elas, levando ao fenómeno visível de aglutinação. O teste de Coombs contribui directamente para o diagnóstico da anemia autoimune, pois a sua positividade confirma que o anticorpo foi fixado in vivo à hemácia do paciente, auxiliando dessa forma o diagnóstico diferencial com outras anemias hemolíticas, como as causadas por alterações da hemoglobina ou da estrutura da hemácia. É importante também no diagnóstico das anemias hemolíticas do recémnascido e das anemias induzidas por drogas. Embora o teste de Coombs seja extremamente sensível, um resultado negativo não exclui a presença de anticorpos ligados às hemácias. Coombs Indirecta O teste de Coombs indirecta permite a identificação de anticorpos antieritrocitários no soro. É importante para a avaliação de grávidas Rh (-) (avaliação de sensibilização), em pacientes com Rh (-) para avaliação da variante Du e nas fases pré-transfusionais, especialmente em pacientes já transfundidos, em que pode ter ocorrido sensibilização para Rh e outros sistemas. O teste indirecto identifica in vitro diferentes anticorpos, de acordo com a fase do teste que apresentou positividade. O teste é realizado em quatro diferentes etapas, conhecidas como: fase fria (à temperatura ambiente) - geralmente anticorpos da classe IgM; fase em meio protéico - identifica os anticorpos IgM e também anticorpos incompletos (da classe IgG); fase quente (à temperatura de 37°C) detecta anticorpos que só reagem a essa temperatura (geralmente IgG); e a última etapa, que identifica aglutininas da classe IgG e anticorpos que fixam o complemento. A ocorrência de aglutinação e/ou de hemólise durante quaisquer das etapas indica a possibilidade da presença de anticorpos irregulares. Creatinina A creatinina não é formada pelo metabolismo corporal, sendo apenas um resultado do metabolismo da creatina e, portanto, relacionada com a massa muscular. A conversão da creatina em creatinina é praticamente constante, sendo que cerca de 2% da creatina total é convertida em creatinina em cada 24 horas. A concentração sérica em indivíduos normais é praticamente constante, apresentando uma variação em relação ao sexo e ao volume de massa muscular, sendo portanto maior nos homens e nos atletas do que nas mulheres, nas crianças e nos idosos. Normalmente, a sua excreção não é afectada pela dieta e pela velocidade do fluxo urinário. Os níveis séricos aumentam à medida que ocorre a diminuição da taxa de filtração glomerular. Por isso, é utilizada como marcador da função renal. Os aumentos tornam-se significativos quando existe uma perda de mais de 50% dos nefrónios funcionantes, com diminuição expressiva da filtração glomerular. Níveis séricos diminuídos podem ser encontrados em crianças e em condições em que ocorra uma redução significativa da massa muscular. A creatinina é filtrada livremente pelos glomérulos. Além da filtração glomerular, há também uma secreção tubular activa contrabalançada por um mecanismo de reabsorção tubular. Na doença renal, à medida que a taxa de filtração glomerular diminui, a secreção tubular activa conduz a uma proporção maior no volume de creatinina excretada pela urina, tornando a utilização da clearance para avaliação da taxa de filtração glomerular uma ferramenta menos precisa. Uma outra variável que deve ser levada em conta aquando da avaliação da clearance da creatinina é o uso de fármacos que possam interferir com a secreção tubular, como os salicilatos, a cimetidina e a espirinolactona, entre outros. Crescimeto A hormona de crescimento é sintetizado pela hipófise anterior. É estimulada pela GHRH (growth hormone - releasing hormone) e é inibida pelo GHIH (growth hormone - inhibiting hormone) secretadas pelo hipotálamo. Actua em inúmeros tecidos, como tecido mole, cartilagem e osso. A principal acção é promover a síntese protéica e, consequentemente, o crescimento desses tecidos. Também mobiliza gordura do tecido adiposo, aumenta a absorção intestinal de cálcio, estimula a glicogenólise hepática e antagoniza os efeitos da insulina. Estas duas últimas acções resultam num aumento da glicemia. A GH induz à síntese hepática de somatomedinas (ou IGFs - insulin - like growth factors), que são os mediadores da acção da GH na cartilagem e no osso. A hipersecreção de GH deve-se a adenomas hipofisários, e os seus efeitos dependem da idade do paciente. Quando ocorre antes do fecho das epífises dos ossos longos, acarreta o crescimento desproporcional (gigantismo); quando ocorre depois, leva a um aumento de ossos da face e das extremidades (acromegalia), como também a um aumento de cartilagem e de tecidos moles. O diagnóstico laboratorial da hipersecreção de GH requer a utilização de provas funcionais, como o teste de supressão de GH com glicose para comprovação da não-supressibilidade normal dessa hormona pela glicose. O doseamento basal de GH é pouco útil nesse diagnóstico, em virtude de, nessa patologia, a secreção de GH ser episódica. A análise de IGF-I é um exame alternativo que tem melhor correlação com a actividade clínica da doença do que o doseamento de GH. O doseamento seriado dos dois é bastante útil na avaliação da eficácia terapêutica. A prolactina pode estar elevada em 30% dos casos, devido à hipersecreção do adenoma hipofisário. Portanto, os seus níveis séricos também devem ser avaliados. A deficiência de GH em crianças resulta na baixa estatura (nanismo hipofisário), definida como altura abaixo do terceiro percentil. Cursa com diminuição da velocidade de crescimento e atraso da idade óssea. Pode ser consequente a doença hipofisária primária ou a disfunção hipotalámica. A falência hipofisária primária resulta de doenças genéticas (hipoplasia hipofisária, aplasia hipofisária, hipopituitarismo familiar e deficiência familiar isolada de GH), trauma, tumores, doenças granulomatosas, radioterapia do sistema nervoso central. A maioria dos casos de deficiência de GH é de origem hipotalámica (traumas do parto, tumores ou infecções). O diagnóstico laboratorial da deficiência de GH requer a realização de provas de estimulação, uma vez que os níveis de GH são geralmente baixos em estado basal. Antes da realização dos testes de estimulação, é necessário investigar se o paciente é eutiroidéio, uma vez que o hipotiroidismo causa uma resposta abaixo do normal do GH ao estímulo. Os estímulos farmacológicos mais comuns são: clonidina, piridostigmina (mestinon) e insulina. O teste com insulina precisa ser cuidadosamente acompanhado com doseamentos de glicemia capilar, devido ao risco de hipoglicemia grave. Devido à possibilidade de ocorrência de resultados falso-negativos, geralmente são realizados dois testes, com estímulos diferentes. Crianças com deficiência discreta podem responder normalmente ao estímulo farmacológico. A dosagem de IGF-I deve apoiar o diagnóstico, uma vez que níveis normais reduzem a possibilidade de deficiência de GH. GH (Hormona do Crescimento) Indicado no diagnóstico e no acompanhamento da acromegalia e do gigantismo, embora valores basais moderadamente elevados não confirmem o diagnóstico, que necessita de comprovação com provas funcionais. Na avaliação do déficite de crescimento, os testes de estimulação são fundamentais, pois níveis basais baixos ou indetectáveis não são úteis para o diagnóstico. A alimentação, o exercício e o stres de qualquer origem podem interferir nos resultados. IGFBP3 (Proteína Carregadora das IGFS) Entre as várias IGFBPs (IGF - binding proteins) descritas, a IGFBP3 é a principal proteína carregadora dos factores de crescimento insulina-like. Os níveis dependem do GH, e a IGFBP3 deve ser avaliada junto com a IGF1. Somatomedina C ou IGF1 (Insulin - Like Growth Factor I) É útil no diagnóstico e no seguimento dos pacientes com hipersomatotropismo (acromegalia e gigantismo), no acompanhamento de pacientes em tratamento com GH exógeno e no diagnóstico da deficiência da hormona de crescimento. A sua interpretação deve levar em consideração mais a idade óssea do que a idade cronológica. Crioglutininas As crioaglutininas são anticorpos capazes de aglutinar hemácias humanas. Acreditase que sejam formadas após exposição a microrganismos que apresentam grupos antigénicos semelhantes aos encontrados nas hemácias. Esses anticorpos necessitam da presença de complemento para a sua reacção. Aparecem na população normal em títulos até 1/32. Em condições normais, exigem refrigeração para que ocorra a reacção com as hemácias. Estas crioaglutininas apresentam-se elevadas em diferentes situações, como nas infecções por Mycoplasma pneumoniae, influenza, mononucleose infecciosa, doenças do colagénio, artrite reumatóide e linfomas. Quando em títulos altos, podem raramente, aglutinar hemácias em temperaturas próximas às do corpo humano, podendo levar à anemia hemolítica. A presença das crioaglutininas pode interferir na avaliação do grupo sanguíneo, na prova cruzada para transfusões, em análises hematológicas e em reacções imunológicas. A prova da crioaglutinina é utilizada para o diagnóstico de infecções pelo Mycoplasma pneumoniae. Não é específica, porém apresenta-se positiva em 34 a 68% dos pacientes com a infecção. Títulos iguais ou maiores do que 1/128, na presença de quadro clínico compatível, podem confirmar o diagnóstico. Em casos duvidosos, recomenda-se um segundo doseamento, após 10 a 15 dias. Crioglobulinas As crioglobulinas são imunoglobulinas que têm a característica de se precipitar em temperaturas abaixo de 37º C (4º a 30º C). As crioglobulinas são classificadas em três tipos principais, de acordo com a sua composição, em tipos I, II e III. O mecanismo pelo qual são produzidas é ainda desconhecido. Quando presentes, os tipos I e II não apresentam sintomas clínicos importantes. Já o tipo III, composto pela associação entre crioglobulinas, cursa com manifestações importantes como fenômeno de Raynaud, artralgias, necrose de pele, púrpura vascular, petéquias e nefropatia. Nos três tipos de crioglobulinemia, é descrita a presença de neuropatia periférica e de concentração sérica de complemento diminuídas, especialmente de C3 e C4, (com maior frequência no tipo III). As doenças associadas incluem doenças virícas, bacterianas e parasitárias, lúpus eritematoso sistémico, poliartrite nodosa, síndrome de Sjögren, outras manifestações auto-imunes, desordens linfoproliferativas e hepatite C. Cryptococcus Neoformans A presença do antigénio capsular polissacarídico do Criptococcus neoformans é pesquisada por intermédio da aglutinação em látex, em amostras de soro e/ou líquor. O antigénio criptocóccico está presente em 87% dos soros e em 99% dos liquores de pacientes com Criptococose. É de grande importância no diagnóstico da criptococose sistémica. O método apresenta algumas limitações, como a reacção cruzada com antigénio de Trichosporum beigelii e a presença de interferência não-específica, resultante da presença de imunoglobulinas geradas por outras patologias como no caso da artrite reumatóide. Cultura de Anaeróbios Os materiais clínicos adequados para a realização da cultura de bactérias anaeróbias devem provir das cavidades fechadas do nosso organismo (coleções líquidas, abcessos, sangue e liquídos biológicos em geral) ou seja, locais estéreis, sem a presença da flora normal. As bactérias anaeróbias causam uma variedade de infecções humanas, incluindo peritonite, empiema, endocardite e artrite. As infecções anaeróbias são, geralmente, de fonte endógena, representada pela própria flora normal. Entretanto, apesar da grande variedade de anaeróbios da flora normal, as infecções são limitadas a uma pequena quantidade de microrganismos, na qual se destacam o isolamento do género Bacteroides spp. Estreptococcus spp., Prevotella spp. e Clostridium perfringens. Os materiais devem ser colhidos e inoculados em frascos anaeróbios de hemocultura, até ao volume máximo permitido, que é de 8 mL. Quando o material for sangue e liquídos biológicos, pode ser armazenado por um período de até 24 horas, à temperatura ambiente, em frascos anaeróbios. Não poderão ser utilizados para pesquisar microrganismos anaeróbios materiais provenientes de locais que normalmente participem da flora normal ou transportados inadequadamente. Cultura de Fezes A coprocultura auxilia o clínico no diagnóstico da etiologia de diarréias bacterianas, por meio do isolamento de patogénios entéricos. As gastroenterites podem ser causadas por bactérias, vírus ou parasitas. Quando é solicitada uma rotina de coprocultura, são procurados os agentes etiológicos mais frequentes, tais como Shigella spp., Salmonela spp. e Escherichia coli enteropatogénica. A E. coli enteropatogénica é pesquisada nos casos de diarréias em crianças de até 4 anos de idade. A E.coli invasora é pesquisada em todas as faixas etárias. A sua toxicidade é dada pela toxina que produz, a qual penetra na mucosa intestinal, provocando diarréia aguda. Em casos mais específicos, como as pesquisas de Campylobacter spp. e Yersinia spp., o pedido médico deverá ser direcionado. Outros patogénios, como Aeromonas spp. e Plesiomonas spp., podem também ser isolados. Cabe lembrar que algumas espécies de Campylobacter spp. não crescem nas condições padronizadas para coprocultura. O crescimento abundante de germes como Pseudomonas aeruginosa, Candida spp., Staphylococcus aureus, entre outros, pode indicar pacientes tratados com antibióticos de amplo espectro. Apesar de seu papel ainda não estar claramente definido, sua presença é comunicada ao médico, indicando o seu predomínio. A cultura deve ser realizada de preferência a partir de fezes frescas. Caso não seja possível, pode-se enviar swab anal em gel de transporte ou fezes colhidas em meio de transporte (tampão glicerol). Para a pesquisa de Campylobacter spp., são adequadas apenas fezes frescas ou colhidas em gel de transporte. Os swabs com meio de transporte e as fezes conservadas em tampão glicerinado podem ser armazenados à temperatura ambiente até 24 horas. Cultura de Materiais do Aparelho Génito-Urinário Importante no diagnóstico laboratorial das uretrites, vaginites, endocervicites, doenças sexualmente transmitidas e agentes bacterianos associados às infecções do aparelho genital. Secreção uretral, vaginal, urina do 1º jacto, esperma, secreção endometrial, fundode-saco uterino e secreção prostática são consideradas amostras clínicas apropriadas. As amostras clínicas colhidas com meio de transporte podem ser armazenadas até 24 horas à temperatura ambiente. As urinas e swabs colhidos sem meio de transporte devem ser processados até 2 horas. São considerados como crescimento patológico: Neisseria gonorrheiae, Estreptococcus agalactiae, Haemophilus spp., Corynebacterium spp. e enterobactérias. A presença de Corynebacterium spp. e de enterobactérias é valorizada, principalmente em crianças, mas também em adultos, quando presentes em grandes quantidades e a critério do médico. Cultura de Materiais do Aparelho Respiratório Inferior Embora as infecções do aparelho respiratório inferior estejam entre as causas de maior morbilidade e mortalidade dos pacientes, o diagnóstico dessas infecções é frequentemente complicado pela contaminação da espécie clínica com a flora normal. A expectoração é submetida inicialmente a culturas, a fim de determinar o agente etiológico das pneumonias. O material recebido no laboratório pode ser expectoração, expectorada e/ou induzida. Outros materiais clínicos incluindo aspirado traqueal, aspirado transtraqueal, lavado bronquico e lavado broncoalveolar protegido e não-protegido. A expectoração deve ser observada ao microscópio, para se avaliar a qualidade da amostra e se é representativa do aparelho respiratório inferior, ou se contém apenas saliva. O lavado broncoalveolar é obtido por meio de procedimentos invasivos, sendo recomendado na suspeita de pneumonias nasocomiais em pacientes com ventilação mecânica. Os resultados da cultura de expectoração são interpretados com base na avaliação da coloração de Gram preparada a partir da porção mais purulenta da amostra: se contém mais de 25 polimorfonucleares/campo ou até 10 células epiteliais/campo, observado através de objetiva de 10 vezes, o material é considerado satisfatório. A informação mais simples envolve a quantificação de um volume maior ou igual a 10 células epiteliais, com a objetiva de 40 vezes, o que seria inaceitável para a cultura. Nas culturas quantitativas, o volume do lavado broncoalveolar protegido colhido frequentemente é de 0,01 mL a 0,001mL de secreção. A contagem de 103 UFC/mL de um microrganismo corresponde a infecção. Para o lavado broncoalveolar (LBA), a contagem de 10.000 UFC/mL ou mais de um microrganismo específico correlaciona-se com pneumonia. No lavado bronquico e no aspirado traqueal, a contagem de 106 colónias, ou seja, 1.000.000 UFC/mL, sugere um processo infeccioso. Os microrganismos mais frequentemente isolados correspondem aos grupos dos bastonetes gram-negativos não-fermentadores ou entéricos, os estafilococos e enterococos. São eles: Staphylococcus aureus, Streptococcus pneumoniae, Streptococcus pyogenes, Enterococcus spp., Haemophilus influenza, Moraxella catarrhalis, Pseudomonas aeruginosa, Klebsiella pneumoniae e Rhodococcus equi. Cultura de Materiais do Aparelho Respiratório Superior Inclui as culturas de secreções da orofaringe, nasofaringe, ocular e do ouvido. Auxilia os clínicos no diagnóstico das faringites bacterianas. A causa mais comum de faringite é representada pelo Streptococcus pyogenes. Em 7% dos casos, as secreções da nasofaringe são úteis no diagnóstico de sinusites infecciosas e na detecção de portadores nasais de germes como Staphylococcus aureus MRSA (estafilococos aureus resistentes à meticilina) e Neisseria meningitidis. No caso da epiglotite, que têm evolução rápida e progressiva com celulite, apresentam um grande potencial de obstrução das vias respiratórias, e os seus agentes etiológicos são Haemophilus influenzae, Streptococcus pneumoniae e Staphylococcus aureus. Nas secreções oculares e ouvido, por possuírem a mesma mucosa de revestimento do aparelho respiratório superior, são isolados os mesmos agentes e diagnosticadas conjuntivites purulentas e otites. Estas infecções são mais comuns na infância e na terceira idade. Para as culturas da orofaringe, os resultados reportados são a presença do crescimento de estreptococos beta-hemolíticos, Streptococcus pyogenes, outros não-pyogenes e a ausência de estreptococos beta-hemolítico. Nas secreções nasais, procura-se evidenciar a presença de Staphylococcus aureus, Streptococcus pneumoniae e Haemophilus influenzae. Nas secreções conjuntivais, a presença do crescimento bacteriano é avaliada, juntamente com os dados clínicos, a presença de cirurgias ou próteses. Os estafilococos coagulase-negativo e os bastonetes gram-negativos são os mais frequentemente isolados, juntamente com Staphylococcus aureus, Streptococcus pneumoniae e Haemophilus spp. No diagnóstico das otites médias e externas, são utilizados secreções ou fluidos do ouvido. As bactérias mais comunns são Pseudomonas spp. e outros microrganismos provenientes da microflora respiratória. Cultura de Micobactérias A realização da cultura de micobactérias utiliza como princípio biológico a detecção radiométrica do CO2 produzido pela actividade metabólica das micobactérias a partir de meios de cultura específicos marcados com C14. É destinada ao diagnóstico da tuberculose e das micobacterioses. Pode ser realizada em expectoração, lavado bronquico, lavado broncoalveolar, líquido ascítico, líquido pleural, líquido peritoneal, líquido cefalorraquidiano, aspirado de medula óssea, sangue, fezes, biópsias e urina. O uso de antituberculostáticos, e a presença de micobactérias não-adaptadas ao crescimento em meio líquido ou à temperatura de 35ºC podem induzir a um resultado falso-negativo. Cultura de Outros Líquidos Biológicos A cultura dos líquidos biológicos é utilizada para determinar a presença de agentes infecciosos nos líquidos pleural, sinovial, ascítico e pericárdio, auxiliando no diagnóstico etiológico de infecções como as pneumonias com derrame pleural, pericardites e sinovites. Os fluidos biológicos normalmente são estéreis, e a presença de um microrganismo resulta quase sempre num agravamento do quadro clínico desses pacientes. O uso de próteses e a terapêutica com imunossupressores têm contribuído muito para o aumento da prevalência de positividade dessas amostras. As principais bactérias isoladas incluem Neisseria spp., Streptococcus pneumoniae, Streptococos betahemolíticos e Staphylococcus aureus, podendo também ser isolados bastonetes gram-negativos. A presença de crescimento bacteriano de qualquer microrganismo após a incubação é considerada patogénica, uma vez que esses líquidos são estéreis. Um número pequeno de microrganismos na amostra enviada pode levar a um resultado falsonegativo. Os líquidos biológicos destinados a cultura devem ser transportados ao laboratório para sementeira em 2 horas após a colheita. Se esse tempo não puder ser respeitado, inocular até o volume de 8 mL num frasco de hemocultura aeróbio ou anaeróbio e enviar ao laboratório. Cultura de Secreções, Abcessos, Tecido Subcutâneo, Fragmento de Tecidos e Biópsias Microrganismos residentes na pele e nas mucosas humanas, assim como no ambiente, podem causar infecções quando inoculados em tecidos normalmente estéreis ou em mucosas íntegras. Nem sempre é necessário existirem mecanismos de virulência para o microrganismo causar a doença. O material de biópsia enviado ao laboratório com mais frequência são os de linfonodos, pulmão, fígado, fragmentos de tecidos obtidos por laparoscopia, fragmentos ósseos, secreções de ferida cirúrgica, furúnculos e punção de abscessos. A cultura desses espécimes permite diagnosticar as infecções dos tecidos cutâneos e subcutâneos e de órgãos mais profundos, tais como abscessos intra-abdominais (incluindo as diverticulites), abscessos peritonsilares, cutâneos e esplênicos, impetigo, foliculite, furúnculos, celulite, fasciite, erisipela e osteomielite. Permite também obter a sensibilidade do microrganismo isolado aos antimicrobianos. O material pode ser proveniente de secreções de pele, bolhosa, de impetigo, de abscessos em geral, ferida cirúrgica, punção de agulha fina de órgãos e fragmentos de tecidos. Os tecidos obtidos durante procedimento cirúrgico são os melhores espécimes, já que os microrganismos são os agentes etiológicos da infecção. Os materiais obtidos dessa forma devem ser enviados em frasco estéril contendo água estéril, soro fisiológico ou lactato de ringer. Normalmente, a flora normal não interfere com esta colheita de material. Em secreções purulentas e abscessos a colheita deve ser feita por aspiração com seringa. AUMENTO DA FORMAÇÃO IMPETIGO ............ FOLICULITES ............ FURÚNCULOS ............ ERISIPELA ............ CELULITES DIMINUIÇÃO DA SECREÇÃO Staphylococcus aureus, Staphylococcus pyogenes. ............................................................ Staphylococcus aureus. ............................................................ Staphylococcus aureus. ............................................................ Staphylococcus pyogenes. ............................................................ Staphylococcus pyogenes, Staphylococcus aureus, Esterobactérias, Aeromonas spp, Clostridium spp, Mycobacterium spp. ........................................................................ FASCIITE Staphylococcus pyogenes, ou infecções sinérgicas por bactérias facultativas e anaeróbias. ........................................................................ ABCESSOS Staphylococcus aureus, Propionebacterium spp. CUTÂNEOS ........................................................................ ABCESSOS Staphylococcus aureus, Staphylococcus spp, Propionebacterium spp. PERINEAL, VULVOVAGINAL, ESCROTAL ........................................................................ MIOSITES Staphylococcus aureus, Staphylococcus spp. ... ... ... ... ... ... ... ... AUMENTO DA FORMAÇÃO DIMINUIÇÃO DA SECREÇÃO OSTEOMIELITES Staphylococcus aureus, Staphylococcus pyogenes, Streptococcus agalactiae, Candida spp., Pseudomonas aeruginosas, Pamonella spp ........................................................................... INSUFICIÊNCIA Enterobactérias, Bactérias anaeróbias. VASCULAR ........................................................................... TRAUMA Staphylococcus spp, Propionebacterium spp, Pseudomonas ssp, ASSOCIADO Staphylococcus aureus e Enterobactérias. Cultura de Urina Auxilia o clínico no diagnóstico das infecções urinárias. As urinas submetidas a cultura são provenientes de pacientes com sintomas ou algum factor de risco para o desenvolvimento de infecção urinária. As infecções do aparelho urinário têm frequentemente como agentes etiológicos, bactérias com características de crescimento rápido, como Escherichia coli, Enterococcus faecalis, Klebsiella pneumoniae, Enterobacter cloacae, Proteus mirabilis, Pseudomonas spp. e Staphylococcus saprophyticus, representando a maioria dos isolamentos em pacientes hospitalizados, assim como da comunidade. As culturas negativas são identificadas como ausência de crescimento bacteriano. As prováveis contaminações são definidas como difteróides, estreptococos alfahemolíticos, lactobacilos, Estafilococos Coagulase-Negativa, ou crescimento de três microrganismos diferentes. As culturas são consideradas positivas quando a contagem de colônias for igual ou superior a 105 UFC, com isolamento de um único agente etiológico, ou na presença de dois microrganismos, quando houver indicação clínica, ou ainda com contagens inferiores a 105 com o isolamento de um único microrganismo associado a um dado clínico e/ou laboratorial. Deve-se colher o 2º jacto urinário após higiene da genitália externa. Em crianças, que não controlam a micção, fazer a higiene e colocar o saco colector adesivo, que deve ser trocado a cada 30 minutos quando não tiver sido possível colher a urina. A urina do paciente em uso de sonda vesical deve ser colhida na válvula lateral do equipamento, após a desinfecção do mesmo. A urina do 2º jacto pode ser da primeira micção ou de qualquer amostra urinária, desde que o paciente retenha a urina por um período mínimo de 4 horas. A urina é um fluido normalmente estéril; por conseguinte, uma colheita inapropriada pode torná-la contaminada com a flora do períneo, da uretra ou da vagina. As amostras permanecem estáveis até 2 horas após a colheita ou em geladeira (2ºC - 8ºC). Cultura de Fungos O isolamento e a identificação de fungo em cultura são prova definitiva no diagnóstico de infecções fúngicas, permitindo a escolha do tratamento adequado. As diferentes amostras clínicas são semeadas nos meios de cultura apropriados para isolamento e identificação de fungos. As amostras deverão ser colhidas de maneira asséptica em frasco estéril, conforme a natureza da amostra. Os materiais biológicos requeridos são: - escamas de pele, unhas, pêlos (micoses superficiais e cutâneas); - aspirado de lesão, secreções, biópsias de pele (micoses subcutâneas); - expectoração, lavado brônquico, aspirado brônquico, escovado brônquico (micoses sistémicas); - secreções: pulmonar, vaginal, traqueal, orotraqueal, de lesões cutâneas, abdominal, oral, de conjunctivas ou de qualquer outra localização (micoses sistémicas); - sangue, biópsia de qualquer órgão ou tecido, urina, líquor, líquidos sinovial, ascítico, amniótico ou outros líquidos orgânicos (micoses sistémicas). Os resultados serão interpretados de acordo com o tipo de material clínico semeado, o local da lesão e a indicação clínica. Alguns fungos são parte da flora normal, mas podem, ocasionalmente, causar doenças. Do mesmo modo, fungos oportunistas podem ser apenas contaminantes como os reais causadores da patologia em investigação. Muitas vezes, o médico prescritor deve ser consultado sobre a condição clínica do paciente, para que se possa concluir qual o real valor do isolamento de determinados fungos. A presença de microrganismos da flora normal ou de infecção bacteriana concomitante pode inibir o crescimento de fungos patogénicos. Curva Glicémica Também conhecida como prova de tolerância oral à glicose (PTOG), a curva glicémica consiste na administração de 75 g de glicose - em solução aquosa a 25% - por via oral, seguida de colheitas seriadas de sangue, nos tempos 0, 60 e 120 minutos, para o doseamento de glicose. Em crianças, administra-se 1,75 g/kg de peso até a dose máxima de 75 g. AUMENTO DA FORMAÇÃO NORMAL Inferior a 140 mg/dl INTOLERANTE (tolerância diminuída) intolerante à sobrecarga entre 140 e 200 mg/dl DIABETES MELLITUS Superior a 200 mg/dl Para garantir a fidelidade dos resultados de um teste de sobrecarga oral à glicose, devem ser tomados os seguintes cuidados: - nos 3 dias que antecedem a prova, o paciente deve ingerir, pelo menos, 150 g de carbohidratos por dia; - o paciente deve estar realizar as suas actividades físicas habituais, mantendo-se em regime alimentar normal, excepto pela adição da quantidade de carbohidratos indicada no item anterior; - o paciente não deve realizar medicação que interfira no metabolismo de carbohidratos; - durante o teste, o paciente deve manter-se em repouso e, se possível sem fumar; - a prova deve ser realizada pela manhã, com o paciente em jejum de 8 a 10 horas. Mesmo com todas essas precauções, é importante salientar que os resultados desta prova, em testes realizados em dias diferentes, podem mostrar-se com vários problemas. Assim, a interpretação deve ser feita sempre com cautela, por um médico que conheça a história clínica do paciente. Triagem Gestacional O doseamento de glicose, os tempos de colheita e os critérios diagnósticos são ligeiramente diferentes para mulheres grávidas. Em grávidas entre a 24ª e a 28ª semana de gravidez, pode ser realizado um teste de rastreio em duas fases. Na primeira, faz-se a glicemia em jejum ou a glicemia de 1 hora após a ingestão oral de 50 g de glicose (sem necessidade de jejum prévio). Resultados de glicemia de jejum iguais ou acima de 85 mg/dL ou após sobrecarga maior ou iguais a 140 mg/dL são considerados positivos e com indicação de realização de PTOG. A segunda fase aplica-se nos casos em que se enquadrem nos critérios anteriores, e é realizado a PTOG com 75 g de glicose. As amostras de sangue são colhidas nos tempos basal , 60 e de 120 minutos. Os limites de 126 mg/dL para glicemia basal e de 140 mg/dL após 2 horas são considerados normais. O diagnóstico de diabetes gestacional será confirmado se pelo menos um dos limites estabelecidos como normais for ultrapassado. Consultar Glicose. CYFRA 21-1 O Cyfra 21-1 é um marcador tumoral cuja presença caracteriza um mau prognóstico nos carcinomas de células escamosas do pulmão. É o fragmento da citoqueratina 19 encontrado no soro. Dados da literatura revelam que o Cyfra 21-1 não é um bom marcador tumoral de carcinoma de pequenas células do pulmão; é porém um marcador de sensibilidade e especificidade melhores para outros carcinomas do pulmão, como carcinomas de células escamosas, adenocarcinomas e carcinomas de células grandes. Dengue Conhecida na literatura há cerca de 200 anos, caracteriza-se como doença infecciosa febril aguda, de etiologia viral e evolução benigna na maioria dos casos. A primeira epidemia foi relatada em ocorrências simultâneas nos três continentes em 1779/1780. Nos últimos 40 anos, mais de 3 milhões de casos de dengue foram registados no mundo, com cerca de 58 mil mortes nesse período. As regiões tropical e subtropical são as mais atingidas por esta doença que é causada por um vírus da família Flaviviridae e transmitida pelos mosquitos Aedes aegypti e A. albopictus. No Brasil e nas Américas, o A. aegypti é o mosquito epidemiologicamente mais importante. Proveniente de África e domesticado por acção antropofílica, o Aedes aegypti é, também, o vector responsável pela transmissão da febre amarela urbana. O mosquito, de cor escura com manchas brancas, adaptou-se muito bem à vida urbana. Possui hábitos diurnos, picando os indivíduos na parte da manhã e à tarde. As fêmeas depositam os ovos em água limpa, onde as larvas podem proliferar-se a partir de depósitos artificiais de água, como pneus e tanques. O vírus de dengue é dividido em quatro sorotipos distintos, com características antigénicas diferentes e isolados inicialmente de fontes diferentes: DEN-1, DEN-2, DEN-3, DEN-4. Na infecção humana, o quadro clínico pode ser assintomático, evoluir de forma clássica, com febre, cefaléia de grande intensidade, artralgia, mialgia, rash cutâneo, insónia e anorexia ou determinar manifestações hemorrágicas fatais, sendo essa forma clínica denominada dengue hemorrágica, ocorrendo em menos de 0,2% dos casos de infeccção primária e em 90% dos casos que apresentam história prévia. A transmissão ao homem ocorre por meio da picada de mosquitos hematófagos infectados. Não ocorre transmissão de pessoa a pessoa. Os mecanismos que determinam a apresentação clínica da doença sob a forma clássica ou hemorrágica ainda são desconhecidos. Entre as hipóteses fisiopatogénicas da forma hemorrágica da doença, as mais aceitas são em função da presença de anticorpos anti-virais: duas infecções sequenciais, por diferentes sorotipos, com intervalo mínimo de 3 anos, são necessárias para que a resposta imunológica do indivíduo sensibilizado seja amplifica da pela segunda infecção. Outra hipótese aceite é a que relaciona as formas graves a uma maior virulência de determinadas cepas virais. No Brasil, as primeiras referências ao Dengue datam de 1916, em São Paulo, e em 1923 em Niterói, Rio de Janeiro. Entretanto, a primeira epidemia só foi relatada em 1982, em Roraima, em que foram registrados 11.000 casos. Em 1986, uma grande epidemia ocorreu no estado do Rio de Janeiro, causada pelo serotipo DEN-1, até então o único serotipo encontrado no Brasil. Foram identificados então mais de 33.000 casos em 1986 e 60.000 casos em 1987, todos de dengue clássico. Na década de 1990, ocorreram vários casos de recrudescimento de DEN-1 no Rio de Janeiro e a introdução da DEN-2, com alta incidência no início da década. No ano de 1991, foram registados os primeiros casos de dengue hemorrágico no estado, com 1.316 notificações e 8 óbitos. Os meses de maior incidência de dengue no Brasil nos últimos anos, segundo dados do Ministério da Saúde, são os cinco primeiros meses do ano, com pico de incidência nos meses de Março, Abril e Maio. Recentemente, foram relatados nos mídia (O Globo, 24 de março de 2001) casos de dengue causados pelo serotipo DEN-3 no Rio de Janeiro. A imunidade é serotipo-específica, ou seja, a infecção causada por um dos serotipos não confere imunidade aos outros. Além disso, como já citado, a probabilidade de ocorrência de formas mais graves da doença é maior em indivíduos que apresentam infecção prévia. Sugere-se que esses indivíduos desenvolvam anticorpos contra um dos serotipos que facilitariam a interacção vírus-célula numa nova infecção viral. Existe a tendência de pacientes que habitam regiões endémicas, quando diagnosticados, apresentarem não a infecção primária, mas sim a secundária. Portanto, a presença dos anticorpos é de grande importância, visto que na primeira reinfecção e nas infecções subsequentes aparece uma alta ocorrência de complicações. Actualmente, utilizam-se testes de ELISA, que determinam simultaneamente a presença de anticorpos IgM e IgG. A classificação da infecção como primária ou secundária é pela análise da presença ou ausência de IgM e pela avaliação dos títulos de IgG. Nos casos positivos, a detecção dos anticorpos IgM caracteriza a infecção aguda. Apresentam-se positivos por volta do terceiro ou quinto dia após o aparecimento da sintomatologia clínica, mantendo-se positivos cerca de 30 a 90 dias e declinando logo após, até níveis indetectáveis. Nalguns casos, mantêm-se detectáveis até 8 meses após o quadro. Os anticorpos IgG apresentam-se positivos por volta da segunda semana após o início do quadro, mantendo-se detectáveis por toda a vida. Os casos secundários caracterizamse pela presença de altos títulos de IgG, podendo ou não apresentar níveis elevados de IgM. Recomenda-se que, nos casos clínicos sugestivos da doença que apresentam serologia negativa, esta seja repetida com intervalo de 1 semana, para afastar a possibilidade de não-detecção por níveis de anticorpos muito baixos, ou em consequência da fase da doença primária ou secundária em que a colheita foi realizada. Além dos exames laboratoriais específicos, devem também ser avaliados, no diagnóstico de dengue, exames complementares definindo trombocitopenia, aumento de hematócrito e hipoproteinémia. De grande utilidade são as aplicações recentes de testes imunocromatográficos, reação em cadeia da polimerase (PCR) e hibridização de ácidos nucleicos para o diagnóstico rápido, sensível e específico. O RNA viral pode ser detectado em soro, líquido cerebroespinhal e tecidos, e os subtipos virais determinados por hibridização dos produtos de reação em cadeia de polimerase (PCR) com sondas de oligonucleotídeos tipo-específicas. A variação de linhagem e subtipos virais pode ser identificada, em estudos de pesquisa, pela análise por RFLP (restriction fragment length polymorphism) ou pela sequência de nucleotídeos dos produtos de PCR. Estes ensaios encontram-se restristos, ainda não disponíveis para a maioria dos laboratórios clínicos. Desidrogenase Láctica É uma enzima intracelular responsável pela oxidação reversa do lactato em piruvato. É amplamente distribuída em todas as células do organismo, concentrando-se mais especialmente no miocárdio, rim, fígado, hemácias e músculos. Possui cinco formas de isoenzimas. Os seus valores encontram-se elevados em todas as situações em que ocorre grande destruição celular. Os níveis séricos elevados encontrados em diferentes condições como anemia megaloblástica e hemolítica, leucemias, linfoma, hemoglobinopatias, enfarte agudo do miocárdio, enfarte pulmonar, insuficiência cardíaca congestiva, insuficiência coronária, choque e hipóxia importantes, doenças musculares, lesões hepáticas, neoplasias primárias ou secundárias (metastáticas), hepatites, icterícias obstrutivas e cirrose. Desordens das Supra-renais O par de glândulas supra-renais localiza-se na borda superior dos rins (suprarenais). Cada supra-renal consiste no córtex (porção mais externa) e na medula (porção mais interna). A medula secreta catecolaminas, em resposta ao estímulo de fibras nervosas simpáticas pré-ganglionares. O córtex compõe-se de três zonas: glomerular, fascicular e reticular. Secreta corticosteróides que, dependendo da função dos esteróides, são classificados como mineralocorticóides, glicocorticóides ou esteróides sexuais. REGIÕES DA SUPRA-RENAL E PRODUÇÃO HORMONAL CÓRTEX ZONA GLOMERULAR --> Mineralocorticóide ZONA FASCICULAR --> Glicocorticóides ZONA RETICULAR --> Esteróides sexuais MEDULA CATECOLAMINAS --> Epenefrina, Noraepinefrina, Dopamina Os glicocorticóides regulam o metabolismo dos carboidratos, das proteínas e das gorduras. O cortisol é o principal glicocorticóide. A hormona adrenocorticotrófica (ACTH) é a principal reguladora da produção e secreção de cortisol. A ACTH é secretada pela hipófise anterior em resposta à libertação, pelo hipotálamo, da hormona libertadora de corticotrofina (CRH). A hormona antidiurético (ADH), a ocitocina e as catecolaminas podem influenciar o ritmo diurno da ACTH. Febre, hipoglicemia, stres, distúrbios psicológicos podem disparar a libertação de ACTH. O cortisol circula na corrente sanguínea ligado a uma alfaglobulina chamada transcortina ou CBG (cortisol binding globulin). Apenas uma pequena fracção circula livre e é biologicamente activa. Possui um ritmo circadiano, com níveis elevados pela manhã, caindo ao final do dia. Actua como feedback negativo no hipotálamo e na hipófise anterior, diminuindo a libertação de CRH e de ACTH. É metabolizado principalmente no fígado e seus metabolitos são excretados na urina como 17hidroxicorticosteróides (17-OH esteróides). As hormonas sexuais circulam ligados a proteínas plasmáticas, principalmente à SHBG (steroid hormone binding globulin). Apenas a fracção livre é biologicamente activa. As hormonas sexuais sofrem metabolização hepática. Os androgénios são excretados na urina como 17-cetosteróides (17-KS). A aldosterona é o principal mineralocorticóide. É regulada por vários mecanismos, sendo o principal o sistema renina-angiotensina. Em caso de depleção de volume, ocorre libertação de renina das células justa-glomerulares das arteríolas aferentes renais. A renina actua sobre o angiotensinogénio produzindo angiotensina I, por sua vez convertida em angiotensina II pela enzima conversora de angiotensina (ECA). A angiotensina II é convertida em angiotensina III, sendo ambas capazes de se ligar ao receptor na célula-alvo e de ativar o ciclo fosfatidil inositol que estimula a libertação do cálcio intracelular e a secreção de aldosterona. Outros estímulos para a secreção de aldosterona são aumento do potássio sérico, elevação dos estrogénios, redução do volume plasmático e redução do sódio sérico. A aldosterona circula ligada a proteínas plasmáticas. Após sofrer metabolização hepática, é excretada na urina como conjugados do ácido glicurónico. Hipercortisolismo Caracterizado pelos elevados níveis de cortisol e pela perda do ritmo circadiano. O Síndrome de Cushing engloba as diversas causas de hipercortisolismo: a administração exógena de cortisol ou de ACTH; a secreção excessiva de ACTH pela hipófise anterior com consequente hiperplasia do córtex adrenal e aumento na secreção de cortisol (doença de Cushing); a secreção ectópica de ACTH ou de CRH por tumor não-hipofisário; a hipersecreção autónoma de cortisol por adenoma ou carcinoma de adrenal; a displasia nodular adrenocortical primária (com produção autónoma de glicocorticóide e ACTH em níveis baixos ou normais). A causa mais frequente do síndrome de Cushing é a terapia prolongada com glicocorticóide, denominado síndrome de Cushing iatrogénico. Dois terços dos pacientes com síndrome de Cushing endógeno têm doença de Cushing (adenoma hipofisário secretor de ACTH). Um terço dos casos do síndrome de Cushing por produção ectópica de ACTH devido a tumores malignos não-hipofisários é causado por carcinoma de pulmão tipo oat cell. Outras causas são: tumores de células das ilhotas pancreáticas, tumores renais, timomas e adenomas brônquicos. Menos de um terço das causas de síndrome de Cushing é de neoplasias adrenais. Carcinomas adrenais podem secretar também grandes quantidades de androgénios. As manifestações clínicas mais comuns do síndrome de Cushing são: acentuada fraqueza e perda muscular, intolerância à glicose, obesidade central, face em lua, pele fina, estrias violáceas, fragilidade capilar, atrazo de crescimento em crianças, osteoporose, cifose, hipertensão arterial e distúrbios psiquiátricos. Nas mulheres, podem ocorrer oligomenorréia, amenorréia, anovulação ou hirsutismo. Nos homens, podem ocorrer diminuição de libido e/ou ginecomastia. Laboratorialmente, o diagnóstico inicial é feito com a dosemento do cortisol basal, ritmo circadiano, teste de supressão nocturna e doseamento do cortisol livre urinário. A presença de hipercortisolismo deve ser confirmada pelo teste de supressão com dexametasona 2 mg, e o diagnóstico etiológico requer o teste de supressão com dexametasona 8 mg, além do doseamento de ACTH. O teste do CRH também é utilizado, apesar da dificuldade de obtenção desse medicamento. HIPERCORTISOLISMO DOENÇA DE ADENOMA CRACINOMA ACTH IATROGÉNICO CUSHING SUPRASUPRAECTÓPICO (ADENOMA RENAL RENAL HIPOFISÁRIO) Cortisol Basal Rítmo Circadiano ACTH Cortisol Livre Urinário 17-OH Esteróides 17 KS (N) (N) A A ou N ou N ( ) elevado ( A A ) muito elevado ( )diminuído (A)ausente A Outros exames complementares são os testes dinamicos: a supressão nocturna pela dexametasona (1 mg); o teste de supressão com dexametasona (2 mg) (Liddle I); o teste de supressão com dexametasona (8 mg) (Liddle II); o teste de estimulação pelo CRH. Insuficiência Adrenal Caracteriza-se pela diminuição na produção de cortisol. Pode ser primária, com ACTH elevada, ou secundária, com ACTH diminuído. A insuficiência secundária geralmente resulta do uso prolongado de glicocorticóide como cortisona e prednisolona, mas também pode ser devido a um tumor hipofisário. Em caso de hipopituitarismo, outras hormonas podem estar comprometidos, como GH, TSH e LH. A insuficiência primária pode manifestar-se de forma aguda ou crónica. A forma aguda é rara e a causa mais frequente é a hemorragia adrenal em pacientes com terapia anticoagulante. Outras causas são: septicéemia, cirurgia, trauma, enfarte do miocárdio e gravidez. Clinicamente, é caracterizada por astenia intensa, dores graves na região lombar, pernas e abdómen, choque e insuficiência renal. A insuficiência adrenal crónica é denominada doença de Addison, e a causa mais comum é um processo de auto-imunidade. Outras causas são as infecções granulomatosas como tuberculose, histoplasmose e amiloidose, sarcoma de Kaposi e infiltração por outros patógenios como citomegalovírus. Clinicamente, a insuficiência adrenal prolongada caracteriza-se por hiperpigmentação da pele, especialmente nas cicatrizes e mucosa bucal, astenia, perda de peso, febre, mialgia e hipotensão. Os achados laboratoriais podem não ser muito expressivos, a menos que ocorra o choque, com hiponatremia, hipercalemia, hipoglicemia, hemoconcentração e uremia. Na insuficiência secundária devido a hiposecreção de ACTH, não ocorrem nem a hiperpigmentação, nem alteração tão grave de volume e eletrólitos, uma vez que a aldosterona não está sob controlo primário do ACTH. AVALIAÇÃO LABORATORIAL DO HIPOCORTISOLISMO PRIMÁRIO (Lesão SECUNDÁRIO (Lesão do Adrenal) Hipotálamo ou Hipófise) Cortisol (8HS) N ou Ritmo A A ACTH ( ) elevado ( )diminuído (A)ausente Em muitos casos de Insuficiência supra-renal moderada, os valores basais podem ser compatíveis com a normalidade, havendo necessidade da realização do teste de estímulo do cortisol com cortrosina (ACTH). O teste de estimulação do cortisol com insulina só deve ser realizado após a constatação de que a adrenal é capaz de responder ao estímulo com ACTH. A discriminação entre insuficiência adrenal hipofisária ou hipotalámica pode ser realizada com o teste do CRH. A resposta positiva sugere etiologia hipotalámica, e a falta de resposta sugere etiologia hipofisária. Síndrome Adrenogenital Este síndrome engloba um grupo de patologias caracterizadas pelo excesso de corticosteróides adrenais: a Hiperplasia adrenal congénita; a Hiperplasia adrenal de início tardio; o Adenoma adrenal; o Carcinoma adrenal. Na maioria dos casos, ocorre hipersecreção de androgénios, que resulta em virilização. A hiperplasia adrenal congénita engloba inúmeros defeitos dos sistemas enzimáticos que envolvem a síntese do cortisol, cuja deficiência leva ao aumento de ACTH, com hiperplasia da adrenal e aumento de inúmeras hormonas intermediárias. O defeito de síntese mais frequente é a deficiência de 21-hidroxilase. Se o defeito é completo, o paciente sofre acentuada perda de sal pela deficiência de aldosterona com hipotensão arterial e insuficiência adrenal pela deficiência de glicorticóides. Pode haver urgência no diagnóstico devido aos graves quadros de desidratação e hipotensão em recém-nascidos. Pode ocorrer genitália externa ambígua no nascimento. Os sinais de virilização podem ocorrer mais tarde, dependendo do grau da deficiência enzimática. O principal exame diagnóstico é o doseamento de 17-OH progesterona. Casos atípicos ou heterozigotos necessitam da prova de estímulo com ACTH. Outros exames utilizados são sulfato de deidroepiandrosterona (S-DHEA), deidroepiandrosterona (DHEA), androstenediona, testosterona, renina e aldosterona. Outros defeitos de sistema enzimático são deficiência de 17-hidroxilase, 11hidroxilase, 3-beta-hidroxiesteróide desidrogenase e colesterol desmolase. Na deficiência de 11-hidroxilase, além da virilização, ocorre hipertensão arterial devido à formação de 11-desoxicorticosterona, um potente retentor de sódio. Nestes casos, é importante o doseamento de 11-desoxicortisol. Tumores produtores de excesso de androgénios são raros e podem ocorrer em qualquer idade. Hiperaldosteronismo A aldosterona é secretada em resposta ao ACTH, à depleção de volume intravascular ou à hiponatremia. Actua nos rins, reabsorvendo sódio e água à custa da excreção de potássio, magnésio e hidrogénio, resultando em hipernatremia e hipervolemia. O hiperaldosteronismo primário ocorre quando há hipersecreção de aldosterona pela supra-renal. Pode ser causado por adenoma unilateral (síndrome de Conn), hiperplasia bilateral ou carcinoma. A principal manifestação clínica é a hipertensão arterial. Os níveis de potássio encontram-se baixos ou no limite inferior da normalidade e estão associados a fraqueza muscular, fadiga e poliúria nocturna; algumas vezes, também, a polidipsia e intolerância à glicose. A perda urinária de iões de hidrogénio pode acarretar alcalose metabólica. O hiperaldosteronismo secundário ocorre em condições como insuficiência cardíaca ou estenose da artéria renal, com consequente aumento da renina plasmática e da aldosterona. Alguns pacientes, nesse caso, apresentam hipertensão, embora a maioria dos casos curse com edema e sem hipertensão, relacionados a patologias como síndrome nefrótico, cirrose com ascite e insuficiência cardíaca congestiva. Hipoaldosteronismo São raros os defeitos isolados na síntese de aldosterona. Defeitos parciais da síntese aparecem na hiperplasia adrenal congénita em virtude da deficiência de 21hidroxilase. Existem duas formas de deficiência isolada de aldosterona: o hipoaldosteronismo idiopático e o hipoaldosteronismo hiporreninémico, sendo esste último o mais frequente e geralmente associado a doença renal crónica, com diminuição da libertação de renina por deficiência das células justaglomerulares, levando à diminuição da aldosterona, hipercaliémia e acidose metabólica. Os níveis de sódio geralmente estão normais ou baixos, e a restrição de sódio agrava as manifestações clínicas. A Diabetes é um achado comum nestes pacientes. Esta condição também é associada à deficiência de prostaglandina indometacina induzida e é agravada pelo uso de heparina, bloqueadores do canal de cálcio ou bloqueadores beta-adrenérgicos. O principal sintoma da deficiência de aldosterona é a hipotensão arterial. O hipoaldosteronismo idiopático é raro, e o paciente pode apresentar um quadro de bloqueio cardíaco secundário a hipercaliémia ou hipotensão postural secundária a hipovolemia. ACTH (Hormona Adrenocorticotrófica) Podem ocorrer picos de secreção pós-stres ou pós-alimentação. É indicado para o diagnóstico da doença de Addison, em que se encontra extremamente elevado, e no síndrome de Cushing, no qual ajuda no diagnóstico diferencial entre patologia adrenal primária (adenoma ou carcinoma) com valores muito baixos e com o hipercortisolismo ACTH dependente com níveis elevados. Colher entre as 7:00 e as 9:00 horas. Cortisol O seu doseamento é útil no diagnóstico de hipercortisolismo, sendo importante no teste de supressão com dexametasona e no diagnóstico de insuficiência adrenal primária (Addison) ou secundária, no qual o teste de cortirosina (ACTH) geralmente é necessário. Convém lembrar que valores normais não descartam nenhuma das patologias citadas. Deve ser dada atenção especial à possibilidade de outras situações que podem elevar os níveis séricos de cortisol, como stres, obesidade, alcoolismo, gravidez, uso de estrogénios e depressão endógena. Variações nas proteínas séricas (globulina ligada ao cortisol - CBG) podem elevar ou diminuir os níveis de cortisol. Colher entre as 7:00 e as 9:00 horas. Cortisol Urinário Livre Principal teste de triagem para hipercortisolismo. Detecta a fração de cortisol livre. Deve ser avaliado em paralelo com o doseamento de creatinina urinária, em urina de 24 horas, para validar a colheita. 11-Desoxicortisol Sérico (Composto S) Também chamado composto S. Eleva-se no bloqueio da enzima 11-hidroxilase por ser o precursor imediato do cortisol. Alguns pacientes com hirsutismo e níveis basais normais de 11 desoxicortisol podem evidenciar defeitos parciais de síntese no teste de estimulação com ACTH. Deidroepiandrosterona (DHEA) A deidroepiandrosterona, precursora da síntese de testosterona, é um androgénio de fraca atividade. A sua utilização está indicada na avaliação do hiperandrogenismo, como ocorre no hirsutismo, acne, hiperplasia congénita da supra-renal, carcinoma de supra-renal e puberdade precoce. A sua semi-vida é mais curta do que a do seu principal metabolito, o sulfato de deidroepiandrosterona (S-DHEA). Isto permite que seja utilizada na avaliação de respostas da supra-renal aos testes dinâmicos de estimulação e supressão. A hiperresposta do DHEA à estimulação com ACTH é utilizada para o diagnóstico de defeito de síntese da supra-renal. Os níveis séricos são significativamente alterados em condições de stres, variando com a idade, com um pico na fase puberal. Sulfato de Deidroepiandrosterona (S-DHEA) O sulfato de deidroepiandrosterona (SDHEA) é o metabolito da DHEA, e os seus níveis não sofrem grandes alterações com estimulação fisiológica, ao contrário do que ocorre com a DHEA. É encontrado em grande quantidade na circulação, e o seu doseamento pode substituir o doseamento sérico dos 17-cetosteróides urinários. A sua utilidade clínica está na avaliação do hiperandrogenismo, como ocorre no hirsutismo, no acne, no carcinoma de supra-renal e no diagnóstico e controle terapêutico da hiperplasia congénita da supra-renal. Androstenediona É um androgénio produzido pelas supra-renais e gonadas. Útil na avaliação do hiperandrogenismo (hirsutismo, acne), no acompanhamento da hiperplasia congénita da supra-renal e nos tumores virilizantes da supra-renal e ovário. 17-Hidroxiprogesterona (17-OHP) É produzido pelos ovários e supra-renais e sofre variações de acordo com a fase do ciclo menstrual. É importante na avaliação do hirsutismo e para diagnóstico e acompanhamento da hiperplasia congénita da supra-renal por defeito de síntese da 21-hidroxilase. Casos duvidosos podem ser confirmados pelo teste de estimulação com ACTH. 17-Cetosteróides (17-KS) Utilizado na avaliação do hiperandrogenismo, uma vez que representa vários metabolitos urinários de diferentes precursores. Nos homens, dois terços dos 17-KS são derivados do córtex da supra-renal, e um terço, dos testículos. Na mulher, são derivados praticamente da supra-renal. Os 17-KS elevam-se nos tumores adrenais e gonodais, no síndrome do ovário poliquístico e na hiperplasia supra-renal. 