Uma revisão sobre biodiesel
Resumo
Renata Carolina Zanetti Lofrano
A energia consumida no mundo é proveniente,
principalmente, do petróleo, do carvão e do gás natural.
Essas fontes são limitadas e esgotáveis, portanto, a busca
por fontes alternativas de energia é de suma importância.
Nesse cenário, o biodiesel surge como uma fonte energética
alternativa, renovável e limpa. O uso do biodiesel como
combustível tem aumentado mundialmente e seu mercado
se expande rapidamente devido à sua elevada contribuição
ao meio ambiente, com a redução dos níveis de poluição
ambiental e também por ser uma fonte estratégica de
energia renovável em substituição ao óleo diesel e a outros
derivados do petróleo.
Palavras-chave
Biodiesel, Reação de Transesterificação, Catalisadores,
Glicerina.
Autor
Renata Carolina Zanetti Lofrano
Bacharel em Química pela Faculdade
de Filosofia Ciências e Letras de Ribeirão
Preto da Universidade de São Paulo –
FFCLRP/USP, com Pós-doutorado em
Nanotecnologia e Mestrado e Doutorado
em Ciências, com área de concentração
Química Orgânica pela FFCLRP/USP.
Professora do Centro Universitário das
Faculdades Associadas de Ensino – FAE
e-mail:
[email protected]
Recebido em 30/abril/2008
Aprovado em 03/junho/2008
Pensamento Plural: Revista Científica do
, São João da Boa Vista, v.2, n.2, 2008
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LOFRANO, R. C. Z.
1. Introdução
A questão energética sempre foi de suma importância
para a história da humanidade. Tudo o que consumimos
ou utilizamos em nossos lares, seu conteúdo, nossos carros e as vias que percorremos, as roupas que usamos, e
os alimentos que comemos, requerem energia para serem
produzidos e embalados, distribuídos às lojas ou em domicílio, operados e depois descartados (SAWIN, 2004, p.
29). Desde a produção mais artesanal até o forte processo
de modernização dos parques industriais, a expansão dos
mercados, o enorme crescimento e concentração populacional, as grandes disputas militares, a previsão de escassez dos recursos naturais e, por fim, a globalização, levaram ao consumo excessivo, tornando a energia um recurso
cada vez mais valorizado. Esses fatores, potencializados
pela utilização predominante de combustíveis fósseis, vêm
gerando graves problemas econômicos, sociais e ainda
ambientais, como por exemplo, o efeito estufa e as alterações climáticas.
Nesse contexto, a produção de biocombustíveis, em especial o biodiesel, tornou-se uma das formas mais eficientes de diversificar a matriz energética, contribuindo para
a conservação do meio ambiente, através da redução da
emissão de gases do efeito estufa; para o desenvolvimento
econômico, através do aprimoramento e descentralização
de investimentos e para o desenvolvimento social através
da geração de emprego e renda no campo. Entretanto, é
necessário, que sejam estabelecidos mecanismos de suporte à produção e comercialização desses biocombustíveis.
Isso é possível através da otimização de recursos e da interação das instituições públicas, privadas e dos pequenos
produtores rurais. Desta forma, se tornam essenciais à produção de informações confiáveis, estudos que garantam a
viabilidade jurídica, técnica, ambiental, social e comercial
(COSTA, 2006, p. 30); (BELTRAMINI E LOFRANO, 2008,
Cap. 1); (SUAREZ, 2007, p. 2068).
2. Biocombustíveis
Os biocombustíveis são fontes de energias renováveis,
derivados de produtos agrícolas como açúcar, plantas oleaginosas, biomassa(1) florestal e outras fontes de matéria
orgânica. Em alguns casos, os biocombustíveis podem ser
usados tanto isoladamente, como adicionados aos combustíveis convencionais. Como exemplos, podem-se citar
o biodiesel, o etanol, o metanol, o gás metano e o carvão vegetal (PÓLO NACIONAL DE BIOCOMBUSTÍVEIS,
2007).
3. Conceito e Especificação do Biodiesel
A lei que regulamenta o biodiesel no Brasil é a Lei n0
11.097, de 13 de janeiro de 2005, na qual estão especificadas todas as regras para sua produção e comercialização. Segundo essa lei:
Biodiesel: biocombustível derivado de biomassa renovável para uso em motores a combustão
interna com ignição por compressão ou, conforme regulamento para a geração de outro
tipo de energia, que possa substituir parcial, ou
totalmente, combustíveis de origem fóssil. (Inciso 10 do art. 20 da Lei n0 11.097 da Constituição Federal, de 13 de janeiro de 2005).
