Revista Baiana
de Saúde Pública
REVISTA BAIANA DE SAÚDE PÚBLICA
Órgão Oficial da Secretaria da Saúde do Estado da Bahia
EXPEDIENTE
Jacques Wagner – Governador do Estado da Bahia
Jorge José Santos Pereira Sola – Secretário da Saúde
Isabela Cardoso de Matos Pinto – Superintendente da SHRS
Gesilda Meira Lessa – Diretor da Escola Estadual de Saúde Pública
ENDEREÇO
EDITORA GERAL
Rua Conselheiro Pedro Luiz, 171 - Rio Vermelho
Caixa Postal 631 CEP 41950-610 Salvador - Bahia - Brasil
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Lorene Louise Silva Pinto – SESAB / UFBA
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Marco Antônio Vasconcelos Rego – UFBA
CONSELHO EDITORIAL
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SECRETÁRIA EXECUTIVA
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BIBLIOTECÁRIA
PROJETO GRÁFICO
REVISÃO E NORMALIZAÇÃO DE ORIGINAIS
TRADUÇÃO/REVISÃO INGLÊS
EDITORAÇÃO
IMPRESSÃO
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Ivone Silva Figueredo
Pamdesign
Maria José Bacelar Guimarães
Elisabeth Reis Teixeira
Jean Beligardi
EGBA
Periodicidade - Semestral
Tiragem - 1.500 exemplares
Distribuição gratuita
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ISSN: 0100-0233
Governo do Estado da Bahia
Secretaria da Saúde do Estado da Bahia
INDEXAÇÃO
Periódica: Índice de Revistas Latinoamericanas en Ciências (México)
Sumário Actual da Revista, Madrid
LILACS - SP - Literatura Latinoamericana en Ciências de La Salud - Salud Pública, São Paulo
Capa: detalhe do portal da antiga Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (Solar do séculoXVIII).
Fotos: Paulo Carvalho e Rodrigo Andrade (detalhes do portal e azulejos).
Revista Baiana de Saúde Pública é associada à
Associação Brasielira de Editores Científicos
Revista Baiana de Saúde Pública / Secretaria da Saúde
do Estado da Bahia. v.30, n.2, jul./dez., 2006.
Salvador: Secretaria da Saúde do Estado da Bahia, 2006.
Semestral.
ISSN 0100-0233
1. Saúde Pública - Bahia - Periódico. I. Título
CDU 614 (813.8) (05)
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EDITORIAL ................................................................................................................................................................................
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ARTIGOS ORIGINAIS
PREVALÊNCIA DE ANSIEDADE, DEPRESSÃO E CARACTERÍSTICAS CLÍNICO
– EPIDEMIOLÓGICAS EM PACIENTES COM DOR CRÔNICA ........................................................................................................
211
Martha Castro, Lucas Quarantini, Carla Daltro,
Durval Kraychette, Ângela Miranda-Scippa
INTERVENÇÃO COMUNITÁRIA MULTIPROFISSIONAL EM UM GRUPO DE GESTANTES
NUM BAIRRO DE PERIFERIA DA CIDADE DE SALVADOR, BAHIA ....................................................................................................
224
Ignês Beatriz Lopes
Helena Fraga Maia
QUALIDADE DO DADO REFERENTE À IDADE GESTACIONAL NO SISTEMA DE INFORMAÇÃO
SOBRE NASCIDOS VIVOS (SINASC) EM TERESINA-PI ...................................................................................................................
238
Keila R. O. Gomes, Elda S. Santos, Grazyella P. Santos, Márcio D. M. Mascarenhas
EXERCÍCIO DO CONTROLE SOCIAL EM MUNICÍPIOS DE PEQUENO PORTE:
O CASO DE LAFAYETE COUTINHO (BA) ...................................................................................................................................
248
José Patrício Bispo Júnior, Kelly Leite Maia de Messias, José Jackson Coelho Sampaio
CUSTOS DE CONSULTAS MÉDICAS EM PESSOAS COM DIABETES MELLITUS DURANTE UM PROGRAMA EDUCATIVO .............................
261
Carla Regina de Souza Teixeira, Maria Lúcia Zanetti
QUEIXAS VOCAIS EM LOCUTORES DE RÁDIO DA CIDADE DO SALVADOR-BAHIA ...........................................................................
272
Carla Lima de Souza, Célia Regina Thomé
USO DE CONTRACEPTIVOS E ABORTAMENTO ENTRE ADOLESCENTES .........................................................................................
284
Bruno Gil de Carvalho Lima, Cleuza Maria Santos de Matos, Eliana Ferraz Melo
TENDÊNCIA DA MORBIMORTALIDADE POR PNEUMONIA NA REGIÃO METROPOLITANA DE SALVADOR - 1980 A 2004 ...........................
294
Bruno Mendonça Protásio da Silva, Diógenes Diego de Carvalho Bispo,
Dulceane Natyara Rocha Cardoso, Mateus Teixeira do Amaral Rocha,
Mauro de Araújo Ferreira, Natalia Santana Andrade Barretto,
Marco Antônio Vasconcelos Rêgo
IMPACTOS DE PESTICIDAS NA ATIVIDADE MICROBIANA DO SOLO E NA SAÚDE DOS AGRICULTORES .................................................
309
Aldo Pacheco Ferreira, Cynara de Lourdes Nóbrega da Cunha,
Eduardo Dias Wermelinger, Marcos Barbosa de Souza,
Márcia de Freitas Lenzi, Cláudio Márcio de Mesquita,
Leila Cristina Jorge
ENSAIOS
INTERDISCIPLINARIDADE E TRANSVERSALIDADE: OPERACIONALIZANDO
O CONCEITO DE RISCO NO ÂMBITO DA VIGILÂNCIA SANITÁRIA ................................................................................................
322
Maria Ligia Rangel
AVANÇOS E LIMITES DA DESCENTRALIZAÇÃO NO SUS E O "PACTO DE GESTÃO" ............................................................................
332
Jorge José Santos Pereira Solla
ARTIGO DE REVISÃO
SÍNDROME METABÓLICA NA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA. UM FATOR MAIOR DE RISCO CARDIOVASCULAR ......................................
349
Isabel C.B.Guimarães, Armênio C.Guimarães
RESUMO DE TESE
CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO EM SAÚDE: O ENSINO DE BIOSSEGURANÇA
EM CURSOS DE NÍVEL MÉDIO NA FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ ................................................................................................
363
Marco Antonio Ferreira da Costa
RESUMO DE DISSERTAÇÃO
EXPOSIÇÃO OCUPACIONAL A NÉVOAS ÁCIDAS E ALTERAÇÕES SALIVARES ....................................................................................
365
Carlos Alberto Lima da Silva
AVALIAÇÃO DA IMPLEMENTAÇÃO DA ESTRATÉGIA DE ATENÇÃO INTEGRADA
ÀS DOENÇAS PREVALENTES NA INFÂNCIA (AIDPI) NO ESTADO DA BAHIA ......................................................................................
367
Cristina Campos dos Santos
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de Saúde Pública
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T
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I
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L
Ao finalizar mais um ano de publicação da Revista Baiana de Saúde Pública,
reafirmamos o nosso compromisso com a divulgação de informações e do conhecimento
produzido por técnicos, docentes e acadêmicos comprometidos com a saúde, nos vários aspectos e
abrangência que o termo nos remete.
Neste número, os autores apresentam estudos que abordam aspectos variados do
processo saúde-doença, formas de intervenção sobre problemas de saúde, qualidade das
informações produzidas nos serviços, relevância das questões ambientais e também um ensaio
sobre a gestão do Sistema Único de Saúde.
alência de Ansiedade, Depressão e Características ClínicoO estudo Prev
Prevalência
epidemiológicas em Pacientes com Dor Crônica apresenta resultados da aplicação de método
para avaliação da presença desses fatores em pacientes atendidos no Hospital Universitário. O
estudo sobre os efeitos da Intervenção Comunitária Multiprofissional em um Grupo de Gestantes
num Bairro da Periferia de Salv
ador
Salvador
ador,, Bahia e o artigo sobre o Uso de Contraceptivos e
Abortamento entre Adolescentes evidenciam como acolher, escutar e orientar se traduzem em
benefícios à saúde das mulheres. Avaliar a Qualidade do Dado Referente à Idade Gestacional no
Sistema de Informação de Nascidos Vivos-SINASC em T
eresina-PI é o objetivo do estudo
Teresina-PI
realizado na maternidade escola dessa cidade, para mostrar a importância da alimentação
responsável dos sistemas oficiais de informação. Exercício do Controle Social em Municípios de
Pequeno Porte: o Caso de Lafayete Coutinho, Bahia analisa e aponta questões limitantes para esta
função no âmbito do SUS em municípios desse porte. Custos de consultas Médicas em Pessoas
com Diabetes Melittus Durante um Programa Educativo objetiva comparar e analisar o número e
os custos de consultas médicas, consultas médicas de urgência e procedimentos médicos um ano
antes e um ano depois da implementação de um Serviço de Medicina Preventiva (SEMPRE) durante
a vigência de um programa educativo em diabetes mellitus.
ocais em Locutores de Rádio da Cidade do Salv
ador
Os estudos Queixas V
Vocais
Salvador
ador,, Bahia
e Impacto de Pesticidas na Atividade Microbiana do Solo e na Saúde dos Agricultores avaliam a
exposição dos trabalhadores a situações e ambientes de risco para à saúde no exercício de
ocupações.
O estudo Tendência da Morbimortalidade por Pneumonia na Região
Metropolitana de Salvador - 1980 a 2004 analisa a tendência da morbidade e da mortalidade por
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pneumonia na Região Metropolitana de Salvador, com base em dados de mortalidade e
hospitalização disponibilizados no Sistema de Informação em Saúde do DATASUS.
Discutir os desafios para a operacionalização do conceito de risco no âmbito da
ransversalidade:
vigilância sanitária é o propósito do ensaio Interdisciplinaridade e T
Transversalidade:
Operacionalizando o Conceito de Risco no Âmbito da Vigilância Sanitária.
O ensaio Avanços e Limites da Descentralização no SUS e o Pacto de Gestão
recupera a construção, identifica avanços, limites e contradições desse processo, apontando a
necessidade de superação das lacunas existentes. O artigo de revisão Síndrome Metabólica na
Infância e Adolescência: um Fator Maior de Risco Cardiov
ascular mostra como as intervenções
Cardiovascular
sobre estilo de vida de crianças e adolescentes são fundamentais para prevenir complicações na
vida adulta.
Com o objetivo de investigar a situação do ensino de biossegurança em cursos de
nível médio, a tese de doutorado Construção do Conhecimento em Saúde: O Ensaio de
aldo Cruz aponta a necessidade de
Oswaldo
Biossegurança em Cursos de Nível Médio na Fundação Osw
aprimoramento nos referidos processos.
As dissertações de mestrado Avaliação da Implementação da Estratégia de Atenção
Integrada às Doenças Prevalentes na Infância (AIDPI) no Estado da Bahia, e Exposição
Ocupacional a Névoas Ácidas e Alterações Salivares tiveram como objetivo avaliar a
implementação da AIDPI em 67 municípios do Estado da Bahia e identificar e descrever alterações
salivares frente à exposição ocupacional ao produto, respectivamente.
Com a publicação desses trabalhos, a Revista Baiana de Saúde Pública coloca-se
como um espaço de divulgação das pesquisas produzidas por profissionais da área de Saúde e
possibilita ao público não apenas o acesso a essa produção como também a discussão e reflexão
sobre os diversos temas abordados.
Ser uma publicação do Sistema Único de Saúde financiada com recursos públicos e
disponível para o público, preservando princípios éticos, técnicos e científicos, coloca a Revista no
ambiente das publicações da área de saúde pública / saúde coletiva, como um promissor veículo
de divulgação. Torna-se necessário o seu fortalecimento e a sua consolidação com a sempre
estimada colaboração de todos.
Lorene Pinto
Editora Geral
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ARTIGO ORIGINAL
Revista Baiana
de Saúde Pública
PREV
ALÊNCIA DE ANSIEDADE, DEPRESSÃO E CARACTERÍSTICAS CLÍNICO –
PREVALÊNCIA
EPIDEMIOLÓGICAS EM P
ACIENTES COM DOR CRÔNICAa
PACIENTES
Martha Castrob, Lucas Quarantini c
Carla Daltro d, Durval Kraychette e
Ângela Miranda-Scippaf
Resumo
A dor crônica é definida na literatura como experiência sensorial e emotiva
desagradável descrita ou associada a lesões teciduais. A despeito das inúmeras publicações
sugerindo a presença de ansiedade e depressão em pacientes com dor crônica, poucos são os
estudos com metodologia adequada que referem uma associação entre dor, transtornos ansiosos e/
ou depressivos. O objetivo deste estudo é determinar a prevalência dos transtornos de ansiedade e
depressão em pacientes com dor crônica, atendidos no Centro de Dor do Hospital das Clínicas em
Salvador (BA). Trata-se de estudo descritivo transversal de 91 pacientes com aplicação da escala
visual analógica numérica para dor (EVA); escala HAD para Ansiedade e Depressão e Mini
International Neuropsychiatric Interview Brazilian Version 5.0.0 (MINI-PLUS), no período de
março de 2002 a julho de 2003. A idade dos pacientes em média foi de 42,8 ± 7,7 anos, com
prevalência de pacientes casadas, com religião católica e 2º grau completo. Pacientes ansiosos
com sintomas depressivos e deprimidos com sintomas ansiosos foi uma relação estatisticamente
significante, o que pode ser atribuído a co-morbidade entre ansiedade e depressão em pacientes
com dor crônica. O MINI-plus revelou transtorno do humor atual (depressão, distimia, episódio
maníaco e hipomaníaco) e transtorno de ansiedade. Conclusivamente, constatou-se que os dados
sócio-demográficos da população estudada são compatíveis com os achados da literatura,
entretanto observou-se maior freqüência de transtorno de ansiedade, contrariando os relatos da
literatura sobre dor crônica.
Palavras-chave: Dor Crônica. Depressão. Ansiedade.
a
b
c
d
e
f
Este artigo foi baseado na Monografia intitulada Pacientes com dor crônica: prevalência de ansiedade e depressão e características
clínico-epidemiológicas apresentada ao Curso de Pós-graduação em Medicina e Saúde da Universidade Federal da Bahia, em
abril de 2004.
Centro de Dor do Hospital Universitário da Universidade Federal da Bahia (UFBA).
Serviço de Psiquiatria do Hospital Universitário da UFBA.
Mestre. Professora Assistente da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública.
Pós-graduação em Medicina e Saúde – FAMED - UFBA
Departamento de Neuropsiquiatria da FAMED – UFBA
Endereço para correspondência: Marta Castro. Av. Juracy Magalhães Jr, 2426, ed. Mansão Principado de Mônaco, apto 103,
Rio Vermelho, Salvador, Bahia, Brasil. Cep: 41940-060. e-mail: [email protected] ou [email protected].
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ANXIETY, DEPRESSION AND CLINICAL – EPIDEMIOLOGICAL PREVALENCE
CHARACTERISTICS IN CHRONIC PAIN PATIENTS
Abstract
Chronic pain is defined as an unpleasant sensorial an emotional experience, which
is associated or described in terms of tissue injury. Despite the large number of publications,
suggesting the presence of anxiety and depression among chronic pain patients, few studies follow
a proper methodology that refer to an association between pain, and anxiety and / or depressive
disorders. To determine the prevalence of anxiety and depressive disorders and describe the clinical
– epidemiological characteristics of chronic pain patients seen at the Pain Center of Professor
Edgard Santos University Hospital (HUPES), in Salvador, Bahia. A cross-sectional study including
91 patients using the following instruments: Visual Analogical Scale (VAS) for pain converted to
numeric scale; Hospital Anxiety and Depression HAD Scale, the Mini International
Neuropsychiatric Interview - Brazilian Version 5.0.0 (M.I.N.I. PLUS), within the period of March
2002 to July 2003. The patients’ age was in average 42.8 ± 7.7 years, being female and male. We
observed a prevalence of married catholic patients, which had completed high school. The
occurrence of anxious patients with depressive symptoms and depressed patients with anxious
symptoms was statistically meaningful, which is attributed to the association between these
symptoms and the co-morbidity between anxiety and depression in chronic pain patients. After
using the MINI – plus, we observed derangement of the present emotional state in of the sample,
being depression, dysthymia, maniac and hippomaniac episode, and anxiety derangement. The
socio-demographic data of the studied population, as well as the high frequency of mental
symptoms are compatible with literature findings, although a higher incidence of anxiety was
observed, contradicting the chronic pain literature.
Keywords: Chronic Pain. Depression. Anxiety.
INTRODUÇÃO
Desde os primórdios da História da humanidade, compreender o fenômeno
doloroso vem sendo uma das grandes preocupações do ser humano, pelo fato da dor acompanhar
sua trajetória evolutiva desde os primeiros momentos de sua existência1. Sua expressão apresenta-se
de forma muito diferente entre os indivíduos e em cada cultura e seu conceito passou por várias
mudanças ao longo do tempo(1,2).
O sistema nervoso percebe as variações do ambiente e organiza as respostas. No
tálamo, a informação dolorosa é localizada espacialmente e projetada em estruturas do sistema
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límbico, motor e cortical. Das conexões do impulso doloroso com as estruturas do sistema
límbico define-se o caráter desagradável e emocional da dor. Esta ampla representação em áreas
corticais e subcorticais resulta na interpretação do fenômeno doloroso em todos os seus domínios
sensitivo-discriminativo, afetivo-motivacional, cognitivo-avaliativo e na ampla gama de respostas
envolvidas neste processo3.
Por resultar de complexos mecanismos envolvidos em seu aparecimento, a dor pode
ser classificada, de acordo com a duração, em aguda e crônica. Enquanto a dor aguda é um
sintoma de alerta e está relacionada a afecções traumáticas, infecciosas ou inflamatórias, sendo
bem definida e transitória, a dor crônica é caracterizada como aquela que persiste além do tempo
necessário para a cura da lesão, com um processo de longa duração e limites mal definidos. Desse
modo, tem se configurado em uma importante causa de incapacitação humana4.
A literatura tem evidenciado que, mesmo em quadros eminentemente orgânicos, a
influência dos aspectos psicológicos têm sido relevantes na queixa de dor. Estudos mostram que há
uma significativa associação entre dor crônica e depressão, podendo a depressão crônica e
recorrente preceder e predispor as pessoas a desenvolverem queixas dolorosas crônicas, assim como
as patologias dolorosas crônicas favorecerem a depressão5. Outro transtorno psiquiátrico associado
a pacientes com dor crônica é o transtorno de ansiedade. Caracterizado como um estado
emocional vivenciado com a qualidade subjetiva do medo ou de emoção a ela relacionada6, pode
ser considerado normal ou patológico.
Para tal diferenciação e para determinar se as manifestações são desproporcionais em
intensidade, duração, interferência com o desempenho e freqüência com que ocorrem, é
necessário levar em conta o contexto no qual a emoção ocorreu, assim como os possíveis fatores
desencadeantes, além das características individuais do sujeito. A ansiedade pode ser situacional
(quando está associada a determinadas circunstâncias) ou constante na vida do indivíduo.
Caracteriza-se como um traço de sua personalidade ou se transforma em doença, gerando prejuízos
funcionais7.
Uma pesquisa, utilizando o Mini International Neuropsychiatric Interview Brazilian
(MINI-plus), avaliou a presença de transtornos de ansiedade e depressão em pacientes com cefaléia
e enxaqueca crônica diária. Revelou que 78% daqueles que sofriam de enxaqueca apresentavam
alguma co-morbidade psiquiátrica, sendo 57% depressão, 30% pânico, 11% distimia, 8%
transtorno de ansiedade, 68% tinha depressão e 38% transtornos de ansiedade. Dos que sofriam de
cefaléia, 74% apresentavam depressão, 51% pânico, 22% distimia e 8% transtorno de ansiedade
generalizada. Este resultado revela a presença de co-morbidade psiquiátrica (principalmente
depressão e transtornos do pânico) em mulheres que sofrem de cefaléia e enxaqueca8.
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O objetivo deste estudo foi determinar a prevalência dos transtornos de ansiedade e
depressão em pacientes portadores de dor crônica atendidos no Centro de Dor do Hospital
Universitário Professor Edgard Santos (HUPES), Salvador, Bahia.
MA
TERIAL E MÉTODOS
MATERIAL
Estudo descritivo do tipo transversal, com amostra de 91 pacientes que procuraram
voluntariamente o Centro de Dor do HUPES em Salvador, Bahia, Brasil, no período de março de
2002 a julho de 2003. A definição da amostra baseou-se em um estudo piloto neste mesmo
Centro, utilizando a Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão (HAD), que encontrou uma
proporção de 61,8% de ansiedade e 81,6% de depressão nos pacientes portadores de dor crônica.
No presente estudo, foi determinado o tamanho da amostra, considerando um erro
de até 10% e um nível de significância alfa de 0,05%. Desta forma, o tamanho amostral para
ansiedade foi equivalente a 91 e o de depressão equivaleu a 58. Como foi utilizada uma única
amostra para os itens ansiedade e depressão, o tamanho amostral considerado foi de 91 pacientes.
Para garantir a aleatoriedade desta amostra, foram encaminhados para avaliação todos os pacientes
do Centro, desde os recém-ingressos até os que faziam parte do serviço em qualquer momento.
Estes encaminhamentos foram feitos por todos os profissionais do serviço.
Para avaliação dos pacientes, foram usados os seguintes instrumentos: formulário
contendo itens para caracterização dos sujeitos – idade, gênero, estado civil, escolaridade, religião,
profissão, ocupação atual (ativos, afastados ou aposentados) – e questões referentes à dor –
diagnóstico médico, duração, freqüência, tempo de tratamento neste Centro e resposta ao tratamento
instituído; Escala Visual Analógica (EVA) – utilizando como pontos 0-1 = sem dor; 2-3 = dor leve;
4-5 = dor moderada; 6-7 = dor intensa ou severa e 8-10 = dor insuportável 9,10 –; HAD, que possui
14 itens, sendo 7 para ansiedade e 7 para depressão, tendo como ponto de corte 8 para ansiedade
e 9 para depressão – desenvolvida por Zigmond e Snaith, em 1983, e validada por Botega em
1998
11
–; e Mini International Neuropsychiatric Interview (MINI-PLUS), entrevista diagnóstica
padronizada, breve, compatível com os critérios do Diagnostic and Statistical Manual of Mental
Disorders - Fourth Edition (DSM-IV) e Classificação Estatística Internacional de Doenças e de
Problemas Relacionados à Saúde (CID-10), para obtenção de diagnósticos de transtornos
psiquiátricos no momento da aplicação, assim como no passado12. Para a utilização desse
instrumento, foi realizada consulta prévia com Dra. Patrícia Amorim (tradutora do instrumento
para o Português) e realizado um treinamento prévio com uma equipe de 3 entrevistadores. Para
obtenção da concordância, foi calculado o Índice Kappa. Foram registrados todos os transtornos
para os quais os pacientes preencheram critérios, de acordo com esse instrumento, e excluído
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transtorno de personalidade anti-social e transtorno de conduta, em razão do MINI-plus não incluir
outros transtornos de personalidade e por existirem questionamentos sobre a validade dos
diagnósticos realizados por meio de entrevistas individuais3.
Para a construção do banco de dados e cálculos estatísticos, foi utilizado o programa
estatístico Statistical Package for the Social Sciences 13.
Os resultados das variáveis contínuas foram apresentados sob a forma de média ±
desvio padrão ou mediana e amplitude interquartil, de acordo com a distribuição. As variáveis
categóricas foram expressas como proporções.
Para correlação das variáveis ordinais, foi utilizado o teste de correlação de Spearman.
Para testar a associação entre as variáveis categóricas, foi utilizado o teste do Qui-quadrado.
Todos os testes foram bicaudais e aplicados após verificação das premissas para sua
utilização. Consideraram-se como significativos valores de p < 0,05.
Todos os pacientes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e o
estudo foi avaliado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Maternidade Climério de
Oliveira, da UFBA, por meio da Resolução 18-2002, de 28 de agosto de 2002.
RESUL
TADOS
RESULT
Dos 91 pacientes estudados, a idade variou de 18 a 50 anos, média ± DP 42,8 ± 7,7
anos. Destes, 87,9% eram do gênero feminino e 12,1% do gênero masculino. Observou-se a
prevalência de pacientes casadas (46,2%), com religião católica (60,4%) e escolaridade de 2º grau
completo (63,7%). A proporção dos pacientes que estão exercendo suas atividades profissionais
Tabela 1
(36,3%) é muito próxima daqueles afastados pelo processo doloroso (34,1%) (T
1).
A dor tinha como características: amplitude variada, média de duração de até 4
anos, freqüência diária e de grave intensidade, tempo de tratamento neste centro de menos de 3
meses. O diagnóstico mais freqüente de dor foi LER/DORT, hérnia de disco e tendinite. Com
relação ao tempo que cursam com dor, 39 (42,9%) referiram-na por até 4 anos, 23 (25,3%)
referiram de 5 a 9 anos, 17 (18,7%) de 10 a 14 anos e 12 pacientes (13,2%) sentem dor há mais
de 15 anos. Quanto à freqüência de dor, a maior parte dos pacientes 66 (72,5%) sente dor
diariamente, 13 (14,3%) pelo menos 3 vezes por semana e 3 (3,3%) referem dor a partir de uma
vez por semana. No tocante ao Tempo de Tratamento no HUPES, 52 (57,1%) referiram estar em
tratamento por até 3 meses, 22 (24,2%) de 3 a 6 meses, 9 (9,9%) de 6 meses a 1 ano, 6 (6,6%)
de 1 a 3 anos e apenas 2 (2,2%) tinham mais de 3 anos de tratamento no Centro. Não houve
uma correlação estatisticamente significante entre o tempo que cursa com dor e a intensidade da
dor (p =0,38).
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Tabela 1. Dados sócio-demográficos dos pacientes atendidos no Centro de Dor do HUPES,
de março de 2002 a julho de 2003.
Quanto ao nível de resposta do tratamento obtido desde a entrada neste centro, 36
pacientes (39,6%) revelaram alívio moderado, 32 (35,2%) nenhum alívio, 18 (19,8%) referiram
pouco alívio e 5 (5,5%) relataram alívio total. Esses dados podem ser compreendidos quando se
analisa a variável Tempo de tratamento no HUPES, visto que a maior parte dos pacientes estava em
tratamento por um período de até 6 meses, tempo insuficiente, na maior parte das vezes, para a
adequada resposta ao tratamento.
Após a aplicação da HAD, detectou-se que 61 (67%) pacientes apresentaram
ansiedade. Destes, 55 (90,2%) eram do gênero feminino e 6 (9,8%) do gênero masculino. Dentre
os pacientes avaliados, 42 (46,2%) apresentaram depressão, dos quais 39 (92,9%) eram do gênero
feminino, enquanto 3 (7,1%) do gênero masculino. Quando comparados os diagnósticos pela
HAD, obteve-se que, dos pacientes deprimidos, 38 (90,5%) eram ansiosos, enquanto 4 (9,5%) não
apresentavam ansiedade. Já entre os pacientes com ansiedade, observou-se que 38 (62,3%)
também estavam deprimidos, sendo esta uma associação estatisticamente significante, enquanto
Tabela 2
23 (37,7%) não eram deprimidos (T
2).
A análise do índice kappa no MINI-plus, entre os observados, foi de 1,0.
Dos 91 pacientes avaliados pelo MINI-plus, encontrou-se 22 (24,1%) que não
apresentaram diagnóstico de nenhum transtorno, 15 (16,4%) apresentaram apenas 1 tipo de
transtorno e a maioria 54 (59,3%) apresentaram 2 ou mais tipos diferentes de transtornos.
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de Saúde Pública
Tabela 2. Comparação de ansiedade e depressão com base na HAD em pacientes do Centro
de Dor do HUPES, de março de 2002 a julho de 2003.
* p < 0,001
Os transtornos psiquiátricos encontrados nesta amostra demonstram que 37 (40,7%)
pacientes apresentam transtornos do humor no momento atual e 25 (27,5%) apresentaram
transtornos de humor no passado. Este dado, no entanto, não corresponde à soma de freqüências
desses diagnósticos, por causa da ocorrência do transtorno, no mesmo indivíduo, atualmente e no
passado. Apresentaram transtornos de ansiedade 43 (47,3%) participantes da amostra, enquanto
apenas 3 (3,3%) apresentaram transtorno misto de ansiedade e depressão. Entre estes, o diagnóstico
mais freqüente foi o de fobia social (n = 12).
Na análise da relação entre os transtornos do humor, obtidos a partir da aplicação
do MINI-plus com depressão, encontrados a partir da HAD, foi encontrado: dos 25 pacientes
com episódio depressivo pelo MINI, em apenas 19 (76%) encontrou-se depressão; dos 10
(100%) pacientes com distimia pelo MINI, apenas em 9 deles foi encontrado depressão pela
escala; em apenas 1 (100%) paciente com episódio maníaco pelo MINI, foi encontrado
depressão pela HAD; e de 1 paciente com episódio hipomaníaco não se encontrou relação com
Tabela 3
depressão pela escala (T
3).
Tabela 3. Freqüência atual dos transtornos do humor pelo Mini-plus nos pacientes com
depressão pela HAD. Números expressos em valores absolutos e percentuais.
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A análise da relação entre os transtornos de ansiedade obtidos a partir do MINI-plus
e ansiedade encontrada pela HAD revelou, quanto à fobia social, agorafobia e fobia específica,
que apenas 1 de cada um destes diagnósticos não evidenciaram ansiedade pela HAD. Para os
transtornos de pânico, ansiedade generalizada, obsessivo-compulsivo e estresse pós-traumático,
Tabela 4
todos os resultados foram equivalentes em ambos os instrumentos (T
4).
Tabela 4. Freqüência dos transtornos de ansiedade pelo MINI-plus nos pacientes com
ansiedade pela HAD. Números expressos em valores absolutos e percentuais.
Na avaliação da freqüência dos outros transtornos mentais, divididos por categorias
diagnósticas, observou-se que o transtorno doloroso foi o mais prevalente (n = 15). Além disso, foi
encontrada uma alta taxa de risco de suicídio (n = 29, 31,9%).
DISCUSSÃO:
Este é o primeiro estudo realizado no Centro de Dor do HUPES, desde sua fundação,
há 6 anos. Com ele, pôde-se ter uma idéia geral do perfil dos pacientes com dor crônica que
fazem parte do cotidiano do Centro e averiguar qual a prevalência de depressão e ansiedade nesta
população.
A utilização de instrumentos como a HAD pode sugerir a presença de transtornos
de humor que poderiam passar despercebidos, pois nesta escala não estão presentes sintomas
confundidores comuns em doenças clínicas e depressão, tais como: fadiga, perda do apetite,
alterações do sono, entre outras. Este instrumento ainda tem a vantagem de rastrear sintomas
subjetivos mais específicos para a depressão, demonstrando, em seu resultado final, a necessidade
ou não do uso de instrumentos diagnósticos adequados na identificação e condução do tratamento
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desses pacientes. Por se tratar de um instrumento de auto-avaliação, o indivíduo, de forma
deliberada, pode exacerbar ou negar sintomas, enfatizando apenas os traços socialmente aceitos, o
que pode favorecer a obtenção de respostas que não correspondam à realidade apresentada pela
população estudada. Além disso, fatores culturais e sociais podem contribuir para a compreensão e
o significado, tendo em vista os termos que a compõem 14.
A descrição da amostra neste estudo foi compatível com os dados apresentados pela
literatura com relação à faixa etária tardia, maior prevalência no gênero feminino e tendo como
causas mais comuns de queixa álgica LER/DORT, artrite reumatóide e osteoartrite15. Quanto à
procedência, religiosidade e grau de instrução, os dados encontrados neste estudo revelam que
estas variáveis não foram relevantes para a análise global destes pacientes, o que corrobora a idéia
de que, se a amostra fosse maior, poder-se-ia obter resultados diferenciados.
Quando, na Tabela 1, foi descrito o perfil dos pacientes, observou-se a prevalência de
gênero feminino, escolaridade até o segundo grau e estado civil casada. Este revelou-se o perfil dos
pacientes com dor crônica atendidos neste Centro. Como estes são também os dados encontrados na
literatura, pode-se supor que esta parcela da população é a que mais se queixa de dor e aquela que
vai mais em busca de tratamento. Contudo, uma análise mais aprofundada destes dados e a
obtenção de resultados mais conclusivos exigiria uma comparação entre estas características nos
pacientes com dor e a população sadia. Contudo este não foi o objeto deste estudo.
Com relação à freqüência e intensidade da dor, observa-se também concordância
com os resultados mostrados pela literatura. Dos pacientes estudados, a maior parte não está em
pleno gozo de suas atividades profissionais, o que corrobora a ênfase do caráter limitante da dor15.
A não correlação entre o tempo que o paciente cursa com dor e sua intensidade
pode ser analisada a partir da compreensão clínica de que, à medida que o paciente persiste no
quadro álgico, maiores poderiam ser os repertórios de comportamentos aprendidos por estes para
lidar com a condição dolorosa. Este fato poderia ser mais bem esclarecido, se pudéssemos avaliar
o nível de enfrentamento e a qualidade de vida destes pacientes, a fim de que pudessem dar
suporte às queixas subjetivas inerentes a seu processo doloroso.
Com relação à resposta ao tratamento, houve semelhança entre o alívio moderado
da dor (39,6%) e nenhum alívio da dor (35,2%). Isto decorre do fato desta amostra ter sido
aleatória e, em sua maior parte (57,1%), serem pacientes que estão realizando tratamento neste
Centro há menos de 3 meses. Este tempo de tratamento não é o esperado para uma boa resposta
de alívio em dor crônica. O que poderia justificar o alto índice do alívio moderado, conforme já
citado, é a presença de uma equipe interdisciplinar que intervenha nos múltiplos fatores
envolvidos neste processo.
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A análise dos resultados obtidos a partir do uso de escalas para ansiedade e
depressão em pacientes com dor crônica evidenciou uma estreita associação com os achados da
literatura em relação à idade 16. Quanto ao alto percentual de pacientes ansiosos, isto pode ter sido
ressaltado pelo fato desta ser uma amostra aleatória, na qual os pacientes foram encaminhados em
diversos momentos de seu atendimento no Centro, culminando com uma população, cujo tempo
de tratamento prevalente tenha ocorrido na faixa de menos de 3 meses e de 3 a 6 meses de
tratamento neste Centro. Logo, percebe-se que o nível de expectativa frente a uma resposta de
alívio é muito grande, e isto de dá por vários motivos: a busca deste tratamento como “último
recurso”, já que são pacientes que percorreram inúmeros profissionais e técnicas terapêuticas, sem
alívio de seu quadro; e por este ser o primeiro Centro de referência para dor crônica na Bahia,
sendo composto por uma equipe multiprofissional interdisciplinar.
Ao se comparar ansiedade e depressão pela HAD, ficou evidenciado, entre os
pacientes que apresentavam depressão, que a maioria (n =38, 90,5%) estavam também ansiosos;
dentre os ansiosos, muitos (n = 38, 62,3%) mostraram-se deprimidos também. Isto torna evidente
a alta significância dos sintomas de ansiedade e depressão que podem apresentar-se em um
mesmo indivíduo. A falta de associação estatisticamente significante entre ansiedade e depressão
pela HAD e intensidade de dor não evidenciaria a proposição de que quanto maior dor o
indivíduo sente, maiores poderiam ser suas respostas ansiosas e depressivas. Este é um dado que
parece corresponder, conforme referido pela literatura, ao episódio de dor aguda, mas não de dor
crônica.
A não significância entre o tempo que o paciente está se tratando neste centro e a
intensidade de dor sentida parece evidenciar o que os achados da literatura apontam. Por ser esta
uma amostra de pacientes com dor crônica, o indivíduo, independentemente do tempo em que
está se tratando, busca uma resposta para seu quadro álgico, sendo, por isso mesmo, significante
quando se investiga a resposta ao tratamento e à intensidade de dor. Assim, isto significa que,
quanto maior a intensidade de dor referida pelo paciente, mais difícil é seu controle.
Ao se investigar os transtornos psíquicos nesta população, foi relevante o resultado de
que a maioria (n = 54, 59,3%) apresentou dois ou mais diagnósticos, quando investigados a partir da
entrevista diagnóstica do MINI–plus. Isto sugere não apenas que esta é uma população pouco
investigada do ponto de vista psíquico, como também aponta para a relevância de mais estudos
diagnósticos, pois este parece ser um dado que interfere no adequado controle do quadro de dor.
Quando submetidos à aplicação do MINI-plus, o resultado contradiz os achados da
literatura, que mostra uma maior associação entre dor crônica e depressão. Nesta amostra,
verificou-se uma prevalência de 43 pacientes (47,3%) que apresentavam ansiedade, em
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contrapartida a 37 pacientes (40,7%) que apresentavam depressão. Isto pode ter ocorrido devido ao
caráter aleatório da amostra, conforme citado anteriormente, em que os pacientes foram
encaminhados para avaliação em diferentes momentos de acompanhamento neste centro. Além
disto, este resultado pode ressaltar que estes pacientes, conforme foi evidenciado na revisão de
literatura, estão sendo submetidos à avaliação do humor a partir de escalas. Estas escalas, no
entanto, apenas identificam a intensidade de sintomas e não evidenciam um diagnóstico
psiquiátrico adequado, o que pode ainda favorecer, nesta população, um falso-negativo quanto aos
aspectos psíquicos. Por isto, é necessária a realização de um diagnóstico, a fim de que seja
possível o sucesso terapêutico dos pacientes com dor.
