Pró-Reitoria de Graduação Curso de Direito Trabalho de Conclusão de Curso O PRAZO PRESCRICIONAL NOS TRIBUTOS SUJEITOS A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO: A MANUTENÇÃO DA SEGURANÇA JURÍDICA EM FACE DO ADVENTO DA LEI COMPLEMENTAR N. 118/2005. Autora: Carla Caroline Ferreira Lima Orientador: Doutor Antônio de Moura Borges Brasília - DF 2010 CARLA CAROLINE FERREIRA LIMA O PRAZO PRESCRICIONAL NOS TRIBUTOS SUJEITOS A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO: A MANUTENÇÃO DA SEGURANÇA JURÍDICA EM FACE DO ADVENTO DA LEI COMPLEMENTAR N. 118/2005. Monografia apresentada no curso de graduação em Direito da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: Doutor Antônio de Moura Borges. Brasília 2010 FOLHA DE APROVAÇÃO À Deus, que me deste o dom da vida. À memória de Meyre Ferreira Lima, que viveu intensamente, plantou alegrias, colheu amor, passou pela vida e hoje está ao lado de Deus. Aos meus avós, que com a sabedoria que não se adquire na escola, me ensinaram a trilhar os melhores caminhos da vida. AGRADECIMENTO A produção de um trabalho de conclusão de curso é sempre uma etapa de intensa motivação para o qual colaboram, consciente ou inconscientemente, inúmeras pessoas. Por essa razão, ao chegar ao final desta jornada, devo prestar meus sinceros agradecimentos àqueles que me apoiaram e, mediante gestos, atitudes ou palavras, me banalizaram e motivaram minhas atuações ao longo dessa empreitada e de toda a graduação. Quero começar agradecendo à Deus por ter me dado, a cada dia, força para superar as minhas fraquezas, minhas angústias e tristezas, conseguindo ultrapassar mais uma fase nesta longa jornada. Agradeço, também, à minha família pela paciência, amor, críticas e pelo simples prazer eterno de tê-la como meu porto-seguro. Muitíssimo obrigada aos professores e funcionários da Universidade Católica de Brasília, que enaltecem os talentos de seus alunos e pregam a ética, os valores, a educação e a humilde para com o próximo e a nós mesmos. Dentre os profissionais que para sempre serão minhas referências, quero expressar um agradecimento muito especial ao saudoso Maurício Muriack, que com sua vasta sabedoria e inteligência me incentivou nos estudos, a seguir a carreira tributária e, principalmente, me agraciou com suas palavras de conforto e superação, sempre me valorizando. Gratidão àquele que escolhi para ser meu orientador: Antônio de Moura Borges, cujo apoio, paciência, humildade e dedicação fizeram-se sempre presentes e essenciais para a finalização deste trabalho. Ainda, quero agradecer aos ensinamentos imensuráveis dos meus queridos chefes Gleice, por sua doçura e simpatia que tanto me espelham, Tiago, por sua perseverança incessante, mesmo diante dos obstáculos e Rubens, pelas palavras, gestos, abraços, alegria incessante e bom-humor esplendido. Eternamente serei fiel aos seus exemplos de profissionalismo e relacionamento interpessoal. Um muito obrigada, de coração, às pessoas que tanto me viram chorar, que não se cansaram de me dizer para nunca desistir, que simplesmente me escutaram, que me suportaram, mesmo diante das minhas objeções, que estão ao meu lado, para o que for necessário. Ludi, Gi, Felipe, Ny, Edson, Carol, Sielto, Paulo, José, Débora, Elisa, Robson, Nat, carinho eterno à todos vocês. Devo agradecer, ao mesmo tempo, à minha amiga inseparável Keici, pela sua presença atuante no meu dia-a-dia, pelas ―revisões monográficas‖, pelo exemplo de vida. Amo-te! Aos colegas que nunca se esquecem de mim, Lu, Mel, Stefano e Alexandre. Saudades. Quero deixar aqui, também, um agradecimento especial ao meu amor eterno, que muito me fez sofrer, mas ainda mais me fez amadurecer. Mostrou-me que há coisas que somente o amor constrói; para estas, não há nada que possa destruí-las. RESUMO LIMA, Carla Caroline Ferreira. O prazo prescricional nos tributos sujeitos a lançamento por homologação: a manutenção da segurança jurídica em face do advento da Lei Complementar n. 118/2005. 2010. 103f. Trabalho de conclusão de curso (Graduação). Faculdade de Direito – Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2010. A presente pesquisa versa sobre a contagem do prazo prescricional nos tributos sujeitos a lançamento por homologação e a manutenção da segurança jurídica diante do advento da LC 118 de 2005, que alterou consolidado posicionamento jurisprudencial. Partindo-se da percepção de que as reiteradas decisões dos tribunais são provenientes do poder interpretativo conferido ao Poder Judiciário para melhor aplicar a lei ao caso em concreto, a exigência de retroação de lei divergente à jurisprudência dominante afigura-se totalmente contraditória à própria essência do princípio constitucional, qual seja: a preservação da segurança jurídica em face da coisa julgada e do direito adquirido. Já em relação aos objetivos específicos, o trabalho traz em perspectiva a dimensão da contagem da prescrição diante dos tributos lançados por homologação e o contrapõe ao que propõe a novel lei complementar 118 de 2005 relacionando com o que já dispunha a legislação tributária. E isso porque, se por um lado, o aparato legal configura a metodologia prescricional a partir de tal fato, constituindo-se determinado prazo, por outro, a inovação jurisprudencial pode gerar novas consequências, até mesmo em benefício aos contribuintes. Ao lado disso, também são abordados variados aspectos atinentes ao tema, tais como o interesse da Fazenda Pública na declaração da constitucionalidade do art. 4º da LC 118/2005, a sistemática das leis interpretativas no ordenamento jurídico e algumas decisões judiciais de caráter relevante. Palavras-chave: Tributo. Lançamento. Homologação. Prescrição. Pagamento indevido. LC 118/2005. Retroatividade. ―Cinco mais cinco‖. Segurança jurídica. ABSTRACT LIMA, Carla Caroline Ferreira. ―The statute of limitations on taxes subject to approval for release: the maintenance of legal certainty in the face of the advent of the Complementary Law 118/2005‖. 2010. 103f. Completion of course work (undergraduate). Faculty of Law Catholic University of Brasilia, Brasilia, 2010. This research is in the running of statute of limitations on taxes subject to approval by launching and maintenance of legal certainty before the advent of LC 118, 2005, which amended consolidated jurisprudential position. Based on the perception that the repeated decisions of the courts are from the interpretative power conferred upon the Judiciary to better apply the law to the particular case, the requirement for recall of the divergent case law ruling seems totally contradictory to the very essence of constitutional principle, namely, the preservation of legal certainty in the face of res judicata and granted. In relation to specific objectives, the work brings into perspective the size of the count before the prescription approval and tributes posted by contrasts to what the novel proposes a supplementary law 118 of 2005 related to what already had the tax laws. This is because, on one hand, the legal apparatus set up the methodology for the prescription from this fact, being given period, on the other, innovation can create new jurisprudential consequences, even for the benefit to taxpayers. Besides, are also addressed various aspects pertaining to the subject, such as the interest of the Treasury in the declaration of the constitutionality of art. 4º of LC 118/2005, the systematic interpretation of the laws on legal and judicial decisions of some relevant character. Keywords: Tribute. Release. Approval. Prescription. Overpayment. LC 118/2005. Retroactivity. "Five plus Five". Legal certainty. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................................... 10 2 RELAÇÃO JURÍDICA TRIBUTÁRIA .................................................................................... 15 2.1 NASCIMENTO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA ................................................................ 16 2.2 FATO GERADOR .................................................................................................................... 19 2.3 SUJEITO ATIVO E SUJEITO PASSIVO. ............................................................................... 22 2.4 CRÉDITO TRIBUTÁRIO E SUA CONSTITUIÇÃO PELO LANÇAMENTO. ...................... 26 2.4.1 Conceito de crédito tributário ...................................................................................... 27 2.4.2 A natureza do crédito tributário no CTN ................................................................... 28 2.4.2.1 2.4.3 O Lançamento Tributário ............................................................................................ 34 2.4.3.1 Atributos do lançamento tributário ............................................................................................40 2.4.3.2 Modalidades de lançamento .......................................................................................................43 2.4.3.3 Lançamento por homologação e legalidade do ato.....................................................................45 2.4.4 3 Exigibilidade do crédito tributário .............................................................................................33 Extinção do Crédito Tributário ................................................................................... 47 2.4.4.1 Decadência .................................................................................................................................49 2.4.4.2 Prescrição ...................................................................................................................................54 O ADVENTO DA LEI COMPLEMENTAR N. 118 DE 9 DE FEVEREIRO DE 2005......... 58 3.1 FINALIDADE DA LEI COMPLEMENTAR N. 118/2005....................................................... 58 3.2 LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA. ............................................................................................... 59 3.2.1 Direito Tributário e Constituição Federal. .................................................................. 59 3.2.2 A lei complementar no Sistema Tributário Nacional. ................................................ 60 3.3 AS LEIS INTERPRETATIVAS E O CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL .......................... 61 3.3.1 Retroatividade das chamadas leis interpretativas. ..................................................... 62 3.4 A LEI COMPLEMENTAR N. 118/2005 E A DENOMINAÇÃO COMO LEI INTERPRETATIVA..................................................................................................................................... 64 3.5 O ALCANCE DA LEI COMPLEMENTAR N. 118/2005. ....................................................... 67 4 A CONTAGEM DO PRAZO PRESCRICIONAL NOS TRIBUTOS LANÇADOS POR HOMOLOGAÇÃO E A LC N. 118/2005 .................................................................................................. 70 4.1 PAGAMENTO ANTECIPADO E LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO....................... 71 4.2 A DECADÊNCIA NOS TRIBUTOS LANÇADOS POR HOMOLOGAÇÃO ......................... 73 4.3 A PRESCRIÇÃO E OS TRIBUTOS LANÇADOS POR HOMOLOGAÇÃO.......................... 76 4.4 A TESE JURISPRUDENCIAL DOS ―CINCO MAIS CINCO‖ ................................................................. 79 4.4.1 Fundamentos da interpretação jurisprudencial. ........................................................ 81 4.4.2 A inovação no ordenamento jurídico pelo Superior Tribunal de Justiça ................. 83 4.5 OS ARTS. 3º E 4º DA LC N. 118/2005...................................................................................... 85 4.6 A MANUTENÇÃO DA SEGURANÇA JURÍDICA PERANTE O ADVENTO DA LC N. 118/2005 .............. 89 4.6.1 A segurança jurídica no texto da Constituição Federal de 1988 ............................... 90 4.6.2 Noções gerais sobre o princípio da segurança jurídica .............................................. 91 4.6.3 A segurança jurídica na tributação ............................................................................. 92 4.6.4 A repercussão da retroatividade do art. 3º da LC 118/2005 no princípio da segurança jurídica ...................................................................................................................................... 93 4.6.5 5 A manutenção da segurança jurídica nos julgados atuais ......................................... 95 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................................... 99 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................. 101 10 1 INTRODUÇÃO A Lei Complementar n. 118 de 09 de fevereiro de 2005 foi inserida no sistema jurídico brasileiro com a finalidade de proporcionar melhor interpretatividade aos dispositivos vigentes, com o escopo principal de adequar o Código Tributário Nacional (CTN) aos novos rumos da legislação falimentar. Por isso se dizer que constitui um importante instrumento legal posto à disposição da sociedade, vez que seu objetivo fundamental, além de ser a adequação da conjuntura legalista relevante ao interesse jurídico-social, é também o de constituir maior coerência entre os diplomas legais existentes. Destarte, com a inserção do referido instrumento normativo no sistema jurídico pátrio, restou alterada não somente a estrutura empresarial, mas seus reflexos se tornaram visíveis quando da tentativa de interpretação do art. 168, I do Código Tributário Nacional, por meio do art. 3º da referida lei complementar. Ora, a interpretação sugerida pela novel medida judicial tornou-se amplamente mais atuante, tornando frágeis os entendimentos jurisprudenciais até então aplicados em relação à cognominada tese sedimentada pelo Superior Tribunal de Justiça, que buscou padronizar a contagem do prazo prescricional nos tributos sujeitos ao lançamento por homologação. Dentre as alterações promovidas com a implantação da Lei Complementar 118/2005, merece destaque a sua natureza autointerpretativa, que planejou afastar qualquer mecanismo que lhe considerasse inválida, pondo, consequentemente, termo à denominada tese dos ―cinco mais cinco‖, a qual vincula todas as ações propostas no seio do debate da prescrição das ações de repetição de indébito tributário nos lançamentos por homologação que percorrem a esfera judicial do país. Neste sentido, é de se ver que o advento da Lei Complementar 118/2005 implicou na supressão de reiteradas decisões, prevendo, inclusive, a possibilidade de retroação de sua nova imposição aos fatos ocorridos anteriormente à sua edição, bem como rejeição total dos precedentes implantados pelos tribunais nacionais. No que diz respeito à possibilidade de aplicação retroativa de sua disposição, que se tornou concreta por meio da combinação do art. 3º com o art. 4º da mesma norma complementar, há de considerar que o princípio da irretroatividade tornou-se questionável, assim como o procedimento de solução das lides em comento restou fragilizado diante do enfraquecimento da proteção e segurança jurídicas às situações que já se encontram em curso, 11 podendo sofrer prejuízos em face da aplicação de novas medidas judiciais impostas pela lei complementar. A questão suscitada pelo presente trabalho diz respeito à aplicabilidade do art. 4º da Lei Complementar 118/2005, que editada com o fito de lei meramente interpretativa, veio a disciplinar acerca do disposto no art. 168 do Código Tributário Nacional. Ressalta-se que o presente objeto possui uma repercussão jurídica, social e econômica extremamente elevada, no entanto, há de convir que o debate não é extremamente complexo, mas a ausência de complexidade não retira a relevância da questão. Discute-se se o art. 3º da LC 118/2005 teria inovado no ordenamento jurídico. Contudo, é importante levar em consideração seu cunho interpretativo, já que se encontra respaldo no próprio diploma tributário, diga-se, no art. 106, viabilizando a retroatividade permitida por esse dispositivo e contestada por muitos especialistas. Cumpre a esta pesquisa, então, a investigação quanto à natureza interpretativa adotada por essa lei complementar ou se realmente ela tendeu a inovar no sistema da contagem do prazo prescricional nos tributos sujeitos ao lançamento por homologação. Diferente do que propõe a novel norma complementar, há muito já estava se assentando nas sessões de julgamento dos tribunais pátrios a cognominada tese jurisprudencial dos ―cinco mais cinco‖. De fato, como será bem demonstrada, a precedente tese se revelou um tanto quanto inovadora, mas há de convir que a mudança interpretativa do código tributário ensejou inúmeros benefícios aos contribuintes. É neste paradigma que surgirá o embate quanto à violação da segurança jurídica, que melhor será refletida em capítulo específico. O objetivo fundamental da nova lei que entrou em vigor no ano de 2005 é o de propiciar a melhor adequação dos enunciados tributaristas à realidade jurídica decorrente da contagem do prazo prescricional nas ações de repetição. Sendo assim, denota-se que a expectativa é no sentido de que realmente a lei complementar venha a interpretar dispositivo controverso, ensejando a permanência de soluções justas e benéficas para ambos os sujeitos da relação jurídica tributária, núcleo essencial da ocorrência do prazo prescricional. No que diz respeito especificamente à retroatividade da lei interpretativa, cumpre ressaltar que a esta não lhe foi vedada a retroatividade total ou absoluta, mas sim, impede que haja a retroação em afronta direta ao ato jurídico perfeito, à coisa julgada e ao direito adquirido. Será observado que não se trata de ato jurídico perfeito, uma vez que estão em discussão atos negociais; coisa julgada também não se caracteriza, já que não é este o alvo da respectiva lei; resta apenas uma possível incidência de direito adquirido. Questiona-se, 12 portanto, se existe direito adquirido para prazo prescricional em curso, ou se é esta a caracterização que se cogita à norma. Em primeiro lugar, a jurisprudência do excelso Superior Tribunal de Justiça já se encontrava consolidada quando o advento da LC 118/2005 tornou-se concreta, trazendo em seu bojo entendimento diverso do aplicado naquela corte. Secundariamente, indaga-se se as mudanças infiltradas no ordenamento jurídico poderiam atingir atos, ações e direitos anteriores à vigência da nova lei, transparecendo uma espécie de iniquidade do Poder Legislativo quanto à competência do Poder Judiciário, que lhe é garantido à interpretação das normas editadas. Isto é, de acordo com o novo diploma complementar, as ações em curso seriam compelidas a se obrigarem aos ditames da LC 118/2005, mesmo se promovidas antes desta data. Em assim sendo, o objeto de averiguação ora proposto adveio do contra-senso existente entre a retroatividade da lei interpretativa, especialmente quanto ao art. 3º da LC 118/2005, que apenas confirmou o que já discorria o Código Tributário Nacional e a segurança jurídica implementada pela consolidada tese do Superior Tribunal de Justiça (tese dos ―cinco mais cinco‖) que atendeu aos pedidos dos contribuintes. Tal percepção, por sua vez, consubstancia-se, principalmente, na contrariedade do objeto da LC 118/2005, qual seja: a possibilidade de reversão de benefícios ao Poder Público, caracterizado pela atuação do Fisco. De fato, a melhor justiça é aquela que tende à imparcialidade, merecendo, pois, gratificações a ambas as partes, no entanto, em se tratando de âmbito tributário e fiscal, não há o que se considerar como menos justo aos contribuintes, que protagonizam o núcleo da vulnerabilidade, diante do poder da máquina arrecadatória fiscal. Outro aspecto que detém demasiada significância e, ao mesmo tempo, corresponde a um dos fios condutores da presente pesquisa, se refere à consolidação da conhecida tese prescricional dos tributos lançados por homologação, tese dos dez anos. Isso porque, uma vez que o Superior Tribunal de Justiça acolheu este precedente, diversas controvérsias foram geradas, questionando a validade das decisões amparadas pela tese, bem como se a jurisprudência afastou amplamente os evidentes equívocos da norma. É relevante considerar o fato de que o contribuinte cumpridor das obrigações tributárias que pleiteia tributo recolhido pelo Fisco indevidamente foi satisfatoriamente protegido pela cognominada tese, devendo-se, por isso, se ter cuidado com a possível alteração que há por vir. Eis, então, que o objetivo central da pesquisa se concentra em evidenciar o contrasenso existente entre a possível retroatividade de tal inovação normativa em detrimento à 13 segurança jurídica implantada pelos julgadores. Já os objetivos específicos, por sua vez, consistem em apontar as possíveis contraposições existentes entre os mecanismos de interpretação da lei preexistente (CTN) em confronto com jurisprudência consolidada (tese dos dez anos); a inovação jurídica da tese dos ―cinco mais cinco‖, que, por sua vez, auxiliou os direitos fiscais dos contribuintes; os equívocos básicos cometidos pelo pretório tribunal; analisar as peculiaridades dos prazos prescricionais relativos aos tributos lançados por homologação e expor os mais atuais paradigmas implementados na corte nacional, inclusive a citação do Recurso Extraordinário nº. 566621/DF que se encontra em curso na Suprema Corte, por meio do qual será concretizada a solução jurídica à situação em tela. No que diz respeito à organização didática do capítulo inicial, ele está dividido em duas seções, cujas divisões internas se dão sob a forma de tópicos devidamente estruturados. Na primeira seção desse capítulo são abordados os aspectos atinentes à prospecção da relação jurídica tributária, bem como suas noções de ordem social e jurídica relacionadas à ocorrência do fato gerador e seus elementos. Já a segunda seção, por sua vez, trata da constituição do crédito tributário e sua concatenação com o lançamento tributário e suas diversas nuances, desde a consolidação deste crédito, até sua extinção, passando pelos vários atributos que interferem na concretização, principalmente por força do lançamento tributário. O capítulo II, por sua vez, gira em torno do advento da Lei Complementar n. 118 de fevereiro de 2005. De início, é feita uma consolidação geral acerca da legislação tributária e a interferência das leis interpretativas em seu bojo. Em um segundo momento, é apresentada uma análise mais técnica sobre os mecanismos da retroatividade em que se embasou a LC 118/2005 e como se manifestou sua repercussão jurídica, assim como o alcance em que chegou. Finalmente, o capítulo III consiste na reunião dos aspectos apresentados anteriormente, incluindo-se aí tópicos relacionados à contagem do prazo prescricional diante da peculiaridade dos tributos lançados por homologação e seu pagamento antecipado. No momento seguinte são apresentados, respectivamente, o impasse jurídico posto na balança entre a jurisprudência representada pela tese do STJ e a edição da lei complementar em comento, que até o momento não foi declarada qualquer inconstitucionalidade quanto ao art. 3º, permanecendo, por isso, vigente, e a manutenção da segurança jurídica em face dos embates ressaltados. Já no que diz respeito aos métodos do trabalho monográfico, há de considerá-los, em sua maioria, como resultantes de pesquisas do tipo bibliográfica, cuja apreciação adveio de obras dos mais renomados doutrinadores, tanto da seara tributária, quanto das esferas 14 constitucional e civil. Ao lado disso, também se fizeram presentes artigos, dissertações, textos referentes ao assunto e jurisprudências relacionadas, cujos respectivos acessos deram-se tanto por meio de revistas jurídicas, a exemplo da Revista Dialética de Direito Tributário, como por intermédio de estudos consolidados em sites eletrônicos. Quanto à relevância da pesquisa, saliente-se que uma vez desenvolvida, a tenderá a propiciar maiores esclarecimentos acerca do tema, bem como poderá levantar maiores questionamentos. E isso advém do fato de que a pesquisa procura dar um viés amplo ao que ainda está em debate, procurando respaldar-se na melhor solução, que ainda é pendente no mundo jurídico. Neste sentido, insta salientar a imprescindível utilização dos dispositivos legais à consecução da pesquisa, vez que é a partir do sistema normativo que advêm à dissonância de entendimentos, interpretações e considerações acerca da presente temática. Com efeito, a metodologia aplicada à pesquisa será pautada no positivismo. Finalmente, há de considerar que o método aplicado ao estudo corresponde ao método dedutivo. Razão pela qual os capítulos iniciais reúnem o arcabouço teórico essencial às hipóteses, de maneira que suas respectivas confirmações são conjuntamente enunciadas no capítulo final. 15 2 RELAÇÃO JURÍDICA TRIBUTÁRIA O ideal entendimento acerca da instrumentalidade e eficácia do lançamento tributário prescinde do entendimento sobre a origem da execução do ato e acerca das decorrências jurídicas que este instituto gera nas relações entre o contribuinte e o Estado, caracterizado pelos órgãos fracionários da Receita Federal e Estadual, comumente denominados Fisco. Para este processo introdutório tem-se a vinculação do advento da obrigação tributária, que materializa as relações tributaristas entre os sujeitos ativo e passivo, ultrapassando os ditames comuns que porventura revestem a palavra obrigação. A relação obrigacional esteve, por muito tempo, profundamente interligada à noção de força ou poder, que demonstrava sinônimo de justiça e direito perante a sociedade antiga. Os indivíduos que se destacavam em suas comunidades ou clãs, principalmente pelo cunho patrimonial que lhes eram atribuídos, demonstravam capacidade ímpar de impor suas necessidades e desejos perante os menos favorecidos, mesmo que estes possuíssem a razão de seu lado. Por isso, a relação obrigacional jamais respeitava a balança da justiça, tendendo a satisfazer o direito àquele que mais demonstrava poder. Considerando esta premissa é que Dória1 entende que nem sempre uma relação obrigacional é necessariamente uma relação de direito, reportando ao fato da relação tributária lembrar em muito esta interação de poder e força, que de um lado tem o Estado, ente constitucionalmente soberano, e do outro o contribuinte, indivíduo sujeito às imposições estatais. No complexo de atos e fatos jurídicos, a existência de uma relação jurídica, representada por um vínculo imaterial entre dois indivíduos - um caracterizado como o sujeito ativo, outro como sujeito passivo - pela qual se consubstancia a satisfação de um dever ou uma prestação exigível, racionaliza o conceito de obrigação, em sentido lato sensu e amplamente civilista. Neste sentido, colaciona-se memorável lição de Francesco Carnelutti ao atribuir ao instituto da obrigação conceito indiscutível pelo qual diz que ―a noção mais ampla e singela de relação jurídica é a de uma relação constituída pelo direito, entre dois sujeitos, com referência a um objeto‖ 2. 1 DÓRIA, Antônio Roberto Sampaio. Direito constitucional tributário e “due processo of law”. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1986. p. 2. 2 CARNELUTTI, 1955 apud JARDIM, Eduardo Marcial Ferreira. Manual de direito financeiro e tributário. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 251. 16 Eduardo Marcial Jardim, no segmento deste raciocínio, diz ainda que ―o dever é parte que se insere no todo denominado obrigação, ou relação jurídica, que, diga-se de passo, traduz uma das noções fundamentais do direito‖ 3. Percebe-se que a conceituação do termo ―obrigação‖ infere-se (e interfere) da interação social e jamais se escusa de adentrar na lógica da relação jurídica, pois a obrigação com efeitos legais será tratada como um integrante na ―comunicação‖ entre as pessoas, que são capazes de materializar seus direitos subjetivos, na finalidade precípua de cumprirem com uma prestação alheia. Desse modo, também defende Luiz Rosa Junior ao considerar que a natureza obrigacional não se limita a uma conjugação bilateral de interesses, mas transcende os reflexos jurídicos capazes de interferir nas atividades sociais, caracterizando indiscutivelmente uma relação de direito4. Portanto, haverão de conter a mesma estrutura basilar as obrigações de natureza civil, penal, comercial e/ou tributária, resplandecendo todas em um caráter genérico, frutos da integração dos indivíduos5. 2.1 NASCIMENTO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA A sistemática da relação jurídica, pela qual se origina a obrigação, tem supedâneos nos mais remotos estudos jurídicos romanos que, por séculos e séculos, transcenderam os conceitos vinculados à obrigação tributária. Ademais, remetia-nos o código de Justiniano6 à caracterização generalizada do tema, uma vez que o instituto da obrigação é um dos mais sedimentados na dogmática do direito. No mesmo patamar de raciocínio, nasce posicionamento defendido por Roque Carrazza, Patrícia Postigo, Paulo de Barros Carvalho, Eduardo Marcial Jardim e Luciano Amaro que enfatizam a unicidade do contexto legal de obrigação atentando-se ao fato de, independente do plano jurídico a que se refere, seja civil, penal, comercial ou tributário, a obrigação será contemplada de maneira única e igual para todos. Surge até mesmo a tese da 3 JARDIM, Eduardo Marcial Ferreira. Manual de direito financeiro e tributário. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 251. 4 ROSA JUNIOR, Luiz Emygdio F. da. Manual de direito financeiro e direito tributário. 18. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 486. 5 JARDIM, op.cit., p. 251. 6 CABANELLAS, 1955 apud JARDIM, Eduardo Marcial Ferreira. Manual de direito financeiro e tributário. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 250. 17 univocidade7. No entanto, há postura diversa desta entre outros doutrinadores, como Luiz Rosa Junior, Hugo de Brito Machado e Ricardo Lobo Torres, que preconizam que a obrigação tributária possui natureza singular, diferindo da obrigação civil, principalmente no que concerne à presença do Estado como sujeito da relação jurídica e pelo caráter público vinculado à situação. Pois bem, livrando do paradigma da dúvida intercorrente que surge ao questionar se existe uma ―obrigação tributária‖, tal fundamento tem-se por encerrado, uma vez que, ao estar inserida no campo do Direito Tributário, ramo de direito público, a relação jurídica entre contribuinte e Estado esbarra em uma prestação, imposta por lei e materializada por meio dos tributos, que porventura também constituirá o objeto da referida relação, configurando claramente uma interação com repercussões jurídicas. Neste sentido, veja-se ensinamento valioso difundido por Luiz Rosa Junior8: A relação jurídica entre o Estado e o contribuinte, no que se refere à imposição, cobrança, fiscalização e arrecadação dos tributos, enquadra-se no ramo do direito público. Tomando-se como base a classificação antes citada, devemos concluir que a relação jurídico-tributária que se instaura entre o Estado e o contribuinte é, sem sombra de dúvida, obrigacional pelas razões a serem enunciadas. No mesmo patamar de explicação, entende Harada9: A obrigação tributária é espécie do gênero obrigação jurídica. Entretanto, a obrigação tributária tem suas peculiaridades que lhe asseguram autonomia, tendo como causa, a lei e não a convergência de vontades, essencial na obrigação de natureza civil. A obrigação tributária é sempre ex lege. Hugo de Brito Machado, na discussão sobre o nascimento da obrigação tributária reflete que esta decorre da relação entre o Estado e os indivíduos10, que pela lei, estão sujeitos a uma tributação, vinculada para a manutenção do Poder Público e da sociedade. Ou seja, transparece a leitura anteriormente preconizada por Harada, ao associar a obrigação tributária a um fator puramente legal. No mesmo raciocínio, converge a professora e advogada Patrícia Postigo Varela ao afirmar que a obrigação tributária nasce da vontade da lei, mediante a ocorrência de um fato nela descrito11, remetendo ao enunciado do princípio da legalidade, exigido pela carta magna. O termo obrigação, que para Paulo de Barros Carvalho costuma ser utilizado com diversas denominações, representando o dever jurídico cometido ao sujeito passivo, no seio das relações de cunho econômico e até o próprio dever jurídico, nos ditames não7 JARDIM, Eduardo Marcial Ferreira. Manual de direito financeiro e tributário. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 250. 8 ROSA JUNIOR, Luiz Emygdio F. da. Manual de direito financeiro e direito tributário. 18. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 487. 9 HARADA, kiyoshi. Direito financeiro e tributário. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 479. 10 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 31.ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 128. 11 CANHADAS, Patrícia Postigo Varela. Saber direito: curso de espécies tributárias. [S. d.]. 18 obrigacionais12, versifica diferentes posicionamentos que, no entanto, nunca distanciam de um conceito comum: do vínculo jurídico pelo qual uma pessoa (sujeito ativo), com base na lei ou em contrato, pode exigir de outra ou de outros (sujeito passivo), o cumprimento de uma prestação possível, determinável e possuindo expressão econômica13. Mais além, completa Luiz Rosa Junior, em seu manual de direito tributário, que a obrigação poderá ser positiva ou negativa, dependendo da prestação a ser satisfeita, se pela prática ou omissão de um ato14. Ao finalizar exposições dos aspectos introdutórios da questão, veja-se que o nascimento da obrigação tributária respeita uma dinâmica jurídica que é contemplada pela instituição de cinco fases circunstanciais capazes de concretizar a procedimentalidade judicial e administrativa fiscal. Tais fases são embasadas na leitura pragmática da Constituição da República de 1988, pela qual instituiu o sistema tributário nacional vigente. Estas etapas se refletem na seguinte estrutura: surgimento da hipótese de incidência (H.I), que antecede a um fato gerador (F.G) capaz, posteriormente, de originar uma obrigação tributária (O.T). Desta obrigação provém a possibilidade de um lançamento (LANÇ.), que constituirá um crédito tributário (C.T), capaz de ser exigido e, se não restituído aos cofres públicos, será lançado na dívida ativa (D.A) para eventual execução fiscal (EXEC. F), a fim de se ver garantido o direito originado com a incidência da norma, registrada na primeira etapa. Tal ―esquematização‖ intensifica a conceituação da obrigação tributária, que pode ser entendida brilhantemente pelos dizeres de Harada15, quando em discussão da matéria: Pode-se definir a obrigação tributária como uma relação jurídica que decorre da lei descritiva do fato pelo qual o sujeito ativo (União, Estados, DF ou Municípios) impõe ao sujeito passivo (contribuinte ou responsável tributário) uma prestação consistente em pagamento de tributo ou penalidade pecuniária (art. 113, §1º, do CTN), ou prática ou abstenção de ato no interesse da arrecadação ou da fiscalização tributária (art. 113, §2º, do CTN). O Código Tributário Nacional se limitou apenas a classificar a obrigação tributária em principal e acessória e determinar sua origem, sem, contudo, dar-lhe conceituação prática, restando à doutrina interpretar e analisar sua repercussão, assim como exposto até o momento. Conclui o art. 113: Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória. §1º. A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente. 12 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1991. p. 193. ROSA JUNIOR, Luiz Emygdio F. da. Manual de direito financeiro e direito tributário. 18. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 488. 14 ROSA JUNIOR, op.cit. 15 HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 479. 13 19 §2º. A obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos. §3º. A obrigação acessória, pelo simples fato da sua inobservância, converte-se em obrigação principal relativamente a penalidade pecuniária. Portanto, é pacífico o entendimento de que a obrigação tributária decorre de um dever do contribuinte de pagar o tributo, uma vez que ela é o perfeito acoplamento do fato real à hipótese tributária prevista na lei16. 2.2 FATO GERADOR Ao discorrer sobre a natureza jurídica da obrigação é permitido desvendar, por consequência, o cerne da origem do vínculo obrigacional tributário, que para tanto será a partir da ocorrência do fato, que especificamente no Direito Tributário denomina-se fato gerador. Este ―marco‖ remete a outrem um dever e um direito, o que caracteriza perfeitamente a relação jurídica capaz de constituir a obrigação tributária.17 De maneira mais consubstanciada, Ricardo Lobo Torres explica que o fato gerador é a ―circunstância da vida‖ 18 que porventura dará nascimento à obrigação tributária. Nas palavras de Hugo de Brito Machado Segundo, toda obrigação decorre de um fato gerador, que simplesmente é a incidência de uma norma sobre um fato19. Neste sentido é a análise do art. 113, § 1º, do Código Tributário Nacional, já transcrito em momento oportuno. É de se considerar que a legislação tributária brasileira adotou a nomenclatura ―fato gerador‖ para caracterizar a situação de fato ou situação jurídica que, acontecendo, determina a incidência do tributo. Luiz Rosa Junior adota esta mesma tese do CTN, uma vez que confirma que o momento em que ocorre o fato gerador é aquele mesmo em que se concretiza a obrigação tributária.20 O ―fato jurídico‖ poderá ser proveniente de qualquer aspecto, inclusive da ocorrência de morte, uma vez que repercutirá significamente nas relações tributárias, a partir da cobrança do imposto causa mortis, de ato jurídico strictu sensu, no 16 Cf. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1991. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 31.ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 128. 18 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 12.ed. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar, 2005. p. 241. 19 MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Direito Tributário e Financeiro. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2009.( Série Leituras Jurídicas. Vol. 24). p. 71. 20 ROSA JUNIOR, Luiz Emygdio F. da. Manual de Direito Financeiro e Direito Tributário. 18. ed. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar, 2005. p. 498. 17 20 tocante às transformações dos interesses de vontades e a partir de uma situação jurídica que decorra de um complexo de direitos e deveres.21 Para outros estudiosos, o termo ―fato gerador‖ ora aparece como hipótese de incidência, ora como suporte fático, fato tributável, situação de fato, fato imponível, ou fato jurígeno22. A doutrina, como de Hugo de Brito Machado, abarca diversas colocações para o termo, sem contanto, retirar desta, o conceito representativo fornecido pelo CTN. A definição relacionada ao fato gerador se perfaz na situação abstrata, descrita na lei, a qual, uma vez ocorrida concretamente, incorre no surgimento da obrigação tributária. Harada intensifica o estudo, ao dizer que o fato gerador se consubstancia em dois planos, o abstrato e o da concretização, vez que aquele se refere à norma descritiva do ato ou fato, e este à exteriorização do ato.23 A lição de Celso Ribeiro Bastos24 nos leva a assimilar que a obrigação tributária e seus efeitos não surgirão somente com a descrição livre da lei. É imprescindível que ocorra materialmente o ato ou o fato descrito, assim como a atuação de qualquer indivíduo. Esta ocorrência caracteriza o núcleo do fato gerador e compreensão de seus diversos aspectos (subjetivo, espacial, temporal, quantitativo). O art. 114 do Código Tributário Nacional fornece a caracterização do fato gerador a partir de um elemento objetivo, visto que expõe a situação detalhada em lei como necessária e suficiente para a ocorrência da obrigação tributária principal.25 Contudo, em decorrência das diversas lacunas presentes na legislação brasileira, fruto de um processo legislativo deficitário, o CTN se tornou alvo de discussões doutrinárias quando o assunto é a ocorrência do fato gerador, especialmente após a análise do art. 116. Diz o referido dispositivo26: Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos: I - tratando-se de situação de fato, desde o momento em que se verifiquem as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos que normalmente lhe são próprios; II – tratando-se da situação jurídica, desde o momento em que esteja definitivamente constituída, nos termos de direito aplicável. 21 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 12.ed. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar, 2005. p. 241. 22 ROSA JUNIOR, Luiz Emygdio F. da. Manual de Direito Financeiro e Direito Tributário. 18. ed. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar, 2005. p. 498. 23 HARADA, kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 480. 24 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Financeiro e de Direito Tributário. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p.194. 25 BASTOS, op.cit.,. p.194/195. 26 BASTOS, op.cit.,. p.195. 21 Didaticamente, a doutrina divide os fatos geradores em instantâneos e complexivos, se enquadrando na primeira classificação os elementos componentes do fato gerador que se extinguem no instante de sua ocorrência e, na segunda hipótese, o fato gerador que estiver relacionado a um aspecto duradouro e periódico.27 Percebe-se que o código tributarista se refere ao fato gerador apenas no sentido de ser uma situação de fato ou jurídica. Neste sentido, o especialista28 intervém explanação apropriada ao referido artigo: Quanto ao art. 116, tanto a situação de fato como a situação jurídica, na verdade, representam a necessidade de ocorrência do fato gerador. O art. 114 é que equaciona a polêmica provocada pelo art. 116. Este está vinculado ao disposto no art. 105 o CTN, que faz menção a um fato gerador pendente. Mas, embora a legislação que lhe seja própria é aquela do momento da sua ocorrência, a obrigação tributária desse fato só acontecerá nos termos em que a lei determinar. Esta é a razão pela qual a situação de fato é aquela sobre a qual incidirá necessariamente uma situação jurídica, a lei aplicável. Não há fato ao qual o Direito não seja aplicável. O art. 116 é uma reprodução sofisticada do art. 114, que em última análise poderia ser assim resumido: o que a lei ordinária definir em conformidade com a lei complementar sem violar a Constituição é a imposição tributária. Ainda, sob o mesmo olhar crítico do dispositivo supracitado, dispõe Paulo de Barros Carvalho29: Da forma como prescreveu (o art. 116), parece até admitir que existam conjunturas de fato, disciplinadas pelo direito, mas que, mesmo assim, não podem ser consideradas situações jurídicas. É de ciência certa a afirmação de que uma circunstância de fato, prevista em norma do direito positivo, será sempre um fato jurídico, quer em sentido lasso, quer em acepção estrita, pois consiste num acontecimento, em virtude do qual as relações de direito nascem e se extinguem, no conceito de Clóvis Beviláquia. E não nos deparamos, ainda, com a discordância de qualquer autor, no que respeita a esse ensinamento. Sobre ele há absoluta unanimidade. (...) Nem por isso, contudo, é de ser desprezado o conteúdo do dispositivo que criticamos. Aquilo que se depreende das palavras da lei é que ficou estabelecida a diferença entre duas situações jurídicas: a) uma não categorizada como instituto jurídico; b) outra, representada por entidade que o direito já houvera definido e prestigiado, sendo possível atribuir-lhe regime jurídico específico. Os primeiros, meros fatos jurídicos; os demais, atos ou negócios jurídicos. Para Celso Bastos, o legislador deixou de rever a redação do artigo em questão a partir do momento que foi editada a Lei Complementar n. 104/01, que acrescentou ao art. 116 do Código Tributário o parágrafo único, estabelecendo que ―a autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária‖. 30 Portanto, o fato gerador, devidamente previsto em lei, caracterizado juridicamente e com efeitos contínuos no espaço de direitos e deveres, é condição sine a quo non para a 27 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Financeiro e de Direito Tributário. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p.195. 28 BASTOS, op.cit.,. p.195. 29 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 158. 30 BRASIL. Código Tributário Nacional. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. art. 116. 22 existência da obrigação tributária, que deve respeitar os princípios da legalidade, da capacidade contributiva e dos direitos fundamentais.31 2.3 SUJEITO ATIVO E SUJEITO PASSIVO. Nesta relação obrigacional do Direito Tributário surge para tanto as figuras dos sujeitos ativo e passivo. São eles elementos subjetivos do fato gerador, de caráter pessoal e constitutivo do negócio jurídico realizado. Considera-se sujeito ativo da obrigação tributária a pessoa jurídica de direito público dotada de competência para exigir seu cumprimento (CTN, art. 119). Machado Segundo32 explica que as pessoas jurídicas de direito público são consideradas polo ativo da obrigação em virtude da competência legislativa proporcionada pela Carta Magna de 88, pela qual estes entes podem criar e editar a lei tributária e os tributos. Contudo, o legislador não se limitou a especificar quais pessoas de direito público poderiam ser sujeitos ativos da relação obrigacional. Por isso, o sujeito ativo pode vir a ser uma autarquia ou qualquer outra pessoa de direito público, uma vez que a competência tributária pode ser delegada, tornando tais pessoas capazes de se enquadrarem como elementos da obrigação tributária no polo ativo. Já para as pessoas de direito privado, não há o que se falar de titularidade para a cobrança dos tributos, uma vez que para estas foi somente garantida a transferência governamental de recursos públicos a fim de beneficiá-las. Desta feita, sindicatos, confederações de empresários e demais entidades caracterizam sujeitos beneficiários do sistema tributário e meramente intervenientes financeiros. O art. 120 do Código Tributário Nacional expande a capacidade tributária ativa para a aquela pessoa jurídica de direito público oriunda de desmembramento ou integração com outra. Ocorrendo este fato, os direitos e deveres da relação obrigacional tributária serão subrogados ao ―novo‖ ente público, até que legislação tributária própria seja promulgada. Para toda relação jurídica regular, tem-se a figura do sujeito passivo. Na relação tributária, o sujeito passivo é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária. Neste sentido, se atentar para o que dispõe o art. 121 do CTN. 31 32 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 12.ed. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar, 2005. p. 242. MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Direito Tributário e Financeiro. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2009. (Série Leituras Jurídicas. Vol. 24). p. 77. 23 Veja-se que em nenhum momento foi caracterizada a personalidade ideal pela qual deve haver a obrigação ao pagamento de um tributo. O Código Tributário não se ateve a formar um grupo específico ou a limitar quem integraria o polo passivo da obrigação. Para tanto, anota-se comentário de Machado Segundo33: Considerando que a obrigação tributária é compulsória, ou seja, seu surgimento independe da vontade das partes, a capacidade tributária passiva independe da capacidade civil das pessoas naturais. Independe, também, de achar-se a pessoa natural sujeita a medidas que importem privação ou limitação do exercício de atividades civis, comerciais ou profissionais, ou da administração direta de seus bens ou negócios. Afinal, como a vontade é irrelevante para o surgimento da obrigação, a eventual impossibilidade de o sujeito passivo exprimir validamente sua vontade não terá reflexos na questão de saber se o tributo é devido, ou não. (E ainda, quanto à irregularidade e possível sujeição ao tributo) Pela mesma razão, quando o sujeito passivo é uma pessoa jurídica, sua capacidade tributária independe de estar ela regularmente constituída, nos termos do Direito Privado, bastando que configure uma unidade econômica ou profissional. A configuração do sujeito passivo pode se desenvolver por meio de três figuras obrigacionais: contribuinte, responsável tributário e substituto tributário. Aquele que, em regra, realiza o fato gerador da obrigação tributária principal enquadra-se na situação de ―contribuinte‖. O ―contribuinte‖ possui uma relação pessoal e direta com a hipótese de incidência do tributo34. Hugo de Brito35 exemplifica brilhantemente tal situação quando menciona o caso do ICMS ao dizer que é contribuinte ―quem promove a circulação de mercadorias‖, ou ainda, usando o imposto de renda (IR), ao caracterizar como contribuinte aquele que ―adquire a disponibilidade jurídica ou econômica sobre rendimentos‖. Ainda que presentes outros sujeitos da obrigação tributária, cumpre destacar que o contribuinte pode ser de fato ou contribuinte de direito, a depender da maneira como este participa da relação jurídica obrigacional. Contribuinte de direito é aquele que realiza e simultaneamente executa o fato gerador do tributo e, por consequência, fica vinculado ao pagamento deste. O débito e a responsabilidade são inerentes do contribuinte de direito. De outro modo, o contribuinte de fato é a pessoa que recebe a carga tributária passivamente, mas não participa de modo efetivo da relação tributária, nem atua no fato gerador. Este tipo de sujeito passivo é muito comum nos chamados impostos indiretos (ICMS). Quando o assunto é responsabilidade tributária, surge para tanto a figura do responsável tributário. Responsabilidade, para fins tributários, é a ―submissão de determinada 33 MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Direito Tributário e Financeiro. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2009. (Série Leituras Jurídicas. Vol. 24). p. 78. 34 BRASIL. Código Tributário Nacional. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. Art. 121, parágrafo único. 35 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 31.ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 138. 24 pessoa, em virtude de disposição legal expressa, contribuinte ou não, vinculada ao fato gerador, ao direito do fisco de exigir a prestação da obrigação tributária‖. 36 Portanto, distinguindo do contribuinte, o responsável tributário é aquele que, embora realize o fato gerador, não participa diretamente da relação jurídica oriunda da hipótese de incidência do tributo, mas a ela se interliga37 tornando-se, por isso, parte do polo passivo da obrigação tributária. A autorização legislativa para a existência do responsável tributário encontra respaldo na norma jurídica, uma vez que é possibilitada através do enunciado que regula que a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação.38 Hugo de Brito Machado Segundo adverte que um terceiro, não-contribuinte, somente pode ser legalmente definido como sujeito passivo, na condição de responsável tributário quando vinculado ao fator gerador da respectiva obrigação. Isto em razão do princípio da capacidade contributiva e da regulamentação expressa do Código Tributário.39 A responsabilidade tributária, por sua amplitude e espécies de incidência, foi tratada pelo CTN de forma subdivida, para que se tornasse mais facilitada os indícios de irregularidades e melhor fiscalização por parte da Receita Federal. Ademais, encontra-se adequadamente dividida a responsabilidade tributária, a fim de satisfazer as hipóteses fiscais, bem como as que porventura vierem a interferir no ramo falimentar. Ricardo Lobo Torres sustenta que a classificação dos responsáveis tributários está amplamente relacionada no art. 128 do CTN, mas assevera que tal relação ainda encontra algumas incoerências.40 De antemão, os responsáveis tributários podem ser subsidiários ou solidários (sucessores e terceiros) ou substitutos, como tratado em tópico específico. O Código Tributário, em seu art. 134, disciplina a razões de se ter um responsável subsidiário. Surge tal expectativa quando a exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte não é satisfeita, devendo, portanto, um terceiro assumir a responsabilidade, 36 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 26.ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 159. TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 12.ed. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar, 2005. p. 261. 38 BRASIL. Código Tributário Nacional. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.Art. 128. 39 MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Direito Tributário e Financeiro. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2009. (Série Leituras Jurídicas. Vol. 24) p. 82. 40 TORRES, op.cit.,. p. 261. 37 25 se colocando no mesmo patamar do contribuinte – não no seu lugar – divergindo neste ponto da substituição. Na solidariedade, a responsabilidade tributária é atestada juntamente com a do contribuinte, desde a ocorrência do fato gerador. Assim, o responsável ocupa exatamente a mesma posição que o contribuinte na relação obrigacional, seja no que tange ao caráter de direito ou processual. Esta responsabilidade desenvolvida pelo art. 135 do CTN se refere à solidariedade ab initio.41 Cabe ressaltar que as hipóteses elencadas nos artigos citados do CTN, quanto aos responsáveis tributários, tratam de transferência de responsabilidade apenas no que tange ao pagamento do tributo e das multas de mora. Os terceiros não podem responder pelas multas decorrentes do descumprimento de obrigações acessórias ou pela prática de outros tipos de infração, em respeito ao princípio da pessoalidade das punições e sanções administrativas prevista na Constituição de 88, especificamente no art. 5º, XLV. 42 O CTN, em seu art. 128, aborda figura do substituo tributário quando diz que a ―lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte‖. Ricardo Lobo Torres,43 remete o substituto tributário a uma disposição de lei, que lhe assegura o lugar antes ocupado pelo contribuinte. Argumenta ainda que a distinção precípua entre os dois sujeitos passivos é que o ―contribuinte realiza o fato gerador da obrigação tributária, enquanto o substituto realiza o fato gerador da substituição prevista em lei‖. Anteriormente, mencionaram-se outros sujeitos passivos, com características similares, mas, ao mesmo, com aspectos únicos de cada um. Não podia ser diferente com o substituto tributário: é sujeito passivo tributário, autônomo, mas componente da relação obrigacional. Não é alheio aos processos econômicos e financeiros, possuindo, desde então, nexo entre as atividades deste e as do contribuinte. Não se enquadram a sua responsabilidade apenas as obrigações principais, mas, também, as acessórias. O vínculo existente entre o substituto e o substituído não tem caráter tributário, ou seja, é plenamente possível a propositura de uma ação regressiva contra o substituído para reaver a importância dos tributos devidos. A lógica para toda esta sistemática encontra 41 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 12.ed. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar, 2005. p. 268. 42 MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Direito Tributário e Financeiro. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2009. (Série Leituras Jurídicas. Vol. 24) p. 88. 43 TORRES, op.cit.,. p. 262. 26 respaldo na busca pelo equilíbrio financeiro da substituição, não se limitando somente à natureza tributária do fato. A substituição é adaptável a qualquer imposto44. Geralmente, suas maiores incidências estão no imposto de renda (IR), quando presente a retenção na fonte do tributo, no imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISS) e no imposto sobre circulação de mercadorias e serviços (ICMS) (Lei Complementar nº. 87, de 13.9.96), que merece em trabalho futuro maior detalhamento, em virtude de sua riqueza doutrinária e divergências jurisprudenciais no que se refere aos contribuintes de fato e de direito, bem como na substituição ―para trás‖ e ―para frente‖. Paulo de Barros Carvalho explica que mesmo sendo a obrigação tributária uma ―relação jurídica de conteúdo patrimonial‖ instaurada a partir da concretização do fato de incidência, onde se tem um sujeito ativo com direito subjetivo de exigir uma prestação pecuniária e um sujeito passivo capaz de cumpri-la,45 em diversas situações, porém, embora ocorrido o fato gerador, a lei tributária não requer do sujeito passivo nenhuma atuação (pagamento) se e enquanto não houver, por parte do sujeito ativo, a prática de outro específico ato jurídico. Esta é também a visão de Luciano Amaro ao se deleitar no assunto46. No raciocínio de Becker, nesses casos, não obstante se tenha o nascimento da obrigação tributária, com a realização do fato gerador, o indivíduo só será compelível ao pagamento do tributo pertinente se (e partir de quando) o sujeito ativo efetivar o ato formal previsto em lei, para a determinação do valor do tributo, dele notificando o sujeito passivo. Tal assertiva é primordial pelo fato de, antes da consecução desta atividade, embora nascida a obrigação tributária, a exigibilidade não estar consubstanciada nela.47 2.4 CRÉDITO TRIBUTÁRIO E SUA CONSTITUIÇÃO PELO LANÇAMENTO. Ao dinamizar a relação obrigacional tributária, pela qual o sujeito ativo detém um direito subjetivo, invoca-se a necessidade da instrumentalização de um objeto a ser cobrado ou ser passível de cumprimento. Para esta instrumentalização dá-se o nome de crédito. Na lógica da relação tributária, que é o atual objeto de estudo, o crédito é caracterizado como o 44 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 12.ed. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar, 2005. p. 263. 45 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 429/430. 46 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 359. 47 BECKER, 1972 apud AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 359-360. 27 pedido, certo, determinado e lícito, pelo qual os sujeitos envolvidos na relação tributária estarão vinculados. Concretizados a descrição da hipótese de incidência, a ocorrência do fato gerador e nascida a obrigação tributária, a relação obrigacional é completada pela atividade do lançamento, capaz de originar uma prestação líquida e passível de cobrança. Nesta prestação configura-se o chamado crédito tributário. 2.4.1 Conceito de crédito tributário Paulo de Barros Carvalho expõe que o crédito tributário não passa de um objeto capaz de ser exigido pelo credor.48 Neste mesmo raciocínio, critica a conceituação do Código Tributário Nacional no que tange a dissociação de obrigação e crédito tributários em razão da mesma concepção de vínculo, nexo e sujeitos.49 No mesmo posicionamento está Hugo de Brito Machado Segundo quando discorre que o CTN não abordou com exatidão a divisão entre obrigação e crédito tributários, visto que um este ocorre em proveniência daquele, mas não necessariamente de forma contínua, uma vez que nem sempre na presença de uma obrigação o crédito será constituído.50 Para tanto, o conceito difundido por Paulo de Barros Carvalho define que o crédito tributário ―é o direito subjetivo de que é portador o sujeito ativo de uma obrigação tributária e que lhe permite exigir o objeto prestacional, representado por uma importância em dinheiro‖51. Hugo de Brito Machado, por sua vez, entende que crédito tributário ―é o vínculo jurídico, de natureza obrigacional, por força do qual o Estado pode exigir do particular, o contribuinte ou responsável, o pagamento do tributo ou da penalidade pecuniária (objeto)‖ 52. Na mesma perspectiva, dispõe Sacha Calmon Navarro sobre a constituição do crédito tributário como objeto da obrigação principal. Assevera que o crédito tributário é proveniente da interpretação do Cód. Tributário Nacional, quando dispõe da necessidade da prestação pecuniária em uma relação obrigacional e, por isso, a esta prestação, para fins fiscais, denomina-se crédito tributário.53 48 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p.430. CARVALHO, op.cit.,. p.430. 50 MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Direito tributário e financeiro. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2009. (Série Leituras Jurídicas. v. 24). p. 72. 51 CARVALHO, op.cit.,. p. 430. 52 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 31.ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 181. 53 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p.749. 49 28 Celso Ribeiro Bastos54 intensifica que o crédito tributário é ―o direito subjetivo de que é portador o sujeito ativo de uma obrigação tributária e que lhe permite exigir do sujeito passivo o seu objeto‖. De antemão, Ricardo Lobo Torres tem como pensamento que a razão para a existência do crédito tributário é proveniente do nascimento da obrigação tributária, confundindo, a partir de então, seus conceitos. Veja-se que, para o autor, ambos estão situados no mesmo aspecto jurídico – o vínculo obrigacional – fazendo, portanto, que crédito e obrigação tributária tenham a mesma essência denominativa. 55 Em congruência com o estudo de Lobo, Eduardo Jardim também assimila que o crédito tributário é a ―prestação pecuniária de índole tributária‖ 56 que ―exsurge no exato lapso temporal em que nasce a obrigação tributária‖, não podendo ser de outra maneira, em vista da investidura do sujeito ativo para a exigência do crédito. Em conclusão terminológica ideal para o perfeito entendimento acerca da matéria debatida, Harada apregoa que o crédito tributário é a conversão da obrigação tributária, que se apresenta de forma ilíquida e incerta, em exigível no prazo estatuído na legislação tributária, ou seja, é a confirmação da obrigação tributária principal pelo lançamento.57 Transpassadas estas questões de natureza semântica e conceitual, o que se verifica é que muito há para se discutir a cerca da propriedade da natureza do crédito tributário. Haja vista o CTN discorrer sobre o assunto, doutrinariamente a exata acepção da natureza aqui colocada ainda não gerou pacificação, merecendo, portanto, melhor esclarecimento quanto ao tema, a partir da leitura sistemática da legislação tributária. 2.4.2 A natureza do crédito tributário no CTN À vista da extrema utilidade acadêmica e utilitária da análise e compreensão do paradigma originado com a edição do art. 139 da Lei n. 5.172/66, Código Tributário Nacional, revelou-se imprescindível o aprimoramento dos artifícios interpretativos para o alcance da superação a cerca da natureza do crédito tributário. Para tanto, não obstante as diversas 54 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Financeiro e de Direito Tributário. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p.206. 55 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 12.ed. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar, 2005. p. 237. 56 JARDIM, Eduardo Marcial Ferreira. Manual de Direito Financeiro e Tributário. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 296. 57 HARADA, kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 495. 29 tentativas de pesquisa e discussões na seara tributária, tal objetivo ainda não foi realizado. Contudo, a incessante busca e o aperfeiçoamento da questão somente ganham argumentações, cada vez mais volutas e consistentes pelos seus propulsores. Adiante, o art. 139 dispõe que a existência do crédito tributário decorre de determinada obrigação principal e tem a mesma natureza desta.58 Em seguida, surge com o art. 142 do CTN59, o núcleo da problemática do lapso temporal inicial para a constituição do crédito. Colaciona-se: Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo o caso, propor a aplicação da penalidade cabível. Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional. A perfeita compreensão destes dispositivos não é medida atingida, pois se percebe quão dogmático foi o legislador ao sustentá-los. Esta definição é de clara incoerência em face das mais variadas argumentações já disseminadas pelos mais brilhantes tributaristas. A demonstração lógica e fática do nascedouro do crédito tributário precisa ter como alicerce um fundamento consistente e menos paradigmático, capaz de dar sustentabilidade jurídica às diversas controvérsias geradas pelos diálogos entre advogados, juízes, promotores, analistas e acadêmicos. Inicialmente, incumbe destacar a existência de duas teses fundamentadas a partir do diploma legislativo, especificamente no Título III, arts. 139 a 193. Estas teses estão bem demonstradas na obra de Ricardo Lobo60, que dispõe de um raciocínio amplo e diversificado quanto ao tema. Uma tese define que o crédito tributário se origina no momento em que dissemina o vínculo obrigacional, não podendo, desde então, ser postulado por estar ausente sua característica de liquidez. Em contrapartida, uma tese diversa apresenta que o crédito tributário é separado da obrigação tributária em função do fator temporal, uma vez que esta é fruto da capacidade legislativa do Estado e aquele é gerado em decorrência desta, posteriormente, mas relacionado com o procedimento administrativo de praticar certos atos. 58 BRASIL. Código Tributário Nacional. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. Art. 139. BRASIL. op.cit.,. Art. 142. 60 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 12.ed. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar, 2005. p. 206. 59 30 Pois bem, de fato, ambas as teses possuem sistemática convencionada em parâmetros razoáveis, tornando os argumentos louváveis de discussão. Lobo61 já remetia tais convergências. Senão, veja o que expõe: a) O crédito tributário nasce juntamente com a obrigação tributária, sendo de diminuta importância o fato de vir ele indeterminado ou ilíquido. Decorre citada coincidência da própria natureza do vínculo obrigacional. b) O crédito tributário nasce com o lançamento - ou com a notificação deste ao contribuinte -, sendo indispensável a declaração de sua existência, de seu montante e da identificação do obrigado pelo prazo legal. [grifo nosso]. Pois bem, o que Lobo pretende explicitar é que determinada corrente prevê o nascimento do crédito tributário simultaneamente com a obrigação tributária, visto que sua consolidação imediata é irrelevante, não deixando de considerar sua visibilidade; outra corrente destoa deste vislumbramento pelo fato de caracterizar o crédito como proveniência do ato administrativo de lançamento, que a partir desta, realmente proporcionará os efeitos jurídicos relevantes. Em consonância com tal paradoxo, Eduardo Jardim enfatiza que não poderia ser de outra forma a insurgência do lapso temporal coincidente entre o crédito tributário e a obrigação, ―porquanto é por meio da obrigação que a Fazenda Pública, ou quem lhe fizer às vezes, fica investida do direito subjetivo de exigir do sujeito passivo uma prestação, representada pelo crédito tributário‖. E conclui: ―por conseguinte, ao contrário do quanto apregoa o Código, o crédito tributário é imanente à obrigação e, por isso, com ela nasce, subsiste e se extingue. Simultaneamente, é lógico; nem antes nem depois.‖ 62 Paulo de Barros Carvalho, ao se pronunciar sobre os problemas semânticos do art. 142 do CTN, adiciona que a circunstância controversa do dispositivo - crédito e obrigação recebendo tratamentos diversificados – reflete irretratável insensatez jurídica, uma vez que não é possível separar o nascimento da obrigação – fato gerador – da constituição do crédito tributário, pois acarreta ―afronta à integridade lógica da relação jurídica‖ aqui discutida.63 Luciano Amaro64, em incontestável sintonia de argumentos, explica como o CTN incorreu no mar de contradições ao tratar do crédito tributário. Para isto, analise sua didática: O Código Tributário Nacional reconheceu que a obrigação tributária nasce com a ocorrência do fato gerador, afirmando o art. 114 que o fato gerador é a condição não apenas necessária, mas também suficiente para o nascimento da obrigação tributária, consoante o ar. 113, §1º, onde se proclama que a obrigação tributária surge com a ocorrência do fato gerador e tem por objeto o pagamento de tributo, vale dizer, a 61 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 12.ed. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar, 2005. p. 207. 62 JARDIM, Eduardo Marcial Ferreira. Manual de Direito Financeiro e Tributário. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 296. 63 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 440. 64 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 364. 31 satisfação do crédito atribuído ao pólo ativo dessa mesma obrigação. Coerentemente, o art. 144 estatui que o lançamento se reporta à data do fato gerador e se rege pela lei então vigente. Porém, é o mesmo Código que confere ao lançamento a virtude de dar nascimento ao crédito tributário (art. 142). É óbvio que isso não pode permitir a afirmação de que, na ―mera‖ obrigação tributária (nascida com a ocorrência do fato gerador), não haja crédito e correspondente débito, sem o que de obrigação não haveria sequer a silhueta. (...) Por outro lado, se o Código pretende que o crédito tributário só se constitua com o lançamento (art. 142), por que teria afirmado que esse crédito tributário é uma decorrência da obrigação tributária (art. 139), que dá origem ao crédito (art. 140), em vez de atestar que ele é uma decorrência do lançamento, e que este é que lhe daria origem? Amaro não é o único tributarista a interrogar a situação dogmática estabelecida pelo Código Tributário. Sacha Calmon65 reflete além, mas não se distancia do posicionamento exposto anteriormente. Para o advogado, não há procedência no tratamento conferido pelo CTN sobre o assunto, uma vez que a obrigação é instituto viabilizador do objeto pecuniário, que é denominado crédito. Enfatiza que a obrigação tributária é mero fator instrumentalista. Desta feita, entende que o crédito tributário é inerente da relação obrigacional, caracterizado especificamente como algo mensurável e necessário para o efetivo vinculum juris. Segue, também, esta linha de raciocínio o professor Hugo de Brito Segundo. O que se visualiza claramente na redação do referido diploma, sem qualquer margem de contestação ou divergência doutrinária, é a autonomia concedida para os institutos da relação tributária, já que a própria Lei n. 5.172/66, art. 140, confere ao crédito tributário tratamento independente dos efeitos da obrigação tributária. Concluindo este levantamento a partir da análise do artigo, Roberval Rocha e João Gomes asseveram que ―o crédito tributário passa a ter vida própria, distinta da obrigação tributária, não confundindo seus conceitos, mas lhes dando mesma natureza.66 Esta problemática quanto à similaridade conceitual do crédito tributário com a denominação de obrigação tributária avança para outro patamar ainda mais tormentoso na seara acadêmica e doutrinária: o momento ideal da constituição do crédito tributário. Assim como as teorias obrigacionais, são defendidas pela doutrina atual duas vertentes relacionadas à questão: a que argumenta que ―a constituição definitiva se perfaz na data da notificação regular do sujeito passivo do lançamento efetuado‖, outra sustentando que o ato se aperfeiçoa 65 66 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p.749 FERREIRA FILHO, Roberval Rocha; SILVA JÚNIOR, João Gomes da. Direito Tributário: Teoria, jurisprudência e questões. Edições Podivm, 2007. p. 266. 32 ―ao final do prazo de notificação ou, ainda, caso o contribuinte impugne o lançamento, ao final do contencioso administrativo.‖ 67 Luciano Amaro, Paulo de Barros Carvalho, Ruy Barbosa Nogueira apoiam a vertente da constituição do crédito tributário a partir do lançamento regulamente notificado e afastam, por consequência, a existência de um ―lançamento provisório‖ antecedente do lançamento definitivo, uma vez que o crédito tributário decorre de um ato administrativo formal e definitivo. Os tribunais não se dirimiam de tomar o mesmo caminho dos tributaristas supracitados, já que as decisões reiteradas dos colegiados se baseavam nesta corrente. Neste sentido, observa-se orientação do antigo TFR: Súmula 153: Constituído no quinquênio através de auto de infração ou notificação de lançamento, o crédito tributário, não há falar em decadência, fluindo, a partir daí, em princípio, o prazo prescricional, que, todavia, fica suspenso, até que sejam decididos os recursos administrativos [grifo nosso]. Em sentido contrário, há o posicionamento de Sacha Calmon Navarro, Hugo de Brito Machado, José Eduardo Soares e Leandro Paulsen que se prendem à ideia que traduz que o crédito tributário é constituído a partir da data do fim do julgamento definitivo das impugnações impeditivas de exigibilidade perante os órgãos fiscais administrativos. Para esta vertente, a jurisprudência68 também já se manifestou em diversas sessões, mas ainda mais pragmática, revelando inferências diretas e indiretas. Senão, colaciona-se: [...] 2. À luz do art. 174, caput, do CTN, firmou-se o entendimento de que a constituição definitiva do crédito tributário, quando impugnado via administrativa, ocorre com a notificação do contribuinte do resultado final do recurso, e somente a partir daí começa a fluir o prazo prescricional de cinco anos para a cobrança o referido crédito [...]. Em seguida, julgamento remetido de forma indireta69: Antes da constituição definitiva do crédito tributário, não há justa causa para início d ação penal relativa aos crimes contra a ordem tributária (art. 1º da lei 8.137/1990). Precedente do Plenário do Supremo Tribunal Federal (HC 81.611. Rel. Min. Sepúlveda Pertence. DJ 13. 05.2005). A substituição, por novos lançamentos dos autos de infração anulados por vício formal não convalida a ação penal ajuizada antes do lançamento definitivo, porquanto a constituição do crédito tributário projeta um novo quadro fático e jurídico para o oferecimento da denúncia. Durante a pendência do curso do prazo prescricional (art. 111, I, Cód. Penal). Ordem de habeas-corpus concedida, para trancamento da ação penal, sem prejuízo do oferecimento de nova denúncia, com base em crédito tributário definitivamente constituído. 67 FERREIRA FILHO, Roberval Rocha; SILVA JÚNIOR, João Gomes da. Direito Tributário – Teoria, jurisprudência e questões. Edições Podivm, 2007. p. 266. 68 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp. 468139/RS. 2ª Turma. Relator Min. João Octávio de Noronha. Julgamento 27.06.2006. DJ 03.08.2006. 69 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 84345/PR. 2ª Turma. Relator Min. Joaquim Barbosa. Julgamento 20.03.2006. DJ 24.03.06. 33 Essas consolidações, ainda sim causam divergências no âmbito dos tribunais, principalmente os de cunho superior, o que não comporta aprofundamento nesta presente pesquisa diante do objeto de estudo visado, merecendo, pois, análise consubstanciada em momento oportuno. No mais, se atentar ao seguinte precedente: STJ. REsp 435.896/SP. Rel. Min. Eliana Calmon. Julgamento em 05.06.03. 2ª T; Informativo STJ nº. 175. 2.4.2.1 Exigibilidade do crédito tributário Ainda tomando como base os ensinamentos de Roberval Rocha e João Gomes70, a nascitura da obrigação tributária e o vínculo jurídico que relaciona o fisco com o contribuinte não são, por si só, garantias de exigibilidade. Este fator é decorrente da viabilidade de efetivação do lançamento tributário, que, nos conformes da análise do CTN, é ato que constitui o crédito tributário. O crédito aqui citado que sugere a exigibilidade, podendo transpor, portanto, a concretização da relação tributária. Nesta matéria, depreende estudos da doutrina71 dominante: São pré-requisitos para a existência do crédito tributário sua previsão em lei, a ocorrência do fato gerador e, posteriormente, o lançamento tributário. O crédito se torna exigível após o decurso do prazo para pagamento do tributo lançado. E só se torna exequível se, não tendo sido adimplido, ocorrer a sua inscrição na dívida ativa. Desta feita, na natureza da constituição do crédito tributário são encontrados três aspectos essenciais para sua eficácia jurídica:72 existência, submetendo à lei combinada ao fato gerador e atividade de lançamento; exigibilidade, que remete à existência, decurso in albis do prazo de pagamento; e exequibilidade, decorrência da exigibilidade e consequência da inscrição em dívida ativa. Há, entretanto, exceção a esta ordem didática quando se tratar, por exemplo, de ―tributo não lançado‖, a despeito do disposto no art. 151 do CTN. A própria jurisprudência se consolidou neste posicionamento73. Atente-se: Lançamento. Homologação. Decadência. [...] A suspensão da exigibilidade do crédito tributário na via judicial impede o fisco de praticar qualquer ato contra o contribuinte visando a cobrança de seu crédito, tais como inscrição em dívida, execução e penhora, mas não impossibilita a Fazenda de proceder à regular 70 FERREIRA FILHO, Roberval Rocha; SILVA JÚNIOR, João Gomes da. Direito Tributário: Teoria, jurisprudência e questões. Edições Podivm, 2007. p. 269. 71 FERREIRA FILHO, op.cit.,. p. 269. 72 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 31.ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 141. 73 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. EREsp. 572.603/PR. 1ª Seção. Relator Min. Castro Meira. Julgamento em 08.06.05. Informativo STJ nº. 250. 34 constituição do crédito tributário para prevenir decadência do direito de lançar. A seção, ao prosseguir o julgamento, conheceu dos embargos e deu-lhes provimento. Na sequência do raciocínio, Cassone confirma que a constituição do crédito tributário se perfaz com o lançamento, que acarretará no pressuposto de exigibilidade necessário para eventual ação executiva fiscal. Para tanto, assevera que a exigibilidade está convencionada ao procedimento administrativo que converte a obrigação tributária em crédito, capaz de gerar um objeto líquido ou ilíquido e, que, porventura, se efetuado o pagamento, extinguirá a obrigação.74 O tratamento oferecido pelo CTN ao crédito tributário causa inquietações perante a maior parte dos estudiosos em virtude de sua incoerência semântica, ora distinguindo obrigação de crédito tributário, ora distanciando a sua constituição da exigibilidade. A tentativa de a legislação infraconstitucional suportar as lacunas originadas restou frustrada, principalmente no que tange ao princípio da indisponibilidade do interesse público, que rege as noções gerais de tributo. Não é propriamente o ato administrativo de lançar que confere à obrigação tributária a exigibilidade de seu objeto (crédito tributário), pois este já possui os atributos inerentes da obrigação jurídica no instante da formação da relação.75 Diante de tais considerações controversas e de unânime crítica doutrinária, percebe-se que o crédito tributário é somente um objeto viabilizador do ato administrativo de lançamento, instituto essencial para efetivação da relação jurídica tributária, que desde já é núcleo de discussão do tema central deste trabalho. 2.4.3 O Lançamento Tributário Após as considerações expostas anteriormente, restou consolidado que a legislação tributária divide sua relação jurídica entre principal e acessória e já colaciona a eventual extinção do crédito que dela decorre. Meso diante de inconsistências legislativa, não há o que se falar em distinção entre uma e outra, muito menos entre o crédito que futuramente poderá se consubstanciar. Há a delimitação necessária para o melhor aperfeiçoamento da completa situação jurídica aqui discutida. Como medida inicialmente necessária para o entendimento do instituto do lançamento é viável a explanação sobre a caracterização do ato administrativo, já que o CTN confere ao 74 CASSONE, Vittorio. Direito Tributário: Fundamentos constitucionais da tributação, definição de tributos e suas espécies, conceito e classificação dos impostos, doutrina, prática e jurisprudência. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 180. 75 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 368. 35 lançamento tributário natureza administrativa. Muitos são os conceitos estabelecidos pela doutrina, tendo como algumas referências Maria Sylvia Zanella, Celso Antônio Bandeira de Mello, Diógenes Gasparini e Hely Lopes Meirelles. Para a autora Daiane Maria Oliveira Viana, o ato administrativo não passa de uma manifestação do Estado, ou daquele (s) que faz (em) às vezes deste, e aqui se pode incluir o particular, no exercício de suas atribuições e competências estabelecidas em lei. A configuração do ato administrativo é proveniente da criação, modificação ou extinção de direitos, podendo se manifestar de maneira tácita ou expressa, sendo passível de controle pelo Poder Judiciário.76 Em sua essência, o ato administrativo lato sensu obedece a determinados critérios estruturais, que se divergem na doutrina, mas que muitas vezes não são ousados a confrontálos, caracterizados como sujeito, que é aquele que compete exercer a função ou atividade atribuída pela lei; forma, sendo a manifestação externa do ato; objeto, que constitui o elemento e conteúdo inserido no ato administrativo; motivo, sendo a causalidade da prática do ato e, por fim, finalidade, que é a circunstância que justifica aquele ato administrativo. Daiane Viana enfatiza, para este último critério, que a finalidade precípua de qualquer ato da Administração Pública ou de quem lhe faça às vezes é a satisfação do bem comum e do interesse coletivo.77 Partindo para a análise especificamente do lançamento tributário, observa-se que muitos são os conceitos originados, criando discussões acadêmicas a cerca do que realmente o lançamento busca atingir, assim como a visível dicotomia da natureza jurídica deste instituto: ora o lançamento tributário é tratado como um ato administrativo, como defendido por Paulo de Barros Carvalho, ora como um procedimento administrativo, considerado por Ruy Barbosa Nogueira.78 Para sanar esta questão é necessária que seja levada em consideração a existência das modalidades do plano fático e do ato-norma, muito bem delimitadas pelo doutrinador Eurico de Santi, que defende que o lançamento pode ser considerado em suas duas facetas, dependendo do que se pretende discutir, se é o fato e a constituição do crédito ou sua aplicação normativa e as penalidades cabíveis. Neste sentido, há de contraponto o posicionamento de Jozélia Nogueira Broliani, que afirma que o lançamento repercutirá 76 VIANA, Daiane Maria Oliveira. Lançamento por homologação e extinção do crédito tributário. Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 96, v. 860, jun. 2007. p. 19-20. 77 Ibid., p. 21-22. 78 Ibid., p. 22-23. 36 simultaneamente como ato-norma e no plano fático, sendo o primeiro, meio para a configuração do segundo.79 O que se aproveita conclusivamente é que o lançamento pode configurar-se tanto como ato, quanto como procedimento administrativo, pois o lançamento tributário é composto de ações preparatórias a fim de atingir a mensuração do quantum e a existência da obrigação tributária, bem como de normas orientadoras e interpretativas dos ditames legais necessários para a determinação do devido sujeito ativo e passivo do tributo, assim como da correta aplicação das penalidades, caso haja. O mais viável, no entanto, para a explanação do assunto, é a caracterização do lançamento tributário como um ato administrativo, assim defendido por Viana.80 Partindo do pressuposto de que lançamento tributário é ato administrativo, conforme ensinamento de Paulo de Barros Carvalho81, este é assim caracterizado por possuir os elementos principais de estruturação do ato administrativo. É considerado ato simples, por ser emitido por um único órgão, sem a dependência de qualquer outro ente público; é constitutivo, por constituir situações jurídicas a partir da modificação, criação ou extinção de situações pretéritas; e por fim, é ato vinculado, pois deve respeitar orientações legais preestabelecidas pela normatização federal, estadual ou municipal, sem qualquer possibilidade de discricionariedade para sua execução.82 A delimitação do lançamento como figura administrativa é corroborada pela distinção de seu objeto, do fato jurídico, da forma e competência. Como objeto, tem-se que este é a inserção no ordenamento jurídico da incidência da regra matriz; como fato jurídico observa-se a motivação pelo qual o lançamento está sendo realizado e a causa de sua designação; em relação à forma, o lançamento tributário obedece a diretrizes próprias, sendo imprescindível a delimitação do sujeito ativo e passivo, se houver, da base de cálculo e as alíquotas devidas; por fim, quanto à competência, respeita-se o princípio da legalidade, devendo, portanto, ser o ente ou sujeito competente aquele designado pela lei.83 A partir desta constatação, à atuação do sujeito ativo (credor) dá-se o nome de lançamento. Luciano Amaro nos permite verificar que uma dissociação temporal entre o momento do nascimento do direito do sujeito ativo da obrigação tributária (com a ocorrência 79 VIANA, Daiane Maria Oliveira. Lançamento por homologação e extinção do crédito tributário. Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 96, v. 860, jun. 2007. p. 23-24. 80 Ibid., p. 24. 81 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 440. 82 VIANA, op.cit., p. 24. 83 Ibid., p. 25. 37 do fato gerador) e o momento em que a obrigação se torna exigível (com a prática do ato de lançamento, e sua comunicação formal ao devedor) decorre do preceito legal que, em determinadas situações, prevê o lançamento como ato a ser necessariamente praticado, após a realização do fato gerador, para que se tenha a exigibilidade da obrigação tributária. Esta explanação confirma tese difundida por maior parte da doutrina no que se refere à base principal do ato de lançamento.84 No entanto, ressalvando sua própria colocação, Luciano Amaro remete ao fato desta dissociação não estar contida em todas as relações obrigacionais aqui discutidas. Sabe-se que existem tributos cuja legislação lhe confere um pagamento ao sujeito passivo independentemente da atividade de lançamento pela Administração Tributária. Veja-se que, presente o fato gerador, a apuração do valor (montante) e seu devido recolhimento se concretizam sem a prática de qualquer atuação do sujeito ativo, ficando tal montante condicionado à verificação posterior.85 O lançamento não se reduz ao simples cálculo do tributo. Mesmo que diversos níveis de complexidade se formem no que respeita às operações necessárias à determinação do valor da obrigação tributária, Amaro dispõe que o lançamento ultrapassa as atividades contábeis e de auditoria exercidas reiteradamente.86 Ademais, entre as fundamentações acerca da natureza jurídica do ato administrativo, em precioso detalhamento, Hugo de Brito Machado Segundo retoma a mensagem do art. 113, do CTN para explicar as facetas da obrigação tributária: a principal é proveniente do pagamento pecuniário, da entrega por meio de dinheiro; já a obrigação acessória é a obrigação de fazer, não - fazer, tolerar ou aceitar ato capaz de satisfazer o objeto do fato gerador.87 Logo, o caráter definidor de ambos é o patrimonial: a obrigação principal envolve patrimônio e a acessória, não. Quanto à natureza jurídica do lançamento tributário é importante salientar que a doutrina não é unânime. Muitos especialistas divergem se a natureza é declaratória ou constitutiva. Mas como posicionamento dominante, o lançamento se vincula ao estado de declaratória, pois não cabe a este instituto a constituição de direitos de forma originária, mas apenas como um instrumento de aplicação dos preceitos gerais de tributação. A conclusão 84 BECKER, 1972 apud. AMARO, Luciano Direito tributário brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 360. 85 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 360. 86 Ibid., p. 361. 87 MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Direito tributário e financeiro. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2009. (Série Leituras Jurídicas, v. 24). p. 71. 38 desta natureza se perfaz no que tange à finalidade do lançamento tributário, que permite a certificação de uma obrigação legal e a autorização de atuação administrativa. O Código Tributário Nacional, a este respeito, adota essencialmente a natureza declaratória do lançamento, principalmente no que tange à obrigação, já que analisando as atribuições do crédito tributário, a este é conferido o aspecto constitutivo. Neste sentido, expõe o CTN, em seu art. 142: Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível. (grifo nosso) Não obstante a característica predominantemente declaratória do lançamento verificase para tanto a necessidade de conferir destaque para a terminativa legal, já que para o CTN não existe crédito sem o processamento anterior do lançamento. Da mesma forma se posicionou a Turma do Superior Tribunal de Justiça, pelo qual consolidou que ―o crédito tributário não surge com o fato gerador. Ele é constituído com o lançamento‖ (1.ª T., REsp 250.306/DF, Rel. Min. Garcia Vieira, j. 06.06.2000, DJU 01.08.2000, p. 208). A circunstância de a legislação ter criado o lançamento como ato de cuja realização depende a atuação de certos direitos do sujeito ativo fez com que a doutrina se estendesse em termináveis discussões sobre a natureza do lançamento, sustentando uns que ele é de caráter constitutivo (da obrigação tributária) e afirmando outros que ele tem natureza meramente declaratória. Não falta, ainda, o posicionamento que firme um meio termo entre ambas as posições, como o escolhido por Luciano Amaro.88 A autoridade administrativa, em razão de inúmeras competências privativas que lhe são atribuídas, é a responsável por viabilizar a constituição do crédito tributário, que se perfaz por meio do ato de lançamento, de acordo com legislação tributária vigente anteriormente ressaltada89. A intenção difundida pelo art. 142 do Cód. Tributário Nacional a cerca do lançamento tributário e sua característica constitutiva avoca impropriedades. Doutrinadores como Hugo de Brito Machado e Paulo de Barros Carvalho revelam que o CTN não teve a felicidade de conceituar o termo, uma vez que nem sempre o montante devido do tributo deverá ser calculado, já que existem os tributos com valores fixos, bem como não há o que se falar em 88 89 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 1972. p. 362. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 31.ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 182. 39 mera proposição da penalidade cabível, visto que cabe a autoridade competente a devida aplicação da pena quando vislumbrar necessária.90 Ao se tentar buscar a apropriada caracterização do ato de lançamento, Hugo de Brito91 Machado destaca que a definição provocada pela legislação tributária atual acarreta incoerências, não devendo o art. 142 ser interpretado em sua forma literal. A partir do momento que a autoridade administrativa fiscal possui a competência privativa para praticar o lançamento e assim constituir o crédito tributário, cabe a ela a aplicação eficaz da penalidade cabível, quando necessária. Este procedimento que torna possível o cálculo do montante do crédito tributário. Complementando seu raciocínio, entende Hugo de Brito que ―sem que esteja aplicada a penalidade não é possível determinar o montante do crédito tributário de cuja constituição se cogita, porque a penalidade pecuniária integra esse montante‖.92 Pode-se constatar, entretanto, que o referido dispositivo, ao se manifestar sobre o lançamento tributário, tende a ser claro quanto a sua expressiva atribuição de ato inerente da administração fazendária, mesmo carecendo de relacionar suas características inerentes declaratória e constitutiva. Sobre esta afirmação se pronunciou o Ministro aposentado Moreira Alves, do STF, em conferência93 realizada em São Paulo. Acolham-se seus argumentos: [...] O lançamento é um elemento que não ocorre no direito privado, porque neste, quando as obrigações nascem ilíquidas, se aplica o art. 1553 do CCB: ―se fixará por arbitramento a liquidação.‖. Permite ao Estado tornar líquido o que é ilíquido, coisa que o particular não pode fazer. Alberto Xavier diz que o lançamento é ato de criação de título jurídico abstrato. E perguntamos: o que é título jurídico abstrato? É o título jurídico adjacente ao fato gerador. Se abstratamente considerado, chegaria-se à conclusão absurda: o título se abstrai do negócio subjacente, e passa a ter vida própria, isto é, o substrato seria inatacável, e isto não é verdade, porque nos Embargos à execução fiscal toda e qualquer matéria é atacada, tanto formal como material, porque o título é dotado apenas de presunção juris tantum. Assim, entende que o lançamento não cria, não modifica nem extingue a obrigação, tendo natureza declaratória e constitutiva. É constitutivo, porque individualiza essa situação, delineando-a concretamente. Se o órgão não lançar, será punido. Não cabe falar em punição para o Estado. O lançamento não é ato indispensável em todos os tributos [...]. Em virtude dessas colocações, o direito tributário brasileiro prefere se respaldar em uma natureza jurídica mista para o lançamento, natureza esta que já se apoia Ricardo Alexandre94, na acentuação de que o ato de lançar qualquer tributo é constituidor do crédito 90 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 31.ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 182. MACHADO, op.cit. 92 MACHADO, op.cit. 93 SIMPÓSIO NACIONAL DE DIREITO TRIBUTÁRIO, VII, out. 1982, CEU/SP. Relatório. In: Caderno de Pesquisas Tributárias. São Paulo: RT, n. 8, 1983. p. 408-413. 94 ALEXANDRE, Ricardo. Direito tributário esquematizado. 4. ed. São Paulo: Método, 2010. p. 366. 91 40 tributário e declaratório da obrigação respectiva95, esclarecendo, pois, as demasiadas invocações controversas a cerca da problemática do conceito jurídico de lançamento. Não obstante renomados estudiosos defenderem argumentos fortes do lado oposto do apresentado neste trabalho até o momento, é de se cogitar a percepção de o lançamento surgir como procedimento, já que a própria leitura do dispositivo legal remete a este parecer, visto que o termo procedimento é visualizado por diversas vezes. Neste parâmetro encontram-se vinculados Alfredo Augusto Becker96 e Antônio Roberto Sampaio Dória97 e igualmente Ruy Barbosa Nogueira98, que salienta que a natureza procedimental do lançamento se alicerça nos fundamentos substanciados de Emílio Betti e José Frederico Marques, quando da análise do Anteprojeto do Código Tributário. 2.4.3.1 Atributos do lançamento tributário Como já visto é impossível dissociar Direito Administrativo de Direito Tributário quando o objeto em destaque é o lançamento. A similaridade se consubstancia na atuação imperiosa do Estado, enquanto detentor da alçada constitucional de regulação dos atos praticados, omissos ou iminentes para disciplinar, regrar, limitar, contrapor, regular os direitos e deveres de seus administrados. A cada ramo jurídico, no caso em destaque, área administrativa e tributária, o Estado muitas vezes ―molda‖ as circunstâncias que lhe são favoráveis atingindo a convalescência de seus interesses. No que tange ao Direito Tributário, esta ―regulação imperiosa‖ desfruta da instituição de tributos, apoiados na atuação de ―lançar‖ respectivo débito/crédito, típica para a manutenção do Poder Público, principalmente no que tange à característica de extrafiscalidade. O vínculo jurídico que estatui a nascitura da obrigação tributária é aspecto abstrato da relação de sujeitos ativo e passivo, que em da virtude da lei, repassam interesses, deveres e ônus. Para a promoção este vínculo é imprescindível a ocorrência de um fato superior, avesso a qualquer vontade dos sujeitos, que se atenta a uma incidência legal. Desde já, a união de interesses provoca a satisfação de um crédito, que sustentará credibilidade, exigibilidade por 95 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 31.ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 183. BECKER, 1963 apud CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 447. 97 DORIA, 1968 apud CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 447. 98 NOGUEIRA, 1973 apud CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 447. 