Índice ÍNDICE JUNHO A GUILHOTINA Coletivo Guilhotina Índice 04. Editorial Segurem as cabeças – Coletivo Guilhotina 05. Cultura Revista A Guilhotina. Todos os direitos reservados © 2015 Expediente Editores: Henri Sardou e Hebert Terra Gaban Conselho Editorial: Emerson Rodrigues; Fábio De’Rose e Juan Araújo Cooltura – O início de tudo – Luis Fosc 06. Pensamentos Sem Cartola – Combinamos alguma coisa antes daqui? – Ben Ludmer; Paul sem Jack - Código Cultural – Paul Friedericks; As Visões de RA – Ego do mágico – Ramon Amaral; Eu acho que eles escutam – Juan Araújo; Palavras Mágicas - Quem é a mágica brasileira? – Rossini Percepção em Perspectiva - “Convencer” e “Acreditar” – Guilherme Ávila Realimágica - Palestras mágicas. Moda ou opção de carreira? – Janderson Santos; Lâminas de Criatividade - Se alimentar de mágica – Emerson Rodrigues; 15. Capa Uri Geller: fato ou flexão – Coletivo Guilhotina; Entrevistamos – Uri Geller Chegou Lá – Fábio De’Rose; 27. Divagações Perguntas impossíveis, respostas bem prováveis. – Juan Araújo; 30. História - Do fundo da Cartola A GUERRA DAS VARINHAS – Rivalidades históricas entre os mágicos. – Leonardo Glass; 33. Academia – Passo a Passe May the force be with you – Daniel Prado; Reflexo 2.0 – Emerson Rodrigues; 36. Avaliamos – Na ponta dos dedos Automata, por Gary Jones e Chris Congreave. – Emerson Rodrigues; Tom Wright Stand Up Magic. – Emerson Rodrigues; Split Second, por Nicholas Lawrence – Emerson Rodrigues; 39. Acontecimentos – Eu fui O dia em que não fui ver o Quik Marduk – Henri Sardou 40. Acontecimentos – Fakes Relatos e Boatos – G. massimo; 41. Cruzadas 42. Humor - Tirinhas Diagramação: Leonardo Correia Projeto Gráfico: Coletivo Guilhotina Foto da capa: Mark Hemsworth Redação: [email protected] Departamento comercial: comercial@ aguilhotina.com Assinaturas: assine@ aguilhotina.com. As opiniões expressas pelos colaboradores não necessariamente refletem a opinião editorial da revista. Recado da Rainha Coletivo Guilhotina SEGUREM AS CABEÇAS Você está sendo convidado a participar de uma conspiração. Uma inconfidência em favor da arte mágica, especificamente. Mas não na acepção negativa da palavra, que é traição. Ao contrário. Inconfidente no sentido daquele que não confidencia, entretanto expõe sua opinião, intenção, ou trama contra algo por um ideal coletivo. Nesse caso tramamos contra os ignorantes. Os que não lêem, que não aprendem, os pequenos. Os que só fazem repetir, replicar, copiar e não percebem que assim estão diminuindo uma arte que é imensa, se não for a maior, pois une várias vertentes artísticas numa coisa só: Ilusão. Pensamos em criar uma revista nova para mágicos, mas sem apresentar mais do mesmo. Uma publicação orientada para o conteúdo e voltada para a correção de vícios e problemas que infelizmente relegam a mágica hoje a um patamar desvalorizado no campo das artes. Precisamos de cada vez mais mágicos com apuro estético e vocação artística, que tenham emoções a transmitir, pensem, proponham. Não que sejam replicantes disputando espaço com animadores de festa, brigando pra ver quem tem o show mais barato da cidade. Somente assim teremos chances de sermos respeitados pela mágica que fazemos aqui no Brasil. Uma guilhotina é um espetáculo que vai do horror à gargalhada. Dá medo, sua lâmina mata, mas também diverte se estiver nas mãos de um bom artista. É, ainda, um dos símbolos da Revolução francesa, servindo bem ao que nós, abnegados, estamos nos propondo a fazer daqui em diante: uma revolução. Não pegaremos em armas, mas usaremos a melhor munição que existe: a informação. Papel, tinta, megabytes, e uma torrente de ideais. Dentro disso, A Guilhotina será um apanhado de pensamentos, acontecimentos e comentários do cotidiano da mágica, escrita de uma forma moderna, apelando para o bom-senso, algumas vezes de maneira séria, outras com irreverência e ironia, mas sempre com propriedade e isenção. A partir de agora estaremos aqui para lutar contra a ignorância e a barbárie na Arte Mágica, informando, entretendo e clamando por cabeças. Você vem conosco? 04 EDITORIAL JUNHO A GUILHOTINA COOLTURA CULTURA JUNHO A GUILHOTINA Luiz Fosc Abertura Promenade O início de tudo Desde que soube do {re}surgimento da revista “A Guilhotina” e tive o convite para compor este projeto com a sessão cultural, ideias borbulharam em minha mente com relação à gênese, ao início, o “algo novo” surgindo. Afinal, a revista é uma ideia completamente inovadora nas terras tupiniquins, e não posso negar que é bastante audaciosa também. Fiquei filosofando por um breve momento, imaginando o que seria uma matéria de abertura ideal para este projeto tão especial para a Arte Mágica. Pensei uma maneira legal de dar as “boas vindas” aos leitores, e também cativar a atenção de todos com este novo projeto... e tentar focar no “inicio” de tudo. Este pensamento me remeteu a uma peça que tive o prazer de assistir 2 vezes: ambas as apresentações foram para abrir a temporada de concertos de 2012 e 2015, respectivamente. A peça é intitulada “Abertura Promenade”, de John Corigliano, e desta vez tive a plena convicção de que se tratava sim de uma peça que retrata “o início”: o palco se inicia vazio, apenas com o maestro regendo o “nada”, e ainda nas coxias, os metais anunciam o início dos trabalhos. Os músicos vão adentrando o recinto enquanto tocam seus instrumentos e aos poucos o cenário vai se compondo, e a orquestra vai se completando. Original, não é mesmo? Diria que sim, se não fosse a obra na qual foi inspirada... Este pensamento, no entanto, me trouxe uma lembrança: um concerto de música clássica que fui há uns 2 anos. Este, ironicamente, encerrou com a música “Abertura Solene 1812” (Overture 1812 – op. 49) do fabuloso Tchaikovsky. Sentado na plateia, naquele momento, confesso ter estranhado um concerto ter em seu encerramento uma música de abertura. Mas à medida que a música ia se desenvolvendo, pude perceber a genialidade do compositor em “dissertar” sobre este paradoxo que tanto me assolava: afinal, é o início ou o fim? Aqueles pensamentos estavam cada vez mais latentes em minha mente no decorrer de toda a apresentação, e a todo o momento percebia os elementos da “gênese” não como “início”, mas sim como um “renascimento”, os quais me fizeram refletir ainda mais... Corigliano se inspirou no compositor Haydn, na obra intitulada “Sinfonia do Adeus”, que geralmente é escolhida para encerrar um concerto, uma vez que, durante o último movimento, os músicos vão deixando o palco gradualmente, restando apenas 2 violinos para terminar a música em um palco vazio. Mas ainda assim estava convencido de que a música de Corigliano deveria ser analisada de forma independente, e apesar da inspiração, não invalida o fato de ela ser “o início”. Mas mal sabia eu que os primeiros acordes executados pelos metais de Corigliano eram na realidade os últimos 5 compassos da “Sinfonia do Adeus” de Haydn de trás para a frente... Genial, para não se dizer o contrário. Curiosamente, esta peça de Tchaikovsky foi composta para a abertura da Exposição Universal das Artes, realizada em Moscou no ano de 1882. Se for levar em consideração que a mágica, bem como é chamada, é “a rainha das artes”, esta música seria sua trilha sonora. E desta vez não digo que seria apenas a trilha sonora de abertura, mas sim do seu ciclo enquanto arte: a abertura da exposição coincidiu com o aniversário de coroação do Czar e consagração da Nova Catedral em 1882 {início}, erigida para comemorar o fracasso da invasão de Napoleão Bonaparte à Rússia, em 1812 {fim}. Ou seja, uma nova era, um novo começo, repaginando e reinventando o que outrora era inadmissível (a obra contrapõe o hino da Rússia e o hino da França, com fragmentos do folclore russos temas religiosos). E a contraposição é mais que evidente (e, aparentemente “contraditória”) inclusive em seu título, visto que a “Abertura Solene 1812” foi criada para um evento em 1882, e o que era o início passa a ser o final, e o ciclo se completa... De toda forma, me esforcei para “superar” os canhões ao final dessa belíssima obra de Tchaikovsky, Sendo assim meus caros amigos e leitores, fico confuso com o que devo chamar de “inicio” e como dar as boasvindas a este novo projeto. Afinal, esta revista seria uma repaginação do que já existe ou o “renascimento” de algo que supostamente ainda não foi inventado? De toda forma, devo finalizar meu texto (ou inicia-lo) com uma simples reflexão: Abram a cabeça para novas artes e culturas! Metanóia já! A mágica é um ciclo completo, pois engloba todas as artes. As melhores ideias mágicas provem de reflexões advindas de outras artes como a música, o teatro, o cinema, etc. E por causa disso eu digo que “A Guilhotina” veio para ficar! Hoje a mágica brasileira ganha um presente do mais alto padrão, de modo que uma nova era se inicia: analisar a arte mágica com o respeito que ela merece, de modo a não fazermos apenas “truques”. E devo dizer que me sinto honrado em desfrutar disso com vocês, meus caros amigos leitores, e espero que vocês se deleitem com a preciosidade de conhecimento contido nesta revista tanto quanto eu o farei... Pensar fora da caixa, isto é, cooltura! Um grande abraço a todos! Fosc Luiz Fosc, é amante de um bom vinho, magica, música e cinema... 05 SEM CARTOLA PENSAMENTOS JUNHO A GUILHOTINA Ben Ludmer Combinamos alguma coisa antes daqui? Não? Então bem que a gente podia combinar de fazer umas piadas mais originais... Mas o humor, caros colegas, é a nova igreja evangélica, é a nova palestra, é o novo Herbalife. É a falsa promessa do sucesso, é a resolução dos seus problemas. E 98% dos mágicos brasileiros hoje se vendem como humoristas, comediantes, improvisadores e a lista segue. Muito louvável. Só falta um detalhe mínimo, como que chama mesmo? É algo religioso, que muitos rezam pra alcançar. Ah sim, graça! Mas onde consegue isso? Será que tem no Seiji? Ah, qualquer coisa eu peço pra um amigo do primo do meu vizinho mormon que mora em Utah comprar na Penguin e mandar pra mim. Espero que não tenha muito imposto na alfândega, será? Mas deve custar mais de 50 dólares, não vejo muita gente com esse gimmick por aí. Tem até um pessoal que deve ter comprado no Ali, mas parece que o gimmick é grande demais pras mãos, parece uma roupa de tamanho diferente. Perdão, do que falávamos? Ah sim, o humor. E a graça. Acabei de ler um artigo que está proibida a venda da graça. Muito menos de graça. A graça custa caro. Custa horas de estudo, horas de palco, e pra usar bem é necessário ter um hold out, que precisa de movimentos orgânicos e precisos, se não prende na manga. Parece técnico, mas não é. É natural. Já vi uns caras que tem isso, Mac King usa no show, Tamariz usa bastante, o Max Maven não gosta muito, mas tem, acho que o nome é carisma. Ah, mas acabei de ler aqui, também não está a venda. Que pena, queria muito colocar no meu número de mentalismo religioso para shows em festa de criança. Na verdade eu não faço mentalismo, e também não faço show em festa de criança. Religioso? Também não. Mas tenho minhas cartas na manga, literalmente. Baralho em festa de criança é tiro certo. Essa crianças de hoje adoram funk, também devem beber, fumar e jogar. Não posso decepcionar meus clientes que me viram fazendo mágica pra minha família na formatura do ensino fundamental da minha prima de segundo grau, finalmente consegui distribuir 12 cartões de visita. Quando me ligaram ontem eu nem acreditei, e o show é daqui a dois dias, então ainda tenho bastante tempo para me preparar e fazer umas mágicas novas. Vou fazer mentalismo com bolas de espuma, e quero fazer aquele lá das facas debaixo dos copos, mas como é festa infantil vou usar facas de plástico. Onde que dá pra aprender umas gags religiosas? Ah já sei, vou ver uns stand ups no youtube e usar as piadas, afinal eu sou mágico, não comediante, então dá pra dizer que nesse contexto as piadas são originais. E antes que eu me esqueça... Quanto dá pra cobrar nesse show? Ben Ludmer é mágico, ator, comediante, humorista e fã da Disney. 06 PAUL SEM JACK PENSAMENTOS JUNHO A GUILHOTINA Paul Friedericks Código Cultural Queridos colegas infectados pelo misterioso vírus da Arte Mágica. É com a maior honra do universo, que decido participar e embarcar nesse ousadíssimo projeto chamado Revista A Guilhotina. Simplesmente, amei este nome! Guilhotina me remete à França, no século XVII, período de “O Grande Medo”, com milhares de cabeças sendo decapitadas por julgamentos de calúnia, inveja e “safadezas”. Enfim! Falando do passado, não vejo a hora de meus filhos começarem a estudar a medíocre versão europeia da história por mim desconhecida do nosso país (fui alfabetizado justamente na França, e estudei a nossa história do lado de lá do Oceano Atlântico). Gosto do clichezão: “Olhar para o passado e tentar prever o futuro.” Quero voltar a estudar com meus filhos para tentar decifrar mais algum enigma do tão sonhado código cultural artístico do nosso país. “Paul... Chega de blá, blá, blá. Chega desse papinho todo coxinha para um primeiro artigo. E me fale sobre close-up, criatividade e marketing para mágico.” Respire fundo, meu amigo. Isso tem absolutamente tudo a ver com mágica, criatividade e, principalmente, marketing. Tudo! O Código Cultural é um dos melhores livros que já tive o prazer de ler. Seu autor, Dr. Clotaire Rapaille (multimilionário), presta serviço a grandes empresas de todo planeta, para decodificar o código cultural de determinados países. Com isso, essas corporações conseguem adaptar os seus produtos e filosofias à cultura da região, com muito mais foco e precisão. Essa estratégia, por exemplo, me permitiu acrescentar em meus espetáculos personagens caricatos (Brasil, país do Carnaval, com referências fortíssimas de multi personagens na televisão brasileira: Chico Anysio Show, Viva o Gordo, Os Trapalhões, etc.). Observei, imediatamente, um sucesso no resultado do meu show. Os espectadores se sentiam mais animados, mais familiarizados com esse humor caricato adicionado às mágicas. Infelizmente, ainda hoje vejo mágicos sendo decapitados em nosso país com vestimentas de outra era (fraque), apresentando efeitos defasados, textos dramáticos e que não tem a menor conexão com o público brasileiro. Convido você, caro leitor mágico brasileiro, a primeiramente observar atentamente o país em que vivemos: - Quais atributos, além de futebol, novela, praia, samba e carnaval, possuímos? - Quais peças de teatro ou programas de televisão fazem mais sucesso, e porquê? - E, finalmente, quais macro adaptações você poderia fazer em seu show que, possivelmente, refletiriam no sucesso do seu espetáculo? Paul Friedericks é mágico integrante da dupla “Paul e Jack”, Palestrante e em 2014 ganhou o Prêmio Julio Lipan de Excelência em Artes Mágicas. 07 AS VISÕES DE RA PENSAMENTOS JUNHO A GUILHOTINA Ramon Amaral Ego do mágico Há quem diga que livrar-se da vaidade é impossível. Outros dizem que a maior arrogância possível é dizer que já se livrou completamente dela. Não estou falando sobre ir ao salão de beleza e fazer as unhas. Em uma publicação sobre mágica, penso ser pertinente colocarmos este assunto em pauta, porque o mágico, com sua aparência de superpoderes, assume uma das figuras mais vaidosas possíveis. Dizem que primeiro o performer ganha a “pose”, só depois, às vezes, faz por merecê-la. Os mágicos representam “espertalhões”, homens que dominam as leis naturais, que controlam o comportamento de outras pessoas e influenciam suas escolhas. Peço que não leia este texto como uma análise definitiva sobre o assunto, até porque se eu tivesse este desejo, isso seria muita prepotência minha. Minha intenção é provocar reflexões sobre este tema que tanto me agrada e que tenho prazer em pesquisar o que os grandes pensadores da história deixaram registrado. O desejo de brincar de Deus. Talvez seja esse o princípio básico que leva uma pessoa a querer se tornar um mágico. Que criança não teve vontade de voar como o Super-Homem? Quando o David Copperfield voa, a maioria dos mágicos gostaria de estar no lugar dele. A ânsia pelo poder, talvez revele o motivo de muitos terem virado mágicos. O ser humano é competitivo por natureza. Esporte, carreira e relacionamento, são áreas que mostram bem isso. Na arte mágica, existe uma competição, mesmo que não revelada, entre mágico e plateia. Nos remete aos gladiadores que precisavam provar que são mais poderosos que a maioria para sobreviver e, até mesmo, para justificar suas presenças na arena. Quem se arrumaria e sairia de casa para assistir uma pessoa comum fazendo coisas comuns? No circo, os artistas desafiam os limites humanos demonstrando força, destreza e controle quase impossíveis aos olhos do leigo. Isso fascina. Fascinação pode ser interpretada como: dominar por encantamento; atrair irresistivelmente; deslumbrar; seduzir. A maior vaidade do ser humano é a inteligência, porque ela nos diferencia dos outros seres vivos. O mágico desafia a inteligência do público. Sabemos que muitos mágicos sentem uma satisfação oculta em iludir, quase como vilões. Temos que admitir que o discurso de levar alegria e encantar de forma totalmente altruísta, é bonito, mas esconde malícias ocultas inerentes ao ser humano. Mesmo que isso seja verdade, levar alegria também faz bem para quem apresenta e, em alguma interpretação, isso poderia ser considerado um comportamento egoísta. A mágica cria um nó na garganta, deception (engano), que mesmo erroneamente traduzo como decepção. Quem gosta de ser enganado? Muitos de nós. “Me engana que eu gosto”. Ser enganado na vida real é duro, mas quando o assunto é arte performática, quando há consentimento, é agradável. 