Ao se comparar a freqüência de depressão pelo MINI-plus com a presença de
depressão pela HAD, pôde-se verificar, entre os 25 pacientes com episódio depressivo, que apenas
19 apresentaram depressão pelo HAD; dos 10 pacientes com distimia pelo MINI, 9 apresentaram
depressão pela HAD; 1 paciente que apresentou episódio maníaco pelo MINI, apresentou depressão
pela HAD; enquanto 1 que apresentou episódio hipomaníaco não foi evidenciado como depressivo
pela HAD. Portanto, pode-se supor que o uso da escala evidencia indícios de depressão nesta
população, assim como, por ser um instrumento simples e de autopreenchimento, pode fazer parte
do protocolo de qualquer profissional clínico, para que sejam evidenciadas respostas depressivas e
Tabela 3
realizado encaminhamento adequado para um profissional da área de saúde mental (T
3).
A análise dos pacientes que apresentaram ansiedade pelo MINI-plus (fobia social,
específica e agorafobia), quando comparada à ansiedade pela HAD evidenciou que, dentre estes
transtornos, apenas 1 paciente de cada diagnóstico não apresentou ansiedade pela HAD; todo o
restante (pânico, Transtorno de Ansiedade Generalizada e Transtorno Obsessivo Compulsivo)
apresentou um resultado equivalente entre os dois instrumentos, o que, mais uma vez, evidencia a
Tabela 4
sensibilidade da escala para este item (T
4).
Com relação ao alto índice de suicídio nesta amostra (n= 29; 31,9%), pode-se
entender que, por se tratar de uma população que sofre de dor há muitos anos e vem buscando,
com apoio de inúmeros instrumentos e técnicas terapêuticas, o alívio de seu quadro álgico,
quando isto não é alcançado, apresenta resposta de “pouca vontade de viver”, o que corrobora
estudos de baixa qualidade de vida nesta população. Além do mais, por ser esta uma população
que apresenta uma concomitância de diagnósticos psiquiátricos, este é um dado que pode ser
evidenciado em um ou em vários destes transtornos (7, 8, 9).
Como o resultado obtido com o MINI-plus equivale ao diagnóstico e à Escala HAD,
apenas a presença de sintomas permite compreender a ausência do diagnóstico e a presença dos
sintomas e vice-versa em um mesmo indivíduo.
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CONCLUSÃO
Este estudo transversal foi o primeiro a ser realizado na população atendida no
ambulatório de dor do HUPES, com a proposta de caracterizar e diagnosticar melhor os pacientes
atendidos. Os dados sócio-demográficos dos pacientes, assim como as respostas obtidas com base
na avaliação de dor, intensidade de sintomas ansiosos e depressivos foram compatíveis com os
referidos pela literatura.
Nesta amostra, mesmo tendo sido uma diferença pequena, foi encontrada uma
prevalência de transtornos de ansiedade, contrariando os relatos da literatura da evidência de maior
prevalência de transtornos depressivos em pacientes com dor crônica. Ao analisar a relação HAD e
MINI-plus, pôde-se perceber que os resultados advindos da aplicação de escalas apontam a
necessidade da aplicação de instrumentos diagnósticos, para que se possa conhecer o perfil
psíquico da população atendida e tratá-la adequadamente.
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Teixeira MJ et al. Dor: contexto multidisciplinar. Curitiba: Maio; 2003.
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anxiety disorders in chronic daily headache and its subtypes. Headache
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Revista Baiana
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1989;5(2): S 35-S 42.
Recebido em 03.10.2005. Aprovado em 27.07.2006.
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ARTIGO ORIGINAL
INTERVENÇÃO COMUNITÁRIA MUL
MULTIPROFISSIONAL
TIPROFISSIONAL EM UM GRUPO DE
ANTES NUM BAIRRO DE PERIFERIA DA CIDADE DE SAL
GESTANTES
SALV
GEST
VADOR, BAHIA
Ignês Beatriz Lopesa
Helena Fraga Maia b
Resumo
No transcorrer da Especialização em Medicina Social com ênfase em Saúde da
Família (ISC/UFBA/SESAB/CCVP), foi observado o despreparo das mulheres para a maternidade.
Considerando a importância da assistência integral para a manutenção da saúde materno-infantil,
este trabalho foi realizado com objetivo de avaliar o efeito de uma intervenção multiprofissional
sobre a saúde das gestantes atendidas em uma unidade de saúde. Trata-se de um estudo qualitativo
com gestantes que moravam no Distrito Sanitário de Pau da Lima, Salvador, Bahia. A seleção das
informantes-chave ocorreu por meio de convite pessoal nas visitas domiciliares e na sala de espera,
respeitando os critérios de inclusão: ser moradora da área de abrangência, realizar
acompanhamento pré-natal na unidade e desejar participar. Inicialmente, foram submetidas à
avaliação fisioterapêutica, responderam a um instrumento elaborado por diversos profissionais e
dados foram coletados em prontuários. Os encontros ocorreram, semanalmente, entre julho e
novembro de 2003, com duração de três horas divididas em duas atividades: abordagem
fisioterapêutica e educação em saúde. Através da comparação das entrevistas iniciais e finais e da
observação contínua do grupo, conclui-se que a intervenção proporcionou melhora na aceitação da
gravidez, no desenvolvimento de hábitos saudáveis, no controle da ansiedade durante o parto e na
adesão ao aleitamento materno.
Palavras-chave: Cuidados Integrais de Saúde. Fisioterapia. Gravidez.
A COMMUNITY-BASED, MULTIPROFESSIONAL INTERVENTION IN A GROUP OF
PREGNANT WOMEN IN AN UNDERPRIVILEGED DISTRICT IN THE OUTSKIRTS OF THE
CITY OF SALVADOR (BAHIA, BRAZIL)
Abstract
Activities related to First Level Post-Graduate Course in Social Medicine with a focus
on Family Health (ISC/UFBA/SESAB/CCVP) allowed for realizing the women's lack of preparation
a
b
Fisioterapeuta, Especialista em Medicina Social com ênfase em Saúde da Família.
Fisioterapeuta, Mestre em Saúde Comunitária, Professora Adjunta da Universidade Católica do Salvador-BA.
Endereço para Correspondência: Ignês Beatriz Lopes. Av. Ulisses Guimarães, 2954, Cd. Central Park II, Ed. Jacarandá, aptº 001,
Sussuarana / CAB, Salvador, Bahia. CEP 41213-000 E-mail: [email protected]
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for motherhood. Given the importance of integral care for mother-child health, this qualitative
study aimed at assessing the impact of a multiprofessional intervention on the health of pregnant
women covered by the Sanitary District of Pau da Lima (Salvador, Bahia, Brazil). The key subjects
were invited to participate during household visits and in the health unit waiting room, according
to the following inclusion criteria: to be dwelling within the health team working area, to receive
pre-natal care in the health unit and to be willing to take part in the study. Subjects had
physiotherapy evaluation, were requested to answer a structured tool devised by professionals from
several fields, and data were collected from their medical records. From July to November, 2003,
three-hour meetings were weekly held comprising two basic activities, namely physiotherapeutic
counseling and health education. Continuous observation and the comparison of interview data at
baseline with those at the end of the study showed that the intervention improved pregnancy
acceptance, the development of healthy habits, anxiety control during childbirth and the
compliance with breast-feeding practices.
Keywords: Integral health care. Physiotherapy. Pregnancy.
INTRODUÇÃO
No período gestacional, o organismo da mulher sofre diversas modificações que o
tornam susceptível a riscos. Deste modo, a assistência ao pré-natal e ao parto é fundamental à saúde
materno-infantil, pois é reconhecido que a qualidade desta assistência está associada à taxa de
mortalidade perinatal1,2,3. Em países em desenvolvimento, como o Brasil, pode-se observar a
ocorrência de agravos à saúde materno-infantil evitáveis por meio de adequada assistência pré-natal,
o que não ocorre em países desenvolvidos, que enfrentam problemas de difícil prevenção4,5,6.
A gravidez caracteriza-se por um período de grandes mudanças físicas e emocionais1
e requer da mulher um preparo para vivenciar a maternidade de forma tranqüila, equilibrada e sem
maiores complicações. Isto, muitas vezes, não ocorre devido a diversos fatores, como a
superficialidade e inadequação da informação oferecida pela mídia sobre saúde sexual7, a falta de
condicionamento físico prévio e as próprias condições sócio-econômicas em que vivem.
Sabe-se que a assistência fisioterapêutica pré-natal, por meio de orientações posturais
e exercícios terapêuticos específicos, pode prevenir e/ou minimizar lombalgias associadas às
alterações decorrentes do período gestacional8,9,10; elevar a auto-estima; fortalecer a musculatura
pélvica e promover maior tolerância à dor, favorecendo o parto, inclusive com redução da
ocorrência de partos prematuros e cesáreas11.
No desenvolvimento das atividades inerentes à Especialização em Medicina Social
com ênfase em Saúde da Família, a equipe de residentes alocados na unidade de saúde Complexo
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Comunitário Vida Plena (CCVP) observou o despreparo das mulheres para o exercício da
maternidade, fato evidenciado especialmente nas visitas domiciliares, nas quais se tornava clara a
fragilidade do vínculo mãe-filho. A maioria das mulheres residentes em comunidades como a do
bairro de Pau da Lima, com alto índice de violência e baixa escolaridade, parece possuir prioridades
emergentes, como a fome e o desemprego em detrimento do cuidado consigo mesma e com seus
filhos. A referida unidade trabalha sob a lógica da saúde da família em parceria com instituições
universitárias, funcionando como campo de estágio para estudantes de graduação e pós-graduação.
O papel do profissional de saúde dentro do contexto familiar envolve ações de
colaboração à reestruturação das famílias, visando promover relações saudáveis e,
conseqüentemente, aprimorar a qualidade de vida destes indivíduos. A gestação mostrou-se um
período propício para interagir com as famílias de modo eficaz, pois a expectativa criada em torno
do novo integrante da família proporciona maior integração entre os parentes, aumenta o interesse
destes por uma vida mais equilibrada, tornando-os mais receptíveis às informações e propostas de
mudanças nos hábitos do cotidiano.
O objetivo deste estudo foi avaliar o efeito de uma intervenção multiprofissional
sobre a saúde das gestantes, moradoras de um bairro de periferia, que participaram de um grupo de
atenção à saúde materno-infantil.
MA
TERIAL E MÉTODOS
MATERIAL
Trata-se de um estudo de cunho qualitativo, realizado com gestantes moradoras do
bairro de Pau da Lima, localizado na periferia da cidade de Salvador, Bahia. Em virtude da
abordagem metodológica, a seleção das informantes-chave foi proposital. As mulheres foram
convidadas nas visitas domiciliares e na sala de espera nos turnos de atendimento pré-natal do
CCVP para participar de um grupo, considerando os seguintes critérios de inclusão: ser moradora
do bairro de Pau da Lima na área de abrangência da equipe, realizar acompanhamento pré-natal
com os profissionais da unidade/CCVP e desejar participar do programa. Para iniciar o trabalho
com este grupo, as gestantes foram submetidas a uma avaliação fisioterapêutica, responderam a
um instrumento previamente estruturado e elaborado por profissionais de diversas categorias e
tiveram dados sobre sua saúde coletados nos prontuários da unidade. Questionários foram
aplicados nas entrevistas iniciais e finais para avaliar conhecimentos específicos sobre o período
gestacional e identificar as expectativas das gestantes sobre o grupo. Utilizou-se também a técnica
de observação participante para captar a experiência vivenciada e expressa pela fala das gestantes.
Em um diário de campo, procurou-se registrar, ao final de cada encontro, o desenvolvimento das
atividades propostas.
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Foram realizados encontros semanais em um salão cedido pela Igreja Católica
situada em frente ao posto de atendimento, no período de julho a novembro de 2003. No
primeiro destes, foram levantados temas de interesse das gestantes que auxiliaram na adequação do
cronograma previamente planejado. Cada encontro teve duração de, aproximadamente, três horas e
foi composto por duas atividades básicas: abordagem fisioterapêutica e educação em saúde. Ao
final do trabalho, vinte encontros haviam sido conduzidos com o grupo.
A abordagem fisioterapêutica foi constituída por orientações posturais para o
período gestacional e de amamentação, exercícios respiratórios, de relaxamento e de
fortalecimento muscular, além da orientação sobre o desenvolvimento neuropsicomotor normal,
para que as mães observassem o desenvolvimento de seus filhos e soubessem identificar a
necessidade de uma intervenção precoce e, potencialmente, evitar maiores limitações. Para seleção
dos exercícios pré-natais foi utilizado principalmente o Guia Oficial da Young Men’s Christian
Association (YMCA). Todas as atividades foram planejadas, considerando previamente a estrutura
local e os recursos disponíveis.
As atividades educativas foram realizadas com a colaboração multiprofissional de
uma psicóloga, uma nutricionista, dois médicos, duas enfermeiras, uma assistente social e uma
odontóloga, todos discentes da especialização em Medicina Social. Deste modo, foi possível
abordar no grupo temas como: vida intrauterina; saúde oral; alimentação pré-natal; higiene;
amamentação; cuidados com o bebê; shantala ou massagem para bebês; direitos do pai, da mãe e
do bebê; e tipos de parto.
A gravidez indesejada, a importância dos serviços de saúde na captação das
gestantes para o pré-natal, a expectativa de dor no parto e a importância do preparo para o sucesso
do aleitamento materno constituíram as principais categorias de análise deste estudo.
A análise do material coletado foi feita com base no discurso dos sujeitos coletivos,
uma vez que a fala é reveladora de representações sociais a respeito de significados e práticas
extraídas das relações dialéticas estabelecidas entre os atores sociais envolvidos.
RESUL
TADOS
RESULT
O grupo teve início com seis gestantes. No decorrer das atividades, estas convidaram
outras que não freqüentaram assiduamente as reuniões. Por esta razão, não foram incluídas na
análise dos resultados. Houve a participação de uma Agente Comunitária de Saúde (ACS)
responsável pela microárea 1 da área de abrangência da equipe, que engravidou durante o
desenvolvimento do grupo gestante, porém suas faltas constantes para atender às solicitações da
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enfermeira coordenadora do Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) impediram-na de
freqüentar assiduamente o grupo, por isto também não foi incluída. Deste modo, os resultados
aqui considerados se referem às seis gestantes com maior adesão ao grupo. Destas, cinco eram
primigestas, uma estava na segunda gestação, e as idades variavam de 15 a 26 anos. Eram
predominantemente negras, nível sócio-econômico baixo e escolaridade baixa, com 1º grau
incompleto. Três gestantes relataram, no início do trabalho, não aceitar a gestação; duas delas não
faziam pré-natal e, ao ingressarem no grupo, sentiram-se motivadas para o acompanhamento com
a equipe da unidade.
Houve relatos de preocupação com o concepto entre as que, inicialmente, não
aceitavam a gravidez, sugerindo estabelecimento de vínculo com o bebê. Outros resultados
detectados através das falas das informantes chaves foram a aquisição de conhecimentos que
podem ajudar na promoção da saúde infantil, como higiene oral do bebê, como dar banho e
cuidar do umbigo, e também a importância da amamentação exclusiva até os seis meses.
Quando da última reunião do grupo, as mulheres já se encontravam no terceiro
trimestre da gravidez. Procurou-se, estabelecer contato com elas após o parto, para avaliações do
impacto da intervenção. Cinco das seis gestantes puderam ser contactadas e houve referência à
supervalorização da expectativa da dor, à importância do preparo para a participação ativa no parto
e controle da ansiedade.
DISCUSSÃO
A assistência pré-natal multiprofissional, no modelo de vigilância à saúde, com
especial enfoque nas atividades educativas, demonstrou ser um meio bastante eficiente na
promoção da saúde materno-infantil. As gestantes, antes com dificuldades em aceitar a gestação,
reconheceram este trabalho como fator de transformação da postura diante da maternidade. A
intervenção favoreceu a aceitação da gestação, proporcionou o desenvolvimento do sentimento
responsabilidade e vínculo com seus bebês, propiciou a participação ativa no trabalho de parto e
controle da ansiedade, promoveu a reflexão e o desenvolvimento de conhecimentos e,
provavelmente, contribuiu para prevenção e redução de desconfortos músculo-esqueléticos comuns
na gestação e no pós-parto.
Os conteúdos emergentes dos relatos de campo foram reveladores das expressões
culturais a respeito do período gestacional e da maternidade. Entre estes, os que surgiram com
maior força são apresentados e discutidos na seqüência; outros que não figuraram nos relatos
espontâneos, mas foram captados pela observação, são posteriormente incluídos, com o intuito de
evocar a necessidade de futuras intervenções.
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de Saúde Pública
Gravidez indesejada
A gravidez indesejada está relacionada à adolescência ou, em menor proporção, à
mulheres acima dos quarenta anos; apresenta dimensões biológicas, econômicas, educacionais,
sócio-culturais, além de envolver aspectos de anticoncepção, da relação com o parceiro e de
construção da identidade feminina12,13,14. No grupo estudado, três gestantes relataram dificuldades
em aceitar a gravidez, e alguns dos motivos para justificar o fato coincidem com os observados na
literatura, a exemplo da relação com o parceiro, questões financeiras e familiares.
“Tive medo do bebê não ser perfeito. Chorei muito quando fui fazer a primeira ultrasonografia, porque eu não queria aceitar a gravidez.” (SJN, 26 anos).
“Ainda não estou bem com o bebê. Penso que seria melhor se eu não estivesse
grávida. Espero que no grupo eu possa me apegar ao bebê, ser como todas as mães.”
(LMS, 19 anos).
“Fiquei preocupada com meu pai. Eu sou filha adotiva, minha mãe e meu pai são na
verdade meus tios. Minha mãe ficou insistindo junto com Daniel (o namorado) para eu
tirar o bebê, eu usei Citotec. Agora estou bem com todos. Estou muito ansiosa, me
sentindo muito sozinha, só gosto de ficar com ele (o namorado). Espero que meu filho
me faça companhia.” ( MJS,15 anos.).
A não aceitação da gravidez tem como grave conseqüência o retardo da procura de
assistência pré-natal. Estudos indicam que a inadequação desta assistência pode advir em função
da baixa escolaridade materna, da baixa renda familiar e da ausência de companheiro2,4,6.
A importância dos serviços de saúde para o início precoce do pré-natal
O sucesso do acompanhamento pré-natal está associado ao início precoce, ao
número de consultas realizadas em todo o período gestacional e à integralidade das ações
desenvolvidas com o objetivo de promover a saúde materno-infantil6,15. Daí a importância dos
serviços de saúde se anteciparem à chegada da cliente ao posto de saúde, iniciando o processo
educativo na comunidade2, como foi realizado neste grupo, tendo sua importância salientada pelas
próprias gestantes:
“A idéia do grupo foi maravilhosa, eu não fazia nada, não aceitava a gestação, não ia
fazer pré-natal, se vocês não me visitassem [...] para mim o grupo chegou em boa
hora.” (SJN, 26 anos).
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“Eu agradeço tanto! Quando eu penso que vocês foram a primeira vez lá em casa, eu
estava tão fria...” (SJN, 26 anos).
Foi possível notar mudanças na forma de vivenciar a gravidez, com relatos de que
não apenas passaram a aceitar a gestação, como também tinham receio de perder o bebê; estavam
felizes em poder compartilhar essa fase com outras gestantes, e mostraram-se ansiosas para verem
seus bebês. Também pareciam mais seguras, como se estivessem preparadas para cuidar de seus
filhos, embora a maioria estivesse grávida pela primeira vez.
Expectativa da dor no parto e a importância da assistência pré-natal
multiprofissional
As dimensões biológicas, psíquicas e culturais do ritual do parto são indissociáveis16
e a dor não é apenas a expressão do sofrimento do corpo, mas a combinação deste com os valores
sócio-culturais e individuais17. Segundo Fontes18, o medo da dor do parto tornou-se um fenômeno
de ação social. Atualmente, observa-se uma crença popular de que o parto é um processo
doloroso, isto é, o parto não é considerado como uma experiência individual, que pode ser vivida
de forma diferente. No grupo estudado, apesar da maioria das gestantes serem primigestas, a
crença na dor do parto era marcante e atribuída às informações obtidas com outras mulheres que já
tinham experimentado a dita “dor do parto” ou pelas cenas de parto na televisão.
Numa pesquisa realizada em 2002, acerca das expectativas de usuárias do SUS sobre o
parto, foi evidenciada a insuficiência de informações sobre o trabalho de parto, tais como:
contrações, dilatação, entre outros; a inadequação do atual modelo de assistência, que não orienta
sobre o processo reprodutivo; a influência do modelo médico hegemônico sobre a concepção
patológica da fisiologia do parto vaginal; e a valorização da dor do parto como ritual de passagem
para o status de adulta e mãe19. No grupo estudado, observou-se a falta de conhecimento da
fisiologia do parto, a influência social na crença individual e a valorização da dor, como se verifica
a seguir:
“As contrações devem ser terríveis. Eu não sei se é por causa da televisão... eu sei que
minha mãe sofreu muito por ter tido três cesarianas.” (ACSM, 22 anos).
“Porque vai passar um nenê, um negocinho pequenininho passar um nenezão!” (SJN,
26 anos).
“Por causa das contrações e o espaço é muito pequeno, mas depende da pessoa, tem
gente que sente, outras não.” (RSP, 23 anos).
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“Não sei, porque as pessoas dizem.” (MJS, 15 anos).
“Você sente prazer e sente dor, tudo que é bom tem que ter um pouquinho de dor.”
(LMS, 19 anos).
Após vivenciarem o parto, as gestantes relataram suas experiências, permitindo
constatar a importância do preparo obtido na participação no grupo. Segundo as participantes, o
grupo lhes proporcionou as informações necessárias à manutenção da calma e as orientou quanto à
melhor forma de agir no momento do parto, especialmente, sobre a respiração.
Consonni20, em 2002, relatou que o programa multidisciplinar de preparo para o
parto e maternidade pode controlar a ansiedade materna e favorecer o parto vaginal. Para Fontes18,
em 1994, as vantagens sobre o curso da gestação e trabalho de parto são indiscutíveis e envolvem
a diminuição da duração, redução das complicações e de intervenções obstétricas. No grupo em
estudo, as gestantes revelaram: manutenção da calma, com redução da ansiedade; pequena
duração do parto; e que haviam superestimado a dor. As falas são ilustrativas:
“Eu não sabia o que era dor de parir. Fui acompanhar RSP [outra gestante do grupo,
que foi à maternidade] e fiquei lá. RSP veio para casa e eu fiquei! Eu senti aquela
pontadazinha. Eu disse não é isso não, o pessoal fala que é uma dor do outro mundo.
Isso não é dor de parir. O médico estranhou. Ele me perguntou se era a primeira vez e
eu disse que sim. Ele perguntou: E você tá assim calma? Com o aumento das
contrações, sentia uma dorzinha. Quando eu fiz a força, eu senti um negócio
estranho, aí eu gritei: Vai nascer enfermeira! O parto foi maravilhoso, não senti dor
nenhuma. Eu ficava lembrando do curso, como eu tinha que respirar. Eu lembrei de
você o tempo todo. A única dor foi dos pontos.” (SJN, 26 anos).
“Não cheguei a sentir dor nenhuma, só as contrações. Quando tinha a contração,
tinha um pouquiiiiiiiiiinho de dor, dor mesmo eu não senti não. Sua imagem não saía
da minha cabeça; eu respirava e chamava por Deus.” (RSP, 23 anos).
“Não demorou muito não. Quando eu comecei a respirar ela desceu. Eu não senti dor,
só senti quando a médica pocou a bolsa.” (LMS, 19 anos).
“Foi maravilhoso! A contração é terrível, mas é suportável, eu já estava acostumada
[com a idéia de parir, de sentir dor]. De vez em quando eu dava um grito, mas nada
de escandaloso. No parto eu não senti dor, é instantâneo, tomei anestesia só para os
pontos.” (ACSM, 22 anos).
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“[...] se eu não participasse, eu não sabia o que fazer na hora, só gritar mesmo!” (RSP,
23 anos).
“Para mim ia ser tudo ao contrário, modo de respirar, ia fazer escândalo [...] a pessoa
nunca pariu, não fez um curso, quando chega lá [...] ia fazer vergonha [...]” (SJN, 26
anos).
Preparo para o aleitamento materno
O aleitamento materno é essencial à manutenção da saúde das crianças, pois além
de ser o alimento mais adequado, promove o estreitamento da relação mãe-filho. Apesar disso, o
desmame precoce é uma realidade preocupante, especialmente no Brasil, que apresenta uma
grande população de baixa renda, o que expõe as crianças a vários riscos, como infecções e
desnutrição21 . O desconhecimento sobre aleitamento materno por parte das mães é um fator
importante para o desmame precoce22. Preconiza-se amamentação exclusiva por seis meses e
acrescida de alimentos complementares até os dois anos de vida23,24.
As gestantes do grupo estudado desconheciam o tempo adequado para a
amamentação e a importância de não incluir outros alimentos na dieta de crianças até seis meses.
Durante os encontros, as gestantes demonstraram que haviam compreendido esses conceitos e
pareciam estar dispostas a colocá-los em prática. Entretanto, após o parto, duas gestantes do grupo
introduziram alimentos na dieta do filho, uma delas argumentou:
“Eu dou mama o dia todo, à noite eu não agüento mais, aí dou mamadeira.” (LMS, 19
anos).
Em estudo de intervenção, Barros, Halpern e Victora25, em 1994, demonstraram que
visitas domiciliares pós-parto podem ter um grande impacto nos padrões de aleitamento materno
nos primeiros meses de vida, pois é neste momento que as mães se deparam com as dificuldades
para amamentar e não encontram auxílio profissional, o que pode culminar no desmame precoce,
devido à falta de orientação adequada.
As outras gestantes do grupo mantiveram o aleitamento materno exclusivo e
destacaram a importância do preparo das mamas realizado sob orientação dos profissionais
atuantes no grupo.
“[...] o exercício no seio. Eu comprei a bucha, todo o dia eu esfregava, tanto que ela
não feriu meu peito.” (RSP, 23 anos).
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“Se eu não tivesse aprendido a coisa do mamilo, da bucha, eu acho que hoje eu não
daria mama com essa tranqüilidade de hoje não.” (ACSM, 22 anos).
Questões relacionadas com a saúde oral, desenvolvimento neuropsicomotor e
modificações físicas comuns ao período gestacional não se constituíram como categorias
emergentes, mas foram objeto de intervenções realizadas no grupo e constituem temas importantes
para a promoção da saúde materno-infantil.
Em respeito à saúde oral, Ramos e Maia26, em 1999, defenderam a educação
materna como a forma efetiva de promover a saúde infantil, através da mudança de valores e
adequação dos hábitos. A promoção da saúde tem como obstáculo a necessidade de promover
mudanças nos hábitos cotidianos. Deste modo, a gestação mostrou-se um período adequado à
promoção de saúde, pois os indivíduos nascem dependentes dos cuidados familiares e,
principalmente, sem hábitos pré-estabelecidos.
As gestantes do grupo possuíam hábitos de higiene oral inadequados e
desconheciam condutas necessárias à promoção da saúde oral infantil. A intervenção proporcionou
a reflexão sobre esses hábitos e informou os cuidados necessários à higiene oral infantil.
Alvarez e Wurgaft27, em 1992, estudando o estado de saúde da família de nível
socioeconômico baixo, concluíram que a saúde é amplamente controlada pelas mães. Ao nascer,
o indivíduo é bastante dependente e a mãe tem papel importante, pois é a primeira a estabelecer
uma relação de cuidado e a qualidade desta interação determinará a condição de saúde deste bebê.
Mondardo e Valentina28, em 1998, ilustraram a importância do vínculo mãe-filho no
desenvolvimento infantil e sua contribuição para a estruturação sadia do aparelho psíquico da
criança.
A despeito do desenvolvimento neuropsicomotor, sabe-se que a instalação e
evolução das deficiências poderiam ser retardadas se os atrasos fossem rapidamente identificados e
encaminhados para adequada assistência. A intervenção precoce é fundamental para assegurar a
qualidade de vida de crianças com deficiência29, 30. Deste modo, é de extrema importância educar
as mães para que saibam identificar possíveis atrasos no desenvolvimento neuropsicomotor e
percebam a necessidade de buscar auxílio profissional. As gestantes deste grupo expressaram a
preocupação em saber se os filhos seriam normais e demonstraram muito interesse em aprender
sobre o desenvolvimento neuropsicomotor normal, o que facilitou o trabalho educativo e a
aprendizagem.
Quanto às modificações físicas determinadas pela gestação, os dados provenientes
do instrumento de coleta apontaram para a crença de que na gestação é normal a mulher
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apresentar lombalgia, edema e dificuldade respiratória. É possível que tais representações tenham
surgido em função de informações obtidas com outras mulheres da comunidade.
Sabe-se que a atividade física regular, moderada e orientada durante o período
gestacional, promove benefícios para a saúde de mãe e filho como o controle de desconfortos
músculo-esqueléticos 8,9,10, a melhora do condicionamento para o parto, aumento da tolerância à
dor, controle do ganho ponderal e elevação da auto-estima11 . Portanto não se trata de alterações
esperadas e normais do período gestacional para todas as mulheres e são passíveis de intervenção
fisioterapêutica pré-natal.
A intervenção fisioterapêutica, no grupo estudado, foi composta por cinesioterapia e
orientações posturais. Tais abordagens podem ter propiciado diminuição da intensidade de
possíveis desconfortos musculoesqueléticos, já que não foram relatadas dores lombares, edema ou
dor em extremidades. Constatou-se também que não houve parto prematuro no grupo; que as
gestantes tiveram pequena duração do parto; e que apenas uma precisou realizar cesárea, por falta
de dilatação.
Em síntese, observou-se que esta intervenção proporcionou melhora na aceitação da
gestação; o desenvolvimento do vínculo mãe-filho; fomentou a responsabilidade com o
desenvolvimento de hábitos saudáveis; ampliou os conhecimentos necessários ao desempenho dos
cuidados consigo e com seus filhos; promoveu a manutenção da calma, controle da ansiedade e
participação ativa no momento do parto; proporcionou o preparo para a amamentação, além de
poder ter contribuído para o bem-estar das gestantes, por meio da redução dos possíveis
desconfortos músculo-esqueléticos comuns no período gestacional.
Os resultados alcançados demonstram a importância de implementar a assistência
pré-natal, visando promover a saúde de forma integral, especialmente em comunidades carentes,
onde prevalecem fatores de risco como a baixa escolaridade, a baixa renda e a desestruturação das
relações familiares.
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Recebido em 03.10.2005. Aprovado em 11.09.2006.
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ARTIGO ORIGINAL
QUALIDADE DO DADO REFERENTE À IDADE GEST
ACIONAL NO SISTEMA DE
GESTACIONAL
INFORMAÇÃO SOBRE NASCIDOS VIVOS (SINASC) EM TERESINA-PI
Keila R. O. Gomes a, Elda S. Santos b
Grazyella P. Santosb, Márcio D. M. Mascarenhasc
Resumo
O objetivo deste estudo é avaliar a qualidade do dado referente à variável idade
gestacional (IG) no Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos (SINASC), fornecido por
maternidade-escola de referência. Trata-se de estudo em maternidade-escola de Teresina (PI), que
notificou ao SINASC 56,43% dos nascidos vivos hospitalares de mães residentes no município em
2002. Para a coleta de dados nas possíveis fontes de registros hospitalares, utilizou-se formulário
(DN-pesquisa) elaborado a partir da Declaração de Nascidos Vivos (DN) oficial, acrescentando-se
campos como concordância da IG oficial e dos registros hospitalares, e possível método de
obtenção da IG selecionado para o SINASC. O registro da variável IG no SINASC foi de 100% e
em nenhuma vez considerou-se este campo como informação ignorada, apesar de em cerca de 7%
dos casos não se ter localizado registro deste dado em qualquer fonte hospitalar, sendo que 95%
destes foram registrados no sistema como recém-nascido (RN) de termo. A concordância entre a
IG procedente do SINASC e a do registro hospitalar foi de 92%. Métodos de avaliação da IG com
valor coincidente ao informado no SINASC foram constatados em 61% dos casos. O método de
Capurro, de escolha para RNs de termo no hospital, foi selecionado para informação da variável ao
sistema em menos de 2/3 destes casos. Concluiu-se que a qualidade do dado referente à IG no
SINASC foi avaliada como excelente e confiável, apesar da necessidade de algumas melhorias.
Palavras-chave: Informação em saúde. Idade gestacional. SINASC. Declaração de nascido vivo.
a
b
c
Departamento de Enfermagem e Programa de Mestrado em Ciências e Saúde do Centro de Ciências da Saúde da Universidade
Federal do Piauí.
Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Federal do Piauí.
Curso de Mestrado em Ciências da Saúde da Universidade Federal do Piauí.
Endereço para correspondência: Rua Magalhães Filho, 575/sul, Teresina, Piauí. CEP-64001-350. Fone: (086) 222-7943. Email: [email protected]
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QUALITY OF THE DATA REFERRING TO THE GESTATIONAL AGE IN THE
INFORMATION SYSTEM OF LIVE BIRTHS (SINASC), IN TERESINA-BRAZIL
Abstract
This paper aims at evaluating the quality of the data in reference to the gestational
age variable (IG) in the Information System of Live Births (SINASC), provided by a hospital
maternity school. This hospital maternity, in Teresina, Piauí, Brazil, reported SINASC a 56.4% of
live hospital births of resident mothers in the municipality in 2002. To collect the data from
possible sources in the hospital records, a form (DN-research) that was prepared from the standard
DN was used. Spaces such as concordance with the standard IG and the hospital records were
added to the possible method of acquisition of the IG selected for SINASC. The registration of the
IG variable in SINASC was 100% and there was no case in which this space was ignored, even
though in around 7% of the cases theses data were not localized on any hospital source. 95% of
these births were registered in the system as full term newborns. The concordance between the IG
from SINASC and the hospital records was 92%, but there was concordance among all source data
just in 16.5% of cases. Evaluation methods of IG with values concurrent to those registered in
SINASC were verified in 61% of the cases. The Capurro method, the choice for term newborns in
the hospital, was selected as the variable information for the system in less than 2/3 of the cases.
The quality of the referred IG data at SINASC was evaluated as excellent and secure, even though
there is a need for some improvement.
Keywords: Health information. Gestational age. SINASC. Live birth report.
INTRODUÇÃO
A tomada de decisão tem como ferramenta essencial a informação, que possibilita
desde o atendimento individual à abordagem das questões coletivas. Logo, conhecer a situação de
saúde requer dados fundamentais ao planejamento, à organização e à avaliação de ações e serviços1.
No Brasil, há os sistemas nacionais de informação em saúde, gerenciados pelo
Ministério da Saúde e mantidos de forma a cumprirem-se dispositivos legais que regulamentam o
Sistema Único de Saúde (SUS)1. O Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos (SINASC),
implantado em 1990, tem como instrumento de coleta de dados a declaração de nascido vivo
(DN), que registra as principais características da mãe e do recém-nascido e deve ser preenchida
para todos os nascidos vivos no país2.
O SINASC encontra-se numa fase em que apresenta ainda alguns problemas
relacionados à qualidade e quantidade das informações, o que traz prejuízos à determinação de
indicadores de saúde, tais como a taxa de mortalidade infantil, e à razão de mortalidade
materna3,4.
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A idade gestacional (IG) é uma variável contida na DN que merece muita atenção e
é considerada uma das mais estudadas na epidemiologia perinatal5. De acordo com Whaley e
Wong6, a maioria das crianças de alto risco nasce antes da data provável do parto. A incidência de
complicações neonatais é mais alta no RN pré-termo, além disso, a prematuridade é geralmente
aceita como principal fator isolado na taxa de mortalidade infantil.
As informações contidas na DN são essenciais para a identificação do perfil do
recém-nascido e da mãe. Fornecem tanto informações epidemiológicas, como subsídio para a
avaliação e o planejamento das políticas de saúde da mulher e da criança. A carência de
informações fiéis pode comprometer, além da formulação de indicadores materno-infantis, a
implementação de medidas que assegurem melhor nível de vida dessa população. Por isso, propõese, neste estudo, a avaliação da qualidade do dado referente à idade gestacional no SINASC, oriundo
de declarações de nascidos vivos preenchidas em maternidade-escola de Teresina (PI).
MÉTODOS
No censo demográfico de 2000, Teresina possuía uma população residente de
714.583 habitantes, dos quais 94,7% residiam na zona urbana7. Em 2002, notificaram-se 14.416
nascidos vivos de mães residentes em Teresina, nos estabelecimentos de saúde existentes no
municípiod. Optou-se por incluir apenas dados de residentes, por este estudo fazer parte de outro
maior que inclui o perfil do RN deste grupo de mães, haja vista esta ser uma maneira indireta de
se avaliar a qualidade da assistência à gestante.
Nesse ano, quase 93,0% dos nascimentos ocorreram em apenas cinco das onze
instituições hospitalares de Teresina que notificam ao SINASC. Dentre estes estabelecimentos,
optou-se pelo de maior demanda, no qual foram notificados 56,4% dos nascidos vivos no
município em 2002 e média superior a 60,0% dos nascimentos notificados em outros anos, o que
faz a qualidade dos dados desta maternidade ser de extrema importância para sistemas de
informação com dados do município, além do fato de ser uma instituição formadora de recursos
humanos para a área da saúde.
A população do estudo foi composta por todos os nascidos vivos de partos não
gemelares, ocorridos no ano de 2002 na maternidade selecionada, com mãe residente no
município de Teresina. Dentre os meses deste ano, sorteou-se um para a coleta dos dados,
excetuando-se fevereiro, por apresentar somente 28 dias. Excluíram-se os gêmeos, em razão do
teste piloto ter mostrado que, em muitos casos, seria impossível identificá-los.
d
Segundo informações obtidas junto à Gerência de Informação em Saúde da Fundação Municipal de Saúde de Teresina, a partir
de relatório emitido pelo SINASC/2002.
