SIMULAÇÃO DO DESEMPENHO TÉRMICO DE REDES DE PERMUTADORES DE CALOR SUJEITAS À INCRUSTAÇÃO Márcio Madi, Cezar O. R. Negrão, Rodrigo Massoqueti Laboratório de Ciências Térmicas – LACIT Departamento Acadêmico de Mecânica – DAMEC Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná – CEFET-PR Resumo Incrustação em permutadores de calor é um assunto que tem recebido forte atenção nos últimos anos na indústria de refino de petróleo, pois isto tem provocado perdas significativas na recuperação de energia. O presente trabalho tem por objetivo simular o comportamento térmico de uma rede de permutadores de calor sujeitos à incrustação. Equações de balanço de energia em regime estacionário são empregadas para determinar as temperaturas de saída das correntes dos permutadores de calor. Considera-se que não há mudança de fases no interior do permutador e que a resistência térmica da incrustação evolui linearmente com o tempo. Os resultados são então comparados com valores medidos experimentalmente, mostrando que há uma boa concordância entre eles. Além disso, mostra-se que a metodologia pode ser empregada para identificar o período adequado para limpeza dos permutadores de calor. 1 Introdução Permutadores de calor em uma refinaria de petróleo são altamente sujeitos a incrustações. Isto acarreta uma redução significativa do desempenho destes equipamentos com o tempo. Consome-se então mais energia nos fornos para compensar esta perda de desempenho. Periodicamente, necessita-se que os permutadores sejam retirados de operação para limpeza e manutenção. Segundo Bailey (1999), somente a indústria de refino de petróleo dos Estados Unidos gasta 2 bilhões de dólares por ano com problemas associados à incrustação. Identificar o período ótimo para limpeza dos permutadores de calor não é uma tarefa trivial. O número de permutadores de calor em uma rede (No pré-aquecimento de petróleo, pode-se encontrar mais de 50 permutadores de calor), a taxa de crescimento diferenciada da incrustação e o comportamento interdependente destes equipamentos dificultam esta tarefa. Além disso, existe a dificuldade de prever a perda de desempenho dos permutadores e conseqüentemente a estimar as despesas a ela associada. A simulação de redes de permutadores de calor é uma maneira de diagnosticar a performance destes equipamentos com o tempo e, portanto, pode ser empregada para estimar as despesas. O presente trabalho tem por objetivo simular uma rede de permutadores considerando a evolução da incrustação com o tempo. As temperaturas de saída dos permutadores serão calculadas baseadas em equações de balanço de energia. Para avaliar a resistência térmica da incrustação emprega-se uma relação linear com o tempo. 2 Modelo Matemático No presente modelo, o problema será considerado quase estático, ou seja, a inércia térmica do permutador de calor é relativamente rápida quando comparada ao tempo de variação das condições de operação da planta. Além disso, admite-se que não há mudança de fase dos fluidos no permutador de calor. Sendo assim, o balanço de energia pode ser escrito como: T2c = T1c + ) ( mc (T ) ( mc − T1c ) ⋅ ε (1) ) ( mc (T ) ( mc − T1c ) ⋅ ε (2) p mí n 1h p c T2h = T1h − p mí n 1h p h é a vazão mássica, c p , o calor específico do fluido a pressão constante e T , a temperatura onde m fluidos. Os índices “h” e “c” referem-se às correntes quente e fria e os números “1” e “2” representam as condições de entrada e saída dos permutadores, respectivamente. O subscrito min indica o menor valor de capacidade térmica entre as correntes quente e fria. ε é a efetividade do permutador de calor que depende do tipo de permutador de calor. Para um permutador de calor do tipo casco-tubo com um passe no casco e n pares de passes nos tubos, tem-se (Incropera e DeWitt, 1998): 2 ε= 1 + R + (1 + R 2 ) 1+ e − NTU (1+ R 2 ) × 100 (3) − NTU (1+ R 2 ) 1 − e Note que a efetividade é uma função da razão entre as capacidades térmicas: R= p ) min (mc p ) max (mc (4) e do Número de Unidades de Transferência (NTU): NTU = UA p ) min (mc (5) onde A é a área de transferência de calor. U é o coeficiente global de transferência de calor que pode ser expresso por: 1 1 1 1 1 1 = = = + R tf = + + R tf UA U o A o U i A i (UA) L h i Ai h o Ao (6) onde os índices o e i representam, respectivamente, o casco e o tubo e o índice L indica o permutador de calor limpo. R tf é a resistência térmica da incrustação de ambos os lados do permutador e o coeficiente h é o coeficiente de película que pode ser obtido de expressões da literatura (Kakaç e Liu, 1998). Estes coeficientes de película são dependentes da geometria, das vazões e das propriedades dos fluidos. Para estimativa da resistência térmica da incrustação ao longo do tempo, utilizou-se a correlação proposta por Madi et al. (2004): R tf ( t ) = R tfd ( t ) ⋅ IF( t ) (7) onde R tfd é a resistência térmica da incrustação definida no projeto do permutador de calor (TEMA, 1978). IF é o índice de incrustação proposto por Jerónimo et al. (1997). Nos permutadores de calor apresentados no presente trabalho, os índices de incrustação apresentam um crescimento linear com o tempo. O crescimento da incrustação é, portanto linear. 