08 A diversão supera os meios usados para alcançála. O ser humano médio é movido pela ânsia em obter prazer e por evitar a dor. Muitas vezes, na mágica, o prazer do encantamento supera a dor da dúvida. Muitos mágicos desejam fazer parte do “seleto grupo dos mágicos famosos” para conquistar vantagens e para “tirar uma ondinha”, talvez por ter tido o ego ferido em algum momento, seja por bullying ou por insatisfação com a própria realidade. Alguém que anseia aplausos e reconhecimento da opinião pública tem propensão ao egocentrismo. O termo “massagem no ego” é percebido como algo bom por muitos. A expressão “ego inflado” corresponde a uma ilusão em acreditar ser maior do que de fato é. Segundo a psicologia podemos descrever o ego como o aspecto racional da personalidade responsável pelo controle dos instintos. Eu, humildemente, interpreto o “eu” como uma espécie de entidade fictícia, criada por opiniões alheias, cultura, criação, fatores sociais e identificadas como reais pela própria pessoa. Existe a defesa que somos o observador, a presença. Quando nos libertamos dos nossos pensamentos (meditação), neste momento somos, de fato, nós mesmos. Nesta era de exposição massiva e julgamentos alheios, o que no passado seria invasão de privacidade tornou-se evasão de privacidade. A fama está mais desejada do que nunca. Quem não é visto não é lembrado. O criminoso some por um tempo até a poeira baixar. O artista quer mais é levantar poeira, já dizia a Ivete Sangalo. O psicoterapeuta e autor de best-sellers Wayne W. Dyer, propõem alguns comportamentos interessantes: 5. Liberte-se da sua necessidade de ter mais. O mantra do ego é mais. Nunca está satisfeito. 6. Deixe de se identificar com base nas suas realizações. Este pode ser um conceito difícil se 1. Pare de se sentir ofendido. você pensar que é as suas O comportamento dos outros realizações. não é uma razão para ser 7. Liberte-se da sua imobilizado. reputação. A sua reputação 2. Liberte-se da sua necessidade de vencer. O ego adora dividir-nos em vencedores e perdedores. 3. Liberte-se da sua necessidade de ter razão. O ego é a fonte de imensos conflitos e dissensões porque o empurra na direção de fazer dos outros errados. 4. Liberte-se da sua necessidade de ser superior. A verdadeira nobreza não tem a ver com ser melhor do que ninguém. não está localizada em si. Ela reside na mente dos outros. Portanto, você não tem controle total sobre ela. Eu, modestamente, enumero: gratidão, contemplação da natureza, observação sem julgamento, autocomplacência e humildade para entendermos que não somos melhores do que ninguém, nem piores. Somos parte de um sistema onde estamos todos ligados e que as nossas ações refletem no grupo, seja por questões místicas ou naturais, tanto faz. Acreditem em mim! Aceitem tudo que escrevi! Engulam sem mastigar! Quem vos escreve não é apenas um mágico, e sim, a personificação do Deus Ra. Ramon Amaral é um profissional multidisciplinar. Além de ilusionista, ele é ator, diretor artístico, analista de RH, palestrante, visagista e consultor de segurança pública. 09 EU ACHO QUE... Juan Araújo Eles escutam Eu acho que muitas vezes nós não percebemos o poder que nossas palavras podem ter enquanto estamos apresentando mágica. Alguns anos atrás eu estava participando do espetáculo Mágicos do Sul que apresentamos todos os anos durante um festival de teatro aqui em Porto Alegre. No final, quando estávamos recebendo os cumprimentos e conversando com alguns espectadores, uma mulher que estava junto com sua filha de aproximadamente 10 anos me disse o seguinte: “Aquilo que você falou me fez pensar, porque hoje eu tenho um trabalho onde ganho muito bem, mas não era isso que eu queria fazer da minha vida, não era meu sonho, eu tenho uma tranquilidade financeira, mas não me sinto feliz no que faço. E não quero isso para minha filha, quero que ela faça o que realmente a deixe feliz.” Em primeiro lugar devo confessar que assim que ouvi “Aquilo que você falou me fez pensar...” eu já tive o impulso de sair procurando pelos meus colegas Eric Chartiot ou David Medina, porque ela só podia estar fazendo confusão, afinal nada que eu falo em minha apresentação tem esse objetivo, fazer alguém pensar. Como eu estava fazendo o papel de Mestre de Cerimônias não consegui identificar imediatamente a que momento ela estava se referindo, mas deixando ela falar mais, percebi que era por causa de uma rotina onde falo de como decidi me tornar mágico. É uma história totalmente fictícia e não tem nada no texto que almeje algo nobre ou profundo, como falar da beleza de uma criança descobrindo a mágica, ou da busca pela minha vocação. Nada disso, apenas precisava de algo para falar e que arrancasse algumas risadas enquanto estaria lá cortando e restaurando um pedaço de corda, essa é a verdade. Mas para aquela mulher naquele dia, a história tocou em um ponto importante da vida dela. Não planejei isso, não busquei isso, mas admito que achei fascinante perceber esse poder que podemos exercer. Pois é, pelo visto as pessoas muitas vezes realmente nos escutam e refletem sobre o que falamos. Quem diria não é mesmo? E agora o que fazer com essa grande descoberta? Em primeiro lugar tomar consciência e refletir sobre o que nossas palavras e ações no palco podem representar e se é isso mesmo que estamos querendo transmitir. Não estou falando aqui de transmitir alguma mensagem, ser filosófico, nada disso, só de nos preocuparmos se nossas palavras são coerentes com a imagem que achamos que passamos aos outros. Por exemplo: “Ei mágico, você faz aparecer dinheiro?” Ou então “Diz aí quais são os números que vão sair na mega sena?”, levanta a mão quem já respondeu perguntas desse tipo com “Se eu fizesse isso mesmo não estaria aqui trabalhando”. Ah vamos lá, entra na brincadeira, levanta a mão aí amigo. Eu já, muitas vezes. Eu odeio meu trabalho de mágico e estou ali por que não tenho outra alternativa? É essa a imagem que quero realmente transmitir? 10 PENSAMENTOS JUNHO A GUILHOTINA Já sei, é só uma piada, e as pessoas percebem isso, não vão levar a sério. Sinceramente, acho que cada pequeno detalhe de nossa apresentação vai reforçando aos poucos a maneira como nossos espectadores nos percebem, mesmo que essa percepção seja “é alguém totalmente perdido, incoerente, que não decide que tipo de personagem é”. Nada que você diga e faça durante uma apresentação é neutro, ou tem impacto positivo em relação à ideia que pretende transmitir ou tem um impacto negativo. Então fica óbvio que antes de mais nada precisamos saber que imagem queremos projetar para nosso público. Quem é seu personagem? Do que ele gosta, por que ele faz mágica? Como é a relação com o público? Essa consciência vai influenciar totalmente no que você fará e dirá em cena. Seu personagem é um cara alegre, simpático e gentil? Ótimo, haja assim então. Mas tem aquela piada “Pode ficar do lado da estrela. Eu sou a estrela” que é garantia de risadas, difícil deixar de usar, não é? Eu também detesto ter que deixar de usar aquela resposta para as perguntas de aparição de dinheiro e números da mega-sena, mas é uma escolha que temos que fazer. Deixando claro que em nenhum momento quero dizer que piadas como essas não deveriam ser usadas (na verdade não deveriam mesmo, mas por outros motivos alheios a este texto). Alguém pode interpretar um personagem para o qual essas piadas seriam perfeitas, Harry Anderson seria um exemplo que me vem à cabeça rapidamente, cada caso é um caso. apenas falando um texto para acompanhar as suas ações enquanto faz sua mágica. E depois disso, mudou muito a apresentação das minhas mágicas? Quase nada, como eu disse, é muito mais fácil falar do que fazer, até hoje tento aos poucos dizer algo, mas por algum motivo quando temos a ajuda da mágica para nos escondermos por trás dela temos a tendência a ficar nessa posição confortável. É um processo lento, em meu caso muito lento. Mas pelo menos é reconfortante saber que quando estivermos dispostos e consigamos dizer algo através de nossa mágica, as pessoas estarão lá para escutar, e com muita atenção. A parte mais difícil é realmente saber que imagem você quer projetar, tendo essa consciência fica muito fácil ser sincero com você mesmo e saber que ações e textos lhe ajudarão a transmitir isso, e mais importante, não atrapalhar em seu objetivo. Bom, mas sabendo desse poder que temos à disposição, de que as pessoas realmente nos escutam, parece até um desperdício não aproveitarmos melhor não é verdade? Passada a fase que não iremos falar e/ou fazer nada que vá contra o que pensamos ou contra a imagem que projetamos em cena, poderia chegar o momento de usar isso para falarmos algo realmente. Eu sei, é muito mais fácil falar do que fazer, eu que o diga. Alguns anos atrás eu me aventurei a fazer Stand Up Comedy por um tempo, falhei miseravelmente, mas deixando esse pequeno detalhe de lado vamos ao que tirei de positivo dessa experiência. No momento em que não tinha como me esconder atrás das cartinhas e da cordinha cortada me senti com a real necessidade de falar algo, algo verdadeiro, não reclamar de viagens de avião e falar sobre relacionamentos (é, os “standapeiros” também têm suas cartinhas e cordinhas cortadas) e foi uma experiência muito interessante perceber que as pessoas estão dispostas a ouvir. Ok, no meu caso elas pareciam dispostas apenas a ouvir mesmo e não a rir, o que não ajudou muito a minha breve carreira de comediante Stand Up. Mas isso me fez perceber como é muito mais gratificante estar no palco dizendo algo mesmo, em vez de Juan Araújo é mágico profissional e Presidente da Associação dos Mágicos do RS. 11 PALAVRAS MÁGICAS PENSAMENTOS JUNHO A GUILHOTINA Rossini Quem é a mágica brasileira? Um artigo com esse título poderia ter várias abordagens. Poderíamos traçar uma longa linha de períodos e influências... Elementos que foram se agregando e amalgamando até os dias atuais... Poderíamos procurar mostrar como as principais escolas e influências da mágica em cada período dialogaram, interagiram e intercambiaram com o Brasil e através de quais veículos. E seria sem dúvida um tema interessante para um livro ou dois; um dos quais já em elaboração. Dar a conhecer ao leitor brasileiro desde o ambiente cultural colonial e dos mágicos aqui atuantes, a forma com a qual interagiam com a sociedade, os formatos de espetáculos da época imperial e suas claras conexões, felizmente muito bem documentadas. Embora pouco pesquisadas. Como tudo isso se amalgamou no que havia no início do século XX e fins do século XIX e dialogou com um ambiente cultural da mágica profundamente internacionalizado. Dar a saber sobre Janus Bartl, De Vere, Herrman, os grandes espetáculos teatrais e circenses. Um universo que muito poucos conhecem, mas que é maravilhoso quando mergulhamos em sua busca. Herrmann e a inserção de seus postulados no Brasil, primeiro por sua própria presença e depois pela obra literária, dentro da corrente filosófica pela literatura de Costa Brito. As interações internacionais de Peixoto e a forma que não apenas o seu empreendedorismo gerou frutos no Brasil, mas sobretudo também no exterior, algo muito pouco conhecido, porém de grande relevância para o panorama mundial da mágica nos tempos atuais. Poderíamos ainda nos debruçarmos a criticar colegas de profissão, nossa coletividade, nosso legado. Isso em um discurso niilista e que se pode fundamentar em muitas coisas, inclusive em desconhecimento sobre o legado de nossos antepassados. O legado de nossos mestres nascidos ou não no Brasil. Mas que aqui atuaram e deixaram as suas marcas e influências. Afinal “para que” aprender com o legado de nossos queridos mestres, quando alguém se julga superior a aqueles que protagonizaram uma realidade mágica no Brasil diferente: Na qual o mágico era respeitado e admirado como um cavalheiro. Um tipo de artista identificado com a sofisticação, a educação o refinamento, o respeito, o encanto e o bom gosto? Que espaço existe para isso na abordagem de quem despreza o legado de mestres de uma era onde isso não era um objetivo distante a ser perseguido, mas sim a realidade que presenciaram e protagonizaram aqueles artistas? Poderíamos ainda, abordar aspectos de mercado, conteúdo, formatos, perspectivas e até mesmo comparações ou 12 julgamentos de valor, desempenho cênico dos artistas que aqui estão e resultados daqueles que, com coragem, mostram a mágica brasileira no exterior. E a receptividade e reconhecimento que acabam por encontrar. E assim traçar um retrato contemporâneo. Todavia o que podemos chamar de mágica “brasileira” face a universalidade da arte? E o que é a mágica “brasileira” face às diferenças que não são apenas regionais na cultura de nosso país? Ou nas diferentes culturas... Mas que vão muito além disso: Repousam nas características do trabalho de cada artista. Sim... o artista. Chegamos no ponto. Comumente vejo ou leio discursos salvíficos. Pessoas, acreditando-se capazes de uma missão redentora... Tal como anjos com uma espada flamejante apontada para o que supõem ser os defeitos só encontrados aqui e chamando-os de “a mágica brasileira” ou “os mágicos brasileiros”. A mágica, por sua natureza, não é uma arte que se move com maledicências verbais. A boa notícia é que ela se move com ações corpóreas, físicas, artísticas e amparadas pelo intelecto positivo a serviço dessas ações práticas. A mágica queira chamá-la de brasileira, universal ou de qualquer outra coisa é uma arte de ato. Uma arte de ações corpóreas sem as quais todo pensamento se reduz a nada. Portanto mexa-se! Você não vai se tornar um mágico melhor falando mal de seus colegas de profissão. Você jamais se tornará um melhor representante da mágica que você entende como brasileira sem fazer, você mesmo, algo muito bom. Algo que te coloque em um grau de excelência não somente entre seus colegas brasileiros, mas eu um patamar artístico que possa falar ao coração e às emoções do Ser Humano, seja ele brasileiro, vietnamita, alemão ou senegalês. Lembre-se: A arte é universal. Brasileiro pode ser você. Leon Tolstói, o universal escritor nos ensina: Se queres ser universal, começa por pintar a tua aldeia. Chaplin, o universal palhaço e ator nos ensina: A persistência é o caminho do êxito. A vida é maravilhosa se não se tem medo dela. Shakespeare afirma: Deixar para amanhã, acaba mal. Stanislavski nos diz: Ame a Arte que há em você. Não você na Arte. A pergunta é: O que você está esperando? Vá no espelho e se olhe. Estude, crie e trabalhe seus movimentos. Procure a arte que há em você... A arte é universal... Você talvez seja brasileiro... Talvez não... Mas entenda que o espírito humano não tem fronteiras. Entenda que o mundo é muito grande e ao mesmo tempo muito pequeno. E as pessoas estão ávidas por contemplar o belo, o intrigante, o curioso, o engraçado e não importa que nacionalidade elas tenham. E acima de tudo: Não devem ser idolatradas e nem tampouco diminuídas por serem de um país ou de outro. Ouça os mestres independente do país que tenham nascido inclusive se esse país se chamar Brasil. Aprendi muito mais aqui do que a maioria pode imaginar. Desde a girada de cordas de Travessoni, ao sonoro de cartas de Pinter, as histórias de Yang a respeito de Carbel e seus números assim como a era dos cassinos e do Teatro de Revista. Aprendi com mestres mágicos daqui muito da estética de aparelhagens das melhores casas europeias da primeira metade do século XX. As técnicas de joalheria e relojoaria a serviço da mágica. Conhecimentos de repuxamento e moldagem de metais. As grandes sacadas teóricas e práticas do Professor Reis. Uso de materiais que eu sequer sonhava existirem com Sesiom. Aqui eu pude ver em cena, e mais tarde adquirir em um leilão, aquela Urna dos Dados Viajantes, desenvolvida ao limite por Leony, e que alguém pode procurar o mundo inteiro e não vai encontrar uma mais intrigante, mais completa e nem com mais possibilidades. O interesse pela história e memória da mágica com Bob Ricardo, Enio Finochi, com os registros de Conde Ramsés e em tantos baús de memórias de grandes mágicos que nos precederam. A teatralidade e poder criativo a serviço da mágica, até os dias atuais com Yago. Olhe-se no espelho... olhe a qualidade do seu trabalho. A mágica brasileira que está melhor ou pior que outrora, melhor ou pior do que a que a de um digno prosseguidor do legado mágico local e universal, pode ser justamente a que está em você. E no seu caso é. Então pare de buscar defeitos nos trabalhos de seus pares. Prefira buscar suas próprias qualidades e ajudar a quem precisa. Melhorando a si mesmo a mágica irá te agradecer ; Pois a mágica é arte. que reside em você e que se projeta no teu público. E perante essa desafiadora, frontal e encantadora realidade, a mágica brasileira, nesse momento, se é que pode-se colocar fronteira em uma arte, será unicamente você e o trabalho que tem a mostrar. E com ele também a luta incansável pela mágica, na qual tenho como exemplo também o incansável, valoroso e combativo Paladino. A elegância simples e misteriosa de Vanick, a grandiosidade cênica de Zino nos picadeiros do Circo Garcia. Os mágicos caracterizados como orientais que povoavam nossos circos na minha infância na década de setenta e que até hoje não me esqueço de seus números maravilhosos... E a cada vez que lembro mais e mais nomes, e de momentos de intensa contemplação cênica, vou me sentindo mais e mais injusto por tantos outros mestres que me foram fundamentais e que deixo com enorme injustiça de mencionar aqui. Então olhe ao seu redor; mas olhe para si. Busque sua verdade em cena; mas converse e acima de tudo aprenda com os mestres. Faça com que a mágica seja respeitada em seu ato cênico. Faça com que a mágica progrida em seu universo e no que estiver ao seu alcance. Seja um bom mágico. Muito bom se conseguir... Excelente se puder. Pretender salvar uma arte que é universal, é bela, te deixou um legado maravilhoso, caso queira estudá-lo e não precisa de salvadores, pode ser uma tarefa muito além de suas capacidades. Mas fazê-la cada vez melhor em cena quase sempre estará ao seu alcance. Então que tal começar pelo mais fácil? Melhore... E tudo ao seu redor irá melhorar. Vá... melhore-se; não deixe para amanhã... Vá agora mesmo como ensina Shakespeare. Não tenha medo; como ensina Chaplin.... Ame a arte que há em você, não você na arte; como ensina Stanislavski... E acima de tudo, antes de tudo, vá pintar a sua aldeia, como ensina Tolstói. Pois isso te fará um bem muito maior do que pode imaginar Rossini é mágico e pesquisador da Arte Mágica. 