GRUPO DE ESTUDOS “DESENVOLVIMENTO EM VIGOTSKI” - PELO C. E. DA VILA OPERÁRIA Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 1 / slide 2 CONTÉUDOS 1 – “O mais importante será o último” - direcionamento para nossa apresentação 1.1 O central não são funções que pessoas desenvolvem mas pessoas que desenvolvem funções 1.2 Necessidade teórica e metodológica de tratar o desenvolvimento como interfuncional 1.3 Importância metodológica da “unidade de análise” contendo as contradições da totalidade 2 – Breve histórico do conceito de desenvolvimento como princípio teórico geral em Vigotski 2.1 1926-27: Centralidade metodológica da dialética e suas implicações para a psicologia 2.2 1928: Dialética entre as linhas biológica e cultural - no “manifesto da teoria histórico-cultural” 2.3 1931: Conceito geral de desenvolvimento como “processo dialético complexo” 2.4 1933-34: Radicalização do conceito de contradição dialética imanente ao desenvolvimento 3 – O problema da periodização do desenvolvimento em Vigotski 3.1 Neoformação guia como critério para a idade psicológica 3.2 Situação social do desenvolvimento como força motriz para a emergência da neoformação guia 3.3 O conceito geral de “crise de desenvolvimento” em Vigotski 3.4 Quadro esquemático das idades psicológicas segundo Vigotski 3.5 Breve crítica de Daniil B. El’konin à visão de Vigotski 4 – A metáfora da “zona blijaishego razvitiia” (no Brasil: z.d. proximal, próximo, imediato, iminente) 4.1 Definições literais de Vigotski sobre o conceito de ZBR 4.2 Alguns cortes ontogenéticos nos quais o conceitos de ZBR se insere 4.3 Caráter metafórico e limitado de definir o desenvolvimento como “tópico” (um espaço) 4.4 Necessidade de manter o conceito sem fazer dele uma panaceia Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 1 / slide 3 1 – “O mais importante será o último” - direcionamento para nossa apresentação A noção presente em Vigotski de que “O mais importante será o último” (1933-34/1991, p. 130) está em clara consonância com a célebre afirmação metafórica (e não tão metafórica) de que a “anatomia do homem é a chave da anatomia do macaco” (Marx e Engels, apud Vygotski, 1926-27/1991, p. 261). (a) Isso se aplicava à Economia Política. Antes de haver capitalismo não havia a forma de circulação de valor que gera o que se chama “capital”*. Em outras épocas também houve expropriação do excedente da produção. O qual poderia se acumular, por exemplo, pelo entesouramento. Mas não havia a forma “capital”. Entretanto, deslindando a natureza da produção e reprodução do valor na sociedade capitalista, a economia mais avançada até então (ainda não superada), que Marx (1867/1983) fornecerá categorias para compreensão crítica até mesmo dos modos de produção mais arcaicos, nos quais não havia “capital”. _____ * Lembremos que “dinheiro não é capital”, mas forma primária do capital que se transforma nele no processo de circulação: D – M [MP+FT] – D’ [D+ΔD] (cf. Marx, 1867/1983, p.125-145). Houve dinheiro muito antes de haver capitalismo. Porém, com tal modo de produção, foi possível compreender criticamente a função econômica do dinheiro como equivalente geral de troca. Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 1 / slide 4 1 – “O mais importante será o último” - direcionamento para nossa apresentação (b) Na psicologia, Vigotski, pela via metodológica de Marx, propõe-se estudar, por primeiro, as formas mais avançadas de desenvolvimento da consciência para compreender toda sua gênese desde o nascimento. Sem saber “para onde” o desenvolvimento vai, não se entende “de onde” vem. Porém, mesmo que Vigotski, com certa “licença poética”, fale de “forma ideal” (1935/ 2010, p. 693 a 699), não há modelo adulto “perfeito” com todos os critérios de para onde deve se desenvolver a criança. Por princípio, tal “forma ideal” seria um ser humano livre. “Uma grande imagem do desenvolvimento da personalidade: [é] um caminho para a liberdade. Renascimento do espinosismo na psicologia marxista” (Vygotsky, 1932/2010, p. 92-93) Porém “o último” ainda não chegou, sequer como um só ser na totalidade da espécie humana. Nem como pais ou professores que educam, cada qual em sua especificidade, uma criança. A “forma mais avançada”, ademais, não depende só de “boa educação” familiar ou escolar, mas da transformação, nunca realizada, de toda sociedade. É paradoxal e desafiador que gerações futuras superem as atuais, sem estas poderem dar exemplo de uma humanidade melhor. Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 1 / slide 5 1 – “O mais importante será o último” - direcionamento para nossa apresentação (c) Contudo proponho aqui um terceiro sentido para “dar prioridade ao que vem por último”. Não na economia política, não no desenvolvimento do psiquismo, mas na história do trabalho criativo de um autor. A invés de começar por como ele pensava quando iniciou seu caminho na psicologia, comecemos por suas ideias mais avançadas, formuladas mais perto de sua morte. O que vem por último contém e desenvolve alguns dos insights progressistas que havia no início e contempla também críticas e superação de noções que se tornaram insuficientes. Por isso, nossa tentativa será a de “começar pelo final” quanto à gênese do próprio conceito de desenvolvimento em diferentes obras de Vigotski. O grupo avaliará este material sob o critério de dar ao menos um passo nessa direção. * * * [vamos aos itens 1.1, 1.2, e 1.3] Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 1 / slide 6 1 – “O mais importante será o último” - direcionamento para nossa apresentação 1.1 O central são as pessoas que desenvolvem funções e não as funções que pessoas desenvolvem. Até o fim da vida, Vigotski (cf. 1934/2005) priorizou as funções psíquicas superiores. Mas seu modo de concebê-las vai avançando para uma concepção na qual: mais importante que as funções são as pessoas que as colocam em função da organização geral de sua consciência, sua personalidade, sua existência social. Algumas citações o indicam: ● Em 1933-34: “A atenção não é uma unidade da consciência, senão um elemento da consciência, carente de outros elementos, com a particularidade de que [neste elemento] a integridade da consciência desaparece.” (Vygotski, 1933-34/2006, p. 383) Destacamos não que a função psíquica superior da “atenção” seja sem valor, ela tem grande importância, mas que tomada de modo isolado de outros elementos, a função se restringe à sua particularidade e a “integridade da consciência desaparece”. É justo a “integridade da consciência” que a proposta de Vigotski visa a explicar e ajudar a superar seus limites. E não funções particulares, como aquelas “medidas” por testes na psicologia tradicional. Logo, o objetivo essencial da educação para Vigotski não pode ser “desenvolver as funções psíquicas superiores dos alunos”, mas promover seu desenvolvimento como seres humanos integrais. Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 1 / slide 7 1 – “O mais importante é o último” - direcionamento para nossa apresentação 1.1 O central são as pessoas que desenvolvem funções e não as funções que pessoas desenvolvem. ● Em 1930: “(...) o decisivo não é a memória, ou a atenção, são até que ponto o humano faz uso dessa memória, que papel ela desempenha. Temos visto que os sonhos podem desempenhar um papel central para o cafre. Para nossa vida psicológica são parasitas que não jogam nenhum papel de importância. O mesmo sucede com o pensamento. Quantas inteligências estéreis há que não produzem nada! Quantas inteligências que pensam, mas que não atuam! Todos conhecemos esta situação quando sabemos como há que atuar, mas fazemos de outra maneira.” (Vygotski, 1930/1991, p. 91) ● Em 1929: “Realmente, não se pode compreender a atividade de qualquer aparato nervoso sem uma pessoa [bez tcheloveka]. Este cérebro — é de uma pessoa. Esta mão é a de uma pessoa.. Nisto está a essência.” (Vigotski, 1929/1986, p. 58 – trad. nossa) “Um pensamento não pensa, uma pessoa é quem pensa. (...) Uma vez que uma pessoa pensa, perguntamos: qual pessoa” (Vigotski, 1929/1986, p. 5859 – trad. nossa, grifo na fonte) [vamos ao item 1.2] Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 1 / slide 8 1 – “O mais importante é o último” - direcionamento para nossa apresentação 1.2 Necessidade teórica e metodológica de tratar o desenvolvimento como interfuncional ● Em 1933-34: “Que é o que move os significados, que determina seu desenvolvimento? «A cooperação [сотрудничество] entre consciências». O processo de alienação [отчуждения] da consciência. A cisão [расщепление] é inerente à consciência. A fusão [слияние] é inerente à consciência. <São necessárias à consciência.> Como surge a generalização? Como varia a estrutura da consciência? Ou bem: o humano recorre ao signo, e isto engendra o significado, ou bem o significado devém da consciência. Não é o último o que ocorre. As relações interfuncionais determinam o significado = a consciência, a atividade da consciência. «A estrutura do significado vem determinada pela estrutura da consciência como sistema. A consciência está estruturada como sistema.» (Vygotski, 1933-34/1991, p. 129 – negrito da fonte, sublinhado nosso) Notemos o tema do desenvolvimento Para estudar a consciência (objeto de análise) é preciso unidade de análise (significado da palavra/palavra significativa) alhures, Vigotski (1934/2001) diz que a principal contribuição do grupo aos estudos sobre pensamento/linguagem é a “descoberta” de que “o significado se desenvolve” concluímos que a consciência se desenvolve assim = as relações interfuncionais que a constituem são o que se desenvolve. Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 1 / slide 9 Adendo ao slide 8 [voltar] Сотрудничество [Sotrudnitchestvo] Отчуждение [Ottchujdenie] cooperação ; colaboração (обособленность) isolamento , separação; alienação, expropriação [está em oposição dialética com “cooperação” ADJr] Слияние [Sliianie] Расщепление [Rasshtcheplenie] (рек) confluência ; (соединение) união ; (организаций) fusão partição , ru(p)tura ; dissociação , desdobramento , desagregação ; (ядра, атома) fissão , cisão ; (распад) desintegração [também é um caso de oposição e complementariedade, como no par acima ADJr ] Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 1 / slide 10 1 – “O mais importante é o último” - direcionamento para nossa apresentação 1.2 Necessidade teórica e metodológica de tratar o desenvolvimento como interfuncional Um modo de exemplificar, talvez, o caráter interfuncional da consciência e do seu desenvolvimento em função das relações sociais, da cultura e do momento histórico em que ambas se situam: ● Em 1930: “No processo de desenvolvimento ontogenético, as emoções humanas entram em conexão com as normas gerais relativas tanto à autoconsciência da personalidade como à consciência da realidade. Meu desprezo a outra pessoa entra em conexão com a valoração desta pessoa, com a compreensão dela. E nessa complicada síntese é que transcorre nossa vida. O desenvolvimento histórico dos afetos ou das emoções consiste fundamentalmente em que se alteram as conexões iniciais em que se produziram e surgem em uma nova ordem de conexões. (Vygotski, 1930/1991, p. 87) [continua] Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 1 / slide 11 1 – “O mais importante é o último” - direcionamento para nossa apresentação 1.2 Necessidade teórica e metodológica de tratar o desenvolvimento como interfuncional [continuando] ● Em 1930: “Temos dito que, como expressava Espinosa, o conhecimento de nosso afeto o altera, transformando-o de um estado passivo em outro ativo. Que eu pense coisas que estão fora de mim não altera nada nelas, mas que eu pense afetos, que os situe em outras relações com meu intelecto e outras instâncias [*], altera muito minha vida psíquica. Dito simplesmente, nossos afetos atuam em um complicado sistema com nossos conceitos e quem não saiba que o ciúme de uma pessoa relacionada com os conceitos maometanos da fidelidade da mulher é diferente do de outra relacionada com um sistema de conceitos opostos sobre o mesmo, não compreende que esse sentimento é histórico, que de fato se altera em meios ideológicos e psicológicos distintos, apesar de que nele recai indubitavelmente certo radical biológico, em virtude do qual surge esta emoção”. (Vygotski, 1930/1991, p. 87) * * * * {afeto ↔ intelecto} ↔ {outras instâncias (?)}. Temos uma importante distinção “misteriosa”! [ADJr] [Passaremos ao item “1.3”] Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 1 / slide 12 1 – “O mais importante será o último” - direcionamento para nossa apresentação 1.3 Importância metodológica da “unidade de análise” contendo as contradições da totalidade Temos que: (a) A pessoa, no caráter integral de sua personalidade e de sua consciência, é mais importante do que as funções psíquicas em separado. Pois é a pessoa que coloca suas funções “em função”, numa dada relação social – nisso a “pessoa” é um conceito que não se resume a “indivíduo”. (b) A importância das funções psíquicas só pode ser compreendida se elas situam-se num sistema interfuncional integral. As partes só podem ser compreendida em relação com a totalidade. (c) Da segunda afirmação deriva um problema de método para quem deseja compreender o processo de desenvolvimento como um todo. Trata-se de que a totalidade das relações sociais que o ser humano vive e que, em suas contradições, constituem que nós somos, não pode ser captada em cada minúcia pelo pesquisador. Nem mesmo quem vive todas essas relações poderá sequer relatar tudo o que viveu, com quem e onde... (d) Coloca-se o problema da busca metodológica por uma “unidade de análise” para o estudo da gênese da consciência, que, por sua vez, “transborda” para o desenvolvimento de toda a personalidade – indissociavelmente, mas não como sinônimos. (e) A unidade seria diferente do elemento. O elemento não contém todas as contradições do todo, porém a unidade contém ao menos as principais contradições do todo. Falaremos, brevemente, sobre duas unidades possíveis para Vigotski: a vivência (unidade personalidade-meio) e o significado (unidade pensamento-fala). Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 1 / slide 13 1 – “O mais importante será o último” - direcionamento para nossa apresentação 1.3 Importância metodológica da “unidade de análise” contendo as contradições da totalidade Em 1935*: “Se se quer saber como se forma a unidade, como se modifica, de que modo influi sobre o curso do desenvolvimento infantil, o fundamental é não fracionar a unidade em suas partes integrantes, porque o fazendo se perdem as qualidades essenciais próprias dessa unidade, mas sim tomar uma unidade, por exemplo, em relação com a linguagem e o pensamento. Se tem tentado ultimamente destacar uma unidade, por exemplo, o significado. Mas o significado da palavra é uma parte da mesma, uma formação verbal, já que uma palavra carente de significado deixa de ser palavra. Todo significado da palavra, por ser uma generalização {383:}, é o produto da atividade intelectual da criança. Portanto, o significado da palavra é a unidade indivisível da linguagem e do pensamento.” (Vygotski, 193334/2006, p. 382-383) [continua] Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 1 / slide 14 1 – “O mais importante será o último” - direcionamento para nossa apresentação 1.3 Importância metodológica da “unidade de análise” contendo as contradições da totalidade Em 1935*: “Podemos assinalar do mesmo modo a unidade para o estudo da personalidade e o meio. Em psicologia e psicopatologia essa unidade se chama vivência. A vivência da criança é aquela simples unidade sobre a qual é difícil dizer se representa a influência do meio sobre a criança ou uma peculiaridade da própria criança. A vivência constitui a unidade da personalidade e do entorno tal como figura no desenvolvimento. Portanto, no desenvolvimento, a unidade dos elementos pessoais e ambientais se realiza em uma série de diversas vivências da criança. A vivência deve ser entendida como a relação interior da criança como ser humano, com um ou outro momento da realidade. Toda a vivência é vivência de algo. Não há vivências sem motivo, como não há ato consciente que não seja ato de consciência de algo. Entretanto, cada vivência é pessoal. A teoria moderna introduz a vivência como unidade da consciência, isto é, como unidade na qual as possibilidades básicas da consciência figuram como tais, enquanto que na atenção, no pensamento não se dá tal relação. A atenção não é uma unidade da consciência, senão um elemento da consciência, carente de outros elementos, com a particularidade de que [neste elemento] a integridade da consciência como tal desaparece. A [uma] verdadeira unidade dinâmica da consciência, unidade plena que constitui a base da consciência é a vivência” (Vygotski, 1933-34/2006, p. 383 – grifos nossos). Em azul passagem citada no slide “6”. Demonstra que o problema da unidade é próprio ao da integridade – e vice versa. [ADJr] Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 1 / slide 15 1 – “O mais importante será o último” - direcionamento para nossa apresentação 1.3 Importância metodológica da “unidade de análise” contendo as contradições da totalidade No texto do qual extraímos as citações anteriores podemos visualizar três pares complementares citados por Vigotski (1933-34/2006). Este texto é o último da primeira parte de nossas leituras em grupo, chamase “A crise dos sete anos” [fiz tradução do espanhol ao português para alunas, não sei se lhes será útil]. Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 1 / slide 16 1 – “O mais importante será o último” - direcionamento para nossa apresentação 1.3 Importância metodológica da “unidade de análise” contendo as contradições da totalidade Entendo que “vivência” é uma unidade mais ampla. Pois personalidade abrange muito mais do que pensamento. E as relações com o meio social abrangem mais do que os momentos de comunicação pela linguagem – embora haja linguagem interior nos mais diversos momentos da nossa vida, até mesmo dormindo. Dizendo isso numa palestra em novembro de 2010, uma pesquisadora me perguntou “Por que, então, não ficar apenas com a unidade mais ampla?” – excelente pergunta! Porém há algo que avalio impedir relação de exclusão/eleição entre as unidades. É o que se explicita no primeiro capítulo de “Pensamento e linguagem” – escrito em 1934: Em 1934: “Verificou-se que a comunicação sem signos é tão impossível quanto sem significado. Para se comunicar alguma vivência ou algum conteúdo da consciência a outra pessoa não há outro caminho a não ser a inserção desse conteúdo numa determinada classe, em um grupo de fenômenos, e isto, como sabemos, requer necessariamente generalização. Verifica-se, desse modo, que a comunicação pressupõe necessariamente generalização e desenvolvimento do significado da palavra” (Vigotski 1934/2001, p. 12 – grifos nossos). Foi traduzido no Tomo IV: “A verdadeira unidade”. Mas a língua russa não tem a classe gramatical “artigo”. Não há artigo “a” nem indefinido “uma”. É preciso deduzir. Se Vigotski acabara de dizer que há duas unidades, a vivência não deve ser “a única” verdadeira unidade. [Passaremos à PARTE 2] Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 2 / slide 17 2 – Breve histórico do conceito de desenvolvimento como princípio teórico geral em Vigotski [Bem breve mesmo, uma boa dica para publicação seria alguém de vocês detalhar esse “desenvolvimento do conceito de desenvolvimento” em Vigotski. ;)] 2.1 1926-27: Centralidade metodológica da dialética e suas implicações para a psicologia Mesmo que “Psicologia da Arte” (tese de 1925, elogiada por Kornílov) apresente uma dialética “individual-coletivo”, “conteúdo-forma”, etc., o princípio genético-causal não está ali tão desenvolvido. Além disso, tal obra traz marcas de um materialismo fisiológico que também aparecerão na chamada “teoria histórico-cultural”, embora já não enfatizando “reações” (estéticas, p.e.), mas “estímulos objeto” e “estímulos meio”. Concordo com Veresov (1999) em que “O significado [sentido] histórico da crise da psicologia” (Vygotski, 1926-27/1991) seja uma obra de transição: do período mais reflexológico/ reatológico do trabalho científico de Vigotski, para o da “teoria histórico-cultural” (1928-1931). Penso que a chave da mudança esteja na explicitação da dialética como princípio geral da psicologia: 1926-27: “A única aplicação legítima do marxismo em psicologia seria a criação de uma psicologia geral cujos conceitos se formulem em dependência direta da dialética geral, porque esta psicologia [geral] não seria outra coisa a não ser a dialética da psicologia” (Vygotski, 1926-27/1991, p. 388) [continua] Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 2 / slide 18 2 – Breve histórico do conceito de desenvolvimento como princípio teórico geral em Vigotski 2.1 1926-27: Centralidade metodológica da dialética e suas implicações para a psicologia “Significado histórico da crise da psicologia” critica abordagens da época, por reduzirem a explicação geral do psiquismo a um só princípio – como “reflexo”, “sexualidade”, “estrutura”, entre outros... Por exemplo: o cálculo do matemático ou o intelecto do macaco – “tudo é estrutura”; a masturbação de um adolescente ou um livro de Dostoiévski – “tudo é sexualidade reprimida”. Tal redução do geral ao específico e/ou generalização indiscriminada do particular, seria ideologia para Vigotski. O legítimo princípio geral da psicologia para Vigotski seria a dialética – como citado no slide 17. Cabe colocar a “dialética” como