Raquel Freitas
Raquel Freitas é actualmente investigadora de pós-doutoramento no
Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES) do Instituto
Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL), a trabalhar sobre Eficácia da
Ajuda ao Desenvolvimento. Tem um Doutoramento em Ciências Sociais e Políticas pelo European University Institute, sobre o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados. Tem sido também
consultora das Nações Unidas na área da Ajuda Humanitária e Apoio
aos Refugiados.
Estudo sobre Ajuda Humanitária
e de Emergência em Portugal
Raquel Freitas
Investigadora no Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES)
do Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL)
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal Raquel Freitas
ÍNDICE
5
Lista de Acrónimos
7
Sumário Executivo
11Introdução
14Metodologia
16
Ajuda Humanitária e de Emergência: pilares de uma estratégia negligenciada
17
Contexto normativo – os princípios que regem a AHE
19
Contexto político nacional e internacional
23
Contexto institucional e operacional
25
Impacto da ausência de estratégia e de coordenação
27
Impacto da falta de previsibilidade no financiamento
28
A sociedade civil e Ajuda Humanitária e de Emergência
28
Perfil geral de actividade da sociedade civil portuguesa no âmbito da AHE
29
Funcionamento em rede internacional
30
Dilema da concentração geográfica e especialização
32Financiamento
34
Planeamento e resposta de emergência
34
Colaboração entre ONGD
35
Sensibilização da opinião pública, imagem e comunicação
36
Controlo de qualidade e divulgação de resultados
38
Recomendações: pilares de uma estratégia a considerar
38
Princípios e Conceito de AHE
39
Enquadramento político e institucional
42Financiamento
44
Promoção de padrões de qualidade e melhoria ao nível da implementação
45
Aprendizagem e prestação de contas
46
O contributo da Sociedade Civil
50Anexos
51
Anexo I: Termos de Referência
58
Anexo II: Lista de entidades contactadas
59
Anexo III: Bibiografia consultada
63
Anexo IV: Links Úteis
Estudo sobre Ajuda Humanitária
Lista de Acrónimos
e de Emergência em Portugal
Lista de Acrónimos
ADDHU - Associação de Defesa dos Direitos Humanos
ADRA - Associação Adventista para o Desenvolvimento, Recursos e Assistência
AHE - Ajuda Humanitária e de Emergência
AMI - Assistência Médica Internacional
APD - Ajuda Pública ao Desenvolvimento
ASP - Associação Saúde em Português
CAD - Comité de Ajuda ao Desenvolvimento da OCDE
CICL - Camões, Instituto da Cooperação e da Língua
CERF - Central Emergency Response Fund
CNPCE - Conselho Nacional de Planeamento Civil e Emergência
CVP - Cruz Vermelha Portuguesa
ECHO - European Commission Humanitarian Office
FGS - Fundação Gonçalo da Silveira
GAHE - Grupo de Trabalho sobre a Ajuda Humanitária e de Emergência
GHD - Good Humanitarian Donorship
INSARAG - International Search and Rescue Advisory Group
IPAD - Instituto Português de Apoio ao Desenvolvimento
5
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
LRRD - Linking Relief, Rehabilitation and Development (ligação entre emergência, reabilitação e desenvolvimento)
MAI – ANPC - Ministério da Administração Interna, Autoridade Nacional de Protecção Civil
MAI - Ministério da Administração Interna
MdM-P - Médicos do Mundo - Portugal
MDN - Ministério da Defesa Nacional
MDN-DGPDN - Ministério da Defesa Nacional, Direção-Geral de Política de Defesa Nacional
MNE - Ministério dos Negócios Estrangeiros
OCDE - Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico
OCHA - UN Office for the Coordination of Humanitarian Affairs
OGE - Orçamento Geral do Estado
OIM - Organização Internacional para as Migrações
ONGD - Organizações Não-Governamentais para o Desenvolvimento
ONU - Organização das Nações Unidas
PALOP - Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa
PCM - Presidência do Conselho de Ministros
PE - Parlamento Europeu
PIC - Programas Integrados de Cooperação
UE - União Europeia
UMP - União das Misericórdias Portuguesas
UNDAC - United Nations Disaster Assessment and Coordination
URD - Grupo de Urgência, Reabilitação e Desenvolvimento
6
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Estudo sobre Ajuda Humanitária
e de Emergência em Portugal
Raquel Freitas 1
s
Sumário Executivo
O presente estudo tem como objectivos principais actualizar a informação
relativamente a princípios e práticas de Ajuda Humanitária e de Emergência
(AHE) em países terceiros e fornecer as bases para a discussão de um possível
modelo de estratégia nacional para esta área.2
As suas conclusões reforçam a ideia já partilhada por diversos sectores ligados
à AHE, de que é imperioso que o Estado português consiga estruturar
as actividades desenvolvidas no âmbito da sua ajuda humanitária e de
emergência. Tal estratégia justifica-se por três ordens de razão principais:
/ Consagração no plano nacional de princípios internacionais relativos à AHE
e compromissos assumidos pelo Estado português.3 Seria desejável aproveitar o
facto de ainda não existir uma política consolidada para esta área, para transpor as
normas do Consenso Europeu sobre Ajuda Humanitária4 e dos Princípios e Boas
Práticas do Doador Humanitário (GHD)5 para o panorama nacional, conforme
recomendado pelo Comité de Ajuda ao Desenvolvimento da Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Económico (CAD-OCDE)6.
1
A autora gostaria de agradecer à Plataforma Portuguesa das ONGD, e ao Grupo de Trabalho de AHE o apoio na
recolha de informação, e de agradecer também a todas as entidades que contribuiram com a sua disponibilidade para
a realização deste estudo.
Para uma definição utilizada pelas ONGD, ver secção sobre Ajuda Humanitária e de Emergência, em Plataforma
Portuguesa das ONGD (2012) Ajuda Humanitária e de Emergência. In Guia das ONGD da Plataforma, disponível em
http://plataformaongd.pt/conteudos/documentacao/documentos/centrodocumentacao/486/Publica%C3%A7%C3%B5es%20
Plataforma/Guia%20das%20ONGD.pdf, acedido em 17/07/2012.
2
Ver em links úteis em anexo.
3
Comissão Europeia (2007). Para um Consenso Europeu em matéria de Ajuda Humanitária. COM(2007) 317 final, disponível
em http://ec.europa.eu/echo/files/policies/consensus/acte_pt.pdf, acedido em 17/07/2012; European Union (2008), The
European Consensus on Humanitarian Aid , Joint Statement by the European Council, the European Parliament and
the European Commission, EU, Brussels, http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2008:025:0001:00
12:EN:PDF acedido em 17/07/2012
4
Princípios e Boas Práticas do Doador Humanitário, disponível em http://www.plataformaongd.pt/conteudos/documentacao/
documentos/centrodocumentacao/1011/Princ%C3%ADpios%20e%20%20Boas%20Pr%C3%A1ticas%20do%20Doador%20
Humanit%C3%A1rio.pdf, acedido em 17/07/2012. Subsequentes referências a estes documentos no texto serão
abreviadas por “Consenso Europeu” e “GHD” (Good Humanitarian Donorship) respectivamente.
5
6
DAC-OECD (2010), DAC Peer Review of Portugal 2010, disponível em: http://www.ipad.mne.gov.pt/CooperacaoDesenvolvimento/
ExameCADCooperacaoPortuguesa/Documents/exame%20do%20cad%20Portugal.pdf, acedido em 17/07/2012.
7
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
/ Clarificação de papéis dos vários actores envolvidos em AHE e dos
mecanismos de interacção, designadamente ao nível da coordenação das
actividades, sobretudo em situações de emergência.
/ O financiamento da AHE tem-se pautado pela dispersão e falta de
previsibilidade numa área em que os elevados custos e a necessidade de
preparação antecipada exigem algum grau de previsibilidade.
A existência de uma política clara para a AHE compensaria a escassez de
financiamento e demonstraria vontade política em fazer um esforço credível
nesta área, aproveitando a imagem positiva do contributo quer da sociedade
civil quer dos organismos do Estado em situações como o Tsunami no
Sudoeste Asiático em 2004, ou o terramoto no Haiti em 2010. A existência de
uma estratégia também asseguraria continuidade na direcção dos esforços,
numa área cada vez mais profissionalizada e sofisticada a nível internacional.
A natureza imprevisível das emergências impõe a manutenção de alguma
flexibilidade que permita adequar a resposta à situação concreta, mas exige
também canais de comunicação bem delineados e informação disponível
sobre a intenção do Estado português relativamente ao tipo de envolvimento
em cada circunstância.
Para além disso existem outras actividades na área de ajuda humanitária que
são de natureza distinta da resposta de emergência, que também carecem
de financiamento, como a prevenção de riscos de desastre natural; a ligação
entre alívio, reabilitação e desenvolvimento (LRRD)7, ou ainda as chamadas
crises esquecidas. Tal financiamento pode e deve ser disponibilizado numa
base de maior previsibilidade, mantendo e desenvolvendo uma massa crítica
de capacidades na área de AHE. Idealmente existiria um fundo ou linha de
financiamento alocado entre as várias dimensões da AHE para actividades
de preparação e de resposta, conforme o desenrolar das necessidades, como
é o caso em vários países doadores.
A continuação da situação presente, marcada pela ausência quer de uma
estratégia global quer de qualquer planeamento anual para AHE, conduz a
uma visibilidade negativa de Portugal nos fóruns internacionais, para além
de prejudicar a eficácia do contributo português nesta área. Apesar de em
situações pontuais Portugal ter demonstrado bons resultados operacionais e
ser reconhecido nesse âmbito, é importante não perder de vista o impacto
7
LRRD é a abreviatura em inglês para a Ligação entre Emergência, Reabilitação e Desenvolvimento (Linking Relief,
Rehabilitation and Development) e será utilizada no texto em substituição da designação completa em português.
8
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
da não conformidade da AHE com os princípios internacionais em termos
de visibilidade do contributo português. Estes princípios nem sempre são
conhecidos de todas as entidades do Estado que desenvolvem actividades
nesta área.
No que diz respeito à sociedade civil, existem limitações e potenciais que
podem ser corrigidas e aproveitados, designadamente nas seguintes áreas:
potencial incremento do funcionamento em rede internacional; vantagens
e desvantagens da concentração geográfica e especialização; opções de
financiamento; formas de planeamento e resposta de emergência; colaboração
entre Organizações Não-Governamentais para o Desenvolvimento (ONGD);
formas de sensibilização da opinião pública, imagem e comunicação;
melhoria do controlo de qualidade e divulgação de resultados.
Assim, uma possível estratégia nacional de ajuda humanitária deverá ter em
conta as seguintes questões essenciais:
/ Incorporação de princípios de direito internacional humanitário e de boas
práticas nessa matéria, promovendo os direitos das populações afectadas em
todas as fases de resposta.
/ Criação de mecanismos de coordenação em situações de emergência
através de um Plano de Contingência a nível nacional.
/ Estabelecimento de mecanismos de financiamento que equilibrem a
flexibilidade de libertação de fundos em situações de emergência com
a previsibilidade que permita actividades de preparação, prevenção e
financiamento de acção humanitária para além das emergências.
/ Reforço da capacidade institucional do Estado e da sociedade civil quer
ao nível operacional, quer ao nível dos conhecimentos sobre a especificidade
da ajuda humanitária e ainda criação de confiança e comunicação entre
instituições de natureza diferente.
9
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Carrefour, Haiti
Distribuição de água potável
às vítimas do terramoto.
ADRA Internacional. 2010
10
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Introdução
Este estudo é um contributo para a reflexão relativamente à ajuda
humanitária e de emergência (AHE) em Portugal, identificando os principais
constrangimentos e oportunidades que se colocam a entidades públicas e
sociedade civil com actividade nesta área. Para além de fornecer uma
análise sobre a situação existente e as opções de configuração de uma futura
estratégia nacional de acção humanitária, o estudo pretende demonstrar a
importância desta área de actuação para o Estado português e sensibilizar
para a necessidade de desenvolver uma abordagem estruturada para a AHE.
A AHE é orientada por considerações marcadamente distintas das de
outras áreas de política externa. Por um lado ela é guiada por princípios
internacionais de direito humanitário, plasmados em diversos instrumentos
jurídicos internacionais com os quais os Estados, incluindo Portugal, se
comprometeram. Por outro lado, ela deve ser orientada pela resposta a
necessidades básicas que permitam: i) salvar vidas; ii) alívio do sofrimento
humano; iii) manter a dignidade humana. Finalmente, a natureza sensível
das actividades no âmbito da AHE faz com que haja uma preocupação
particular em isolá-la dos interesses nacionais específicos do país doador, não
só por determinação dos princípios e normas internacionais, mas também
para assegurar a eficácia das actividades desenvolvidas no terreno no sentido
da melhoria das condições das populações mais necessitadas de assistência
ou protecção humanitária.
Não se deve deixar de considerar que a participação em esforços
internacionais de AHE representa também um valor acrescentado
para o país que contribui. Verificou-se ao longo da década de 2000 uma
tendência de expansão da agenda humanitária, um aumento do empenho
dos doadores a um nível estratégico e um aumento dos contributos dos
doadores tradicionais, de novos países doadores para esta área e ainda do
sector privado. No entanto, e apesar do terramoto no Haiti e das cheias no
Paquistão, que em 2010 mobilizaram vastos financiamentos, os dados desse
11
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
ano apontam já para um abrandamento da tendência de aumento devido à
crise económica e financeira.8 A importância política da agenda humanitária
é ilustrada pela inclusão no exame inter-pares do CAD da OCDE, de uma
secção autónoma dedicada exclusivamente à AHE, o que permite aferir a
conformidade do país doador relativamente aos compromissos assumidos
nesta área, contribuindo assim para uma visibilidade positiva ou negativa do
mesmo junto aos seus pares, consoante as conclusões do exame.9
Portugal é membro da União Europeia; presentemente é membro nãopermanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas; desenvolveu em
2007 um trabalho louvável enquanto Presidência da União Europeia (UE),
no âmbito da qual inclusive se destaca o facto de ter negociado o Consenso
Europeu sobre Ajuda Humanitária; pretende candidatar-se ao Conselho dos
Direitos Humanos para o triénio 2015-2017. São apenas alguns exemplos
que demonstram o envolvimento de Portugal em questões internacionais, e
a prioridade que sempre tem sido dada à promoção dos direitos humanos e
resolução de conflitos, incluindo também esforços na área da AHE.
A opinião pública portuguesa tem-se revelado muito sensível a situações que
carecem de AHE, com um historial rico em manifestações de boa vontade e
solidariedade com outros povos. No entanto as respostas dadas por Portugal
nesta área também se têm caracterizado pela dispersão e falta de orientação
estratégica relativamente à maximização do potencial dessa boa vontade.
Adicionalmente regista-se uma falta de priorização sistemática desta área,
materializada na escassez de financiamento disponível para AHE, o qual é
de resto, o mais baixo de entre os países do CAD da OCDE em termos de
percentagem de Ajuda Pública ao Desenvolvimento (APD).10
A actual situação económica nacional e internacional representa um
constrangimento importante que origina dilemas relativamente às
recomendações que se podem esperar deste estudo. Sendo certo que não
se esperam aumentos imediatos de financiamento para AHE, procurouse perspectivar as opções disponíveis em dois momentos: no curto prazo,
identificação de outras acções que poderiam colmatar essa dificuldade,
designadamente pela racionalização e sistematização de procedimentos
8
Development Initiatives (2011), Global Humanitarian Assistance Report 2011, disponível em http://www.
globalhumanitarianassistance.org/report/gha-report-2011, acedido em 17/07/2012.