13 PERCEPÇÃO EM PERSPECTIVA PENSAMENTOS JUNHO A GUILHOTINA Guilherme Ávila “Convencer” e “Acreditar” Um conceito importante e muito mencionado em outros estudos teóricos da Arte Mágica é a distinção entre “alguém estar convencido” e “alguém ter acreditado”. Em obras escritas em língua inglesa, os termos usados são convince someone e deceive someone respectivamente. Penso que seja a base para a compreensão do papel fundamental do mágico. No vocabulário cotidiano, esses dois termos ---”alguém estar convencido” e “alguém ter acreditado” --- provavelmente sejam quase sinônimos: se você convenceu alguém de alguma coisa, você o fez acreditar em alguma coisa. Quando se trata de mágica, a semântica é distinta. Ao ler minha explicação, parecerá uma diferença ínfima, porém na prática ela é enorme. Vou procurar ser o mais claro e objetivo possível. Em 1969, Henning Nelms, em seu livro Magic and Showmanship, trouxe para o campo da mágica um conceito importante da Teoria da Literatura, introduzido no século XIX por Samuel Taylor Coleridge: Suspension of Disbelief. Traduzido ao pé da letra, seria algo como Suspensão da Descrença. É tudo o que um efeito mágico precisa fazer. Não se trata de fazer a plateia acreditar naquilo que viu, mas parar de desacreditar; parar de resistir, parar de se opor, para se deixar levar. Não é que o espectador passe a “acreditar” que uma moeda sumiu e sim que ele passe a se envolver a ponto de, naquele momento, se deixar levar e se “convencer” de que viu a moeda sumir. Lembre que não estou usando a palavra convencer como sinônimo de “acreditar”. Aqui, “deixar-se convencer” significa permitir-se o envolvimento e deixar-se levar. A atmosfera mágica, como diria Arturo de Ascanio, é extremamente importante para criar essa condição. Por outro lado, ”acreditar” é bem diferente. O público “acredita” no fenômeno quando ele realmente crê que o mágico é capaz de fazer aquilo. Para ser mais claro, o público “acredita” na mágica quando crê, incondicionalmente, que tudo que ele viu é real e que o mágico possui, de fato, alguns poderes paranormais. Nesse sentido, “alguém ter acreditado” é um estado mais forte do que ``alguém estar convencido’’. Diversas artes --- como o teatro, o cinema e a ficção literária --- se baseiam em “convencer” sem fazer “acreditar”. Ao ler um poema ou um romance, não estamos acreditando fielmente na história que está se passando. Estamos apenas convencidos do enredo que o autor criou, isto é, deixamos de desacreditar que aquilo é tudo falso e nos envolvemos na história. Nenhum adulto “acredita” que o Homem Aranha existe. Ao ver o filme, porém, estamos convencidos da existência do personagem. Estamos convencidos que o Homem-Aranha sobe paredes e lança teia pelas mãos. Deixamos de desacreditar que o superherói não existe, Suspensão da Descrença. Uma criança, por outro lado, facilmente confunde esses conceitos e passa a “acreditar” que o Homem Aranha existe. Se dizer ao público que os mágicos são paranormais e possuem 14 poderes extrassensoriais é charlatanismo e antiético, então isso significa que na Arte Mágica precisamos apenas do conceito de “convencer” e podemos ignorar o conceito de “acreditar”? Na verdade, não. Os dois termos devem ser cuidadosamente aplicados em um ato mágico. Por um lado, o mágico deve fazer as pessoas acreditarem que não existem mecanismos secretos; por outro, deve apenas convencê-las do fenômeno de sua mágica. O espectador deve ter certeza incondicional de que o mágico não está utilizando nenhuma aparelhagem secreta, nenhum movimento falso, nenhum objeto especialmente fabricado. Essa é a parte em que ele deve acreditar. Quanto ao fenômeno, ao efeito, o espectador deve apenas se “convencer” e se deixar levar por ele. Assim, quando se trata do segredo (que é o método), a plateia deve “acreditar” que não existe nenhum. Quando se trata do fenômeno, ela deve estar apenas “convencida” de sua existência. Em outras palavras, o mágico deve ser capaz de simular a inexistência total de qualquer artifício secreto que possa provocar o fenômeno. Deve ser capaz de fazer a plateia não duvidar do efeito e muito menos questionar sua falsidade. Porém, em momento algum, a plateia deve crer na veracidade dos poderes simulados e “acreditar” que o mágico é uma espécie de paranormal. Fazer a plateia “acreditar” no fenômeno seria aproveitar-se da ignorância do público leigo quanto às técnicas de ilusionismo. O papel fundamental do mágico Apesar da expressão “alguém ter acreditado” ser um estado mais forte do que “alguém estar convencido”, o primeiro não é condição suficiente para o segundo, isto é, não é verdade que se a plateia “tiver acreditado” que não existe método vai, necessariamente, “estar convencida” do fenômeno. Podem ocorrer casos em que o método funciona, mas o efeito falha, e a plateia simplesmente deduz como o mágico fez determinada coisa. Em um exemplo simples, porém razoável, o mágico executa uma transferência falsa de uma moeda da mão direita para a mão esquerda. A plateia pode “acreditar” que não houve nenhum movimento falso e que a moeda está, de fato, na mão esquerda. Porém, no momento em que o mágico abre a mão esquerda e revela a desaparição da moeda, a plateia pode supor que, na verdade, a moeda está ainda na mão direita. A plateia não sabe como o mágico verdadeiramente fez --- ela “acreditou” que o mágico não fez uso de artifícios ---, mas deixa de “estar convencida” do fenômeno por ter conseguido uma explicação alternativa. Dessa forma, é função do mágico garantir que a plateia não saiba como o fenômeno foi verdadeiramente executado e que não tenha outras alternativas para explicar como aquilo pode ser executado. Ou seja, o mágico deve fazer com que a plateia, sempre, não apenas “acredite” que não foi utilizado um método, mas também “se convença” da veracidade do fenômeno. Guilherme Ávila é mágico, empresário e autor do livro “A Arte Mágica: A Percepção em Perspectiva” URI GELLER: FATO OU FLEXÃO? Coletivo Guilhotina Uri Geller: fato ou flexão CAPA JUNHO A GUILHOTINA Piada Improvável Se você é um eremita que vive sob uma rocha dentro de uma geladeira em Urano (Em termos modernos: Se você não acessa a internet para saber qual é a última novidade do métier artístico), é justificável não saber da novidade. Não que seja algo surpreendente, dada a época em que vivemos, onde parece que vale tudo por um “Like”, virar “Meme” ou para ser o próximo “Viral” de uma internet cada vez mais apelativa. Em tempos onde cada vez mais veículos de comunicação suficientemente sérios precisam explicar que “Não é matéria do Sensacionalista (um site de humor e notícias fictícias, e com frequência bastante plausíveis, inspirado no americano The Onion)”, fica difícil acreditar quando você se depara com uma peça de vídeo muito bem produzida de ninguém menos do que Uri Geller convidandonos para prestigiar o FISM 2015, a ser realizado em Rimini, na Itália. Para males dos pecados, isso ocorreu na mesma semana do “Dia da Mentira”. Oras, só pode ser brincadeira. Geller é um caso onde boa parte de suas declarações enquanto figura pública põem o espectador em xeque: Com uma biografia permeada de brilhantes atos de violência contra tudo que é lógico e coerente, Geller se vê com frequência na privilegiada posição de quem fala algo que é absurdo demais para ser verdade, e, todavia, plausível demais para ser uma simples e jocosa piada interna entre amigos que sabem que ele só está brincando. Eis aqui o grande trunfo do auto-intitulado “Paranormal”, que é seu domínio da fina arte do sarcasmo: O Ilusionista, e que jamais nos esqueçamos disso, redefiniu todos os conceitos do que é ser “cara-de-pau” de tal forma que no final das contas não é a colher quem dobra – somos nós que viramos a cabeça de lado e, por um momento pensamos “Ei, será que ele está falando sério mesmo...? ”. que já desperdiçaram oxigênio neste planeta, fazer gente sã considerar desistir da humanidade já não satisfaz o desejo de ver o circo pegar fogo: Geller sabe, e nós sabemos, que há de existir alguém que vai cair nas suas esparrelas. Sempre haverá alguém que ofusca a linha entre a inocência e a burrice que vai jurar de pés juntos que toda a prataria da sua casa se curvou à vontade do “Paranormal” durante uma aparição do mesmo no “Fantástico”, em uma era onde a TV e a Audiência, ambos ainda em sua “adolescência”,compreensi velmente careciam de informação. O tempo passou, a Internet veio e com ela as pessoas têm cada vez mais acesso a e menos desculpas para dizer “Eu não sabia”. E ainda hoje, em pleno 2015, o número de pessoas que ainda hoje brindam validação a charlatães como Uri Geller é imperdoavelmente alto. As estratégias empregadas por Geller em suas artimanhas midiáticas são, como previsto, tão absurdas que funcionam perfeitamente, tendo como base o modus operandi da célebre Fraude 419, vulgo “O Golpe do Príncipe Nigeriano”, cujas incontáveis variações modernas e aplicadas por e-mail têm em comum as premissas sempre grandiloquentes e o uso propositalmente errado da língua inglesa. De forma quase paradoxal, essa é uma das maneiras mais efetivas de filtrar vítimas em potencial, reduzindo o número de falsos positivos. E a lógica é simples: Qualquer pessoa cujo “Desconfiômetro” não entre em colapso ao deparar-se com uma premissa absurda (um príncipe da Nigéria escolheu você como único herdeiro / um ser humano com “poderes paranormais” é capaz de entortar colheres), transmitida através de meios improváveis (a caixa de “Spam” do seu e-mail / “ondas mentais” através da TV) e com uma argumentação que, no mínimo, levanta sérias suspeitas (o uso criativo do idioma) claramente não é o público-alvo da fraude em questão. É notável, portanto, que o primeiro filtro de suscetibilidade depende única e exclusivamente das motivações internas da vítima, sejam estas guiadas por ganância, curiosidade ou pelo simples desejo de acreditar no sobrenatural. There Is No Phone Golpe de Mestre Para um humilde faixa preta da Ironia Competitiva, causar essa dúvida já seria o suficiente. Saudosos são os tempos dos “Semeadores da Discórdia”, que no falecido Orkut elevaram o “trolling” a um estado de arte. Fazer com que pessoas perfeitamente racionais se descabelassem, horrorizadas com argumentos malucos, ainda que plausíveis, era o suficiente. Rendia algumas boas risadas, e ninguém saía ferido. Já para um dos maiores charlatães 16 Tome-se como exemplo o auge da polêmica do #Bendgate: Não tardou até que Geller alegasse, com uma seriedade beirando a psicopatia, que o então recém-lançado iPhone 6+ estava entortando nos bolsos dos usuários devido a ondas mentais geradas pela histeria coletiva em torno do tão aguardado lançamento da Apple, e não pelas características físicas e do aparelho, que é muito alto, muito fino e com corpo em alumínio. Desnecessário apontar que muita gente acreditou, e diversos jornais e veículos de mídia na internet replicaram a informação (ainda que em tom de neutralidade ou troça) enquanto Geller preparava a cereja do bolo: Uma falsa entrevista em vídeo onde ele novamente aclara o populacho sobre o porquê de seus gadgets feitos de alumínio superfino entortarem misteriosamente dentro dos bolsos apertados de suas calças jeans, parodiando a situação e as suas próprias declarações de outrora. Na peça CAPA JUNHO em questão, que novamente “viralizou”, Geller faz uma demonstração “real” (mantidas as devidas proporções) de flexão de metais, e ao final tira sarro da situação como um todo, ao “entortar” um iPhone através dos poderes da manipulação de efeitos especiais em vídeo. E ainda assim, não faltam copiosos exemplos, nas seções de comentários dos inúmeros locais onde foi veiculado o vídeo, de pessoas que juram de pés juntos que se tratava de uma façanha real. Os Riscos da Auto-Ajuda Esquizotérica Ora, seria então de se esperar que Mágicos e afins abominassem a menor menção ao nome de Uri Geller, visto que o mesmo presta o que alguns consideram um desserviço à Arte Mágica ao fazer um uso da mesma para fins no mínimo altamente questionáveis e os exemplos são abundantes e também utilizados pelo próprio Geller como forma de promover seus supostos poderes parapsicológicos. De cristais mágicos, cromoterapia e auto-ajuda new age a colheres tortas que podem “ajudar a parar de fumar” e “ajudam nos acordos entre Israel e Palestina” (citações diretas do seu website oficial), as alegações dos poderes de Uri Geller podem parecer inocentes em primeira instância, porém há de se lembrar que não há como desassociar a figura e o Mito chamado Uri Geller de situações que se entrelaçam, e prejudicam a todos os envolvidos. Eis um exemplo que aos mágicos interessa: os supostos “poderes” de Uri Geller já foram copiosamente desmentidos, e seria chover no molhado mencionar seu uso de um compêndio técnico que, em um mundo ideal, estaria restrito ao seu uso secreto aplicado ao Entretenimento em diversas vertentes da Arte Mágica, com uma óbvia e maior frequência no Mentalismo. Sabemos que se trata de um Mágico, e o público em geral também o sabe. Isto posto, é notável a impossibilidade de desassociação do conceito “Uri Geller” do conceito “Arte Mágica”, e isso é nocivo em diversas ocasiões: Desde o mais inocente, onde um espectador comum associa “Mágica” a “Poderes” até o mais ofensivo, onde o mesmo espectador pode associar “Mágicos” a A GUILHOTINA “Charlatães” e podendo chegar ao patamar do absurdo, onde uma pessoa pode associar “Mágico” a “Poderes Paranormais” e depositar na figura do Artista um peso de alguém com poderes “de verdade”. Ou vai dizer que você nunca pensou “Puxa vida, com um pouco de Leitura Fria e um deck de Tarot eu ganharia uma boa grana” ou afins? Admita: É uma ideia, uma tentação que já passou em diversos graus pela cabeça de muitos, e à qual infelizmente uma parcela destes se rendeu, alimentando desta forma um ciclo de ignorância e desinformação que pode causar danos irreparáveis. Pois a missão do Mágico é criar a efêmera certeza de uma realidade que, fechadas as cortinas da ilusão, se diluirá nas águas da memória, tingindo-as em tons de dúvida. Penso que um bom Mentalista é capaz de criar no imaginário da audiência uma ilusão de dúvida plausível, e ainda que alguns levantem de seus assentos com quaisquer certezas, um bom e ético artista não usa destas para alimentar esperanças nos desamparados, como por exemplo, ao alegar ser capaz de despertar Ariel Sharon de um coma ou afirmar categoricamente que a modelo húngara Helga Farkas, sequestrada em 1992, estava bem de saúde e em segurança quando, se descobriu mais tarde ela havia sido assassinada por seus captores. Imagine o quão ludibriadas se sentiram as famílias de Farkas e de Sharon. E pensar que alguém que alimenta tanta dor e sofrimento de forma egoísta e psicótica está irrevogavelmente atrelado à profissão do Mágico. Duas Gerações, Duas Opiniões 17 Para o Mentalista Kardini, fã declarado desde a década de 70 e que considera um privilégio tê-lo assistido e conhecido em pessoa, Uri Geller é alguém digno de admiração “por sua extrema criatividade (...) e também por suas perfeitas e convincentes apresentações, as quais chegaram a confundir renomados cientistas”. Kardini também afirma, com o know-how de quem atua profissionalmente como Mentalista há mais tempo que muitos outros renomados praticantes do gênero têm de vida, que “Nenhum artista mágico ou mentalista, reproduzindo seus feitos com melhores recursos o conseguiu igualar ou superar”. Já para Nicolas, Mágico premiado e autor da série de DVDs Neuromágicas, não coincidentemente com forte apelo ao Mentalismo, a contratação de Uri Geller para compor o prestigioso elenco da FISM 2015 é “um contra-senso histórico”, já que “grandes mágicos, como Houdini e James Randi dedicaram suas vidas a desmascarar charlatães” e indaga o que vai acontecer se Randi e Geller, inimigos declarados, se cruzarem nos corredores durante o evento em Rimini, na Itália. Bastante incisivo, Nicolas lembra quesempre que um suposto “paranormal” se apresenta na TV, os mágicos são os primeiros a denunciar suas falcatruas e provoca, chamando de “hipócritas” aqueles que “se posicionam contra alguém que faz cirurgias espirituais na TV e agora acham normal Uri Geller ser atração da FISM”. Pesado. deveria ser, que Uri Geller é Showmanship em pessoa. Tal como Chung Ling Soo, ele jamais sai do personagem e chegou em um ponto, após quarenta anos de uma carreira inigualável (em diversos aspectos), em que criador e criatura, Dr. Jekyll e Mr. Hyde, se fundiram em alguém quase difícil de considerar um personagem por si só, tamanha a complexidade das muitas camadas que compõem uma figura polêmica e deveras influente. De tão poucas pessoas, é possível dizer que alguém “Chegou lá”. Rigorosamente desmistificado, Uri Geller continua a ser assunto em qualquer metiér e mantém intacto seu status de verdadeiro ícone da Cultura Pop. Aquela cena da colher (que não existe) em “Matrix”? De certo há influência dele ali. Thomaz Green Morton, “O Homem do Rá”? Influência direta e evidente. Nosso Uri Geller tupiniquim. Entre magos e profanos, é difícil encontrar alguém que não o conheça ou a suas façanhas. Qualquer pessoa que não viveu em Marte, principalmente entre os anos 70 e 90, tem alguma história para contar ou alguma lembrança envolvendo a inutilização proposital de talheres inocentes. Uri Geller chegou lá, é verdade. Mas