princípio geral não implica repetir a generalização indiscriminada. Nada explicamos dizendo: a violência contra a mulher “é um processo dialético”; nosso gosto por esta poesia “é um processo dialético”. Seria também uma apropriação meramente ideológica, não metodológica, do princípio. Ao contrário, a dialética como princípio geral leva a perceber que há o predomínio de diferentes princípios explicativos e forças motrizes do psiquismo humano, em cada momento da vida, a qual passa por profundas mudanças revolucionárias na transição para um novo momento. É possível vislumbrar, na crítica metodológica, uma mais nítida direção para a teorização psicológica, como explicação do psiquismo por sua gênese. O que não está claramente presente em obras de 1924 a 1925, por exemplo. Por isso, consideramos este um momento histórico relevante para o avanço teórico do conceito de desenvolvimento em Vigotski. [passaremos ao item 2.2] Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 2 / slide 19 2 – Breve histórico do conceito de desenvolvimento como princípio teórico geral em Vigotski 2.2 1928: Dialética entre as linhas biológica e cultural - no “manifesto da teoria históricocultural” Andrei Puziréi (1989), considera “O problema do desenvolvimento cultural da criança” (Vygotsky, 1928/1994) o “manifesto” da “teoria histórico-cultural”. Nome dado por adversários de Vigotski e Luria, mas incorporado depois por continuadores da obra de Vigotski referindo-se não só ao período de 1928 a 1931, mas a toda sua produção - metonímia da parte pelo todo. Sobre desenvolvimento, destacamos: (a) Existem duas linhas principais: “Nós devemos, portanto, distinguir as principais linhas do desenvolvimento do comportamento da criança. Primeiro, há a linha natural do desenvolvimento. (...) Segundo, há a linha do aprimoramento cultural das funções psicológicas, a elaboração de novos métodos de raciocínio, o domínio de métodos culturais de comportar-se” (Vygotsky, 1928/1994, p. 37). (b) Os signos são essenciais na linha cultural: “O desenvolvimento cultural consiste em dominar métodos de comportar-se que são baseados no uso de signos como meios de complementar alguma operação psicológica particular” (Vygotsky, 1928/1994, p. 38). Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 1 / slide 20 2 – Breve histórico do conceito de desenvolvimento como princípio teórico geral em Vigotski 2.2 1928: Dialética entre as linhas biológica e cultural - no “manifesto da teoria históricocultural” (c) As duas linhas não estão em relação dualista: “A cultura, geralmente falando, não produz nada de novo à parte do que é dado pela natureza. Mas ela transforma a natureza para cumpri as finalidades do humano. Estas mesmas transformações ocorrem também no desenvolvimento cultural do comportamento.” (Vygotsky, 1928/1994, p. 59). (d) O estudo da relação entre as linhas deve ter método: “Este método pode ser convencionalmente chamado ‘instrumental’ já que é baseado na ‘função instrumental’ dos signos culturais no comportamento e em seu desenvolvimento. (...) “No plano da investigação experimental este método é baseado no ‘método funcional da dupla estimulação’” (Vygotsky, 1928/1994, p. 69). [dupla estimulação => estímulos objeto; e estímulos meio – ADJr] (e) Buscando objetividade, tal método: “(...) é baseado no método dos reflexos condicionais” (1928/1994, p.70). [mas vai além dessa base – ADJr] [continua] Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 2 / slide 21 2 – Breve histórico do conceito de desenvolvimento como princípio teórico geral em Vigotski 2.2 1928: Dialética entre as linhas biológica e cultural - no “manifesto da teoria históricocultural” Diagrama do método da dupla estimulação (f) O princípio da “gênese” guia o método: “Este método em sua verdadeira essência é um método histórico-genético” (Vygotsky, 1928/1994, p 70). Nesta direção, o autor retoma a afirmação de Pavel Blonski: “O comportamento apenas pode ser entendido como história do comportamento” (apud VYGOTSKY, 1928/ 1994, p. 70). [passaremos ao item 2.3] Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 2 / slide 22 2 – Breve histórico do conceito de desenvolvimento como princípio teórico geral em Vigotski 2.3 1931: Conceito geral de desenvolvimento como “processo dialético complexo” Como há críticas à coletânea Formação social da mente, buscamos a definição de desenvolvimento que nele aparece nas fonte russa e espanhola. Nelas não está tão organizado, mas eis o fragmento mais significativo: “Перед психологией встает сейчас задача — уловить “La tarea que se plantea hoy día a la psicología es la de реальное своеобразие поведения ребенка во всей captar la peculiaridad real de la conducta del niño en полноте и богатстве его {136:} действительного toda su plenitud y riqueza de expansión y presentar ele . выражения и дать позитивный снимок, с личности positivo de su personalidad. Sin embargo el positivo [*] ребенка. Но позитивный снимок возможен только в puede hacerse tan sólo en el caso de que se modifique том1933-34: случае, если мы кореннымdo образом изменим de raízdialética la concepción sobre el ao desarrollo infantil y se 2.4 Radicalização conceito de contradição imanente desenvolvimento наше представление о детском развитии и примем comprenda que se trata de un complejo proceso во внимание, что оно представляет собой сложный dialéctico, que se distingue por una complicada диалектический процесс, который характеризуется periodicidad, la desproporción cualitativa de unas сложной периодичностью, диспропорцией в formas en otras, un entrelazamiento complejo de развитии отдельных функций, метаморфозами, или procesos evolutivos y involutivos, el complejo cruce de качественным превращением одних форм в другие, factores externos y internos, un complejo proceso de сложным сплетением процессов эволюции и superación de dificultades y adaptación.” (Vygotski, инволюции, сложным скрещиванием внешних и 1931/2000, p. 141) внутренних факторов, сложным процессом преодоления трудностей и приспособления” (Vigotski, 1931/1983, p. 135-136) * Está criticando o fato de a psicologia avaliar as crianças apenas por aquilo que lhes falta, que não atingiram ainda, ou seja, pelo “negativo” [ADJr]. Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 2 / slide 23 2 – Breve histórico do conceito de desenvolvimento como princípio teórico geral em Vigotski 2.3 1931: Conceito geral de desenvolvimento como “processo dialético complexo” “Nosso conceito de desenvolvimento implica a rejeição do ponto de vista comumente aceito de que o desenvolvimento cognitivo é o resultado de uma acumulação gradual de mudanças isoladas. Acreditamos que o desenvolvimento da criança é um processo dialético complexo caracterizado pela periodicidade, desigualdade no desenvolvimento de diferentes funções, metamorfose ou transformação qualitativa de uma forma em outra, embricamento de fatores internos e externos, e processos adaptativos que superam os impedimentos que a criança encontra. Dominados pela noção de mudança evolucionária, a maioria dos pesquisadores em psicologia da criança ignora aqueles pontos de viragem, aquelas mudanças convulsivas e revolucionárias que são tão frequentes no desenvolvimento da criança. Para a mente ingênua, evolução e revolução parecem incompatíveis e o desenvolvimento histórico só está ocorrendo enquanto segue uma linha reta. Onde ocorrem distúrbios, onde a trama histórica é rompida, a mente ingênua {84:} vê somente catástrofe, interrupção e descontinuidade. Parece que a história para de repente, até que retome, uma vez mais, a via direta e linear do desenvolvimento” (Vygotsky, 1989 – p. 83-84) [voltar] [ir para a página do grupo] Referência: VYGOTSKY, L. S. (1989/1931) Problemas de método [cap. 5]. In: ______. A formação social da mente. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, . p. 83-84. Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 2 / slide 24 2 – Breve histórico do conceito de desenvolvimento como princípio teórico geral em Vigotski 2.4 1933-34: Radicalização do conceito de contradição dialética imanente ao desenvolvimento Temos duas citações que entendemos ampliar a radicalidade dialética do conceito de desenvolvimento em Vigotski. Não podemos extrair aqui todas as suas implicações metodológicas, teóricas e práticas. Serão apenas apresentadas seguidas de breve comentário. 1931: Na defectologia, Vigotski afirma que o desenvolvimento é: “o artificial dualismo do ambiente e da herança nos leva a um caminho equivocado, nos esconde o fato de que o desenvolvimento é um processo ininterrupto, que se autocondiciona e não uma marionete manobrada com dois fios” (Vygotski, 1931/1997, p. 325). Os fios seriam: herança genética e ambiente social. A categoria dialética da “contradição”, integração de realidades opostas, não permite ver o desenvolvimento como resultado de duas determinações – mas como síntese que as incorpora. Dizer que “o desenvolvimento se autocondiciona” implode a lógica formal e idealismo. Pois perguntamos: Quais as condições para a história, senão as condições históricas? [continua] Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 2 / slide 25 2 – Breve histórico do conceito de desenvolvimento como princípio teórico geral em Vigotski 2.4 1933-34: Radicalização do conceito de contradição dialética imanente ao desenvolvimento [concluindo a PARTE 2] 1933-34: Na pedologia, Vigotski afirma que em seu desenvolvimento: “a criança é parte do entorno vivo, (...) este meio nunca é externo para ela. Se a criança é um ser social e seu meio é o meio social, se deduz, portanto, que a própria criança é parte do meio social” (Vigotski, 1933-34/2006, p. 382). Pela “Lei genética geral do desenvolvimento cultural” tudo primeiro é social/interpsíquico/externo para então se tornar individual/intrapsíquico/interno. Mas por que o meio social “nunca é externo” à criança? É que em relação com alguém, “social” não é só “outra pessoa”, mas nós. Interpsíquico não é só “outro psiquismo” agindo sobre o meu pela mediação do signo, mas nossa ação conjunta e assimétrica de produção de sentido. O “externo” que se torna “interno” já era relação entre meu desenvolvimento e o de outra pessoa. “Inter” é “entre”: se algo ocorre “entre nós”, tanto eu quanto vocês agimos. Até porque o desenvolvimento também nunca é só “interno” (endógeno), mas síntese dialética biológico-cultural. O que vai contra a visão da sociabilidade como realidade estranha à vida “natural” da criança (“background”, “habitat”, “fator”...) e desta sendo moldada sob pressão de tais forças “externas”. [passaremos à PARTE 3] Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 3 / slide 26 3 – O problema da periodização do desenvolvimento em Vigotski “Periodização do desenvolvimento” em Vigotski é “problema” porque, dos estudiosos do desenvolvimento, é dos que mais enfatiza o seu caráter histórico. Não só por o desenvolvimento da pessoa ter uma “história”, mas por estar situado na história da sociedade à qual pertence. De início, alguns supunham que não havia, no autor, referência a períodos ou fases. Pois cada pessoa se desenvolve em função de seu contexto cultural e histórico. Mas, Vigotski falava também em “avanço no desenvolvimento” pelas relações sociais. Se algo “avança”, significa que vai de estado menos complexo a mais complexo. A principal teoria psicológica que não aceita fases de desenvolvimento é o behaviorismo, para a qual tudo é aumento quantitativo de condutas adquiridas: “ampliação de repertório”. Não se coloca o problema dos “saltos de qualidade” – que para o pensamento dialético é essencial. Assim os períodos tem vantagens e desvantagens teóricas. Em todos os encontros do grupo enfrentaremos tal problema. 3.1 Neoformação guia como critério para a idade psicológica Como em todos os mais importantes estudiosos do desenvolvimento (Piaget, Freud, Gesell, etc.), em Vigotski o critério para a mudança de período não é o “calendário”. Por isso ele diferencia entre “idade cronológica” e “idade psicológica”. Mas o que define uma “idade psicológica”? 1932-34: Para Vigotski é graças às neoformações que “se pode determinar o essencial em cada idade psicológica” (Vygotski, 1932-34/2006, p. 154). No próximo slide teremos uma definição do que é “neoformação” Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 3 / slide 27 3 – O problema da periodização do desenvolvimento em Vigotski 3.1 Neoformação guia como critério para a idade psicológica 1932-34: “Novoobrazovanie” [новообразование] Neoformação é: “Entendemos por neoformações o [um] novo tipo de estrutura da personalidade e de sua atividade, as mudanças psíquicas e sociais {255:} que se produzem pela primeira vez em cada idade e determinam, no aspecto mais importante e fundamental, a consciência da criança, sua relação com seu meio, sua vida interna e externa, todo o curso de seu desenvolvimento no período dado.” (Vigotski, O problema da idade, 1932-34/2006, p. 254-255). 1) Um “novo tipo de estrutura da personalidade e de sua atividade” 2) Um conjunto de “mudanças psíquicas e sociais que se • produzem pela primeira vez em cada idade; e • determinam, no aspecto mais importante e fundamental: ○ a consciência da criança, [ou seja:] sua relação com seu meio; ○ sua vida interna e externa; ○ todo o curso do desenvolvimento no período dado.” Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 3 / slide 28 3 – O problema da periodização do desenvolvimento em Vigotski 3.1 Neoformação guia como critério para a idade psicológica [comentário adicional – pularemos] Notamos que (em mais que uma passagem) quando Vigotski explicita “o que entende por”; isto é, quando nos vai apresentar a “definição” de um conceito fundamental, pode ocorrer de ele fazer isso com uma lista de conceitos necessários para entender o que está definindo. E na definição de “neoformação” vemos que há uma lista em que às vezes na sequência pode haver sinônimos, como no caso de “a consciência da criança, sua relação como o mundo” o que sabemos por ter lido em outro lugar que "Entendemos a consciência como a relação da criança com o meio" (Vigotski. A crise dos sete anos, 1933-34/2006, p. 386). [comentário adicional – pularemos] Já sobre consciência ser o mesmo que o conjunto da “vida interna e externa”, não devemos ter um sinônimo. Pois a vida possui mais determinações do que nossa relação consciente com o mundo. E “todo o curso do desenvolvimento no período dado” já poderia estar mais próximo de “toda vida interna e externa” – o interno e externo estão para marcar que neoformação não tem desdobramentos apenas intrapsíquicos. “todo curso do desenvolvimento” é que acaba saindo mais intenso e significativo, pois além de personalidade ser mais amplo que consciência, está se falando de processo, movimento, “curso”... [passamos ao item 3.2] Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 3 / slide 29 3 – O problema da periodização do desenvolvimento em Vigotski 3.2 Situação social do desenvolvimento como força motriz para a emergência da neoformação guia. Além de haver diferentes “neoformações” (plural) em cada “idade psicológica”, a que “define” a idade é a “neoformação guia”, “regente”, “dominante”. É de questionar: quando uma “neoformação” deixa de ser “nova” e passa a ser uma formação (modo de organização) habitual? Isso demanda mais estudo. Porém, outro conceito a estudar será “situação social de desenvolvimento”. Porque, na dialética biológico/cultural, o que leva ao surgimento de uma “neoformação guia” realmente “inédita”, característica da nova “idade psicológica” é uma mudança na “situação social do desenvolvimento”. Ponto pouco esclarecido até agora na periodização de Vigotski, entre nós, no Brasil. Sabemos que: (a) Para a idade do primeiro ano de vida: a relação afetiva da criança com a mãe (ou o principal responsável por seus cuidados), é uma situação social de desenvolvimento particular. (b) Para a idade pré-escolar (por volta dos 3 aos 6 anos) a brincadeira de papéis sociais é uma situação social de desenvolvimento particular. (c) Para a idade escolar (por volta dos 7 aos 13 anos) o estudo sistemático é uma situação social de desenvolvimento particular. Aprimorar toda essa terminologia só pode ser resultado do estudo em grupo e não premissa. Do contrário não teríamos um “grupo de estudos” mas um “curso”. [passaremos ao item 3.3.] Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 3 / slide 30 3 – O problema da periodização do desenvolvimento em Vigotski 3.3 O conceito geral de “crise de desenvolvimento” em Vigotski A segunda parte do Tomo 4, das Obras de Vigotski, nos trará conteúdos mais densos sobre cada momento de crise do desenvolvimento que proporciona a emergência de uma inédita “neoformação guia” e o início de um novo “período estável”. Para o momento recorrerei a uma citação de estudiosos do autor que têm acesso aos originais russos: “Vigotski enfatiza a natureza dos processos desenvolvimentais enquanto reorganização estrutural qualitativa (síntese dialética). Ele descreve o curso do desenvolvimento da criança como caracterizado por períodos de avanço “calmo” ou corriqueiro que são separados de outros por tempos de “crise”. Os últimos são os períodos relevantes de desenvolvimento, enquanto uma progressão ontogenética que toma uma forma catastrófica e assemelha-se a “saltos revolucionários” (Vigotski, 1933/1984a, p.249). Os pontos exatos de início e fim das “crises” não podem ser captados de um modo exato, mas os períodos durante os quais as transformações efetivas das estruturas psicológicas têm lugar podem ser definidas por causa de sua aparência desorganizada e sua natureza caótica. Seis períodos de crise no desenvolvimento da criança foram sublinhados por Vigotski: aquele da idade dos recémnascidos, o primeiro, o terceiro, o sétimo, o décimo terceiro, e o décimo sétimo anos. É durante estes períodos que a emergência de níveis mais elevados de organização psicológica tem lugar. Vigotski estava sempre apto a ver a mudança desenvolvimental como um processo de síntese dialética, e os “períodos de crise” na ontogênese mostravam-no onde procurar por fenômenos desenvolvimentais relevantes.” (Valsiner e van der Veer, 1991/2001, p. 7 – versão em português para fins didáticos). Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 3 / slide 31 3 – O problema da periodização do desenvolvimento em Vigotski 3.4 Quadro esquemático das idades psicológicas segundo Vigotski Até o momento não temos o quadro preenchido, apenas suas denominações tal como figuram no Tomo IV. Então aqui vai para nossa informação, apenas: Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 3 / slide 32 3 – O problema da periodização do desenvolvimento em Vigotski 3.4 Quadro esquemático das idades psicológicas segundo Vigotski Em 2001 publicaram-se todas as “Conferências de Pedologia” de Vigotski, em russo. Foi delas que antes se retiraram alguns textos para o Tomo IV, não todos. E os que entraram não sempre estão na íntegra. Cabe lembrar que mesmo em plenos anos 1980, por conta das proibições stalinistas à pedologia, ainda havia algum preconceito contra tal palavra. Em alguns lugares, nas obras, ela foi trocada por “psicologia infantil”. Sobretudo no Tomo IV, publicado em 1984. A lista original de Vigotski, era um tanto mais “meticulosa” em denominações, que a do Tomo IV. [Vejamos no slide seguinte, pois é longo] Схема периодизации детского развития Esquema de periodização do desenvolvimento da criança de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 2 / slide 33 1. Кризис Grupo новорожденности: 1. Crise do recém-nascido а) предкритическая фаза; б) критическая фаза; в) посткритическая фаза. 2. Младенческий возраст(2 месяца- 1 год): а) первая стадия: раннее младенчество; б) вторая стадия: позднее младенчество. 3. Кризис 1 года: а) предкритическая фаза; б) критическая фаза; в) посткритическая фаза. 4. Раннее детство (1 - 3 года): а) первая стадия; б) вторая стадия. 5. Кризис 3 лет: а) предкритическая фаза; б) критическая фаза; в) посткритическая фаза. 6. Дошкольный возраст ( 3 - 7 лет): а) первая стадия: ранний дошкольный возраст; б) вторая стадия: поздний дошкольный возраст. 7. Кризис 7 лет: а) предкритическая фаза; б) критическая фаза; в) посткритическая фаза. 8. Школьный возраст ( 8 - 12 лет): а) первая стадия: ранний школьный возраст; б) вторая стадия: поздний школьный возраст. 9. Кризис 13 лет: а) предкритическая фаза; б) критическая фаза; в) посткритическая фаза. 10. Пубертатный возраст (14 - 18 лет): а) первая стадия: ранний пубертатный возраст; б) вторая стадия: поздний пубертатный возраст. 11. Кризис 17 лет: а) предкритическая фаза; б) критическая фаза; в) посткритическая фаза. a) fase pré-crítica b) fase crítica c) fase pós-crítica 2. Idade pueril (“primeira infância”) (2 meses – 1 ano) a) primeiro estádio: primeira infância inicial b) segundo estádio: primeira infância tardia 3. Crise do primeiro ano: a) fase pré-crítica b) fase crítica c) fase pós-crítica 4. Meninice inicial (1 – 3 anos): a) primeiro estádio b) segundo estádio 5. Crise dos 3 anos: a) fase pré-crítica b) fase crítica c) fase pós-crítica 6. Idade pré-escolar (3-7 anos) a) primeiro estádio: idade pré-escolar inicial b) segundo estádio: idade pré-escolar tardia 7. Crise dos 7 anos: a) fase pré-crítica b) fase crítica c) fase pós-crítica 8. Idade escolar (8-12 anos): a) primeiro estádio: idade escolar inicial b) segundo estádio: idade escolar tardia 9. Crise dos 13 anos: a) fase pré-crítica b) fase crítica c) fase pós-crítica 10. Idade da puberdade: a) primeiro estádio: idade da puberdade inicial b) segundo estádio: idade da puberdade tardia 11. Crise dos 17 anos: a) fase pré-crítica b) fase crítica c) fase pós-crítica Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 3 / slide 34 3 – O problema da periodização do desenvolvimento em Vigotski 3.4 Quadro esquemático das idades psicológicas segundo Vigotski Comparem o slide anterior (33) com o que saiu no Tomo IV – na figura abaixo (Vygotski. 