A especificação do biodiesel destina-se a garantir a sua
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qualidade e é pressuposto para se ter um produto adequado ao uso. O biodiesel terá qualidade quando for adequado ao uso que se propõe. As especificações das normas
visam a dois grupos de cuidados: os que pertencem ao que
se denomina "padrão de identidade" e o que se denomina
"padrão de qualidade". As normas que se direcionam para
o padrão de qualidade dizem respeito ao uso do produto e
as que dizem respeito ao padrão de identidade procuram
assegurar que o produto não seja adulterado.
A especificação do biodiesel no Brasil ficou a cargo da
Agência Nacional do Petróleo (ANP). Até o momento foram
editadas duas portarias sobre o biodiesel: a portaria n0
240, que trata do uso de combustíveis não especificados,
ou seja, aqueles cujas características não estão definidas
por dispositivos legais expedidos pela ANP; a portaria n0
255, trata da especificação técnica do biodiesel puro a ser
adicionado ao óleo diesel automotivo, para testes em frotas cativas, ou para uso em processo industrial específico.
O assunto ainda necessita de um modelo detalhado sobre
a regulação da produção, da comercialização e o uso do
biodiesel. (ANP, 2005).
4. Matérias-primas
As gorduras ou lipídios são os principais constituintes
das células de armazenamento de gordura dos animais e
das plantas e são as mais importantes reservas alimentares
do organismo. Por extração destas gorduras animais e vegetais – as gorduras líquidas designam-se freqüentemente
por óleos, obtêm-se substâncias como azeite, o óleo de
milho, o óleo de semente de algodão, o óleo de linhaça, a
banha de porco e a manteiga (VOLHARD, 2004, p. 757).
Quimicamente, os óleos e gorduras animais e vegetais
consistem de moléculas de triacilglicerídeos, as quais são
constituídas de três ácidos graxos de cadeia longa, ligados na forma de ésteres a uma molécula de glicerol. Esses
ácidos graxos variam na extensão da cadeia carbônica,
no número, orientação e posição das insaturações ou duplas ligações (MORRISON, 2005, Cap. 20). A Tabela 1
apresenta a composição do óleo de soja, através da qual
podemos verificar que ele é composto por cinco diferentes
ácidos graxos.
Muitas matérias-primas podem ser utilizadas na proÁcidos
graxos
Símbolo
Composição (%)
Palmítico
C16
12,36
Esteárico
C18
3,70
Oléico
C18:1c
27,00
Linoléico
C18:2c
50,25
Linolênico
C18:3c
10,61
Tabela 1. Composição em porcentagem dos ácidos graxos, presentes
no óleo de soja (ABREU, 2001, p. 1931), (MA, 1999, p. 1).
dução de biodiesel e podem ser divididas nos seguintes
grupos: óleos vegetais, gordura animal e óleos e gorduras
residuais.
Algumas fontes para extração de óleo vegetal, com potencial para ser utilizado na produção de biodiesel, são:
baga de mamona, polpa do dendê, amêndoas do coco
de dendê, do coco de babaçu, do coco da praia, caroço
de algodão, grão de amendoim, sementes de canola, de
girassol, de maracujá, de linhaça e de tomate, polpa de
Pensamento Plural: Revista Científica do
, São João da Boa Vista, v.2, n.2, 2008
Uma revisão sobre biodiesel
abacate, caroço de oiticica, e de nabo forrajeiro.
Entre as gorduras animais, destacam-se o sebo bovino,
os óleos de peixes, o óleo de mocotó, a banha de porco,
entre outros.
Os óleos e gorduras residuais, resultantes de processamento doméstico, comercial e industrial também podem
ser utilizados como matéria-prima. Os óleos de frituras representam grande potencial de oferta. Um levantamento
primário da oferta de óleos residuais de frituras, suscetíveis
de serem coletados, revela um potencial de oferta no País
superior a 30 mil toneladas por ano. Algumas possíveis
fontes dos óleos e gorduras residuais são: lanchonetes e
cozinhas industriais, indústrias onde ocorre a fritura de
produtos alimentícios, os esgotos municipais onde a nata
sobrenadante é rica em matéria graxa e águas residuais de
processos de indústrias alimentícias (VIEIRA, 2008, p. 14).