9
Para mais informação sobre os exames inter-pares do CAD-OCDE, ver Freitas, Raquel (2012) Os exames inter-pares
e a Eficácia do Desenvolvimento. In Oliveira, Ana Filipa e Proença, Fátima (eds.), in Portugal E África: Melhor
Cooperação, Melhor Desenvolvimento ACEP: Lisboa http://www.acep.pt/portals/0/BlogueMelhorCoop/MCMD_
versao%20Online.pdf, acedido em 17/07/2012.
10
Op. Cit. Nota 6.
12
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
através de uma política estruturada que oriente a AHE de acordo com os
padrões internacionais; a médio prazo recomendando a identificação clara
de montantes para esta área e formas de os afectar.
Face a esta limitação em termos de recursos disponíveis, torna-se ainda mais
relevante pensar uma política estruturada de AHE que maximize o potencial
dos recursos existentes e os enquadre no contexto dos princípios a que o
Estado português se comprometeu e das prioridades de política externa
que defende em fóruns internacionais. Este estudo procurará traçar o perfil
da situação actual de AHE em Portugal, identificar quais os actores com
intervenção na área de AHE e seu potencial de acção, propondo finalmente
eixos de reflexão sobre áreas com potencial de virem a configurar uma
política na área de AHE.
13
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Metodologia
A análise aqui desenvolvida assenta na recolha de informação sobre o
contexto nacional e internacional da ajuda humanitária e recorre a fontes
primárias e secundárias para informar a argumentação apresentada. Entre
as fontes primárias encontram-se os contactos directos através de entrevistas
com funcionários das instituições ligadas à AHE, quer da sociedade civil quer
das entidades oficiais relevantes que foi possível entrevistar.11 Foi também
aplicado um questionário online às ONGD que são membros da Plataforma
Portuguesa das ONGD, para obter informação relativamente ao mapeamento
das actividades realizadas no âmbito da AHE. Nem todas as ONGD
relevantes responderam ao questionário, pelo que o alcance dos resultados é
apenas ilustrativo, e serve para complementar a informação obtida através de
entrevistas semi-estruturadas com as ONGD mais activas nesta área. 12
Como fontes secundárias recorreu-se à consulta da documentação oficial
portuguesa, europeia e internacional que regula princípios e operacionaliza
metodologias de intervenção em AHE, bem como avaliações de boas práticas
de outros países, e ainda a literatura analítica sobre as implicações das
políticas existentes. Na comparação com outros países houve a preocupação
de limitar o âmbito aos países que têm volumes de APD dedicados à
ajuda humanitária a níveis semelhantes ao de Portugal, para garantir a
comparabilidade ao nível de escala e foram retirados também exemplos de
boas práticas, designadamente pela consulta dos relatórios dos exames interpares do CAD da OCDE.13
11
Ver lista em anexo. Nota adicional: optou-se por não nomear directamente as entidades consultadas ao longo do relatório.
12
Treze ONGD preencheram o questionário, que constituem a base da análise que se segue, e como tal apenas aplicável
a este universo muito restrito. Trata-se pois de uma análise que pretende apenas dar uma perspectiva geral sobre dados
mais salientes que se extraem das respostas e que foram considerados relevantes para os objectivos do presente relatório.
A informação aqui contida combina análise do questionário online, com entrevistas semi-estruturadas a algumas
ONGD (ver lista em anexo). Às ONGD associadas da Plataforma que responderam ao questionário juntam-se os dados
de entrevistas em profundidade com algumas delas e com duas que não fazem parte da Plataforma das ONGD.
13
Lista de exames inter-pares do CAD-OCDE disponível em
en_2649_34603_46582825_1_1_1_1,00.html, acedido em 17/07/2012).
14
http://www.oecd.org/document/41/0,3746,
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Sendo a ajuda humanitária uma área de enorme complexidade e multiplicidade
de iniciativas e processos, e tendo em conta a necessidade de síntese para
este estudo, a recolha de informação foi estruturada tendo em vista uma
resposta muito direccionada aos objectivos gerais e específicos dos termos de
referência do estudo, pelo que uma parte da informação de enquadramento
é preferencialmente remetida para a literatura secundária e para o elenco de
boas práticas constantes de manuais internacionais sobre AHE.14
A recolha de informação e a elaboração do presente relatório decorreu no
segundo semestre de 2011, embora por motivos supervenientes só tenha sido
finalizado em 2012.
14
Ver anexos III e IV
15
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Ajuda Humanitária e de Emergência:
pilares de uma estratégia negligenciada
As linhas de orientação existentes relativamente à AHE disponibilizada por
Portugal a países terceiros foram definidas no documento de orientação
estratégica da cooperação portuguesa de 2005, aqui designado por Visão
Estratégica.15 No entanto pouco se seguiu em termos de operacionalização
dessa estratégia ao nível de AHE. Apesar disso pode dizer-se que Portugal se
rege por um pilar normativo, consolidado pela assunção de compromissos
relativos a instrumentos internacionais que regulam a ajuda humanitária
e de emergência, e por um pilar institucional com experiências de sucesso
no terreno e marcado por uma diversidade de entidades com valências
diferentes. Assim, segundo a Visão Estratégica, “a acção humanitária na
Cooperação Portuguesa orienta-se fundamentalmente para o apoio em
situações de catástrofe natural e de calamidade pública, da qual resultem
necessidades acrescidas de apoio para as populações locais.”16
A ausência de uma política clara para esta área limita a ligação entre estes
dois pilares e impede que se retire o devido partido da experiência acumulada
e das potenciais sinergias entre os vários interlocutores. A escassez de
financiamento e a indefinição de montantes para AHE são factores ainda
mais penalizadores para a eficácia das acções nesta área e também para a
imagem de Portugal junto dos seus pares enquanto país doador.
15
16
MNE-CICL (2006) Uma Visão Estratégica para a Cooperação Portuguesa, Documento aprovado em RCM
196/2005, 22 de Dezembro de 2005. Disponível em http://www.ipad.mne.gov.pt/CooperacaoDesenvolvimento/
EstrategiaCooperacaoPortuguesa/Documents/Visao_Estrategica_editado.pdf, acedido em 17/07/2012.
Idem, p. 54.
16
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Contexto normativo – os princípios que
regem a AHE
Os princípios básicos que orientam a AHE são os da Humanidade (objectivo
primordial de salvar vidas e aliviar sofrimento humano), Imparcialidade (acção
prestada exclusivamente com base em necessidades e sem discriminação
entre as populações), Neutralidade (não favorecer nenhuma das partes num
conflito), Independência (ajuda prestada independentemente de objectivos
políticos, económicos, militares ou outros de qualquer dos actores que
intervêm na zona afectada).
Estes princípios estão consagrados em diversos instrumentos internacionais
a que Portugal aderiu, desde as Convenções de Genebra, que configuram o
direito internacional humanitário, ao Consenso Europeu sobre a Ajuda ao
Desenvolvimento e os Princípios e Boas Práticas do Doador Humanitário
(GHG). Estes últimos são os documentos de referência da AHE a nível europeu
e devem ser transpostos para o nível nacional, sendo os países membros da UE
avaliados relativamente a essa transposição. Os princípios básicos da AHE são
já reconhecidos na Visão Estratégica, e o Camões, Instituto da Cooperação
e da Língua (adiante designado como CICL) refere os GHD e o Consenso
Europeu sobre Ajuda Humanitária como orientação, mas não há a tradução
destas normas num instrumento nacional.17 Há a referir que Portugal produziu
documentos estratégicos em áreas específicas, que fazem referência a acção
humanitária, mas não concretizam a relação entre essas áreas e AHE.18
Para além dos princípios consagrados no direito internacional, a natureza
sensível da ajuda humanitária implica que também as boas práticas operacionais
devam assumir um carácter normativo, que oriente a actuação no terreno de
acordo com linhas e padrões aceites internacionalmente.19 Duas prioridades
operacionais assumem o estatuto de norma, consagrada no Consenso Europeu,
designadamente a prontidão e eficácia das respostas. Por outro lado, sublinha-se
que a ajuda deve ser disponibilizada com base nas necessidades, não constitui
um instrumento de gestão de crises, deve ser oportuna e apropriada e não deve
causar impactos negativos nas populações afectadas pela situação.
17
Ver website do IPAD sobre a AHE:
http://www.ipad.mne.gov.pt/CooperacaoDesenvolvimento/AjudaHumanitaria/Paginas/default.aspx, acedido em 17/07/2012.
18
Plano Nacional para a Implementação da Resolução da ONU sobre Mulheres, Paz e Segurança (http://www.
un.org/womenwatch/ianwge/taskforces/wps/nap/Plano_Nacional_Accao_1325.pdf) e a Estratégia Nacional sobre
Segurança e Desenvolvimento (http://www.portugal.gov.pt/pt/GC17/Governo/Ministerios/MNE/Programas_e_Dossiers/
Pages/20090826_MENE_Prog_Est_Seguranca_Desenvolvimento.aspx ), acedidos em 17/07/2012.
19
Ver lista de links úteis em anexo.
17
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
O enorme esforço de reforma do sistema humanitário das Nações Unidas
é o reflexo desta tendência para uma crescente exigência da conformidade
da ajuda humanitária internacional não só com os princípios mas também
com as boas práticas, onde entre outras foram reforçadas as capacidades de
articulação e coordenação das várias entidades que desenvolvem actividades
de AHE ao nível internacional.
A definição de ajuda humanitária plasmada nos princípios GHD reafirma
claramente não só princípios de intervenção mas também objectivos
distintos da ajuda humanitária relativamente à ajuda ao desenvolvimento,
ou seja salvar vidas, aliviar o sofrimento humano e manter a dignidade
humana em situações de desastre humano ou catástrofes naturais. A ajuda
humanitária concretiza-se em actividades de protecção física e de direitos
humanos, mas também actividades de assistência material a civis afectados
pela emergência. O GHD sublinha ainda a dimensão preventiva em relação
a tais eventualidades.
Assim, podemos considerar no âmbito da AHE as situações de emergência;
as acções que se enquadram no âmbito da prevenção, designadamente, a
prevenção de conflitos e de desastres naturais; as acções destinadas a dar
resposta na transição entre alívio, reabilitação e desenvolvimento (LRRD); e
as acções que se desenrolam no âmbito das chamadas crises esquecidas, ou
seja situações de necessidade humanitária que se prolongam no tempo sem
uma resposta sustentável.
O princípio da independência da ajuda humanitária é particularmente
importante e tal é reconhecido quer na Visão Estratégica quer pelas
ONGD portuguesas no sentido de evitar a instrumentalização política
da AHE e impedir que a mesma seja integrada como contrapartida
de interesses políticos ou militares. Assim, no Tratado de Lisboa a ajuda
humanitária assume estatuto de política de pleno direito o que implica
uma autonomização em relação a outros objectivos políticos da UE.20 O
Parlamento Europeu (PE) sublinhou recentemente que a ajuda humanitária
não é um instrumento de gestão de crises e que deve haver maior informação
relativamente ao Consenso da UE sobre ajuda humanitária junto do Serviço
Europeu de Acção Externa e dos intervenientes militares, assim como
da protecção civil.21 A utilização de meios e capacidades militares e de
20
Tratado de Lisboa (2007), disponível em http://europa.eu/lisbon_treaty/index_pt.htm, acedido em 17/07/2012.
21
Parlamento Europeu (2010), PROJECTO DE RELATÓRIO sobre a aplicação do Consenso Europeu em matéria de
Ajuda Humanitária: avaliação intercalar do seu plano de acção e perspectivas futuras (2010/2101(INI)), disponível em
http://www.europarl.europa.eu/meetdocs/2009_2014/documents/deve/pr/830/830651/830651pt.pdf, acedido em 17/07/2012.
18
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
protecção civil deve ser feita em último recurso, sublinhando a distinção de
mandatos e recomendando que os meios e capacidades militares só sejam
utilizados em situações muito limitadas e em último caso de acordo com as
directrizes das Nações Unidas.22 A preservação do “espaço humanitário”,
ou seja, a capacidade de os actores humanitários disponibilizarem ajuda de
emergência e protecção às populações afectadas, tem sido uma preocupação
crescente por parte das organizações humanitárias no terreno, embora tal
preocupação não seja necessariamente comprovada em todos os casos.23
Da mesma forma, também a selectividade com que a ajuda humanitária é
disponibilizada, com um direccionamento de fundos predominantemente
para determinadas situações onde há interesses políticos, tem sido objecto
de debate, sendo os dados efectivos pouco conclusivos.24
Contexto político nacional e
internacional
Tem-se verificado uma tendência de aumento muito significativo do número
e da intensidade das catástrofes naturais, originadas, nomeadamente, pelo
impacto das alterações climáticas. Também se assiste a um aumento dramático
das crises decorrentes de insegurança alimentar. Para além disso têm-se
multiplicado as chamadas crises complexas, com perturbações generalizadas
da lei e ordem, movimentações forçadas das populações, violações sistemáticas
de direitos humanos e aumento da violência sexual como arma de guerra.
A UE no seu conjunto é o primeiro doador de ajuda humanitária no
mundo, e tem respondido a este aumento das necessidades que requerem
respostas de natureza humanitária. A sua contribuição representa mais
de 40% da assistência humanitária internacional oficial, tendo a média
da UE (Estados membros + Comissão Europeia) relativamente à APD
vindo a crescer sistematicamente excepto em 2009, ano em que teve uma
22
Directrizes MCDA: Directrizes sobre a utilização de meios das forças armadas e da protecção civil para apoiar
operações humanitárias de emergência complexas levadas a cabo pelas Nações Unidas (Março de 2003), disponível
em http://www.coe-dmha.org/Media/Guidance/3MCDAGuidelines.pdf, acedido em 17/07/2012.
Directrizes de Oslo: Directrizes sobre a utilização de meios das forças armadas e da protecção civil na resposta
internacional a catástrofes (Novembro de 2007), disponível em http://www.unhcr.org/refworld/docid/47da87822.html,
acedido em 17/07/2012.
23
Collinson, S. e S. Elhawary (2012), Humanitarian Space: a Review of Trends and Issues, HPG Reports 32, disponível em
http://www.odi.org.uk/resources/details.asp?id=6425&title=humanitarian-space-principles-aid, acedido em 17/07/2012.
24
Binder, Martin (2009), Humanitarian Crises and the International Politics of Selectivity. Human Rights Review 10:327-348
Setembro 2009, disponível em http://search.ebscohost.com/login.aspx?direct=true&db=aph&AN=43103419 acedido em
17/07/2012.
19
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
redução significativa.25 Os doadores não tradicionais têm sido os que mais
têm aumentado os seus contributos para ajuda humanitária.26 Portugal
enquanto membro da UE e do Comité de Ajuda ao Desenvolvimento da
OCDE (CAD-OCDE) assumiu compromissos internacionais em termos de
volume de APD e deve reger-se pelos padrões definidos por estas instituições.
De acordo com a OCDE, no período 2007-2009 Portugal foi de longe o
membro do CAD que menos contribui para a ajuda humanitária, com
apenas 0.17% da sua APD destinada a essa finalidade, quando a média do
CAD se situa nos 9.2%.27 Isto representa 14 vezes menos do que a proporção
que é dada pelo menor doador de APD, a Grécia.
As dificuldades económicas que se fazem sentir pela Europa e em particular em
Portugal sugerem que no curto prazo pouco se poderá fazer para inverter esta
situação. No caso específico de Portugal o panorama torna-se mais confrangedor
na medida em que para além de os montantes disponibilizados serem cada vez
menos, não existe a menor previsibilidade em relação a montantes mínimos
para AHE, nem uma noção de como eles deverão ser disponibilizados. A
estratégia seguida tem sido sempre a de não-estratégia, ou seja ausência de
atribuição programática de financiamento para permitir atribuições esporádicas
em situações de emergência, acompanhada de uma ausência de coordenação
sistemática entre as diferentes entidades que intervêm no processo. Neste
contexto de escassez de financiamento torna-se ainda mais importante fazer
uma atribuição estratégica e em linha com os princípios de GHD dos fundos
que possam surgir para esta área, tendo em conta que a eficácia do esforço do
doador assume o valor de norma intransponível nesta área.