17-Hidroxicorticosteróides (17-OHS) Utilizado no diagnóstico de hipercortisolismo, uma vez que representa um grupo de esteróides secretados pela adrenal, incluindo cortisol, 11-desoxicortisol e outros. Várias situações podem elevar os seus níveis, como stres, obesidade e alcoolismo. Aldosterona Deve ser colhida após 1 hora de repouso em decúbito dorsal ou após 2 horas em posição ortostática. São interferências comuns o uso de hipotensores e de diuréticos, o teor de sódio na dieta e a postura. É útil na avaliação da hipertensão e/ou hipotensão arterial. Importante para diagnóstico de hiperaldosteronismo primário e secundário, hipoaldosteronismo, síndrome de Bartter e pseudo-hipoaldosteronismo. Para localização de tumores, podem ser colhidas amostras por cateterismo venoso. No hiperaldosteronismo primário, a aldosterona encontra-se elevada. Já os níveis de renina mostram-se baixos ou indetectáveis, associados com hipocaliémia. Renina elevada com aldosterona elevada sugere hiperaldosteronismo secundário (encontrado na hipertensão renovascular). No síndrome de Bartter, a aldosterona e a renina podem estar elevadas em pacientes normotensos, com potássio baixo. No hipoaldosteronismo, constatamos elevação de potássio com níveis baixos de aldosterona. Na síndrome de resistência à ação da aldosterona (pseudo-hipoaldosteronismo), encontra-se hipercaliémia com aldosterona em níveis elevados. Renina Deve ser colhida após 1 hora de repouso em decúbito dorsal ou após 2 horas em posição ortostática. Pode ser colhida por cateterismo das veias renais. Interferências comuns são o uso de diuréticos, de anti-hipertensivos e de estrogénios, assim como a postura e o teor de sódio na dieta. O seu doseamento é útil na avaliação da hipertensão e/ou hipotensão arterial. Tem um papel importante no diagnóstico de hiperaldosteronismo primário e secundário, hipoaldosteronismo e síndrome de Bartter, e no seguimento de portadores de defeito da 21-hidroxilase em tratamento. Encontra-se diminuída no hiperaldosteronismo primário e no hipoaldosteronismo hipo-reninémico, e elevada no hiperaldosteronismo secundário e no síndrome de Bartter. Deve ser avaliada em associação com os níveis de potássio e de aldosterona. Catecolaminas e Ácido Vanil Mandélico Utilizados na avaliação da hipertensão arterial. Úteis no diagnóstico de feocromocitoma, neuroblastoma, ganglioneuroma, ganglioneuroblastoma e gangliomas. Também empregues na monitorização do tratamento, para avaliar se houve remoção completa do tumor, assim como na avaliação da possibilidade de recidivas. Devido à secreção intermitente de catecolaminas por alguns tumores, várias colheitas devem ser realizadas num curto intervalo de tempo. Em 20 a 30% dos neuroblastomas, o doseamento de AVM pode ser normal. É necessário observar as inúmeras interferências causadas por drogas e pela dieta. Ácido Vanil Mandélico (AVM) Realizado em amostra de urina de 24 h, colhida em frasco especial contendo ácido e após dieta especial. O uso de bebida alcoólica, de reserpina, de inibidores da MAO (monoamino oxidase) e de contrastes radiológicos pode interferir, diminuindo os seus valores. A ingestão de chocolate, chá, cafeína, banana, frutas cítricas, vegetais, baunilha e anfetaminas pode elevar os valores. Catecolaminas Urinárias Realizado em amostra de urina de 24 h, colhida em frasco especial contendo ácido e após dieta especial. O uso de guanetidinas e o uso crónico de inibidores da ECA (enzima conversora da angiotensina), reserpina e bromoergocriptina podem interferir e originar valores reduzidos. A ingestão de bebidas alcoólicas, chá, café, banana, nicotina, teofilina, anfetaminas, levodopa, aldomete e isoproterenol pode elevar os valores. Digoxina Os digitálicos são dos fármacos mais frequentemente prescritos na prática clínica. Devido à sua capacidade de aumentar a força de contracção cardíaca, são usados no controle de taquicardias supraventriculares e no tratamento da insuficiência cardíaca congestiva. A digoxina é um dos digitálicos mais usada. Tem uma semivida de 24 a 48 horas (com uma média de 35 horas). Como a digoxina é eliminada principalmente por meio de excreção renal, os pacientes com função renal reduzida apresentam uma semi-vida sérica mais longa. A digoxina deve ser avaliada até que o efeito terapêutico seja alcançado, no acompanhamento da estabilidade e no uso adequado do fármaco pelo paciente e ao primeiro sinal de aparecimento de efeito tóxico (como anorexia ou arritmia). O doseamento em crianças é aproximadamente 50% maior do que o usado em adultos, quando calculada em miligramas por quilograma de peso corporal. Doses mais altas são necessárias por causa da maior relação de massa cardíaca com a massa corporal em crianças. Estas doses mais altas refletem-se em concentrações séricas mais altas em crianças. A intoxicação digitálica acontece com frequência, já que o intervalo entre os níveis terapêuticos e tóxicos é muito pequeno. Os sintomas clínicos mais comuns de subredosagem são anorexia, náuseas e vômitos, visão turva e desorientação. A manifestação miocárdica mais importante e comum da intoxicação digitálica é a arritmia cardíaca. Frequentemente, o diagnóstico clínico de intoxicação digitálica torna-se difícil em pacientes com patologias cardíacas graves, pois a maioria das manifestações pode ser causada pela doença ou por farmacos. Por isso, o doseamento de digoxina sérica é especialmente útil na interpretação de arritmias. As maiores causas de intoxicação digitálica são a depleção de potássio e a diminuição da função renal com a idade. Alterações da função renal, hipercalcémia, alcalose, mixedema, hipomagnesemia, enfarte do miocárdio recente, hipóxia e hipocaliémia podem aumentar a sensibilidade aos efeitos tóxicos da digoxina. O uso de drogas como quinidina, verapamil, amiodarona, ciclosporina, espirinolactona, entre outras, pode aumentar os níveis séricos por diminuição da clearance da digoxina. Quando diante de níveis séricos abaixo do esperado, deve-se avaliar a presença de doença tiroidiana, má absorção, diminuição do fluxo sanguíneo intestinal por arteriosclerose mesentérica e uso de drogas como laxantes, antiácidos, fenitoína, neomicina e metoclopramida, que podem diminuir a absorção. Outro dado a ser avaliado é o nível de adesão do paciente ao tratamento, tanto na frequência quanto nas doses prescritas. O tempo de colheita da amostra é um factor importante na determinação dos níveis séricos de digoxina. Os níveis séricos elevam-se nitidamente durante a primeira hora depois de uma dose oral. Isto é seguido por uma diminuição quando a digoxina é levada para o miocárdio e outros tecidos. Normalmente, para absorção e armazenamento, quando administrada por via oral, são necessárias 4 a 6 horas, e por via endovenosa, cerca de 30 minutos. Depois disso, os níveis de digoxina no soro tendem a estabilizar, passando a diminuir muito lentamente durante as 24 a 48 horas seguintes. Não é possível determinar com precisão os níveis de digoxina em pacientes em fase de troca de terapia de digitoxina para terapia com digoxina, visto que ambas as drogas podem estar presentes no soro. Os anticorpos anti-digoxina usados na maioria dos testes comerciais para doseamento de digoxina apresentam reacção cruzada significativa com digitoxina (2% a 6% de reação cruzada, com alguns casos que chegam a 40%) e outros digitálicos. O problema da reação cruzada é exacerbado pelo facto de que níveis terapêuticos de digitoxina são aproximadamente 10 vezes mais altos do que os da digoxina. O anticorpo antidigitoxina também apresenta reacção cruzada com digoxina (2% a 4% de reação cruzada), mas, por causa dos níveis terapêuticos mais altos, a interferência da digoxina é menos importante no doseamento de digitoxina. Obtém-se a maior precisão diagnóstica colhendo a amostra de sangue num momento padronizado durante a fase estável, quando os níveis de digoxina no soro reflectem as concentrações cardíacas usuais. Normalmente, o equilíbrio é alcançado num prazo de cerca de 5 dias, e a colheita é realizada imediatamente antes da próxima dose, ou a qualquer momento, aquando da suspeita de intoxicação. Doença de Chagas A tripanossomíase americana ou doença de Chagas é uma parasitose endémica causada pelo Trypanosoma cruzi. Pode cursar com infecções agudas ou crónicas. A forma aguda geralmente é uma doença febril discreta. Pode evoluir, especialmente em crianças, com um quadro mais exuberante, que é caracterizada por febre, anorexia, edema da face e dos membros inferiores, linfadenopatias e hepatoesplenomegalia discreta. Mais raramente ocorre miocardite. Após a fase aguda, o paciente, permanece infectado e passa para uma fase crónica assintomática. A doença crónica sintomática irá manisfestar-se anos ou mesmo décadas após a fase aguda. As clássicas manifestações crónicas relacionam-se com distúrbios de ritmo e condução cardíaca, tromboembolias, miocardiopatia de chagas, megaesófago e megacólon. Nas situações de imunossupressão, pode ocorrer a reactivação do quadro, que muitas vezes é fatal. A transmissão ocorre por vectores hematófagos, mas pode dar-se por via congénita, transfusional e outras formas menos frequentes, como a inoculação involuntária em laboratório. Os métodos serológicos para diagnóstico da doença de Chagas apresentam sensibilidade e especificidade elevadas, sendo úteis para o diagnóstico nas fases aguda e crónica da doença. Entretanto, é possível a reacção positiva por reactividade cruzada com as leishmanioses, especialmente com a forma visceral e as formas cutaneo-mucosas da leishmaniose tegumentar, e com outros antigénios em comum. Por isso, é recomendável a realização de reacções por diferentes métodos como hemaglutinação, imunofluorescência e enzima imunoensaio. Devem ser realizados no mínimo dois métodos, para que se controlem mutuamente, visto que, em cada método, são utilizados diferentes antigénios e formas do parasita, o que permite diminuir a possibilidade de resultados falso-positivos. Resultados positivos devem ser encontrados nos dois métodos utilizados para confirmar o diagnóstico. Nos casos de apenas um método apresentar positividade, torna-se necessária a análise clínica da história epidemiológica, achados clínicos e outros exames diagnósticos complementares. Na fase aguda, anticorpos das classes IgM e IgG são detectáveis. Na fase crónica, são encontrados anticorpos da classe IgG. Os níveis de reactividade diferem para cada método e de acordo com a finalidade do diagnóstico. Os valores considerados para triagem de dadores de sangue são sempre inferiores aos considerados para o diagnóstico clínico. Electroforese da Hemoglobina A realização da electroforese da hemoglobina permite a identificação das diferentes fracções normais e patológicas da hemoglobina. A hemoglobina é separada, de acordo com a sua migração, num meio sólido (acetato de celulose), quando submetida a um campo eléctrico. A visualização das diferentes posições é evidenciada por coloração. É um método importante para investigar a presença das hemoglobinas anormais como a hemoglobina S e C e nas talassemias que podem cursar com aumento da HbA2 e com a presença da HbH. Permite também a quantificação das fracções normais da hemoglobina como A, A2 e Fetal. As fracções podem ser quantificadas por densitometria após eluição. A electroforese é realizada em pH alcalino e pode ser realizada, de forma complementar, também em pH ácido para melhorar a identificação de hemoglobinopatias, já que outras fracções anómalas podem migrar na mesma posição das hemoglobinas S e C como as HbD e HbE Electroforese das Proteínas O plasma humano contém mais de 500 proteínas identificáveis. Entre essas, estão presentes proteínas transportadoras, anticorpos, enzimas, inibidores enzimáticos, factores da coagulação e proteínas com outras funções. A avaliação das concentrações de proteínas séricas e as proporções das diferentes fracções de proteína têm considerável valor no diagnóstico de patologias agudas e crónicas. A electroforese das proteínas no soro é uma técnica simples para separar as proteínas do soro. É o teste de triagem mais utilizado para investigação de anomalias das proteínas séricas. Em condições normais, são separadas cinco bandas do soro: albumina, alfa-1, alfa-2, beta e gamaglobulinas. Eventualmente, pode ser observada a presença da pré-albumina. O reconhecimento de paraproteínas, normalmente encontradas nas gamapatias benignas ou malignas é o uso diagnóstico mais importante para a electroforese das proteínas. Quando alteradas, as bandas apresentam-se com padrões conhecidos para importantes patologias. A banda de albumina é relativamente homogenea, porém as demais são compostas por uma mistura de diferentes proteínas. Informações adicionais podem ser encontradas nos títulos referentes às diferentes proteínas que compõem as bandas identificadas pela electoforese como: albumina, alfa-1-antitripsina, alfa-1-glicoproteína ácida, haptoglobina, ceruroplasmina, entre outras. Pré-Albumina Sintetizada pelo fígado, tem como função conhecida o transporte da tiroxina e desempenhar um papel significativo no metabolismo da vitamina A. Forma um complexo com o retinol, que se liga posteriormente à vitamina A. Devido à sua baixa concentração no soro, com frequência não se traduz na electroforese das proteínas séricas. Contudo, consegue ultrapassar a barreira hemato-encefálica e pode também ser sintetizada por células do plexo coróide, o que explica seu aparecimento frequente na electroforese do líquor cefalorraquidiano. Os níveis de pré-albumina estão significativamente diminuídos em diversas patologias hepáticas e aumentados em pacientes que usam esteróides, como também na falência renal e durante a gravidez. Por ter uma semi-vida muito curta e ser bastante sensível às variações do aporte alimentar e ao estado funcional hepático, é considerada um bom marcador do estado nutricional. Albumina É a proteína mais abundante no plasma, responsável por cerca de 60% da concentração total de proteínas. É sintetizada exclusivamente pelo fígado, aparecendo primeiro no citoplasma dos hepatócitos como um precursor chamado pré-albumina. Possui um papel muito importante em diversas funções do organismo, como o transporte de diferentes substâncias e em especial na manutenção da pressão oncótica. Foram descritas mais de 20 variantes genéticas de albumina. O tipo mais comum é chamado albumina A. Essas albuminas variantes podem resultar numa faixa de albumina larga na electroforese das proteína séricas ou podem dar origem a duas faixas distintas (bis-albuminémia). Nenhuma dessas variantes foi ainda associada a manifestações patológicas. Na rara síndrome de ausência congénita de albumina, os pacientes podem apresentar edema moderado, mas podem poupar as consequências hemodinámicas com a utilização de mecanismos compensatórios, como o aumento das globulinas do plasma, que assumem algumas das funções da albumina. O problema bioquímico principal nesses pacientes é uma alteração no metabolismo lipídico, como o aumento de colesterol, fosfolipídios e outras lipoproteínas. Alfa-1-Globulinas A alfa-1-antitripsina corresponde a cerca de 90% das proteínas que correm na faixa das alfa-1-globulinas. A deficiência da alfa-1-antitripsina está associada ao enfisema pulmonar e à cirrose hepática. Só é detectável pela electroforese quando homozigótica; os estados heterozigóticos só podem ser identificados por técnicas imunoenzimáticas que também são utilizadas para confirmação das deficiências homozigóticas. É uma das proteínas de fase aguda e pode ser encontrada noutros fluidos orgânicos, como lágrimas, sémen, bile e líquido amniótico. Nos 10% restantes, estão a alfa-1-glicoproteína ácida, a alfafetoproteína e outras proteínas. Os níveis elevam-se nas doenças inflamatórias agudas e crónicas, neoplasias, após traumas ou cirurgias e durante a gravidez ou terapia com estrogénios. Nos carcinomas hepatocelulares, a elevação pode acontecer devido ao aumento da alfafetoproteína. Alfa-2-Globulinas Incluem a haptoglobina, a alfa-2-macroglobulina e a ceruloplasmina. Raramente se encontram alterações nessa banda electroforética, já que a diminuição de um componente é compensada pelos demais mesmo dentro dos valores de referência. Níveis elevados de alfa-2-macroglobulina associados à diminuição da albumina acontecem no síndrome nefrótico. Os níveis de haptoglobina e de ceruloplasmina podem apresentar-se elevados em numerosas situações que levam à reacção de fase aguda. Os níveis de haptoglobina apresentam-se diminuídos nas hepatopatias graves, na anemia megaloblástica, nas situações de aumento da hemoglobina livre, como na hemólise de eritrócitos ou na reabsorção de grandes hematomas e na terapia com estrogénios e corticóides. Os níveis de ceruloplasmina aumentam na terapia comestrogénios e encontram-se diminuídos na doença de Wilson, na desnutrição, no síndrome nefrótico e nas enteropatias com perda de proteínas. Betaglobulinas Composta pelas beta-lipoproteínas (LDL), transferrina, C3 e outros componentes do complemento, beta-2-microglobulina e antitrombina III. A redução dessa banda é rara. A anemia por défice de ferro leva ao aumento da transferrina. O hipotiroidismo, a cirrose biliar, as nefropatias e alguns casos de diabetes mellitus podem evidenciar-se pelo aumento de colesterol e consequente aumento das betalipoproteínas (LDL). A beta-globulina está elevada nos casos de icterícia obstrutiva e menos frequentemente nalguns casos de hepatite. Quase sempre, está elevada nos casos de cirrose hepática. Nesses casos, pode aparecer junto com sobreposição ou fusão das bandas beta e gama pelo aumento de IgA, que ocorre nas cirroses hepáticas, infecções de pele ou respiratórias e na artrite reumatóide. Elevações causadas normalmente pelo aumento dos componentes do complemento podem ocorrer na hipertensão maligna, doença de Cushing, poliartrite nodosa e carcinomas. Gamaglobulinas Composta pelas imunoglobulinas, predominantemente pela IgG. As imunoglobulinas A,M,D,E e proteína C reactiva encontram-se na área de junção beta-gama. A ausência ou a diminuição da banda gama indica imunodeficiências congénitas ou adquiridas. O aumento dessa banda sugere o aumento policlonal das gamaglobulinas associadas a doenças inflamatórias crónicas, reacções imunes, doenças hepáticas ou neoplasias disseminadas. Bandas oligoclonais podem eventualmente ser observadas em infecções víricas crónicas, nalgumas infecções bacterianas como as pneumonias por pneumococos e as hepatites crónicas activas. Tuberculose, sarcoidose, linfogranuloma venéreo e sífilis terciária são doenças crónicas que levam ao aumento dessa banda. Artrite reumatóide, lúpus eritematoso sistémico e outras colagenoses podem apresentar níveis normais a acentuadamente aumentados, dependendo da fase de actividade da doença. Níveis aumentados também são encontrados em linfomas malignos, doença de Hodgkin e leucemia linfocítica crónica. Tipicamente, a macroglobulinemia de Waldenström e o mieloma múltiplo exibem um pico homogéneo, que pode ou não resultar do aumento total da banda gama. As hepatopatias cursam frequentemente com aumento da banda das gamaglobulinas. Na hepatite, verifica-se um aumento das beta e gamaglobulinas com redução da albumina. Nas cirroses, o padrão mais sugestivo consiste na elevação da gamaglobulina de base ampla, juntamente com a fusão da beta e da gamaglobulina, sem a individualização dos picos da chamada fusão beta-gama. Apenas cerca de 20% dos cirróticos apresentam a fusão completa, e cerca de 3% apresentam a fusão parcial. Alguns Padrões Electroforéticos Típicos A diminuição das bandas da albumina, alfa-1, beta e gamaglobulinas com a elevação da faixa alfa-2 é um padrão de perda seletiva de proteínas, como a que ocorre no síndrome nefrótico. Entretanto, convém lembrar que é necessário uma diminuição de pelo menos um terço na concentração da albumina para que seja possível a visualização na electroforese. A alteração característica das reacções de fase aguda consiste no aumento da alfa-1 e alfa-2-globulinas, quase sempre associado à diminuição da albumina. O aumento isolado da banda alfa-1 pode ser observado nas hepatites crónicas, nas reacções de fase aguda acompanhadas de hemólise, na gravidez e durante a terapia de estrogénios. O aumento predominante da banda alfa-2 pode ser observado em patologias que cursam com vasculites como a artrite reumatóide ou nas doenças por imunocomplexos. Podem aparecer faixas normalmente não-visualizadas, como um pico que pode surgir entre a albumina e a região alfa-1, como resultado de um aumento da alfafetoproteína. Um grande aumento de proteína C reactiva numa reacção de fase aguda severa pode gerar uma leve faixa na região gama. O aumento de lisozimas observadas na leucemia monocítica pode produzir uma faixa depois da região de gama. O pico monoclonal apresenta-se na região gama, menos frequentemente na faixa beta e, em raros casos, na região alfa-2. Consiste num pico alto e relativamente delgado, homogéneo e fusiforme, que normalmente está associado aos casos de mieloma ou são consequência de patologias como macroglobulinemia de Waldeström, gamapatias monoclonais secundárias e idiopáticas. Em contraste com os aumentos policlonais, as gamapatias monoclonais produzem um padrão muito específico. As bandas monoclonais ocorrem pelo aumento de clones de imunoglobulinas distintas, secretadas por uma proliferação monoclonal de células plasmáticas, acompanhada de quantidades progressivamente menores das imunoglobulinas policlonais, à medida que as células plasmáticas normais são substituídas pelos clones malignos. AVALIAÇÃO LABORATORIAL DA ELECTROFORESE DAS PROTEÍNAS Electroforese da Urina A electroforese de proteínas da urina, assim como do soro, é uma técnica simples para separar as proteínas presentes na urina. A indicação mais importante da realização da electroforese de proteínas na urina é o reconhecimento de paraproteínas nas gamapatias benignas ou malignas, especialmente no mieloma múltiplo. Na presença de proteína de Bence Jones (cadeias leves), métodos específicos de identificação, como a análise de cadeias kappa e lambda, podem ser realizados para um diagnóstico mais específico. Electroforese do Líquor A realização da electroforese do líquido cefalorraquidiano (LCR) pode auxiliar na quantificação da proporção albumina/globulinas. A sua maior utilidade está na identificação de bandas oligoclonais presentes em 70 a 90% dos pacientes com esclerose múltipla. Entretanto, bandas oligoclonais de IgG também podem ser encontradas em diferentes situações como pan-encefalite esclerosante subaguda, encefalite por caxumba, em pacientes com infecção pelo HIV, meningite criptocócica, linfoma de Burkitt, neurossífilis, síndrome de Guillain-Barré, carcinomatose meníngia, toxoplasmose e meningoencefalites víricas e bacterianas. Na presença de lesões traumáticas do SNC, podem cursar nas fases iniciais com um aumento dos níveis de alfa-2-globulina. Como as alterações das imunoglobulinas podem ser derivadas de alterações séricas, é importante a realização concomitante da electroforese do soro e do líquor. Os casos duvidosos devem ser confirmados por outras técnicas, como a imunofixação. Enolase Neurónio-Específica (NSE) A enolase neurónio-específica (NSE) é uma enzima glicolítica que existe na forma de diversas isoenzimas diméricas: alfa-alfa, alfa-beta, beta-beta e gama-gama. Dessas subunidades, as isoenzimas alfa-gama e gama-gama são as enolases neurónio-específica que são encontradas principalmente nos neurónios e nas células neuroendócrinas. É um marcador diagnóstico de relativa especificidade (85%) para carcinoma de pequenas células de pulmão. Pode ser usado para monitorizar os efeitos da terapia e indicar recidivas antes das evidências clínicas. É encontrado também noutras condições malignas como neuroblastoma, melanoma, carcinoma de células das ilhotas pancreáticas e hipernefroma. No neuroblastoma, o NSE correlaciona-se com o prognóstico, mas não é útil para o acompanhamento das recidivas. Epstein-Barr Vírus (EBV) O vírus Epstein-Barr (EBV) é um herpesvírus humano conhecido por causar a mononucleose infecciosa e também pela sua provável participação na etiologia de alguns carcinomas (nasofaríngeo), linfomas (linfoma de Burkitt) e doenças linfoproliferativas em pacientes imunodeprimidos. Recentemente, foi descrita o síndrome ativo crónica severo, no qual a linfoproliferação continua activa. Já o papel etiológico do EBV noutras patologias como artrites reumáticas, doença de Hodgkin e síndrome de fadiga crónica ainda não está bem definido. Na fase aguda da mononucleose infecciosa, anticorpos IgM e IgG para antigénios precoces do EBV (EA), antígénios da capsíde viral (VCA) e antigénios nucleares (EBNA) aparecem em sequência. A pesquisa mais utilizada é a de anticorpos IgM contra VCA por enzima imunoensaio. A positividade indica infecção aguda. Entretanto, a presença de anticorpos IgM para VCA ou IgM /IgG para EA, com ausência ou baixa concentração de anticorpos contra EBNA, indica infecção recente ou em curso. A presença de anticorpos contra VCA e a relação IgG/ IgM inferior a 1 podem auxiliar no diagnóstico de casos dificeis. A análise da avidez de anticorpos IgG contra VCA do EBV também é útil em casos de reactivação ou infecção recente. A persistência de EA e/ou VCA IgG em títulos altos indica infecção crónica pelo EBV. A pesquisa de anticorpos específicos para EBV deve ser realizada nos quadros de mononucleose para confirmação do diagnóstico ou nos casos de suspeita clínica que cursa com anticorpos heterófilos negativos, não sendo diagnosticada pelo métodos tradicionais, e também para o diagnóstico diferencial das patologias que podem mimetizar um quadro de mononucleose (mononucleose-like), como hepatites víricas agudas, colagenoses, síndrome de seroconversão do HIV-1, citomegália e toxoplasmose. A comparação de métodos de cultura de células e a amplificação genómica por PCR indica a maior sensibilidade da técnica molecular (PCR ) na detecção de EBV. A infecção crónica por EBV pode ser detectada pela presença do DNA-EBV em sangue periférico por PCR. Em pacientes em tratamento profilático com imunoglobulinas, o diagnóstico serológico pode acarretar problemas relativos a reacções falsopositivas. A técnica de PCR usando células mononucleares de sangue periférico pode ser usada para o diagnóstico preciso e precoce da infecção por EBV em pacientes altamente vulneráveis, com doenças linfoproliferativas, nos quais a PCR se apresenta altamente sensível, mesmo em amostras de saliva. A PCR é útil em detectar o EBV noutras patologias tais como pneumonia intertiscial, pericardite e miocardites a partir da análise de tecidos ou de líquidos. Entretanto, deve-se ter o cuidado de proceder à avaliação qualitativa e quantitativa em amostras colhidas em diferentes datas, além da correlação clínica para a confirmação da relação entre os sintomas e a etiologia vírica. Consultar Mononucleose Infecciosa Eritropoietina A eritropoietina (EPO) é um factor regulador na formação dos glóbulos vermelhos do sangue. O rim é responsável por 90% da síntese da EPO circulante. Em situações anormais, pode ser produzida noutros órgãos, como ocorre nos casos de neoplasias. O seu doseamento está indicado na avaliação das anemias, policitemias, como marcador nalguns tumores e na monitorização dos níveis terapêuticos de EPOrecombinante. Os níveis séricos estão diminuídos na policitemia vera, na insuficiência renal crónica e na doença de Hodgkin. Níveis elevados podem ser encontrados em condições que cursem com hipóxia, como em grandes altitudes, presença de hemoglobinas anormais, cardiopatias e pneumopatias. Exame Directo para Fungos O exame microscópico directo de amostras clínicas tem como finalidade detectar a presença de fungos em material colhido de pacientes com suspeita de infecção fúngica. A presença de fungos pode ser detectada por meio de diferentes colorações, tais como: hidróxido de potássio 20%, isolado ou acrescido de tinta Parker ou de DMSO (dimetilsulfóxido) e Giemsa. A escolha da coloração varia conforme o tipo de material a ser analisado e a suspeita clínica. A visualização de estruturas fúngicas em material clínico é um importante instrumento diagnóstico. O exame directo pode fornecer identificação completa ou parcial do fungo (quando apenas o género ou o grupo pode ser identificado). Em ambos os casos, proporciona informação necessária para a escolha da conduta terapêutica. Em certos casos, a identificação pelo exame directo é o único exame necessário para o diagnóstico. São exemplos dessa situação a identificação dos agentes etiológicos de algumas micoses, como pitríase versicolor (Malassezia furfur), lobomicose (Loboa loboi), rinoesporodiose, adiaspiromicose. Noutras micoses, o agente pode ser identificado pelo exame directo, como por exemplo o Paracoccidioides brasiliensis e o Cryptococcus neoformans. Entretanto, é necessário proceder à realização da cultura para fungos. Trata-se de um exame indispensável, visto que os fungos podem permanecer presentes no exame directo por longo tempo, mesmo após o tratamento, sem no entanto serem viáveis. Portanto, não representa um bom parâmetro para controlo de cura. As amostras deverão ser colhidas em frasco estéril, de maneira asséptica. Os materiais biológicos necessários são: escamas de pele, unhas e pêlos (micoses superficiais e cutâneas); aspirado de lesões, secreções, biópsias de pele (micoses subcutâneas); expectoração, lavado brônquico, aspirado brônquico, escovado brônquico (micoses sistémicas); secreções: pulmonar, vaginal, traqueal, orotraqueal, de lesões cutâneas, abdominal, oral, de conjuntivas ou de qualquer outra localização (micoses sistémicas); sangue, biópsia de qualquer órgão ou tecido, urina, líquor, líquido sinovial, ascítico, amniótico ou outros líquidos orgânicos (micoses sistémicas). As infecções fúngicas podem atingir qualquer órgão ou tecido do corpo humano. Portanto, qualquer material biológico pode ser analisado para a pesquisa de fungos. Os resultados devem ser interpretados de acordo com o tipo de material e o local da lesão. Muitas vezes, o fungo pode ser parte da flora local, não tendo significado clínico. Exame Microscópico Directo para Fungos com Tinta-da-China É utilizado para a pesquisa de leveduras do género Cryptococcus em qualquer material clínico. As amostras são coradas com tinta-da-china, com a finalidade de visualizar as leveduras encapsuladas. A tinta-da-china não é capaz de penetrar na cápsula dessas leveduras, mas é capaz de corar todo o material em negro, permitindo o fácil reconhecimento das leveduras encapsuladas, que permanecem claras. A sua presença é indicativa de criptococose, e o seu achado é fundamental para confirmação diagnóstica, embora não permita garantir que as leveduras sejam viáveis. A sua viabilidade terá que ser avaliada pela confirmação por realização da cultura para fungos, visto que podem permanecer presentes no exame directo por um longo tempo, mesmo após o tratamento, sem no entanto serem viáveis. Portanto, não representam um bom parâmetro para controlo de cura. Exame Parasitológico de Feses A investigação da presença de parasitas nas fezes é realizada pela pesquisa de ovos ou larvas de helmintas, e nas infecções por protozoários, quando se encontram cistos ou oocistos nas fezes. O exame parasitológico de fezes frescas possui uma excelente especificidade. Entretanto, a sua sensibilidade só será adequada (95%) se forem solicitados exames de pelo menos três amostras de fezes em dias distintos. Portanto, um resultado negativo numa única amostra não elimina a possibilidade de uma parasitose. A positividade vai depender de diferentes factores. O estadio da infecção, o ciclo do parasita, da eliminação intermitente de formas de resistências, da intensidade do parasitismo e o exame propriamente dito, que utiliza apenas uma pequena amostra de todo o material colhido, são alguns dos factores que interferem na possibilidade de o exame se revelar positivo. Além disso, algumas parasitoses necessitam de exames especiais para serem identificadas, como por exemplo o Enterobius vermicularis, sendo também o caso da investigação da presença de trofozoitos. São necessárias fezes frescas colhidas no frasco de plástico. No caso de fezes sólidas ou pastosas, a quantidade deverá corresponder a 5 colheres plásticas fornecidas com o frasco de colheita. Se as fezes estiverem liquefeitas, pelo menos 10 mL deverão ser fornecidos ao laboratório para análise. As fezes deverão ser colhidas originalmente num recipiente limpo e a seguir transferidas para o frasco fornecido pelo laboratório. O paciente não deve estar a fazer laxantes ou ter sido submetido a contrastes radiológicos nos 3 dias anteriores à colheita. Durante a colheita, é importante evitar a contaminação pela urina, pois a sua presença acelera a fermentação bacteriana, prejudicando a conservação. ACHADOS PATOGÉNICOS MAIS FREQUENTES Ascaris lumbricoides Hymenolepis diminuta Cryptosporidium sp. Hymenolepis nana Dietamoeba fragilis Isospora beli Entamoeba Strongyloides histolytica stercolaris Enterobios Trichuris trichiura vermicularis Giardia lamblia Schistosoma mansoni ACHADOS NÃO PATOGÉNICOS Chilomastix mesnillii Endolimax nana Entamoeba coli Iodamoeba butschlii Exame Parasitológico de Feses/ MIF Como estão presentes amostras de fezes de 3 dias diferentes, a sensibilidade do exame aumenta. É útil na pesquisa de estrutura de resistência de helmintas (ovos e larvas) e protozoários (cistos e oocistos). As amostras de fezes são colhidas durante 3 dias consecutivos ou não (emissões diferentes), em líquido conservante MIF (Merthiolate-Iodo-Formol). No casos de fezes sólidas ou pastosas, deverá ser considerada como medida uma colher fornecida com o frasco de colheita de cada emissão. Se as fezes estiverem liquefeitas, deverão ser colhidos aproximadamente 2 ml de cada emissão. As fezes deverão ser colocadas num frasco com líquido conservante (MIF), tendo-se o cuidado de colocar pequenas porções de fezes de 3 emissões diferentes, misturando bem todas as fezes. Deve-se evitar encher demais o frasco, pois as fezes devem ficar totalmente cobertas pelo líquido conservante. Manter em local fresco. Contra-indicados laxantes e enemas. O paciente não deve ter sido submetido a contrastes radiológicos nos 3 dias anteriores à colheita. Factor Reumatóide O termo factor reumatóide (FR) engloba um grupo de auto-anticorpos das classes IgG, IgM e IgA que tem em comum a capacidade de reagir com diferentes epítopos da porção Fc da molécula da imunoglobulina G humana. Apesar da pequena evolução no conhecimento dos mecanismos de ligação do FR aos auto-antigénios e do seu envolvimento no processo patológico típico da artrite reumatóide (AR), o FR IgM pode servir como marcador precoce na AR, apoiando-se em dados que demonstram que o risco de desenvolvimento de AR aumenta de forma proporcional ao aumento da concentração de FR em indivíduos normais. Os pacientes com artrite que cursam com FR positivo, principalmente quando se encontram em concentrações elevadas, correm maior risco de apresentar complicações clínicas e uma menor resposta à terapia. O FR está presente em cerca de 50-90% dos casos de AR clássicos, alguns meses após o início da doença, e dessa percentagem, 17% em média apresentam-se negativos nas fases mais precoces da doença. Durante a fase activa, são encontradas concentrações mais elevadas, que começam a decair à medida que o paciente evolui para a remissão clínica, mantendo-se positivas em níveis baixos e estáveis e tornando a elevar-se nos períodos de reactivação da doença. O FR está aumentado também em 75 a 95% dos quadros de síndrome de Sjögren, em 50 a 60% dos pacientes com doença mista do tecido conjuntivo (DMTC), em 15 a 35% dos casos de lúpus eritematoso sistémico (LES), em 20 a 30% dos casos de esclerodermia, noutros casos de colagenoses e noutras patologias, como nefropatia e crioglobulinemia. Sabe-se hoje que o FR não é produzido apenas sob condições patológicas, e uma pequena parcela da população normal, especialmente os idosos, pode apresentar positividade para FR. Essas percentagens de incidência, tanto nas patologias como nos pacientes normais, assim como a ocorrência de falsos positivos, variam de acordo com a sensibilidade e a especificidade do método utilizado. Os ensaios tradicionais para investigação do FR empregavam partículas de látex revestidas por imunoglobulina G humana (prova do látex) ou, na hemaglutinação indirecta, hemácias de carneiro, revestidas por imunoglobulina de coelho (reacção de Waller-Rose). A prova do látex era considerada mais sensível, e a reacção de Waller- Rose, mais específica. Realizadas em conjunto, forneciam dados complementares. Actualmente, o método de referência para a pesquisa do FR é a nefelometria, que fornece um resultado numérico em UI/mL, em vez dos resultados em títulos, resultantes de diluições fornecidas pelo método anterior (látex), o que permite um melhor acompanhamento dos pacientes. Com a nefelometria, podem ser identificadas três classes de auto-anticorpos, isto é o FR das classes IgG, IgM e IgA. A identificação e a quantificação da classe do FR que se encontra elevada podem ser realizadas pelo método de ensaio imunoenzimático. A utilidade clínica dessa individualização e quantificação tem sido cada vez mais explorada. Por exemplo, a presença de FR IgA nas manifestações extra-articulares da AR com ausência de FR IgM ou IgG; a predominância na AR de FR IgM, sendo que o FR IgG e IgA estão geralmente presentes, mas em baixa frequência e quantidade. É rara a detecção concomitante do FR das três classes noutra patologia que não a artrite reumatóide. Afoiçameto das Hemácias ou Faucização das Hemácias O teste de afoiçamento reproduz in vitro as condições de baixa tensão de oxigénio que levam as hemácias que contêm hemoglobina S a sofrerem falcização. Para isso, são utilizadas substâncias redutoras, como o metabissulfito de sódio. É importante lembrar que o teste é positivo para anemia falciforme, na presença de traço falcêmico e também para algumas outras variantes anormais da hemoglobina, como a Hb Bart e a HbC Harlem. O teste pode ser falsamente negativo em baixas concentrações de HbS e em altas concentrações de Hb fetal. Fenitoína Trata-se de uma droga anticonvulsivante, utilizada no tratamento da epilepsia, de outros estados convulsivos secundários e nalguns casos de intoxicação digitálica e arritmias cardíacas. Actua modulando o canal sináptico de sódio e prolongando a inactivação, o que reduz a habilidade do neurónio de responder à alta frequência. O efeito fisiológico dessa acção é a redução da transmissão sináptica central, ajudando ao controlo de excitabilidade dos neurónios anormal. A absorção do fármaco é lenta e por vezes incompleta. Cerca de 90% do fármaco está ligada a proteínas. Apenas a fracção livre (cerca de 10%) é biologicamente activa. É metabolizada no fígado, sendo a maior parte excretada na bilis na forma de metabolitos inactivos, que são reabsorvidos no intestino e excretados na urina. Independentemente de estar nos níveis normais, a fenitoína pode interferir na ação de outros fármacos como anticoagulantes orais, ciclosporina, teofilina e contraceptivos orais. Pode diminuir a concentração sérica ou a eficácia de outras drogas, como a carbamazepina, ácido valpróico, primidona, corticosteróides, dopamina e cloranfenicol. Níveis baixos são encontrados, geralmente, nos casos de não-adesão ao tratamento ou de utilização inadequada pelo paciente. Os problemas de absorção são mais frequentes e importantes em crianças, especialmente até os primeiros 3 meses de vida. Níveis elevados encontrados em pacientes com uso crónico e adequadamente monitorizados, sem alteração da posologia, podem ocorrer por interacções medicamentosas ou infecções. As drogas que podem interagir, elevando os níveis séricos de fenitoína, são, entre outras, antidepressivos tricíclicos, cloranfenicol, cimetidina, amiodarona, sulfas, fenilbutazona, etanol, halotano e metronidazol. Os valores de pico normalmente aparecem entre 4 a 5 horas após a última dose. Entretanto, a grande variação inter-individual de metabolização faz com que os níveis do fármaco necessários para alcançar os níveis terapêuticos e os momentos de pico sejam extremamente variáveis. A semi-vida é de 20 a 40 horas nos adultos e de cerca de 10 horas nas crianças. São considerados níveis terapêuticos valores entre 10 a 20 mg/mL. Entretanto, como já citado, a grande variação individual tanto na absorção quanto na velocidade de metabolização do fármaco faz com que esses valores possam variar de paciente para paciente, sendo aceite como nível terapêutico ideal aquele que não apresente efeitos tóxicos e no qual não ocorram convulsões. Os efeitos tóxicos manifestam-se por sonolência, ataxia, nistagmo, diplopia , disartria e confusão mental. Apesar das variações individuais, raramente se observam sinais clínicos abaixo dos valores definidos como terapêuticos. O nistagmo geralmente apresenta-se com valores acima de 20 mg/mL. Já a ataxia é observada mais frequentemente em níveis entre de 25 a 30 mg/mL, e a disartria e a sonolência, em níveis de 40 mg/mL Recomenda-se que a colheita seja realizada imediatamente antes da dose seguinte e com níveis estáveis (cerca de 7 dias de tratamento), ou a qualquer hora, caso se suspeite de intoxicação. Fenobarbital É um barbitúrico de acção prolongada, frequentemente utilizado no tratamento dos quadros de convulsões tónico-clónicas generalizadas e convulsões parciais simples com sintomas motores, formas de epilepsia focal, bem como na ansiedade e na insónia. A monitorização dos níveis séricos é fundamental para se obterem os melhores níveis terapêuticos, evitando-se os efeitos colaterais. Ou seja, é importante para individualizar a posologia de cada paciente. Níveis baixos são encontrados frequentemente por não adesão ao tratamento. Porém, algumas interações medicamentosas também podem levar a concentrações séricas baixas. Níveis séricos elevados são encontrados com o uso concomitante de ácido valpróico, que inibe o metabolismo do fenobarbital, e nos casos de doses inadequadas. O fenobarbital é metabolizado pelo fígado e tem uma semi-vida longa, de 50 a 140 horas, o que leva ao risco de doses cumulativas. Cerca de 40 a 50% está ligado à proteína. O fenobarbital pode afetar o metabolismo da fenitoína, acelerar a clearance de eliminação do cloranfenicol, teofilina, anticoagulantes orais, ciclosporina e contraceptivos orais. Pode diminuir a concentração sérica ou o efeito da fenilbutazona, griseofulvin, beta-bloqueadores, teofilina, corticóides, antidepressivos triciclícos, quinidina, haloperidol e propoxifeno. A furosemida, o ácido valpróico e os salicilatos podem inibir o metabolismo do fenobarbital, levando a um aumento de sua concentração sérica. A sua actividade é aumentada quando associada ao uso de bebidas alcoólicas, anti-histamínicos, neurolépticos e antidepressivos tricíclicos. O uso de fenobarbital acelera a degradação de outros agentes antiepilépticos, anticoagulantes orais, neurolépticos e contraceptivos orais. O uso de fenobarbital pode levar ao aumento da fosfatase alcalina, da gama GT e à diminuição da bilirrubina e do cálcio sérico. O fenobarbital aumenta o metabolismo da bilirrubina por indução enzimática e pode ser utilizado nos casos de hiperbilirrubinémia congénita (não- hemolítica, familiar, não-obstrutiva). Os pontos de equilíbrio são alcançados nos adultos em 10 a 25 dias e, em crianças, entre 7 a 17 dias. A média é de 14 a 21 dias. O pico é atingido entre 6 a 18 horas após a administração. Os efeitos colaterais mais frequentes são sonolência, nistagmo, ataxia e disartria. Em doses elevadas, pode provocar o aumento da frequência das convulsões. Recomenda-se que a colheita seja realizada imediatamente antes da dose seguinte e com níveis estáveis (cerca de 7 dias de tratamento), ou a qualquer hora caso se suspeite de intoxicação. Ferritina A ferritina é a mais importante proteína de reserva do ferro e é encontrada em todas as células, especialmente naquelas envolvidas na síntese de compostos férricos e no metabolismo e na reserva do ferro. O doseamento da ferritina é o mais fiel indicador da quantidade de ferro armazenada no organismo. A sua grande utilidade clínica está no diagnóstico diferencial entre as anemias hipocrómicas e microcíticas por deficiência de ferro de anemias por outras etiologias. Nesses casos, a ferritina diminui antes das alterações dos níveis de ferro sérico e das alterações morfológicas da série vermelha. Entretanto, por fazer parte do grupo de proteínas de fase aguda, a ferritina elevase em resposta a infecções, traumatismos e inflamações agudas. A elevação ocorre nas 24 a 48 horas iniciais, com um pico no terceiro dia, e mantém-se por algumas semanas, o que pode dificultar a sua interpretação. Os seus níveis podem elevar-se no excesso de ferro, em pacientes transfundidos e em neoplasias, especialmente nas leucemias e linfomas e nos carcinomas de mama, fígado, pulmão, cólon e próstata. Elevam-se também nas anemias hemolíticas e megaloblásticas e nas lesões hepáticas, especialmente as lesões alcoólicas. Cerca de 25% dos pacientes com hepatite crónica têm aumento da ferritina. Ferro O ferro é absorvido principalmente na parte superior do duodeno e no jejuno. Uma vez absorvido, liga-se à transferrina plasmática. A maior parte do ferro circulante é captada pelos precursores eritróides na medula óssea para formar a hemoglobina. A hemoglobina utiliza cerca de 80% do ferro corporal. O restante é armazenado no interior das células reticulares da medula óssea, baço e fígado, 60% sob a forma de ferritina e cerca de 40% como hemossiderina. Portanto, a distribuição do ferro corporal é feita entre compartimentos: o funcional - hemoglobina, mioglobina, enzimas heme e não-heme, o de transporte transferrina - e o de reserva - ferritina e hemossiderina. A maior parte do ferro corporal é proveniente da dieta. É ingerido no estado férrico e, para a sua absorção, precisa estar na forma reduzida (ferroso). Por isso, a absorção é influenciada por factores redutores gastrointestinais, pH gástrico e composição da dieta, como a presença de ácido ascórbico, que mantém o ferro no estado ferroso. Outra fonte do ferro é a proveniente do processo de degradação da hemoglobina, quando o ferro é libertado da hemoglobina e retorna à transferrina plasmática. Ao contrário de outros elementos, a homeostase do ferro é regulada pelo controlo da absorção, estando directamente relacionada às reservas de ferro e ao nível de eritropoiese. Quando as reservas de ferro diminuem ou o nível de eritropoiese aumenta, a taxa de absorção de ferro aumenta de forma compensatória. Os sinais clínicos da deficiência de ferro resultam de um longo período de desequilíbrio no balanço de ferro. Inicialmente ocorre uma depleção das reservas, sem alterações nos níveis de ferro sérico, o que pode ser evidenciado pela redução dos níveis de ferritina. Essa diminuição das reservas leva ao aumento da absorção intestinal de ferro. Num segundo momento, com as reservas já depletadas, mas com o nível de hemoglobina ainda normal, algumas alterações podem já ser evidenciadas, como a presença de hemácias microcíticas no exame do sangue periférico, mesmo com volume corpuscular médio (VCM) normal, presença de anisocitose, diminuição da saturação de transferrina e da ferritina e aumento do TIBC (capacidade total de combinação do ferro). Finalmente, os níveis de hemoglobina começam a cair, instalando-se um quadro clássico de anemia ferropriva, com diminuição do ferro sérico, da hemoglobina, do VCM, da saturação da transferrina e da ferritina. A deficiência de ferro pode ocorrer por diferentes mecanismos: - Por aumento das necessidades, como ocorre na gravidez, na lactação e na fase de rápido crescimento. - Por diminuição da ingestão, numa dieta pobre em proteínas animais. - Por diminuição da absorção, como nos casos de cirurgias ou de patologias que levem a má absorção. - Por perda excessiva, como sangramentos agudos ou crónicos. A perda sanguínea constitui a causa mais importante de deficiência de ferro em adultos. Nos homens e nas mulheres na pós-menopausa, quase sempre é consequência de perda sanguínea pelo tubo gastrointestinal, causada por patologias benignas e malignas. O uso crónico de medicamentos como antiinflamatórios, corticoesteróides, salicilatos e também o uso de álcool podem causar ou agravar os quadros gastrointestinais. Nas mulheres, a hemorragia vaginal é também um factor importante. Quando a perda é aguda, leva a uma anemia normocrómica e normocítica, e, quando crónica, a uma anemia microcítica hipocrómica. A hemorragia crónica quase sempre esgota as reservas corporais de ferro, pelo esforço contínuo da medula em restaurar os níveis circulantes de hemoglobina. A pesquisa de sangue oculto é um exame importante na investigação dos pacientes com anemia ferropriva e deve ser realizada em amostras múltiplas para impedir a possibilidade de negatividade quando as perdas sanguíneas são intermitentes. A deficiência de ferro por ingestão inadequada quase sempre é subclínica. A infecção por ancilostomídeos é uma causa frequente de hemorragia. FERRO SÉRICO DIMINUÍDO Anemia Ferropriva Doenças Crónicas Neoplasias Hipermenoréia Hemorragias FERRO SÉRICO AUMENTADO Anemias Hemolíticas e Megaloblásticas Aplasias Medulares Necrose Hepática Maciça Hemocromatose - Hemossiderose Estrogenioterapia - Ferroterapia A única anemia microcítica e hipocrómica em que as reservas de ferro estão ausentes é a anemia ferropriva. Na maior parte dos casos, a avaliação dos indicadores como ferro baixo, TIBC aumentado, ferritina e saturação de transferrina diminuídas faz o diagnóstico. Entretanto, estes indicadores podem estar alterados na presença de neoplasias, infecções, processos inflamatórios, alcoolismo, desnutrição ou doença hepática, prejudicando a avaliação. A determinação concomitante do ferro sérico e da transferrina permite a avaliação da percentagem de saturação da transferrina, que é o melhor índice de avaliação do armazenamento do ferro. A avaliação da capacidade de fixação do ferro (TIBC) aumenta em resposta à diminuição do ião. FERRO Deficiência de ferro Infecções Crónicas Neoplasias Menstruação Gravidez Hepatites Nefropatias Talassemia TIBC SATURAÇÃO DA TRANSFERRINA N ,N Adaptado da tabela: Clinical Diagnosis and Management, by Laboratory Methods- 19º edição -1999. Fibrinogénio O fibrinogénio (Factor I) é uma glicoproteína sintetizada no fígado e está envolvida na etapa final da coagulação, que consiste na sua conversão em fibrina, sob a acção da trombina. Além do seu papel na coagulação, é uma importante proteína na resposta de fase aguda. Portanto, pode estar elevado em diferentes patologias, como processos inflamatórios e infecciosos agudos, traumas, neoplasias, pós-operatório, uso de anticoncepcionais orais e síndrome nefrótico. Encontra-se também elevado por influências genéticas, na gravidez e no tabagismo. No entanto, pode estar reduzido devido à diminuição da produção hepática, em doenças hepáticas graves, ou por aumento de consumo, com conversão excessiva do fibrinogénio em fibrina, sem tempo para reposição adequada, como nos quadros de coagulação intravascular disseminada. Pode também apresentar-se diminuído nos casos de fibrinólise primária e secundária e devido ao uso de agentes fibrinolíticos. Já foram identificadas diversas variantes hereditárias do fibrinogénio (disfibrinogenemia). Os quadros podem variar entre alterações hemorrágicas, tendência a distúrbios trombóticos ou indivíduos assintomáticos. A disfibrinogenemia adquirida está associada a doenças hepáticas ou renais. A sua avaliação tem um papel importante no diagnóstico diferencial das coagulopatias adquiridas, na coagulação intravascular disseminada, na fibrinólise primária e secundária, na disfibrinogenemia e na afibrinogenemia. Fosfatase Ácida As maiores concentrações da fosfatase ácida ocorrem na próstata, no fígado, na medula óssea, nos eritrócitos e nas plaquetas. Os pacientes com carcinoma da próstata confinados dentro da cápsula, normalmente apresentam níveis normais da fosfatase ácida sérica; já nos casos com metástases, mais da metade dos pacientes apresenta níveis elevados. Níveis alterados podem também ser observados em pacientes com hipertrofia benigna de próstata, retenção urinária e após manipulação prostática. A fracção não-prostática encontra-se fisiologicamente elevada nas crianças em fase de crescimento e patologicamente aumentada em condições em que existe um hipermetabolismo ósseo. Valores elevados são encontrados na doença de Paget e noutras patologias ósseas, no hiperparatiroidismo, nas metástases ósseas como no carcinoma da mama, do pulmão, da tiróide, nos mielomas e em situações de grande destruição de eritrócitos e de plaquetas. Elevam-se também em doenças metabólicas como doença de Gaucher, doença de Niemann-Pick e em leucemias e outras patologias hematológicas. Consultar Fosfatase Ácida Prostática. Fosfatase Ácida Prostática A fosfatase ácida de maior importância clínica é a derivada da próstata. Dada a importância clínica do aumento do nível sérico da fosfatase ácida no diagnóstico e na monitorizaação da resposta ao tratamento e no aparecimento de metástases no carcinoma da próstata, é necessário diferenciar-se especificamente entre aumentos nas concentrações das fosfatases de origem prostática das formas de origem nãoprostática. Certos inibidores podem aumentar a discriminação entre as duas formas. A fracção prostática é fortemente inibida pelo tartarato, e a fração não-prostática é resistente ao tartarato. Dessa forma, podemos obter valores mais específicos para o acompanhamento dos casos de carcinoma prostático. Devemos lembrar que a fosfatase ácida libertada pelas plaquetas apresenta resposta à inibição semelhante à de origem prostática. Os pacientes com carcinoma de próstata confinados dentro da cápsula normalmente apresentam níveis normais da fosfatase ácida sérica; já nos casos com metástases, mais da metade dos pacientes apresenta níveis elevados. Níveis alterados podem ser observados em pacientes com hipertrofia benigna de próstata, retenção urinária de monta e após manipulação prostática. Fosfatase Alacalina É uma enzima presente em praticamente todos os tecidos do organismo, especialmente nas membranas das células dos túbulos renais, ossos (osteoblastos), placenta, trato intestinal e fígado. Portanto, a fosfatase alcalina encontrada no soro é resultado da presença de diferentes isoenzimas originadas em diferentes órgãos, com predomínio das fracções ósseas e hepáticas. Embora até hoje a sua função ainda não esteja bem definida, a fosfatase alcalina parece estar envolvida no transporte de lípidos no intestino e nos processos de calcificação óssea. A fosfatase alcalina óssea e a hepática partilham proteínas estruturais, codificadas por um mesmo gene. A fosfatase intestinal só se expressa em indivíduos dos grupos sanguíneos Lewis O e B. Além das isoenzimas conhecidas - óssea, hepática, intestinal e placentária -, podem ser encontradas isoformas patológicas, como a carcioplacentária ou Regan, que ocorre por uma depressão do gene da fosfatase placentária em neoplasias (do ovário, do pulmão, trofoblásticas, gastrointestinais, seminomas e doença de Hodgkin). Outras isoformas incomuns têm sido descritas em várias neoplasias. Na prática clínica, a grande utilidade está na investigação de doenças hepatobiliares e nas doenças ósseas que cursam com aumento da actividade osteoblástica. Como é totalmente excretada pela bilis, durante muito tempo pensou-se que sua elevação nas patologias hepatobiliares resultava da falência de excreção da enzima. Hoje sabe-se que a resposta hepática a qualquer tipo de agressão da árvore biliar é sintetizar a fosfatase alcalina principalmente nos canalículos biliares. Isto explica a sua marcada elevação nas patologias biliares. A elevação tende a ser maior nas obstruções extra-hepáticas (litíase e carcinoma da cabeça de pâncreas) do que nas intra-hepáticas (processos invasivos). Isto acontece devido a uma combinação do aumento de produção associado a uma diminuição da excreção. Por isso, é considerada um marcador importante para processos obstrutivos hepáticos. Níveis elevados podem ser também encontrados noutras lesões hepáticas activas e nas infiltrativas com níveis mais moderados de elevação. Está aumentada nos carcinomas hepáticos primários e secundários. Nas doenças ósseas, o maior aumento dos níveis séricos da fosfatase alcalina aparece na doença de Paget (valores de 10 a 25 vezes o normal). Níveis moderadamente elevados podem ser encontrados na osteomalácia, nalguns tumores ósseos e no hiperparatiroidismo primário e secundário. As fracturas ósseas levam a um aumento transitório, e na osteoporose os valores são normais. Nas neoplasias, os níveis da fosfatase alcalina são úteis para avaliar a presença de metástases envolvendo fígado e osso. Valores muito elevados são observados em pacientes com lesões osteoblásticas como as encontradas no carcinoma da próstata com metástases ósseas. Elevações menores são observadas quando as lesões são osteolíticas, como as encontradas no carcinoma metastático da mama. Outras condições malignas com infiltração hepática como leucemias, linfomas e sarcoma podem cursar também com elevação da fosfatase alcalina. Recém-nascidos e crianças, mas especialmente adolescentes, apresentam valores significativamente mais elevados do que os adultos, devido ao crescimento ósseo. Durante a fase de crescimento rápido da adolescência (puberdade), são encontrados níveis extremamente elevados. Normalmente, os valores são discretamente mais elevados nos homens do que nas mulheres, e essa diferença desaparece durante e após a menopausa. Na população idosa, existe uma diminuição dos níveis séricos habitualmente encontrados, como consequência do aumento da incidência de osteoporose nessa faixa etária. Níveis elevados, duas a três vezes os valores de referência, podem ser encontrados durante a gravidez, especialmente no terceiro trimestre, devido à produção placentária. Níveis diminuídos podem ser encontrados no hipotiroidismo, na anemia perniciosa, nas hipofosfatémias e no uso de fármacos como contraceptivos orais. Aumento dos níveis séricos podem ser encontrados após uma refeição com alimentos ricos em gordura, especialmente em pacientes do grupo sanguíneo O ou B, devido à elevação da fracção intestinal. Recomenda-se portanto que seja avaliada sempre em jejum. ALGUMAS CAUSAS DE FOFATASE ALCALINA ELEVADA PUBERDADE GRAVIDEZ CRIANÇAS DOENÇA DE PAGET ACROMEGALIA SARCOMA HIPERPARATIROIDISMO OSTEOMALÁCIA MIELOFIBROSE HIPERNEFROMAS LEUCEMIAS MIELOMA ALCOOLISMO CIRROSE CIRROSE BILIAR PRIMÁRIA COLANGITES COLANGITES AUTO-IMUNES COLEDOCOLITÍASE CA DO PÂNCREAS COLECISTITES COLANGITES CA HEPÁTICO METÁSTASES HEPÁTICAS METÁSTASES ÓSSEAS SARCOIDOSE AMILOIDOSE ABCESSOS HEPÁTICOS HEPATITES DROGAS COLESTÁTICAS PANCREATITE Fosfatase Alacalina Óssea Os ossos encontram-se em constante processo metabólico de remodelação. Este, inclui a degradação e reabsorção ósseas, que são mediadas pelos osteoclastos, e os processos de estruturação e formação óssea mediada pela acção dos osteoblastos . A remodelação óssea é necessária para a manutenção da saúde global e da firmeza da trama óssea. Para isso, é importante um equilíbrio entre os processos de reabsorção e formação ósseas. Em estados de alteração do metabolismo ósseo, estses processos dissociam-se, ou seja, perdem o equilíbrio. Quando a reabsorção excede a formação, leva a uma perda de osso que pode conduzir a osteoporose ou a doenças do tecido ósseo, como as lesões da doença de Paget. A utilização de marcadores bioquímicos específicos para esses eventos de remodelação fornece dados analíticos em relação à taxa de metabolismo, ou seja, do turn-over ósseo. A fosfatase alcalina óssea é uma glicoproteína específica encontrada na superfície dos osteoblastos. A sua função ainda não é de todo conhecida, porém o seu papel na mineralização do esqueleto está confirmada. A avaliação da actividade sérica da fosfatase alcalina óssea é um marcador de turnover ósseo que fornece informações úteis da remodelação óssea na osteoporose, na doença de Paget e na monitorização de terapias preventivas e de reposição hormonal ou de outras terapias. A osteoporose é uma doença do metabolismo ósseo caracterizada pela remodelação óssea anormal. Esta remodelação conduz a uma baixa da massa óssea e a uma deterioração da microarquitetura do tecido ósseo, com aumento consequente da suscetibilidade para fracturas. O tipo mais comum de osteoporose acontece nas mulheres na menopausa, como resultado da deficiência de estrogénio produzida pela cessação da função ovariana. A restauração dos níveis de estrogénio àqueles compatíveis com a fase pré-menopausa, através da terapia de reposição hormonal, previne a perda óssea e consequentemente a osteoporose. A osteoporose pode também resultar de um pico de ganho de massa óssea inadequado durante a fase de crescimento - um desequilíbrio ósseo relacionado à idade, que remodela com excesso de reabsorção - e várias condições clínicas e terapias que induzem a perda óssea ou a remodelamento ósseo desequilibrado, incluindo doenças endócrinas como hipogonadismo, hipertiroidismo, hiperparatiroidismo, hipercortisolismo, falência renal, metástases ósseas, doenças gastrointestinais relacionadas com a nutrição e metabolismo mineral, doenças do tecido conjuntivo, mieloma múltiplo, imobilização crónica, alcoolismo, tabagismo e terapia crónica com heparina e corticóides. A doença de Paget tem etiologia ainda desconhecida, porém hipóteses de etiologias envolvendo factores genéticos e víricos têm sido apontadas. É uma desordem óssea focal que produz dor e deformidade, com elevadas taxas de actividade de remodelação óssea. As lesões ocorrem principalmente no cránio, coluna vertebral, pelve e ossos longos, e podem resultar em fracturas e comprometimento neurológico. Fósforo O fósforo é um dos constituintes mais abundantes do organismo, presente em diferentes tecidos. Num adulto normal, a maior parte encontra-se no osso, e o restante, nos tecidos moles e ligados a proteínas, lìpidos e carbohidratos. Participa em diferentes processos metabólicos e está presente como fosfolípido em todas as membranas celulares. A sua homeostase depende basicamente do controle da absorção (intestino delgado), filtração e reabsorção renal e da reserva que é armazenada no osso. Cerca de 80 a 90% do fósforo ingerido é absorvido de forma activa no intestino. A absorção é aumentada na diminuição da ingestão de cálcio, na acidez do conteúdo intestinal e também pela acção da vitamina D e da hormona de crescimento. A maior parte do fósforo absorvido é excretada na urina. É filtrado pelos glomérulos e reabsorvido em grande parte pelo túbulo proximal, de modo que apenas cerca de 10 a 15% do fósforo filtrado alcança o túbulo distal. Nas situações em que há diminuição da filtração de fósforo, ocorre aumento da reabsorção tubular, e, ao contrário, quando aumenta a carga filtrada, diminui a reabsorção e aumenta a depuração. Nos casos de lesão renal, à medida que a taxa de filtração glomerular diminui, o fósforo é retido, reduzindo discretamente o nível de cálcio sérico, o que estimula as paratiróides a secretar a paratormona (PTH). A ação da PTH no sistema tubular reduz a reabsorção, na tentativa de restaurar os níveis normais de cálcio e de fósforo. Com a evolução da lesão renal, a fracção de fósforo reabsorvido pelo sistema tubular diminui, mantendo a depuração de fósforo constante, e por conseguinte os níveis séricos normais. Quando a taxa de filtração chega a níveis muito baixos, cerca de 20 mL/min, a excreção de fósforo não se mantém mais, devido a esse mecanismo de compensação, levando a uma elevação do fósforo sérico. Os mecanismos de regulação do cálcio afetam também os níveis de fósforo, sendo os seus valores directamente relacionados: a elevação de um significa a diminuição do outro. Os níveis séricos de fósforo oscilam ao longo do dia: valores mínimos são observados entre as 9 e as 12 horas, aumentando gradualmente até atingir um platô à tarde, e apresentando um discreto pico em torno da meia-noite. Os níveis de fósforo são mais altos nas crianças, e tendem a elevar-se nas mulheres após a menopausa. Aumentam também com o exercício e na desidratação. Os valores séricos diminuem com a ingestão de carbohidratos e aumentam com a ingestão de fósforo, sendo portanto fundamental que a colheita seja realizada em jejum. O aumento do fósforo sérico ocorre pela diminuição da filtração glomerular, aumento da reabsorção tubular renal e aporte exógeno ou endógeno. A diminuição ocorre por doenças tubulares e aumento das perdas. Alterações nos níveis da hormona paratiroidéia afectam a reabsorção renal do fósforo. São causas de aumento dos níveis de fósforo no soro: desidratação, hipovolemia, acromegalia, hipoparatiroidismo, pseudo-hipoparatiroidismo, hipervitaminose D, metástases ósseas, sarcoidose, cirrose, embolia pulmonar, falência renal, após manobras de ressuscitação e cetoacidose diabética. Valores séricos diminuídos são encontrados no uso de diuréticos, antiácidos, hiperparatiroidismo primário, septicémia, deficiência de vitamina D, acidose tubular renal, síndrome de Fanconi, hemodialisados crónicos, após episódios de vómitos, osteomalácia e por outras causas que levem à elevação de cálcio no soro. Níveis urinários aumentados de fósforo podem ser encontrados no hiperparatiroidismo, na acidose tubular renal e no uso de diuréticos. Níveis diminuídos são encontrados no hipoparatiroidismo e no pseudo-hipoparatiroidismo. Fragilidade Osmótica Quando em meio hipotónico, os eritrócitos normais são capazes de resistir à hemólise, aumentando o seu volume. A variação da forma leva a variação da espessura das membranas dos eritrócitos, alterando a sua capacidade de resistir à lise celular por variações da pressão osmótica do meio onde se encontram. Os esferócitos têm fragilidade osmótica aumentada, pois apresentam uma membrana mais escassa do que a membrana de um eritrócito normal, o que os impede de acumular água no seu interior. Já os reticulócitos têm mais membrana, o que os torna capazes de resistir melhor à hemólise, mostrando assim menor grau de fragilidade osmótica. Na curva de fragilidade osmótica, os eritrócitos são submetidas a concentrações crescentes de cloreto de sódio. A percentagem de hemólise é avaliada pela quantidade de hemoglobina livre na solução. Frutosamina Além da HbA, a glicose pode ligar-se a outras proteínas e globulinas por meio de uma glicosilação não-enzimática. A proteína total, que após a ligação com a glicose, se transforma numa cetamina estável, é denominada genericamente frutosamina. Devido à sua semi-vida curta, de cerca de 30 dias, os resultados obtidos indicam a média das glicemias nas 2 últimas semanas (1 a 3). Os valores podem ser alterados em situações de perda ou diminuição da semi-vida das proteínas. Não deve ser utilizada como diagnóstico e sim como monitorização do controle da diabetes mellitus. Os resultados dos doseamentos de frutosamina devem ser analisados juntamente com os resultados de glicose e da hemoglobina glicosilada. A frutosamina mostrase elevada em todos os casos de diabetes fora de controle metabólico, independentemente dos valores da glicemia de jejum. Os seus valores retornam aos níveis de referência 20 dias após a estabilização da glicemia em níveis adequados. É útil no acompanhamento de casos de pacientes portadores de hemoglobinopatias que interferem no doseamento da hemoglobina glicosilada. Gama Glutamil Tanspeptidase (GGT) A gama glutamil transpeptidase ou transferase (GGT) é uma enzima presente nas membranas celulares e nas fracções microssómicas envolvidas no transporte de aminoácidos através da membrana celular. Está presente em ordem decrescente de abundância no túbulo proximal renal, fígado, pâncreas e intestino. Os níveis séricos da GGT são principalmente de origem hepática. A sua semi-vida é de 7 a 10 dias, aumentando para 28 dias nas lesões hepáticas ligadas ao álcool. Os valores são aproximadamente 50% mais elevados nos homens do que nas mulheres, e são directamente proporcionais à massa corporal, ao consumo de álcool, ao fumo e ao nível de actividade física. Por mecanismos ainda não muito bem esclarecidos, pacientes com diabetes mellitus, hipertiroidismo, artrite reumatóide e doença pulmonar obstrutiva crónica frequentemente apresentam valores aumentados de GGT. Valores muito elevados são encontrados nos quadros de colestase crónica, como na cirrose biliar primária ou na colangite esclerosante e noutras patologias hepáticas e biliares. Apresenta-se elevada em alcoólatras, mesmo sem hepatopatia, na obesidade e no uso de fármacos como analgésicos, anticonvulsivantes, quimioterápios, estrogénio e contraceptivos orais. Nos períodos após enfarte agudo do miocárdio, a GGT pode permanecer alterada por semanas. Em estudos do gene humano, a GGT teve a sua sequência de nucleotídeos identificada. Deste modo, puderam ser identificadas três principais formas de GGT circulantes, que aparentemente, não são isoenzimas verdadeiras. Uma, de alto peso molecular, aparece nos soros normais, na obstrução biliar e, com mais frequência nos casos de neoplasia hepática. A segunda forma tem um peso molecular intermediário e apresenta duas fracções: uma detectável em hepatopatias, e a outra em obstruções das vias biliares. A terceira tem um baixo peso molecular e ainda não teve a sua função definida. Infelizmente, esses testes não estão disponíveis para uso clínico, pois o método ainda não apresenta sensibilidade e especificidade adequadas. Gasimetria Arterial Para funcionarem normalmente, as actividades metabólicas necessitam de um pH mantido em condições ideais. Este factor depende da manutenção do equilíbrio ácido-base do organismo, obtido pela interacção dos mecanismos renais (controle de concentração de bicarbonato) e pulmonares (controle de concentração de CO2). Consequentemente, o estado do equilíbrio metabólico depende de mecanismos respiratórios com uma troca gasosa adequada e boa oxigenação tecidual e um tamponamento fornecido pelo rins. Os distúrbios ácido-base que podem ocorrer são: acidose metabólica, acidose respiratória, alcalose metabólica e alcalose respiratória. Inicialmente, pode parecer que o conhecimento isolado da alteração da concentração de bicarbonato ou da concentração de pCO2 conduza, respectivamente, a um diagnóstico de alteração metabólica e respiratória. Entretanto, isto não é verdadeiro, visto que um distúrbio primário pode levar a uma alteração secundária compensatória, que no final leva à manutenção do pH para níveis adequados. Portanto, a análise do equilíbrio ácidobase depende da avaliação de um conjunto de diferentes parâmetros, que são representados pelo exame gasimetria arterial. Esses parâmetros são: - pH - pCO2 - bicarbonato - pO2 - saturação do O2 - bases em excesso O primeiro parâmetro observado na análise da gasimetria arterial deve ser o pH. Independentemente dos demais parâmetros, o pH determina se o paciente se encontra em acidose ou alcalose. O valor limite do pH para essa definição é de 7,4. Valores abaixo deste são considerados acidose, e acima alcalose. Apenas após a avaliação desse parâmetro, outros, como bicarbonato e pCO2 poderão ser utilizados para diagnosticar se a origem dos distúrbio é metabólica ou respiratória. A concentração do bicarbonato, da pCO2 e do pH é interdependente. Portanto, a alteração de um dos parâmetros leva ao movimento compensatório dos demais, na busca do equilíbrio. Os níveis de bicarbonato associados aos mecanismos respiratórios de retenção e eliminação do CO2 mantêm o equilíbrio ácido-base. SITUAÇÃO pH BIRCABONATO PCO2 Acidose metabólica <7.4 Baixo Baixa Acidose respiratória <7.4 Alto Alta Acidose metabólica >7.4 Alto Alta Acidose respiratória >7.4 Baixo Baixa CAUSAS FREQUENTES Cetoacidose diabética, acidose láctica (sépsis por gramnegativos), insuficiência renal, paragem cardio-respiratória e uso abusivos da aspirina. DPCO, insuficiência respiratória, paralisia dos músculos respitetórios, pneumonia e lesões do SNC. Vómitos, outras causas de perda de ácido clorídrico e uso abusivo de diuréticos. Dor aguda e intensa, ansiedade, hiperventilação, estimulação não pulmonar do centro repirtório e uso de fármacos Na acidose metabólica, a produção excessiva de ácido é tamponada pelo bicarbonato, que é consumido nesse processo, levando a um aumento da frequência respiratória para diminuir a pCO2 e compensar a perda de bicarbonato. Na alcalose metabólica, existe uma perda de ácido, com aumento da concentração do bicarbonato e de pCO2. Na acidose respiratória, o aumento da concentração de CO2 leva a uma diminuição do pH, o que induz a uma retenção renal de bicarbonato para compensar a equação de equilíbrio. A avaliação da pO2 é importante para avaliação do estado de perfusão tecidual. Importante também é a determinação da percentagem de saturação da hemoglobina pelo O2. Valores baixos de um ou de ambos os parâmetros acima referidos, são indicação de patologia subjacente. A queda da pO2 leva a acidose metabólica. As principais causas dessa condição são: embolia pulmonar, enfarte agudo do miocárdio, anóxia tecidual secundária a estados de hipoperfusão como situações cirúrgicas, septicémia, choque ou insuficiência cardíaca grave, entre outras. Outra causa de hipoxia, são as situações que levam à retenção do CO2, como as lesões pulmonares e a DPCO. O excesso de bases representa o cálculo realizado a partir dos valores de