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Após o sorteio, foi emitido relatório completo do SINASC (banco de dados oficial)
para listar os nomes das mães que deram à luz no período de 1° a 31/08/2002 na instituição, onde
constavam 660 nascidos vivos. Este relatório foi o ponto de partida para obtenção de dados do
Livro de Registro do RN, Prontuário da mãe e Prontuário do recém-nascido. Antes do início da
coleta dos dados, solicitou-se o consentimento do gestor da maternidade e o do SINASC,
garantindo-lhes o anonimato das mães. O projeto de pesquisa do qual este estudo faz parte foi
aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFPI.
O instrumento de coleta dos dados utilizado nesta pesquisa foi o mesmo do estudo
intitulado Avaliação da Qualidade dos Dados do Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos em
Teresina, Piauí 8. Ao formulário e à DN-pesquisa, instrumento padronizado e pré-testado,
elaborado a partir da DN oficial, acrescentaram-se campos tais como os relativos à IG segundo o
método de avaliação; concordância entre o dado referente à IG constante no SINASC e o obtido de
registros hospitalares e a presumida fonte original do dado coletado para o sistema.
Inicialmente, foram identificados os casos de interesse para o estudo por meio do
Livro de Registro do RN. A seguir, preencheram-se, na DN-pesquisa, a data da última menstruação
(DUM) que constava no prontuário materno e a IG calculada pela DUM, pelo método Capurro9 e
pela ultra-sonografia gestacional (USG). A IG seria considerada não localizada quando esses dados
não fossem localizados nos prontuários maternos ou do RN. O método de avaliação da IG foi
escolhido pelo profissional que atendeu à mãe ou ao RN. Ao pesquisador coube anotar o valor
registrado na fonte de dados ou recalculá-lo quando possível, pois, no caso do método Capurro,
não havia como certificar-se do valor, haja vista que o estudo trabalha com informação secundária,
tendo sido coletada para a pesquisa meses após o nascimento da criança.
Posteriormente, os dados coletados nos registros hospitalares sobre a IG foram
confrontados com o informado no SINASC. Quando houve coincidência no valor da IG, procedeuse à identificação dos métodos utilizados para o seu cálculo (DUM, Capurro ou USG),
especificando-os no campo correspondente do formulário. Assim, presumidamente, identificou-se
a fonte selecionada do dado referente à variável IG informada ao SINASC.
Quando a IG calculada pela DUM era localizada nos registros hospitalares,
realizava-se o cálculo da IG a partir da DUM coletada, utilizando-se gestograma distribuído pelo
Projeto Nascer, do Ministério da Saúde.
Segundo o critério utilizado por Silva et al4, para a realização do cálculo da IG pela
DUM, quando não se obtivesse o dia, mas apenas o mês em que ocorreu a última menstruação,
imputar-se-ia o dia 15. Quando não fosse possível obter dia e mês da última menstruação, a DUM
e, conseqüentemente, a IG seriam consideradas ignoradas.
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O cálculo da IG pela USG foi feito tomando-se como base a IG na referida data em
que o exame realizou-se, ao qual acrescentou-se o número de dias ou semanas seguintes até a data
do nascimento.
As definições utilizadas para nascido-vivo quanto à IG foram as da Organização
Mundial de Saúde10, que o classifica como pré-termo quando nasce com IG menor que 37
semanas; de termo quando a IG é de 37 semanas a 41 semanas e seis dias; pós-termo quando
nascem com 42 semanas ou mais de gestação.
Após a coleta dos dados, as informações oficiais dos nascimentos vivos, ocorridos
no mês sorteado, foram importadas para o aplicativo software Epi Info, versão 6.0111. Realizou-se,
então, a seleção destes casos, utilizando-se os dados relativos à idade da mãe, gestação, consultas
de pré-natal, data e hora do nascimento, sexo e peso do RN, para a localização dos casos, por
meio de busca manual, sendo a data do nascimento considerada o melhor identificador para o
pareamento dos casos. A adoção desse critério permitiu a identificação de 84% dos casos.
Utilizou-se ainda o nome da mãe para os casos não localizados com o identificador data do
nascimento, mas obteve-se apenas mais 13 casos. Este procedimento foi necessário, haja vista o
SINASC ter como bom identificador o número da DN, dado inexistente nos registros hospitalares.
Realizadas a codificação e a conferência manual dos formulários, procedeu-se a
formação do banco de dados, processo realizado no Epi Info. Para avaliação da freqüência de
registro da variável que permite identificar a idade gestacional do RN no SINASC, utilizou-se a
classificação definida por Mello Jorge et al 12: excelente, quando o percentual de ignorado/ branco
era menor que 10%; bom, entre 10% e 29,9%, e mau, quando igual ou superior a 30%.
RESULTADOS
Verificou-se que dos 660 casos apontados pelo SINASC como de mães residentes,
15 eram de mães que não residiam em Teresina, sendo, portanto, excluídos da pesquisa. Além
disso, houve perda de 79 casos (12,2% do total) não localizados nas fontes de registro hospitalar.
Assim, foram viáveis para a pesquisa 566 casos.
O registro da variável relativa à IG no sistema de informação foi de 100%, sem
nenhum caso de registro do dado como informação ignorada e sendo de 92,0% a concordância da
IG proveniente do SINASC em relação à IG oriunda do registro hospitalar.
Quanto aos métodos de avaliação utilizados, em cerca de 40% dos casos houve
coincidência de apenas um dentre os localizados nos registros hospitalares com o valor referente à
IG no sistema. Os valores registrados pelos três métodos utilizados no hospital coincidiram entre
si e com o valor do SINASC em apenas 16,5% dos casos. A USG foi o método menos utilizado
Tabela 1
como fonte do dado IG para o sistema (T
1).
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Tabela 1. Distribuição das freqüências de nascidos vivos na maternidade-escola de Teresina,
em agosto de 2002, segundo os métodos de avaliação das idades gestacionais (IG)
com valor coincidente com o registrado na Declaração de Nascido Vivo (DN).
*IG=idade gestacional; DUM=data da última menstruação; USG=ultra
sonografia gestacional.
** Excluídos 82 casos em que ou o valor não coincidiu com o da DN ou
não havia registro hospitalar.
Os achados revelaram que, em 93,1% dos casos, foi localizado algum registro
hospitalar da IG. Mas, ao se correlacionar a IG destes registros, segundo as três categorias
consideradas pela OMS e a que constava no SINASC, verificou-se que 37 dos 39 casos em que a IG
Tabela 2
não foi localizada nos registros hospitalares constavam no sistema como RN de termo (T
2).
Tabela 2. Distribuição das freqüências de nascidos vivos na maternidade-escola de Teresina,
em agosto de 2002, segundo a duração da gestação informada no Sistema de
Informação sobre Nascidos Vivos (SINASC) e a localização deste dado em registros
hospitalares.
IG=idade gestacional.
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Ao analisar-se o método anotado nos registros hospitalares para avaliação da IG, em
alguns prontuários havia concomitância de métodos nas anotações; observou-se que os métodos
Tabela 3
mais utilizados foram o da DUM e o de Capurro (T
3).
Tabela 3. Freqüência dos métodos de avaliação da idade gestacional (IG) localizados nos
registros hospitalares na maternidade-escola de Teresina, em agosto de 2002.
IG=idade gestacional; DUM=data da última menstruação; USG=ultrasonografia gestacional.
DISCUSSÃO DOS RESUL
TADOS
RESULT
Em pesquisa realizada em maternidades maranhenses por Silva et al4, que avaliou a
qualidade dos dados do SINASC, verificou-se que o percentual de informações ignoradas ou em
branco para a variável IG, utilizando-se esta classificação, foi considerado bom. Na presente
pesquisa, detectou-se que a freqüência de registro no sistema foi excelente para a mesma variável,
visto que, para todos os casos registrados no SINASC, este campo foi preenchido.
Embora vários estudos tenham sido realizados, a partir da utilização das informações
do SINASC, para descrever o perfil das mães, dos neonatos e das condições de parto, ou justificar
o uso dessas informações no planejamento das ações na área da saúde materno-infantil, outras
investigações epidemiológicas questionam a qualidade dessas informações no sentido de
identificar inconsistências nos dados de natalidade13,14.
Mesmo com estes questionamentos sobre qualidade, os achados deste estudo
revelaram que as informações sobre a IG obtidas a partir do SINASC são de boa qualidade, quando
se toma como referência os dados do hospital em que se avaliou o dado fornecido, haja vista a
elevada coincidência entre o dado do sistema de informação e o contido nos registros hospitalares.
Entretanto há elevada variação entre os valores encontrados nos registros institucionais, o que
denota a falta de padronização no método de escolha para o cálculo da IG. Na prática, um mesmo
Rn pode ser avaliado por todos os métodos disponíveis e dificultar a identificação mais adequada
do valor atribuído à variável a ser informada na DN, o que pode levar à formação de falsos
indicadores que utilizam esta medida.
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Apesar da controvérsia a respeito do melhor método para se estimar a IG5,15,16,17,18,19,
para Moraes e Reichenheim20, o exame clínico do RN logo após seu nascimento, em algumas
situações, é o único meio disponível, tanto para pediatras, como para pesquisadores na área de
saúde perinatal. A falta de acesso ao pré-natal, ou seu início tardio por grande parte das mulheres
brasileiras, impossibilita a realização da USG nos períodos gestacionais de maior capacidade
diagnóstica deste método. Além disso, a DUM é desconhecida em algumas situações. Nessas
circunstâncias, a utilização do exame clínico do recém-nascido apresenta-se como a única
estratégia para estimar a IG da criança.
Dentre os métodos de avaliação da IG por meio de métodos clínicos pós-natais
destaca-se o de Capurro, recomendado na maternidade onde se realizou este estudo. Neste
método, características físicas e respostas a testes neurológicos são utilizados para estimar-se a
idade gestacional do RN.
Apesar da importância da variável em estudo, nem todos os nascidos vivos de termo
foram avaliados pelo método de Capurro e estes foram quase na totalidade considerados de termo.
Portanto, pondera-se que houve tendência em se considerar RN de termo os casos em que não se
obteve registro hospitalar sobre a IG. Este fato pode ter levado à subestimação dos prematuros,
tendo em vista que se trata de hospital de referência para gestação de alto risco e que não era
rotina a DN ser preenchida por neonatologista. Assim, presume-se que na DN constava a IG
estimada por pessoas não qualificadas para tal procedimento ou que os registros hospitalares não
eram adequadamente feitos.
Silva et al4 verificaram que há subestimação muito grande na taxa de prematuridade
calculada pelo SINASC em maternidades do Maranhão, onde identificaram cerca de sete vezes
mais prematuros que o SINASC.
Em suma, percebem-se problemas na qualidade do dado referente à variável IG
contida no sistema de informação, principalmente no que diz respeito a dados em que não havia
registro hospitalar sobre a IG, com conseqüente possibilidade de subestimação da prematuridade.
Isto requer melhor supervisão e controle da qualidade na coleta de dados para o SINASC, além da
capacitação dos recursos humanos envolvidos na geração de dados. Em virtude da significância
destes dados para o SINASC no município de Teresina, eles podem distorcer as informações
utilizadas na gestão da saúde materno-infantil.
No geral, os dados sobre duração da gestação, informados pelo SINASC na referida
maternidade, são confiáveis, quando se tem como base o dado referente à IG contido nos registros
hospitalares. Entretanto alguma melhoria deve ser implementada para uniformizar os dados
registrados, haja vista que houve baixo nível de coincidência dos dados hospitalares entre si.
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AGRADECIMENTOS
Nossos agradecimentos aos formandos do Curso de Graduação em Enfermagem da
UFPI, Ketiana Melo Guimarães e Tiago de Sousa Macedo, pelo auxílio na coleta de dados.
REFERÊNCIAS
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revisão e discussão da situação atual. IESUS 1997;6(4):7-46.
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internacional de doenças e problemas relacionados à saúde: 10ª rev. São
Paulo: Centro Colaborador da OMS para a Classificação de Doenças em
Português; 5a ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo; 1997.
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11. CDC - Center for Disease Control and Prevention. Epi Info, Versão 6.01
[programa de computador]. Atlanta, Geórgia: CDC; 1994.
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Revista Baiana
de Saúde Pública
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Cad Saúde Pública 2000; 16(1):1-19.
Recebido em 31.01.2006. Aprovado em 03.07.2006.
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ARTIGO ORIGINAL
EXERCÍCIO DO CONTROLE SOCIAL EM MUNICÍPIOS DE PEQUENO PORTE:
O CASO DE LAF
AYETE COUTINHO (BA)
LAFA
José Patrício Bispo Júniora
Kelly Leite Maia de Messias a
José Jackson Coelho Sampaio a
Resumo
Com a criação do Sistema Único de Saúde (SUS) a participação popular foi
institucionalizada na gestão da saúde. Foram estabelecidas como instâncias para o exercício do
controle social as conferências e os conselhos de saúde. Neste artigo analisa-se o exercício do
Controle Social em Lafayete Coutinho (BA). Trata-se de um estudo exploratório de natureza
qualitativa. Os dados e informações foram obtidos por meio de análise documental e entrevistas
semi-estruturadas. O conselho apresenta irregularidades em sua composição e irregularidades na
freqüência das reuniões. Delibera por políticas que apontam em direção à reversão da situação
sanitária do município, porém com dificuldade em fazer cumprir tais deliberações. Demonstra
preocupação com o funcionamento dos serviços de saúde municipais, todavia pouco delibera
sobre tal problemática. E apresenta desempenho inadequado no acompanhamento da gestão
financeira. Desta forma, identifica-se que o conselho apresenta limitações no exercício do
Controle Social, atuando mais como homologador das decisões proferidas pelo gestor, do que
como foro de construção e acompanhamento das políticas de saúde municipais. As principais
questões apontadas pelos conselheiros como limitantes para o exercício do Controle Social foram
a rivalidade política local, a capacitação inadequada de conselheiros e a existência de
policonselheiros.
Palavras-chave: Participação Comunitária. Políticas de controle social. Organização social. SUS.
Política de saúde.
a
Universidade Estadual do Ceará (UECE)
Entidade Financiadora - Fundação Cearense de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico - FUNCAP.
Endereço para correspondência: José Patrício Bispo Júnior, Av. José Moreira Sobrinho, 815, Jequiezinho, Jequié-BA. CEP:
45206-190. E-mail: [email protected]
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THE EXERCISE OF SOCIAL CONTROL IN SMALL MUNICIPALITIES: THE CASE OF
LAFAYETE COUTINHO-BA
Abstract
Popular participation has been established in Brazil under the creation of Unified
Health System-SUS, as an instance for social control by means of health conferences and councils.
This paper aims at assessing the exercise of social control in Lafayete Coutinho, in the state of
Bahia. It is an exploratory qualitative study. The data and information were obtained by analyzing
documents and interviews. The Council has irregularities in its composition, and its meetings have
no regularity. The Council deliberates policies aiming at reverting the sanitary situation, however it
has found difficulties in terms of their implementation. The Council shows concern with the
functioning of local health services, although it does not take action with reference to this issue.
Furthermore, the council demonstrates inadequate performance in terms of financial management.
Thus, we identify a Council facing limitations in exercising Social Control, its actions mainly
corroborating the decisions taken by the mayoral office, rater than being a locus for the
construction and follow-up of local health policies. The main problems reported by counselors as
limiting factors were local political rivalries, the lack of training on the part of counselors
themselves, and the non-existence of poly-counselors.
Keywords: Community participation. Social control policies. Social organization. SUS. Health
policy.
INTRODUÇÃO
Com a Constituição de 19881, a participação da comunidade passa a ser um dos
requisitos fundamentais para a implantação e a consolidação do Sistema Único de Saúde (SUS).
Em 1990, são publicadas as Leis 8080/902 e 8142/903 que institucionalizam e regulamentam a
participação popular e o Controle Social na gestão da saúde, tendo como instâncias legalmente
instituídas as conferências e os conselhos de saúde. No que se refere aos conselhos, a Lei 8142/90
define que esses são de caráter permanente e deliberativo e sua função é atuar na formulação de
estratégias e no controle da execução da política de saúde na instância correspondente, inclusive
nos aspectos econômicos e financeiros.
Mas o que se pode entender por Controle Social? De acordo com a sistematização
do entendimento de diversos autores4-9, Controle Social pode ser entendido como a articulação, a
mobilização e a interferência da Sociedade Civil sobre o planejamento, a implementação, a
avaliação e o controle das ações do Estado. Esse controle somente é exercido por meio da
participação popular, entendida por Misoczky10 como processo de envolvimento dos cidadãos
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com o intuito de redistribuir poder na sociedade, na perspectiva de se atingir maior equidade e
justiça social.
A participação popular e o Controle Social, portanto, muito mais do que a
finalidade de vigiar, controlar e até mesmo punir, como é entendido por alguns, têm o propósito
do exercício da democracia, da cidadania e da realização do homem como construtor de sua
sociabilidade. O ser humano é um ser participativo e a prática da participação facilita o
crescimento da consciência crítica, fortalece o poder de mobilização e interação para o
entendimento e condução de sua vida social.
A concepção de gestão do SUS é essencialmente participativa e democrática.
Nenhum gestor é senhor absoluto da decisão; ele deve ouvir a população e submeter suas
intenções e ações à análise da sociedade para que, com base em uma avaliação coletiva, o
conselho de saúde possa decidir qual a melhor política a ser implementada. O planejamento e as
ações de saúde devem ser construídos coletivamente, levando-se em consideração as ponderações
do poder executivo, as necessidades dos usuários e as experiências dos profissionais de saúde e dos
prestadores.
A existência de leis e a simples implantação dos conselhos de saúde, no entanto,
não garantem uma gestão democrática e participativa no SUS11. Alguns fatores, por sua presença
ou ausência, em maior ou menor intensidade, podem ser decisivos para o pleno funcionamento
dos conselhos de saúde. Segundo Cortes7, dentre os fatores determinantes do processo participativo
destacam-se: a organização da população local; e a disposição das autoridades em respeitar e
incentivar as decisões coletivas.
O pleno exercício do Controle Social e a democratização do poder, por meio dos
conselhos de saúde, serão sempre facilitados na presença de um território comprometido com a
ampliação dos canais de participação, em reforço ao processo de descentralização das ações de
saúde. Todavia, sendo intenção do gestor desenvolver práticas de centralização, autoritarismo e
descompromisso social, quanto menor o município mais fácil de tornar-se despótico12.
Clientelismo e paternalismo ainda são características marcantes nas relações entre
governo e grupos de interesse no Brasil, especialmente nas cidades pequenas e nas áreas rurais
menos industrializadas do país. Embora a existência dos conselhos de saúde possa colaborar para a
consolidação de formas mais democráticas na representação de interesses, eles têm seu
funcionamento limitado e condicionado pela realidade concreta das instâncias e da cultura
política dos municípios brasileiros7.
O poder local não é intrinsecamente o mais democrático e pode ser autoritário
como qualquer outro. Inclusive é nele que mais proximamente se dão as relações de
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apadrinhamento, de personalismo, de fisiologia política. Evidentemente, quando não assegurados
o respeito à participação livre do cidadão e à impessoalidade, o gestor de municípios pequenos
pode tornar-se poderoso e opressor com o munícipe, pois o conhece pelo nome, família, religião,
ideologia e partido político11.
Desta forma, a realização de estudos que abordem as questões referentes a real
situação da participação popular e do funcionamento dos Conselhos Municipais de Saúde em
municípios de pequeno porte emerge como necessidade premente para uma reflexão mais
cuidadosa acerca do exercício do Controle Social. Essa necessidade torna-se ainda mais evidente ao
se constatar, na Bahia e no Brasil, a grande quantidade de municípios com população até 10.000
habitantes. Na Bahia, dos 417 municípios do estado, 76 encontram-se nessa faixa populacional,
perfazendo um total de 18% dos municípios baianos. No Brasil, dos 5.507 municípios, quase
metade 2.727 (49,5%) possui população de até 10.000 habitantes13.
O presente artigo tem por objetivo analisar o exercício do Controle Social no
município de Lafayete Coutinho (BA), averiguando a efetividade do Conselho Municipal de Saúde
(CMS) enquanto espaço da construção coletiva das políticas de saúde municipais, e se as ações da
Secretaria Municipal de Saúde (SMS) estão pautadas nas deliberações do Conselho. Por fim, são
apontados alguns aspectos identificados como impeditivos para o pleno exercício do Controle
Social no município. Tais reflexões visam contribuir com a efetivação do Controle Social e a
consolidação do sistema de saúde brasileiro, na perspectiva de construção de um SUS resolutivo,
democrático, humanizado e participativo.
MA
TERIAL E MÉTODOS
MATERIAL
Considerando que os CMS são espaços de conflito, caracteristicamente
heterogêneos, com atores pertencentes a classes sociais diversas, representando, muitas vezes,
interesses contrários e correlação de forças também desigual, optou-se pelo método dialético, por
ser capaz de desvelar os fenômenos sociais como resultado da convivência de contrários e
contradições que se harmonizam14.
Trata-se de um estudo exploratório de natureza qualitativa, para o qual foi escolhido
como campo da pesquisa o CMS de Lafayete Coutinho (BA). Os dados e informações foram
obtidos por meio de Análise Documental e de Entrevistas semi-estruturadas, tendo a fase de campo
ocorrida entre fevereiro e abril de 2005. Os documentos analisados foram: decretos, leis e portarias
municipais; relatórios anuais de gestão da SMS; planos municipais de saúde; e relatórios das
Conferências Municipais de Saúde. Além desses documentos, foram analisadas as atas do conselho
do período de 1997, ano de sua criação, até 2004, período em que se finda esta pesquisa.
Perfazendo um total de oito anos de atas analisadas.
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Foram entrevistados oito conselheiros de saúde, sendo cinco usuários e três
prestadores. O processo de seleção dos entrevistados fundamentou-se no protagonismo dos atores,
que foram identificados e selecionados, de acordo ao conteúdo das atas, por seu desempenho nas
atividades do conselho.
Para a realização das entrevistas, foi estabelecido contato prévio com os sujeitos,
quando foram esclarecidas as finalidades, os procedimentos para sua realização e agendada a data
de sua efetivação. As entrevistas foram gravadas em aparelho cassete de áudio, transcritas pelo
próprio entrevistador e, posteriormente, submetidas ao processo de análise.
Para a análise das entrevistas, optou-se pela técnica de Análise do Discurso, por ser
capaz de tratar o discurso como elemento de mediação necessária entre o homem e sua realidade e
como forma de engajá-lo na própria realidade, que é lugar de conflito e de confronto ideológico. A
utilização dessa técnica subentende que o homem não pode ser estudado fora da sociedade, uma
vez que os processos que o constituem são histórico-sociais15. Assim, essa técnica que dispõe dos
recursos necessários para captar, de forma profunda, a subjetividade dos significados dos discursos,
possibilitou desvelar, nos discursos dos sujeitos, o lugar da estrutura social de onde falam, a
representação do sentido coletivo da classe a que pertencem e o processo de determinação
histórica das posições ocupadas.
O projeto da pesquisa que deu origem a esse artigo foi submetido ao crivo do
Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Estadual do Ceará (UECE), sendo concedido
parecer favorável a sua realização. Foram respeitadas as exigências éticas estabelecidas pela
Resolução 196/9616 do Conselho Nacional de Saúde, sendo esclarecidos aos entrevistados o
objetivo da pesquisa, a garantia do anonimato e o direito de desistir de participar da mesma. Antes
da realização da entrevista, foram procedidas leitura e assinatura do Terno de Consentimento Livre
e Esclarecido, ficando uma cópia com o entrevistador e uma com o entrevistado.
RESUL
TADOS E DISCUSSÃO
RESULT
Localizado na Região Sudoeste da Bahia, o município de Lafayete Coutinho foi
criado no ano de 1962, por desmembramento do município de Maracás. Possui uma população de
4.102 mil habitantes13 . O município integra a região do semi-árido nordestino, apresentando
opções restritas de economia e renda. Sua agricultura caracteriza-se por ser de natureza familiar e
de subsistência e a prefeitura constitui-se como principal pólo empregador.
Os principais indicadores econômicos e sociais demonstram a condição adversa a
que está submetida sua população. A taxa de analfabetismo do município é de 37,5%, a
mortalidade infantil alcança 49,2% e a proporção de pobres chega a 70,50%17.
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O CMS de Lafayete Coutinho foi criado em junho de 199718 como exigência para o
processo habilitação do município na gestão plena da atenção básica. Já em sua formação inicial,
o Conselho apresenta uma série de irregularidades, indo de encontro ao preconizado pela Lei
8142/90 e pela Resolução 33/92d do Conselho Nacional de Saúde. Dentre essas irregularidades
iniciais, destaca-se o fato do conselho ser composto apenas por representantes dos prestadores e
dos usuários, com a exclusão dos profissionais de saúde; e pelo fato do prefeito municipal ter sido
empossado como conselheiro municipal de saúde. Esta última condição evidencia uma atitude de
desrespeito, inibição e enfraquecimento do espaço de exercício do Controle Social, ocupando o
prefeito, indevidamente, um espaço de debate e de construção coletiva, em que sua simples
presença pode ser capaz de inibir a manifestação de alguns conselheiros e impedir
posicionamentos mais críticos sobre a saúde do município.
Deve-se destacar que as irregularidades quanto à composição do CMS e posse dos
conselheiros não são características exclusivas de sua formação inicial. No decorrer de sua história,
o CMS de Lafayete Coutinho sofreu diversas alterações, com frequentes quebras da paridade e
exclusão de segmentos que deveriam compor o conselho.
No que se refere à freqüência das reuniões, observa-se uma grande irregularidade
(Quadro
1). Das 96 reuniões que deveriam ocorrer no período em estudo, 1997-2004, foram
Quadro 1
realizadas 37, correspondendo a apenas 38,5% do total previsto.
Fonte- Lafayete Coutinho/Livro de Ata do CMS. 1997-200419.
Quadro 1. Reuniões realizadas pelo CMS de Lafayete Coutinho. 1997-2004.
Independente de uma avaliação qualitativa em relação às discussões do conselho e
ao desempenho de suas atribuições, uma frequência tão reduzida de reuniões comprova um
d
Resolução vigente quando da criação do CMS de Lafayete Coutinho.
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funcionamento precário e pode sugerir um inadequado exercício do Controle Social no município.
As demandas em saúde e o debate sobre as políticas públicas não teriam espaço suficiente para
serem definidas em tão poucas reuniões.
De acordo com as análises do livro de atas19 e os discursos dos conselheiros, a
escassez de reuniões ocorria em virtude da não convocação regular por parte da presidência do
conselho, a convocação em período de tempo demasiadamente curto e o desinteresse de alguns
conselheiros. Em algumas ocasiões, o conselho deixou de se reunir por falta de quorum e em
muitas ocasiões reuniu-se com quorum mínimo. No que se refere ao processo de convocação das
reuniões, os discursos evidenciam a forma irregular de convocação e a consequente dificuldade de
comparecimento dos conselheiros às reuniões.
“Às vezes, as reuniões eram de última hora, que eu acho que uma reunião onde tem
entidade da zona rural participando, no mínimo, no mínimo, o ofício tem que chegar
lá dois dias antes, no mínimo.” (Entrevistado 4).
“Muito curto o tempo da convocação [...] Inclusive eu mesmo já falhei por contra
disso, de última hora, às vezes até em prestação de conta, eu tava indo almoçar. Ah!
Vai ser agora duas horas. Eu não tenho condição. Eu sempre reclamei disso, mas
nunca mudou, né?” (Entrevistado 6).
A desmotivação dos conselheiros é considerada uma causa básica para debilidade do
processo participativo 20. Em Lafayete Coutinho, dentre os motivos desencadeadores da
desmotivação em participar, os discursos apontam a própria irregularidade no processo de
convocação e realização das reuniões.
Quanto ao desempenho do CMS, foi realizado um levantamento de suas principais
deliberações, que foram agrupadas em três categorias: estado de saúde da população e as políticas
públicas de saúde; organização e funcionamento dos serviços de saúde; e, por fim, gestão
financeira e prestação de contas dos recursos da saúde do município.
Os assuntos referentes ao estado de saúde e às políticas públicas estiveram, em
regular freqüência, na pauta de discussão do conselho e as condições de vida e saúde da população
lafayetense foram objeto de seguidos debates no conselho. O CMS, por vezes, deliberou por ações,
condições de gestão e programas que apontavam em direção à reversão das condições de saúde da
população.
Todavia, deve ser destacado que a maioria das deliberações referentes às políticas de
saúde e à mudança do modelo de gestão foram por iniciativa da SMS, da Secretaria de Saúde do
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Estado da Bahia (SESAB) ou do Ministério da Saúde. Essas proposições, muitas vezes, eram
impostas ao conselho como única e melhor alternativa para a saúde do município, conforme
desvela o discurso a seguir:
“Às vezes, às vezes a diretoria do próprio conselho já chegava com o pacote feito,
chegava com o pacote feito, né?! E a gente tinha só que cumprir. Quer dizer, a gente
não podia escolher.” (Entrevistado 4).
Tal situação demonstra uma fragilidade técnica e política dos conselheiros
municipais, que, referente a essa questão, atuavam muito mais como homologadores das
proposições do gestor, abstendo-se de seus papéis de propositores e formuladores das políticas
locais de saúde.
Ainda que a maioria das ações fossem propostas pela SMS, o Conselho de Saúde
encontrava dificuldade no cumprimento das deliberações. A análise dos Relatórios de Gestão da
SMS21-22 em confronto com as deliberações do conselho comprova o cumprimento parcial ou o não
cumprimento de boa parte das deliberações do conselho. Tal condição desvela a fragilidade no
exercício do Controle Social no município e uma afronta às legislações nacional e municipal, que
atribuem ao conselho caráter deliberativo, devendo o chefe do poder executivo implementar as
deliberações da plenária do conselho.
As categorias organização e funcionamento dos serviços de saúde foram as que mais
se fizeram presentes na pauta do CMS de Lafayete Coutinho. No entanto, a maioria destes assuntos
ficou apenas no nível da discussão, ou apenas da comunicação pela SMS da implantação ou
mudança do funcionamento dos serviços de saúde. As deliberações todo conselho para a melhoria
ou ampliação dos serviços de saúde do município foram escassas. Tal situação reflete uma atitude
de impotência do conselho frente aos problemas de saúde que afetam a população lafayetense,
que, no entanto, eram constantemente debatidos no conselho.
Na análise das categorias prestação de contas e gestão financeira, pôde-se comprovar
que a SMS não era a responsável pela gestão dos recursos financeiros da saúde, visto que, em
muitos momentos, a prestação de contas, bem como o Relatório de Gestão foram apresentados
pelo secretário municipal de administração e não pelo secretário municipal de saúde.
No que se refere à atuação do conselho frente à gestão financeira da saúde do
município, pôde-se concluir que o CMS de Lafayete Coutinho não exercia, de forma efetiva, uma
atitude fiscalizadora e de acompanhamento e controle dos recursos destinados à saúde municipal.
Tal afirmação fundamenta-se no fato do conselho não exigir da SMS uma prestação de contas
regular. Ainda que o conselho tenha deliberado que as prestações de contas deveriam ocorrer
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trimestralmente, raramente ocorreram nesse espaço de tempo, sendo, na maioria das vezes
realizadas semestral ou anualmente. E como agravante dessa situação, os exercícios financeiros de
muitos períodos não foram em nenhum momento apresentados, apreciados ou aprovados pelo
conselho.
A forma como se dava o processo de prestação de contas também comprova a
inefetividade do conselho no acompanhamento da gestão financeira. As apresentações dos
balancetes aconteciam de forma superficial e sucinta, sem a possibilidade de uma análise
aprofundada por parte dos conselheiros.
“Eles traziam na hora da aprovação, não era debatido com o tempo adequado. Tal dia
prestação de contas, e aí chegava na hora, passava a pasta pra gente ler, tudo, tava
tudo certinho, entendeu? Gastou tanto com isso, tanto com aquilo. Mas a gente não
sabia como era na realidade.” (Entrevistado 6).
Além da forma como se dava o processo de prestação de contas, um outro ponto a
ser destacado, sobre a ineficácia do conselho no acompanhamento da gestão financeira do
município, foi a aprovação de alguns exercícios financeiros, mesmo diante de denúncias e
comprovações de irregularidades.
Mediante esse cenário, três questões principais foram apontadas pelos conselheiros
como contribuintes para dificultar o exercício do Controle Social em Lafayete Coutinho: a
rivalidade política local; a capacitação inadequada; e a questão dos policonselheirose.
A rivalidade dos grupos político-eleitorais interfere direta e substancialmente no
desempenho do conselho. Todos os conselheiros entrevistados foram unânimes em afirmar a
prejudicial interferência das disputas locais no desenrolar das atividades do conselho.
“Geralmente, a questão política, né?! Por que eu votei no ‘candidato A’, mas quem
ganhou foi ‘candidato B’, então não tenho interesse de participar.” (Entrevistado 1).
“Infelizmente, acontecem questões políticas. Porque se foi contra o prefeito, eles não
participam, porque vão dizer, ah! Eu vou beneficiar o prefeito, eu não gosto dele. Mas
esquece que não tão beneficiando o prefeito, tão beneficiando o município, então, tem
que saber distinguir uma coisa da outra. Muitas pessoas deixam de participar por pura
e
Neologismo utilizado para se referir aos cidadãos que participavam de vários conselhos.
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política [...] As pessoas, mais que a preocupação com a saúde do município, estão
preocupadas com a rixa política.” (Entrevistado 2).
“[...] mas também tinha da parte dos conselheiros alguns que misturavam a questão
política, a política partidária. Aí muitos não participavam justamente por isso, ah! Eu
sou da oposição, o prefeito, o secretário que chamou, eu não vou lá, né?”
(Entrevistado 4).
Essa situação demonstra a existência de uma cultura política primitiva e coronelista,
que ainda se faz presente em áreas rurais e cidades pequenas7 , obstacularizando o processo de
democratização da sociedade. Atkinson, Fernandes, Caprara e Gideon 23 apontam a dificuldade nas
relações de poder e a cultura de dominação e apropriação do espaço público, desenvolvidas em
áreas rurais do nordeste do Brasil. Práticas como essas tornam evidente a necessidade de se
repensar o exercício no Controle Social no Brasil, na perspectiva de se desenvolver práticas sociais
de amadurecimento político e elevação da consciência cidadã, com vistas a que os fóruns de
participação social possam ser utilizados como verdadeiros instrumentos na construção de uma
sociedade democrática.
A debilidade da capacitação dos conselheiros de saúde também se constitui em
obstáculo para o pleno exercício do Controle Social em Lafayete Coutinho. Durante os oito anos
de existência do conselho de saúde, apenas um único curso de capacitação, no período de sua
fundação, foi realizado no município. Após esse período, o conselho, por duas vezes, renovou seu
quadro de conselheiros, sem que esses tivessem acesso a qualquer tipo capacitação ou
treinamento.
Vázquez, Siqueira, Kruze, Da Silva e Leite24, estudando os processos de participação
em saúde na América Latina, apontam que o acesso à informação e à capacitação continuada dos
participantes é elemento chave para o bom desempenho das instâncias participativas. Atividades
de educação e atualização de conselheiros devem acontecer de maneira periódica e continuada,
com vistas a proporcionar aos conselheiros uma adequada consciência de seu papel e uma
competente qualificação para exercê-lo.
Uma outra questão apontada por alguns conselheiros como capaz de influenciar no
funcionamento do conselho é a existência dos policonselheiros. O modelo de gestão adotado no
país, após a Constituição de 19881, com forte ênfase na descentralização e na democratização,
preconiza a criação de conselhos, em vários setores, nos três níveis de governo, tais como: saúde,
educação e bem-estar social. No entanto, o processo de formação dos conselhos parece ter
desencadeado uma particularidade inerente aos municípios de pequeno porte: conselhos de vários
segmentos são compostos, basicamente, pelos mesmos cidadãos.
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Em virtude de sua pequena população, nos municípios de pequeno porte, poucos
são os cidadão com maior escolaridade, maior capacidade de retórica ou maior consciência do
próprio protagonismo político, que assumem o desafio de participar. Dessa forma, alguns cidadãos
acabam fazendo parte de muitos conselhos, conforme destacam os discursos a seguir.
“[...] poderia ser feito assim a convocação de pessoas que tivesse mais disponibilidade
de participar das reuniões, que às vezes o conselheiro de saúde é conselheiro do bemestar social, é conselheiro da merenda... aí sempre tá tendo reuniões [...] Têm pessoas
que acumulam muitas funções, alguns reclamavam. Ah! Tenho reunião, sair de uma
reunião agora do conselho da merenda, sair de uma reunião do conselho do bemestar, e já vai ter reunião do conselho de saúde.” (Entrevistado 1).
“[...] Porque as mesmas pessoas que participam do conselho de saúde, participam do
Faz-Cidadão, participam do Fórum dos Usuários da Água, participam de uma série de
coisa [...] Então o que nos deixa de uma certa forma triste no caminhar de tudo isso, é
que infelizmente acabava nas mãos das mesmas pessoas [...] Porque são os únicos
que querem compromisso, que querem ver a coisa fluir, querem ver melhor.”
(Entrevistado 4).
Essa situação, de poucos cidadãos participando de muitos conselhos do município,
coloca duas questões que precisam ser debatidas e enfrentadas pela sociedade: Quais os motivos
que levam ao desinteresse de grandes parcelas da população sobre a questão da participação?
Quais as estratégias necessárias e adequadas para despertar maior interesse da população pela
participação? Essas são questões essenciais que precisam ser encaradas e cuja solução precisa ser
buscada, a fim de se avançar no processo de democratização da sociedade e envolvimento dos
cidadãos nos assuntos referentes a sua saúde e à saúde da coletividade.