Esta ausência de estratégia parece resultar de uma aparente tensão mal
resolvida entre o contexto normativo e o chamado interesse nacional. Essa
tensão resulta também numa incoerência entre o discurso e a prática que é
prejudicial à imagem de Portugal enquanto país doador.
É um facto que cada situação de emergência tem por base contextos diferentes
e que, se nalgumas situações a ajuda humanitária se prende exclusivamente
com valores de solidariedade e humanidade, noutras situações há interesses
do país doador em causa. Em particular destacam-se situações de desastre
natural em que se encontram vítimas nacionais do país doador, e situações
de conflito em que estão presentes cidadãos do país doador ou em que o país
25
Op. cit. Nota 8 e http://www.globalhumanitarianassistance.org/data-guides/graphs-charts, acedido em 17/07/2012.
26
Harmer, A. e E. Martin (2010), Diversity in Donorship: Field Lessons, HPG Report 30, Overseas Development Institute,
disponível em http://www.odi.org.uk/resources/docs/5876.pdf, acedido em 17/07/2012.
27
Op. cit. nota 10
20
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
doador participa também de alguma forma em missões de natureza militar.
Nestas situações a protecção civil ou a defesa assumem a liderança das
operações mas já não se trata puramente de ajuda humanitária de acordo com
os princípios internacionais. No entanto a tendência é para um esbatimento
desta distinção, quer por interesse político, quer por desconhecimento dos
princípios internacionais, resultando assim em processos de decisão pouco
claros em termos de definição de competências.
Isto significa que o processo de decisão se mantém ad hoc, totalmente
dependente da natureza da emergência e das capacidades identificadas no
momento. Para além de não haver fundos dedicados, também não existem
recursos humanos dedicados, critérios ou procedimentos específicos que
permitam orientar a gestão ou atribuição (eventual) de financiamentos.
Enquanto as normas internacionais promovem a previsibilidade das acções,
o processo de decisão nesta matéria em Portugal privilegia a flexibilidade,
abrindo a possibilidade a considerações políticas, diminuindo o peso da
avaliação de necessidades e da análise da mais-valia do contributo nacional.
Esta forma de intervenção aumenta os riscos de ineficácia e de visibilidade
negativa junto do país receptor de ajuda mas também junto dos outros
doadores bilaterais e multilaterais, afectando a credibilidade do país doador
e eventualmente a sua capacidade de influência em foruns internacionais.
O próprio exame do CAD da OCDE à cooperação portuguesa sublinha as
dificuldades que derivam de não dispor uma política que inclua uma abordagem
estratégica de coordenação dos vários ministérios envolvidos nesta área.28 As
falhas de Portugal ao nível da ajuda humanitária já tinham sido identificadas
no exercício do CAD de 2006 e não foram corrigidas até 2010.29 O exame
de 2010 aponta três aspectos essenciais como recomendações: retirar lições
de envolvimentos recentes em resposta a crises humanitárias, empenhar-se na
criação de mecanismos de coordenação efectiva inter-ministerial desenvolvendo
o modelo do Centro Nacional de Co-ordenação de Operações30, e integrar as
preocupações humanitárias em termos de prevenção de riscos em documentos
como os Programas Integrados de Cooperação (PIC) bem como linhas de
orientação para financiamento, fortalecendo a ligação estratégica com as
28
Da análise feita aos Peer Review do CAD aos 23 países membros, verifica-se que apenas xx países não têm uma estratégia.
29
DAC-OECD (2006), DAC Peer Review of Portugal 2006, disponível em http://www.ipad.mne.gov.pt/CooperacaoDesenvolvimento/
ExameCADCooperacaoPortuguesa/Documents/DAC%20Peer%20Review%202006.pdf, acedido em 17/07/2012, e Op. Cit. Nota 10.
30
Este modelo é descrito no exame do CAD (op. Cit. Nota 10, p. 96), como tendo sido eficaz na resposta ao Tsunami
no Sudoeste Asiático, mas não voltou a ser usado desde então.
21
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
organizações humanitárias.31 Uma constatação importante deste exame
do CAD é a necessidade de abandonar o financiamento por projectos, o
que não é consistente com os princípios de GHD, que apelam a redução do
direccionamento e à provisão de financiamento de mais longo prazo, com maior
previsibilidade e de acordo com a gravidade da crise.
Assim, importa perceber que Portugal não se encontra isolado na sua AHE.
Existem esforços estruturados a nível internacional e sobretudo a nível
europeu, nos quais Portugal deve integrar-se de pleno direito, formulando a
sua estratégia e coordenando acção de forma eficaz. Para além disso interessa
a Portugal, enquanto membro da UE, de estar preparado para adaptar as
ferramentas de trabalho em AHE àquilo que são os critérios europeus. As
dificuldades de financiamento não justificam a ausência de mecanismos para
gerir de forma transparente e de acordo com os princípios internacionais, os
fundos que sejam disponibilizados em ocasiões específicas, ou que venham
no futuro a ser afectos especificamente à AHE. A coordenação no contexto
da UE é cada vez mais uma questão central que também condiciona
acção portuguesa e o exame do CAD assinala a ausência de Portugal dos
mecanismos de coordenação internacional como United Nations Disaster
Assessment and Coordination (UNDAC) ou o International Search and
Rescue Advisory Group (INSARAG).32 Portugal também não figura entre os
vinte principais doadores do Apelo Consolidado Inter-agências da ONU.33
Os esforços de Portugal podem ser potenciados pelo trabalho conjunto
com outros países, designadamente percebendo melhor os canais de acesso
a financiamento conjunto, de que Portugal pode beneficiar aproveitando
as suas competências já demonstradas nalgumas áreas (ex. protecção civil
e a acção de algumas ONGD). Para isso importa identificar as áreas que
para Portugal são prioritárias. Em termos geográficos a identificação é
direccionada para os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP)
e Timor-Leste, onde há reconhecida vantagem comparativa. A existência de
planos de contingência é fundamental para a eventualidade de intervenções
no caso de conflito ou desastre, mas também é importante a colaboração
noutras acções na área de prevenção como a redução de riscos de desastre34,
Op. Cit. Nota 10.
31
32
Comissão Europeia (2010), Mid-term review of the European Consensus on Humanitarian Aid Action Plan, COM(2010)
722 final, http://ec.europa.eu/echo/files/policies/consensus/mid-term_review/1_EN_ACT_part1_v21.pdf, p. 4, acedido em
17/07/2012; e op. cit. nota 10.
33
Ferreira, P. M. (2008), Relatório de Avaliação do Projecto Sensibilização para a Ajuda Humanitária e de Emergência.
34
Hyogo Framework for Action (Hyogo Framework), disponível em http://www.unisdr.org/we/coordinate/hfa, acedido em
17/07/2012.
22
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
assim como o trabalho com Estados frágeis35 e intervenções no âmbito da
ligação entre alívio, reconstrução e desenvolvimento36.
Dada a prioridade política atribuída por Portugal à sua imagem de país orientado
para a promoção dos direitos humanos e da paz, empenhado no envolvimento
eficaz com Estados frágeis e participação activa em esforços internacionais,
incluindo na área da ajuda humanitária, como recentemente reafirmado pelo
Primeiro-Ministro numa reunião no âmbito da ONU, este tipo de lacuna começa
a tornar-se insustentável.37 Daí a pertinência de se dar atenção a esta matéria, até
porque entretanto Portugal participou com eficácia em operações de emergência,
como no caso do Haiti, o que significa que pode ser um actor relevante a nível
internacional, mas para isso precisa de uma estratégia estruturada.
Uma vez reconhecida a prioridade a esta área, importa dar sequência aos dois
desígnios identificados no documento de orientação Visão Estratégica que na
prática ficaram aquém das expectativas: O desígnio de criação de uma linha
de financiamento da ajuda humanitária no CICL suficientemente dinâmica
para responder às necessidades e o desígnio de apostar na coordenação da
ajuda humanitária no plano nacional e internacional.
Contexto institucional e operacional
A natureza descentralizada da cooperação portuguesa para o desenvolvimento
reflecte-se também na ajuda humanitária. Ao nível institucional existe uma
multiplicidade de actores que tem algum tipo de actividade em AHE mas
não existe uma estrutura com competência clara e capacidade operacional
para a coordenação dos esforços.
O Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE), através do Instituto Português
de Apoio ao Desenvolvimento – IPAD (actualmente Camões, Instituto
da Cooperação e da Língua), é a entidade responsável pela coordenação
35
Principios para uma Intervenção Internacional Eficaz em Estados Frágeis e em Situações de Fragilidade, disponível
em http://www.oecd.org/dataoecd/37/60/42332900.pdf, acedido em 17/07/2012.
36
Comissão Europeia (2001), Interligação entre ajuda de emergência, reabilitação e desenvolvimento – avaliação, COM (2001) 153 final,
disponível em http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=COM:2001:0153:FIN:PT:HTML, acedido em 17/07/2012.
37
Temos procurado que essas iniciativas reflictam igualmente a prioridade que concedemos à defesa e promoção dos Direitos Humanos,
aos assuntos humanitários e à protecção de civis. E quisemos fazê-lo, promovendo uma colaboração próxima com Organizações Não
Governamentais e uma maior coordenação de esforços entre as Missões das Nações Unidas, da União Europeia e da União Africana.
“ Discurso de Sua Excelência o Primeiro-Ministro de Portugal, Dr. Pedro Passos Coelho, no debate aberto do
Conselho de Segurança sobre “Manutenção da Paz e Segurança: Prevenção de Conflitos” (Nova Iorque, 22.09.2011) http://www.
missionofportugal.org/mop/index.php?option=com_content&view=article&id=428:discurso-de-sua-excelencia-o-primeiro-ministrode-portugal-dr-pedro-passos-coelho-no-debate-aberto-do-conselho-de-seguranca-sobre-manutencao-da-paz-e-seguranca-prevencao-deconflitos-nova-iorque-22092011&catid=55:intervencoes-em-2011&Itemid=131 , acedido a 05/10/2011
23
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
da cooperação para o desenvolvimento, na qual se insere a AHE a países
terceiros, excepto em situações consideradas de interesse nacional, conforme
identificadas acima. Em geral são os MNE que têm esta responsabilidade e que
asseguram que os compromissos assumidos internacionalmente pelo Estado são
respeitados.38 Daí a legitimidade e importância da função de coordenação. A
Visão Estratégica refere a necessidade de coordenação inter-institucional mas
não especifica como é que tal se deverá desenvolver quer ao nível da interacção
com o sector da protecção civil quer com o da emergência medica que são
explicitamente referidos no documento, ou mesmo com a da defesa. Como
nunca foi formalizado o plano para a AHE previsto na operacionalização da
Visão Estratégica, a relação entre as várias entidades mantém-se informal e numa
base caso-a-caso sem procedimentos claros. Também o relacionamento destas
entidades com a sociedade civil tem sido desestruturado, o que se reflecte num
desconhecimento relativamente às actividades das várias entidades envolvidas
na resposta em situações de emergência.
A Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC), do Ministério da
Administração Interna (MAI) é identificada no exame do CAD-OCDE
como o mecanismo central de disponibilização da AHE. Outras instituições
fundamentais identificadas no exame são o Conselho Nacional de
Planeamento Civil e Emergência (CNPCE), na dependência da Presidência
do Conselho de Ministros (PCM) 39, que tradicionalmente assume a
coordenação da resposta em situações de interesse nacional, e o Instituto
Nacional de Emergência Médica, do Ministério da Saúde (INEM). Por
exemplo, no caso do sismo no Paquistão em 2005, o CNPCE coordenou
o envio de 30 toneladas de ajuda (cobertores, tendas, kits de higiene) duas
semanas após o sismo, na sequência de um pedido de um organismo de
coordenação de ajuda humanitária da NATO.40 Curiosamente no relatório
do CAD não é elencado o papel do Ministério da Defesa, onde cada vez há
maior articulação e que tem a seu cargo o principal elemento potenciador
da ajuda que são os meios de transporte aéreos como o C-130, para além
de participar em actividades no âmbito das missões da ONU que incluem
componentes de protecção da ajuda humanitária.
38
Da análise feita aos Peer Review do CAD aos 23 países membros, verifica-se que apesar de nalguns casos haver
também uma dispersão dos centros de decisão, a maior parte dos países tem uma estratégia para AHE e é o MNE
que tem as funções de coordenação.
39
O exame refere uma instituição que parece não existir que é o Conselho Nacional de Emergência e Protecção Civil
do MAI. Presumimos que se trate do CNPCE, uma estrutura sob a alçada da Presidência do Conselho de Ministros,
mas cuja actividade concreta parece ser desconhecida de muitos dos actores na área humanitária.
40
Jornal Público (2005), Portugal envia 30 toneladas de ajuda para o Paquistão, 19/10/2005 http://www.publico.pt/Sociedade/
portugal-envia-30-toneladas-de-ajuda-para-o-paquistao_1236213 acedido a 17/07/2012.
24
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Impacto da ausência de estratégia e de
coordenação
O CICL enquanto instituição com competência de coordenação de AHE vê
a sua tarefa dificultada pela ausência de uma política que defina de forma
clara as competências e interacções entre os diversos agentes envolvidos. Esta
dificuldade é acrescida pelo facto de o mesmo ter pouco peso político no
contexto inter-ministerial, um facto aliás que se reflecte a nível mais amplo
no que diz respeito à cooperação para o desenvolvimento cujos processos de
decisão e de financiamento, se encontram muito descentralizados. Uma boa
parte do poder de decisão sobre afectação de fundos da Cooperação reside
no Ministério das Finanças, que não é o legítimo representante da política
externa mas que de facto têm o maior peso no direccionamento da APD. Por
fim, e por força também das reformas administrativas no aparelho do Estado
em Portugal, o CICL ficou em 2005 sem a unidade que anteriormente era
especificamente destinada à ajuda de emergência, tendo esta sido fundida com
a unidade de apoio à sociedade civil. Isto abriu mais uma brecha na capacidade
institucional da entidade que tradicionalmente detém a coordenação da AHE.
Actualmente, as alterações institucionais em curso não permitem vislumbrar
com clareza os impactos a este nível, mas não se prevê que a situação melhore.
A ausência de estratégia, de clarificação de papéis e de mecanismos de
coordenação perpetua a situação de desconhecimento das competências das
várias instituições e também das potencialidades de cada uma num esforço
integrado de resposta nacional que confira uma visibilidade positiva ao esforço
de Portugal. Isto inclui a interlocução com a sociedade civil, com a qual o
CICL deverá articular e contribuir para estabelecer a ligação com os outros
ministérios. O caso do Tsunami no Sudoeste Asiático foi paradigmático da
proliferação de entidades que oferecem o seu contributo nestas situações e
que frequentemente causa mais confusão do que articulação. Apesar disso,
a intervenção do Estado foi vista como sendo clara, com um orçamento
específico e acabaram por ser identificadas um conjunto de ONGD parceiras
que foram envolvidas. Foi nessa sequência que se procurou também estruturar
melhor o trabalho da Plataforma das ONGD nesta área, formando-se o
Grupo de Trabalho sobre Ajuda Humanitária e de Emergência (GAHE).41
41
A relação entre o GAHE e a Plataforma das ONGD é regulada por um protocolo de 2006: Protocolo de Cooperação
entre a Direcção da Plataforma Portuguesa das ONGD e as ONGD suas associadas que trabalham na área da
Ajuda Humanitária e de Emergência. Os membros actuais do GAHE são ADRA Portugal, OIKOS Cooperação e
Desenvolvimento, Associação Saúde em Português (ASP) e Médicos do Mundo – Portugal.