pH, de pCO2 e da concentração da hemoglobina, que significa o excesso ou o déficite de bases, permitindo avaliar a gravidade do distúrbio metabólico. O excesso de bases é encontrado nas alcaloses, e o déficite nas acidoses. Gastrina É uma hormona produzida pelas células G localizadas principalmente no antro e duodeno proximal. Existem várias formas moleculares de gastrina. A principal forma de gastrina na mucosa antral é um heptadecapeptídeo com 17 resíduos de aminoácidos (G-17) que representa 90% da gastrina produzida nessa região. Já na circulação, dois terços da gastrina sérica são representados por uma molécula maior, com 34 aminoácidos (G-34). Embora a G-17 tenha uma semi-vida mais curta que a G-34, ambas têm a mesma intensidade de estimulação da secreção gástrica. A sua avaliação é útil no diagnóstico do síndrome de Zollinger-Ellison, caracterizado por ulceração péptica severa do trato gastrointestinal com hipersecreção ácida gástrica, consequente à excessiva secreção de gastrina. Valores superiores a 1.000 pg/mL associados a hipercloridria são praticamente diagnóstico da presença desse síndrome. Além do síndrome de Zollinger-Ellison, níveis elevados podem ser detectados também em situações que cursam com acloridria ou hipocloridria, como nas anemias perniciosas, na gastrite atrófica e no carcinoma gástrico. Nestes casos, os níveis não se encontram tão elevados quanto no Síndrome de Zollinger-Ellison. O teste dinámico com infusão de cálcio ou secretina tem um papel importante no diagnóstico diferencial entre as possíveis etiologias. A ingestão de aminoácidos, drogas como carboneto, cloreto de cálcio e insulina podem elevar os níveis de gastrina. Já o uso de atropina diminui os seus níveis séricos. Genotipagem da Hepatite C Os vírus da hepatite C são um grupo de isolados ou linhagens com alto grau de variabilidade. Esta heterogeneidade também pode ser observada no próprio hospedeiro, do qual um simples isolado pode abrigar variantes víricas de múltiplas sequências, as quais mostram apenas 92% de similaridade nas regiões que codificam proteínas do envólucro. Isolados de determinados subtipos exibem similaridades nucleotídicas em torno de 80% para o genoma completo ou regiões não-estruturais, enquanto um ou mais subtipos podem ser classificados em alguns tipos principais com similaridades em torno de 68%. Os seguintes genótipos são caracterizados como principais tipos de HCV: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10 e11. Estes são subdivididos em diferentes subtipos possíveis de serem analisados pela genotipagem para HCV: - 1a, 1b, 1c 2a, 2b, 2c 3a, 3b 4a, 4b, 4c, 4d, 4e 5a 6a 7a, 7b 8a, 8b 9a 10a 11a Evidências substanciais têm demonstrado a grande importância da tipagem e subtipagem para a clínica. Estudos indicam que a infecção pelo HCV genótipo 1b não apresenta resposta eficiente ao tratamento com interferon alfa (10% dos pacientes tratados com resposta favorável), enquanto para os genótipos 1a, 2a, 2b e 3a respondem de forma favorável (50 a 80% de resposta). Tem sido demonstrado que infecções por HCV genótipo 1b evoluem rapidamente para formas crónicas de hepatites, cirrose e carcinoma hepatocelular. A rápida evolução da doença hepática crónica e cirrose em órgão transplantado é observada para o subtipo 1b. A genotipagem para HCV é obtida com a utilização de métodos de biologia molecular e de sequenciamento genómico, os quais são úteis para definir os genótipos e subtipos para estudos de epidemiologia molecular, estudos clínicos e monitorização da hepatite C. Genotipagem para HIV Recentes avanços nos estudos sobre o HIV-1 orientados, principalmente, para a quantificação da carga viral em plasma e células mononucleares do sangue periférico de pacientes nos diferentes estádios da síndrome de imunodeficiência adquirida (SIDA) têm evidenciado que a infecção pelo HIV-1 é um processo dinámico, em que ocorre um equilíbrio entre a produção e a eliminação de partículas virais. Este processo é observado, inclusive, na fase de lactência clínica, caracterizada por ausência de sintomas, altos níveis de anticorpos circulantes e níveis baixos ou não-detectados de virémia. A associação à elevada taxa de mutação genómica do HIV-1 resulta no desenvolvimento de linhagens virais mutantes, que são mais eficazmente selecionadas sob condições de pressão selectiva exercida pelo sistema imunológico ou pela intervenção farmacológica prolongada. Essas variantes HIV-1 não são reconhecidas pelos mecanismos imunes efectores (anticorpos neutralizantes e/ou linfócitos T citotóxicos) e podem apresentar mutações nos genes codificantes para as enzimas protease ou transcriptase reversa. Estas resultam em mutações de aminoácidos nas enzimas, selecionando, desta forma, variantes resistentes aos anti-retrovirais. Mutações no genoma do HIV que conferem resistência aos agentes anti-retrovirais têm sido relatadas para todos os compostos usados no tratamento de pacientes infectados. O início da infecção está associado a uma população homogenea de HIV que é, usualmente, sensível aos anti-retrovirais. No entanto, as altas taxas de mutação podem resultar em 106 variantes genéticas, entre as quais podem estar presentes, em baixos níveis, as resistentes aos anti-retrovirais, antes do início da terapia. O significado clínico da resistência aos anti-retrovirais não está ainda totalmente elucidado, porém atribui-se a ocorrência ao decréscimo na eficiência da quimioterapia anti-retroviral. A enzima transcriptase reversa é estudada mais extensamente para a intervenção farmacológica. Ela é essencial para a replicação do HIV-1, uma vez que a expressão das proteínas virais e a progénie viral dependem da conversão da cadeia simples de RNA em cadeias duplas de DNA e a subsequente integração do cDNA viral ao genoma da célula hospedeira. Análogos aos inibidores nucleosídicos da transcriptase reversa 3'-azido-3'desoxitimidina (AZT; zidovudina); 2',3'-didesoxinosina (ddI; didanosina); 2',3'didesoxicitidina (ddC; zalcitabina); (-)-b-L- 2',3'-didesoxi-3'-tiacitidina (3TC; lamivudina) e 2',3'-didesidro-3'-desoxitimidina (d4T; estavudina) são os fármacos actualmente aprovadas para o tratamento da SIDA. Estes compostos actuam de modo semelhante, após activação metabólica por fosforilação efectuada por quinases intracelulares. As formas trifosfato resultantes, podem inibir a enzima transcriptase reversa por competição pelo substrato ou podem actuar como cadeias finais da reacção de transcrição reversa, inibindo a síntese do cDNA viral. As mutações de resistência são divididas em primárias e secundárias. As primárias devem ser analisadas em separado, já que são directamente responsáveis pela diminuição acentuada na sensibilidade ao fármaco. Para utilização adequada da genotipagem para HIV-1 é necessária uma avaliação criteriosa dos resultados. As alterações nos códons abaixo podem definir resistência total ou parcial às medicações anti-retrovirais. Inibidores de transcriptase reversa análogos de nucleosídeos - T215YF, M41L, K70R, D67N, L210W, K219Q, M184VI, V1181, E44D, K65R, L74V, Y115F. Inibidores de transcriptase reversa não-análogos de nucleosídeos - K103N, V106A, V1081, Y181CI, Y188CLH, G190AS, P236L, L1001. Inibidores de protease - M461L, V82AFTS, 184V, L10FIRV, K20MR, L24I, V32I, M36I, 154V, A71VT, G73AS, V77I, L90M, N88D, 147V. Uma única mutação pode resultar em diferentes graus de sensibilidade viral ao quimioterápio. A mutação na posição 184, com substituição de metionina por valina, resulta num decréscimo de cerca de mil vezes na sensibilidade ao 3TC (alto nível de resistência) e de quatro a oito vezes ao ddI e ao ddC (baixo nível de resistência). Trabalhos desenvolvidos por alguns investigadores têm evidenciado que o desenvolvimento de mutações associadas à resistência viral à zidovudina segue um padrão transitório: a mutação pode ocorrer primeiro em qualquer códon, enquanto mutações adicionais acumulam-se lenta e progressivamente durante a terapia. Outros investigadores têm observado, entretanto, que a resistência do HIV-1 à zidovudina desenvolve-se de forma ordenada: em indivíduos assintomáticos em tratamento com zidovudina, a mutação no códon 70 ocorre primeiro, mas é substituída pela mutação, mais estável, no códon 215. Com o tratamento prolongado, outras mutações nos códons 41, 67 e novamente 70 desenvolvem-se, conferindo ao HIV maior resistência à zidovudina. Isto ocorre apenas com a progressão da doença, uma vez que vírus altamente resistentes não têm sido isolados de amostras biológicas de indivíduos assintomáticos. Vários métodos laboratoriais têm sido utilizados para a detecção de mutações associados à resistência à zidovudina, incluindo técnicas de clivagem por RNAse e sistemas de hibridização RNA/RNA. Porém, a maioria dos estudos usa métodos fundamentados na reacção em cadeia da polimerase (PCR), na qual o segmento do genoma do HIV-1, codificado para transcriptase reversa e protease, é amplificado e utilizado numa segunda reacção, empregando-se pares de primers especificamente definidos para a amplificação de sequências de mutantes ou selvagens em códons de interesse. Os segmentos amplificados por PCR são sequenciados directamente utilizando-se sequenciadores fluorescentes automatizados. Outro método para a análise genotípica consiste no ensaio de hibridização com sondas (LIPA), que se baseia na detecção de um sinal colorimétrico não-radioactivo, emitido pela hibridização do produto de PCR do HIV-1 com sondas oligonucleotídicas, imobilizadas em fitas de nitrocelulose. Entretanto, uma restrição ao seu emprego é polimorfismos muito próximos, que dificultam a hibridização, impedindo a obtenção de resultados. Glicose A glicose é essencial para a função do cérebro e dos eritrócitos. O excesso de glicose é armazenado na forma de glicogénio no fígado e nas células musculares. A determinação de glicose no sangue é um dos exames mais solicitados aos laboratórios clínicos e tem como finalidade diagnosticar e acompanhar o tratamento de portadores de algum distúrbio no metabolismo de carbohidratos que levem a situações de hipo, ou hiperglicemia. Um dos problemas mais frequentes é a diabetes mellitus, que pode ser descrito como um grupo de doenças metabólicas de diversas etiologias, caracterizado por hiperglicemia, glicosúria e outras manifestações clínicas decorrentes do comprometimento, principalmente, do sistema vascular e do sistema nervoso, levando a lesões em múltiplos órgãos, em especial olhos, rins e coração. A prevalência da diabetes mellitus tem vindo a aumentar acentuadamente nos últimos anos. As causas apontadas para esse aumento são as mudanças de hábitos de vida ocasionados pela acelerada urbanização, levando a um sedentarismo cada vez maior, alimentação desequilibrada, obesidade e stres contínuo, que facilitam a manifestação da doença em indivíduos geneticamente predispostos. Outro dado importante é o aumento da esperança média de vida na população, que contribui também para o aumento da prevalência da doença. Estudos multicêntricos confirmam o aumento da prevalência e sugerem que os indivíduos obesos apresentam o dobro de risco de desenvolver a doença; já aqueles com parentes directos diabéticos apresentam risco triplicado. Outro dado importante oriundo desses estudos é que metade dos pacientes que tiveram o diagnóstico de diabetes confirmado desconhecia o facto e que 20% entre os que já conheciam o diagnóstico da doença não faziam nenhum tipo de tratamento. O dado de que metade dos pacientes diabéticos no nosso país vive com hiperglicemia levanos a um quadro desolador, no qual o risco de morbilidade e de mortalidade aumenta significativamente por complicações vasculares, renais, neurológicas, oftalmológicas e infecciosas. Uma nova classificação e novos critérios diagnósticos de diabetes mellitus foram propostos em maio de 2000 pela American Diabetes Association, e endossados pela Organização Mundial de Saúde. A classificação etiológica identifica quatro grupos distintos de diabetes DIABETES TIPO I Auto imunidade e idiopática .......................................................................... DIABETES TIPO II .......................................................................... OUTROS TIPOS ESPECÍFICOS Defeitos genéticos na acção da insulina, defeitos genéticos da células beta, doenças do pâncreas exócrino, endocrinopatias, induzido por fármacos, infecções, síndromes genéticos associados e formas imunomediadas incomuns. .......................................................................... DIABETES GESTACIONAL .......................................................................... A diabetes tipo I apresenta duas formas clínicas. Uma, imunomediada, representa 90% dos casos e cursa com marcadores imunológicos de destruição das células beta pancreáticas, como os anticorpos anti-ilhota, anti-insulina e anti-GAD, entre outros. A outra corresponde a 10% dos casos que, por não terem etiologia conhecida, são classificados como idiopáticos. Embora seja a principal endocrinopatia diagnosticada na infância e na juventude, o termo diabetes infantojuvenil não deve ser utilizado, uma vez que de forma menos frequente, pode também manifestar-se na idade adulta. O termo insulino-dependente também foi abandonado, já que qualquer tipo de diabetes pode, levar à dependência em relação à insulina, além do paciente apresentar grande tendência a cetoacidose e coma. A diabetes tipo II caracteriza-se pela resistência periférica à acção da insulina, forte predisposição genética e familiar, e deficiência relativa de insulina, que aumenta com a evolução da doença. A maior parte dos pacientes é obeso clássico ou apresenta a chamada obesidade abdominal, que está associada ao aumento da produção de ácidos gordos livres, levando a um maior afluxo hepático e provocando hiperinsulinemia por diminuição da ligação e extração de insulina pelo fígado. Ambos os quadros cursam com a resistência periférica da insulina. A glicemia eleva-se de modo gradual e, durante os estágios iniciais, não induz a sintomas clínicos significativos. Com isso, o paciente permanece sem diagnóstico por muito tempo. A diabetes gestacional é definidao como uma intolerância à glicose diagnosticada durante a gravidez. A partir da sexta semana após o parto, nova avaliação deve ser realizada para reclassificação do estado da paciente. Os novos parâmetros diagnósticos para diabetes: - quadro clínico de diabetes associado a uma glicemia casual de 200 mg/dL; - glicemia de jejum superior a 126 mg/dL; - glicemia 2 horas após sobrecarga oral (PTGO) de 200 mg/dL. A avaliação do doseamento de glicose deve ser confirmada, pelo menos, em duas ocasiões diferentes. O grupo de intolerantes inclui os indivíduos que se afastam da normalidade (faixa de 110 a 125 mg/dL) mas não apresentam alterações suficientes para serem considerados diabéticos. Informações adicionais, consultar Curva glicémica. NOVOS CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS DE DIABETES MELLITUS PROVA DE GLICEMIA TOLERÂNCIA ORAL À GLICEMIS DE JEJUM CASUAL GLICOSE (AOS 120 MINUTOS) NORMAL até 109 mg/dl até 139 mg/dl Intolerante à INTOLERANTE intolerante em jejum sobrecarga entre (Tolerancia Diminuída) entre 110 e 125 mg/dl 140 e 200 mg/dl DIABETES MELLITUS Acima de 126 mg/dl > ou = 200 mg/dl Acima de 200 mg/dl. Mesmo a população aparentemente saudável deve ser submetida a exames, a fim de obter o diagnóstico precoce da diabetes, o que favorece o tratamento. Casos que devem ser investigados e/ou acompanhados: - pacientes obesos, - obesidade abdominal, - sedentários, - parentes de 1º grau de diabéticos, - história de diabetes gestacional, - história de macrossomia fetal e abortos de repetição, - hipertensão arterial sistémica, - resultados que indicam tolerancia diminuída à glicose, - níveis aumentados de triglicerídeos e diminuídos de HDL colesterol. Glicose-6-Fosfato Desidrogenase, Pesquisa Este erro inato é causado por mutações no gene codificante para a enzima glicose6-fosfato desidrogenase (G6PD) que se encontra localizado no cromossomo X, sendo portanto uma doença hereditária ligada ao sexo. Como a deficiência, está ligada ao cromossomo feminino (X), para que ocorra a expressão total da doença o gene não deve ser antagonizado por um cromossoma X normal. Portanto, a manifestação é mais grave nos homens (XY) e num número reduzido de mulheres que apresentam ambos os X alterados. Mais de 400 mutações distintas já foram determinadas como responsáveis pela deficiência de G6PD. Afecta cerca de 400.000 indivíduos no mundo. A deficiência da glicose-6-fosfato desidrogenase (G6PD) altera directamente a estabilidade das hemácias, tornando-as vulneráveis à desnaturação oxidativa da hemoglobina, o que por sua vez leva a episódios hemolíticos intermitentes e à presença de corpos de Heinz. A susceptibilidade à hemólise dos portadores da deficiência pode ser aumentada pela exposição a fármacos com propriedades oxidantes, em situações de agressões víricas ou bacterianas e na presença de distúrbios metabólicos. A apresentação clínica mais grave é a hemólise intravascular aguda, com hemoglobinúria e icterícia após quadros infecciosos ou exposição a fármacos com efeitos oxidantes (sulfonamidas, sulfonas, analgésicos, antipiréticos, antimaláricos etc.). As manifestações clínicas podem aparecer ao nascimento ou os pacientes podem permanecer assintomáticos por vários anos, conhecendo a doença após infecções ou exposição aos medicamentos supracitados. Quando o aparecimento dos sintomas é precoce, icterícia neonatal é comum e desenvolve-se em 1 a 4 dias após o nascimento. Pode apresentar-se de forma grave, evoluindo para comprometimento renal, sequelas cerebrais ou mesmo óbito. O rastreamento neonatal é pertinente por se considerar a alta frequência do gene defectivo na população e pela possibilidade de profilaxia de crises hemolíticas causadas por fármacos e pela opção de medidas terapêuticas consensuais, levando a um bom prognóstico. Gonodotrofina Coriónica Humana Os ensaios laboratoriais para o diagnóstico da gravidez doseiam a gonadotrofina coriónica humana (HCG), que é uma hormona glicoprotéica produzida pelas células do sinciciotrofoblasto da placenta. A molécula de HCG é composta por duas subunidades: alfa e beta. A subunidade beta é a que confere a especificidade, uma vez que a subunidade alfa é comum a outras hormonas como a LH, a FSH e o TSH. Além das subunidades livres, outras moléculas HCG-relacionadas podem estar presentes, tanto no soro como na urina de mulheres grávidas. Essas moléculas podem apresentar grandes variações estruturais e são reconhecidas de modo diferente por diversos imunoensaios para HCG. Alguns ensaios detectam apenas a molécula inteira, que é a hormona biologicamente activa, uma vez que, isoladamente, nenhuma das subunidades exerce efeito hormonal. Outros detectam tanto a molécula inteira quanto a fração beta livre. Outros, ainda, detectam, além das frações livres, todas as moléculas HCG-relacionadas. Esta é uma das razões para as variações passíveis de serem encontradas entre os diversos métodos para doseamento de HCG. A variação é menos significativa na gravidez normal e pode ser muito expressiva em gestações complicadas como aborto espontâneo, pré-eclâmpsia, doença trofoblástica, síndrome de Down e neoplasias do testículo, bexiga ou ovário. Nesses casos, a proporção de moléculas de HCG fragmentadas ou de fração beta livre pode ser muito maior. O doseamento de beta HCG também é útil como marcador tumoral, especialmente no diagnóstico e no acompanhamento dos tumores trofoblásticos e testiculares. Os ensaios capazes de dosear a molécula de beta HCG total e as suas fracções livres são os mais indicados na detecção e na monitorização dessas patologias, já que alguns tumores secretam, além da molécula total da HCG, uma grande quantidade de fracções livres. O carcinoma testicular apresenta um pico de incidência em homens entre os 30 e 40 anos, sendo 10 vezes mais frequente em pacientes com história de criptorquidismo. Pode ser observada apenas a presença de nódulo indolor, ou ainda de dor, disúria, perda de peso, feminilização, ginecomastia e diminuição da líbido. Mais de 95% dos tumores testiculares originam-se nas células germinativas dos túbulos seminíferos. Geralmente são malignos. Os tumores de células germinativas podem ser divididos em seminomas e não-seminomas. Os não-seminomas mais comuns são os tumores de células embrionárias, o teratoma e o coriocarcinoma. A presença de alfafetoproteína (AFP) elevada indica a presença de um nãoseminoma, já que os seminomas não a secretam. Detectar HCG elevada sugere a presença de um coriocarcinoma ou tumor de células embrionárias, já que raramente a HCG é secretada por seminomas puros. Apenas 7 a 16% dos seminomas secretam HCG total, e cerca de 20 a 50% secreta também as suas fracções livres. Por isso, como já citado, a utilização de métodos capazes de detectar o HCG total e as suas frações aumenta a possibilidade diagnóstica. A realização do exame histológico do material de punção testicular é fundamental para diferenciar seminomas de não-seminomas. Na gravidez normal, a secreção de HCG é detectável entre 7 a 10 dias após a fertilização e eleva-se, alcançando níveis máximos nas 8 a 10 semanas de gestação. Após a 12ª semana, os seus níveis começam a diminuir, até alcançarem um platô. Níveis inferiores a 5 mUI/mL podem ser encontrados em mulheres não-grávidas, enquanto níveis superiores a 25 mUI/mL são interpretados como positivos. Os valores intermediários entre 5 e 25 mUI/mL são considerados inconclusivos e devem ser confirmados após 2 a 3 dias, pois no caso de existir gravidez, os valores duplicam a cada 24 horas. Gestações múltiplas cursam com níveis mais elevados do que a gestação normal. Os níveis de HCG alcançados numa gestação normal são significativos, e a realização de doseamentos seriados é importante para elucidar casos de gravidez ectópica, que cursam com níveis bem menores. Grupo Sanguíneo e Factor RH A denominação grupos sanguíneos não se restringe apenas ao sistema de antigénios encontrados nas hemácias, podendo também ser expressa por outros constituintes sanguíneos como leucócitos, plaquetas e o próprio plasma. Esses antigénios são definidos geneticamente, e de acordo com as combinações das suas expressões na superfície das células sanguíneas, formam os sistemas que identificam os diferentes grupos sanguíneos. Os principais antigénios eritrocitários e os seus anticorpos correspondentes mais utilizados nas avaliações de imunohematologia de rotina são o sistema ABO e o Rhesus (Rh). O sistema ABO tem uma característica peculiar. A maioria dos indivíduos normais apresenta anticorpos (hemaglutininas potentes) contra os antigénios que não possuem, e é nessa singularidade que os mecanismos de identificação do grupo ABO se baseiam. Portanto, para classificar os diferentes grupos, podemos realizar a chamada prova directa, em que são utilizados soros padrões que permitem identificar a presença de um determinado antigénio na superfície das hemácias. Uma outra forma é chamada prova reversa (confirmatória), na qual se utilizam células com antigénios conhecidos, permitindo a pesquisa de anticorpos livres no plasma ou no soro. É importante a realização das duas provas, para maior segurança da classificação do grupo sanguíneo. Os grupos A e B apresentam subgrupos de pouca importância clínica em relação às transfusões. Nalgumas situações, é possível encontrarmos discordância entre as duas técnicas e/ou dificuldades na classificação. Esses casos podem ser encontrados em subgrupos mais fracos, com fenótipos raros. Entre as diferentes causas de discordância na classificação ABO podemos citar os idosos e recém-nascidos, por baixa actividade do antigénio (aglutinina), presença de auto-anticorpos frios, imunossupressão, anticorpos ABO adquiridos passivamente ou, ainda mais raramente, alterações dos antigénios em patologias graves como a depressão antigénica observada em leucemias e noutras patologias, especialmente neoplasias. Encontra-se também o antigénio B adquirido, associado aos carcinomas do cólon e gástrico. Grupo ABO O A B AB Antigénios presentes H A B AB Anticorpos naturais anti-A e anti-B anti-B anti-A - % População branca 45 40 11 4 % População negra 49 27 20 4 A explicação da expressão do factor Rh é complexa e envolve a manifestação dos diferentes antigénios em grupos de três. O sistema Rh foi assim denominado por Wiener logo no início de sua descoberta de diferentes antigénios eritrocitários D-ce-C-E, e é baseado na sua teoria de hereditariedade dos antigénios Rh. Posteriormente, outros autores propuseram a denominação sistema DCE, que terminou por não ser utilizada na rotina. Para simplificar a compreensão, consideremos que, do ponto de vista prático, apenas se utiliza o soro anti-D para classificação dos grupos Rh positivos, negativos e fracamente positivos (variante Du). Portanto, didáticamente, são indivíduos Rh(+) (85% da população) os que apresentam o antígeno D, e Rh(-) (15% da população) os que não apresentam o antígeno D. A variante Du é avaliada em todos os casos negativos. Quando positivo, o indivíduo será tratado como Rh(+). Haptoglobina É uma glicoproteína produzida pelo fígado, que migra na região alfa-2-globulina, na electroforese das proteínas, podendo ser identificados, pelo menos, três fenótipos diferentes (HAP1, HAP2-1, HAP1-1). A sua função é ligar-se à hemoglobina livre, libertada pela destruição intravascular das células vermelhas, conservando o ferro e prevenindo a possível nefrotoxidade causada pela hemoglobina durante a filtração glomerular. O complexo formado pela haptoglobina e pela hemoglobina livre é removido pelo sistema reticuloendotelial, no qual o grupo heme da hemoglobina é degradado em ferro e em bilirrubina. Em estados de acelerada hemólise intravascular, a haptoglobina começa a diminuir, devido ao facto de estar a ser utilizada em maior velocidade do que a da reposição hepática, o que leva ao aparecimento de dímeros de hemoglobina livre que serão filtrados pelos rins. Uma vez filtrada, a hemoglobina livre é degradada pelas células epiteliais tubulares, levando à formação de hemossiderina. O rim possui capacidade limitada de filtração, em torno de 5 g de hemoglobina por dia. Quando ultrapassa esse nível, a hemoglobina livre começa a aparecer na urina. A hemoglobina livre pode ligar-se, também a uma outra proteína, a hemopexina, que por sua vez se liga ao heme, transportando-o para o fígado, onde o ferro é incorporado à ferritina e o heme segue a via metabólica das bilirrubinas. Assim como a haptoglobina, pode ser consumida em estados de hemólise acelerada. Os níveis de haptoglobina podem estar elevados em numerosas situações que levam à reacção de fase aguda como no síndrome nefrótico, em que, dependendo do fenótipo, podem aumentar de forma a compensar a perda de outras proteínas. A mesma elevação pode ocorrer no uso de corticóides. Apresentam-se diminuídos nas hepatopatias graves, nas situações de aumento da hemoglobina livre pela hemólise aumentada de eritrócitos, como em hemoglobinopatias, reacções transfusionais, anemia megaloblástica, eritropoiese ineficaz associada a destruição medular de células vermelhas, queimaduras extensas, coagulação intravascular disseminada, reabsorção de grandes hematomas, síndrome nefrótico em que, dependendo do fenótipo, podem diminuir os níveis séricos por perda urinária (geralmente fenótipo HAP1-1), e terapia com estrogénios e corticóides. Nas situações de hemólise severa aguda, a haptoglobina pode ser totalmente consumida, necessitando de cerca de 1 semana para retornar aos níveis normais. Já nos casos de hemólise crónica, como os que podem ser vistos em hemoglobinopatias e na hemólise causada por válvulas cardíacas mecânicas, os níveis séricos de haptoglobina decrescem mais lentamente, e o seu doseamento seriado pode ser um melhor indicador para o acompanhamento do nível de hemólise do que a avaliação isolada da hemoglobina. Por ser uma proteína de fase aguda, a presença conjunta de processos inflamatórios e de hemólise pode dificultar o diagnóstico em análises isoladas. Para facilitar o diagnóstico diferencial, recomenda-se a avaliação de outras proteínas de fase aguda, além do acompanhamento seriado. HDL-Colesterol O HDL-colesterol (colesterol contido nas HDL) é inversamente proporcional ao risco de desenvolvimento de doenças coronárias. Níveis superiores a 60 mg/dL são associados a um efeito protector, enquanto níveis séricos abaixo de 40 mg/dL relacionam-se a risco mais elevado de desenvolvimento de doença coronária. Esta capacidade protectora parece estar relacionada com o mecanismo de transporte reverso do colesterol, no qual o HDL está envolvido, captando colesterol não-esterificado dos tecidos periféricos pela acção enzimática da LCAT (lecitinacolesterol-acil-transferase) e formando as HDL maduras, que irão levar o colesterol até ao fígado de forma directa ou transferindo-o para outras lipoproteínas, as VLDL. No fígado, o colesterol é reutilizado em processos metabólicos ou excretado pela bilis. Os valores séricos variam de acordo com a idade e o sexo. Algumas situações podem contribuir para a diminuição dos níveis séricos de HDL-colesterol, como sedentarismo, tabagismo, diabetes, factores genéticos, obesidade e diversos fármacos. O exercício e o uso moderado de flavonóides (contidos no vinho tinto) têm sido apontados como factores que ajudariam a elevar os níveis séricos do HDLcolesterol. Para cada redução de 5 mg/dL do HDL-colesterol abaixo da média, o risco de doença coronária aumenta em 25%. Nas hepatopatias, os níveis séricos do HDLcolesterol podem encontrar-se diminuídos. Consultar Perfil Lipídico Helicobacter pylori Em 1994, uma conferência de consenso declarou que a úlcera é uma doença infecciosa e recomendou que o tratamento dos sintomas com antiácidos deveria ser alterado para a erradiação antibiótica da infecção. A úlcera péptica é uma das doenças mais comuns, afectando, aproximadamente, 50% da população do mundo. O Helicobacter pylori está presente em quase 100% dos pacientes adultos com úlcera duodenal e em aproximadamente 80% dos pacientes com úlcera gástrica. A associação da úlcera gástrica com o carcinoma gástrico, suspeitada há muito tempo, está agora a ser confirmada. Em países em desenvolvimento, onde a maioria das crianças é infectada aos 10 anos de idade, as taxas de carcinoma gástrico são muito altas. Nos EUA e noutros países desenvolvidos, padrões de higiene e a melhoria socioeconómica crescente da população reduziram a incidência de infecção. Em paralelo, as taxas de úlcera péptica e de carcinoma gástrico baixaram. Os antagonistas H2 receptores de histamina diminuem a secreção ácida a curto prazo, mas as taxas de recaída atingem 95% dos casos em 2 anos, determinando a retoma do tratamento. Recentes achados em gastrites crónicas e infecção por Helicobacter pylori em países desenvolvidos sugerem que: - Gastrites por Helicobacter pylori são adquiridas na infância e na adolescência (idade inferior a 20 anos) em mais de 50% dos casos; - Risco e taxa de aquisição são mais altos na infância; posteriormente, ocorre um declínio exponencial na taxa de aquisição; - Novas infecções acontecem na maior idade, mas são bastante raras (incidência anual de 0,4% em média); - A taxa e o risco de infecção pelo Helicobacter pylori são altos em nascidos no princípio do século XX, mas muito mais baixas entre os nascidos depois; - Este declínio deve-se à diminuição na taxa e no risco de aquisição de gastrites por Helicobacter pylori em particular na infância. Todas as espécies de Helicobacter causam algum grau de inflamação persistente no estômago dos mamíferos. São constatadas gastrites em praticamente todos os humanos infectados, embora a maioria não tenha nenhum sintoma; 1 em 10 desenvolve a úlcera. O desenvolvimento de adenocarcinoma gástrico é três a doze vezes mais provável em indivíduos infectados pelo Helicobacter pylori. A identificação do Helicobacter pylori pela coloração de Gram e a detecção de anticorpos anti-H. pylori por hemaglutinação ou fixação de complemento têm sensibilidade relativamente alta e especificidade como a do teste de biópsia/urease. Existe uma excelente correlação entre uma apresentação clínica clássica de gastrites, a presença de Helicobacter pylori no estômago e a serologia alterada. A sensibilidade e a especificidade são de 90%, e o valor preditivo de um resultado negativo para anticorpos anti-Helicobacter pylori por enzima imunoensaio (EIA) é elevado na infecção recente, excluindo-se uma população mais velha. Combinações de antigénios diferentes melhoram a sensibilidade sem perda de especificidade. Resultados positivos justificam uma tentativa empírica de curta terapia com antimicrobianos em gastrites de origem desconhecida. Pode ser esperada uma queda significativa das concentrações de anticorpos IgG anti-H. pylori depois de terapia antibacteriana adequada. Pacientes assintomáticos e sem tratamento continuam com seropositividade para IgG, mostrando a presença de H. pylori mesmo após a resolução histológica. A erradiação de H. pylori está associada à redução significativa do retorno de úlcera duodenal. A sua avaliação é útil na diferenciação entre gastrites por Helicobacter pylori e linfoma gástrico. Recentemente, surgiram testes imunoenzimáticos para a detecção de antigénios específicos de Helicobacter pylori. A investigação do antigénio Helicobacter pylori é um método não-invasivo para a identificação das bactérias em amostras. O teste tem altas sensibilidade (93,9%) e especificidade (96,3%), com uma precisão diagnóstica de 95%. Este ensaio pode simplificar o diagnóstico preciso da infecção por Helicobacter pylori. A PCR é uma técnica altamente sensível e rápida de identificação de Helicobacter pylori em espécimes clínicos. Hemocultura Quando uma bactéria vence as barreiras normais do hospedeiro e das células do sistema reticuloendotelial, ela invade a corrente circulatória ou os vasos linfáticos, podendo rapidamente disseminar-se e causar bacteriémia (presença de bactérias no sangue). A bacteriémia pode ocorrer de forma transitória, intermitente ou contínua. Além disso, os seus produtos metabólicos interagem com os mecanismos de resposta inflamatória, podendo levar à septicémia e ao choque, que é uma das mais sérias complicações das doenças infecciosas. A(s) bactéria(as) responsável(is) pode(m) ser identificada(s) pela realização da cultura do sangue (hemocultura) e é (são) útil (eis) no diagnóstico etiológico e na escolha da terapia. Para o diagnóstico, é importante a colheita de mais de uma amostra (mínimo de 2, ideal de 3), antes da administração de antimicrobianos. O número de amostras e o intervalo entre as colheitas dependem do quadro clínico investigado. Nas bacteriémias agudas e/ou contínuas, recomenda-se a colheita de 3 amostras com intervalo de 1 a 2 horas. Já nas intermitentes, recomenda-se a colheita em intervalos menores e antes ou imediatamente após o início do pico febril. Para a colheita, deve-se fazer anti-sépsia da pele, com álcool a 70%, 2 vezes, e esperar a acção do anti-séptico durante 2 minutos. Esta operação também pode ser realizada utilizando-se uma primeira anti-sépsia com álcool a 70%; posteriormente, utilizar álcool iodado. Puncionar a veia e colher o número de amostras no intervalo de tempo indicado. Deve-se evitar a colheita de sangue na região inguinal. O material biológico utilizado pode ser sangue arterial ou venoso, aspirado de medula óssea ou de qualquer outro líquido biológico. Podem ser colhidos também líquidos de cavidades fechadas para cultura de anaeróbios. Quando o material for sangue, o volume colhido é um dos mais importantes parâmetros na detecção de bactérias na corrente sanguínea. Colher os seguintes volumes nas diferentes faixas etárias: - crianças até 1 ano: 0,5 mL a 1,5 ml em cada frasco de cultura; - crianças de 1 a 6 anos: 1,0 mL por cada ano de idade; - adultos: 20 mL de sangue para cada amostra de hemocultura. Quando for utilizada para cultura de líquidos biológicos, qualquer volume do espécime pode ser utilizado. O sangue colhido é acondicionado em frascos especiais com meio líquido e diferentes de acordo com o tipo de bactéria a ser investigada (aeróbia ou anaeróbia). A rapidez na identificação etiológica do agente bacteriano é essencial para a decisão precoce e adequada do tratamento específico. Os métodos modernos automatizados permitem a disponibilização rápida dos resultados. Nesses métodos, a presença de bactérias é detectada pelo CO2 produzido durante o crescimento bacteriano, que irá modificar o sensor existente no fundo do frasco de cultura, proporcionando a emissão de fluorescência, por sua vez detectada pelo aparelho utilizado para leitura. A presença de crescimento bacteriano no sangue do paciente indica bacteriémia e/ou septicémia. Alguns agentes patogénios devem ser questionados quanto ao seu poder patogénico, como por exemplo o estafilococos coagulase-negativos numa única amostra, Propionebacterium acne e grupo Corynebacterium. Nas infecções hospitalares, os patogénios mais encontrados são Staphylococcus aureus, Escherichia coli, Klebsiella pneumoniae, Enterobacter spp., Pseudomonas aeruginosa, Enterococcus spp. e estafilococos coagulase-negativos. Nas endocardites, os agentes mais frequentemente isolados correspondem aos Estreptococcus spp. alfa-hemolíticos ou mesmo beta-hemoliticos, assim como aos Staphylococcus aureus e aos Stafilococcus coagulase-negativos. O anticoagulante utilizado no meio de cultura (SPS) inactiva o sistema do complemento, porém inibe o crescimento das Neisseria spp. e Gardnerella vaginalis. As bactérias com exigencias especiais, tais como Brucella spp., Leptospira spp., Bartonella spp., Legionella spp., Mycobacteria spp., não crescem nos meios tradicionalmente usados para hemoculturas. Hemocultura para Fungos O isolamento e a identificação de fungos em cultura são prova definitiva no diagnóstico de fungemia. O sangue venoso do paciente é inoculado num frasco especial, que contém os nutrientes necessários ao crescimento adequado dos fungos. Cada frasco contém um sensor capaz de detectar o decréscimo da concentração de oxigénio, resultante do metabolismo e do crescimento do fungo presente na amostra. Esse sensor é monitorizado por equipamento automatizado. No fundo de cada frasco existe um fluorocromo que produz uma fluorescência que é proporcional ao decréscimo do oxigénio na amostra. Na presença de fungos, ocorre consumo de oxigénio e, consequentemente, aumento da fluorescência, que provocará indicação de amostra positiva. Os resultados devem ser interpretados correlacionando-se com o estado clínico do paciente. Alguns fungos podem provocar fungemia transitória, sendo isolados em amostra de hemocultura e com significado clínico duvidoso. Em caso de isolamento de fungo patogénico, o resultado é liberado para o médico o mais rápido possível. A presença de infecção bacteriana concomitante pode inibir o crescimento de fungos, assim como o uso de medicação sistémica. Os frascos utilizados não são selectivos para fungos e permitem também o crescimento de bactérias. Se presentes, as bactérias de crescimento rápido podem mascarar a detecção dos fungos. Alguns fungos, tais como Rodothorula rubra e Blastomyces dermatitidis, podem não ser detectados por esse método, necessitando, para a sua identificação, de outros métodos de cultura adicionais. A identificação de presença de leveduras pelo método automatizado exige uma espera de 7 dias, e os demais fungos, de 30 dias. Para colher a amostra, fazer anti-sépsia da pele com álcool a 70%, 2 vezes, e esperar a acção do anti-séptico durante 2 minutos. Puncionar a veia e colher o sangue. O número de amostras e o intervalo de tempo de colheita entre elas são determinados pelo próprio médico assistente. O volume recomendado é de 3 a 5 mL. Hemoglobina A2, Pesquisa A HbA2 é composta por dois pares de cadeias alfa e delta e é responsável por cerca de 3% da hemoglobina do adulto normal. O nível de HbA2 aumenta gradualmente durante o primeiro ano de vida, quando atinge os níveis de um adulto normal. Os seus níveis podem estar aumentados nalgumas beta-talassemias, doença da hemoglobina H e anemias megaloblásticas. A anemia por deficiência de ferro e as sideroblásticas podem levar à diminuição da sua síntese. Nos casos de beta-talassemias minor, a HbA2 está aumentada (>3,5%), com presença de microcitose e hipocromia eritrocitária e níveis séricos de ferritina normais. Hemoglobina Fetal, Pesquisa Cerca de 80% da hemoglobina do recém-nascido é constituída pela hemoglobina fetal . Ela é composta por 2 cadeias alfa e 2 cadeias gama. Essa hemoglobina possui uma maior afinidade para o oxigénio do que a do adulto. Por volta dos 6 meses após o nascimento, quase toda a hemoglobina fetal é substituída pela do adulto, a hemoglobina A (HbA), restando apenas cerca de 1 a 2% da fetal. Níveis aumentados no adulto podem ser encontrados na persistência hereditária da hemoglobina fetal, nas síndromes beta-talassémicas, na interação talassemia/outra hemoglobinopatia, na anemia falciforme e nas síndromes mieloproliferativas. Alterações discretas podem ser encontradas nas anemias aplásticas, na esferocitose hereditária e na anemia megaloblástica. Hemoglobina Glicosilada O processo pelo qual a hemoglobina e outras proteínas se ligam à glicose é denominado glicosilação e corresponde à adição de forma não-enzimática de resíduos de açúcar a grupos de aminoácidos da proteína. A glicosilação da hemoglobina ocorre durante os 120 dias do período de sobrevida das hemácias. Entretanto, a glicose presente no sangue depende de um intervalo de tempo para glicosilar a hemoglobina. A glicemia dos últimos 30 dias antes do doseamento contribui com 50% da hemoglobina glicosilada doseada, e as glicemias dos últimos meses (2 a 4), com 25%. O doseamento final, portanto, corresponde à média ponderada dos níveis das glicemias das 6 a 8 últimas semanas antes do doseamento. No indivíduo adulto normal, a hemoglobina circulante é composta por 97% de HbA, 2,5% de HbA2 e 0,5% de HbF. A hemoglobina predominante, a hemoglobina A, é formada por 2 subunidades alfa e 2 subunidades beta. Por isso, as moléculas de açúcar podem ligar-se em diferentes sítios da hemoglobina, produzindo distintas formas de hemoglobinas glicadas ou glicosiladas. A hemoglobina glicosilada HbA1 é uma hemoglobina de migração rápida na electroforese, que tem um açúcar ligado ao local de maior reactividade para glicação, o aminoácido N-terminal da cadeia beta. É encontrada em níveis aumentados nos pacientes com hiperglicemia mantida e dentro dos limites de referência em indivíduos normais. De acordo com a metodologia empregue, podemos isolar apenas a HbA1 ou isolar as suas diferentes fracções, que são designadas como HbA1a, HbA1b HbA1c.Como a HbA1c representa cerca de 80% da HbA1, a sua avaliação reflete com fidelidade o grau de glicosilação da hemoglobina. Além disso, a HbA1c é a única irreversivelmente glicada e, portanto, suficientemente estável para ser utilizada para monitorização dos níveis glicémicos. A membrana da hemácia é totalmente permeável à glicose, expondo a hemoglobina a concentrações de glicose similares às plasmáticas. É com essa exposição que acontece a ligação da glicose com a valina N-terminal da cadeia beta da hemoglobina A. Embora existam diversos métodos para a quantificação da hemoglobina glicosilada, tais métodos podem ser divididos em dois grandes grupos, de acordo com o principio utilizado: a separa ção por diferenças estruturais (cromatografia HPLC/coluna e electroforese) e a separação por diferença de carga (cromatografia de troca iónica HPLC/coluna e método imunoenzimático). Os dois métodos mais utilizados são o cromatográfico por troca iónica e a cromatografia de afinidade. A cromatografia por troca iónica sofre a interferência de hemoglobinas variantes, como a HbS e HbC, e também por drogas ou substâncias que alterem a carga da hemoglobina. Já a cromatografia de afinidade não sofre a influência das hemoglobinas variantes, nem de medicamentos. No entanto, não consegue quantificar a fracção e sim o total de hemoglobinas glicosiladas. A literatura tem apontado a quantificação da HbA1c por HPLC como método de referência pelo DCCT (Diabetes Control and Complications Trial). Recomenda-se a monitorização a cada 3 meses em todos os pacientes diabéticos. Nalguns casos, como na diabetes gestacional ou com mudanças importantes do esquema terapêutico, a monitorização poderá ser mais frequente (a cada 4 semanas). As principais interferências são as patologias que alteram a semi-vida da hemácias, hemoglobinopatias e nefropatias crónicas. Hemoglobina H, Pesquisa A hemoglobina H (HbH) pode ser encontrada na alfa-talassemia. É uma hemoglobina composta por 4 cadeias beta. A doença manifesta-se por anemia hemolítica crónica de grau moderado. A sua presença pode ser detectada pela electroforese da hemoglobina ou pela observação de corpos de inclusão que podem ser observados no sangue periférico por coloração especial. As inclusões de hemoglobina H ocorrem pela precipitação de cadeias em excesso. Está também descrita uma forma adquirida da doença da HbH observada nalguns pacientes com síndromes mieloproliferativos e mielodisplásicos. Hemoglobina S, Pesquisa A hemoglobina S pode apresentar-se de formas homozigótica (HbSS), heterozigótica, (HbAS), ou ainda associada a outras variantes de hemoglobinas, como a hemoglobina fetal e alfa ou beta-talassemia. É possível a detecção da hemoglobina S pela electroforese da hemoglobina. Entretanto, a presença necessita de ser confirmada por metodologias específicas, visto que é possível observar outras fracções de hemoglobina na mesma posição, como a HbD e a Hb Lepore, entre outras. Estão disponíveis diferentes métodos para confirmação da HbS, como a electroforese em pH ácido, a solubilidade e o teste de céluals falciformes. A electroforese em pH alcalino com avaliação da percentagem de HbS é útil na identificação e avaliação da concentração de HbS. Hemoglobina, Solubilidade Neste teste, investiga-se a presença de HbS, por meio da lise das hemácias e redução da possível hemoglobina S presente, pela acção do ditionito de sódio. Como a HbS é insolúvel em tampões inorgânicos concentrados, formam-se polímeros que produzem opacidade. O teste é útil como triagem para anemia falciforme, sendo positivo na presença de HbS e de outras hemoglobinas também insolúveis como HbC, HbC Harlem e Hb Bart. Reações falso-positivas podem ocorrer devido à turvação ocasionada pela presença de grande quantidade de corpos de Heinz e da presença de precipitação de proteínas plasmáticas. Podem ocorrer falso-negativos na presença de pequenas quantidades de HbS, alta concentração de hemoglobina fetal e anemia grave. Hemoglobinas Instáveis As hemoglobinas chamadas instáveis constituem um grupo composto por cerca de 80 diferentes tipos de hemoglobinas anormais, que cursam, nos seus portadores, com anemias hemolíticas agudas ou crónicas. Podem ser identificadas pela instabilidade das suas cadeias polipeptídicas, que se precipitam quando submetidas ao calor, levando a uma reacção de floculação. Esta instabilidade deve-se a uma ligação anormal entre as cadeias alfa e beta ou na região do heme. A hemólise pode ser induzida por diferentes medicamentos e por processos infecciosos bacterianos ou víricos. Nestes pacientes, é frequente, após esplenectomia, a presença de corpos de Heinz nas hemácias, por colorações especiais. É também um achado laboratorial comum a presença de metaemoglobina proveniente da constante oxidação do heme. A presença de altas concentrações de hemoglobina fetal é uma limitação para essa investigação. Hemoglobinopatias A hemoglobina é uma proteína composta por dois pares de cadeias polipeptídicas e pelo heme (estrutura porfirínica que possui no interior um átomo de ferro mantido em estado ferroso). As cadeias polipeptídicas são compostas por combinações entre os diversos tipos de cadeias, resultando em hemoglobinas diferentes na sequência de seus aminoácidos. As cadeias são identificadas como a (alfa), b (beta),g (gama), d (delta) e as embrionárias e (épsílon) e z (zeta). Cerca de 80% da hemoglobina do recém-nascido é constituída pela hemoglobina fetal (duas cadeias a e duas cadeias g ). Essa hemoglobina possui maior afinidade com o oxigénio do que a do adulto. Por volta dos 6 meses após o nascimento, quase toda a hemoglobina fetal é substituída pela do adulto, a hemoglobina A (HbA), restando apenas cerca de 1 a 2% da fetal. A HbA é composta por dois pares de cadeias alfa e beta. Representa quase a totalidade da hemoglobina do adulto, que pode apresentar mínimas fracções da hemoglobina fetal e da chamada HbA2 (dois pares de cadeias alfa e delta). Existe um grupo de hemoglobinas chamadas de anormais porque diferem do ponto de vista estrutural e bioquímico da hemoglobina normal (HbA). As mutações são genéticas, podendo ter o caráter homozigótico ou heterozigótico, e são consequência de alterações dos genes estruturais (alterações qualitativas) ou dos genes reguladores (alterações quantitativas) que comandam a síntese das cadeias polipeptídicas. Portanto, as alterações ditas qualitativas são as que afectam estruturalmente a formação das cadeias, resultando em hemoglobinas bioquimicamente diferentes, denominadas anormais ou variantes. São causadas na sua maioria pela substituição de aminoácidos, sendo as mais comuns, no Ocidente, a hemoglobina falciforme (HbS), que decorre da substituição do ácido glutámico por valina na posição 6 da cadeia beta, e a hemoglobina C (HbC), decorrente da substituição do ácido glutámico por lisina, também na cadeia beta. Existem mais de 300 tipos diferentes de hemoglobinas anormais descritos, mas apenas uma pequena parte delas está associada a manifestações clínicas e hematológicas. Elas podem ser identificadas pela mobilidade electroforética e são designadas por letras. A primeira a ser identificada foi a HbS, assim denominada pela aparência característica em foice da hemácia falciforme que, em inglês, é sickle (foice), o que explica a denominação HbS. Nos anos que se seguiram, foram descritas muitas outras variantes. A partir de 1962, durante o Congresso da Sociedade Internacional de Hematologia, estabeleceu-se a regra para a descrição das variantes reconhecidas a partir daquela data. Ficou estabelecido que passariam a receber designações seguindo o alfabeto (C, D, E, G, H) e que, quando com a mesma mobilidade electroforética porém com estruturas diferentes, seriam identificadas pela cidade onde foram descobertas. As mutações dos genes reguladores promovem alterações quantitativas que levam a anormalidades da síntese das hemoglobinas, com uma deficiência na produção de uma ou mais cadeias polipeptídicas da hemoglobina. Esta ocorrência dá origem às talassemias, classificadas de acordo com a cadeia que é produzida em taxa reduzida como a-tal e b-tal, as mais frequentes. São descritas também a b-d-tal, dtal e a g d b -tal. Os quadros clínicos variam de assintomáticos a moderados, leves e muito graves. Mais informações de exames relacionados: Curva de fragilidade osmótica Electroforese de hemoglobina Hemoglobina A2, S, H, fetal Hemoglobinas instáveis Hemograma Hemoglobina, Solubilidade Hemograma O hemograma contempla diversas provas efectuadas, com a finalidade de avaliar quantitativa e qualitativamente os componentes celulares do sangue. Os itens avaliados incluem: eritrócitos, hemoglobina, hematócrito, índices hematimétricos, leucócitos totais, contagem diferencial de leucócitos, plaquetas e exame microscópico de esfregaço de sangue após coloração. A análise quantitativa dos eritrócitos, leucócitos totais, plaquetas e a avaliação dos índices hematimétricos são hoje realizados por meio de equipamentos automatizados que combinam diferentes métodos de avaliação de alta tecnologia e precisão à capacidade de análise de milhões de células, permitindo resultados mais precisos. A utilização desses equipamentos permite também a avaliação de índices hematológicos e a visualização em histogramas que demonstram a distribuição dos diferentes elementos analisados. Essa característica possibilita a identificação de alguns parâmetros antes impossíveis de serem avaliados ou que eram analisados subjetivamente, com a visualização do esfregaço em lámina. Entre esses parâmetros, temos o índice de anisocitose (RDW), a identificação de populações mistas de células, a anisocitose plaquetária e alertas para possíveis alterações presentes na amostra examinada. Esses alertas são específicos para alterações das séries vermelha, branca e das plaquetas, como presença de blastos, granulócitos imaturos, desvio à esquerda, linfocitos atípicos, agregados plaquetários, microcitose, hipocromia, entre outros. Realizam ainda, por uma combinação de métodos de análise celular e coloração, a contagem diferencial de leucócitos, que serve de orientação para o hematologista, chamando a atenção para situações nas quais a avaliação deve ser mais cuidadosa. A análise qualitativa é realizada pela avaliação da lámina corada, associada aos resultados obtidos pela avaliação electrónica. A coloração das células diferencia em detalhes as estruturas nucleares e citoplasmáticas, permitindo a avaliação do tamanho das células, a relação núcleo/citoplasma, a forma do núcleo, a presença de nucléolos, o padrão da cromatina e a coloração do citoplasma, a presença de granulação, vacúolos e outras alterações morfológicas. Os resultados auxiliam a identificação de doenças de origem primária ou secundária de características agudas ou crónicas. São utilizados também para acompanhar a evolução de uma variedade de doenças e para monitorizar os efeitos colaterais decorrentes do uso de medicamentos. A avaliação eritrocitária pode identificar processos anémicos, policitémicos, alterações de forma e tamanho dos eritrócitos. A avaliação leucocitária pode identificar processos inflamatórios, infecciosos, alérgicos, parasitários e leucémicos. Pode também indicar a presença de elementos anormais e de linfocitos atípicos. A avaliação plaquetária identifica processos de trombocitopenias adquiridas ou hereditárias e trombocitoses. SÉRIE VERMELHA A contagem de eritrócitos é a primeira informação fornecida e é expressa em milhões por mm3. Os níveis de eritrócitos iguais ou maiores que 6,20 milhões/mm3 em homens e iguais ou maiores que 5,70 milhões/mm3 em mulheres são considerados poliglobulia. A concentração de hemoglobina é expressa em g/dL, e a sua avaliação é de grande importância pelo papel no transporte de oxigénio e por estar directamente relacionada à anemia, sendo a melhor forma de avaliação laboratorial. O volume relativo dos eritrócitos dentro do volume de sangue é fornecido pela análise do hematócrito, que é expresso em percentagem. A relação entre esses diferentes parâmetros pode ser obtida pela análise dos índices hematimétricos que irão fornecer informações adicionais sobre as variações de volume e concentração da hemoglobina. Os achados morfológicos do esfregaço após coloração fornecem mais informações sobre conteúdo da hemoglobina, forma, tamanho e inclusões eritrocitárias. Índices Hematimétricos Volume Corpuscular Médio - VCM Avalia a média do tamanho (volume) dos eritrócitos, que estão no tamanho normal, e são denominados normocíticos, diminuídos (microcíticos) ou aumentados (macrocíticos). O achado de microcitose é comum em anemias por deficiência de ferro, nas doenças crónicas e nas talassemias. O aparecimento de macrocitose pode estar associado à presença de um grande número de reticulócitos, ao tabagismo e à deficiência de vitamina B12 e de ácido fólico. ALTERAÇÃO DE TAMANHO NORMOCITOSE MICROCITOSE MICROCITOSE DISCRETA MICROCITOSE ACENTUADA MACROCITOSE MACROCITOSE ACENTUADA ANISOCITOSE ADULTOS CRIANÇAS ATÉ 3 ANOS CRIANÇAS DE 4 A 14 ANOS 81,0 73,0 73,0 <ou = 81,0 <ou= 71,0 <ou= 73,0 80 a 80,9 71 a 72,9 73 a 74,9 < 60 < 60 < 60 > 90 > 99 > 99 >120 > 120 > 120 Presença de eritrócitos com volumes diferentes Hemoglobina Corpuscular Média (HCM) Índice hematimétrico que corresponde à média de hemoglobina por eritrócito. Pode estar elevado na presença de macrocitose e diminuído na presença de eritrócitos microcíticos. Concentração da Hemoglobina Corpuscular Média (CHCM) É a avaliação da hemoglobina encontrada em 100 mL de eritrócitos. Este índice permite a avaliação do grau de saturação de hemoglobina no eritrócito. A saturação da hemoglobina normal indica a presença de eritrócitos ditos normocrómicos. Quando diminuída, teremos eritrócitos denominados hipocrómicos e, quando aumentados, eritrócitos hipercrómicos. RDW (Red Cell Distribution Width) A variação do tamanho dos eritrócitos é analisada electronicamente pela variação de impulsos obtidos durante a leitura. A análise dessa variação permite a obtenção deste novo índice, que representa a amplitude de distribuição dos glóbulos vermelhos, servindo como um índice de anisocitose, que se altera precocemente na deficiência de ferro, mesmo antes da alteração de outros parâmetros, como a alteração do VCM e a diminuição da hemoglobina. Alterações da Cor (Características Tintoriais) A coloração dos eritrócitos reflecte a concentração da hemoglobina e pode ser ocasionada: - pela diminuição da concentração de hemoglobina e consequente redução da cor, que leva à chamada hipocromia; - pela presença de células com diferentes concentrações de hemoglobina chamada anisocromia; - pela presença de um grande número de reticulócitos que caracteristicamente têm uma cor azulada, que junto com a cor normal, produz a chamada policromasia. POIQUILOCITOSE Variação das formas dos eritrócitos que normalmente se apresentam numa forma circular e com uma halo central claro. ........................................................................... ELIPTÓCITOS/ Eritrócitos elípticos e ovalados, que ocorrem na ovolacitose hereditária OVALÓCITOSE (eliptocitóse) e podem também ser encontradas em anemias carenciadas e mais raramente nas talassemias e outras anemias. ........................................................................... ESFERÓCITOS Eritrócitos pequenos, de forma esférica e hipercorada que aparece na esfericitose hereditárias e nas animias hemolíticas auto-imunes. ........................................................................... DACRIÓCITOS Eritrócitos em forma de lágrima. Ocorrem provavelmente por atrazo da saída da medula óssea. Presente na metaplasia mielóide, na anemia megaloblástica, nas tatassemias e na esplenomegalia. .......................................................................... CODÓCITOS Células em forma de alvo. Ocorre um excesso de membrana, o que faz com que a heoglobina se distribua num anél periférico, com uma zona densa central. Encontradas nas talassemias, na hemoglobina C, icterícia obstrutiva e na doença hepática severa. .......................................................................... DREPANÓCITOS Eritrócitos em forma de foice, caracteristica da anemia falsiforme. .......................................................................... ACANTÓCITOS Eritrócitos pequenos com projeções irregulares. Célula peculiar da betalipoproteinemia hereditária, presente também noutras dislipidemias, na cirrose hepática, na hepatite do recám-nascido, na anemia hemolítica, após esplenectomia e após administração de heparina. .......................................................................... ESQUIZÓCIOTS Fragmentos de eritrócitos de tamanhos diferentes e com fromas bizarras. Observados em muitos casos de próteses valvulares e vasculares, microangiopatias, síndrome hemolítico-urêmico, nos casos de queimaduras graves e na coagulação intravascular disseminada. . . . . Inclusões e Outras Variações das Hemácias As inclusões que podem ser observadas nos eritrócitos estão relacionadas com diferentes patologias e são consequência do aumento ou de defeitos da eritropoiese. Dependem, também, da capacidade do baço de retirar da circulação as hemácias mal formadas. Outras alterações também podem ser observadas, como a presença de eritroblastos e a formação de rouleaux. ANEL DECABOT Figura em forma de anel observada na anemias megaloblásticas, podendo, nalguns casos, torcer-se, assuimindo um aspécto de oito (8). Pode também ser observada noutras situações de eritropoiese anormal. É um filamento fino, de cor vermelho-violeta, concêntrico em relaçãoa à membrana celular, que resulta de restos mitóticos de mitoses anomalas. ........................................................................... CORPÚSCULOS DE HOWEL JOLLY Corpúsculo de inclusão pequena, basófilo, restos nucleares de mitoses anomalas. São observados em pacientes esplenectomizados, nas anemias hemolíticas e megaloblásticas. ........................................................................... PONTILHADO BASÓFILO Granulações variáveis em número e tamanho, de cor azulada, agregados de ribissomas remanescentes. podem ser encontradas na intoxicação por metais especialmente o chumbo, nas talassemias, e outras alterações da hemoglobina, nas mielodisplasias e noutras formas de anemia severa. ........................................................................... CORPOS DE HEINZ Precipitados de hemoglobina desnaturada que podem ser encontrados aderidos à membrana dos eritrócitos, em pacientes com anemia hemolítica por alguns fármacos, na deficiência da glicose-6-fosfato desidrogenase e nos síndromes das hemoglobinas instáveis. Para a sua visualização, é necessário coloração especial com azul de cresil brilhante. ........................................................................... CORPÚSCULO DE PAPPENHEIMER Associados a ribossomas remanescentes, apresentam-se como pontos enegrecidos, agrupados ou localizados nas anemias hemolíticas e sideroblásticas. ........................................................................... ROULEAUX Aglutinação dos eritrócitos que formam verdadeiras pilhas, podendo ser observadas em lámina corada, são decorrentes da concentração elevada de fibrinogénio ou de globulinas, especialmente nas gamapatias monoclonais. Levam ao aumento da velocidade de hemossedimentação. ........................................................................... ERITOBLASTOS São eritrócitos nucleados que podem aparecer no sangue periférico devido a grandes regenerações eritrocitárias, ou como consequências de infiltração medular. Aparecem na anemia hemolítica e nas reações leuco-eritroblásticas (fibrose e metástase medular). SÉRIE BRANCA A contagem global e diferencial de leucócitos e suas alterações quantitativas e qualitativas são as principais informações fornecidas na análise da série branca. Os leucócitos totais são expressos em mil/mm3. A contagem diferencial é de grande importância, podendo definir perfis patológicos, e é fornecida pela análise conjunta dos equipamentos automáticos e pela leitura do esfregaço corado, que avalia as diferentes formas leucocitárias e as expressa de forma percentual (relativa) e em mm3 (absoluta). A análise das alterações morfológicas dos leucócitos também é realizada por observação microscópica do esfregaço corado. Os leucócitos podem ser divididos em granulócitos (mielócito, metamielócito, com forma de bastonete, neutrófilos, eosinófilos e basófilos), monócitos e linfócitos. Alterações Morfológicas dos Leucócitos Pelger-Hüet É uma alteração hereditária autossómica dominante rara, que se caracteriza pelao presença de neutrófilos hipossegmentados, sem que no entanto ocorra alteração da função da célula. Os neutrófilos aparecem na periferia com discreta segmentação (bilobulados) ou mesmo sem segmentação (como bastonetes). Como não conduz a alterações funcionais, não apresenta repercussões clínicas. O diagnóstico assume importância afim de evitar a sua interpretação como um desvio à esquerda. Pode também ser encontrada nos eosinófilos. Existe, ainda, um quadro chamado de pseudo-Pelger-Hüet, no qual esta alteração pode ser adquirida, sendo causada por reacções a fármacos e em alguns casos de mielodisplasias e leucemias. Alder-Reilly É uma alteração hereditária autossómica recessiva, que se caracteriza