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PANORAMA SOBRE DISCURSO DE ÓDIO NO BRASIL
O que é Discurso do Ódio?
É o discurso que visa à promoção do ódio e incitação a discriminação, hostilidade e violência
contra uma pessoa ou grupo em virtude de raça, religião, nacionalidade, orientação sexual,
gênero, condição física ou outra característica de um determinado grupo.
O discurso do ódio tem sido empregado para insultar, perseguir e justificar a privação dos
direitos humanos e, em casos extremos, para dar razão a homicídios.1
As diversas experiências mundiais em relação ao discurso de ódio, principalmente com o
Holocausto na Alemanha Nazista durante a Segunda Guerra Mundial, geraram a preocupação
com as consequências nocivas de tais discursos e a necessidade de se criarem legislações que
impedissem sua disseminação.
Entretanto, a proibição do discurso do ódio entra em conflito com o direito à liberdade de
expressão, garantido por diversos documentos e legislações internacionais e de essencial
importância para a democracia.
Neste sentido, como combater o discurso do ódio sem que isto represente uma ameaça ao
direito à liberdade de expressão?
Porque restringir a Liberdade de Expressão?
A liberdade de expressão é um direito consagrado mundialmente como essencial à realização
e proteção de todos os direitos humanos.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada pela Assembleia Geral das Nações
Unidas em 10 de dezembro de 1948, em seu Artigo 19 garante que “toda pessoa tem direito à
liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter
opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios e
independentemente de fronteiras.”
1
Hate Speech and the American Convention on the Human Rights, by the Office of the Special
Rapporteur for Freedom of Expression, 2004, Organization of the American States.
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Da mesma forma, o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (PIDCP), tratado das
Nações Unidas ratificado por diversos países, em seu artigo 19(2) estabelece que:
“Toda pessoa terá direito à liberdade de expressão; esse direito incluirá a
liberdade de procurar, receber e difundir informações e idéias de qualquer
natureza, independentemente de considerações de fronteiras, verbalmente
ou por escrito, em forma impressa ou artística, ou qualquer outro meio de
sua escolha.”
E ainda, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, ratificada pelo Brasil em setembro
de 1992, protege a liberdade de expressão e acesso à informação em seu artigo 13(1):
“Artigo 13 - Liberdade de pensamento e de expressão
1. Toda pessoa tem o direito à liberdade de pensamento e de expressão.
Esse direito inclui a liberdade de procurar, receber e difundir informações e
idéias de qualquer natureza, sem considerações de fronteiras, verbalmente
ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer meio de
sua escolha.”
Entretanto, este direito não é absoluto. O direito à liberdade de expressão é limitado por
outros direitos igualmente consagrados, como o direito à imagem, à intimidade, à honra.
Desta forma, são impostas responsabilidades e restrições ao exercício da liberdade de
expressão.
O artigo19(3) do PIDCC determina responsabilidades no exercício da liberdade de expressão e
restrições em alguns casos, mas somente se a restrição for (a) prevista em lei, (b) necessária,
(c) para proteção de um dos objetivos listados no artigo, quais sejam: assegurar o respeito do
direito e reputação dos outros, a segurança nacional, a ordem, saúde ou moral pública.
A Convenção Americana de Direitos Humanos garante, em seu artigo 13(2) que não haverá
censura prévia (com exceção daquela com o objetivo de proteção moral de crianças e
adolescentes no acesso à espetáculos públicos), mas impõe a responsabilização posterior do
autor no exercício da liberdade de expressão.
Ambos os tratados trazem também a obrigação de a lei proibir a propaganda em favor da
guerra e a apologia do ódio nacional, radical, racial ou religioso que constitua incitamento à
discriminação, à hostilidade ou à violência – o discurso de ódio.