96 41 meio do ato de lançamento que o constituirá. Ressalta-se que a constituição do crédito tributário via lançamento não se limita a caracterizá-la como criadora, transformadora, transferidora ou extintora de direitos materiais, mas é calcada na especificidade da preparação e revisão que o lançamento possibilita ao crédito.99 Por se tratar de instrumento hábil para o controle da máquina do sistema tributário, o lançamento deve se atentar às circunstâncias legais que lhe asseguram a perfeita execução do ato, garantindo a segurança jurídica, legitimidade e primazia aos princípios da administração pública. Vige, conforme art. 145, do CTN, que qualquer alteração do lançamento deve repercutir aos fatores previamente editados em lei própria, passíveis de proteção ao contribuinte e/ ou sujeito passivo da respectiva obrigação. No mesmo raciocínio, o art. 149 proclama a possibilidade de modificação em virtude ―erro de fato‖, obedecido o decurso do prazo.100 Em sintonia com as disposições expostas, converge Paulo de Barros Carvalho 101 ao mencionar que o lançamento tributário, ora analisado como norma, ora como procedimento ou como ato passa a ser simples opção de quem vá analisá-lo, valendo a asserção para o jurista prático e para o jurista teórico, que para o especialista, não tem relevância. Segue afirmando que a problemática enaltecida deste enfoque reage quanto ao caráter emulativo que se disseminou na doutrina, com a disputa entre a primazia das três possibilidades cognoscitivas. Sendo assim, há de se afirmar que independente da posição regulada pela legislação, ora retribuindo ao lançamento natureza de procedimento, ora confrontando com os ensinamentos doutrinários, que refletem majoritariamente a investidura de ato administrativo, o lançamento tributário há de ser condição predisposta para o nascimento e a exigibilidade da obrigação e crédito tributários, respectivamente. Vislumbra-se, portanto, sua perceptividade administrativa de ato vinculado102, já que é vedada a discricionariedade restando à lei o imperativo de atuação da administração fazendária quanto às regularidades a serem revistas. Não há o que se falar de disponibilidade, sendo certo que impera para este instituto o caráter obrigatório, no que concerne á comprovação de existência do crédito tributário, já que 99 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p.751. 100 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 376-77. 101 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 456. 102 FABRETTI, Láudio Camargo. FABRETTI, Dilene Ramos. Direito Tributário para os Cursos de Administração e Ciências Contábeis. 7. ed. São Paulo: Atlas. 2009. p.103 42 ao Estado resta o papel arrecadatório. Ou seja, a atuação do Poder Público é precípua para o regular processamento da competência tributária atribuída pela Constituição. Imprescindível destacar, porém, que a vinculação atribuída ao lançamento tributário não se confunde com impossibilidade de interpretação da norma tributária. Neste sentido, explica Ricardo Lobo103 que a interpretação da hipótese de incidência é fundamental para a qualificação do fato concreto e para ulterior subsunção. E completa afirmando que a distinção entre as duas características se consubstancia na forma como é visualizado o ato pela autoridade administrativa, seja a partir de liberdade conclusiva, com respeito as premissas legais, seja com a compreensão de conceitos indeterminados, baseados na lei, a qual se chegará a uma única solução. Em relação à aplicabilidade deste instituto no tempo, reflete Ricardo Alexandre 104 que o ―lançamento é realizado em determinado momento na linha do tempo, mas sempre com os lhos voltados para um instante passado, o da ocorrência do fato gerador da respectiva obrigação‖. Pois bem, tomando como parâmetro esta dogmática há de se aceitar que o lançamento tributário poderá ter efeitos ex tunc, repercutindo conseqüências principalmente no que tange às obrigações tributárias relativas às penalidades pecuniárias (multas). O raciocínio do Procurador é ponto esclarecedor dos dirimíveis questionamentos em relação à aplicação temporal das leis tributárias, uma vez que elas podem ser formais ou matérias. Momento não há para aprofundar neste debate, contudo merece breve esclarecimento quanto a este aspecto, a partir da análise minuciosa do art. 144 do CTN e seu respectivo § 1º, abaixo transpostos: Art. 144. O lançamento reporta-se à data da ocorrência do fato gerador da obrigação e rege-se pela lei então vigente, ainda que posteriormente modificada ou revogada. § 1º. Aplica-se ao lançamento a legislação que, posteriormente à ocorrência do fato gerador da obrigação, tenha instituído novos critérios de apuração ou processos de fiscalização, ampliado os poderes de investigação das autoridades administrativas, ou outorgado ao crédito maiores garantias ou privilégios, exceto, neste último caso, para o efeito de atribuir responsabilidade tributária a terceiros. O caput do artigo trata da legislação tributária material, estabelecendo a data do fato gerador como aplicável à legislação vigente. Já o § 1º, remete à legislação formal 105, atribuindo-lhe aplicação imediata de seus efeitos.106 Portanto, brevemente confirmadas as 103 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 12.ed. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar, 2005. p. 277. 104 ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 4. ed. São Paulo: Método, 2010. p. 371. 105 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p.757. 106 ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 4. ed. São Paulo: Método, 2010. p. 372. 43 nuances da lei fiscal, resta superada a qualidade incontroversa da aplicabilidade da legislação quanto ao procedimento do lançamento. Portanto, o lançamento é instituto ―retrospectivo‖107, uma vez que se reporta à data da ocorrência do fato gerador da obrigação e rege-se pela lei então vigente, ainda que modificada ou revogada, salvo em se tratando de instituição de novos critérios de apuração ou procedimento de fiscalização, seja para ampliar os poderes de investigação das autoridades administrativas, seja para limitar garantias e privilégios, pois assim, aplicar-se-ia imediatamente a nova lei, enquadrando os aspectos do lançamento relacionado à lei anterior aos da norma atual. 2.4.3.2 Modalidades de lançamento A Lei 5.172/66, em seus arts. 147 a 150, dispôs para o lançamento três formas de manifestação, caracterizadas como modalidades. Cada modalidade recebe nomenclatura específica, de acordo como é feita a celebração do ato e concretização do ato. Trata-se, então, de lançamento ―direto‖, ou por ―ofício‖, lançamento por ―declaração‖, ou por ―homologação‖. Paulo de Barros Carvalho108 explica que a determinação classificatória do lançamento de acordo com a sua forma de execução atende unicamente ao aspecto do grau de participação de cada sujeito da relação tributária. Conforme o papel de cada ente, a delimitação das modalidades observará os atributos preparatórios ou efetivamente finalísticos para a concretização do ato. Em decorrência da busca pela explicação coerente no âmbito jurídico, observa-se que por muitas vezes será constatada controvérsias causadas pelo legislador quando da conceituação de lançamento no CTN. Para algumas modalidades, a disposição do art. 142 se encaixa de maneira perfeita quanto à sua terminologia, no entanto, para outras, surge a crítica da semântica do instituto do lançamento exposto pelo CTN. Para rebater esta incógnita, Luciano Amaro109 ensina que o próprio CTN cuidou de se atentar ao erro estipulado e engendrou a figura de um tipo de lançamento que acolhesse, em ato posterior, todas as características defendidas no artigo citado, afastando eventual suscitação de impropriedade da norma. Contudo, a doutrina é conformada em assumir que 107 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 12.ed. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar, 2005. p. 278. 108 Cf. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. 109 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 384. 44 mesmo com esta intenção, o CTN não dirimiu tal questão, causando, ainda, muitas discussões emblemáticas. O art. 147 cuida de identificar a modalidade de lançamento caracterizada por declaração. Configura-se como sendo aquela em que o contribuinte ―informa‖ ao Fisco a ocorrência do fato gerador e lhe fornece as informações necessárias à apuração do devido tributo.110 Desta feita, o lançamento realizado pela autoridade competente somente se efetiva após a declaração pelo sujeito passivo a cerca das hipóteses cabíveis de tributação. O momento posterior ao ato do contribuinte provoca o lançamento e gera a obrigação de notificação pelo Fisco para a ocorrência do pagamento ou, se for o caso, ser apresentada impugnação (defesa administrativa).111 A exemplo desta modalidade tem-se o Imposto Estadual sobre Transmissão Causa Mortis e Doações (ITCD) e o Imposto Municipal sobre Transmissão Onerosa e Inter Vivos de Bens Imóveis (ITBI). De ―ofício‖ é o lançamento realizado sem qualquer interferência efetiva do sujeito passivo. Sua utilização corresponde às situações taxativamente expressas no art.149 do CTN. Logo, compete à própria autoridade administrativa apurar a ocorrência do fato gerador da obrigação, o valor devidamente tributável, assim como identificar o contribuinte e demais aspectos da relação tributária. Outro tipo de prática do lançamento de ofício é sua previsão para a correção de equívocos apontados em lançamentos anteriores, seja em relação às irregularidades quanto a correção ou revisão de valores apuráveis, seja quanto às diferenças ou omissões encontradas, não importando a modalidade de lançamento que se perfez anteriormente.112 Contudo, o art. 149, parágrafo único, do CTN autoriza a validade para o lançamento de ofício nestes casos somente se forem feitos antes da extinção do crédito tributário pela decadência ou prescrição. O lançamento por ―arbitramento‖, previsto no artigo 148 do CTN, é um tipo de lançamento de ofício aplicável nas hipóteses dos incisos II, III, IV e V do artigo 149 do CTN. Serve como supedâneo para ficções e presunções jurídicas, sempre que o comportamento do contribuinte dificultar ou tornar impossível a descoberta ou revelação de elementos informativos do fato gerador, escondendo-se o preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos; nesse caso, a autoridade fiscal poderá ―presumir‖ e ―arbitrar‖ o valor a ser 110 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 12.ed. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar, 2005. p. 280. 111 MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Direito Tributário e Financeiro. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2009. (Série Leituras Jurídicas. Vol. 24). p. 104. 112 MACHADO SEGUNDO, op.cit., p. 102. 45 considerado para o preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos, obtendo-se desta forma algum tipo de base de cálculo para suportar a incidência da alíquota.113 2.4.3.3 Lançamento por homologação e legalidade do ato Em continuidade às modalidades, recai-se no objeto principal deste presente estudo, seja ele o lançamento do tributo feito por homologação. Diferentemente dos demais espécimes de lançamentos já explanados, o lançamento por homologação guarda peculiaridades capazes de desenvolver controvérsias extensas, provenientes de interpretações diversas e práticas indubitavelmente contraditórias. Sinteticamente discorrendo, o lançamento por homologação trata-se de modalidade pelo qual o recolhimento do respectivo tributo se efetua independentemente da atuação prévia da Administração Pública – sujeito ativo – uma vez que o crédito tributário é averiguado pelo sujeito passivo, que antecipadamente verifica o montante e a natureza do crédito devido. Poder-se-ia concluir que para certa atuação do sujeito passivo – contribuinte – fosse mais bem caracterizada a definição de ―autolançamento‖, diante da procedência do ato. No entanto, o legislador tributário entendeu que soaria mais lógica a terminologia ―lançamento por homologação‖, afastando a utilização de qualquer outra similar. Destarte, originou-se a complexidade da questão. Baleeiro114 explica que faz sentido a interpretação conferida pelo legislador quando da terminologia adotada, já que, no sentido técnico-jurídico, não existe u lançamento, mas uma posterior aceitação do órgão competente sobre os dados apresentados. Não será o próprio sujeito passivo que lançará, a ele incube apenas a quantificação dos dados. O pagamento será efetuado sem lançamento, mas confirmado via ―homologação‖. Eis, portanto, a natureza da nomenclatura. O Código Tributário Nacional, no art. 142, defendendo a ideia de manter intocável o lançamento pela autoridade competente, não excluiu desta modalidade a atuação do referido sujeito ativo, uma vez que é detentor de ato vinculado e obrigatório, perfazendo-se, portanto, ainda a necessária homologação do montante pendente. Ou seja, não poderia o tributo estar unicamente vinculado à apuração do sujeito passivo, restando, desta forma, pendente de 113 114 BRASIL. Código Tributário Nacional. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.Art. 128. Art. 148. BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense. 2010. p. 832. 46 análise pelo sujeito ativo, que concordaria ou não com os valores levantados. A este procedimento e sua finalização denomina-se ―homologação‖. O lançamento por homologação é ressaltado no art. 150, caput, do Código Tributário Nacional. Sua aplicação está estritamente relacionada às situações em que haja autorização pela norma, em que será possível a ―antecipação do pagamento‖ sem prévia constatação do recolhedor do tributo. E aqui se destaca a diferença crucial desta modalidade em comparação com as demais: nas outras espécies de lançamento não existe o prévio exame, mas sim o prévio lançamento; neste, o pagamento efetua-se antes do lançamento.115 Destarte, Paulo de Barros Carvalho116 destoa da análise circundada do tema, entendendo que o lançamento por homologação não se caracteriza como ―lançamento‖ visto que ―lançamento e homologação são realidades jurídicas antagônicas, não podendo subsistir debaixo do mesmo epíteto‖. Cumpre ressaltar que tal posicionamento não é majoritário, resistindo a ideia de que é perfeitamente condizente a modalidade conferida pelo legislador. Nesta esteira, o lançamento por homologação respeita a sistemática da proposta do art. 150 do CTN, configurando-se como ―ato administrativo, expresso ou tácito, que confirma a atividade desenvolvida pelo sujeito passivo, equiparando-se a ato liquidatário e extinguindo o crédito tributário‖.117 Por sua propensão numerosa de tributos que se sujeitam ao lançamento por homologação, é imprescindível que tal modalidade se adéque a determinados fundamentos constitutivos. Isto porque a preferência por essa modalidade tem sido cada vez mais frequente nas apurações dos tributos. Quanto a este aspecto, Ferreiro Lapatza118 denuncia que existe uma ―privatização da gestão tributária‖, uma vez que o contribuinte não apenas divulga informações e dados essenciais para a declaração e lançamento o tributo, mas quantifica o quantum e recolhe aquilo que lhe convém ser devido. A explicação da preponderância do lançamento por homologação encontra-se respaldo na estrutura econômica, política, social e/ou jurídica, que facilitam a justificativa desta modalidade. Aliomar Baleeiro119 visualiza nesta modalidade certo despreparo da esfera administrativa de cobrança, que, consequentemente, atrai elevados custos e impropriedades no 115 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 391. CARVALHO, 1991 apud BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense. 2010. p. 833. 117 BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense. 2010. p. 834. 118 LAPATZA, 1990 apud BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense. 2010. p. 830. 119 BALEEIRO, op.cit., p. 830. 116 47 conhecimento correto dos dados levantados pelo sujeito passivo. Em outro patamar, assume que o lançamento por homologação incentiva a agilidade na arrecadação e a proteção da intimidade e sigilo das informações. Mas para que todos estes mecanismos sejam atingidos, essencial que haja a compatibilização de arrecadação dos tributos com a sistemática do lançamento por homologação, o que, via de regra, está vigente na maioria os tributos, pelo menos os mais importantes. 2.4.4 Extinção do Crédito Tributário A relação oferecida anteriormente entre vínculo jurídico civil e tributário vem a ser fundamental, também, no estudo da extinção o crédito tributário, visto que as semelhanças estruturais são correntes. A circunstância que, principalmente, vem diferir os dois tipos de vínculos se baseia no princípio da legalidade, que se mostra mais efetivo na relação obrigacional tributária, pela qual repercutirão fatores como lugar do pagamento ou remissão, que para cada ramo do Direito receberá tratamento específico. Distante das diferenças entre a extinção do crédito tributário e a extinção do crédito na obrigação civil comum, há de suscitar, ainda, as similaridades que comprovam que os dois institutos em muito se interdisciplinam. Nesta esfera, vislumbra-se que, apesar do dispositivo referente ao assunto no Código Tributário Nacional trazer as possibilidades de extinção do crédito, bem como a necessidade de lei para a previsão dos efeitos da extinção parcial ou total sobre a ulterior verificação de irregularidade de sua constituição, conforme os arts. 144 e 149,120 os incisos que discriminam tais casos não se perfaz de maneira taxativa, uma vez que figuras previstas no Código Civil podem extinguir o crédito tributário. Acompanham esta premissa Hugo de Brito Machado,121 Paulo de Barros Carvalho,122 Luciano Amaro e Aliomar Baleeiro.123 A exemplo disto, Ricardo Lobo124 cita a ―confusão‖, que extingue a obrigação desde que na mesma pessoa se confundem as qualidades de credor e devedor (art.381, Cód. Civil), que no ramo do direito tributário poderá se manifestar quando o ente tributante tenha 120 MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Direito Tributário e Financeiro. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2009. (Série Leituras Jurídicas. Vol. 24). p. 120. 121 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 31.ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 209. 122 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 522. 123 BALEEIRO, 1992 apud AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 416. 124 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 12.ed. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar, 2005. p. 288. 48 recebido a herança jacente ou tenha estatizado empresas privadas e a morte do devedor, que não deixa bens, extinguindo por isso o crédito tributário devido. E ressalta que a ―novação‖, caracterizada quando o devedor contrai com o credor nova dívida para resolver a anterior, ou quando novo devedor sucede um antigo ou, ainda, quando em virtude de uma nova obrigação, outro credor é substituído ao anterior, não se compreende no âmbito tributário, porque do caráter dispositivo associado ao princípio da legalidade aplicável para os aspectos financeiros e fiscais. Do lado oposto a esta argumentação, apesar de também suscitar os casos que estão à margem do CTN, Ricardo Alexandre125 defende que a lista trazida pelo art. 141 do CTN e taxativa, uma vez que o diploma referido delimita a lei pela qual as hipóteses serão amparadas. Em consideração ao aspecto legal que está intrinsecamente conjuminado com o crédito tributário, Hugo de Brito Machado126 amplia esta análise esclarecendo que a matéria está compreendida no princípio da reserva legal, pelo qual estipula que somente a lei poderá abordar as situações de desaparecimento do crédito tributário. Quanto à relação entre extinção do crédito tributário e obrigação tributária, a doutrina não se manifesta de maneira equânime, uma vez que o próprio CTN dispõe de transparecer lacunas e incoerências a respeito do fato. A começar pela crítica engajada de Luciano Amaro127 que discute a ―incoerência interna‖ do Código Tributário Nacional, que assumiu o crédito tributário como estágio ‗mais avançado da obrigação tributária‘, devendo este ser extinto juntamente com a obrigação relacionada. Frisa o autor que há obrigações tributárias que se extinguem antes da nascitura do crédito feita pelo lançamento, como a hipótese de decadência. E mais, a própria legislação tributária discorre sobre alguns fatores que podem extinguir o crédito tributário, sem nem mesmo existir uma obrigação, tais como os do art. 156, IX e X, do CTN. Em preciosa conclusão, Amaro fundamenta que tais problemáticas do código se amparam em um parâmetro dualístico: há o tratamento da extinção do crédito tributário como similar à extinção da obrigação tributária, além de existir a condensação da ―extinção do direito material do Fisco‖ com a ―extinção de mera pretensão do Fisco‖. 128 125 ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 4. ed. São Paulo: Método, 2010. p. 416. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 31.ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 209. 127 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 411. 128 Ibid., p. 412. 126 49 Hugo de Brito Machado129 concorda com posicionamento de Amaro ao destacar que esta lógica irregular do CTN é causa de controvérsias acadêmicas por não esclarecer as possibilidades capazes de dissociar a extinção do crédito com a necessária extinção da obrigação tributária. Expõe que é perfeitamente viável a extinção do crédito sem que esta afete a obrigação tributária quando a Fazenda Pública realize novo lançamento referente a uma formalização do crédito deficiente. E completa ao ressaltar que o ―crédito é distinto da obrigação, sendo uma relação formalizada, acertada, tornada líquida e certa‖, podendo a causa extintiva atingir apenas a forma, ou somente o conteúdo. Contrapondo-se as estas exposições, Paulo de Barros Carvalho130 preconiza que é claro o desaparecimento da obrigação tributária diante de causa extintiva do crédito, assim previsto m legislação. Preceitua que ―o crédito tributário é apenas um dos aspectos da relação jurídica obrigacional, mas sem ele inexiste o vínculo‖. E neste esteio, tomou a liberdade de discordar veemente do legislador do CTN, criticando sua postura ―assistemática‖. Deixadas de lado tais incógnitas doutrinárias frutos do debate fundamental para o enriquecimento acadêmico e melhoramento das práticas advocatícias em natureza tributária, toma-se como parâmetro o Código Tributário Nacional, no art. 156, que enuncia onze causas extintivas do crédito tributário. Eis que: I – o pagamento; II – a compensação; III – a transação; IV – a remissão; V – a prescrição e a decadência; VI – a conversão do depósito em renda; VII – o pagamento antecipado e a homologação do lançamento; VIII – a consignação em pagamento; IX – a decisão administrativa irreformável; X – a decisão judicial passada em julgado; XI – a dação em pagamento em bens imóveis. Não há neste presente trabalho o interesse de adentrar profundamente cada espécie de extinção do crédito, uma vez que será realizada a análise sistemática de apenas algumas causas extintivas do artigo supracitado - aquelas intrinsecamente relacionadas com o tema ora pesquisado. 2.4.4.1 Decadência Haja vista a importância primordial de determinados fatos jurídicos para as relações obrigacionais, é cediço que o tempo demonstra-se como o fato natural de grande, se não maior, essencialidade para o nascimento, exercício e perda de determinados direitos. 129 130 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 31.ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 209. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 520-1. 50 Consoante, portanto, destacar que o tempo influencia nas relações jurídicas das pessoas desde a concepção humana. Por meio de tais influências temporais dos institutos jurídicos, principalmente no que concerne aos fatos de repercussão no direito público, apesar da maior significância no âmbito do direito civil, o aspecto temporal é objeto de pontos extremamente importantes para a relação obrigacional tributária: a decadência e a prescrição. A priori, destacam-se noções imprescindíveis para o ideal entendimento do instituto da decadência e sua repercussão prática nos lançamento por homologação. Manifestando-se através dos ensinamentos de Francisco Amaral131, é medida que se impõe a necessidade de certeza e segurança nas relações jurídicas, com ordem e paz na sociedade. Para toda atuação do Estado, faz-se mister revelar o verdadeiro interesse camuflado nos vínculos, seja este o interesse social, de determinado grupo ou corporação ou apenas individual, sem contudo, adentrar nas questões jurídicas propriamente ditas, que mais ensejam divergências. É medida que se impõe a averiguação dos argumentos que circundam a esfera da extinção dos direitos pelo decurso do tempo, uma vez que não é circunstância conveniente a exposição longínqua das relações jurídicas. Neste sentido, cabe brilhantemente a explicação de Hugo de Brito Machado132: Não seria razoável admitir que as relações jurídicas permanecessem todas elas expostas a questionamentos por tempo indeterminado. A possibilidade de questionamento, a qualquer tempo, de uma relação jurídica, aumentaria de modo insuportável a insegurança. Necessária, portanto, mostra-se a estabilização das relações jurídicas, a consolidação destas com o passar do tempo, como forma de realização do princípio da segurança. A partir deste interesse inerente à estrutura lógica de caráter jurídico que se perfaz a decadência. Ou seja, fundamenta-se a decadência na premência da segurança jurídica e liquidez de seus instrumentos. Segundo Amaral133 ―a decadência é a perda do direito potestativo pela inércia do seu titular no período determinado em lei, traduzindo, portanto, em uma limitação que a lei estabelece para o exercício de um direito.‖ 131 AMARAL, Francisco. Direito Civil: Introdução. 6. ed. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar, 2006. p. 567. 132 MACHADO, Hugo de Brito. Decadência e prescrição no direito tributário brasileiro. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. In: Curso de direito tributário. SILVA, Ives Gandra da (Coord.). 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 217-285. p. 219. 133 AMARAL, op.cit., p. 567. 51 Veja-se, o aspecto destacável da decadência se consubstancia pela vontade reconhecida em lei de matéria de direito disponível, não sendo, de plano, suscetível de oposição, como meio de defesa.134 Hugo de Brito, incansavelmente sábio em suas colocações, enfatiza o posicionamento supracitado ao demonstrar que existe estrita e clara distinção entre os institutos da decadência e da prescrição, destacando que o primeiro decorre do próprio direito material, enquanto a segunda inviabiliza a progressividade normal da ação. Em suas colocações, a decadência atinge diretamente a natureza do direito material e a prescrição afeta indiretamente.135 Em se tratando da relação tributária propriamente dita, o lançamento tributário, como instrumento de poder-dever da administração, responde aos efeitos do direito potestativo, uma vez que sua execução não interfere, nem é interferida por qualquer tipo de colaboração alheia. Por isso, o lançamento, como meio eficaz de constituição do crédito tributário, nos termos do Código Tributário Nacional, atende aos preceitos da decadência, quando os prazos prescritos em lei não são amparados pela Fazenda Pública, que consequentemente não usufruirá deste direito em momento posterior. Oportunamente, é razão adequada a dilação deste tópico, uma vez que o CTN, em seu art. 173 desdobra tal circunstância temporal de maneira mais abrangente, pois são constatados dois marcos de análise fundamental do prazo decadencial. Remete o artigo que a contagem do prazo será observada a partir do momento em que se efetivar o lançamento e a partir do primeiro dia subsequente àquele que deveria ter sido feito. E mais, surge para tanto, em melhor análise, um terceiro aspecto decadencial, regido pelo parágrafo único do mesmo artigo que expõe ―da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela notificação, ao sujeito passivo (...)‖.136 Em contraponto às exposições constantes no CTN, colaciona-se que tais considerações hoje vigentes vão de encontro às teses defendidas por Paulo de Barros Carvalho137 e maioria da doutrina tributarista, que asseguram que tal diploma, no que concerne à decadência, infringiu princípios basilares da caracterização deste instituto. Ora, imprescindível se atentar para o fato de que existe forte diferenciação entre ―decadência do direito de crédito‖ e 134 CASTRO, 1984 apud AMARAL, Francisco. Direito civil: introdução. 6. ed. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar, 2006. p. 568. 135 MACHADO, Hugo de Brito. Decadência e prescrição no direito tributário brasileiro. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. In: Curso de direito tributário. SILVA, Ives Gandra da (Coord.). 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 217-285. p. 219. 136 BRASIL. Código Tributário Nacional. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.Art. 128. Art. 173, parágrafo único. 137 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 538. 52 ―decadência do direito de constituir o crédito‖, o que não foi assinalado pelo legislador ordinário. E ainda, ajustou-se na jurisprudência dominante orientação ainda mais eloquente, de difícil conciliação com a norma vigente, como assim dispõe diversos estudiosos. Expressa é a determinação que afugenta preceitos principiológicos, como assim aplicam Excelentíssimos Ministros do Supremo Tribunal Federal.138 Não obstante a lucidez nos debates realizados por esta Suprema Corte em razão de sua importante atuação no Estado democrático de direito, a tese aqui levantada não encontrou, data vênia, merecimento jurídico diante das omissões normatizadas pelo art. 173 do CTN quanto ao prazo decadencial. Assim, também, prevê ensinamentos de Hugo de Brito Machado, que contempla o presente paradigma, dentre outros, exemplo de ―insuficiência jurídica, sem qualquer explicação plausível para o albergue do acórdão em questão‖.139 A razão para esta discussão encontra respaldo na incoerência praticada pelo legislador que incluiu o instituto da decadência no rol de causas extintivas do crédito tributário. Ora, é cediço que o prazo decadencial é óbice para o nascimento do crédito tributário, todavia, o CTN apoiou-se na sistemática de que a decadência extingue circunstância que ela própria impediu que fosse gerada. Ao bom agrado da doutrina140, mostrar-se-ia mais plausível inserir a decadência entre as causas de exclusão do crédito tributário, justificando didática adotada, sem, portanto, contradizer dispositivos legais. A par disto, o instituto da decadência é forma de extinção do crédito, conforme numeração imposta pelo Código Tributário Nacional. Quanto ao prazo de contagem, surge para tanto outro ponto controverso, talvez o mais relevante sobre a questão: a delimitação da decadência corresponde ao prazo quinquenal (cinco anos), assim prevista no art. 173, do CTN. Não obstante este dado, o Código autoriza outras três maneiras de contagem, atribuindo ao prazo de cinco anos apenas uma ―base‖, como regra geral. Desta feita, são analisados como aspecto para contagem do prazo decadencial a antecipação de contagem, a interrupção da decadência e o lançamento por homologação, além da regra geral anteriormente citada. A regra geral está contemplada no inciso I do art. 173 do Código Tributário Nacional, segundo o qual a contagem do prazo de cinco anos para a constituição do crédito pela 138 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ERE. 94.462-1/SP, Plenário. RTJ, n. 106, p. 263. MACHADO, Hugo de Brito. Decadência e prescrição no direito tributário brasileiro. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. In: Curso de direito tributário. SILVA, Ives Gandra da (Coord.). 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 217-285. p. 231 140 ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 4. ed. São Paulo: Método, 2010. p. 457. 