por grânulos grosseiros de cor púrpura, os quais podem ser encontrados em granulócitos, monócitos e linfócitos. May-Hegglin Alteração hereditária autossómica dominante rara, na qual os neutrófilos apresentam inclusão citoplasmática azulada de RNA, semelhante aos corpos de Döhle, associada a trombocitopenia leve e à presença de plaquetas gigantes. Chediak-Higashi Doença autossómica recessiva rara, em que os granulócitos, monócitos e linfócitos se apresentam com gránulos gigantes, associada a infecções piogénicas frequentes e anormalidade funcional dos leucócitos, geralmente com sobrevida curta. Alterações Adquiridas Entre as alterações adquiridas, pode ser destacada a presença de corpúsculos de Döhle, inclusões ovais azuladas encontradas na periferia do citoplasma. Geralmente, encontram-se isolados e são consequência de ribossomas que persistiram e costumam ser encontrados em infecções e grandes traumas. O achado de granulações grosseiras (tóxicas) no citoplasma dos neutrófilos pode acontecer em longos processos infecciosos. As vacuolizações citoplasmáticas acontecem em resultado da depleção dos gránulos azurófilos no processo de fagocitose. Plaquetas A avaliação das plaquetas pode ser feita de forma quantitativa, expressa em mm3, e de modo qualitativo, pela avaliação das características analisadas no esfregaço corado, o que permite a identificação de alterações morfológicas das plaquetas. A utilização de equipamentos automáticos, além de fornecer contagens mais precisas, permite que se obtenham informações em relação à presença de anisocitose e agregados plaquetários, e também de índices plaquetários, que na sua maioria ainda não são liberados para uso clínico. Entre eles, os que começam a ser utilizados são o MPV (Mean Platelet Volume), considerado um índice de anisocitose plaquetária, e o PDW (Platelet Distribution Width). Entretanto, ainda faltam maiores dados de correlação clínica. As alterações quantitativas podem ser tanto o aumento da quantidade de plaquetas, chamada hiperplaquetémia, quanto a diminuição, denominada plaquetopenia. Consultar Plaquetas. Hepatites A hepatite vírica consiste numa doença inflamatória, com quadro clínico infeccioso. São conhecidos vários tipos de vírus hepatotrópicos, com características físicoquímicas e epidemiológicas próprias para cada tipo e subtipos. As infecções desenvolvem-se de forma transitória ou persistente, favorecendo a evolução para a infecção aguda autolimitada, estado de portador crónico assintomático e doença crónica. Observa-se, com frequência, o desenvolvimento clínico associado às manifestações sistémicas, semelhantes àquelas observadas em diferentes infecções, não permitindo, dessa forma, o diagnóstico etiológico preciso. Os principais agentes víricos hepatotrópicos causadores de hepatite são designados como: vírus da hepatite A (HAV); vírus da hepatite B (HBV); vírus da hepatite C (HCV); vírus da hepatite Delta (HDV); vírus da hepatite E (HEV) e vírus GBV-C (HGV). Cada um apresenta características estruturais e genómicas que permitem diferenciá-los, detectadas por diferentes metodologias laboratoriais com sensibilidade e especificidade definidas. Infecções persistentes causadas por HBV, HCV e HDV estão sempre associadas a doença hepática crónica, podendo evoluir para cirrose e hepatocarcinoma. Hepatite A O vírus da hepatite A (HAV) classifica-se na família Picornaviridae e é transmitido por via fecal-oral, determinando formas esporádicas e epidémicas de hepatite aguda. Água e alimentos contaminados constituem as vias mais comuns em surtos epidémicos. O período de incubação da doença é de 4 semanas, com evolução clínica de forma branda a moderada e ausência de formas crónicas. A hepatite fulminante é descrita em 0,2 a 0,7% dos indivíduos infectados. Em crianças na faixa etária de 1 a 10 anos, a hepatite A é geralmente anictérica e assintomática. A presença da imunoglobulina M específica (IgM anti-HAV) no sangue é quase sempre concomitante ao período sintomático da hepatite aguda. Títulos elevados, obtidos por metodologias de diluições seriadas ou por comparação aos valores limites (cut off), são detectados na fase aguda e no início da convalescença. Títulos menores são detectados 3 a 4 meses após o acometimento da doença e podem persistir por mais de 6 meses, em 20 a 30% dos indivíduos, e até por 1 ano em 5 a 10%. Nos casos em que os sintomas precedem por poucos dias, a detecção de IgM anti-HAV, recomenda-se a serologia pareada. A segunda colheita, feita após 15 a 20 dias, é útil para a confirmação do resultado reactivo, definindo o laudo de positividade. Os métodos actuais para a pesquisa em soro e plasma permitem a detecção qualitativa e, eventualmente, um cálculo estimado, semiquantitativo, pela análise comparativa da reactividade do teste com o valor limite (cut-off). Anticorpos da classe IgG anti-HAV permitem a definição de infecção passada. Resultados de seroconversão, traduzidos por anticorpos IgG não-reactivos numa primeira análise e reactivos na segunda colheita, com intervalos de 20 a 30 dias, estão associados a infecção recente. A resposta imune aos diferentes antigénios estruturais, proteínas do capsídeo viral, VP0, VP1 e VP3, ocorre a partir da quarta semana após a infecção, com títulos máximos de anticorpos após a sétima semana. A pesquisa do RNA-HAV em soro, plasma e suspensão fecal é um método pouco utilizado, embora permita a detecção do genoma viral a partir do segundo dia após a infecção, podendo prolongar-se até o 25º dia. A metodologia de PCR pode detectar períodos mais longos de virémia (várias semanas), em concentrações elevadas, de 104 a 106 partículas virais/mL de sangue. A heterogeneidade de sequências genómicas de isolados víricos obtidos em diferentes partes do mundo definiu, até ao momento, 7 genótipos e 1 sorotipo de HAV. Hepatite A Fase de Incubação Anticorpos totais antiHAV (serologia) Anticorpos IgM antiHAV (serologia) RNA-HAV (pesquisa em suspenção fecal P: Positivo. N: Negativa. Fase aguda Fase Crónica Resposta sintomática Canvalecência Sintomática ou eficaz à ou Assintomática vacinação assintomática N N P P P N P P N Não há comfirmação de evolução para cronicidade. São descritos casos esporádicos de hepatite fulminante e de reagudização. P N N Considerações gerais O HAV acomete população pediátrica com evolução assintomática e população adulta com sintomatologia evidente. Resultado reactivo em primeira avaliação e comfirmado em segunda avaliação. Resultado não-reactivo em primeira análise e confirmado em segunda avaliação. Hepatite B O vírus da hepatite B (HBV) pertence à família Hepadnaviridae e apresenta três formas distintas: partículas defectivas esféricas, tubulares e o vírião, constituído por um envólucro (antígeno de superfície do vírus da hepatite B - HBsAg), nucleocapsídeo (antígeno do core - HBcAg e antigénio e - HBeAg), DNA de cadeia dupla parcial e a enzima polimerase. A transmissão ocorre por via parenteral, com a presença obrigatória de sangue ou derivados. A transmissão sexual é eficaz, da mesma forma que a materno-fetal, sendo a eficácia definida pelo grau de replicação viral ou pela quantidade de vírus, avaliada pela concentração de DNA-HBV (carga viral) no sangue. O HBV é detectado em sangue, saliva, leite materno, secreções vaginais, sémen e líquido ascítico. A transmissão homossexual tem diminuído em consequência da consciencialização e das acções efectuadas para controlar a epidemia de SIDA. A transmissão heterossexual responde por mais de um terço dos casos novos nos EUA. A taxa de portadores do HBV varia enormemente no mundo. A taxa global nos EUA é 0,3%; em zonas da África, Filipinas, e Ásia, alcança 20%. O risco de adquirir HBV após acidente com agulhas contaminadas varia de 20%, nos casos em que o paciente é positivo para HBsAg, a 66%, quando o paciente é positivo para HBsAg e HBeAg. Estima-se a existência mundial de 300 milhões de portadores crónicos do vírus da hepatite B (HBV). A história natural de infecção aguda por HBV varia de acordo com a idade do paciente e o tempo de infecção. Em adultos, 95% dos casos evoluem com vários graus de gravidade da doença aguda, havendo resolução espontânea na maioria. Cerca de 5% de adultos e 90% de recém-nascidos infectados desenvolvem hepatites crónicas. O período de incubação para HBV varia de 45 a 180 dias. As características clínicas da doença variam consideravelmente. A icterícia acontece em menos de 10% dos casos em crianças abaixo de 5 anos de idade. Porém, a icterícia manifesta-se em 50% de crianças mais velhas e em adultos. Os sintomas incluem anorexia, náusea, vómitos, queixas gripais e fadiga. Achados físicos variam de anormalidades inespecíficas mínimas a icterícia e hepatomegalia e, ocasionalmente, características extra-hepáticas que refletem fenômenos imunológicos, como vasculites, nefrites por imunocomplexos, artrites e poliarterite nodosa. A maioria dos adultos com infecção por HBV aguda apresenta recuperação total, e cerca de 5%, especialmente os homens, desenvolve infecção crónica, que é frequentemente assintomática. Dez a 20% desses pacientes podem progredir para cirrose ou carcinoma hepático. Três fases de replicação viral acontecem durante o curso da infecção por HBV, especialmente em pacientes com hepatites crónicas. Fase de Alta Replicação Está associada à presença de HBsAg, HBeAg e HBV DNA. Ocorrem aumentos nas aminotransferases, e, histologicamente, comprova-se a actividade inflamatória moderada. O risco de evolução para cirrose é alto. Fase de Baixa Replicação Associada a perda do HBeAg, a diminuição ou a não-detecção de concentrações de DNA-HBV. A soroconversão, com aparecimento de anti-HBe, pode indicar diminuição da actividade inflamatória, uma vez que indica diminuição da replicação vírica. Fase Não-Replicante Associada a ausência, a concentrações indetectáveis ou só detectáveis por meio de técnicas ultra-sensíveis de marcadores de replicação viral, a inflamação apresentase diminuída, e os achados histológicos não são significativos. O aumento das aminotransferases, especialmente da ALT (TGP), durante a hepatite aguda B, varia de um aumento médio a moderado a um aumento notável, superior a 100 vezes o valor da normalidade. As concentrações de ALT são normalmente mais altas que as de AST. A concentração de bilirrubina sobe na maioria dos pacientes com infecção aguda. A icterícia clínica manifesta-se em 50% de adultos com concentrações de bilirrubina de 3,0 mg/dL. Concentrações maiores podem acontecer. Uma elevação leve da fosfatase alcalina também é evidente. Em pacientes que desenvolvem insuficiência hepática fulminante, uma queda rápida em ALT e AST (TGO) pode levar à conclusão errónea de que a infecção hepática está a melhorar, quando na realidade, há perda de hepatócitos. Aumentos nas concentrações de aminotransferases durante mais de 6 meses são indicativos de evolução para hepatite crónica. O HBV pode determinar uma variedade de doenças hepáticas, incluindo infecção aguda autolimitada, hepatite fulminante, hepatite crónica com progressão para cirrose e falência hepática, hepatocarcinoma e estado de portador crónico assintomático. Sistemas de antigénios e anticorpos específicos são definidos como marcadores biológicos e sorológicos do HBV e podem ser detectados por testes laboratoriais sorológicos que apresentam alta sensibilidade e especificidade. O HBsAg e a IgM anti-HBc são os principais marcadores em processos de infecção aguda, embora a IgM anti-HBc possa permanecer reactiva por alguns meses, em determinados indivíduos, após essa fase. O HBsAg pode ser detectado em soro e plasma, em períodos de 3 a 13 semanas após o início da infecção, dependendo da carga viral à qual o indivíduo foi exposto. Marcadores da Hepatite B Fase de Incubação HBsAg (antigénio de envólucro P Anticorpo Anti-HBs N Quando positivo, é indicativo de alta replicação viral e simultâneo ao HBsAg, com prognóstico HBeAg desfavorável. (antigénio de Negativo e nucleosimultâneo ao capsídeo viral) HBsAg com significado de baixa replicação, conferindo melhor prognóstico. Fase aguda sintomática ou assintomática Fase crónica sintomática ou assintomática Resposta eficaz à Vacinação P em alta concentração N > 10 mU/ml evoluindo para superior a 100 mU/ml N 10 mU/ml após a 1ª dose 100 mU/ml após a 2ª dose 1000 mU/ml após a 3ª dose N P em altos títulos ou N: em casos de mutações da região pré-core. N Convalecência Baixa P:em altas concentração ou concentrações N N P ou N Anticorpo Anti-HBe HBcAg (útil em pesquisa) IgM anti-HBc Ac totais antiHBc DNA-HBV quantitativo N ou P:baixa concetração N ou P N ou P N N P P N P N N P N N N N N P P N P: define replicação viral activa com alta produção de vírus. P N P N >500.000 N ou cópias/ml (sem N <10.000cópias/ml tratamento) P: Positivo. Resultado reactivo na primeira avaliação e comfirmado na segunda avaliação. N: Negativa. Resultado não-reactivo em primeira análise e confirmado em segunda avaliação. DNA-HBV Carga viral >100.000 cópias/ml >100.000 cópias/ml A concentração máxima anterior ao desenvolvimento dos sintomas pode ser definida por alguns métodos quantitativos ou estimada por métodos semiquantitativos, quando comparada ao valor limite da reacção (cut-off). Estimase que 5 a 10% dos indivíduos infectados apresentem a IgM anti-HBc como único marcador de infecção aguda. Outro antigénio estrutural, HBeAg, deve ser pesquisado sempre após a confirmação do marcador HBsAg. A detecção do antigénio, que pode ocorrer antes do desenvolvimento dos sintomas, define o grau de infectividade e de replicação viral. A soroconversão para anti-HBe ocorre durante as 5 primeiras semanas da doença, definindo a diminuição da replicação viral e, consequentemente, do grau de infectividade. A persistência do HBsAg, em concentrações elevadas, da ordem de dez a cem vezes o valor limite, e a presença do HBeAg em análises seriadas, por períodos de até 4 meses, associam-se à evolução para a infecção crónica. Anticorpos contra o HBcAg, da classe IgG, são detectados de 12 a 20 dias após a fase aguda da doença, persistindo por muitos anos. Esses anticorpos podem indicar infecção passada, na ausência de HBsAg, ou infecção crónica, quando associados ao antigénio de superfície. Alguns estudos demonstram a presença de IgG anti-HBc como único marcador em até 10% dos indivíduos. Este resultado apresenta significados diferentes que devem ser analisados para determinadas situações: - Baixas concentrações de IgG anti-HBc, geralmente inferiores a 10 vezes o valor limite, sugerem infecção passada sem replicação viral; - Altas concentrações de IgG anti-HBc, superiores a 10 vezes o valor limite, sugerem infecção passada com replicação viral indetectável, sendo necessário, nesses casos, o acompanhamento por meio da pesquisa do DNA HBV por PCR qualitativo; - Valores de IgG anti-HBc próximos ao valor limite sugerem reactividade inespecífica. Em todos os casos mencionados, deve-se avaliar a necessidade de análises em novas colheitas, utilizando-se metodologias de diferentes procedências. A complementação dos resultados, por meio da análise do HBeAg e anti-HBe, deve ser realizada. Porém, a ausência do antigénio nem sempre está associada a diminuição da replicação viral. A não-detecção do HBeAg em portadores com elevada replicação viral é possível e associa-se às mutações do DNA HBV na região do pré-core/core. A detecção do DNA HBV em soro, plasma e tecido hepático auxilia na definição da replicação viral efectiva (indivíduos HBsAg-negativo) e no diagnóstico precoce (crianças nascidas de mães HBsAg-positivo). Após a detecção qualitativa, recomenda-se a análise quantitativa da carga viral (DNA HBV). Essa avaliação apresenta sensibilidade superior a 70% quando comparada à detecção do HBeAg, sendo indicada para a monitorização do tratamento. A pesquisa de anticorpos específicos para o HBsAg é indicada para definir a fase de convalescença e redução drástica da replicação viral, sugerindo imunidade. A recomendação para o diagnóstico laboratorial é a análise de pelo menos 2 amostras de material biológico, soro ou plasma, em períodos diferentes, seguindo metodologias tradicionais. Hepatite C O vírus da hepatite C (HCV) é classificado na família Flaviviridae. Apresenta RNA de cadeia simples, polaridade positiva, com cerca de 9.400 nucleotídeos. Até a sua identificação e caracterização em 1989, por Choo e colaboradores, os casos clínicos não-diagnosticados sorologicamente para os vírus das hepatites A e B ou outros vírus hepatotrópicos conhecidos (Epstein-Barr, febre amarela, citomegalovírus, vírus da hepatite delta) eram rotulados como hepatite por vírus não-A e não-B. Sabe-se, actualmente, que o HCV é o principal agente etiológico, responsável por 90 a 95% dos casos de hepatite pós-transfusional não-A e não-B. A transmissão ocorre por via parenteral, por intermédio do sangue e derivados, pela utilização de agulhas e seringas contaminadas e transplantes de órgãos e tecidos. A transmissão sexual tem sido relatada, embora seja pouco frequente. Ocorrências esporádicas, sem história prévia de transfusão ou outra causa aparente, representam cerca de 40% dos casos de hepatite C. A infecção pelo HCV assemelha-se à causada pelo vírus B, e os sintomas iniciais da doença são inespecíficos e/ou gastrointestinais, seguindo-se a icterícia. Os níveis de alanina aminotransferase apresentam flutuações, com valores inferiores aos observados nas hepatites A e B. O curso clínico da hepatite C é menos severo que o da B, porém a evolução para a forma crónica da doença ocorre em 50% dos pacientes infectados pelo vírus C, em comparação aos 5 a 10% dos casos de indivíduos infectados pelo vírus B. A detecção de anticorpos contra o HCV, em amostras de soro de pacientes infectados, pode ser feita por ensaios imunológicos específicos. Porém, esses anticorpos refletem a exposição prévia ao agente infeccioso e não podem ser considerados marcadores da infecção actual. Não estão, ainda disponíveis métodos imunológicos directos para a detecção de antigénios virais e métodos de cultura celular para o isolamento viral. A quantificação dos níveis de alanina aminotransferase, associada à sorologia, é utilizada como indicador auxiliar na avaliação da infecção pelo HCV, porém não constitui medida directa da virémia. A reacção em cadeia da polimerase (PCR), pela amplificação exponencial do ácido nucleico viral, permite a detecção e a quantificação em amostras de soro ou plasma, constituindo-se a medida directa para avaliação da virémia. A capacidade de detectar e de quantificar a carga viral é altamente desejável e será especificamente requerida nas seguintes condições: estabelecer o agente etiológico em casos de infecção aguda, quando ensaios imunodiagnósticos são negativos; identificação de indivíduos assintomáticos; monitorização da virémia em casos crónicos, com fins prognósticos ou quando o imunodiagnóstico resulta em dados inconsistentes; identificação de pacientes crónicos com elevada carga viral, que possuem, portanto, alto risco de desenvolvimento do carcinoma hepatocelular; monitorização da terapia antiviral; detecção do HCV em indivíduos anti-HCV positivos que tenham desenvolvido auto-anticorpos; detecção do HCV em dadores e receptores de transplantes hepáticos; avaliação da transmissão vertical do HCV. As técnicas de rT-PCR e PCR são utilizadas para a detecção e a quantificação do RNA viral ou do DNA pró-viral integrado ao genoma da célula hospedeira, em amostras de soro ou plasma, tecido hepático e células do sangue periférico. Rotineiramente, o método da rT-PCR é utilizado com boa sensibilidade e especificidade como teste qualitativo e quantitativo em análises de soro ou plasma. A metodologia utilizada permite a amplificação em quantidade do genoma viral (RNA-HCV). Marcadores da Hepatite C Fase da incubação Fase Aguda Sintomática ou Assintomática P Convalecência Fase Crónica Sintomática ou Assintomática P Anti-HCV N P RNA-HCV P P N P qualitativo RNA-HCV > 50.0000 > 50.0000 > 100.000 N carga viral cópias/ml cópias/ml cópias/ml P: Positivo. Resultado reactivo na primeira avaliação e comfirmado na segunda avaliação. N: Negativa. Resultado não-reactivo na primeira análise e confirmado na segunda avaliação. Comparação de alterações enzimáticas e marcadores em diferentes estadios da hepatite C Estadios da Anticorpos Anticorpos ALT (TGP) doença ELISA RIBA Hepatite Crónica Elevada Positivo Positivo Portador da Normal Positivo Positivo Hepatite C Hepatite C em Normal Positivo Positivo recuperação Falso-positivo Normal Positivo Negativo para anti-HCV HCV-RNA (rT-PCR) Positivo Positivo Negativo Negativo Os últimos estudos têm demonstrado que reacções contendo 10 ou mais cópias de RNA-HCV são positivas. Este valor é equivalente a 2.000 cópias de RNA-HCV por mililitro de soro ou plasma. A genotipagem para HCV é obtida com a utilização de métodos em biologia molecular e de sequenciamento genómico, os quais são úteis para definir os genótipos e subtipos para estudos de epidemiologia molecular, estudo clínico e monitorização da hepatite C. Consultar Genotipagem para Hepatite C. Hepatite D O vírus da hepatite Delta (HDV), as co-infecções pelos vírus da hepatite B (HBV) e HDV e as superinfecções por HDV em portadores do HBV podem ocorrer em indivíduos procedentes de áreas endémicas. A presença (infecção aguda) ou a ausência (infecção crónica) de IgM anti-HDV deverá estar sempre associada a IgM anti-HBc ou a IgG anti-HBc, respectivamente. Baixas concentrações de HDAg podem ser detectadas na fase aguda, e anticorpos IgG anti-HDV, na fase crónica. A co-infecção HBV-HDV é diagnosticada pela detecção transitória, e em baixas concentrações, de anticorpos específicos para o HDV, principalmente da classe IgM, que poderão apresentar-se como os únicos marcadores da infecção no período de declínio de HDAg e desenvolvimento de anticorpos IgG. A presença constante de HBsAg e de IgG anti-HDV, em altos títulos, indica evolução para a infecção crónica, com detecção e quantificação do RNA HDV em soro ou plasma e detecção do HDAg em tecido hepático. Testes específicos são desenvolvidos para a detecção do HDAg e RNA HDV no soro, complementados pela maior sensibilidade do teste para IgM anti-HDV. A monitorização do tratamento deve ser feita por testes quantitativos, que permitem a detecção mínima de 10 cópias do genoma viral. O HDV apresenta diferentes genótipos: I, II e III, sem haver, entretanto, correlação definida com a evolução clínica. Hepatite E O vírus da hepatite E (HEV) é um dos agentes etiológicos de hepatites agudas por veiculação hídrica. São descritos casos de evolução aguda e fulminante. Partículas de HEV podem ser detectadas em suspensões fecais, na fase aguda da doença, por métodos aplicados à pesquisa. Anticorpos IgM e IgA são detectados em soro e plasma, por metodologias tradicionais, demonstrando percentagens variadas de grupos populacionais com infecção aguda. Anticorpos IgG específicos para HEV apresentam-se em altos títulos na fase aguda da doença, posteriormente ao declínio de IgM. O RNA HEV pode ser detectado por PCR em soro, plasma ou suspensão fecal até 40 a 50 dias após o início da doença, durante a fase aguda. A detecção no material fecal é, entretanto, menos frequente (até 70%) do que nos outros materiais biológicos (93%). Hepatite G A hepatite vírica é causada por diversos agentes, com seu próprio modo de transmissão e replicação, e as doenças causadas por esses vírus diferem significativamente em relação à severidade do dano hepático. Entretanto, várias evidências laboratoriais e epidemiológicas têm sugerido a existência de agentes adicionais, que podem ser transmitidos por via parenteral. Cerca de 10 a 20% de casos de doença hepática é de etiologia desconhecida. Um agente em potencial está associado ao soro de um cirurgião (com as iniciais "GB"), que tinha desenvolvido hepatite aguda sem história epidemiológica conhecida. Estudos experimentais de Deinhardt e cols. (1967) de inoculação em primatas (Saguinus sp.) com o soro desse indivíduo mostraram que o material induziu hepatite nos animais, e o agente envolvido é mencionado como agente GB. Experiências adicionais de culturas de células levaram à caracterização de GB como agente viral. Entretanto, a variação de hospedeiros primatas e experiências crosschallenge sugeriram que o agente GB era distinto dos vírus das hepatites actualmente conhecidas, em humanos. Além disso, anticorpos específicos aos vírus das hepatites A,B,C,E não eram induzidos pela inoculação de GB em macacos, como não eram detectados em imunoensaios. Foi descrita a clonagem molecular de dois genomas, com características semelhantes a flavivirus de macacos experimentalmente infectados. Esses genomas representam dois vírus independentes: GB-vírus A (GBV-A) e GB-vírus B (GBV-B). Têm sido descritos estudos de PCR para a detecção de GBV-A e GBV-B RNA e o uso de imunoensaios para anticorpos específicos aos antigénios codificados pelos genomas dos agentes GB. Os genomas de GBV-A e GBV-B apresentam semelhança limitada na sequência de nucleotídeos entre si (27%) e com o vírus da hepatite C (28%), nas regiões NS3 (helicase) e NS5B (RNA-polimerase dependente de RNA). Os seus genomas apresentam respectivamente 9.493 e 9.143 nucleotídeos. Os genomas desses agentes estão organizados de forma bastante semelhante a pestivírus e flavivírus, com genes que codificam proteínas estruturais e não-estruturais em terminações 5' e 3', respectivamente. O grau de divergência na sequência entre GBV-A e GBV-B e outros membros da família Flaviviridae demonstra que os agentes GB representam dois novos géneros nessa família. Um terceiro agente viral, recentemente notificado, foi identificado no soro de vários pacientes com hepatite criptogénica (não A-E). Devido ao alto grau de identidade com GBV-A (59% em nível de nucleotídeos e 64% em nível de aminoácidos), esse vírus foi chamado GB-vírus C (GBV-C). Análises filogenéticas demonstraram que o GBV-C é um membro adicional dos Flaviviridae, distinto do grupo HCV e mais intimamente relacionado ao GBV-A.. A transmissão do HGV por meio de transfusões de sangue e por outras vias de exposição parenteral, tais como em usuários de drogas injectáveis, tem sido claramente estabelecida. A partir daí, conclui-se que muitos pacientes HGV-positivo tenham sido co-infectados com HBV ou HCV, provavelmente devido aos factores de risco compartilhados da infecção. O rastreio das doações de sangue para esses vírus também elimina as unidades de sangue infectadas por HGV, reduzindo dessa forma a incidência de hepatite pós-transfusional relacionada ao HGV. Estudos recente, demonstram que a infecção por HGV está associada a hepatite na maioria dos pacientes investigados. Há também pacientes com níveis normais de transaminases que requerem estudos adicionais de sequenciamento para determinar se são portadores ou pacientes em estado quiescente da doença. A associação do vírus com a doença hepática crónica e a sua presença em pacientes com dupla infecção por HBV ou HCV é irrefutável. Entretanto, a sua associação e potencial envolvimento na hepatite fulminante e carcinoma hepatocelular ainda estão a ser investigados. Estudos retrospectivos evidenciaram os seguintes pontos: - a doença relacionada ao HGV é geralmente branda, com níveis pouco elevados de ALT (TGP); - a infecção por HGV pode ser persistente e acompanhada de hepatite crónica; - as infecções por HCV/HGV e HBV/HGV podem ocorrer simultaneamente e resultam em co-infecções persistentes; - a prevalência de HGV em dadores de sangue é maior do que HCV e não se relaciona aos níveis de ALT presentes nos doadores; - nas infecções duplas, os níveis de ALT são maiores e mais frequentemente aumentados; - indivíduos com infecções duplas crónicas podem apresentar severa necroinflamação hepática; - 6% e 10% de indivíduos com infecções crónicas respectivamente por HBV e HCV, apresentam positividade para HGV. A detecção do ácido nucléico viral a partir do soro de indivíduos infectados por HGV é, actualmente, o método disponível para a identificação dos casos. Comercialmente, existem kits que contêm primers dirigidos para o sequenciamento das regiões NS5 e NCR (non-coding region) do vírus da hepatite G. Intensos estudos que empregam peptídeos indicam que o uso de epítopos lineares não resulta em reconhecimento fiável da infecção pelo vírus da hepatite G por imunoensaios. Hepatite por TTV Partículas semelhantes a vírus são observadas com frequência em amostras biológicas humanas sem, necessariamente, apresentarem correlação com alguma patologia. Recentemente, uma dessas observações, originada num trabalho de pesquisa no Japão, por Nishizawa e colaboradores, originou o chamado Transmited Transfusion Vírus (TTV), caracterizado como uma partícula semelhante a vírus, extraída de um paciente com doença hepática crónica, adquirida, provavelmente, após transfusão sanguínea. O TTV, vírus associado à hepatite pós-transfusional não A-não G, apresenta estrutura genómica formada por DNA de cadeia simples e duas Open Reading Frame (ORF), sugerindo relações filogenéticas com outros vírus da família Circiniviridae e originando dois grupos genéticos com 16 genótipos distintos. A replicação do TTV parece ocorrer em hepatócitos, onde foram detectados DNA por métodos moleculares. Novas metodologias foram desenvolvidas, com diferentes sensibilidades, permitindo determinar altas prevalências de DNA-TTV em sangue de dadores sem doença hepática aparente e em pacientes com hepatites associadas a outras etiologias víricas - HCV e HBV, não havendo evidências de interferências na evolução da doença hepática por essas co-infecções. A via de transmissão parenteral parece ser a mais eficiente. Por outro lado, dados epidemiológicos de alta prevalência em países como Escócia (1,9%) e Japão (12%) sugerem a possibilidade de vias alternativas de transmissão. A detecção de DNA-TTV em amostras de fezes colhidas em pacientes com hepatite aguda e crónica demonstra a possibilidade de transmissão fecal-oral. No Brasil, alguns dados demonstram a prevalência de DNA-TTV em 62% dos indivíduos de uma casuística de 72 dadores de sangue e em 10% da população geral. No Japão, 12% dos dadores de sangue avaliados apresentaram DNA-TTV detectável, 47% hepatites fulminantes não-A-G, 46% hepatopatias crónicas de etiologia desconhecida, 39% carcinoma hepatocelular e 48% cirroses. Embora a detecção de DNA-TTV tenha sido feita em tecidos hepáticos, não há confirmação de sua patogenicidade para o fígado. Outro estudos têm sido desenvolvidos para a definição de um novo agente hepatotrópico. Herpes Simplex A infecção pelos vírus Herpes simplex (HSV) está entre as infecções víricas com maior prevalência na população mundial. Existem dois sorotipos diferenciados: HSV1 e HSV2. São vírus DNA, da família Herpetoviridae, e reagem de forma cruzada, pois os sorotipos possuem cerca de 50% de sequência homóloga. O desenvolvimento, nas últimas décadas, de técnicas sorológicas que identificam e diferenciam os sorotipos tem aumentado não só a possibilidade de diagnosticar e tratar as infecções como também de compreender melhor a sua patogenia e meios de transmissão, em especial do herpes perinatal. A transmissão pode dar-se pelo contacto com superfícies mucosas infectadas por soluções de continuidade da pele e mucosas, relações sexuais e durante o parto. A disseminação do vírus ocorre pela migração centrífuga dos vírus através dos nervos sensoriais periféricos. Na porta de entrada, na derme e na epiderme, ocorre o processo de replicação, e as partículas virais são transportadas pela terminação nervosa retrogradamente ao núcleo dos neurónios sensoriais. Conhece-se menos a sucessão de eventos a partir deste ponto. Nalguns casos, ocorre a infecção com a replicação viral e morte celular ao nível mucocutâneo. Noutros, o vírus fica em estado de lactência. O detalhe dos mecanismos da persistência em lactência do HSV e sua reactivação periódica permanecem obscuros. O primeiro episódio de doença herpética, a primoinfecção, é normalmente acompanhado de sinais e sintomas envolvendo lesões mucosas e extramucosas. Apresenta longa duração dos sintomas e da permanência dos vírus na lesão e uma taxa maior de complicações do que os episódios de reagudização ou recorrentes. A gengivoestomatite aguda é a manifestação mais comum das primoinfecções. É mais frequente entre 1 e os 4 anos de idade. O herpes labial e as úlceras da córnea são as infecções sintomáticas recorrentes mais frequentes. As manifestações clínicas e a evolução da infecção dependem da idade, da localização, do estado imunológico do paciente e do tipo antigénico do vírus. A exposição ao sol (luz ultravioleta), imunossupressão e traumas cutâneos ou do gânglio podem levar à reactivação. Ocasionalmente, múltiplas linhagens do mesmo subtipo viral são detectadas no mesmo paciente, principalmente os imunodeprimidos. Este facto sugere a possibilidade de infecção exógena por diferentes linhagens de um mesmo subtipo. A infecção pelo tipo 1 émuitas vezes, adquirida mais cedo do que a do tipo 2. Cerca de 90% dos adultos apresentam anticorpos contra HSV1 por volta dos 50 anos de idade. Nas populações socioeconómicas desfavorecidas, a faixa etária decresce para 30 anos. Os anticorpos contra o tipo 2 não são normalmente detectados até à puberdade. As taxas de prevalência desses anticorpos correlacionam-se com a fase de vida sexual activa, o que distingue um grupo do outro. A percentagem aumentou 30 pontos nos últimos 12 anos nos Estados Unidos. Numa avaliação obstétrica, 25% da população investigada tinham anticorpo positivo; entretanto, apenas 10% relatavam história de lesão genital. Cerca de 50% dos adultos heterossexuais, com vida sexual activa, apresenta anticorpos positivos, sendo a taxa 5% maior entre as mulheres. O HSV tipo 1 está associado a uma variedade de infecções envolvendo lesões mucocutâneas orolabiais, oftálmicas, meningoencefálicas, podendo eventualmente causar lesões viscerais e genitais, enquanto o HSV tipo 2 (HSV2) normalmente causa as infecções genitais sexualmente adquiridas. Ambos os tipos podem causar lesões nas diferentes localizações, e a infecção clínica é indistinguível. Tanto o HSV1 como o HSV2 podem ser responsáveis por lesões mucocutâneas primárias em qualquer localização. A duração e a intensidade da infecção são independentes do sorotipo envolvido. O tipo de vírus e a localização da primoinfecção afectam a frequência e a probabilidade de recidiva. Estudos recentes demonstram que tanto a frequência como a probabilidade são maiores quando a infecção é causada pelo HSV2. A infecção genital por HSV2 ocorre com frequência oito a dez vezes maior que a infecção genital por HSV1. Por outro lado, a infecção orolabial por HSV1 ocorre mais frequentemente do que a infecção orolabial por HSV2. A probabilidade de reactivação da infecção causada pelo HSV2 é duas vezes maior. Em indivíduos imunocompetentes, a infecção limita-se às localizações mucocutanêas e ao gânglio sensorial. Em indivíduos imunodeprimidos, as lesões causadas tanto pela primoinfecção como pelas reactivações tendem a ser mais extensas e persistir por muito mais tempo do que nos indivíduos imunocompetentes. Nesses pacientes, o quadro é grave, geralmente com comprometimento esofágico, pneumonite intersticial e doença disseminada com comprometimento visceral. A infecção pelo HSV2 é do tipo infecção oportunista importante em indivíduos infectados pelo HIV. Calcula-se que até 90% desses são co-infectados com HSV2. Num pequeno número de casos, a infecção pelo HSV leva a encefalite vírica e a um dano neurológico grave. O HSV, principalmente o tipo 1, pode causar encefalite em adultos pela reactivação de infecção latente. As infecções mais agressivas, com risco de vida, são a perinatal e as que ocorrem em indivíduos imunocomprometidos, incluindo pacientes com SIDA. Existem dados que demonstram que os pacientes que apresentam episódio primário intenso e não tratado têm índices mais elevados de recorrência a longo prazo. As respostas imune, humoral e celular manifestam-se nas primeiras semanas e persistem por toda a vida. Embora não possuam carácter imunizante, induzem a manifestações mais leves e apresentam reacção cruzada entre os dois subtipos. A sorologia permite a identificação de anticorpos IgM e IgG de forma qualitativa. A avaliação deve ser realizada em sorologia pareada para melhor interpretação dos resultados. O isolamento viral em cultura de tecidos era o método de escolha para o diagnóstico e tipagem do HSV. O HSV pode ser detectado em cultura depois de 2 a 8 dias, mas em vários casos, como nos de baixos títulos virais, cura das lesões ou lesões atípicas, o vírus não pode ser isolado. A sensibilidade do isolamento do HSV em cultura de tecido é de aproximadamente 105 vírus por mL. A reacção em cadeia da polimerase (PCR) é o método de escolha para o diagnóstico da infecção por HSV. É altamente sensível (até 5 vírus por ensaio), específica (98- 100%), e pode identificar o genótipo e a quantificação viral. A PCR quantitativa pode ser útil para monitorizar a resposta à terapia antivírica. Os ensaios mais usados para distinguir o tipo 1 do tipo 2 são os que utilizam a avaliação da presença de anticorpos contra glicoproteínas do HSV1 (gG1) e do HSV2 (gG2). Além disso, o ensaio realizado por PCR permite o diagnóstico utilizando-se diferentes materiais como sangue, líquor, líquido amniótico, vilosidades coriónicas e sangue fetal. O líquido amniótico pode ser colhido a partir da 12ª semana até o final da gestação. Porém, o período ideal para a colheita situa-se entre a 14ª e a 16ª semana. O período ideal para a colheita de vilosidades trofoblásticos situa-se entre a 10ª e a 12ª semana de gestação. No entanto, esse prazo poderá estender-se até à 14ª semana. O período ideal para a colheita de sangue fetal situa-se entre a 18ª e a 22ª semana de gestação. Hidroxiprolina Encontrada principalmente no colagénio da matriz óssea, a hidroxiprolina é o aminoácido utilizado como marcador bioquímico do metabolismo ósseo, mais especificamente da reabsorção óssea. A hidroxiprolina libertada do osso na degradação do colagénio é metabolizada pelo fígado (90%), e apenas 10% da hidroxiprolina são eliminados na urina. A sua excreção urinária reflecte o grau de catabolismo ósseo, aumentando nos momentos em que ocorre reabsorção óssea rápida. Níveis aumentados podem ser encontrados na doença de Paget, na osteomalacia, em fracturas extensas em fase de consolidação, nas neoplasias com metástase óssea, no hipertiroidismo, no hiperparatiroidismo primário e secundário, na osteomielite aguda, na acromegalia e na artrite reumatóide em actividade. Níveis normais ou ligeiramente alterados podem ser encontrados na gravidez, na osteoporose, na doença renal e em doenças inflamatórias cutâneas. A dieta influencia directamente a taxa de libertação urinária de hidroxiprolina. Para facilitar a colheita e evitar a realização de dieta preparatória, tem sido proposta a avaliação em amostra de urina de 2 horas colhida após um jejum nocturno de 12 horas. HIV 1 O síndrome da imunodeficiência adquirida (SIDA) é causado pelo vírus da imunodeficiência humana tipo 1 (HIV-1), um retrovírus da família Retroviridae, subfamília Lentivirinae, transmitido por contacto sexual, exposição a sangue contaminado e derivados e da mãe infectada para o feto. Na infecção inicial há, geralmente, um aumento significativo da virémia, posteriormente inibida pela activação da resposta imune. As subsequentes concentrações no plasma reflectem o equilíbrio alcançado entre vírus e hospedeiro, que pode durar alguns anos. Este nível de interacção varia de pessoa para pessoa e pode ser preditivo de um curso clínico de longa duração. Nessa fase clinicamente estável, indivíduos infectados apresentam geralmente níveis de virémia baixos e persistentes e uma depleção gradual de linfócitos T CD4(+) que pode levar a uma severa imunodeficiência, ao aparecimento de múltiplas infecções oportunistas, a neoplasias e à morte. O diagnóstico laboratorial pode ser feito pela pesquisa de anticorpos contra o HIV-1 por técnicas imunoenzimáticas e Western-blot. Essas técnicas, embora precisas, apresentam limitações em determinados casos, tais como: crianças em idade até 15 meses, nas quais a permanência de anticorpos maternos, adquiridos na fase gestacional através da placenta, no momento do parto ou na fase pós-parto, através do colostro, pode determinar resultados falso-positivos; casos de infecção recente, em períodos inferiores a 2 ou 3 meses, nos quais não houve, ainda, a soroconversão, e casos que apresentam resultados indeterminados ou duvidosos. Sorologia Os testes sorológicos mais comuns são os imunoenzimáticos como ELISA (Enzyme Linked Immunosorbent Assay) e ELFA (Enzyme Linked Fluorescent Assay); esses testes que pesquisam anticorpos circulantes (anti-HIV) utilizam antigénios, adsorvidos em fases sólidas, que podem ser de origem sintética, peptídeos sintéticos (geralmente gp41 e p24 para o HIV-1 e gp36 para o HIV-2) ou o próprio vírus inactivado. O método ELFA apresenta uma versão para a detecção simultânea de anti-HIV e antígeno p24 (HIV-DUO), favorecendo o diagnóstico precoce de infecção por HIV, antecipando-o em até 7 dias, quando comparado a métodos que detectam apenas anti-HIV. Os métodos enzimáticos são, preferencialmente, utilizados para triagens de diferentes populações, em bancos de sangue e amostras sorológicas de indivíduos com sintomatologia sugestiva ou mesmo assintomáticos e com história de situação de risco. Os testes imunoenzimáticos, licenciados e comercializados actualmente, apresentam sensibilidade e especificidade que ultrapassam 98% a 99%. Segundo recomendações do OMS, a entrega de um resultado de um teste sorológico anti-HIV positivo só pode ser concretizada se pelo menos dois testes forem realizados em paralelo, com a mesma amostra, por metodologias diferentes (outro fabricante, outro tipo de antigénio ou diferente princípio metodológico) Se os resultos forem positivos ou discordantes (+/ -), é necessário a realização de um teste confirmatório, sendo o Western-blot o utilizado na rotina da maioria dos laboratórios privados. Caso após estas duas etapas o resultado final seja positivo, uma segunda amostra clínica deve ser solicitada para a repetição do procedimento realizado na primeira amostra. Havendo discordância entre os resultados da 1ª amostra com os obtidos na 2ª amostra, solicita-se uma nova colheita. O teste confirmatório para a presença de anticorpos anti-HIV indicado em crianças até dois anos de idade é a reacção em cadeia da polimerase (PCR) para a pesquisa do cDNA-HIV. Em indivíduos com alto risco de exposição ao HIV, uma reactividade intensa pelo teste imunoenzimático apresenta um valor preditivo de 99%. Podem ocorrer reactividades falso-positivas em testes imunoenzimáticos, principalmente em pacientes com hepatite alcoólica, outras patologias em que ocorram anormalidades imunológicas, neoplasias, mulheres multíparas e indivíduos politransfundidos, os quais desenvolveram anticorpos contra antigénios HLA classe II, presentes em linhagens de células onde há a replicação do HIV. Os testes imunoenzimáticos para HIV-1 detectam 40% a 90% de infecções causadas por HIV-2, e testes de ELISA licenciados para HIV-2 têm uma sensibilidade de 99%. A opção mais utilizada actualmente são os testes imunoenzimáticos que detectam, simultaneamente, anticorpos contra HIV1 e HIV2. A detecção de antigénio p24 do HIV-1 circulante por teste imunoenzimático é particularmente útil em determinadas situações. Nas primeiras semanas após a infecção, o antigénio p24 está presente no soro, antes da detecção dos anticorpos. Com o aparecimento destes, o antigénio p24 torna-se indetectável, permanecendo assim por meses ou anos. O reaparecimento da antigenémia durante o curso da infecção geralmente está associado a um prognóstico desfavorável. Métodos para a detecção de antigénio p24, principalmente aqueles que utilizam dissociação ácida, também têm sido utilizados para acompanhar pacientes em tratamento antiviral, conforme demonstrado durante ensaios clínicos. A sua eficácia porém é comprometida devido à baixa sensibilidade dos métodos actualmente disponíveis, sendo substituídos pela detecção da carga viral por metodologias de biologia molecular. Western-Blot O método de Western-Blot é amplamente utilizado como teste confirmatório dos resultados obtidos em testes imunoenzimáticos. Outros testes também são indicados, como imunofluorescência em células fixadas e o teste RIPA (Radio Immuno Precipitation Assay). O Western-Blot utiliza antigénios do HIV, obtidos em cultura de linhagem celular, separados eletroforecticamente em bandas distintas, posteriormente transferidas para membrana de nitrocelulose. A reacção ocorre entre os antigénios em contacto com os anticorpos, presentes no soro ou no plasma de indivíduos infectados. Padrões específicos de reacções podem ser identificados, e embora a definição de testes positivos seja controversaa, a ausência de reacções específicas para os diferentes antigénios do HIV confirma a reacção negativa. Padrões de positividade (presença de anticorpos) podem ser definidos no teste confirmatório de Western-Blot, pela visualização de bandas correspondentes às três principais proteínas virais: a proteína do núcleo, p24 ou p31 e duas proteínas do envólucro, gp41 e gp120/gp160 . Alternativamente, o Centers for Diseases Control and Prevention-CDC recomenda que pelo menos uma das duas, p24 ou gp120/gp160, seja identificada. Outras bandas de antigénios do HIV são p17, p31, p51, p55, p66. Padrões definindo casos indeterminados, quando apenas uma das três principais bandas é visualizada no teste de Western-Blot, podem ocorrer, causando dúvidas quanto à real interpretação. Indivíduos infectados, em fase avançada de SIDA, podem não apresentar reactividade para p24, sugerindo resultado indeterminado. Alguns podem apresentar esse padrão por longo período de tempo, sem evidências de infecção por HIV. As interpretações mais correctas e apropriadas para os resultados de testes de ELISA reactivos e Western-blot indeterminados envolvem avaliações clínicas e acompanhamento laboratorial. Testes de Western-Blot são desenvolvidos por diferentes laboratórios de produção de kits e reagentes para diagnóstico. Isto origina a possibilidade de diferentes critérios de interpretação que devem estar sempre sujeitos a avaliações comparativas com aqueles recomendados por instituições de referência, tais como o CDC. A interpretação de resultados poderá acompanhar também os critérios complementares como se seguem: A presença ou a ausência de anticorpos contra HIV-1 em amostras de soro e/ou plasma e a identificação de anticorpos presentes são determinadas pela comparação de cada reacção com os controlos de reactividade baixa, alta e ausente. Deverão ser seguidas três fases de interpretação: primeira - cada banda de reacção que aparece na fita de nitrocelulose da amostra deverá ser identificada comparativamente ao controlo padrão de alta reactividade; segunda - cada banda deverá ser avaliada com base na intensidade de reacção; terceira - a interpretação deverá ser finalizada pela associação dos padrões de reactividade. Proposta de interpretação alternativa seguindo-se os critérios de interpretação do Centers for Diseases Control and Prevention e da Association of State and Territorial Public Health Laboratory Directors (ASTPHLD): PADRÃO Ausência da bandas Presença de alguma banda sem atender ao critério de POSITIVO Duas ou mais bandas das seguintes alternativas: p24, gp41 e gp120/160. Cada banda com reactividade maior ou igual ao padrão positivo. Normalmente a banda para gp41 ou gp160 é difusa. Outras bandas poderão ou não estar presentes. INTERPRETAÇÃO NEGATIVO INDETERMINADO POSITIVO Nalgumas publicações, sugere-se que não há necessidade da presença de reactividade para p31. Outros estudos indicam como inadequada a interpretação de positividade para reacções em que estejam ausentes quaisquer duas das bandas para p24, gp41 ou gp 120/160 com padrão de reactividade igual ou maior do que controlo positivo. É reconhecido que indivíduos com soroconversão recente podem apresentar padrões distintos e incompletos de reacção mas que evoluirão para aumento de reactividade, em número e intensidade, quando acompanhados por períodos de 4 a 6 meses. Os resultados com interpretação de POSITIVO apresentarão as bandas p17, p31, p55, p66 e gp120. Reactividades inespecíficas, que persistem mas não evoluem para padrões completos, podem ocorrer, em particular nas regiões p17, p24, p55 e p66. As reactividades inespecíficas podem ser atribuídas a auto-anticorpos ou a reactividades com outros retrovirus humanos. Tem sido evidenciado que pacientes com SIDA perdem a reactividade para p24 e p31, e que em crianças pode haver falha de soroconversão e persistência de anticorpos maternos por vários meses. Pacientes com doenças tumorais e em tratamento com imunossupressores podem falhar na resposta com padrão de positividade em Western-Blot. Bandas inespecíficas que não estejam acompanhadas das principais bandas de proteínas virais, p24 e gp41/120/160, podem estar relacionadas com constituintes celulares com pesos moleculares em torno de 70K, 51-55K (possivelmente originadas de HLA DR) e 43 K (de origem HLA-ABC). Carga Viral A quantificação de partículas virais no sangue periférico, que define a carga viral, pode ser estimada por níveis plasmáticos de antígeno p24, a principal proteína do nucleocapsídeo viral; por métodos quantitativos de cultura celular para HIV-1 ou pela quantificação directa do RNA viral no plasma, através de tecnologias de amplificação do ácido nucléico ou de amplificação de sondas marcadas. A utilização de testes quantitativos para antigénio p24 como parâmetro na avaliação da carga viral é de valor limitado, uma vez que apenas 20% de indivíduos assintomáticos e 40 a 50% de pacientes sintomáticos apresentam níveis antigénicos detectáveis, mesmo utilizando-se procedimentos de dissociação de imunocomplexos. As metodologias de biologia molecular (RT-PCR, b-DNA, Nuclisens-NASBA) são metodologias quantitativas hoje recomendadas para a avaliação da carga viral. Elas permitem a quantificação directa do RNA viral em amostras de plasma. A carga viral, definida em número de cópias do genoma viral por mililitro de plasma, está correlacionada com o estadio da infecção, ao risco de evolução para SIDA e à eficácia do tratamento anti-retroviral. Vários estudos demonstram que níveis mais elevados de carga viral estão associados a maior risco de evolução da doença, enquanto níveis mais baixos correlacionam-se a risco diminuído de progressão clínica. A avaliação da carga viral, associada a dados clínicos e a outros parâmetros laboratoriais, permite ao clínico estabelecer condutas adequadas na monitorização do tratamento anti-retroviral. As metodologias de biologia molecular podem apresentar diferentes sensibilidades. A RT-PCR apresenta sensibilidade da ordem de 200 cópias de RNA viral, e a RT-PCR ultra-sensível, da ordem de 50 cópias. É recomendada a realização de duas avaliações, com intervalos de 15 dias, para o estabelecimento dos níveis de carga viral antes do tratamento. A eficácia do tratamento anti-retroviral é acompanhada por avaliação 4 semanas após o início da terapia. É esperado um declínio inicial rápido dos níveis da carga viral, que se segue a uma diminuição em ritmo mais lento e moderado no decurso dos meses subsequentes. A carga viral deve ser repetida rotineiramente a cada 3 ou 4 meses. Nos momentos de mudança terapêutica ou início de novos esquemas, recomendase uma avaliação em 2 a 4 semanas após a alteração e a cada 10 a 12 semanas. É indicado que a carga viral seja avaliada com o paciente em situação clínica estável. Em casos de imunização recente, recomenda-se um intervalo mínimo de 4 semanas para a colheita da amostr. Sugere-se também que sejam utilizadas as mesmas metodologias e o mesmo laboratório. Homocisteína A aterosclerose é uma doença da actualidade, e a sua consequência mais drástica é a coronariopatia, uma das mais importantes causas de mortalidade nos países desenvolvidos. Vários factores já se encontram descritos como factores de risco para o aparecimento da doença, com inúmeras confirmações epidemiológicas. Dessa forma, o tabagismo, a hipercolesterolemia, o sedentarismo, a obesidade, a hipertensão arterial e a diabetes mellitus colaboram efectivamente para a instalação de doença aterosclerótica. De forma revolucionária, agentes infecciosos como Chlamydia pneumoniae, Helicobacter pylori e alguns vírus (herpes, citomegalovírus e vírus sincicial respiratório) passaram também a contribuir na causa de disfunções endoteliais e aterogénese. Recentemente, um novo factor tem sido aventado no desenvolvimento dessa doença: o aumento sérico de homocisteína (hiper-homocisteinémia). A hiperhomocisteinémia é, actualmente, considerada um factor de risco independente para doença arterial coronária, doença vascular periférica, doença cerebrovascular e tromboses. A evidência epidemiológica de que talvez esse aminoácido pudesse estar envolvido no desenvolvimento da aterosclerose veio da observação de que crianças com homocistinúria, um erro inato do metabolismo devido a um defeito monogénico autossómico recessivo que cursa com aumento de homocisteína plasmática e urinária, possuíam alto potencial aterogénico. A homocisteína é um pequeno aminoácido sulfidrílico que ocupa posição reguladora central no metabolismo da metionina. O plasma humano contém formas reduzidas (1%) e oxidadas de homocisteína (98 a 99%), sendo que de 80 a 90% da forma oxidada se encontram ligados a resíduos protéicos. A metileno tetraidrofolato redutase (MTHFR) é uma importante enzima no metabolismo da homocisteína. A sua actividade, quando diminuída, tem sido associada à hiper-homocisteinémia. Uma das principais causas de diminuição da actividade é uma mutação (Ala 677>Val), que resulta na forma termolábil da enzima, que possui então 50% da actividade normal. Deficiências de vitaminas do complexo B, seja por insuficiência na dieta ou má absorção, estão associadas ao aumento de homocisteína sérica. O doseamento de homocisteína na população geral de adultos saudáveis revela concentrações que variam entre 5 a 15 mmol/L. Estudos recentes, demonstram que o nível desejável deve estar abaixo de 10 mmol/L. Concentrações situadas acima de 15 mmol/L são consideradas patológicas. Indivíduos com doença vascular periférica, cerebral ou coronária possuem valores entre 15 a 25 mmol/L. Indivíduos com insuficiência renal apresentam níveis séricos aumentados do aminoácido. A grande vantagem em determinar o nível de homocisteína reside no facto de podermos intervir em vias enzimáticas com suplementação dietética de vitaminas B12 e B6 e ácido fólico, para atingirmos baixas concentrações séricas do aminoácido. Os métodos habituais de doseamento de homocisteína nos laboratórios clínicos são a cromatografia líquida (HPLC) ou o teste imunoenzimático com anticorpos monoclonais e a análise de fluorescência polarizada. Factores que aumentam os níveis da homocisteína: Demográficos e Genéticos: - Idade, sexo e étnia - Níveis enzimáticos de metionina sintetase, MTFHR e cistatina sintetase Adquiridos: - Deficiência de vitamina B (B6, B12 e ácido fólico) - Insuficiência renal - Transplantes - Hipotireoidismo Outros: Tabagismo, alcoolismo, sedentarismo e ingestão abusiva de café. HPV Os papilomavírus pertencem a um grupo de vírus que induzem à formação de verrugas ou papilomas. Podem ocorrer em muitos vertebrados e, principalmente, no homem. A natureza viral das verrugas no homem foi diagnosticada há mais de 80 anos. Cada tipo viral exibe especificidade segundo os hospedeiros e o tecido epitelial que infectam. Infecções benignas manifestam-se com formações de verrugas, e algumas lesões associadas a tipos virais específicos podem progredir para displasias, carcinomas e cancro invasivo. A presença de tipos específicos de papiloma vírus humano (HPV) encontrados no trato genital feminino e masculino está associada a doenças neoplásicas e a carcinomas intra-epitelial da vulva, vagina, cérvixl e peniano. O HPV apresenta como estrutura viral definida e completa um vírus de 52 a 55 nm de diâmetro, contendo uma molécula de DNA de 8.000 pares de bases, organizados em cadeia dupla, interna ao capsídeo protéico. Pouco se conhece sobre o mecanismo de infecção pelo papiloma vírus. Receptores estão presentes numa variedade de células, em diferentes espécies animais. Entretanto, o tropismo específico a determinados tecidos é derivado da permissividade à transcrição do genoma viral. Os níveis de expressão do oncogene viral não sofrem alterações significativas durante a evolução do carcinoma in situ e do cancro invasivo, sugerindo que essa progressão seja atribuída à acumulação de mutações cromossómicas da célula hospedeira e a factores imunológicos que podem influenciar aparecimento da infecção. A análise das sequências de nucleotídeos do DNA permite a classificação em 70 genótipos diferentes. Dados epidemiológicos e experimentais demonstram a associação de alto risco dos tipos HPV 16 e HPV 18 com a etiologia do cancro anogenital, em especial o carcinoma cervical. Os tipos HPV 6 e HPV 11 associam-se ao baixo risco, enquanto os tipos HPV 31, 33 e 35 relacionam-se ao risco intermediário. Os sete genótipos identificados são descritos em 70% das neoplasias cervicais. Outros tipos, 42, 43, 45, 51, 52, 56, 58, 59 e 68 podem ser identificados nas outras lesões. O DNA do HPV pode ser detectado em aproximadamente 10% das mulheres com epitélio cervical normal. As lesões causadas pelo papilomavírus podem regredir, persistir ou progredir com o tempo, ou de acordo com alterações imunológicas do paciente. Estudos prospectivos demonstram que 15-28% dessa população podem desenvolver neoplasia intra-epitelial, em 2 anos de acompanhamento. Dados epidemiológicos sugerem que múltiplos parceiros sexuais e infecções por HPV pertencentes ao grupo de alto risco são os factores mais importantes para o desenvolvimento de carcinomas cervicais. Outros carcinogénios, tais como metabolitos do tabaco e radiações ultravioleta, podem participar e favorecer a evolução para carcinomas oral e cervical associados ao HPV. Os métodos de biologia molecular são os mais sensíveis e específicos para a complementação do diagnóstico da infecção por HPV. A utilização da técnica de captura híbrida permite a detecção do DNA viral e a genotipagem por grupos de risco. A pesquisa é feita em tecido e/ou células, permitindo a detecção antes do surgimento de manifestações clínicas. HTLV I/II O vírus linfotrópico de células T humanas tipo I (HTLV I) foi o primeiro retrovírus humano a ser descoberto. Descrito inicialmente nos Estados Unidos por Poiesz e cols. no ano de 1980, está actualmente classificado na família Retroviridae. O primeiro relato de infecção pelo HTLV I no Brasil foi feito por Kitagawa et al., após estudo da soroprevalência de anticorpos anti-HTLV I em imigrantes japoneses que viviam no país à 50 anos. Actualmente, são descritos casos em todo o país, tanto em populações urbanas como em comunidades isoladas. Esse tipo de virus está directamente associado a leucemia/linfoma de células T do adulto e a paraparesia espástica tropical/mielopatia associada. As proteínas do HTLV encontram-se codificadas nos genes gag (grupo antigénio), pol (polimerase) e env (envelope), flanqueados por sequências terminais longas repetidas (LTR), que contêm sinais importantes para o controle da expressão dos genes virais. A região gag é inicialmente traduzida por uma proteína precursora (p53) que é clivada em: proteína da matriz (Ma) ou p19, proteína do capsídeo (Ca) ou p24 e proteína do nucleocapsídeo. A protease é codificada por uma sequência de leitura aberta (open reading frame - ORF), situada entre a parte 3' da região gag e a parte 5' da região pol. A integrase e a transcriptase reversa são codificadas na região pol. De forma distinta dos outros retrovírus, este possui uma região particular com cerca de 2 Kb, situada imediatamente acima da LTR 3', denominada inicialmente pX, em razão da sua natureza desconhecida. Esta região contém pelo menos 4 ORF que codificam as proteínas p40 tax, p27 Rex, p21 Rex, p12 I, p13 II, p30 II. O diagnóstico laboratorial da infecção por HTLV pode ser realizado por técnicas sorológicas, tais como testes imunoenzimáticos (ELISA), testes de imunoblotting (Western-Blot) e imunofluorescência indirecta (IFI), que detectam anticorpos para as proteínas estruturais do vírus. Contudo, a técnica de reacção em cadeia da polimerase (PCR) permite rápido acesso às sequências de DNA e RNA, celular e viral, possibilitando o diagnóstico dos indivíduos que, embora portadores do vírus, ainda não produzem anticorpos em níveis detectáveis. Esta é também a técnica mais sensível para a detecção de sequências de provírus de retrovírus humanos, mesmo quando o número de cópias é baixo. Além dessas técnicas, existem métodos moleculares que são utilizados na quantificação do vírus circulante no organismo do hospedeiro. O risco de transmissão via amamentação e o grau de infecciosidade in vitro podem ser avaliados através da detecção dos marcadores de infecção e replicação viral no leite de mães portadoras do HTLV, por técnicas de PCR e cultura de células mononucleares do leite materno (BMMC). Imunofenotipagem de Leucemias Desde o primeiro relato dessa doença como uma entidade clínica, em 1845, até os dias de hoje, é notável a evolução ocorrida no entendimento da biologia das leucemias. Durante esse período, as doenças hematológicas serviram como modelo para o desenvolvimento dos conceitos actuais da imunologia, principalmente nas áreas da diferenciação linfocitária e da genética molecular. De maneira complementar, o desenvolvimento dessas áreas, juntamente com os avanços técnicos no campo da imunologia, permitiram um maior entendimento das leucemias. As leucemias representam um grupo heterogéneo de doenças clonais de precursores hematopoiéticos, caracterizadas por anomalias quantitativas e qualitativas. Devido à extrema heterogeneidade das entidades englobadas sob a mesma denominação, tanto no aspecto clínico como no comportamento biológico, é fundamental a utilização de critérios diagnósticos precisos para a sua classificação. Recentemente, métodos diagnósticos mais sofisticados (imunológicos e moleculares) redefiniram a classificação das leucemias de acordo com a origem celular, linfóide (B ou T e maturidade celular) e mielóide, além do tipo de anomalia genética envolvida. A classificação das leucemias segundo esse critério tem grande importância na terapêutica e, portanto, na resposta obtida. A determinação da origem celular irá influenciar directamente a conduta clínica, já que a partir dela se saberá se a leucemia é linfóide ou mielóide, levando a dois caminhos clínicos totalmente diferenciados. Além disso, o reconhecimento da origem celular nas leucemias linfóides (B ou T) também dá uma informação importante para a estratificação inicial da conduta clínica a ser adoptada. Convém salientar que o reconhecimento do estadio de maturação diferencia entre as formas agudas ou crónicas e é um factor relevante na avaliação do prognóstico do paciente. Isso é bastante claro quando se trata de uma leucemia linfoblástica aguda (LLA) de origem B. Nesses casos, a própria definição do estadio de maturação está relacionada às translocações cromossómicas ocorridas. Além disso, a informação obtida a partir do diagnóstico é ainda de grande utilidade para orientar a terapêutica durante o processo de tratamento e principalmente após o término, na procura de doença residual mínima (DRM). A metodologia padrão para a classificação das leucemias inclui morfologia, citoquímica, estudo de marcadores celulares (citometria de fluxo), citogenética e análise molecular. Já a sua avaliação preliminar inclui o hemograma, que fornece dados essenciais como a contagem global, diferencial, o comprometimento da hematopoiese e a morfologia dos leucócitos. Uma vez sugerido o diagnóstico de leucemia, é necessária a avaliação morfológica do aspirado de medula óssea