25
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Por fim, a ausência de estratégia e mecanismos pré-definidos permite muita
flexibilidade e pouca previsibilidade. O processo de decisão sobre intervenções
específicas é articulado a nível político entre gabinetes ministeriais, e só depois passa
ao nível técnico da implementação. Como não há mecanismos de articulação
transversal, através por exemplo de um gabinete de crise, o nível técnico recebe
informação fragmentada que não permite levar a cabo a totalidade das tarefas
exigidas e surgem situações de desarticulação em que não se conseguem identificar
os interlocutores relevantes.42 Em situações de emergência em que a celeridade
é essencial, a falta de diálogo prévio e de preparação, exercícios conjuntos,
programação e identificação de capacidades impedem que o contributo de
Portugal seja mais significativo. Nalguns casos essa falta de articulação pode mesmo
ser detrimental, levando a confusões relativamente ao que é a ajuda humanitária,
designadamente por protecção civil e militares, uma vez que a ajuda humanitária
está presente nas competências de cada uma destas instituições. Cada uma destas
instituições rege-se acima de tudo pela defesa do interesse nacional e tal deve estar
explicitamente afastado das considerações que presidem à definição do auxílio
dado como AHE, que deve ser feito com base nas necessidades efectivamente
identificadas no terreno. Finalmente, a ajuda humanitária não deve ser politizada,
o que além de ser contrário aos princípios GHD, reduz o espaço de actuação
independente das ONGD e coloca mesmo em causa a segurança dos trabalhadores
humanitários, que por vezes são identificados com as forças militares, logo com
uma das partes no conflito.43
Portugal fez um esforço por melhorar a coordenação civil-militar, por forma
a garantir o respeito pelas directrizes de Oslo e pelo direito internacional
humanitário, tendo as ONGD sido envolvidas no processo.44 Trata-se de um
passo importante para garantir a independência das acções e a colaboração
no respeito pelos princípios bem como melhorar a comunicação e a partilha
de lições e compreensão e respeito pelas distintas culturas organizacionais.
42
Uma das consequências é a dificuldade em obter informação sobre quem está a fazer o quê, em que zonas, que
recursos mobiliza, objectivos, parceiros, etc. A dispersão entre actores da sociedade civil mas também entidades
estatais também não facilita a compilação de informação para estudos internacionais, onde Portugal sistematicamente
tem aparecido sem informação, por exemplo em DARA (2010) Humanitarian Response Index 2010, disponível
em http://daraint.org/humanitarian-response-index/humanitarian-response-index-2010/, acedido em 17/07/2012; Spaak, M
e R. Otto (2009) Study on the Mapping of Donor Coordination (Humanitarian Aid) at the Field Level, disponível
em http://ec.europa.eu/echo/files/evaluation/2009/Donor_coordination.pdf, acedido em 17/07/2012. Isto contribui
também para a visibilidade negativa de Portugal enquanto doador, como se pode verificar pelo perfil traçado em
Dara (2011), Humanitarian Response Index 2011: Donor Assessments, disponível em http://daraint.org/wp-content/
uploads/2012/03/Portugal_donor_assessment_HRI_2011.pdf, acedido em 17/07/2012.
43
Para mais informação sobre estudos de caso relativos a esta temática, ver projecto de investigação do Feinstein International
Center, Tufts University: Winning Hearts and Minds? Understanding the Relationship between Aid and Security, disponível em http://sites.
tufts.edu/feinstein/program/winning-hearts-and-minds-understanding-the-relationship-between-aid-and-security, acedido em 17/07/2012.
44
Op. Cit. Nota 10 e Guidelines On The Use of Foreign Military and Civil Defence Assets In Disaster Relief “Oslo Guidelines”, disponível em http://reliefweb.int/sites/reliefweb.int/files/resources/8706B7B69BD77E00C125723300
4F0570-OCHA-Nov2006.pdf, acedido em 17/07/2012.
26
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Impacto da falta de previsibilidade no
financiamento
O financiamento da AHE em Portugal caracteriza-se por oscilações
significativas de ano para ano, sendo a única dimensão estável o contributo
que é dado para o CERF (Central Emergency Response Fund), o qual no
entanto não se enquadra numa estratégia mais ampla.
O facto de não haver uma linha de financiamento específico para AHE deriva
do facto de toda a cooperação para o desenvolvimento em geral dispor de
muito pouco financiamento por não ser uma prioridade nacional. A grande
prioridade da cooperação portuguesa é o relacionamento com os PALOP e
Timor-Leste e as emergências que têm ocorrido nesses países têm sido de
escala relativamente reduzida. Não havendo uma estratégia de AHE ao nível
da prevenção de riscos, que seria desejável, tem sido difícil redireccionar
financiamento da Cooperação para a AHE, e tem-se optado por esperar que
em situações de emergências com grande impacto sejam utilizados fundos
da dotação provisional do Orçamento Geral do Estado (OGE).
A dispersão das fontes de financiamento da cooperação portuguesa por diversos
ministérios, com maior peso no Ministério das Finanças, desvia a centralidade
da capacidade de decisão do órgão mandatado para exercer a coordenação
da cooperação, que é o CICL e faz com que as ONGD portuguesas recebam
uma parte muito reduzida do financiamento disponível. A previsibilidade é
um aspecto que beneficiaria sobretudo o trabalho das ONGD.
O Estado necessita de ter a possibilidade de equilibrar a necessidade de
flexibilidade com previsibilidade. Esta última é fundamental para estruturar as
expectativas dos parceiros, entre eles a sociedade civil. A falta de impedimento
legal a que se financie directamente uma ONGD em caso de emergência tem
possibilitado em situações particulares a atribuição sem concurso, de verbas
a ONGD. Também por esse motivo não tem havido necessidade de criar
acordos de parceria do tipo dos contratos-quadro com o departamento de
Acção Humanitária e Protecção Civil da Comissão Europeia (ECHO) que
identifiquem à partida as ONGD com capacidade e valor acrescentado em
determinadas áreas. No entanto isto prejudica também o desempenho do
Estado, que se compromete internacionalmente a fortalecer a capacidade da
sociedade civil do Norte e do Sul para a área de AHE.
27
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
A sociedade civil e Ajuda Humanitária e
de Emergência
Como vimos, do ponto de vista político há um reconhecimento quer ao nível
internacional quer ao nível nacional da importância do papel da sociedade
civil na AHE. O Consenso Europeu reconhece o papel “dos actores da
sociedade civil, tanto do Norte como do Sul, não só na prestação da ajuda,
mas também no desenvolvimento de políticas que reflictam as verdadeiras
necessidades e preocupações dos parceiros locais do Sul e na obtenção
do apoio dos cidadãos europeus”.45 A Visão Estratégica reconhece que o
elevado número e complexidade de situações de conflito e crise humanitária
conferem um grau acrescido de relevância às actividades de resposta de
emergência, reabilitação e reconstrução enquanto áreas importantes de
actuação das ONGD e outras instâncias da sociedade civil e que esta deve
ser incluída na Educação para o Desenvolvimento.46 No entanto, no caso
português esse reconhecimento não é devidamente traduzido em apoio quer
político quer financeiro.
Perfil geral de actividade da sociedade
civil portuguesa no âmbito da AHE
Apenas treze das sessenta e sete ONGD associadas da Plataforma das
ONGD responderam ao questionário online, estimando-se por isso que o
universo total com actividade em AHE ronde as 15. Isto mostra a escassez
de ONGD a trabalhar nesta área, o que será também um reflexo da falta
de financiamento público e de capacidade operacional para intervir em
situações de emergência. Esta secção do relatório utilizará dados indicativos
que resultam do questionário bem como informação recolhida no âmbito
das entrevistas realizadas.
45
Op. Cit. Nota 5 parágrafo 21.
46
Op. Cit. Nota 15.
28
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
A maioria das ONGD que tem actividade em AHE dedica-se quer a
angariação de fundos quer ao fornecimento de bens e serviços no terreno
(69%), sendo mais reduzido o número de ONGD que faz acções de pressão
e sensibilização para questões de AHE (46%). A maioria das ONGD actua
através de parceiros operacionais no terreno (85%), embora algumas tenham
delegações no terreno (38%).
A fase de intervenção em que mais ONGD desenvolve actividade é LRRD
(77%), seguido da fase de reabilitação (62%), sendo que 62% afirmou
existir articulação entre as suas actividades de AHE e de cooperação para
o desenvolvimento. Esta continuidade é mais frequente no caso dos PALOP
e Timor-Leste uma vez que existe financiamento do CICL no âmbito
da cooperação para o desenvolvimento. Apenas 46% das ONGD que
responderam ao questionário desenvolve actividades na fase de emergência
e 8% tem actividade na área de prevenção e resolução de conflitos.
Existe uma distribuição equilibrada de actividades das ONGD nos vários
sectores operacionais de AHE, com uma predominância no sector da Saúde
(46%). Salienta-se a fraca acção em áreas transversais como a de Género
(8%). Há também ausência de qualquer ONGD com actividade na área
de ambiente/alterações climáticas, embora ao abrigo da Hyogo Framework
for Action exista uma ligação entre alterações climáticas e prevenção de
riscos de desastres, à qual podem ser associados financiamentos através de
mecanismos nacionais e internacionais.47
Funcionamento em rede internacional
Existem vários tipos de envolvimento em trabalho em rede, nos quais o
grau de autonomia das ONGD participantes é variável. Algumas ONGD
portuguesas são delegações nacionais de ONGD internacionais e limitamse a canalizar os fundos recolhidos em Portugal, quer directamente para
delegações locais, quer para o terreno por via dos secretariados internacionais
das suas ONGD. Nestes casos há uma forte relação de confiança no parceiro
local, o qual faz a identificação das necessidades e a partilha com a rede,
possibilitando uma canalização mais célere dos fundos. Por outro lado essa
relação também parece justificar um menor interesse pela avaliação (por
vezes confundida com auditoria ou monitorização) dos projectos nesta área.
47
ISDR (2008), Climate Change and Disaster Risk Reduction, Briefing note 01, disponível em http://www.unisdr.org/files/4146_
ClimateChangeDRR.pdf , acedido em 17/07/2012.
29
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
A participação neste tipo de estruturas internacionais funciona como
uma forma interessante de ONGD que não têm capacidade logística,
canalizarem financiamentos obtidos em resultado de recolhas de fundos
nacionais. Constitui também um enquadramento importante para troca de
experiências a nível operacional e de advocacy, uma vez que algumas ONGD
exercem alguma actividade na área de advocacy e angariação de fundos de
acordo com os parâmetros definidos pela sua rede. Tal participação permite
ainda que, embora com um envolvimento limitado a nível da emergência,
as ONGD possam dar um contributo mais significativo quando a sua rede
elabora o plano de médio prazo para a reabilitação, o qual já é feito com
mais tempo e após missões de identificação de necessidades no terreno. Isto
é particularmente importante para as ONGD que têm um papel na área da
educação ou outros sectores que promovem a ligação LRRD.
Algumas dessas estruturas de dimensão internacional também possuem
fundos de financiamento de emergência que disponibilizam imediatamente,
mesmo antes do apelo internacional. As ONGD portuguesas podem
também beneficiar das estruturas de angariação de fundos internacionais
das suas redes, para implementarem projectos directamente no terreno, em
colaboração com parceiros locais. O trabalho em situações de emergência
exige grande capacidade financeira antecipada porque os tempos de
aprovação de projectos são mais longos do que as 72 horas que são os tempos
de resposta para a fase de emergência. São poucas as ONGD portuguesas
que dispõem de tal capacidade. Com escassez de financiamento a nível
nacional a tendência será para cada vez maior coordenação dos esforços
com o nível internacional para aquelas ONGD que não tiverem capacidade
operacional. As vantagens do funcionamento em rede internacional e a
necessidade de tomadas de decisão rápidas na resposta a emergências fazem
com que algumas dêem pouca atenção aos esforços nacionais, uma vez que
a rede fornece já o enquadramento considerado necessário.
Dilema da concentração geográfica e
especialização
Embora a maioria das ONGD que responderam ao questionário concentre
a sua actividade nos PALOP e Timor-Leste (77%), uma parte significativa
(62%) tem também actividade noutros países, entre eles o Haiti, Paquistão
ou Sri Lanka e na América Latina.
30
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
A tendência para a tradicional concentração nos PALOP e Timor-Leste
é vista por alguns como uma atitude conservadora e por outros como o
investimento numa área de mais-valia para as ONGD portuguesas. A
intervenção humanitária no espaço lusófono é pontual, pelo que poucas
ONGD com actividade nos PALOP e Timor-Leste se dedicam a esta área.
Dado o parco financiamento disponível, há algum receio em relação à
dispersão quer em termos de áreas de actividade quer geográficas e a uma
consequente perda de eficácia.
O caso da resposta ao terramoto no Haiti constitui um exemplo contrário
a esta tendência, em que ONGD portuguesas entraram numa zona
geográfica distinta e até em áreas onde não tinham experiência prévia e
isso contribuiu para uma expansão dos horizontes de trabalho a novas áreas
operacionais. Para tal foi importante não só o apoio do Estado português,
como também o estabelecimento de uma parceria com uma organização
internacional, mostrando bons resultados e conseguindo financiamento para
projectos adicionais. Houve uma colaboração com o Estado português e isso
impulsionou também uma parceria com a Organização Internacional para
as Migrações (OIM), que financia o trabalho de coordenação dos campos,
tendo esta ONGD acabado por ficar com a responsabilidade da gestão de
mais dois campos. Isto representa uma oportunidade de aprendizagem e
capacitação em novas funções e uma eventual área de intervenção futura.
Noutro caso, uma ONGD obteve um financiamento da Agência de
Coordenação da Ajuda Humanitária (OCHA), no âmbito do Fundo de
Resposta de Emergência para implementar um projecto de criação de uma
unidade de saúde familiar no Haiti, segundo o modelo que tem orientado a
reforma dos cuidados de saúde primários em Portugal e que foi considerado
inovador e interessante para o contexto em causa, representando também
a primeira experiência em campos internacionais. Segundo representantes
da organização, trata-se também de uma forma de mostrar ao mundo o
que tem sido feito em Portugal. O projecto é na maior parte financiado pela
OCHA, sendo o restante financiamento oriundo de angariação de fundos
em Portugal à população e empresas.
A especificidade da AHE leva alguns interlocutores a considerar as vantagens
de haver poucas ONGD mas especializadas em ajuda de emergência por
ganhos de eficácia e de escala, designadamente em termos da profissionalização
dessas ONGD. Uma das limitações apontadas em relação à possibilidade de
especialização é a escassez de recursos humanos com competências na área
31
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
humanitária e de emergência e capacitadas para as actividades que lhe são
inerentes. Nas equipas de AHE verifica-se uma distribuição equilibrada entre
profissionais (62%) e voluntários (69%), e apenas em metade das ONGD que
responderam ao questionário existe formação específica dos funcionários
que trabalham em AHE. No entanto actualmente há já uma maior oferta
de formações nesta área, muitas vezes ministradas pelas próprias ONGD e
verifica-se um interesse crescente pela área.
Financiamento
Em relação ao financiamento, procurou-se neste estudo ter uma ideia da
percentagem dos fundos da ONGD que são gastos em AHE em média
anual, e os valores válidos obtidos polarizaram-se entre 10-20% e 70-80%.
Isto significa que algumas ONGD se especializam na AHE enquanto outras
fazem acções pontuais, sobretudo de recolhas de fundos.
Quanto às fontes de financiamento para AHE, claramente a maioria
(85%) é financiada por apelos especiais à população portuguesa, e uma
parte substancial (54%) por fundos próprios da ONGD. Das ONGD que
responderam ao questionário nenhuma utiliza fundos com origem no governo
português ou entidades internacionais como a UE ou Nações Unidas. A falta
de apoios públicos para esta área e o facto de a ajuda de emergência ser tão
dispendiosa explica a escassez de ONGD activas nesta área.