5. Produção do Biodiesel
No processo de produção do biodiesel estão envolvidas as seguintes etapas (ver Figura 1) (www.biodieselbr.
com, 2008):
• Preparação da matéria-prima,
• Reação de transesterificação,
• Separação das fases,
• Recuperação e desidratação do álcool,
• Destilação da glicerina e
• Purificação do biodiesel.
MATÉRIA
PRIMA
PREPARAÇÃO DA
MATÉRIA-PRIMA
Óleo ou
Gordura
Metanol
ou
Etanol
REAÇÃO DE
TRANSESTERIFICAÇÃ
O
Catalisador
SEPARAÇÃO
DAS FASES
Fase
pesada
Fase leve
DESIDRATAÇÃO
DO ÁLCOOL
RECUPERAÇÃO DO
ÁLCOOL DA
GLICERINA
DESTILAÇÃO
DA GLICERINA
Resíduo
glicérico
Excesso
de álcool
recuperado
Glicerina
destilada
RECUPERAÇÃO DO
ÁLCOOL DOS
ÉSTERES
PURIFICAÇÃO
DOS ÉSTERES
BIODIESEL
Figura 1. Fluxograma do processo de produção de biodiesel (VIEIRA, 2008, p. 34).
5.1. Preparação da matéria-prima
A matéria-prima, se necessário, deve ser submetida
a um processo de neutralização, filtração ou secagem. A
acidez é reduzida por lavagem com solução alcalina de hidróxido de sódio ou potássio. A filtração pode ser realizada
usando-se papel de filtro com diferentes porosidades. A
umidade da matéria-prima deve ser muito baixa e para tal
podem ser usados agentes secantes tais como, sulfato de
magnésio ou sulfato de sódio, ou ainda aquecimento.
5.2. Reação de transesterificação
A reação de transesterificação de um óleo e um álcool
produz ésteres e um subproduto, o glicerol ou glicerina. A
Figura 2 mostra a reação de transesterificação de um triPensamento Plural: Revista Científica do
glicerídeo com o metanol. Como essa reação é reversível,
é necessário o uso em excesso de álcool para deslocar o
equilíbrio no sentido do produto desejado. A estequiometria para a reação é de 3:1 (álcool:lipídio). Um catalisador
é normalmente usado para acelerar a reação, podendo ser
básico, ácido ou enzimático (ver item 5.2.1.).
Na reação de transesterificação são usados, preferencialmente, álcoois de baixa massa molecular, como por
exemplo, metanol, etanol, propanol, butanol e álcool amílico (FERRARI, 2005, p. 19), mas metanol e etanol são os
mais freqüentemente empregados.
Metanol é o mais utilizado devido ao seu baixo custo na
maioria dos países e às suas vantagens físicas e químicas
(polaridade, álcool de cadeia mais curta, reação rápida
com triacilglicerídeo e dissolução fácil com o catalisador
básico). Além disso, permite a separação simultânea do
glicerol. A mesma reação usando etanol é mais complicada, pois requer um álcool anidro, bem como um óleo
com baixo teor de água para levar a separação do glicerol
(GERIS, 2007, p. 1369). Contudo, o etanol está se tornando mais popular, pois ele é renovável e muito menos tóxico
que o metanol (VIEIRA, 2008, p. 14).
O tipo de catalisador, as condições de reação e a concentração de impurezas numa reação de transesterificação
determinam o caminho que a reação segue.
Na transesterificação com catalisadores básicos, água
e ácidos graxos livres não favorecem a reação. Assim sendo, são necessários triglicerídeos e álcool desidratados
para minimizar a produção do sabão. A produção de sabão diminui a quantidade de ésteres e dificulta a separação entre a glicerina e os ésteres (biodiesel). Nos processos
que usam óleo in natura, adiciona-se álcali em excesso,
para remover todos ácidos graxos livres (COSTA NETO,
2000, p. 531).
Observando a Tabela 2, pode-se verificar que o biodiesel tem propriedades similares às do óleo diesel, pois
apresenta menor valor calorífico, viscosidade e densidade
próximas à do óleo diesel e baixíssimo teor de enxofre.