para a sua confirmação. A classificação morfológica das leucemias agudas mais utilizada foi desenvolvida em 1976 por um grupo de hematologistas franceses, americanos e britânicos (classificação FAB) e classifica a LLA em três subtipos, designados L1, L2 e L3. As leucemias mielóides agudas (LMA) são caracterizadas por sete subtipos M0 a M7, de acordo com o grau de maturação dos precursores mielóides envolvidos. Citometria de Fluxo Os marcadores de superfície celular são proteínas de membrana detectadas por meio de anticorpos monoclonais marcados com substâncias fluorescentes. Essas diferentes proteínas são expressas em diversas fases de maturação, o que permite que sejam utilizadas como marcadores de tipo e estadio. Além da caracterização dos antigénios expressos pelas células envolvidas, a citometria de fluxo fornece informação quanto ao tamanho e à granulosidade celular. O gráfico obtido permite uma análise preliminar da população investigada, na qual se delineiam as áreas correspondentes a linfócitos, monócitos, granulócitos, células plasmáticas e regiões de blastos linfóides ou mielóides, quando presentes. Nas leucemias agudas, o exame está indicado para determinação da linhagem celular, análise de clonalidade e do estado de maturação das células leucémicas, expressão de padrões de antigénios aberrantes típicos de determinados grupos de leucemias e acompanhamento do tratamento e detecção de doença residual mínima (DRM). Torna-se necessária a utilização de um painel mínimo de anticorpos monoclonais contra antigénios específicos para determinação dos parâmetros descritos anteriormente. Já um painel secundá rio, realizado a partir do painel inicial, pode ser usado para a caracterizacão mais detalhada da patologia em questão e do estadio de maturação da célula envolvida. Geralmente, utiliza-se um painel primário mínimo de anticorpos monoclonais selecionados, com o objetivo de se conseguir uma definição da linhagem celular, que inclui a determinação dos antigénios intracitoplasmáticos mieloperoxidase (MPO) para a determinação de linhagem mielóide e dos antígenos CD22 ou CD79 e CD3 para a determinação inicial de linhagem linfocitária B ou T, respectivamente. A enzima TdT (desoxinucleotidil terminal transferase) é um marcador intracitoplasmático que está presente na maioria dos casos de leucemia linfóide aguda (LLA) e que contribui para a confirmação da origem linfóide e blástica de uma leucemia. Com base nos mercadores celulares presentes nas células, é possível definir a origem linfóide ou mielóide das leucemias e classificá-las de acordo com a tabela abaixo: LLA LLA LLA LLA LLAs de origem B Pró-B Comum (CALLA positivo) Pré-B com a presença de imunogloglobulina intracitoplasmática B madura (com imunoglobinas de superfície) LLAs de origem T LLA Pró-T LLA Pré-T LLA T madura (CD4+ ou CD8+) LMA M0, M1, M2, M3, M4, M5, M6 ou M7. As leucemias crónicas fazem parte de um grupo de condições denominadas doenças linfoproliferativas, que têm origem em precursores linfocíticos mais maduros. São as leucemias mais comuns do adulto e na maioria dos casos, ocorrem por proliferação dos linfocítos B. Entretanto, várias doenças crónicas que envolvem as células T e as células NK (Natural Killer) também são encontradas. A distinção entre leucemias crónicas primárias e outras doenças linfoproliferativas, como a fase leucémica dos linfomas não-Hodgkin, leucemia linfoblástica aguda, leucemia prolinfócitica e leucemia de células pilosas, entre outras, é necessária com vista ao prognóstico e ao tratamento. Os painéis utilizados para identificação das doenças linfoproliferativas crónicas dividem-se entre os relacionados às leucemias e linfomas e permitem diferenciar entre: leucemia linfóide crónica (LLC), leucemia prolinfocítica (LPL), leucemia de células cabeludas (HCL), linfoma esplênico de zona marginal e associados, linfoma de células do manto, linfoma folicular e discrasias de células plasmáticas: Linhagem T: síndrome de Sezary, leucernia T do adulto (ATI), large granular leukemia (LGLL) & linfoma hepatoesplênico (gama-delta), e finalmente, a avaliação de linfomas CD30+. O painel para leucemias agudas, leucemias crónicas e/ou linfoma e avaliação de células CD34+ para transplante autólogo está disponível para análise em sangue, medula óssea, líquor e líquidos corporais obtidos por punção. Para a realização em medula óssea, o material é colhido pelo médico assistente ou no próprio laboratório na quantidade mínima de 1 mL, colhido com heparina ou EDTA. Esse material deve ser conservado à temperatura ambiente e enviado ao laboratório (no caso dda colheita ser realizada pelo médico assistente), juntamente com o esfregaço de 2 a 5 láminas não-coradas. Imunofenotipagem de Leucócitos A imunofenotipagem linfocitária é realizada com a utilização de anticorpos monoclonais que são capazes de reconhecer antigénios na membrana da célula. Devido à capacidade de identificar e quantificar com segurança as populações linfocitárias, é utilizada, na avaliação da imunodeficiência celular e na monitorização de pacientes com SIDA. No teste, é utilizado um grupo de anticorpos monoclonais conjugados. Os anticorpos são selecionados para reconhecer diferentes populações e subpopulações linfocitárias, permitindo estudar as populações de linfócito T (CD3) e linfócito B (CD19) e as subpopulações de T, linfócito T helper (CD4) e linfócito T supressor (CD8). Em relação à SIDA, a contagem de linfócitos T CD4+ realizada em citómetros de fluxo é, hoje, o teste recomendado para avaliação do estdiio da doença, orientando decisões sobre o ínicio do tratamento, modificações da terapia antiviral e tratamento profilático contra patogénios oportunistas. Representa também um marcador prognóstico utilizado em conjunto com a análise da carga viral, indicando a evolução clínica da doença e a expectativa de sobrevida. No início da infecção vírica, há uma súbita diminuição da contagem de células CD4 e altos níveis de virémia plasmática (RNA-HIV). Ao longo de vários anos, há uma diminuição gradual dos níveis de CD4, que se acentua por um período médio de 1,5 a 2 anos antes do diagnóstico da AIDS. A doença avançada caracteriza-se pela contagem de CD4 abaixo de 200 células/mm3 e pelo desenvolvimento de infecções oportunistas, neoplasias, síndrome de consumo e complicações neurológicas. Alguns autores recomendam que os pacientes sintomáticos devem ser sempre tratados, independentemente dos valores de CD4. Quando assintomáticos, a decisão do tratamento está associada aos valores da carga viral e de CD4. Para valores acima de 350 células/mm3, não há indicação de tratamento, e valores abaixo desse limite indicam a necessidade de início do tratamento. Os linfócitos T CD8+ também são afectados pela doença, observando-se níveis aumentados na fase inicial e que retornam ao normal em meses. Com a evolução da doença, tendem a diminuir em proporções menores que os dos linfócitos T CD4+. Vários factores podem influenciar a contagem de células CD4. Entre eles, variações de métodos (que permitem valores normais entre 500 a 1.400 células por mililitro), variações sazonais e diurnas, doenças intercorrentes e uso de corticóides. Existem descrições que associan a co-infecção pelo HTLV-1 e a esplenectomia à contagem enganosamente alta de CD4. Imunoglobulina E Específica O doseamento da imunoglobulina E (IgE total) é um bom teste laboratorial para a triagem de processos alérgicos. Os níveis de IgE total encontram-se elevados na rinite alérgica, na dermatite atópica e em muitos casos de asma. Porém, não é um teste específico, pois existem outras situações clínicas que cursam com o aumento de IgE sérica total, como parasitoses (helmintíases), mielomas, aspergilose, filariase pulmonar e o síndrome de Wiskott-Aldrich. Por isso, torna-se necessário o diagnóstico diferencial para alergia, por meio da pesquisa da IgE com actividade específica. Além de diferenciar das outras possibilidades clínicas que apresentam aumento de IgE total, a pesquisa da IgE específica é realizada para diferentes alergénios isolados, permitindo identificar o alergénio específico, causador da sintomatologia clínica, com uma eficiência acima de 90%, sem interferência de fármacos ou de parasitas. O doseamento de IgE específica pode ser realizado para uma enorme variedade de alergénios, que são agrupados em painéis de acordo com a sua natureza, para facilitar a investigação. Os alergénios podem ser solicitados individualmente ou em painéis. FRUTAS Laranja Limão Ananás Kiwi Morango Cacau Tomate f33 f208 f210 f84 f44 f93 f25 PEIXES E FRUTOS DO MAR Peixe (bacalhau) Camarão f3 f24 Atum Salmão Mexilhão f40 f41 f207 LACTICÍNEOS Leite Caseína Alfa-lactoalbumina Beta-lactoalbumina f2 f78 f76 f77 PROTEÍNAS ANIMAIS Carne de Porco Carne de Vaca Gema do Ovo Clara do Ovo f26 f27 f75 f1 GRÃOS Glúten Trigo Milho Amendoim Grão de Soja f79 f4 f8 f13 f14 INALANTES-EPITÉLIO Pêlo de Cão Pêlo de Gato e2 e1 INALANTES-INSECTOS Blatella germenica (barata) i6 INALANTES-POEIRA Hollister-stier-labs (poeira domociliar) D. pteronysinnus D. farinae Bomia tropicalis h2 d1 d2 rd 201 INALANTES-GRAMÍNEAS Grama Azevém Rabo-de-gato Erva-de-febre Zaburro de alepo g2 g5 g6 g8 g10 DROGAS Penicilina G Penucilina V c1 c2 FUNGOS Penicillium notatum Cladosporium herbarum Aspergillus fumigatus Candida albicans Alternaria alternata m1 m2 m3 m5 m6 OCUPACIONAIS Latéx (Hevea brasiliensis) k 82 Imunoglobulinas As imunoglobulinas ou anticorpos são um grupo de glicoproteínas presentes no soro e nos líquidos orgánicos. São produzidas pelos linfócitos B, precursores que, depois de sensibilizados, isto é, depois de terem entrado em contato com o antigénio, originam os plasmócitos de diferentes linhagens e clones celulares, que irão produzir as cinco frações de imunoglobulinas, denominadas imunoglobulinas A, G, M, D e E. Apesar de apresentarem muitas semelhanças, diferem entre si no tamanho, na composição de aminoácidos, no conteúdo de carbohidratos e na carga eléctrica. A estrutura básica de uma molécula de imunoglobulina (monómero) consiste em duas cadeias polipeptídicas de cadeias leves e duas cadeias pesadas, sempre em pares idênticos. As quatro cadeias mantêm-se unidas por ligações de pontes dissulfeto, sendo que as duas leves (L) são menores e comuns a todas as classes de imunoglobulinas. As cadeias pesadas (H) possuem um alto peso molecular, contêm cerca de 440 aminoácidos e são maiores, com estruturas distintas em cada classe ou subclasse. As chamadas cadeias leves possuem um baixo peso molecular e contêm cerca de 220 aminoácidos. Apresentam-se em dois tipos distintos: kappa (K) e lambda (l). Em cada imunoglobulina existem sempre duas idênticas de um único tipo, nunca as duas simultaneamente. As imunoglobulinas possuem dois locais idênticos de ligação com o antigénio. Um é realizado pela cadeia H, e outro pela cadeia L. São bifuncionais, pois cada molécula de imunoglobulina apresenta uma região que age na ligação com o antigénio, enquanto a outra promove a ligação das imunoglobulinas às células do sistema imune e ao sistema do complemento. Imunoglobulina G A IgG é a principal imunoglobulina do sangue, correspondendo a cerca de 70 a 75% do total de imunoglobulinas. É monomérica e é o principal anticorpo nas respostas imunes secundárias, quando são produzidas em grande quantidade. É a única que atravessa a barreira placentária e confere um grande grau de imunidade passiva ao recém-nascido. Subclasses de Imunoglobulina G Tanto a classe quanto as subclasses da imunoglobulina são determinadas pelo tipo de cadeia pesada. A IgG apresenta quatro subclasses distintas: IgG1, IgG2, IgG3 e IgG4, que possuem quatro cadeias pesadas, similares mas não-idênticas, já que apresentam diferenças nas suas propriedades, tais como número de pontes dissulfídicas e sequências de aminoácidos diferentes. Apesar de apresentarem níveis séricos de imunoglobulinas normais, os pacientes com baixa resistência a infecções de repetição, especialmente respiratórias, podem apresentar uma deficiência específica de uma ou mais das subclasses de imunoglobulinas. As subclasses ocorrem na proporção de 66% de IgG1, 23% de IgG2, 7% de IgG3 e 4% de IgG4. A subclasse IgG1 é a principal subclasse nos adultos normais. A IgG2 é a única que não atravessa a barreira transplacentária, e sua deficiência está muitas vezes associada à deficiência de IgA e especialmente a infecções víricas e bacterianas, na maioria dos casos, do aparelho respiratório superior e inferior. A IgG3 é a que se liga de modo mais efectivo ao complemento. A IgG1 e a IgG2, respectivamente, ligam-se em ordem decrescente de ecfetividade, e a IgG4, em muitos casos, falha inteiramente a ligação ao complemento pela via clássica. A deficiência de IgG3 está associada a infecções respiratórias de repetição, especialmente pelo Streptococcus pneumoniae e Haemophilus influenzae, e a infecções das vias urinárias. A IgG4 apresenta níveis séricos elevados, em condições atópicas. A sua deficiência também está associada a infecções do aparelho respiratório superior e inferior, especialmente a doenças broncopulmonares. Níveis séricos diminuídos de todas as subclasses podem ser observados nas doenças auto-imunes e nas infecções pelo vírus HIV. Imunoglobulina M Representa 5 a 10% das imunoglobulinas totais Apresenta-se na forma de um pentâmero e não possui subclasses. É reconhecida como o anticorpo precoce, visto ser a primeira imunoglobulina encontrada na resposta a um estímulo antigénico. Por isso, é útil no diagnóstico diferencial das infecções víricas ou parasitárias agudas. Ao contrário da IgG, não atravessa a barreira placentária e é a única que o recém-nascido sintetiza. Níveis séricos aumentados em recém-nascidos indicam que a imunoglobulina M foi produzida pelo feto, sugerindo uma infecção pré-natal. Como a IgM é pentamérica, ou seja, possui 10 sítios de ligação com o antigénio, é mais eficiente em ligar-se aos antigénios e ao sistema do complemento. Essas características, aliadas ao aparecimento precoce durante a evolução da infecção, fazem dela um potente agente de combate às infecções. Imunoglobulina A A IgA representa cerca de 10 a 15% das imunoglobulinas totais. É a imunoglobulina predominante nas secreções: saliva, lágrimas, secreções nasais, colostro, leite, secreções traqueobrônquicas e gastrointestinais. A sua estrutura pode variar, dando origem a duas subclasses: IgA1 e IgA2. A maior parte das IgAs é da subclasse IgA1, a mais encontrada no soro, e a IgA2, mesmo em menor quantidade, tem um papel importante, por se tratar da subclasse dominante nas secreções, nas quais tem a função de proteger a mucosa de agressões. Não atravessa a barreira transplacentária, mas devido à sua grande concentração no colostro, tudo indica que contribua para a proteção dos recém-nascidos contra infecções, principalmente do tubo gastrointestinal. Existe uma outra forma de apresentação da IgA, chamada de IgA secretória (sIgA), na qual a imunoglobulina A se apresenta associada a uma outra proteína, que é o componente secretório, sintetizado pelas células epiteliais, servindo de receptor para a ligação da IgA. Devido à sua presença nas membranas externas, os constituintes secretores da IgA formam uma primeira linha de defesa contra agressões do ambiente externo. Aparentemente, não conseguem activar o complemento pela via clássica, fazendo-o pela via alternativa (sistema properdina). Imunoglobulina D Representam menos de 1% das imunoglobulinas plasmáticas. Aparecem em grande quantidade na membrana dos linfócitos B circulantes. A função biológica ainda não é bem conhecida, mas parece desempenhar um papel importante na diferenciação dos linfócitos antigenicamente estimulados, sendo um dos principais receptores para antigénios na superfície das células B. Imunoglobulina E Entre todas as classes de imunoglobulinas, a IgE é a que se encontra em menor quantidade e está presente na superfície de basófilos e mastócitos, o que resulta na libertação de mediadores da resposta de hipersensibilidade imediata. Tem um papel importante na imunidade activa contra parasitas, especialmente os helmintas, e nas doenças alérgicas. A IgE não atravessa a barreira placentária e não se liga ao complemento pela via clássica, e sim pela via alternativa. Alterações da Concentração das Imunoglobulinas O aumento policlonal das imunoglobulinas séricas representa uma resposta normal a uma série de patologias, como infecções, doenças hepáticas, doenças pulmonares e alterações auto-imunes, entre outras. O aumento de IgG tende a predominar nas respostas crónicas e nas doenças hepáticas; já os aumentos de IgA tendem a predominar nas infecções de pele, aparelhos respiratório, intestinal e renal. A IgM está relacionada às fases agudas das infecções primárias e às infecções intrauterinas. Na cirrose biliar primária, a IgM está marcadamente elevada, e algumas vezes de forma conjunta com a IgG. A IgE normalmente encontra-se elevada na asma e noutros quadros alérgicos, especialmente nas crianças. As infecções bacterianas crónicas cursam com o aumento de todas as imunoglobulinas. O aumento monoclonal das imunoglobulinas é causado por um único clone de células plasmáticas, produzindo imunoglobulinas de estrutura idêntica. Estas imunoglobulinas monoclonais são chamadas de paraproteínas e podem ser polímeros, monómeros ou fragmentos da molécula de imunoglobulina. Esses fragmentos costumam ser cadeias leves (proteínas de Bence Jones) e, mais raramente, cadeias pesadas. A expressão gamapatia monoclonal é utilizada para identificar o grupo de patologias em que são encontradas paraproteínas. Cerca de 60% das paraproteínas são produzidas por células oriundas do mieloma múltiplo ou de um plasmocitoma solitário. Cerca de 15% são causadas pela superprodução, pelos linfócitos B, principalmente em linfonodos, linfomas, leucemias linfocíticas crónicas, macroglobulinemia de Waldenström ou mais raramente na doença de cadeias pesadas. Cerca de 25% das paraproteinémias são benignas, e decorrem em diferentes patologias ou muitas vezes de causas desconhecidas. IMUNOGLOBULINAS MONOCLONAIS NO MIELOMA MÚLTIPLO PROTEINÚRIA DE BENCE PARAPROTEÍNA SÉRICA INCIDÊNCIA JONES IgG 50% 60% IgA 25% 70% IgD 2% 100% IgM 1% 100% IgE 0,1% a maior parte Apenas cadeias leves 20% 100% Biclonal 1% Não-detectável <1% 0% Adaptada Tietz Textbook of Clinical Chemistry 3ª Edição - 1999. Inibidor da C1-Esterase O inibidor da C1-esterase actua na resposta inflamatória pela inactivação das proteases do sistema complemento C1r e C1s, dos factores da coagulação XIa e XIIa e da plasmina do sistema fibrinolitico. A deficiência hereditária ou adquirida de C1-esterase leva a uma activação desordenada de C1, com a produção de substâncias vasoactivas que causam episódios recorrentes, com angioedema de pele, mucosas, faces, aparelhos respiratório e gastrointestinal superior. Com a idade, o angioedema hereditário pode precipitar situações de coagulação intravascular disseminada ou de falência de múltiplos órgãos. Existem duas variantes da doença: tipos I e II , e ambas são doenças autossómicas dominantes. O tipo I corresponde a cerca de 85% dos casos e é caracterizado por baixas concentrações plasmáticas do inibidor da C1 esterase. O tipo II corresponde aos 15% restantes e caracteriza-se pela presença de concentrações normais ou até elevadas do inibidor da C1 esterase, porém com comprometimento da actividade funcional. A variedade mais comum de deficiência adquirida ocorre por consumo aumentado, em vez da síntese diminuída, e está associada a desordens linfoproliferativas benignas ou malignas de células B. Uma forma menos comum é a associada a autoanticorpos contra o inibidor da C1-esterase. Jejum Quando nos referimos à necessidade de jejum, ou seja à privação de alimentação antes da realização de uma avaliação laboratorial, este pode variar de acordo com o exame solicitado, indo de um período determinado de horas, com 8 a 12 horas de abstinência, ou apenas a restrição de ingestão alimentar matinal que antecede a colheita de material para análise. A maioria de exames hoje, dispensa longos períodos de jejum, sendo passíveis de ser realizados desde que não tenha ocorrido alimentação recente (4horas) rica em lipídios e proteínas que possam interferir ns sua análise. Por outras palavras, poucos são os exames que exigem regras rigorosas de jejum com o mínimo de 8 e o máximo de 14 horas para glicose, prova de tolerância à glicose e testes funcionais endócrinos, de 12 horas para avaliação de lípidos, especialmente triglicirídeos. Entretanto, é necessário deixar claro que a maioria dos valores de referência é obtida utilizando-se uma população saudável, em jejum pela manhã. Apesar disso, na prática, constata-se que o doseamento dos diferentes analitos não sofre grande interferência com o jejum, apresentando variações em torno de 5% nos resultados decorrentes da alimentação, variações estas consideradas aceitáveis. Excepção feita às restrições já citadas, permitindo a realização com vantagem da extemporaneidade da colheita sanguínea. Outro dado importante é o efeito do jejum prolongado, que pode afectar alguns resultados de laboratório. Assim, tempos superiores a 14 horas podem influenciar a doseamentos de glicose, insulina e hormonas. Após um jejum de 48 horas, a libertação hepática de billirrubina pode aumentar em aproximadamente 240% do seu valor. Com jejum prolongado, há uma diminuição de proteínas específicas, como componente de C3 de complemento, pré-albumina e albumina. Os níveis normais são rapidamente recuperados com ingestão de alimentos . As concentrações de glicose, uréia, colesterol, triglicerídeos e apolipoproteínas diminuem, e a creatinina e ácido úrico aumenta. Os níveis de hormonas tiroidéias T3 e T4 diminuem. LDL- Colesterol O LDL- colesterol (colesterol contido nas lipoproteínas LDL) tem sido apontado por diversos autores como um indicador de risco de desenvolvimento de arteriosclerose melhor do que o colesterol total, já que está directamente envolvido no mecanismo de desenvolvimento da lesão arterosclerótica. O endotélio tem participação activa no processo de aterogénese, e sofre a acção dos factores de risco, como aumento do LDL-colesterol, tabagismo, suscetibilidade hereditária, entre outros. A disfunção endotelial, que se caracteriza por diminuição da resposta dos mecanismos de vasoconstrição e vasodilatação arteriais sob a acção da acetilicolina, parece decorrer de diferentes factores, por sua vez consequentes à acção das LDL oxidadas. Estas são removidas pelos macrófagos com receptores específicos, levando a um acúmulo de ésteres de colesterol no interior dos macrófagos e levando à formação das células espumosas, as principais responsáveis pela quantidade de colesterol na placa de ateroma. Consultar Perfil Lipídico Lipase A lipase é a enzima digestiva produzida principalmente pelas células acinares do pâncreas exócrino. Tem o papel fisiológico de hidrolisar as longas cadeias de triglicerídeos no intestino delgado (lipólise). A sua avaliação é essencial no diagnóstico das patologias pancreáticas. Ela aumenta nas primeiras 8 horas após o início da agressão pancreática, atingindo valores mais altos em 24 horas e mantendo-se elevada em torno de 7 a 14 dias. Os seus níveis geralmente não permanecem elevados por mais de 2 semanas. Quando isto acontece, sugerem complicações como abcessos e pseudocistos. Normalmente os seus níveis elevam-se quase que paralelamente aos da amilase, um pouco mais tarde, mantêm-se elevados por um período mais longo. O seu aumento não se correlaciona necessariamente com a gravidade da doença. O uso combinado da avaliação sérica da lipase e de amilase permite um melhor diagnóstico. Cerca de 20% dos casos de pancreatite aguda cursam com níveis de amilase normais e com lipase isoladamente elevada. Nas parotidites agudas, em que a amilase pode apresentar-se elevada, os níveis séricos de lipase não se alteram, auxiliando no diagnóstico diferencial. A lipase é portanto um marcador mais específico de doença pancreática aguda do que a amilase. Os seus níveis estão aumentados em pacientes com pancreatite aguda e recorrente, abcesso ou pseudocisto pancreático, trauma, carcinoma de pâncreas, obstrução dos ductos pancreáticos e no uso de fármacos (opiáceos). Está também aumentada na maior parte das condições inflamatórias da cavidade abdominal, doenças do trato biliar, abcessos abdominais e insuficiência renal aguda e crónica (com menor frequência do que a amilase). A lipase é filtrada pelos glomérulos, devido ao seu baixo peso molecular. Em condições usuais, é totalmente reabsorvida pelos túbulos proximais, estando ausente da urina de pacientes normais. Nos distúrbios renais que cursam com alteração da capacidade de reabsorção tubular, a lipase pode ser detectada na urina, numa relação inversa com a clearance da creatinina. Lipoproteína (a) A lipoproteína (a), ou Lp(a) é uma classe distinta de liproteínas, estruturalmente relacionada com as lipoproteínas de baixa densidade (LDL), já que ambas as classes de liproteínas possuem uma molécula de Apo B-100 por partícula e uma composição lipídica similar.No entanto, ao contrário da LDL, a Lp(a) contém uma proteína, a Apo (a), que se liga à Apo B-100. A Apo (a) é estruturalmente semelhante ao plasminogénio. Apesar de não possuir as mesmas características funcionais, compete com o plasminogénio nos seus locais de acção, o que explicaria a sua capacidade de conduzir a um estado prótrombótico, ao impedir a formação da plasmina, a enzima responsável pela lise da fibrina. Outro dado importante é que, pela ligação entre a Apo B-100 e a Apo (a), a sua velocidade de remoção da circulação fica diminuída, aumentando a sua permanência na circulação, o que facilita a sua migração para a região subendotelial. É considerada por muitos autores um factor de risco para o desenvolvimento de doença coronária obstructiva, de caráter genético, que sofre pouca influência dos demais factores de risco já conhecidos. Portanto, níveis elevados constituem um risco, independentemente do desenvolvimento de doença aterosclerótica. Lipoproteínas As lipoproteínas são complexos macromoleculares sintetizados no fígado e no intestino delgado, que transportam o colesterol e os triglicerídeos através da corrente sanguínea. São classificadas segundo características físico-químicas. Lipoproteínas de Alta Densidade – HDL As HDL são pequenas partículas constituídas por cerca de 50% de proteína, especialmente Apo A I e II, e pouca quantidade de Apo C e Apo E, 20% de colesterol, 30% de triglicerídeos e resíduos de fosfolípidos. A HDL pode ser separada em duas subclasses principais: HDL 2 e HDL 3, que diferem em tamanho, densidade e composição, especialmente em relação ao tipo de apoproteínas. Cumprem o importante papel de transportar o colesterol até ao fígado directamente ou transferindo ésteres de colesterol para outras lipoproteínas, especialmente as VLDL. É atribuído à fracção HDL 2 o papel de proteção do desenvolvimento da arteriosclerose. Lipoproteínas de Baixa Densidade – LDL As LDL representam 50% da massa total de lipoproteínas circulantes. São partículas bem menores, tão pequenas, que mesmo quando em grande quantidade não são capazes de turvar o plasma. O colesterol representa metade da massa da LDL. Cerca de 25% são proteínas, especialmente Apo B-100 e pequenas quantidades de Apo C; o restante é constituído de fosfolípidos e triglicerídeos. É a lipoproteína que mais colesterol transporta. Tem a função de transportá-lo para locais onde ele exerce uma função fisiológica, como por exemplo a síntese de esteróides. São, na sua maior parte, produzidas a partir das lipoproteínas VLDL. A sua concentração sérica tem uma relação directa com o aumento do risco de aterogénese. Lipoproteínas de Muito Baixa Densidade – VLDL São partículas grandes, porém menores do que as partículas dos quilomícrons produzidas no fígado. São constituídas por 50% de triglicerídeos, 40% de colesterol e fosfolípidos e 10% de proteínas, principalmente Apo B-100, Apo C e alguma Apo E. Têm como função o transporte dos triglicerídeos endógenos e do colesterol para os tecidos periféricos para serem armazenados ou utilizados como fonte de energia. Assim como os quilomícrons, são capazes de turvar o soro. Quilomícrons São grandes partículas produzidas pelas células intestinais, compostas por cerca de 85 a 95% de triglicerídeos de origem da dieta (exógeno), pouca quantidade de colesterol livre e fosfolípidos e 1 a 2% de proteínas. Devido à sua proporção lípido/proteína, os quilomícrons flutuam, dando ao plasma um aspecto leitoso, formando ainda, sobre ele, uma camada cremosa, quando deixado em repouso. Consultar Perfil lipídico. Líquido Cefalorraquidiano - Líquor O líquido cefalorraquidiano (LCR) é formado principalmente pelos plexos coróides. Nos adultos, é produzido a uma taxa de 20 mL/h, o que corresponde a aproximadamente 500 mL/24 h. Como o volume do LCR é de cerca de 100 a 150 mL, isso significa que é renovado em média a cada 6 horas. Entre as suas diferentes funções, a principal é proteger mecanicamente o tecido cerebral. Além disso, actua como um lubrificante, evitando atrito com o crânio, realiza a recolha de resíduos, faz circular os nutrientes e varia a sua produção de acordo com a pressão intracraniana. A composição do líquor é controlada pelas barreiras hematoencefálica e hematoliquórica, que também protegem contra a invasão de agentes externos. EXAME MICROSCÓPICO O líquor normal é límpido, cristalino, inodoro e com aspecto de água. De acordo com as diferentes patologias, essas características alteram-se. Apresenta-se opalescente ou turvo pelo aumento de bactérias, fungos, eritrócitos e leucócitos. A cor é resultante da presença de bilirrubina, eritrócitos, hemoglobina, leucócitos ou proteínas. Na hemorragia subaracnóidea, o aspecto é hemorrágico vermelho turvo. Esta coloração também poderá ocorrer nos acidentes de punção, sendo o diagnóstico diferencial a prova dos 3 tubos, cujo aspecto na hemorragia é uniforme e no acidente de punção tende a clarear a cada tubo. A presença de coágulo nos acidentes de punção, o aspecto do sobrenadante após a centrifugação, que nas hemorragias se apresenta xantocrómico, enquanto nos acidentes é límpido, também auxiliam no diagnóstico diferencial. Nas meningites bacterianas, o líquor apresenta-se turvo, amarelo e, por vezes, xantocrómico, após centrifugação. Já nos casos de meningites víricas, a cor geralmente varia de esbranquiçada a incolor após a centrifugação. EXAME BIOQUÍMICO Cloro Qualquer condição que altere os níveis séricos de cloreto também irão afetar o nível de cloreto no LCR. Os cloretos no LCR são normalmente 1 a 2 vezes maiores do que os séricos. Níveis diminuídos são encontrados nas meningites tuberculosa e bacteriana e na criptococose. Glicose Os níveis de glicose no LCR correspondem a cerca de 2/3 da glicose sanguínea de jejum. A proporção normal de glicose LCR/plasma pode variar de 0,3 a 0,9. São considerados valores anormais de glicose no LCR resultados inferiores a 40 mg/dL e/ou relações inferiores a 0,3. A diminuição dos níveis da glicose no líquor é um dado importante no diagnóstico das meningites bacterianas, tuberculosas e fúngicas, nas quais encontramos geralmente valores baixos a muito baixos. Já nas meningites víricas, os níveis variam de normais a discretamente baixos. Outras patologias que cursam com níveis diminuídos são neoplasias com comprometimento meníngeo, sarcoidose, hemorragia subaracnóide e hipoglicemia sistémica, entre outras. Níveis elevados de glicose no LCR não possuem significado clínico, reflectindo aumento dos níveis da glicemia sistémica. Acidentes de punção podem, ocasionalmente, causar aumento da glicose no LCR. Proteína Das proteínas encontradas no líquor, mais de 80% são provenientes do plasma. Normalmente, equivalem a valores inferiores a 1% do nível sanguíneo. O aumento dos níveis de proteínas no líquor é um bom indicador, embora não-específico, da presença de doença. As proteínas no LCR podem estar elevadas em diferentes patologias, como meningites, especialmente as bacterianas, doenças neurológicas, hemorragias e tumores, entre outras. A elevação pode ser decorrente da alteração da permeabilidade da barreira hematoencefálica, da diminuição dos mecanismos de reabsorção, de uma obstrução mecânica do fluxo do LCR ou do aumento na síntese de imunoglobulina intratecal. Os níveis podem estar diminuídos em crianças entre os 6 meses e 2 anos de idade e em condições associadas a um turnover aumentado, como acontece nas punções com remoção de grandes volumes, traumas com perda de líiquor e aumento da pressão intracraniana. É importante lembrar a variação da concentração de proteína de acordo com o local da punção, pois os valores encontrados são menores nos ventrículos e maiores na região lombar, assim como também ocorrem drásticas variações nos recémnascidos. Para avaliação da integridade da barreira hematoencefálica, pode-se utilizar um índice obtido pela proporção entre os níveis de albumina no líquor (mg/dL) e no soro (g/L). Normalmente, o valor encontrado é menor que 9. Valores maiores indicam alterações da barreira, que podem variar de discretas a severas, de acordo com os índices encontrados. São considerados discretos valores entre 9 e 14, moderados entre 14 e 30, e acima de 30, um comprometimento severo. Índices ligeiramente alterados são encontrados em crianças de até 6 meses, traduzindo imaturidade da barreira hematoencefálica. Os acidentes de punção invalidam a utilização destes índice. NÍVEIS DE PROTEÍNA PUNÇÃO VENTRICULAR PUNÇÃO CISTERNAS PUNÇÃO LOMBAR RECÉM-NASCIDOS PREMATUROS EM ADULTOS 5 a 15 mg/dl 15 a 25 mg/dl 15 a 45 mg/dl Até 150 mg/dl Até 500 mg/dl EXAME CITOLÓGICO A análise citológica do LCR é composta de duas fases distintas: a citometria, em que é feita a análise quantitativa das células, e a citologia, em que é feita a contagem diferencial em lámina corada. Convém lembrar a importância do exame citológico nas meningopatias leucémicas (mais frequente na leucemia linfoblástica aguda), tanto no diagnóstico como no acompanhamento do tratamento. As meningites bacterianas agudas apresentam grande celularidade (geralmente acima de 500 leucócitos/mm3) e com predomínio de polimorfonucleares. Já as de origem vírica, fúngica ou tuberculosa apresentam celularidade menor e um predomínio de células mononucleres, podendo no entanto, nas primeiras 24/36 horas manter um predomínio de polimorfonucleres. CITOMETRIA Até 5 leocóciotos/mm3 Adultos 0 eritócitos/mm3 Até 30 leocócitos/mm3 Recém-nascidos 0 eritócitos /mm3 Até 10 leocócitos/mm3 1 mês a 1 ano 0 eritócitos /mm3 Até 8 leocócitos/mm3 1 a 4 anos 0 eritócitos /mm3 Até 5 leocócitos/mm3 Acima de 5 anos 0 eritócitos /mm3 CITOLOGIA POLIMORFONUCLEARES Adultos 2% Crianças 10% MONONUCLEARES Adultos 98% Crianças 90% Outras Avaliações Índice imunoglobina líquor/soro Doenças neorológicas, HIV, meningites fúngicas. Esclerose múltipla, infecções do sistema nervoso central, síndrome de Guilain-Barré, mielite transversa, carcinomatose meníngea. Diagnóstico diferencial etiológico de meningites e Ácido Láctico traumatismo craniano. Tumores, acidentes vasculares, meningites, convulsões, Creatinofofoquitase traumatismo craniano. Lesão cerebral por hipóxia, diferencial de acidente de Desidrogenase Láctica punção e hemorragias, meningites bacterianas. Outros: VDRL/FTA-Abs, Vírus HIV, Toxoplasmose, Gram e culturas, e a pesquisa de antigénios bacterianos rápidos. Electroforese de Proteínas Líquido Pericárdico Em condições normais, encontram-se cerca de 10 a 50 mL de líquido no espaço pericárdico. É um filtrado plasmático produzido por um processo transudativo. O derrame pericárdico (aumento da quantidade de líquido) pode ser encontrado em processos inflamatórios, malignos ou hemorrágicos. Entre as causas mais comuns, encontramos pericardite bacteriana, vírica, tuberculosa e fúngica, infecções por micoplasma e relacionada com a SIDA, carcinomas metastáticos e linfomas, enfarte do miocárdio, hemorragias por trauma, distúrbios da coagulação, doenças do foro reumático, lúpus eritematoso sistémico e distúrbios metabólicos como uremia e mixedema. EXAME MICROSCÓPICO O líquido pericárdico normal é amarelo claro e límpido. Apresenta-se hemorrágico em processos infecciosos, malignos, traumas, distúrbios da coagulação, derrame de aneurisma aórtico, colagenoses, pericardite hemorrágica idiopática e pós-enfarte. Entretanto, pode significar também um acidente durante a punção. O diagnóstico diferencial será realizado pelo hematócrito, que nos acidentes será similar ao do sangue periférico, ao contrário do encontrado nas efusões hemorrágicas verdadeiras. Além disso, o sangue da efusão não coagula, enquanto o do acidente de punção sim. Já as efusões por processos metabólicos é clara e com uma cor amarelo-pálida. Grandes volumes (acima de 350 mL) sugerem processos malignos, uremia e processos inflamatórios ligados à SIDA. EXAME BIOQUÍMICO Proteínas A determinação de proteínas tem pouco valor para o diagnóstico diferencial das efusões pericárdicas. Glicose Podem ser encontrados níveis de glicose inferiores a 40 mg/dL nos derrames bacterianos, na tuberculose, na artrite reumatóide e nos processos malignos metastáticos. A sua avaliação tem pouco valor para o diagnóstico diferencial. EXAME CITOLÓGICO A análise citológica é composta de duas fases distintas: a citometria, em que é feita a análise quantitativa das células, e a citologia, em que é feita a contagem diferencial em lámina corada. A presença de células de aspecto morfológico suspeito determina a indicação de citopatologia para células neoplásicas. As metástases dos carcinomas de pulmão e de mama são as mais observadas. ADULTOS CITOMETRIA <500 leucócitos/mm3 0 eritócitos /mm3 EM ADULTOS POLIMORFONUCLEARES <25% Outras Avaliações A presença de anticorpos antinucleares, em títulos altos, tem sido descrita nos derrames associados ao lúpus eritematoso sistémico. No entanto, não são específicos para o diagnóstico dessa patologia. A análise pela coloração de Gram apresenta uma sensibilidade de 50%, e a cultura, de 80%, para o diagnóstico de pericardite bacteriana. Já a cultura e a coloração para tuberculose (BAAR) apresentam uma sensibilidade de aproximadamente 50%, que pode chegar a 90% quando analisado o tecido pericárdico em vez do líquido. Líquido Peritonial É um ultrafiltrado do plasma que ocupa a cavidade peritoneal, e a sua produção depende da permeabilidade vascular e da pressão oncótica, sendo portanto um transudado. Nesse espaço revestido por mesotélio, normalmente existem cerca de 50 mL de líquido presente. Aumentos acima desse nível já são considerados alterações e podem ocorrer em patologias peritoneais, primárias ou não. Pacientes com volumes aumentados são considerados portadores de ascite, e o líquido é chamado de líquido ascítico. EXAME BIOQUÍMICO Amilase Os valores de amilase são similares aos níveis séricos. Valores superior a três vezes o valor sérico é uma boa evidência de origem pancreática, como pancreatite aguda, pseudocisto pancreático ou traumatismo. A presença de úlcera péptica perfurada, perfuração intestinal, trombose mesentérica e necrose de anças intestinais também pode produzir níveis elevados. Glicose Os valores de glicose são similares aos séricos, apresentando-se diminuídos em 30% a 60% dos casos de peritonite tuberculosa e em cerca de 50% dos casos de carcinomatose peritoneal. Os pacientes hiperglicémicos cursam com valores de glicose aumentados no líquido ascítico. Proteínas A determinação dos níveis de proteínas é um dos dados utilizados para diferenciar os exsudados dos transudados. No entanto, no líquido ascítico, esse parâmetro não funciona de forma satisfatória. Nos transudados encontramos níveis de proteína mais baixos (< 50% do valor sérico) e nos exsudados mais altos. Não é raro que as amostras infectadas ou relacionadas com processos malignos apresentem concentrações de proteínas na faixa do transudado. Muitos pacientes com ascite por cirrose ou insuficiência cardíaca possuem taxas de proteínas na faixa do exsudado. O Índice obtido pela relação da albumina no soro-albumina do líquido ascítico é considerado um bom parâmetro na diferenciação da cirrose das outras formas de efusão peritoneal. TRANSUDADOS Insificiência cardíaca congestiva, cirrose hepática, hipoproteínas (síndrome nefrótico) ................................................................................... EXUDADOS Peritonites bacterianas primárias e secundárias, tuberculose, hepatomas, carcinoma metástico, linfomas e mesomielomas, traumas, pancreatite e peritonite biliar. EXAME CITOLÓGICO A análise citológica é composta de duas fases distintas: a citometria, em que é feita a análise quantitativa das células, e a citologia em que é feita a contagem diferencial em lámina corada. A presença de células de aspecto morfológico suspeito, determina a indicação de citopatologia para células neoplásicas. Os carcinomas metastáticos do pulmão e da mama são os mais observados. ADULTOS CITOMETRIA <500 leucócitos/mm3 0 eritócitos /mm3 CITOLOGIA POLIMORFONUCLEARES <25% Outras Avaliações Segundo alguns autores, o colesterol tem um valor moderado na diferenciação entre a ascite de origem maligna e a ascite por cirrose, utilizando-se como valor limite 45 a 48 mg/dL. Níveis elevados de desidrogenase láctica são encontrados nas ascites malignas. O índice entre os valores de LDH líquido ascítico/LDH soro superior a 0,6 possui uma sensibilidade de 80% no diagnóstico diferencial de neoplasias. Valores de bilirrubina superiores a 6,0 mg/dL e uma proporção de bilirrubina líquido/soro superior a 1,0 sugerem ruptura da vesícula biliar, causando coliperitonite. Líquido Pleural A cavidade pleural é revestida pelos mesotélios das pleuras visceral e parietal. Normalmente, contém uma pequena quantidade de líquido, dito pleural, o que permite o movimento de uma membrana contra a outra. O líquido pleural é um filtrado plasmático produzido continuamente pela pleura parietal. Quando ocorre acumulação de líquido, é denominado derrame pleural, que é o resultado do desequilíbrio entre a produção e a reabsorção do líquido. EXAME MICROSCÓPICO O líquido pleural é límpido, inodoro, amarelo-pálido e não coagula. Apresenta-se hemorrágico nos processos traumáticos e malignos e no enfarte pulmonar. Pode também acontecer num acidente durante a punção, sendo o diagnóstico diferencial feito pela presença de pequenos coágulos e pela característica de ir clareando com a drenagem continuada. Pode aparecer também noutras situações, como traumas, distúrbios da coagulação e ruptura de aneurisma da aórta. Na realização do hematócrito, este, apresentará um valor próximo a 50% do sangue periférico no caso de hemotórax. Já nos processos metabólicos, o líquido pleural é claro e tem cor amarelo-pálida. Grandes volumes (acima de 350 mL) sugerem processos malignos, uremia e processos inflamatórios ligados à SIDA. EXAME BIOQUÍMICO Amilase Níveis de amilase acima dos níveis séricos indicam a presença de pancreatite aguda, pseudoquisto do pâncreas, ruptura esofágica ou, nalguns casos, derrames de origem maligna. Glicose A diminuição dos níveis de glicose para valores inferiores a 60 mg/dL ou um índice glicose líquido pleural/glicose soro inferior a 0,5 são mais frequentes e acentuadas nos derrames pleurais da artrite reumatóide e nos macroscopicamente purulentos (empiemas). Em neoplasias, tuberculose, lúpus eritematoso sistémico e infecções bacterianas não-purulentas, apresentam valores baixos num pequeno número de casos. LDH É um dos parâmetros para diagnóstico diferencial entre exsudados e transudados. Os níveis de LDH são sempre analisados em relação aos valores séricos (líquido pleural/soro), obtendo-se um índice que é maior do que 0,6 nos exsudados e menor do que 0,6 nos transudados. A presença de níveis diminuídos de LDH durante a evolução dos processos inflamatórios indica uma boa evolução e um bom prognóstico. Em contrapartida, níveis aumentados indicam uma evolução inadequada e sugerem que se mude para uma conduta terapêutica mais agressiva. Proteínas A determinação dos níveis de proteínas no líquido pleural só tem significado clínico como um dos dados utilizados para diferenciar os exsudados dos transudados. O transudado acontece por factores mecânicos, como aumento da pressão hidrostática ou diminuição da pressão oncótica, que influenciam o processo de formação e reabsorção dos líquidos e apresentam níveis protéicos 50% menores do que os do plasma. O exsudado acontece por aumento da permeabilidade capilar e diminuição da reabsorção linfática, e apresenta níveis protéicos maiores. Os transudados são geralmente bilaterais e são encontrados na cirrose hepática, no síndrome nefrótico e na insuficiência cardíaca congestiva. Os exsudados são mais frequentemente unilaterais e aparecem nas infecções bacterianas, neoplasias e doenças do colagénio. EXAME CITOLÓGICO A análise citológica é composta de duas fases distintas: a citometria, em que é feita a análise quantitativa das células, e a citologia, em que é feita a contagem diferencial em lámina corada. A presença de células de aspecto morfológico suspeito determina a indicação de citopatologia para células neoplásicas. Normalmente, encontram-se células mesoteliais nos processos inflamatórios. A presença de eosinofilia (>10%) pode resultar de diferentes causas, como reacção a fármacos, síndromes de hipersensibilidade, doenças reumatáticas, traumatismos, enfarte pulmonar e doença de Hodgkin. Nestas situações, pode ser observada a presença dos cristais de Charcot-Leyden, derivados dos eosinófilos. TRANSUDADOS EXSUDADOS CITOMETRIA <1.000 leucócitos/mm3 0 eritócitos /mm3 <1.000 leucócitos/mm3 0 eritócitos /mm3 CITOLOGIA POLIMORFONUCLEARES 20% MONONUCLEARES 80% PREDOMÍNEO DE POLIMORFONUCLEARES Líquido Sinovial É normalmente claro, transparente e viscoso. A sua quantidade média em condições normais é de 1,0 mL. Na sua composição encontramos: um ultrafiltrado plasmático, com ausência dos elementos da coagulação e o ácido hialurónico, produzido pelas células sinoviais, responsável pela viscosidade característica do líquido sinovial. A análise do líquido sinovial incluí as análises macroscópica, citológica e bioquímica e outras investigações específicas. EXAME BIOQUÍMICO Mucina O teste consiste na adição de ácido acético e na observação da formação ou não do coágulo de mucina. A formação de um coágulo de mucina firme e compacto revela um grau de viscosidade normal. Já a formação de um coágulo entre regular e fraco, em fragmentos dispersos e numa solução turva, reflecte diluição e despolimerização do ácido hialurónico, ou seja, uma alteração da viscosidade, que é uma característica inespecífica de várias artrites inflamatórias. Glicose As concentrações no líquido sinovial são semelhantes às plasmáticas. Por isso, a interpretação adequada dos valores de glicose do líquido sinovial requer uma comparação com os níveis séricos da glicose em jejum. Em condições normais e na maioria das condições não inflamatórias, a diferença é menor que 10 mg/dL. Diferenças significativas são encontradas nos processos inflamatórios e infecciosos. Os valores da glicose podem ser mascarados pela glicólise, aquando da presença de um grande número de leucócitos. Proteínas A concentração normal de proteínas varia de 1,2 a 2,5 g/dL. Valores aumentados são encontrados em processos inflamatórios e sépticos. Durante a fase inflamatória, proteínas maiores, como o fibrinogénio, entram no líquido sinovial. EXAME CITOLÓGICO A análise citológica do líquido sinovial é composta de duas fases distintas: a citometria, em que é feita a análise quantitativa das células, e a citologia, em que é feita a contagem diferencial em lámina corada. Normalmente, é pancicelular, com predomínio de mononucleares. Durante a análise microscópica por luz polarizada, é avaliada a presença de cristais, livres ou no interior das células, que podem ajudar no diagnóstico de artropatias induzidas por cristais. Permite também identificar os cristais como os de urato monossódico (gota), pirofosfato de cálcio (condrocalcinose ou pseudogota) e outros, como apatita e oxalato de cálcio. LEUCÓCITOS NORMAIS Até 200/ml INFLAMATÓRIOS 2000 a 75.000 NÃO-INFLAMATÓRIOS 200 a 2.0000 SÉPTICOS >100.000 POLIMORFONUCLEARES <25% >50% <25% >85% EXAME MICROSCÓPICO É normalmente claro, transparente ou levemente amarelo. A turvação pode dar-se pela presença de células (leucócitos e eritócitos) ou pela presença de cristais ou fibrina. A alteração de cor mais frequente é a avermelhada, que pode ser causada por uma hemartrose verdadeira ou por um acidente durante a punção. A diferenciação dá-se pelo facto de que, nos casos de acidente de punção, a coloração varia, clareando no fim da colheita, e pela presença de coágulos. A coloração esverdeada pode ser observada em artrites sépticas. A viscosidade está directamente relacionada à quantidade de ácido hialurónico e encontra-se diminuída nos processos inflamatórios. A observação faz-se durante a colheita do material, pela velocidade de queda pela agulha de punção e analisada laboratorialmente pelo teste da mucina. A presença de coágulos é outro dado importante da avaliação macroscópica. Em condições normais, o líquido sinovial não coagula. Portanto, a presença de coágulos é indicativa de processos inflamatórios. Outras Avaliações Os níveis de ácido úrico no líquido sinovial geralmente são similares aos séricos e, portanto, não possuem valor no diagnóstico. O dosemento da desidrogenase láctica encontra-se elevada na artrite reumatóide, na gota e nas artrites infecciosas. É provável que isso se deva à presença de um grande número de leucócitos, o que prejudica sua aplicabilidade clínica. Alguns autores mencionam a possibilidade de identificação do factor reumatóide e de anticorpos antinuclerares no líquido sinovial, sem contudo terem uma definição clínica clara da importância desses achados. Níveis de complemento diminuídos, sem correlação com níveis séricos, têm sido descritos em artrites séptica e reumatóide e no lúpus sistémico. A presença de imunocomplexos acontece em diferentes patologias e parece ter relação com a actividade da doença. Listeria É causada pela Listeria monocytogenes, bacilo Gram-positivo que pode ser encontrado no solo, na vegetação e em reservatórios animais. A infecção humana ocorre geralmente, durante a gravidez, ou em condições de alteração da imunidade, especialmente da imunidade celular. Trabalhos recentes, evidenciam como principal fonte de contaminação a ingestão de alimentos contaminados. De forma distinta de outros patogénios alimentares, a Listeria monocytogenes não causa distúrbios gastrointestinais, mas desencadeia síndromes invasivos como meningites, septicémias e partos de nados-mortos. Os anticorpos são pesquisados por reacções de aglutinação. Títulos positivos devem ser considerados com cuidado, devido à possibilidade de reacção cruzada com outras bactérias. Títulos de até 1/160 podem ser encontrados na população geral. Portanto, são considerados significativos títulos iguais ou superiores a 1/160. Recomenda-se sempre realizar a análise em mais de uma amostra, com intervalo de 10 a 15 dias. Variações superiores a 4 vezes o título anterior são indicativas de infecção recente. A identificação da bactéria por hemocultura e material vaginal após aborto e os exames histopatológicos da placenta podem ser realizados para confirmação do diagnóstico. Litio O mecanismo de acção de sais de lítio na estabilização do humor é desconhecido. Não é conhecido também o seu papel na fisiologia normal. Em níveis terapêuticos, não altera o humor do indivíduo normal. A relação com iões potássio e sódio tem experimentalmente sugerido uma possível influência na polarização de membrana na transmissão neurológica. O carbonato de lítio é administrado por via oral no tratamento de alterações de humor, particularmente na psicose maniacodepressiva. O doseamento de lítio sérico é utilizada na monitorização de pacientes para avaliar a adesão do paciente à terapia, níveis terapêuticos e avaliar estados de intoxicação pelo fármaco. O principal objetcivo é a manutenção do níveis terapêuticos. Os sintomas de intoxicação por lítio incluem anorexia, náuseas, vómitos, diarréia, letargia, ataxia, sonolência, tremores, fraqueza muscular, arritmias cardíacas e coma. Apresenta uma semi-vida de 24 horas em adultos saudáveis. É absorvido rápidamente no trato gastrointestinal, apresentando pico dos níveis séricos cerca de 2 a 4 horas após a absorção. Cerca de metade da dose é excretada pela urina após 6 a 12 horas. Depois disso, a excreção continua lentamente durante 10 a 14 dias. Os diuréticos, em especial os tiazídicos, podem aumentar os níveis séricos, pois a depleção de sódio diminui a clearance renal do lítio. A colheita deve ser sempre realizada imediatamente antes da dose ou entre 6 a 12 horas após a última dose. Magnésio O magnésio é um dos catiões inorgânicos mais abundantes no organismo. É essencial para diversos processos físico-químicos, sendo um co-factor para diversas enzimas intracelulares. A sua concentração é maior no meio intracelular do que no extracelular. A absorção é feita principalmente pelo intestino delgado, sendo a distribuição em 50% nos ossos, menos de 1% no sangue, e o restante em tecidos moles. A homeostase é mantida por excreção renal e regulada pela reabsorção tubular. Convém lembrar que os níveis séricos podem manter-se inalterados até que ocorra cerca de 20% de depleção do magnésio do organismo. O doseamento sérico do magnésio não reflecte directamente a sua concentração intracelular. Têm sido desenvolvidos testes para o doseamento de magnésio intracelular. Actualmente, na investigação da hipomagnesemia, podemos dispor da avaliação sérica e da excreção urinária de 24 horas. O quadro de depleção é mais frequente do que os de intoxicação. Os sinais clínicos da depleção só se manifestam quando os níveis séricos se encontram muito comprometidos, ou seja, em valores abaixo de 1mEq/L. As causas de depleção podem ser: má absorção, desnutrição, diarréia severa, uso de sonda nasogástrica de demora sem reposição líquida adequada, alcoolismo, pancreatite aguda, hiperalimentação parenteral prolongada, diálise crónica, hiper- e hipoparatiroidismo, hiperaldosteronismo, cetoacidose diabética, lactação abundante, gestação (2º e 3º trimestres) e raros casos idiopáticos. Os sinais clínicos de hipomagnesemia são: fraqueza, tremores, irritabilidade, delírio, convulsões, tetania e alterações no electrocardiograma. Geralmente, a depleção é acompanhada por hipocalcémia. Uma das indicações para avaliação do nível sérico de magnésio é a presença de hipocalcémia ou de hipocaliémiaa que não responde à reposição. Níveis séricos do magnésio são considerados prognósticos na insuficiência cardíaca congestiva e no período pós-enfarte do miocárdio, além de diversos relatos de uma boa correlação entre níveis normais de magnésio e o sucesso nas manobras de ressuscitação. A associação de terapia com aminoglicosídeos e ciclosporina com hipomagnesémia indica a sua monitorização aquando da necessidade de terapia com esses fármacos. Como já citado, os quadros de hipermagnesémia são menos frequentes. Os aumentos de níveis séricos de magnésio podem ocorrer nas desidratações severas, na insuficiência renal, na insuficiência adrenocortical, na doença de Addison, em grandes traumas teciduais, no hipotiroidismo, no lúpus eritematoso sistémico e no mieloma múltiplo. O uso abundante de antiácidos e de enemas ricos em magnésio também pode, mais raramente, levar ao aumento sérico. Os sinais clínicos são: diminuição de reflexos, sonolência, arritmias e paragem cardíaca. O aumento do nível sérico de magnésio potencializa os efeitos cardíacos da hipercaliémia. Cerca de 40% do consumo diário de magnésio é absorvido e excretado pela urina. O equilíbrio é mantido pela acção reguladora da reabsorção tubular. A grande vantagem da avaliação dos níveis urinários está na avaliação da redução dos níveis de magnésio e no acompanhamento da reposição terapêutica. O magnésio urinário diminui antes do que o sérico. Níveis diminuídos são encontrados nas dietas pobres em magnésio, síndromes disabsortivas e alterações da função tubular renal. Níveis elevados geralmente estão ligados ao uso de fármacos, especialmente diuréticos. Marcadores Tumorais O marcador tumoral perfeito seria aquele que fosse produzido somente por um tecido e secretado em quantidades mensuráveis em fluidos corporais, só seria positivo na presença de uma neoplasia maligna e deveria ser capaz de identificá-la antes de sua expansão além do seu local de origem. Os seus níveis séricos deveriam reflectir o tamanho do tumor, permitir caracterizar o seu tipo e estadiamento e reflectir respostas ao tratamento e à progressão da doença. Esse marcador tumoral perfeito ainda não existe. Se existisse, poderia ser usado como triagem para a presença da neoplasia oculta em indivíduos assintomáticos, permitindo o diagnóstico e o tratamento precoce. Na prática, a maioria dos marcadores tumorais encontra-se em baixas concentrações em indivíduos normais e em quantidades mais altas durante processos inflamatórios e outras condições malignas e não-malignas. Por isso, o seu papel mais importante não está no diagnóstico da neoplasia, e sim como um co-factor, orientador e confirmatório, do diagnóstico, com um papel definido na avaliação das recidivas, na resposta à terapia e na avaliação do prognóstico de evolução do tumor. Os marcadores tumorais são divididos em 5 categorias: - Enzimas e proteínas - Glicoproteínas - Glicoproteínas mucinas - Hormonas - Moléculas do sistema imune. Enzimas e Proteínas A NSE (enolase neurônio-específica), na sua forma gama, está elevada nos soros dos pacientes com neuroblastoma, carcinoma pulmonar de pequenas células, melanoma, carcinoma de células da ilhota pancreática e hipernefroma. No neuroblastoma, a NSE correlaciona-se com o prognóstico, mas não é útil para o acompanhamento das recidivas. O uso primário de NSE está no carcinoma pulmonar de pequenas células. Cerca de 70% desses pacientes apresentam níveis altos de NSE. A NSE pode ser usada para monitorizar os efeitos da terapia e a avaliação de recaídas antes das evidências clínicas. Elevações da desidrogenase láctica são notáveis em quase todas as malignidades. Os valores encontrados na neoplasia sobrepõem-se com valores em doenças benignas. Não tem nenhum valor como um marcador tumoral de triagem, entretanto, tem utilidade limitada na monitorização da terapia em malignidades hematológicas. São encontrados níveis extremamente altos nos casos de leucemias em crianças e nos casos de linfoma não-Hodgkin nos quais o tratamento fracassou. Os níveis de ferritina podem elevar-se em neoplasias, especialmente na doença de Hodgkin, nas leucemias agudas, nos carcinomas de mama, fígado, pulmão, cólon e recto, em tumores da próstata e testículos e no mieloma múltiplo. São úteis na monitorização da evolução da doença. Os níveis de fosfatase alcalina são úteis em neoplasias para avaliar a presença de metástases envolvendo fígado e osso. Valores muito elevados são observados em pacientes com lesões osteoblásticas, como as encontradas no carcinoma de próstata com metástase óssea. Aumentos menores são observados quando as lesões são osteolíticas, como as encontradas no carcinoma metastático de mama. Outras condições malignas com infiltração hepática como leucemias, linfomas e sarcoma podem cursar também com elevação da fosfatase alcalina. A sua elevação pode ocorrer também pela presença de isoformas patológicas. Os níveis de fosfatase ácida podem estar alterados em pacientes com carcinoma de próstata. Os que se encontram confinados dentro da cápsula normalmente apresentam níveis normais; já nos casos em que há metástases, mais da metade dos pacientes apresenta níveis elevados. Níveis alterados podem ser observados em pacientes com hipertrofia benigna de próstata, retenção urinária e após manipulação prostática. A fracção não-prostática encontra-se elevada em condições em que existe um hipermetabolismo ósseo, como nas metástases ósseas no carcinoma da mama, pulmão, tiróide, mielomas e em situações de grande destruição de eritrócitos e de plaquetas em patologias hematológicas malignas. Glicoproteínas As glicoproteínas são marcadores tumorais derivados de tecido fetal ou placentário, encontrados em pequenas quantidades no tecido do adulto normal. Portanto, esses marcadores não são específicos para nenhum tumor. Exemplos de marcadores tumorais dessa classe são antigénio carcinoembrionário (CEA), alfafetoproteína (AFP), gonadotrofina coriónica humana, (HCG), antigénio polipeptídio tecidual (TPA), antigénio do carcinoma de células escamosas (SCC-A) e antigénio específico da próstata (PSA). O CEA foi primeiro identificado em 1965 em extratos de carcinoma de cólon humano e em células de cólon fetais. Existe em baixos níveis na mucosa do cólon normal, pulmão e tecido da mama, e é encontrado no soro associado com várias malignidades. É usado especialmente na monitorização de tumores gastrointestinais, particularmente no carcinoma colorrectal. Cerca de 63% de pacientes com carcinoma colorretal têm elevações de CEA. Quando presente, o CEA correlaciona-se histologicamente com a fase do tumor. Níveis pré-operatórios muito altos são prognósticos de altas taxas de retorno e baixas taxas de sobrevivência. Se o tumor secreta CEA, este pode ser usado para monitorizar a eficácia da remoção cirúrgica do tumor, bem como para monitorizar a recidiva da doença. A sua avaliação não é recomendada para screening por causa da incidência de elevação de CEA noutras doenças inflamatórias. Consultar Antígeno Carcinoembrionário. A AFP é a principal glicoproteína plasmática precoce do feto humano. Encontra-se elevada no soro fetal, no soro materno e no soro de adultos com hepatomas e teratoblastomas testiculares. Nem todos os hepatomas ou teratoblastomas produzem AFP, mas se sintetizam, fazem-no em grandes quantidades. Nem sempre as elevações de AFP estão associadas a malignidade; os níveis podem estar elevados em doenças inflamatórias do fígado e intestino. É inútil como screening por causa das elevações significativas em condições benignas. Consultar Alfa-1-Fetoproteína. A HCG é secretada através do sinciciotrofoblasto placentário. A cadeia alfa dessa molécula compartilha a sequência homóloga com a hormona luteinizinante (LH), mas a cadeia beta é única. A beta-HCG, é normalmente encontrada no soro e na urina durante a gravidez. Porém, pode também estar presente em 10% dos pacientes com doença inflamatória intestinal benigna, úlcera duodenal e cirrose hepática. Além disso, a beta-HCG é encontrada em quase 100% dos pacientes com tumores trofoblásticos e em 10% a 40% de tumores de células não-germinativas, como carcinoma do pulmão, mama, trato GI e ovário. Em pacientes com tumores trofoblásticos (células germinativas) como seminomas, teratomas e coriocarcinomas, a beta-HCG é muito útil quer para o diagnóstico, como para a monitorização da terapia, prevendo o aparecimento de metástases e predizendo o fracasso do tratamento ou recidivas da doença. Quando avaliado em combinação com AFP, torna-se particularmente útil na detecção dos seminonas. Consultar Gonadotrofina Coriônica. O TPA aparece no soro de pacientes com carcinoma de células escamosas da cabeça e pescoço, pulmão e bexiga, mas também é encontrado em condições benignas, processos cicatriciais, gravidez e doenças inflamatórias. Além disso, o TPA pode ser encontrado em 20% das doenças benignas da mama, sendo por isso não-específico para o diagnóstico ou a monitorização de carcinoma. O SCC-A, subfracção do antigénio tumoral TA-4, está aumentado nos carcinomas de células escamosas do útero, endométrio e noutros carcinomas da área genital. TA-4 e SCC-A também estão presentes em níveis altos em tumores de células escamosas de cabeça e pescoço, pulmão e cérvix. O SCC-A é útil na monitorização da terapia nesses tumores, mas não para o diagnóstico. O PSA é uma glicoproteína com actividade enzimática proteolítica que dissolve gel seminal depois da ejaculação. O PSA é encontrado no