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A Convenção Internacional sobre Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial2, por
sua vez, é mais incisiva e traz em seu artigo 4(a) um texto mais abrangente a respeito do
discurso de ódio:
“[Os Estados Membros comprometem-se] a declarar como delitos puníveis
por lei, qualquer difusão de idéias baseadas na superioridade ou ódio
raciais, qualquer incitamento à discriminação racial, assim como quaisquer
atos de violência ou provocação a tais atos, dirigidos contra qualquer raça
ou qualquer grupo de pessoas de outra cor ou de outra origem étnica, como
também qualquer assistência prestada a atividades racistas, inclusive seu
financiamento”
Sobre o discurso de ódio o Relator Especial sobre Liberdade de Expressão da Comissão
Interamericana sobre Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos, em
declaração conjunta com o Relator sobre Liberdade de Expressão e Opinião da ONU e com a
Organização para Segurança e Cooperação Europeia, reconheceu o caráter nocivo de
declarações que incitem e promovam ódio racial, discriminação, violência e intolerância, e que
crimes contra a humanidade são frequentemente precedidos deste tipo de discurso.3
Qualquer restrição à liberdade de expressão deve respeitar a chamada “regra dos três passos”
contidos no artigo 19 (3) do PIDCP:
(a) A restrição deve ser prevista em lei. Este requisito estará preenchido somente se a lei for
acessível e sua formulação for precisa de modo que o cidadão seja capaz de regular sua
própria conduta4;
(b) A restrição deve objetivar resguardar um interesse legitimo. Exclusivamente aqueles
definidos pelos tratados internacionais;
(c) A restrição deve ser necessária em uma sociedade democrática. Deve haver uma
premente necessidade social 5 para restrição. A justificativa dada deve ser relevante e
suficiente e a restrição deve ser proporcional ao objetivo visado.6
2
Adotada pela Resolução 2.106-A (XX) da Assembleia Geral das Nações Unidas, em 21.12.1965, e
ratificada pelo Brasil em 27.03.1968
3
Ibid. nota 1
4
The Sunday Times x. United Kingdom, 26 de abril de 1979, Pedido No. 6538/74, parágrafo 49 (Corte
Européia de Direitos Humanos)
5
Zana v Turkey, julgado da Suprema Corte de 25 de novembro de 1997, Pedido No. 18954/91, parágrafo
51; Ligens v Austria, julgado de 8 de julho de 1986. Pedido No 9815/82, parágrafos 39-40.
6
Ligens v Austria, julgado de 8 de julho de 1986. Pedido No 9815/82, parágrafos 39-40 (Corte Européia
de Direitos Humanos)
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Como determinar que um discurso é considerado de ódio?
O discurso de ódio deve ser aquele que se enquadre dentro dos padrões definidos pelos
tratados internacionais e deve seguir os parâmetros da jurisprudência das cortes
internacionais.
A Artigo 19 defende que deve haver uma rigorosa padronização dos termos a serem utilizados
nas legislações domésticas sobre discurso de ódio, de preferência usando o exato texto do
artigo 20 da PIDCP, de forma a torná-los o mais claros possíveis:
“ARTIGO 20
1. Será proibido por lei qualquer propaganda em favor de guerra.
2. Será proibida por lei qualquer apologia do ódio nacional, radical, racial
ou religioso que constitua incitamento à discriminação, à hostilidade ou à
violência.”
Neste sentido a Artigo 19, com base em estudos e discussões sobre liberdade de expressão e
igualdade envolvendo um grupo de oficiais de alto nível da ONU e de outras organizações,
elaborou os Princípios Camden sobre Liberdade de Expressão e Igualdade. O 12 Princípio,
deste texto é dedicado a fornecer uma proposta de texto legal sobre discurso de ódio e de
interpretação de seus termos, com base no artigo 20(2) do PIDCP:
“12.1. Todos os Estados devem adotar legislação que proíba qualquer
promoção de ódio religioso, racial ou nacional que constitua uma incitação
à discriminação, hostilidade ou violência (discurso do ódio). Sistemas
jurídicos nacionais devem deixar claro, seja de forma explícita ou por meio
de interpretação impositiva, que:
i. Os termos ‘ódio’ e ‘hostilidade’ se referem a emoções intensas e
irracionais de opróbrio, animosidade e aversão ao grupo visado.
ii. O termo ‘promoção’ deve ser entendido como a existência de intenção de
promover publicamente o ódio ao grupo visado.
iii. O termo ‘incitação’ se refere a declarações sobre grupos religiosos,
raciais ou nacionais que criam risco iminente de discriminação, hostilidade
ou violência a pessoas pertencentes a esses grupos.
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iv. A promoção, por parte de comunidades diferentes, de um sentido
positivo de identidade de grupo não constitui discurso do ódio.”
Além disso, a Artigo 19 recomenda a adoção de alguns critérios para enquadrar um discurso
como discurso do ódio, tornando-o passível de punição. Tais critérios são considerados pela
Artigo 19 como elementos constitutivos da incitação, conforme o artigo 20 da PIDCP, e foram
elaborados para servir de orientação às Cortes para identificar o discurso de ódio. São eles7:
i. severidade: a ofensa deve ser “a mais severa e profunda forma de
opróbrio”8
ii. intenção: deve haver a intenção de incitar o ódio
iii. conteúdo o forma do discurso: devem ser consideradas a forma, estilo e
natureza dos argumentos empregados
iv. extensão do discurso: o discurso deve ser dirigido ao público em geral
ou à um número de indivíduos em um espaço público.
v. probabilidade de ocorrência de dano: o crime de incitação não necessita
que o dano ocorra de fato, entretanto é necessária a averiguação de algum
nível de risco de que algum dano resulte de tal incitação.
vi. iminência: o tempo entre o discurso e a ação (discriminação, hostilidade
ou violência) não pode ser demasiado longo de forma que não seja razoável
imputar ao emissor do discurso a responsabilidade pelo eventual
resultado.
v. contexto: o contexto em que é proferido o discurso é de suma
importância para verificar se as declarações tem potencial de incitar ódio e
gerar alguma ação.