139 53 Fazenda Pública se inicia a partir do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento deveria te sido concretizado. Atenta-se para o fato, nesta situação específica, que o prazo para ocorrer o lançamento começa posteriormente ao momento do direito de lançar, visto que o CTN conferiu ao Fisco um prazo razoável para o conhecimento do fato gerador. Já no parágrafo único do art. 173 do CTN, restou contemplado o prazo extintivo definitivamente iniciado com o decurso do período de cinco anos, contados a partir da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento. Explica Ricardo Alexandre141 que este tipo de prazo decadencial se aplica nas situações em que, durante o interstício temporal, compreendido entre o fato gerador e o início da fluência do prazo decadencial, a Administração Fazendária adota medida preparatória para o lançamento. Ou seja, antes de chegar o dia inicial do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido realizado, a Administração Tributária inicia procedimento de fiscalização relativo ao fato. Quanto a este tipo de contagem decadencial, é unânime o entendimento de que seus efeitos não causam interferência na contagem de prazo que já foi iniciada, uma vez que possui a finalidade somente de antecipar a contagem do referido prazo. De acordo com o inciso II, do art. 173 do CTN, o direito de proceder ao lançamento extingue-se em cinco anos, contado da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado. A esta regra se enquadra o caso de ―interrupção‖ da decadência. A justificativa deste tipo de contagem tem respaldo nas possíveis ilegalidades cometidas na atividade de lançamento, atribuindo como consequência a devolução do prazo para que se constitua novo crédito. São fluentes as discussões em relação a esta interrupção por motivo de anulação do lançamento, já que diversas outras soluções também seriam viabilizadas para estes casos. No entanto, claramente o CTN atendeu aos deleites da Fazenda Pública e considerou necessária a devolução integral do prazo para tais situações. A sistemática doutrinária em estabelecer se a disposição do inciso II do art. 173 tratase de interrupção ou meramente concessão de um novo prazo independente não é finalidade específica desta pesquisa, o que demonstra ser mais adequada sua análise aprofundada em momento oportuno142. Conclui-se, apenas, que os ditames legais consideram a regra de 141 142 ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 4. ed. São Paulo: Método, 2010. p. 459. Cf. ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 4. ed. São Paulo: Método, 2010. 716 p. 54 anulação de ato de lançamento por vício formal como forma de interrupção do prazo decadencial, favorecido o órgão fiscal. Em relação à outra hipótese de contagem de prazo decadencial – lançamento por homologação – previsto pelo código, merece destaque em capítulo próprio, uma vez que é objeto crucial desta presente didática, importando em aguardar considerações sistemáticas posteriormente. Finalmente, seja como for utilizado e adequado aos casos concretos às hipóteses de contagem de prazo decadencial, sobrevindo esta circunstância, desaparece o direito subjetivo de exigir a prestação tributária e, em contrapartida, também se extingue o débito do sujeito passivo, desvinculando-se do laço obrigacional.143 2.4.4.2 Prescrição Superados os alicerces controversos e expositivos que se sobrepõem aos conceitos do instituto da decadência, dirige-se a partir de então para a análise de outro elemento jurídico constante na relação tributária: a prescrição. Com a densa explicação a cerca da decadência, é possível estabelecer conexão sistemática com o objeto e a finalidade da prescrição para o cenário tributarista. O Código Civil de 2002 estabelece de forma condizente o conceito de prescrição. Prescreve a norma que ―trata-se de perda da pretensão em virtude da inércia do seu titular no prazo fixado em lei‖ 144. Ora, observe que se trata de uma medida assecuratória que o sistema jurídico dispõe para a eficácia da procedimentalidade casuística. Contudo, é necessária cautela na configuração da prescrição, já que sua convalidação se efetiva com a extinção da pretensão de exigibilidade, bem como não há o que relacionar ―direito subjetivo pessoal‖ com a delimitação prescricional eventualmente ocorrida na relação jurídica. De modo genérico, a prescrição se amolda aos ―direitos subjetivos patrimoniais‖, principalmente no que confere às obrigações em sentido técnico.145 A caracterização da prescrição se perfaz no cumprimento didático de alguns aspectos peculiares a este instituto, pelo qual a reunião de tais elementos configura, de maneira lógica, a prática deste fenômeno. A prescrição é reconhecida quando um direito subjetivo é lesado, 143 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 539. BRASIL. Código Civil, 2002. Brasília: Câmara dos Deputados, 2009. art. 189. 145 AMARAL, Francisco. Direito Civil: Introdução. 6. ed. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar, 2006. p. 566. 144 55 surgindo à pretensão de ressarcimento; quando o cumprimento do respectivo dever ou ressarcimento não é exigido, ou ainda; quando há o decurso do prazo conferido pela lei para tal ato.146 Em obediência ao princípio da finalidade, a prescrição afasta de sua amplitude a insatisfação da certeza jurídica. Neste sentido, a prescrição é justificada para atingir a paz, a ordem, segurança e exigibilidade jurídica, conferindo ao processo legal concretização das decisões e executoriedade imediata às lides. Debatida a questão civilista do instituto peremptório, passa-se agora para a análise do instituto em um contexto mais específico, dirigido a atender às relações jurídicas de Direito Tributário. Desta forma, acompanhando a legislação civil, o Código Tributário Nacional adotou o mesmo parâmetro conceitual ao descrever a prescrição em seu dispositivo. E mais, organiza no art. 174 deste diploma que ―a ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva.‖ Em destaque ao enunciado acima relatado, percebe-se que a leitura do artigo merece interpretação mais sistemática, uma vez que não somente a ação executiva fiscal é ampara pelo prazo prescricional, mas o próprio CTN, em seu art. 156, V, dispõe que a prescrição atingirá, também, o crédito tributário e o direito material tributário. As indagações sobre a real diferenciação entre a decadência e a prescrição sempre tomaram parte dos discursos e seminários acadêmicos em matéria tributária. Não obstante calorosos debates, é refutável que tal assunto ainda inspire controvérsias, uma vez que já se consolidou a diversificação entre os institutos. No melhor dos fundamentos, Hugo de Brito Machado realça congruentemente a diferença entre a decadência e a prescrição e se baseia, principalmente, no disposto do art. 174 do CTN. Em suas palavras, a prescrição não necessariamente se manifesta de forma contínua, podendo haver interrupção ou suspensão em seu lapso temporal, diversamente do que ocorre com o período decadencial.147 O embate que ainda provoca inquietações entre os renomados tributaristas gira em torno do início do lapso prescricional. A que tempo exatamente o crédito tributário estará passível de prazo quinquenal se sustenta como objeto dos mais alongados julgamentos nos tribunais superiores, já que a leitura do código possibilita interpretações nas mais variadas formas. 146 AMARAL, Francisco. Direito Civil: Introdução. 6. ed. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar, 2006. p. 566. 147 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 31.ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 237. 56 Existe corrente que apoia a tese de que o lapso temporal se inicia no instante em que ocorre a notificação pela Fazenda Pública ao sujeito passivo para realizar pagamento do crédito, mesmo que pendente recurso ou defesa. A argumentação é sentido de que já se constituiu o crédito tributário definitivamente. A pendência recursal apenas suspenderia o prazo de prescrição. Na linha jurisprudencial, este entendimento prevaleceu corroborando que a prescrição somente se iniciará quando a constituição do crédito for plenamente satisfeita, pois é a partir deste fato de publicidade (intimação) que surge para o sujeito passivo a obrigatoriedade do pagamento do crédito tributário.148 Assim configura o art. 174 do Código Tributário. Para isto cuidou o CTN, ao descrever delimitadamente as hipóteses de interrupção e suspensão do prazo de prescrição, moldando a cada situação a aplicação adequada a ser aplicada. No discorrer do art. 174 aparecem as causas de interrupção e suspensão da prescrição, tais como o despacho que ordena a citação pessoal feita ao devedor (alterado pela LC 118/2005), protesto judicial, ato judicial que constitua em mora o devedor, entre outras. Cumpre ressaltar que a interrupção interfere na continuidade do prazo de forma que este volta a ser contado do início, quando presente algumas das hipóteses do art. 174 do CTN. Já a suspensão prescricional paralisa o curso do prazo enquanto perdurar a causa suspensiva, voltando a fluir no momento em que cessar tal fato.149 Outro cuidado especial deve se ter quanto ao lançamento por homologação, que não obedece a lógica até então exposta, já que seu prazo de prescrição começa a fluir a partir da ocorrência do fato. Mas este aspecto merece fundamento mais apropriado em capítulo próprio, a ser debatido posteriormente, já que entendimentos divergentes têm sido consolidados nas cortes judiciais. Em relação à dogmática sobre a exigibilidade do crédito, a prescrição, neste ponto, atinge a exigibilidade e não o crédito literalmente falando. Imperioso destacar que a legislação faz menção à chamada ―prescrição intercorrente‖, que se consubstancia após a propositura da ação. Sua base reside nos arts. 174 e 40, § 4º da Lei nº. 6.830/80, alterada pela Lei nº. 11.051/04. Entretanto, o juiz diante de tal prazo deve ter cautela, pois surgem duas formas de decisão neste caso: acolher a prescrição intercorrente ou determinar o arquivamento do processo, com base no CPC. Geralmente, o caminho mais 148 149 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 31.ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 237/8. Ibid., p. 237. 57 eficaz e adequado é a aplicação de precedente do STJ, que inclusive, dispõe de súmula a cerca do tema.150 150 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula n.º 106. Proposta a ação no prazo fixado para o seu exercício, a demora na citação, por motivos inerentes ao mecanismo da Justiça, não justifica o acolhimento da arguição de prescrição. apud CASSONE, Vittorio. Direito Tributário: Fundamentos constitucionais da tributação, definição de tributos e suas espécies, conceito e classificação dos impostos, doutrina, prática e jurisprudência. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 191/2. 58 3 O ADVENTO DA LEI COMPLEMENTAR N. 118 DE 9 DE FEVEREIRO DE 2005. Ao ser editada, a Lei n. 11.101/2005151, que ficou caracterizada como nova ―Lei de Falências‖, regulamentando “a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária‖, trazendo inovações na criação dos regimes destes institutos. Extinguiu o procedimento da concordata e ofereceu vias mais adequadas e eficazes para o empresário e para a sociedade empresária, no que tange a solução das celeumas econômicofinanceiras, procurou inovar no processo falimentar vigente e, desde então, interferiu, também, nos liames do sistema tributário nacional. As modificações se realizaram de modo efetivo, necessitando, contudo, de adequação por parte do Código Tributário Nacional, uma vez que as diversas alterações ocorridas tenderam a criar novos institutos e extinguir ouros procedimentos, a fim de que a nova lei de falências não encontrasse barreiras e controvérsias em função da aplicação do diploma tributário. Desta feita, houve a adaptação sistemática por meio da publicação da Lei Complementar n. 118, que reviu os conceitos do CTN e os integrou ao novo texto legal falimentar, de modo a facilitar a aplicação dos atuais procedimentos junto aos empresários e às sociedades empresárias. 3.1 FINALIDADE DA LEI COMPLEMENTAR N. 118/2005 Não obstante o aprimoramento do procedimento de falências, recuperação judicial e extrajudicial, a LC 118/ 2005 revelou ditames que em nada se relacionam com a nova lei de falências, gerando, para tanto, discussões quanto à sua aplicabilidade. De fato, grande parte de seu conteúdo é destinado a atender às questões correlatas à Lei n. 11.101/2005, mas percebese, que tantos outros aspectos, especificamente tributários, foram abordados, como bem expõe, por exemplo, o art. 3º da LC 118/2005, um dos objetos de pesquisa deste presente trabalho. 151 MARTINS, Ives Gandra da Silva et al. Comentários à Lei Complementar n. 118/2005. 12. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010. In: Curso de direito tributário. SILVA, Ives Gandra da (Coord.). 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 1247-1263. p. 1263. 59 Diante destas considerações é medida que se impõe a explicação sobre a efetividade da legislação tributária e a exposição sistemática dos argumentos controversos que giram em torno dos dispositivos da LC 118, já que esta possui cunho meramente interpretativo, mas que ainda sim implicou inovações na aplicação de preceitos até então regulados pelo CTN. 3.2 LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA. O sistema tributário nacional está intrinsecamente consubstanciado nas premissas e disposições da Constituição Federal de 1988. De longe, a Carta Magna brasileira é a mais específica e detalhada no que confere aos ditames tributaristas, visto que todos os princípios e as regras estão amplamente inseridos na Constituição. Este comportamento se diferiu do adotado por países europeus e pelo EUA, que preferiram cuidar da tributação de forma esparsa e menos categórica, transferindo tal competência preceitual às situações descentralizadas.152 3.2.1 Direito Tributário e Constituição Federal. O amparo devidamente exposto pela matriz legislativa confere ao Direito Tributário maior segurança quanto à sua aplicação, desenvolvendo efetividade e vinculação aos entes públicos, que compõem a esfera legislativa, executiva e judiciária. É por isso que a programação constitucional das diretrizes, normas gerais, previsões, implícitas e explícitas, geram maior amplitude e responsabilização quanto a eficácia dos atos praticados em matéria tributária, quando praticados sem observância da Lei Maior. A significante receptividade atribuída à Lei 5.172/66 em relação à Constituição Federal proporcionou validade consubstancial das disposições ali dispostas anteriormente à promulgação desta última, constituindo aplicabilidade e, mais ainda, efetividade aos princípios da ―economia legislativa e da recepção‖. Pois bem, não se deve esquivar da benevolência legislativa gerada pelas considerações constitucionais em relação ao Código Tributário Nacional, muito porque este instrumento assegurou legitimidade jurídica ainda mais eficaz, configurando uma estrutura normativa capaz de assegurar a implementação nas diversas entidades federativas. Veja-se, portanto, que 152 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p.47. 60 o papel precípuo da Constituição de 1988 foi determinar um ―Sistema Tributário Nacional‖ e as ―rédeas‖ pelas quais as normas gerais seriam guiadas, a fim de se atingir a finalidade social da lei. 3.2.2 A lei complementar no Sistema Tributário Nacional. Por determinação expressa da Constituição Federal de 1988, as leis complementares observarão processo legislativo específico, com aprovação por maioria absoluta (art.69, CF/88), dispondo de matéria estritamente colacionada pelo diploma maior, complementando características normativas e operacionalizando comandos constitucionais. No que tange ao universo tributário, a lei complementar acentua as mesmas características conferidas pela Constituição, realizando objetivo interligado às predisposições necessárias para a adequada aplicação da legislação tributária. São categoricamente delimitadas as pontuações as quais a lei complementar tributária se compromete a dispor. Estas, por sua vez, decorrem de funções capazes de aprimorar o liame tributário, satisfazendo necessidades e interesses em proveniência ao Sistema Tributário Nacional, consubstanciado pela Lei Maior. Neste sentido, a Constituição, no seu art. 146 e na EC nº. 42/03, bem assevera que a lei complementar cuidará de: a) emitir normas gerais de Direito Tributário; b) dirimir conflitos de competência; c) regular as limitações ao poder de tributar; d) fazer atuar certos ditames constitucionais. A característica da implementação da legislação tributária por leis complementares de âmbito constitucional enfatizam a dinâmica da relação jurídica tributária, principalmente no que confere à ―concorrência tributária‖ entre os entes políticos,153 que se perfaz na integralização de fatores capazes de beneficiar as relações obrigacionais de natureza tributária. Como brilhantemente assevera o advogado Sacha Calmon, a análise minuciosa da lei complementar calcada no texto constitucional pelo art. 146 e pela EC nº. 42/03 ultrapassa os ditames da mera função atributiva de complementar as normas de eficácia contida, originando uma maior aplicabilidade à lei, que se utiliza de instrumentos capazes de oferecer incentivos fiscais e incentivos econômicos.154 Diante de tais explanações, configura-se medida imensurável o manejo de leis complementares no Sistema Tributário brasileiro, equalizando uma atuação incontestável do 153 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p.110/111. 154 Ibid., p.111. 61 legislador originário, uma vez que assegurou legitimidade e adequação na infra-estrutura fiscal e econômica, ampliando as delimitações das normas de eficácia contida. Logo, os objetos da lei complementar de natureza tributária concretizam o planejamento fiscal, como bem merecem os incentivos que geram efeitos nas relações jurídicas dos contribuintes. 3.3 AS LEIS INTERPRETATIVAS E O CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL Os imensuráveis preceitos e princípios que compõem a dinâmica jurídica, sejam estes explícitos ou implícitos, se concretizam de forma claramente, mas divergentes entre si, em virtude das intensas mudanças no plano da existência jurídica, as quais necessitam de aplicabilidade. Esta aplicabilidade é materializada pela normatização dos fatos, que constantemente passam por procedimentos de atualizações, adequação e suprimentos, a fim de melhor cogitar a observância estrita da lei. O ―maquinário‖ legislativo responsável pela procedimentalidade supracitada é provocado a partir do momento em que esta materialização é insurgida, se perfazendo, desde então, em uma tarefa difícil, principalmente ao operador da norma, que deverá incansavelmente dispor da finalidade da norma que asseguram a segurança e a certeza jurídica. É cediço que os preceitos jurídicos nem sempre são claros e precisos, revelando ambiguidades e imperfeições, primando por redação defeituosa, omissões e contradição entre diplomas ou dispositivos vigentes, especialmente porque se origina da atuação humana.155 Destarte, a elaboração pelo Poder Legislativo competente do sistema normativo necessariamente consiste em guardar coesão e coerência com os ditames válidos e manter relação com os preceitos constitucionais, em uma completa compatibilização eficaz. Carlos Maximiliano156 enfatiza que é imprescindível a possibilidade de interpretação da lei para fins de ideal adequação no convívio social, no entanto, é criterioso ao afirmar que esta interpretação não pode ensejar na banalização do texto jurídico, invertendo conceitos até então sensatos. Para o doutrinador, deve se ter cuidado com o dogma axiológico in claris 155 Cf. MELO, José Eduardo Soares de. Interpretação e Integração da Legislação Tributária. 12. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010. In: Curso de direito tributário. SILVA, Ives Gandra da (Coord.). 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. 1263 p. p. 161-187. 156 MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do Direito. 12. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010. In: Curso de direito tributário. SILVA, Ives Gandra da (Coord.). 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. 1263 p. p. 163. 62 cessat interpretatio (disposições claras não comportam interpretação), já que a denominação ―clareza‖ possui natureza relativa: o que a um parece evidente, antolha-se obscuro e dúbio a outro, por ser este menos atilado e culto, ou por examinar o texto sob um prisma diferente ou diversa orientação. No mesmo sentido, de maneira ainda mais delimitada, Amaro157 entende que todas as leis precisam ser interpretadas, independentemente de o seu texto apresentar eventual obscuridade, restando, pois, superado o brocardo suprareferido. No Código Tributário Nacional, a interpretação (lato sensu) da legislação tributária é calcada em um sistema abrangente, consubstanciado pelas noções de interpretação (sentido estrito) e de integração. A interpretação consiste em adequar as normas aos fatos ocorridos e aplicá-las de maneira condizente com o convívio e realidade social; já a integração se aperfeiçoa diante da presença de omissões ou lacunas da norma, pela qual se busca preencher este vácuo com as possibilidades determináveis pela LICC e pelo próprio CTN (art. 108). No entanto, não se pode olvidar que cada um destes instrumentos não se materializa de maneira independente, ou seja, o processo de integração pressupõe o de interpretação, para fins de afastar o manejo de tais instrumentos à margem do sistema jurídico. Com a finalidade de esclarecer e detalhar dispositivos já preexistentes, o Código Tributário Nacional assimilou a possibilidade de inserir em seu sistema leis interpretativas, suscetíveis, inclusive, de retroatividade no ordenamento jurídico. A interpretação ―pura‖, realizada por edição do legislador, tornaria viável a aplicação remota da lei, salvo quando aplicável sanção ou penalidade à infração dos dispositivos interpretados (CTN, art. 106, I). 3.3.1 Retroatividade das chamadas leis interpretativas. A abertura no ordenamento jurídico tributário para a eficácia das leis interpretativas e sua repercussão nas normas já existentes tornou-se tema bastante difundido entre o meio acadêmico e doutrinário. Vislumbra-se que o diploma tributarista não se atentou para a celeuma que tal repercussão causaria quando analisadas ditadamente as leis interpretativas em relação à sua retroatividade ou não. Neste sentido, a doutrina esclarece que é inviável a conciliação da retroatividade da lei interpretativa com o princípio constitucional da irretroatividade, já que para esta foi-lhe dado caráter meramente explanador, sem necessariamente inovar no ordenamento. 157 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 231. 63 Paulo de Barros Carvalho defende que ―as leis interpretativas exibem um traço bem peculiar (...) circunscrevendo seus objetivos ao esclarecimento de dúvidas‖. Aliomar Baleeiro somente aceita ser possível a lei ―realmente‖ interpretativa. Complementando este raciocínio, Eduardo Marcial Ferreira Jardim ressalva que a lei interpretativa ―tão somente explicita mandamentos fluidos ou vagos ou mesmo obscuros‖. De outro modo, para Luciano Amaro, mesmo na existência das leis interpretativas, que não ―surpreendem‖ as disposições legais, os efeitos das leis retroativas serão aplicados a estas, se tornando ―inúteis‖.158 A discussão se torna contumaz quando surge a expectativa da lei interpretativa apenas ―clarear‖ as descrições dispostas na lei. Isto porque é de difícil assimilação o fato de uma norma apenas esclarecer outra norma, sem, contudo, modificá-la; é possível, mas imprescindível uma cautela quanto à exegese mensurada. Com efeito, a chamada ―lei interpretativa‖, quando consegue ―apenas‖ detalhar e explicar a outra lei afetada, em nada legitima a ocorrência da retroação, já que os efeitos ali foram nulos, pois nenhum aspecto legal foi alterado para que nova aplicação fosse feita. De outro modo, quando traz em seu bojo uma inovação jurídica, neste caso há o que se falar em retroação da norma, com as consequências ali provocadas. Por isso a difusão do embate entre a possibilidade da retroatividade da lei interpretativa. É necessário que se tal instrumento normativo atenda às premissas analíticas para a aplicação da retratação dos efeitos gerados. Óbvio que a didática não é tão simples: ou a lei atual confere ao preceito interpretado o mesmo núcleo semântico inferido pelo operador do direito, sendo os efeitos desta inócua, ou não, quando a partir de então será inoperante, já que será retroativa. Baleeiro159 brilhantemente fundamenta o porquê das razões das controvérsias inerentes da edição da chamada lei interpretativa. Para o ministro aposentado do STF, é preciso verificar se a lei interpretativa se perfaz de maneira inovadora, se tornando, desta feita, uma lei nova. Neste sentido, confira suas argumentações: (...) lei que interpreta outra há de ser retroativa (...) no sentido que espanca as obscuridades e ambiguidades. Mas contaminar-se-á de inconstitucionalidade se, em matéria fiscal, criar tributos, penas, ônus ou vexames que não resultavam expressa e implicitamente do texto interpretado. Tais inovações só alcançam o futuro. Em contrapartida, Amaro, apoiado pelo primordial enfoque de Roque Carrazza e Pontes de Miranda, leciona que é importante uma visão minuciosa para apurar estas considerações, já que se atentará tanto ao fato da lei interpretativa se caracterizar como a 158 159 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. 541 p. BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense. 2010. p. 670. 64 substituição retroativa do dispositivo obscuro da norma anterior pelo dispositivo esclarecido da lei atual, quanto ao fato da lei interpretativa ser considerada como uma determinação ao aplicador do ato normativo para que julgue a sua aplicabilidade ou não diante dos novos rumos definidos, uma vez que em ambas as situações os efeitos sujeitos às leis retroativas serão aplicáveis a lei tida como interpretativa, pois esta é consubstancialmente uma lei nova.160 A Lei Complementar n. 118 de 2005, objeto de estudo deste presente trabalho, traz e sua estrutura normativa a expressão ―lei interpretativa‖, no que tange ao dispositivo do inciso I do art. 168 do CTN. O art. 3º dessa norma complementar o caráter interpretativo a este referido inciso; por sua vez, o art. 4º da LC 118/2005 indica que o artigo anterior seja remetido ao que dispõe o art. 106, I, do Código Tributário. Pode saltar aos olhos que o Poder Judiciário somente aplicará a retroatividade da lei considerada como interpretativa se considerar que, anteriormente à Lei Complementar n. 118/2005, a interpretação mais benéfica já era aplicada em face da concedida por esta nova norma, entretanto, é de salientar maior sensatez nas assimilações aqui proferidas já que tantos outros aspectos foram nitidamente apresentados de maneira controvertida, tais como os prazos extintivos da restituição de débito nos tributos lançados por homologação, os quais serão amplamente abordados em tópico específico. 3.4 A LEI COMPLEMENTAR N. 118/2005 E A DENOMINAÇÃO COMO LEI INTERPRETATIVA. A Lei Complementar n. 118, publicada no Diário Oficial de 09/02/2005, alterou alguns dispositivos do Código Tributário Nacional. Os aspectos pontuais abordados por esta lei complementar referem-se, de forma quase totalitária, a temas referentes àqueles regulados pela nova ‗Lei de Falências‘ (Lei n. 11.101/2005, publicada no DOU da mesma data), tendo ambos os projetos tramitados conjuntamente no Congresso Nacional. De fato, o art. 3º da LC 118/2005 regulou questão que não remete qualquer inferência com a Lei n. 11.101/2005. Senão, veja-se seu texto legal: Art. 3°. Para efeito de interpretação do inciso I do art. 168 da Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966 — Código Tributário Nacional, a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1° do art. 150 da referida Lei. 160 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 228. 65 O artigo 4° do diploma supracitado (LC 118/2005), por sua vez, determina que a mesma entre em vigor cento e vinte dias após sua publicação, ―observado, quanto ao art. 3°, o disposto no art. 106, inciso I, da Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966 (CTN)‖. Visualiza-se que, ao invés de modificar a redação do artigo 168, I, do Código Tributário Nacional, tratou-se de ‗interpretá-lo‘ no sentido de que a extinção do crédito tributário, em se tratando de tributo sujeito a lançamento por homologação, aconteceria no instante do pagamento antecipado (de modo que começaria a fluir desde então o prazo para pleitear a respectiva devolução, esgotando-se em 5 anos) e não quando de sua efetiva homologação (hipótese em que o prazo prescricional se iniciaria apenas a partir desta, totalizando 10 anos nos casos de homologação tácita).161 A existência de leis interpretativas no ordenamento tributário realça a análise da dimensão que a edição da LC 118/2005 proporcionou, já que se buscou a tentativa de regulamentar de maneira interpretativa o disposto no CTN sobre o instante em que se inicia o prazo de contagem para a extinção do crédito tributário. A divergência prolixada para a questão da LC 118/2005 se consubstancia no fato de as leis interpretativas não serem asseguradas de retroatividade, uma vez que não têm caráter de alterar ou criar normatizações, mas apenas interpretar e dar maior dinamismo a uma lei já existente.162 Neste aspecto, vários juristas se comprometem a analisar a edição da LC 118, visto que, ao contrário do que sua finalidade pressupõe, ela trouxe inovação ao ordenamento jurídico. Não há o que se falar em extinção do crédito a partir da homologação ou do aceite tácito do lançamento, mas do pagamento antecipado do tributo. Ou seja, houve uma implementação ao art. 150, § 1º do CTN. Observa-se que é necessária uma interpretação extensiva atribuída ao art. 3º da referida lei, pela qual revela que as competências dos entes federados não se dão de forma absoluta, assim como a norma interpretativa não tem o condão apenas de regulamentar. Visualiza-se que a expectativa alcançada por esta lei ultrapassa os benefícios do contribuinte, uma vez que a delimitação temporal do prazo prescricional e seu 161 162 FUX, Luiz. Do prazo prescricional para o exercício do direito de o contribuinte pleitear a compensação/repetição do indébito referente a tributos sujeitos a lançamento por homologação: manutenção da cognominada tese jurisprudencial dos “cinco mais cinco” a despeito do advento da Lei Complementar n. 118/2005. BDJur, Brasília, DF, 27 maio 2008. Disponível em: <http://bdjur.stj.gov.br/dspace/handle/2011/17128>. Acesso em 07 jun 2010. VIANA, Daiane Maria Oliveira. Lançamento por homologação e extinção do crédito tributário. Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 96, v. 860, jun. 2007. p.37. 