tecido prostático normal, benigno e maligno e no plasma seminal, e é produzido no citoplasma das células acinares prostáticas e no epitélio ductal. Os níveis de PSA são elevados no carcinoma da próstata. Também aparecem níveis de PSA altos na hipertrofia benigna da próstata e nas prostatites agudas ou crónicas. Os níveis de PSA correlacionam-se directamente com o volume da próstata, com a fase do carcinoma e com a resposta à terapia. O carcinoma de próstata é a única forma de carcinoma em homens nos quais o PSA é detectável no soro. Por isso, o doseamento de PSA é recomendado, em combinação com o exame rectal digital, para a investigação do carcinoma da próstata. Glicoproteínas Mucinas Glicoproteínas mucinas são antigénios de superfície celular de alto peso molecular. Elas são compostas por 60 a 80% de carbohidratos e têm uma semelhança estrutural com os antigénios de grupo sanguíneo Lewis A e B. As glicoproteínas mucinas expressas na superfície epitelial incluem CA 15-3, MCA, CA 19-9 e CA 125. O CA 15-3 é expresso durante a diferenciação mamária e é encontrado em células mamárias lactentes, epitélio pulmonar, carcinoma de mama, ovário, pâncreas, estômago e fígado. Podem ser encontrados níveis baixos de CA 15-3 em condições não-malignas como hepatites crónicas, cirrose, sarcoidose, tuberculose e lúpus eritematoso sistémico. São detectados níveis elevados de CA 15-3 em carcinomas de mama, ovário, pâncreas, estômago e fígado. A sua utilização está indicada no acompanhamento do carcinoma da mama, especialmente no rastreamento da presença de metástases ósseas. Os seus níveis diminuem em resposta à quimioterapia. Doseamentos consecutivos do CA 15-3 têm previsto recaídas de carcinoma da mama antes da sua demonstração pelo exame clínico. Consultar CA 15-3. O MCA é encontrado na maioria das células de carcinoma da mama, independentemente do grau histológico. Os níveis são mais altos em metástases do carcinoma da mama, do que as alterações encontradas nos níveis do CA 15-3. O CA 19-9 é uma muciglicoproteína idêntica em estrutura com antigénio Lewis A, e a expressão do CA 19-9 depende da expressão do antigénio Lewis. O CA 19-9 é encontrado nas pancreatites agudas e crónicas, na doença hepática benigna, no carcinoma do pâncreas e outras patologias malignas. A sua maior indicação está no acompanhamento do carcinoma do pâncreas. As diminuições dos valores séricos depois de ressecção cirúrgica demonstram que estas foram eficazes, e a avaliação periódica prevê a recorrência 3 a 9 meses antes dos sintomas clínicos aparecerem. Consultar CA 19-9. O CA 125 é uma muciglicoproteína grande com baixo teor de carbohidrato que se expressa no epitélio do cólon embrionário e é encontrada em várias doenças benignas e malignas. A monitorização dos níveis de CA 125 é muito útil durante tratamento do carcinoma do ovário para mulheres de todas as idades. Consultar CA 125. Hormonas A calcitonina é uma hormona produzida pelas células C da tiróide e desempenha um papel na regulação do cálcio. A calcitonina está presente em altas concentrações na gravidez e em várias doenças benignas, como hipertiróidismo, doença de Paget e anemia perniciosa. Além disso, a calcitonina está elevada em neoplasias malignas específicas como carcinoma da mama, hepatoma, hipernefroma e carcinoma do pulmão, mas está notavelmente elevada no carcinoma medular da tiróide. Como um marcador tumoral para o carcinoma medular da tiróide, o nível de calcitonina correlaciona-se com a gravidade da doença e é útil para monitorizar a terapia, além de poder ser usado como triagem nas famílias com transmissão autossómica dominante do carcinoma medular da tiróide. A tireoglobulina é uma glicoproteína produzida pelas células foliculares da tiróide e é necessária para proteólise e libertação da tiroxina (T4) e da triiodotironina (T3) na circulação. Níveis altos de tireoglobulina estão presentes em quase todas as doenças da tiróide, sendo portanto inúteis para screening de doença benigna ou maligna. Porém, a tireoglobulina é um marcador tumoral útil, depois de tiróidectomia total ou radioterapia, quando níveis de tireoglobulina podem antecipar o aparecimento de metástases. O ácido vanil mandélico (VMA) e o ácido homovanílico (HVA) são encontrados na urina nos casos de feocromocitoma e neuroblastoma. Os níveis pré-tratamento correlacionam-se com a fase da doença, e as determinações consecutivas são úteis para a monitorização da terapia. A PTH-RP (paratormona, proteína relacionada) é secretada principalmente por tumores que cursam com hipercalcémias malignas, como carcinoma epidermóide do pulmão, carcinoma da mama e do córtex renal e outros tumores epiteliais. Moléculas do sistema imune As imunoglobulinas monoclonais (proteínas M) foram os primeiros marcadores tumorais conhecidos. Elas são reconhecidas pela electroforese de proteína do soro ou da urina e caracterizadas por imunofixação no soro ou na urina como imunoglobulinas (IgG , IgA, IgM, IgD, IgE, ou cadeias leves livres k (kappa) ou l (lambda). As proteínas M estão presentes em quase 1% dos adultos, mas cerca de 25% dessas proteínas têm significado indeterminado. Cerca de 50% dessas proteínas M identificadas indica o diagnóstico de mieloma múltiplo. Aproximadamente 4% dos pacientes com imunoglobulinas monoclonais têm macroglobulinemia de Waldenström, doença maligna de linfócitos B que secretam grandes quantidades de IgM. Quase 15% dos pacientes com proteínas M têm doença maligna linfoproliferativa de células B, como leucemia linfocítica crónica ou linfoma. A beta 2-microglobulina está situada na superfície da membrana de quase todas as células nucleadas e é libertada na circulação durante o turnover da membrana. A B2-M ajuda a prever os fracassos de tratamento em pacientes com linfoma e mieloma múltiplo, tendo relação com o tamanho do tumor e um valor prognóstico. Oncogenes e produtos de genes como marcadores tumorais A próxima geração de marcadores tumorais descoberta deverá incluir a descoberta de mutações em oncogenes, quantificações de proteínas codificadas através desses oncogenes, ou talvez auto-anticorpos produzidos pelas oncoproteínas na translocação cromossómica, algumas das quais podem ser descobertas através de técnicas de citogenética e também através de estudos usando hibridização com sondas radioactivas, inclusive bcr/abl na leucemia mielogénica crónica, bcl-2 em linfomas foliculares e myc em linfomas e outras leucemias Genes supressores do tumor (TSGs) regulam o crescimento das células, parando a sua proliferação. Mutações em TSGs conhecidas envolvidas com neoplasias incluem inactivação do gene de Rb encontrado no retinoblastoma familiar, gene de APC na polipose familiar do cólon, WT-1 no tumor de Willms e p53 encontrado numa grande variedade de tumores (epiteliais, leucemia, linfoma, sarcoma e neurogénios). Um ensaio imunofluorimétrico para quantificação da proteína p53 tem demonstrado a sua presença no carcinoma do ovário e no carcinoma da mama. Como já citado, não há nenhum marcador tumoral perfeito, e por isso, não devem ser usados para screening da presença de neoplasias malignas. O PSA é actualmente o único marcador aprovado pelo FDA, em combinação com o toque rectal para triagem do carcinoma da próstata. A AFP é apropriadamente usada como um teste de triagem em populações de risco (chineses, japoneses e esquimós do Alasca). A calcitonina pode ser usada como um teste de screening para carcinoma em famílias de pacientes com carcinoma medular da tiróide. Vários testes são eficazes no diagnóstico diferencial de tumores específicos. A AFP e a beta-HCG são úteis no diagnóstico diferencial de tumores de células germinativas não-seminomas, quando utilizadas na clínica de forma apropriada. O CA 125 é usado na avaliação de massas ovarianas, mas com reservas. Embora o CA125 tenha-se mostrado elevado antes da descoberta clínica do carcinoma do ovário, menos de 50% dos pacientes com doença inicial apresentam elevações nos níveis de CA 125. Por outro lado, em mulheres na pré-menopausa, várias condições benignas são associadas a elevações moderadas de CA 125. Uma combinação de ensaios que usam CA 125, CA 15-3 e TAG72 (anticorpo monoclonal específico para fragmento de gonadotrofina urinária) demonstrou uma especificidade de 99,9%, para a detecção do carcinoma do ovário em estadios precoces, mas os números de pacientes foram considerados insuficientes para extrapolar o resultado para a população em geral. Proteínas M detectadas por electroforese de proteína no soro não são úteis para screening para mieloma, porque só 50% dos pacientes que apresentam proteína monoclonal têm mieloma múltiplo. O diagnóstico, o prognóstico e a monitorização da terapia dependem não só da descoberta de uma proteína monoclonal mas também da caracterização do tipo de imunoglobulina. Pacientes com mieloma IgA apresentam taxa de sobrevida significativamente reduzida e complicações mais severas da doença do que os pacientes com mieloma IgG ou doença de cadeias leves. Os marcadores tumorais citados têm aplicabilidade na monitorização da progressão da doença ou da eficácia da terapia. A frequência da monitorização não é padrão, mas uma frequência apropriada deveria testar mensalmente no período pósoperatório, durante os primeiros 6 meses, a cada 2 meses durante mais 6 meses, trimestralmente durante o ano seguinte e 2 vezes ao ano nos anos subsequentes. Metahemoglobina A hemoglobina é continuamente oxidada do estado ferroso para o estado férrico devido ao processo dinâmico de libertação de oxigénio para os tecidos. Diariamente, cerca de 1% da hemoglobina total é convertida espontaneamente de oxihemoglobina em metahemoglobina. Em indíviduos normais, os níveis de metahemoglobina no sangue não ultrapassam 3% da hemoglobina total. Portanto, a condição clínica denominada metahemoglobinemia é aquela em que o paciente apresenta níveis acima dos 3% de hemoglobina oxidada para a forma férrica. Essa forma da hemoglobina é incapaz de transportar o oxigénio. Esta característica dá ao sangue uma tonalidade vermelha escura, devido à presença da hemoglobina desoxigenada, que em níveis acima de 5% levam a cianose clínica. As causas da metahemoglobinemia podem ser deficiência enzimática, tóxica ou por anomalia molecular. A deficiência enzimática hereditária da NAD-diaforese é descrita como metahemoglobinemia congénita. Essa enzima participa numa etapa da via principal da redução da hemoglobina e a sua ausência resulta no acúmulo do pigmento pardo nas hemácias circulantes. Os heterozigóticos normalmente não apresentam sinais clínicos da deficiência. Entretanto, as manifestações podem ocorrer de forma intermitente, induzidas por fármacos ou por exposição a poluição oxidante. O curso da doença é benigno, devendo-se proteger esses pacientes de factores desencadeantes da metaemoglobinémia, na verdade, os mesmos que afectam os indivíduos normais. Na metahemoglobinémia tóxica, o quadro é provocado pelo uso de diferentes fármacos, compostos químicos, derivados de benzeno e outras substâncias tóxicas. A poluição é uma causa importante. Nestes pacientes, é possível observar os produtos da agressão oxidativa no interior dos eritrócitos sob a forma de corpos de Heinz. Ambas as etiologias - metahemoglobinemia tóxica e metahemoglobinemia por deficiência enzimática hereditária, podem ser tratadas por agentes redutores, como a vitamina C, ou por via parenteral, pelo azul de metileno. A metahemoglobinemia por anormalidade molecular resulta da presença de uma hemoglobina anormal a hemoglobina M. Geralmente, o diagnóstico das metahemoglobinemias é clínico. A sua confirmação é realizada pela pesquisa laboratorial da presença de metahemoglobinemia. Microalbuminúria A albumina é excretada na urina em quantidade contínua, e encontra-se aumentada em alguns pacientes com diabetes mellitus. Foi verificado que, nesses pacientes, existe um período lactente entre o início da lesão renal e a doença renal instalada. Durante essa fase, a lesão glomerular expressa-se por meio da excreção aumentada da albumina. No entanto, essas quantidades são muito pequenas para serem detectadas pelos testes laboratoriais padrões e mesmo nas investigações de proteinúria nas 24 horas. Por isso, a imunoturbidimetria/nefelometria, método mais sensível, é preferível para proceder à investigação, visto que os testes tradicionais só são positivos em níveis de 150 a 200 mg/L. A microalbuminúria pode ser definida como uma elevação persistente da albumina urinária, acima de 20 µg por minuto. Aparece antes da manifestação clínica da proteinúria, detectável pelos métodos tradicionais, e tem de ser revelado um marcador preditivo do aumento de falência renal e mortalidade precoce dos pacientes diabéticos, em muitos e diferentes estudos detalhados e rigorosos. Alguns estudos relatam a presença de microalbuminúria 5 anos antes da manifestação clínica clássica do quadro de diabetes mellitus. Outros sugerem a sua utilização na monitorização do aparecimento da lesão renal em pacientes com hipertensão, lúpus eritematoso sistémico e durante a gravidez nas suspeitas de quadros de pré-eclâmpsia. Albuminúria <20ug por minuto <30 mg/24h Microalbuminúria <20 a 200 ug por minuto 30-300 gm/24h Macroalbuminúria >200 ug por minuto >300 mg/24h A excreção de albumina é mais alta em fumadores do que em não-fumadores e diminui 30-50% durante a noite, possivelmente devido à pressão sanguínea e a taxas de filtração glomerular mais baixas à noite. Devem ser doseadas, no mínimo, 3 amostras em datas variadas no período de 1 mês, e pelo menos 2 devem ser positivas para a confirmação do diagnóstico de microalbuminúria. A colheita de múltiplas amostras torna-se necessária, visto que a excreção pode variar de um dia para o outro. A variação biológica entre as amostras, durante um período de 1 mês, segundo a literatura, pode ser de 20 a 40%. São factores de interferência o exercício físico, infecção urinária, doença aguda e qualquer outro factor que leve a resultados falso-positivos de proteína na urina. Alguns autores sugerem que a colheita deve ser realizada à noite (urina nas 12 horas nocturnas) para que ocorra em repouso, evitando a interferência do exercício nos valores da albumina urinária. A presença de microalbuminúria identifica os pacientes com maior risco de desenvolvimento de nefropatia diabética. A incidência de nefropatia diabética é de aproximadamente 30% para pacientes com diabetes mellitus insulino-dependente (DMID) e varia entre 25% a 60% nos pacientes com diabetes mellitus Tipo II nãoinsulino-dependente (DMNID). Nos pacientes com DMID, a microalbuminúria predispõe ao desenvolvimento de proteinúria persistente em 80% e grave lesão renal subsequente. Em contraste, a maioria dos pacientes com excreção de albumina urinária menor do que 30 mg/dia permanece saudável. O risco de progressão para doença renal em pacientes com microalbuminúria é 20 vezes mais alto do que nos pacientes com excreção normal. A hipertensão é o principal factor preditivo para o desenvolvimento de microalbuminúria. Recentes estudos acompanharam pacientes que tinham microalbuminúria, hipertensão, resistência periférica à insulina e hipertrofia renal e cardíaca. O risco de macroalbuminúria (>300 mg/24 h) e de declínio da taxa de filtração glomerular é de 80% em 10 anos, em comparação com os 5% de risco desse tipo de evolução verificados nos pacientes que cursam com albuminúria normal. Já nos pacientes diabéticos com microalbuminúria, normotensos ou em tratamento precoce com antihipertensivos com inibidores da enzima angiotensina convertase, observa-se um atrazo no início da macroalbuminúria e na diminuição da taxa de filtração glomerular. É recomendado que os pacientes diabéticos pesquisem a microalbuminúria pelo menos uma vez por ano. Microbiologia O laboratório de microbiologia tem a finalidade primordial de auxiliar no diagnóstico etiológico das doenças infecciosas. Para que isto ocorra de maneira satisfatória, a qualidade da colheita, do armazenamento e do transporte do material clínico é extremamente importante. Todos os materiais devem ser obtidos antes do início da terapia antimicrobiana. Devem ser colhidos no local onde se espera encontrar o microrganismo, e com a menor contaminação externa possível. Deve-se colher a amostra em quantidade suficiente, seguindo as instruções específicas para cada local. Antes de colher o material, o local deve ser limpo com soro fisiológico, tendo o cuidado de não se utilizarem substâncias anti-sépticas. O material colhido, salvo instruções específicas, deve ser acondicionado em recipiente estéril. Quanto mais precoce for a colheita, maiores são as probabilidades de isolamento do agente etiológico. Os dado clínicos, assim como o local e a hora da colheita, são informações importantes para o tratamento adequado da amostra. Para informações mais detalhadas, consultar nos títulos: - CULTURA DE ANAERÓBICOS - CULTURA DE FEZES - CULTURA DE LÍQUOR - CULTURA DE MICOBACTÉRIAS - CULTURA DE OUTROS LÍQUIDOS BIOLÓGICOS - CULTURA DE PONTA DE CATETER - CULTURA DE SECREÇÕES, ABCESSOS, TECIDO SUBCUTÂNEO, FRAGMENTO DE TECIDOS E BIÓPSIAS - CULTURA DO APARELHO GENITOURINÁRIO - CULTURA DO APARELHO RESPIRATÓRIO SUPERIOR - CULTURA DO APARELHO RESPIRATÓRIO INFERIOR - CULTURA DE URINA - HEMOCULTURA Mioglobina A mioglobina é uma proteína de baixo peso molecular, encontrada nos músculos esqueléticos e cardíacos. É uma proteína que se liga ao oxigénio, actuando como reserva de oxigénio, o que facilita a sua movimentação dentro das células musculares. Uma lesão celular do músculo esquelético ou cardíaco leva à libertação de mioglobina para a circulação sanguínea. Nos pacientes com enfarte agudo do miocárdio (EAM), podemos encontrar níveis de mioglobina elevados já nas primeiras horas após enfarte, com pico entre as 6 e as 9 horas, retomando os níveis normais em 24 a 48 horas após o enfarte. A elevação da mioglobina é extremamente precoce quando comparada com outras enzimas cardíacas, devido ao seu baixo peso molecular, que permite um rápido deslocamento para a circulação. Esta mesma característica é responsável pela sua curta permanência em níveis alterados, já que é rapidamente filtrada e eliminada pelos rins. O doseamento de mioglobina é apontada como um marcador de rastreio no diagnóstico precoce do EAM, devido à sua rápida elevação após a lesão miocárdica. Como já mencionado, valores elevados de mioglobina podem ser encontrados também nas lesões do músculo esquelético, não tendo portanto uma especificidade para lesões cardíacas. Devido à sua característica de rápida eliminação renal, resultados alterados obtidos em pacientes com patologias renais devem ser interpretados com cuidado, pois podem ser causados pela diminuição da eliminação renal. Mononucleose Infecciosa Doença infecciosa aguda causada pelo vírus Epstein-Barr (EBV), apresenta uma maior incidência em crianças, adolescentes e adultos jovens. Durante o curso da doença, aparecem anticorpos heterófilos, capazes de aglutinar eritrócitos de carneiro e de cavalo, que são uma característica dessa infecção. São anticorpos da classe IgM não-específicos para mononucleose, podendo estar presentes noutras patologias. O diagnóstico é feito pelo conjunto dos sinais clínicos associados a positividade para anticorpos heterófilos. Diante de um quadro sugestivo que apresente a pesquisa negativa para esses anticorpos, torna-se necessária a pesquisa de anticorpos específicos para EBV, visto que mais de 70% das crianças e cerca de 10% dos adultos não desenvolvem anticorpos heterófilos. Os achados clínicos mais frequentes são febre, adenomegalia, linfocitose com alto grau de linfócitos atípicoas (mais de 50%, geralmente com presença de células de Downey), esplenomegalia e hepatomegalia. O monoslideteste, também conhecido como reação de Paul e Bunnell, é uma reacção de hemaglutinação que detecta a presença de anticorpos heterófilos utilizando eritrócitos de cavalo, sendo útil como teste de triagem para mononucleose. É sensível, e positiva logo nas primeiras semanas, mantendo-se positivo por cerca de 12 semanas. O monoslideteste não é um exame específico para EBV, não sendo útil na avaliação da doença crónica. A reacção de Paul-Bunnell pesquisa a presença de anticorpos heterófilos contra eritrócitos de carneiro. São considerados sugestivos de mononucleose títulos superiores a 1/56. Esses anticorpos podem pertencer a outro grupo de anticorpos heterófilos, como os encontrados na doença do soro e no soro normal (anticorpos de Forssman). Como os anticorpos heterófilos que surgem na mononucleose possuem a característica de serem absorvidos pelo eritrócito de boi e de não serem absorvidos pelo rim de cobaia, a reacção de Paul-Bunnell-Davidsohn explora essa característica, permitindo a exclusão de outros anticorpos heterófilos, servindo dessa forma como teste confirmatório. Uma pequena percentagem de falsopositivos foi descrito em linfomas, na leucemia linfocítica aguda, na hepatite infecciosa, no carcinoma do pâncreas, na infecção por citomegalovírus, na artrite reumatóide e na rubéola. A pesquisa de anticorpos para o vírus EBV torna-se necessária para a confirmação do diagnóstico da mononucleose naqueles casos nos quais os pacientes apresentam alterações clínicas sugestivas porém sem os achados hematológicos clássicos e os títulos negativos para anticorpos heterófilos. São anticorpos específicos que aparecem no final do período de incubação, atingindo títulos mais baixos durante a fase de recuperação, que irão persistir por toda a vida como indicadores de imunidade para essa doença. Os anticorpos específicos para EBV devem ser pesquisados também para o diagnóstico diferencial das patologias que podem mimetizar um quadro de mononucleose, como pode acontecer em quadros de hepatites víricas agudas, colagenoses, síndrome de soroconversão do HIV-1, infecção por citomegalovírus e toxoplasmose. Consultar Eptein-Barr, Vírus. Mycobacterium tuberculosis A infecção por Mycobacterium tuberculosis, o bacilo causador da tuberculose identificado em 1882, é a causa de infecção e da doença que se desenvolvem em pelo menos dois estadios: Fase Activa - em que o paciente é altamente infeccioso; Fase Lactente - fase não-contagiosa. Para realizar o diagnóstico laboratorial, é necessário isolar o microrganismo pertencente ao complexo Mycobacterium tuberculosis. O diagnóstico definitivo de tuberculose no aparelho respiratório é realizado pela concentração, digestão e descontaminação de amostras do trato respiratório (expectoração normal ou induzida, lavado broncoalveolar ou lavado gástrico). Métodos de rotina, por meio da utilização de culturas, requerem pelo menos 3 semanas e usualmente 4 a 6 semanas para o resultado final. A avaliação microscópica, ou bacterioscópica, é o método mais rápido para a detecção de micobactérias, permitindo o resultado em poucas horas. Entretanto, é pouco sensível e inespecífico, não permitindo a identificação entre as diferentes espécies. Estima-se que sejam necessários 5.000 a 10.000 microrganismos por mililitro de expectoração para a positividade em bacterioscopia, e que apenas 50% dos casos diagnosticados clinicamente apresentem cultura positiva. Técnicas imunológicas e sorológicas são limitadas devido à baixa sensibilidade e especificidade. Outras avaliações também são úteis, tais como a análise do ácido micótico por cromatografia líquida de alta performance, como complementar à cultura e a testes bioquímicos. Sondas de ácidos nucléicos espécie-específicas representam um auxílio para confirmações rápidas de resultados de culturas para as diferentes espécies de micobactérias. O desenvolvimento de métodos de biologia molecular, específicos e sensíveis, permite alternativas para o diagnóstico mais rápido e seguro da tuberculose por meio da detecção do genoma bacteriano directamente nas amostras biológicas. As reacções de amplificação isotérmica de rRNA e a reacção em cadeia da polimerase (PCR) - Amplicor PCR têm sido amplamente utilizadas para a detecção de ácidos nucléicos de M. tuberculosis em amostras biológicas do aparelho respiratório. O princípio do teste de PCR está na execução de quatro processos principais: preparação da amostra, amplificação do DNA-alvo, hibridização do produto amplificado à sonda específica e detecção do produto final. As amostras de expectoraação normal ou induzida, lavado broncoalveolar e lavado brônquico são recomendadas para a avaliação por PCR. Outros materiais podem ser utilizados, podendo ocorrer perda na sensibilidade do método. Resultados falsonegativos podem ocorrer por interferência de constituintes existentes nas amostras biológicas que alterem a actividade da enzima DNA polimerase. Resultados fidedignos dependem da colheita e de procedimentos de transporte adequados. A sensibilidade analítica do teste de PCR para DNA purificado é de cinco ou mais cópias de DNA de Mycobacterium tuberculosis purificado. A sensibilidade para células de M.tuberculosis é igual a 40 células. Estudos comparativos demonstram a sensibilidade da PCR de 90%, significativamente superior à bacterioscopia, que é de 67%. Esses dados demonstram que não deve ser excluída a possibilidade de diagnóstico de tuberculose em resultados negativos individuais, bacterioscopia ou PCR. A possibilidade de detecção de DNA em materiais negativos em cultura pertencentes a pacientes anteriormente positivos e com história de terapia reforça a idéia de detecção de microrganismos não-viáveis. Os métodos em biologia molecular para M.tuberculosis mostram grande sensibilidade e utilidade para o diagnóstico laboratorial de tuberculose pulmonar. A alta especificidade do método é de grande valia para diferenciar M.tuberculosis das outras micobactérias, que não a tuberculosis, uma vez que as terapias para essas infecções são diferentes. A PCR tem, na prática clínica, um impacto significativo para a conducta com os pacientes supostamente infectados com M. tuberculosis. A PCR permite o diagnóstico rápido, em 24 a 72 horas, e a administração da terapia correta, propiciando a melhoria do paciente e reduzindo o uso de fármacos, assim como as necessidades de isolamento e de investigações adicionais. NTX - N - Telopeptídeo Tipo 1 O osso encontra-se em constante processo metabólico de remodelação. Isso inclui a degradação e reabsorção ósseas, que são mediadas pelos osteoclastos, e os processos de estruturação e formação óssea, mediados pela acção dos osteoblastos. A avaliação dos produtos específicos da degradação da matriz óssea fornece dados sobre o turnover ósseo, ou seja, o índice de metabolismo ósseo. Cerca de 90% da matriz orgânica do tecido ósseo são formados por colagénio do tipo I, uma proteína helicoidal com ligação cruzada nos terminais N e C da molécula e que forma a estrutura básica e a resistência do tecido ósseo. Os N-telopeptídeos de ligação cruzada com colágeno tipo I (NTx) são um indicador sensível da reabsorção óssea. São o produto final da actividade osteoclástica, encontrados na urina. Níveis elevados de NTx indicam elevada reabsorção óssea. O seu doseamento é importante na osteoporose, em mulheres na pós-menopausa, na doença de Paget e para a monitorização de terapêutica anti-reabsortiva. Convém lembrar que, mesmo sendo um bom marcador do metabolismo ósseo, valores normais não afastam a existência de osteoporose nem a necessidade de tratamento. Paratiróide A maioria dos indivíduos possui dois pares de glândulas paratiróides, localizadas posteriormente aos polos superior e inferior da glândula tiróide. Elas são responsáveis pela secreção da hormona paratiroidéia (PTH), que posteriormente, é degradado nos tecidos periféricos, especialmente fígado e rins, produzindo os fragmentos aminoterminal e carboxiterminal. O fragmento aminoterminal tem uma semi-vida mais curta do que o carboxiterminal. Contudo, apenas a molécula intacta e o fragmento aminoterminal possuem actividade biológica. A síntese e a libertação do PTH dependem dos níveis de cálcio ionizado: a hipercalcémia bloqueia e a hipocalcémia aumenta a secrecção de PTH. A hipocalcémia prolongada da insuficiência renal crónica acarreta um hiperparatiroidismo secundário. A PTH promove a conversão de 25-hidroxivitamina D (25-OHD) em 1,25dihidroxivitamina D (1,25-dihidroxicolecalciferol). Nos rins, o metabolito dihidroxivitamina D estimula directamente a captação intestinal de cálcio. A PTH também promove a libertação de cálcio do osso, além de aumentar a reabsorção e diminuir a excreção renal de cálcio. Promove ainda a excreção de AMP cíclico, hidroxiprolina, sódio, potássio e bicarbonato, além de inibir a reabsorção de fosfato, aumentando a fosfatúria. O aumento dos níveis séricos de PTH causa manifestações clínicas de hipercalcémia. Casos leves necessitam de monitorização laboratorial periódica, tanto sérica como urinária. Casos graves são classificados como emergência endocrinológica, com risco de vida, necessitando de intervenção médica imediata. A secreção inadequada de PTH causa hipocalcémia, cujo diagnóstico e tratamento precoce também são vitais. Hiperparatiroidismo O hiperparatiroidismo (HPT) pode ser classificado como primário, secundário ou terciário. O HPT primário caracteriza-se por aumento de PTH, hipercalcémia, hipofosfatémia e hipercalciúria, e pode ser causado por hiperplasias, adenoma ou carcinoma das paratiróides. O HPT secundário decorre geralmente de insuficiência renal crónica ou deficiência de vitamina D (por deficiência na ingestão ou resistência à sua acção), que, devido à hipocalcémia prolongada, gera um aumento compensatório de PTH. Laboratorialmente, os achados mais clássicos são hipocalcémia, hiperfosfatémia e aumento de PTH. O HPT terciário surge no decurso de um período prolongado de HPT secundário com o desenvolvimento de autonomia na secreção de PTH e consequente hipercalcémia. No pseudo-hipoparatiroidismo, os baixos níveis de cálcio sérico disparam a secreção de PTH. Contudo, nem os rins nem os ossos respondem ao estímulo, devido a defeito nos receptores hormonais, resultando em hipocalcémia persistente, apesar do aumento de PTH. A PTHrP (PTH-proteína relacionada) é uma molécula semelhante à fracção aminoterminal da PTH. É secretada por tecidos neoplásicos, como o carcinoma de células escamosas do pulmão, gerando um pseudo-hiperparatiroidismo, com hipercalcémia grave e níveis baixos ou indetectáveis de PTH. Níveis de PTH elevados também ocorrem em 80 a 90% dos pacientes com o síndrome de neoplasia endócrina múltipla familiar tipo I (MENS tipo I), em indivíduos que apresentam adenoma ou hiperplasia das paratiróides associados a tumores hipofisários e pancreáticos. As manifestações clínicas de hipercalcémia são variadas e afectam principalmente o sistema nervoso central, os rins, o coração e o aparelho gastrointestinal. São comuns manifestações como depressão, alucinações, coma, diminuição da filtração glomerular, poliúria, nictúria, polidipsia, nefrolitíase, fadiga, anorexia, náuseas, dor abdominal, constipação e úlcera péptica. O aumento de enzimas pancreáticas pode levar à pancreatite. Podem ocorrer também dores ósseas, fracturas, osteíte fibrosa cística e precipitação de cálcio em tecidos moles como pulmões, rins, vasos sanguíneos, articulações e córnea. Hipoparatiroidismo Após cirurgias de adenoma ou hiperplasia de paratiróide, em pacientes com doença óssea avançada, podem ocorrer hipocalcémia severa e tetania. É o chamado fenómeno do osso faminto, decorrente da rápida mineralização óssea e consequente depleção do cálcio ionizado circulante. Essa condição é geralmente transitória. Inúmeros fármacos usados em quimioterapia podem alterar a função das paratiróides, acarretando hipocalcémia, hipomagnesémia e diminuição da PTH. O hipoparatiroidismo primário definitivo pode seguir-se à remoção cirúrgica das paratiróides ou à auto-imunidade. O síndrome de Di George é uma patologia congénita rara, que cursa com deficiência de PTH, devido à aplasia das paratiróides e do timo. Geralmente, a deficiência neonatal de PTH provoca a morte por hipocalcémia grave e infecções persistentes. O hipoparatiroidismo funcional com hipocalcémia é observado com frequência em crianças, especialmente pré-termo e de baixo peso ao nascimento. Isso é atribuído a uma imaturidade temporária ou à não-reactividade das glândulas paratiróides aos baixos níveis de cálcio por várias horas após o nascimento. A secreção fetal de PTH pode ser inibida in útero em resposta à hipercalcémia materna. O termo pseudo-hipoparatiroidismo é utilizado para casos de resistência à acção da PTH nos tecidos alvos, cursando com hipocalcémia, hiperfosfatémia e hiperplasia de paratiróides. Clinicamente, caracteriza-se por baixa estatura, obesidade, face redonda e 4º e 5º metacarpianos curtos. Este síndrome é conhecido como osteodistrofia hereditária de Albright. O hipoparatiroidismo idiopático abrange inúmeras anomalias. O início da doença pode ocorrer na infância precoce ou mais tardiamente. Embora tenha sido relatada a presença de anticorpos circulantes, a etiologia ainda não está claramente definida. Ocorrem ainda defeitos de libertação e de atividade da PTH, devido a vários outros factores, como a diminuição de magnésio sérico, que impede a libertação da PTH e diminui o seu efeito hipercalcémico. Pacientes desnutridos como os alcoólicos têm tendência a hipomagnesémia. As manifestações clínicas dependerão da intensidade e da duração da hipocalcémia. A hipocalcémia crónica pode ser assintomática, desenvolver sintomas precocemente ou apresentar doenças dermatológicas, como monilíase e psoríase. Os sintomas encontrados mais frequentemente são irritabilidade neuromuscular, tetania, fraqueza muscular, laringoespasmo, broncoespasmo, manifestações psiquiátricas (ansiedade, irritabilidade e demência), arritmias, hipotensão, insuficiência cardíaca congestiva, catarata, fadiga, dores ou espasmos musculares. São comuns calcificações ectópicas. Paratormona (PTH) - Molécula Intacta É útil no diagnóstico diferencial das hipercalcémias: hiperparatiroidismo primário, hiperparatiroidismo secundário (na insuficiência renal crónica) e hipercalcémias das doenças malignas. O doseamento de PTH deve ser incluído na rotina de investigação de litíase renal, devido à possibilidade de diagnosticar hiperparatiroidismo. No hipoparatiroidismo, os níveis de cálcio encontram-se baixos, com PTH em níveis baixos ou indetectáveis. O hipoparatiroidismo transitório ou permanente pode ocorrer no pós-operatório de cirurgias da tiróide. Hiperparatiroidismo primário Hiperparatiroidismo secundário Hipercalcémias malignas CÁLCIO SÉRICO FÓSFORO SÉRICO PTH PTH-RP (Paratormona - Proteína Relacionada) É secretada principalmente por tumores malignos. A PTH-rp tem uma estrutura semelhante à PTH e é útil no diagnóstico diferencial do hiperparatiroidismo primário e das hipercalcémias malignas. Não se eleva na insuficiência renal crónica. Hiperparatiroidismo primário CÁLCIO SÉRICO FÓSFORO SÉRICO PTH PTH - RP Hipercalcémias malignas --- Osteocalcina A osteocalcina é uma proteína sintetizada pelos osteoblastos. É encontrada na matriz óssea, nos dentes e no sangue. Como a sua função se relaciona à ligação do cálcio à matriz óssea, é utilizada como um marcador bioquímico da formação óssea. A sua concentração sérica reflecte a actividade dos osteoblastos maduros e representa uma pequena percentagem da parcela sintetizada pelos osteoblastos, uma vez que a maior parte dessa fracção está ligada à hidroxiapatita na matriz óssea. Os níveis séricos variam de acordo com o sexo, a idade e o horário de colheita da amostra. Concentrações elevadas são encontradas na infância e na puberdade, com pico durante a puberdade e o declínio da fase adulta. Nas mulheres após a menopausa, os níveis séricos tendem aumentar. O doseamento da osteocalcina está indicada na investigação das doenças ósseas, como osteoporose pós-menopausa, hiperparatiroidismo e doença de Paget, que cursam com níveis elevados. Também se encontra aumentada em pacientes com fracturas que necessitem de redução aberta, com inserção de pinos e nos casos de metástases ósseas não-tratadas. Níveis diminuídos são encontrados em pacientes com uso crónico de glicocorticóides, na osteoporose senil e no hiperparatiroidismo. A reconhecida variação dos níveis de osteocalcina, relacionada à instabilidade após a colheita, determina cuidados especiais na colheita e no armazenamento das amostras. AMPc A maior parte do AMPc encontrado na urina provém da acção da paratormona (PTH) nos túbulos renais. O doseamento é importante para o diagnóstico do hiperparatiroidismo primário. Atenção especial deve ser dada à possibilidade de resultados falso-positivos em pacientes com hipercalcémia tumoral, pelo estímulo realizado pelo peptídeo PTH-rp. Portanto, no diagnóstico diferencial de hipercalcémia, o seu doseamento tem muito pouco interesse. Pesquisa de Oxiúros A fêmea do Enterobius vermicularis põe os seus ovos na região perianal durante a noite, e não no lúmen intestinal. Por isso, o exame de fezes de rotina é quase sempre ineficaz (negativo). Assim, deve ser utilizado o método de pesquisa na fita adesiva (método de Graham, swab anal para a pesquisa de oxiúros). O material deverá ser colhido algum tempo após o paciente se ter deitado, ou pela manhã, ao acordar, antes de qualquer higiene. Abrir a prega anal do paciente e aplicar a parte adesiva da fita transparente na região. Em seguida, distendê-la com a face adesiva sobre uma lámina de vidro (fornecida pelo laboratório), de maneira que fique bem distendida, lisa e sem bolhas de ar. Pâncreas Insulina A insulina é uma hormona peptídica produzida pelas células beta das ilhotas de Langerhans do pâncreas. A sua secreção é estimulada pela hiperglicemia. Estímulos nervosos e hormonais também controlam a sua secreção. A sua principal função é o aumento da permeabilidade das células à glicose, resultando na diminuição dos níveis plasmáticos. A intensidade de resposta à insulina depende do número de receptores e da afinidade destes pela insulina. Algumas condições podem cursar com hiperinsulinismo sem hipoglicemia, como acontece na obesidade e noutros síndromes de resistência insulínica. Um doseamento de insulina inapropriadamente elevado (maior que 10 mU/mL) com hipoglicemia (glicemia menor que 40 mg/dL) sugere o diagnóstico de insulinoma. É bastante útil a determinação da relação insulina/glicemia, que normalmente é menor do que 0,3. Uma relação maior que 0,3 sugere a presença de insulinoma. É importante lembrar que, na presença de anticorpos anti-insulina, o doseamento de insulina fica prejudicado. As hipoglicemias podem ser classificadas em três grupos: Tipo I Pacientes diabéticos em tratamento com uso de insulina ou de fármacos relacionados. ................................................................................... Tipo II Insulioma Jehum Fictícia (auto-administração de insulina) Tumores endócrinos que levam à deficiência de hormonas contra-reguladores. Doença hepática, Indução por fármacos. ................................................................................... Tipo III Idiopatica Reactiva Hipersecreção de insulina pós alimentação Hiprsensibilidade dos tecidos periféricos à acção de insulina Deficiência de mecanismos contra-reguladores Alimentar Em consequência da gastrectomia A hipoglicemia de jejum é definida como a presença de níveis baixos de glicose, ocorrendo em jejum, geralmente 6 horas ou mais após a alimentação. A hipoglicemia reactiva acontece em resposta à alimentação, num estado pósabsortivo. Geralmente, ocorre 2 a 4 horas após a alimentação. O teste de tolerância à glicose realizado até o tempo de 5 horas é uma possibilidade, embora não definitiva, de diagnóstico nestes casos. Peptídio C Após a clivagem da pró-insulina, são libertadas a insulina e uma sequência de aminoácidos denominada peptídio C. O peptídio C é secretado em concentrações equimolares à insulina. Não tem acção fisiológica conhecida, e o seu interesse clínico está na avaliação da capacidade secretora das células beta pancreáticas, especialmente quando o doseamento de insulina está prejudicado pela presença de anticorpos endógenos. É particularmente útil no diagnóstico da hipoglicemia fictícia, na qual o peptídio C é indetectável e os níveis de insulina se mostram elevados. Parasitoses Intestinais As chamadas doenças parasitárias ainda são responsáveis por um alto índice de morbilidade em grande parte do mundo. Apesar do grande avanço tecnológico, do alto padrão educacional, da boa nutrição e de boas condições sanitárias, mesmo países desenvolvidos estão sujeitos a doenças parasitárias. Nos últimos anos, a investigação e o tratamento dessas doenças têm tido um interesse renovado. A globalização permite uma rápida deslocação de pessoas pelo mundo, como viajantes e migrantes de áreas endémicas. Além disso, o facto de terem sido achados patógenios emergentes e reemergentes em pacientes imunocomprometidos por diferentes motivos, especialmente em pacientes com SIDA, fez com que parasitas anteriormente sem importância clínica em humanos, como os coccídeos intestinais Isospora belli, Cryptosporidium parvum e Sarcocystis hominis, fossem observados. Para um diagnóstico parasitológico preciso, é importante ter em consideração factores que condicionam as parasitoses, como o mecanismo de transmissão, a biologia, o clima e as condições sanitárias, além da patogenia. O exame clínico é o primeiro passo para o diagnóstico, mas o laboratório é essencial nessa definição, estabelecendo a espécie de parasita presente no paciente. Amebas Flagelos Coccídeos Neomatódeos Trematódeos Cestódeos AUMENTO DA FORMAÇÃO PROTOZOÁRIOS Entamoeba histolytica, Entemoeba coli, Endolimax nana, Dientamoeba fragilis e lendomoeba butschii Giardia lamblia, Chilomaxtix mesnilli Cryptosporidium parvum, Isopora belli HELMINTAS Ascaris lumbricoides, ancilostomídeos, Enterorobius vermucularis, Strongyloides, stercolaris, Trichuris trichiura Schistosoma mansoni Taenia sp., Hymenolepis diminuta, Hymenolepis nana É no aparelho digestivo que a grande maioria dos parasitas do homem encontra o seu hábitat adequado. Cada parasitose no entanto tem a sua peculiaridade, dependendo da biologia do helminta ou protozoário a ser pesquisado. Por esta razão, não existe um método único, capaz de identificar com precisão todas as formas de parasitas. Assim, na falta desse método onivalente, dentro dos descritos na literatura, temos de lançar mão de diferentes métodos diagnósticos isolados electivos para um determinado parasita, ou combinados, para poder realizar um diagnóstico mais preciso de acordo com o parasita investigado. Os melhores resultados são obtidos com a utilização combinada dos métodos de Hoffmann e colaboradores e Kato-Katz. O método de Hoffmann e cols., apesar de simples sedimentação, apresenta excelentes resultados na detecção de ovos, cistos e larvas. Na pesquisa específica do helminta Schistosoma mansoni, o método mais eficaz é o Kato-Katz, que permite uma avaliação da carga parasitária, graças à contagem do número de ovos por grama de fezes. Ainda mencionando a esquistossomose, há autores que dizem que devem ser realizados pelo menos seis exames de fezes com resultados negativos para que seja requisitada uma biópsia rectal. Neste caso, o material é colhido pelo médico e remetido ao laboratório para análise. Outro método recomendado, especialmente nos casos de pacientes com eosinofilia muito alta, é o Baermann-Moraes, específico para a pesquisa de formas larvares de nematódeos, principalmente o Strongyloides stercoralis, que é eliminado nas fezes na sua forma larvar. Para a pesquisa de helmintas como a Taenia sp., que elimina proglotes, recomenda-se a tamização (simples peneiração das fezes) ou a identificação de vermes, em que será feita a identificação dos proglotes de Taenia sp. e de vermes adultos de outros helmintas. Em crianças, a literatura relata um alto índice de contaminação com Enterobius vermicularis, cuja fêmea realiza a oviposição durante a noite, na região perianal. Nesses casos, o exame parasitológico costuma apresentar-se negativo, e a técnica indicada é a fita gomada transparente, aderida a uma lámina, chamada de método de Graham. A investigação da presença de helmintas nas fezes é realizada pela pesquisa de ovos ou larvas. Já as infecções por protozoários são diagnosticadas quando se encontram trofozoítos, cistos ou oocistos nas fezes. O exame parasitológico mais simples é o que permite a detecção de ovos e larvas de helmintas e cistos de protozoários nas fezes frescas. A eliminação intermitente de formas de resistência, a intensidade dos parasitas e o exame que utiliza apenas uma pequena amostra do material oferecido são alguns dos factores que interferem na positividade do exame. Isto deve-se ao facto de as técnicas existentes possuírem em geral óptima especificidade, embora a sensibilidade só se mostre adequada se forem solicitados exames em pelo menos três amostras de fezes de dias distintos. AUMENTO DA FORMAÇÃO Parasitas Intestinais Ascaris lunbricoides Trichuris trichiura Ancilostomídeos Schistosoma Hoffmann Identificação Safranina Kato- Biópsia BaermannTamização de vermes Graham MIF Metatoxilina azul de Katz retal Moraes adultos metileno X X Ñ Ñ X Ñ X Ñ Ñ X X Ñ Ñ X Ñ X Ñ Ñ Ñ Ñ X Ñ X Ñ Ñ Ñ X Ñ Ñ Ñ X X X Ñ mansoni Enterobios vermucularis Strongyloides stercopalis Taenia sp. Girardia lablia Entemoeba histolytica Entemoeba coli Endolimax nana Iodamoemba butschii Chilomastix mesnilli Cryptosporidium parvum Isospora beli Ñ Ñ Ñ X Ñ Ñ X X Ñ Ñ Ñ X X Ñ Ñ X X Ñ Ñ Ñ X Ñ Ñ Ñ Ñ Ñ Ñ X X Ñ X Ñ Ñ Ñ Ñ Ñ Ñ X X Ñ X Ñ Ñ Ñ Ñ Ñ Ñ X X Ñ X Ñ Ñ Ñ Ñ Ñ Ñ X X Ñ X Ñ Ñ Ñ Ñ Ñ Ñ X X Ñ X Ñ Ñ Ñ Ñ Ñ Ñ X X Ñ Ñ Ñ Ñ Ñ Ñ Ñ Ñ Ñ X Ñ Ñ Ñ Ñ Ñ X=Eletivo / =Possível / Ñ=não-indicado Ñ X A técnica do MIF (Methiolate/Iodo/Formol) é uma metodologia que possibilita o achado de estruturas de resistência de helmintas e protozoários. As amostras de fezes devem ser colhidas em 3 dias distintos, num recipiente contendo o conservante MIF. Esse conservante contém formol, razão pela qual as fezes não necessitam de conservação em frigorífico. É também muito útil em crianças, por apresentar um alto índice de positividade para Giardia lamblia, protozoário que tem um ciclo biológico com período sem eliminação de quistos que pode chegar a 15 dias. Nos quadros clínicos compatíveis com amebíase, nos quais o exame parasitológico se apresentou negativo, a literatura recomenda que seja solicitada uma pesquisa de trofozoítos (formas vegetativas), por intermédio de coloração das fezes diarréicas pela hematoxilina férrica. Nesses casos, o material (fezes diarréicas) deve ser colhido em líquido conservante, para que as formas vegetativas sejam preservadas, visto que os trofozoítos se deterioram quase que imediatamente após a emissão. O achado de formas de resistência de protozoários considerados comensais não constitui uma necessidade de tratamento, mas revela que os pacientes estiveram susceptíveis à contaminação orofecal. Parasitas oportunistas, como os coccídeos intestinais (Cryptosporidium parvum e Isospora belli), podem ser reconhecidos por meio de técnicas de coloração como a safranina-azul de metileno. Nesses casos, as fezes devem ser colhidas com o conservante formol a 10%, para que suas formas sejam preservadas. Paternidade A investigação de paternidade por meio da análise de DNA (material genético presente no núcleo de todas as células), desenvolvido no início da década de 1980, tem sido, desde então, largamente utilizada como elemento fundamental em disputas jurídicas (herança e noutros processos frequentemente encontrados em tribunais de família). O teste de investigação de paternidade baseia-se no facto de que todos nós recebemos metade do material genético (alelos) de cada um dos progenitores biológicos. São estas informações que determinam as nossas características biológicas. O conhecimento desse material genético no genoma humano revelou uma série de sequências de DNA que, devido à sua abundância e variabilidade, se transformaram em marcadores genéticos individuais (impressão digital molecular). Os marcadores genéticos utilizados na investigação de paternidade foram definidos a partir de estudos moleculares e populacionais, nos quais os índices de variabilidade e de frequência foram avaliados nas raças humanas. Bancos de dados e a análise de frequência desses marcadores foram cuidadosamente construídos e são, até hoje, a base da estatística empregue na análise de DNA fingerprinting em casos de disputa de paternidade, em que alcançam níveis de confiança superiores a 99,99%. Actualmente, dois métodos são utilizados para a investigação de paternidade: PCR/STR e westhern blot. Este segundo método é mais antigo, porém ainda é utilizado na complementariedade de exames realizados por PCR. O PCR/STR, o mais utilizado no momento, tem como base a amplificação de repetições de DNA no genoma humano denominadas STR (short tandem repeats). As STRs são repetições de três a sete bases de DNA que se constituem em marcadores muito polimórficos, amplamente distribuídos em todo o genoma. Os STRs são diferenciados pelo número de cópias dessas sequências repetitivas contidas num fragmento de DNA amplificado por PCR. Cada indivíduo tem um alelo herdado da mãe e outro do pai. Assim, serão identificados dois tipos de repetições para cada STR analisado. Devido à grande eficácia deste método na detecção e distinção das diferenças no genoma humano, o poder de exclusão de paternidade é extremamente alto (>99,999 %), o que leva, nos casos de não-exclusão, a probabilidades extremamente elevadas de determinar a paternidade biológica. A estimativa quantitativa destes dados é obtida com a análise de no mínimo 12 STRs. O índice de paternidade (ip), que são probabilidades estatísticas de um suposto pai ser o pai biológico da criança em questão, comparado com um indivíduo aleatório, é calculado a partir do resultado obtido em cada um dos 12 STR analisados. O método de investigação de paternidade pela técnica de STR/PCR tem como uma das principais vantagens a utilização de uma quantidade muito menor de DNA, o que possibilita a utilização de DNA extraído de raspagem bucal, por exemplo, sem a necessidade de colher sangue venoso. Perfil Lipídico Segundo as recomendações dos últimos Concensos Internaconais, o termo tradicional - lipidograma – deveria ser abandonado, passando a adoptar-se a denominação de perfil lipídico, que é composto pelos doseamentos de colesterol total (CT), triglicerídeos (TG), HDL - colesterol (HDL-C) e LDL - colesterol (LDL-C). O doseamento de lípidos totais deveria também ser abolida, por se dispor dos vários doseamentos específicos de cada componente isoladamente. A realização de rotina da electroforese de lipoproteínas para a investigação do risco de doença arterial coronariana é apontada como desnecessária. A sua indicação fica restrita à investigação de alguns casos específicos, como as hipolipidemias, e ao diagnóstico diferencial de hiperlipidémias dos tipos II b e III de Fredrickson. Os Consensos recomendam que os adultos com idades acima de 20 anos realizem o perfil lipídico. Nos casos de resultados dentro das faixas desejáveis e sem outros factores de risco, a avaliação deve ser repetida a cada 5 anos, desde que os hábitos de vida e as condições clínicas não se alterem. Nos casos com valores alterados a avaliação deverá ser repetida de acordo com os graus de risco e o médico prescritor. Em crianças e em adolescentes, a avaliação deve ser realizada entre os 2 e os 19 anos de idade, não como rastreio, mas sim, a critério do médico, quando existirem na família situações como doenças arteriais coronárias, cerebrovasculares ou periféricas precoces ou parentes próximos com níveis de colesterol total igual ou superior a 300 mg/dL ou de triglicerídeos igual ou superior a 400 mg/ dL. No adulto, deve ser investigado na presença de pancreatite aguda, xantomatose, obesidade ou outros factores de risco de doença coronária. Os factores de risco coronários incluem: sexo masculino; história familiar prematura de doença cardiovascular; fumo; hipertensão; níveis baixos de HDL-colesterol; diabetes mellitus; doença cerebrovascular ou vascular periférica oclusiva; obesidade e sedentarismo. A doença arterial coronariana relaciona-se em proporção directa e duplicada com níveis de colesterol séricos. Diferentes estudos corroboram a hipótese de que cada 1% de redução dos níveis de colesterol está associado à queda de 2% de risco de doença arterial crónica. Outros estudos baseados em angiografias demonstram que a diminuição de 26% dos níveis de colesterol LDL relacionou-se com uma menor progressão da doença arterial crónica em 49% dos casos, estabilização das lesões em 33% dos casos, regressão em 18% dos casos e com diminuição de 47% de doenças coronárias. Estudos clínicos e epidemiológicos têm demonstrado que o aumento das concentrações dos níveis de triglicerídeos pode ser considerado um factor de risco independente para aterosclerose. A dificuldade dessa avaliação deve-se às diversas partículas ricas em triglicerídeos. Os doseamentos de lipídios são passíveis de variações tecnicamente conhecidas. Essas variações podem ser consideradas analíticas, quando estão relacionadas à metodologia e aos procedimentos laboratoriais, e pré-analíticas, quando relacionadas a factores intrínsecos, estilo de vida, uso de medicações, doenças associadas, procedimentos de colheita e manipulação da amostra. Os factores préanalíticos são reconhecidos como os principais responsáveis pela variabilidade dos resultados. Para minimizar os efeitos dos factores pré-analíticos sobre os resultados dos doseamentos de lípidos, vários cuidados devem ser tomados. O paciente deve realizar os doseamentos no seu estado metabólico normal e estável. Para isso, pelo menos nas 2 semanas que antecedem a colheita, a alimentação, o peso e os exercícios não devem fugir do habitual. Caso contrário, os resultados obtidos poderão não representar os níveis habituais do paciente. A ingestão de álcool deve ser evitada pelo menos nas últimas 72 horas, pois interfere directamente nos valores dos lípidos, especialmente dos triglicerídeos. O exame não deve ser realizado antes de 8 semanas posteriores à recuperação de traumas, cirurgias, infecções bacterianas e víricas agudas ou doenças crónicas debilitantes. Nos casos de EAM e AVC, a amostra deve ser obtida logo nas primeiras 24 horas ou somente depois de decorridas 8 semanas da fase aguda, pois no intervalo do 2º dia à 7ª semana, os valores normalmente encontram-se reduzidos. Nas grávidas, os valores encontram-se habitualmente elevados. Portanto, a avaliação só deve ser realizada 3 meses após o parto. É muito importante avaliar sempre o uso concomitante de medicamentos. Para uma correcta avaliação e acompanhamento dos exames que fazem parte do perfil lipídico, a qualidade da amostra é fundamental. A colheita deve ser realizada após 12 a 14 horas de jejum; água e medicamentos que não possam ser suspensos podem ser ingeridos. Períodos de jejum inferiores a 9 horas e superiores a 14 horas não são recomendados. Nos casos de jejum inferiores a 9 horas, ocorrem uma diminuição de 2 a 4% do LDL-C, de 1 a 4% do HDL-C, e um aumento de 2 a 4% do TG. O doseamento isolado de colesterol não necessita de jejum, que entretanto, deve ser solicitado, visto que os valores de referência foram obtidos com jejum de 12 horas. Em pacientes que apresentem valores alterados em relação aos desejáveis para a idade, recomenda-se a validação com a repetição do doseamento dentro de um intervalo mínimo de 7 dias e máximo de 2 meses. AMOSTRA DO PACIENTE BIOLÓGICO COMPORTAMENTAL CLÍNICO USO DE FÁRMACOS FONTES DE VARIAÇÃO PRÉ-ANALÍTICA Tempo de jejum, anticoagulante, condições de armazenamento e transporte, punção venosa, identificação do material, instruções e preparação antes da colheita. Intra-individual, idade, sexo, raça. Dieta, tabagismo, exercício, obesidade, stres, consumo de álcool e de cafeína Doença metabólica e endócrina, doenças hepática, renal aguda, etc. Anti-hipertensivos, imunossupressores, esteróides sexuais. Vários autores recomendam que, para um diagnóstico definitivo, o doseamento deve ser repetido num intervalo de 8 a 15 dias, quando encontrado um valor alterado. Se o resultado obtido na segunda avaliação exceder os limites de variação aceitáveis (à volta de 3 a 5% para o colesterol total, 10% para o HDL- colesterol e até 20% para os triglicerídeos), recomenda-se uma terceira avaliação antes de se afirmar um diagnóstico definitivo. O valor a ser considerado, será a média dos valores mais próximos. Recomenda-se também que os doseamentos sejam realizados num mesmo laboratório, possibilitando assim a comparação com a diminuição da variabilidade analítica. DOENÇAS QUE INTERFEREM NOS VALORES DOS LIPÍDIOS Hipertireoidismo Insuficiêncis renal crónica Hipertireoidismo Atresia biliar congénita Diabetes mellitus Síndrome nefrótico Doenças de Armazenamento Lúpus eritematoso sistémico FÁRMACOSS QUE INTERFEREM NO DOSEAMENTO E NOS VALORES DOS LÍPIDOS Anti-hipertensores: tiazidas, clortalidona, espironolactona, Ácido acetil salicílico betabloqueadores. Imunossupressores: ciclosporina, prednisolona, Ácido ascórbico prednisona Esteróides: estrógenios, progestágenos, Amiodarona contraceptivos orais. Anticonvulsivantes Alopurinol PERFIL LIPÍDICO - VALORES DE REFERÊNCIA EM ADULTOS (>ou = 20 ANOS) COLESTEROL TOTAL LDL-C HDL-C TRIGLICERÍDEOS Valores em mg/dL Desejáveis < 200 < 130 > 40 < 150 Limítreofes 200 – 239 130 - 159 150 - 199 Aumentados > ou = 240 > ou = 160 > ou = 200 Directrizes internacionais para o tratamento de dislipidémias e prevenção da aterosclerose PERFIL LIPÍDICO - VALORES DE REFERÊNCIA ENTRE 2 E 19 ANOS COLESTEROL TOTAL LDL-C Valores em mg/dL HDL-C TRIGLICERÍDEOS 10 anos >ou= 40 10 a 19 anos >ou= 35 - 10 anos <ou= 100 10 a 19 anos <ou= 130 Limítreofes 170 – 199 110 - 129 10 anos >ou= 100 Aumentados > ou = 200 > ou = 130 10 a 19 anos >ou= 130 Directrizes internacionais para o tratamento de dislipidémias e prevenção da aterosclerose Desejáveis < 170 < 110 Pesquisa da Células LE A pesquisa de células LE é um teste citomorfológico, uma forma indirecta de avaliar a presença de anticorpos antinucleares. A sua formação ocorre em duas fases distintas. Inicialmente, acontece a interacção do núcleo com o anticorpo antinuclear, geralmente da classe IgG. O núcleo já sensibilizado é fagocitado por leucócitos íntegros, especialmente neutrófilos e monócitos, na presença da fracção C1 do complemento, dando origem à célula LE. A positividade do teste dá-se pelo aparecimento de leucócitos com inclusões homogéneas, violáceas, amorfas, de rosetas (diversos leucócitos envolvendo material nuclear amorfo ou ainda de corpos nucleares amorfos livres). É um fenómeno inespecífico, que ocorre em cerca de 60 a 80% dos casos de lúpus eritematoso sistémico, mas que pode ser encontrado noutras colagenoses e em reacções ao uso de diversos medicamentos. Pesquisa de Coccídeos Os coccídeos (Cryptosporidium parvum e Isospora belli) são geralmente parasitas oportunistas, causadores de diarréia, que tiveram sua incidência aumentada com o advento da SIDA e com a evolução de outras patologias que cursam com o comprometimento imunológico. Nos pacientes imunocompetentes, geralmente evoluem para a resolução espontânea, sem uso de medicamentos. As fezes devem ser colhidas em recipiente com conservante - formol a 10%. Pesquisa de Elementos Anormais das Fezes É pesquisada a presença de eritrócitos, leucócitos e muco e é avaliado o pH. Como os leucócitos e os eritrócitos são rapidamente destruídos no lúmen intestinal, quando presentes, sugerem a presença de lesões intestinais mais altas, associadas ao aumento do trânsito intestinal, ou de lesões de partes mais baixas do cólon, como colites ulcerativas, disenterias bacilares, diverticulite e tuberculose intestinal. A presença de leucócitos isolados sugere infecções bacterianas, colites inflamatórias e, quando em menor quantidade, pode estar associada a lesões parasitárias. As fezes frescas devem ser colhidas em frasco de plástico. No caso de fezes sólidas ou pastosas, a quantidade deverá corresponder a 5 colheres plásticas fornecidas com o frasco de colheita. Se as fezes estiverem liquefeitas, pelo menos 10 mL deverão ser fornecidos ao laboratório para análise. As fezes deverão ser colhidas originalmente num recipiente limpo, e a seguir transferidas para o frasco colector. O paciente não deve estar a usar laxantes nem ter sido submetido ao uso de contrastes radiológicos nos 3 dias anteriores à colheita. Durante a colheita, é importante evitar a contaminação pela urina, pois a sua presença acelera a fermentação bacteriana, prejudicando a conservação. Pesquisa de Gordura Fecal A presença de gordura fecal é indicativa de má absorção de gorduras pelo intestino. É importante como diagnóstico de triagem da esteatorréia associada a patologias do intestino delgado, fibrose quística do pâncreas, pancreatite crónica, doenças inflamatórias intestinais, enteropatias víricas, bacterianas e parasitárias. Fezes frescas devem ser colhidas em frasco de plástico. No caso de fezes sólidas ou pastosas, a quantidade deverá corresponder a 5 colheres plásticas fornecidas com o frasco de colheita. Se as fezes estiverem liquefeitas, deverão ser fornecidos ao laboratório pelo menos 10 mL para análise. As fezes deverão ser colhidas originalmente num recipiente limpo e a seguir transferidas para o frasco colector. O paciente não deve estar a usar laxantes nem ter sido submetido ao uso de contrastes radiológicos nos 3 dias anteriores à colheita. Pesquisa de Larvas Alguns helmintas eliminam formas larvares em vez de ovos, como acontece nos casos de Strongyloides stercoralis, helminta responsável por um alto índice de eosinofilia. Fezes frescas devem ser colhidas em frasco de plástico. No caso de fezes sólidas ou pastosas, a quantidade deverá corresponder a 5 colheres plásticas fornecidas com o frasco de colheita. Se as fezes estiverem liquefeitas, pelo menos 10 mL deverão ser fornecidos ao laboratório para análise. As fezes deverão ser colhidas originalmente num recipiente limpo, e a seguir transferidas para o frasco colector. O paciente não deve estar a usar laxantes nem ter sido submetido ao uso de contrastes radiológicos nos 3 dias anteriores à colleita. Durante a colheita, é importante evitar a contaminação pela urina, pois a sua presença acelera a fermentação bacteriana, prejudicando a conservação. Pesquisa de Rotavírus Apesar de desconhecermos as percentagens exactas da incidência de gastroenterites causadas pelo rotavírus, sabemos que se trata do maior responsável pelos episódios de diarréia infantil no mundo e que, de acordo com a bibliografia, raramente se manifesta em adultos. A transmissão é feita por via fecaloral, apresentando um pico de incidência nos meses de inverno. As fezes frescas devem ser colhidas em frasco de plástico. No caso de fezes sólidas ou pastosas, a quantidade deverá corresponder a 5 colheres plásticas, fornecidas com o frasco de colheita. Se as fezes estiverem liquefeitas, pelo menos 10 mL deverão ser fornecidos ao laboratório para análise. As fezes deverão ser colhidas originalmente num recipiente limpo, e a seguir transferidas para o frasco colector. O paciente não deve estar a usar laxantes nem ter sido submetido ao uso de contrastes radiológicos nos 3 dias anteriores à colheita. Durante a colheita, é importante evitar a contaminação pela urina, pois a sua presença acelera a fermentação bacteriana, prejudicando a conservação. Como é feita em crianças e lactentes, a colheita pode ser realizada directamente das fraldas, desde que não estejam contaminadas por urina. Pesquisa de Sangue Oculto A pesquisa de sangue oculto nas fezes é útil para a identificação de lesões do tubo gastrointestinal que cursam sem sangramento clínicamente visível. As causas mais comuns são sangramentos oriundos de úlceras gástricas e duodenais, gastrite, ulcerações medicamentosas da mucosa gastrointestinal (antiinflamatórios, aspirina), neoplasias gástricas ou do cólon, diverticulite, colites, algumas parasitoses, hemorragias de boca ou trato respiratório superior deglutidas. É utilizada também no diagnóstico