a que custo? Enfim, Uma Verdade Incontestável Todavia atentemos a um fato inegável: Uri Geller atingiu o inabalável status de Mito. Sua fama extrapolou a de Copperfield e o levou aos quatro cantos do planeta e além. Quantos artistas performáticos, excluindo músicos, transcenderam gerações e alcançaram essa imortalidade? Poucos, e Geller tem assento VIP em uma lista privilegiada por natureza. Sua influência e o arsenal que o Ilusionista (e que jamais nos esqueçamos disso), tem e teve à sua disposição, seja de forma inata ou adquirida, e do qual fez e faz um uso maestral são lições, boas lições inclusive, que qualquer artista que almeje tornar-se uma figura pública de facto deve ter em mente. Uri Geller é a personificação do carisma, e qualquer um que o tenha encontrado em pessoa concorda com tal afirmação, atestando que ele é uma figura de simpatia irresistível. O olhar penetrante, o sorriso fácil e aparentemente sincero, aliados ao seu grande poder de argumentação e impostação pessoal de uma forma jamais agressiva - mesmo quando ferozmente questionado por James Randi e afins - transformam em meros coadjuvantes quaisquer técnicas de Ilusionismo aplicadas em seus jogos. Há quem diga que, em termos estritamente técnicos, a Torção de Metais executada por Geller não é mais que mediana. Então por que funciona tão bem? O “Paradoxo Machadiano da Mulher Bonita e Coxa” aplicado ao Mentalismo: Dá um bom título de TCC, e a resposta deste suposto enigma tem mais perguntas que soluções. Onde, exatamente, é que termina a técnica per se e começa o carisma? E qual a percentagem deste que é inata, qual que foi aprendida? Não é segredo algum, ou ao menos não 18 Coletivo Guilhotina é formado pelo conselho editorial d’A Guilhotina e colaboradores afinados com o propósito da publicação. Os conteúdos assinados dessa forma expressam a opinião da revista. Entrevista com Uri Geller Demorei para processar a informação do “De’Rose, conseguimos”. Após longas negociações e tentativas de aumentar nosso QI (O famoso “Quem Indica”), o Coletivo Guilhotina celebrou em segredo a conquista: Uri Geller estava disposto a nos conceder uma entrevista... No dia seguinte. A ficha demorou uns minutos para cair – era por volta das cinco da manhã e eu sofria de uma insônia que logo se converteria em ansiedade. Munido de uma lista de perguntas que já havíamos elencado, assisti vários documentários, li entrevistas e declarações de e sobre nosso sabatinado. Não queria correr o risco de perguntar coisas que ele já cansou de responder, nem tampouco de ousar demasiado – É o Uri Geller, afinal de contas. Desde que me conheço por “Mágico”, conheço Geller e sua (in) fama. Cético e confessamente radical em alguns pontos, entrevistá-lo foi um exercício de distanciamento das minhas próprias crenças (ou ausência das mesmas) e opiniões - Eu estaria ali para ouvir, e não para falar. Já entrevistei outros artistas, em outras ocasiões… Só que ali eu estava pisando em um terreno delicado. Depois de conferir umas setecentas e quinze vezes se meu telefone estava funcionando corretamente, se o gravador estava em ordem e respirar bem fundo - e eu jamais teria acreditado se alguém me contasse que um dia eu diria as palavras a seguir... telefonei para a casa de Uri Geller para dar início a mais uma conversa do que entrevista propriamente dita. Sua simpatia e carisma me desarmaram não apenas da ansiedade, como também das pedras que eu, mesmo sem querer, poderia estar segurando.O resultado, você pode ler a seguir. Em meio a uma relação de amor e ódio quanto à figura de Uri Geller, pode ter certeza de que fiz o possível e fiz com muita admiração. Ressalvas, sim… Mas essas, eu guardei para mim. GUILHOTINA: Bom dia, Sr. Geller! Como vai? UG: Bom dia, Fábio. E por favor, pode me chamar de Uri. Sem esse negócio de “Mr. Geller” (risos). GUILHOTINA: Primeiramente, Uri, muito obrigado pela honra desta entrevista! Aqui na Guilhotina somos todos grandes fãs do seu trabalho. UG: Obrigado, o prazer é meu em conversar com vocês. GUILHOTINA: Recentemente foi anunciada sua contratação para o próximo FISM, que ocorrerá na Itália. A notícia pegou boa parte do mundo mágico de surpresa, então eu gostaria de saber como estão os preparativos - certamente será uma oportunidade única para que muitos mágicos possam conhecê-lo e aprender com sua fantástica experiência no Show Business. Haverá novas surpresas para os mágicos? UG: Bem, deixe-me primeiramente voltar no tempo um pouco. Você sabe que durante a maior parte da minha carreira, eu me mantive afastado do métier mágico; E o que isso significa é que eu nunca me envolvi de forma alguma com outros mágicos, associações, círculos [. Referindo-se ao Magic Circle, especificamente ] e eventos… Então eu sempre estive de certa forma sozinho em tudo o que eu fiz e em tudo que ainda faço. E isso aborreceu muitos mágicos, pois vários deles diziam que o que eu digo e o que eu faço de certa forma engana, ou enganou o mundo quando eu dizia ter poderes de verdade, enquanto eles [os mágicos] não acreditaram em mim. GUILHOTINA: É compreensível. UG: Sim. E isso obviamente me tornou alguém extremamente controverso. E controvérsia é algo incrível de se ter à sua volta! Controvérsia é algo que você não compra em uma loja, simplesmente… É como o carisma. Ninguém pode comprar carisma. Quando eu me dei conta, no início da minha carreira, e foi algo que me surpreendeu bastante é que quanto mais me atacavam, mais pessoas vinham assistir meu show. Então eu soube que havia algo de bom e positivo em meio à essa… aura, a esse ambiente envolto em controvérsia. GUILHOTINA: Uau! UG: Em todos esses anos eu nunca li um livro de mágica sequer. E tampouco jamais assisti um show de mágica, exceto em uma ocasião onde perdi um vôo de conexão em Las Vegas, e acabei assistindo Siegfried & Roy. Foi a única vez na vida em que assisti a um show de mágica. GUILHOTINA: Incrível! UG: Pois é. Em todos esses anos, sempre houve rumores e histórias sobre Uri Geller, especialmente no mundo mágico. As pessoas constantemente falavam sobre mim, conspiravam, fofocavam sobre a minha pessoa… Foram ditas coisas boas sobre mim, e também coisas más. Quando me mudei para a Inglaterra há alguns anos, acabei ficando amigo de David 20 “jamais assisti um show de mágica, exceto em uma ocasião onde perdi um vôo de conexão em Las Vegas, e acabei assistindo Siegfried & Roy.” Berglas, que você deve conhecer. E ele até me deu um prêmio por promover a Arte Mágica. Fui então convidado a ministrar uma Conferência, acredito que foi na Flórida, para cerca de mil mágicos. E qual não foi minha grande surpresa quando os vi levantar e receber os seus aplausos! GUILHOTINA: Dada a situação, deve ter sido uma grata surpresa para você. UG: Com certeza. Eu sempre tive a ideia de que, em geral, os mágicos odiavam Uri Geller… E eles provaram que eu estava errado. Eu percebi que na verdade eu era muito admirado entre os mágicos por ter trazido ao mundo algo muito novo. GUILHOTINA: Isso é verdade. UG: Ainda hoje, eu jamais digo que sou um Mágico. Permaneço no escuro, em uma área cinza… Eu caminho sobre uma linha muito fina. Não estou aqui, nem tampouco lá. Pois, por que eu aceitei participar da FISM? Veja que eu não tenho um empresário, não faço uso de agentes, de Relações Públicas ou de alguém que cuide da minha imagem. Há algum tempo conheci um rapaz chamado Walter Rulto, e acabamos nos tornando bons amigos. Um dia ele me perguntou “Uri, você toparia participar da FISM?”, e eu aceitei. Foi basicamente como aconteceu. No que tange os preparativos que você mencionou, na verdade não há nenhum em especial. Apenas será uma questão de subir no palco e fazer o meu trabalho. Ainda assim, eu definitivamente vou surpreender muita gente na FISM. CAPA JUNHO GUILHOTINA: Você diria que há nisso um gostinho de vitória, por assim dizer, sobre os Mágicos? UG: Sabe, esta é uma excelente pergunta. Eu já rodei o mundo incontáveis vezes, e fui visto por milhões de pessoas. Centenas de milhões, talvez… GUILHOTINA: E inclusive no Brasil. UG: Exatamente. Conhecer o Brasil foi uma experiência inesquecível. Fiz muitos shows em locais enormes, em estádios de futebol… Inclusive há um jogador de futebol no Brasil com meu nome, você o conhece? GUILHOTINA: Sim. O “nosso” Uri Geller é bem famoso (refere-se ao ponta-esquerda do Flamengo nos anos 70 e 80, que “entortava” os adversários). “Inclusive há um jogador de futebol no Brasil com o meu nome” UG: Pois bem. É imperativo traçar uma linha agora entre dois tipos de público. Entre a pessoa comum, que assiste o Uri Geller em casa, e o membro da Fraternidade Mágica. Quando eu pela primeira vez me senti bem-vindo entre os Mágicos, pensei comigo mesmo: “Uau! Isso é realmente incrível. Após tantos anos sem jamais me envolver com os mágicos, eu de repente estou me vendo… Não sei, honrado, respeitado”. Então respondendo finalmente à sua pergunta, acredito que sim. É uma sensação bem especial. GUILHOTINA: Faço uma pequena ideia. UG: Mas não se esqueça de algo. Há nove anos atrás eu criei um programa de TV chamado The Next Uri Geller (“O Próximo Uri Geller”, em tradução literal). Ele foi exibido em dezoito países, e em breve terá sua primeira edição na China. E a maioria dos performers que participam do programa são Ilusionistas, Mágicos e Mentalistas. Alguns deles, talvez sejam Médiuns. Eu honestamente não sei, e nem me importo em saber como esses artistas executam suas performances. A GUILHOTINA Quero dar atenção unicamente ao “Fator Entretenimento”. Quero que as pessoas em casa gritem “UAU! Como eles fazem essas coisas?!”. Há alguns anos, nos Estados Unidos, Criss Angel participou do meu programa. Ele foi meu coapresentador, e em algumas ocasiões ele [CA] me chamava de canto e cochichava no meu ouvido o segredo dos truques feitos no palco. E eu lhe dizia “Criss, por favor não me conte. Eu não quero saber [do método]! ” (risos). GUILHOTINA: Esta é uma excelente “Filosofia”. Possivelmente a melhor maneira de manter-se um verdadeiro admirador da Mágica, do Mentalismo e essencialmente do Mistério inerente às formas de arte. Com relação a programas de TV que tiveram sua participação, tais como The Next Uri Geller e Phenomenon, gostaria de saber sua opinião, e nisso me refiro especificamente ao chamado “público leigo”, sobre uma possível nova percepção que eles possam vir a ter sobre o seu trabalho. Sendo este o cerne da questão: Você se preocupa que um leigo, após dar-se conta do seu envolvimento com Mágicos e Mentalistas, pode passar a pensar que o que você faz é Mágica, isto é, essencialmente truques, e/ou por outro lado que o que os Mágicos fazem são o que nós podemos chamar neste contexto de “Poderes Reais”? UG: Fantástica pergunta. E a resposta é “Não”. Eu não me preocupo. E se um leigo vier à FISM e assistir ao meu show de uma hora e meia de duração não terá uma resposta definitiva, nem para uma suposição ou para outra. A sua percepção não irá pender para a esquerda nem para a direita. Um jovem mágico que vá lá para me assistir, no entanto, certamente sairá altamente surpreendido com o que eu pretendo ensinar, isto é, como tornar-se um dos grandes, como “chegar lá” e tornar-se um artista célebre. A propósito, durante todos esses anos eu busquei ser extremamente cauteloso, e minha participação na FISM não é como assumir que durante todo o tempo eu fui um Mágico. Se você ler [essa afirmação] em algum lugar, trata-se de uma mentira ou de alguém que usou palavras minhas fora de contexto. Se algum dia você ouvir que Uri Geller se assumiu como um Mágico, isso será uma inverdade. GUILHOTINA: É interessante saber disso, pois não é incomum hoje em dia ver Mágicos fazendo esse tipo de comentário, dizendo coisas como “Oh, então ele finalmente admitiu”. UG: Pois é, e isso não é verdade. Alguém por acaso ouve algo, e comenta com outra pessoa. E essa pessoa distorce um pouco o que lhe foi dito, e repassa a outra, que repassa a outra… De repente você tem uma história totalmente falsa sobre Uri Geller. É assim que a Mídia funciona. Isto posto, a verdade é que no final das contas não importa se o que eu faço é através de um truque de mágica ou do poder da mente. Realmente não importa. No mundo da Mágica... E, aliás, o que é mágica? A Mágica é o Mistério. É o Assombro. A Mágica é algo que te faz querer maravilhar-se perante um fenômeno incrível. E é por isso que eu não quero saber como um truque funciona. Esse aspecto não me interessa - Se é mágica, se é truque, se é poder mental… Não faz diferença no final das contas. 21 “A Mágica é o Mistério. É o Assombro. A Mágica é algo que te faz querer maravilhar-se perante um fenômeno incrível.” GUILHOTINA: Excelente ponto de vista. UG: E agora, respondendo à sua questão sobre o público leigo. A mente humana é uma espécie de computador, sabe? Quando ela sofre um bombardeio de informação non-stop, é impossível associar cem por cento de tudo que vemos, ouvimos e sentimos. A vida corre rápido, e diariamente somos bombardeados com novidades: Seja através de jornais, TV ou das Redes Sociais, Internet, etecetera, somos constantemente expostos a demasiada informação. E a capacidade humana de foco e atenção é bastante curta. Você se dá conta de que as pessoas não se lembram exatamente de tudo aquilo que ouviram ou leram sobre Uri Geller. O que eles se lembram, todavia, é do meu nome. E é por isso que eu realmente não me importo com o que as pessoas falam sobre mim, contanto que elas escrevam meu nome corretamente. GUILHOTINA: (risos). Eis uma maneira genial de encarar a vida! UG: Eu nunca leio o que escrevem sobre mim. Em vez disso, eu meço. O que quero dizer com isso é que eu olho para um artigo e penso o quão grande, o quão extenso é isso que falaram sobre mim. Para mim, é tudo publicidade, é ter meu nome na boca do povo. Esta é a forma como tenho visto essas situações ao longo da vida. GUILHOTINA: Uma boa filosofia. UG: Agora suponhamos... vamos apenas chutar um número qualquer. Digamos que eu tenha… 10 Milhões de fãs, ok? Quantos desses você acha que sabem que vou atuar na FISM? Dentre esses dez milhões, quantos não apenas sabem disso, como também se importam com o fato de que eu darei uma palestra lá? Esta é a verdadeira percepção de ser um indivíduo, uma pessoa que atua e tem algo a dizer para o público leigo. Então as pessoas podem não necessariamente se recordar do que você fez ou faz, porém continuam se importando com você. GUILHOTINA: Faz muito sentido. Você diria que, citando o antigo ditado, toda publicidade é boa publicidade? UG: Sim, definitivamente. E eu aprendi essa lição nos Estados Unidos ao ser convidado para o programa do Johnny Carson [www.youtube.com/watch?v=TNKmhv9uoiQ], onde eu fui vítima de uma armadilha. Fiquei sentado ali durante vinte e dois minutos, e fui completamente humilhado. A colher não entortou o suficiente, e eles tiveram aquele lance com James Randi… Enfim. Durante aqueles 22 minutos eu estive suando, e a única coisa que passava pela minha cabeça era “Uri Geller, sua carreira acaba aqui e agora. É o seu fim. Faça suas malas e volte para Tel-Aviv”. 22 No dia seguinte, eu estava desmoralizado. Estava fazendo minhas malas e só conseguia pensar no meu monumental fracasso no programa do Johnny Carson, uma das maiores celebridades televisivas dos EUA. De repente o telefone do meu quarto tocou, e eu me lembro como se tivesse acontecido ontem! A operadora me disse “Senhor Geller, tenho Merv Griffin na linha e ele quer falar com o senhor”. Tenha em mente que Merv Griffin era tão grande quanto Johnny Carson na época. E ele [Merv] me disse “Uri, eu vi você ontem no Johnny Carson. E eu quero que você participe do meu programa essa semana”. E foi quando eu me dei conta de que realmente não existe nada chamado: “má publicidade”. GUILHOTINA: Deve ter sido um choque para você. Muitos provavelmente teriam, no seu lugar, pensado que a situação no programa do Johnny Carson significaria a ruína instantânea da sua carreira. UG: Exatamente. Foi uma surpresa enorme para mim, porque foram 22 minutos muito, muito longos para mim. E o efeito, contrariando qualquer expectativa, foi o exato oposto do imaginado. Agora, é importante lembrar que desde o início da minha carreira em Israel eu fui severamente atacado. As pessoas, os cientistas de lá me chamavam de fraudulento, de truqueiro, diziam que eu usava raios laser, ou produtos químicos… Eu estava nas capas de revistas que me chamavam de charlatão e barato. Então eu já havia tido essa experiência, essa percepção de que notas negativas na imprensa não afetavam negativamente as vendas de ingressos para os meus shows. GUILHOTINA: Pelo contrário. Até mesmo impulsionaram essas vendas. UG: Sim. Porém nos EUA era uma situação diferente para mim. Aquilo era Televisão. Era enorme! E também foi um longo tempo exposto ali… Mas foi uma grande lição na minha vida. Eu cheguei à conclusão de que se estão falando sobre você, e lhe dando publicidade gratuita… A sua carreira terá grande longevidade. GUILHOTINA: Você menciona a participação de James Randi nesse episódio em particular. A mídia em geral sempre tentou criar uma ideia de que vocês dois são arqui-inimigos, sempre acentuando as opiniões fervorosas de Randi contra você, e frequentemente se recorda o fatídico episódio no Johnny Carson sobre o qual falávamos. Como você descreveria seu relacionamento com Randi hoje? Como um verdadeiro rival, ou apenas um “bom inimigo”, isto é, alguém com quem se compartilha publicidade mútua? UG: Você sabe que houve um filme feito sobre James Randi recentemente [Nota do Editor: O Documentário se chama “An Honest Liar”]. Os produtores me contataram, perguntando se eu aceitaria participar. Eles queriam muito me entrevistar. E é claro que o que quer que fosse feito desse filme, no que se referisse a mim seria algo negativo. Naturalmente James Randi diria “Oh, Uri não passa de um