IMPORTÂNCIA DA PROGRAMAÇÃO DIÁRIA DA OPERAÇÃO DO SISTEMA INTERLIGADO NACIONAL Criciéle Castro Martins Acadêmica do Curso de Engenharia Elétrica Universidade Federal do Pampa - UNIPAMPA [email protected] Mauricio Sperandio Professor do Curso de Engenharia Elétrica Universidade Federal de Santa Maria - UFSM [email protected] Resumo. O Setor Elétrico Brasileiro (SEB) conta com uma matriz energética com predominância hídrica, o que acarreta em um complexo sistema de planejamento da operação. Tal modelo de planejamento tem por objetivo encontrar uma solução ótima de despacho, buscando sempre a minimização de custos. Atualmente diversas matérias jornalísticas enfatizam o baixo nível dos reservatórios e o possível racionamento de energia. Com baixos períodos de afluências, as usinas térmicas são cada vez mais exigidas. Contudo, apesar do modelo afirmar que as térmicas possuem condições de abastecer o Sistema Interligado Nacional (SIN), dados do Operador Nacional do Sistema (ONS) diferem do mesmo. Este artigo tem por objetivo mostrar a situação do SEB atual, analisando as possíveis restrições do modelo de despacho. Palavras-chave: Hídrica; Setor Elétrico Brasileiro; Planejamento. 1. INTRODUÇÃO A atual matriz brasileira de produção de energia elétrica é composta por um complexo de usinas hidrelétricas, usinas termelétricas e outras fontes, centros de consumo e redes de transmissão de energia elétrica, no qual compõe o Sistema Interligado Nacional (SIN). Os processos de produção de energia possibilitam a entrega e intercâmbio por quase todo território nacional sob controle do Operador Nacional do Sistema (ONS). O sistema de geração do Brasil é caracterizado como hidrotérmico, ou seja, conta essencialmente com geração hídrica e térmica para abastecimento de seu sistema. A predominância está em usinas hidrelétricas, cerca de 63,02% da capacidade instalada, conforme dados apresentados pelo Banco de Informação de Geração da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). Sendo que apenas 25,93% da capacidade, tem origem térmica imune às incertezas acarretadas pelos fenômenos naturais [1]. Outros 2,71% são de usinas eólicas, a fonte que mais cresce em participação nos leilões de energia nova. Diversos modelos de otimização foram desenvolvidos para gerenciamento e operação dos sistemas de geração. Onde atualmente o ONS, utiliza o modelo NEWAVE, este baseado na Programação Dinâmica Dual Estocástica (PDDE), desenvolvido pelo Centro de Pesquisa de Energia Elétrica (CEPEL). O principal objetivo do ONS na cadeia de suprimento de energia elétrica pode ser resumido como: Cadeia de suprimento de energia elétrica, visando à produção de energia ao menor custo, com padrões adequados de segurança e continuidade, o ONS desenvolve uma série de atividades, que vão desde o planejamento da operação para os próximos anos, passando pela programação para os próximos dias ou semanas, até o controle da operação do Sistema Elétrico de Potência em XXVI CONGRESSO REGIONAL DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA EM ENGENHARIA – CRICTE 2014 8 a 10 de outubro de 2014 – Alegrete – RS – Brasil tempo real, executando nos Centros de Operação Nacional do Sistema Elétrico [2]. A última etapa do planejamento da operação antes da operação do sistema em tempo real é a Programação Diária da Operação – PDO, onde esta tem por objetivo a otimização do SIN. Sendo que nesta programação diária consideram-se disponibilidades do parque gerador hidrotérmico, bem como da malha da transmissão de energia [2]. As informações geradas do PDO são utilizadas para compor o Programa Diário da Operação Eletroenergético – PDE, que abrangem informações de caráter energético: Programa Diário de Produção – PDP, bem como o Programa Diário de Intervenções – PDI, que abrange diretrizes para a operação do SIN, considerando as manutenções previstas no sistema de transmissão [3]. Diante disso, nota-se a grande importância do planejamento para que o sistema elétrico opere com segurança e confiabilidade. Onde, conforme a situação atual do setor elétrico, exigência maior de térmicas, faz-se necessário uma maior avaliação do setor e o modelo de despacho utilizado para operação do mesmo. 