de anemias ferroprivas, resistente ao tratamento, especialmente em crianças. Para um resultado fidedigno, o exame deverá ser realizado de forma seriada em dias diferentes, tanto para certificar a negatividade, um falso-positivo ou o carácter crónico do sangramento. Casos de falsos-positivos podem ocorrer pela presença de mioglobina e/ou hemoglobina de origem de carne animal, assim como também do uso de alimentos ricos em peroxidases. Falsos-negativos podem acontecer no uso de vitamina C e agentes antioxidantes. Uma pequena quantidade de sangue é fisiologicamente perdida pelo tubo digestivo, cerca de 2,0 a 2,5 mL/dia. Os métodos de investigação têm sensibilidade para identificar apenas valores acima de 5 mL. Para realizar adequadamente o exame, o paciente deverá manter a dieta por 3 dias consecutivos. A dieta deve ser isenta de carne e derivados que possam conter hemoglobina. Deve-se evitar o excesso de clorofila (vegetais verdes) e suspender o uso de medicamentos que contenham ferro, bismuto ou cobre, assim como aspirina e antiinflamatórios. Pesquisa de Trofozóitos Os trofozoítos são formas vegetativas dos protozoários. Pesquisá-los é importante em fezes diarréicas, com o objetivo de identificar Giardia intestinalis, Entamoeba histolytica, Dientamoeba fragilis e outros protozoários intestinais, os quais muitas vezes não são evidenciados pelos exames parasitológicos de rotina, que realizam a pesquisa de formas de resistência (quistos). Devem ser colhidas fezes diarréicas, recém-emitidas, em recipiente com líquido conservante. Plaquetas As plaquetas têm forma discóide, e têm origem na fragmentação do citoplasma dos megacariócitos na medula óssea. Têm uma importante participação na fase inicial da hemostase, por meio dos mecanismos de adesão plaquetária à superfície estranha, agregação das plaquetas entre si, formando o tampão plaquetário, activação da coagulação plasmática pela exposição do factor plaquetário 3, libertação do factor plaquetário 4, e também pela absorção de factores de coagulação na sua atmosfera. Também é libertado o factor mitogénico plaquetário responsável pela multiplicação acelerada das células do endotélio vascular. Em todo o processo, estão envolvidos mecanismos como adesão e agregação paquetárias. A avaliação das plaquetas pode ser feita de forma quantitativa, expressa em mm3, e de modo qualitativo, pela avaliação das características analisadas no esfregaço corado, o que permite a identificação de alterações morfológicas das plaquetas. As alterações quantitativas podem ser tanto o aumento da quantidade de plaquetas, chamada trombocitemia, quanto a diminuição, denominada trombocitopenia. As alterações qualitativas podem ser observadas em processos de produção acelerada de plaquetas. Plaquetas de diferentes tamanhos caracterizam uma anisocitose plaquetária, comum nos síndromes mieloproliferativos, mielodisplásicos e disfunções plaquetárias. Plaquetas gigantes (macroplaquetas) ou com morfologia bizarra (plaquetas dismórficas) demonstram um turnover acelerado e são encontradas quando ocorre grande destruição periférica, como nos casos de púrpura trombocitopénica idiopática, tromboses importantes e síndrome de Bernard Soulier. Um fenómeno de aglutinação de plaquetas in vitro pode ocorrer devido à presença de anticorpos dirigidos a antigénios na membrana de plaqueta. O EDTA leva à quelação de cálcio e expõe esses antigénios, permite a ligação aos anticorpos, levando à aglutinação das plaquetas e a um resultado falsamente diminuído. Porém, a colheita e a realização imediata da avaliação das plaquetas ou a confirmação em material colhido com citrato afastam a possibilidade dessa interferência. Consultar Hemograma. Pneumocystis carinii O Pneumocystis carinii é um parasita oportunista que, em imunossuprimidos, causa um quadro de pneumonia grave e de grande morbilidade. As evidências indicam que a maioria das crianças entra em contacto com o parasita, desenvolvendo diferentes níveis de reacções - de assintomáticas e subclínicas a clinicamente moderadas. O P. carinii pode então persistir num estado lactente até uma reactivação, em situação de baixa imunidade. Até há pouco tempo, eram considerados população de risco crianças prematuras, pacientes com doenças hematopoiéticas malignas, com deficiência de imunoglobulinas, e pacientes a usarem fármacos imunossupressores. Após o advento da epidemia da SIDA, ocorreu um aumento da prevalência da pneumonia pelo Pneumocystis carinii, já que cerca de 60 a 85% desses pacientes desenvolve o quadro de pneumonia pelo P.carinii, sendo considerada a infecção oportunista mais comum nesse grupo. Ao microscópio, três formas evolutivas do P.carinii podem ser identificadas: trofozoítos, esporos e quistos (forma de mais fácil reconhecimento). O diagnóstico clínico da pneumonia pelo P.carinii normalmente baseava-se nas evidências radiológicas e na observação microscópica de material respiratório usando diferentes técnicas de coloração. Actualmente, é possível a identificação de trofozoítos e quistos de P.carinii em material de origem respiratória como a expectoração espontânea ou induzida e o lavado broncoalveolar por imunofluorescência directa, utilizando-se anticorpos monoclonais, com alto grau de especificidade. Porfirina As porfirias são um grupo de patologias resultantes de distúrbios enzimáticos na síntese do heme. Os defeitos podem ser congénitos, como erros inatos do metabolismo, ou adquiridos, por disfunções eritrocitárias e hepáticas causadas por patologias metabólicas ou exposição a agentes tóxicos. Das diferentes espécies de porfirinas, apenas três têm significado clínico: as uroporfirinas, as coproporfirinas e as protoporfirinas. O ácido deltaaminolevulínico e o porfobilinogénio são precursores metabólicos das porfirinas. Por isso, podem ser úteis no diagnóstico dessa patologia. Como podem apresentar-se normais nos períodos de lactência, a sua maior indicação é a avaliação, especialmente nas fases de ataques agudos. São muito úteis no diagnóstico da forma intermitente aguda. Como existem diferentes enzimas envolvidas neste processo, o defeito em cada passo dessa síntese corresponde a uma manifestação distinta da doença. Segundo a classificação de Moore, as porfirias são divididas em agudas e não-agudas, com base nas manifestações clínicas e no padrão de produção e excreção de porfirinas e de seus precursores. Porfirias agudas ou hepáticas - Porfiria intermitente aguda, coproporfirina hereditária e porfirina variegada, que têm em comum as manifestações abdominais e alterações neurológicas e psiquiátricas. Porfirias não-agudas ou eritropoiéticas - Porfiria hepatocutânea, protoporfirina hematopoiética e porfirina congénita, que têm em comum as manifestações cutâneas, com fotossensibilidade solar. Os sintomas são dependentes do órgão atingido e podem incluir lesões de pele, alterações hepáticas e distúrbios do sistema nervoso central. Alguns factores podem desencadear a doença, como o uso de medicamentos, hormonas, sulfas, benzodiazepinas e álcool, além de dietas rígidas para emagrecimento. Não há tratamento específico para nenhuma das diferentes formas de porfirias. O tratamento é sintomático, e em muitos casos a única solução é o transplante hepático. O aumento da excreção do porfobilinogénio na urina reflecte uma crise aguda de porfiria. A avaliação é realizada numa amostra de urina recém-emitida, que deve ser mantida envolta em papel de alumínio para protecção contra a luz. Potássio O potássio é o catião de maior concentração nos líquidos intracelulares. Apenas cerca de 2% do potássio corpóreo é extracelular. A relação entre as concentrações do potássio no meio intracelular e extracelular é normalmente de 38:1. A manutenção dessa relação é muito importante para o funcionamento neuromuscular normal. Cerca de 90% do potássio ingerido é absorvido pelo trato gastrointestinal, sendo 80% excretados pelos rins, e o restante, pelas fezes. A quantidade excretada pela fezes aumenta como compensação, em situações clínicas de insuficiência renal. Os níveis séricos variam em ritmo circadiano, com maiores concentrações pela manhã entre as 8 e as 9 horas, e menores entre as 15 e as 16 horas. Existe uma pequena variação entre os níveis séricos e plasmáticos, sendo os níveis séricos cerca de 0,4 mEq/L maiores do que os níveis plasmáticos. Essa diferença é atribuída em parte à libertação de potássio pelas plaquetas durante a coagulação. Nos casos de pacientes com contagem de leucócitos e/ou plaquetas elevadas, essa diferença pode ser maior. Os cuidados durante a colheita são fundamentais, podendo levar a variações de até 20% dos valores, caso haja demora no uso do garrote ou no exercício de abrir e fechar a mão prolongado, ou ainda a ocorrência de hemólise. A deficiência de potássio (hipocaliémia) prejudica a função neuromuscular, tendo como sinais clínicos fadiga, mialgia e fraqueza muscular, especialmente nos membros inferiores; labilidade emocional, fraqueza muscular progressiva, hipoventilação, íleo paralítico, hiporreflexia, paralisia, alterações no electrocardiograma, taquicardia com alterações na onda T (achatamento ou inversão), depressão do segmento ST e, nos casos mais graves, prolongamento do intervalo PR, arritmias ventriculares e paragem cardíaca podem ser evidenciados. Os riscos são maiores nos pacientes com isquemia miocárdica ou hipertrofia ventricular esquerda. A hipocaliémia predispõe à intoxicação digitálica. O déficite de potássio sérico pode ser causado por uma redistribuição do potássio entre os meios intra- e extracelular e por déficite verdadeiro de potássio. As causas mais comuns de alteração de distribuição de potássio são resposta à insulinoterapia, alcalose, grandes leucocitoses, excesso de beta-adrenérgico e hipotermia. As causas de perda real de potássio podem ser subdivididas em causa com perda renal e sem perda renal. Entre as hipocaliémias com perda renal estão acidose tubular renal, necrose tubular aguda, fármacos, hipomagnesémia, uso de mineralocorticóides, doença de Cushing, aldosteronismo primário e secundário, uso de corticóides, diuréticos e outros fármacos, como anfotericina B e teofilina em altas doses. As hipocaliémias sem perda renal incluem ingestão inadequada, alcoolismo, má absorção, hidratação e alimentação parenterais inadequadas, perdas gastrointestinais por vómitos, diarréia, laxantes, fístulas e sonda nasogástrica prolongada, queimaduras e sudorese excessiva. Na cetoacidose diabética, há perda de potássio por diurese osmótica causada pela hiperglicemia e pelo desvio para o meio intracelular pela insulinoterapia. Porém, essas alterações são mascaradas, no início do quadro, pela desidratação. É importante lembrar que a hipercaliémia é muito mais importante clinicamente na presença de pH alcalino do que ácido. Para cada aumento do pH de 0,1, o potássio diminui 0,6 mmoL. A hipercaliémia leva a uma despolarização da membrana celular, com sinais clínicos como confusão mental, fraqueza, paralisia flácida, hipoventilação por fraqueza da musculatura respiratória e irritabilidade muscular. No electrocardiograma, podemse observar bradicardia, alterações na onda T (apiculada), desaparecimento das ondas P, aumento dos intervalos PR e QRS, fibrilação ventricular ou assistolia. Esta condição é mais frequente em pacientes hospitalizados, especialmente os idosos. Alguns estudos apontam a incidência de 15% de hipercaliémia numa investigação de um grupo de pacientes internados acima de 70 anos de idade. Reflecte geralmente excreção renal inadequada, mobilização do potássio dos tecidos, excesso de aporte oral ou de administração parenteral. A insuficiência renal é a causa mais comum de hipercalemia. Outras causas são grandes traumas, neoplasias malignas, anemias hemolíticas graves, 50% dos casos de doença de Addison e uso de antiinflamatórios, especialmente nos renais crónicos. A desidratação pode causar uma pseudo- hipercaliémia . Portanto, a avaliação dos níveis séricos de potássio é útil na avaliação do equilíbrio electrolítico, especialmente em pacientes idosos, em hiperalimentação parenteral, em uso de diuréticos, nas doenças renais e nos pacientes em hemodiálise. É importante fazer a avaliação também nos quadros de arritmias cardíacas, fraquezas musculares, encefalopatias de origem hepática, monitorização da cetoacidose na diabetes mellitus e na reposição intravenosa de líquido. Em condições normais, os rins excretam entre 80 a 90% do potássio oriundo da dieta, variando com a alimentação. Os diuréticos são a causa mais frequente do aumento da perda de potássio por via urinária. Outras causas de perdas renais são as secundárias à acidose tubular renal, à alcalose metabólica e ao excesso de mineralocorticóides. Em pacientes com hipocaliémia, perdas urinárias superiores a 20 mEq/L sugerem que os rins são a fonte de perda ou uma causa aguda para hipocaliémia, já que podem demorar de 1 a 3 semanas para conseguir manter de forma efetiva a concentração de potássio. Caso, nessa mesma situação, os níveis urinários de potássio sejam inferiores a 20 mEq/L , o mais provável é que não sejam os rins a maior fonte de perda; nessas condições, a deplecção já deve durar semanas. As condições associadas à diminuição dos níveis de potássio na urina incluem perdas gastrointestinais, distribuição entre os meio extra e intracelular, ingestão inadequada de potássio e doença renal com oligúria. Níveis elevados de potássio na urina podem ser encontrados no aldosteronismo primário e secundário, no uso de ACTH e corticóides, na doença tubular renal e na síndrome de Cushing. Prolactina A sua função é o início e a manutenção da lactação pós-parto. Ao contrário de outras hormonas hipofisárias, a prolactina é regulada mais pela inibição do que pelo estímulo. O factor de inibição da prolactina é a dopamina, um neurotransmissor hipotalámico que controla a sua síntese por meio da inibição da secreção. A prolactina é secretada episodicamente, com níveis mais elevados durante o sono. Os seus níveis elevam-se durante a gravidez. A lactação ocorre quando os níveis elevados de estrogénio da gestação começam a diminuir. Durante a amamentação, os níveis retornam gradualmente aos níveis prégravídicos. Hipoprolactinemia Ocorre no pan-hipopituitarismo. Clinicamente, os níveis baixos de prolactina manifestam-se pela impossibilidade de amamentar no pós-parto. Hiperprolactinemia O adenoma hipersecretor de prolactina (prolactinoma) é a disfunção mais frequente da hipófise anterior. Os tumores podem ser microadenomas ou macroadenomas, de crescimento lento ou rápido, secretores apenas de prolactina ou de prolactina e GH. A hipersecreção de prolactina pode ser consequência da ausência de inibição pela dopamina, como nos casos de craniofaringioma, compressão da haste hipofisária por um adenoma ou formação granulomatosa. Nestas condições, o transporte da dopamina secretada pelo hipotálamo por meio da haste hipofisária está prejudicado, o que diminui sua concentração na hipófise anterior. Alguns fármacos bloqueiam a ação da dopamina, como as fenotiazidas, enquanto fármacos como a metildopa impedem a sua síntese. A hiperprolactinemia pode ocorrer ainda como consequência do efeito estimulador do estrogénio e do TRH, respectivamente em casos de terapia com estrogénios ou hipotiroidismo primário. Stress, sela vazia, doença hepática grave, ovários poliquísticos, doença de Cushing, insuficiência renal crónica, estímulo mamário, trauma da parede torácica, fármacos antidepressivos, anti-hipertensivos e metoclopramida também acarretam elevação da prolactina. Há ainda a hiperprolactinemia idiopática. As manifestações clínicas da hiperprolactinemia são galactorréia não relacionada ao pós-parto ou a amamentação, disfunção eréctil em homens e alterações menstruais em mulheres. O TAC do cránio ou a ressonância magnética são necessários na complementação do diagnóstico. Níveis basais de prolactina superiores a 200 ng/mL sugerem fortemente adenoma, embora níveis pouco elevados possam ser encontrados. Grandes tumores com níveis baixos de prolactina podem indicar compressão da haste hipofisária, com bloqueio da inibição dopaminérgica, em vez de adenoma hipersecretor de prolactina. Doseamento de Prolactina Deve ser colhida, de preferência, na forma de pool de 2 a 3 amostras e, quando possível, com o paciente em repouso. Útil no diagnóstico de galactorréia, alterações menstruais, infertilidade e hipogonadismo em mulheres, bem como na avaliação de ginecomastia, impotência, infertilidade e hipogonadismo masculino. Importante na avaliação da reserva hipofisária em ambos os sexos. Macroprolactinémia Várias isoformas de prolactina com diferentes actividades biológicas podem ser identificadas no soro. A forma monomérica corresponde à maior parte da prolactina doseada em indivíduos normais. A pesquisa de macroprolactina realizada por cromatografia é importante para definir, dentro da população hiperprolactinémica, os casos consequentes à presença de agregados moleculares como a big-big prolactin. Estes compostos possuem pouca actividade biológica, o que justifica a hiperprolactinemia oligossintomática ou assintomática, que na grande maioria não necessita de tratamento. O doseamento de prolactina por diferentes metodologias numa amostra de soro de paciente com macroprolactina positiva pode fornecer resultados bastante diferentes, uma vez que alguns métodos detectam todas as isoformas, enquanto outros não. Proteína C Reativa As reacções inflamatórias são uma resposta do organismo aos diferentes tipos de agressão tecidual, como as infecções víricas, bacterianas, parasitárias ou fúngicas, e às agressões físicas, químicas e imunológicas. Diante de uma reacção inflamatória, os monócitos secretam substâncias como IL-6, IL-1 e TNF, que levam ao hepatócito a informação da necessidade de síntese das denominadas proteínas de fase aguda. A determinação da concentração plasmática dessas proteínas ajuda, clinicamente, a avaliar a presença, a extensão e a actividade do processo inflamatório e a monitorizar a evolução e a resposta terapêutica. A proteína C reactiva (PCR) é uma das proteínas plasmáticas de fase aguda. Foi identificada no soro de pacientes com pneumonia pneumocócica, em reacção de precipitação do polissacarídeo C da parede do pneumococo (Gram-positivo), agente etiológico da patologia. É usada rotineiramente para monitorizar a resposta de fase aguda, sendo considerada uma das mais sensíveis, por apresentar algumas características, como semi-vida curta (entre 8 a 12 horas) e valores normais muito baixos (< 0,5 mg/dL), que em resposta a estímulos inflamatórios, podem atingir valores até 100 vezes o normal em menos de 24 horas. Além de se elevar rapidamente após o estímulo inflamatório (4 a 6 horas), na ausência de estímulo crónico, normaliza-se em 3 a 4 dias. A proteína C reactiva deve ser utilizada como método auxiliar no diagnóstico, controle terapêutico e acompanhamento de diversas patologias, uma vez que é o mais sensível e precoce indicador de processos inflamatórios resultantes de infecções, carcinomas, necrose tecidual e cirurgias. Depois de 24 horas, a velocidade de hemossedimentação (VS) é complementar à PCR. Durante muitos anos, a PCR foi utilizada apenas no contexto de avaliação de processos inflamatórios, mas actualmente, tem assumido outros papéis importantes na clínica. Por exemplo, podemos citar que, como marcador de mortalidade nos primeiros 24 meses após enfarte agudo do miocárdio (EAM), foi mais valiosa que as enzimas cardíacas. Além disso, altos níveis séricos de PCR puderam ser considerados factores preditivos de ruptura cardíaca subaguda pós-EAM. Nove pacientes que apresentavam este tipo de complicação foram comparados ao grupo controle de 28 pacientes enfartados sem complicações. No grupo com ruptura cardíaca, níveis elevados de PCR, superiores a 20 mg/dL, foram evidenciados no segundo dia pós-EAM. Um marcador tradicional de lesão muscular, a enzima CK, não mostrou diferença significativa entre os dois grupos. A sensibilidade diagnóstica de altos níveis séricos de PCR, predizem uma possível ruptura cardíaca pós-EAM, foi de 89%, garantindo o seu uso na prática cardíaca. Com a recente descoberta de componentes inflamatórios na arteriosclerose, a PCR foi proposta como indicador de risco para doença coronária e acidentes vasculares cerebrais. O risco revelado pelos altos nivéis séricos de PCR, é independente de factores ligados à dislipidémia e pode ser reduzido pelo uso de aspirina como tratamento profilático. Estas novas hipóteses de doenças arterioescleróticas associadas à possibilidade de terapêutica preventiva abrem novas perspectivas, que devem ser consideradas. Da mesma forma, níveis aumentados de PCR parecem estar relacionados a eventos coronários em pacientes com angina estável ou instável. Noutras áreas da medicina, como a infecciologia e a cirurgia, a importância da PCR também deve ser levada em conta. O uso do doseamento da PCR foi avaliado num estudo envolvendo 193 casos de endocardite infecciosa. Níveis elevados de PCR puderam ser evidenciados em casos que cursavam com complicações, levando à conclusão de que a PCR é um bom marcador prognóstico e pode ser utilizada para monitorizar a resposta à terapia antimicrobiana em endocardites infecciosas. Na recuperação cirúrgica, a PCR aumenta nas primeiras 4 a 6 horas, revelando picos séricos por volta das 48 a 72 horas pós-operatório, em concentrações de 2,5 a 3,5 mg/dL. Em cirurgias que cursam com evolução favorável, os níveis de PCR normalizam-se por volta do sétimo dia após o procedimento cirúrgico. Se existirem complicações, os valores da PCR permanecem elevados, e podem atingir níveis superiores a 3,5 mg/dL. Em estados inflamatórios crónicos, as concentrações de PCR podem persistir altas indefinidamente. Em casos de LES e outras doenças do colagénio, colites ulcerativas e leucemias, as concentrações são geralmente normais, porém marcadamente mais altas nas infecções bacterianas do que nas víricas, auxiliando no diagnóstico diferencial. Na febre reumática, a PCR é um bom parâmetro de reagudização, pois persiste em concentrações elevadas (>4 mg/dL) quando a doença está activa, embora decaindo a níveis normais durante a remissão. Encontram-se níveis elevados de PCR e de haptoglobina em pacientes com espondilite anquilosante HLA-B27 clinicamente activa; mas nem a PCR nem a haptoglobulina estão elevadas nos casos activos com HLA-B27, em que são encontradas concentrações elevadas de IgA. Aproximadamente 60% de recém-nascidos saudáveis podem apresentar, normalmente, concentrações de PCR acima de 1 mg/dL durante os primeiros 20 dias de vida. Consequentemente, as faixas de referência de adultos não são adequadas para crianças. O doseamento pela técnica de nefelometria, ou imunoturbidimetria, utilizando anticorpos monoclonais anti-PCR, ao contrário dos métodos tradicionais qualitativos, origina resultados quantitativos (mg/dL) que facilitam a interpretação clínica e o acompanhamento laboratorial de cada caso. Proteína Bence Jones A proteína de Bence Jones é formada por dímeros de cadeias leves (kappa e lambda) de imunoglobulinas monoclonais encontradas na urina. A presença ou a ausência da proteína de Bence Jones na urina depende da taxa e da quantidade de síntese de cadeias leves e do estado renal do paciente. É encontrada em 60 a 70% de pacientes com mieloma múltiplo, macroglobulinemia de Waldenstrom (30%), em 20% de doenças linfoproliferativas e também em aproximadamente 10% das gamapatias monoclonais benignas. Pode estar presente também na amiloidose sistémica. Aproximadamente 20% dos mielomas múltiplos secretam apenas cadeias leves livres (proteína de Bence Jones), e cerca de 50% dos pacientes com mieloma tem imunoglobulinas monoclonais no soro e cadeias leves livres na urina. A monitorização da proteína de Bence Jones é útil na avaliação de recidivas da doença, na transição para uma forma mais agressiva e na resposta à terapia. A presença e a quantidade de proteína de Bence Jones influenciam o prognóstico. Os critérios do National Cancer Institute para a avaliação de mielomas apontam como resposta objectiva uma diminuição de 50% da concentração de imunoglobulinas monoclonais no soro ou da excreção de cadeias leves na urina de 24 horas. The Southwest Oncology Group define como resposta objetiva a diminuição de 75% de imunoglobulinas monoclonais no soro (para níveis menores que 25 g/L) e diminuição de 90% de cadeias leves monoclonais na urina. As respostas devem manter-se pelo menos por 4 semanas e devem ser acompanhadas por doseamentos normais de cálcio sérico, valores de albumina sérica equivalentes a 30 g/L e nenhuma progressão de doença óssea. Pacientes com diminuição de 50% a 74% da produção de imunoglobulinas monoclonais têm bom prognóstico. A proteinúria de Bence Jones tem um efeito nefrotóxico. Assim, a sua presença aumenta o risco de insuficiência renal. Pacientes com mieloma que secretam só proteína de Bence Jones têm pior prognóstico. Mieloma de cadeias lambda têm prognóstico pior do que os de cadeias kappa. Proteína S Os estados de deficiência de proteína S assemelham-se clinicamente aos da deficiência de proteína C. A deficiência, quando homozigótica, manifesta-se na fase neonatal como púrpura fulminante e coagulação intravascular disseminada. Quando heterozigótica, têm sido descritos episódios tromboembólicos venosos e de trombose vascular cerebral, especialmente quando associados a outros factores de risco. A proteína S é também dependente de vitamina K, sendo sintetizada pelo fígado e, em menor quantidade, pelas células endoteliais e por megacariócitos. Duas formas da proteína S estão presentes na circulação: a livre e a conjugada. A porção livre corresponde a aproximadamente 40% da concentração plasmática da proteína e representa a forma funcionalmente activa, enquanto a outra (60%) circula conjugada à proteína ligadora do C4b, um componente do sistema complemento. Proteínas Totais e Fracções O plasma humano contém diversas proteínas identificáveis, que representam um papel importante na manutenção da pressão osmótica e em diferentes funções como proteínas transportadoras, anticorpos, enzimas, inibidores enzimáticos, factores da coagulação, entre outras. A avaliação dos seus níveis séricos é de grande utilidade na avaliação do estado nutricional e da presença de doenças sistémicas agudas ou crónicas. O doseamento isolado de proteínas totais tem pouco valor, já que a alteração numa das fracções pode ser compensada por alteração oposta de outra fracção, como ocorre nas inflamações crónicas, em que há diminuição de albumina com aumento de gamaglobulina. Geralmente, o valor isolado da proteína total tem utilidade médica em grandes elevações como no mieloma múltiplo ou na diminuição acentuada dos seus níveis, como os que são encontrados nos estados graves de desnutrição, perdas como no síndrome nefrótico e enteropatias com perdas de proteínas, ou na alteração da síntese protéica, que ocorre nas doenças hepáticas graves. O doseamento das fracções albumina e gamaglobulina e a avaliação da relação albumina/globulina auxiliam na orientação diagnóstica em alterações sistémicas com diminuição da albumina, como estados carenciais, perdas renais, distúrbios intestinais e hepáticos e quadros de aumento das imunoglobulinas, como as gamapatias e os processos infecciosos crónicos. Consultar Albumina Eletroforese de proteínas. Proteinúria Pequenas quantidades de proteína oriundas do plasma e do trato urinário podem ser encontradas na urina normal. Falsas proteinúrias podem acontecer pela contaminação da urina com sangue ou secreções genitais. A proteinúria funcional pode surgir, geralmente com valores pouco elevados, num quadro febril importante, exercício vigoroso, posição ortostática, desidratação e uso de drogas, entre outras situações. A proteinúria é um indicador importante da presença de patologia renal e pode resultar de lesão glomerular, comprometimento tubular, degradação do tecido renal ou concentrações excessivas de proteínas de baixo peso molecular (gamapatias monoclonais). Consultar Urina-EAS. Eletroforese de Proteínas. PSA A incidência mundial do carcinoma da próstata, é ascendente. As estáticas demomonstram que o carcinoma da próstata é hoje, a segunda maior causa de morte por carcinoma nos homens. Esta tendência deve manter-se, devido ao aumento da esperança de vida da população. A epidemiologia do carcinoma da próstata é complexa, e poucos factores de risco foram estabelecidos. Alguns estudos documentaram como factores de risco: - Idade, - Raça e etnia, - História familiar, - Dieta, - Produção de androgénio e outros factores, como vasectomia e hiperplasia benigna da próstata. Idade O carcinoma da próstata é particularmente comum em homens idosos. É clinicamente insuspeito, frequentemente detectado em autópsias. A sua prevalência é cerca de 40% em homens acima dos 70 anos de idade. Desconhece-se a participação de algum mecanismo fisiológico concomitantemente ao envelhecimento, necessário ao desenvolvimento e à progressão do carcinoma da próstata, ou se esses processos são tão lentos que requerem muitos anos para se tornarem clinicamente evidentes. A elevação da incidência de carcinoma da próstata em relação à idade conduziu à especulação de que os processos de envelhecimento podem estar relacionados biologicamente com o desenvolvimento do carcinoma da próstata. Raça e Etnia Foram observadas grandes variações na incidência e na mortalidade de carcinoma da próstata entre países e grupos raciais. Americanos e africanos têm as taxas de mortalidade mais altas do mundo, seguidos por brancos de países escandinavos. Homens asiáticos têm as taxas mais baixas. As grandes diferenças raciais na incidência de carcinoma da próstata e mortalidade fornecem dados importantes na etiologia da doença. História familiar Estudos epidemiológicos demonstraram que pacientes que relatam história de carcinoma da próstata em pais, irmãos ou filhos têm duas a três vezes aumentado o risco de desenvolver a doença, com estimativas de risco mais altas associadas a múltiplos parentes afetados ou em idades jovens. Algumas análises apoiam a possibilidade de factores genéticos herdados como explicação desse fenómeno. Porém, não foram ainda obtidos dados decisivos da possível herança de genes no cromossomo X. Vários estudos populacionais apontam um risco maior de carcinoma da próstata em homens com irmãos afetados quando comparados com pais afetados, aumentando a hipótese de uma herança ligada ao cromossomo X. Dieta A modificação do aporte dietético é, potencialmente, um método promissor de controle de carcinoma da próstata. A possibilidade de que a dieta tenha um papel importante na etiologia da doença é apoiada por dados epidemiológicos, tais como: - a incidência de carcinoma da próstata tem aumentado no Japão, onde mudanças dietéticas significativas aconteceram nas últimas três décadas; - a incidência da doença é mais elevada em japoneses e imigrantes chineses nos Estados Unidos; - a incidência de carcinoma da próstata está correlacionada com outros carcinomas relacionados com a dieta, como carcinoma do cólon. O componente dietético principal associado ao carcinoma da próstata é a gordura. Dados epidemiológicos globais são consistentes, mostrando a associação com gordura dietética, especialmente a gordura saturada, embora alguns estudos não apoiem essa relação. Foram apontados vários mecanismos para o efeito da gordura no desenvolvimento do carcinoma da próstata, inclusive efeitos na composição de membrana celular, síntese de prostaglandina e níveis de andrógenios no sangue ou tecido. Porém, esses mecanismos são especulativos, e faltam provas críticas e dados experimentais. A relação de risco de carcinoma da próstata para vários micronutrientes é, ainda, incerta. O papel da vitamina A ou dos seus precursores, particularmente o betacaroteno, é obscuro. Alguns estudos mostram uma associação negativa, e outros mostram não haver associação ou existir até mesmo uma associação positiva. Recentes estudos sugerem efeitos protectores no uso de selénio e vitaminas D e E. O selénio está envolvido na biossíntese da testosterona e pode estimular a produção de hormonas pituitárias e adrenais. Está envolvido, também, em vias metabólicas antioxidantes, e a sua deficiência pode expor as células prostáticas a tensões oxidativas que podem ser carcinogénicas. Androgénios Os androgénios têm um papel no desenvolvimento do carcinoma da próstata. São hormonas necessárias ao crescimento, à manutenção e à actividade funcional das células prostáticas. A castração ou a terapia com estrogénio podem ter um efeito paliativo no carcinoma da próstata. Porém, os resultados de estudos epidemiológicos da avaliação de níveis séricos de androgénio foram incompatíveis. Essa inconsistência pode reflectir a fraca correlação entre níveis circulantes de androgénio e níveis intracelulares. Pode reflectir também, a fase imprópria para doseamento do androgénio. A maioria dos doseamentos é realizada em pacientes idosos, porém os níveis de androgénio são de grande valor na adolescência ou no adulto jovem. Outros Factores Uma gama extensa de outras exposições exógenas e características do hospedeiro foi apontada no papel etiológico do desenvolvimento do carcinoma da próstata, inclusive peso ao nascer, obesidade, altura, hiperplasia benigna de próstata, consumo de álcool, tabagismo, exposição a radiação, agentes infecciosos, vasectomia e níveis de actividade física, embora as evidências que apoiem um papel importante para esses factores sejam bastante ténues. O exame rectal digital (toque rectal) era o único teste disponível para a detecção precoce do carcinoma da próstata. Recentes estudos sugeriram que a sensibilidade desse procedimento é de aproximadamente 30%, e sua especificidade de 40% para a doença órgão-limitada. A introdução do doseamentos sérico do antígeno específico da próstata (PSA) no final na década de 1980 marcou um grande avanço no campo do diagnóstico e do acompanhamento dos pacientes com carcinoma da próstata. O PSA é uma proteína produzida pelo epitélio da próstata e das glândulas periuretrais, agindo do ponto de vista funcional, como uma protease envolvida na liquefação do coágulo seminal. Embora apareça em altas concentrações no líquido seminal, é ainda desconhecido o mecanismo pelo qual o PSA passa para a circulação. Acreditava-se inicialmente, que o PSA se originava unicamente na próstata; porém, baixas concentrações têm sido detectadas em glândulas periuretrais, mamárias, salivares e pancreáticas, leite, soro de mulheres, líquido amniótico e outros fluidos corporais. Num estudo recente, foi avaliado um grupo de mulheres com lesões benignas e carcinoma da mama antes e após cirurgia. O PSA foi detectado, nessas pacientes, usando-se técnicas ultra-sensíveis. As concentrações de PSA foram correlacionadas com os achados histológicos. As pacientes com carcinoma da mama apresentaram concentrações mais altas de PSA, avaliadas no período pré-operatório, com diminuição após a cirurgia, que porém, não se mostrou significativa. Mulheres com lesões benignas de mama, equivalentes a um terço dos casos estudados, também apresentaram valores de PSA no soro. Portanto, a expressão de PSA no soro não distingue doenças benignas e malignas de mama, mas talvez possa ser valiosa no acompanhamento da doença. O PSA apresenta-se, na sua maior parte, na forma de complexos formados com enzimas inibidoras da protease como a alfa-1-antiquimiotripsina e a alfa-2macroglobulina. Uma menor porção circula na forma livre, representando geralmente menos de 30% do PSA total. Tanto a forma livre como a ligada às proteínas podem ser medidas por técnicas de imunoensaio. Ambas as formas são enzimaticamente inactivas no soro. Em associação com o toque rectal, o doseamento do PSA conduziu a um diagnóstico de carcinoma da próstata mais precoce em pacientes mais jovens e em maior número de pacientes diagnosticados. Além disso, o PSA também é útil para monitorizar a resposta à terapia. Porém, o PSA tem as suas próprias limitações em relação à sensibilidade e à especificidade, sendo a sua principal desvantagem a ausência de especificidade como marcador tumoral. Além disso, essa característica faz com que exista uma grande faixa de valores comuns às doenças da próstata, tanto benignas como malignas. Nos últimos anos, têm sido desenvolvidos vários ensaios de PSA com sensibilidade crescente, e a avaliação da fracção livre do PSA tem demonstrado oferecer uma especificidade melhor do que o doseamento isolado do PSA total. Preconiza-se hoje, que níveis de PSA no soro normal não deveriam exceder 4 ng/mL. Entretanto, alguns estudos têm demonstrado uma prevalência moderada de carcinoma da próstata detectado por biópsias em pacientes com níveis de PSA total entre 2,6 e 4,0 ng/mL. Níveis entre 4 e 10 ng/mL, geralmente, levam à probabilidade de 20% de risco de carcinoma; níveis superiores a 10 ng/mL têm acima de 50%, e níveis superiores a 40 ng/mL estão associados a doença metastática óssea. Porém, convém lembrar a correlação com a idade, na qual níveis até 6,5 ng/mL, em homens acima de 70 anos, podem ser normais. A análise integrada de vários testes e diferentes índices é útil para aumentar a sensibilidade e a especificidade da investigação. Para aumentar a especificidade do PSA, especialmente na faixa cinzenta (entre 4,0 e 10,0 ng/dL), utiliza-se a soma de diferentes recursos, como: - PSA ajustado à idade; - Densidade do PSA; - A velocidade do PSA; - Relação PSA livre/ PSA total. PSA Ajustado à Idade A idade é um factor importante em níveis de PSA crescentes. Por isso, alguns médicos usam níveis ajustados à idade, definindo valores diferentes, normais para cada grupo etário. Esse método sugere que homens abaixo de 50 anos de idade deveriam ter PSA abaixo de 2,5 ng/ml, enquanto níveis de até 6,5 ng/ml seriam considerados normais para homens acima de 70 anos. Densidade Prostática Segundo Stamey e cols., cada grama de tecido prostático na hipertrofia benigna da prostata (HBP) liberta 0,31ng de PSA, enquanto cada grama no carcinoma da próstata liberta 3,5 ng de PSA. Normalmente, é aceite como limite de uma próstata normal o volume de 25 g. A densidade do PSA é calculada segundo a definição de Benson e cols., em que: dPSA =PSA/volume prostático (obtido por ultra-som transrectal). Densidades acima de 0,12 g sugerem a presença de carcinoma da próstata e obrigam à realização de biópsia confirmatória. Já as menores que 0,12 g indicam HBP. Antigamente considerava-se como ponto de cut-off o valor de 0,15g; hoje já consideramos o valor de 0,12 g, e existe uma tendência para se considerar 0,10g como ponto de corte ideal. Entre os factores que podem interferir na análise da densidade do PSA estão a variabilidade dos dados de avaliação do volume prostático pelo ultra-som, diferenças na proporção do conteúdo glandular e estromal (glândula com o mesmo peso, mas com conteúdo glandular maior irá produzir mais PSA) e outros factores locais, como manipulação prostática, infecções urinárias e prostatites. A Velocidade do PSA A velocidade do PSA é outro dado importante, e signific a avaliação dos valores do PSA num período de tempo definido. É esperado um aumento de 0,75 ng/mL/ano. Se o tempo de duplicação do PSA é superior a 10 meses, há uma recidiva local; quando o tempo de duplicação é inferior a 6 meses, indica recidiva à distância. É considerado um parâmetro útil para avaliação de doença residual em pacientes após cirurgia. Relação PSA Livre/ PSA Total O doseamento de PSA livre e a relação PSA livre/PSA total são utilizadas para aumentar a sensibilidade de detecção do carcinoma da próstata, quando o PSA total é normal (entre 2,6 e 4,0 ng/mL), e melhoram a especificidade quando o PSA total está aumentado, particularmente na faixa entre 4,0 e 10,0 ng/mL. Trinta a 50% dos pacientes com PSA total entre 4,0 e 10,0 ng/mL já possuem doença extra prostática na altura da cirurgia. Valores dessa relação acima de 0,15 sugerem hipertrofia prostática benigna, e abaixo desse nível indicariam investigação mais intensa, na procura de uma possível neoplasia prostática. O prognóstico do carcinoma da próstata depende de muitos factores. Se for diagnosticado precocemente, pode ser curado aproximadamente em 90% dos casos. São considerados factores importantes de prognóstico a ausência de metástases, idade, fase clínica, extensão do tumor e níveis séricos de PSA. O acompanhamento do pós-operatório de prostatectomia radical deve ser realizado pela avaliação do PSA, pois o aumento dos seus níveis ocorre nas recidivas, muito antes de qualquer evidência clínica ou detecção por métodos de imagem. Nódulos palpáveis ao toque rectal são considerados recidiva local. A recidiva à distância é evidenciada por adenopatia pélvica na tomografia computadorizada, aumento de volume e do número de gânglios e alterações na cintilografia óssea. Na recidiva local, o PSA aumenta 2 anos após a cirurgia. Na sistémica, o PSA aumenta antes de 1 ano, após a cirurgia. O acompanhamento das recidivas após a cirurgia é feito pelo doseamento do PSA no pré-operatório, 3 semanas após a cirurgia, trimestral nos primeiros 2 anos, semestral entre 2 a 5 anos e a partir daí, com avaliação anual. O efeito das doenças genitourinárias e da manipulação urológica nos valores do PSA tem sido investigado e discutido. Tem sido relatado aumento dos níveis de PSA nas prostatites agudas e subclínicas, na retenção urinária, citoscopia, cateterização uretral, após ejaculação, biópsia prostática e após massagem prostática vigorosa, porém em graus variados. Acredita-se ser prudente a colheita de soro para doseamento de PSA antes dos procedimentos descritos, para afastar a possibilidade de interferência. Relata-se o período de 48 horas para os valores voltarem a níveis basais após a ejaculação, 1 a 6 semanas após a massagem prostática, e 72 horas após o toque rectal. Alguns trabalhos demonstram a redução de 50% dos valores de PSA 48 horas após a resolução dos quadros de retenção urinária. São necessários cerca de 6 a 8 semanas para a normalização dos níveis de PSA após a resolução do quadro de prostatite aguda e 30 a 40 dias após biópsias. Outro relato importante é a possibilidade de alteração do PSA em ciclistas, usuários de bicicleta ergométrica e praticantes de hipismo. Recomenda-se a suspensão dessas actividades 1 a 2 semanas antes da colheita da amostra, especialmente em pacientes com hipertrofia benigna da próstata. O rastreio anual por doseamento de PSA, para carcinoma da próstata é recomendado pela American Urological Association e pela American Cancer Society, para homens a partir de 50 anos, ou nos casos com história familiar ou ascendência africana, a partir dos 40 anos. O rastreio deve ser realizado pelo exame da próstata por toque rectal e pelo dosemento de PSA. Essa associação aumenta a sua sensibilidade e especificidade, visto que cerca de 15% das neoplasias da próstata pode não produzir aumento dos níveis de PSA, assim como, noutros casos, o PSA pode estar alterado antes da identificação do tumor pelo toque rectal. Existe a necessidade urgente de se identificar novos marcadores que, utilizando sistemas baseados em critérios moleculares, celulares e histológicos, conduziriam a um diagnóstico mais preciso. A meta dessa combinação é identificar, com precisão, pacientes em diferentes estágios do carcinoma da próstata, desde os aparentemente localizados, que requerem terapia local, aos que requerem terapia local e sistémica. Têm sido realizadas tentativas para identificar novos marcadores, como por exemplo o antígenio de membrana próstata-específico (PSMA), proposto recentemente como novo marcador sérico para o carcinoma da próstata (ainda não disponível para uso de rotina), com valor prognóstico clínico, não observado para outros marcadores. Outro passo será a identificação de algumas alterações moleculares e celulares, na fase pré-maligna e nas células malignas, utilizando-se métodos como imunocitoquímica e RT-PCR. Rastreio Neonatal O rastreio neonatal de doenças genéticas é importante para a identificação precoce de indivíduos com doenças metabólicas, particularmente as patologias passíveis de manuseamento dietético ou de tratamento medicamentoso. O rastreio com amostras de sangue colhidas em papel de filtro a partir da punção do calcanhar do recém-nascido - o teste do pézinho - foi implementado na década de 1960, com os testes para fenilcetonúria (PKU), doença do xarope de bordo, homocistenúria, galactosemia e hipotiroidismo congénito. À medida que novas metodologias se desenvolveram, testes relativos a outras doenças foram sendo incluídos paulatinamente no programa de rastreio neonatal. O sucesso das práticas de triagem depende do cumprimento de várias etapas como: esclarecimento da comunidade médica e familiar, controlo da qualidade das amostras sanguíneas e das técnicas laboratoriais e um pronto acompanhamento dos recém-nascidos que se mostrem positivos nos testes diagnósticos. É fundamental que o médico prescritor esteja consciente dos procedimentos de aplicação do teste e dos protocolos individuais do laboratório que o efectua. Resultados falso-positivos podem ocorrer devido a uma série de causas: prematuridade, hemotransfusão, aplicação precoce do teste, inadequabilidade préanalitica da amostra como superaquecimento, uso de antibióticos, etc. Nesses casos, são sempre provocadas angústias desnecessárias. Os pais do recém-nascido devem estar cientes dos benefícios da realização do exame. É necessário que os profissionais médicos e os pais compreendam que um teste positivo para uma determinada doença triada não é sinónimo de recémnascido portador da doença, mas sim que há a necessidade de avaliação profunda imediata. O raciocínio inverso também deve ser considerado, ou seja, apesar de os testes serem, na sua maioria, sensíveis e específicos, qualquer recém-nascido ou lactente que se apresente sintomático, mesmo com rastreio negativo, deve ser reavaliado. Em termos pragmáticos, o tempo para a obtenção da amostra tem sido padronizado para prover o potencial máximo de detecção do maior número de patologias. Condições detectáveis a partir da aferição de marcadores protéicos que estão presentes ao nascimento (por exemplo: hemoglobinopatias, IgM para toxoplasmose, deficiência de galactose 1-fosfato-uridil transferase e deficiência de biotinidase) são adequadamente rastreadas, independentemente da época de realização do teste. Por outro lado, doenças para as quais a detecção adequada depende da acumulação de uma substância específica decorrente de um metabolismo alterado estão completamente vinculadas à época de obtenção da amostra, facto que torna crítica a confiabilidade do rastreio neonatal. Nesse grupo, estão incluídas os doseamentos de tiroxina (T4) e de hormona tireotrófica (TSH) para hipotiroidismo congénito, de fenilalanina para PKU, de galactose para galactosemia e de 17hidroxiprogesterona (17-OHP) para hiperplasia congénita da supra-renal. O timing óptimo para o rastreio é entre 48-72 horas após o nascimento, preferencialmente após a ingestão de dieta láctea. Patologia Incidência Locus cromossómico Deficiência enzimática 1:12.000 12q22-q24 Finilalanina hihoxilase 1:4.000 Maioria dos casos de causa nãocongénita Não existente PKU Hipretiroidismo congénito Incidência A instituição precoce de dieta previne a ocorrência de atrazo mental A instituição precoce de hormonoterapia previne a ocorrência de atrazo mental e do crescimento Hiperplasia congénita da supra-renal 1:12.000 6p21.3 21-hidroxilase (90% dos casos) 1:375 (HbSS) 11p21.3 HbSS 1:250.000 3p25 Biotinodase 1:60.000 9p12.3 Galactose 1fosfato-urudil transferase 1:2.500 -1:9.000 7q31 Não existente 1:1.000 -1:8.000 Causa infecciosa Não existente Hemoglobinopatias Deficiência de biotinidase Galactosemia Fibrose quística (IRT) Toxoplasmose cingênita (IgM) O tratamento precoce previne o excesso de virilização, a baixa estatura e a dificiência de cortisol (resto da vida) A instituição precoce de medidas de suporte diminui a morbi-mortilidade O uso de biotina oral previne e diminui a sintomatologia Alto índice de sequelas cognitivas/endocrinológicas Avaliação rotineira do aparelho respiratório O tratamento específico interrompe a doença aguda. Cuidados universais no manuseamento de sangue são observados. O local da punção deve ser a região lateral da superfície plantar do calcanhar, e não a curva posterior. Medidas como o aquecimento prévio e o manuseamento do pé a ser puncionado abaixo do nível cardíaco aumentam o fluxo sanguíneo local. A assépsia do local é feita com álcool, evitando-se o excesso, sob o risco de diluição da amostra colhida e consequente alteração do resultado de alguns testes. A tabela na página anterior mostra os testes laboratoriais disponíveis na rotina, a incidência das doenças em questão, o locus cromossómico envolvido e sua deficiência enzimática, assim como considerações terapêuticas. Outros exames adicionais podem também ser solicitados na mesma amostra de sangue do recém-nascido, colhida em papel de filtro, tais como: cromatografia de aminoácidos, glicose-6-fosfato desidrogenase, deficiência de desidrogenase dos ácidos gordos de cadeia média, sorologia para SIDA, sífilis, rubéola, citomegaloviros e doença de Chagas. Resistência à Proteína C Activada A resistência à proteína C activada é causada por um defeito hereditário, autossómico dominante, ligado ao gene do factor V, onde ocorre uma troca de aminoácidos (arginina por glutamina) no local onde o factor Va é clivado pela proteína C activada, tornando o factor Va mutante (factor V Leiden) e assim resistente à inactivação pela proteína C. A mutação resulta num aumento importante do risco de trombose. Estudos demonstram que, provavelmente esse defeito corresponda a cerca de 20 a 60% dos casos de trombose de etiologia não-esclarecida. O risco trombótico aumenta significativamente se associado a outros factores de risco, como o uso de contraceptivos orais, gravidez e em idosos. Reticulócitos Os eritrócitos são formados a partir de uma célula mãe na medula óssea. Estimuladas pela eritropoetina, essas células diferenciam-se, dando origem a uma sucessão de divisões mitóticas com um contínuo processo de diferenciação, até à expulsão do núcleo do eritroblasto, dando agora origem ao reticulócito. Esse processo ocorre num período de 72 horas. Nas 48 horas seguintes, o reticulócito em maturação transforma-se num eritrócito. Portanto, o reticulócito é uma célula jovem que representa uma fase intermédia entre os eritroblastos da medula óssea e os eritrócitos maduros, anucleados e já totalmente hemoglobinizados. Por ainda não estarem totalmente maduros, os reticulócitos apresentam-se na periferia como células um pouco maiores que os eritrócitos e com uma coloração azul-acinzentada, que se deve à existência de material nuclear residual de cor azulada associada à cor avermelhada da hemoglobina. A sua avaliação é importante, pois serve como indicador da produção de eritrócitos pela medula óssea. As causas mais comuns de reticulocitose são as hemorragias agudas, as anemias hemolíticas agudas e crónicas e a resposta ao tratamento de reposição de ferro, folato e vitamina B12. Uma contagem diminuída de reticulócitos pode ocorrer nas anemias aplásticas, na invasão medular e nas anemias por carencias antes do respectivo tratamento. Retracção do Coágulo A retracção é a fase final do processo de coagulação e está directamente ligada à actividade funcional adequada das plaquetas. O coágulo pode estar alterado em volume na presença de plaquetopenia e nas anemias. A avaliação da retracção tem maior utilidade na avaliação de deficiências funcionais das plaquetas. É quando a retracção se encontra diminuída, mesmo na presença de um número normal de plaquetas. Pode ser influenciada pela quantidade de trombina e da fibrinogénio e por valores alterados do hematócrito. Rubéola Causada por um vírus RNA do género Rubivirus, a rubéola continua a manifestar-se na população, apesar das campanhas de vacinação, que conseguiram diminuir a incidência da doença. É uma doença normalmente moderada, com complicações pouco frequentes, que pode ser assintomática em cerca de 50% dos casos ou cursar com manifestações clínicas discretas. No entanto, quando ocorre em gestantes suscetíveis, especialmente durante o primeiro trimestre e, com menor frequência, no segundo trimestre de gravidez, pode levar ao aborto espontâneo ou ao síndrome de rubéola congénita, com comprometimentos cardíacos, oculares, auditivos e do sistema nervoso fetal. Os riscos abortivos e teratogénicos da infecção em mulheres grávidas tornam de grande importância a investigação pré-natal de anticorpos contra o vírus da rubéola. O contágio ocorre por via respiratória, e o período de incubação, de 2 a 3 semanas, é seguido por sintomas virais e rash cutâneo maculopapular, com linfadenopatia suboccipital. Os anticorpos anti-rubéola são detectáveis logo após o desaparecimento do rash cutâneo. Os primeiros a aparecer são da classe IgM, detectáveis cerca de 4 a 5 semanas após a infecção (ou vacinação). Actualmente, métodos ultra-sensíveis possibilitam a sua detecção por mais tempo (6 meses ou mais). A seguir, aparecem os da classe IgG, que, quer por infecção natural ou por vacinação, persistem pelo resto da vida. A infecção quase sempre confere imunidade permanente. Entretanto, a reinfecção pode ocorrer, especialmente nos indivíduos vacinados, apresentando aumento da concentração de anticorpos da classe IgG. A resposta de anticorpos da classe IgM está tipicamente ausente ou baixa, mas pode acontecer, embora raramente, o que dificulta significativamente a sua interpretação. Anticorpos IgM são detectados por EIA em 100% dos pacientes entre 11 e 25 dias depois do exantema; em 60% a 80% dos indivíduos 15 a 25 dias após a vacinação, e em 90% a 97% das crianças com rubéola congénita, entre 2 semanas e 3 meses após o nascimento. O anticorpo materno IgG, adquirido passivamente, desaparece após 6 a 7 meses. O feto não desenvolve IgM antes de 18 a 20 semanas de gestação. A imunidade activa é raramente adquirida antes dos 2 anos de idade. Nas investigações de possíveis infecções fetais e pós-natais, é necessário evitar reacções falso-positivas para IgM pela presença de factor reumatóide, mononucleose infecciosa, infecção por parvovírus e citomegalovírus. Em alguns casos, as mulheres grávidas podem ser reactivas para anticorpos IgM para rubéola, citomegalovírus, varicela-zoster e sarampo. Todos os resultados de IgM positivos devem ser confirmados por mais de um método em soros duplos e comparados com a história clínica detalhada. O diagnóstico laboratorial é realizado por técnicas imunoenzimáticas que avaliam e quantificam a presença de anticorpos IgM e IgG, com a finalidade de diferenciar entre infecção aguda, passada, congénita ou vacinação. As novas técnicas imunoenzimáticas eliminaram a possibilidade de resultados falso-positivos e falsonegativos. Pesquisam anticorpos IgG e IgM com maior sensibilidade, permitindo uma detecção mais precoce e efectiva por maior período de tempo. No entanto, a grande sensibilidade desses testes, ao tornar possível a detecção de anticorpos IgM, mesmo em níveis baixos, por um longo período de tempo após a fase aguda, fez com que a presença de IgM não seja suficiente para o diagnóstico da doença em fase aguda. A presença de soroconversão é conclusiva de infecção aguda. A presença de anticorpos IgM indica infecção aguda. Porém, pode ser atribuída a níveis residuais de infecção passada ou reacção pós-vacinação. Actualmente, para definir a fase da doença, dispomos da avaliação dos testes de avidez dos anticorpos IgG. Estes testes baseiam-se na característica de baixa avidez que os anticorpos apresentam pelo antigénio, durante o início da resposta imunológica. Portanto, na infecção recente, estão presentes os anticorpos IgG de baixa avidez, e nas infecções mais antigas, encontramos os de alta avidez. Consideram-se de baixa avidez índices inferiores a 30%, que indicam que a infecção ocorreu nos últimos 3 meses. Índices superiores a 60% são considerados de alta avidez, apontando para uma infecção ocorrida há mais de 3 meses. Valores entre 30% e 60% não permitem a caracterização da fase da doença. Sífilis Doença infecto-contagiosa, essencialmente transmitida pelo contágio sexual, que tem como agente etiológico o Treponema pallidum. É um patogénio exclusivamente humano, com carácter infectante apenas na fase aguda da doença. Após o contágio, a infecção apresenta um período de incubação médio de 3 semanas, após o qual se manifesta a lesão inicial, o cancro duro, com repercussão ganglionar inguinal bilateral e indolor, que evolui para auto-resolução, mesmo se não tratada, em cerca de 1 a 2 meses, sem deixar cicatrizes. Esta fase é denominada sífilis primária. Cerca de 2 a 3 meses após, aparecem as lesões generalizadas da sífilis secundária, que se caracterizam por erupção cutânea generalizada com envolvimento palmoplantar. Caso não-tratada, assume carácter sistémico, evoluindo crónicamente, com períodos de actividade e de lactência. Em cerca de um terço dos pacientes não-tratados ocorre um estágio de manifestações, dito terciário, que se caracteriza por lesões parenquimatosas, musculoesqueléticas, mucocutâneas progressivas, lesões aórticas ou sintomáticas do sistema nervoso central. Cerca de 10% dos pacientes que apresentam a forma primária, caso não-tratados, evoluirão para neurossífilis. A neurossífilis assintomática é a forma mais comum de apresentação. Não há sinais ou sintomas clínicos. Acredita-se que os pacientes que apresentam alterações no líquor, mesmo sem sintomatologia, durante as fases iniciais da doença, tenham mais chances de evoluir para síndromes neurológicos tardios. A progressão das alterações neurológicas pode dar-se com quadros de meningite sifilítica, sífilis meningovascular, meningoencefalite sifilítica, tabes dorsalis e sífilis medular. Portanto, a sífilis pode manifestar-se no sistema nervoso tanto de forma aguda como crónica, e mesmo vários anos após a forma primária. Deve-se dar atenção a essa hipótese, já que a SIDA levou a um aumento da incidência e a formas clínicas atípicas de evolução mais agudas e mais graves dessa doença. As características laboratoriais consistem no achado de alterações do líquor como pleocitose, aumento de proteínas, redução da glicose ou positividade para a reacção de VDRL. O diagnóstico laboratorial da sífilis é feito pela pesquisa directa do treponema, ou pela pesquisa de anticorpos formados durante a infecção, que podem ser de dois tipos: anticorpos não-treponémicos e anticorpos treponémicos. A pesquisa directa, realizada por microscopia de campo escuro, apesar de altamente específica, tem indicação limitada, podendo ser realizada na fase primária, directamente do cancro duro do órgão genital ou noutras localizações. Durante a fase secundária, o material pode ser obtido das lesões cutâneas e no líquido amniótico, placenta, muco nasal e lesões cutâneas de recém-nascidos para a investigação de sífilis congênita. A pesquisa de anticorpos não-treponémicos, inespecífica para o diagnóstico, é feita pela reação de VDRL (Veneral Disease Research Laboratories test), que se mostra positiva numa provável reacção cruzada contra a cardiolipina, componente presente em vários tecidos, sendo indicada como exame de triagem. Estão presentes nas primeiras semanas da doença e, quando em títulos iguais ou maiores de 1/16, sugerem fortemente casos de sífilis; títulos inferiores, geralmente até 1/8, são encontrados em diferentes patologias, especialmente no lúpus eritematoso sistémico e como títulos residuais (cicatriz sorológica) de sífilis anteriormente tratada. O tempo de negativação depende directamente da fase em que foi iniciado o tratamento, podendo nalguns casos, permanecer indefinidamente com baixos títulos flutuantes. A pesquisa de anticorpos treponémicos, que são específicos contra o Treponema pallidum, é indicada como testes confirmatórios e pode ser realizada pela imunofluorescência indirecta (FTA-ABS) e pela hemaglutinação passiva (TPHA). O FTA-ABS (fluorescent treponemal antibody absorption) é o mais sensível, auxiliando no diagnóstico de diferentes estágios da doença. Permite a pesquisa de anticorpos IgG e IgM, fundamental na investigação diagnóstica da sífilis congênita, assim como na avaliação do estágio da doença. Quando positivos, permanecem por toda a vida como cicatriz sorológica. Quando negativos, afastam o diagnóstico de sífilis. Apesar de sua alta especificidade, existem casos de reacções falso-positivas em 2% da população normal em pacientes com lúpus eritematoso sistémico, durante a gravidez, na lepra, mononucleose, leptospirose, artrite reumatóide, cirrose biliar primária e doenças associadas à produção de globulinas anormais. A reacção de hemaglutinação é, também, considerada um teste confirmatório. Resultados falso-positivos são encontrados em diferentes patologias. A sua sensibilidade é similar à do FTA-ABS, com excepção da investigação da fase primária, na qual é menos sensível. Assim como no FTA-ABS, se positivos, os anticorpos permanecem por toda a vida como cicatriz sorológica. O diagnóstico da sífilis congênita baseia-se na presença de anticorpos IgM, sendo o método de escolha a pesquisa do FTA-ABS IgM. No entanto, um resultado negativo não afasta a possibilidade de infecção, já que a positividade só acontece em cerca de 80% dos casos. A persistência de reacções sorológicas positivas, treponémicas e não-treponémicas, por mais de 6 meses após o nascimento é altamente indicativa de sífilis congênita. Sódio O sódio é o maior catião e a principal partícula osmótica do meio extracelular. Por isso, é considerado o íão mais importante do organismo, tanto do ponto de vista quantitativo quanto pela sua importância na manutenção do equilíbrio osmótico e da electro-neutralidade. As alterações da concentração do sódio extracelular resultam em alterações da osmolaridade, que por sua vez, influenciam a distribuição da água corporal. Os distúrbios da homostase do sódio podem ocorrer por excessiva perda, ganho ou retenção de sódio ou por excessiva perda, ganho ou retenção de água. Entre as causas de hiponatremia, o uso de diuréticos e a reposição de líquidos intravenosos hipotónicos são as mais frequentes. As perdas gastrointestinais por vómito, diarréia e drenagem por sonda nasogástrica, sudorese e queimaduras extensas também são importantes fontes de depleção de sódio. Síndrome nefrótica, cirrose, hipoalbuminemia grave, insuficiência cardíaca congestiva e insuficiência renal aguda com oligúria ou crónica com acidose também levam à hiponatremia. Algumas outras patologias podem cursar com hiponatremia, como hipotiroidismo, doença de Addison, distúrbios da secreção de vasopressina e da hormona (ADH) antidiurético que ocorrem em pacientes com doenças crónicas, dor, stress físico ou emocional, neoplasias e distúrbios metabólicos do sistema nervoso central. A velocidade da diminuição do sódio é proporcional à gravidade dos sintomas clínicos observados. A concentração de sódio pode estar também diminuída em condições de hiperglicemia, nas quais o líquido é atraído do meio intracelular para o extracelular, levando a uma diluição. O aumento excessivo de triglicerídeos e de proteínas também pode ser a causa de hiponatremias por diluição (falsas hiponatremias). Reposição deficiente oral ou venosa de água, diurese excessiva (diurese osmótica e diabetes insipidus central ou nefrogénico), perda pela pele, pulmão ou tubo gastrointestinal sem reposição líquida, superdosagem parenteral por hidratação endovenosa ou hiperalimentação parenteral, síndrome de Cushing e o hiperaldosteronismo primário podem levar a hipernatremia. O sódio é livremente filtrado pelos glomérulos, e cerca de 60% do sódio filtrado é reabsorvido no túbulo proximal. Também ocorre reabsorção de sódio ao longo dos outros segmentos dos nefrónios. Receptores localizados nas células justaglomerulares são sensíveis à diminuição da pressão arterial ou da concentração de sódio no filtrado e estimulam a secreção de renina. A renina estimula as suprarenais a produzirem aldosterona, que regula a reabsorção de sódio e a secreção de potássio. Deste modo, quando ocorre uma diminuição do nível de sódio ou quando o rim é hipoperfundido, os túbulos distais sob a influência da aldosterona retêm sódio. Portanto, a avaliação da concentração do sódio urinário é importante como apoio ao diagnóstico diferencial das hiponatremias em causas renais e extra-renais e dos casos de oligúria. Níveis urinários aumentados são encontrados na doença de Addison, nas nefrites com perdas de sal, nas dietas com teor excessivo de sódio, na acidose tubular renal, no uso de diuréticos e no sindrome de secreção inapropriada da hormona antidiurética, entre outras condições. Níveis diminuídos podem existir na desidratação, na insuficiência cardíaca congestiva, nas hepatopatias, no síndrome nefrótico, em situações que levem à diminuição da taxa de filtração glomerular e em dietas pobres em sódio. SÓDIO URINÁRIO NA AVALIAÇÃO DE OLIGÚRIAS Pré-renal < 20 mEq/ml Renal > 30 mEq/ml Pós-renal > 30 mEq/ml Tempo de Protrombina Os fármacos anticoagulantes orais actuam sobre os factores da coagulação pertencentes ao sistema extrínseco da coagulação. Por isso, o (TP) tempo de protrombina é o exame de eleição para a monitorização da terapêutica com estes fármacos. Por avaliar a via extrínseca, o TP pode estar elevado na deficiência isolada do factor VII, na presença de anticorpos inibidores circulantes e em patologias que afectem o processo de absorção, síntese e metabolização da vitamina K, visto que a produção desse factor é dependente dessa vitamina. Pode apresentar-se alterado também, quando ocorre um comprometimento da fase final da via comum (X, V, II e I). Como teste de referência para o acompanhamento da anticoagulação oral, o TP não fornecia a uniformidade desejada. As tromboplastinas utilizadas (inicialmente tecido humano e actualmente oriundas de tecido animal) geravam resultados que variavam amplamente em comparações intra e interlaboratoriais. Estas variações representavam um grande entrave ao acompanhamento adequado dos pacientes. Por este motivo, depois de diferentes tentativas de padronização, em 1983, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estabeleceu, em conjunto com o Comité Internacional de Trombose e Hemostasia e a Comissão Internacional de Padronização em Hematologia, a recomendação para a utilização mundial do ISI (International Sensibility Index) e a conversão dos resultados obtidos em INR (International Normalized Ratio). Os fabricantes mundiais de tromboplastina foram orientados para padronizar o seu reagente, comparando as suas tromboplastinas com a tromboplastina de referência mundial da OMS. Com esses dados, podem calcular o índice de sensibilidade internacional (ISI) para cada lote de tromboplastina produzido. Esse valor de ISI, fornecido pelo fabricante em cada lote enviado, é utilizado para o cálculo do INR (razão normalizada internacional). Quanto maior o ISI, menor a sensibilidade do reagente. O INR é obtido por um cálculo que divide o valor do TP encontrado na amostra do paciente pelo resultado do TP de um pool de plasmas normais, elevados ao ISI. Portanto, na prática, ele passa a funcionar como um TP padronizado intra e inter laboratorialmente. A alteração do TP com o uso de anticoagulantes orais é obtida em média 3 a 5 dias após o início da administração. Durante este período, a avaliação do TP deve ser feita diariamente, até que o INR alcance o valor terapêutico preconizado como ideal para a condição clínica de que se está a tratar. Além disso, a avaliação deverá manter a frequência diária, até que se comprove a estabilidade dos valores obtidos. O acompanhamento do paciente pelos valores do INR só deve ser feito em pacientes com resultados já estabilizados. O horário ideal para a colheita do sangue para avaliação do TP está directamente relacionado com o horário da administração do medicamento. Os principais protocolos apontam para que os anticoagulantes devam ser administrados à tarde (18 h) e o sangue colhido na manhã seguinte (até as 10 h), de modo a garantir a absorção adequada do medicamento. No entanto, na prática, a melhor indicação é que o paciente tome o medicamento sempre no mesmo horário e faça a colheita no mesmo prazo em que realizou as anteriores. REFERENCIAIS DE ALVOS TERAPÊUTICOS Maioria das situações com indicação de anticoagulação 2.0-3.0 Prevenção e tratamento de trombose venosa Embolia pulmonar, sistêmica Embolia arterial pós-operatória Infarto agudo do miocardio Doença de válvula cardíaca Fibrilação atrial .................................................................. Prótese cardíaca 2.5-3.5 .................................................................. Formas recidivantes de trombose venosa profunda 3.0-4.0 Formas recidivantes de embolia pulmonar .................................................................. Adaptação das recomendações do American College of Physicians, National Heart Lung, and Blood Institute e British Society for Haemalotogy Diversos factores podem interferir na acção dos anticoagulantes orais. O primeiro problema, e o mais comum, é a adesão adequada do paciente ao tratamento. Outros factores importantes são o teor de vitamina K da dieta, a dose em relação à massa corporal, interacções medicamentosas, integridade da função hepática e comportamento metabólico individual quanto ao fármaco. Em relação ao uso de outros fármacos, sabemos que existe a interferência com a interacção entre drogas que podem potenciar, diminuir ou inibir a acção dos anticoagulantes orais, por diferentes mecanismos, alterando a sua acção terapêutica. FÁRMACOS QUE ALTERAM A ACÇÃO DOS ANTICOAGULANTES ORAIS POTENCIALIZAM Alguns antibióticos, anti-inflamatórios, ácido acetilsalicílico, antidepressivos tricíclicos anti-agragantes plaquetários, cimitidina e outros fármacoas com acção no tracto gastrointestinal, hormonas teroidéias, anti-lipémicos, imunossupressores, inibidores de MAO, entre outras. ........................................................................................ INIBEM Alguns antibióticos, antiácidos, contraceptivos orais, barbitúricos, antifúngicos, álcool, diuréticos, corticosteróides, anti-histamínicos, esteróides, entre outros. ........................................................................................ DIMINUEM Laxantes, Vitamina C. Tempo de Coagulação O tempo de coagulação é um teste de baixa sensibilidade e de reprodutibilidade muito variável, sendo afectado principalmente por alterações da via intrínseca, do fibrinogénio e fibrina. Pode estar elevado no decurso de heparinoterapia. Este teste é substituído pela realização do tempo de tromboplastina parcial activado (TTPA), que fornece um resultado fidedigno das alterações de via intrínseca. Tempo de Sangria É um indicador de alterações numéricas (quantitativas) e funcionais (qualitativas) das plaquetas. Geralmente, mantém-se normal, mesmo quando as plaquetas se encontram diminuídas, mas acima do limite de 100.000/mm3. Em pacientes com plaquetopenia, a variação do tempo de sangria mantém uma boa correlação com os valores das plaquetas. Valores alterados podem ser encontrados nos defeitos congénitos das plaquetas, como a trombastenia de Glanzmann, e nos adquiridos, como nos quadros de uremia e síndromes mieloproliferativos. Tempo de Tromboplastina Parcial Activada O tempo de tromboplastina parcial activada (TTPA) avalia defeitos da via intrínseca da coagulação, podendo, portanto, constatar a deficiência dos factores VIII, IX, XI e XII. É útil também no controle do uso terapêutico de heparina e na avaliação da presença de anticoagulantes circulantes. Pode apresentar-se alterado também quando ocorre comprometimento da fase final da via comum (X, V, II e I). O achado de TTPA prolongado na presença de TP normal indica a possível deficiência dos factores XII, XI, IX, VIII. Ao contrário, TTPA normal na presença de TP prolongado indica comprometimento do factor VII. Quando ambos (TTPA e TP) estão alterados, indicam comprometimento da fase final da via comum, ou seja, dos factores X, V, II e I. Já ambos normais indicam pacientes sem alterações ou comprometimento do factor XIII. Teofilina A teofilina é um potente broncodilatador amplamente utilizado em doenças pulmonares obstrutivas agudas e crónicas. Além do efeito broncodilatador, possui efeitos no aumento da clearance mucociliar, efeitos vasodilatadores, diuréticos, sob a contracção diafragmática, e um efeito miocárdio inotrópico positivo. O nível sérico terapêutico está entre 10 a 20 mg/mL. Apresenta uma semi-vida de cerca de 8 horas em não-tabagistas e de 5 horas em tabagistas. A metabolização é extremamente individualizada, indicando a necessidade de monitorização adequada das concentrações séricas. São observadas grandes discrepâncias entre a dose administrada e as concentrações séricas em indivíduos submetidos a doses idênticas. Cerca de 90% do fármaco é metabolizado no fígado, e cerca de 60% encontra-se ligada a proteínas. O estado de equilíbrio é alcançado por volta das 48 a 72 horas. A teofilina atravessa a barreira transplacentária, podendo ser teratogénica. Os efeitos colaterais mais comuns são náuseas, vómitos, diarreia, taquicardia, arritmias, convulsões e hemorragias gastrointestinais. O uso de teofilina pode diminuir a acção da fenitoína, do lítio e de bloqueadores neuromusculares. O uso concomitante de cimetidina, alopuridol, propranolol, contraceptivos orais, amiodarona, lincomicina e infecções pelo vírus influenza ou mesmo a vacinação para esse vírus podem aumentar a concentração da teofilina. Rifampicina, fenitoína e fenobarbital podem diminuir a concentração da teofilina. Os estados de insuficiência cardíaca, doenças hepáticas, febre prolongada e obesidade aumentam a semi-vida da teofilina, e consequentemente os seus níveis séricos. A semi-vida está diminuída em fumadores, existindo casos que indicam a necessidade de uma quantidade 1,5 a 2 vezes maior do fármaco para se obter o mesmo efeito que se consegue em pacientes não-fumadores. A semi-vida está diminuída também em recém-nascidos. A colheita deve ser realizada 2 horas após a administração oral ou 30 minutos após a administração por via endovenosa. Teste de HAM O teste de Ham consiste numa prova de lise ácida realizada em soro acidificado a 37º C, na qual as hemácias comprometidas, ao contrário das normais, sofrem lise na presença de complemento. É um teste pouco sensível mas com alta especificidade. É utilizado na investigação da hemoglobinúria paroxística nocturna (HPN). A HPN é uma patologia adquirida, em que a medula óssea produz hemácias com membranas celulares defeituosas, o que as torna sensíveis à lise pelo complemento. Clinicamente, estes pacientes apresentam hemólise intravascular crónica, e muitos deles cursam com episódios de trombose venosa recidivante. Teste Triplo (rastreio pré-natal) Até alguns anos atrás, se uma mulher, durante a gravidez, quisesse saber se seu bebé nasceria normal, a única opção seria submeter-se a exames de carácter invasivo. Ainda hoje, esses procedimentos estão em uso e envolvem riscos de 0,5 a 1,5%. Ou seja, 1 a 3 mulheres em cada 200 submetidas a punção correm algum risco, que pode ser desde uma infecção até danos de continuidade da gestação. Apesar de pequena, essa incidência de risco já seria pelo menos três vezes maior do que a probabilidade de nascimento de um bebé com problemas. Com a divulgação, pelos meios de comunicação, de métodos diagnósticos prénatais, muitas mulheres resolveram submeter-se ao procedimento, independentemente da idade, basicamente por conta de ansiedades em relação à gravidez. A grande maioria dessas pessoas encontra-se no grupo chamado de baixo risco, ou seja, abaixo dos 35 anos. Nesse caso, pela pequena probabilidade de nascimento de um bebé com anomalia cromossómica, o procedimento não seria indicado. Os exames invasivos só seriam então indicados quando o risco de anormalidade fosse maior do que o risco do procedimento. É por isso que, em geral, mulheres com 35 anos de idade ou mais, primíparas, são encaminhadas aos exames de punção. Novas alternativas de investigação por meio de exames não-invasivos avaliam estatisticamente os riscos de gestação do feto com anomalia cromossómica. O rastreio bioquímico, ou teste triplo (TT), é uma dessas alternativas. Nele, são doseados a alfafetoproteína, a gonadotrofina coriónica e o estriol livre, numa amostra de sangue da gestante, colhida entre 15 e 19 semanas de gestação. Por intermédio desse exame, é possível detectar cerca de 60% das anomalias cromossómicas. Além disso, quando colhido entre 16-18 semanas, também é possível avaliar riscos para algumas malformações, como defeitos do tubo neural e da parede abdominal. O cálculo de riscos no exame tem como base o risco de nascimento de um portador da síndrome de Down, pela idade materna (probabilidade inicial), sendo recalculado pelos resultados dos doseamentos hormonais realizados. Um exame tendo como resultado risco aumentado não significa que o feto apresente alterações, apenas indica que estatisticamente estará justificada a realização dos procedimentos tradicionais para complementação e definição diagnóstica, como a biópsia de vilo corial ou a amniocentese. Isto fica claro quando se observa um grupo de gestantes que fizeram o exame. Cerca de 5% (do grupo de gestantes até 34 anos) e 30% (do grupo com idade de 35 anos ou mais no parto) foram selecionadas para punção de líquido amniótico. De todas as gestantes que fizeram o exame invasivo, apenas 1 a 2 em cada 100 tiveram confirmação de alteração no feto. Outros marcadores indirectos para as anomalias cromossómicas também têm sido utilizados, em especial a medida ultra-sonográfica da translucência nucal (TN) com 11-13 semanas de gestação (rastreio biofísico), com detecção de quase 70% dos fetos com anomalia cromossómica e 50% dos fetos com síndrome de Down. Os exames de rastreio já foram aplicados em centenas de milhares de gestantes em todo o mundo e têm mostrado excelentes resultados, especialmente hoje, quando, ao contrário do que ocorria no passado, os casos de gestações tardias em primíparas são cada vez mais frequentes. É uma maneira de, prevenindo punções desnecessárias, detectar no imenso grupo de gestantes de baixo risco, que não fariam nenhum exame específico da parte genética, aquelas que estariam correndo risco de estar a gerar um bebé com anomalia cromossómica. Deste modo, o casal poderá ter maiores informações quanto ao bem-estar de seu bebé e eventuais opções quanto à gestação. Os métodos são simples, seguros, e têm causado grande impacto em todo o mundo na prevenção do atrazo mental e das malformações congénitas ligadas a anomalias cromossómicas. Convém salientar alguns aspectos dos exames de rastreio: - Fazem parte da rotina pré-natal e são principalmente indicados para gestantes jovens e sem histórico de anomalia cromossómica - Os resultados refletem probabilidades (maior ou menor) de estar a gerar um feto com anomalia cromossómica. Um exame alterado indica investigação adicional, que, na maioria das vezes, apenas confirma a normalidade do bebé; exames normais diminuem riscos, mas não garantem a normalidade do bebé em todos os aspectos. Considerando a limitação dos exames em detectar todos os fetos com anomalias cromossómicas, a realização de testes de rastreio em sequência (TN com 11-13 semanas, seguido por TT com 15-19 semanas e complementado por ultrasonografia morfológica com 20-22 semanas) tem sido de grande utilidade para tranquilizar a maioria dos casais. Resultados normais em todos os exames diminuem acentuadamente os riscos de anomalias. Por outro lado, cada novo exame oferece mais uma possibilidade de detectar falsas normalidades de um exame anterior. Tiróide A regulação da função tiroideia começa no hipotálamo, com a secreção da hormona libertadora de tireotrofina (TRH), que por sua vez estimula a síntese e a libertação da hormona estimuladora da tiróide (TSH). A secreção de TSH é regulada não apenas pela TRH, mas também pelos níveis de T4 e T3 livres circulantes. Inúmeros fármacos, bem como algumas hormonas, podem interferir na função tiroideia. Hipertiroidismo O hipertiroidismo decorre do excesso de hormonas tiroideias circulantes. Laboratorialmente, caracteriza-se por TSH suprimido e T3 e/ou T4 elevados. Uma vez que as hormonas tiroidéias circulam no sangue ligados às proteínas, e que apenas a fracção livre da hormona é metabolicamente activa, nos casos que cursam com a diminuição da TBG (thyroid binding globulin), podemos encontrar apenas as fracções livres de T3 e T4 elevadas, enquanto os níveis séricos do T3 e T4 totais podem estar em níveis normais ou até baixos. A causa mais comum é a doença de Basedow Graves, ou bócio difuso tóxico (85% dos casos). É uma doença auto-imune causada por auto-anticorpos circulantes dirigidos contra receptores na superfície da célula tiroidéia: anticorpos estimuladores da tiróide (TSAB). Podem ocorrer anticorpos que não estimulam a função tiroidéia, mas apenas se ligam ao receptor de TSH. A diversidade de acção desses anticorpos gera variações na expressão clínica da doença, bem como uma variedade de denominações e testes para detectá-los. O denominado anticorpo anti-receptor de TSH (TRAB) identifica a presença de anticorpos que se ligam ao receptor de TSH, independentemente da sua acção ser estimulatória ou não. Outras etiologias do hipertiroidismo são bócio nodular tóxico, tumores secretores de HCG, tumores hipofisários, carcinomas tiroidéios, ingestão excessiva de iodo, hipertiroidismo fictício por uso de T3 e/ou T4 e tiróidite. Os sintomas clínicos de tirotoxicose estão relacionados com efeitos catabólicos e hipermetabólicos causados pelo aumento da actividade em vários tecidos e maior sensibilidade às catecolaminas: perda de peso e de massa muscular, dispnéia, fadiga, nervosismo, irritabilidade, insónia, tremor, intolerância ao calor, sudorese excessiva, taquicardia, palpitações, pele quente e húmida. A maioria dos pacientes tem manifestações de oftalmia não-infiltrativa, com olhar brilhante e lid lag. A oftalmia infiltrativa manifesta-se com protrusão do globo ocular (exoftalmia). Pode ocorrer ainda edema pré-tibial. Hipotiroidismo O hipotiroidismo surge quando os níveis das hormonas tiroidéias são insuficientes para preencher as necessidades metabólicas das células. Laboratorialmente, caracteriza-se pela elevação dos níveis séricos do TSH e pela diminuição dos níveis de T3 e T4. O hipotiroidismo pode ser congénito ou adquirido. O hipotiroidismo primário consiste na deficiência tiroidéia propriamente dita, e é responsável pela maioria dos casos de hipotiroidismo congénito, que ocorre aproximadamente em 1 por cada 4.000 nascimentos. O hipotiroidismo secundário é consequente à falência hipofisária na secreção de TSH e, geralmente, deve-se a um tumor hipofisário. Já o hipotiroidismo terciário resulta da falência hipotalâmica na secreção de TRH, geralmente causada por tumor, insuficiência vascular, infecção, processo infiltrativo ou trauma. O hipotiroidismo adquirido é a secreção inadequada das hormonas tiroidéias devido ao dano da tiróide, como os causados por tiroidite crónica, cirurgia, tratamento com iodo radioactivo para hipertiroidismo ou carcinoma, atrofia idiopática e carcinoma metastático. A tiroidite crónica, chamada tiroidite de Hashimoto, é a causa mais frequente de hipotiroidismo primário adquirido. É uma doença auto-imune resultante da infiltração da glândula tiróide por linfócitos, células plasmáticas e tecido conjuntivo. Pode ser geneticamente determinada e leva à produção de linfócitos sensibilizados e anticorpos contra a tiróide, podendo eventualmente, causar a destruição do tecido tiroidéio. Acima dos 50 anos de idade, o número de novos casos diagnosticados tem aumentado exponencialmente. A manifestação clínica pode variar, e o paciente pode ser hipotiroideu, eutiroideu ou hipertiroideu. Clinicamente, o hipotiroidismo congénito ou cretinismo está associado a pescoço curto e largo, língua aumentada e protrusa, pernas curtas, abdómen distendido, voz ou choro rouco, pele seca, letargia e atrazo mental. Estes sintomas manifestam-se caso o tratamento do recém-nascido não seja iniciado precocemente. A deficiência adquirida das hormonas tiroidéias torna mais lentos os processos metabólicos, provocando fadiga, atrazo mental, alterações de personalidade, déficit de memória, intolerância ao frio, dispnéia de esforço, rouquidão, constipação e parestesias. O hipotiroidismo grave é denominado mixedema e carateriza-se pela infiltração da pele por mucopolissacarídeos, com a face edemaciada, especialmente em torno dos olhos. A língua apresenta-se aumentada, e o espessamento das cordas vocais leva à rouquidão. Ocorrem bradicardia e aumento de peso, a contractilidade miocárdica é reduzida, e a frequência cardíaca torna-se mais lenta. A anemia pode estar presente e ser consequência de hipometabolismo, de redução das necessidades de oxigénio e de diminuição da eritropoietina. O coma mixedematoso é a apresentação mais severa do hipotiroidismo: coma, hipotermia, hipoglicemia, hipotensão, hiponatremia e falência respiratória com alta taxa de mortalidade. Tiroidites As tiroidites podem ser classificadas como aguda, subaguda, crónica e fibrótica (ou tiroidite de Riedel). As manifestações clínicas variam de acordo com o tipo de tiroidite. A tiroidite aguda é rara, e caracteriza-se por abcesso e supuração da tiróide. O início é abrupto, com febre, calafrios e mal-estar. Geralmente, é provocada por uma infecção bacteriana, particularmente por estafilococos, estreptococos ou pneumococos, por disseminação de focos sépticos ou secundária a lesão do pescoço. A tiroidite subaguda, conhecida como tiroidite de Quervain, é possivelmente causada por um vírus, podendo ser acompanhada de infecção do tracto respiratório superior, dor na região da tiróide e febre. A tireidite crónica, também conhecida como linfocítica, ou doença de Hashimoto, é uma doença auto-imune com intenso infiltrado inflamatório crónico da tiróide. A presença de auto-anticorpos conduz, eventualmente a destruição do tecido tiroideu. As manifestações da tiroidite de Hashimoto são extremamente variáveis, podendo ser do tipo hipo, hiper- ou eutiroidismo. O sinal principal é a presença de um bócio indolor. Em estadios finais, quando a fibrose é importante, o paciente pode não ter bócio. A tiroidite de Riedel é de etiologia desconhecida e caracteriza-se por fibrose extensa. Neoplasias Tiroidéias Podem ocorrer isoladamente ou associadas a bócios nodulares benignos. Alguns adenomas são normofuncionantes, e outros são hiperfuncionantes. Os adenomas foliculares são tumores encapsulados, benignos, e os mais encontrados. O carcinoma tiroideu é mais frequente em pacientes submetidos a irradiação do pescoço na infância. Os tumores malignos são classificados como papiloma, folicular, indiferenciado, medular e epidermóide. O carcinoma papiloma é o mais frequente. O carcinoma medular é responsável por 5% dos carcinomas e é derivado das células parafoliculares da tiróide. Pode ocorrer esporadicamente ou ter um padrão familiar, associado a outras neoplasias endócrinas. Hormona Estimulante da Tiróide (TSH) É muito útil no diagnóstico do hipotiroidismo primário, sendo a primeira a ser alterada. Na fase inicial da doença, apenas o TSH se encontra elevado, enquanto os níveis séricos do T3 e T4 permanecem normais. Com a introdução de ensaios ultrasensíveis, o doseamento de TSH tornou-se valioso para a detecção do hipertiroidismo, substituindo em muitos casos a prova do TRH. Tiroxina (T4) Anticoncepcionais, gravidez e beta-bloqueadores elevam os níveis de T4, sem que isso necessariamente signifique doença tiroidéia. Outros factores que podem interferir são o uso de hormonas tiroidéias, alteração congénita dos níveis de TBG, uso de salicilatos, diazepam e corticóides, desnutrição, patologias hepáticas ou renais, outras drogas e a presença de anticorpos anti-T4. É útil no diagnóstico do hiper- e do hipotiroidismo. Nos casos de hipotiroidismo primário, é a segunda alteração laboratorial a surgir. Após a elevação do TSH, ocorre a diminuição do T4, podendo o T3 ainda permanecer em níveis normais. Apenas nos estados mais avançados da doença ocorrerá diminuição do T3. Tiroxina Livre (T4L) A fracção livre reflete o efeito metabólico da hormona, sendo indicada para avaliação do hiper- e do hipotiroidismo, minimizando a influência das proteínas séricas. Torna-se assim, mais valiosa do que o doseamento do T4 total, especialmente em grávidas ou em mulheres a fazer anticoncepcionais. É apontado como uma interferência o uso de hormona exógena, de drogas antitiroidéias e de beta-bloqueadores. Triiodotironina (T3) Útil no diagnóstico de hipertiroidismo. No hipotiroidismo, é a última a ser alterada, podendo ainda permanecer normal mesmo com TSH elevado e T4 diminuído. Pode estar diminuída nas doenças graves em geral, no uso de beta-bloqueadores ou corticóides. Triiodotironina Livre (T3L) A grande indicação do T3L é o diagnóstico e o acompanhamento do paciente hipertiroideu. Globulina Ligadora da Tiroxina (TBG) É a principal proteína transportadora das hormonas da tiróide. O aumento ou a diminuição conduz a uma resposta paralela da T4 e T3 totais. São consideradas as causas mais comuns de aumento da TBG: gravidez, uso de estrógenios, hepatite aguda, salicilatos, diazepam, fenilbutazona e factores congénitos. Síndrome nefrótico, andrógenios, corticóides, cirrose hepática, desnutrição e factores congénitos são considerados as causas mais comuns de diminuição de TBG. Tireoglobulina (TG) Varia com o estado funcional da glândula e encontra-se elevada no hipertiroidismo, em tiroidites e em carcinomas da tiróide. O seu principal valor é no seguimento de carcinomas pós-cirúgicos (especialmente papiloma, folicular e misto papilomafolicular). Para isso, é fundamental o dosemento pré-operatório da tireoglobulina e do seu anticorpo, permitindo um acompanhamento da queda dos níveis de TG no pós- operatório. Se no pré-operatório os níveis de TG forem muito baixos, ou o anticorpo for positivo, o teste não terá importância no acompanhamento do caso específico. Calcitonina O seu doseamento é útil para o diagnóstico dos casos de carcinoma medular da tiróide, dos quais cerca de 10% é familiar e normalmente integra os componentes da neoplasia endócrina múltipla tipo II. Aproximadamente 30% dos carcinomas medulares da tiróide apresentam níveis basais normais. Por isso, é necessário o teste de estímulo com pentagastrina para o diagnóstico. A calcitonina pode estar elevada nos carcinomas pulmonar, do pâncreas e da mama, na insuficiência renal, anemia perniciosa, cirrose, síndrome de Zollinger-Ellison, gravidez a termo e recém-nascidos. Anticorpos antitiroideus A pesquisa de anticorpos antiroideus é também de grande importância nas doenças auto-imunes da tiróide. Os mais pesquisados são os anticorpos antitiroglobulina (anti-TG), antiperoxidase (anti-TPO) e anti-receptor do TSH (Trab). Consultar Anticorpos Antireóidianos. PATOLOGIAS HIPERTIROIDISMO HIPOTIROIDISMO PRIMÁRIO HIPOTIROIDISMO SECUNDÁRIO HIPOTIROIDISMO TERCIÁRIO TSH T3 T3L T4 T4L TRH Suprimido Hiper-reactivo Não-reactivo Gradualmente reactivo Interferências Medicamentosas FÁRMACOS T4 TOTAL T3 TOTAL Amiodarona Ácido iopanóico TBG N N/ N/ N Danazol N N Fenilbutazona Fenobarbital - Furosemida N/ N/ N N N/ N/ Lítio N/ N Propiltiouracil N/ N/ Resorcina N/ N N N - N - N N/ - N - Propanolol N - Iodo Salicilatos N/ N/ Heparina Metoclopramida - N/ ou N Fenitoína Glicocorticóides - N Estrogénio N - N/ N/ Diazepam Dopamina N Carbamazepina TRH N/ - N/ Androgénios Anfetamina TSH - - - N ou - - - - - - Sulfoniluréia N/ - - - Toxoplasmose A toxoplasmose é uma zoonose causada pelo Toxoplasma gondii. É um parasita de vida intracelular obrigatória. A transmissão aos humanos normalmente ocorre por ingestão de oocistos em alimentos crus ou mal cozidos, água não-potável, contacto com animais infectados e por via transplacentária. A infecção é, geralmente, assintomática ou subclínica, com raros casos graves, que se manifestam especialmente em indivíduos imunocomprometidos e na gravidez, levando a riscos abortivos e teratogénicos. No feto, causa lesões cerebrais e oculares, de gravidade variável, dependendo da fase da gestação em que ocorreu a infecção. No adulto, na fase aguda, raros casos mais graves podem evoluir com coriorretinite e comprometimento cerebral. Indivíduos infectados não-tratados na fase aguda podem evoluir para a doença crónica, por persistência da forma quística do parasita, podendo ocorrer a activação da doença em situações de comprometimento do estado imunológico. Aliado ao facto de que a maioria dos casos não apresenta dados clínicos significativos, existe uma grande incidência de anticorpos IgG na população, apresentando positividade em cerca de 70 a 90% dos adultos investigados. Isso cria uma dificuldade para se estabelecer o diagnóstico clínico e sorológico, o que torna a realização e a interpretação da sorologia para toxoplasmose de grande importância, especialmente na possibilidade de infecção congénita. A investigação sorológica para toxoplasmose deve ser sempre realizada no período pré-natal. A detecção de anticorpos IgG, indicando infecção passada, afasta o risco de possibilidade de toxoplasmose congénita. Mulheres com sorologia negativa devem ser consideradas grupos de risco e acompanhadas durante toda a gestação. O diagnóstico sorológico baseia-se na demonstração de anticorpos específicos contra antigénios do Toxoplasma gondii no soro dos pacientes infectados. Anticorpos IgG e IgM podem ser detectados por imunofluorescência indireta (IFI), hemaglutinação e testes imunoenzimáticos. Os anticorpos da classe IgG aparecem de 1 a 2 semanas após a infecção e persistem por toda a vida. A detecção de anticorpos da classe IgM é utilizada para diagnóstico de infecção aguda e geralmente surge cerca de 5 dias após o contacto com o parasita, desaparecendo após algumas semanas ou meses. Porém, baixos títulos de IgM podem permanecer por um tempo superior a 1 ano. A grande sensibilidade desses testes torna possível a detecção de anticorpos IgM, mesmo em níveis baixos, por longo período de tempo após a fase aguda, fazendo com que a presença de IgM não seja suficiente para o diagnóstico da doença em fase aguda. Este facto pode levar a incertezas quando os anticorpos IgM e IgG são detectados numa primeira amostra de sangue de uma gestante, podendo tratar-se de uma infecção adquirida anteriormente à gravidez, que não traz riscos para o feto, ou de uma infecção aguda, que requer intervenção e tratamento. Portanto, actualmente, para definir a fase da doença, dispomos da avaliação dos testes de avidez dos anticorpos IgG. Esses testes baseiam-se na característica de baixa avidez que os anticorpos apresentam pelo antigénio, durante o início da resposta imunológica. Portanto, na infecção recente, estão presentes os anticorpos IgG de baixa avidez, e nas infecções mais antigas, encontramos os de alta avidez. Consideram-se de baixa avidez índices inferiores a 30%, que indicam que a infecção ocorreu nos últimos 4 meses; índices superiores a 60% são considerados de alta avidez, apontando para uma infecção ocorrida há mais de 4 meses. Valores entre 30% e 60% não permitem a caracterização da fase da doença. O diagnóstico de infecção fetal é, actualmente, realizado pela pesquisa de toxoplasma no líquido amniótico pela técnica de PCR. O doseamento de IgM em amostras colhidas por punção do cordão umbilical, além de ser realizada somente a partir da 22ª semana de gestação, é pouco sensível, não detectando baixos níveis de IgM pelos métodos disponíveis. O diagnóstico da infecção congénita em recém-nascidos é dificultado pela positividade para IgG, indicando transferência transplacentária de anticorpos maternos que permanecem positivos por cerca de 6 a 18 meses. A presença de IgM, que não tem passagem transplacentária, pode indicar infecção fetal, porém não é suficiente para se estabelecer o diagnóstico, visto que o feto pode produzir anticorpos IgM tardiamente. Actualmente, o método de escolha para o diagnóstico de toxoplasmose congénita é a pesquisa de toxoplasma no sangue periférico do recém-nascido ou do cordão umbilical pela técnica de PCR. Transaminase Oxaloacética A aspartato aminotransferase - AST, antigamente denominada transaminase oxaloacética, é encontrada em diversos órgãos e tecidos, incluindo coração, fígado, músculo esquelético e eritrócitos. Está presente no citoplasma e também nas mitocôndrias, e portanto a sua elevação indica um comprometimento celular mais profundo. No caso do hepatócito, isso revela-se por uma elevação por tempo mais prolongado no curso das hepatites virícas agudas e uma elevação selectiva nos casos de hepatites alcoólicas, metástases hepáticas e necroses medicamentosas e isquémicas. Aumentos da AST no soro são muitas vezes encontrados no enfarte agudo do miocárdio, elevando-se nas primeiras 12 horas e apresentando um pico sérico após cerca de 24 horas, com retorno aos valores normais num período de 3 a 5 dias. Valores discretamente elevados podem ser encontrados também no enfarte pulmonar, no enfarte renal ou em casos de grandes tumores, na embolia pulmonar, distrofias musculares, dermatomiosite, traumas da musculatura esquelética, no pós-operatório, especialmente de cirurgias cardíacas, cirrose alcoólica, hepatite induzida por fármacos, mononucleose infecciosa, citomegaloviroses, anemias hemolíticas, pancreatite aguda e acidente vascular cerebral. Transaminase Pirúvica A alanina aminotransferase - ALT, antigamente denominada transaminase pirúvica, é encontrada abundantemente no fígado, em quantidades moderadas no rim e em pequenas quantidades no coração e na musculatura esquelética. A sua origem é predominantemente citoplasmática, fazendo com que se eleve rapidamente após a lesão hepática, tornando-a um marcador sensível da função do fígado. Como marcador hepatocelular, apresenta valores alterados em patologias que cursam com necrose do hepatócito, como hepatites virícas, mononucleose, citomegalovirose e hepatites medicamentosas. Entretanto, é um marcador menos sensível que a AST para hepatopatias alcoólicas, cirrose activa, obstruções extrahepáticas e lesões metastáticas do fígado. Pode apresentar-se elevada, em situações de trauma da musculatura esquelética, miosites e miocardites, e normal ou discretamente elevada nos casos de enfarte agudo do miocárdio. Em recém-nascidos, podem ser encontrados valores superiores aos de referência, o que é atribuído à imaturidade dos hepatócitos nos recém-nascidos, que apresentam as membranas celulares mais permeáveis. Os valores igualam os níveis do adulto por volta dos 3 meses de idade. Transferrina A transferrina é uma proteína de transporte e leva o ferro no plasma e no líquido extracelular para suprir as necessidades teciduais. Aparece como uma banda distinta na electroforese de proteínas e é o maior componente da fracção betaglobulina. A maior parte é sintetizada pelo fígado, e o restante, por diferentes locais. A ligação com o ferro é estável em condições fisiológicas, mas a dissociação pode ocorrer em meio ácido. É capaz de se ligar a outros elementos, como cobre, zinco, cobalto e cálcio, mas com exceção da ligação ao cobre, não há significado fisiológico. É responsável pelo transporte do ferro do seu local de absorção a nível intestinal ou nos locais de catabolismo da hemoglobina para os precursores de células vermelhas na medula óssea ou para os locais de armazenamento de ferro no sistema reticuloendotelial na medula óssea, no fígado e no baço. Após a libertação do ferro, a transferrina retorna à circulação e é reciclada. A sua semi-vida é de 8 dias. Além da função de transporte, a transferrina minimiza os níveis de ferro livre no plasma, a perda urinária de ferro, e previne os potenciais efeitos tóxicos de níveis elevados de ferro livre circulante. O organismo contém cerca de 3 a 5 gramas de ferro, porém apenas 3 a 5 miligramas são encontrados no plasma. A maioria apresenta-se ligada à transferrina. No entanto, uma pequena parcela pode ligar-se a outras proteínas, como a albumina. O nível de ferro livre circulante é muito pequeno, portanto o ferro sérico avaliado reflecte basicamente o que se encontra ligado à transferrina. A transferrina apresenta grande polimorfismo genético, e têm sido identificadas variantes pela electroforese. Essas variantes são denominadas de acordo com a sua posição de migração na electroforese comparadas com o tipo mais comum, conhecido como transferrina C. Apesar dessas variantes não estarem associadas a patologias, em alguns casos podem migrar junto com outros componentes na electroforese, mascarando os resultados. Raramente, quadros congénitos de atransferrinémia resultam em níveis praticamente indetectáveis de transferrina, associada a sobrecarga férrica e a anemia severa por dificuldade de mobilização dos stoques do ferro orgânico. A diminuição dos níveis de transferrina pode ser observada nas doenças hepáticas e em situações clínicas com perdas protéicas, como certas enteropatias, síndrome nefrótico e desnutrição, além de ser um bom marcador de desnutrição em pacientes hospitalizados. Níveis baixos podem ser encontrados numa variedade de estados inflamatórios agudos e crónicos e em casos de malignidade. O doseamento de transferrina é importante na avaliação das anemias. Na anemia ferropriva, o nível de transferrina está elevado, mas a sua percentagem de saturação é baixa. Na anemia das doenças crónicas, a transferrina apresenta-se normal, e a percentagem de saturação está aumentada. Níveis elevados também podem ser encontrados nos estadios iniciais de hepatites agudas, na gravidez e no uso de estrogénios. Nas hemocromatoses idiopáticas e hemossideroses por sucessivas transfusões sanguíneas, são observados níveis elevados de saturação (acima de 90%). A transferrina apresenta-se aumentada na deficiência crónica de ferro nãocomplicada, alterando-se simultaneamente ou por vezes um pouco antes das alterações dos níveis séricos do ferro. Entretanto, a sua correlação clínica não é inteiramente satisfatória, visto que, em cerca de 30 a 40% dos pacientes com anemia ferropriva crónica, podem ser encontrados valores dentro dos limites da normalidade. A transferrina não é uma das proteínas de fase aguda. Portanto, apresenta-se diminuída mesmo nos casos de doenças agudas ou crónicas graves, que podem cursar com deficiência de ferro sérico. Justamente por isso, trata-se de um bom parâmetro para acompanhamento. Triglicerídeos Os triglicerídeos circulantes são provenientes da dieta (fonte exógena) e do fígado (fonte endógena). Triglicerídeos, ésteres de ácidos gordos de glicerol, representam a maior quantidade de gordura no organismo. A sua função primária é armazenar e providenciar energia para as células. A concentração de triglicerídeos do plasma é dada pelo balanço entre as taxas de entrada e de eliminação dessas moléculas no organismo. As concentrações de triglicerídeos no plasma variam conforme a idade e o sexo. Aumentos moderados ocorrem durante o crescimento e o desenvolvimento. Doseamentos de triglicerídeos são usadas para avaliar hiperlipidemias. Altas concentrações podem ocorrer com hipoparatiroidismo, síndrome nefrótico, doenças de depósitos de glicogénio e diabetes mellitus. Concentrações extremamente elevadas de triglicerídeos são muitas vezes encontradas em casos de pancreatite aguda. Alguns fármacos, como anticoncepcionais orais e estrogénio, podem levar a resultados falsamente elevados. O papel dos triglicerídeos no risco de desenvolvimento de doença arterial coronária tem sido bastante discutido. Até agora, os trabalhos apontavam os triglicerídeos não como factores de risco independentes, mas sim como associados à presença de outros factores de risco, variando inversamente com os valores de HDL-colesterol e directamente com os níveis séricos do LDL-colesterol. Estudos clínicos e epidemiológicos mais recentes demonstraram que o aumento das concentrações dos níveis de triglicerídeos pode ser considerado um factor de risco independente para aterosclerose. A dificuldade dessa avaliação deve-se às diversas partículas ricas em triglicerídeos. Cabe lembrar que níveis séricos aumentados de triglicerídeos aumentam a adesividade plaquetária, favorecendo a trombogénese. Troponinas As troponinas são constituídas por três diferentes proteínas (C,T e I) que estão presentes nos músculos esquelético e cardíaco, onde são elementos importantes no processo contrátil. São codificadas por genes diferentes, sendo que a troponina C se expressa de forma idêntica, e as troponinas T e I, de forma diferenciada nas duas localizações. Essa característica das troponinas T e I permitiu a identificação por anticorpos monoclonais e a sua utilização no diagnóstico diferencial do enfarte agudo do miocárdio (EAM). Outra característica importante é que as troponinas não são detectadas em pacientes hígidos, fazendo com que mesmo pequenos níveis detectados na fase inicial da lesão sinalizem de forma precoce a presença de injúria miocárdica. A troponina I é a mais específica para lesões do músculo cardíaco, eleva-se entre 4 a 6 horas e atinge o pico em torno de 12 horas após a lesão miocárdica, permanecendo elevada no soro por um período de 3 a 10 dias. Esse marcador tem sido apontado como o marcador de lesão miocárdica mais próximo do ideal, demonstrando claramente o seu valor prognóstico tanto no enfarte como na angina instável. Vários estudos demonstraram a sua positividade na presença de microenfartes indetectáveis por outros marcadores. A troponina T apresenta-se alterada nas lesões do músculo cardíaco, aparece no soro, após o início dos sintomas, com curva semelhante à do aparecimento da CKMB, eleva-se entre 3 a 12 horas e atinge o pico em torno de 24 horas após a lesão miocárdica, com a característica de se manter elevada por mais tempo, 12 a 14 dias. Devido à sua alta concentração nos músculos cardíacos, pela sua alteração precoce e por normalmente não estar detectável na circulação, o doseamento das troponinas, especialmente a troponina I, tem sido utilizada com alta sensibilidade e especificidade como um novo marcador de lesão miocárdica. Uréia Sérica A uréia é um produto do catabolismo de aminoácidos e proteínas. Gerada no fígado, é a principal fonte de excreção do nitrogénio do organismo. É difundida através da maioria das membranas celulares, e a sua maior parte é excretada pela urina, sendo que pequenas quantidades podem ser excretadas pelo suor e degradadas por bactérias intestinais. É livremente filtrada pelos glomérulos e é dependente da velocidade do fluxo urinário, ligado directamente ao grau de hidratação. Grande parte da uréia filtrada é reabsorvida passivamente nos túbulos proximais. No indivíduo saudável, a sua concentração varia de acordo com diferentes factores tais como o conteúdo protéico da dieta e a hidratação. Os níveis séricos da uréia são alterados por diferentes formas de acção sobre o seu metabolismo. Os glicocorticóides e a hormona tireidéia aumentam, e os androgénios e a hormona de crescimento diminuem os seus níveis séricos. Apesar de ser um marcador da função renal, é considerada menos eficiente do que a creatinina pelos diferentes factores não-renais que podem afectar a sua concentração. No entanto, a sua elevação é mais precoce, e não sofre com a variação da massa muscular. A avalição conjunta com a creatinina é útil no diagnóstico diferencial das causas de lesão renal. Os aumentos dos níveis séricos da uréia podem ser classificados, de acordo com a sua origem, como pré-renais, renais e pós-renais. O quadro abaixo apresenta essa classificação. UREMIA PRÉ-RENAL Níveis aumentados de produção (Função renal normal) de uréia ou diminuição do fluxo sanguíneo UREMIA RENAL Doença renal intrínseca UREMIA PÓS-RENAL Obstrução do fluxo renal (Reabsorção da uréia ) Catabolismo protéico aumentado, ingestão excessiva de proteínas, choque traumático ou hemorrágico, desidratação, descompensação cardíaca aguda, absorção de grandes hemorragias, infecções maciças ou toxémia. Doença renal glomerular ou tubular aguda ou crónica ou lesão parenquimatosa difusa. Obstrução do tracto urinário por cálculo, obstrução externa, tumores de bexiga, tumores ou hipertrofia da próstata, defeitos congénitos de bexiga ou uretra Os níveis séricos diminuídos são mais raros e decorrem de importante restrição da ingestão de proteínas, desidratração, reposição excessiva de líquidos, durante a gestação e nas doenças hepáticas graves por diminuição da síntese da uréia. Urina Tipo II e Sedimento urinário O exame rotineiro de urina é um método simples, não-invasivo, capaz de fornecer uma variedade de informações úteis em relação a patologias envolvendo os rins, o trato urinário e, por dados indirectos, algumas patologias sistémicas. Sumário de urina, exame de urina tipoII e sedimento urinário são alguns dos sinónimos empregues na identificação desse exame. Apesar de simples, diferentes técnicas encontram-se envolvidas na sua realização, em quatro etapas distintas: - avaliação da amostra, - análise física, - análise química, - análise microscópica do sedimento. Avaliação da Amostra Como na maioria dos exames laboratoriais, a qualidade dos resultados depende da colheita. A urina deverá ter sido colhida recentemente, com um volume mínimo de 20 mL, sem adição de preservativos, refrigerada e nunca congelada, para garantir a sua melhor preservação. Deve estar claramente identificada e colhida em recipiente adequado. A colheita deverá ser realizada após assepsia da área genital, desprezando-se o primeiro jacto e colhendo-se o jacto intermediário. O recomendável é a colheita da primeira micção da manhã ou uma amostra com pelo menos quatro horas de intervalo da última micção, em recipiente de plástico esterilizado. Se necessário, a amostra poderá ser colhida a qualquer hora, lembrando-se da existência, durante o dia, de variações em relação à dieta, exercício físico, concentração da urina e uso de medicamentos. O exame do primeiro jacto da urina é recomendado quando o objetivo é a investigação do trato urinário inferior, mais especificamente da uretra. A urina de primeiro jacto contém células e bactérias presentes na uretra, tornando-a uma boa amostra indirecta para outras avaliações, como as uretrites com pouca secreção. A diferença de celularidade encontrada entre o primeiro e segundo jactos auxilia a localizar a origem do processo. Análise Física Aspecto O aspecto normal é límpido. Entretanto, uma ligeira turvação não é necessariamente patológica, podendo ser decorrente da precipitação de cristais e de sais amorfos não-patológicos. A turvação patológica pode ser consequência da presença de células epiteliais, leucócitos, eritrócitos, cristais, bactérias e leveduras. Pode ocorrer a presença de depósito por excesso de muco em função de processos inflamatórios do trato urinário inferior ou do trato genital, ou pela presença de grande quantidade de outros elementos anormais. Cor A cor habitual da urina é amarelo citrino, o que se deve, na sua maior parte, ao pigmento urocromo. Essa coloração pode apresentar variações em situações como a diluição por uma grande ingestão de líquidos, que torna a urina amarelo-pálida. Uma cor mais escura pode ocorrer por privação de líquidos. Portanto, a cor da urina pode servir como avaliação indirecta do grau de hidratação e da capacidade de concentração urinária. O uso de diversos medicamentos e a ingestão de corantes alimentares também podem causar alteração da cor da urina. Há numerosas possibilidades de variação de cor, sendo a mais frequente a cor avermelhada (rosa, vermelha, vermelho-acastanhada). Em mulheres, deve-se sempre afastar a possibilidade de contaminação vaginal. A cor avermelhada pode acontecer na presença de medicamentos, eritrócitos, hemoglobina, metaemoglobina e mioglobina. As porfirias também podem cursar com coloração vermelha ou púrpura da urina. Também é frequente a cor âmbar ou amarelo-acastanhada, pela presença de bilirrubina, levando a urina a apresentar-se verde-escura em quadros mais graves. Densidade A densidade ajuda a avaliar a função de filtração e concentração renais, bem como o estado de hidratação do corpo. Depende directamente da proporção de solutos urinários presentes (cloreto, creatinina, glicose, fosfatos, proteínas, sódio, sulfatos, uréia, ácido úrico) e o volume de água. Normalmente varia entre 1.015 a 1.030. Densidades diminuídas podem ser encontradas na administração excessiva de líquidos por via intravenosa, reabsorção de edemas e transudados, insuficiência renal crónica, uso de drogas, quadros de hipotermia, aumento da pressão intracraniana, diabetes insipidus e hipertensão maligna. Densidades elevadas podem ser encontradas na desidratação, diarréia, vómitos, febre, diabetes mellitus, glomerulonefrite, insuficiência cardíaca congestiva, insuficiência supra-renal, proteinúria, síndrome de secreção inapropriada de hormona antidiurético, toxémia gravídica, uropatias obstructivas e no uso de algumas substâncias, como contrastes radiológicos e sacarose. Análise Química Corpos Cetónicos Os corpos cetónicos são um subproduto do metabolismo da gordura e dos ácidos gordos que proporciona fonte de energia para as células quando as reservas de glicose estão diminuidas ou quando a glicose não pode penetrar nas células devido à falta de insulina. Os corpos cetónicos que passam para a corrente sanguínea são quase totalmente metabolizados no fígado. Quando são formados em velocidade maior do que o normal, são excretados na urina. O jejum ou a dieta podem determinar o aparecimento de corpos cetónicos na urina. O uso de alguns fármacos pode levar a falso-negativos, entre elas o captopril, a levodopa e o paraldeído. Bilirrubina Aumentadas nas situações em que ocorre o aumento da bilirrubina sérica conjugada e sua consequente presença na urina. Portanto, valores elevados podem ser encontrados em doenças hepáticas e biliares, lesões parenquimatosas, obstruções intra e extra hepáticas, neoplasias hepáticas ou do trato biliar. Ao contrário, estará sempre ausente nas ictéricias por hemólise. Alguns casos de doença biliar obstrutiva crónica podem cursar com níveis alterados de bilirrubina sérica e ausência de bilirrubina na urina. Falso-negativos podem ser induzidos pelo uso de ácido ascórbico e exposição da urina à luz intensa por longo tempo. Hemoglobina A presença de hemoglobina na urina pode ser proveniente de diferentes estados de hemólise intravascular, em que uma quantidade excessiva de hemoglobina satura a capacidade de ligação com a haptoglobina. Nessas condições, fica livre no plasma, sendo filtrada pelo glomérulo e em parte reabsorvida pelo sistema tubular. A restante é excretada na urina. A outra causa é a presença de eritrócitos libertados no trato urinário por pequenos traumas, exercícios extenuantes ou patologias das vias urinárias, em que as hemácias são lisadas, libertando hemoglobina. A verdadeira hemoglobinúria é rara, sendo mais frequente a segunda situação, em que a hemoglobinúria é acompanhada pela presença de hematúria. Glicose A glicose presente na urina reflecte os níveis séricos da glicose associados à capacidade de filtração glomerular e de reabsorção tubular. Normalmente, a glicosúria só se manifesta quando os níveis séricos se encontram acima de 160/180 mg/dL. A glicosúria pode ser causada tanto pelo diabetes mellitus como por outras patologias, como doenças renais que afectem a reabsorção tubular e nos quadros de hiperglicemia de outras origens que não a diabética. Nitritos A presença de nitritos na urina indica infecção das vias urinárias, causadas por microrganismos que reduzem os nitratos a nitritos. O achado de reacção positiva indica a presença de infecção nas vias urinárias, principalmente por bactérias entéricas. pH Avalia a capacidade de manutenção renal da concentração de iões de hidrogénio no plasma e líquidos extracelulares. Participando do equilíbrio ácido-base, os rins, quando em funcionamento normal, excretam o excesso de iões de hidrogénio na urina. Portanto, o pH da urina reflecte o pH plasmático e é um indicador da função tubular renal. Normalmente varia entre 5,0 a 8,0. Valores elevados podem ser encontrados na alcalose respiratória, em dietas com grande ingestão de vegetais e frutas cítricas, hiperémese ou o uso prolongado de sonda nasogátrica, na presença de cálculos renais, infecção das vias urinárias, especialmente por microrganismos que utilizam uréia (Proteus e Pseudomonas sp.), síndrome de Cushing, hiperaldosteronismo, hipocalemia, insuficiência renal, síndrome de Fanconi e subredosagem de alcalinos. Os fármacos também podem alterar o pH urinário, como os diuréticos e a terapia alcalina (bicarbonatos). Valores diminuídos podem ser encontrados em acidose metabólica e respiratória, perda de potássio, dieta rica em proteínas, infecção das vias urinárias por Escherichia coli, diarréias severas, diminuição de cloro, fenilcetonúria e tuberculose renal. O uso de anestésicos e de ácido ascórbico, assim como de outros fármacos, pode diminuir o pH urinário. Proteínas Em indivíduos normais, uma pequena quantidade de proteína é filtrada pelo glomérulo (albumina, alfa-1 e alfa-2-globulinas), sendo a sua maior parte reabsorvida por via tubular e eliminada em pequenas quantidades pela urina. São considerados normais, valores de até 150 mg/ 24 h. O aumento da quantidade de proteínas na urina é indicador inicial de patologia renal. Entretanto, não são todas as patologias renais que cursam com proteinúria, a qual não é uma condição exclusiva de doença renal, podendo aparecer em patologias não-renais e em algumas condições fisiológicas. As proteínas são excretadas em velocidades diferentes e em momentos variáveis durante o período de 24 horas, sendo maior durante o dia e menores durante a noite. As proteinúrias podem ser classificadas, quanto à sua origem, como pré-renal, renal e pós- renal. Pré-renal Algumas patologias não-renais, como hemorragia, estados febris, algumas endocrinopatias, distúrbios convulsivos, neoplasias, queimaduras extensas, mioglobinúria, hemoglobinúria, mielomas, superexposição a certas substâncias (ácido sulfossalicílico, arsénico, chumbo, éter, fenol, mercúrio, opiáceos), lesão do sistema nervoso central, leucemia (mielocítica crónica), obstrução intestinal, reacção de hipersensibilidade, toxémia, toxinas bacterianas (difteria, escarlatina, estreptocócica aguda, febre tifóide e pneumonia) podem levar a proteinúrias ditas pré-renais. A proteinúria transitória pode surgir em consequüência de estados não-patológicos, como stress físico (exercícios intensos) ou emocional, desidratação, dieta (proteínas em excesso), exposição ao frio e posição do corpo (proteinúria ortostática). Renal Pode ocorrer devido a um comprometimento glomerular, tubular ou intersticial, glomerulonefrites, síndrome nefrótico, nefropatia diabética, hipertensão (maligna, renovascular), amiloidose, doença poliquística, lúpus eritematoso sistémico, nefropatia membranosa, pielonefrite (crónica), tumores, malformações congénitas, síndrome de Goodpasture, trombose da veia renal, acidose tubular renal, necrose tubular aguda, intoxicação por metais pesados e alguns fármacos. Pós-renal Contaminação por material da área genital (uretral e genital), infecções do trato urinário superior e inferior (uretrites e cistites) e prostatites. Urobilinogénio O urobilinogénio é um produto de redução formado pela acção de bactérias sobre a bilirrubina conjugada no trato gastrointestinal. A maior parte do urobilinogénio é excretada nas fezes. Uma pequena parte é reabsorvida através da via enterohepática e reexcretrada na bile e na urina. Os níveis urinários de urobilinogénio geralmente são maiores do início até meio da tarde, mantendo-se em níveis inferiores a 1 mg/dL. O aumento do urobilinogénio na urina indica a presença de processos hemolíticos, disfunção hepática ou porfirinúria. Análise Microscópica do Sedimento Células Epiteliais É comum o achado de algumas células epiteliais. Podem ser de três tipos distintos: células escamosas, transacionais e dos túbulos renais. A maioria não tem significado clínico, representando uma descamação de células velhas do revestimento epitelial do trato urinário. O achado de células com atípias nucleares ou morfológicas pode indicar a presença de processos neoplásicos necessitando de investigação específica. A presença de fragmentos epiteliais e de células de origem tubular pode estar ligada a processos de necrose tubular aguda e a lesões isquémicas renais, entre outras lesões do rim. Eritrócitos Podem estar presentes em pequena quantidade na urina normal (2 a 10 por campo). A presença de hematúria indica lesões inflamatórias, infecciosas ou traumáticas dos rins ou vias urinárias. Deve-se sempre excluir contaminação por via genital. O exercício extenuante pode levar a hematúria discreta. A forma da apresentação dos eritrócitos, segundo alguns autores, pode indicar a sua origem, servindo como um diagnóstico diferencial de hematúrias de origens glomerular e não-glomerular. Quando se apresentam na sua forma esférica habitual, seriam de origem mais distal no trato urinário; quando crenadas (irregulares), teriam origem glomerular. Leucócitos Podem estar presentes em pequena quantidade na urina normal (2 a 10 por campo). Normalmente neutrófilos. Quantidades aumentadas indicam a presença de lesões inflamatórias, infecciosas ou traumáticas em qualquer nível do trato urinário. Deve-se sempre excluir contaminação por via genital. Cilindros São elementos exclusivamente renais compostos por proteínas e moldados principalmente na luz dos túbulos contornados distais e túbulos colectores. Indivíduos normais, principalmente após exercícios extenuantes, febre e uso de diuréticos, podem apresentar pequena quantidade de cilindros, geralmente hialinos. A sua formação é influenciada pelos elementos presentes no filtrado e pelo tempo de permanência dentro do túbulo. Nas doenças renais, apresentam-se em grandes quantidades e em diferentes formas, de acordo com o local da sua formação. Os mais comuns são os cilindros hialinos. São compostos principalmente pelas proteínas de Tamm-Horsfall, considerados normais em pequenas quantidades (0 a 2) e em maior quantidade em situações como febre, desidratação, stress e exercício físico intenso. Os cilíndros podem estar presentes em diferentes patologias como os hemáticos (doença renal intrínseca), leucocitários (pielonefrites), de células epiteliais (lesões túbulos renais), granulosos (doença renal glomerular ou tubular e algumas situações fisiológicas) e céreos (insuficiência renal, rejeição a transplantes e doenças renais agudas e estase do fluxo urinário). Cristais São um achado frequente na análise do sedimento urinário normal, raramente com significado clínico e com ligação directa com a dieta. Alguns cristais representam um sinal de distúrbios físico-químicos na urina ou têm significado clínico específico, como os de cistina, leucina, tirosina e fosfato de amoníaco magnesiano. Podem também ser observados cristais de origem medicamentosa e de componentes de contrastes urológicos. A cistina está ligada a um defeito metabólico, designado por cistinúria, e é responsável por cerca de 1% dos cálculos urinários. Como a tirosina e a leucina são resultado de catabolismo protéico, o seu aparecimento na urina sob a forma de cristais pode indicar necrose ou degeneração tecidual importante. Os cristais de fosfato amoníaco magnesiano estão relacionados a infecções por bactérias produtoras de urease. Apesar de não existir uma relação directa entre a presença de cristais e o desenvolvimento de cálculos, alguns autores apontam a existência de diferenças morfológicas entre os cristais dos pacientes que desenvolvem calculose com uma apresentação de formas maiores, agregadas e bizarras. Muco Produzido pelo epitélio do túbulo renal e células epiteliais. A presença excessiva de muco decorre de processos inflamatórios do trato urinário inferior ou do trato genital. Velocidade de Sedimentação A velocidade de sedimentação (VS) reflecte o resultado entre as forças envolvidas no movimento de sedimentação dos eritrócitos e os mecanismos oponentes exercidos por substâncias plasmáticas, principalmente o fibrinogénio e as proteínas de fase aguda. A capacidade de agregação dos eritrócitos depende de factores ligados às mesmas, como a força de coesão entre os eritrócitos e a sua carga eléctrica, que tem uma força repulsiva que mantém os eritrócitos afastados em condições normais, e factores plasmáticos que têm como função atenuar o efeito das forças repulsivas. A presença de processos inflamatórios leva a uma agregação maior dos eritrócitos, formando agregados conhecidos como rouleaux. Esse fenómeno favorece o aumento da velocidade de sedimentação dos eritrócitos. O aumento da concentração plasmática de imunoglobulinas e fibrinogénio leva a uma diminuição da força repulsiva entre os eritrócitos, facilitando a agregação e aumentando portanto a VS. A presença de proteínas anómalas, como no mieloma, de eritrócitos alterados em número, forma ou tamanho e o uso de medicamentos podem levar a uma alteração da VS, mesmo na ausência de resposta de fase aguda. As principais alterações que podem levar a um aumento significativo da VS (=100mm na 1ª hora) são processos infecciosos, doenças do tecido conjunctivo, neoplasias e doenças renais. A velocidade de sedimentação (VS) é um indicador não-específico de infecção e lesão tecidual. É útil para monitorizar a inflamação crónica, inclusive a actividade da doença como na artrite reumatóide. A VS é mais útil do que a proteína C reactiva para o diagnóstico e a monitorização da polimialgia reumática e a artrite de células gigantes, em que se encontra frequentemente elevada durante a recaída. Homens entre 45-64 anos com VS no limite superior têm duas vezes mais risco de morte de doença coronária do que os homens com VS na faixa inferior, depois de ajustar outros factores de risco. O método tem alta sensibilidade com baixa especificidade, o que leva a alterações em inúmeras situações patológicas e em algumas situações fisiológicas como período menstrual, gravidez, temperatura, sexo e idade. ALTERAÇÕES DA VELOCIDADE DE SEDIMENTAÇÃO ELEVADA Infeceções bacterianas Hepatite aguda, hepatopatia crónica Pancreatites, colites e ilites, peritonites Processos inflamatórios agudos e crónicos Febre reumática Lúpus eritematoso sistémico Artrite reumatóide Vasculites e dermatomiosites Anemias graves Leucemias e linfomas DIMINUÍDA Policitemia Hemonoglobinopatia Esferocitose Alterações da forma dos eritrócitos Microcitose Hipofibrinogenemia Insuficiência cardíaca Cardiopatia congénita Desnutrição grave Lesões hepáticas graves Metástases Síndrome nefrótico, glomerulonefrite aguda, pielonefrite Tiroidites Mieloma, crioglobulinémia e macroglobulinémia Necrose tecidual (cirurgias, queimaduras, quimioterapia e radioterpia) Uso de heparina Uso de antiflamatórios Vitamina B12 A vitamina B12 (cianocobalamina) é encontrada em praticamente todos os alimentos de origem animal. É separada das proteínas animais pela acção da secreção gástrica. Uma vez libertada, forma com o factor intrínseco (FI), um complexo cobalamina-FI. Essa associação é indispensável para a sua absorção, pois adere-se aos locais especifícos nas células epiteliais do íleo terminal, permitindo a absorção da cobalamina num processo que demora várias horas para se completar. Participa nos mecanismos de manutenção da hematopoiese, no metabolismo do ácido fólico e na função neurológica. É transportada no plasma ligado a proteínas chamadas de transcobalamina e armazenada principalmente no fígado. A sua deficiência leva a anemia megaloblástica, a alterações dos níveis de ácido fólico eritrocitário e a neuropatias. Pode ocorrer nas deficiências da dieta, especialmente em dieta vegetariana estrita, deficiência de factor intrínseco, síndromes de má absorção, alcoolismo, uso de fármacos (contraceptivos orais, anticonvulsivantes e aspirina) e raros casos de ausência congénita de transcobalamina.