mágico”, mas tudo bem, eu aceitei ser entrevistado para a obra. E sabe… ele [Randi] sempre foi, e na minha opinião CAPA JUNHO ainda é absolutamente obcecado com Uri Geller. Desde o início da minha carreira Randi tentou destruir-me, e se você fizer uma breve pesquisa irá encontrar incontáveis palestras e artigos onde ele diz coisas terríveis sobre a minha pessoa. Mas ele foi, para mim, um publicista gratuito. GUILHOTINA: (risos) UG: Se eu tivesse de pagar um especialista em publicidade para me fornecer, em igual teor, o que James Randi me conseguiu de graça ao longo dos últimos quarenta anos, eu teria de desembolsar por volta de 2.5 a 3.5 milhões de dólares. A publicidade grátis com a qual Randi me brindou é de fato nessa escala. Então eu só tenho a admirá-lo e agradecer-lhe! Quero lhe enviar buquês de flores por manter o Mistério em torno da figura de Uri Geller. Ele essencialmente criou a lenda de Uri Geller. Não sei quantas vezes encontrei com ele… Talvez umas três ou quatro? Mas há uma ocasião em especial da qual me recordo bem. Foi em um encontro com David Blaine em Nova York, onde Randi também estava presente. Lembro-me de ter pensado “Ora, vejam. James Randi está aqui! Que excelente oportunidade de apertar sua mão e lhe dizer ‘Que tal colocarmos toda a rivalidade para trás? ’”, e foi o que eu fiz. Dirigi-me até Randi, e quando estiquei meu braço lhe disse “Randi, vamos fazer as pazes. Eis a minha mão, para que você a aperte”. Ele se recusou, impassível, e eu lhe perguntei “Por que você não aperta minha mão, Randi?”, ao que ele respondeu “Por que eu te odeio. Odeio suas entranhas”. E isso meio que diz tudo, sabe? Eu acabei me tornando o tipo de pessoa que realmente não odeia ninguém. Esse episódio em particular me mostrou que Randi é o tipo de homem que provavelmente jamais irá gostar de mim, jamais irá apertar minha mão. Então, hoje em dia, se você me perguntar o que eu penso sobre James Randi, eu vou dizer que, bem, eu usei o cara e só tenho a agradecer por tudo que ele me fez. E eu o quero bem, sabe. De verdade. Ele é um senhor idoso hoje em dia, e não sei como ele está de saúde. Mas realmente desejo que ele esteja bem e siga uma vida longeva. “Se eu tivesse de pagar um especialista em publicidade para me fornecer, em igual teor, o que James Randi me conseguiu de graça ao longo dos últimos quarenta anos, eu teria de desembolsar por volta de 2.5 a 3.5 milhões de dólares.” GUILHOTINA: E que aconteceria se por acaso vocês se cruzassem nos corredores da FISM? UG: Oh, eu certamente me dirigiria a ele e diria “Veja, Randi. Me chamaram para participar do seu filme, e eu participei. Que tal apertar minha mão hoje? Você não precisa ser meu amigo, mas vamos deixar toda a animosidade no passado”, é isso o que eu diria. E certifique-se, Fábio, de que quando você escrever o seu artigo, deixar bem claro que essa é a minha opinião. A GUILHOTINA GUILHOTINA: Certamente! UG: É que vai que um dia Randi diga que isso não é verdade… Eu não sei o que ele pensa sobre mim hoje em dia. Eu só sei que durante os últimos quarenta anos, aliás, mais de quarenta anos, ele vem me provendo com muita publicidade grátis. GUILHOTINA: De fato. É uma das demonstrações que ao longo da sua carreira não houve nada a chamar de “má publicidade”, pois tudo lhe serviu de alguma forma. Com todas as polêmicas, é possível dizer até mesmo que você se alimenta de controvérsia. E por falar em controvérsia, durante os anos 1970 você foi arduamente estudado e testado pela NASA e eles concluíram, à época, que você era o que podemos chamar de um “verdadeiro paranormal”, ou um “médium real” ou, no mínimo, como uma pessoa cujas habilidades a ciência ainda não podia explicar. Se você fosse convidado hoje para ser novamente testado pela NASA, com a tecnologia atual, você aceitaria? “Eu usei poderes reais. Ninguém sabe, nem você, nem Randi, nenhum Mágico ou Leigo sabe como eu produzi aqueles fenômenos.” UG: Veja bem. Nos anos 70 quando eu fiz todos aqueles testes, e foram muitos… Estas são as minhas palavras, que inclusive estão no meu website [www.urigeller.com] e você pode citá-las ipsis verbis: O que eu fiz com os cientistas foi real. Quer você goste de ouvir isso ou não, aquilo foi real. Sim, naquela época eu me intitulava “Médium”, e posteriormente mudei meu título para “Paranormalista”, e como você sabe hoje em dia me chamo de “Mistificador”. E se você me perguntasse “Uri, mas quando você fez aqueles testes você usou poderes de verdade, ou nada passou de uma série de truques? ”, a resposta seria: Eu usei poderes reais. Ninguém sabe, nem você, nem Randi, nenhum Mágico ou Leigo sabe como eu produzi aqueles fenômenos. E é aí onde está o misterioso, o místico e o interessante. O fato de eu ter passado em todos aqueles testes foi, para os cientistas, algo incrível. Inacreditável, até. E foi tudo real. Se hoje você me propusesse algum teste dessa natureza, eu recusaria… Simplesmente porquê eu já o fiz no passado. GUILHOTINA: O que é bastante compreensível, a bem da verdade. UG: O que se sabe sobre mim, e sobre o que eu fiz, cientificamente falando, só se sabe uns 15, no máximo 20 por cento ainda hoje. E eu odiava aquilo tudo. Mas era importante que eu tivesse aprovação da ciência. Ter a validação de que meus poderes eram verdadeiros. GUILHOTINA: Ainda nesse tema, há um episódio da época que se menciona em um documentário da BBC, onde você fora instruído a tentar parar o coração de um porco utilizando seus poderes. Essa situação teria lhe causado grande ojeriza pelos cientistas, e há quem diga que seria 23 esse o motivo pelo qual você não gostaria de ser testado hoje em dia, porquê supostamente você teria passado a acreditar que a ciência não é feita apenas de boas e investigativas intenções. O que você teria a dizer sobre o caso? UG: Esse experimento com o porco, que me foi proposto por alguém que não irei revelar, ocorreu basicamente assim: Me levaram a uma sala onde havia um porco, e me pediram para fazer o coração dele parar. É por isso que até mesmo surgiu, alguns anos depois, um filme com George Clooney onde espiões paranormais tentam parar o coração de uma cabra, sabe qual é? GUILHOTINA: The Men Who Stare At Goats (No Brasil, “Os Homens Que Encaravam Cabras”)? UG: Sim. Nesse filme Clooney me interpreta, e aliás é uma coincidência divertida ele [Clooney] recentemente ter comprado uma casa ao lado da minha (risos), achei bem curioso. Havia um grupo de cientistas que efetivamente não se importavam em como você fazia as coisas que fazia, contanto que trouxesse os resultados que eles queriam. E isso era realmente… Bem, eu recomendo que você leia o livro The Secret Life of Uri Geller, pois ele é bem interessante. Eu não o escrevi, aliás. Nele há muitas histórias sobre como a CIA, o FBI, o MI5, a Mossad… E tantas outras Agências de Espionagem e Inteligência, sobre como eles se importavam unicamente com a Informação. Realmente não importava em que forma, maneira ou circunstância você obtivesse a informação que eles desejavam, desde que você conseguisse fazê-lo, e que fosse algo que eles pudessem verificar e validar como sendo algo legítimo. Foi o que eu fiz durante muitos e muitos anos por diversas Agências Governamentais. GUILHOTINA: Muito interessante. Voltando um pouco ao tema da Mágica e do Mentalismo, é sabido e notório que você influenciou gerações inteiras de performers e de autointitulados “Paranormais”. Nos anos 80 surgiu no Brasil um cara chamado Thomas Green Morton, o chamado “Homem do Rá”. Ele fez grande sucesso, mas foi rapidamente desmascarado pela mídia local por usar truques de mágica e efeitos especiais. Qual a sua opinião sobre pessoas que tentam se aproveitar do seu sucesso e emular a sua figura para obter lucro? UG: Deixe-me responder sua pergunta de uma maneira diferente. Eu não fico nem um pouco contente com esses verdadeiros charlatães, que tomam o dinheiro das pessoas ao primeiramente alegarem ser curandeiros, capazes de curar enfermidades. Eu recebo por volta de trezentos e-mails por dia, e muitos deles são de pessoas doentes. Eles me pedem ajuda, e sempre a primeira coisa que lhes digo é: Olha, eu não sou um curandeiro. Eu não opero milagres, e eu recomendo fortemente que você se dirija imediatamente a um consultório médico. Há muitas pessoas por aí alegando ser capazes de curar doenças e pegando o dinheiro de doentes, e isso é errado. É algo que eu jamais faria. Há inúmeros cultos por aí, geridos por auto-intitulados 24 paranormalistas, que querem dinheiro das pessoas, algo a que eu me oponho completamente. Se você é um Mágico, um Mentalista que alega ter poderes de verdade… Não tem problema, desde que você seja um entertainer. Se você faz essas coisas com fins de entreter as pessoas, então tudo bem. Eu tenho sido um entertainer desde o dia em que iniciei minha carreira… Só que eu não tenho como controlar pessoas que por ventura tentem ligar seus supostos poderes paranormais, seus atos à minha história. Emular minha persona, como você mencionou. Como eu poderia controlar isso? Seria similar a me perguntar “Uri, o que você pensa sobre mágicos que entortam colheres? ”, e sobre eles eu acho fantástico! Fico muito honrado que tantos Mágicos imitem e copiem Uri Geller, realmente acho ótimo. Jamais me aborreci com quem quisesse me copiar, e muito ao contrário, fico honrado. É fantástico que alguém possa traçar uma carreira no Entretenimento baseado em algo que viu Uri Geller fazer e que lhe trouxe inspiração. Isto posto, é claro que há linhas que eu devo traçar, sabe? Dizer que tal coisa é OK, e já tal coisa não é OK. Olha, eu não sou um curandeiro. Eu não opero milagres, e eu recomendo fortemente que você se dirija imediatamente a um consultório médico.” GUILHOTINA: Nas últimas décadas você atingiu um grau de celebridade facilmente comparável ao de artistas como Elvis, Madonna, Michael Jackson - que inclusive foi um grande amigo seu em vida -, e ainda hoje você está na boca do povo. Seja para o bem ou para o mal, as pessoas ainda falam sobre Uri Geller. Você acredita que algum dia terá um verdadeiro sucessor? Ou por vivermos em uma época onde a fama e a celebridade são tão efêmeras isso seria impossível? UG: Sabe, eu fico realmente lisonjeado que ainda hoje as pessoas falem sobre mim. Recentemente Clint Eastwood mencionou meu nome em alguma coletiva de imprensa. Ontem mesmo o Primeiro-Ministro do Japão, [Shinzō] Abe, disse algo positivo sobre mim. Eu sei disso pois utilizo o sistema de Alertas do Google, que envia um alerta ao meu Blackberry toda vez em que alguém menciona meu nome. E é algo muito raro que líderes de estado como Abe, que é meu amigo, façam declarações públicas sobre celebridades ou pessoas famosas em geral. O próprio Primeiro-Ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, já falou todas essas coisas gentis sobre mim, algo que me deixa muito contente. Agora quando você me pergunta se na minha opinião ainda haverá alguém no mesmo nível de fama que eu alcancei… Sabe, Fábio, há muitas pessoas no mundo da Mágica mais famosas do que eu. David Copperfield, por exemplo, é muito maior do que Uri Geller. Criss Angel é maior do que Uri Geller. Há mágicos mais jovens, como por exemplo David Blaine… Que eu considero mais famoso do que eu. E isso é fantástico! Há muitos mágicos que eu adoro, que eu realmente admiro e quero ver fazendo cada vez mais sucesso. O tempo passa! E eu não nutro nenhum sentimento de inveja contra essas pessoas. Muito pelo CAPA JUNHO contrário, inclusive. Quero cada vez que mais mágicos jovens surjam e fiquem conhecidos, pois eu tenho a consciência de que em algum grau, em algum momento do passado eu tive alguma influência em seu sucesso. “Há mágicos mais jovens, como por exemplo David Blaine... que eu considero mais famoso do que eu.” GUILHOTINA: De fato, e notoriamente no mundo do Mentalismo você tem sido uma influência enorme, tendo basicamente criado uma nova vertente dessa arte, isto é, a Flexão de Metais. Ver alguém criar um estilo de Mágica totalmente novo é algo muito raro de se ver. Neste ponto da Entrevista, Uri propõe uma inversão nos papéis e me pergunta sobre a minha vida pessoal e profissional, demonstrando grande interesse em conhecer melhor o seu interlocutor. Quando mencionei meu recente aniversário de casamento, até arriscou uma previsão: Rindo e sem sair do personagem, me recomendou a viver na Europa por alguns anos pois segundo um “pressentimento”, eu terei filhos em breve e mencionou sentir saudades das praias do Rio de Janeiro. Quando eu disse ter ressalvas sobre viver na Europa, Uri disse “Não hesite, jamais. O Universo não gosta de atrasos ou enrolação. Se você quer algo, vá buscar”. GUILHOTINA: Última pergunta, Uri. Qual seria sua dica, sua sugestão para quem ainda está se encontrando na Mágica ou no Mentalismo? Qual a sua mensagem para quem lhe tem como uma referência majoritária dentro e fora da Arte e do Show Business? UG: Meu conselho para jovens mágicos que buscam destacarse na cena seria, para primeiramente, abandonar o visual de antigamente e o senso de Mágica de antigamente. Não se vista como um Mágico. Vista-se cool - Armani, Versace… Uma camisa preta de boa qualidade. Segundo: Use seu carisma. Ative seu carisma, sua personalidade e seu personagem. Todos temos essas idiossincrasias, e a alguns só lhes falta saber ativá-las. Você não precisa ser um cara bonitão ou charmoso, ou uma mulher linda para ter sucesso na vida. O que atrai o olhar das pessoas é efetivamente o seu carisma. Terceiro: Sorria. Seja gentil com as pessoas à sua volta, e tenha sempre tempo para ouvir o que elas têm a dizer. E no que se relaciona à Mágica: Busque ser criativo. Crie sempre novas ideias e novas coisas. O segredo do sucesso está na originalidade. Sim, realmente pode até não haver nada de novo na Mágica ultimamente, mas você possui a capacidade de criar isso, e basta usar seu cérebro. Tudo começa com o raciocínio: “O que eu posso fazer que ainda não foi feito, e que pode atrair a atenção dos outros? ”. E também é importante executar façanhas, como David Blaine por exemplo. Coisas esquisitas, bizarras mesmo. Coisas estranhas que vão te fazer ser desejado pela TV, Revistas e Jornais. Isso de ficar fazendo Mágica em Bar-Mitzvahs, Aniversários e Confraternizações de Empresas não vai te levar a lugar algum. Você precisa sair da caixa e criar algo estranho! Algo que faça as pessoas pensarem A GUILHOTINA “Hey, veja só o que esse cara está fazendo! ”. Outro fator: Networking é algo muito importante. Networking significa conhecer sempre novas pessoas que possam te levar a novos lugares, e manter contato com elas. Ter seus cartões de visita sempre à mão. Anotar números de telefone e e-mails das pessoas que você conhece. Uma vez, duas vezes ao ano você os envia um cartão de aniversário, um telefonema de feliz-ano novo… Porquê pode ser que um dia alguma dessas pessoas estejam em uma posição onde vai poder te ajudar a subir. “Não se vista como um Mágico.” GUILHOTINA: Excelentes conselhos! UG: Outra coisa. Sempre esteja limpo e bem-cuidado. Invista em uma Colônia pós-barba de qualidade e tenha suas unhas sempre impecáveis. Se você seguir esses passos, o sucesso será uma consequência natural. E por último, esforce-se. Pressione a si mesmo, pois ninguém senão você mesmo vai te impulsionar rumo ao topo. GUILHOTINA: No máximo, vão tentar puxá-lo para trás, infelizmente. UG: Pois é, e isso é triste. No mundo da Mágica há muita inveja e ciúmes. Esta é uma das razões pelas quais eu sempre procurei me manter afastado desse meio. Não que isso seja algo ruim, pois somos animais… É natural sentir inveja de alguém que tem mais sucesso do que você. Por que essa pessoa conquistou mais e eu menos? O negócio é que você também é capaz disso, e basta impulsionar a si mesmo sem medo, sem vergonha ou pudores. Há uma palavra em Hebreu para isso, Chutzpah. Isso significa que você tem de ser ousado, sem-vergonha. Significa ser alguém que dá a cara a tapa e quando se depara com uma porta fechada, arromba essa porta e continua na implacável busca do seu alvo. GUILHOTINA: São conselhos realmente esclarecedores. Conceitos que podem até mesmo ser aplicados de forma universal, seja por Mágicos quanto por outros Artistas, pois são ideias que transcendem simples truques ou habilidades manuais UG: Mágicos jovens, principalmente, tendem a focar demais na questão das suas habilidades e nos truques, e acabam esquecendo de pensar na imagem pessoal, na sua persona e personalidade. Na conta final, são esses os fatores decisivos para que alguém seja desejado. Se há um mágico na TV que transmite uma personalidade agradável, que se veste bem e fala bem… É por isso que o público vai se sentir atraído, e o truque se torna algo secundário. É por isso que quando eu apresento meu programa The Next Uri Geller, a primeira coisa na qual eu reparo é na personalidade sobre o palco, no seu carisma. Ali [no programa] eu busco presença cênica, primeiramente. Depois de tudo isso é que eu me preocupo com a performance do truque em si. 25 Sempre nutri opiniões bem fortes a respeito de Uri Geller. Seria hipocrisia da minha parte negar o legado que ele criou para a Mágica (para o bem ou para o mal, que fique claro), e devo confessar que após nossa conversa permeada do distanciamento “forçado” e exigido pelo papel de “jornalista”, se é que posso emprestar momentaneamente o título, eu passei a observá-lo sob um prisma um pouco diferente. Passei a compreendê-lo melhor, e entender seus motivos. Tirei boas lições disso, como imagino que o leitor também tenha tirado. Passei a nutrir um respeito maior por ele e pelo que ele representa e me dou nessas últimas linhas uma breve liberdade de dizer parte dessa renovada percepção pessoal que tenho por Geller: Por mais que possa parecer lerolero New Age, o ponto que ele levanta sobre essencialmente, não alimentar sentimentos negativos sobre ninguém, é uma prática, no mínimo, deveras saudável. Exercitemos, pois. Fábio De’Rose é Mágico, Poliglota Autodidata e Autor do livro Cartosophia. É de Áries, não acredita em horóscopo e detesta falar de si mesmo em terceira pessoa. 