Racismo e Discurso de Ódio no Brasil
Segundo dados do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, colhidos no Censo
Demográfico realizado em 2010, a população total brasileira em 2010 chegou a 190.755.799
7
Freedom of expression and Equality: The prohibition of incitement to hatred in Latin America. A study
prepared by ARTICLE 19’s Director for South America, Paula Martins.
8
Decisão da Suprema Corte do Canada no caso R v Keegstra, [1990] 3 S.C.R. 697, 13/12/90, em 697
(Can.), parágrafo 1
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de pessoas, sendo que aproximadamente 50,74% desta população se autodeclara negra ou
parda.9
Apesar de negros e pardos representarem a maior parte da população, sua representação na
política, no governo, nas universidades e no acesso à renda em geral está muito aquém da sua
proporção real na população brasileira.
Esta marginalização da população negra e parda no Brasil vem de um histórico de
marginalização social dos afrodescendentes e remonta a própria história do País.
A escravidão africana no Brasil data do início da colonização portuguesa no século XVI e
perdurou mesmo após a independência. A abolição da escravidão africana se deu através de
um lento processo e uma série de leis, até a abolição total pela Lei Áurea em 1988, um ano
antes de o Brasil se tornar República e a mais tardia dentre os países independentes do
Continente Americano.
Entretanto, após a abolição iniciou-se um processo de marginalização da população
afrodescendente no Brasil, impulsionado inclusive pelo governo com a produção de leis com o
intuito de dificultar a integração social dos negros.
Os efeitos dessa marginalização são visíveis até hoje e o racismo no Brasil, embora se dê de
forma velada, ainda é muito latente.
I - Legislação sobre discriminação e discurso de ódio no Brasil
Não há no Brasil legislação especifica em relação ao discurso de ódio. Contudo, a Constituição
Federal de 1988, promulgada após o fim da ditadura militar, garante a igualdade dos
indivíduos perante a lei e a proteção legal contra a discriminação.
A Constituição estabelece:
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do
Brasil:
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor,
idade e quaisquer outras formas de discriminação.
9
Dados do Censo 2010 do IBGE, acessíveis pelo link:
ftp://ftp.ibge.gov.br/Censos/Censo_Demografico_2010/Resultados_do_Universo/tabelas_pdf/tab3.pdf
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Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e
liberdades fundamentais;
XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível,
sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;
Um ano após a promulgação da Constituição foi sancionada a lei 7.716/89 que define crimes
resultantes de preconceito de raça e de cor e dando corpo à determinação constitucional do
art. 5º, XLII.
Esta lei em seu artigo 20º determina pena de reclusão de um a três anos e multa para quem
“praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou
procedência nacional”.
A pena pode chegar a cinco anos nos casos de fabricação, comercialização, distribuição ou
veiculação de símbolos para fins de divulgação do nazismo, ou caso o crime seja cometido pela
utilização de meios de comunicação social ou pública.
Em 1997 a Comissão Interamericana em um relatório sobre a situação dos direitos humanos
no Brasil onde se concluiu que havia baixa eficácia da lei 7.716/89 devido a lei não estabelecer
mecanismos que facilitassem a prova da ocorrência do crime de racismo.
A partir de lutas de grupos do movimento negro no Brasil pela efetivação da igualdade racial,
em 2010 foi promulgado o Estatuto da Igualdade Racial com o objetivo de garantir à população
negra a efetivação da igualdade de oportunidades e combater a discriminação, estabelecendo
não somente sanções e punições mas também uma série de obrigações aos Estados para
inclusão social de minorias raciais no País.
A comunidade LGBT a anos vem pressionando para que seja modificada a lei 7.716/89 para
que seja incluindo em seu texto os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de
gênero, sexo, orientação sexual e identidade de gênero. Atualmente tramita no Senado o
Projeto de Lei Nº 122/2006.