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Federal; 1988.
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1990. Brasília; 1990.
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São Paulo: Ática; 1993.
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Recebido em 15.02.2006. Aprovado em 03.07.2006.
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ARTIGO ORIGINAL
Revista Baiana
de Saúde Pública
CUSTOS DE CONSUL
TAS MÉDICAS EM PESSOAS COM DIABETES MELLITUS
CONSULT
DURANTE UM PROGRAMA EDUCA
TIVOa
EDUCATIVO
Carla Regina de Souza Teixeira b
Maria Lúcia Zanetti c
Resumo
Este estudo objetiva comparar e analisar o número e os custos de consultas médicas,
consultas médicas de urgência e procedimentos médicos, um ano antes e um ano depois da
implementação de um Serviço de Medicina Preventiva (SEMPRE) durante a participação de um
programa educativo em diabetes mellitus. Na coleta de dados, do sistema informatizado SEMPREqualidade de vida, foram obtidos os dados sócio-demográficos; do sistema Serious-Unimed
Ribeirão Preto, extraiu-se as variáveis relacionadas aos custos da assistência médica. Para a análise
estatística, utilizou-se o teste t-student. Dos 42 sujeitos investigados, 36 possuem o diabetes tipo
2; e 6 o tipo 1. Em relação aos gastos em urgência, houve redução de 74,91% com as pessoas com
diabetes mellitus tipo 1 e 40,4% no tipo 2. No tocante aos gastos com procedimentos médicos em
geral, houve redução de 11,1% no tipo 2 e 3,8% no tipo 1, comparando-se um ano antes e um
ano depois da participação no SEMPRE. Quanto às consultas médicas, não houve diferença durante
a participação do programa educativo no SEMPRE, mantendo-se a média de uma consulta por mês,
por pessoa. Contudo reforça-se a necessidade dos sistemas de informação constituírem-se em prérequisito para um serviço de atenção à saúde coordenado, integrado e orientado por evidências
científicas.
Palavras-chave: Diabetes melittus. Gastos em saúde. Enfermagem.
a
b
c
Extraído da tese A atenção em diabetes mellitus no serviço de medicina preventiva-SEMPRE: um estudo de caso apresentada
à Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, para obtenção do título de Doutor em Enfermagem,
em 03 de dezembro de 2003.
Professor Doutor junto ao Departamento de Enfermagem Geral e Especializada da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto
da Universidade de São Paulo.
Professor Associado junto ao Departamento de Enfermagem Geral e Especializada da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto
da Universidade de São Paulo.
Endereço para correspondência
correspondência: Av. Bandeirantes, 3900, Ribeirão Preto, São Paulo. Cep: 14.040-902. E-mail:[email protected]
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COSTS OF MEDICAL APPOINTMENTS DURING PARTICIPATION IN A DIABETES
MELLITUS EDUCATION PROGRAM
Abstract
This study aimed to compare and evaluate the number and costs of medical
appointments, urgent medical appointments and medical procedures one year before and one year
the implementation of a Preventive Medicine Service (SEMPRE), during participation in a diabetes
mellitus education program. Sociodemographic data were obtained from the information system
SEMPRE-quality of life, while variables related to the direct costs of medical care were taken from
Serious-Unimed RP. Student’s t-test was used for statistical analysis. Study subjects were 42
persons, 36 of whom were type 2 diabetes patients and 6 type 1. We found a 74.9% decrease in
expenditures on urgent medical procedures for type 1 patients and 40.4% for type 2 between the
two moments of study. Expenditures on medical procedures in general decreased by 11.1% for
type 2 patients and 3.8% for type 1. What the number of medical appointments is concerned, the
average of one appointment per month per patient was found for both patient categories before and
after their participation in the education program. We highlight the need for information systems
as a prerequisite for a coordinated and integrated diabetes mellitus health care service that is
guided by scientific evidence.
Keywords: Diabetes mellitus. Health costs. Nursing.
INTRODUÇÃO
A Organização Mundial de Saúde (OMS) aponta, no Relatório Mundial sobre
doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs) e saúde mental, que as condições crônicas
constituem problemas de saúde que persistem e requerem gerenciamento contínuo e permanente1.
A rápida ascensão das DCNTs representa um grande desafio para o setor saúde no
tocante ao desenvolvimento global. Pesquisadores, formuladores de políticas e defensores da saúde
pública nas Américas reconhecem, cada vez mais, a necessidade de apoiar a luta contra as
DCNTs. Nesse sentido, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) identificou objetivos
programáticos e políticas que buscam efetivar a prevenção e controle das DCNTs nas Américas2.
As DCNTs de maior importância para a saúde pública na América Latina e Caribe
são as doenças cardiovasculares, câncer e diabetes mellitus. Dentre essas, o diabetes mellitus (DM)
é considerado um fardo econômico, social e pessoal para as instituições e famílias. Na década de
1990, o DM afetou a saúde de 110 milhões de indivíduos, mas esse número poderá dobrar para
221 milhões até 20103.
Há, na literatura, estudos que demonstram a redução e prevenção das complicações
crônicas do DM, reforçando a importância da educação em diabetes como o caminho para o
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alcance desses objetivos3. Essa estratégia educacional tem um impacto impressionante sobre o
comportamento das pessoas com DM, sua evolução de saúde, assim como nos custos de
atendimento à saúde em diabetes. Estudos mostraram que as mudanças no estilo de vida, por meio
da educação continuada das pessoas com diabetes mellitus, resultam em redução de peso, melhor
controle glicêmico, da pressão arterial e lipídeos e, conseqüentemente, reduzem os riscos
cardiovasculares3.
No sistema de saúde americano, usa-se o termo atenção gerenciada para descrever
uma variedade de mecanismos pelos quais as operadoras de planos de saúde buscam conter os
custos e/ou racionalizar a utilização de serviços e insumos incorporados em cada tratamento. Tais
planos e produtos fazem parte de um sistema que integra financiamento e prestação de assistência
à saúde, bem como as organizações que oferecem tal cobertura – health maintenance
organizations/HMOs, preferred provider organizations/PPOs – e planos denominados point-ofservice/POS – ponto de serviço –, consideradas formas mais atualizadas de prestação de serviços a
oferecerem maior poder de escolha aos beneficiários3.
Nesse sentido, os planos de saúde buscam conter os custos e oferecer o maior
número de benefícios para diferenciar-se no mercado. Os problemas de saúde, em sua grande
maioria, não necessitam de grandes recursos técnicos no estabelecimento de diagnóstico e podem
ser resolvidos por medidas e condutas clínicas e terapêuticas simples, realizadas pelo médico e
pela equipe de saúde capacitada4.
A complexidade do DM, seu caráter crônico e suas complicações crônicas e agudas
exigem freqüentes períodos de atenção, supervisão médica e acompanhamento pela equipe de
saúde. Para atender a estes aspectos, surgem os serviços de medicina preventiva nos planos de
saúde, oferecendo o apoio contínuo da equipe multiprofissional para complementar o
atendimento do médico, principalmente, nas doenças crônico-degenerativas.
Nessa perspectiva, a medicina preventiva constitui-se um espaço de mudanças nas
práticas de saúde e contribui para a organização dos sistemas de saúde público e privado, sendo
fundamental para o atendimento eficaz em DM. Por outro lado, cabe ressaltar a preocupação das
cooperativas médicas com a redução dos riscos de complicações importantes e,
conseqüentemente, dos custos da assistência médica.
Desta maneira, constitui-se em objeto da presente investigação comparar e analisar o
número e os custos de consultas médicas, de consultas médicas de urgência e procedimentos
médicos, um ano antes e um ano depois de participação no Serviço de Medicina Preventiva em
diabetes mellitus.
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MA
TERIAL E MÉTODOS
MATERIAL
Trata-se de um estudo descritivo e observacional, no qual dois pontos foram
analisados: um ano antes e um ano depois de participação no Serviço de Medicina Preventiva em
diabetes mellitus. O trabalho no SEMPRE é multiprofissional, realizado por meio de encontros
grupais. Atende pessoas com doenças crônicas. Para o estudo foram eleitas pessoas adultas e
crianças com diabetes mellitus. Das 86 pessoas com DM, cadastradas na implementação do
SEMPRE, no período de junho a novembro de 2001, 44 foram excluídas por descontinuidade no
atendimento. Deste modo, a população do estudo foi constituída por 42 pessoas com DM tipos 1
e 2 que participaram do programa educativo em DM por um ano. A coleta de dados foi realizada
no período de novembro de 2002 a abril de 2003. Nessa etapa, utilizou-se o sistema
informatizado denominado SEMPRE-Qualidade de vida. O acesso foi realizado por meio do nome
do usuário do SEMPRE, sendo extraídas as informações sobre as variáveis sociodemográficas (data
de cadastro, sexo, idade, estado civil e escolaridade). Os dados mais expressivos indicaram que
69,1% dos sujeitos do estudo são do sexo feminino, 47,6% possuíam o primeiro grau incompleto,
54,7% são casados e 35,7% estão na faixa etária de 70 a 79 anos de idade.
No segundo sistema, denominado Serious-Unimed-RP, o acesso foi realizado por
meio do código do usuário na cooperativa, registrado na ficha cadastral de cada usuário. Nesse
sistema, foram obtidas as informações sobre as variáveis relacionadas aos custos diretos da
assistência médica (número e valor em reais de consultas médicas, procedimentos médicos,
número e valor em reais de consultas de urgências). Buscou-se as informações referentes a um ano
antes e um ano depois da participação do programa educativo no SEMPRE. Para a criação do banco
de dados, as informações obtidas nos arquivos dos sistemas informatizados Serious e Qualidade de
Vida foram registradas nas planilhas previamente elaboradas e digitadas no Microsoft Excel-1997.
Para a análise estatística, utilizaram-se os testes para dados pareados (o teste t-
student para diferença entre médias), uma vez que as variáveis foram observadas em tempos
diferentes com os mesmos indivíduos. O estudo foi realizado após aprovação do projeto de
pesquisa pelo Comitê de Ética e Pesquisa do local de estudo, em março de 2002, atendendo à
Resolução nº 196/96 do Conselho Nacional de Saúde.
RESULTADOS
Dos 42 (100%) sujeitos investigados, 36 (85,7%) possuíam o diabetes tipo 2 e 6
(14,3%), o tipo 1. O valor pago pela cooperativa foi de R$ 46.723,00 em um ano antes da
participação no SEMPRE, variando de R$ 2.394,30 a R$ 8.610,83 por mês e média de R$ 108,11
por pessoa/mês. Durante o primeiro ano no SEMPRE, o valor total foi de R$ 41.510,16, variando
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de R$ 1.926,14 a R$ 6.007,96 por mês e média de R$ 96,08/mês, com redução de 11,1% durante
o programa educativo no SEMPRE.
Em relação ao número de consultas médicas realizadas, as pessoas com DM tipo 2
totalizaram 445 consultas em um ano antes do SEMPRE, sendo a média de 37 consultas por mês e
1 consulta por pessoa mensal. Durante o ano no SEMPRE, foram realizadas 412 consultas, sendo a
Gráfico 1
média de 34 consultas por mês e 0,95 consulta por pessoa no mês (Gráfico
1).
Fonte: Programa Serious-Unimed de Ribeirão Preto, 2002
Gráfico 1. Distribuição numérica das consultas médicas realizadas pela população estudada
segundo o tipo de diabetes e o tempo de participação no SEMPRE, Ribeirão Preto,
2002.
Quanto aos gastos em urgência, as pessoas com DM tipo 2 totalizaram, em um ano
antes do SEMPRE, R$ 2.149,60 e durante o ano no SEMPRE, R$ 1.279,28, com redução de 40,4%
(T
1). Em relação às consultas médicas de urgência, as pessoas com DM tipo 2 realizaram, em
Tabela 1
um ano antes do SEMPRE, 44 consultas e durante o ano no SEMPRE, 23 consultas, com redução de
Gráfico 2
21 consultas, representando 47,7% (Gráfico
2).
Realizados os testes estatísticos, considerando o total do ano anterior e o total do
ano posterior para cada pessoa com Diabetes tipo 2, verifica-se que, para a variável gasto em
urgência, consultas de urgência, gasto em procedimentos médicos e consultas médicas a hipótese
de igualdade não é rejeitada, ou seja, não existe diferença significativa a um nível de significância
de 5% entre as médias observadas, ou seja, estatisticamente não existe diferença entre as médias
dos anos antes e após o SEMPRE.
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Tabela 1. Custos em urgência e procedimentos médicos em reais das pessoas diabéticas
tipos 1 e 2, em um ano antes e um ano durante a participação no SEMPRE,
Ribeirão Preto, SP, 2002.
Fonte: Programa Serious-Unimed de Ribeirão Preto, 2002
Fonte: Programa Serious-Unimed de Ribeirão Preto, 2002.
Gráfico 2. Distribuição numérica das consultas médicas de urgência realizadas pela população
estudada segundo o tipo de diabetes e o tempo de participação no SEMPRE,
Ribeirão Preto, 2002.
Em relação às pessoas com DM tipo 1, estas gastaram, em urgências, R$ 1.457,03
em um ano antes do SEMPRE e R$ 365,52 durante o primeiro ano no SEMPRE, variando de
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R$ 58,72 a R$ 651,52 antes do SEMPRE e de R$ 40,80 a R$ 539,58, por mês, durante o SEMPRE,
Tabela 1).
1 Quanto ao valor gasto no diabetes tipo 1
apresentando a redução de 74,91% nos gastos (T
em procedimentos médicos, o valor foi de R$ 3.254,47 um ano antes do SEMPRE e R$ 3.128,74
depois do SEMPRE, com redução de 3,8% (T
1). As pessoas com DM tipo 1 realizaram 9
Tabela 1
consultas médicas/mês antes, sendo a média de 1,5 consulta/pessoa/mês e 7 por mês em um ano
Gráfico 1
no SEMPRE, sendo a média de 1,1 consulta/pessoa/mês (Gráfico
1).
Realizados os testes estatísticos, considerando o total do ano anterior e o total do
ano posterior para cada diabético tipo 1, verifica-se que, para a variável gasto em urgência,
consultas de urgência e consultas médicas, a hipótese de igualdade não é rejeitada, ou seja, não
existe diferença significativa a um nível de significância de 5%. Já para a variável gasto com
procedimentos médicos, a hipótese de igualdade é rejeitada, ou seja, existe diferença significativa
entre as duas médias, antes e após o SEMPRE.
DISCUSSÃO
Verificou-se a ocorrência de apenas uma mudança significativa com a inclusão do
SEMPRE, observada para a variável gasto com procedimentos médicos. No entanto a não rejeição
da hipótese de igualdade para os outros casos foi determinada pelos valores altos do desvio
padrão, ou seja, devido à grande variabilidade existente entre os indivíduos.
As pessoas com doença crônica, que possuem planos de saúde, realizaram maior
número de consultas médicas em 12 meses em relação ao serviço público. A média de consultas
médicas foi de 5,6/mês para aqueles com plano de saúde e 4,7/mês para os demais. Embora a
aquisição de um plano de saúde tenha possibilitado maior utilização de consultas médicas, a
diferença foi apenas de uma consulta, mostrando que a cobertura oferecida pelo Sistema Único de
Saúde tem sido próxima àquela oferecida pela aquisição de um plano particular, empresarial5.
Em países desenvolvidos, a taxa de utilização de consultas médicas é mais elevada.
No Japão, 92% dos indivíduos adultos utilizam, em média, 2 a 2,5 consultas médicas/mês6. Em
um inquérito de saúde norte-americano, observou-se, em 1995, a média de 5,8 consultas médicas
por mês, nos últimos 12 meses, para a população total. Esse valor aumenta com a idade, chegando
a 11,1/mês consultas para os indivíduos com 65 anos ou mais. A taxa de utilização é maior entre
as mulheres e entre os mais pobres (renda familiar abaixo de 15 mil dólares anuais) e sem
diferenças entre brancos e negros5.
Em 1996, aproximadamente 14% das pessoas com diabetes relataram ter
freqüentado a sala de urgência7. Na Califórnia, entre os indivíduos adultos, maiores de 40 anos de
idade, em um estudo de intervenção, há o relato de 5,86 visitas ao médico ou a um serviço de
emergência nos últimos 6 meses8.
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A utilização de serviços de saúde pelas pessoas que apresentam problemas crônicos
de saúde é consideravelmente maior do que a observada entre a população em geral. Ao analisar
os gastos em saúde efetuados pelas organizações administradoras de saúde norte-americanas,
verifica-se que 84% dos recursos são direcionados para o tratamento e a recuperação e apenas 16%
para prevenção dos agravos à saúde9. As pessoas com doenças crônicas, embora correspondam a
20% dos clientes, consomem em torno de 80% dos recursos dos serviços de saúde.
As pessoas com diabetes mellitus perfazem 8% dos gastos totais com internações
hospitalares; as complicações crônicas de diabetes são os principais gastos com internação
hospitalar10. Em cada 1.000 pessoas com diabetes mellitus, 135 hospitalizam-se em comparação a
95 por 1.000 pessoas sem diabetes. As pessoas com diabetes mellitus são hospitalizadas quatro
dias a mais do que as pessoas sem diabetes mellitus, concluindo-se que a utilização do hospital
contribui com uma carga econômica desproporcional entre as pessoas11.
As pessoas que possuem planos de saúde apresentam maior facilidade de internação,
quando comparados aos que não o possuem5. Dessa maneira, ressalta-se que outros estudos devem
ser conduzidos, identificando-se atividades preventivas para diminuir as internações hospitalares.
Consideramos que a evolução, principalmente do DM tipo 2 para o tratamento insulínico, e as
complicações crônicas constituem-se em indicadores de avaliação em saúde e incrementam o
impacto sobre os custos diretos da assistência12.
A avaliação dos benefícios deve levar em consideração não apenas o impacto sobre
a doença e os custos de seu manejo, mas também a extensão na qual afeta todos os outros
aspectos de atenção à saúde dos usuários. Os encargos de saúde tornam-se excessivos quando as
condições crônicas são mal gerenciadas. O impacto dos problemas crônicos em saúde vai além
dos gastos normais relacionados ao tratamento médico1.
Nesse contexto, torna-se difícil implementar modelos de planejamento ou controle
de desempenho que abranjam todo o sistema cooperativista médico. Mesmo em relação a
procedimentos de controle de custo e inflação médica, observa-se grande variabilidade entre as
singulares da Unimed, tanto nos mecanismos implementados, como nos resultados obtidos, sem
que se realize qualquer tipo de monitoramento sistemático destas experiências13.
Uma dualidade permanente é identificada no interior do sistema cooperativo,
marcado pela competição entre os objetivos da organização, quando explicitados – diminuir o
grau de utilização dos serviços, para otimizar a relação receita/despesa –, e os objetivos dos
profissionais em aumentar seus ganhos com o aumento da produtividade. Tal situação permeia, de
maneira clara, os interesses e as demandas dos usuários13.
Acredita-se, contudo, que os conhecimentos sobre estratégias e práticas de
promoção da saúde e melhoria da qualidade de vida contribuirão na formação de novos sujeitos
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das práticas de saúde. Se, por um lado, há o investimento por parte de serviços de saúde em
prevenção de doenças e agravos à saúde, por outro há a necessidade de investir-se em esforços
coletivos pela socialização da promoção à saúde e na formação de novos sujeitos políticos
coletivos que se mobilizem pela transformação do novo pensar e fazer em saúde.
A experiência, como enfermeira, de participar do planejamento e implementação do
SEMPRE e a reflexão durante o processo de construção desta investigação permitem tecer algumas
reflexões sobre a atenção em diabetes mellitus nos serviços de saúde.
Acredita-se que essas informações poderiam constituir-se em fontes de evidências
importantes para o desenvolvimento de estudos futuros. Porém, reforça-se a necessidade dos
sistemas de informação tornarem-se pré-requisito para um serviço de atenção à saúde coordenado,
integrado e orientado por evidências científicas.
Este estudo, por traduzir uma dinâmica de trabalho multiprofissional em diabetes
mellitus, implementado na iniciativa privada, aponta uma proposta inovadora dentro das atuais
mudanças nos serviços de saúde no Brasil.
Na realização deste estudo, percebeu-se que, se os serviços de saúde apresentarem
uma estrutura adequada, há probabilidade de um processo eficaz e, conseqüentemente, melhores
resultados. Acredita-se que as características dentro de cada componente (estrutura-processoresultado) diferem de lugar para lugar e de época para época e são determinadas pelo ambiente
social, político, econômico e físico em que se insere o serviço de saúde.
Os projetos de reorganização das práticas de saúde necessitam de definição de
estratégias para a avaliação, sintonizadas com as modificações propostas em um novo modelo
assistencial, que ultrapassem o atendimento à demanda espontânea, centrada no cuidado médico
individual. O tratamento em condições crônicas requer um tipo diferente de serviço de saúde e
exige mudanças no estilo de vida e gerenciamento da saúde por período extenso.
Enfrentar esses desafios implica em decisão política de aceitar e incorporar, como
um problema a ser solucionado, a reorientação dos serviços de saúde para as condições crônicas.
Até mesmo porque, educar em diabetes mellitus, como doença crônica não-transmissível é um
processo que deve ser avaliado continuamente, encarando-se, inclusive, os resultados negativos de
um processo avaliativo.
Acredita-se que os serviços de saúde devem enfatizar o tratamento do usuário que
tem diabetes e não o diabetes em si. Os serviços de saúde deveriam redirecionar o enfoque do
tratamento para programas de prevenção e as necessidades das pessoas que apresentam condições
crônicas. A promoção da saúde, a prevenção e a assistência são elementos fundamentais para o
alcance de serviços efetivos.
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CONCLUSÕES
Pôde-se concluir que dos 42 (100%) sujeitos investigados, 36 (85,7%) possuíam o
diabetes tipo 2 e 6 (14,3%), o tipo 1. Quanto aos custos diretos da assistência médica, nos gastos
em urgência, houve redução de 74,91% nos casos de diabetes mellitus tipo 1 e 40,4% no tipo 2.
Já em relação aos gastos com procedimentos médicos em geral, houve redução de 11,1% no tipo 2
e 3,8% no tipo 1, comparando um ano antes e um ano depois da participação no SEMPRE.
Quanto às consultas médicas, não houve diferença durante a participação do
programa educativo no SEMPRE, mantendo-se a média de uma consulta por mês por pessoa, tanto
para o diabético tipo 1 como para o do tipo 2.
A análise estatística demonstrou que há diferença significativa entre a média antes e
depois da participação no SEMPRE na variável gasto com procedimentos médicos para os
diabéticos tipo 1. No entanto a não rejeição da hipótese de igualdade para as outras variáveis foi
determinada pelos valores altos do desvio padrão, ou seja, devido à grande variabilidade existente
entre os indivíduos.
Ressalta-se que estudos sobre medicina preventiva podem subsidiar o planejamento
de ações efetivas, bem como servir de base para avaliar o impacto de futuras intervenções.
REFERÊNCIAS
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crônicas: componentes estruturais de ação: relatório mundial. Brasília;
2003. 105 p.
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prevenção integrada de doenças não-transmissíveis nas Américas.
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atendimento multiprofissional. Tese (Livre docência). Ribeirão Preto, São
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São Paulo; 1994.
5. Almeida FA, et al. Prevalência de doenças crônicas auto-referidas e
utilização de serviços de saúde. Ciên. Saúde Colet. 2002;7(4):85-93.
6. Izumi Y, Ichiro T, Takayoshi O, Aya K, Yoshikazu N, Shigeru H. Impact
of smoking habit on medical care use and its costs: a prospective
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de Saúde Pública
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Massachusetts: Jones and Bartlett Publishers; 2002. 609p.
8. Lorig KR, Ritter P, Stewart AL, Sobel, DS, Brown BW, Bandura A, et al.
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health care utilization outcome. Med. Care 2001;39(11):1217-23.
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10. Gonzales M, Galindez A. Study of the hospitalisations cost of
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12. Lessa I. O adulto brasileiro e as doenças da modernidade –
Epidemiologia das doenças crônicas não-transmissíveis. São Paulo:
Hucitec; 1998. 284 p.
13. Duarte CMR. Unimed: história e características da cooperativa de trabalho
médico no Brasil. Cad. de Saúde Púb. 2001 jul./ago.;17(4):35-41.
Recebido em 02.03.2006. Aprovado em 04.07.2006.
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ARTIGO ORIGINAL
QUEIXAS VOCAIS EM LOCUTORES DE RÁDIO DA CIDADE DO SAL
VADOR-BAHIA
SALV
Carla Lima de Souza a
Célia Regina Thomé b
Resumo
O locutor de rádio atrai a atenção do público unicamente por sua voz. Sendo assim,
é indispensável a adoção de cuidados a fim de preservar seu instrumento de trabalho. O objetivo
deste estudo foi determinar a prevalência de sintomas vocais e fatores de risco associados nesses
profissionais da radiodifusão. A pesquisa foi desenvolvida com locutores de emissoras de rádio em
AM e em FM da Cidade do Salvador, segundo relação fornecida pelo Sindicato dos RadialistasBahia. Participaram da pesquisa 52 locutores, sendo 25 deles profissionais de emissoras com
modo de transmissão em AM e 27 de emissoras em FM. Os dados foram coletados por meio de
questionário fechado. A prevalência de sintomas vocais foi de 21%. Encontrou-se associação com
fatores relativos ao perfil do profissional e hábitos de saúde vocal. Pôde-se concluir que estes
profissionais necessitam de orientações quanto ao uso e cuidados com a voz.
Palavras-chave: Voz. Sintomas. Saúde ocupacional.
VOCAL COMPLAINTS BY CASTING PROFESSIONALS
Abstract
Casting professionals attract the attention of the audience exclusively through their
voices. Therefore, specific care is essential for preserving their main tool. The Study aimed at
determining the prevalence of vocal symptoms in these casting professionals, as well as
investigating possible risk factors. The research was developed in AM and FM radio stations in the
city of Salvador, based on a list provided by the Bahia Radio Worker’s Union. 52 speakers took
part in the research, being 27 from FM stations and 25 from AM. Data were collected through a
multiple-choice questionnaire. According to the results, the prevalence of vocal symptoms
a
b
Mestranda em Saúde Coletiva (ISC/ UFBA), Especialização em Audiologia - saúde do trabalhador (CEFAC), Docente da
Universidade Federal da Bahia.
Mestranda em Fonoaudiologia (PUC/ UNIME), Especialização em Voz (CEFAC), Docente da Universidade Federal da Bahia.
Endereço para Correspondência: Carla Lima de Souza. Instituto de Ciências da Saúde - Departamento de Fonoaudiologia, Av.
Reitor Miguel Calmon, s/n, 1º andar, Vale do Canela - Salvador, Bahia, Brasil. CEP 40110-100. Tel: (71) 245-8339 (71) 2458602 / (71) 9167-2297. E-mail: [email protected]
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corresponds to 21%. Association was found with factors related to the professional’s profile and
vocal health habits. It was possible to conclude that such professionals need to be oriented
regarding voice care.
Keywords: Voice. Symptoms. Occupational health.
INTRODUÇÃO
Entre os meios de comunicação de massa, o rádio é o mais popular e o de maior
alcance, no Brasil e no Mundo1. O locutor de rádio atrai a atenção do público unicamente por sua
voz. Sendo assim, é indispensável a adoção de cuidados, a fim de preservar seu instrumento de
trabalho.
Considerando-se a incidência de alterações vocais e o impacto em suas carreiras, os
profissionais da voz poderiam ser comparados aos atletas, os quais, pela demanda física, estão
mais sujeitos a lesões do que a população geral. Enquanto o atleta toma medidas corretivas ao
menor sinal de alteração, o profissional da voz assume uma atitude de risco, adiando o
diagnóstico e o tratamento até o momento em que é praticamente impedido de atuar2.
O uso da voz em caráter profissional, sem o necessário preparo específico, pode
sobrecarregar o aparelho fonador e gerar adaptações deficientes que se refletem numa disfonia, ou
seja, numa dificuldade na emissão vocal que impeça a produção natural da voz3.
O primeiro passo na identificação de alterações vocais é conhecer a queixa ou
sintoma de um indivíduo. Sintoma “[...] é o que o paciente relata sobre seu problema e suas
características.” 4: 22
Os principais sintomas de distúrbios vocais envolvem: rouquidão; fadiga vocal ou
cansaço após a fala prolongada; soprosidade ou constante necessidade de reabastecer o suprimento
de ar somado a dificuldade em fazer-se ouvir; extensão fonatória reduzida, em geral associada a
cantores com dificuldades em alcançar algumas notas; afonia ou ausência de voz; quebras de
freqüência ou dificuldade de controlar a freqüência da voz; voz tensa/comprimida ou necessidade
de esforço ao falar; e, por último, tremor ou incapacidade de produzir um som estável sustentado4.
Uma série de sintomas podem ser relacionados ao abuso agudo ou crônico, ou mau
uso do mecanismo vocal: pigarro; rouquidão; cansaço ao falar; falhas na voz; ardor; ressecamento
da boca ou garganta; dificuldade para engolir; perda da voz; sensação de aperto ou corpo estranho;
sensação de pescoço inchado; dor5. Muitos destes sintomas podem resultar de não adoção de
medidas de higiene vocal. “Higiene vocal consiste de normas básicas que auxiliam a preservar a
saúde vocal e prevenir o aparecimento de alterações e doenças” 6. Fazem parte destas normas
básicas atitudes como: cuidar em manter postura corporal ereta e pés apoiados no chão; realizar
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aquecimento vocal antes do uso profissional da voz; realizar desaquecimento e repouso vocal após
o uso profissional da voz; manter hidratação adequada, ingerindo 2 litros de água por dia ou de 8
a 10 copos; ingerir líquidos na temperatura ambiente; evitar uso indiscriminado de medicamentos;
evitar uso de soluções caseiras; evitar falar em intensidade excessiva, tossir e pigarrear
freqüentemente; não fazer uso de drogas, álcool ou fumo, entre outros cuidados6.
Com relação ao tipo de emissora de rádio, afirma-se que existe diferença
significativa entre a forma de atuação dos locutores de AM e FM7,8,9. De modo geral, os locutores
de rádio em AM dispõe de mais tempo para falar, o que exige um maior preparo, pois necessitam
freqüentemente improvisar8. Durante suas apresentações, conversam com os ouvintes de forma
mais direta, discutindo sobre as tarefas da vida diária, acontecimentos e fazem chamadas musicais.
Na maior parte das rádios em FM, os locutores buscam, por meio da voz, transmitir a idéia de
dinamismo, agitação, um estilo jovem7. A característica fundamental da emissora em FM é a
transmissão de música e entretenimento. “Fala-se menos e de uma maneira mais rápida e
objetiva.” 8:97
Esta pesquisa teve por objetivos determinar a prevalência de sintomas vocais e
fatores de risco associados nesses profissionais da radiodifusão.
MATERIAL
MA
TERIAL E MÉTODOS
Realizou-se um estudo transversal com locutores de rádios comerciais da cidade de
Salvador, com modo de transmissão em AM e FM. Para estimar a população de estudo, foi
utilizada a base de dados do Sindicato dos Radialistas (SINTERP-Ba), cujo universo de locutores
radialistas era de 132 profissionais, distribuídos em 17 emissoras de rádio, sendo 7 em AM e 10
em FM.
Os dados foram coletados por meio de questionário fechado, auto-aplicado. Este
instrumento buscou conhecer as características do profissional que indicariam a possibilidade de
presença ou predisposição a alterações vocais.
Queixa vocal foi definida como variável dependente. As variáveis independentes
formam cinco categorias, a saber: características gerais (sexo, idade); características inerentes à
profissão (tempo de profissão, tipo de emissora, formação preparatória, atividade paralela,
distúrbio vocal ao longo da carreira); hábitos potencialmente maléficos à saúde vocal (uso de
fumo, uso de bebida alcoólica, beber líquidos gelados durante a locução, falar sempre em forte
intensidade, trabalhar em ambiente com ar-condicionado, ingerir café durante a locução, pigarrear,
uso de sprays, pastilhas e semelhantes); e hábitos potencialmente benéficos à saúde vocal (beber
no mínimo 8 copos de água por dia, beber água na temperatura ambiente, postura ereta e pés
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apoiados no chão, realizar aquecimento vocal, realizar desaquecimento vocal, fazer repouso vocal
após a locução).
A participação de cada indivíduo esteve subordinada à assinatura prévia do Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido, sendo assegurado aos participantes o anonimato. O
instrumento da pesquisa foi adaptado do protocolo desenvolvido por Navarro e Behlau5.
Do total de 132 locutores de rádios comerciais da Cidade do Salvador, não foi
possível acesso a 7 emissoras, onde trabalhavam 33 locutores. Dos 99 locutores restantes,
distribuídos entre 10 emissoras, 52 devolveram os questionários devidamente preenchidos.
A pesquisa recebeu aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Saúde
Coletiva da Universidade Federal da Bahia, sob número de protocolo 008-02.
RESUL
TADOS
RESULT
A idade dos locutores variou entre 23 e 68 anos, sendo a média 36,5 anos. Quanto
ao sexo, 43 (82,7%) são do sexo masculino. O tempo de profissão variou entre 3 meses e 52 anos,
com média de 15,5 anos. Há uma maior concentração de profissionais na faixa entre 11 e 20
anos, com 22 (42,3%). Quanto à formação preparatória para o exercício da profissão, 32 (61,5%)
locutores responderam afirmativamente.
Além da locução de programas de rádio, 32 (61,5%) dos indivíduos exercem alguma
atividade paralela, em que também é necessário utilizar a voz. Destas, a atividade mais
freqüentemente citada foi a locução de comerciais 14 (43,8%).
Do total de indivíduos, 45 (86,5%) afirmaram ter procurado um ou mais tipos de
trabalho vocal para aperfeiçoar a voz, sendo mencionados com maior freqüência dicção 36 (80%),
impostação 20 (44,5%) e preparação vocal 19 (42,2%). A fonoterapia foi citada como recurso
utilizado para aprimoramento vocal por 5 (11%) locutores.
Verificou-se que 7 (13,5%) profissionais afirmaram ter sofrido algum distúrbio vocal
ao longo da carreira, sendo as fendas glóticas a alteração mais citada. No momento da coleta de
dados 11 (21%) locutores afirmaram apresentar uma ou mais queixas vocais. Houve uma grande
variabilidade quanto ao tipo de queixa mencionada; dor na garganta 3 (5,8%) foi a mais
frequentemente citada, conforme demonstra a Tabela 1
1.
Com relação à adoção de hábitos adequados de cuidado com a voz, bem como aos
hábitos prejudiciais ao bom desempenho vocal, encontram-se demonstrados nas Tabelas 2 e 3
3.
Verificou-se associação entre ter queixas vocais e: ser do sexo feminino (RP=1,19);
ter maior tempo de profissão (11 a 20 anos, RP=1,27; 21 a 30 anos, RP=1,16); atuar em emissora
com modo de transmissão em AM (RP=1,29); não ter formação preparatória para o exercício da
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profissão (RP=1,56); desenvolver atividade paralela que requeira o uso da voz (RP=1,09); ter tido
distúrbio vocal ao longo da carreira (RP=1,43).
Tabela 1. Distribuição numérica e percentual das queixas vocais referidas pelos locutores.
Tabela 2. Freqüência de adoção de hábitos de cuidado com a voz pelos locutores.
Tabela 3. Freqüência de adoção de hábitos prejudiciais à voz pelos locutores.
Quanto aos chamados hábitos maléficos ou benéficos à saúde vocal, encontrou-se
associação com presença de queixa vocal e: beber líquidos gelados durante a locução (RP=1,28);
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ingerir café durante a locução (RP=2,2); ingerir chocolate, leite ou derivados antes ou durante a
locução (RP=1,69); uso de sprays, pastilhas ou semelhantes (RP=1,25); e não realizar aquecimento
vocal (RP=1,53).
Os valores encontrados estão descritos nas Tabelas 4, 5 e 6
6.
Tabela 4. Associação entre queixa vocal e características gerais e inerentes à ocupação.
*grupo de referência
DISCUSSÃO
Os resultados obtidos evidenciam a importância de conhecer as características do
locutor de rádio, no que se refere às queixas e aos cuidados com a voz, a fim de que se
desenvolvam abordagens específicas de intervenção, seja de caráter reabilitativo, sejam ações
preventivas.
Estudos epidemiológicos com esta categoria profissional ainda são escassos e devem
ser ampliados.
O desenvolvimento do distúrbio de voz relacionado ao trabalho é multicausal,
podendo estar associado a diversos fatores, que podem desencadear ou agravar o quadro de
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alteração vocal do trabalhador, de forma direta ou indireta10. Neste estudo, as associações
encontradas com a presença de queixas vocais apresentam plausibilidade científica.
Tabela 5. Associação entre queixa vocal e hábitos potencialmente maléficos à saúde vocal.
*grupo de referência
Estudos descrevem maior suscetibilidade das laringes femininas ao impacto vocal,
justificando a ocorrência maior de lesões nas pregas vocais, como nódulos, entre as mulheres. Isto
ocorre devido a fatores como a proporção glótica feminina, que favorece o fechamento incompleto à
fonação11; a quantidade menor de ácido hialurônico nas pregas vocais, que tem o papel de resistir a
forças de compressão, o que torna o sexo feminino mais sensível aos efeitos do fonotrauma12.
Embora o fator tempo no estudo das disfonias seja relacionado primariamente com
demanda vocal diária, é importante considerar também o efeito do uso excessivo ao longo dos
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anos. O tempo de profissão é um dado que se associa com a maior prevalência de sintomas
vocais.
Tabela 6. Associação entre queixa vocal e hábitos potencialmente benéficos à saúde vocal.