26 CAPA JUNHO PERGUNTAS IMPOSSÍVEIS, RESPOSTAS BEM PROVÁVEIS A GUILHOTINA AUTOR: JUAN ARAÚJO As entrevistas desta coluna são fictícias, porém baseadas em textos sobre os entrevistados e/ou escritos por eles próprios. TOMMY WONDER (29/11/1953 - 26/06/2006) (A guilhotina) MUITO OBRIGADO POR ACEITAR SER NOSSO PRIMEIRO ENTREVISTADO PARA ESSA SEÇÃO DA REVISTA (Tommy Wonder) É um prazer poder contribuir de alguma maneira. (A.G.) EU ME LEMBRO QUE NA ÉPOCA DO LANÇAMENTO DE SEUS VIDEOS (VISIONS OF WONDER) LI UM COMENTÁRIO SOBRE SUA ROTINA DE CUPS & BALLS DIZENDO QUE ERA TÃO BEM CONSTRUÍDA QUE VOCÊ PODERIA VER A MESMA ROTINA MOMENTOS DEPOIS E MESMO SABENDO O QUE ACONTECERIA NÃO PERCEBERIA NENHUM DAS CARGAS QUE ACONTECEM. NA MESMA HORA PENSEI SER UM EXAGERO, QUE A PESSOA APENAS ESTAVA QUERENDO SER GENTIL. MAS REALMENTE FOI O QUE ACONTECEU DEPOIS QUE TIVE A OPORTUNIDADE DE ASSISTI-LÁ. O QUE VOCÊ PODE NOS FALAR SOBRE O USO DA MISDIRECTION, QUE É UMA FERRAMENTA TÃO BEM USADA POR VOCÊ? (T.W.) Em primeiro lugar acho que o uso do termo “Misdirection” é um grande erro. Quer dizer direção errada, significa que a atenção deve ser desviada a outra direção, e não deveria ser assim. O melhor termo a usar seria “Direction”, porque focamos em dirigir a atenção a um lugar e não em desviá-la, pode parecer um detalhe, mas faz toda a diferença. Se você quer empalmar uma carta com a mão direita, todos seus esforços são dirigidos a desviar a atenção dessa mão e assim sua mente se foca nisso, na mão direita. É difícil esquecer-se dessa mão, isso transparece para o público, e podem acabar como você. Agora imagine que você se concentre em usar a mão esquerda para deslocar uma taça em cima da mesa, toda sua a atenção está nessa ação, e enquanto faz isso empalma uma carta com a outra mão. É uma dinâmica totalmente diferente. Outro problema é que a técnica é usada de maneira errada, para corrigir problemas em uma rotina. É como construir um barco, notar que está cheio de furos e então usar algo para remendá-los. Não seria melhor já construir o barco sem o problema? Eu sempre tento construir minhas rotinas para, a todo momento, controlar o foco de atenção para onde desejo, e assim fica mais fácil identificar os momentos onde posso realizar as ações secretas necessárias. (T.W.) Umas das maiores dificuldades no uso da “Misdirection” (vamos seguir usando esse termo para facilitar) para encobrir alguma parte do segredo consiste em ser praticamente impossível conseguir isso se falta confiança em seu poder. Vamos supor que você vai apresentar pela primeira vez um efeito que requer o poder da “misdirection” para ocultar o método. É completamente compreensível que você esteja nervoso, e essa falta de confiança pode fazer com que seu controle de atenção não funcione. Esse fracasso irá minar sua confiança no poder da “misdirection”. Assim, na próxima vez que for apresentar esse efeito sua confiança será ainda menor, e esse ciclo continuará até que você acabe concluindo que tudo relacionado a “misdirection” não serve para você, e acabará deixando de lado uma das ferramentas mais poderosas que um mágico pode ter a seu dispor. Então para evitar isso o ideal é encontrar maneiras de experimentar esse poder sem a possibilidade de fracasso. O primeiro efeito do meu livro é um exemplo disso: nele um ovo aparece na mesa com o mágico a 1m de distância. O método é puro controle de atenção, mas esse não é o efeito final da rotina, então se no momento exato você percebe que alguém está vendo você deixar o ovo na mesa, simplesmente age normalmente como se estivesse fazendo aquilo abertamente sem tentar esconder e segue com a rotina, que culmina com uma carta aparecendo no interior do ovo. Mas é um assunto muito complexo para eu tentar explicar em detalhes aqui, em meu livro explico tudo que sei sobre “misdirection” e como a aplico em meu trabalho. (A.G.) QUAIS DICAS VOCÊ DARIA PARA AQUELES QUE QUEREM EXPLORAR TODO O PODER DA MISDIRECTION? 27 (A.G.) O QUE VOCÊ ACHA DA FRASE DO AL BAKER “NÃO CORRA SE NINGUÉM ESTIVER LHE PERSEGUINDO”? QUERENDO DIZER QUE NÃO SE DEVE FICAR TENTANDO PROVAR DEMAIS ALGUMA COISA, SE AS PESSOAS NEM ESTÃO PENSANDO NAQUILO. (T.W.) Faz todo sentido e digo mais, acho que uma vez que essa “corrida” é iniciada não tem como sairmos vencedores, “correr” mais que eles é impossível. Você não pode se dar ao luxo de sequer entrar numa corrida dessas, por isso acho que precisamos fazer nossas corridas antes que alguém esteja nos perseguindo. Temos que pensar em tudo que for possível, toda estratégia, toda sutileza, todo ardil disponível para dirigir a atenção em direção ao efeito distanciando-a do método. Esse “correr” durante a etapa de construção da rotina garante que não haverá perseguições durante a apresentação. Temos que usar a estrutura do efeito para provar tudo que pudermos, para que na hora da apresentação não precisemos provar quase nada. (A.G.) E O QUE FAZER COM ESPECTADORES QUE NÃO SE DEIXAM LEVAR POR NOSSA APRESENTAÇÃO, QUE SÓ QUEREM DESCOBRIR O SEGREDO? PARA OS MÁGICOS DE AUTO-ILUDIREM EM RELAÇÃO AO SEU SUCESSO? (T.W.) Existe uma coisa muito interessante sobre o público, que pode nos dar uma impressão errônea sobre nosso sucesso. Os espectadores são muito sensíveis ao nível de profissionalismo do artista, sua impressão não se baseia apenas no repertório do mágico e no quão bem ele o apresenta, mas também no ambiente em que trabalha, na atitude, na confiança, na maneira como se veste, na idade, em suas aparições mais ou menos freqüentes na televisão, e outros diversos fatores. É importante para um iniciante saber que as pessoas o tratam diferente de acordo como ele é percebido. Quando alguém não é reconhecido como um profissional experiente, quase sempre os espectadores são mais indulgentes. As pessoas assistirão com menor atenção e estarão dispostos a perdoar mais coisas. Não estou dizendo que vão descobrir o segredo dos números e fingirão que não perceberam por educação, mas justamente por a atenção ser menor, muitas coisas que de outra maneira detectariam e criticariam no trabalho de um profissional, passarão despercebidas. Quanto maior a experiência do profissional, mais impiedoso será o público. (T.W.) A primeira coisa a fazer é verificar se algum elemento de sua apresentação incentiva o público a fazer isso. Pode ser um detalhe pequeno e sutil. Procure por qualquer coisa que possa sugerir “sou mais esperto que vocês”. A melhor maneira de impedir que o público assuma o papel de detetive é ter certeza de que sua mágica desperta muito mais interesse do que um simples enigma. (A.G.) MAS VOCÊ NÃO ACHA QUE MESMO NUMA APRESENTAÇÃO QUE NÃO TENHA NENHUM DESSES ELEMENTOS DE DESAFIO PODEM SURGIR ESPECTADORES ASSIM, QUE SÓ TEM INTERESSE EM DESCOBRIR OS SEGREDOS? (T.W.) Claro que é possível, algumas pessoas estão condicionadas a no momento quem vêem um mágico focarem toda sua energia para descobrir o segredo. Não é muito inteligente pensar que com sua personalidade e apresentação você conseguirá sempre transportar todos os membros do público a um mundo de sonhos onde eles deixarão de lado sua incredulidade de maneira voluntária. Os que pensam assim dão a impressão de nunca terem atuado perante um público real. Quando nos depararmos com um espectador desse tipo, é preciso de alguma maneira tirá-lo de sua posição de apenas observador. Temos que fazer com que participem fisicamente, pedindo que emprestem algum objeto, que segurem alguma coisa ou que façam algo. Uma vez que tenham entrado no jogo e recebido o impacto do primeiro efeito, na maioria das vezes não voltam ao papel de detetive imparcial. (A.G.) DEPOIS DE VER A QUANTIDADE DE ESFORÇO E PENSAMENTO QUE VOCÊ COLOCA EM SUA MÁGICA, MUITOS MÁGICOS PODER SE PERGUNTAM SE É PRECISO REALMENTE TODO ESSE TRABALHO, AFINAL DE CONTAS JÁ CONSEGUEM GRANDES REAÇÕES EM SUAS APRESENTAÇÕES. POR QUE VOCÊ ACHA QUE É TÃO FÁCIL 28 (A.G.) PERCEBO QUE OUTRO FATOR QUE CONTRIBUI PARA ESSA ACOMODAÇÃO É QUE OS MÁGICOS TÊM UMA TENDÊNCIA A SEREM POUCO CRÍTICOS COM SEUS COLEGAS, A QUE VOCÊ ATRIBUI ISSO? (T.W.) É muito cultivada a ideia de que a mágica é uma grande família, onde todos somos irmãos em função de nosso interesse em comum. Isso é muito bonito e tem seu aspecto positivo claro, mas também causa alguns problemas, como esse citado por você. Eu fico realmente revoltado quando vejo mágica ruim ser aplaudida e incentivada apenas por conta dessa ideia de que a mágica deve ser uma fraternidade onde tudo é perfeito e lindo. Esse conceito de “grande família” muitas vezes incentiva os mágicos a se acomodarem, com a amizade sendo mais importante do que a busca pela boa mágica. Claro que podemos ser amigos, mas isso não pode interferir no estímulo à mágica de qualidade. Já vi muitas organizações mágicas defenderem que a amizade e fraternidade são os aspectos mais importantes da mágica. Essas organizações fariam um bem maior se promovessem a boa mágica, e deixassem o desenvolvimento da amizade para os indivíduos envolvidos. CAPA JUNHO (A.G.) VOCÊ ACHA QUE QUALQUER PESSOA PODE FAZER MÁGICA, OU É PRECISO NASCER COM TALENTO PARA ISSO? (T.W.) Acho que é necessário que tenha um talento natural. Mas esse talento é como um diamante bruto, que precisa ser polido para que toda sua beleza apareça. Não adianta nada ter talento e não desenvolvê-lo, é preciso muito trabalho para tirar proveito disso. (A.G.) MAS ESSA IDEIA, DE QUE SEM UM TALENTO NATURAL É IMPOSSÍVEL ALGUÉM SE TORNAR UM BOM MÁGICO, NÃO É UM POUCO PESSIMISTA, E ATÉ ELITISTA? (T.W.) Pode parecer, mas por outro lado eu acredito que a grande maioria das pessoas possuem algum talento. Talvez não muito, mas um minúsculo diamante polido até a perfeição é muito mais belo que um grande diamante bruto. Então não é preciso se desesperar ao notar que seu diamante bruto não é muito grande, mesmo assim sua mágica pode ser admirável. Mas como eu já disse, é preciso muito trabalho para isso. Eu percebo que muitas vezes a expressão “falta de talento” é usada como desculpa para “falta de trabalho”. (A.G.) E QUAL A MELHOR MANEIRA DE “POLIR ESSE DIAMANTE”? (T.W.) Praticando e apresentando mágica o máximo que você puder. Quanto mais você a fizer, mais experiência acumulará e mais desenvolverá um sentido para perceber o que cai bem para você, um tipo de intuição. Com o tempo apenas se imaginando apresentando algo você será capaz de saber se aquilo combina com seu estilo ou não. A GUILHOTINA (A.G.) BOA PARTE DOS 2 VOLUMES DE SEU LIVRO SÃO DEDICADOS À TEORIA. MUITOS MÁGICOS DEFENDEM QUE TEORIA É BONITA NO PAPEL, MAS NÃO TEM MUITA APLICAÇÃO PRÁTICA. O QUE VOCÊ TEM A DIZER SOBRE ISSO? (T.W.) Primeiro preciso dizer que a intuição que desenvolvemos depois de muito trabalho é a melhor ferramenta que temos à disposição para desenvolver nossa mágica. Esse feeling é um critério muito melhor e muito mais seguro para tomar decisões do que qualquer análise teórica. Claro que essa intuição dependerá do seu talento natural e o quanto você a desenvolveu. (A.G.) PARA QUE SERVE A TEORIA ENTÃO? (T.W.) Depois que a intuição lhe mostrar o caminho, a teoria poderá ajudá-lo muito. A intuição é uma peça chave para a criação de boa mágica, mas por si só é pouco provável que alcance o potencial máximo das ideias que ela produziu. Essa é a tarefa da análise teórica. Mas por outro lado, aplicar teoria sem esse primeiro passo intuitivo pode produzir uma verdadeira porcaria. A principal função da teoria é solidificar e refinar os frutos de nossa intuição. Primeiro vem intuição, depois teoria e análise. Essa progressão é essencial. (A.G.) E SE A PESSOA NÃO TEM ESSA INTUIÇÃO DESENVOLVIDA? (T.W.) Se você não confia em sua intuição, deve aprender a desenvolvê-la, a trabalhar e ter fé nela. Se sua intuição se mostra errada repetidas vezes, só significa que ainda não está desenvolvida, ou que simplesmente falta talento. Relembrando, o tamanho do talento não pode ser aumentado, mas a pessoa deve continuar trabalhando, e chegará o momento em que descobrirá que pode confiar nessa intuição cada vez mais. (Continua na edição de Julho) 29 DO FUNDO DA CARTOLA HISTÓRIA JUNHO A GUILHOTINA Leonardo Glass A Guerra das Varinhas A RIVALIDADE ENTRE MÁGICOS Quem assistiu ao filme “O Grande Truque” viu a que ponto pode chegar a rivalidade entre dois mágicos. No mundo real, rivalidades também aconteceram, e muitas delas entraram para a história. Alexander Herrmann x Carl Herrmann – Irmãos dividindo o mundo X Seria um exagero dizer que Carl e Alexander eram rivais. Carl e Alexander eram irmãos e Carl (cujo nome verdadeiro era Compars) servia de inspiração ao irmão mais novo. Carl largou os estudos em medicina e resolveu dedicar-se integralmente à mágica. Sendo um grande fã do irmão mais velho, Alexander começou a copiar o irmão e a demonstrar interesse na mágica. Precisando de ajuda e percebendo o interesse do irmão mais novo, Carl “sequestrou” Alexander – que à época tinha apenas oito anos – e o levou para uma turnê pelo Leste Europeu. Alexander servia ao irmão como assistente de palco. Ele levitava no palco apoiado em bastão e atuava como médium vendado. Alexander ainda tomava lições de manipulação, para a qual demonstrou grande afinidade. Após a turnê, Carl “devolveu” o irmão aos seus pais. Alexander mostrou ao seu pai, Samuel (o qual já era um renomado físico – ou seja, um mago cientista) o que havia aprendido com o irmão. Samuel viu o potencial do garoto e permitiu anos mais tarde que Alexander acompanhasse o irmão. Aos 11 anos Alexander mudou-se de Paris para Viena para trabalhar ao lado do irmão. A cada ano a habilidade de Alexander aumentava e ele se tornava parte maior do show. Aos 17 anos, Alexander e Carl vieram para a América. Já era patente que a habilidade de Alexander rivalizava com a do irmão. Isso deixou Carl ciumento, porém, ele continuava sendo a estrela do show e Alexander continuava sendo o médium vendado. Os irmãos fizeram seu tour pela América e logo decidiram se separar. Enquanto Alexander permaneceu na América, tornando-se “O” Herrmann, Carl voltou para a Europa e por lá excursionava. Assim o mundo ficou dividido entre dois Hermmanns: Carl ficou com a Europa e Alexander com a América. A rivalidade entre os irmãos não era declarada, mas é fato que ambos competiam para ver quem levaria o nome Herrmann mais longe. E, embora rivais, eles ainda eram irmãos.Quando Carl faleceu em 1887, Alexander ficou profundamente triste e para um jornal declarou que tudo o que ele era, devia ao irmão. 30 Chung Ling Soo x Ching Ling Foo – A batalha pelo original X O original não se desoriginaliza ou, ao menos, não deveria. Mas e quando a cópia sobrepuja o original? Essa é a história de Chung Ling Soo e Ching Ling Foo. Ching Ling Foo (nascido Zhu Liankui) era um mágico chinês, nascido em Pequim, versado nas artes ilusionistas orientais. Tendo alcançado grande prestígio na China, resolveu tentar a sorte no Ocidente, empreitada essa que foi bem sucedida; Foo foi o primeiro mago oriental a fazer sucesso no ocidente. Dentre seus truques estavam a produção de uma enorme tigela cheia d’água e a decapitação de um garoto (coisa que nem Dedi fez, mas divago...). Num ato de publicidade, Ching desafiou qualquer pessoa a reproduzir o seu número da tigela de água. A recompensa era de US$ 1.000,00 (aproximadamente R$ 30.000,00 em valores atuais). Foi então que um mágico do Brooklyn chamado William Robinson arriscou reproduzir o truque. Foo repeliu o desafiante, recusando-se até mesmo à assistir à tentativa de Will. Ficou claro, então, para Will que Foo não daria o prêmio a ninguém, independentemente da realização do truque. A vingança de William foi única. Aproveitando uma oportunidade de trabalho que requeria um ilusionista chinês, William emulou praticamente todo o show de Ching. O próprio nome artístico foi uma cópia quase fiel do rival. Assim, em 1900, nascia Chung Ling Soo. O toque de gênio foi o slogan criado por ele: “O conjurador chinês original”. De acordo com a biografia fictícia de Chung, ele era filho de um missionário americano e mãe cantonesa. Ficou órfão de pai e mãe aos 13 anos e foi então adotado por Arr Hee, um mágico chinês versado também nos truques “europeus”. Após a morte de seu mestre, Soo partiu pelo mundo em carreira solo e chegou à América. Robinson manteve-se no papel de forma plena e integral. Raramente falava inglês no palco e quando falava era um inglês fortemente carregado de sotaque. Entrevistas, só com o suporte de intérpretes. Logo, Soo (Robinson) se tornou o mágico oriental mais popular do ocidente, sobrepujando inclusive o próprio Foo (Liankui). Não tardou para que Liankui desafiasse seu simulacro. CAPA JUNHO A GUILHOTINA Em 1905 os dois mágicos estavam em Londres, Foo (Liankui) se apresentando no Empire Theatre e Soo no Hipódromo. À essa altura Foo já sabia da verdadeira identidade de Soo e que ele havia emulado o seu show. Como um golpe publicitário, Foo (Liankui) foi à público e anunciou que Soo (Robinson) era uma fraude e se propôs a replicar, pelo menos, metade do show de Soo, provando assim que ele era o verdadeiro ilusionista chinês. Sem se abalar Soo aceitou o desafio e concordou em se encontrar com Foo no escritório da “The Weekly Dispatch”, um jornal londrino da época. O problema para Foo é que a imprensa estava mais interessada na disputa entre números de mágica do que na real identidade de Soo, o que foi um baque para Liankui. Dessa forma, Liankui se recusou a aparecer na conferência de imprensa e retirou o desafio. O episódio causou um embaraçamento público para Foo a ponto de seu show no Empire Theatre ter durado apenas quatro semanas, enquanto o show de rival ficou em cartaz por cerca