2. A QUESTÃO HIDROLÓGICA DO SIN Várias matérias jornalísticas enfatizam que fatores climáticos tem afetado o Setor Elétrico Brasileiro (SEB). De onde vem também à tona a discussão que o Brasil possa vir a sofrer com um racionamento de energia como o ocorrido no ano de 2001 [5] [9]. Contudo, não somente os fatores climáticos afetam a característica de regularização dos reservatórios do sistema elétrico brasileiro. Outros fatores que levaram a alteração da regularização dos reservatórios são o aumento do consumo de eletricidade e a estagnação ou até mesmo diminuição da capacidade de armazenamento. Como pode ser observado na Figura 1, apresentada pela Empresa de Pesquisa Energética – EPE, há de se perceber que ao longo dos anos o país sofre com a diminuição da capacidade de armazenamento frente ao crescimento de carga. Sendo que os fatos que mais influenciam para esta situação são as crescentes restrições socioambientais para a aprovação e construção de novos reservatórios, bem com o assoreamento dos existentes. Figura 1. Evolução da Capacidade Armazenamento dos Reservatórios [4]. de Com isso, há uma maior dependência de boas afluências, e consequentemente, aumento da necessidade dos recursos térmicos para garantir o suprimento de energia. Consequência disso é que, desde outubro de 2012, as usinas térmicas vêm sendo bastante exigidas. O que provoca o aumento do preço da energia consumida e faz crescer significativamente a taxa de emissão de gases geradores de efeito estufa. De acordo com [5], que fez a análise da reserva estratégica desde 2004, verificou-se que, nesses oito anos, perdeu-se o equivalente a um mês de carga, caindo de 6 para 5 meses a capacidade de armazenamento no SIN. O mesmo debate o fato da construção de novos reservatórios, como uma possível solução, apontando que: Bem, se quiséssemos recuperar os 6 meses de carga que tínhamos em 2004, teríamos que aumentar em 6/5 (120%) a nossa capacidade de reserva. Isso significa construir novos reservatórios com capacidade equivalente a todo o Rio S. Francisco. Se fosse possível, quando estivessem prontos, já teríamos que repetir a dose. Portanto, sem descartar essa alternativa, a estratégia não vai solucionar o problema [5]. XXVI CONGRESSO REGIONAL DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA EM ENGENHARIA – CRICTE 2014 8 a 10 de outubro de 2014 – Alegrete – RS – Brasil Desta forma, para preparar-se para qualquer condição adversa do setor energético seria necessário um sobreinvestimento de uma magnitude que tornaria a tarifa de energia elétrica extremamente cara. O fato da exigência maior da capacidade do potencial hidráulico acarreta em um esvaziamento mais rápido dos reservatórios, mesmo em cenários de afluência média e, consequentemente, maior exigência térmica e aumento das tarifas pagas pela energia consumida. 3. A QUESTÃO TÉRMICA E O MODELO DE DESPACHO Como já citado anteriormente, o Setor Elétrico Brasileiro conta com uma sofisticada cadeia de modelos de despacho, que objetiva que a energia chegue ao menor preço possível para o consumidor. O seu último processo de cálculo está na Programação Diária da Produção - PDP, que fornece programas diários de geração hidráulica, térmica, eólica, bem como intercâmbios entre os agentes de operação, servindo como base para os centros de controle durante a operação em tempo real. A Figura 2, elaborada a partir de [6], ilustra o PDP, expressando-se a diferença entre o quanto as usinas que compõe o SEB precisam gerar e o quanto realmente forneceram ao sistema (Verificado), ao longo de 20 meses. Figura 2. Programação Diária de Produção X Energia Verificada. Observando a Figura 2, pode-se notar que principalmente as térmicas na maior parte do tempo não cumpriram a geração esperada. Entretanto, as hídricas, apesar das baixas afluências, tiveram que operar acima do planejado. Já as eólicas contribuem apenas com 0,7% do despacho programado e tiveram um saldo positivo de 345,45 MW médios nos meses de fevereiro a junho de 2014. A questão a ser analisada diante da Figura 2 é: porquê as térmicas não cumprem o esperado de sua geração, apesar dos baixos níveis dos reservatórios? Uma das causas possíveis é que o programa de planejamento energético, (o NEWAVE), não tem a capacidade de avaliação da quantidade de recurso térmico disponível. Em outras palavras, o modelo “enxerga” o combustível utilizado pelas usinas termelétricas como sendo infinito, possuindo todas as termelétricas do SIN a sua disponibilidade. Um exemplo que se pode verificar tal problema do modelo está no despacho das usinas térmicas de Cuiabá e Uruguaiana. Estas foram acionadas em caráter emergencial, no mês de abril de 2014, mas acabaram sem gerar, por falta de combustível, sendo este o gás natural. Com a interrupção das térmicas, o SIN deixou de receber 730 MW médios, tal volume