II – Monitoramento e aplicação da Lei 7716/89
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Em 25 de abril de 2012 a ARTIGO 19 expediu às Secretarias de Segurança Pública de 19 Estados
Brasileiros e à Secretaria de Política de Promoção de Igualdade Racial - SEPPIR, pedido de
informação referente ao mapeamento e monitoramento da Lei 7.716/89, especialmente no
tocante ao artigo 20.10
No Estado de São Paulo foram registradas na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de
Intolerância – DECRADI, 39 ocorrências no ano de 2011 e 21 até maio de 2012, referentes aos
crimes de discriminação e racismo e, apesar de todas as ocorrências serem convertidas em
inquérito, a delegacia informou que não há acompanhamento após a conversão em processo
criminal.
No Estado de Minas Gerais o Relatório de Análise Criminal, Crimes Resultantes de Preconceito
de Raça ou de Cor, elaborado pela Superintendência de Investigações e Polícia Judiciária da
Polícia Civil, apontou 244 ocorrências no ano de 2011 e 119 ocorrências até maio de 2012.
Entretanto, conforme apontou o relatório, a demanda é parcial pois o sistema utilizado não
adota as naturezas de preconceito de etnia, religião ou procedência nacional.
Este relatório ainda apontou que em 2011, 87% das ocorrências tiveram como principais
condutas a prática, induzimento ou incitação ao preconceito, incidindo no artigo 20 da Lei
7716/89.
No Estado do Rio de Janeiro a Chefia da Polícia Civil informou que foram registrados 42 crimes
referentes à lei 7716/89 no período de 17 de julho de 2010 à 16 de julho 2011 e 52 crimes no
período de 17 de julho 2011 à 16 de julho de 2012.
Em Sergipe o Departamento Especializado em Atendimento a Grupos Vulneráveis – DGVA
informou que foram instaurados 12 inquéritos policiais em 2010, 9 inquéritos em 2011 e, até
02 de julho, 4 inquéritos em 2012, constando como vítimas pessoas vulneráveis em razão da
raça e da cor.
No Rio Grande do Sul foram registradas no ano de 2011, 981 ocorrências enquadradas no
artigo 20, parágrafos 2º, 3º e 4º da Lei 7716/89, sendo 243 ocorrências de preconceito de raça,
cor, origem, etnia ou nacionalidade, e 738 ocorrências por injúria qualificada referente à raça,
cor, etnia, religião ou origem.
10
Pedido solicitado com base no artigo 11 da Lei de Acesso à Informação nº 12.527/11 e enviado às
Secretarias de Segurança Pública dos Estados do Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Rio Grande do Norte,
Sergipe, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, São Paulo, Espírito Santo,
Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, além da Secretaria de Política
de Promoção de Igualdade Racial – SEPPIR. Ainda aguarda-se a resposta de alguns dos pedidos.
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Em Alagoas foram registrados no ano de 2011 27 crimes referentes ao artigo 20 da lei
7.716/89, sendo que não houve incidência dos §§ 2º, 3º e 4º.
No Rio Grande do Norte a Delegacia Geral da Polícia Civil informou que foram registradas 32
ocorrências em 2010 e 15 ocorrências em 2011.
No Paraná a Coordenadoria de Análise e Planejamento Estratégico da Secretaria de Segurança
Pública informou em seu relatório estatístico de registros criminais da Lei 7716/89 que foram
registradas 76 ocorrências em 2009, 72 ocorrências em 2010 e 78 ocorrências em 2011.
Em Goiás o relatório da Gerência de Análise de Informações da Secretaria de Segurança
Pública apontou a ocorrência de crimes enquadrados no art. 20 da Lei 7716/89 sendo que
foram 8 ocorrências em 2010, 13 ocorrências em 2011 e 4 ocorrências até maio de 2012.
No Estado do Mato Grosso a Secretaria de Estado de Justiça e Direitos humanos informou que
houve 192 ocorrências de crimes de racismo registrados em Cuiabá no ano de 2011.
No Piauí a Delegacia de Defesa e Proteção dos Direitos Humanos e Repressão às Condutas
Discriminatórias informou que não houve nenhum registro de ocorrência de crime previsto no
artigo 20, §2º, §3º e §4º da Lei 7.716/89 no ano de 2012.
No Mato Grosso do Sul o Núcleo de Estatísticas e Analise Criminal da Coordenadoria de
Fiscalização e Controle informou que foram registradas ocorrências enquadradas no artigo 20,
parágrafos 2º, 3º e 4º, sendo que foram 8 ocorrências em 2010, 05 ocorrências em 2011 e 03
ocorrências até 17 de outubro de 2012.
Todas as ocorrências registradas foram convertidas em inquéritos policiais, sendo que foram
encaminhados ao Poder Judiciário 04 inquéritos em 2010, 03 inquéritos em 2011 e 02
inquéritos em 2012, 01 inquérito policial foi arquivado.