66 início não satisfazem ao interesse do cidadão,163 que detém, a partir da validação e disposição da norma, de período inferior para o ajuizamento da ação de repetição de indébito. Remete-se a Exposição de Motivos do projeto de lei complementar originário da LC 118 a assertiva de que o projeto de lei ordinária referente às falências acarretaria simultânea modificação do Código Tributário Nacional, tendo sido ali pretendido que: Além das normas pertinentes ao processo falimentar e de recuperação de empresas, o projeto aqui submetido à elevada consideração de Vossa Excelência também veicula normas interpretativas que eliminam dúvidas acerca do alcance de dispositivos do Código Tributário Nacional, com evidentes benefícios para o contribuinte e para a Fazenda Pública federal, estadual e municipal, especificamente no que toca a segurança jurídica. Ao analisar as circunstâncias que levaram à edição da Lei Complementar n. 118/2005, Mário Luiz Oliveira da Costa164 refuta de forma memoravelmente sistemática as perplexidades trazidas pela norma. Para este excelente doutrinador e especialista a LC 118/2005 destoou detalhes até então indiscutíveis no âmbito tributário, mostrando-se um tanto oportuna a sua edição. Como não poderia deixar de assentar seus comentários, atenta-se a seguir para as suas primazias: (...) é a prova inequívoca de que a suposta interpretação do art. 168, 1, do CTN foi incluída de forma oportunista no projeto de lei complementar que efetivamente se fazia necessário para adequar o CTN às alterações previstas no projeto da nova lei de falências (o qual já tramitava no Congresso Nacional), com elas não guardando qualquer vínculo. Mais ainda, pretendeu-se dar ao dispositivo em questão roupagem de efetiva norma interpretativa, como se realmente houvesse dúvida acerca de seu alcance que necessitasse ser esclarecida, não tendo havido qualquer menção ao fato de já ter sido a matéria objeto de inúmeras decisões do STJ. Como agravante, tentou-se legitimá-lo com a falsa assertiva de que implicaria ‗evidentes benefícios para o contribuinte‘! Por primeiro, ao pretender externar suposta interpretação acerca de dispositivo legal já exaustivamente apreciado pelo Poder Judiciário (com o que não mais se verificava qualquer dúvida ou obscuridade a ser sanada), resta claro que o art. 3º da LC 118, ao invés de encontrar fundamento de validade no art. 106, I, do CTN, acabou por contrariá-lo frontalmente. Afinal, não mais sendo possível, muito menos necessário, aclarar o que já fora definitivamente aclarado pelo Poder Judiciário, disto resulta inequívoco ter havido má utilização do expediente, sem o alegado amparo do art. 106, I, do CTN por tratar-se de hipótese à qual era o mesmo manifestamente inaplicável. A efetiva necessidade de uma norma interpretativa para o aclaramento da matéria envolvida é condição sine qua non para a validade de qualquer dispositivo editado ao amparo do art. 106, I, do CTN. Ausente tal necessidade, será inexoravelmente inválido o dispositivo que falsamente pretendera fundamentar-se na excepcional autorização constante do Código Tributário. 163 VIANA, Daiane Maria Oliveira. Lançamento por homologação e extinção do crédito tributário. Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 96, v. 860, p. 18-47, jun. 2007. p. 40. 164 COSTA, Mário Luiz Oliveira da, 2005 apud FUX, Luiz. Do prazo prescricional para o exercício do direito de o contribuinte pleitear a compensação/repetição do indébito referente a tributos sujeitos a lançamento por homologação: manutenção da cognominada tese jurisprudencial dos “cinco mais cinco” a despeito do advento da Lei Complementar n. 118/2005. BDJur, Brasília, DF, 27 maio 2008. Disponível em: <http://bdjur.stj.gov.br/dspace/handle/2011/17128>. Acesso em 07 jun 2010. 67 De outro lado, a tentativa de interpretação do art. 168, I, do CTN, em sentido oposto àquele consolidado no âmbito do STJ, caracteriza abuso do poder de legislar e desvio de finalidade do ato legislativo em questão. Para o renomado Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Luiz Fux, é cediço que lei para ser considerada interpretativa, deve assim declarar-se e não criar direito novo, sem prejuízo de assim mesmo ter seu caráter interpretativo questionado. Ainda, desta sorte é inequívoco que a lei interpretativa procura restaurar o melhor entendimento da norma.165 Neste sentido, para o reiterado posicionamento dos tribunais, a LC 118/2005 inovou no ordenamento jurídico, não alcançando apenas os fins interpretativos. Por isso, como qualquer outra lei da legislação brasileira, esta não pode ser associada aos casos pretéritos, em função do disposto no art. 5º XXXVI da CF/88. Complementando, entende o próprio STJ que tal lei complementar desfruta de privilégios até então não incluídos no CTN, o que corrobora que a função legislativa atribuída ao Poder Legislativo não é absoluta, merecendo acolher a ideia de que os poderes são independentes, mas harmônicos entre si. Esta harmonia é justamente a possibilidade que cada poder tem de exercer sua função primária e, supletivamente, para melhor desenvolvimento funcional, uma atividade secundária que é inerente de outro poder federativo.166 A LC 118 poderá ser considerada interpretativa em face das oscilações jurisprudenciais e somente se aplica a fatos pretéritos ainda não sujeitos a apreciação judicial, quer nas instâncias inferiores, quer nos tribunais superiores, pela exegese emprestada aos artigos 303, 462 e 517 do CPC e 105 da Constituição Federal, notadamente este na parte em que exige o prequestionamento da matéria em única ou última instância, conforme ditames do Pretório Excelso.167 3.5 O ALCANCE DA LEI COMPLEMENTAR N. 118/2005. Sob o aspecto do advento da Lei Complementar n. 118/2005, os tribunais, essencialmente o Superior Tribunal de Justiça, assentaram a magnitude eu tal diploma legal 165 FUX, Luiz. Do prazo prescricional para o exercício do direito de o contribuinte pleitear a compensação/repetição do indébito referente a tributos sujeitos a lançamento por homologação: manutenção da cognominada tese jurisprudencial dos “cinco mais cinco” a despeito do advento da Lei Complementar n. 118/2005. BDJur, Brasília, DF, 27 maio 2008. Disponível em: <http://bdjur.stj.gov.br/dspace/handle/2011/17128>. Acesso em 25 out 2010. 166 VIANA, Daiane Maria Oliveira. Lançamento por homologação e extinção do crédito tributário. Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 96, v. 860, p. 18-47, jun. 2007. p. 38-39 167 FUX, op.cit. 68 regraria as relações jurídicas tributárias, apesar de sua finalidade precípua atender aos fatos de natureza falimentar e empresarial. Neste estanque, o colendo tribunal passou a concluir que: i. Nas ações em que se questiona a devolução (repetição ou compensação) de tributos lançados por homologação não declarados inconstitucionais pelo STF, aplica-se a tese dos ―cinco mais cinco‖, vale dizer, 5 (cinco) anos de prazo decadencial para consolidar o crédito tributário a partir da homologação expressa ou tácita do lançamento e 5 (cinco) anos de prazo prescricional para o exercício da ação; ii. Nas ações em que se questiona a devolução (repetição ou compensação) de tributos lançados por homologação declarados inconstitucionais pelo STF, o termo a quo da prescrição era: — a data da publicação da resolução do Senado Federal nas hipóteses de controle difuso de constitucionalidade (EREsp 423.994/MG); e — a data do trânsito em julgado da decisão do STF que, em controle concentrado, concluiu pela inconstitucionalidade do tributo (REsp 329.444/DF).168 Ressalta-se que tal argumentação jurisprudencial sedimentou-se em notável pressuposto ético-fiscal, considerando o contribuinte que, pretendido em uma presunção de legalidade e legitimidade das normas tributárias, adimplira a exação e, surpreendido com a declaração de inconstitucionalidade difusa, promovia a ideal oportunidade de se ressarcir daquilo que pagara de boa-fé. Induzia-se injusto impor-lhe a prescrição da data do pagamento que fizera baseado na atuação incólume do legislador. Em decorrência de sua mutação ideológica, a Seção de Direito Público do STJ no período anual de 2005, uniformizou a discussão referente ao tempo prescricional/decadencial nas relações tributárias, firmando o entendimento de que169: PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AÇÀO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. 1. Versando a lide tributo sujeito a lançamento por homologação, a prescrição da ação de repetição/compensação de valores indevidamente recolhidos deve obedecer o lapso prescricional de 5 (cinco) anos contados do término do prazo para aquela atividade vinculada, a qual, sendo tácita, também se opera num qüinqüênio. 2. O E. STJ reafirmou a cognominada tese dos 5 (cinco) mais 5 (cinco) para a definição do termo a quo do prazo prescricional, nas causas in foco, pela sua Primeira Seção no julgamento do ERESP n. 435.835/SC, restando irrelevante para o estabelecimento do termo inicial da prescrição da ação de repetição e/ou compensação, a eventual declaração de inconstitucionalidade do tributo pelo E. STF. 3. Consequentemente, o prazo prescricional para a repetição ou compensação dos tributos sujeitos a lançamento por homologação começa a fluir decorridos 5 (cinco) 168 FUX, Luiz. Do prazo prescricional para o exercício do direito de o contribuinte pleitear a compensação/repetição do indébito referente a tributos sujeitos a lançamento por homologação: manutenção da cognominada tese jurisprudencial dos “cinco mais cinco” a despeito do advento da Lei Complementar n. 118/2005. BDJur, Brasília, DF, 27 maio 2008. Disponível em: <http://bdjur.stj.gov.br/dspace/handle/2011/17128>. Acesso em 25 out 2010. 169 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. AgRg no RESP. 638.248/PR. 1ª Turma, Relator Min. Teori Albino Zavascki. Julgamento 02.12.2004. DJU de 28.02.2005. 69 anos, contados a partir da ocorrência do fato gerador, acrescidos de mais um quinquênio computado desde o termo final do prazo atribuído ao Fisco para verificar o quantum devido a título de tributo. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. Consolidada tal jurisprudência, em posterior proveniência de uma definição jurisprudencial nacional e pacifica, em que estavam decorridas as inteligências atuantes no cenário jurídico, adveio a LC 118/2005, publicada no DOU de 09/02/2005, com o escopo expresso de ―interpretar‖ o art. 168, I, do CTN, a partir dos seus arts. 3° e 4º. No entanto, esta implementação, considerada em sua essência como sendo interpretativa, refuta a questão de sua aplicação imediata ou retroativa, porquanto o CTN, no art. 106, é límpido ao admitir a sua incidência aos fatos geradores pretéritos, ressalvados os consectários punitivos por eventual infração ao dispositivo ora aclarado e que está em pleno vigor, posto jamais declarado inconstitucional.170 Luiz Fux171 preconiza que ―a severa perplexidade gerada pelo advento da novel lei tantas décadas após, não a torna inconstitucional, tanto mais que, consoante reavivado, a jurisprudência vinha oscilando, e a ratio da lei interpretativa é exatamente conceder um norte para a adoção de regramentos dúbios‖, não impedindo que se sujeite a uma interpretação ao crivo da própria Lei interpretativa, como visto anteriormente. Consoante este raciocínio é que a subjugada Lei Complementar n. 118/2005 aplica-se, tão somente, aos fatos geradores pretéritos ainda não submetidos ao veredicto judicial, pelo que o novo ordenamento não é retroativo em razão de seu caráter interpretativo. Ressalta excelentíssimo ministro que a lei interpretativa, como toda lei, não pode retroagir.172 Conclusivamente, observa-se que a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, em 27.04.2005, nos autos do EREsp. n. 327.043/DF, da relatoria do Excelentíssimo Ministro João Otávio de Noronha, novamente tratou de dirimir a lide com a jurisprudência da Corte acerca da cognominada tese dos cinco mais cinco para a definição do termo a quo do prazo prescricional das ações de repetição/compensação de valores indevidamente recolhidos a título de tributo sujeito a lançamento por homologação, desde que ajuizadas até 9 de junho de 2005, tendo em vista o advento da Lei Complementar n. 118/2005.173 170 FUX, Luiz. Do prazo prescricional para o exercício do direito de o contribuinte pleitear a compensação/repetição do indébito referente a tributos sujeitos a lançamento por homologação: manutenção da cognominada tese jurisprudencial dos “cinco mais cinco” a despeito do advento da Lei Complementar n. 118/2005. BDJur, Brasília, DF, 27 maio 2008. Disponível em: <http://bdjur.stj.gov.br/dspace/handle/2011/17128>>. Acesso em: 16 mai. 2010. 171 FUX, op.cit. 172 FUX, op.cit. 173 FUX, op.cit. 70 4 A CONTAGEM DO PRAZO PRESCRICIONAL NOS TRIBUTOS LANÇADOS POR HOMOLOGAÇÃO E A LC N. 118/2005 A contagem do prazo nos tributos lançados por homologação, por sua natureza diferenciada e específica, provoca inúmeras discussões e posicionamentos jurisprudenciais contumazes, uma vez que o diploma tributário, representado pelo CTN, aborda um determinado prazo prescricional, que, por sua vez, foi retificado pela Lei Complementar n. 118 de 2005. Em contrapartida, ascendeu uma celeuma, já que a jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça havia se consubstanciado de maneira diversa ao proposto pelo Código Tributário, no sentido de tratar a contagem do prazo para a repetição do indébito como sendo aquele previsto na legislação somado aquele que a Fazenda Pública teria para efetivar o lançamento, a fim de beneficiar o contribuinte. O art. 168 do Código Tributário Nacional indica que o direito de pleitear a restituição, nos casos dos incisos I e II do art. 165, conta-se da data da extinção do crédito tributário. Por sua vez, o art. 156 determina que o pagamento antecipado e a homologação são causas de extinção do crédito, senão vejamos: Art. 156. Extinguem o crédito Tributário: (...) VII – o pagamento antecipado e a homologação do pagamento nos termos do disposto no art. 150 e seus §§ 1º e 4º Por sua vez, expõe o art. 150 do mesmo diploma legal a cerca do lançamento por homologação: Art. 150 (...) §1º O pagamento antecipado pelo obrigado nos termos deste artigo extingue o crédito, sob condição resolutória da ulterior homologação do lançamento. (...) §4º Se a lei não fixar prazo à homologação, será ele de 5 (cinco) anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação. Ressalta-se que tais disposições engendraram a máquina judiciária no que tange à interpretação destes aos casos concretos relativos ao prazo para a repetição de indébito. Desta forma, surgiu, no melhor direito, a argumentação de que somente seria viável o início da contagem do respectivo prazo quando a homologação do tributo tivesse se consolidado, podendo, a partir de então, considerar o prazo previsto pelo art. 150, § 4º do CTN. Neste diapasão, o Superior Tribunal de Justiça, enfatizando a aplicabilidade de todos os dispositivos legais supramencionados, no que concerne aos tributos lançados por homologação, preconizou em jurisprudência uniformizada que o termo a quo para a contagem 71 é data da homologação expressa ou tácita. Ausente homologação expressa aplicar-se-á o referido §4º do art. 150 do CTN, que considera extinto o crédito tributário somente após o decurso de cinco anos, contados da ocorrência do fato gerador. Neste sentido, colaciona-se tal entendimento174: ―TRIBUTÁRIO – EMPRÉSTIMO COMPULSÓRIO – CONSUMO DE COMBUSTÍVEL – REPETIÇÃO DE INDÉBITO – DECADÊNCIA – PRESCRIÇÃO – INOCORRÊNCIA‖. Sendo assim, consolidando entendimento reiterado de seus excelentíssimos membros, o STJ promoveu que o indébito pode ser repetido dentro do prazo de 10 anos, contado da ocorrência do fato gerador, quando da ausência da homologação expressa do tributo. Surgiu em contrapartida a este posicionamento, a edição da LC n. 118/2005, que derrubou a jurisprudência até então consolidada nas lides referentes ao tema. Percebe-se que ao objetivar a interpretação de disposições do Código Tributário Nacional, os arts. 3º e 4º da lei complementar em comento acabou por rebater argumentação viabilizada pela Corte Superior. Confira-se: Art. 3º. Para efeito de interpretação do inciso I do art. 168 da Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966 — Código Tributário Nacional, a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1° do art. 150 da referida lei. Art. 4°. Esta Lei entra em vigor 120 (cento e vinte) dias após sua publicação, observado, quanto ao art. 3°, o disposto no art. 106, inciso I, da Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966 — Código Tributário Nacional. Ora, o advento da referida lei complementar, que transpareceu o cunho apenas interpretativo, provocou a retomada da discussão quanto a forma de contagem dos prazos nos tributos lançados por homologação, uma vez que modificou as decisões já prolatadas, interferindo na segurança jurídica dos resultados judiciais. 4.1 PAGAMENTO ANTECIPADO E LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO Nas hipóteses de submissão dos tributos ao lançamento por homologação, será verificado, à sabedoria de todos, que o sujeito passivo apurará o montante devido e então submeterá para apuração da Administração competente, que por ato exclusivo, efetuará a chamada homologação, que se caracterizará como a anuência dos valores e aspectos ali divulgados. 174 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp. nº. 65.277/PE 1ª Turma, Relator Min. Humberto Gomes De Barros, decisão de 07.08.1995, DJ 18.09.1995, p. 29.949, decisão por maioria. 72 Em decorrência desta série de atuações, será efetivado o ―lançamento‖, propriamente dito. Ou seja, o ato do lançamento decorre da homologação consubstanciada pela autoridade fiscal. Não satisfeito com o procedimento acima disposto, o CTN invocou ao sujeito passivo da obrigação – contribuinte – e aqui, excluem-se as demais modalidades de lançamento, o dever de ―antecipar‖ o pagamento, uma vez que se tornou plenamente possível adimplir o quantum tributável que ele alega ser devido, anteriormente ao processo de homologação pela Administração Tributária. Cumpre esclarecer, contudo, que tal pagamento antecipado, por si só, não caracteriza as hipóteses de extinção do crédito tributário, devendo estar sincronizado com a posterior homologação, expressa ou tácita, deste pagamento efetuado. Isto, porque, no intróito da homologação, em tese, não há o lançamento efetivo, muito menos o crédito tributário exigível. Em decorrência destes fatores que o art. 156, VII do Código Tributário preconiza que serão causas de extinção do crédito tributário ―o pagamento antecipado ―e‖ a homologação do lançamento nos termos do disposto no art. 150 e seus §§ 1º e 4º‖. O legislador diante da possibilidade de antecipação do pagamento para determinados tributos, remeteu ao fato do crédito ali em referência não estar ainda constituído, afastando, a priori, o efeito constitutivo do ato de lançar. Destarte, a finalidade precípua do legislador não alcançou todos os fatores que pudessem dar a efetiva validade ao pagamento que fosse antecipado, tornando, na realidade, a antecipação do pagamento, pelo contribuinte, uma espécie de encargo capaz de valorizar os fatos à vista da norma aplicável, de determinar a matéria tributável, identificar-se como sujeito passivo, de calcular o montante devido e adimpli-lo, anteriormente a qualquer atuação ou apuração da autoridade competente.175 A desventura proporcionada pela edição do artigo referente à antecipação do pagamento se perfaz quando se analisa se prescinde ou não o ―lançamento‖. Pois bem, o próprio CTN enfatiza que o lançamento decorre do ato da autoridade que, tomando ciência da atuação praticada pelo devedor, homologa-a. A atuação em referência é o pagamento. Questiona-se, portanto, se não seria medida mais justo o uso da terminologia ―homologação do pagamento‖, visto a literalidade interpretativa atribuída ao diploma legal. De outro modo, não são circunstâncias cabíveis neste presente estudo as impropriedades de tal nomenclatura utilizada pelo CTN, ou ainda se de outra forma soaria 175 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 391. 73 melhor o fato de se ―homologar o pagamento‖ realizado antecipadamente e não o ―lançamento‖ que ali se efetuaria. O que se mostra perspicaz é o fato de que foi possibilitado o adimplemento anterior ao lançamento, praticado por ato unilateral do contribuinte e que, principalmente, influenciará na contagem dos prazos de decadência e prescrição dos tributos lançados por homologação, uma vez que o CTN preconizou que o prazo será considerado quando da ocorrência do fato gerador; se houver pagamento de montante tributável, é porque o sujeito passivo constatou circunstância geradora do tributo, qualquer que seja e, por consequência, capaz, assim, de se iniciar o decurso previsto na norma. 4.2 A DECADÊNCIA NOS TRIBUTOS LANÇADOS POR HOMOLOGAÇÃO Já restou superado que o prazo, quando consolidada a homologação por meio do ―pagamento antecipado‖ e, assim, findado o direito de realizar suposto lançamento de ofício, é, em tese, de 5 (cinco) anos, contabilizados a partir do fato gerador176. A priori, cumpre sinalizar determinado aspecto quanto ao pagamento antecipado, já discutido em tópico anterior177: quando a antecipação do pagamento não é efetivada, não haverá o lançamento por homologação, visto que não restou concretizado o objeto o qual se homologa. Assim também sucede o entendimento de Carlos Mário da Silva Velloso ao dispor que ―na hipótese de inexistir o pagamento antecipado, não tem lugar a homologação, pois o art. 150, § 4º só trata de hipótese em que tenha havido aquele pagamento‖ 178. Percebe-se que tal situação não foi apreciada pelo art. 150 do CTN, já que, em face do que dispõe o art. 149, que trata de maneira superficial em que hipótese caberá a homologação de ofício, enquanto presente, ainda, o direito potestativo do Fisco, o prazo a ser aplicado (nas omissões legislativas) respeitará a regra do ar. 173. Portanto, é de se notar, como bem analisou Amaro179, que o período de cinco anos será observado quanto aos fatos não sujeitos ao pagamento antecipado, ―contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que (à vista da omissão do sujeito passivo) o lançamento de ofício poderia ser feito‖. O doutrinador completa, ainda, que ―se realizado o pagamento 176 BRASIL. Código Tributário Nacional. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. Art. 150, § 4º. Cf. item 4.1 deste trabalho. 178 VELLOSO, Carlos Mário da Silva, 1980 apud AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 435. 179 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 435. 177 74 antecipado, a autoridade administrativa deve, sob pena de anuência tácita, manifestar-se em cinco anos a partir do fato gerador, procedendo ao lançamento de ofício‖ Destarte a lacuna do dispositivo legal, faz-se necessário acentuar o que reflete o § 4º do art. 150 do CTN, que preconiza algumas ressalvas até então não analisadas. Pois bem, uma se consubstancia em expor que o prazo de cinco anos ali firmado será considerado quando a ―lei não fixar prazo à homologação‖; outra se cristaliza no sentido de persistir casos de simulação, fraude ou dolo, pelos quais será caracterizada a homologação ―ficta‖. Ora, com tais considerações, é imperioso questionar se é possível a fixação livre, pela norma tributária, de prazo diverso, seja inferior ou superior, daquele previsto no artigo supracitado para homologação. A legislação tributária e suas vertentes normativas se abstiveram de disponibilizar, expressamente, sobre o fato. O que se observa é que há a tentativa de se buscar uma solução por meio de análise sistemática do caso em comento. Para a doutrina majoritária, existe a possibilidade de a norma estabelecer somente um prazo divergente quando de maneira inferior ao que já preexiste.180 De outro modo, quanto às situações de fraude, dolo ou simulação, surge a questão sobre qual seria o prazo dentro do qual o Fico poderia recusar a homologação (quando verificar que estão presentes tais vícios) e efetuar o lançamento de ofício, já que não há o que se falar aqui em homologação tácita que trata o dispositivo em tela.181 Em relação a esta celeuma, Amaro182 já se pronunciou, de forma brilhante, enfatizando que a aplicabilidade mais viável é a do art. 173, I do CTN. No entanto, ele afirma que tal disposição não é a mais sensata, senão veja-se: Essa solução não é boa, mas continuamos não vendo outra, de lege data. A possibilidade de o lançamento poder ser feito a qualquer tempo é repelida pela interpretação sistemática do Código Tributário Nacional (arts. 156, V, 173, 174 e 195, parágrafo único). (...) Aplicar o prazo geral (5 anos, do art. 173) contado após a descoberta da prática dolosa, fraudulenta ou simulada igualmente não satisfaz, por protrair indefinidamente o início do lapso temporal. Assim, resta aplicar o prazo de cinco anos, contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido feito. Melhor seria não se ter criado a ressalva. Outras interferências em relação à matéria também foram levantadas por demais especialistas. Sendo assim, para melhor explanação do infortúnio, colacionam-se pareceres183: 180 Cf. AMARO, Luciano. Lançamento por homologação e decadência. Resenha tributária, Seção 1.3 – Imposto de Renda – Comentário, São Paulo: Resenha Tributária, 1975. 181 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 435. 182 Ibid., p. 436. 183 AMARO, op. cit. 75 José Souto Maior Borges refutou as alternativas até então sugeridas, inclusive a utilizada por Amaro (art. 173, I). A seu ver, correto seria o reconhecimento de que a lei ordinária material pode integrar o Código Tributário Nacional (vale dizer, preencher a lacuna desse diploma). (...) Se a lei ordinária não dispuser a respeito desse prazo, não poderá a doutrina fazê-lo, atribuindo-se o exercício de uma função que incumbe só ao órgão de produção normativa. Fala-se, até mesmo, na aplicação do art. 205 do Código Civil de 2002. Paulo e Barros Carvalho reconhece que a regra mais condizente com o espírito do sistema é a do art. 173, I. Em plena concordância é a lição de Fábio Fanucchi, complementando, apenas, que seria possível lei ordinária fixar outro prazo, maior. Carlos Mário Velloso registrou que, mesmo havendo homologação expressa, a verificação de dolo, fraude ou simulação ensejaria revisão de lançamento (art. 149, VII). Porém, o Fisco teria mais cinco anos, contados da homologação expressa. Muitas são as orientações184 quanto à contagem do prazo decadencial relativo às vertentes suscitadas até então. Excluindo a hipótese de ausência de pagamento antecipado, consolidando na doutrina que não haverá caracterização da homologação, a observância do lapso temporal referente às situações que ensejam os vícios do negocio jurídico não atendem a uma equação unânime, haja vista que uma corrente defende que o prazo terá como termo inicial ―o exercício seguinte ao término dos cinco anos contados a partir do fato gerador, ou seja, o Fisco teria como prazo de lançamento cinco anos depois do exercício em que terminaria o prazo original‖. Em contrapartida, outra corrente leciona que o sistema em vigor preconiza que o período a ser considerado é aquele do art. 173, I, logo, ―será o prazo decadencial de cinco anos, a partir do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado”. Amaro185 brilhantemente operacionaliza os argumentos enfrentados, na expectativa de demonstrar que a regra do art. 173, I é a que melhor se adéqua às benesses dos contribuintes. Sendo assim exemplifica nos seguintes termos: Supondo que o fato gerador ocorreu em 10 de junho de 1995, e a lei dá ao sujeito passivo trinta dias para efetuar a ―antecipação‖ do pagamento, se, até 30 de julho de 1995, o recolhimento não tiver sido feito, ou tiver-se realizado com insuficiência, graças a artifício do devedor (dolo, fraude, simulação), o Fisco poderia ter lançado de ofício já no dia 31 de julho de 1995. Ou seja, o exercício em que o lançamento poderia ter sido efetuado é o exercício de 1995, e não o ano 2000, contando-se o prazo decadencial a partir de 1º de janeiro de 1996. A jurisprudência por muito tempo relutou em cristalizar a situação ora ventilada, permanecendo, ainda, na superficialidade do tema. O já extinto Tribunal Federal de Recursos (TFR) chegou a se aproximar da resolução da questão, implantando, consequentemente, a Súmula 219, que determinava o prazo de cinco anos, contado do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que ocorreu o fato gerador, para o direito de constituir o crédito 184 185 Cf. AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. Ibid., p. 437. 76 previdenciário, se inexistente a antecipação do pagamento. No entanto, com a ascensão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), este entendimento novamente retornou aos holofotes das tribunas: em julgamento da 1ª turma desta corte, entenderam os Ministros ali empossados que ―a decadência relativa ao direito de constituir crédito tributário somente ocorre depois de cinco anos, contados do exercício seguinte àquele em que se extinguiu o direito potestativo de o Estado rever e homologar o lançamento‖ 186. Com efeito, data venia, o posicionamento instaurado pelo Egrégio Tribunal aglutinou fundamentos primordiais do sistema tributário do país. Haja vista o enfático diploma legal (art. 173, que define o prazo de inicio da decadência), não restaram consubstanciadas as colocações dos doutos ministros. Nesta esteira, é salutar entender que se trata de prazo para lançar, devendo este ser priorizado do início e não do final, como propõe o STJ. Portanto, demanda rever a contagem nas regras do art. 173, I, considerando, também, a ressalva do art. 150, § 4º do CTN. No mesmo sentido, com o fim de compreender a posição aqui defendida, não seria juridicamente sensato e lógico a exegese do prazo estendido pelo tribunal superior, ou seja, ―a de o prazo para o lançamento começar a correr quando já não seja mais lícito lançar‖, pois incorreria em afronta ao principio da não contraditoriedade das normas jurídicas.187 Tanto se perfaz controverso o entendimento firmado pelo STJ, que este mesmo tribunal, por inúmeras vezes, já se posicionou em sentido inverso188, demonstrando equivocado em suas proclamações a cerca do tema. Ora se aplica o prazo ali consolidado189, ora se efetua a contagem da corrente que mais se coaduna com a sistemática jurídica.190 4.3 A PRESCRIÇÃO E OS TRIBUTOS LANÇADOS POR HOMOLOGAÇÃO Vergastada a celeuma quanto ao prazo decadencial, haja vista que o lançamento quando efetuado respeita a sistemática deste, passa-se a mensurar a contagem temporal por 186 AMARO, Luciano. Ainda o problema dos prazos nos tributos lançáveis por homologação. In: REZENDE, Condorcet (Org.). Estudos Tributários. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 363. 187 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 439. 188 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Embargos de Divergência no REsp 101.407/SP. 1ª Seção. Relator Min. Humberto Gomes de Barros. Julgamento 07.04.2000. DJU 8.05. 2000. 189 Ibid., Embargos de Divergência no REsp 169.246/SP, 1ª Seção. Relator Min. Humberto Gomes de Barros. Julgamento 18.06.2001. DJU 4.03. 2002; BRASIL. Superior tribunal de Justiça. REsp 413.343/SC, 1ª Turma. Relator Min. Humberto Gomes de Barros. Julgamento 17.12.2002. DJU 17.02.2003. 190 Ibid., REsp 276.142/SP, 2ª Turma. Relatora Min. Eliana Calmon. Julgamento 19.11.2002. DJU 17.02.2003; BRASIL. Superior tribunal de Justiça. REsp 289.181/MG, 2ª Turma. Relator Min. Francisco Peçanha Martins. Julgamento 13.05.2003. DJU 30.06. 2003. 77 meio de outro prazo, caracterizado como o da prescrição, que era considerado para a propositura da ação de cobrança do tributo que fora lançado. Neste diapasão, confere o art. 174 do Código de Processo Civil que o decurso prescricional da ação de cobrança será de 5 (cinco) anos, contados da data da sua constituição definitiva. Surge, mais uma vez, a necessária explanação quanto o que realmente se considera ―constituição definitiva‖ do crédito, já que não foi elencada pela legislação tributarista a espécie da ―constituição provisória‖. Amaro191 discorre que a constituição definitiva do crédito não necessariamente guarda relação com a possibilidade de não mais ser impugnado por vias de recurso administrativo ou judicial, mas sim, com a dogmática de concepção que é atribuída ao instituto do lançamento, ou seja, a efetivação se consuma com a notificação do sujeito passivo a cerca do montante devido. Completando este raciocínio, há o respaldo na linha de pensamento de Baleeiro192, que traduz ainda mais além que mesmo pendente de incontroversa legitimação, o lançamento constitutivo do crédito já é por si só eficaz para o início da contagem o prazo prescricional, e aqui destaca como já superado, que a terminologia ―constitutivo‖ é apenas em referência ao que dispõe o CTN, já que o crédito não se legitima (somente) pelo lançamento. A contrária sensu, Hugo de Brito Machado193, em extenso arrazoado, defende que o lançamento do crédito somente se torna plenamente eficaz quando a possibilidade de intervenção impugnativa não mais se torna viável pelo sujeito passivo. Neste sentido, acompanham o autor tantos outros especialistas, tai como Bernardo Ribeiro de Moraes194, Sacha Calmon Navarro Coêlho195 e Ricardo Lobo Torres.196 No mesmo patamar encontra-se a jurisprudência pátria, quando discorre que o posicionamento acima enfrentado é admitido, como confere o STJ ao declarar que ―a 191 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 440/1. BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense. 2010. p.528-30. 