5.2.1. Catalisadores
Um catalisador é uma substância que aumenta a velocidade de uma reação, sem ele próprio sofrer variação
química (BROWN, 2005, p. 521).
Do ponto de vista cinético, a reação de transesterificação pode ser realizada usando-se catalisadores básicos,
ácidos ou enzimas. A catálise básica é, indiscutivelmente,
a mais utilizada em todo mundo. A produção industrial de
biodiesel é, em sua quase totalidade, conduzida por esta
rota.
- Catálise Básica
Os catalisadores, utilizados na catálise básica, são bases fortes como hidróxido de potássio, hidróxido de sódio,
carbonatos e metóxidos, etóxidos e, em menor grau, propóxidos e butóxidos de sódio e potássio. Nestes processos,
a base é dissolvida no álcool utilizado, e adicionada ao
óleo. São utilizados reatores agitados, com ou sem aquecimento. O tempo de reação típico é de cerca de 1 a 2 h.
A utilização de catalisadores básicos permite obter
taxas de reação quase 4000 vezes superiores às obtidas
pela mesma quantidade de catalisadores no processo ácido. Além disso, o custo das bases fortes é bastante inferior
ao das enzimas utilizadas como biocatalisadores, além de
vantagens adicionais associadas à disponibilidade dos catalisadores básicos que, apesar das dificuldades de recuperação, permitem a reutilização como catalisadores sem
perda de atividade.
A catálise básica permite a utilização de temperaturas
, São João da Boa Vista, v.2, n.2, 2008
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LOFRANO, R. C. Z.
Figura 2. Reação de transesterificação do triacilglicerídeo e metanol para obtenção de biodiesel (VOLHARD, 2004, p. 755).
Figura 2. Reação de transesterificação do triacilglicerídeo e metanol para obtenção de biodiesel (VOLHARD, 2004, p. 755).
Propriedade
Óleo diesel
Biodiesel
Massa específica (Kg/L)
8,835
0,88
Valor colorífico bruto (MJ/L)
38,3
33,3
Viscosidade (mm2/s a 37,80C)
3,86
4,7
Enxofre (%)
0,15
> 0,01
Tabela 2. Propriedades do óleo diesel e do biodiesel (DBIO/CERBIO, 2008).
e pressões menores, diminuindo os custos energéticos e
de instalação dos reatores. Além disso, a catálise alcalina
permite o uso de menores relações molares álcool/óleo.
Entretanto, devido à possibilidade de saponificação, o processo é limitado a óleos de baixa acidez, de maior preço,
dificultando a utilização de resíduos ou óleos não processados, mais baratos. No caso de se utilizar resíduos de óleos
não processados é necessária a utilização de metanol ou
etanol anidro, que são mais caros que seus correspondentes hidratados. A separação, recuperação e purificação do
glicerol e dos catalisadores são dispendiosas e demoradas.
O tempo de reação necessário é relativamente longo, e
como o processo transcorre em reatores agitados, o consumo energético é alto e os custos associados também são.
Assim, a melhor alternativa no presente momento, sendo o
processo alcalino, está longe de ser completamente otimizado para a produção de éster de óleo vegetal.
- Catálise Ácida
Os ácidos utilizados no processo de transesterificação
incluem ácido sulfúrico, sulfônico, fosfórico ou clorídrico,
entre outros. Destes, o ácido sulfúrico é o mais utilizado.
Entre as possibilidades associadas à catálise ácida está a
transesterificação in-situ onde a matéria-prima, rica em triglicerídeos, é adicionada diretamente à solução alcoólica
acidificada, ao invés de se reagir o óleo purificado com o
álcool. Desta forma, a extração do óleo e a transesterificação ocorrem juntas.
A catálise ácida apresenta taxas de conversão de triglicerídeos muito inferiores aos obtidos na catálise básica homogênea e demanda quantidades maiores de catalisador
e relações álcool/óleo mais altas. Os tempos de reação
são mais longos e o consumo energético maior, visto que
a maioria dos processos demanda aquecimento. Contudo,
a rota ácida permite a utilização de óleos e gorduras que
possuem um alto teor de ácidos graxos livres, como muitos óleos vegetais não refinados, e resíduos industriais e
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domésticos ricos em triglicerídeos, como óleos de fritura
usados. Portanto, a rota catalítica ácida poderá desempenhar um papel relevante no futuro, no que diz respeito à
produção de biodiesel (SOUZA, 2006).