Na Bahia a Ouvidoria Geral da Secretaria de Segurança Pública informou que em 2010 foram
registradas 94 ocorrências enquadradas na Lei 7.716/89, 89 ocorrências em 2011 e 35
ocorrências em 2012. A ouvidoria informou todas as ocorrências são transformadas em
Inquéritos Policiais ou Termos Circunstanciados de Ocorrência (TCO) e encaminhados para
uma das Varas Crimes da Comarca.
Em Recife recebemos resposta do Grupo de Trabalho Racismo da Polícia Civil de Pernambuco,
grupo instituído em setembro de 2012 com o objetivo de melhorar os serviços prestados aos
cidadãos, banindo toda a forma de discussão e ampliando a discussão sobre o enfrentamento
ao racismo institucional.
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O grupo informou em seu relatório que vem desde sua instituição buscando melhorar o
sistema de acompanhamento destes crimes, mas não informou sobre o registro de
ocorrências.
Ressaltaram que o grupo tem participado de encontros e trabalhos junto com o CEPIR –
Comitê Estadual de Políticas para Igualdade Racial e com o Grupo de Trabalho Racismo do
Ministério Público, acompanhando inclusive o processo de criação da campanha RACISMO.
COMEÇA COM OFENSA. TERMINA COM JUSTIÇA, iniciada em novembro de 2011 e que recebeu
em julho de 2012 o Prêmio Nacional de Comunicação e Justiça.
A Secretaria de Política de Promoção de Igualdade Racial – SEPPIR, cujas funções incluem o
acompanhamento da implementação de legislação de ação afirmativa e definição de ações
públicas que visem o cumprimento de acordos, convenções e outros instrumentos congêneres
assinados pelo Brasil, nos aspectos relativos à promoção da igualdade e combate à
discriminação racial ou étnica11, respondeu informando que não acompanha questões de
mapeamento e monitoramento da Lei 7.716/89, como também não possui dados de todos os
procedimentos em que se aplica o artigo 20, §§ 2º, 3º e 4º da referida lei.
A SEPPIR informou, entretanto, que está constituindo um sistema de acompanhamento e
monitoramento das Políticas Públicas de enfrentamento ao racismo e promoção da igualdade
racial, no qual foi incluso o monitoramento da Lei 7.716/89.
Em 11.10.2012 enviamos novo pedido a SEPPIR para acompanhar o andamento da instituição
do sistema e a secretaria respondeu que faz o monitoramento da implementação da Lei
7.716/89 por meio do recebimento de informações e denúncias por meio da sua Ouvidoria
Nacional da Igualdade Racial.
Informou ainda a SEPPIR que está prevista ano de 2013 a implementação de um código tridígito
de telefonia de fácil memorização, destinado à prestação de serviço de utilidade pública, para
acolhimento das denúncias de vítimas de discriminação e racismo.
Quanto ao discurso do ódio a SEPPIR apontou a existência do Programa Juventude Viva, recém
lançado em sua em sua experiência-piloto no Estado de Alagoas, em quatro municípios, e que
será estendido a outros 128 municípios no Brasil todo, que tem como um de seus objetivos a
desconstrução da cultura da violência por meio de campanhas nacionais e mobilização da
sociedade civil em torno da discussão de valores com fito na valorização da vida o que,
segundo eles, em última instância, tem rebatimento no enfrentamento ao discurso do ódio.
Por fim a SEPPIR destacou o acompanhamento do Programa 2034 – Enfrentamento ao
Racismo e Promoção da Igualdade Racial.
11
http://www.seppir.gov.br/sobre
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Aguarda-se ainda respostas das Secretarias de Segurança Pública dos Estados do Ceará,
Espírito Santo, Santa Catarina, Paraíba.
Estas respostas recebidas demonstram que não há uma padronização no sistema de
mapeamento e monitoramento dos crimes da Lei 7.716/89, o que dificulta a correlação de
dados para análise do tema no quadro nacional como um todo.
Além disso, muitas das respostas evidenciam um despreparo dos órgãos públicos no
acompanhamento de questões relacionadas aos crimes de racismo e discriminação, e, ainda,
um despreparo para o atendimento dos pedidos de informação nos termos da Lei Geral de
Acesso à Informação nº 12.527/2011.
Casos judiciais
Apesar da legislação vigente no Brasil proibindo a prática da discriminação racial e de um
número considerável de ocorrências registradas nas delegacias de todo o país o número de
casos que chegam ao judiciário ainda é muito pequeno.
Selecionamos abaixo três dos principais casos que já foram julgados pelo nosso judiciário
envolvendo discriminação racial e liberdade de expressão. São casos emblemáticos e que
tiveram repercussão na mídia.