3 Metodologia para Solução das Equações O objetivo da simulação proposta é determinar a evolução das temperaturas de saída de todos permutadores de calor de uma rede. As equações (1) e (2) podem então ser escritas para cada permutador da rede, gerando assim um conjunto de equações lineares, uma vez que as vazões e as propriedades termofísicas são consideradas conhecidas. Estas equações são interdependentes e, portanto devem ser resolvidas simultaneamente. No presente trabalho, um procedimento iterativo é empregado na solução das equações lineares. 4 Resultados 4.1 Verificação do Modelo Quatro permutadores de calor de uma rede de pré-aquecimento de petróleo (Refinaria Presidente Getúlio Vargas da Petrobras, localizada em Araucária-PR) foram escolhidos para serem simulados. A Figura 1 ilustra estes quatro permutadores, designados por TC-04, TC-05, TC-06 e TC07. Os permutadores são do tipo casco-tubo, onde o petróleo escoa nos tubos e os produtos (fluidos quentes), no casco. A vazão de petróleo é a mesma em todos os permutadores analisados e os produtos em cada permutador têm vazões e temperaturas de entrada independentes. As vazões dos produtos e as cargas de petróleo variam no período. Utilizou-se curvas de crescimento de incrustação levantadas por Madi et al. (2004) para cada um dos quatro permutadores de calor. Os resultados da simulação foram então comparados com valores experimentais obtidos da operação da planta. Inicialmente, os permutadores foram considerados independentes, ou seja, tanto a temperatura do petróleo quanto dos produtos, obtidas experimentalmente, foram empregadas como condições de contorno para o problema. A Figura 2 apresenta a temperatura de saída do petróleo do permutador de calor TC-05 ao longo de um período de 29 meses. A queda na temperatura do petróleo entre os meses de maio/99 e fevereiro/00 está relacionada à redução da vazão do produto (fluido quente) no período. Note que a máxima diferença de temperatura observada entre os valores calculados e medidos é da ordem de 5°C. Nas simulações, não foram consideradas as variações de propriedades termofísicas. Vale ressaltar que as temperaturas medidas e calculadas mostram uma tendência similar, indicando que o modelo utilizado para prever a incrustação é adequado. Figura 2. Rede de permutadores de calor analisada. 250 TEMPERATURA (°C) 240 230 220 210 200 out/98 jan/99 abr/99 jul/99 out/99 jan/00 abr/00 jul/00 out/00 jan/01 DATA MEDIDO CALCULADO Figura 1. Temperatura de saída do petróleo do permutador de calor TC-05. Para o permutador de calor TC-06, a máxima diferença de temperatura observada entre os valores calculados e medidos na corrente de petróleo (Figura 3) é de 4°C. Mais uma vez, pode ser observada a mesma tendência das curvas e uma maior proximidade entre elas. Finalmente, comparou-se os valores calculados com os medidos para os quatro permutadores de calor em conjunto. Neste caso, as vazões do petróleo e dos produtos, a temperatura de entrada do petróleo no permutador TC-04 e as temperaturas de entrada dos produtos em todos os permutadores são as condições de contorno. A Figura 4 mostra a temperatura do petróleo na saída do permutador TC-07. Note que a máxima diferença de temperatura observada entre os valores calculados e medidos é da ordem de 25°C. A diferença destes valores aumenta quando a comparação é feita para a rede completa. Entretanto, o efeito da evolução da resistência térmica da incrustação pode ser notado igualmente nos valores da simulação e nos obtidos experimentalmente. 260 TEMPERATURA (°C) 250 240 230 220 210 200 out/98 jan/99 abr/99 jul/99 out/99 jan/00 abr/00 jul/00 out/00 jan/01 DATA MEDIDO CALCULADO Figura 3. Temperatura de saída do petróleo no permutador de calor TC-06. 300 290 TEMPERATURA (°C) 280 270 260 250 240 230 220 210 200 out/98 jan/99 abr/99 jul/99 out/99 jan/00 abr/00 jul/00 out/00 jan/01 DATA MEDIDO CALCULADO Figura 4. Temperatura de saída do petróleo da rede de permutadores de calor. 