- Catálise Enzimática
Um grande número de catalisadores muito eficientes
são conhecidos como enzimas. Enzimas são moléculas
grandes de proteínas com massas moleculares variando
entre 10 mil e, aproximadamente, 1 milhão. Elas são muito
seletivas nas reações que catalisam e algumas são absolutamente específicas, atuando somente para uma substância, em uma única reação (BROWN, 2005, p. 516).
A catálise enzimática sintetiza especificamente ésteres
alquílicos. Ela permite a recuperação simples do glicerol,
a transesterificação de glicerídeos com alto conteúdo de
ácidos graxos, a transesterificação total dos ácidos graxos
livres e o uso de condições brandas no processo, com rendimentos aproximadamente 90%, tornando-se uma alternativa comercialmente muito mais rentável.
A maioria das pesquisas sobre a transesterificação de
óleos vegetais para a obtenção de biodiesel utiliza a enzima comercial pura, fazendo uso da imobilização da enzima
em suportes, tais como celite e polímeros, principalmente.
A catálise enzimática faz com que não ocorram reações
paralelas de formação de subprodutos, o que ameniza gastos com a posterior purificação. Algumas enzimas necessitam de cofatores: íons metálicos ou compostos orgânicos
(coenzimas). Esses cofatores irão influenciar na atividade
do catalisador biológico.
As vantagens deste processo são: a inexistência de
rejeito aquoso alcalino, menor produção de outros contaminantes, maior seletividade e bons rendimentos, que
motivam a realização de pesquisas que visem a diminuir
a principal desvantagem da metodologia, o alto custo das
enzimas puras. O custo elevado dos processos de extração
e purificação das macromoléculas e sua instabilidade em
Pensamento Plural: Revista Científica do
, São João da Boa Vista, v.2, n.2, 2008
Uma revisão sobre biodiesel
solução representam um obstáculo à recuperação do biocatalisador após sua utilização (CASTRO, 2004, p. 146),
(DUARTE, 2006, p. 4).
5.3. Separação de fases
A separação de fases é uma etapa importante na produção de biodiesel. O processo de isolamento dos produtos
pode ser experimentalmente difícil, e pode elevar, substancialmente, os custos de produção. A pureza do biodiesel deve ser
alta e o teor de ácidos livres, álcool, glicerina e água devem
ser mínimos de modo que a pureza do biodiesel seja maior
que 96,5% (KARAOSMANOGLU, 2007, p. 221).
A mistura típica do produto de uma reação de transesterificação contém ésteres, monoglicerídeos, diglicerídeos,
glicerol, álcool e catalisador, em várias concentrações. Na
separação, o principal objetivo é remover os ésteres dessa mistura, a baixo custo, e assegurar um produto de alta
pureza. O glicerol, na sua forma pura, é visto como um
produto secundário da reação, mas, para manter a competitividade do custo de produção, a remoção e a revenda de glicerol é essencial. A mistura restante, que contém
subprodutos e álcool, deve ter o mínimo de contaminantes,
se a conversão for alta, exceto para o álcool que ainda for
destilado. Se a reação atingir um alto nível de conversão,
o produto formará duas fases líquidas e uma fase sólida,
se for usado um catalisador sólido. A fase inferior, mais
densa, será o glicerol e a fase superior, menos densa, serão
o álcool e ésteres.
5.4. Recuperação e desidratação do álcool
A fase inferior que contém água e álcool deve ser submetida a um processo de evaporação. Os vapores de água
e álcool são, a seguir, liquefeitos em um condensador. Da
mesma forma, o álcool residual é recuperado da fase
superior. Após essa recuperação, o álcool ainda contém
água e deve ser desidratado. Essa desidratação é normalmente feita por destilação. A desidratação do metanol é
bastante simples e fácil de ser conduzida, uma vez que a
volatilidade relativa dos constituintes dessa mistura é muito
grande e inexiste a azeotropia. A desidratação do etanol é
mais difícil em razão da azeotropia, associada à volatilidade relativa não tão acentuada.
5.5. Destilação da glicerina
A glicerina bruta do processo contém impurezas e, se
purificada, terá um valor de mercado muito mais favorável.
A purificação da glicerina bruta pode ser feita por destilação a vácuo, gerando um produto límpido e transparente.