*grupo de referência
Num estudo com professores, o sintoma vocal apareceu nos primeiros anos de
profissão, com aumento da prevalência desses sintomas quanto maior o tempo de docência13. Um
estudo semelhante encontrou associação estatística entre diagnóstico referido de “calo nas cordas
vocais” e tempo de trabalho como docente maior que oito anos14.
Com relação ao tipo de emissora, afirma-se que locutores de rádios em AM têm alta
demanda vocal devido à característica dos programas que apresentam, noticiário com comentários.
Os locutores de FM, por outro lado, têm demanda vocal menor, visto que intervém no decorrer da
programação musical somente para informar o nome da rádio, da música e a hora9.
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O uso da voz em caráter profissional, sem o necessário preparo específico, pode
sobrecarregar o aparelho fonador e gerar adaptações deficientes que se refletem numa disfonia³.
Este dado justifica maior prevalência de sintomas vocais entre indivíduos que não tiveram
formação preparatória para exercer a profissão.
Para muitos locutores, a prática é sua própria escola. No princípio da carreira,
entretanto, procuram imitar um profissional consagrado, o que, às vezes, gera adaptações
prejudiciais15,16.
Na população estudada, 32 (61,5%) indivíduos passaram por curso preparatório, a
fim de obterem o registro profissional. Estes correspondem aos locutores mais jovens. Este dado
indica a modificação na regulamentação da profissão de radialista, que passou a requerer formação
específica.
Legalmente, o locutor pode trabalhar no máximo cinco horas diárias17 . Porém, é
muito comum que os profissionais desempenhem atividades paralelas que requeiram uso intensivo
da voz. O emprego da voz deve ser caracterizado pelo tempo e intensidade de uso vocal no
desempenho da atividade profissional e, neste caso, deve ser considerado o tempo total
despendido.
O fato de o profissional ter desenvolvido um distúrbio vocal ao logo da carreira
indica uma predisposição a distúrbios vocais. A referência freqüente a sintomas neste grupo pode
ser sinal de que os indivíduos estão mais atentos a seus sintomas.
Os locutores de rádio, embora reconheçam a voz como instrumento de trabalho e
demonstrem interesse em preservá-la, deixam de adotar medidas importantes para manutenção da
saúde vocal, possuindo conhecimento insuficiente sobre os cuidados com a voz.
Um estudo realizado com locutores de rádio encontrou que estes profissionais não
detinham conhecimento quanto à higiene vocal, não adotavam cuidados especiais com a voz ou o
faziam de forma inadequada15.
Sabe-se que alimentos e bebidas gelados são potencialmente nocivos, pois o choque
térmico causa uma descarga imediata de muco e edema nas pregas vocais6.
O café favorece a desidratação do organismo e, consequentemente, da mucosa das
pregas vocais. Além disso, aumenta o nível de acidez, podendo induzir o refluxo gastroesofágico18.
Chocolate, leite e derivados aumentam a secreção do muco no trato vocal,
prejudicando a ressonância, além de induzirem a produção de pigarro6.
Balas, pastilhas e sprays locais podem atenuar sensações desagradáveis durante a
emissão da voz, porém acabam por mascarar a dor do esforço vocal, prejudicando ainda mais as
mucosas6.
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O condicionamento vocal é uma estratégia útil na prevenção de problemas vocais e
na manutenção da qualidade vocal adequada ao uso profissional da voz. O aquecimento vocal
envolve exercícios de resistência e flexibilidade vocais, devendo ser realizado imediatamente antes
do início da atividade vocal16.
Os achados deste estudo confirmam que os locutores de rádio, embora reconheçam
a voz como instrumento de trabalho e demonstrem interesse em preservá-la, deixam de adotar
medidas importantes para manutenção da saúde vocal, possuindo conhecimento insuficiente sobre
os cuidados com a voz5,9,15,16,.
Como limitações deste estudo têm-se o número pequeno de participantes, o que
compromete seu poder de generalização. Além disso, não foram avaliados em profundidade
aspectos relacionados ao ambiente de trabalho.
Sabe-se que, em geral, as condições de trabalho dos locutores em estúdio são mais
favoráveis, com amplificação e retorno adequados, sendo fatores nocivos ar-condicionado e
presença de ácaros. Já a locução em ambiente externo, como em reportagens ou narrativa de
futebol, pode levar ao desgaste vocal pela exposição ao ruído competitivo, retorno ausente ou
inadequado, uso prolongado da voz em forte intensidade2.
Estes dados reforçam a importância da orientação a estes profissionais sobre a saúde
vocal, o que pode ocorrer durante os cursos de formação.
CONCLUSÃO
A prevalência de sintomas vocais nesta população de locutores de rádio é de 21%,
associando-se a este dado fatores relativos ao perfil do profissional e hábitos de saúde vocal. Os
sintomas vocais são mais prevalentes nos profissionais do sexo feminino, com maior tempo de
profissão, que atuam em emissoras em AM, não tiveram formação preparatória para o exercício da
profissão, desenvolvem outras atividades que requeiram o uso da voz e tenham desenvolvido
distúrbio vocal ao longo da carreira. Além disso, não realizar aquecimento vocal e manter hábitos
como beber líquidos gelados ou ingerir café durante a locução, ingerir chocolate, leite ou
derivados antes ou durante a locução e uso de sprays, pastilhas ou semelhantes estão relacionados
às queixas vocais.
É de suma importância que estes profissionais recebam orientações adequadas sobre
uso profissional da voz e hábitos de higiene vocal, visando a prevenção de alterações, o que
deveria ocorrer durante os cursos de formação.
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Recebido em 09.03.2006. Aprovado em 11.09.2006.
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ARTIGO ORIGINAL
USO DE CONTRACEPTIVOS E ABORT
AMENTO ENTRE ADOLESCENTES
ABORTAMENTO
Bruno Gil de Carvalho Limaa
Cleuza Maria Santos de Matos b
Eliana Ferraz Melo c
Resumo
O abortamento é uma causa de morbi-mortalidade materna, e sua prevalência no
Brasil permanece elevada, sobretudo entre jovens. O objetivo deste estudo foi testar a associação
entre falha no uso de contraceptivos e a prática do abortamento entre adolescentes. Foi realizado
um estudo seccional entre adolescentes internadas para assistência ao parto ou pós-abortamento
numa maternidade pública de Salvador. Calcularam-se razões de prevalência de abortamento
segundo uso ou não de contraceptivos ao engravidar. Foi realizada análise estratificada e de
regressão logística dessa associação por grupos de idade, escolaridade, estado civil e gestação
prévia. A prevalência de abortamento entre as usuárias de anticoncepcionais foi 2,3 vezes maior
que entre não usuárias. Escolaridade foi um confundidor desta associação. Encontrou-se interação
entre contracepção, gestação anterior e estado civil. A razão de odds ajustada por anos de estudo
foi maior em estratos de adolescentes sem história de gestação prévia e solteiras. Conclui-se que é
preciso aumentar a efetividade dos serviços de saúde voltados para o planejamento familiar,
melhorando a informação das adolescentes sobre a correta aplicação dos anticoncepcionais e
assegurando a continuidade do uso dos métodos.
Palavras-Chave: Contracepção. Abortamento. Planejamento familiar. Adolescentes. Prevalência.
CONTRACEPTIVES USE AND ABORTION AMONG TEENAGERS
Abstract
Abortion is a cause of mother morbi-mortality and its prevalence in Brazil remains
high, mainly among youngsters. This study aimed at testing the association between failure in
a
b
c
Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal da Bahia.
Hospital Ana Néri, Secretaria da Saúde do Estado da Bahia.
Maternidade Tsylla Balbino. Secretaria da Saúde do Estado da Bahia
Endereço para correspondência: Bruno Gil de Carvalho Lima. Rua Basílio da Gama, s/n, Campus do Canela Salvador-BA CEP
40110-040. E-mail: [email protected]
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contraceptive use and abortion among teenagers. A sectional study was developed, including
teenagers assisted in a public maternity in Salvador during delivery or after an abortion. Prevalence
ratios of abortion according to use of contraceptives before pregnancy were calculated. Stratified
and logistic regression analysis was conducted of such association by groups of age, years of
education, marital status and previous pregnancies. The prevalence of abortion among teenagers
using contraceptives was 2,3 times greater than that of non-users. Educational level was a
confounder of such association. Interaction between contraception, previous pregnancy and marital
status was found. The odds ratio adjusted by years of education was greater in strata of teenagers
with no previous gestation and single ones. We concluded it is necessary to improve the
effectiveness of family planning health services, with more information to teenagers regarding the
correct application of contraceptive methods and reassuring the continuity of their use.
Keywords: Contraception. Abortion. Family Planning. Teenagers. Prevalence.
INTRODUÇÃO
O abortamento e complicações secundárias à interrupção da gestação, como
hemorragias e infecções, encontram-se entre as causas mais prevalentes de mortalidade materna no
mundo1,2,3,4,5,6. Tem-se verificado o declínio da letalidade associada a práticas abortivas,
provavelmente em decorrência da preferência por métodos não invasivos, como o uso de
misoprostol, em lugar das sondas uterinas, mais utilizadas no passado3,7,8. Um fator determinante
do risco de submeter-se a tais procedimentos é a sua legalidade, já que países onde a prática é
proibida apresentam maiores taxas de mortalidade por abortamento, devido às precárias condições
de realização em situação de clandestinidade1,9,10, além do risco de seqüelas, como problemas
ginecológicos e infertilidade, e maior chance de complicações em gestações subseqüentes11.
Entretanto o decréscimo da mortalidade por causas relacionadas ao abortamento é
provavelmente conseqüência apenas da diminuição da letalidade, pois a sua prevalência
permanece elevada. Em alguns países, como Brasil e Bolívia, registram-se taxas progressivamente
maiores de utilização do sistema de saúde para curetagens uterinas motivadas por interrupções
gestacionais, indicando o aumento da freqüência de abortamentos7,12 , sobretudo entre
adolescentes13,14,15. Em Salvador (BA), até um terço dos internamentos de mulheres entre 13 e 20
anos em maternidade pública foram secundários a aborto16.
A taxa de fecundidade no Brasil tem diminuído de forma constante nas últimas
décadas, exceto entre adolescentes13,17. A precocidade do início da atividade sexual e a falha em
iniciar e manter a utilização de métodos contraceptivos têm sido apontadas como possíveis causas
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do aumento do número de gestações indesejadas na adolescência, verificando-se que os jovens
conhecem os anticoncepcionais, mas a irregularidade e a falta de planejamento das relações
sexuais e mitos em relação à performance sexual, entre outros fatores, contribuem para a
descontinuação dos métodos14,17. Essa situação associa-se à baixa escolaridade e à dificuldade de
acesso a serviços específicos para essa faixa etária, bem como à representação da gravidez por
algumas adolescentes como uma oportunidade de realizar o sonho do casamento e alcançar a
autonomia econômica e emocional em relação à família de origem15,17.
Um inquérito populacional detectou, em Salvador (BA), que 37,8% das mulheres
sexualmente ativas já haviam vivenciado uma gestação antes dos 20 anos, proporção maior que no
Rio de Janeiro (RJ) e Porto Alegre (RS)18. Levinson, Sadigursky e Erchak19, observaram que, a
despeito dos níveis elevados de informação sobre métodos anticoncepcionais, as adolescentes, no
município de Salvador, apresentavam dificuldades em transpor tais conhecimentos para uma
prática contraceptiva continuada e adequada19. É possível que, em nosso meio, iniciativas
anticoncepcionais inadequadas entre as adolescentes sejam um dos fatores associados à elevada
freqüência de abortamento neste grupo populacional.
Este trabalho tem como objetivo investigar a existência de associação entre a falha
no uso de contraceptivos e a prática do abortamento entre adolescentes.
MA
TERIAL E MÉTODOS
MATERIAL
Realizou-se um estudo observacional de corte transversal, incluindo-se na amostra
todas as gestantes adolescentes, de 13 a 20 anos de idade, internadas no período de agosto a
novembro de 1996, na Maternidade Tsylla Balbino, localizada em Salvador (BA).
Para o cálculo do tamanho da amostra, considerou-se a estimativa de prevalência de
abortamento de 30% em população adolescente atendida em unidade de emergência obstétrica do
município20,21, admitindo-se uma precisão absoluta de 5%, a um nível de confiança de 95%. Com
base nesses parâmetros, observou-se que seria necessária uma amostra de, no mínimo, 323
pacientes22. Prevendo-se perdas no processo de coleta, optou-se por entrevistar 433 pacientes. Para
testar a associação entre falha no uso de contraceptivos e abortamento, com nível de confiança de
95% e poder de 80%, para uma proporção de não expostas para expostas de 2:3 em Salvador16 e
prevendo proporção de 23% de abortamento entre as não expostas, seria necessário incluir 383
pacientes para detectar uma razão de prevalência de, pelo menos, 1,6, segundo o programa
Statcalc do freeware EpiInfo, versão 6, condição preenchida pela amostra estudada.
As participantes foram entrevistadas por uma assistente social e uma enfermeira,
depois de assegurados o anonimato e a impessoalidade das informações coletadas. As pacientes
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internadas para assistência ao parto foram abordadas durante o período puerperal, antes da alta
hospitalar, enquanto aquelas internadas por abortamento responderam às questões passado o efeito
da indução anestésica necessária ao procedimento realizado (curetagem uterina). Não foram
convidadas a participar da investigação puérperas no período de pós-parto imediato, recémchegadas do Centro Obstétrico, em consideração ao provável cansaço apresentado imediatamente
após os procedimentos relacionados à parturição/curetagem, nem as que se encontravam
repousando, mas apenas aquelas que estavam descansadas, despertas, aptas a serem abordadas.
Foram assim consideradas as pacientes que já estivessem respondendo às solicitações inerentes à
própria assistência numa maternidade pública, ou seja, avaliação por obstetra da unidade em visita
diária à enfermaria, avaliação do recém-nascido por pediatra da unidade, visita da nutricionista,
orientação para o aleitamento materno, cuidados com a higiene do recém-nascido e orientação
sobre calendário vacinal e contracepção.
A variável dependente foi o motivo do internamento obstétrico, podendo ser
assistência ao parto ou após abortamento. Uso de contraceptivo foi a variável independente,
enquanto idade maior ou menor que 18 anos, escolaridade (menos ou mais de 6 anos de estudo),
estado civil e gestação prévia foram as covariáveis estudadas, que, segundo o modelo preditivo
elaborado, seriam possíveis variáveis modificadoras de efeito ou confundidoras.
Para a análise dos dados, empregou-se o programa SPSS for Windows 11.0,
estimando-se razões de prevalência (RP). Como medidas de precisão, utilizaram-se os intervalos de
confiança de 95% (IC95%). Além da medida de associação bruta, foi realizada uma análise
estratificada para identificação de interação e confundimento, estimando-se as medidas estratoespecíficas para cada covariável com respectivos intervalos de confiança. Também foram
utilizados modelos de regressão logística para estimar medidas de associação (no caso, a odds ratio
ou razão de odds – OR), testar interação e confundimento. O teste da razão de verossimilhança
(LRT) foi utilizado para avaliar interação. Aceitaram-se como confundidoras as covariáveis que
inserissem uma diferença maior que 5% entre a medida de associação bruta e a ajustada.
O projeto de pesquisa não foi submetido a um Comitê de Ética em Pesquisa
porque, à época da realização do estudo, ainda não estavam disponíveis tais fóruns nem a estrutura
institucional para garantir a adequação à Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde,
publicada em outubro daquele ano, portanto, depois de iniciada a coleta de dados. Foi dada às
pacientes a opção de não participar do estudo, sendo incluídas aquelas que deram seu
consentimento oral depois de informadas sobre os objetivos da pesquisa.
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RESULTADOS
Características da Amostra
A distribuição das adolescentes segundo as duas variáveis quantitativas contínuas foi
assimétrica, uma vez que as idades se concentraram entre os valores de 18-19 anos, e os anos de
estudo tenderam a valores mais elevados, de 5 a 9, com poucos indivíduos de 1 a 3 anos. Foi
observado afastamento de ambas as variáveis da normalidade. A mediana de idade foi 18 e a de
escolaridade, 6 anos de estudo.
A Tabela 1 demonstra que as adolescentes, de acordo com a exposição (uso de
contraceptivos), não eram comparáveis quanto à idade, aos anos de estudo e gestação prévia. As
usuárias de contraceptivos apresentavam menor proporção de gestação prévia, de escolaridade
maior que seis anos de estudo e de idade maior que 18 anos, ou seja, a maioria das adolescentes
que não usavam métodos anticoncepcionais eram mais velhas, mais instruídas e já tinham
vivenciado outra gravidez, diferenças que se mostraram estatisticamente significantes a 5%. A
distribuição segundo estado civil, entretanto, foi semelhante entre as usuárias e não-usuárias de
contraceptivos.
Tabela 1. Características da população do estudo de acordo com a exposição.
Valor p pelo teste do qui-quadrado de Pearson.
Análise estratificada da associação entre Uso de Contraceptivos e Abortamento
Conforme a Tabela 2
2, a razão de prevalência para a associação principal foi de 2,3,
sugerindo associação estatisticamente significante entre uso de contraceptivos e abortamento entre
adolescentes. Houve diferenças da medida de associação entre os estratos por gestação prévia e
estado civil, indicando que tais variáveis modificaram o efeito do uso de contraceptivo sobre a
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interrupção gestacional. Já as RP estrato-específicas para anos de estudo e idade demonstraram que
essas variáveis não se encontram em interação; para anos de estudo, isso se deu de forma limítrofe,
ou seja, poder-se-ia esperar resultado diferente, caso a amostra tivesse maior poder pelo aumento do n.
Tabela 2. Análise estratificada da associação entre uso de contraceptivo e abortamento para
as covariáveis gestação prévia, estado civil, anos de estudo e idade.
N= número, RP= razão de prevalência, IC 95%= intervalo de confiança de 95%.
A grande diferença observada na distribuição das medidas de associação das
covariáveis anos de estudo e idade entre as adolescentes usuárias e não-usuárias de
anticoncepcionais sugeriu a possibilidade de serem confundidoras da associação principal. Embora
não fosse observada diferença relevante entre os valores da RP bruta – 2,30 [1,76;2,99] – e
ajustada por idade – 2,24 [1,71;2,94] – e anos de estudo – 2,11 [1,58;2,81] –, esta última
covariável mostrou-se associada negativamente com a exposição entre os não-casos (RP=0,55
[0,35;0,87]) e com o desfecho entre os não-expostos (RP=0,61 [0,38;0,98]), de forma significante
a 5%, indicando ser confundidora, o que não ocorreu para a covariável idade.
A Tabela 3 apresenta a análise da associação entre o uso de contraceptivos e
abortamento, controlada por gestação prévia e estado civil e ajustada por anos de estudo, observandose que existe associação positiva para adolescentes casadas ou não e com ou sem gestação anterior,
com significância estatística a 5%, exceto para aquelas com história de gestação prévia.
Análise de regressão logística da associação entre Uso de Contraceptivos e
Abortamento
O teste da razão de verossimilhança indicou existência de interação entre
contracepção e gestação prévia (p=0,001) e entre contracepção e estado civil (p<0,001), verificada
pela exclusão dos respectivos termos-produto do modelo saturado.
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Tabela 3. Razão de prevalência da associação entre uso de contraceptivos e abortamento
controlada por estado civil e gestação prévia e ajustada por anos de estudo pela
análise estratificada.
RPaj. = razão de prevalência ajustada, IC 95%= intervalo de confiança de 95%.
A avaliação de confundimento mostra que o modelo reduzido sem a covariável anos
de estudo gerou um odds ratio (OR) 9,55% maior que o indicado pelo modelo saturado, portanto
ajustado para aquela covariável, o que indica ser confundidora. O mesmo não ocorreu para idade.
A Tabela 4 é semelhante à terceira, trazendo, entretanto, as medidas de associação
(OR) do modelo final da regressão logística, que confirmou os achados da análise estratificada.
Tabela 4. Odds ratio da associação entre uso de contraceptivos e abortamento controlada
por estado civil e gestação prévia e ajustada por anos de estudo pela regressão
logística.
OR aj.= razão de odds ajustada, IC 95%= intervalo de confiança de 95%.
DISCUSSÃO
Os resultados do presente estudo indicam que o uso inadequado de contraceptivos é
um fator de risco para abortamento em adolescentes. Tais achados estão de acordo com os de
outras pesquisas. Na Bolívia, detectou-se taxa de utilização de anticoncepcionais maior que o
dobro entre pacientes que provocaram um abortamento 12. É possível que isso ocorra porque
adolescentes que usam contraceptivos já têm uma decisão tomada para não ter uma gestação,
tendo optado por postergar a maternidade, portanto podem decidir pela interrupção de uma
gravidez acidental mais freqüentemente do que não-usuárias de anticoncepcionais. Em Campinas
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(SP), constatou-se que 88,9% das adolescentes com repetição da gravidez haviam usado
contraceptivos no intervalo entre a gestação prévia e a atual, e que 77,8% não tinham planejado
esta última14, o que sugere descontinuação ou uso inadequado.
A ocorrência de abortamento entre adolescentes usuárias de métodos contraceptivos
apresentou variações na amostra estudada, com força de associação variável, segundo
apresentassem história de gravidez anterior ou de acordo com o estado civil e nível de instrução.
Em São Paulo (SP), também ficou demonstrado que a utilização de anticoncepcionais está
associada ao nível de instrução, e a taxa de fecundidade é maior entre jovens com menor
escolaridade e que não exercem atividade econômica17. Naquele estudo, 12% dos jovens
afirmavam combinar métodos de alta eficácia (pílula, preservativo) com outros de baixa eficácia
(comportamentais), o que pode indicar uso inconstante dos primeiros. Este aspecto não foi
avaliado no presente trabalho, mas é possível que também ocorra em Salvador. A associação com
estado civil também foi verificada no Rio de Janeiro (RJ), onde a contracepção foi mais comum
entre as adolescentes casadas15.
Portanto, faz-se necessário melhorar o desempenho do nosso sistema de saúde no
que se refere à informação das adolescentes sobre o uso correto de contraceptivos e à ênfase na
continuidade da aplicação do método ativado. Em toda a América Latina, percebe-se que o
problema não é o desconhecimento das práticas de planejamento familiar, mas a utilização de
métodos de menor efetividade, inclusive com altas proporções de usuárias que têm como fonte de
informação a este respeito amigas e familiares (34%), o mesmo percentual das que recebem
orientação de profissionais de saúde1 . Mecanismos de busca ativa de adolescentes nas
comunidades, inclusive aquelas que nunca tiveram uma gestação e solteiras, por meio das equipes
dos Programas de Saúde da Família e de Agentes Comunitários de Saúde, levando-as para os
ambulatórios de planejamento familiar e acompanhando a adesão ao método contraceptivo,
poderiam contribuir para a diminuição da incidência de abortamentos e das suas complicações na
nossa população.
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Recebido em 15.03.2006. Aprovado em 19.06.2006.
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ARTIGO ORIGINAL
TENDÊNCIA DA MORBIMORT
ALIDADE POR PNEUMONIA NA REGIÃO
MORBIMORTALIDADE
METROPOLIT
ANA DE SAL
VADOR – 1980 A 2004
METROPOLITANA
SALV
Bruno Mendonça Protásio da Silva a, Diógenes Diego de Carvalho Bispo a
Dulceane Natyara Rocha Cardoso a, Mateus Teixeira do Amaral Rochaa
Mauro de Araújo Ferreiraa, Natalia Santana Andrade Barretto a
Marco Antônio Vasconcelos Rêgo b
Resumo
A pneumonia é um problema de saúde pública responsável por óbitos,
principalmente entre pacientes idosos e crianças internados por causas respiratórias. Este estudo
analisou a tendência da morbidade e da mortalidade por pneumonia na Região Metropolitana de
Salvador, Brasil. Realizou-se um estudo de agregados de séries temporais, com base em dados de
mortalidade e hospitalização disponibilizados no Sistema de Informação em Saúde do DATASUS
do Ministério da Saúde. Calcularam-se coeficientes padronizados de mortalidade e de morbidade
por sexo e faixa etária e utilizou-se a regressão linear simples, o coeficiente de correlação de
Pearson e o coeficiente de determinação. As proporções de óbito e de internação foram sempre
mais altas para o sexo masculino, para as crianças menores de um ano e para os indivíduos acima
de 60 anos de idade. Observou-se uma redução nos coeficientes de mortalidade e de morbidade
por pneumonia, mas notou-se uma tendência crescente da morbidade nos últimos três anos. Além
disso, observou-se uma correlação positiva entre os coeficientes de morbidade e os índices
pluviométricos e uma correlação negativa entre cobertura vacinal contra Haemophilus influenzae
tipo b nas crianças menores de um ano e coeficientes de morbidade. Recomenda-se a
intensificação de ações voltadas para os mais susceptíveis, para ampliar os programas educacionais
e as coberturas vacinais nos extremos etários, especialmente antes dos períodos chuvosos.
Palavras-chave: Pneumonia. Mortalidade. Morbidade. Hospitalização. Série temporal. Vacina.
a
b
Acadêmicos do 6o semestre de Medicina da Universidade Federal da Bahia (UFBA)
Professor Adjunto Doutor / Departamento de Medicina Preventiva, Faculdade de Medicina da Bahia, Universidade Federal da
Bahia (UFBA).
Endereço para correspondência: Pavilhão de Aulas da Faculdade de Medicina da Bahia da UFBA - Departamento de
Medicina Preventiva. Av. Reitor Miguel Calmon, s/n, Vale do Canela, CEP: 40.110-100, Salvador, Bahia, Brasil. E-mail:
[email protected]
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de Saúde Pública
MORBIDITY AND MORTALITY TRENDS DUE TO PNEUMONIA IN THE
METROPOLITAN REGION OF SALVADOR, BRAZIL, 1980 TO 2004
Abstract
This study analyzed morbidity and mortality trends due to pneumonia in the
Metropolitan Region of Salvador, Brazil. An aggregate study of time series was carried out from
secondary data, available in the Health Information System (DATASUS) of the Ministry of Health.
Data analysis ware based on the calculation of mortality and morbidity standardized coefficients
by sex and age, on simple linear regression, on Pearson’s correlation coefficient and on
determination coefficient. The proportions of death and hospitalization were always higher for
male, for those under one year, and for individuals over sixty years of age. In general, reductions in
mortality and morbidity coefficients were found, but it was observed an increasing trend of
mortality coefficient in the past three years. In addition, a positive correlation between morbidity
coefficients and pluvial intensity was described. A negative correlation between the vaccine
coverage against type b Haemophilus influenza and morbidity coefficients was found for children
less than one year of age. Public health actions, as health education and vaccine coverage, should
be intensified among the more susceptible people, especially before the rainy season.
Keywords: Pneumonia. Mortality. Morbidity. Hospitalization. Time series. Vaccine.
INTRODUÇÃO
A pneumonia é uma doença inflamatória das vias aéreas que atinge o parênquima
1
pulmonar , envolvendo os bronquíolos, os brônquios e, ocasionalmente, a pleura2. É possível
classificá-la em comunitária e nosocomial, a depender do local de adoecimento. O risco estimado
de adquiri-la é cinco vezes superior para os casos hospitalares. Destaca-se, entre esses, a alta
incidência nos indivíduos internados em UTI1.
As taxas de incidência de pneumonia são consideravelmente mais altas em países
em desenvolvimento, onde uma larga proporção da doença deve-se a causas bacterianas2,3. A
principal bactéria implicada na etiologia da pneumonia é o Streptococcus pneumoniae, embora
também se destaquem outras gram-positivas (Staphylococcus aureus) e gram-negativas
(Haemophilus influenzae), além de bactérias anaeróbicas4,5. Os vírus também participam como
agentes etiológicos da pneumonia, com destaque para o vírus da Influenza3,4,5.
Dados do Brasil, de 2002, revelam que a pneumonia é responsável por 14,2% dos
óbitos e por 36,3% dos pacientes internados por causas respiratórias. Tais valores correspondem a
1,6% de todas as causas de morte e a 2,5% de todas as causas de internação para o mesmo
período6.
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Atualmente, muitas evidências demonstram forte influência exercida pelos extremos
etários nos indicadores de pneumonia1, especialmente na população menor de dois anos2 e maior
de 65 anos de idade3. Dessa forma, vale ressaltar a importância da cobertura das ações de saúde
pública e assistência médica, sobretudo para crianças e idosos. Destaca-se nesse contexto a
imunização por Streptococcus pneumoniae2,3,7, Haemophilus influenzae tipo b2,8 e vírus da
Influenza2,3. Diante disso, o presente estudo tem o objetivo de analisar a tendência de
morbimortalidade por pneumonia na Região Metropolitana de Salvador (RMS) no período de 1980
a 2004, destacando a estratificação por sexo e faixa etária, a abordagem sazonal de sua ocorrência
e a avaliação do impacto das intervenções.
MA
TERIAL E MÉTODOS
MATERIAL
Realizou-se um estudo de agregados de séries temporais com dados de óbito no
período de 1980 a 2002 e de internações e óbitos hospitalares por local de residência, no período
de 1995 a 2004, na Região Metropolitana de Salvador (RMS). Para permitir alguma comparação,
foram coletados dados de mesma natureza para as regiões metropolitanas de Recife e de São Paulo
e para o Brasil. Além disso, coletaram-se informações de dados referentes à cobertura vacinal
contra Haemophilus influenzae do tipo b (vacina anti-Hib introduzida em 1999 e a vacina
tetravalente, em 2002) e contra o vírus da Influenza na RMS. Estes dados foram obtidos do Sistema
de Informações sobre Mortalidade, do Sistema de Informações Hospitalares do SUS e do Sistema
de Informações do Programa Nacional de Imunização (MS/DATASUS).
A causa básica do óbito foi definida conforme a nona revisão da Classificação
Internacional das Doenças (CID BR-9) para o período de 1980 a 1995 e a décima revisão (CID BR10) para 1996 a 2002. Por sua vez, no que se refere aos indicadores de morbidade, utilizaram-se a
nona revisão para 1995 a 1997 e a décima revisão para 1998 a 2004. Os dados de
morbimortalidade seguiram o capítulo de causa doenças respiratórias da CID (capítulo VIII da CID
BR-9 e capítulo X da CID BR-10).
Os dados relativos à população foram obtidos junto à Fundação Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE) para os anos censitários (1980, 1991 e 2000), contagem da população
(1996) e projeções intercensitárias. Todos os dados do estudo referentes à população com sexo e faixa
etária ignorados foram desprezados. Informações referentes às médias mensais dos índices de
precipitação pluviométrica, no período de 1980 a 1998, da RMS, foram obtidas junto à Diretoria de
Vigilância Epidemiológica (DIVEP) – Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (SESAB).
O banco de dados foi elaborado utilizando o software Microsoft Excel 2000. Foram
construídos os seguintes indicadores: coeficiente de mortalidade (óbitos por 10 mil habitantes),
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coeficiente de morbidade (internações hospitalares por 10 mil habitantes), coeficiente de
letalidade hospitalar (óbitos por 100 internações hospitalares), cobertura vacinal contra
Haemophilus influenzae tipo b e vírus da Influenza (doses aplicadas por 100 habitantes).
Procedeu-se a padronização dos coeficientes de mortalidade e morbidade por faixa etária, pelo
método direto, adotando-se como padrão a população do Brasil de 1980.
Na avaliação da distribuição sazonal das pneumonias, calcularam-se as médias
mensais com seus respectivos desvios-padrão no período de 1995 a 2004, para a construção do
diagrama de controle, com base nos coeficientes de morbidade. Foi verificada grande variação das
freqüências e, dessa forma, optou-se pela utilização das medianas dos coeficientes de morbidade.
Com o objetivo de evitar o uso de um ano epidêmico no diagrama de controle, decidiu-se
eliminar os valores extremos, de modo a utilizar o inframáximo e o supramínimo como limites
superior e inferior, respectivamente.
A análise da tendência temporal foi realizada por meio da regressão linear simples.
A análise de correlação foi feita com o apoio do cálculo do coeficiente de correlação de Pearson
(R) e do coeficiente de determinação (R2), verificando associação entre as variações sazonais das
precipitações e as medianas referentes aos coeficientes de morbidade, além da associação entre
vacinações e morbidade hospitalar.
RESUL
TADOS
RESULT
MORTALIDADE
Observou-se uma tendência geral de queda nos coeficientes de mortalidade por
pneumonia no Brasil e em três de suas principais regiões metropolitanas: São Paulo, Salvador e
Recife. De 1980 a 2002, verificou-se um declínio total de 53,7% no coeficiente nacional, tendo a
RMS uma queda ainda mais expressiva: de 85,3%. Nas regiões metropolitanas de Recife e São
Paulo, o declínio foi de 66,1% e 63,2%, respectivamente. A RMS apresentou ainda, nesse período,
o maior declínio anual médio: de 0,25 óbito por pneumonia por 10 mil habitantes; que foi 3,5
vezes maior que o do Brasil, 2,0 vezes maior que o da Região Metropolitana de Recife e 1,2 vez
maior que o da Região Metropolitana de São Paulo (Gráfico 1)
1).
Notou-se também que, ao longo desses 23 anos, a RMS apresentou seis picos no
coeficiente de mortalidade (anos de 1980, 1983, 1986, 1992, 1998 e 2000), tendo, em 1983, seu
valor mais alto dentre todos estudados (5,7 óbitos por pneumonia por 10 mil habitantes). Somente
no período de 1986 a 1989, a RMS registrou um declínio total de 59,6% no coeficiente,
representando a variação mais acentuada no estudo. Além disso, foi também na década de 80
(1980 a 1989) que se verificou a maior redução total (queda de 63,5% no coeficiente de
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mortalidade), quando comparada com a década de 90 (1990 a 1999) e com o período de 2000 a
2002, com 47,7% e 27,3%, respectivamente.
Gráfico 1. Coeficientes de mortalidade por pneumonia (por 10.000 habitantes), padronizados
por idade. Regiões Metropolitanas e Brasil, 1980 a 2002
Observou-se uma redução dos óbitos por pneumonia na ordem de 86,3% para o
sexo feminino e de 84,5% para o sexo masculino, o que significou uma redução anual média
de 0,26 e 0,23 óbitos por pneumonia por 10 mil habitantes para o sexo masculino e
feminino, respectivamente, nesses 23 anos. Já com relação à variável faixa etária, destacaramse as faixas de 0 a 4 anos e a de 80 anos e mais. A primeira apresentou uma redução de
91,9% (de 30,8 em 1980 para 2,5 óbitos por 10 mil habitantes em 2002), representando a
maior queda total dentre todas as faixas etárias. Entretanto foi na faixa etária de 80 anos e mais
que se verificou a redução anual média mais importante (2,5 óbitos por pneumonia por 10 mil
habitantes), que, comparativamente, foi 1,7 vez maior que a da faixa de 0 a 4 anos. Verificou-se
ainda que o coeficiente de mortalidade da faixa de 80 anos e mais atingiu seu maior valor no ano
de 1984, registrando-se 78,4 óbitos por pneumonia por 10 mil habitantes. Além disso, obteve-se
uma redução total de 55,0% do coeficiente dessa faixa para o período de 1986 a 1989. Desde
então, houve um comportamento oscilante ao redor de 30,0 óbitos por pneumonia por 10 mil
habitantes (Gráfico 2)
2).
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NOTA: As faixas etárias que compõem o intervalo de idade de cinco a 49 anos não estão sendo mostradas, pois
possuem valores muito pequenos para serem analisados neste gráfico.
Gráfico 2. Coeficientes de mortalidade por pneumonia (por 10.000 habitantes), segundo a
faixa etária. Região Metropolitana de Salvador, 1980 a 2002.
INTERNAÇÕES HOSPITALARES
Observou-se uma tendência geral de declínio nos coeficientes, no período de 1995 a
2004, de 36,9 internações por 10 mil habitantes em 1995 para 26,9 em 2004. Esta redução foi de
27,0%, associada a uma queda anual média de 2,0 internações por pneumonia por 10 mil
habitantes. Tais declínios foram semelhantes para os sexos masculino e feminino, tanto
considerando os extremos da série (27,2% e 26,7%, respectivamente), quanto a redução média
anual de 2,2 e 1,8 internações por pneumonia por 10 mil habitantes, respectivamente. Além disso,
destacaram-se, no período estudado, os anos de 1996 e de 1999 com os mais altos coeficientes de
morbidade (41,5 e 37,7 internações por pneumonia por 10 mil habitantes, respectivamente), e o
ano de 2002, com o menor valor registrado (19,1 internações por pneumonia por 10 mil
habitantes). Por fim, notou-se que, embora tenha havido um declínio significativo no coeficiente
de morbidade no período de 1999 a 2002 (49,4%), presenciou-se, ao final dos últimos três anos
estudados (2002 a 2004), um aumento de 41,3% nesse mesmo coeficiente.
A análise por faixa etária evidenciou uma redução de 28,8% em menores de um
ano, 26,7% em crianças de 1 a 4 anos, 30,9% em idosos de 70 a 79 anos e 30,3% em idosos de
80 anos e mais. Dentre essas, notou-se que, embora a queda total, no período de 1995 a 2004,
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tenha sido aproximadamente homogênea, as quedas anuais médias foram bastante diferentes: a
faixa de menores de um ano apresentou a maior redução anual média de 30,5 internações por
pneumonia por 10 mil habitantes, sendo 117,8 vezes maior que a da faixa de 1 a 4 anos; 13,9
vezes maior que a de 70 a 79 anos; e 7,4 vezes maior que a de 80 anos e mais. Verificou-se ainda
que o coeficiente de morbidade da faixa de menores de um ano atingiu seus maiores valores nos
anos de 1996 e 1999 (553,8 e 516,1 internações por pneumonia por 10 mil habitantes
respectivamente), tendo, em 2002, seu valor mais baixo (211,2 internações por pneumonia por 10
mil habitantes). Essa mesma faixa etária registrou, no período de 1999 a 2002, um declínio de
59,1% no valor do coeficiente de morbidade, tendo apresentado, ao final dos últimos três anos do
estudo (2002 a 2004), uma elevação de 63,9% nesse indicador (Gráfico 3)
3).