Caso Ellwanger
Em 2003 o Supremo Tribunal Federal julgou o caso de Siegfried Ellwanger, condenado pelo
Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul pelo crime de racismo pela edição e publicação de
livros considerados como apologia de ideias preconceituosas e discriminatórias contra a
comunidade judaica.
O Habbeas Corpus 82424 foi o primeiro caso de prática de racismo a chegar ao Supremo e o
caso judicial mais importante sobre discurso do ódio no País.
No julgamento finalizado em Setembro de 2003 o Supremo Tribunal Federal decidiu, por 7
votos a 3 por manter a condenação de Ellwanger pela prática de racismo nos termos da Lei
7716/89.
Foram analisados principalmente dois aspectos chave sobre o caso:


se o crime de racismo da Lei 7716/89 também abrange o preconceito contra os judeus;
como resolver o conflito entre a liberdade de expressão e a igualdade e não
discriminação.
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A maioria dos ministros entendeu que embora com a descoberta do genoma humano saiba-se
que só existe uma raça, a raça humana, o racismo resulta de um processo histórico, político,
social e cultural, e, portanto, o crime de racismo também abarca o preconceito contra os
judeus.
Quanto ao conflito entre o discurso do ódio e a liberdade de expressão, foram usadas diversas
metodologias e argumentos para decidir qual dos princípios constitucionais – a liberdade de
expressão e a igualdade e não discriminação – deveria prevalecer no caso, sendo que o
principal método utilizado foi o da proporcionalidade (Fórmula de Alex Weiss), mas que foi
usada inclusive para se chegar a conclusões diversas.
Veja no quadro abaixo quais foram os principais argumentos dos ministros:
Ministro
Moreira Alves
(Relator)
Votou contra ou
a favor do réu?
A favor
Carlos Ayres
Britto
A favor
Marco Aurélio
A favor
Qual o argumento?
Aplicando
interpretação
restritiva da constituição,
entendeu que não sendo os
judeus uma raça, não houve
crime de racismo, portanto há
prescrição.
A obra do réu está situada no
plano da convicção política,
protegida constitucionalmente
pela liberdade de expressão, e
quantos as obras editadas elas
levam assinatura de outros
autores e o réu não deve o
autor responder nem civil ou
criminalmente.
A
imprescritibilidade
é
instituto gravíssimo para a
segurança jurídica e deve, no
caso
do
racismo,
ser
interpretada da forma mais
restritiva
possível
e,
considerando a história e a
realidade brasileira, aplicável
apenas ao preconceito contra
Como solucionou o
conflito entre
liberdade de expressão
x discurso do ódio?
Não analisa por entender
que não é objeto do
habeas corpus.
A constituição protege a
liberdade de expressão
para defender convicção
político-ideológica.
A restrição à liberdade de
expressão
não
deve
ocorrer pela simples
alegação de que a opinião
seja discriminatória sem
que
haja
elementos
concretos
que
demonstrem a existência
de motivos suficientes
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o negro.
para a limitação. A
restrição deve seguir a
regra
da
proporcionalidade:
adequação dos meios,
necessidade dos meios e
proporcionalidade
em
sentido estrito. No caso
entende que a defesa de
uma ideologia não é
crime e que as ideias do
livro
devem
ser
combatidas
com
confronto de ideias e não
com proibição.
Embora cientificamente não - Liberdade de expressão
Maurício
Contra
existam subdivisões da raça não é absoluta, devendo
Corrêa
humana, o racismo persiste ser exercida de maneira
como
fenômeno
social, harmônica.
decorrente da concepção - Conflito de direitos –
histórica política e social. O direito individual não
combate ao racismo tem pode ser salvaguarda
inspiração no direito à para cometer-se ato
igualdade
e
no ilícito, no caso incitação
reconhecimento mundial do ao racismo.
direito dos homens.
- Deve preponderar o
direito de toda a parcela
da sociedade atingida
pela publicação das obras
Preservação da causa dos - Nenhum direito ou
Celso de Mello
Contra
direitos essenciais da pessoa garantia tem caráter
humana, sendo a prática do absoluto.
racismo ofensa inaceitável a A
liberdade
de
esses direitos. Entende que expressão não pode
racismo não se resume à compreender, em seu
conceito
estritamente âmbito
de
tutela,
antropológico ou biológico manifestações revestidas
mas
se
projeta
numa de ilicitude penal
dimensão
abertamente - O caso não traduz
cultural e sociológica.
conflito entre “direitos
básicos titularizados por
sujeitos diversos”.
- A igualdade e da
dignidade pessoal dos
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seres
humanos
constituem
limitações
externas à liberdade de
expressão.