O produto de calda da destilação, ajustável na faixa de
10% a 15% do peso da glicerina bruta, pode ser denominado de “glicerina residual” e ainda encontra possíveis
aplicações.
5.6. Purificação do biodiesel
Quando a reação de transesterificação for incompleta,
ou caso a purificação não seja eficiente, o biodiesel produzido pode ficar contaminado com glicerol, triglicerídeos
e álcool. A presença de contaminantes pode ser prejudicial
para os motores e para o meio ambiente. Os ésteres deverão ser lavados por centrifugação e, posteriormente, secos
(VIEIRA, 2008).
6. Análise e Caracterização do
Biodiesel
Na última década, vários estudos têm sido feitos visando-se ao desenvolvimento de metodologias de análise de
Pensamento Plural: Revista Científica do
biodiesel e seus subprodutos. As técnicas investigadas incluem a cromatografia gasosa, a cromatografia de filme
líquido, cromatografia em camada delgada (FROEHNER,
2007, p. 2016), a cromatografia de líquido de alta precisão, a refratometria e a ressonância magnética nuclear,
entre outras (WUST, 2004).
As técnicas de análise necessitam ser precisas, confiáveis, reprodutíveis, rápidas e simples. Nesse sentido a
cromatografia gasosa tem sido o método mais aceito para
caracterização do biodiesel (KNOTHE, 2006).
7. Glicerina
A glicerina é uma matéria-prima de alto valor agregado que pode ser empregada em uma ampla variedade de
produtos como cosméticos, químicos, alimentícios e farmacêuticos. Porém, no caso da glicerina bruta, resultante do
processo da transesterificação de óleos e gorduras residuais
na produção do biodiesel, são necessários processos complexos e onerosos para que essa matéria-prima alcance as
exigências em grau de pureza necessária para esses fins,
e não se pode simplesmente depositar a glicerina residual
em aterros, pois se cria um problema ambiental, devido à
sua alta demanda bioquímica de oxigênio (DBO).
Alguns estudos indicam que o mercado, a médio prazo, só conseguirá absorver 50% de toda essa matéria-prima produzida (KRAUSE, 2004; McCOY, 2005). Uma das
alternativas viável econômica e ambientalmente, para o
aproveitamento dessa matéria-prima, obtida pela transesterificação básica, com hidróxido de potássio (KOH) como
catalisador, portanto rico em potássio, é sua compostagem
com outros resíduos orgânicos, para a fabricação de adubo (ROBRA, 2006, 53).
8. Outras Aplicações
O biodiesel pode também ser utilizado como lubrificante, atuando como óleo de limpeza de peças e máquinas,
como solvente para tintas e adesivos químicos e ainda, no
funcionamento de aquecedores, lanternas e fornos.
Uma faceta importante da produção do biodiesel é
que, depois de extrair o óleo das plantas oleaginosas, resta ainda uma fração protéica, uma espécie de “bagaço”
(detrito sólido). Este material não precisa ser descartado,
podendo ser utilizado como alimento, ração animal, adubo orgânico ou como combustível para fornos e caldeiras
(BIODIESEL, 2008).
9. Programa Brasileiro de Produção de
Biodiesel
O biodiesel passou a fazer parte oficialmente da matriz
energética brasileira, a partir da lei n0 11097, de 13 de
janeiro de 2005, que o instituiu no Brasil.
A adição de biodiesel ao óleo diesel aprovada para ser
utilizada facultativamente até 2008 é de 2% (B2); a partir
de 2008 essa adição ao diesel será obrigatória, passando
a ser facultativa a mistura de 5% (B5) até 2013. Isso representa, atualmente, uma demanda de 800 milhões de litros,
que deverá aumentar, chegando à cerca de 2 bilhões de
litros em 2013 (CORDEIRO, 2008, p. 2140).
No Brasil, os estudos envolvendo combustíveis alternativos iniciaram na década de 70, com a experiência do
Proálcool. A idéia de utilizar o biodiesel surgiu na Universidade Federal do Ceará, nos últimos anos da década de 70
(PARENTE, 2003, p. 68).
, São João da Boa Vista, v.2, n.2, 2008
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LOFRANO, R. C. Z.
outras ações (PADULA, 2006, p. 89).