NOTA: Deve-se ressaltar que as outras faixas etárias dentro de 10 a 59 anos não estão sendo representadas neste
gráfico, pois possuem coeficientes menores que cinco internações por 10 mil habitantes.
Gráfico 3. Coeficientes de morbidade por pneumonia (por 10.000 habitantes), segundo a
faixa etária. Região Metropolitana de Salvador, 1995 a 2004.
LETALIDADE HOSPITALAR
A despeito das variações, observou-se leve tendência de queda do coeficiente de
letalidade na RMS. No período de 1995 a 2004, percebeu-se um declínio total de 4,9% e declínio
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médio anual de 0,1 óbito por pneumonia por 100 internações. Em 1998, o coeficiente de
letalidade assumiu seu maior valor, equivalente a 4,5 óbitos por pneumonia por 100 internações.
Em 2002, observou-se o menor coeficiente de letalidade: 2,2 óbitos por pneumonia por 100
internações.
SAZONALIDADE
A análise sazonal das internações permitiu constatar que a mediana dos coeficientes
de morbidade, no período de 1995 a 2004, foi menor em fevereiro (1,2 internação por pneumonia
por 10 mil habitantes), alcançando valores muito altos em maio e junho (respectivamente 2,4 e
2,3 internações por pneumonia por 10 mil habitantes). A partir de julho, as medianas voltaram a
cair. Observou-se que nos meses de abril e junho ocorreu uma maior dispersão dos dados, com
amplitude de, respectivamente, 1,9 e 1,8 internação por pneumonia por 10 mil habitantes;
enquanto o mês de novembro apresentou a menor dispersão (amplitude de 0,9 internação por
pneumonia por 10 mil habitantes). Observou-se uma correlação positiva muito forte entre
pluviosidade e internações por pneumonia no período de 1980 a 1998 (r= 0,950). Partindo-se do
cálculo do coeficiente de determinação (r2= 0,903), pode-se afirmar que 90,3% da variabilidade do
coeficiente de morbidade pode ser explicada pela variabilidade na distribuição pluviométrica
sazonal. Dados recentes de 2005 mostraram coeficientes de morbidade abaixo do limite inferior
nos meses de março e abril (Gráfico 4)
4).
Gráfico 4. Coeficiente de morbidade por pneumonia (por 10.000 habitantes), no período de
1995 a 2004 e índice pluviométrico no período de 1980 a 1998. Região
Metropolitana de Salvador.
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VACINAÇÃO
Em 1999, a vacina anti-Hib foi introduzida no calendário de vacinação básica dos
indivíduos menores de um ano, correspondendo a uma cobertura de apenas 0,7%. Entretanto a
imunização por essa vacina, em 2000, foi aproximadamente 106 vezes maior do que em 1999. A
cobertura oscilou em torno de 75,0% para essa mesma faixa etária no período de 2000 a 2004.
Vale ressaltar que, em 2002, a quantidade de doses aplicadas da vacina anti-Hib correspondeu a
54,5% do total de vacinas aplicadas contra Haemophilus influenzae do tipo b, enquanto 45,5%
destas equivaleram à vacina tetravalente (DPT + Hib). Em 2003, a vacina tetravalente correspondeu a
97,0% do total das vacinas contra Haemophilus influenzae do tipo b e 99,9% em 2004 (Gráfico 5)
5).
Gráfico 5. Coeficiente de morbidade <1 ano por pneumonia (por 10.000 habitantes) e
cobertura vacinal contra Haemophilus influenzae tipo b (por 100 habitantes).
Região Metropolitana de Salvador, 1995 a 2004.
A partir do cálculo do coeficiente de correlação, constatou-se uma correlação
negativa forte (r= -0,798) entre o coeficiente de morbidade infantil e a cobertura vacinal contra
Haemophilus influenzae do tipo b. Com apoio do cálculo do coeficiente de determinação (r2=
0,637), pode-se afirmar que quase 63,7% da variabilidade do coeficiente de morbidade infantil
pode ser explicada pela variabilidade na cobertura de imunização contra Haemophilus influenzae
do tipo b.
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Em 1999, o Ministério da Saúde introduziu a vacina contra o vírus da Influenza no
calendário de imunização. Nesse ano, a cobertura foi de 69,2% na população com idade de 60
anos e mais. Desde então, tem-se verificado um aumento anual médio de 6,3% da cobertura
vacinal dessa faixa etária, alcançando 96,2% em 2004. Notou-se que, após a introdução da vacina,
tem ocorrido uma redução anual média de 0,9 internação por pneumonia por 10 mil habitantes.
Verificou-se uma correlação positiva fraca entre a cobertura vacinal contra o vírus da Influenza e o
coeficiente de morbidade para indivíduos maiores de 60 anos (r= 0,170).
DISCUSSÃO
A análise da tendência histórica da pneumonia permite não só estabelecer hipóteses
sobre os fatores envolvidos no processo de adoecimento e óbito, mas também avaliar as medidas e
as ações de saúde pública e evidenciar a melhoria da qualidade de vida na saúde da população9.
Diante disso, percebe-se a grande relevância em se conhecer a evolução da morbimortalidade por
pneumonia na RMS e suas particularidades.
Ao longo das duas últimas décadas, observou-se uma redução importante dos
indicadores de morbimortalidade em ambos os sexos e em todas as faixas etárias na RMS. Essa
redução ocorreu concomitantemente a um período de expansão do acesso aos serviços de saúde,
especialmente na Região Nordeste, com a criação do Sistema Único de Saúde (SUS)10 , e de
ampliação das ações preventivas, sobretudo com o aumento da cobertura vacinal contra
Haemophilus influenzae do tipo b e vírus da Influenza6.
Notou-se que o risco de internamento e de morte por pneumonia foi sempre mais
elevado na população masculina. Verificou-se também que o risco de morte por pneumonia foi
sempre maior para idosos na faixa etária de 80 anos e mais, enquanto o risco de internamento foi
sempre superior para as crianças menores de um ano. Além disso, constatou-se que o maior risco
de internamento por pneumonia ocorreu nos meses mais chuvosos (maio e junho) e o menor risco
de internamento, no mês menos chuvoso (fevereiro).
Há inúmeros fatores predisponentes para adoecimento e morte por pneumonia.
Sabe-se que muitos desses fatores estão presentes em todos os estratos etários, a exemplo de fatores
sócio-demográficos (maior número de pessoas co-habitando a mesma casa, tabagismo e pobreza) e
fatores ambientais (poluição atmosférica, amplitude térmica e umidade)3,11. Algumas evidências,
entretanto, mostram que vários fatores estão associados intimamente a determinadas faixas etárias.
Nos idosos, destacam-se os efeitos provocados pelo envelhecimento, pela freqüência elevada de
co-morbidades (doenças crônicas debilitantes, doenças cardiopulmonares, diabetes mellitus) e pela
maior freqüência de micro e macroaspiração3,12. Nas crianças, por sua vez, destacam-se as
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complicações decorrentes do baixo peso ao nascer3,11,13, de deficiências no aleitamento materno,
da desnutrição2,3, além de variáveis demográficas como menor escolaridade materna11,13. Portanto,
supõe-se que esses fatores predisponentes possam estar associados à distribuição diferenciada dos
riscos de adoecimento (internações) e óbito nos diversos grupos etários verificados neste estudo.
Acredita-se também que a distribuição sazonal das internações hospitalares esteja
relacionada à variação cíclica da presença da maioria dos agentes patógenos causadores de
pneumonia. De fato, sabe-se que tal padrão é mais proeminente para os agentes virais, muito
embora também se verifique em patógenos bacterianos2. Além disso, supõe-se que a forte
correlação vista entre a distribuição sazonal das internações por pneumonia e os índices
pluviométricos se devam provavelmente à tendência à aglomeração das pessoas em períodos mais
chuvosos.
A análise da gravidade permitiu a constatação de que a letalidade hospitalar se
manteve praticamente constante ao final do período estudado, com redução proporcional das
internações e dos óbitos hospitalares.
Diante da importância atribuída às medidas profiláticas no âmbito dos agravos da
saúde, avaliou-se o papel das imunizações sobre os grupos etários mais susceptíveis: indivíduos
menores de um ano e com sessenta anos e mais. Assim, as vacinas contra Haemophilus influenzae
do tipo b e vírus da Influenza foram analisadas com o propósito de avaliar sua efetividade. Além
disso, é válido ressaltar que, embora o uso recentemente licenciado da vacina conjugada
pneumocócica aponte para a prevenção da maioria dos casos de pneumonia pneumocócica nos
EUA14, a cobertura vacinal contra Streptococcus pneumoniae é muito deficiente na RMS e, por
isso, os dados obtidos não são satisfatórios para análise de sua efetividade6.
Dados finlandeses têm mostrado uma eficácia da vacina capsular polissacarídica
(PRP) de 95% (55 a 98%) contra o Haemophilus influenzae do tipo b8, um importante causador de
pneumonia infantil em locais restritos do mundo, bem documentado em várias pesquisas14. Na
RMS, essa vacina foi introduzida em 1999 e causou forte impacto nas internações por pneumonia
na faixa etária de menores de um ano. Em 2002, foi introduzida a vacina tetravalente (DPT + Hib),
prevalecendo seu uso em 2003 e 2004 sobre a antiga. Esse período coincide com o aumento
significativo das internações por pneumonia, revertendo a tendência de queda iniciada em 1999.
Isso sugere que algum fator relacionado à nova vacina possa estar interferindo na efetividade da
imunização.
A análise da imunização contra o vírus da Influenza também foi abordada neste
estudo. Sabe-se que o vírus da Influenza acomete mais freqüentemente crianças e adolescentes,
embora a taxa de morbimortalidade por pneumonia associada à infecção pelo vírus da Influenza
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seja maior nos pacientes idosos. Destaca-se o vírus da Influenza A, com papel importante na
gênese de epidemias, pandemias e mortes3. Além disso, sabe-se que o vírus da Influenza pode
atuar de maneira primária (diretamente) e secundária (aumentando a susceptibilidade do indivíduo
a outros patógenos) na etiologia da pneumonia7.
Nos Estados Unidos, recomenda-se a vacinação contra o vírus da Influenza não
apenas para prevenir surtos de sua doença, mas também para evitar conseqüências sérias desse
vírus, tais como hospitalização e morte. A vacinação é recomendada para quase metade da
população desse país. Dentre as recentes inclusões para o grupo de vacinados estão pessoas com
50 anos ou mais, mulheres que estarão no segundo ou terceiro trimestre de gravidez durante o
período de maior incidência do vírus da Influenza, e pacientes com imunossupressão causada pela
infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV). Na população mais velha, a proteção
contra pneumonia, hospitalização e morte permanece alta, não obstante a eficácia da vacina entre
os mais velhos estar entre 30% a 60%, proporção menor do que nos adultos (70% a 100%). A
vacina inativada do vírus da Influenza também pode reduzir a incidência de otite média em
crianças durante os períodos de pico de incidência do vírus da Influenza15.
Estudos realizados nos Estados Unidos mostraram que na população idosa vacinada
contra o vírus da Influenza, houve uma redução consistente das freqüências de hospitalização por
doença respiratória, doença cardíaca e morte por todas as causas, quando comparado com os
idosos não-vacinados15,16. Entretanto uma metanálise recente encontrou que a efetividade da
vacinação contra o vírus da Influenza na população idosa é apenas modesta17.
Dados da Fundação Nacional de Saúde (FUNASA) mostram que o vírus da Influenza
tem maior freqüência no período de março a agosto, quando ocorre sua maior circulação3. Na
RMS, verificou-se que esse período coincide com índices pluviométricos mais altos.
Mesmo com o aumento da cobertura vacinal e uma tendência de queda nas
internações por pneumonia nos idosos com sessenta anos e mais, constatou-se uma correlação
positiva, ainda que fraca, inesperada entre essas variáveis. De fato, isso põe em dúvida a
efetividade dessa vacina na prevenção de internações por pneumonia para essa faixa etária.
LIMIT
AÇÕES
LIMITAÇÕES
Por se tratar de um estudo que utiliza dados históricos e de diferentes fontes,
diversas limitações podem interferir na interpretação dos resultados. A limitação principal deste
estudo é a deficiência na abrangência e qualidade dos dados, que foram obtidos de um sistema de
informações que ainda apresenta muitas subnotificações. Além disso, é possível que tenha havido
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mudanças nos critérios de internação que possam explicar parte da variabilidade das freqüências
ocorridas nas duas últimas décadas.
Muitas são as limitações intrínsecas do estudo ecológico. Destaca-se o fato deste
estudo não ser controlado nem randomizado, implicando na dificuldade de se controlar os fatores
de confundimento. Além disso, a presença de vieses, sobretudo o viés de admissão para a análise
da morbidade, pode comprometer a validade interna e dificultar a extrapolação dos resultados.
Diante disso, é possível que os eventos e as intervenções propostas como fatores influenciadores
possam estar associados apenas indiretamente com as variações demonstradas neste estudo. Por
fim, é importante estar atento à possibilidade de se incorrer em “falácia ecológica” ao se tentar
extrapolar os resultados de base populacional para um nível individual18.
Não obstante essas limitações, deve-se valorizar a redução expressiva dos
coeficientes de morbidade e mortalidade por pneumonia na RMS em ambos os sexos.
Entretanto, deve-se dirigir maior atenção às faixas etárias de maior risco. Enquanto crianças
menores de um ano apresentam maior risco de se internar, idosos com 80 anos e mais
apresentam risco maior de morrer.
Desta forma, recomendam-se ações de saúde pública direcionadas tanto para
prevenção primária quanto secundária, destacando-se programas educacionais e ampliação das
coberturas vacinais. O presente trabalho identificou uma correlação negativa entre imunização
contra Haemophilus influenzae tipo b e o coeficiente de morbidade por pneumonia em menores
de um ano no período de 1999 a 2004, demonstrando efetividade dessa vacina no contexto de
saúde pública. Ao contrário, a vacina contra o vírus da Influenza mostrou mínima correlação com
o coeficiente de internação por pneumonia, colocando em dúvida sua efetividade na prevenção da
pneumonia entre os indivíduos com 60 anos e mais. As ações de prevenção e assistência médica
devem ser priorizadas nos períodos chuvosos, pois há uma correlação positiva entre o índice de
precipitação pluviométrica e a morbidade por pneumonia na RMS. Para finalizar, necessita-se de
novos estudos no intuito de reavaliar essas associações e de esclarecer possíveis fatores causais,
visando melhor planejar e intervir com ações integradas de saúde.
AGRADECIMENTOS
Aos professores Annibal Muniz Silvany Neto, Fernando Martins Carvalho e José
Henrique Silva Barreto da disciplina Epidemiologia da Faculdade de Medicina da Bahia (UFBA) e
ao médico Juarez Pereira Dias da Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (SESAB) pela colaboração
e pelo acesso a dados usados neste trabalho.
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Recebido em 05.06.2006. Aprovado em 13.07.2006.
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ARTIGO ORIGINAL
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IMP
ACTOS DE PESTICIDAS NA ATIVIDADE MICROBIANA DO SOLO E SOBRE A
IMPACTOS
SAÚDE DOS AGRICULTORES
Aldo Pacheco Ferreiraa, Cynara de Lourdes Nóbrega da Cunha b
Eduardo Dias Wermelinger a, Marcos Barbosa de Souza a
Márcia de Freitas Lenzia , Cláudio Márcio de Mesquita a
Leila Cristina Jorge a
Resumo
Os pesticidas figuram atualmente como um dos principais poluidores e agentes
causadores de impacto nos agroecossistemas, sendo responsáveis pelos mais diversos tipos de
interações, que podem levar à degradação dos recursos naturais fundamentais para a fertilidade do
solo e, principalmente, à diminuição da diversidade. O objetivo deste estudo é encontrar
evidências do impacto dos agrotóxicos na saúde do trabalhador rural e, subseqüentemente, avaliar
a atividade microbiana mediante o uso dos indicadores biomassa microbiana do solo (BMS),
respiração basal do solo (RBS) e quociente metabólico (qCO2), para checar e discutir o nível de
impacto provocado ao ambiente e à saúde pública pela ação de pesticidas. Os resultados obtidos
nas análises do solo de Paty do Alferes evidenciaram o uso indiscriminado de pesticidas no
processo produtivo da agricultura local e seu impacto para a saúde e o meio ambiente. Por outro
lado, a exposição continuada a pesticidas comprometeu a saúde de vários agricultores, levando a
casos crônicos, mal definidos, e outros extremamente graves.
Palavras-chave: Biomassa microbiana. Respiração basal. Quociente metabólico. Pesticidas.
Colinesterase. Saúde pública. Ambiente.
PESTICIDE IMPACTS IN THE MICROBIAL SOIL ACTIVITY
AND ON FARMERS HEALTH
Abstract
Pesticides represent, at present, one of the main pollutant impact causative agents in
agroecossistems, being responsible for the most several types of interactions, with many of these
a
b
Departamento de Ciências Biológicas, Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, Fiocruz.
Laboratório de Estudos em Monitoramento e Modelagem Ambiental, UFPR/IAPAR/SIMEPAR/LEMMA.
Endereço para correspondência
correspondência: Aldo Pacheco Ferreira. Rua Leopoldo Bulhões, 1480, Manguinhos, Rio de Janeiro, CEP 21
041-210. E-mail: [email protected]
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provoking fundamental natural resources soil fertility degradation and, mainly, decrease in terms of
the diversity. The objective of this study is to find evidences of the impact of pesticides in rural
workers’ health and, subsequently, to evaluate the microbial activity by means of using soil
microbial biomass indicators (SMB), soil basal respiration (SBR) and metabolic quotient (qCO2),
to check and to discuss the impact level provoked to atmosphere and public health by pesticides
action. The results obtained in the analyses at Paty do Alferes evidenced the indiscriminate use of
pesticides in the productive process of local agriculture and their impact to both health and
environment. Furthermore, the continued exposure to pesticides impaired several farmers’ health,
leading either to chronic deseases, not well defined, or to extremely severe cases.
Keywords: Microbial biomass. Basal respiration. Metabolic quotient. Pesticides. Cholinesterase.
Public health. Environment.
INTRODUÇÃO
As ações antropogênicas são responsáveis por uma série de impactos provocados ao
meio ambiente. Dentre estas, a utilização indiscriminada e abusiva de pesticidas para controle dos
mais diversos tipos de pragas que assolam as plantações destaca-se como bastante predatória para
o meio ambiente e traz sérios prejuízos à saúde da população.
Os prejuízos dos agrotóxicos causados pelo uso inadequado extrapolam o campo
econômico e ganham uma dimensão social, pois, ao prejudicar a saúde humana, demandam
verbas públicas e privadas para o atendimento médico e hospitalar. Somam-se a isso os dias de
confinamento e tratamento da doença. Pode-se, portanto, inferir os impactos causados na
produtividade agrícola e, conseqüentemente, no processo de geração de renda no campo.
Sabe-se que o grau de eficiência dos agrotóxicos diminui à medida que o número de
aplicações aumenta. Isso porque, ao fazer uso dos agrotóxicos, o agricultor, além de erradicar as
pragas, também elimina seus inimigos naturais, ou seja, seus predadores e competidores.
Acrescenta-se o fato de que alguns indivíduos são mais resistentes, o que faz com que, na maior
parte das vezes, as pragas não sejam completamente dizimadas, restando indivíduos com genótipo
mais forte e resistente. O cruzamento desses indivíduos, em adição a uma menor competição por
alimento, espaço e abrigo promove aumentos substanciais na população, fazendo com que a praga
volte mais resistente e a níveis populacionais maiores do que antes da aplicação química.
Além de doses cada vez mais fortes, novos produtos vêm surgindo no mercado com
princípios ativos mais letais e cada vez mais tóxicos à saúde humana. Esse processo inerente à
natureza dos agrotóxicos, além de contribuir para o aumento de suas vendas, é responsável pelo
impacto nocivo na saúde humana e no meio ambiente. O trabalhador rural, ao aplicar doses
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altamente tóxicas, quase sempre sem o devido equipamento de proteção, intoxica-se, podendo,
em alguns casos, morrer prematuramente 1.
Vários fatores contribuem para que os diversos sistemas de produção comportem-se
diferentemente nos ecossistemas. Sem dúvida, o mais importante é o fator solo, com suas
características físicas, químicas e biológicas. O Brasil atua no mercado de agrotóxicos como um
dos principais consumidores do mundo e o maior da América do Sul. Seu consumo é estimado em
mais de 1,5 bilhão de dólares ao ano. Esse quadro tem preocupado bastante os órgãos de saúde
pública, em virtude do grande número de casos de intoxicações e patologias associadas à
exposição de pessoas aos pesticidas. Dados recentes estimam que cerca de três milhões de pessoas
são contaminadas por agrotóxicos em todo o mundo por ano, sendo 70% desses casos nos países
em desenvolvimento1. Somado a isso, existe ainda toda uma preocupação com os efeitos destas
substâncias sobre o meio ambiente e sua relação com o esgotamento dos recursos naturais,
principalmente a água e o solo.
Especificamente na agricultura, na pós-revolução-verde, passou-se a adotar
mundialmente parâmetros para avaliação da sustentabilidade dos agroecossistemas mediante a
utilização de indicadores mensuráveis que pudessem, por exemplo, avaliar a fertilidade do solo2.
Um indicador fornece informações sobre uma dada realidade, podendo sintetizar um conjunto
complexo de informações e servir como um instrumento de previsão. No presente estudo, entendese indicador como um instrumento que permite a avaliação de um sistema e que determina o
nível ou a condição em que esse sistema deve ser mantido para que seja sustentável. Seguindo esta
linha, os indicadores biológicos são parâmetros que têm a capacidade de medir o nível de
desequilíbrio ao qual um determinado ambiente está sujeito. Assim, os indicadores
microbiológicos devem regular os processos ecológicos do solo e refletir as condições dos manejos
atuais, sendo úteis para determinar os efeitos positivos e negativos sobre a qualidade do solo e a
sustentabilidade das práticas agrícolas. Indicadores como a biomassa microbiana do solo (BMS), a
respiração basal do solo (RBS) e o quociente metabólico (qCO2) vão dar informações que servirão
de subsídios para uma avaliação da qualidade do solo3,4,5.
Os microrganismos estão diretamente envolvidos nos ciclos dos nutrientes no solo;
a quantificação de grupos importantes dá indicação de como os processos estão ocorrendo. A
fertilidade natural do solo depende, portanto, da dinâmica de matéria orgânica e ciclagem de
nutrientes, os quais são catalizados pela biomassa microbiana do solo6. A BMS é o principal
componente do subsistema de decompositores que regula a ciclagem de nutrientes, o fluxo de
energia, a produtividade das plantas e dos ecossistemas. Portanto a medição deste compartimento
e sua atividade são relevantes para a conservação dos solos. Assim, o declínio da atividade
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microbiana tem grande impacto na fertilidade natural do solo, com grandes efeitos nos
ecossistemas naturais.
Além de atuar como agente da transformação bioquímica dos compostos orgânicos,
os microorganismos são reservatórios de Nitrogênio (N), Fósforo (P) e Enxofre (S). A estimativa da
biomassa microbiana pode fornecer dados úteis sobre modificações nas propriedades biológicas
dos solos decorrentes dos tipos de manejo aplicados e de diferentes culturas. É um parâmetro
muito dinâmico e, segundo Gonçalves, Monteiro, Guerra e De Polli7, deve ser avaliada juntamente
com a atividade agrícola, em face da extrema heterogeneidade do ambiente natural da microbiota
e de sua diversidade no solo. Além desses indicadores, os quocientes metabólicos, como o qCO2,
razão entre C-CO 2 da atividade microbiana e C de sua biomassa, tornam-se ferramentas
fundamentais na elucidação de fluxos de entrada de elementos ou energia por meio da biomassa
microbiana8.
O objetivo deste estudo é encontrar evidências do impacto dos agrotóxicos na saúde
do trabalhador rural e, subseqüentemente, avaliar a atividade microbiana mediante indicadores
biomassa microbiana do solo (BMS), respiração basal do solo (RBS) e quociente metabólico
(qCO2), para checar e discutir o nível de impacto provocado ao ambiente e à saúde pública pela
ação de pesticidas.
MATERIAL
MA
TERIAL E MÉTODOS
ÁREA DE ESTUDO
A área de estudo localiza-se em Caetés, distrito do município de Paty do Alferes.
Localizado na região serrana do Estado do Rio de Janeiro, esse município tem a agricultura como
exclusiva atividade econômica (cerca de 40% do total dessa atividade é destinada ao cultivo de tomate
e de um grande número de outras olerícolas, tais como: repolho, pimentão, vagem, pepino etc.)9,10.
PESTICIDAS USADOS NA REGIÃO
Os pesticidas encontrados nas visitas feitas aos locais de armazenamento nas 43
lavouras de tomate estão listados no Quadro 1
1. Foram encontrados, entre inseticidas, fungicidas e
acaricidas, 14 produtos comerciais: 4 da classe I (extremamente tóxico), 6 da classe II (altamente
tóxico), 2 da classe III (medianamente tóxico) e 2 da classe IV (pouco tóxico), segundo a
classificação toxicológica do Ministério da Agricultura/Ministério da Saúde, baseada no Decreto no.
98.816/90, de 11 de janeiro de 1990, que regulamenta a Lei no. 7.802/89.
A pesquisa foi realizada com o intuito de, por meio de alguns parâmetros de
qualidade do solo, avaliar o impacto provocado pela utilização de pesticidas na qualidade do
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ambiente e a repercussão deste impacto na saúde da população rural exposta diretamente. O
estudo tem um caráter explicativo, pois visa apresentar as causas que levam a uma situação de
impacto do solo na área de estudo, e um caráter exploratório, em razão da carência de estudos que
abordem o impacto provocado por pesticidas a microbiota do solo e sua relação com a saúde
ambiental e da população.
Quadro 1. Inseticidas, fungicidas e acaricidas utilizados nas 43 lavouras pesquisadas na
área de estudo.
AMOSTRAS
Para cada experimento foram coletadas nove amostras simples de solo de uma área
delimitada de 200 m2 , 20 metros morro acima da plantação de tomate e 10 metros lateralmente,
enumeradas seqüencialmente de 1 a 9, na profundidade de 0-10 cm, utilizando trado tipo copo
junto aos pés de tomate. As amostras foram armazenadas em sacos plásticos devidamente
fechados e levadas, no mesmo dia, ao laboratório de solos da Embrapa (Agrobiologia-UFRRJ).
Após 24 horas as amostras foram destorroadas e peneiradas a uma granulometria de dois mm e
pesadas em balança analítica com precisão de centésimo de grama11.
Para esta pesquisa foram feitas duas coletas em 2005. A primeira no mês de março,
em virtude de a plantação estar na fase de desenvolvimento dos frutos, momento que se caracteriza
pelo uso de uma grande variedade e quantidade de pesticidas nas plantações. A segunda coleta
ocorreu no mês de agosto, na mesma área, após 20 dias do término do ciclo de cultivo do tomate.
Os tomateiros deram lugar à vegetação de pastagem, quase sem nenhum tipo de manejo e sem
aplicação de agrotóxicos.
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DETERMINAÇÃO DE BIOMASSA MICROBIANA E RESPIRAÇÃO DO SOLO
Para a determinação de biomassa microbiana e respiração do solo, foi adotado o
método de fumigação-extração11,12. Três sub-amostras de cada amostra de solo rizosférico foram
fumigadas em dessecador com clorofórmio por 24 horas. Outras três sub-amostras foram deixadas
sem fumigação. A umidade do solo foi determinada secando-se outra sub-amostra numa estufa a
105oC por 24 h. A extração foi feita com K2SO4 0,5 mol L-1, procedendo-se conforme previamente
descrito para a determinação de C orgânico. A determinação do nitrogênio da biomassa
microbiana foi realizada dosando-se NH4+ e NO3- extraídos em K2SO4 0,5 mol L-1 de sub-amostras
de solo fumigadas e não fumigadas. A respiração do solo foi estimada após cinco dias de
incubação. O CO2 produzido pela respiração do solo foi capturado em frascos contendo 20 ml de
NaOH 1 mol L-1, procedendo-se a titulação do excesso de hidróxido de sódio com HCl. O cálculo
do quociente metabólico (qCO2) foi feito por meio da divisão da quantidade de CO2 liberado por
hora pelo C da biomassa microbiana.
A análise de BMS quantifica a parte viva da matéria orgânica do solo, excluindo-se
as raízes e animais maiores que aproximadamente 5x103 µm3 e, funcionalmente, atua como agente
de transformação da matéria orgânica no ciclo de nutrientes e no fluxo de energia13,14. A BMS
representa também a reserva de nutrientes existente no solo que será assimilada nos ciclos de
crescimento dos organismos que compõem o ecossistema 15. Dessa forma, pode-se entender que,
quanto maior for a quantidade de BMS em um determinado solo, maior será sua capacidade de
estocar e processar nutrientes, permitindo que organismos vivos possam fazer uso destes e tenham
facilidade em realizar seus ciclos de desenvolvimento normalmente.
DETERMINAÇÃO DA RESPIRAÇÃO BASAL DO SOLO
A respiração basal do solo (RBS) é a absorção de O2 e/ou liberação de CO2 pelas
entidades vivas e metabolizantes do solo; ela reflete a atividade da microbiota responsável pela
degradação de compostos orgânicos16.
O quociente metabólico (qCO2) é outro valioso indicador de estresse, perturbação
ou estabilidade do ecossistema. Ele indica o estado metabólico dos microrganismos e a quantidade
de energia necessária para a manutenção da atividade metabólica em relação à energia necessária
para a síntese da biomassa17,18.
COLINESTERASE
A classificação dos 106 agricultores que permitiram coleta de sangue para análise da
colinesterase, segundo a faixa etária foi a seguinte: 10,38% têm até 20 anos de idade, 50% entre
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21 e 45 anos, 31,12% entre 46 e 65 anos e 8,5% mais de 65 anos. Dos agricultores, 22% nunca
freqüentaram a escola. Dentre aqueles que a freqüentaram 38% concluíram o primeiro grau. A
escolaridade máxima dos entrevistados foi o segundo grau incompleto (5%). Dentre o grupo
pesquisado, 34 são meeiros, ou seja, indivíduos que plantam em terreno alheio, repartindo o
resultado das plantações com o proprietário, 16 são donos da terra em que trabalham, 31 são
arrendatários, 11 trabalham em terra emprestada, 6 são empregados e 8 são sócios da lavoura. A
classificação de acordo com o tempo de trabalho na lavoura foi a seguinte: 15,1% até 5 anos,
36,79% entre 6 e 15 anos, 43,39% entre 16 e 25 anos e 4,72% acima de 26 anos.
A variável nível de colinesterase divide-se em classes que seriam percentuais do
nível da enzima no sangue. Níveis iguais ou abaixo de 75% indicam intoxicação por agrotóxicos.
Dessa forma, essa variável foi dicotomizada como “intoxicados” e “não intoxicados”, segundo o
valor limite de 75% da enzima na atividade sangüínea.
O nível da enzima colinesterase no sangue é um excelente indicador da relação
entre exposição a agrotóxicos e problemas na saúde. Esta enzima tem como função destruir a
acetilcolina que serve como mediadora das transmissões nervosas no sistema nervoso central,
parassimpático, ortossimpático e nas junções mioneurais. Em excesso, a acetilcolina é prejudicial.
A função da colinesterase é destruir a acetilcolina, dando origem à colina e ao ácido acético,
ambos inofensivos ao organismo humano. A inibição da colinesterase por meio dos compostos
fosforados provoca o acúmulo de acetilcolina e o organismo passa a sofrer uma série de
manifestações, entre as quais estão as seguintes: a) efeitos muscarínicos – brandicardia, miose,
espasmos intestinais e brônquicos, estimulação das glândulas salivares e lacrimais; b) efeitos
nicotínicos – fibrilações musculares e convulsões; e c) efeitos centrais – sonolência, letargia,
fadiga, cefaléia, perda de concentração, confusão mental e problemas cardiovasculares19.
ASPECTOS ÉTICOS DA PESQUISA
O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de ética, parecer 41/04, com base
nas normas estabelecidas pela Resolução 196/96, que trata da pesquisa envolvendo seres humanos.
RESULTADOS
As Tabelas 1 e 2 apresentam os resultados das análises de BMS, RBS e qCO2 obtidos
das amostras coletadas no primeiro e segundo experimento, respectivamente. Esses resultados dão
uma idéia do estado do solo em relação a sua fertilidade e a sua qualidade em duas épocas
distintas, em que ocorreram práticas diferenciadas de manejo.
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Tabela 1. Resultados das análises de BMS, RBS e qCO2 das amostras coletadas no primeiro
experimento.
Tabela 2. Resultados das análises de BMS, RBS e qCO2 das amostras coletadas no segundo
experimento.
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Quanto aos resultados da BMS, comparando-se os resultados do primeiro
Tabela 1
Tabela 2
experimento (T
1) com os do segundo experimento (T
2), pôde-se observar que a média
dos valores da primeira coleta é inferior (157,96 µgC/g solo) ao da segunda (206,12 µgC/g solo). A
variação dos resultados trabalhada estatisticamente pelo desvio padrão (DP), a amplitude de
variação (AV) e o coeficiente de variação (CV) mostraram uma diferença entre os valores das duas
coletas. Pela análise do desvio padrão, pôde-se observar que as amostras coletadas em março
apresentaram uma variação de resultados de BMS bem mais acentuada em torno da média do que
as amostras coletadas em agosto. Isso foi ratificado pelo coeficiente de variação das amostras de
março que se apresentou bem superior ao das amostras de agosto, refletindo maior dispersão dos
valores individuais das amostras em torno do valor da média dos resultados. Um outro dado de
confirmação é a amplitude de variação nas amostras; na de março, os valores máximos e mínimos
estavam muito mais distanciados que nas amostras da segunda coleta.
Numa análise comparativa entre amostras do primeiro e segundo experimentos,
pôde-se observar que o valor médio da primeira coleta era ligeiramente inferior (1,02 µgC.gP1
Psolo/hora) ao da segunda (1,17 µgC.gP-1Psolo/hora). Os valores de RBS das amostras referentes às
duas coletas, trabalhados estatisticamente, comprovam a alta variação dos resultados obtidos. As
amostras das duas coletas apresentaram variações semelhantes. Os valores das amostras oriundas
da segunda coleta apresentaram-se ligeiramente maiores que os valores das amostras da primeira
coleta. Os valores individuais das amostras de agosto, além de apresentarem uma variação maior
em torno da média aritmética (DP= 0,63) desses valores, apresentaram também uma amplitude de
variação e uma dispersão dos valores em relação à média ligeiramente maior do que os valores das
amostras de março.
Quanto aos resultados do qCO2 na comparação entre os valores médios das
amostras da primeira com as da segunda coleta, pôde-se observar que o valor médio da primeira
coleta foi superior (12,02 µgC-CO2 h-1 x 103 µgC.biom g-1solo) ao da segunda (5,59 µgC-CO2 h-1 x
103 µgC biom g-1solo). O estudo estatístico feito com os valores das amostras da primeira coleta e
da segunda, mostrou que os valores das amostras de março apresentaram uma dispersão em
relação à média bastante elevada se comparado às amostras de agosto. Isso foi ratificado pelos
resultados do C.V. que comprovaram, percentualmente, que a dispersão dos valores das amostras
da primeira coleta foi mais de duas vezes maior do que a dispersão da segunda coleta. Deve-se
considerar também que os valores de qCO2 das amostras de março apresentaram uma amplitude
de variação alta comparados aos valores das amostras de agosto.
Na pesquisa com os 106 agricultores, encontrou-se 64 agricultores com nível de
colinesterase de até 75%, 32 com nível de colinesterase de 76 a 85% e com 10 com nível de
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3 Ficou evidente o quadro tóxico grave em 60,37% dos
colinesterase de 86 a 100% (T
Tabela 3).
pesquisados. A convivência com os agrotóxicos e a falta de informação da população têm gerado
um quadro dramático de intoxicações agudas, além de não existirem informações acerca da
morbidade resultante do uso desses produtos.
Tabela 3. Resultados dos exames de colinesterase sangüínea em agricultores no Município
de Paty do Alferes.
DISCUSSÃO
Os resultados obtidos mostraram que os valores menores de BMS e maiores de
qCO2, para as amostras de março, evidenciaram que o solo encontrava-se mais impactado no
período em que ocorreu o plantio e que esse impacto já era menos acentuado no período em que
o solo se encontrava em uma fase não agricultável e sob vegetação de pastagem, como em agosto.
Indicam também que nesse período o solo apresentava alterações em suas propriedades biológicas,
possuindo um menor potencial produtivo decorrente do manejo ao qual é submetido. Isso, além
de gerar um estresse a este ecossistema, repercute na queda de produtividade do solo pelo uso de
pesticidas.
Comparando-se ainda os resultados das análises, tanto de março quanto de agosto,
fica evidenciado que há uma situação de estresse no solo estudado em Paty do Alferes. Essa
situação é traduzida em perda de fertilidade do solo, logo, perda de produtividade das plantações e
aumento do problema com pragas. Como forma de remediar esta situação, o agricultor vê como
solução a utilização de pesticidas com mais freqüência e em maior quantidade.
A maior parte dos pesticidas utilizados acaba atingindo o solo e as águas,
principalmente pela deriva na aplicação, controle de ervas daninhas, lavagem das folhas tratadas,
lixiviação, erosão, aplicação direta em águas para controles de vetores de doenças, resíduos de
embalagens vazias, lavagens de equipamentos de aplicação e efluentes de indústrias de
agrotóxicos. Hoje, o foco de atenção é a conservação da diversidade de microrganismos. A
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importância destes organismos reside no papel ecológico chave que desempenham no
funcionamento dos ecossistemas, destacando-se, entre outras, as atividades microbianas de
decomposição. Considera-se também que os microrganismos são responsáveis primários pela
degradação e desintoxicação de muitos contaminantes ambientais.