Para a maioria das ONGD que respondeu ao questionário (62%), não está
previsto qualquer incremento do envolvimento na área de AHE, tendo sido
alegado como impedimento para um maior envolvimento a falta de recursos
humanos e financeiros estáveis.
Apenas três ONGD portuguesas têm um contrato-quadro com a ECHO.
Tal possibilidade não faz parte dos objectivos de 31% das ONGD que
responderam ao questionário, sendo que 23% não dispõe de escala suficiente
para se candidatar. Algumas ONGD indicaram que os parceiros da rede
em que trabalham têm um contrato desse tipo, sugerindo que a rede no
conjunto beneficiará das candidaturas. No conjunto, 31% das ONGD
nunca tentou mas teria interesse em explorar a possibilidade e uma ONGD
iniciou o processo, outra concluiu sem sucesso. Um dos motivos invocados
para não se candidatar a este tipo de acordo foi a falta de capacidade técnica
para elaborar a candidatura.
32
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Apesar da elevada carga burocrática, existem claras vantagens para a
ONGD em ter um contrato-quadro: para além da possibilidade de aceder
a financiamento, o reconhecimento e credibilidade que advêm da parceria
com a ECHO e a aprendizagem e profissionalização que o processo implica.
Segundo algumas ONGD poderia haver mais apoio do Estado português
na promoção das candidaturas, quer pela via diplomática quer política,
quer mesmo na capacitação para processos desta escala e na garantia de
financiamento complementar ao financiamento internacional, muitas vezes
essencial para se obter a aprovação de projectos. Recorde-se também que
existem ao nível de terreno vários foruns de coordenação ao abrigo dos quais
são formadas parcerias e candidaturas a financiamentos internacionais,
designadamente da ONU, mas só recentemente algumas ONGD portuguesas
começaram a aceder a esses instrumentos.
Quase todas as entidades contactadas foram receptivas à ideia de criação de um
Fundo ou uma linha de financiamento público para AHE com uma quantia prédefinida. Sublinharam a importância de haver uma dotação financeira definida
(inclusive por questões de transparência) que fosse renovada anualmente no
caso de ser utilizada, ou então acumular com a do ano seguinte; e critérios de
acesso também definidos, sendo o Estado responsável pela definição do destino
(geográfico e áreas de actividade). Por exemplo, o Departamento de Ajuda
Humanitária da Região da Andaluzia, com 6 M€ em 2010, fez um convénio
com organizações identificadas através de um processo de acreditação do
género do contrato-quadro da ECHO. Essa decisão é reavaliada de tempo em
tempo, em termos da capacidade de intervenção rápida e de implementação.
Têm um valor fixo definido para a ajuda humanitária em geral (não só para
emergências) e que vai só para as ONGD seleccionadas, o que permite
previsibilidade das actividades das mesmas, independentemente da variação
dos montantes globais. Neste contexto a maioria das ONGD portuguesas
consultadas seriam favoráveis ao estabelecimento de um acordo de parceria do
estilo da ECHO, em escala reduzida e simplificada. A própria Visão Estratégica
sublinha a necessidade de “melhorar os mecanismos de incentivos até hoje
muito parcos, para que a sociedade civil possa ser mais activa em iniciativas de
cooperação”, preconizando a criação de condições mais favoráveis no âmbito
dos incentivos fiscais ao mecenato para a cooperação para o desenvolvimento
e para a AHE.48
48
Op.cit. nota 15, p. 43.
33
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Planeamento e resposta de emergência
A necessidade de criar capacidade de preparação antecipada para acções no
terreno foi veementemente sublinhada pelas ONGD contactadas, sendo até
considerado que um potencial fundo deveria contribuir para o financiamento
de verbas para preparação das organizações a nível interno.
Esta perspectiva não tem sido institucionalizada em parte porque há uma
mentalidade de protelar planeamento, uma vez que se entende que em tempos
normais não é prioritário o planeamento para as situações de emergência.
Para AHE tem que haver armazenamento, stockagem em termos de recursos
materiais e de capacidades. O planeamento também é condicionado pela
falta de informação relativamente ao trabalho do CICL quando há uma
emergência, pouca clareza de procedimentos, que são ad hoc e dependentes
das circunstâncias. Não é possível antecipar em que situações haverá
financiamento nem com que critérios. As decisões acabam por depender do
impacto mediático. Quando ocorre uma emergência as ONGD por norma
contactam o CICL para saber se vão fazer algum tipo de intervenção. Mas por
vezes é o CICL ou outros ministérios que procuram as ONGD.
A resposta de emergência caracteriza-se também pelo surgimento de uma série
de entidades com respostas muito emotivas e muitas vezes contraproducentes
relativamente à ajuda que poderiam prestar. A canalização das boas vontades
dispersas através de um sistema estruturado seria uma forma de potenciar a
eventual mais-valia de cada contributo.
Colaboração entre ONGD
De entre várias possibilidades de colaboração entre ONGD portuguesas na
área de AHE, foi manifestada uma clara preferência pela participação em
acções de coordenação e articulação de esforços (85%) e pela partilha de
informação relevante (77%), havendo um interesse muito mais reduzido na
participação em apelos conjuntos das ONGD em situações de emergências
específicas (46%).
Há uma cultura organizacional ainda bastante fechada em torno de rotinas
isoladas das ONGD portuguesas nesta área, havendo pouca experiência de
troca de informação e colaboração. Por outro lado há uma preocupação grande
com a visibilidade, que por vezes impede formas de colaboração, embora haja
34
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
a noção de que há muita manifestação de interesse e de disponibilidade mas
que não se concretiza na prática, ou pelo menos não se concretiza em acções
que façam alguma diferença. Parece haver algum desconhecimento do tipo
de trabalho que as diferentes ONGD podem fazer nesta área, sendo difícil
identificar complementaridades. Esta falta de convergência afecta também a
capacidade de influência das ONGD junto do poder político.
Para melhorar o relacionamento das ONGD que trabalham nesta área talvez
seja importante esclarecer a identificação e distinção de actividades que cada
uma exerce, até porque tal condiciona o tipo de legitimidade de acção.
Sensibilização da opinião pública, imagem
e comunicação
É conhecida a generosidade dos portugueses em situações de emergência.
No entanto não se tem retirado uma mais-valia concertada relativamente a
essa generosidade. Os apelos são feitos isoladamente por parte das diversas
ONGD, independentemente de terem um historial de intervenção na área
humanitária ou não, e os fundos recolhidos são por vezes canalizados sem
ser dada uma informação aos doadores sobre o destino dos fundos. Mantémse assim igualmente uma mentalidade de generosidade assistencialista que se
traduz no envio de bens que nem sempre correspondem às necessidades no
terreno e também em surtos de generosidade que dependem da exposição
mediática, havendo pouco interesse ou conhecimento relativamente a outras
áreas de AHE. O próprio acesso das ONGD aos media está condicionado
à natureza dramática da catástrofe e algumas ONGD têm dificuldade em
conseguir espaço mediático onde difundir apelos. No entanto, a difusão
das redes sociais e novas tecnologias da comunicação abre uma nova área
de acesso que depende muito mais da proactividade das ONGD e da sua
capacidade de explorar tais janelas de oportunidade.
Por vezes a dificuldade em projectar imagem não deriva da falta de acção e
resultados mas da falta de interesse mediático pelas zonas de intervenção de uma
ONGD. Daí também a dificuldade em obter financiamento e interesse por zonas
de crises esquecidas. O interesse mediático é oportunista só para emergências
uma vez que as questões de direitos e de ajuda humanitária são menos apelativas
e também porque os jornalistas têm pouca formação nessas matérias.49
49
Aureliano, S. (2004) O Papel dos Media na Mobilização da Sociedade Civil para a Ajuda Humanitária, disponível em
http://www.bocc.ubi.pt/pag/aureliano-sofia-papel-dos-media-ajuda-humanitaria.pdf, acedido em 17/07/2012.
35
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Foi sublinhada a importância de mostrar à opinião pública que há muito mais
a fazer no âmbito da AHE do que apenas socorro em situações de emergência.
Nesta lógica, foi reconhecido o potencial de aproveitamento de financiamento
da área de ED para acções de sensibilização para a questão da AHE. Alguns
dos entrevistados que desenvolvem actividade prioritariamente nesta área
mostraram-se interessados em investir em projectos dentro desta linha.
A experiência do Projecto de Sensibilização para a Ajuda Humanitária e
de Emergência, co-financiado pelo CICL e pela Plataforma das ONGD,
demonstrou efeitos positivos mas outros menos positivos: por um lado constituiu
um momento de entusiasmo e empenho das ONGD nesta área. Por outro lado
teve um impacto reduzido para as ONGD que participaram nas formações,
talvez devido aos participantes não serem quadros superiores ou com capacidade
de decisão, ou porque muitas delas não têm actuação na área. 50
Controlo de qualidade e divulgação de
resultados
Conforme concluído por um estudo sobre o papel dos media na mobilização
da ajuda humanitária, a falta de transparência é a grande inimiga das ONGD,
sobretudo quando surgem situações de detecção de situações fraudulentas,
gerando desconfiança no seio da opinião pública e dos media.51 Dada a
natureza apelativa desse tipo de situação enquanto notícia, a sua divulgação
cristaliza uma imagem generalizada de todo o sector. É pois fundamental
insistir na ideia da qualidade e transparência para quebrar este ciclo de
preconceito. Cerca de metade das ONGD (54%) afirmou não possuir
mecanismos de controlo de qualidade relativamente aos serviços de AHE e
apenas duas mencionaram especificamente a utilização dos parâmetros do
Projecto Esfera.52
Por outro lado, há trabalho das ONGD que é feito e não é divulgado. Há
pouca cultura de publicitar resultados e isso pode ter o efeito dissuasor no
público em geral e em particular nos doadores. Parece ser mais fácil captar
atenções quando se está presente directamente no terreno, o que favorece
ONGDs mais operacionais, e com maior capacidade de projectar imagem.
50
Op.cit. Nota 33.
51
Op. Cit. Nota 49.
52
PROJECTO ESFERA (1998); Carta Humanitária e Normas Mínimas de Resposta Humanitária em situações de desastre.
Genebra. http://www.sphereproject.org/resources/download-publications/?search=1&keywords=&language=Portuguese&type=0
&category=22, acedido em 17/07/2012.
36
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
No entanto as ONGD têm ao seu dispor uma série de ferramentas de
comunicação que permitem fazer essa divulgação e tornar-se também mais
transparentes em relação aos serviços que prestam. A Plataforma das ONGD
pode ajudar nessa divulgação, conferindo ainda mais credibilidade ao sector.
37
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Recomendações: pilares de uma
estratégia a considerar
A definição de uma política deve ter visão para o futuro. Ao pensar na AHE
em Portugal devem contemplar-se não só os constrangimentos presentes mas
também a perspectiva de uma evolução positiva do contexto económico,
tendo em conta a necessidade de Portugal responder aos compromissos
internacionais que já assumiu. Os instrumentos a criar agora servem para
conferir estrutura a uma área que tem beneficiado de pouca substancia
financeira e tem sido marcada pela descoordenação entre as várias valências
na sociedade portuguesa, traduzindo-se numa menor eficácia e visibilidade.
A AHE exige preparação cuidada e requer recursos bem formados e mecanismos
de coordenação afinados para que a resposta seja adequada. Daí a importância
não só de ter uma política, mas que esta seja abrangente e avançada. O facto
de não existir ainda uma política ou estratégia definidas em Portugal abre uma
janela de oportunidade para o fazer de acordo com os padrões internacionais
e para adaptar o Consenso Europeu e os princípios de GHD para o contexto
nacional. Nessa medida, sugere-se que uma futura estratégia siga os principais
eixos de reflexão sugeridos por estes dois instrumentos, adaptado à realidade
portuguesa, cujo diagnóstico foi feito nas secções anteriores.
Princípios e Conceito de AHE
Objectivo
Definir a abrangência que se pretende dar ao conceito de AHE.
Meios
A fonte doutrinal mais recente reconhecida internacionalmente é o
documento de princípios de GHD, que define que “os objectivos da acção
humanitária são: salvar vidas, aliviar o sofrimento e preservar a dignidade
38
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
humana durante e após as crises resultantes da intervenção humana ou de
catástrofes naturais, assim como prevenir e reforçar a capacidade de resposta
para quando ocorram tais situações.”53 Isto inclui o respeito dos princípios
de Humanidade, Imparcialidade, Neutralidade e Independência, bem como
a protecção e assistência material a civis que dela necessitem, entre outros.
O Consenso Europeu adopta os mesmos padrões.
Recomendações
Desta definição conclui-se pela abrangência da AHE para além da resposta de
emergência, sugerindo-se a inclusão clara de actividades na área de prevenção
de riscos, LRRD, crises esquecidas. Para estas acçors deverá ser previsto o
devido financiamento, que no caso dos PALOP pode ser previsto nos PIC.
Sugere-se também a identificação e distinção clara entre as situações que
são puramente de natureza humanitária e aquelas que são consideradas de
interesse nacional, consoante haja cidadãos portugueses ou outros interesses
nacionais envolvidos. Esta distinção terá implicações para o enquadramento
institucional e definição da resposta de AHE.
Enquadramento político e institucional
Objectivo
Fornecer um enquadramento estratégico que oriente opções políticas e
estabeleça mecanismos de coordenação das respostas de emergência dos
vários actores.
Meios
Definir o modelo de orientação para esta área: se se pretende uma política, um
documento estratégico, ou um planeamento anual com base no enquadramento
internacional, conducente à definição de uma política a mais longo prazo.
Identificar interlocutores relevantes quer nas instituições do Estado quer na
sociedade civil, e esclarecer papéis de cada um para as diferentes modalidades de
AHE bem como formalizar mecanismos de trabalho que promovam a troca de
informação, colaboração e articulação entre todos. Esta clarificação permitirá
gerir de forma racional a tensão entre política e princípios.
53
Op. Cit. Nota 5.
39
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Recomendações
a) Instrumentos a adoptar: No que toca ao relacionamento entre os vários
departamentos do Estado com competências nesta matéria, importa que,
seja qual for o instrumento utilizado (política específica, adopção formal
dos GHD suplementado por planeamento estratégico de implementação,
protocolos de cooperação), este assegure o seu relacionamento de forma
articulada, equilibrada e previsível.
b) Clarificação da entidade responsável pela AHE, que deve ser o MNE/CICL
Verifica-se que a quase totalidade dos países do CAD da OCDE confere a
responsabilidade pela AHE ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, embora
depois possa haver competências específicas dispersas por outros sectores,
inclusive com estratégias próprias. Isto dificulta a abordagem integrada,
pelo que se recomenda que seja desenvolvida uma estratégia única de AHE
que reconheça a existência de situações de emergência distintas, algumas
de natureza exclusivamente humanitária, outras onde existe um interesse
nacional, com o objectivo de identificar as entidades responsáveis em cada
uma das situações. Tal deverá ser feito com base no respeito dos princípios
internacionais de GHD, que deverão prevalecer em situações ambivalentes.
Assim, deverá competir ao MNE, enquanto entidade que responde
internacionalmente perante os compromissos assumidos pelo Estado no
âmbito da AHE, a coordenação ou pelo menos articulação das actividades,
com base nesses princípios.
É ao MNE/CICL que cabe a articulação com as Embaixadas no
terreno em situações de emergência, as quais têm a função de agilizar a
disponibilização de meios no terreno e contactos com entidades locais. Cabe
à mesma instituição a atribuição de financiamento multilateral e bilateral
neste âmbito, representando os interesses de Portugal nos foruns europeus
e multilaterais em geral. Importa para isso ter orientações claras sobre a
abordagem estratégica de Portugal em termos de AHE.