de três meses. Em 1918 Soo (Robinson) morreu tragicamente durante um show enquanto executava o truque de pegar a bala. Sua morte causou dupla comoção: pelo modo como aconteceu, e por finalmente fazer a verdade sobre sua identidade vir à tona. Já a morte de Foo, 4 anos depois, permanece ainda hoje um mistério. da assistente e, em seguida, serrada ao meio com um serrote. As seções eram separadas e o torso da assistente mostrado. Na versão de Goldin, a caixa ficava na horizontal e a assistente entrava dentro da caixa. Seus pés, mãos e cabeça eram postos para fora por aberturas feita na caixa e a assistente presa por grilhões. A caixa então era serrada ao meio e em seguida eram inseridas folhas de metal nas bordas cortadas e as metades separadas. A primeira apresentação de Goldin não foi das mais exitosas. Seu número apresentou inúmeras deficiências que não trouxeram o assombro esperado. Ainda mais em se considerando que foi apresentado para os membros da Sociedade Americana de Mágicos. Mas um dos espectadores viu o potencial do truque e se prontificou em ajudar Goldin a desenvolvê-lo. Howard Thurston então indicou Harry Janses, seu engenheiro de equipamentos que refinou o número. Nesse ponto, Goldin acabou registrando e patenteando o número, o que impediu que outros mágicos pudessem executar esse número. Assim, por 17 anos, Goldin teve o monopólio do número, tanto que, até hoje, algumas pessoas creditam a ele a invenção desta ilusão. Goldin ainda enfrentou alguns processos judiciais por conta do segredo do número e de sua revelação. Quanto à Selbit, ele voltou para a Inglaterra onde continuou trabalhando e tentando criar números tão bons quanto o da mulher serrada ao meio. Muitos de seus números fizeram muito sucesso como o “The Million Dollar Mystery” apresentado, entre outros, por Carter, o Grande; Mas nenhum deles atingiu o mesmo grau de sucesso da mulher serrada ao meio. Horace Goldin x P.T. Selbit – O número da discórdia Houdini x Thurston – O Ying-Yang da mágica X Goldin era um mágico polonês que migrou para a América ainda adolescente. Seu sucesso veio em 1921 ao apresentar e patentear o número da mulher serrada ao meio. O problema é que este truque foi criado por PT Selbit, um mágico inglês, o qual foi assistido por Goldin meses antes de ele dar entrada na patente do número da mulher serrada ao meio. Selbit apresentou seu número oficialmente em janeiro de 1921, meses antes, portanto, de Goldin. Há registros que já em dezembro de 1920 Selbit havia feio pequenas exibições privadas para alguns donos de teatro a fim de avaliar a qualidade do seu número. Havia pequenas diferenças entre os números: no de Selbit a caixa ficava na vertical e a assistente ficava com braços e pernas abertos. Era amarrada com cordas pelos pés e mãos por voluntários da plateia. A seguir eram inseridas duas placas de vidro na caixa, na altura do torso X Dois grandes mágicos que não poderiam ser mais contrastantes. Não se odiavam, mas também não se amavam. Não obstante, Jim Steinmeyer dedicou um livro inteiro para contar a história de rivalidade entre Harry Houdini e Howard Thurston. Thurston foi vice-presidente da Sociedade de Mágicos Americanos; Houdini foi o presidente. Thurston era um ex-golpista que revisou a sua biografia para vender a imagem de um homem religioso e de intenções nobres; Houdini era filho de um rabi judeu e forjou uma identidade falsa na qual havia se associado à criminosos. Aliás, Thurston era reconhecidamente um polido gentleman, enquanto Houdini era visto como arrogante e cheio de si. Apesar de famoso pelas suas grandes ilusões, a grande virada de Thurston veio quando aprendeu o “backhand palm” com T. Nelson Downs; Houdini, apesar de se proclamar o “O rei das cartas” era pífio na cartomagia e o causo onde foi enganado por Dai Vernon tornou-se uma lenda no meio mágico. 31 O grande número de Thurston foi “A Levitação da Princesa Karnac”, número que herdou de Harry Kellar; o grande número de Houdini foi criado por ele mesmo, mas não envolvia mágica, mas sim escapismo (“The Water Torture Cell”). Aliás, Thurston foi o sucessor natural de Harry Kellar, o maior ilusionista nativo americano até então. Houdini era muito amigo de Kellar, praticamente um discípulo, mas não o seu sucessor natural. O show de Thurston fazia jus ao título de “O Show mais Maravilhoso do Universo”: dançarinas, um automóvel que desaparecia no palco, transformações, truques com água, cartas, patos, coelhos... O show de Houdini incluía, além de algum ato de mágica, escapismo e uma lição sobre os falsos médiuns. Steinmeyer definiu a rivalidade entre os dois de forma absoluta e brilhante: “Enquanto Thurston buscava se tornar o melhor mágico do mundo, Houdini lutava para se tornar uma lenda”. No fim das contas, cada um obteve o seu quinhão. David Copperfield x Herbert Becker – Batalha nos tribunais X David Copperfield já se envolveu em inúmeros processos, a grande maioria de natureza trabalhista. Mas um caso em especial entrou para o hall de causos curiosos da arte. Em 1993 Herbert Becker estava escrevendo um livro sobre a vida de grandes mágicos e revelando alguns de seus truques mais famosos, quando David Copperfield se aproximou de Becker e pediu para ser incluído no livro. Os dois trabalharam juntos e Becker incluiu em seu livro, além de fatos sobre a vida de Copperfield, a revelação de alguns de seus truques. Mais tarde Copperfield moveu um processo contra Becker com o intuito de parar a publicação do livro sob pretexto de que “Becker estaria revelando os truques de Copperfield”. David perdeu o processo, mas quando o livro foi publicado em 1995 este saiu da gráfica SEM o capítulo sobre David Copperfield. Um capítulo inteiro simplesmente desapareceu do livro. Becker buscou tomar satisfações da editora mas estes se recusaram a comentar sobre o ocorrido. Em 1997 Becker processou a editora e David Copperfield alegando um conluio entre eles que culminou em uma quebra de contrato da Editora com Becker. Becker saiu vencedor deste processo; Poucas semanas depois de ser processado por Becker, Copperfield entrou com um processo contra a revista Paris Match por difamação. Segundo a revista, o encontro de David Copperfield e Claudia Schiffer teria sido armado e o seu casamento um mero arranjo de interesses, e que ela sequer 32 gostava de David. David alegou que Becker era a fonte por trás da história e o acusou de ser um mágico fracassado e invejoso. Becker negou a acusação e disse que Copperfield era realmente terrível com as mulheres e que só queria fama e atenção. Independentemente se Becker era ou não a fonte por trás da notícias, o fato é que David e Becker resolveram as suas diferenças e Becker, antes citado no processo por Copperfield, acabou testemunhando em defesa do outrora rival. E o testemunho de Becker foi decisivo para que em 1999 David Copperfield saísse vencedor do processo contra a revista francesa, a qual, além de pagar a indenização, se retratou publicamente. E hoje? Atualmente a rivalidade entre artistas é menos patente, embora ainda exista. Porém, ao invés de resolver o problema nos palcos, eles tem sido decidido nos tribunais. Em 2012 Teller moveu um processo contra o mágico holandês Gerard Bakardy por suposta quebra de direitos autorais. Bakardy assistiu a uma apresentação de Penn & Teller em Las Vegas e quando viu o número “Shadows” de Teller, no qual Teller projetava a sombra de uma rosa em um fundo branco e, ao cortar a sombra da rosa com uma faca, a rosa caia no palco. Bakardy então criou o seu próprio método para o efeito e o colocou à venda por US$ 3.000. O problema é que esse truque havia sido patenteado por Teller em 1983. Teller ainda tentou um acordo com Bakardy para comprar a sua versão, mas não houve acordo. O caso foi parar nos tribunais e em 2014 Teller saiu vitorioso. O caso tornou-se emblemático pois abriu a discussão sobre a aplicação da lei de direitos autorais para números de mágica como um todo, e não apenas para o aparato. Hoje os mágicos convivem com uma nova realidade: as redes sociais que permitem críticas mais mordazes e o nascimento de inimizades entre artistas mágicos, muitas vezes ainda antes da fama. Parafraseando um rabino do século I d.C. “(...) é inevitável que hajam escândalos; mas ai daquele homem por quem o escândalo vem.” Leonardo Glass é cartomago amador, mentalista incipiente e fortiano convicto. PASSO A PASSE ACADEMIA JUNHO A GUILHOTINA Daniel Prado Olá caros leitores, é com enorme satisfação que inauguro esta coluna onde vocês poderão não só aprender números novos e originais, como também clássicos da mágica em diversos segmentos. Todos nós sabemos que sem a transmissão de informação nosso ofício certamente morreria. A divulgação de uma ideia é fundamental para que esta floresça, ganhe notoriedade e por fim, saia do mundo das ideias e passe a pertencer ao mundo dos fatos. Um bom mágico não deveria se conter apenas em encantar seu público, mas também em provê-lo de material novo, fresco, mesmo que adaptando, a seu modo, um número antigo. A criação de técnicas e efeitos é, sem dúvida, uma engrenagem importante no desenvolvimento de uma cultura mágica mais coesa e estimular este processo é nosso dever! Aqui você terá acesso a ideias originais e clássicas explicadas em detalhes, para que você possa colocá-las em prática o mais rapidamente possível. Bem-vindos ao Passo a Passe! Modus Operandi A ideia é uma variação do Cull Force e se apresenta da seguinte forma: Culling é a técnica para se “separar” uma carta durante a abertura (spread) das cartas nas mãos. O cull mais conhecido é o Hofzinser Spread Cull. No entanto, recomendo fortemente o DVD Roadrunner Cull de Kostya Kimlat, que é, mais especificamente, o cull que utilizo. O cartão apresentado tem em seu verso o desenho de uma carta ou o nome da carta escrito. Este cartão deve ser deixado com o desenho pra baixo sem nenhuma ênfase de que há algo escrito nele. Para efeito didático, a carta desenhada será o 7 de Copas. Após o espectador misturar bastante as cartas do baralho, no momento em que você abrir as cartas com as faces para cima para comentar sobre a ordem única, procure o 7 de Copas May The Force Be With You - Daniel Prado Descrição do efeito: O mágico apresenta seu cartão de visitas e o deixa em destaque em cima da mesa. Apresenta um baralho ao espectador e pede para que ele seja embaralhado. São mostradas as faces das cartas, lembrando ao espectador que o baralho agora se encontra em uma ordem única, a qual ele não mais tem qualquer controle. O mágico então explica que ele tem uma carta em mente e pede para que o espectador coloque seu cartão de visitas onde ele quiser no meio do baralho. Começa então a abrir as cartas nas mãos, com as faces para baixo e pede para que o espectador coloque este cartão onde quiser, especificando se quer que o cartão fique acima, ou abaixo da carta que o mágico está pensando. O cartão é posicionado e o baralho é fechado e entregue de volta ao espectador. Explica-se que a mágica é como uma substância que permeia o universo. Ninguém sabe exatamente o que é ou como ela funciona, mas que todos nós estamos sujeitos aos seus poderes e qualquer um pode controlá-la. Ele, o mágico, transferiu esta habilidade ao espectador por alguns segundos sem que ele soubesse, de forma que o espectador possa experimentar a sensação de controlar essa energia. Ele pede então que o espectador vá abrindo as cartas até encontrar seu cartão e assim que encontrar, verificar qual carta está na posição. O espectador olha então a carta e verifica que é um 7 de Copas. O mágico sorri satisfeito e diz: “Esta era exatamente a carta que eu estava pensando!” É claro que neste momento não há mágica nenhuma, afinal, que prova o espectador tem de que esta era exatamente a carta que estava em seu pensamento? O mágico pede para o espectador olhar o verso do cartão. Nele há um desenho de uma carta: 7 de Copas! e faça um cull nele. Vá até o final e, conte quatro cartas a partir do topo. 33 Posicione o 7 de Copas na quinta posição (considerando o baralho virado com as faces para baixo) Feche o baralho, vire-o com a face para baixo, peça para o espectador pegar seu cartão de visitas e comece a abrir o baralho nas mãos, com as faces das cartas para baixo e imediatamente faça um cull na 5ª carta (7 de Copas). Mantendo o 7 de Copas “separado”. Se ele disser ABAIXO, apenas coloque o macete da mão direita acima do cartão e a carta escolhida será imediatamente a carta acima do cartão. Peça para ele ver qual é a carta. e logo após se referir à prova de que aquela era a carta na qual estava pensando, peça para que ele veja o verso do cartão. Peça para o espectador apontar onde quer colocar o cartão e corte o baralho naquela posição. Peça para o espectador colocar o cartão acima do macete da mão esquerda. Pergunte a ele se quer o cartão ACIMA ou ABAIXO da carta. Se ele escolher ACIMA, “carregue” o 7 de Copas, que agora é a última carta do macete da mão direita, abaixo do cartão e feche o baralho. Pensamentos Finais Se você preferir, você pode pedir para o espectador embaralhar as cartas e ao abrir o baralho (em faixa, em uma mesa, por exemplo) você nota a 5ª carta (do topo para a boca) e a partir daí, faz uma previsão no seu cartão de visitas. Sempre que elaboro um efeito ou técnica, penso em diversas aplicações para ela que não caberiam neste espaço. Sugiro que, como exercício, você pense em outras aplicações para o mesmo princípio. Até a próxima! Daniel Prado é louco, não confie nele! 34 CAPA JUNHO A GUILHOTINA Reflexo 2.0 Criado e descrito por Emerson Rodrigues Na primeira edição da “Convenção de Mágicos em Oz” compartilhei em minha conferência o efeito “Reflexo” um dos meus efeitos favoritos, mas que devido ao formato da “foto/previsão” foi levantada uma objeção sobre a orientação da foto (sobre a foto estar ou não de cabeça para baixo). Agora a orientação é reforçada pelas palavras escritas na foto, desde que visualizei este efeito eu queria que ele fosse algo que eu pudesse fazer “em qualquer momento e qualquer lugar” (O que não é tão prático usando-se 2 baralhos) por isso mudei os objetos, que agora além de fazerem mais sentido entre si, todos podem ser facilmente carregados em sua carteira e serem usados em qualquer lugar, eu acredito também que o fato de usar dinheiro como um dos objetos atrai mais interesse e adiciona drama à trama. Efeito: O mágico abre a carteira. Retira uma foto de dentro e a deposita sobre a mesa, em seguida ele retira uma nota de dinheiro enrolada por um elástico e propõe uma aposta, uma chance de o espectador ganhar dinheiro, retira o elástico da nota e entrega estes dois objetos para o espectador (uma nota dobrada e o elástico), ele diz que independente das ações do espectador, na foto em que ele pôs sobre a mesa ele tem “um reflexo perfeito de suas escolhas”, ”caso a previsão não reflita as suas escolhas você pode ficar com o dinheiro” ele pede para que o espectador troque os objetos de uma mão para outra rapidamente e pare quando ele quiser. Independente de qual objeto estiver na mão esquerda ou direita a previsão estará sempre correta. Materiais 1 elastico,1 nota de dinheiro e 1 uma foto editada. Preparação A foto contém a imagem de um mágico (Apenas as mãos) emoldurada em um espelho (representando o reflexo) segurando dois objetos, um elástico em sua mão esquerda e o dinheiro em sua mão direita, abaixo de sua mão direita esta escrito “Dinheiro” e embaixo da sua mão esquerda está escrito “Elástico”. Abra a nota de dinheiro e escreva: “Obrigado por se deixar levar pelo meu poder de indução e deixar a nota em sua mão esquerda e o elástico em sua mão direita” Dobre a nota algumas vezes e a enrole com o elástico. Guarde tudo na sua carteira, e quando alguém te disser: “Você é MÀGICO? Faz uma mágica para mim???!!!” E você estiver sem o seu baralho, você já tem o que apresentar! Explicação O roteiro é muito importante para o sucesso deste efeito “Independente de suas ações aqui eu tenho um reflexo perfeito de suas escolhas”. Esta frase tem duplo sentido, já que em sua previsão você tem a imagem de um reflexo no espelho e como sabemos quando estamos na frente de um espelho nossa imagem fica invertida, ou seja, de acordo com a posição dos objetos, posso mostrar a foto de maneira diferente. Resultado 1: Se o dinheiro estiver na mão esquerda de seu espectador e o elástico estiver por consequência na mão direita, você apresentara a foto de frente para ele representando um espelho, ou seja, um reflexo perfeito. Para reforçar que isto não é apenas uma coincidência e que você tinha total certeza das escolhas de seu espectador você abre a nota de dinheiro e lê o que está escrito em seu interior “Obrigado por se deixar levar pelo meu poder de indução e deixar a nota em sua mão esquerda e o elástico em sua mão direita”. Resultado 2: Se o dinheiro estiver na mão direita de seu espectador e o elástico estiver por consequência na mão esquerda, você apresenta a foto ao lado do seu espectador e mostra que realmente na foto você está segurando o Dinheiro com a mão direita e o Elástico com a mão esquerda, e para salientar o fato de que não é apenas uma coincidência, você explica: “eu tinha tanta certeza de que você acabaria com o dinheiro na mão direita e o elástico na mão esquerda que eu não escolhi estes objetos por acaso”; então, você salienta o fato de que dinheiro começa com a letra D de “direita” e elástico começa com a letra “E” de esquerda, assim como está escrito na foto (As letras iniciais das palavras “Dinheiro” e “Elástico” tem coloração diferente para salientar isto). Creditos: Efeito inspirado no efeito “The Blocks of the Yogi” publicado no livro “Dunninger’s Complete Enciclopedia of Magic” de 1967. Dunninger usava dois blocos de madeira de cores diferentes, e um gimmick para identificar a posição dos blocos dentro do bolso esquerdo ou direito do espectador, outro efeito que provavelmente me influenciou no funcionamento da previsão foi o efeito “Rubik Predicted” de Mark Elsdon. OBS: Para receber o arquivo da foto editada, basta enviar um e-mail para: [email protected] com o assunto: Reflexo 2.0. 