A utilização de pesticidas e a mecanização da lavoura promovem o aumento da
degradação do solo, a diminuição da fertilidade e o aumento da infestação por pragas, gerando um
círculo vicioso: uso de pesticidas, aumento de pragas, aumento do uso de pesticidas. A
preocupação com este tema resultou na comparação dos resultados dos índices de qualidade do
solo com os números de casos clínicos de intoxicação crônica de agricultores revelados por
levantamentos feitos em literatura. Este quadro leva à busca de um indício, de um nexo associativo
entre a degradação do ambiente, em decorrência do uso abusivo de pesticidas, e os casos de
intoxicação ocorridos na região, decorrentes da exposição aos pesticidas.
Os pesticidas figuram atualmente como um dos principais poluidores e agentes
causadores de impacto nos agroecossistemas, sendo responsáveis pelos mais diversos tipos de
interações que, em muitos casos, levam à degradação dos recursos naturais fundamentais para
fertilidade do solo, a alterações em sua estruturação, ciclagem de nutrientes e, principalmente, na
diminuição da diversidade8. Desta forma, mudanças na composição ou atividade da comunidade
microbiana podem levar a efeitos imediatos e permanentes no funcionamento do ecossistema.
Casos de intoxicações por agrotóxicos são freqüentemente observados e relatados
pelos trabalhadores. O uso desordenado e excessivo desses produtos acarreta também impacto
econômico negativo nos agricultores, com nítidas repercussões sociais. Os prejuízos causados pelo
uso inadequado dos agrotóxicos extrapolam o campo econômico e ganham uma dimensão social,
pois, ao prejudicar a saúde humana, demandam verbas públicas e privadas para o atendimento
médico e hospitalar. Somam-se a isso os dias de confinamento e tratamento da doença, que
causam impactos na produtividade agrícola e, conseqüentemente, no processo de geração de renda
no campo.
É importante ressaltar que, embora com riscos direto e indireto para os agricultores,
formuladores ou comerciantes, os agrotóxicos estão presentes no dia-a-dia da população, por meio
dos resíduos nos alimentos. Por outro lado, dados de estudos locais mostraram que, na cultura de
tomate, 17% das amostras provenientes da produção industrial estavam impróprias para consumo,
em virtude dos níveis de metamidofós encontrados; a situação da produção de tomate de mesa foi
mais grave, visto que 58,6% das amostras de tomate violaram o estabelecido pela legislação
brasileira com respeito a resíduos tóxicos, com valores acima do permitido para o inseticida
organofosforado metamidofós e a presença ilegal do organoclorado endosulfan9,10.
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Neste sentido, a identificação e implementação de práticas agrícolas que
minimizem a perda de energia e que mantenham a produtividade em níveis satisfatórios é um
desafio para produtores e pesquisadores. É importante ressaltar que a diversidade é a questão chave
no fluxo de energia do sistema. O solo é o maior reservatório de C da Terra, sob a forma de
matéria orgânica. A busca da sustentabilidade é, portanto, crucial, pois possibilitará, em longo
prazo, a manutenção da capacidade produtiva, a viabilidade e a qualidade da vida, a conservação
do ambiente e a minimização dos agravos à saúde pública.
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ENSAIO
INTERDISCIPLINARIDADE E TRANSVERSALIDADE: OPERACIONALIZANDO O
CONCEITO DE RISCO NO ÂMBITO DA VIGILÂNCIA SANITÁRIA a
Maria Ligia Rangel-S b
Resumo
O artigo discute os desafios para a operacionalizaão do conceito de risco no âmbito
da vigilância sanitária, com o objetivo de contribuir com a formulação de estratégias nesse campo.
Apresenta alguns argumentos que sustentam o debate para o desenvolvimento de práticas
interdisciplinares e transversais no controle de risco no âmbito dessas vigilâncias. Consideram-se as
abordagens do risco em diversas disciplinas que fragmentam o olhar sobre esse objeto complexo,
ao longo do processo de desenvolvimento científico e tecnológico. Consideram-se também as
principais características dos riscos na sociedade contemporânea, em suas dimensões econômica,
política e ideológica, e as formas de atuação do Estado, em especial das ações de vigilância
sanitária. Finalmente, alguns desafios referentes à recomposição do olhar e à reconstrução de
práticas são destacados, para estimular o debate sobre o desafio de operacionalizar o conceito de
risco nas vigilâncias, na proteção e promoção da saúde.
Palavras-chave: Risco. Interdisciplinaridade. Vigilância sanitária.
INTERDISCIPLINARY AND TRANSVERSALLY FOCUSED ACTIONS:
OPERATING THE CONCEPT OF RISK AT SURVEILLANCE ACTIVITIES
Abstract
The article discusses some challenges in operating with risk concept in health
surveillance activities, in order to contribute to the formulation of practices in this field. Some
arguments are presented to support the debate for the development of interdisciplinary and
transversally focused actions for the risk control at surveillance activities. Risk approaches are
considered in different disciplines that fragment the vision over this complex object, along
scientific and technologic development. They are also considered the main characteristics of risk in
a
b
Texto apresentado, em síntese, na Mesa Redonda Interdisciplinaridade e Transversalidade: Operacionalizando o Conceito de
Risco no Âmbito das Vigilâncias, na I Jornada Norte-Nordeste de Vigilância Sanitária e III Semana de Vigilância Sanitária de
Natal, realizadas em Natal, de 22 a 25 de novembro de 2005.
Instituto de Saúde Coletiva (ISC), Universidade Federal da Bahia (UFBA).
Endereço para correspondência: [email protected]
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contemporary society, including the economic, political and ideological dimensions and State
actions, mainly for surveillance activities. Finally, some challenges are pointed out that refer to the
reconstruction of view and practices, in order to stimulate the debate on challenges for operating
the concept of risk in health protection and promotion.
Keywords: Risk. Interdisciplinary. Health surveillance.
INTRODUÇÃO
O presente artigo propõe-se a refletir sobre o desafio de operacionalizar a
interdisciplinaridade no olhar em torno do risco à saúde, e a transversalidade nas ações de
Vigilância Sanitária (VISA). Esses temas impõem-se na sociedade contemporânea, dada a grande
relevância dos riscos nessa sociedade, desafiando a operacionalização do seu controle, tornandose, por esta razão, eixo temático em diversos fóruns voltados para a vigilância, a exemplo das
últimas conferências de saúde.
A interdisciplinaridade convoca a integralização do olhar sobre o objeto do
conhecimento e da ação, que ao longo da história da modernidade, nos três últimos séculos, em
decorrência do desenvolvimento científico e tecnológico, foi fragmentado em diversas disciplinas,
levando à especialização, ou seja, à delimitação de campos cada vez mais específicos para se
abordar aspectos particulares da realidade. Na segunda metade do século XX, impõe-se a busca
pela comunicação entre as especialidades e pela recomposição da organização do trabalho
fragmentado e alienante. Esse fenômeno é também observado no trabalho em saúde1, cuja
recomposição se tenta realizar mediante o trabalho em equipe multiprofissional2.
A noção de transversalidade surge para tentar superar a hierarquização de saberes
disciplinares que, no processo referido, gerou concentração de valores em torno de uns, em
detrimento de outros. Assim, essa noção sugere que o conhecimento atravesse as estruturas,
rompendo hierarquias de conteúdos, de disciplinas, de instituições e organizações. Isso implica
em questões organizacionais de como as práticas se estruturam, e em questões políticas de
desconcentração de poder. Na transversalidade, todos os conhecimentos e idéias são válidos e
todas as ações são importantes, embora algumas possam ser mais complexas do que outras.
Portanto esse tipo de ação facilita a descentralização e a horizontalização; possibilita a conexão/
confronto interinstitucional ou intra-institucional; permite o aumento de comunicação entre os
diferentes membros de cada grupo e entre os diferentes grupos; facilita a produção de
conhecimento compartilhado e a solidariedade entre os grupos.
A noção de transversalidade remete à noção de Rede, cujo conceito, de acordo com
3
Rovere , traz uma mensagem de cooperação e articulação e não incorpora contradições difíceis de
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conciliar, como ocorre com outros conceitos de circulação freqüente no setor saúde. Contudo,
para o autor, democratizar, articular, conectar, coordenar podem se expressar melhor com o uso do
conceito no plural: redes. Pode denominar, por exemplo, toda a infraestrutura de uma instituição,
como uma rede de redes, conformando uma unidade.
Alguns pontos precisam ser aprofundados, para compreender-se o desafio da
interdisciplinaridade e da transversalidade no âmbito das vigilâncias, destacando-se, neste artigo,
os seguintes aspectos: o conceito de risco no senso comum e na ciência; o controle do risco e
vigilância sanitária na sociedade contemporânea.
RISCO NO SENSO COMUM E NA CIÊNCIA
O termo risco é considerado polissêmico, por ter diferentes significados, seja no
senso comum, seja no campo científico. No senso comum, o risco é tomado como perigo,
expectativa de um evento desagradável, ruim ou indesejado. No campo científico, são diversos os
significados, mesmo em uma única disciplina, embora, em muitas delas, encontre-se subjacente a
idéia de incerteza ou de dimensionamento da incerteza, tendo como base o conceito estatístico de
probabilidade. Na engenharia de segurança, o risco é concebido como probabilidade de ocorrência
de dano em certo tempo ou número de ciclos operacionais de um processo produtivo, que pode
acarretar dano ou azar. No campo da saúde, o conceito de risco fundamenta as práticas da clínica
e da saúde pública, cujos significados desdobram-se da definição de risco utilizada na
epidemiologia. Nesta, o risco corresponde a uma probabilidade de ocorrência de um evento, em
um determinado período de observação, e à incidência cumulativa4. Na saúde pública, a aplicação
do conceito é também probabilística, mas utilizada para a identificação de grupos populacionais
que diferem entre si em relação à probabilidade de desenvolver eventos relativos à saúde. Aplicado
para a planificação e gestão, permite a identificação de grupos de maior risco, para os quais se
deveriam voltar as prioridades da atenção à saúde. Vale ressaltar que esta é uma lógica implícita
na vigilância à saúde, que, orientada pelo princípio da eqüidade, precisa identificar as
desigualdades do adoecer e morrer. Neste caso, o risco se situa para além e para fora dos sujeitos,
no âmbito da população, e é produzido ou atribuído a coletivos humanos.
O risco visto assim, objetivamente, em fatores identificáveis na coletivdade, torna
possível seu controle e redução, a partir de intervenções programadas sobre as condições objetivas.
Essa noção, contudo, não fica isenta de derivações de ordem econômica, política e ideológica.
Segundo Duclos5, ela se filia a uma concepção que Short chama de uma verdadeira indústria de
análise do risco. Desenvolvida especialmente nos Estados Unidos, para ela são constituídos
quadros comparativos de avaliação social dos riscos, que buscam exprimir a variação em termos
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monetários e propiciam o desenvolvimento de estratégias de gerenciamento do risco. Isso, segundo
o autor, tem influenciado o modo de pensar dos atores em corpos profissionais distintos.
O risco tem sido objeto de estudos diversos, desde a década de 1960, nas
abordagens quantitativas e nas qualitativas, nos mais variados campos de conhecimento. Estudos
recentes em torno do risco reconhecem as significativas contribuições de Beck e Giddens, como
principais autores/leitores do risco na sociedade contemporânea a partir da década de 19806,7, 8, 9,10.
Estes estudos oferecem trajetórias e especificidades dos modos como o risco vem sendo abordado
na sociedade e em diversas disciplinas acadêmicas. As contribuições de Beck e Giddens são
referidas na literatura recente sobre o risco, especialmente reconhecendo-se a centralidade
conferida por estes autores ao risco, particularmente o ambiental e tecnológico, na teoria social,
para entender o projeto histórico da modernidade reflexiva. Contudo, são os estudos realizados por
Douglas11 que inauguram a análise cultural do risco nas Ciências Sociais, ainda na década de
1960, identificando a diversidade de racionalidades leigas e peritas em torno do risco. Com
Wildasky12, é desenvolvida a idéia de escolhas sociais de riscos aos quais os indivíduos ou grupos
se submetem, relacionadas a valores éticos e morais conformados em culturas particulares.
Mas são Beck e Giddens que relacionam o risco às profundas mudanças da
sociedade globalizada. Em sua análise sociológica, Beck13:21 define o risco como “[...] um modo
sistemático de lidar com o perigo e incertezas induzido e introduzido pela modernização em si.
Risco, em oposição aos velhos perigos, são conseqüências relacionadas com a força ameaçadora
da modernização e com a globalização da dúvida.” Beck13 enuncia cinco teses sobre a distribuição
do risco na sociedade: 1) o risco produzido na modernidade tardia, caracterizado por sua
diversidade extrema e por sua capacidade de escapar da habilidade perceptiva humana; 2) a
distribuição dos riscos é assimétrica, variando com a posição de classe social; 3) a difusão e
comercialização dos riscos levam a lógica do capitalismo a um outro estágio, havendo sempre
perdedores e vencedores nas definições de risco; 4) na sociedade de risco, a consciência determina
o ser, de modo que o conhecimento ganha um significado político; 5) a catástrofe emerge com um
potencial político, implicando na reorganização do poder e da autoridade.
A leitura de Beck13 e Giddens14 mostra os limites da racionalidade instrumental para
assegurar certezas, o que significa a limitação da própria ciência para controlar riscos na sociedade
pós-industrial, em face das evidências históricas das grandes catástrofes de origem tecnológica.
Segundo Guivant15, Beck entende esses fenômenos não como efeitos, mas como parte intrínseca de
um modo de organizar e produzir na sociedade, quando o progresso conduz à autodestruição da
mesma. Beck13 destaca três planos, nos quais as transformações se processam: 1) as relações da
sociedade da indústria moderna com os recursos naturais e culturais; 2) as relações da sociedade
com os perigos e problemas que produz; e 3) as fontes de significado, como consciência de classe
ou confiança no progresso.
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Os autores convergem na constatação de que há múltiplas racionalidades em torno
do risco, o que, por vezes, gera conflitos, especialmente na relação entre cientistas/peritos e leigos.
Experiências de situações concretas de risco têm levado a julgamentos de risco por parte de peritos,
fundados em lógicas das diversas disciplinas e, ainda, em variáveis de cunho econômico, político
e moral, podendo conduzir à perda da confiança e credibilidade de leigos em instituições
supostamente responsáveis por assegurar a proteção, sejam elas empresas, hospitais, agências
regulatórias dos riscos ou outras.
Observando as relações sociais em torno dos riscos, Beck13 afirma que cientistas
determinam riscos enquanto populações os percebem, e este é um ponto de divergência em um
suposto diálogo sobre os riscos. Por sua vez, Douglas12 observa que valores sócio-culturais estão
implicados nas escolhas de grupos sociais para se submeterem a determinados fatores de risco, de
modo que, na sociedade, idéias de justiça influenciam a aceitação de grupos sociais a se
submeterem a determinados fatores de risco. Ainda observa que alguns eventos de grande monta,
que afetaram grande contingente populacional e produziram extensos danos à vida e à saúde
humana, acabaram ligando, de forma consistente, o risco à religião.
Também pesquisadores da área da engenharia como Duclos5, Lagadec16 e Sevá
Filho 17, e ergonomistas como Wisner18, têm mostrado que os riscos existem em meio a relações
sociais complexas. Duclos5 destaca que a prevenção dos riscos nos espaços produtivos é ao mesmo
tempo simbólica e prática; ou seja, é possível identificar que estratégias de prevenção se destinam
a um certo funcionamento de relações sociais nos locais de trabalho, mais do que propriamente à
redução do risco técnico em si. Assim, o discurso normativo de saúde e segurança imposto a
trabalhadores parece cumprir mais uma função ideológica de controle e disciplinamento da força
de trabalho, que de proteção contra eventos mórbidos, como o acidente e a doença do trabalho,
obscurecendo-se alguns fatos da realidade e favorecendo o controle de modos de apreensão social
do fenômeno19. Duclos5 enfatiza que fatores psicológicos, cognitivos e defensivos da relação do
trabalhador com os fatores de risco no trabalho se articulam com as relações políticas e
ideológicas dentro das empresas.
Vê-se então o risco, esse objeto complexo que a vigilância sanitária se propõe a
controlar, representado mediante múltiplas abordagens nas diversas disciplinas que conformam o
referencial da ação dos diferentes sujeitos da vigilância sanitária: farmacêuticos, médicos,
veterinários, engenheiros, educadores etc. Estes enfrentam o desafio de construir um olhar
integralizador do conhecimento e da ação, no contexto de uma sociedade em que o controle de
riscos assume especificidades que lhe são próprias e que diferem do controle de riscos na
sociedade disciplinar7.
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de Saúde Pública
CONTROLE DE RISCOS E VIGILÂNCIA SANITÁRIA
A sociedade atual gera incessantemente novos riscos e cria paralelamente
tecnologias de controle. Em face da emergência de numerosos fatores e situações de risco à saúde
nessa sociedade, a vigilância sanitária passou a operar em uma densa gama de competências,
ampliando cada vez mais sua abrangência e densidade para o controle de riscos em áreas de
interesse da saúde, tais como: tecnologias médicas; serviços direta ou indiretamente relacionados
com a saúde; portos; aeroportos; fronteiras; saúde dos viajantes; aspectos do ambiente e da saúde
do trabalhador20 . Assim, a diversidade de ações se impõe ao campo de atuação da vigilância
sanitária, envolvendo vários setores, para tratar de fenômenos sociais complexos, dirigindo-se para
o controle de riscos oriundos da produção, circulação e consumo de bens e serviços de saúde.
Essa mesma sociedade, marcada por um intenso e acelerado desenvolvimento
tecnológico, deu lugar ao discurso do risco, que passou a desempenhar papel fundamental na
estruturação, reprodução e reparo do projeto histórico da modernidade13, em função da crise de
legitimação resultante de eventos de grande monta que afetaram amplos contingentes
populacionais e produziram extensos danos ao ambiente, à vida e à saúde humana. São exemplos:
o acidente nuclear de Three Mile Island (TMI), em 1979, e, no Brasil, o acidente radioativo de
Goiânia, em 1987, o de Vila Socó (Cubatão, SP), em 1984, um dos 13 acidentes dessa natureza,
ligados à indústria, ocorridos no mundo inteiro entre 1974 e 198717. Nesse país, mais diretamente
vinculados ao âmbito da ação da vigilância sanitária, destacam-se a implantação de próteses de
silicone, que se disseminou e contagiou a população como uma epidemia, desconhecendo-se os
riscos implicados nesse procedimento21; as 94 mortes de velhinhos na Clínica Genoveva no Rio de
Janeiro, em 1996; a tragédia do Instituto de Doenças Renais (IDR) de Caruaru (PE), em 1996,
causando a morte de 71 pacientes; as 22 mortes causadas pelo Celobar, em 2003, em Goiás; entre
outras. São escândalos e tragédias que se repetem, levando ao rebaixamento da já problemática
confiança da população nos órgãos regulatórios, abalando a credibilidade em serviços de saúde e
de tecnologias biomédicas.
A despeito dessa complexidade, a VISA no Brasil ainda se caracteriza por um papel
eminentemente normativo e fiscalizador; a decisão e organização das ações de VISA possuem
tradição centralizadora e vertical; as ações são desarticuladas e fragmentadas em setores. A
vigilância sanitária, no Brasil, enfrenta uma luta incessante entre o econômico e o social e
necessita transmitir para a população idéias sobre os riscos na perspectiva da proteção e promoção
da saúde. De todo modo, vem desenvolvendo, ao longo dos últimos anos, um profundo trabalho
de reflexão crítica do seu modus operandi, buscando romper com a tradição predominantemente
normativa e fiscalizadora, para se ver comprometida com um papel social de regulador abrangente,
que a vincula, definitivamente, ao núcleo central das relações de poder da sociedade industrial.
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Nesse contexto, a análise de risco, que envolve a triangulação entre cálculo,
percepção e gerenciamento do risco, converte-se, nos anos 80, conforme Porto e Freitas20, tanto em
uma resposta política à formação de consenso social nos processos decisórios, como em uma
resposta técnica às preocupações coletivas, embora, como entendem os autores, seu caráter
político se sobreponha à dimensão técnica. Deste modo, a complexidade que envolve o risco na
sociedade atual torna impossível compreendê-lo apenas na perspectiva da análise do risco, uma
vez que o controle é mediado por um conjunto de valores de natureza econômica, a exemplo do
adicional de insalubridade e periculosidade; políticas/normas que regulam relações em torno dos
riscos e fundamenta lutas econômicas e políticas de trabalhadores e lutas sociais para proteção da
saúde; e ideológica, como a confiança e a credibilidade14.
Desse modo, mostra-se a complexidade do controle do risco na sociedade
contemporânea, impondo-se a necessidade da comunicação entre as diversas disciplinas e a
organização da ação, de modo a integrá-las.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Dessa reflexão, a interdisciplinaridade e a transversalidade no âmbito das vigilâncias
enfrentam vários desafios. Os sujeitos da ação estão imersos em culturas das diversas instituições e
organizações, formados com diferentes visões das diversas disciplinas, portanto, sujeitos com
visões disciplinares fragmentadas em relação ao objeto da ação. Esta é segmentada em setores, de
modo que os agentes das vigilâncias deixam escapar de seu olhar a profunda interação entre
produção, circulação e consumo e a saúde do trabalhador e do ambiente, ao lado da salubridade
dos produtos e processos.
As instituições governamentais, organizadas para exercer o controle disciplinar sobre
o risco, possuem forte tradição de concentração de poder e de ação fiscalizadora, com caráter
inspirado na polícia médica do início do século passado. Contudo, o controle de riscos na
sociedade atual requer, em primeiro lugar, a ruptura com a visão e a prática fiscalizadoras
realizadas pela vigilância sanitária, para por em ação um projeto que evidencie a prática de
proteção e promoção da saúde, frente à verdadeira avalanche de produtos e serviços despejados no
mercado cotidianamente, acometendo o ambiente e a saúde de trabalhadores e de consumidores.
Em segundo lugar, cabe refletir quanto à conformação de novos sujeitos da ação: que sujeitos são
necessários? Com que olhares, para que ação sobre objeto tão complexo? Qual a formação
necessária? Como incorporar o olhar das diversas disciplinas ao controle de risco no âmbito das
Visas? Em terceiro lugar, é necessário pensar o desafio do diálogo, da comunicação entre atores
sociais em meio a relações de conflito, especialmente entre leigos e experts; as relações de poder
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entre Estado e sociedade e as múltiplas dimensões sociais e culturais que envolvem o fenômeno
risco. O principal desafio, portanto, não parece ser a articulação formal, mas o encontro político e
cultural, o diálogo e a participação, considerando-se que a adesão a práticas saudáveis, seja pelo
setor regulado, seja pelos demais grupos sociais, pode ser uma questão de negociação não só
econômica e política, mas também de entendimentos.
Nesse sentido, ganha relevância a construção de redes, pelo seu potencial de
democratização, horizontalização e abertura para a criação de novas formas de construir e
compartilhar o conhecimento e a ação. Em torno das redes poder-se-ia representar as expectativas e
a articulação das pessoas de uma instituição, podendo-se abrir e articular-se com outras que
possuam interesses comuns. Pressupõe-se, em todo caso, a existência de um diálogo implícito ou
explícito e da mútua influência entre as noções de redes e o planejamento estratégico, o que
permite enriquecer os instrumentos teórico-metodológicos.
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Recebido em 16.01.2006. Aprovado em 19.06.2006.
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ENSAIO
AVANÇOS E LIMITES DA DESCENTRALIZAÇÃO NO SUS E O “P
ACTO DE GESTÃO”
“PACTO
Jorge José Santos Pereira Sollaa
Resumo
O Sistema Único de Saúde (SUS) do Brasil é um dos maiores sistemas públicos de
saúde do mundo e tem na descentralização da gestão um de seus princípios mais importantes. O
presente artigo recupera a construção do processo de descentralização no SUS desde as definições
constitucionais, passando pelas diversas iniciativas de normatização efetivadas. Identifica seus
avanços, inclusive aqueles realizados nos últimos anos, realiza um diagnóstico dos principais
limites, contradições e obstáculos existentes e discute a proposta recentemente aprovada de “Pacto
de Gestão”; identifica suas insuficiências e problemas e aponta a necessidade de superar lacunas
existentes.
Palavras-chave: Descentralização. Sistema de Saúde – SUS. Sistema Único de Saúde.
Administração de Serviços de Saúde.
ADVANCES AND LIMITATIONS IN THE SUS´ DESCENTRALIZATION
AND THE “MANAGEMENT PACT”
Abstract
The Brazilian Unified Health System (SUS) is one of the largest public health
systems in the world and has in management decentralization of one of its more important
principles. The present article reviews the construction of SUS decentralization process from the
constitutional definitions, going through the many normatization initiatives. It identifies its
advances, including those carried through in recent years, develops a diagnosis of the main
limitatons, contradictions and obstacles and argues in favor of the recently approved proposal of
the “Management Pact”, at the same time it identifies its insufficiencies and problems, by pointing
the necessity to surpass the existing gaps.
Keywords: Decentralization. Health System. SUS (BR). Health Services Administration.
a
Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal da Bahia.
Endereço para correspondência: Rua Basílio da Gama, s/n - Campus Universitário Canela - Cep: 40.110-040 - Salvador – BA.
E-mail: [email protected]
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INTRODUÇÃO
O presente estudo tem como objetivo realizar uma breve sistematização do processo
de descentralização da gestão do Sistema Único de Saúde (SUS). Destaca seus principais avanços e
limitações e desenvolve uma análise preliminar do mais recente instrumento introduzido, o “Pacto
de Gestão”. Para tanto, é desenvolvida uma análise de referências bibliográficas, documentos
normatizadores do processo de descentralização, aprovados pela Comissão Intergestores Tripartite
(CIT) e sancionados pelo Ministério da Saúde, e de bases de dados do Sistema de Informação
Ambulatorial do SUS (SIA/SUS), Sistema de Informação Ambulatorial do SUS (SIH/SUS), dados
das Programações Pactuadas Integradas (PPI), do Sistema de Informação sobre Orçamentos
Públicos em Saúde (SIOPS) e de transferências de recursos do Fundo Nacional de Saúde (FNS) para
os Fundos Estaduais e Municipais de Saúde. Todos estes dados estão disponíveis na Internet, nos
sítios do Ministério da Saúde – área da Secretaria de Atenção à Saúde (SAS) – e no Departamento
de Informática do SUS (DATASUS).
CONSTRUÇÃO DA DESCENTRALIZAÇÃO NO SUS
O Sistema Único de Saúde (SUS) é um dos maiores sistemas públicos de saúde do
mundo, propondo-se a garantir assistência integral e gratuita para a totalidade da população
brasileira. Mesmo os 40.281.718 beneficiários de operadoras da saúde suplementar (21,6% da
população, conforme dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar), utilizam pelo menos
uma parte das ações e serviços pelo SUS: vigilância sanitária, vigilância epidemiológica e controle
de doenças e vetores, imunização e, muitas vezes, procedimentos de alta complexidade e maior
custo, que nem sempre são cobertos pelos planos privados de saúde.
A rede de serviços do SUS possui 63.662 unidades ambulatoriais e 5.864 hospitais,
com 441.591 leitos, responsáveis por cerca de 12 milhões de internações por ano. Em 2005, o
SUS realizou mais de 1,1 bilhão de procedimentos de Atenção Básica e pela primeira vez superou
a marca de 1 bilhão de procedimentos ambulatoriais especializados. São 2,3 milhões de partos por
ano, mais de 100 mil procedimentos de hemodinâmica, mais de 14 mil transplantes de órgãos e
97% da oferta de terapia renal substitutiva (8,9 milhões de procedimentos realizados em 2005) –
dados do Sistema de Informação Ambulatorial e do Sistema de Informação Hospitalar do SUS –
SIA/SUS e SIH/SUS.
O Brasil é um país complexo, com dimensão geográfica continental e marcado por
uma estrutura econômico-social bastante heterogênea, com grandes diferenças regionais e
distribuição profundamente desigual de serviços e de profissionais de saúde. Tal quadro aponta a
importância da descentralização das políticas públicas, inclusive na área de saúde. Além disso,
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trata-se de um sistema federativo especial, em que os municípios são entes federativos, dotados de
autonomia política, administrativa e financeira, com um papel de protagonista da gestão do
sistema de saúde em seu território, definido constitucionalmente.
Acrescenta-se que o desafio de construir o SUS se dá em um contexto extremamente
complexo e adverso, com um quadro de morbi-mortalidade em que se observa a convivência de
doenças típicas do subdesenvolvimento, com alta prevalência de doenças crônicas, alta incidência
de agravos devidos a causas externas, progressivo envelhecimento populacional e demandas
crescentes por serviços de alta complexidade. Além disso, observa-se um quadro de incorporação
tecnológica intensa, acrítica e abusiva no setor saúde, uma cultura política conservadora,
clientelista e fisiológica hegemônica, fortes pressões corporativas e empresariais, relação públicoprivada fortemente marcada pela privatização da coisa pública e baixos níveis de financiamento do
sistema.
Na Constituição de 1988, a saúde passou a ser entendida como direito social
universal, direito de cidadania e as ações e serviços de saúde caracterizados como de relevância
pública. Este direito social (direito à saúde) deve ser assegurado pelo Estado1. A saúde vai se inserir
em um conjunto de direitos sociais (dos trabalhadores, à saúde, à segurança social etc.) que
necessitam do papel do Estado para sua garantia; ou seja, são direitos a serem assegurados pelo
Estado.
Enquanto os direitos de liberdade nascem contra o superpoder do Estado – e, portanto,
com o objetivo de limitar o poder –, os direitos sociais exigem, para sua realização
prática, ou seja, para a passagem da declaração puramente verbal a sua proteção efetiva,
precisamente o contrário, isto é, a ampliação dos poderes do Estado.
2:72
Cabe lembrar que as proposições da reforma sanitária se deram em direção contrária
às propostas de reforma do Estado, hegemônicas na década de 1980, e a implantação do SUS, nos
anos 1990, se deu em uma conjuntura desfavorável, sofrendo os efeitos das medidas voltadas para
o desmantelamento do aparelho de Estado durante os governos Fernando Collor e Fernando
Henrique Cardoso3, 4.
Após a nova Constituição da República5, foram diversas as iniciativas institucionais
e legais voltadas para criar as condições de viabilização plena do direito à saúde, destacando-se, no
âmbito jurídico institucional, as chamadas Leis Orgânicas da Saúde – nº. 8.080/906 e nº 8.142/907
– e as Normas Operacionais Básicas (NOB). As leis orgânicas regulamentaram o SUS, agregando
todos os serviços estatais – federal, estadual e municipal – e os serviços privados contratados/
conveniados. As normas operacionais básicas têm sido instrumentos de regulamentação que,
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progressivamente, têm aprofundado o processo de descentralização da gestão do sistema de saúde
e definido as relações entre as três esferas de governo. A NOB 01/91, ainda editada pela
presidência do INAMPS, estabeleceu a transferência de recursos para estados e municípios, por
meio de convênios, considerando estes entes federativos como prestadores de serviços.
A NOB/SUS 01/93 criou três alternativas de gestão para as instâncias subnacionais,
expressando graus crescentes de descentralização: incipiente e parcial, na qual continuavam apenas
como prestadores de serviços ao SUS; e a gestão semi-plena, na qual, pela primeira vez, alguns
municípios passaram efetivamente a assumir a gestão do sistema de saúde. Esta NOB estabeleceu
o funcionamento de instâncias colegiadas de gestão do SUS: as Comissões Intergestores Tripartite
(CIT – nacional) e Bipartites (CIB – estaduais).
A Lei nº 8.689, de 27 de julho de 1993, extinguiu o Instituto Nacional de
Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS), transferiu para estados e municípios
atribuições, pessoal, equipamentos e imóveis, criou o Sistema Nacional de Auditoria e estabeleceu
que os recursos de custeio dos serviços fossem repassados de forma regular e automática do Fundo
Nacional de Saúde para os fundos estaduais e municipais de saúde7. O peso do INAMPS era tão
intenso na assistência à saúde que, no momento de sua extinção, o órgão ainda tinha sob sua
gestão o contrato de 6.500 hospitais e 40.000 outros serviços (clínicas, laboratórios etc.) e contava
com 96.913 servidores9. Em 1994, um decreto presidencial (Decreto nº 1.232, de 30 de agosto de
199410) autorizou o repasse financeiro direto do Fundo Nacional de Saúde para os Fundos
Municipais de Saúde, viabilizando o mecanismo necessário para operacionalizar a gestão semiplena11. Três anos após a edição da NOB/SUS – 01/93, ou seja, ao final de 1996, existiam 3.078
municípios habilitados, sendo 2.323 em gestão incipiente, 618 em gestão parcial e 137 em gestão
semi-plena, com a descentralização sendo polarizada especialmente entre o governo federal (poder
financeiro e normatizador) e os municípios, que surgiram com força e capacidade de resposta na
cena político-sanitária12.
O acúmulo obtido pelas experiências de gestão semi-plena de alguns municípios
serviu como referência para um amplo processo de discussão e de negociação política, resultando
na aprovação da NOB/SUS - 01/96, redefinindo responsabilidades e prerrogativas de municípios,
estados e União e impulsionando nova onda descentralizadora, ainda mais forte que a
possibilitada pela NOB anterior, com dois níveis de gestão possíveis para os municípios (gestão
plena da atenção básica e gestão plena do sistema municipal de saúde). A NOB/SUS – 01/96 teve
como um dos avanços indiscutíveis a criação do Piso Assistencial Básico (PAB), encerrando o
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repasse por produção de serviços de atenção básica para municípios habilitados, passando a fazê-lo
por critérios populacionais e criando incentivos para implantação e funcionamento de ações
prioritárias13. Dos 5.506 municípios existentes em junho de 2000, no país, 5.426 (98,5%) estavam
habilitados pela NOB/SUS - 01/96, sendo 4.906 (89,1%) em gestão plena da atenção básica e 520
(9,4%) em gestão plena do sistema municipal de saúde.
Ao assumirem a gestão semi-plena pela NOB 93, ou a gestão plena pela NOB 96,
muitos municípios avançaram na gestão do SUS: reorganizaram a oferta e redimensionaram a rede
de serviços; ampliaram o acesso da população às ações e serviços de saúde; aumentaram a
capacidade instalada pública; criaram capacidade de regulação, serviços de controle, avaliação e
auditoria, sistemas informatizados de marcação de consultas, procedimentos especializados e
internações hospitalares; desenvolveram a participação dos conselhos de saúde (municipais e
locais); aumentaram a participação relativa dos gastos ambulatoriais em relação aos hospitalares; e
reduziram internações desnecessárias11, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23.
Não obstante todas as dificuldades, o processo de descentralização tem transferido
responsabilidades, prerrogativas e recursos para os governos municipais, ocorrendo ampla
descentralização dos recursos e das responsabilidades de gestão sobre os serviços24. Coloca-se
como desafio dos municípios, além de assumir o conjunto de responsabilidades expressas pelas
normas operacionais, avançar na implementação de mudanças nos modelos de atenção e gestão,
inclusive ampliando os espaços de controle social, e superar os riscos de reproduzir, no âmbito
municipal, os processos clientelistas e cartoriais entre Estado e Sociedade que tornaram o antigo
INAMPS um exemplo de privatização do Estado e foram repassados às Secretarias Estaduais de
Saúde, em maior ou menor grau, junto com todo o espólio da atenção médica previdenciária.
Diversos esforços foram feitos para aperfeiçoar o processo de descentralização do
SUS, que culminaram com a aprovação da Norma Operacional de Assistência à Saúde (NOAS 01/
2001)25, a qual não chegou a ser implantada, e da Norma Operacional de Assistência à Saúde
(NOAS 01/2002)26. Como saldos positivos do processo de implantação da NOAS, a despeito de
suas limitações, fragilidades e inadequações metodológicas frente aos desafios da gestão
descentralizada do sistema de saúde, destacam-se: o fortalecimento das ações de regulação,
controle e avaliação da regionalização na pauta prioritária dos gestores do SUS nas três esferas de
governo e a ampliação do emprego da Programação Pactuada Integrada (PPI). É importante lembrar
que a descentralização da assistência, da vigilância sanitária e da vigilância em saúde tem sido
efetivada em tempos e formatos diferentes. No âmbito da NOAS, houve completo descompasso
entre estes processos.
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Avanços recentes no processo de descentralização do SUS
A partir de 2003, observa-se a implantação de um conjunto de ações visando à
intensificação e qualificação do processo de descentralização no SUS. Em janeiro de 2003, apenas
13 estados estavam em gestão plena. Mediante um forte mecanismo de indução financeira e
cooperação técnica intensa foi possível chegar a outubro de 2004 com todos os estados em gestão
plena. O reajuste dos valores das consultas médicas especializadas, aprovado em 2002 apenas para
os prestadores privados contratados pelo SUS (Portaria GM/MS nº 1.188, de 26/02/2002), foi, em
2003, estendido aos prestadores públicos, condicionado ao fato de que as unidades públicas
estivessem sob gestão plena do sistema estadual ou gestão plena do sistema municipal de saúde
(Portaria GM/MS nº 654 de 28/05/2003). Cerca de 80% destes procedimentos são feitos em
serviços públicos e o volume de recursos alocado correspondeu a um aumento superior a R$ 422,5
milhões por ano. Esta indução estimulou, em especial, os estados que ainda não tinham sido
habilitados a assumirem a gestão plena, de forma que, em outubro de 2004, todos já se
encontravam habilitados 27.