Finalmente o papel fundamental de ligação entre organismos do Estado e a
sociedade civil deve estar claramente consagrado e devem ser definidos os
mecanismos próprios para desempenhar esse papel.
c) Processo de decisão sobre o tipo de intervenção em situações de emergência: cabe ao
governo a decisão sobre a pertinência de um apoio do Estado português em
situações de emergência, quer pela via bilateral quer pela via multilateral
(geralmente UE ou ONU). Essa decisão deve ser informada por pareceres
40
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
técnicos com identificação de necessidades e com identificação de meios que
Portugal pode disponibilizar. No presente cenário de descoordenação essa
identificação é parcelar e não permite respostas integradas. É fundamental
reunir contributos dos diversos actores envolvidos e articular o processo de
decisão política com a comunicação com o nível técnico que vai implementar
as decisões. É importante ter a noção de que as decisões de um ministério
têm implicações para as de outros ministérios, muito em particular para os
que têm funções de articulação entre diversos parceiros, como é o caso do
MNE/CICL. A clarificação do processo de decisão quer a nível horizontal
quer a nível vertical permitiria transitar de forma mais suave entre as decisões
políticas e a sua implementação operacional. A clarificação de estatutos
dos vários intervenientes também permitiria uma melhor coordenação
segundo os princípios humanitários. Isto deve ser acompanhado por uma
atribuição de competências de financiamento centralizadas nas entidades de
coordenação, assente em processos transparentes e com o envolvimento da
sociedade civil, e ancorado na existência de planeamento de contingência.
d) Entidades competentes para desempenhar a coordenação operacional em situações de
emergência humanitária
/ Após da definição do tipo de contributo de Portugal numa situação de
emergência, segue-se a sua implementação operacional. Tal poderá ser
assegurado pelo CNPCE ou estrutura semelhante dependente da PCM que
congregue diferentes ministérios, incluindo o MNE/CICL, e representantes
da sociedade civil, possivelmente da Plataforma das ONGD por representar
a maioria das organizações com competências na matéria.
Procedimentos sugeridos de articulação em caso de emergência:
/ reunião de um gabinete de crise no âmbito do MNE ou CNPCE que
define a natureza da emergência do ponto de vista de Portugal (se existe
interesse nacional; se a intervenção será de natureza puramente humanitária
ou se exitem segmentos de actividade que não sejam de natureza puramente
humanitária).
/ Identificação de necessidades deve ser feita com base em
/ Pedidos directos do país afectado
/ Informação das organizações multilaterais (ONU, UE)
/ Informação de parceiros no terreno
41
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
/ Cada ministério que recebe informação sobre necessidades identificadas
deverá ser responsável por a partilhar com os outros ministérios e promover
a identificação de possíveis respostas às solicitações de uma forma integrada
através de mecanismos de troca de informação pré-estabelecidos, aos quais
a sociedade civil deve ter acesso através do CICL.
/ Articulação através da Plataforma das ONGD ou do CICL, dos contributos
da sociedade civil e da forma como podem ser canalizados com o apoio do
Estado onde tal se considere relevante e apropriado.
/ O papel fundamental do MNE/CICL neste processo e o facto de estar
em curso a re-estruturação institucional na área da cooperação, reforçam a
pertinência de considerar a constituição de uma unidade dedicada a AHE
no novo enquadramento institucional.
Financiamento
Objectivos
Identificar as formas mais adequadas de assegurar financiamento previsível
numa área marcada pela imprevisibilidade. Pretende-se aumentar a
percentagem de APD destinada a AHE; aumentar a previsibilidade
do financiamento; aumentar/diversificar as fontes de financiamento
(recolha organizada de fundos; trabalho em redes internacionais; acesso
a financiamento ECHO). Este último deve ser um objectivo partilhado
do Estado e sociedade civil. O financiamento pode também servir para
estimular as ONGD a investirem em determinadas áreas de intervenção que
podem complementar a acção do Estado, desde que preservada a separação
entre os interesses de política externa e os princípios de acção humanitária.
Meios
Em 2007 foi feito um estudo procurando identificar as modalidades
possíveis de financiamento, concluindo pela proposta de um fundo cativo
para AHE, e foram também estudados vários exemplos de modalidades de
financiamento.54 Em praticamente todos os países do CAD da OCDE existe
alguma forma previsível de financiamento, desde as mais sofisticadas que
permitem uma previsibilidade de 3 anos, às mais comuns, com uma base de
programação anual. Nalguns países os orçamentos estão dispersos em várias
54
Grünewald, F. (2007), Financiar a Acção Humanitária das Ong Portuguesas Opções e Estratégias, Groupe URD. Não
publicado.
42
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
linhas orçamentais, por tema ou por ministérios, mas apesar disso elas estão
claramente definidas e permitem ter uma noção dos meios disponíveis. A
definição de instrumentos de financiamento adaptados à especificidade da
AHE permitirá harmonizar a necessidade de flexibilidade com a necessidade
de previsibilidade e de qualidade do auxílio disponibilizado.
Recomendações
a) criação de um mecanismo de financiamento exclsusivamente de AHE no CICL, não
restrito a respostas de emergência, podendo afectar recursos para acções no
âmbito da prevenção, LRRD, crises esquecidas, e em caso de emergência ter
flexibilidade para disponibilizar verbas para a sociedade civil. O mecanismo
(desejavelmente uma linha de financiamento), teria vários segmentos
segundo estas áreas de acção identificadas, sendo uma parte cativa para
situações de emergência até ao trimestre final do ano, e o restante atribuído
pelos restantes segmentos. A verba de emergência que não fosse utilizada
transitaria para o ano seguinte ou seria atribuída a projectos no âmbito dos
restantes segmentos. Também incluiria acções de sensibilização da população
no âmbito de projectos de Educação para o Desenvolvimento que possam
ser contabilizados como AHE e de capacitação na área de prevenção de
riscos, eventualmente incluídas nos PIC com os países parceiros.
b) parceiros: organismos do Estado que se disponibilizem a desenvolver
acções no âmbito da AHE e de acordo com os princípios de GHD; ONGDs
reconhecidas pelo IPAD como tendo competências e capacidades específicas
para resposta de emergência humanitária, através de um acordo de parceria
semelhante ao FPA da ECHO mas num formato simplificado. Tal acordo
implicaria a possibilidade de destinar uma verba base para actividades nesta
área, que poderiam servir para complementar financiamentos próprios
ou internacionais que algumas ONGD especializadas conseguissem obter.
Outras ONGD com actividade na área humanitária poderiam também
beneficiar de apoios para projectos nas áreas de ajuda humanitária e
promoção de direitos, prevenção de riscos, LRRD e crises esquecidas. A
sociedade civil portuguesa possui poucas organizações especializadas em
AHE e pouca economia de escala. Seria desejável maior previsibilidade para
permitir maior especialização das ONGD e para potenciar ganhos maiores
de capacidade nesta área, inclusive acesso a financiamento internacional.
43
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Promoção de padrões de qualidade e
melhoria ao nível da implementação
Objectivo
Aproximar o desempenho de Portugal dos padrões europeus de qualidade
na implementação da AHE.
Meios
Reforçar a acção nas áreas do Consenso Europeu e GHD, entre elas:
coordenação, coerência e complementaridade entre os parceiros UE; prestar
ajuda adequada e eficaz; diversidade e qualidade da parceria; eficácia,
qualidade e responsabilização; responsabilidade na utilização dos recursos
e das capacidades militares e da protecção civil fora do território da UE;
promoção da redução dos riscos de catástrofes e da preparação para as
mesmas; reforço da ligação com outros instrumentos de ajuda.
Recomendações
/ Traçar um plano que aborde as seis áreas do Plano de Acção do Consenso Europeu55
ou outras áreas que venham a ser identificadas neste âmbito.
a.
Advocacia, promoção de princípios humanitários e direito internacional
b.
Reforço da qualidade
c.
Reforço das capacidades de resposta
d.
Fortalecimento das parcerias entre as diversas entidades
e.
Reforço da coerência e coordenação
f.
Continuum da ajuda
/ Sensibilização do poder político; informação da opinião pública; formação
dos intervenientes em AHE.
55
Comissão Europeia (2008), European Consensus on Humanitarian Aid – Action Plan, SEC(2008)1991, disponível em http://
ec.europa.eu/echo/files/policies/consensus/working_paper_en.pdf, acedido em 17/07/2012. Este Plano de Acção será em
breve sujeito a avaliação e posterior revisão, pelo que se recomenda o acompanhamento do processo e a devida
incorporação das recomendações que daí surjam.
44
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Aprendizagem e prestação de contas
Objectivo
Desenvolver uma cultura organizacional convergente com os padrões
europeus de prestação de contas e crescente aprendizagem no sentido de
maior credibilidade da acção desenvolvida em AHE, que contribuirá para
atracção de mais financiamento.
Meios
Retirar lições da experiência acumulada, partilhar essas lições e incorporálas em novos procedimentos; prestar contas de forma transparente.
Recomendações
/ Importância da formação e profissionalização dos funcionários do Estado
e das ONGD que trabalham em AHE.
/ Transparência de procedimentos em todos os sectores envolvidos e na
relação entre eles.
/ Promoção de actividades de sensibilização da opinião pública para a
importância da AHE, por parte de entidades públicas e ONGD, salientando
as suas diversas vertentes e informando sobre o destino dos financiamentos.
/ Estimular o papel da Assembleia da República nesta área. O Parlamento
tem um papel importante na verificação da prossecução das políticas dentro
dos compromissos assumidos pelo Estado e nesse sentido a Comissão de
Assuntos Externos em particular e os parlamentares em geral deveriam ser
alvo de sensibilização para estas matérias quer por parte da sociedade civil,
quer por parte do CICL. O CAD-OCDE propõe mesmo que se identifiquem
“aliados” no Parlamento que estejam dispostos a ser mais activos em questões
estratégicas para a cooperação para o desenvolvimento. O papel fiscalizador
do Parlamento deverá também incidir sobre a separação entre política
externa e AHE e que esta é orientada pelos princípios de GHD.
45
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
O contributo da Sociedade Civil
Objectivo
Valorizar o contributo da sociedade civil, numa época em que a estrutura
do Estado tende a ficar mais reduzida. Apelo à pro-actividade e iniciativa da
sociedade civil.
Meios
Em 2007, durante a Presidência portuguesa da UE houve um momento de
grande ímpeto em que se negociou o Consenso Europeu em Matéria de Ajuda
Humanitária, tendo havido ainda um projecto de sensibilização para a ajuda
humanitária e de emergência que apesar das suas limitações teve grande
mérito de mobilizar um conjunto de entidades em torno destas matérias.56
Esse ímpeto deverá ser retomado sob a forma de colaboração mais estruturada
entre as ONGD especializadas em AHE, contando com o papel catalítico da
Plataforma das ONGD, através do GAHE.
Recomendações
/ Aproveitar mais-valias do trabalho em rede internacional das ONGD portuguesas:
experiência, profissionalização, capacitação e aprendizagem de normas, padrões,
protocolos e procedimentos de coordenação e colaboração utilizando também
instrumentos internacionais, como as normas do Projecto Esfera.57 Promover
pontes entre a resposta em Portugal e o trabalho no âmbito dessas redes.
/ Concentração geográfica e especialização permitem uma maior eficiência embora
seja mais importante a especialização do que a concentração geográfica. As
ONGD que intervêm de forma operacional em situações de emergência não
estão limitadas ao espaço de actuação dos PALOP e Timor-Leste.
/ Mobilização de fundos da sociedade civil. Entende-se que uma mobilização
conjunta de fundos, com uma mensagem única ou harmonizada teria
muito maior impacto do que recolhas individuais. Embora a sociedade civil
tenha manifestado disponibilidade para articulação e troca de informação,
não parece ser ainda o momento para gestão conjunta de fundos. Será de
incentivar um aprofundamento da relação entre as ONGD que trabalham
nesta área no sentido de permitir a consideração de mecanismos do género
de consórcio, já utilizados no Reino Unido, Suíça e outros países. Apesar
de não ser sua responsabilidade, o CICL poderia ter um papel de suporte
no processo, nos termos que viessem a ser acordados com a sociedade
56
Op.cit. Nota 33.
57
Op.cit. Nota 52.
46
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
civil. Potencial papel do GAHE enquanto centralizador de informação
relativamente a apelos.
/ Planeamento e resposta de emergência: estimular o papel da Plataforma das
ONGD através do GAHE em assegurar representação das ONGD junto
do governo português, evitando a descoordenação comum em situações de
emergência, em que todos querem participar de alguma forma. Esta entidade
tem legitimidade para assegurar tal representação não só pelo estatuto mas
também por ser o forum das organizações com experiência de trabalho,
capacidade e conhecimentos específicos da área e dos padrões de intervenção
nestas situações que são particularmente sensíveis. São desaconselhadas
estruturas muito pesadas de coordenação, mas devem ser estabelecidos
mecanismos de troca de informação e articulação suficientemente ágeis para
responder às necessidades de uma emergência.
/ Controlo de qualidade e divulgação de resultados: Trabalhar de forma colaborativa,
evitando a dispersão de meios e recursos, melhorando assim a eficácia e
eficiência. Formação deve ser adaptada ao tipo de trabalho efectivamente
desenvolvido pelas ONGDs tendo em conta que nem todas são activas na
fase de emergência. Para além da formação sobre mecanismos externos de
coordenação, seria sobretudo desejável aproveitar a estrutura do GAHE
para promover conhecimento mais profundo do trabalho desenvolvido pelas
diferentes ONGD e partilharem experiências e desafios concretos de forma
a melhorar a qualidade da actuação individual e colectiva. É importante
construir e manter a imagem de qualidade e profissionalismo que inspira
confiança para manter os contributos, designadamente divulgando e
aderindo a códigos de conduta existentes, como o Código de Conduta para o
Movimento Internacional da Cruz Vermelha e Crescente Vermelho, e as Organizações
Não-governamentais em Actividades Humanitárias, de 1994.58 Um público cada
vez mais informado e com acesso a conteúdos deve ter acesso às contas e
resultados para que se sinta confiante em voltar a contribuir. É importante a
publicitação de resultados de auditoria e avaliação.
/ Colaboração entre ONGD: Poderia haver um papel da Plataforma das ONGD
em constituir com outras ONGD menos vocacionadas para AHE, uma
retaguarda de apoio em relação às que são especializadas na área. Por
exemplo ter equipamento não perecivel armazenado, tendas de campanha,
material medico-cirurgico etc, que pode estar disponivel. A Plataforma
58
Código de Conduta para o Movimento Internacional da Cruz Vermelha e Crescente Vermelho, e as Organizações Não-governamentais em
Actividades Humanitárias http://www.icrc.org/por/resources/documents/misc/654h33.htm, acedido em 17/07/2012.
47
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
poderia assumir um papel de coordenação dessa retaguarda. Sugere-se que
o GAHE possa desenvolver renovados esforços de reach out às ONGD que
estão fora do grupo e que têm algum tipo de actividade nesta área, algumas
das quais desconhecem a mais valia que este tipo de fórum pode trazer
para o seu trabalho, designadamente ao nível da troca de informação e da
preparação. Não são desejáveis mecanismos demasiado concentradores para
permitir a flexibilidade de actuação que cada entidade entende precisar. No
entanto, devem ser estimuladas formas de colaboração para que se saiba
o que é que cada um está ou pode fazer, melhorar a eficácia das acções e
também para dar uma imagem coerente do trabalho das ONGDs no seu
todo para a sociedade, aumentando também a capacidade de influência
junto do poder político.