10. Considerações Finais
Notas
O tema "biodiesel" tem sido amplamente abordado em
reuniões políticas, científicas e tecnológicas demonstrando
o interesse da sociedade e do setor produtivo nessa nova
oportunidade de negócios para o país. Isso se justifica pelos inúmeros benefícios a ele relacionados, tais como a
criação de novos empregos no setor agroindustrial, a geração de renda, o fomento ao cooperativismo, a perspectiva
de contribuição ao equilíbrio de nossa balança comercial
e pelos comprovados benefícios ao meio ambiente, devido à diminuição na emissão de poluentes causadores do
efeito estufa e doenças respiratórias. Assim sendo, pode-se
dizer que o biodiesel tem potencial para constituir um dos
principais programas sociais do governo brasileiro, representando fator de distribuição de renda, inclusão social e
apoio à agricultura familiar.
Muitos e variados estudos têm sido desenvolvidos
empregando-se diferentes metodologias e condições experimentais para a produção do biodiesel. Estes têm se
mostrado bastante promissores na busca por melhorias nos
rendimentos e condições mais eficientes de produção de
biodiesel e demonstram a potencialidade dessa tecnologia,
justificando o investimento em pesquisas e desenvolvimento de tecnologia nacional, para implantação no Brasil.
(1) Biomassa é toda matéria orgânica de origem vegetal ou animal que pode ser usada para produção de energia. http://www.biodiesel.gov.br/docs/Cartilha_Sebrae.pdf. Acesso em 10 de setembro de 2008;
Referências
O uso do biodiesel como combustível poderá se tornar
um apoio às políticas governamentais, nas áreas social e
ambiental, tendo em vista a contribuição que este combustível poderá representar para a atividade econômica do
país. Dentre elas, pode-se destacar (MCT, 2005):
•
Criação de emprego e geração de renda no
campo;
•
Redução de índices de emissões de gases causadores de efeito estufa;
•
Redução da emissão de poluentes locais com
melhorias na qualidade de vida e saúde pública;
•
Possibilidade de utilização dos créditos de carbono vinculados ao mecanismo de desenvolvimento limpo
decorrentes do Protocolo de Quioto;
•
Uso de terras inadequadas para a produção de
alimentos;
•
Diversificação da matriz energética.
Em oposição a essas vantagens, a viabilidade econômica para o uso comercial do biodiesel ainda requer
análises mais aprofundadas, que deverão envolver, além
das variáveis meramente econômicas, a mensuração das
vantagens indiretas com o uso de um combustível de origem renovável e a maior utilização de mão-de-obra na
cadeia produtiva, promovendo assim, a inclusão social dos
brasileiros menos favorecidos (MCT, 2005); (BELTRAMINI
E LOFRANO, 2008, Cap. 1), além da possibilidade de o
país se beneficiar dos créditos de carbono, advindos dos
projetos de produção de combustíveis renováveis, dentre
ABREU, L. R. et al. Efeito da Suplementação de Lipídios na Ração sobre a Produção de Ácido Linoléico Conjugado
(CLA) e a Composição da Gordura do Leite de Vacas. Revista Brasileira de Zootecnia, v. 30, n0. 6. 1931-1938,
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AGÊNCIA NACIONAL DE PETRÓLEO, GÁS E BIOCOMBÚSTÍVEIS - ANP. Disponível em: http://www.anp.gov.br.
Acesso em 15 de setembro de 2008
BELTRAMINI, L. H. e LOFRANO, R. C. Z. BIODIESEL: Uma Alternativa à Inclusão Social e questões Multifacetárias.
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Abstract
WUST, E. Estudo da viabilidade técnico-científica da produção de biodiesel a partir de resíduos gordurosos. 2004.
101p. Dissertação (Mestrado) – Centro de Ciências Tecnológicas, Universidade Regional de Blumenau, FURB,
Blumenau.
The energy consumed in the world comes mainly from oil, coal and natural gas. These sources are limited and
exhaustible, so the search for alternative sources of energy is of paramount importance. In this scenario, biodiesel
is emerging as an alternative energy source, renewable and clean. The use of biodiesel as fuel has increased
worldwide and its market is rapidly expanding because of their high contribution to the environment, with reduced
levels of environmental pollution and also as a strategic source of renewable energy to replace the diesel oil and
other derivatives oil.
Key words
Biodiesel, the Transesterification Reaction, Catalysts, Glycerin.
Pensamento Plural: Revista Científica do
, São João da Boa Vista, v.2, n.2, 2008
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