4.2 Potencialidades do Modelo Com a simulação, pode-se prever a redução do desempenho da rede de permutadores de calor com o tempo devido à incrustação e, conseqüentemente, o consumo extra com combustível queimado nos fornos. Além disso, a metodologia permite avaliar o desempenho da rede quando da retirada de um ou mais permutadores de calor para limpeza. Um estudo de caso foi conduzido com o objetivo de estimar a perda de desempenho da rede. As vazões do petróleo e do produto, temperaturas de entrada do petróleo no permutador TC-04 e dos produtos em todos os permutadores foram consideradas constantes, bem como as propriedades termofísicas. A mesma rede de permutadores de calor da Figura 1 foi utilizada nestas simulações. A rede inicia seu funcionamento com as resistências térmicas da incrustação nulas para todos os permutadores de calor. A Figura 5 mostra a evolução da temperatura do petróleo na saída da rede e a Figura 6, o calor trocado pela rede ao longo de trinta meses. Entre o nono e o décimo segundo mês, o permutador TC-06 é retirado da rede para ser efetuada a limpeza. Neste período, a rede opera com os demais permutadores e com um by-pass na posição do permutador retirado. Após este período, o permutador de calor TC-06 retorna totalmente limpo à rede. Ao final do vigésimo primeiro mês, o permutador TC-07 é também retirado para limpeza. A rede opera sem este permutador durante três meses, retornando totalmente limpo. As figuras 5 e 6 apresentam de forma evidente o efeito da incrustação na rede, bem como, o efeito da retirada dos permutadores; a temperatura do petróleo diminui na entrada dos fornos e a quantidade de calor trocada reduz, indicando que haverá um maior consumo de combustível nos fornos para atingir a temperatura de destilação. Além disso, observa-se que a limpeza de dois permutadores tem efeitos diferentes na rede. Pode-se ver que a limpeza do permutador TC-07 teve um impacto maior na recuperação do desempenho da rede. Apesar dos permutadores TC-06 e TC-07 apresentarem taxa de incrustação similares, o segundo estava mais sujo que o primeiro no momento da limpeza. Adicionalmente, o calor trocado pelo TC-07 é maior do que pelo TC-06, indicando que a sua limpeza terá maior efeito na troca de calor total da rede. A diferença entre o calor trocado pela rede limpa e pela rede suja indica o quanto a mais de calor deverá ser adicionado nos fornos. A integração desta diferença no período analisado possibilita o cálculo das despesas adicionais de combustível nos fornos. Portanto, a ferramenta apresentada possibilita identificar qual o período apropriado para limpeza dos permutadores de maneira a minimizar esta integral. 5 Conclusão Este trabalho apresenta uma metodologia para simulação de redes de permutadores de calor sujeitas ao processo de incrustação. As temperaturas de saída das correntes de fluidos de cada permutador são determinadas ao longo do tempo considerando o aumento da resistência da incrustação. Emprega-se o conceito de efetividade do permutador de calor no cálculo das temperaturas. Os coeficientes de película são avaliados de correlações da literatura e a resistência térmica da incrustação é baseada em funções que variam com o tempo, obtidas de Madi et al. (2004). Comparações com valores medidos de temperatura de permutadores de uma rede de préaquecimento mostram uma boa concordância, indicando que a metodologia é promissora. Uma vez que as propriedades termofísicas foram consideradas constantes na modelagem, espera-se uma melhora na comparação com o experimento se estas propriedades forem avaliadas em função da temperatura. Um estudo de caso considerando a incrustação dos permutadores e a limpeza de dois deles no período analisado mostra o potencial da metodologia apresentada. Pode-se ver que a metodologia é capaz de auxiliar na determinação do período ótimo de limpeza dos permutadores de calor. O período ótimo é aquele que minimiza as despesas adicionais com combustível nos fornos associadas à incrustação. 260 255 250 240 235 230 225 220 215 210 205 200 1 3 5 7 9 11 13 15 17 19 21 23 25 27 29 PERÍODO (meses) Figura 5. Temperatura de saída do petróleo na rede de permutadores de calor. 14000 12000 CALOR TROCADO (kW) TEMPERATURA (°C) 245 10000 8000 6000 4000 2000 0 1 3 5 7 9 11 13 15 17 19 21 23 25 27 29 PERÍODO (meses) Figura 6. Calor trocado pelo petróleo na rede de permutadores de calor. 6 Referências BAILEY, K. Optimize heat exchanger operations by minimizing fouling. Hydrocarbon Processing,, v. 78, n. 6, p. 113-116, 1999. INCROPERA, F. P., WITT, D. P. Fundamentos de transferência de calor e de massa. 4. ed Rio de Janeiro - RJ: LTC Livro Técnico e Científico Editora S.A.1998. 600p JERÓNIMO, M. A. S., MELO, L. F., BRAGA, A. S., FERREIRA, P. J. B. F., MARTINS, C. Monitoring the thermal efficiency of fouled heat exchangers – a simplified method. Experimental Thermal and Fluid Science, v. 14, p. 455-463, 1997. KAKAÇ, S., LIU, H. Heat exchangers – selection, rating and thermal design. 1. ed. New York: CRC Press. 1998. 424p. MADI, M. NEGRÃO, C. O. R., MASSOQUETTI, R. Análise do crescimento da resistência térmica da incrustação em trocadores de calor. In: Congresso Nacional de Engenharia Mecânica, Belém -PA, Brasil. ago, 2004. (a ser publicado) TEMA. 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