35 NA PONTA DOS DEDOS AVALIAMOS JUNHO A GUILHOTINA Emerson Rodrigues Automata por Gary Jones e Chris Congreave Revisado por Emerson Rodrigues bem criativo, o único problema é achar o tipo de alfinete que ele usa, que é uma espécie de alfinete tamanho jumbo. Free Phone: Uma versão bem bacana de Corbuzier’s Free Will,usando uma mensagem de texto no celular como previsão. A mensagem indica as escolhas do espectador entre 3 objetos. Poker cheat: O espectador dá as cartas, mas você sempre vence. Para quem gosta de números com o toma Poker é uma boa pedida e não requer habilidade. Titulo: Automata por Gary Jones e Chris Congreave Tipo: DVD Fabricado por: Full 52 Productions Lingua: Inglês Faixa de Preço:$22,40 (Dolares) Automata é um DVD com nove rotinas intituladas pelo texto de propaganda como “self-working” (Automáticas). Existem duas rotinas que no meu ponto de vista não se encaixam nesta premissa, mas isso não significa que sejam efeitos difíceis de se executar. Em sua maioria são efeitos de fácil execução e bem profissionais, este é um DVD feito com o Worker (mágico profissional) em mente. Conteúdo: Metal Sheep É uma transposição múltipla de moedas. Na verdade se trata de uma variação do clássico números das ovelhas, muitas vezes apresentado com bolinhas de papel, aqui ele é apresentado com moedas e com um gimmick que deixa o efeito mais limpo. Card 2 Matchbox: É uma versão de carta na caixinha de fósforos automática. Oprocesso de escolha é um pouco demorado, mas tudo é feito pelo espectador, no final duas cartas são somadas indicando assim a carta escolhida, o mágico então retira a varinha mágica (palito) de dentro da caixa de fósforo, pede para que o espectador bata com ele no baralho e depois novamente na caixinha, ele então abre a caixinha e revela a carta escolhida. Para apresentar de mesa em mesa eu aceleraria o processo de escolha, com um force comum e usaria apenas a aparição, que usa uma sutileza inteligente. Kingpins: Um anel preso dentro de um alfinete marcado, passa visualmente para o outro sem marca. O método é 36 Thirty Four: O melhor efeito do DVD na minha opinião. Quatro colunas de cartas numeradas de 01 a 16 são distribuídas na mesa, uma carta de cada coluna é escolhida colocando-se uma moeda sobre elas, no final a soma dos números escolhidos é a mesma do valor das moedas, além disso o mágico mostra que o valor já estava escrito dentro do envelope de onde foram retiradas as cartas,ele então mostra o outro lado das cartas eliminadas mostrando se tratar do nome de vários mágicos conhecidos, com exceção das 4 cartas escolhidas que tem o seu nome e o lugar aonde você está trabalhando, um efeito muito forte e com múltiplos clímaxes. Birthday Card: A carta escolhida é encontrada enquanto o espectador canta “Parabéns pra você”. Acredito que este efeito foi colocado no DVD apenas para preencher espaço. Princess Redux: É uma variação muito bacana do Clássico “Princess card trick” (aquele efeito que viralizou na internet aonde o espectador pensa em uma carta entre 5 e depois de misturada as cartas você vê apenas 4 e a sua está faltando). Você vai precisar de algumas cartas extras para montar este jogo, mas vale a pena. Fireballs: É uma rotina de Cups and Balls feita com copos de metal bem pequenos e bolinhas de flash papper,no final surge um pequeno load. O manuseio é bem básico e bem prático,o difícil é achar o tamanho certo dos copinhos por aqui,e para fazer de mesa em mesa acredito ser mais recomendável investir em um Chop Cup. A qualidade do DVD é boa, bem produzido e bem editado como a maioria dos produtos da Full 52. Contém performances ao vivo e em estúdio, todas as performances ao vivo foram realizadas para as mesmas pessoas uma dupla de moças simpáticas em um bar. Devem ter tido uma overdose de mágica naquele dia, mas reagiram bem naturalmente aos efeitos, eu gostaria de ver mais variedade entre os espectadores, mas nada que prejudique a qualidade das performances e das explicações ,que são bem claras e explicadas por Gary e Chris ao mesmo tempo. CAPA JUNHO A GUILHOTINA Tom Wright Stand Up Magic Revisado por Emerson Rodrigues Titulo: Tom Wright Stand up Magic Tipo: DVD Fabricado por: World Magic Shop Lingua: Inglês Faixa de Preço: $48,80 (Dolares) Ao contrário do que aparenta o título do DVD, não se trata de um DVD sobre Stand-Up Comedy e Mágica, ou sobre mágica em pé estilo salão, se trata sobre uma abordagem diferente e única de se fazer mágicas de mesa em mesa, o grande ponto de venda deste DVD é a filosofia de Tom sobre esta forma de apresentação. Ele dá uma palestra de 30 minutos falando diretamente com a câmera, ou seja, como se estivesse falando diretamente com você, sobre quais as vantagens de usar este método de apresentação. Na realidade não se trata apenas de um DVD e sim de dois. Um somente com as performances, realizadas em um Jantar e outro com as explicações realizadas em estúdio. As performances ao vivo são filmadas na integra, e depois ele as repete em estúdio antes de cada explicação, o que é bom, porque dá para apreciar a rotina de diferentes ângulos e ver como ela funciona com uma plateia de verdade. Como eu disse anteriormente o grande ponto de venda destes DVDs é esta maneira nova de se apresentar, pois os efeitos ensinados aqui são clássicos, ou seja não espere aprender efeitos novos neste DVD. O proveitoso deste DVD é ver como as rotinas foram construídas e como você pode adaptar o seu repertório a esta nova forma de se apresentar. Mesmo assim ele explica passo a passo 6 rotinas clássicas: Bottle Production: Produção de garrafa com um lenço e moeda, finalizando com a produção de um sapato, estilo o Tom Stone. A pequena sequência com a moeda no início da rotina ajuda a atrair a atenção dos espectadores, ele sempre usa esse efeito como número de abertura. Chop Cup Game Show: Uma das rotinas de Chop Cup mais divertidas que eu já vi,5 minutos de entretenimento e a apresentação que prende. Card from Mouth: Produção de cartas da boca, explicadas brevemente. Ele usa mais como uma gag do que como um efeito propriamente dito. Card in Mouth: Um manuseio diferente para a clássica carta na boca (dobrada em quatro) Bottle Penetration: É o efeito de atravessar a mesa com uma garrafa, achei um efeito bem ousado para ser apresentado de mesa em mesa, mas que funciona surpreendentemente bem usando este novo método de performance. Ring On Rope: É uma rotina bônus de várias fases utilizando uma corda e um aro (mais ou menos do tamanho de um mini aro chinês) O novo método de apresentação abordado neste DVD consiste em pedir para que os espectadores se levantem durante o tempo que você está se apresentando, parece simples, mas este simples ato, tem vários benefícios que são descritos em detalhe nos DVDs. Vale a pena tanto pelas rotinas como pelo workshop sobre “Stand Up Magic” 37 Split Second por Nicholas Lawrence Revisado por Emerson Rodrigues Titulo: Split Second por Nicholas Lawrence Tipo: Gimmick acompanha DVD Fabricado por: Sans Minds Lingua: Inglês Faixa de Preço: $29.95 (Dolares) O Trailer deste produto não é 100% verdadeiro, existem algumas imagens que levam o consumidor a crer que o efeito é mais limpo do que realmente é. Infelizmente a Sans Minds peca constantemente neste aspecto, em seus trailers, algo infelizmente desnecessário já que eles têm uma linha enorme de produtos de qualidade. Efeito: Uma única nota de dinheiro é retirada de sua carteira e em um giro ela se transforma em um maço de cartas. Metodos: No efeito principal (em que você retira uma única nota da carteira) o método não é dos melhores com relação a ângulos. O segundo método, em que a nota sai diretamente do seu bolso, é mais prático e garantido. Existe uma seção extra no DVD que explica como aplicar o gimmick em diferentes objetos, como por exemplo para transformar a nota em uma embalagem de chicletes. Você tem que fornecer, o seu baralho e a sua nota de dinheiro para construir o gimmick junto com os materiais fornecidos. Este efeito não funciona com todas as notas de Real, devido às variações nos tamanhos das notas Os materiais fornecidos são de boa qualidade e acredito terem uma boa durabilidade. O DVD é muito bem produzido, gravado em alta qualidade e profissionalmente editado como de costume nos produtos da SansMinds. 38 Envie-nos por email sugestões de produtos, livros e DVDs para avaliarmos: [email protected] EU FUI... ACONTECIMENTOS JUNHO A GUILHOTINA Henri Sardou O Dia em que não fui ver o Quique Marduk. Chovia, eu estava sem carro, e minha mulher tinha feito planos para essa noite, enfim…Não que eu tenha cagado para o evento, ao contrário, ia até fazer uma resenha para A Guilhotina, mas não deu. Quique Marduk, pela segunda vez veio ao Rio e eu não fui ver. Então resolvi escrever uma coluna sobre uma das muitas conferências que não vou, mas que me arrependo fortemente de não ter ido. Talvez muitos mágicos fiquem se perguntando como e onde obter informações e novidades para incorporar nos seus shows e resposta é bem simples: em livros, vídeos e, principalmente, conferências. Isso porque além de você estar aprendendo ao vivo ali com quem domina o assunto, você pode trocar experiências e interagir depois com quem viu também, o que é, além de saudável, desejável. É no mesão que rola depois que se discutem as coisas mais cabeludas de forma descontraída, é ou não é? Para quem nem sabe, Quique Marduk é um mágico argentino de meia idade, que durante os últimos 15 anos foi “só” o dono da loja que vende artigos de mágica mais importante da América do Sul: o “Bazar da Magia”. Além disso, as atividades profissionais de Marduk são shows para eventos empresariais, lançamentos de produtos e convenções, tanto no palco ou em close-up para recepções. Uma de suas especialidades é criar efeitos mágicos para empresas que usam logotipos de produtos ou material de merchandising. Durante oito anos, ele trabalhou para a Disney em shows ao vivo, realizando magica com efeitos especiais pirotécnicos indoor, criados especialmente para essas ocasiões. Seu show tem mágica, comédia e humor, além da participação da plateia, em números de pickpocket, uma de suas habilidades e a que lhe dá mais fama e notoriedade, inclusive. Pois é. Nada justifica você deixar um mestre da mágica passar pela sua cidade e fazer uma conferência na AMARJ por módicos R$30,00 e ficar indiferente. Isso é imperdoável. Ainda que não fosse uma conferência inédita, mesmo assim sempre se aprende uma coisa nova. É como a Filarmônica de Berlim, fazer um concerto aberto ao público de graça e você não ir...Ai talvez você nem saiba que teve e fique se lamentando agora que sabe que aconteceu. Não sei o que é pior. Não ir porque não deu ou não quis ou não ir porque não soube que ia ter. Não chega a ser esse o caso, mas também tenho uma certa preguiça de conferências que você tem que fazer força para saber onde vai ser, quando e quanto e quando fica sabendo bum, já passou. As artes geralmente são ruins, seu feed fica tomado por gatos e fotos de comida e você quase não vê, ou se vê não se interessa. Seu e-mail cheio de spam oferecendo produtos para aumento peniano, ou coisas mais prosaicas. Os produtores nesse ponto ainda dão muito mole na divulgação. Mas nada disso justifica, eu sei. E por isso vou me penitenciar assistindo uns vídeos do Dynamo no youtube. O que me consola, é que sempre tem um amigo disposto a mandar a nota de conferência inbox. Mas é isso aí, além de ser vacilo, já é papo para outra coluna... E eu mais uma vez não vi um dos mestres do pickpocket passar seus ensinamentos, vivencias e técnicas, numa conferência de uma hora e quinze minutos, incluindo vários números do seu repertório. Não vi suas dicas preciosas sobre pickpocket, nem sua visão em dividir os lados do espectador furtado em zona clara e zona escura para o lado da plateia e para o lado oposto à ela . Também não vi sua apresentação do saco do ovo do Malini, usado até hoje com muito sucesso, por alguns outros mágicos. Tampouco vi suas ideias para mentalismo corporativo, rotinas comerciais adaptadas para trabalho em empresas, etc. Nem mesmo vi sua versão de roleta russa. Até tinha motivos para não ter ido, mas não justifica. Henri Sardou é um mágico cara de pau, mas de madeira nobre. 39 ACONTECIMENTOS JUNHO A GUILHOTINA Por G. Massimo - Colaborou o Coletivo Guilhotina. RELOADED Após um longo recesso, voltamos a publicar Fakes, agora em forma de coluna, dentro da revista A Guilhotina. Mas isso não significa que estamos fora de forma, ao contrário. Voltamos mais afiados que nunca e com carta branca para guilhotinarmos ou laurearmos quem merecer. Prometemos isenção de imparcialidade nos relatos e alguns boatos... MÃO DE FERRO Depois do imbróglio envolvendo a troca da administração do grupo e um festival de banimentos decorrentes, o Mágicos Brasileiros, no Facebook, agora é comandado com firmeza por outro administrador. Ele tem se mostrado pouco tolerante aos temas polêmicos ou que envolvam discussão entre os membros. PEDIGREE Pepe Volkane, filho do Volkane, fez seu debùt na mágica, apresentando-se em público pela primeira vez no Programa Truques & Ilusões, do Karpes. Mostrou que é de pequeno que se torce o pepino e encarou uma participação ao vivo para todo o Brasil. O garoto tem futuro... MÁGICO IRRITANTE Foi aflitivo assistir ao vivo à participação do mágico Renner no programa Mais Você, mês passado. O apresentador André Marques estava irritado e não escondeu isso durante a performance do Renner. Somente no final deu o braço a torcer quando o mágico revelou a carta corretamente. Mas também Renner levou quase 9 minutos pra executar um Cardiographic, vai ver foi por isso… Aliás, Renner deve ser o mágico brasileiro que usa a maior taxa de gags kibadas por minuto. 40 Pepe Volkane, tadinho, foi flagrado num momento de tédio, após ouvir durante 27 minutos uma lista de aniversariantes no Programa Truques & Ilusões. SEM PASSAPORTE Dani DaOrtiz esteve em turnê pelo Brasil com seu workshop, mas não fez escala do Rio de Janeiro. Ainda bem, porque senão seria fácil descobrir o motivo do sumiço de seu passaporte. O artista teve que adiar sua volta por causa do imprevisto, mas tudo se resolveu bem no final. DESAFIO REVELADO Está desfeito o mistério envolvendo o desafio que o mágico Andrély alardeou na internet. Trata-se de uma série diária de videos inéditos com mágicas diferentes que serão postados ao longo de 365 dias. Projeto semelhante já foi executado pelo mágico canadense Eric Leclerc em 2011, com o nome de “Project 365”. Quem quiser acompanhar a versão brasileira do desafio deve se inscrever no seu canal no Youtube. Vamos ver o que de diferente vem por aí... MITOMAGIA Acabou de ser desmascarado mais um mágico mitômano - que tem compulsão por mentir. Formação em marketing, trabalho em cruzeiros no exterior e um currículo de dar inveja, foi tudo desmentido pela própria companheira do colega, que estava farta desse mundo de fantasias. SEM BRAZUCAS NA FISM? Foram divulgados os nomes dos concorrentes ao FISM 2015 e para surpresa geral não tinha nenhum brasileiro. Mas tudo não passou de um erro da produção, que legendou Gustavo Vierini e Caio Ferreira com sendo da Espanha. Erro corrigido, vamos torcer por eles! BIOGRAFADO EM VIDA Dia 23 de maio foi lançada, com direito a coquetel em Belo Horizonte, a biografia do mágico Kellys intitulada “SANGUE, SUOR & MÁGICA”. Escrito por sua filha, Kênia Colares, o livro é uma homenagem ao mágico, fabricante, dealer e mestre. Henri Vargas, Carlos Hilsdorf, Rick Thibau, Rubadel, dentre outros estiveram no evento prestigiando o lançamento, além de amigos e familiares. VAMOS VAIAR VAMOS APLAUDIR O novo spider ao contrário: a hipnose. Assim como foi com a ventriloquia e o pickpocket, a nova moda é o mágico inserir hipnose no show. Isso porque seria mais fácil demonstrar poderes via hipnotismo do que através do talento? Vamos acompanhar… G. Massimo já foi o segredo mais bem guardado da mágica brasileira... O Karpes que tem o programa sobre mágica mais longevo do Brasil, apresentado terças, às 21h, na TV Cinec. Karpes, aliás, está preparando também uma revista a ser lançada em breve... Envie sua opinião e sugestão de nota para [email protected] CRUZADAS JUNHO A GUILHOTINA 12 3 4 5 6 78 91 01 1 12 13 14 15 16 17 18 19 41 20 HORIZONTAIS VERTICAIS 3 - Único rei que não tem bigode no baralho. 5Forma de teatro popular que surgiu no século XV, na Itália, e se desenvolveu na França. 9Banda de hard rock dos Estados Unidos, formada por Gene Simmons. 11 - Any Card At Any Number. 15 - Palavra mágica usada pelo paranormal brasileiro Thomas Green Morton. 17 Nome completo de J.Peixoto. 18 Sobrenome do Penn, da dupla Penn & Teller. 19 "Sangue Suor e..." Título do livro sobre a carreira do mágico Kellys. 20 Mão usada por Renè Lavand. 1Capacidade de mover fisicamente objetos com a força psíquica. 2Problema no pulmão que levou Tommy Wonder a óbito. 4Artista Holandes que pintou o quadro "O Prestidigitador". 6Nacionalidade de Victor Voitko. 7Termo usado por Tamariz para a súbita e crescente percepção, por parte do espectador, do quão impossível é o efeito final de um número. 8Mágico canadense, naturalizado americano, que é famoso pelo ceticismo e desafio às alegações de paranormalidade. 10 Movimento artístico que surgiu na França no final do século XIX. 12 Um dos autores da música tema do filme "Missão Impossível". 13 Falso movimento usado para enganar ou distrair a atenção do espectador. 14 Sigla que denomina o Estado Islâmico da Síria e Iraque. 16 Nome do personagem que é mágico na série americana "Arrested Development". HUMOR 42 JUNHO A GUILHOTINA