/ Sensibilização da opinião pública, imagem e comunicação: Sugere-se a melhoria da
articulação com os média nestas matérias e enfatizar a imagem de isenção
e profissionalismo das ONGD, partilhando informação sobre actividades e
resultados, e dissipando preconceitos. Sublinha-se o potencial papel do GAHE
para divulgação de resultados e prestação de contas; sensibilização; lobby
político e agenda-setting. A legitimidade que as organizações especializadas no
sector têm pela sua intervenção no terreno, confere capacidade de influência,
que deverá ser associada às prioridades da Plataforma das ONGD.
48
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Point Pedro, Distrito de Jaffna, Sri Lanka
Intervenção de Emergência Humanitária
aquando do Tsunami que assolou o país.
Fabrice Demoulin/MdM. 2005
49
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Anexos
50
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Anexo I: Termos de Referência
Enquadramento Geral
A Ajuda Humanitária é um instrumento vocacionado para salvar vidas
e reduzir o sofrimento no curto-prazo, ou seja, destina-se a grupos da
população cuja vida está em perigo, quer em resultado de catástrofes de
origem natural quer provocadas pelo Homem59. A Acção Humanitária não
se destina apenas a situações que resultam de crises súbitas, mas também a
contextos em que existem comunidades afectadas por crises continuadas (tais
como guerras civis) que não permitem ainda a prossecução de programas
de desenvolvimento mais estruturais e de longo-prazo. Apesar de ser
reconhecido que a responsabilidade primordial de assegurar a assistência e
protecção das populações cabe, naturalmente, aos Estados e aos respectivos
governos nacionais, a intervenção de organizações humanitárias impõe-se
como uma necessidade nos casos em que tal não seja possível.
Em Abril de 2007, o CAD-OCDE publicou um conjunto de directrizes que
alinham o conceito de ajuda humanitária com o estabelecido pela Good
Humanitarian Donorship (GHD)60, afirmando que o objectivo da AH “is
to save lives, alleviate suffering and maintain and protect human dignity during and in the
aftermath of emergencies”61. Estas directrizes consagram um conceito abrangente
de acção humanitária, que inclui:
/ A ajuda de emergência, que tem como objectivo preservar vidas em situações
de emergência, com carácter pontual e limitado, normalmente sob a forma
de envio de alimentos, equipas médicas, abrigos, roupas e material sanitário
para satisfação das necessidades básicas das populações. No quadro deste
59
AFONSO, Maria Manuela; FERNANDES, Ana Paula (2005); abCD: Introdução à Cooperação para o Desenvolvimento.
ForumDC, p.67.
60
Os Princípios e Boas Práticas do Dador Humanitário (Good Humanitarian Donorship -GHD) foram aprovados em
Estocolmo a 17 de Junho de 2003 pela Alemanha, Austrália, Bélgica, Canadá, Dinamarca, Estados Unidos, França,
Finlândia, Irlanda, Japão, Luxemburgo, Noruega, Países Baixos, Reino Unido, Suécia e por Portugal em 2006. Estes
princípios encontram-se em anexo no presente relatório.
61
Revised DAC directives on official humanitarian aid, 2007.
51
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
instrumento destaca-se a ajuda alimentar de emergência, que constitui
actualmente cerca de metade de toda a ajuda alimentar concedida62.
/ Alguma ajuda de reabilitação e reconstrução de infra-estruturas e equipamentos, que
visam criar as bases para o desenvolvimento futuro, em articulação com os
actores locais e aproveitando a experiência e os trabalhos realizados na fase
de emergência.
/ A prevenção de conflitos e de desastres naturais, protegendo as populações de situações
de risco que poderão desembocar em crises humanitárias futuras, nomeadamente
através de sistemas de alerta antecipado e de medidas de intervenção adequadas
(como a diplomacia preventiva, que pretende evitar a ocorrência de conflitos).
Verifica-se actualmente que os desastres naturais são mais frequentes e com
maior gravidade, afectando um número crescente de pessoas. Os países em
desenvolvimento tendem a ser os mais afectados pelas alterações climáticas,
originando fenómenos de cheias e/ou secas que ajudam a perpetuar o ciclo
da pobreza.
Nos últimos anos surgiram algumas iniciativas com relevância para o mundo
humanitário e particularmente para a AHE europeia, como por exemplo:
Good Humanitarian Donorship (GHD)63
É uma iniciativa dos membros do CAD-OCDE, constituindo um fórum
para discussão das boas práticas no financiamento da ajuda humanitária
e de outras questões de interesse mútuo. Definiu princípios e padrões
para a ajuda humanitária, fornecendo assim um guia para estas acções e,
simultaneamente, um mecanismo para encorajar uma maior transparência
e rigor na prestação de contas (accountability). O GHD estabelece 23
princípios e boas práticas para orientar a actuação dos doadores (em anexo)
e conta com a participação de todos os membros do CAD desde 2005.
São realizadas reuniões anuais para estabelecer prioridades e avaliar os
progressos realizados.
62
A ajuda alimentar concedida em situações que não são consideradas de emergência tem sido objecto de acesa
polémica, uma vez que se provou existirem casos em que é instrumentalizada por interesses de política externa,
em que se destina a promover o escoamento dos produtos dos doadores, em que origina uma alteração nas dietas
alimentares locais e subverte o mercado local (afectando a produtividade e o desenvolvimento agrícola) e em que
acaba por aumentar a dependência externa. Nesse sentido, tende a ser utilizada actualmente apenas como resposta a
problemas graves de fome que resultam de problemas estruturais, preferencialmente através do Programa Alimentar
Mundial (PAM) das NU.
63
www.goodhumanitariandonorship.org
52
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Consenso Europeu em matéria de ajuda humanitária64
Depois da aprovação de um documento semelhante no contexto do
Desenvolvimento, este documento, assinado pelos presidentes do Conselho
da UE, do Parlamento Europeu e da Comissão Europeia a 18 de Dezembro
de 2007, pretende definir uma visão e uma estratégia comuns para a UE
destinada a socorrer mais eficazmente milhões de pessoas afectadas por
conflitos e catástrofes naturais65.
Ao estabelecer objectivos comuns e uma estratégia integrada, o Consenso
procura melhorar a coordenação entre as instituições europeias, promover
as boas práticas da ajuda humanitária e contribuir para tornar a ajuda
europeia mais rápida, coerente e eficaz. No entanto, este Consenso não
resolve o problema de “double standards” ao nível da UE, uma vez que esta
é muitas vezes incapaz de falar a uma só voz na cena internacional, o que
determina respostas diferentes para casos semelhantes. A coordenação com
os meios e acções dos Estados-membros, deverá, assim, ser uma prioridade
para reforçar o papel político da UE no mundo.
As Nações Unidas são definidas como o parceiro primordial para
implementação da acção humanitária, sendo feitas referências também
a outros parceiros como a Cruz Vermelha e as ONG humanitárias. É
igualmente colocado o acento tónico no apoio e desenvolvimento das
capacidades locais.
Enquadramento Nacional
A coordenação entre os diversos intervenientes na ajuda
humanitária é efectuada numa base ad-hoc. Se, por um lado, o IPAD não
consegue assumir, totalmente e na prática, o papel de coordenador da ajuda
que lhe foi consagrado, por outro lado, não existe qualquer estrutura de
coordenação entre actores – IPAD, SENEC, MDN, Protecção Civil -, que
esteja integrada num esforço comum de prestar uma assistência eficaz e
64
http://ec.europa.eu/echo/pdf_files/consensus/consensus_en.pdf
65
O Consenso Europeu define que “The objective of EU humanitarian aid is to provide a needs-based emergency response aimed
at preserving life, preventing and alleviating human suffering and maintaining human dignity wherever the need arises if governments and
local actors are overwhelmed, unable or unwilling to act. EU humanitarian aid encompasses assistance, relief and protection operations
to save and preserve life in humanitarian crises or their immediate aftermath, but also actions aimed at facilitating or obtaining access to
people in need and the free flow of assistance. EU humanitarian assistance is provided in response to man-made crises (including complex
emergencies) and to natural disasters as needed. (...) Capacity building activities to prevent and mitigate the impact of disasters and to
enhance humanitarian response are also part of EU humanitarian aid (...).
53
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
atempada às populações afectadas por crises humanitárias. No que respeita
à participação das Embaixadas portuguesas no exterior, apesar do seu papel
de aconselhamento, não existe delegação de responsabilidades, nem em
termos de decisões humanitárias nem em fundos.
O financiamento da ajuda humanitária é decidido caso-a-caso, não
existindo linhas de financiamento ou fundos independentes para acções de
ajuda humanitária, geridos profissionalmente de acordo com critérios de
necessidade e pertinência, para apoio às populações mais carenciadas em
situações de catástrofe e conflito66. Já em 2007, o Manifesto sobre a política
Europeia de Ajuda Humanitária preparado pela Plataforma das ONGD
em colaboração com a VOICE, apelava à UE e aos Estados-membros, em
particular ao Estado Português, que garantissem a existência de mecanismos
efectivos de financiamento da ajuda humanitária e que se solidifiquem as
parcerias com organizações humanitárias (nomeadamente da sociedade civil).
Relativamente ao contexto específico das ONG portuguesas relativamente à
AH, as últimas décadas são marcadas pelo papel importante desempenhado
pela AMI, que veio influenciar formas de actuação e de organização. Para
as ONG, a ajuda humanitária pode ser considerada atractiva por produzir
impactos aparentemente mais visíveis e imediatos e por beneficiar de uma
maior facilidade na mobilização de fundos (na medida em que apela aos
sentimentos de solidariedade mais imediatos das pessoas). No entanto,
verifica-se que a sociedade civil portuguesa conhece muito pouco o trabalho
desenvolvido pelas ONG e o seu papel na erradicação da pobreza e das
desigualdades, o que significa que é menos complicado sensibilizar a
população em situações pontuais de crise, mas é um grande desafio obter
uma atenção e participação contínuas da sociedade civil.
Por outro lado continua a ser pouco relevante o papel das organizações
da Sociedade Civil, quer nos processos de tomada de decisão de acções
humanitárias, quer como agentes importantes da reflexão do que poderá ser
uma política portuguesa de AH, quer ainda como agentes implementadores
da ajuda humanitária do Estado português.
Reconhecendo a necessidade de unir esforços para a consolidação das ONGD
66
A inexistência de critérios/regras de financiamento e a decisão caso-a-caso tem resultado, em alguns casos, em
descoordenações entre os diversos actores. Um exemplo é a recente actuação relativamente às cheias em Moçambique,
tendo a Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação anunciado um apoio do Estado português
sem que tenha sido tido em devida linha de consideração as ONG portuguesas já presentes no terreno ou até a
existência de pedidos de financiamento ao IPAD para a resposta àquela situação de emergência (Oikos).
54
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
nesta área e impulsionado pela resposta ao tsunami asiático, constituiu-se,
em Fevereiro de 2006, o Grupo de Ajuda Humanitária e de Emergência
(GAHE) na Plataforma Portuguesa das ONGD. Este tem por objectivos67:
a.
Coordenar e harmonizar os procedimentos conjuntos das ONGD
em situações de emergência;
b.
Servir de interlocutor comum perante os outros actores públicos e
privados, nacionais, europeus e internacionais que actuem ou que
tenham relevância na área da AHE;
c.
Servir como grupo de pressão para objectivos comuns, quer a nível
nacional quer a nível internacional;
d.
Promover formação e preparação interna e externa.
Quer o exame do CAD à Cooperação Portuguesa de 2006, quer o Exame
realizado já este ano, apresentam recomendações específicas ao governo
português em relação à Acção Humanitária, destacando a necessidade
de criação de mecanismos de coordenação e financiamento, definidos em
colaboração com a Sociedade Civil.
Nos últimos anos, Portugal adoptou os Princípios e Boas Práticas do
Doador Humanitário (GHD, em 2006) e aprovou o Consenso Europeu em
matéria de Ajuda Humanitária (final de 2007). No entanto, continua por
definir e colocar em prática uma estratégia geral para a AH portuguesa,
que incorpore todos os documentos internacionais relevantes e que possa
contribuir para: aumentar a sua eficácia e a visibilidade, a flexibilidade e
previsibilidade dos financiamentos, bem como a cultura de resultados e de
avaliação destes apoios.
Objectivos gerais
/ Elaboração de um documento de orientação/informação/discussão para
a Sociedade Civil tendo em vista projectar para o centro da agenda política
nacional a questão da necessidade de estruturar as actividades desenvolvidas
no âmbito da sua acção humanitaria.
67
PLATAFORMA PORTUGUESA DAS ONGD (2006); Protocolo de Cooperação entre a Direcção da Plataforma Portuguesa
das ONGD e as ONGD suas associadas que trabalham na área da Ajuda Humanitária e de Emergência. http://www.plataformaongd.
pt/site3/index.php?option=com_docman&task=doc_view&gid=12
55
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
/ Documento que contenha bases para a definição de uma Estratégia
Nacional de Acção Humanitária que envolva todas as entidades públicas e
da Sociedade Civil, procurando construir um modelo de coordenação global
entre estas organizações.
Objectivos específicos
/ Actualizar os dados sobre o enquadramento Nacional e Internacional que
caracteriza actualmente a Ajuda Humanitária e de Emergência;
/ Mapeamento do panorama nacional da Sociedade Civil em termos de
áreas de actuação, constrangimentos e potencialidades na área da ajuda
humanitária;
/ Tendo como ponto de partida o exame do CAD e as suas recomendações
à Cooperação Portuguesa, o Consenso Europeu em Matéria de Ajuda
Humanitária e os Princípios do GHD, de que forma se deve estruturar a
participação de Portugal nos esforços internacionais de Ajuda Humanitária;
/ Perceber como deve Portugal aplicar a nível interno os princípios
adoptados internacionalmente em matéria de ajuda humanitária, tendo
em consideração o panorama nacional, mas também a realidade e as boas
práticas de outros países;
/ Avaliar qual poderá ser o papel do Estado português, de cada um dos seus
organismos em particular e em coordenação com as ONGD, numa situação
de emergência humanitária.
O estudo deverá ter como corpo principal um sumário executivo e um texto
de cerca de 20-30 págs, com uma linguagem e utilização de elementos gráficos
apelativos que facilitem a compreensão e apreensão rápida da informação.
Qualificações requeridas
/ Formação na área das Ciências Sociais;
/ Experiência na temáticas em questão;
/ Experiência em organizações relevantes que trabalhem em Acção
Humanitária e Cooperação para o Desenvolvimento.
56
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Metodologia
A elaboração do estudo deverá envolver:
/ Análise de documentos e relatórios sobre a temática abordada (fontes
secundárias);
/ Contactos e entrevistas com stakeholders envolvidos em operações de Acção
Humanitária, nomeadamente organismos públicos e ONGD (Grupo de
AHE da Plataforma);
/ Apresentação pública das conclusões do estudo, num evento que a
Plataforma organizará e para o qual convidará personalidades e entidades
relevantes nas matérias em análise.
57
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Anexo II: Lista de entidades contactadas
ADDHU – Associação de Defesa dos Direitos Humanos
ADRA – Associação Adventista para o Desenvolvimento, Recursos e
Assistência
AMI – Assistência Médica Internacional
Caritas Portuguesa
CVP – Cruz Vermelha Portuguesa
FGS – Fundação Gonçalo da Silveira
MDN-DGPDN – Ministério da Defesa Nacional, Direção-Geral de Política
de Defesa Nacional
MdM-P – Médicos do Mundo - Portugal
MNE IPAD/CICL – Ministério dos Negócios Estrangeiros, Camões
Instituto da Cooperação e da Língua
OIKOS – Cooperação e Desenvolvimento
UMP – União das Misericórdias Portuguesas
58
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Anexo III: Bibiografia consultada
Aureliano, S. (2004) O Papel dos Media na Mobilização da Sociedade Civil para a
Ajuda Humanitária, disponível em http://www.bocc.ubi.pt/pag/aureliano-sofia-papeldos-media-ajuda-humanitaria.pdf, acedido em 17/07/2012.