acaba exigindo um consumo maior de água dos reservatórios [7]. De acordo com [8] existem aproximadamente 1.492 MW da capacidade instalada térmica suspensa pela ANEEL. Segundo a agência, estas usinas não têm capacidade de operar regularmente devido aos equipamentos estarem no final da sua vida útil. É o caso das UTES Alegrete, Campos, Piratininga, Nutepa e Brasília. Outro fato que o modelo não considera em suas simulações de despacho é que a maioria das termelétricas não foi projetada para operar continuamente, pois normalmente eram requisitadas apenas durante o horário de ponta do sistema, sendo limitadas principalmente pela capacidade de estoque de combustível. Assim como a vida útil dos equipamentos trás dificuldades na geração de eletricidade, acarretando na suspensão da XXVI CONGRESSO REGIONAL DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA EM ENGENHARIA – CRICTE 2014 8 a 10 de outubro de 2014 – Alegrete – RS – Brasil usina térmica, o tempo que a mesma levará para manutenção é outro fato que deve ser tomado como variável que afetará o modelo de despacho utilizado pelo SIN. Mario Veiga, da consultoria PSR, afirma que há um mistério no setor de energia, referindo-se ao fato dos altos níveis dos reservatórios nos inícios dos anos 2010 e 2012, terminando com baixos níveis de hidrologia, exigindo, assim, máxima capacidade térmica. Segundo ele, as hidrelétricas estão gastando mais água para o volume previsto de energia, ressaltando também o fato de poder haver erros nos cálculos de capacidade dos reservatórios, pois estes podem variar se com o decorrer dos anos, devido ao assoreamento e sedimentos, diminuindo assim a capacidade [9]. 4. REFERÊNCIAS [1] ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica. BIG – Banco de Informação de Geração. 2013. Disponível em< http://www.aneel.gov.br/aplicacoes/capacida debrasil/capacidadebrasil.cfm>. Acesso em: 21 agos. 2014. [2] SILVA, R. M. “Gestão de Risco no Programa Diário de Operação do Operador Nacional do Sistema Elétrico” 2013, Gestão de Projetos em Engenharias e Arquitetura, Brasília, 2013. [3] ONS, “Programação diária da operação eletroenergética”. Disponível em: < http://www.ons.org.br/download/procedimen tos/modulos/Modulo_8/Subm%C3%B3dulo %208.1_Rev_1.0.pdf>. Acesso: 1set. 2014. [4] EPE. Plano Decenal de Expansão de Energia 2019, Ministério de Minas e Energia. Empresa de Pesquisa Energética, Brasília, 2010. [5] ILUMINA. “Da superfície para as entranhas do modelo com defeitos genéticos”. Disponível em: <http://ilumina.org.br/da-superficie-para-asentranhas-um-modelo-com-defeitosgeneticos/>. Acesso: 1 set. 2014. [6] ONS. “Boletim Senamal de Operação”. Disponível em: <http://www.ons.org.br/resultados_operacao /boletim_semanal/index.htm>. Acesso: 20 agos. 2014. [7] ILUMINA. “Sem gás natural, térmicas de Cuibá e Uruguaiana deixam de gerar energia”. Disponível em: <http://ilumina.org.br/sem-gas-naturaltermicas-de-cuiaba-e-uruguaiana-deixam-degerar-energia-valor-economico/>. Acesso: 1 set. 2014. [8] JornaldaEnergia. ”ONS e Aneel “de olho” nas indisponibilidades térmicas”. Disponível em: <http://www.jornaldaenergia.com.br/ler_noti cia.php?id_noticia=13829>. Acesso: 1 set. 2014. [9] GLOBO.COM. “Risco de Racionamento”. Disponível em: <http://oglobo.globo.com/economia/miriam/ posts/2014/04/18/risco-de-racionamento532995.asp>. Acesso: 1 set. 2014. [9] FALCETTA. F. A. M., ZAMBON. R. C. “Evolução da Capacidade de Regularização do Sistema Hidrelétrico Brasileiro”. XX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos, 2013. CONSIDERAÇÕES FINAIS Através do modelo de planejamento energético do SEB tem-se a melhor escolha de energia a ser utilizada sempre minimizando os custos de operação. Logo, níveis hidrológicos baixos, acarretam em um despacho térmico maior. Tal modelo admite em suas simulações de previsão de despacho que há o total funcionamento dos recursos térmicos do SIN, não considerando, por exemplo, paradas para manutenção, possível falta de combustível, vida útil dos equipamentos. Em consequência disso, pode vir ocorrer falhas, de modo que, pode ser planejado operar determinada usina térmica através do modelo, não podendo então ser despachada devido algum fator que o mesmo não leva em consideração. Assim, serão despachadas usinas hidrelétricas para compensar tal erro. Diante disso, tem-se que o planejamento da operação é de fundamental importância, onde visa sempre aumentar a margem de segurança da operação energética. 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