193 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 31.ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2010. p. 144. 194 MORAES, Bernardo Ribeiro de. A decadência e a prescrição diante do crédito tributário. In: Caderno de Pesquisas Tributárias, n. 1, São Paulo: Centro de Estudos de Extensão Universitária – Resenha Tributária, 1976, p. 51. 195 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Decadência e Prescrição. Resenha Tributária, Seção 1.3 – Imposto de Renda – Comentário, São Paulo: Resenha Tributária, 1976. p.18 e ss. 196 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 12.ed. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar, 2005. p. 246. 192 78 constituição definitiva do crédito tributário se dá quando não mais cabível recurso ou após o transcurso do prazo para sua interposição, na via administrativa‖.197 No entanto, a melhor plausividade encontra-se sustentada no próprio caderno legal, que atribui a fluência da prescrição ao fato do crédito tributário ter sido lançado, seja de forma contestável ou não, incluindo os atos de preparação e apuração capazes de formar a atividade administrativa consumadora. Destarte, os efeitos do lançamento já estariam sendo visualizados. Não poderia se ter outra perspectiva, uma vez que antes de consubstanciada a atividade de lançar e de apurar o quantum tributável, não há o que se aplicar a contagem intertemporal prescritiva, mas sim a decadencial, pelo fato de ainda estar em curso a possibilidade de se efetuar o lançamento e quando isso poderá ser feito. É notória a infelicidade do Código Tributário Nacional em relação aos prazos extintivos de lançamento. Como exemplo, veja-se que não conferem lógica matemática a estruturação dos prazos quanto ao pagamento, impugnação e recursos, que geralmente respeitam um decurso de 30 (trinta) dias em comparação aos períodos de decadência e prescrição, que se sinalizam por entre 5 (cinco) anos.198 A discrepância é ainda mais visível quando posto em análise os tributos sujeitos ao lançamento por homologação, já que a estes se considera o momento pelo qual se efetuará o início da contagem: se anterior ao instante em que se poderia ter lançado ou posterior à ocorrência do fato gerador. Neste aspecto o atual Sistema Tributário Nacional rege o início da contagem do prazo, quanto à decadência nos tributos lançados por homologação, pela anterioridade do momento em que seria devida a apuração pelo sujeito ativo.199 Em se tratando especificamente de tributo lançado por homologação, é irrefutável que se deve considerar que, quando a homologação se efetiva, seja tácita ou expressamente, não há que mensurar a mesma contagem do prazo prescricional imputado aos tributos lançados por ofício, por exemplo. Assim sustenta Amaro ao preconizar que ―não cabe falar em prescrição no caso de tributos lançados por homologação‖, sob o argumento de que não ―há o que se cobrar na situação em destaque‖.200 Portanto, o que se verifica é que, se efetivado o lançamento expressa ou tacitamente, a prescrição será instaurada nas prováveis ações de restituição que ali perduraram, o que, via e 197 BRASIL. Superior tribunal de Justiça. Resp. 239.106/SP. 2ª Turma. Relator Min. Francisco Peçanha Martins. Julgamento 21.03.2000. DJ 24.04.2000. 198 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 441. 199 Cf. item 4.2 deste trabalho. 200 AMARO, op.cit., p. 443. 79 regra, respeitarão a mesma lógica jurídica estabelecida nos demais tributos; de outro modo, a contagem da prescrição Sá sinalizada já que, mesmo não sendo lançado o tributo por homologação, seja porque constatado qualquer vício ou montante não devido, este se efetuará por ofício, o que integra a prescrição do art. 174 do CTN. Reiteradamente o Superior Tribunal de Justiça201 tem decidido que a prescrição nos tributos lançados por homologação deve compreender o prazo fixado pelo art. 174 do CTN, contado a partir do momento do vencimento da dívida declarada e não paga, in verbis: Se tratando de tributos lançados por homologação, ocorrendo a declaração do contribuinte, por DCTF, e na falta de pagamento da exação no vencimento, mostrase incabível aguardar o decurso do prazo decadencial para o lançamento. Tal declaração elide a necessidade da constituição formal do débito pelo Fisco, podendo este ser imediatamente inscrito em dívida ativa, tornando-se exigível, independentemente de qualquer procedimento administrativo ou de notificação ao contribuinte. O termo inicial do lustro prescricional, em caso de tributo declarado e não pago, não se inicia da declaração, mas da data estabelecida como vencimento para o pagamento da obrigação tributária constante da declaração. No interregno que medeia a declaração e o vencimento, o valor declarado a título de tributo não pode ser exigido pela Fazenda Pública, razão pela qual não corre o prazo prescricional da pretensão de cobrança nesse período. (destaque não original). Percebe-se, portanto, que a atual linha procedimentalista adotada pelo excelso tribunal destoa daquela exatamente enfadada no artigo do CTN, seja de cinco anos, contados a partir do pagamento indevido, já que a contagem ora exposta remete a um prazo mais extenso (10 anos). 4.4 A TESE JURISPRUDENCIAL DOS ―CINCO MAIS CINCO‖ A sistemática atribuída à consolidação da tese dos 10 (dez anos) ou tecnicamente conhecida como tese dos ―cinco mais cinco‖, teve nascitura preliminar nas atribuições jurisdicionais do extinto Tribunal Federal de Recursos – TFR. Neste patamar, a discussão quanto ao prazo decadencial da ação de repetição de indébito tributário restou consolidada por meio da Súmula 219202, assim transcrita à época: Não havendo antecipação do pagamento, o direito de constituir o crédito previdenciário extingue-se decorridos 5 (cinco) anos do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que ocorreu o fato gerador. Ora, veja-se que aquela corte atribuía aos fatos ocorridos a lógica do art. 173, I fixada no Código Tributário Nacional, que mandamenta que a contagem do prazo seja realizada a 201 202 BRASIL. Superior Tribunal Justiça, Resp 658.138/PR, Relator Min. Castro Meira, 2ª Turma, julgamento 8.11.2005, DJ 21.11.2005, p. 186. AMARO, Luciano. Ainda o problema dos prazos nos tributos lançáveis por homologação. In: REZENDE, Condorcet (Org.). Estudos Tributários. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 363. 80 partir do primeiro dia do exercício seguinte em que o lançamento poderia ter sido efetuado. Em se tratando de ―ausência de antecipação do pagamento‖, como discorrido pela súmula supramencionada, infere-se o ato de lançar o tributo de ofício, pois não haverá ato homologatório a ser concretizado, o que enseja a aplicação deste artigo. Com efeito, a súmula o TFR já dispunha que o enunciado ditado pelo dispositivo legal merecia reparação no que tange à sua aplicabilidade jurídica. A referência se manifesta no que pese à interpretação dada ao termo ―quando o lançamento poderia ter sido feito‖ em relação à ―ocorrência do fato gerador‖, sinalizando que, não necessariamente, os dois vernáculos representam o mesmo exercício. Convalidando o entendimento quanto ao adequado exercício a ser considerado como termo de contagem, a Súmula em comento pugnou por identificar que o exercício é circunstância inerente da inicialização da contagem do prazo decadencial. Haja vista a abstração dos iminentes equívocos que caracterizam o momento em que o lançamento poderia ter sido feito como identificador do exercício a ser considerado, o TFR admitiu que, nos casos em que se consubstanciam a inexistência de pagamento antecipado, cabendo, então, o lançamento de ofício, o lapso temporal terá início no exercício seguinte em que ocorreu o ―fato gerador‖, de modo que, após cinco anos, o direito potestativo do Estado de lançar ou rever o lançamento, estará caduco.203 Merece saliência a consagração dada por aquele tribunal ao art. 173, I, já que a regra do art. 150, § 4º do CTN somente abrange os tributos que foram pagos de forma antecipada, ensejando, assim, a homologação expressa ou tácita. Os liames expostos pela jurisprudência da memorável corte refletiram a ausência deste pagamento antecipado, excluindo, portanto da aplicação do ar. 150, § 4º e recaindo a regra geral do art. 173, I do Código Tributário. Ascendendo a criação do Superior Tribunal de Justiça, em 1989, em substituição ao TFR, as exegeses jurídicas se renovaram, mas a linha de raciocínio não se absteve de se manter como a anterior, reiterando, por muitos parâmetros, o entendimento jurisprudencial já cristalizado pelo extinto Tribunal. Neste diapasão, manejados recursos a este egrégio tribunal, novamente a controvérsia da contagem dos prazos nos tributos sujeitos a lançamento por homologação retornou aos gabinetes dos Excelentíssimos Ministros para debate. Sendo assim, cumpre analisar a evolução da matéria na corte responsável pela pacificação das normas infraconstitucionais do país. 203 AMARO, Luciano. Ainda o problema dos prazos nos tributos lançáveis por homologação. In: REZENDE, Condorcet (Org.). Estudos Tributários. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 363. 81 O Superior Tribunal de Justiça, baseando-se na Súmula 219 do TFR, completou o entendimento ora ali ementado, reconhecendo a exegese da utilização do exercício da ocorrência do fato gerador como propulsor do início da contagem do prazo prescricional. Em decisão proferida pelo TRF da 5ª Região as premissas consolidadas nos arts. 156, VII e 150, §§ 1º e 4º do CTN foram relevantes para a construção da tese dos ―cinco mais cinco‖. Apreciando a possível inovação interpretativa, o Superior Tribunal de Justiça sedimentou a conclusão por meio do Recurso Especial nº. 58.918-5/RJ204, pelo qual se demonstrou que ―a decadência relativa ao direito de constituir o crédito tributário somente ocorre depois de cinco anos, contados do exercício seguinte àquele em que se extinguiu o direito potestativo de o Estado rever e homologar o lançamento‖. A partir do julgamento do Recurso Especial ora destacado que foram alinhadas as nuances que construíram a consolidada conclusão pretoriana, que ensejou na formulação da tese dos ―cinco mais cinco‖, que ora é percalcada por equívocos, ora é fundamental para a garantia dos direitos dos contribuintes. 4.4.1 Fundamentos da interpretação jurisprudencial. A análise do STJ é embasada nos ditames conceituais dos institutos da decadência e da prescrição, amparados legalmente pelos arts. 150 e 173 do CTN. Ainda há de se olvidar quanto a importância da data em que ocorreu a inscrição da dívida e como serão considerados seus efeitos. Luciano Amaro entende que o período em que se deu a inscrição não é fato superveniente para a decadência e sua fluência temporal, uma vez que o código tributarista considera para efeitos da contagem do prazo decadencial a data de constituição do crédito. E completa dizendo que a importância consiste, ―em primeiro lugar, que o lançamento tenha sido notificado dentro o prazo decadencial e, em segundo, que não haja transcorrido o prazo de prescrição antes do ajuizamento da respectiva ação‖.205 Portanto, resguardando os cuidados de Amaro, tem-se que a decadência e a prescrição afetam o lançamento, que é ato que comprova a constituição do crédito tributário, o que, porventura, basta para inferir a tempestividade recursal ou decadencial. De plano, afasta-se a incidência em que ocorreu a inscrição da dívida, pois esta não configura fator consubstancial 204 205 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp n. 58.918-5/RJ, Relator. Min. Humberto Gomes de Barros, 1ª Turma, julgamento 24.05.95, DJU 19.06.95. AMARO, Luciano. Ainda o problema dos prazos nos tributos lançáveis por homologação. In: REZENDE, Condorcet (Org.). Estudos Tributários. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 364. 82 para a contagem dos prazos, uma vez que a garantia de existência do crédito se dá por meio da notificação do lançamento devidamente efetuado. Considerando que o Colendo Tribunal se respaldou, quando da definição de seus precedentes, em duas possíveis aplicações viáveis na contagem do prazo decadencial e prescricional, percebem-se as seguintes situações controversas206: a) De um lado, o aresto adota como termo inicial da decadência a data a partir da qual seria possível consumar-se o lançamento; b) De outra parte, afirma-se que o prazo decadencial inicia-se quando se escoa o prazo deferido ao credor para consumar o lançamento. Vale dizer, desde quando já não é mais possível o lançamento. Para a circunstância velada na alínea a, acima confrontada, tem-se que seu êxito não merece lograr, por não consubstanciar e qualquer fundamento até então explanado pelos respectivos artigos do CTN, muito menos pela orientação jurisprudencial utilizada (considerando que até mesmo a Súmula 219 do antigo TFR não se referia a qualquer dos elementos para o acatamento da propositura exposta no tópico ―a‖. Ora, é cristalino que a exegese amparada na primeira tese não cuida da sobremaneira em que vislumbram a contagem decadencial no sistema tributário vigente, já que a este é interveniente o decurso a partir do exercício seguinte àquele em que determinada ocorrência do fato foi fundamental.207 De outra forma, surge a indagação quanto à segunda tese apresentada, que considera a nascitura do prazo decadencial posterior ao período em que teria que ter sido realizado o lançamento. A controvérsia surge em razão do acréscimo de um novo período, quando o crédito a que deseja constituir, já se encontra extinto em razão da inércia do órgão competente pelo lançamento. Em suma, o que se pretende ressaltar é que ambas as teses vislumbradas entram em confronto com o preceito intitulado no art. 173, I do CTN e, desta feita, merece ser agraciada uma terceira propositura; aquela em que contempla que a fluência do prazo é determinada a partir do exercício posterior àquele em seria ―lícito‖ atribuir o lançamento. Ainda, no mesmo patamar de discussão, há de ser considerada a leitura do art. 150, § 4º do mesmo diploma que foi enaltecida pela tese dos ―cinco mais cinco‖, pois, aqui, enquadram-se apenas os tributos lançados por homologação. A figura do pagamento antecipado confere credibilidade ao crédito tributário, mesmo diante do decurso prazo do lançamento que será, como já demonstrado em momento oportuno, efetivado via homologação tácita. 206 AMARO, Luciano. Ainda o problema dos prazos nos tributos lançáveis por homologação. In: REZENDE, Condorcet (Org.). Estudos Tributários. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 366. 207 Ibid., p. 370. 83 Sendo assim, o cerne consagrado no embate da superior corte se ateve a considerar que, nos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, havendo pagamento antecipado, caberia à Administração Pública confirmar os fatos ali apresentados, não concordar e impugnar, seja por meio de novo pagamento devido ou, caso insuficiente o quantum, complementar, de ofício, o adequado tributo, ou ainda, deixar transcorrer o decurso prazo de cinco anos. Nestas situações, o Fisco estará realizando sua atuação de lançamento, cada qual dentro do prazo quinquenal. Destarte, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça contemplou que na inocorrência do pagamento antecipado, ensejará ao Fisco, a possibilidade de lançar de ―ofício‖. Por ora, os ministros ali assentados consideraram que a contagem dos prazos extintivos deve obedecer à conjunção de dois períodos: aquele em que se poderá averiguar e rever a ausência do pagamento e outro em que efetivamente poderá ser efetuado o lançamento de ofício. Portanto, o surgimento da precedente tese dos dez anos atendeu a dois tipos de fundamentos: cinco nos para a averiguação do pagamento realizado antecipadamente ou, na ausência deste, a realização do lançamento de ofício para que efetivamente seja considerado homologado o lançamento e assim, extinguindo-o. Ao término deste período é que se inicia o prazo para pleitear a restituição, caso considerado indevido o pagamento do tributo.208 4.4.2 A inovação no ordenamento jurídico pelo Superior Tribunal de Justiça Ao invocar que o prazo para a restituição do débito indevido deve preconizar o interstício do prazo para lançar, já que é necessário aguardar a consolidação do crédito para extingui-lo, somente posterior a este intervalo que se deve inicializar a contagem do prazo prescricional para efeitos de cobrança, o Superior Tribunal de Justiça priorizou uma inovação interpretativa dos dispositivos relacionados ao tema na legislação. A partir do ano de 1995, período em que se consolidou que o prazo devido ao contribuinte para rever seus créditos se daria em dez anos, a tese avoca pelo Excelso Tribunal incorreu em um equívoco básico, visível na simples leitura dos arts. 173, I e 150, § 4º do Código Tributário. O tribunal interpretou a norma não no sentido de dar ao Fisco a possibilidade de lançar de ofício ainda dentro do prazo de cinco anos de homologação do pagamento que ―deveria‖ 208 MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Direito Tributário e Financeiro. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2009. (Série Leituras Jurídicas. Vol. 24). p. 147. 84 ter sido realizado pelo contribuinte, mas considerou que tal possibilidade somente se iniciaria após ter ocorrido a homologação tácita. Ora, como viabilizar uma atividade jurídica fora do período em que necessariamente ela deveria ter sido realizada? Luciano Amaro interroga a interpretação do Superior Tribunal de Justiça, enfatizando que não se deve garantir um direito a um sujeito, quando este já mais pode ser praticado.209 E completa, no sentido de justificar o prazo do lançamento por homologação quando realizado o pagamento antecipado, dizendo que o § 4º do art. 150, do CTN apenas deslocou o prazo quinquenal para a época da ocorrência do fato gerador, sem alterar o interstício. Para suplementar a inconsistência da aludida precedência jurisprudencial, a corte apoiou-se, ainda, no possível somatório dos prazos regrados pelo art. 173, I e art. 150, § 4º, ambos do CTN. Sabe-se que cada artigo dispõe de situações diversas, mas, ainda sim, as turmas especializadas do pretório excelso consolidaram a tese revelada, que, destarte, ocasionou benefícios aos contribuintes, especialmente, diante do inovado entendimento firmado. Com o advento da Lei Complementar 118/2005 a discussão reascendeu às tribunas, pois o art. 3º, com o fim de interpretar o art. 168 do CTN, modificou jurisprudência até então preconizada. Mas, ao analisar os recursos que tinha como objeto a referida lei e sua alteração jurisdicional, o STJ novamente entendeu que a tese ali sedimentada continuaria e vigor, em razão da proteção da segurança jurídica, admitindo a LC 118/2005 apenas para os casos propostos a partir da vigência desta. Para fins de ilustração, a cognominada tese dos ―cinco mais cinco‖ restou sedimentada com o julgamento do ERESP 327.043210, o qual se colaciona o seguinte excerto: (...) ajuizada a ação após 9 de junho de 2005, poderá ser aplicado o art. 3º da Lei Complementar nº 118/2005 – o qual baixou de dez para cinco o prazo para a ação de recuperação indébito (devolução de valores pagos indevidamente) – aos fatos geradores ocorridos antes de sua aplicação. Com a decisão desta Seção, fica valendo o prazo de ―cinco mais cinco‖ até essa data. No mesmo sentido, registra-se o RESP 744.831211, de relatoria do ministro Luiz Fux, assim ementado: Mesmo diante da análise baseada em (breves) equívocos, quanto ao que se pretende elucidar o Código Tributário Nacional, o STJ fixou a tese dos dez anos, gerando a expectativa 209 AMARO, Luciano. Ainda o problema dos prazos nos tributos lançáveis por homologação. In: REZENDE, Condorcet (Org.). Estudos Tributários. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 375 210 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. ERESP 327.043/DF. 1ª Seção. Relator Min. Mauro Campbell Marques. Julgamento 09.08.2010 DJ 19.08.2010. 211 Ibid., RESP 744.831/SP. 1ª Turma. Relator MIn. Luiz Fux. Julgamento 06.12.2005. DJ 13.02.2006. 85 satisfatória aos direitos do contribuinte e ainda sim, reconhecendo a viabilidade da LC 118/2005 para os casos ali excepcionados. 4.5 OS ARTS. 3º E 4º DA LC N. 118/2005 O advento da Lei Complementar n. 118/2005, com sua finalidade precípua de atingir mais sensatez ao processo de falência e recuperação judicial e extrajudicial, proporcionaram uma discussão além dos ditames legais da processualística falimentar: ao racionalizar o direito falimentar com o direito tributário acabou por enaltecer outra problemática decorrente da prática comumente visualizada nos tribunais do país. No cumprimento de assumir a função que até então é considerada como preponderante na regular prestação jurisdicional, o art. 3º da LC 118/2005 se preocupou em interpretar norma anteriormente prevista pelo Código Tributário Nacional, passando a submeter-se à natureza de corretor legislativo. Ensina Ricardo Lobo Torres sobre o tema:212 A correção legislativa dá-se através de emenda constitucional, lei complementar ou lei ordinária. Implica: a) o radical repúdio à interpretação judicial, pela edição de norma intencionalmente contrastante com a jurisprudência; b) a retificação da norma anterior que, por ambiguidade, ou falta e clareza, tenha levado o Judiciário a adotar interpretação com os pressupostos doutrinários da matéria. Com estas argumentações, abre-se a discussão se o presente dispositivo não afronta o princípio da independência funcional dos Poderes Federativos do Estado ou até mesmo a sistemática do processo legislativo em vigor. Em incessante análise das circunstâncias ora provocadas pelo art. 3º da LC 118/2005 depreende-se de seu texto que não restou caracterizada a violação a tal princípio, muito menos consubstanciou invadida a competência construtiva de interpretação da norma pelo Poder Judiciário. Em excelente demonstração do fático questionamento quanto a validade do art. 3º, Thiago Buschinelli Sorrentino prioriza que é contumaz afastar tal controvérsia pelo fato de que é plenamente possível a regulação que foi conferida pela LC 118/2005. Tudo porque há o amparo do próprio legislativo para esta situação, uma vez que ―não é somente o Poder Judiciário capaz (e responsável) de produzir comunicação jurídica sujeita a remoção da 212 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 12.ed. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar, 2005. p. 321. 86 ambiguidade e vagueza‖, já que, ―no sistema jurídico brasileiro, a existência de comunicação jurídico-legislativa é pressuposto para a comunicação jurídico-jurisdicional‖.213 Neste diapasão há que se considerar que o art. 3º, não demonstra interferência, a priori, na distinção separatista dos Poderes constitucionalmente implantada. No entanto, permaneceu inerente ao artigo a amplitude interpretativa que este originou no CTN e nos direitos adquiridos dos contribuintes. Sendo assim, observe no que consiste a ambiguidade e lacuna proporcionada pelo artigo em comento: a) Até a promulgação da LC 118/2005, a ambiguidade e a vagueza de algumas das palavras dos enunciados dos arts. 150, §§ 1º e 4º, e 168, I, do CTN permitiam que lhes fossem adjudicados dois sentidos possíveis: a.1. o prazo de prescrição deveria ser contado a partir do recolhimento indevido, porque a ―extinção do crédito‖ se dava com o ―pagamento antecipado‖; ou a.2. o prazo de prescrição deveria ser contado a partir da proibição de revisão do pagamento pelas autoridades fiscais, porquanto a ―extinção do crédito‖ somente se daria com a ―homologação‖, expressa ou tácita. b) A partir da promulgação da LC 118/2005, a nova comunicação altera os critérios de uso possíveis, removendo o universo possível. Como a comunicação legislativa complementar antecede sintaticamente a comunicação jurisdicional, espera-se também que a definição de sentido pelo processo orientado será diversificada em relação ao que foi proposto no subitem acima. 214 Em comparação aos dois interstícios temporais, um anterior à leitura do art. 3º da LC 118/2005 e outro posterior, surge a propositura de uma controvérsia no que se refere a qual norma deve ser aplicada no caso de necessária ação restitutiva de um débito, quando o pagamento indevido for efetivado durante a vigência de lei anterior à LC 118/2005, mas o julgamento (decisão judicial) quanto ao fato ocorre somente na existência da novel lei. Thiago Sorrentino vai além ao indagar se o fato relevante para a determinação da norma aplicável é o pagamento indevido ou a decisão que o reconhece e determina a restituição.215 Ora, o deslinde de tal celeuma percorre a análise do art. 106, I, do CTN, devendo este ser considerado para fins de aplicabilidade da norma conflitante. Na verdade, para melhor compreensão, cumpre salientar que o art. 3º da LC 118/2005 não necessariamente guarda obrigatória sujeição do sistema normativo, haja vista que a lógica jurisdicional brasileira vincula apenas as decisões prolatadas em ADI E ADC ou por recomendação sumular do Supremo Tribunal Federal, nos termos dos arts. 102, §2º e 103-A, da CF, respectivamente. A autodeterminação ―interpretativa‖ conferida ao art. 3º da LC 118/2005, enquanto norma jurídica eficaz, já que até o momento não foi delimitada sua inconstitucionalidade, 213 SORRENTINO, Thiago Buschinelli. Prescrição do Direito do Sujeito Passivo à Restituição do Indébito Tributário. In: CARVALHO, Aurora Tomazini de. (Org.). Decadência e Prescrição em Direito Tributário. MP: São Paulo, 2008, p. 308. 214 Ibid., p. 309-10. 215 Ibid., p. 310. 87 promovendo, por isso, efeitos do mundo jurídico, introduziu modificações significativas no parâmetro tributário. Com efeito, suas consequências se projetarão para o futuro, não podendo ser admitido, na conjuntura jurídica do Brasil, a propensão de efeitos a situações pretéritas. Neste sentido, confere-se que a LC 118 foi promulgada em 09/02/2005, gerando, por isso, propensão nas ações ajuizadas a partir 9 de junho de 2005, ratificando o que se considera como ―fato futuro‖. Logo, os requerimentos de restituição efetuados posteriormente a entrada em vigor da referida lei que modificou a contagem do prazo prescricional nas ações de repetição de indébito. Vislumbra-se que a dogmática mais sensata da verdadeira interpretação do art. 3º da lei complementar depreende-se do momento em que se considera ―extinto o crédito tributário‖, pois através desta visualização é que será possível definir quando se iniciará a contagem refletida pela LC 118/2005 em interpretação aos artigos do CTN. Sendo assim, melhor se adéqua o consentimento expandido por Fabiana Del Padre Tomé, em seus estudos a cerca do tema. Para a doutora, o art. 3º deve apenas atingir os pagamentos indevidos que foram configurados sob a égide de sua vigência, passando o termo inicial das ações de repetição ser considerado quando da extinção prevista pelo Código Tributário.216 A Lei Complementar 118/2005, em art. 4º, dispõe o seguinte enunciado: Art. 4°. Esta Lei entra em vigor 120 (cento e vinte) dias após sua publicação, observado, quanto ao art. 3°, o disposto no art. 106, inciso I, da Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966 — Código Tributário Nacional. O Tribunal Federal Regional da 4ª Região, em apreciação ao artigo em comento, incidentalmente declarou inconstitucional os arts. 3º e 4º da lei complementar por ter, em tese, ofendido o princípio da irretroatividade das leis. Ora, o preceito do art. 4º nem precisaria ter sido transcrito, uma vez que o art. 106, I do CTN já havia disciplinado a questão ao explanar que ―em qualquer caso, caso seja expressamente interpretativa, excluída a penalidade de infração a dispositivos interpretados a lei aplica-se a atos e fatos pretéritos‖.217 Sendo assim, o art. 3º da LC 118/2005, que expressamente se caracteriza como autointerpretativa, já teria aplicação retroativa, cabendo apenas a positivar um conceito jurídico preexistente, seja qual aquele em que define que as normas interpretativas têm natureza retroativa. 216 TOMÉ, Fabiana Del Padre. Restituição do indébito tributário. In: CARVALHO, Aurora Tomazini de. (Org.). Decadência e Prescrição em Direito Tributário. MP: São Paulo, 2008, p. 286. 217 BRASIL. Código Tributário Nacional. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.Art. 106, I. 88 Poderia se alegar que o art. 3º não tem caráter interpretativo. Esta visão deve ser apresentada com cautela e devida investigação, senão vejamos. O próprio artigo se referencia como interpretativo, embasado na autorização que o Código Tributário dispensou. O art. 165 do CTN trata da possibilidade de repetição de indébito. Ele diz que é possível que o sujeito passivo pleiteie a restituição dos valores indevidamente pagos do tributo. Em outro aspecto, o art. 168 do mesmo diploma enuncia que o direito para pleitear este direito a restituição extingui-se em cinco anos da data de extinção do crédito. Bem, será que o Código Tributário já dizia qual era esta data da extinção do crédito? Retorna-se ao que convém o CTN: Art. 156. Extinguem o crédito tributário: (...) VII – o pagamento antecipado e a homologação do lançamento nos termos do disposto no art. 150 e seus §§ 1º e 4º (...). Em relação ao período em que é feito este pagamento e a homologação, dispõe o art. 150, §§ 1º e 4º: Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa. § 1°. O pagamento antecipado pelo obrigado nos termos deste artigo extingue o crédito, sob condição resolutória da ulterior homologação do lançamento. (...) § 4º. Se a lei não fixar prazo à homologação, será ele de 5 (cinco) anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado este prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito (...). Percebe-se que a condição imposta pelo código é ―resolutória‖ e não suspensiva, restando à Administração responsável, quanto ao § 4º apenas a hipótese de ausência de pagamento, pela qual será efetivado por meio do lançamento de ofício. Ou seja, é um prazo meramente decadencial caso não seja atingido o que define o parágrafo anterior. Desta feita, parte da doutrina acata que o próprio Código Tributário Nacional já resolvia a questão imposta pelo art. 3º da Lei Complementar 118/2005, apesar de reconhecer que existem interpretações divergentes respeitáveis, mas contraditórias, que ensejaram na necessidade de editar normas interpretativas. Cumpre ressaltar, que nem por isso havia uma interpretação uma, pacificada, e assim, os arts. 3º e 4º da LC 118/2005 se ativeram a elucidar que o código sempre solucionou de tal forma e tal maneira. Eis a razão de dizer que a lei complementar tem cunho interpretativo, não vindo a inovar no ordenamento jurídico. Eis que então se pondera a análise concretizada pelo Poder Público, que sem sombra de dúvida, se beneficia com a tese sustentada pela novel lei complementar. 89 4.6 A MANUTENÇÃO DA SEGURANÇA JURÍDICA PERANTE O ADVENTO DA LC N. 118/2005 A priori, desde o ano de 1995, quando em julgamento do ERESP 43.152, a 1ª Seção do STJ firmou entendimento no sentido do reconhecimento da prescrição dentro dos dez anos restou consolidado, pacificando o assunto. Desde então, não houve qualquer alteração em relação a este tema de prescrição, sendo, inclusive, reafirmada no julgamento do ERESP 435.835, ocasião em que o STJ passou a desconsiderar outras teses sugeridas no âmbito daquele corte, relacionadas à contagem do prazo prescricional. Após inúmeras tentativas de alteração deste sólido entendimento jurisprudencial, ainda sim a Administração Pública, se utilizando seu poder de legislar fez editar a Lei Complementar nº. 118 de 2005, cujo art. 3º, que alega ser interpretativo, nos termos do art. 106 do Código Tributário, tentou reduzir o prazo prescricional de cinco anos, com efeitos retroativos, logo, atingindo, também, um número considerável de ações que ainda estão em curso. Entretanto, pelo que se depreende do art. 3º, há uma imposição quanto à extinção do crédito tributário, passando a ocorrer, nos casos dos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado e não posteriormente à homologação daquele. Em razão do pretenso caráter interpretativo, como bem destacou o estudioso Paulo de Barros Carvalho,218 o art. 4º da mesma lei complementar prescreve a sujeição do art. 3º ao comando do art. 168, I do CTN, nos termos dos quais a lei interpretativa retroage, aplicando aos fatos pretéritos. Ou seja, pretendeu com a LC nº. 118/2005 criar uma prescrição retroativa que, em tudo e por tudo é reprovada no cenário jurídico democrático vigente. Defende-se, como Sacha Coêlho,219 que o Poder Público pretendeu usurpar função predominantemente judiciária, atribuindo ao Poder Legislativo a competência daquele em interpretar as leis promovidas pelo legislativo. Sabe-se que este aspecto seria inviável, diante da afronta ao princípio da separação dos poderes. A possível distorção conferida pela norma complementar resguardou um propósito específico de tentar superar uma hermenêutica uniforme no excelso Superior Tribunal, na interpretação da sistemática da contagem do prazo prescricional das ações, que objetivam a 218 219 Cf. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. Cf.COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. 90 recuperação dos tributos recolhidos indevidamente. A respectiva lei complementar infere um conteúdo interpretativo, que, no entanto, vai de encontro não somente com o reiterado posicionamento do STJ, mas com a própria lógica do sistema tributário e dos tributos lançados por homologação. Firmou-se na corte especial do STJ, que a lei complementar em estudo não se apresenta como meramente interpretativa, pois inovou no ordenamento pátrio, e sua retroatividade implica em ofensa à segurança jurídica, certeza do direito e ao princípio da separação dos poderes. 4.6.1 A segurança jurídica no texto da Constituição Federal de 1988 Em parâmetros constitucionais, a segurança jurídica é ressaltada sob três diferentes ângulos: como princípio, como valor e como direito fundamental.220 Inicialmente, a Carta Magna incube, já no seu preâmbulo, em estabelecer a segurança jurídica como componente da estrutura jurídica, social, econômica e política do país. Não obstante essa menção introdutória, ao longo de seu corpo textual a segurança novamente é destacada, expressamente no art. 5º, caput, talvez com a finalidade de revelar que ali a ―segurança‖ está tratada de forma generalizada, mas ainda sim essencial, afirmando, portanto, sua natureza valorativa. Ao introduzir a segurança jurídica entre as funções que tutelam, garantem e protegem os direitos dos indivíduos, restou configurada sua conotação principiológica, surgindo, novamente, a precisa exposição no dispositivo relacionado às garantias e direitos fundamentais da Constituição.221 Finalmente, sem maiores considerações extensas, visto que já resta sedimentado que o tratamento proporcionado pela Constituição Federal de 1988 preconizou a imprescindibilidade da segurança jurídica nas relações individuais coletivas, sua natureza fundamental se tornou viabilizada pela inscrição do art. 5º, especificamente em seu inciso XXVI, consagrando-a intrinsecamente como elemento de direito fundamental. 220 Cf. DELGADO, José Augusto. O princípio da segurança jurídica. Supremacia constitucional in palestra proferida no XXI Congresso Brasileiro de Direito Constitucional – “O Direito Constitucional do Século XXI‖, realizado em São Paulo pelo Instituto Brasileiro de Direito Constitucional – IBDC, 21 de maio de 2005. Disponível em: < http://bdjur.stj.jus.br/xmlui/handle/2011/448>. Acesso em 26 out 2010. 221 DELGADO, op. cit. 91 4.6.2 Noções gerais sobre o princípio da segurança jurídica A sistemática quanto ao tema ora exposto é de imensurável progressão diante do regime democrático atual. A cerca dele, tem os especialistas se deleitado a fim de garantir a melhor e mais adequada solução que fortaleça a sua aplicabilidade, uma vez que os flagelos do universo jurídico se disseminam, afastando seus efeitos mensurados, ensejando, por isso, instabilidades que não aperfeiçoam o Estado democrático de Direito. A didática suscitada por estudiosos, como J.J Gomes Canotilho222, reflete a mais perfeita consonância com a lógica necessária dos princípios que regem o Estado e dos ditames estruturais que sinalizam o Direito Constitucional. Neste sentido, despacha o autor: Partindo da idéia de que o homem necessita de uma certa segurança para conduzir, planificar e conformar autônoma e responsalvemente a sua vida, desde cedo se considerou como elementos constitutivos do Estado de Direito os dois princípios seguintes: - o princípio da segurança jurídica; - o princípio da confiança do cidadão. Com efeito, a segurança jurídica remete a outros dois paradigmas consubstanciados na sistemática geral do princípio da proteção jurídica: o princípio da determinabilidade das leis, que cuidadosamente vincula às leis a um conteúdo claro e denso e, ao princípio da proteção da confiança, repercutindo na imputação de leis não lesivas de previsibilidade e calculabilidade dos cidadãos relativamente aos seus efeitos jurídicos.223 A importância e necessidade que prescindem da sujeição à segurança jurídica decorrem da própria natureza que o tributo possui. Já dizia Roque Antonio Carrazza que a exigência iure imperii224 do tributo naturalmente salta aos olhos quanto à relevância da imposição deste instituto na tributação. Ora, por se tratar de atuação vinculada da autoridade competente, incorrendo em ausência da participação efetiva do contribuinte quanto à apuração contenciosa, não poderia esquivar-se o legislador de conferir ao contribuinte o devido respaldo protetivo quanto aos possíveis exageros eminentes. Desta feita, é mister a amplitude concedida pela Constituição ao tratar do tema, vinculando o contribuinte aos amparos dos direitos fundamentais diretamente conveniada com o sistema de tributação pelo qual será sujeitado. 222 CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional. Coimbra: Livraria Almedina. 1991. p. 375/76. DELGADO, José Augusto. O princípio da segurança jurídica. Supremacia constitucional in palestra proferida no XXI Congresso Brasileiro de Direito Constitucional – “O Direito Constitucional do Século XXI‖, realizado em São Paulo pelo Instituto Brasileiro de Direito Constitucional – IBDC, 21 de maio de 2005. Disponível em: < http://bdjur.stj.jus.br/xmlui/handle/2011/448>. Acesso em 26 out 2010. 224 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 26 ed. São Paulo: Malheiros. 2010. p. 412. 223 92 Canotilho discorre brilhantemente que a segurança jurídica confere aos seus coobrigados não somente um respaldo extrínseco, mas amplifica e dinamiza a ―capacidade do cidadão poder (e dever) confiar nos seus atos ou nas decisões públicas incidentes sobre os seus direitos, posições jurídicas e relações, praticados de acordo com as normas jurídicas vigentes, pelos quais se ligam os efeitos jurídicos duradouros, previstos ou calculados com base nessas mesmas normas‖.225 Neste ínterim, pode-se considerar finalmente que a segurança jurídica prescinde de preceitos constitucionais, vangloriados a partir da proteção da confiança, capazes de objetivar, principalmente, o impedimento da retroatividade das normativas jurídicas, a imutabilidade dos julgados e a irrevogabilidade dos atributos constitutivos de direito. 4.6.3 A segurança jurídica na tributação Percorridas as nuances que justificam a necessária garantia da segurança jurídica nas relações que ora se encontram os indivíduos, em contraposição às manipulações e os abusos que porventura venham a obstar o regular patrocínio da justiça, configura-se medida atuante uma proteção que vai além do mero inconformismo social. Carrazza226 leciona que o princípio da segurança jurídica garante a prevenção, a certeza e a ciência quanto às consequências que advirem das controvérsias que lhe derem causa. No âmbito tributário, o renomado autor prescreve que os objetivos elevados buscam intimidar a Fazenda Pública dos atos que possam manipular e subjetivar os direitos e critérios que os contribuintes fazem jus. Por caracterizar a lealdade que os indivíduos conquistam em relação ao Direito, a segurança jurídica se manifesta em meio aos princípios norteadores da certeza e igualdade imprescindível para a configuração do Estado de Direito. Neste diapasão são inferidos os princípios da tipicidade fechada, do exclusivismo, da vinculação do lançamento à lei, da interpretação da lei, da igualdade, da confiança na lei fiscal, bem como na boa-fé do contribuinte.227 Sendo assim, a competência do Poder Público não pode se sobrepor ao interesse arrecadatório, muito menos ao ―estatuto do contribuinte‖228, uma vez que a deslealdade do Fisco não pode ensejar em prejuízos aos direitos fundamentais. Com efeito, esta é a 225 CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional. Coimbra: Livraria Almedina. 1991. p. 375/76. CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 26 ed. São Paulo: Malheiros. 2010. p. 450. 227 Cf. op. cit. 228 Cf. op. cit. 226 93 interpretação concebida pela aplicação do art. 146 do Código Tributário Nacional 229, que limita a atuação discricionária do órgão competente, padronizando o respeito quanto à exposição do contribuinte em relação aos infortúnios da relação jurídica tributária. 4.6.4 A repercussão da retroatividade do art. 3º da LC 118/2005 no princípio da segurança jurídica Está consignado que a edição normativa da lei complementar 118 de 2005 no ordenamento jurídico ultrapassou os conceitos da interpretatividade de outra norma infralegal. Restou visualizado que a mera alegação de caráter interpretativo não configura necessariamente que determinada lei possui um perfil capaz de atingir feitos anteriores à sua promulgação. Haja vista a imputação do art. 4º, do referido diploma, quanto à retroatividade dos efeitos desta lei complementar no universo tributário, a matéria não configurou superada, mas na verdade, ressuscitou tema demasiadamente debatido e já consolidado perante a jurisprudência pátria. Esse reavivamento de posições e controvérsias caracterizou a instigante discussão sobre a repercussão prática do princípio da segurança jurídica nos litígios em curso. Não obstante a vasta previsão pela qual a Constituição concede à segurança jurídica, ainda sim, a massa legislativa entendeu por bem resgatar, por meio da edição de uma novel lei, que, de antemão, escapa de sua real característica, assumindo superficialmente uma roupagem inversa daquela que realmente transparece algo que carece de certeza jurídica quanto às suas finalidades. Com estas relevantes considerações que se presta a mensurar os inúmeros prejuízos que a recente norma proporcionara àqueles que não se sujeitara aos seus deleites. Isto porque a alterações legislativas ultrapassaram o aspecto meramente interpretativo, derrubando ―por terra‖ toda uma lógica e estudos jurídicos consubstanciados em longos debates nos tribunais. Ciente de que, em matéria tributária, o individuo padece diante da primazia que o ente estatal manipula, Roque Antonio Carrazza230 destaca que a segurança jurídica deve estar pautada nos ditames regiamente fixados, sinalizando o espaço limítrofe em que a atuação do poder competente pode se efetivar, sem, contudo, afastar a proteção e respeito ao direito do contribuinte. Neste contexto, se posiciona: 229 230 BRASIL. Código Tributário Nacional. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.Art. 146. CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 26 ed. São Paulo: Malheiros. 2010. p. 453. 94 (...) as pessoas têm o direito subjetivo de só serem consideradas sujeitos passivos de tributos: a) previstos, expressa ou implicitamente, na Constituição; b) criados legislativamente, em total sintonia com os ditames que ela consagra; e c) após a ocorrência de seus fatos imponíveis (...). O liame interpretativo emprestado à LC 118/2005 escapou da conciliação entre o ―devidamente possível‖ com o ―juridicamente apropriado‖. Ou seja, a interpretação legal deve atender a uma exegese equilibrada, equânime, capaz de concatenar os interesses momentâneos, ocasionais, retrós e futuros, sem desvairar na incredibilidade suscitada231. Isto acarreta, lamentavelmente, no enfraquecendo da segurança jurídica e da estrutura do Estado. Percebe-se que a pretensão do que dispõe o art. 4º em relação ao art. 3º da LC 118/2005 enquadra-se em uma ―pseudo-interpretação‖ a fim de efetivamente alterar o Código Tributário Nacional e materializar um mecanismo de diminuir o prazo prescricional nas ações de repetição dos tributos lançados por homologação, inclusive para as ações aforadas anteriormente à edição da lei complementar em comento. Veja-se que parece intencional a fixação do texto normativo complementar em ver garantida a modificação jurisprudencial consolidada a mais de dez anos, na expectativa de afastar as conclusões contrárias aos interesses da Fazenda Pública. E assim cumpre destacar que a rejeição à tese do Superior Tribunal de Justiça viola não somente a segurança jurídica, mas também, o senso comum e jurídico do hermeneuta, no sentido de que ―o direito não socorre aos que dormem‖. Não se pode olvidar que as consequências trazidas pela norma buscam agraciar aquele que se demonstra inerte; aquele que não se desincumbiu do ônus de homologar os pagamentos e que deseja criar situação além das vantagens e prerrogativas que o crédito tributário já dispõe. Paradoxalmente, em nenhum instante foram aprimoradas pela lei complementar a incerteza, a insegurança e a angústia que a nova sistemática de devolução de pagamento nos tributos lançados por homologação geraria em detrimento dos direitos do contribuinte e como seus efeitos seriam representativos. A lealdade da relação tributária, a integridade do sistema normativo e o papel das jurisprudências estão em jogo, esperando todos os contribuintes que estes princípios sejam preservados, sem desmerecer o conteúdo de cunho inovador e de questionável natureza interpretativa elencada pela LC 118 de 2005. Com efeito, tem-se ainda que uma lei com um 231 FUX, Luiz. Do prazo prescricional para o exercício do direito de o contribuinte pleitear a compensação/repetição do indébito referente a tributos sujeitos a lançamento por homologação: manutenção da cognominada tese jurisprudencial dos “cinco mais cinco” a despeito do advento da Lei Complementar n. 118/2005. Produção intelectual dos ministros. BDJur, Brasília, DF, 27 maio 2008. Disponível em: <http://bdjur.stj.gov.br/dspace/handle/2011/17128>. Acesso em 15 mai 2010. 95 quórum constitucional qualificado, como é o processo de aprovação da lei complementar, não pode ser simplesmente retroagida, afetando fatos incontroversos. 4.6.5 A manutenção da segurança jurídica nos julgados atuais Tratando-se, como se trata, de tributo sujeito a lançamento por homologação, não ocorrido o pagamento antecipado, a prescrição da ação de repetição de indébito – conforme jurisprudência pacífica do Egrégio Superior Tribunal de Justiça já vastamente fundamentada – tem por termo inicial a data da extinção do crédito tributário, que somente ocorre com o transcurso do prazo decadencial de cinco anos contados da ocorrência do fato gerador (homologação tácita, art. 156, VII, do CTN), ao qual se deve acrescer os cinco anos previstos no art. 168 do CTN. Assim dispõe a regra dos cinco mais cinco. Neste sentido, restam prescritas as parcelas anteriores aos dez anos, contados do ajuizamento da ação. Não se ignora que com a edição da Lei Complementar 118/2005 não há mais que se falar em ―cinco mais cinco‖ na contagem do prazo prescricional, pois assim interpretou o art. 3º dessa lei. Com efeito, também não se desconhece que o art. 4º, segunda parte, da mencionada Lei determina a aplicação retroativa do seu art. 3º, de sorte a alcançar fatos passados. Destarte as inovações suscitadas, a Corte Especial do Colendo Superior Tribunal de Justiça, por meio da Arguição de Inconstitucionalidade nos ERESP 644736/PE232, declarou a inconstitucionalidade da aplicação retroativa do mencionado dispositivo – por ofensa ao art. 2º da CF/88 (que consagra a autonomia e independência do Poder Judiciário em relação ao Poder Legislativo), bem assim ao inciso XXXVI do art. 5º, que resguarda, da aplicação da lei nova, o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada - entendendo que a tese dos ―cinco mais cinco‖ prevalece para as ações de repetição de indébito que se refiram às situações ocorridas até 9 de junho de 2005. A par disso, assentou aquela Corte que, ―tratandose de preceito normativo modificativo e, não simplesmente interpretativo, o art. 3º da LC 118/2005 só pode ter eficácia prospectiva, incidindo apenas sobre situações que venham a ocorrer a partir de sua vigência‖ 233. 232 233 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. ERESP 644736/PE. 1ª Seção. Relator Min. Teori Albino Zavascki. Julgamento 28.11.2007. DJ 17.12.2007. Ibid., Argüição de Inconstitucionalidade nos Embargos de Divergência em REsp. 644.736/PE, Relator Min. Teori Albino Zavascki. Julgamento 06.06.2007. DJ 17.12.2007. 96 No mesmo patamar, o eminente Ministro Celso de Mello, do STF, em decisão monocrática, consignou que a norma em exame ―somente pode ter eficácia para fatos geradores ocorridos a contar de 09.06.2005, sendo sua aplicação retroativa inconstitucional, como já decidiu o STJ no Recurso Especial n. 719.101‖ 234. Cumpre ressaltar que, antes da manifestação da Corte Especial do STJ, foram prolatados alguns acórdãos por órgãos fracionários daquele Tribunal, que, embora reconhecendo a impossibilidade de retroação, consideravam, equivocadamente, que o art. 3º da Lei Complementar n. 118/2005 aplicava-se apenas às ações ajuizadas posteriormente a sua vacatio legis, e não a fatos geradores ocorridos a contar da sua vigência. Tal questão restou superada com o exame de constitucionalidade pela Corte Especial, órgão que detém atribuição para tanto, naquele Colendo Tribunal Superior, quando se assentou que a lei nova só pode alcançar fatos geradores futuros, não se aplicando aos fatos geradores anteriores a 9 de junho de 2005. Por último, e a propósito de tudo quanto aqui se examinou, confiram-se os seguintes julgados, in verbis: PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. TRIBUTÁRIO. COMPENSAÇÃO. IMPUTAÇÃO EM PAGAMENTO. ART. 354 DO CÓDIGO CIVIL. INAPLICABILIDADE. TRIBUTO SUJEITO AO LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. PAGAMENTO INDEVIDO. ARTIGO 4º, DA LC 118/2005. DETERMINAÇÃO DE APLICAÇÃO RETROATIVA. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONTROLE DIFUSO. CORTE ESPECIAL. RESERVA DE PLENÁRIO. MATÉRIA DECIDIDA PELA 1ª SEÇÃO, NO RESP 1002932/SP, JULGADO EM 25/11/09, SOB O REGIME DO ART. 543-C DO CPC. 1. O princípio da irretroatividade implica a aplicação da LC 118/2005 aos pagamentos indevidos realizados após a sua vigência e não às ações propostas após a mesma, tendo em vista que a referida norma pertine à extinção da obrigação e não ao aspecto processual da ação. 2. A Primeira Seção, quando do julgamento do REsp. 1002932/SP, sujeito ao regime dos "recursos repetitivos", reafirmou o entendimento de que "O advento da LC 118/05 e suas conseqüências sobre a prescrição, do ponto de vista prático, implica dever a mesma ser contada da seguinte forma: relativamente aos pagamentos efetuados a partir da sua vigência (que ocorreu em 09.06.05), o prazo para a repetição do indébito é de cinco anos a contar da data do pagamento; e relativamente aos pagamentos anteriores, a prescrição obedece ao regime previsto no sistema anterior, limitada, porém, ao prazo máximo de cinco anos a contar da vigência da lei nova." (RESP 1002932/SP, Rel. Ministro Luiz Fux, julgado em 25/11/2009) 3. Isto porque a Corte Especial declarou a inconstitucionalidade da expressão "observado, quanto ao art. 3º, o disposto no art. 106, I, da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional", constante do artigo 4º, segunda parte, da Lei Complementar 118/2005 (AI nos ERESP 644736/PE, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, julgado em 06.06.2007). 4. In casu, a recorrente, que impetrou o presente mandamus em 26/08/2005, pugna pelo reconhecimento do 234 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Ação Civil Originária – ACO 981/RS, Tutela Antecipada, DJ de 0803-2007, p. 30. 97 prazo prescricional decenal, porquanto o Tribunal de origem entendeu ser aplicável à espécie o prazo quinquenal, merecendo reforma, nesse particular, o acórdão recorrido, para reconhecer a inocorrência da prescrição relativamente aos pagamentos efetuados nos 10 anos imediatamente anteriores ao ajuizamento da ação, com observância do critério de contagem do prazo prescricional acima explicitado. (...) 15. Recurso especial parcialmente provido, tão-somente para determinar a aplicação do prazo prescricional decenal. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008‖ (grifo nosso).235 ―RECURSO ESPECIAL DA UNIÃO. OMISSÃO. NÃO-OCORRÊNCIA. CONTRIBUIÇÃO PARA O FUNDO DE SAÚDE DO EXÉRCITO - FUSEX. NATUREZA JURÍDICA TRIBUTÁRIA. PRECEDENTES. PRESCRIÇÃO. TESE DOS "CINCO MAIS CINCO". JUROS MORATÓRIOS. LEGALIDADE DA APLICAÇÃO DA TAXA SELIC. RECURSO DESPROVIDO. 1. Não há omissão a ser sanada no julgado impugnado. Isso, porque o Tribunal a quo decidiu a lide apresentando satisfatoriamente os motivos de seu convencimento. Consoante orientação firmada no Superior Tribunal de Justiça, não é necessário que o órgão julgador se manifeste sobre todas as questões trazidas pelas partes, desde que o entendimento adotado seja suficiente para decidir a controvérsia, como ocorreu na hipótese dos autos. 2. Esta Corte Superior já firmou orientação no sentido de que a contribuição para o Fundo de Saúde do Exército - FUSEX -, em razão da sua compulsoriedade, possui natureza tributária, de modo que não pode ter sua alíquota fixada ou alterada por ato infralegal. Precedentes: REsp 692.277/SC, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 27.6.2007; REsp 761.421/PR, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 1º.3.2007; REsp 789.260/PR, 1ª Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, DJ de 19.6.2006. 3. A Primeira Seção desta Corte, a partir do julgamento dos EREsp 435.835/SC (Relator para o acórdão o Ministro José Delgado, julgados em 24.3.2004), adotou o entendimento de que o prazo prescricional para propor ação de repetição de indébito de tributos sujeitos a lançamento por homologação inicia-se decorridos cinco anos, contados a partir do fato gerador, acrescidos de mais um qüinqüênio, computados a partir do termo final do prazo atribuído à Fazenda Pública para aferir o valor devido referente à exação – tese dos "cinco mais cinco". 4. Registre-se, ainda sobre o assunto, que a Corte Especial, na sessão de 6 de junho de 2007, ao julgar a Argüição de Inconstitucionalidade nos EREsp 644.736/PE, declarou, por unanimidade, a inconstitucionalidade da expressão "observado, quanto ao art. 3º, o disposto no art. 106, inciso I, da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional", constante do art. 4°, segunda parte, da Lei Complementar 118/2005. Assim, prevalece a tese dos "cinco mais cinco" para as ações de repetição e compensação de valores indevidamente recolhidos a título de tributo sujeito a lançamento por homologação, desde que se refiram a situações ocorridas até 9 de junho de 2005. 5. No tocante aos juros moratórios, a jurisprudência consagrada nesta Corte de Justiça delineia que, na restituição tributária, seja por repetição em pecúnia, seja por compensação, são devidos juros de mora. Em se tratando de valores reconhecidos em sentença cujo trânsito em julgado ocorreu em data anterior a 1º de janeiro de 1996, aplicam-se os juros moratórios previstos no Código Tributário Nacional, de um por cento (1%) ao mês, a partir do trânsito em julgado (arts. 161, § 1º, e 167, parágrafo único, do CTN). De 1º de janeiro de 1996 em diante, aplica-se apenas a taxa SELIC, instituída pela Lei 9.250/95, referente a cada recolhimento indevido. 6. Recurso especial desprovido ― 236. (destaque não original) ―TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. PRESCRIÇÃO. IRRETROATIVIDADE DA LEI COMPLEMENTAR 118/05. ACORDO COLETIVO DE TRABALHO. SUPRESSÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. NATUREZA INDENIZATÓRIA. CORREÇÃO MONETÁRIA. 235 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 960.39/SC. 1ª Seção. Relator Min. Luiz Fux. Julgamento 09.06.2010. DJ 24.06.2010. 236 Ibid., REsp. 764.526/PR, Relatora Min. Denise Arruda, 1ª Turma, julgamento 22. 04 .2008. DJ 07.05.2008. p. 1. 98 1. Nos casos em que o lançamento do tributo se processar por homologação tácita, nos termos do art. 150, § 4º, do Código Tributário Nacional, a contagem do prazo prescricional de que trata o art. 168, I, do CTN somente começa a fluir após o decurso de cinco anos do pagamento antecipado do tributo, ocasião em que se dá a efetiva extinção do crédito tributário vinculado a condição resolutiva. Portanto, torna-se exigível a restituição do tributo indevido, dentro do decêndio anterior à propositura da ação. 2. A aplicabilidade da LC 118/2005 se restringe aos tributos cuja extinção, pelo pagamento antecipado (art. 3º), ocorreu após o início da vigência da mencionada norma, pois, admitir-se a retroatividade da norma para as situações consumadas anteriormente à sua vigência, quando se entendia a extinção do crédito tributário somente quando da homologação, expressa ou tácita, seria aceitar a retroatividade em prejuízo aos contribuintes. (...) 7. Apelação e remessa oficial a que se dá parcial provimento ―237·. (destaque não original). Frise-se que ascendendo a discussão referente à tese dos ―cinco mais cinco‖ ao Supremo Tribunal Federal, por meio do Recurso Extraordinário n. 566621/RS238, pretende-se por a termo e concretizar finalmente todas as considerações ora apreciadas, pormenorizando cada aspecto ressaltado pela Lei Complementar 118 de 2005, merecendo, portanto o adequado crivo final, em obediência às normas e aos princípios constitucionais, que imperam sob a guarda e proteção desta Corte Suprema. 237 238 BRASIL. Tribunal de Justiça de Minas Gerais. AC 2005.38.00.020349-5/MG, Relatora Desembargadora Federal Maria Do Carmo Cardoso, 8ª Turma, DJ de 18/01/2008, p.200. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 566621/RS. Pleno. Relatora Min.Ellen Gracie. Julgamento sobrestado. Aguardando voto-vista Min. Eros Grau. 99 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Conforme observado ao longo da pesquisa, a Lei Complementar 118/2005 adveio da necessidade de um novo diploma que fosse capaz de adequar os procedimentos do sistema tributário nacional às nuances do processo falimentar e de recuperação judicial e extrajudicial. Face às tendências da nova ordem tributária conscrita na análise dos doutos julgadores, os princípios constitucionais do contribuinte foram postos à prova diante da inovação legislativa. Não se pode olvidar que a mudança teve repercussão, também, nas reiteradas interpretações jurisprudenciais, capazes de enfraquecer leis e fortalecer valores. Neste sentido, restou consubstanciado que o referido diploma legal inseriu no sistema normativo pátrio o retrocesso jurídico, afastando-se do objetivo maior do âmbito jurídico, qual seja a segurança jurídica dos resultados já atingidos. Para tanto, o enfraquecimento das consolidadas teses dos tribunais superiores prioriza a insatisfação nos resultados e uma justiça banalizada e eivada de incoerências e dúvidas. Todavia, diante de todo o aparato legal tributário, que até então estabelecia os meios suficientes para a solução de controvérsias a cerca da contagem dos prazos nos tributos lançados por homologação, ainda sim foi manejada norma complementar capaz de interferir nos enunciados legais já vigentes e, principalmente, nas situações já amplamente decididas e consignadas. Estas nuances somente foram possibilitadas com a vigência dos arts. 3º e 4º da LC 118 de 2005. Exatamente neste condicionamento legal que tem se suscitado inúmeros debates, tanto na doutrina como na jurisprudência. Inclusive, as interpretações ressaltadas pelas cortes judiciais estão sob a tentativa de se tornarem meros resquícios, diante da manobra do Poder Legislativo em editar norma com ―caráter interpretativo‖. A reputação que a retroatividade do referido dispositivo da LC 118/2005 em questão gera incertezas quanto a sua validade é contumaz. O patamar de discussão transcende o âmbito conceitual do direito adquirido, mas esbarra no aspecto quanto à coisa julgada, correspondendo à reiterada jurisprudência da Corte. No mesmo sentido, não se poderia entender que o legislador pudesse expandir em suas pretensões interesses que repercutissem nas ações em trânsito ou já decididas, se submetendo, de imediato, ao prazo reduzido, sem qualquer regra de transição. Com um mínimo de senso jurídico, é cristalino que há ofensa ao conteúdo do princípio da segurança jurídica. Restou evidente que, se, de um lado, não haveria 100 dúvida de que a proteção das situações jurídicas consolidadas em ato jurídico perfeito, direito adquirido ou coisa julgada constituiria imperativo de segurança jurídica, concretizando o valor inerente a tal princípio, de outro, também seria certo que teria esta abrangência maior e que implicaria resguardo da certeza do direito, da estabilidade das situações jurídicas, da confiança no entrave jurídico. De igual modo, não seria possível fulminar, de imediato, prazos então em curso, sob pena de irrefutável violação à garantia de acesso ao Judiciário e à segurança jurídica de suas decisões. Sendo, assim, manteve-se amplamente divulgado no presente trabalho que há o dissenso quanto à retroatividade da novel norma complementar, destacando, especificamente o aspecto quanto à aplicabilidade do art. 3º da LC 118/2005, que deveria ser apenas considerada nas ações promovidas posteriormente ao término do período de vacatio legis, mas, na verdade, aos próprios fatos ocorridos após esse momento. A divergência culmina justamente nesta fase de aplicação, já que é enfatizado que a LC 118/2005 não encontra óbice em retroagir seus efeitos, uma vez que suas disposições apenas acompanharam os enunciados do Código Tributário Nacional, em sentido contrário ao que preceitua o Poder Judiciário, ente responsável pela verdadeira interpretação das normas do ordenamento jurídico, que diante de tese contrária, a renomada tese dos ―cinco mais cinco‖, está sob a eminente decisão de ter seus precedentes redirecionados, sob o liame de ter inovado no ordenamento. O que se esclareceu é que a retroatividade não agrada aos direitos fundamentais do contribuinte, atestando que, muito mais que apenas contradizer posicionamento dos eminentes especialistas tributários, é agraciar o ordenamento jurídico com as discricionariedades do legislativo, sem nem mesmo atentar-se apara os ditames basilares do Estado de Direito. À guisa de arremate final é interessante ressaltar, sobretudo, que o instituto da segurança jurídica não deve ser desprovido de conotação prática. É, pois, evidente que ele deve atuar como forma de concretização dos valores jurídicos adequados às soluções mais justas possíveis. E, com efeito, o que se deve ponderar é que a manutenção deste princípio não pode ser submetida às diretrizes da simples lógica jurídica ou do mero agrado à Fazenda Nacional, capaz de se restabelecer situação retrógada. A perseverança na consolidação do assunto visa somente resguardar garantias já pactuadas e protegidas pela Carta Magna, no sentido de dinamizar e promover o correto recolhimento de tributos, satisfazendo, tanto aos direitos do contribuinte, quanto ao Sistema Fiscal Nacional, dentre outros aspectos. 101 REFERÊNCIAS ALEXANDRE, Ricardo. Direito tributário esquematizado. 4. ed. São Paulo: Método, 2010. ALVES Moreira. SIMPÓSIO NACIONAL DE DIREITO TRIBUTÁRIO, VII, out. 1982, CEU/SP. Relatório. In: Caderno de Pesquisas Tributárias. São Paulo: RT, n. 8, 1983. p. 408-413. AMARAL, Francisco. Direito Civil: Introdução. 6. ed. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar, 2006. AMARO, Luciano. Ainda o problema dos prazos nos tributos lançáveis por homologação. In: REZENDE, Condorcet (Org.). Estudos Tributários. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 359379. ______. Direito Tributário Brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11. ed. 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