1932-34/2006, p. 261). Na nota “5” do mesmo textos (idem, p. 273) se menciona os conceitos de “pré-crítico; crítico; pós-crítico” e a de “primeiro e segundo estágios”, mas tal como foi editado, não temos a dimensão da tabela na fonte original. [passaremos ao item 3.5] Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 3 / slide 35 3 – O problema da periodização do desenvolvimento em Vigotski 3.5 Breve crítica de Daniil B. El’konin (1904-1984), comentando Vigotski: 1984[?] : “Duvidamos, por exemplo, que no surgimento histórico de diferentes períodos infantis, estes simplesmente se estruturavam um encima do outro [não penso que Vigotski diga isso – ADJr]. Há suficiente fundamento para supor que o processo de surgimento de diferentes períodos era mais complexo. Também é duvidosa a comparação do nível de desenvolvimento das crianças de épocas remotas da sociedade com as crianças de hoje [concordo – ADJr]. Dizer que a criança de três anos, de tempos passados foi mais jovem que a criança contemporânea de três anos, apenas é correto. São simplesmente diferentes crianças: por exemplo, segundo seu nível de independência, nossas crianças de três anos têm um nível mais baixo de independência que seus coetâneos polinésios, descritos por N. N. Miklujo-Maklai” (Elkonin, 1984/2006, p. 395). Perguntei a professora russa, em Marília, se há algo de “transcultural” na psicologia soviética. Uma teoria desenvolvida com crianças soviéticas (URSS acabou há 23 anos), seria transponível a crianças atuais num país capitalista? Não respondeu. Noutro dia e atividade, falou do sorriso da criança como primeiro ato propriamente humano. Citando belo exemplo de cultura africana, em que só quando sorri a criança recebe um nome. Isso indica que achados de realidade social particular podem estar presentes em outras. Mas ela chamou o fato de “Cross cultural”. O que me parece enfatizar mais as diferenças entre culturas (a nossa escolhe o nome bem antes) do que semelhanças, que uma teoria dialética geral permitiria explicar. [continuemos com El’konin] Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 3 / slide 36 3 – O problema da periodização do desenvolvimento em Vigotski 3.5 Breve crítica de Daniil B. El’konin (1904-1984), comentando Vigotski: 1984[?]*: “O grande material etnográfico recolhido desde as publicações de Vigotski nos faz pensar, que a própria não coincidência da maturação sexual com a maturação geral e com a formação da personalidade, sobre o que fala {396:} Vigotski, deve ser estudada desde um ponto de vista mais geral, desde um ponto de vista da mudança histórica do lugar da criança na sociedade como parte desta, e da mudança, em relação com isto, de todo o sistema de inter-relações entre as crianças e os adultos. Sem nos determos nesta questão, destacamos que o ponto de vista histórico sobre os processos de desenvolvimento psíquico da criança foi aceito na psicologia soviética, mesmo que ainda não tenha estudado suficentemente” (Elkonin, 1984/2006, p. 395-396). _____ * 1984 é o ano da primeira publicação russa do Tomo IV. Não há como saber a data exata em que Elkonin escreve o “Epílogo”. Há por exemplo um artigo de Leontiev a título de posfácio ao Tomo I, publicado em 1982, mas Leontiev morreu em 1979. E Elkonin só viveu até 1984. [passaremos à parte 4] Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 4 / slide 37 4 – A metáfora da “zona blijaishego razvitiia” (z.d. proximal, próximo, imediato, iminente) 4.1 Definições literais de Vigotski sobre o conceito de ZBR O termo russo de Vigotski “зона ближайшего развития” [zona blijaishego razvitia] tem, até a última vez que pesquisei, quatro versões no Brasil: (1) “zona de desenvolvimento proximal” (traduzido do inglês); (2) “zona de desenvolvimento próximo” (traduzido do espanhol); (3) “zona de desenvolvimento imediato” (traduzido do russo por Paulo Bezerra); e (4) “zona de desenvolvimento iminente” (traduzido do russo por Zoia Prestes). A palavra em disputa é “blijaishego”: genitivo de um “superlativo absoluto”. Não apenas “próximo”, nem “muito próximo”, mas “o mais próximo de todos”. Como “best” significa “o melhor (de todos)”, não “melhor que”. Em inglês seria literalmente “nearest” ou “closest” (cf. Wertsch, 1985). Em português não há esta forma. Literalmente: “a zona do desenvolvimento mais próximo”. Com Vigotski, entendemos que a forma externa da palavra não é mais importante que seu significado ou conceito. Ele diz “O que importa é o significado, não o signo” (Vigotski, 1924/1997, p. 84). Fala também da “Lei de equivalência dos conceitos”. “Esta lei estabelece: todo conceito pode ser designado por uma infinidade de meios por intermédio de outros conceitos” (1933-34/2001, p. 364), supondo que de fato nos apropriamos do conceito. Usarei a sigla russa “ZBR” por provocação, mas sugiro que optem pela forma com a qual já estejam habituados. Nada de essencial muda por mudarmos a forma externa. Interessados no “conceito”, também permeado por disputas e alguma incompreensão, nos próximos slides transcreveremos citações do próprio Vigotski para defini-lo, em traduções “diretamente” do russo. Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 4 / slide 38 4 – A metáfora da “zona blijaishego razvitiia” (z.d. proximal, próximo, imediato, iminente) 4.1 Definições literais de Vigotski sobre o conceito de ZBR 1933-34: “Suponhamos que nós definamos a idade mental de duas crianças que verificamos ser equivalente a oito anos [só usando testes - ADJr]. Se não nos detemos nesse ponto [mas teremos passado por ele - ADJr] mas tentamos esclarecer como ambas as crianças resolvem estes testes destinados a crianças das idades seguintes [tudo “supondo” - ADJr] – e se as ajudamos com demonstrações, perguntas sugestivas, início de solução, etc., verificamos [só verificaríamos se o fizéssemos - ADJr] que uma criança pode, com ajuda, em cooperação e por sugestão, resolver problemas elaborados para uma criança de doze anos, ao passo que a outra não consegue ir além da solução de problemas para crianças de nove anos. [certamente só poderíamos afirmar se tivéssemos feito - ADJr] Essa discrepância entre a idade mental real ou nível de desenvolvimento atual, que é definida com o auxílio dos problemas resolvidos com autonomia, e o nível que ela atinge ao resolver problemas sem autonomia, em colaboração com outra pessoa, determina a “zona blijaishego razvitia”. Em nosso exemplo, esta zona é de quatro anos para a primeira criança e de um para a segunda. Podemos afirmar que o nível de desenvolvimento mental é o mesmo e que o estado do seu desenvolvimento coincide?” (Vigotski, 1933-34/2001, p. 327) [continua] Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 4 / slide 39 4 – A metáfora da “zona blijaishego razvitiia” (z.d. proximal, próximo, imediato, iminente) 4.1 Definições