- deve ser utilizado
método da ponderação
de bens e valores
O conceito jurídico de racismo A
liberdade
de
Contra
não se dissocia do conceito expressão não é absoluta.
Gilmar Mendes
histórico,
sociológico
e - A discriminação racial
cultural,
que
inclui
o compromete um dos
antissemitismo.
pilares
do
sistema
democrático: a igualdade
- Para restringir liberdade
de expressão usa-se o
princípio
da
proporcionalidade:
adequação, necessidade
e proporcionalidade em
sentido estrito.
Necessidade de proteção dos - A incitação ao ódio
Carlos Velloso
Contra
direitos humanos. Racismo público contra o povo
constitui-se no atribuir a seres judeu não está protegida
humanos
características pela
liberdade
de
‘raciais’ para instaurar a expressão.
desigualdade
e
a - Quando há conflito
discriminação.
aparente de direitos
fundamentais prevalece o
direito que melhor realiza
o sistema de proteção
dos direitos e garantias
da Constituição.
A
liberdade
de
expressão não pode
sobrepor-se à dignidade
da pessoa humana
Entende que a discriminação A
liberdade
de
Nelson Jobim
Contra
contra
os
judeus
está expressão é pressuposto
enquadrada nos termos da e instrumento para a
constituição federal como produção do debate
racismo, sendo imprescritível. democrático e, assim,
para a formação da
convicção da maioria.
A
igualdade
é
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precondição
para
a
democracia e o objetivo
da liberdade de opinião
- O discurso do ódio não
tem a intenção de gerar
um debate democrático
sobre uma ideologia, mas
apenas
de
impor
condutas antiigualitárias
de extermínio, ódio e
linchamento, ferindo o
princípio da igualdade, o
que a constituição não
tolera.
Preconceito de raça conforme Não mencionou.
Ellen Gracie
Contra
a Constituição não se dá
segundo critérios científicos,
pois não existem, mas na
percepção do outro como
diferente e inferior, revelada
na atuação carregada de
menosprezo e no desrespeito
a seu direito fundamental à
igualdade.
A constituição tende, em A edição e publicação de
Cezar Peluso
Contra
última instância, a resguardar forma sistemática de
a integridade biopsicológica livros com o propósito de
de
grupos
sociais difundir o antissemitismo,
diferenciáveis por caracteres instigando e reforçando
físicos, religiosos, étnicos, de preconceitos e ódios
procedência ou origem, que históricos, trata-se de
podem ser alvo de ideologia conduta
contrária
à
racista
e
manifestações constituição e fora dos
concretas de discriminação e limites à liberdade de
violência.
expressão.
Entende
o
preconceito O exercício da liberdade
Sepúlveda
Contra
antissemita como racismo e de expressão se exaure
Pertence
que o livro do autor tinha quando da manifestação
intenção de incitar o ódio.
do pensamento, mas a
partir daí o autor está
sujeito a responder civil e
criminalmente por esta
manifestação.
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Embora tenha sido dada uma conclusão ao caso concreto, devido às particularidades do caso
Ellwanger e à variedade de argumentos, sem uma metodologia bem definida entre os
ministros, não foi dada uma solução definitiva ao conflito entre a liberdade de expressão e a
vedação ao racismo.
Na opinião de Samantha Meyer-Plufg, autora da obra “Discurso do Ódio e Liberdade de
Expressão”, o Supremo Tribunal Federal teve a oportunidade neste caso de explorar todos os
direitos em jogo e firmar uma jurisprudência consolidada, mas não o fez. Ela afirma que
quando o Tribunal perde esta oportunidade a questão se repete12.
Além disto, apesar de terem sido citadas as legislações e tratados internacionais sobre o tema,
os ministros não seguiram os padrões internacionais definidos para a resolução do conflito.
Unidos do Viradouro
Outro caso emblemático foi o da escola de samba Unidos do Viradouro, que em 2008
apresentou o samba-enredo “É de arrepiar”, trazendo carros alegóricos fazendo referencia à
coisas que causam arrepio, como aranhas, exorcismo, cadeiras elétricas, guilhotinas.
Um dos carros alegóricos faria referência ao Holocausto, com esculturas representando
cadáveres nus empilhados e sapatos e trazendo um dos membros da escola de samba vestido
de Adolf Hitler sobre os corpos.
Ao saber disto o presidente da Federação Israelita do Rio de Janeiro (Fierj) entrou com um
pedido liminar que foi concedido pela justiça do Rio de Janeiro que determinou uma multa de
R$ 200.000,00 caso a escola de samba apresentasse o carro alegórico no Sambódromo no
carnaval e mais R$ 50.000,00 caso algum dos membros da escola aparecesse fantasiado de
Hitler.