Binder, Martin (2009), Humanitarian Crises and the International Politics of Selectivity.
Human Rights Review 10:327-348 Setembro 2009, disponível em http://search.
ebscohost.com/login.aspx?direct=true&db=aph&AN=43103419 acedido em 17/07/2012.
Collinson, S. e S. Elhawary (2012), Humanitarian Space: a Review of Trends and
Issues, HPG Reports 32, disponível em http://www.odi.org.uk/resources/details.
asp?id=6425&title=humanitarian-space-principles-aid, acedido em 17/07/2012.
Comissão Europeia (2001), Interligação entre Ajuda de Emergência, Reabilitação e
Desenvolvimento – Avaliação, COM (2001) 153 final, disponível em http://eurlex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=COM:2001:0153:FIN:PT:HTML,
acedido em 17/07/2012.
Comissão Europeia (2007). Para um Consenso Europeu em matéria de Ajuda
Humanitária. COM(2007) 317 final, disponível em http://ec.europa.eu/echo/
files/policies/consensus/acte_pt.pdf, acedido em 17/07/2012.
Comissão Europeia (2008), European Consensus on Humanitarian Aid – Action
Plan, SEC(2008)1991, disponível em http://ec.europa.eu/echo/files/policies/
consensus/working_paper_en.pdf, acedido em 17/07/2012.
Comissão Europeia (2010), Mid-term Review of the European Consensus on
Humanitarian Aid Action Plan, COM(2010) 722 final, http://ec.europa.eu/
echo/files/policies/consensus/mid-term_review/1_EN_ACT_part1_v21.pdf, p. 4,
acedido em 17/07/2012; e op. cit. nota 10.
DAC-OECD (2006), DAC Peer Review of Portugal 2006, disponível em http://www.
ipad.mne.gov.pt/CooperacaoDesenvolvimento/ExameCADCooperacaoPortuguesa/Documents/
DAC%20Peer%20Review%202006.pdf, acedido em 17/07/2012, e Op. Cit. Nota 10.
59
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
DAC-OECD (2010), DAC Peer Review of Portugal 2010, disponível em http://
www.ipad.mne.gov.pt/CooperacaoDesenvolvimento/ExameCADCooperacaoPortuguesa/
Documents/exame%20do%20cad%20Portugal.pdf, acedido em 17/07/2012.
DARA (2010) Humanitarian Response Index 2010, disponível em http://
daraint.org/humanitarian-response-index/humanitarian-response-index-2010/,
acedido em 17/07/2012.
Dara (2011), Humanitarian Response Index 2011: Donor Assessments
- Portugal, disponível em http://daraint.org/wp-content/uploads/2012/03/
Portugal_donor_assessment_HRI_2011.pdf, acedido em 17/07/2012.
Development Initiatives (2011), Global Humanitarian Assistance Report
2011, disponível em http://www.globalhumanitarianassistance.org/report/ghareport-2011, acedido em 17/07/2012.
Estratégia Nacional sobre Segurança e Desenvolvimento (http://www.
portugal.gov.pt/pt/GC17/Governo/Ministerios/MNE/Programas_e_Dossiers/
Pages/20090826_MENE_Prog_Est_Seguranca_Desenvolvimento.aspx), acedido
em 17/07/2012.
European Union (2008), The European Consensus on Humanitarian
Aid , Joint Statement by the European Council, the European Parliament
and the European Commission, EU, Brussels, http://eur-lex.europa.eu/
LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2008:025:0001:0012:EN:PDF acedido em
17/07/2012.
Ferreira, P. M. (2008), Relatório de Avaliação do
Sensibilização para a Ajuda Humanitária e de Emergência.
Projecto
Freitas, Raquel (2012) Os exames inter-pares e a Eficácia do Desenvolvimento. In
Oliveira, Ana Filipa e Proença, Fátima (eds.), Portugal E África: Melhor
Cooperação, Melhor Desenvolvimento ACEP: Lisboa http://www.
acep.pt/portals/0/BlogueMelhorCoop/MCMD_versao%20Online.pdf acedido em
17/07/2012.
Grünewald, F. (2007), Financiar a Acção Humanitária das Ong Portuguesas
Opções e Estratégias, Groupe URD. Não publicado.
Harmer, A. e E. Martin (2010), Diversity in Donorship: Field Lessons, HPG
Report 30, Overseas Development Institute, disponível em http://www.odi.
org.uk/resources/docs/5876.pdf, acedido em 17/07/2012.
60
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Hyogo Framework for Action (Hyogo Framework), disponível em http://
www.unisdr.org/we/coordinate/hfa, acedido em 17/07/2012.
ISDR (2008), Climate Change and Disaster Risk Reduction, Briefing note 01,
disponível
em
http://www.unisdr.org/files/4146_ClimateChangeDRR.pdf,
acedido em 17/07/2012.
Jornal Público (2005), Portugal Envia 30 Toneladas de Ajuda para o Paquistão,
19/10/2005 http://www.publico.pt/Sociedade/portugal-envia-30-toneladas-deajuda-para-o-paquistao_1236213 acedido a 17/07/2012.
MNE-CICL (2006) Uma Visão Estratégica para a Cooperação Portuguesa,
Documento aprovado em RCM 196/2005, 22 de Dezembro de 2005. Disponível em
http://www.ipad.mne.gov.pt/CooperacaoDesenvolvimento/EstrategiaCooperacaoPortuguesa/
Documents/Visao_Estrategica_editado.pdf, acedido em 17/07/2012.
Parlamento Europeu (2010), PROJECTO DE RELATÓRIO sobre a
aplicação do Consenso Europeu em matéria de Ajuda Humanitária: avaliação
intercalar do seu plano de acção e perspectivas futuras (2010/2101(INI)),
disponível em http://www.europarl.europa.eu/meetdocs/2009_2014/documents/
deve/pr/830/830651/830651pt.pdf, acedido em 17/07/2012.
Plano Nacional para a Implementação da Resolução da ONU sobre
Mulheres, Paz e Segurança (http://www.un.org/womenwatch/ianwge/taskforces/
wps/nap/Plano_Nacional_Accao_1325.pdf) acedido em 17/07/2012.
Plataforma Portuguesa das ONGD (2007); Manifesto sobre a política
europeia de Ajuda Humanitária, disponível em http://www.oikos.pt/
en/about-us/os-nossos-parceiros/implementing-partners/item/1140-manifestosobre-a-pol%C3%ADtica-europeia-de-ajuda-humanit%C3%A1ria acedido em
17/07/2012.
Plataforma Portuguesa das ONGD (2012) Ajuda Humanitária e de
Emergência. In Guia das ONGD da Plataforma, disponível em http://
plataformaongd.pt/conteudos/documentacao/documentos/centrodocumentacao/486/
Publica%C3%A7%C3%B5es%20Plataforma/Guia%20das%20ONGD.pdf,
acedido em 17/07/2012.
Princípios e Boas Práticas do Doador Humanitário, disponível em http://www.
plataformaongd.pt/conteudos/documentacao/documentos/centrodocumentacao/1011/
Princ%C3%ADpios%20e%20%20Boas%20Pr%C3%A1ticas%20do%20
Doador%20Humanit%C3%A1rio.pdf, acedido em 17/07/2012.
61
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Principios para uma Intervenção Internacional Eficaz em Estados
Frágeis e em Situações de Fragilidade, disponível em http://www.oecd.org/
dataoecd/37/60/42332900.pdf, acedido em 17/07/2012.
Projecto Esfera (1998); Carta Humanitária e Normas Mínimas de Resposta
Humanitária em situações de desastre. Genebra. http://www.sphereproject.org/
resources/download-publications/?search=1&keywords=&language=Portuguese&type
=0&category=22, acedido em 17/07/2012.
Spaak, M e R. Otto (2009) Study on the Mapping of Donor Coordination
(Humanitarian Aid) at the Field Level, disponível em http://ec.europa.eu/echo/
files/evaluation/2009/Donor_coordination.pdf, acedido em 17/07/2012.
Tratado de Lisboa (2007), disponível em http://europa.eu/lisbon_treaty/index_
pt.htm, acedido em 17/07/2012.
62
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Anexo IV: Links Úteis68
http://ochaonline.un.org/
Website do Gabinete das Nações Unidas para a Ajuda Humanitária,
que tem por missão mobilizar e coordenar uma acção humanitária eficaz, em
parceria com diversos actores. Para além de vários relatórios, fornece uma
actualização diária das principais emergências e crises humanitárias no Mundo.
http://www.reliefweb.int
Portal de Informação gerido pela OCHA, sobre a prevenção gestão e
resposta a desastres e emergencias. Fornece noticias, documentos, mapas,
sistema de alerta antecipado, informações sobre emprego, etc, de uma forma
independente e atempada.
http://www-jha.ac/articles
Journal of Humanitarian Affairs, revista online sobre assuntos
humanitários.
http://www.alertnet.org
Serviço de informação e análise da Reuters Foundation sobre ajuda de
emergência e as crises humanitárias em vários pontos do globo. Inclui um
serviço de mapas interactivos e recursos específicos para jornalistas.
68
Retirado de op.cit. Nota 33.
63
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
http://www.alnap.org
Active Learning Network for Accountability and Performance
in Humanitarian Action, elabora relatórios e avaliações sobre ajuda
humanitarian, para além de reuniões e formações sobre esta temática.
http://www.ifrc.org/
Comité Internacional da Cruz Vermelha/Crescente Vermelho,
com informações sobre diversas crises humanitárias.
www.unhcr.ch
Alto Comissariado nas Nações Unidas para os Refugiados, tem
disponíveis informações variadas sobre a situação dos refugiados no Mundo
e publica o Handbook for Emergencies.
http://www.unisdr.org/
International Strategy for Disaster Reduction, tem como objectivo
criar comunidade resistentes aos desastres naturais sensibilizando para
a necessidade de politicas de redução de desastres naturais como um
componente integral do desenvolvimento sustentável. Neste website, dispõe
de acesso a uma importante base de dados estatística sobre desastres naturais.
http://www.gdin.org/
Global Disaster Information Network (Nações Unidas), procura
oferecer uma variedade de serviços que permita a ligação de utilizadores com os
fornecedores de informação apropriada e encorajar o uso de maior compatibilidade
ou integração de sistemas de informação através de regiões geográficas para que a
informação possa ser partilhada de uma forma mais eficaz.
64
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
http://www.odihpn.org/
Humanitarian Practice Network, é um fórum para decisores políticos e
trabalhadores humanitários partilharem conhecimentos e experiências, bem
como para a divulgação de informação nesta área. Permite a consulta online
de uma série de papers e artigos.
www.globalhumanitarianassistance.org
Website da “Development Initiatives”, que publica um relatório anual
sobre a situação da ajuda humanitária no Mundo, incluindo perfis da ajuda
concedida pelos doadores.
www.goodhumanitariandonorship.org
Good Humanitarian Donorship, é uma iniciativa criada pelos governos
doadores em 2003 para melhorar a qualidade e eficácia da ajuda humanitária,
constituindo um fórum de debate sobre as boas práticas, financiamento da
ajuda, definição de regras de actuação e outras questões de interesse comum.
Aprovou em 2003 os Princípios e Boas Práticas do Doador Humanitário.
http://www.hapinternational.org/
Humanitarian Accountability Partnership (HAP). Centra o seu trabalho
na transparência e prestação de contas da ajuda humanitária, de forma
a aumentar a qualidade e eficácia da ajuda. Publica o Humanitarian
Accountability Report.
http://www.odi.org.uk/hpg/
Humanitarian Policy Group, do Overseas Development Institute (ODI).
É uma rede de investigadores independentes e profissionais da comunicação
social que trabalham em questões humanitarias. Contém informação sobre
a aplicação dos princípios humanitários, sobre a arquitectura da ajuda
humanitária e sobre a ajuda em situações de crise. Publica o “Disasters”, um
jornal sobre emergências complexas e desastres naturais.
65
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
http://www.sphereproject.org/
Projecto Esfera, lançado em 1997 por um grupo de ONG humanitárias
e pela Cruz Vermelha. O projecto apresenta vários produtos, entre os
quais um Handbook. O website fornece ainda informações sobre eventos,
formações e documentos.
http://www.ifrc.org/publicat/wdr2007/summaries.asp
World Disasters Report, relatório anual que analisa a situação e os
números relativos aos desastres no mundo. A edição de 2007 tem como tema
central a discriminação.
http://eupolitics.einnews.com/news/eu-humanitarian-aid
EU Humanitarian Aid News, fornece notícias actualizadas sobre a ajuda
humanitária da UE, sobre a publicação de relatórios e sobre os resultados de
debates realizados sobre este tema.
www.daraint.org
DARA. Organização independente que, através da avaliação, visa melhorar
a qualidade e eficácia da ajuda humanitária e da cooperação para o
desenvolvimento. Publica anualmente o Índice de Resposta Humanitária
(http://www.daraint.org/web_es/hri_es.html).
http://www.urd.org/
Grupo Urgência, Reabilitação e Desenvolvimento, dedica-se
a compreender, analisar e inovar, ao nível operacional e estratégico, a
implementação da ajuda humanitária.
66
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
http://www.ngovoice.org/
VOICE - Voluntary Organisations in Cooperation in Emergencies,
é uma rede de cerca de 90 ONG europeias que trabalham no sector da Ajuda
Humanitária. O website fornece diversas notícias, publicações e informações
sobre actividades, bem como uma newsletter que pode ser solicitada online.
http://www.epn.peopleinaid.org/
Emergency Personnel Network, é uma rede informal de organizações
humanitárias, com a finalidade de melhorar a capacidade das instituições
para seleccionar e preparar os recursos humanos que intervêm em situações
de emergência.
67
Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal
Ficha Técnica
Título
Estudo sobre Ajuda Humanitária e
de Emergência em Portugal
Autoria
Raquel Freitas, Investigadora no
Centro de Investigação e Estudos
de Sociologia (CIES) do Instituto
Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL)
Comentários
Grupo de Trabalho de Ajuda
Humanitária e de Emergência da
Plataforma Portuguesa das ONGD
Edição
Plataforma Portuguesa das ONGD
Data
Outubro de 2012
Apoio
Camões, Instituto da Cooperação
e da Língua
Design Gráfico
Ana Grave
Pré-Impressão, Impressão
e Acabamento
Staff 4 You Lda.
ISBN 978-989-95715-6-3
O presente estudo foi realizado no âmbito
do Contrato Programa 2009-2013 entre a
Plataforma das ONGD e o IPAD, actual
Camões, Instituto da Cooperação e da Língua.
O estudo foi realizado para a Plataforma
Portuguesa das ONGD que detém propriedade
sobre o mesmo. O tratamento da informação e
as análises que aqui são expressas não refletem,
contudo, uma posição oficial desta organização,
sendo da exclusiva responsabilidade da autora
que o elaborou.
68
PLATAFORMA PORTUGUESA DAS ONGD
A Plataforma Portuguesa das Organizações Não-Governamentais para
o Desenvolvimento (ONGD) é uma associação privada sem fins lucrativos que representa um grupo de ONGD registadas no Ministério dos
Negócios Estrangeiros.
Constituída a 23 de Março de 1985, a Plataforma Portuguesa das
ONGD tem como missão contribuir para melhorar e potenciar o
trabalho a nível político, legislativo e social, promovendo as boas práticas das ONGD Portuguesas que trabalham para um mundo mais justo
e equitativo junto dos Países em Desenvolvimento em áreas como a
Cooperação, a Educação e a Comunicação para o Desenvolvimento
bem como a Ajuda Humanitária e de Emergência.
[capa]
MONAPO, MOÇAMBIQUE
recolha da água (pela população)
ADPM. 2010
Download

Estudo sobre Ajuda Humanitária e de Emergência em Portugal