literais de Vigotski sobre o conceito de ZBR Como vimos no slide anterior, tal como em outros textos a ZBR aparece como “discrepância” (noutro lugar “distância”, noutro “diferença”) entre dois níveis: (a) o nível de desenvolvimento atual (idade mental real); e (b) o nível que ela atinge ao resolver problemas sem autonomia. Utilizando o exemplo psicométrico, portanto quantitativo, do próprio Vigotski, apresentemos os níveis e a zona, ou “região”, ou “área”, de forma gráfica, já que se trata de termos tópicos: ZBR = 4 anos Nível atingido na resolução sem autonomia = 12 anos ZBR = 1 ano Nível de desenvolvimento atual = 8 anos Nível atingido na resolução sem autonomia = 9 anos (uma criança) (outra criança) [isto se confirma no próximo slide] Nível de desenvolvimento atual = 8 anos Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 4 / slide 40 4 – A metáfora da “zona blijaishego razvitiia” (z.d. proximal, próximo, imediato, iminente) 4.1 Definições literais de Vigotski sobre o conceito de ZBR Em tradução do russo, por Zoia Prestes, de outro texto de Vigotski com definição explícita de ZBR, também vemos que se trata de uma “distância” entre “dois níveis. s/data: “A zona blijaichego razvitia é a distância entre o nível do desenvolvimento atual da criança, que é definido com ajuda de questões que a criança resolve sozinha, e o nível do desenvolvimento possível da criança, que é definido com a ajuda de problemas que a criança resolve sob a orientação dos adultos e em colaboração com companheiros mais inteligentes. (...) A zona blijaichego razvitia define as funções ainda não amadurecidas, mas que encontram-se em processo de amadurecimento, as funções que amadurecerão amanhã, que estão hoje em estado embrionário” (VIGOTSKI, 2004*, p. 379 apud PRESTES, p. 173). Outra vez, há dois níveis de desenvolvimento: (a) um definido por relações interfuncionais que a pessoa já pode dominar sem auxílio de outras (nível de desenvolvimento “atual”, “real” ou “efetivo”); e (b) outro definido por relações interfuncionais cuja amplitude e eficácia aumentam com auxílio de alguém mais experiente (nível de desenvolvimento “possível”, noutra tradução: “potencial”). Sendo a ZBR uma “diferença”, “distância”, ou “discrepância” entre eles. O termo “zona” indica “área”, “espaço”. Níveis indicam “limites”, “patamares”. A distância entre o desenvolvimento já consolidado das relações interfuncionais e aquele por ser consolidado no futuro, com auxílio, é definida como muito próxima. _____ * Psikhologuia razvitia rebionka. Moskva: Eksmo, 2004 Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 4 / slide 41 4 – A metáfora da “zona blijaishego razvitiia” (z.d. proximal, próximo, imediato, iminente) 4.2 Alguns cortes ontogenéticos nos quais o conceitos de ZBR se insere Temos associado ZBR a apenas dois modos de relação social: (a) a “instrução” (“ensino”, “processo de ensino-aprendizagem”), da palavra “обучение” [obutchénie] – em escolares; e (b) a “brincadeira” (“jogo de papéis”, “brincadeira de papéis”, “faz de conta”), da palavra “игра” [igrá] – em pré-escolares. Jaan Valsiner (em 12-06-1992), disse-nos que Vigotski mencionou outras relações que criam ZBR. Não tomei iniciativa de pedir bibliografia e não mais o encontrei. Teríamos ZBR gerada, pelo menos: 4.2.1 Pela relação afetiva da mãe com o bebê. 4.2.2 Pela brincadeira pré-escolar 4.2.3 Pela educação escolar. 4.2.4 Pelos projetos* de futuro que o adolescente faz ______ * Neles ele ou ela também vão além de seu desenvolvimento atual. Notamos que ZBR (em “cortes ontogenéticos”) se relaciona com “situação social de desenvolvimento” e com a emergência de inéditas “neoformações guia”. Assim, a lista precisa ser completada. Também cabe discutir ZBR “a cada dia”, em situações que alguns chamam de “microgenéticas”. A pessoa está na mesma “idade psicológica”, mas há pequenas mudanças a cada dia ou situação. Não só as mais radicais que surgem com crises, mas as graduais. Não por adquirir mais habilidades (um mesmo sistema interfuncional executa muitas), mas pela organização qualitativa distinta das relações interfuncionais, sistêmicas e dotadas de sentido. [passaremos ao item 4.3] Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 4 / slide 42 4 – A metáfora da “zona blijaishego razvitiia” (z.d. proximal, próximo, imediato, iminente) 4.3 Caráter metafórico e limitado de definir o desenvolvimento como “tópico” (um espaço) É claro que o desenvolvimento não é algo como uma “área” ou “zona”. O desenvolvimento está mais relacionado ao tempo do que ao espaço. O desenvolvimento está mais relacionado ao movimento do que à posição. A ideia de o desenvolvimento ser comparável a um espaço convém à de que possa ser medido. Vigotski só pode estar usando a ideia de “zona” como metáfora – uma figura de linguagem. Tal metáfora indica que a diferença entre o menos avançado e o avançado mais próximo, não está longe de ser vencida, com ajuda de outras pessoas com maior domínio de certos recursos culturais. 4.4 Necessidade de manter o conceito sem fazer dele uma panaceia Como “ponte” que liga o desenvolvimento consolidado no presente ao que se consolidará no futuro próximo, ZBR é um conceito progressista. Tanto mais se o “salto” do presente para o futuro próximo, só pode ser dado em relação social. A relação social sempre é o que cria o avanço do desenvolvimento agora e foi aquilo que o criou antes. Logo, não há nenhum desenvolvimento individual que não tenha sido social em sua origem e não permaneça social na sua dinâmica e estrutura. Isso pode ser visualizado na ontogênese, mas também nos breves momentos que se passam no decorrer de cada idade psicológica. É bom conceito como orientação geral do nosso olhar, mas insuficiente para avaliar as relações sociais específicas que geram o desenvolvimento concreto (multideterminado) em cada idade ou momento de vida. Ele é apenas esquemático, demanda conteúdo vivencial para ganhar mais potência. Cabe perguntar: “desenvolvimento de quem exatamente?”; e “de quais das suas relações interfuncionais”? [Fim] Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 1 / slide 43 REFERÊNCIAS ELKONIN, D. B. (1984/2006) Epílogo. In: VIGOTSKI, L. S. Obras Escogidas. Tomo IV. 2. ed. Madrid: Vysor y Antonio Machado Libros. p. 387-412. MARX, K. H. (1867/1983) O Capital: crítica da economia política. 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A conferência deve ter sido dada entre 1933 e 1934. Grupo de estudos “Desenvolvimento em Vigotski” - Pelo C. E. da Vila Operária PARTE 1 / slide 45 REFERÊNCIAS VYGOTSKI, L. S. (1933-34/1991). El problema de la conciencia. In: ______. Obras Escogidas. Tomo I. Madrid: Visor; Ministerio de Educación y Ciencia. p. 119-132. VYGOTSKI, L. S. (1933-34/2006) La crisis de los siete años. In: ______. Obras escogidas. 2. ed. Tomo IV. Madrid: Visor y A. Machado Libros. p. 377-386. VYGOTSKY, L. S. (1928/1994) The problem of the cultural development of the child. In: ______. The Vygotsky reader. Edited by René van der Veer and Jaan Valsiner. Oxford; Cambridge: Blackwell. p. 57-72. Wertsch, J. V. (1985) Vygotsky and the social formation of mind. Cambridge, Massachusetts and London, England: Harvard University Press.