A decisão mostrou que a falta de parâmetros claros na resolução do caso Ellwanger resultou
em interpretações erradas a cerca da proteção contra o discurso de ódio, especialmente no
que tange à verificação da intenção de promover o ódio e a discriminação13.
No lugar do carro alegórico do Holocausto os membros da Viradouro desfilaram usando
mordaças e com a frase “não se constrói o futuro enterrando a história” em protesto contra
decisão judicial.
12
MEYER-PLUFG, Samantha Ribeiro, Ideias devem ser confrontadas com ideias, Revista Problemas
Brasileiros, nº 406, julho/agosto de 2011
13
Ibid. nota 7
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Monteiro Lobato
Atualmente tramita no Supremo Tribunal Federal ação proposta pelo Instituto de Advocacia
Racial e Ambiental (Iara) que discute a adoção do livro infantil “Caçadas de Pedrinho”, de
Monteiro Lobato, pelo Programa Nacional Biblioteca na Escola (PNBE), do Ministério da
Educação.14
O instituto e o técnico em gestão educacional Antônio Gomes da Costa Neto afirmam que o
livro faz referências ao negro com “estereótipos fortemente carregados de elementos racistas”
e pediram a anulação do parecer do Conselho Nacional de Educação (CNE) que libera a adoção
do livro nas escolas públicas.
Caso o livro permaneça como parte do acervo do PNBE o Iara pede a elaboração de uma nota
explicativa com esclarecimentos sobre a presença de elementos racistas na literatura e a
capacitação e formação de educadores para a utilização adequada da obra na Educação Básica.
Foram realizadas audiências de conciliação nos dias 11 e 25 de setembro de 2012 convocadas
pelo relator Ministro Luiz Fux, que decidirá sobre o caso, e embora não tenha sido firmado
acordo o ministro afirmou que houve avanços e o resultado dos encontros foi positivo.
Em nota publicada sem seu portal oficial na internet o Ministério da Educação reafirmou sua
posição absolutamente contrária à censura da obra e em defesa da “ plena liberdade de ideias
e o acesso dos estudantes a produções culturais e científicas com a mediação de um professor”.
O Iara por sua vez afirma que o pede não é censura, mas esclarecimento.
Após a realização segunda audiência de conciliação as informações da reunião foram
encaminhadas ao ministro Luiz Fux e aguarda-se o desfecho que será dado ao caso15.
Conclusão
O escasso número de ações judiciais envolvendo o crime de racismo e de certa forma os
próprios número apresentados pelas Secretarias de Segurança Pública corroboram com a ideia
14
15
Mandado de Segurança nº 30952, STF, min. rel. Luiz Fux
http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=217743
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de que o discurso de ódio no Brasil se dá de forma velada, implícita e muitas vezes travestida
na forma de humor.
Segundo Samantha Meyer-Plufg isto caracteriza um “discurso de ódio material”, ou seja, um
discurso que materialmente se reveste de todas as características do discurso do ódio, mas
que se não se dá de maneira explícita. Para ela o discurso do ódio material atinge os mesmos
objetivos do discurso do ódio formal, porém é mais dificultoso o seu combate justamente por
ocorrer de maneira velada.
Isso implica que o discurso do ódio no Brasil deve ser combatido não somente com base nos
padrões internacionais e tratados ratificados pelo Brasil, mas também considerando suas
particularidades, sob o risco de não serem eficientes as políticas de combate à discriminação.
Além disso, a ARTIGO 19 defende que a criminalização do discurso de ódio deve se limitar à
um número muito restrito de situações e deve seguir rigorosos procedimentos para a
determinação de sua aplicação de modo que não represente uma desproporcional e
injustificada restrição à liberdade de expressão.
Ainda sim, simplesmente restringir a liberdade de expressão nos casos do discurso de ódio,
ainda mais sob a égide do direito penal, não tem o condão de de fato impedir o preconceito a
discriminação, qualquer que seja, mas apenas de punir sua exteriorização e proteger os
indivíduos que dele sejam alvo.
O combate ao preconceito e à discriminação deve se dar através da educação, do diálogo, e
através de políticas que garantam efetivamente o acesso às mídias e aos meios de
comunicação aos grupos geralmente alvos de preconceito em nossa sociedade, de forma que
às diversidades étnicas, religiosas, sociais, culturais, sexuais, de gênero, regionais, estejam de
fato refletidas nos meios de comunicação.
Somente garantindo voz e visibilidade à esses grupos é que de fato teremos uma sociedade
igualitária, plural e diversa e livre de quaisquer formas de discriminação e preconceito.
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PANORAMA SOBRE DISCURSO DE ÓDIO NO BRASIL