Assim, desde novembro de 2004, o Ministério da Saúde não realiza pagamento
direto para prestadores de serviços do SUS. Todos os recursos são repassados para fundos estaduais
e municipais de saúde. A exceção ainda existente situa-se nos repasses de incentivos, para os quais
já estão sendo trabalhadas políticas que irão incorporá-los nos tetos financeiros estaduais e
municipais, mediante processo de contratualização com hospitais universitários, hospitais de
pequeno porte e hospitais filantrópicos – o Incentivo de Integração ao Sistema Único de Saúde
(INTEGRASUS), distribuído para os hospitais filantrópicos, o incentivo à assistência ambulatorial e
hospitalar à população indígena e o fator de Incentivo ao Desenvolvimento do Ensino e Pesquisa
Universitária em Saúde (FIDEPS), repassado para hospitais universitários. Ocorreu também um
aumento do número de municípios em gestão plena do sistema municipal, chegando, em outubro
de 2005, a um total de 657, com 429 habilitados pela NOB 01/96 e 228 pela NOAS 01/02.
Outro avanço a ser destacado encontra-se no âmbito da gestão da atenção básica.
Em setembro de 2004, apenas 15 municípios não estavam habilitados em alguma forma de gestão.
Após diversos debates e aprovação pela Comissão Intergestores Tripartite (CIT) e Conselho
Nacional de Saúde (CNS), a Portaria Ministerial nº 2.023, de 23 de setembro de 2004, estabeleceu
que todos os municípios e o Distrito Federal são responsáveis pela gestão do sistema municipal de
saúde na organização e na execução das ações de atenção básica. Cessava o processo de
habilitação de municípios em Gestão Plena de Atenção Básica, passando a vigorar como única
modalidade de habilitação a Gestão Plena de Sistema Municipal. Em seu anexo, a referida portaria
estabeleceu o conjunto de responsabilidades dos municípios e do distrito federal na gestão e
execução da atenção básica à saúde.
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Chama atenção o importante aumento nos repasses de recursos federais para estados
e municípios b. Entre dezembro/02 e julho/05, tiveram uma ampliação da ordem de R$
5.385.972.327,00 por ano, significando 1/3 a mais no financiamento. Saíram de R$
1.361.679.173,67 por mês (dezembro/02) – deste total R$ 370.116.019,62 referentes a
remuneração por prestação de serviços e R$ 991.563.154,05 relativos a transferências para fundos
estaduais e municipais de saúde – para R$ 1.810.510.200,92 mensais (julho/05)27.
Este aumento se deu por meio dos seguintes mecanismos: reajustes importantes nas
tabelas SUS (ambulatorial e hospitalar), priorizando procedimentos de média complexidade com
maiores diferenças entre o valor de tabela e o custo do procedimento; aumento de valores de
incentivos existentes (especialmente para Saúde da Família); implantação de novas políticas
estratégicas com financiamento global – Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU),
Centros de Especialidade Odontológica (CEO) etc.; criação de novos mecanismos de
financiamento para rede hospitalar no SUS – contratualização dos hospitais universitários, iniciada
em 2003, dos hospitais filantrópicos (2005), implantação da política de hospitais de pequeno
porte; expansão da rede de alta complexidade, principalmente leitos de UTI, serviços de diálise,
centros de alta complexidade em oncologia e cardiologia; e ainda aumento de valores dos tetos
estaduais, inclusive incorporando critérios de redução da desigualdade regional27.
Em 2003 e 2004, ocorreram ampliações de tetos superiores a aumentos aprovados
em períodos anteriores, privilegiando estados com per capita mais baixos – inferiores à média
nacional (todos da Região Norte e alguns da Região Nordeste). Os tetos financeiros dos estados
para ações de média e alta complexidade ambulatorial e hospitalar (MAC)c – não incluindo
medicamentos excepcionais e Fundo de Ações Estratégicas e de Compensação (FAEC) – que
haviam aumentado apenas 9% entre 2000 e 2002, foram ampliados em 21% em 2003-2004, com
maiores variações para Amazonas e Acre (40 a 45%) e Amapá e Tocantins (respectivamente 52,3%
e 57,6%)27.
O valor médio das internações pelo SUS obteve reajustes em 2003 e 2004 que,
somados, corresponderam a um aumento médio de 24,58%, variando entre 24,03% na clínica
médica, 28,56% na pediatria e 33,02% na obstetrícia. Em 2001-2002, o valor médio das
internações tinha aumentado em 3,8% na clínica médica, 5,67% na pediatria e 7,42% na
b
c
Dados dos repasses financeiros do Ministério da Saúde para estados e municípios encontram-se disponíveis no sítio do
DATASUS na internet – http://www.datasus.gov.br.
Dados dos Limites Financeiros da Assistência de Média e Alta Complexidade Ambulatorial e Hospitalar de Estados e Municípios
estão disponíveis no portal do Ministério da Saúde -http://dtr2001.saude.gov.br/sas/CPA/tetos/tetos.htm.
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obstetrícia. O valor médio dos procedimentos ambulatoriais especializados aumentou em 2,31%,
comparando-se o de 2002 com o de 2000, e em 14,36%, comparando-se o valor médio em 2004
com o de 2002; os de média complexidade tiveram reajuste do valor médio de 5,51% em 20012002 e 18,96% em 2003-2004. O valor médio neste último período chegou a aumentar em
67,8% no grupo das consultas médicas especializadas, 66,7% para ultra-sonografias, 25,6% na
traumato-ortopedia e 23,3% em anátomo e citopatologia28.
Conforme dados do Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Saúde
(SIOPS), a evolução dos gastos públicos federais para a saúde no Brasil caiu, entre 1997 e 2002, de
U$ 89 (oitenta e nove dólares) para US$ 48 (quarenta e oito dólares) per capita. A partir de 2003
houve uma mudança importante, passando a aumentar para US$ 50,1 naquele ano, US$ 62,4 em
2004 e, pelo orçamento de 2005, uma aplicação de US$ 62,729.
Entre outras iniciativas recentes que contribuíram para o fortalecimento da gestão
descentralizada do SUS destacam-se: o Projeto de Apoio à Expansão da Estratégia de Saúde da
Família (PROESF) – para municípios com mais de 100 mil habitantes –; o Projeto de Qualificação
da Saúde da Família; a acelerada implantação de Centros de Atenção Psico-Social (CAPS); a
implementação do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES); o Programa Nacional
de Avaliação de Serviços de Saúde; a descentralização do processamento das autorizações de
internações hospitalares (AIH); e o projeto de capacitação das equipes estaduais e municipais em
regulação, controle, avaliação e auditoria.
Limites e contradições da descentralização no SUS
Um primeiro aspecto a ser ressaltado é que, não obstante o processo de
descentralização no setor saúde apresentar potencialmente diversas vantagens, nos âmbitos
administrativo, político e econômico, ele não é um fim em si mesmo. Tampouco temos a garantia
a priori de que todas as gestões descentralizadas irão assegurar a realização deste potencial. Pelo
contrário, muitas delas irão desempenhar um exercício da gestão do sistema de saúde com
características semelhantes ao observado pela gestão anteriormente centralizada de cunho político
conservador. No entanto é evidente que um sistema de saúde descentralizado, com um processo
eficiente de transferência de recursos e autoridade às instâncias subnacionais (estados e
municípios, no caso brasileiro), gera maiores possibilidades de impactos positivos na gestão e na
atenção à saúde29, 30, 31, 32.
A despeito dos marcantes avanços, a cultura política hegemônica conservadora
aponta em direção oposta, contribuindo para a fragilidade da política de saúde como política de
Estado, com papel muito forte do ideário político na condução de seus rumos. Neste sentido, o
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programa de governo e a direção vigente na gestão têm peso intenso e preponderante na definição
dos destinos, ritmo e intensidade do processo de descentralização.
Cabe ressaltar ainda que os avanços obtidos no processo de descentralização do SUS
não devem ser atribuídos exclusivamente a um dos níveis de gestão do sistema. São, portanto,
resultado de uma somatória de esforços e de um processo decisório que soube construir pactuações
entre os três níveis. Muitas das políticas, hoje assumidas como prioritárias pelo Ministério da
Saúde, decorreram de iniciativas inovadoras locais, que foram progressivamente se multiplicando,
ao ponto de criarem referência para a construção de uma política nacional. Como exemplo, podese citar a estratégia de Saúde da Família, o SAMU e o processo de contratualização da rede
hospitalar do SUS.
Contudo são evidentes ainda fortes resistências à efetiva e ampla descentralização,
especialmente originária do poder político hegemônico conservador que tem o fisiologismo, o
assistencialismo e o clientelismo como características marcantes e o exerce no setor saúde, por
meio do binômio constituído pela execução direta das ações e serviços de saúde e pela contratação
de serviços privados. No primeiro caso, a persistência da ação assistencial sendo vista pela maioria
da população ainda como um “favor” e não como um direito social, permite que a execução
destas ações seja traduzida como um “valor de troca” e “moeda” eleitoral. No segundo, a maioria
absoluta dos estados e municípios contrata serviços privados sem cumprir a legislação vigente, não
realiza efetivamente procedimentos licitatórios e não formaliza contratos com os prestadores,
configurando a contratação destes como um favor dos governantes e, assim, podendo receber
retribuições destes contratados por este “privilégio”.
Nesta relação irregular, os prestadores de serviços, em geral, terminam por definir a
oferta a ser paga pelo SUS, privilegiando procedimentos considerados mais lucrativos e
selecionando a clientela a ser atendida, com prejuízos no atendimento às necessidades da
população. Como exemplo, com base em dados do Sistema de Informação Ambulatorial do SUS
(SIA/SUS), pode-se destacar que, no primeiro semestre de 2005, dos 323 municípios com
realização de hemodiálise e diálise (terapia renal substitutiva), em 101 (31,3%) deles não eram
oferecidas consultas médicas em nefrologia pelo SUS; e em 155 (48%), a relação entre estas
consultas e o número de procedimentos de diálise realizados pelo SUS variou de 1/100 a 9/100.
Em muitas situações, agrava-se este quadro pela existência de fraudes ao sistema,
não detectadas nem corrigidas em face da inexistência de mecanismos efetivos de gestão
(regulação, controle, avaliação e auditoria). O levantamento feito pelo Ministério da Saúde, em
2005, identificou a operação de apenas 69 Centrais de Marcação de Consultas e Procedimentos
Ambulatoriais Especializados, sendo 1 no Norte, 20 no Nordeste, 41 no Sudeste, 5 no Sul e 2 no
Centro-Oeste. Em 1996, havia somente uma central no país.
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Associam-se a estas dificuldades as limitações observadas na democratização da
gestão pelos espaços de controle social. A despeito de existirem conselhos de saúde em todos os
estados e na quase totalidade dos municípios, a heterogeneidade da situação destes é marcante.
Existem desde conselhos com atuação expressiva no controle social sobre as ações e serviços de
saúde, até aqueles que só têm existência formalizada em uma ata conformada pela gestão local
para cumprir burocraticamente exigências cartoriais de habilitação. Assim, não é automático o
ganho de autonomia pelos atores locais. O exercício do controle social depende do fortalecimento
prévio desses atores e da condução da gestão local. Da mesma forma, a condução das instâncias
intergestoras é também heterogênea, com uma relação desigual entre os gestores nessas comissões.
Em muitas situações, a desigualdade do poder entre as esferas de gestão induz fortemente a
decisões que privilegiam interesses dos gestores estaduais sobre os municipais, com resultados por
vezes inadequados ao processo de descentralização.
A ausência de gestão mais solidária do sistema, com a devida co-responsabilização
entre as esferas de governo, é outra limitação verificada. De forma geral, a competição é mais
intensa que a cooperação entre os gestores. Em vários estados, o processo de municipalização tem
se dado de forma “solitária” sem a devida cooperação técnica e financeira dos estados, ou ocorre
de forma “incompleta”, com o Estado mantendo sob sua gestão uma parte da rede de serviços.
Observa-se também resistência e despreparo das Secretarias Estaduais de Saúde em assumir o novo
papel a elas atribuído pela Constituição e pela Lei Orgânica da Saúde.
Um grave problema é a inexistência de medidas efetivas para superar impasses frente
ao não cumprimento de responsabilidades de gestão. Mesmo as resoluções das comissões
intergestoras e dos conselhos de saúde são traduzidas em portarias das respectivas esferas de
governo, não tendo força jurídica para a cobrança efetiva de seu cumprimento. A desabilitação de
entes federados ou suspensão de repasses financeiros são medidas ineficientes, já que penalizam
mais a própria população do que os respectivos gestores.
Outro aspecto vital está relacionado com a ausência de indução suficiente para o
desenvolvimento efetivo das capacidades gestoras. Além da insuficiência de cooperação por parte
dos estados e da esfera federal, o financiamento federal é programado “exclusivamente”
(direcionado e em função de) para a oferta de serviços e pagamento de procedimentos. Não são
programados recursos para financiar as ações de regulação, controle, avaliação e auditoria, como se
estas não fossem imprescindíveis ao adequado funcionamento do sistema de saúde, não
necessitassem de recursos financeiros e seu financiamento fosse atribuição exclusiva das outras
esferas de governo. Na maioria dos estados e municípios, estas funções de gestão não são
realizadas ou são exercidas de forma precária, reproduzindo o modelo de forte autonomia dos
prestadores com a oferta fortemente determinada pela rede assistencial.
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Mesmo com algumas iniciativas recentes e louváveis, como regra geral os estados
não repassam recursos para custeio das ações e serviços de saúde aos municípios no formato
regular e automático (fundo-a-fundo), optando, quando o fazem, por mecanismos conveniais, em
que o “quanto”, “para que”, “para quem”, “quando” e “como” são definidos pelo gestor detentor
dos recursos. Os recursos federais, diferentemente, são totalmente repassados para fundos estaduais
e municipais de forma regular e automática, com critérios pactuados na CIT (exceto recursos de
investimento que são, em geral, repassados por convênios).
Chama atenção o formato de alocação dos recursos federais ao interior de cada
estado. A distribuição dos valores dos tetos estaduais entre os municípios, dentro de cada estado, e
o montante que fica sob gestão estadual é aprovada na respectiva Comissão Intergestores Bipartite
(CIB) sem participação do Ministério da Saúde. Em última instância, o Ministério da Saúde não
tem poder de decisão sobre o volume de recursos financeiros federais que chega a cada município
para custeio do SUS. Em algumas situações, tem se observado expressivo desfinanciamento de
municípios com papel importante de pólo regional de oferta de serviços pelo SUS, sem
mecanismos que permitam ao governo federal corrigir este problema, por meio dos repasses
financeiros, a não ser que rompa com esta lógica atualmente vigente.
A despeito de todos os estados e cerca de 10% dos municípios estarem atualmente
em gestão plena, ainda existem muitos municípios com mais de 100 mil habitantes com
responsabilização apenas sobre a atenção básica. Como o processo de habilitação é proposto por
decisão do gestor local, se este não tiver interesse em assumir esta responsabilidade, não existe
mecanismo que o obrigue a tomar tal decisão. Como exemplo, temos o caso de Salvador (3ª
maior cidade do país), que somente em 2006 veio a ser habilitada em gestão plena do sistema
municipal. Por outro lado, em determinadas situações, observa-se que a decisão do gestor
municipal não é tomada em função do desinteresse, falta de apoio ou mesmo resistência da gestão
estadual, para que a municipalização plena venha a ocorrer.
Em função das questões acima especificadas, pode-se levantar a hipótese de existir,
nos marcos atuais, certo esgotamento do processo de descentralização por habilitação
(comprovação cartorial de requisitos e capacidades) feita por adesão (vontade política do gestor
local) e concordância das outras esferas, tendo a indução financeira, por meio de recursos federais,
como seu grande motor.
PROPOST
A DE “P
ACTO DE GESTÃO”
PROPOSTA
“PACTO
A identificação dessas questões tem motivado o debate sobre a necessidade de uma
reformulação em aspectos substanciais do processo de descentralização e de criação de legislação
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que faça frente a estas dificuldades. Tal debate ganhou corpo a partir de 2004, com a elaboração,
pelo Ministério da Saúde, de um projeto de “Lei de Responsabilidade Sanitária”,, encaminhado
pelo ex-Ministro Humberto Costa para consulta pública, e na construção de uma proposta
denominada de “Pacto de Gestão”. A proposta construída pelo Ministério apontava na direção da
saída do processo de habilitação por adesão para um modelo de contratualização entre gestores
(federal, estadual e municipal). A responsabilização efetiva, deixaria de ser uma decisão do gestor
local com a concordância dos demais, passando a ser assumida de modo negociado, com a
criação de capacidade progressiva de gestão, pela efetiva cooperação técnica e financeira e
negociação de metas (assistenciais e gestoras) e compromissos entre as três esferas de governo sobre
o SUS. A Lei de Responsabilidade Sanitária daria a base legal para que tais pactos tivessem caráter
e respaldo jurídico.
Com as mudanças no governo federal, saída do Ministro Humberto Costa e entrada
do Ministro Saraiva Felipe, a proposta de Lei de Responsabilidade Sanitária foi abortada e o
anteprojeto do Ministério da Saúde retirado do debate. Em relação ao “Pacto de Gestão”, o debate
continuou junto à Comissão Intergestores Tripartite (CIT) e uma proposta foi aprovada ao final da
gestão de Saraiva Felipe no Ministério da Saúde, que durou menos de nove meses, sendo publicada
pelas Portarias nº 399/GM, de 22 de fevereiro de 2006, e nº 699/GM, de 30 de março de 2006.
As mudanças apresentadas nessas portarias podem ser situadas em cinco grandes
âmbitos: substituir o processo de habilitação pela formalização de termos de compromisso de
gestão; apontar a regionalização solidária como eixo da descentralização; aprovar proposta de
integração de várias formas de repasse de recursos federais para estados e municípios em blocos de
financiamento; cobrar a explicitação dos recursos de custeio próprios das esferas municipal e
estadual; e unificar os processos de pactuação de indicadores a partir de 2007.
Sem querer fazer uma avaliação precoce destas proposições, até pelo fato de ainda não
ter sido efetivamente iniciada sua implantação neste momento em que este artigo está sendo
elaborado, e considerando ainda que muitas normativas podem vir a ser aprovadas para dar conta de
lacunas evidenciadas, gostaríamos de apontar algumas questões centrais que merecem ser debatidas.
Entre as mudanças significativas aprovadas, destaca-se o fim do processo cartorial de
habilitação e sua substituição pela formalização de termos de compromisso de gestão que definam
a responsabilidade sanitária e os compromissos de cada esfera de governo. Contudo esta proposta
prevê uma adesão voluntária, o que pode, em última instância, não incorporar os municípios e
estados, em que os gestores não optarem por aderir ao processo. Torna-se imprescindível a criação
de mecanismos de indução que incentivem a adesão ao Pacto de Gestão e construir um processo
de monitoramento e avaliação que possa contribuir para evitar que a saída do processo cartorial de
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habilitação não seja efetivada, por meio de processos cartoriais de pactuação e formalização de
termos de compromisso burocráticos.
Ainda que a regionalização solidária seja apontada como eixo estruturante da
descentralização, a proposta aprovada não consegue ir além do já definido pela NOAS, apenas
criando um mecanismo de gestão regional, com os gestores municipais e o gestor estadual. Na
verdade, uma CIB regional ampliada, com todas as secretarias municipais da região de saúde.
Com o importante objetivo de reduzir o grande número de rubricas diferentes para
repasses de recursos federais aos fundos municipais e estaduais (as famosas “caixinhas”), foram
criados 5 blocos de financiamento (“caixotes”): atenção básica; atenção de média e alta
complexidade; vigilância em saúde; assistência farmacêutica e gestão do SUS. A criação deste
último bloco (gestão do SUS) foi extremamente importante e é a primeira iniciativa concreta
aprovada, estabelecendo financiamento destinado ao custeio de ações relacionadas com a
organização do sistema de saúde: regulação, controle, avaliação e auditoria; planejamento e
orçamento; programação; regionalização; participação e controle social; gestão do trabalho;
educação em saúde e implementação de políticas específicas. No entanto, até o momento, fica no
plano das intenções, pois ainda não foram aprovados repasses com tal finalidade.
A criação dos blocos de financiamento não elimina as rubricas anteriores para fins
de programação e cálculo dos repasses federais. Esta medida, ao invés de dar maior flexibilidade à
aplicação dos recursos por parte dos gestores locais, criou limitações, na medida em que o uso dos
recursos federais para o custeio fica restrito a cada bloco, só podendo ser aplicados nas finalidades
previstas dentro de cada um dos blocos. Assim, se antes a única restrição efetivamente
estabelecida era a de não ser possível aplicar recursos da atenção básica em ações e serviços de
média e alta complexidade, agora o financiamento ficou efetivamente “amarrado” dentro de cada
bloco, ampliando em muito as restrições à utilização dos recursos federais pela gestão local. Ao
invés de integrar as várias formas de repasses de recursos financeiros, o que se alcançou foi uma
limitação no âmbito da aplicação destes recursos.
Um resultado muito positivo alcançado foi a cobrança de que o Termo do Limite
Financeiro Global do Município deverá explicitar também os recursos de custeio próprios das
esferas municipal e estadual – caso não seja possível explicitá-los por blocos, deverá ser informado
apenas o total do recurso. Esta medida é um passo fundamental para garantir a efetiva aplicação
dos recursos próprios de municípios e, em especial, dos estados, nas ações e serviços de saúde em
cada território municipal.
Outra preocupação sobre as proposições aprovadas para o Pacto de Gestão está
relacionada à baixa permeabilidade dos pactos ao controle social. Além da fragilidade de grande
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parte dos conselhos de saúde para efetivamente conseguirem influir neste processo, o fato de que a
aprovação nos respectivos conselhos de saúde (municipal, estadual e nacional) é o ponto de
partida para a homologação não garante por si só um envolvimento mais amplo em seu
acompanhamento e fiscalização.
Uma questão extremamente relevante diz respeito à operacionalização do comando
único, ou seja, da efetivação de um único gestor com o controle de todos os prestadores de serviço
do SUS em um dado território. As portarias aprovadas reafirmam a necessidade do comando
único, inclusive colocando como anexo do termo de compromisso de gestão uma declaração da
CIB de comando único do sistema pelo gestor municipal. Contudo o modelo definido para esta
declaração, mais do que declarar a existência de comando único, cumpre principalmente outros
dois objetivos: identificar quais são as unidades de saúde que o município ainda não está
assumindo a gestão, mas para as quais existe um cronograma pactuado para a gestão das mesmas
passar para o município; e declarar quais são as unidades de saúde que continuarão sob a gestão
do estado, conforme pactuação estabelecida. Por incrível que possa parecer, a declaração da CIB
de comando único do sistema pelo gestor municipal, na verdade, é a declaração da CIB de não
existência de comando único.
Ressalta-se a preocupação com o risco de esta proposta aprovada em um ano
eleitoral vir a imobilizar o ritmo do processo de descentralização. Por fim, cabe ainda registrar que
todo o esforço para firmar divisão de responsabilidades claramente definidas e pactos de gestão
estabelecidos em termos de compromisso intergestores perde muito da efetividade com o
abortamento da proposta de criação de uma Lei de Responsabilidade Sanitária. Esta lei poderia dar
base jurídica legal e estabelecer penalidades para o não cumprimento, por parte de qualquer
gestor, de questões indispensáveis ao funcionamento do sistema de saúde e imprescindíveis de ser
viabilizadas pelos respectivos gestores do SUS em um dado território.
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Recebido em 05.06.2006. Aprovado em 07.08.2006.
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ARTIGO DE REVISÃO
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SÍNDROME MET
ABÓLICA NA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA.
METABÓLICA
UM FFA
ATOR MAIOR DE RISCO CARDIOV
ASCULAR
CARDIOVASCULAR
Isabel C.B.Guimarães a
Armênio C.Guimarãesb
Resumo
A Síndrome Metabólica (SM), transtorno complexo representado por um conjunto de
fatores de risco de doença cardiovascular aterosclerótica com elevada incidência e prevalência no
adulto, tem início na infância e a sua evolução clínica no adulto é modulada por fatores hereditários
e ambientais. O objetivo deste artigo é rever os principais aspectos etiopatogênicos, epidemiológicos,
clínicos, terapêuticos e preventivos da síndrome metabólica, com enfoque na infância e
adolescência. Os dados foram coletados no Medline, período de 1988 a 2005 – seleção de estudos
anátomopatológicos, epidemiológicos, clínicos e de diretrizes, e permitiram a seguinte síntese: o
conhecimento da síndrome metabólica na população pediátrica está em evolução; o sobrepeso/
obesidade na infância e adolescência é o principal fator de risco predisponente para o
desenvolvimento de doenças cardiovasculares na vida adulta, por facilitar o aparecimento de
hiperinsulinemia, dislipidemia e hipertensão arterial; a identificação precoce e a implementação de
medidas para o controle do sobrepeso/obesidade deve representar a principal forma de atuação do
pediatra. Concluiu-se que a intervenção precoce sobre o estilo de vida de crianças e adolescentes é
fundamental para prevenir complicações metabólicas e cardiovasculares na vida adulta.
Palavras-chave: Síndrome metabólica. Dislipidemia. Resistência à insulina. Sobrepeso/obesidade.
Criança. Adolescente.
METABOLIC SYNDROME IN CHILDREN AND ADOLESCENTS: A MAJOR
CARDIOVASCULAR RISK FACTOR
Abstract
The metabolic syndrome can be defined as a complex clinical condition represented
by a number of cardiovascular risk factors, with high incidence and prevalence in adulthood. More
a
b
Cardiologista Pediátrica pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) e Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), Mestre em
Medicina e Saúde pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), Doutoranda do Curso de Pós-graduação em Medicina e Saúde
da Faculdade Medicina (FAMED), UFBA.
Professor Titular de Cardiologia da FAMED, UFBA.
Endereço para correspondência: Isabel Cristina Britto Guimarães. Rua do Ebano, Edf. Colina do Ébano, 251, apto. 501,
Caminho das Árvores Salvador, Bahia, Brasil. CEP: 41810.430.
E-mail: [email protected] .
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recently, it has been shown to start in childhood and adolescence. The main objetive of this paper
is to review the main aspects of the pathogenesis, epidemiology, diagnosis, treatment and
prevention of the metabolic syndrome in children and adolescents. Data were collected from
Medline review between 1988 and 2005 – a selection of articles on pathology, epidemiology,
clinic and guidelines – and point to the following results: the knowledge on metabolic syndrome
is evolving; overweight/obesity in infancy and childhood is the main predisposing risk factor to the
development of cardiovascular disease in adulthood, being associated with the development of
hyperinsulinemia, dyslipidemia and hypertension. Early diagnosis and intervention regarding life
style modifications by the pediatrician are imperative. Early prevention and/or control of
overweight/obesity in children and adolescents should be the main target to be pursued in order to
reduce the incidence and prevalence of cardiovascular risk factors in adulthood.
Keywords: Overweight/obesity. Children. Adolescents. Insulin resistance. Hyperlipidaemia.
Metabolic syndrome.
INTRODUÇÃO
A Síndrome Metabólica (SM), inicialmente descrita em adultos, inclui obesidade
central, hipertensão arterial, dislipidemia e intolerância à glicose ou diabetes melito tipo 2.
Constitui-se em fator de risco de doença cardiovascular aterosclerótica1, com elevada incidência e
prevalência no adulto2. A presença da SM aumenta a mortalidade geral em 1,5 vezes e a
mortalidade cardiovascular em 2,5vezes3.
Não existe ainda consenso na sua definição. Enquanto a Organização Mundial de
Saúde (OMS)4 preconiza, como ponto principal, na sua caracterização, a resistência à insulina ou a
presença de distúrbio do metabolismo da glicose, o mesmo não é exigido pelos critérios do
National Cholesterol Education Program’s Adult Treatment Panel III (NCEP-ATPIII)5.
Em paralelo, estudos da história natural da aterosclerose evidenciaram que a mesma se
inicia na infância, tendo a sua evolução clínica no adulto, modulada por fatores hereditários e
ambientais 6. Dentre estes últimos, destaca-se o estilo de vida caracterizado por alimentação
inadequada e sedentarismo, ambos responsáveis pela epidemia de sobrepeso/obesidade que ocorre na
infância e adolescência e principais fatores predisponentes da SM, a qual tende a agregar fatores
causais maiores de aterosclerose, como hipertensão, dislipidemia e intolerância à glicose ou diabetes
melito tipo 27. Assim sendo, o combate ao sobrepeso/obesidade nessas faixas etárias passa a ser
mandatório para a prevenção da doença aterosclerótica, principalmente prematura no adulto.
Diante da magnitude do problema, o objetivo desta revisão é abordar os principais
aspectos etiopatogênicos, epidemiológicos, clínicos, terapêuticos e preventivos da SM, na infância
e adolescência.
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METODOLOGIA
Utilizando os bancos de dados MEDLINE e LILACS-BIREME, foram selecionados
artigos publicados nos últimos oito anos, abordando a resistência à insulina e a obesidade na
população pediátrica. Os seguintes termos de pesquisa (palavras-chaves e delimitadores) foram
utilizados em várias combinações: 1) overweight/obesity; 2) children; 3) adolescents; 4) insulin
resistance; 5) hyperlipidemia; 6) metabolic syndrome.
A pesquisa bibliográfica incluiu artigos originais, artigos de revisão, editoriais e
diretrizes escritos nas línguas inglesa e portuguesa, sendo selecionados 55 artigos.
ETIOLOGIA E FISIOP
ATOLOGIA
FISIOPA
RESISTÊNCIA À INSULINA
A SM tem relação com fatores hereditários e adquiridos, alguns não totalmente
esclarecidos, tendo como elo comum o desenvolvimento de resistência à insulina. A
hiperinsulinemia conseqüente seria, então, responsável pela elevação da pressão arterial,
intolerância à glicose e pela dislipidemia que caracterizam a síndrome. Por sua vez, tudo indica
que a resistência à insulina tem como principal fator predisponente a presença de obesidade
central, na qual a gordura visceral é mais sensível aos efeitos lipolíticos das catecolaminas do que
aos efeitos antilipolíticos da insulina, comparativamente à gordura subcutânea8.
Os adipócitos desses pacientes, além do número excessivo, proporcional ao grau de
adiposidade, são capazes de manter elevada a atividade da lípase hormônio sensível (LHS), mesmo
na presença da ação antagônica da hiperinsulinemia. Nessas circunstâncias, o excesso de tecido
adiposo e a atividade da LHS concorrem para um aumento considerável de ácidos graxos livres,
acarretando menor sensibilidade dos tecidos periféricos à ação da insulina, principalmente na
musculatura esquelética, com conseqüente desenvolvimento de hiperinsulinemia compensatória a
fim de manter a homeostase da glicemia. Esse excesso de ácidos graxos que chega ao fígado via
circulação porta, reduz também a ação inibitória da insulina na gliconeogênese hepática, com
aumento da produção de glicose. Esta, associada à redução simultânea na utilização periférica de
glicose, poderá, após um determinado período, não ser mais compensada pela hiperinsulinemia,
resultando em hiperglicemia, caracterizando, de acordo com a sua intensidade, os estágios de
intolerância à glicose ou diabetes tipo 2, respectivamente. Esta associação entre nível elevado de
insulina sérica e acúmulo central de gordura (obesidade central), também tem sido descrita em
crianças e adolescentes9.
Na puberdade, a distribuição da gordura corporal entre os sexos é diferente. Nos
meninos, ocorre um acúmulo de gordura das extremidades para o tronco; nas meninas, dá-se o
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inverso. Esta diferença decorre de modificações hormonais relacionadas aos níveis de estrógeno e
testosterona, respectivamente. Contudo, para Moreno10, o excesso de gordura em adolescentes é
preferencialmente central e independe do gênero.
HIPERTENSÃO ARTERIAL
A elevação da pressão arterial na SM teria relação com a resistência à insulina. Ela
resultaria da estimulação pela hiperinsulinemia do sistema nervoso simpático, com aumento da
reabsorção tubular de sódio e água e antagonismo à ação vasodilatadora do óxido nítrico11 . No
estudo Bogalusa, por exemplo, demonstrou-se uma correlação positiva entre pressão arterial e nível
de insulina sérica de jejum, mesmo após ajuste para o índice de massa corporal, já aos 5 anos de
idade12. Outrossim, estudo de Grunfeld, Balzareti, Romo, Gimenez, Gutman13 observou, em
adolescentes filhos de pais hipertensos, níveis elevados de insulina sérica após uma carga de
glicose endovenosa, sugerindo que a resistência à insulina precede o aumento da pressão arterial
em indivíduos com hereditariedade de hipertensão. Embora a prevalência de hipertensão arterial
seja baixa na população pediátrica, os seus precursores estão presentes muitos anos antes da sua
manifestação clínica. Aproximadamente 20 a 30% das crianças obesas têm pressão arterial mais
elevada do que crianças eutróficas e um risco 2,4 vezes maior de desenvolverem hipertensão
quando adultos14. Estudos epidemiológicos e genéticos confirmam o efeito tracking dos níveis
pressóricos, sugerindo que as raízes da hipertensão primária têm a sua origem nas duas primeiras
décadas de vida15,16.
DISLIPIDEMIA
A dislipidemia da SM caracteriza-se por hipertrigliceridemia, HDL-C diminuído e
valores do LDL-C entre a normalidade e leve a moderada elevação. A hipertrigliceridemia tem
relação com a excessiva oferta de ácidos graxos livres ao fígado e conseqüente superprodução de
lipoproteínas de muito baixa densidade (VLDL), as quais são ricas em triglicérides. A diminuição
da concentração do HDL-C decorre do aumento da atividade da CETP (proteína de transferência de
ésteres de colesterol), intensificando, no plasma, a troca de ésteres de colesterol das HDL pelas
triglicérides das VLDL, reduzindo assim o conteúdo de colesterol das partículas de HDL e,
conseqüentemente, a concentração plasmática do HDL-C. Quanto ao valor do LDL-C, é modulado
também pela ação da CEPT, com aumento da troca de ésteres de colesterol pelas triglicérides das
VLDL, o que diminui o conteúdo de colesterol das LDL e, portanto, a concentração plasmática do
LDL-C. Por sua vez, a ação das lípases hepática e lipoprotéica sobre as partículas das LDL,
hidrolisando as triglicérides, as transforma em partículas pequenas e mais densas de colesterol,
ricas em apoproteína B (partículas do tipo B).
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Diante do exposto, entendemos porque este tipo de dislipidemia é chamado de
aterogênica. Na cascata do metabolismo endógeno das lipoproteínas, a ação das lípases, também
sobre as VLDL, cria remanescentes mais enriquecidos em ésteres de colesterol e, portanto, mais
aterogênicos. As partículas de LDL tipo B, pelo seu menor tamanho e maior densidade, atravessam
mais facilmente a barreira endotelial e são mais facilmente oxidáveis, o que as tornam também
mais aterogênicas. Por último, a redução do desempenho das HDL no metabolismo reverso do
colesterol diminui o retorno ao fígado de ésteres do colesterol que, sendo cedidos em maior
quantidade às VLDL, aumentam a aterogenicidade do plasma.
INFLAMAÇÃO
As células gordurosas concentradas na região abdominal estimulam um estado
inflamatório crônico pela secreção de uma variedade de moléculas biologicamente ativas,
conhecidas como adipocitocinas: resistina, leptina e adiponectina17,18,19. Esse processo inflamatório
pode ser identificado por níveis elevados de interleucina 6 (IL-6), fator de necrose tumoral alfa
(TNF-a) e proteína C reativa (PCR). Além disso, encontram-se aumentadas as concentrações de
fibrinogênio e do inibidor do ativador do plasminogênio tecidual (PAI 1)20,21, caracterizando a
tendência prótrombótica desse processo. Essas moléculas são determinantes da evolução do
processo de aterogênese, atualmente aceito como um processo inflamatório crônico. Neste
particular, é importante conhecer que a presença desses indicadores já pode ser detectada em
crianças e adolescentes com sobrepeso/obesidade. Assim, Ford, Galuska, Gillespie, Wiil, Giles e
Dietz22 , avaliando 5305 crianças e adolescentes entre 6 e 18 anos, no NHANES III, observaram
níveis elevados de PCR em 24,2% dos meninos e 31,9% das meninas com IMC acima do
percentil 95.
EPIDEMIOLOGIA
A prevalência e incidência da SM acompanham a de sobrepeso/obesidade em todas
as idades. Nos EUA, há um aumento na prevalência de sobrepeso em 21,5% das crianças negras,
21,8% nas de origem hispânica e 12,3% entre as brancas23. No Brasil, estudos em cidades diversas
encontraram sobrepeso/obesidade em 20% de crianças e adolescentes24.
A relação etiopatogênica entre sobrepeso/obesidade e SM tem sido estabelecida pela
determinação da resistência à insulina. A prevalência de resistência à insulina é maior em crianças
e adolescentes obesos, situando-se entre 25% a 49%25 em casos de obesidade grave, com o grau da
resistência apresentando variação linear com o grau de adiposidade26,27. Contudo, em amostras
incluindo sobrepeso, as cifras de resistência à insulina ficam entre 3,6% a 4,5%28 . No Brasil,
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faltam estudos semelhantes. Considerando que em populações selecionadas de escolares a
prevalência de sobrepeso/obesidade pode chegar a 38,7%, com 17% de obesos29, é provável que
encontremos percentuais elevados de resistência à insulina nesse tipo de amostra. Estudos nesse
sentido estão em andamento.
Quanto ao gênero, os estudos apontam desde maior prevalência masculina (6,1%
versus 2,1% em mulheres) até ausência de diferença30,31. Em relação à etnia, a distribuição depende
muito da população amostrada e dos diferentes estratos sociais. Em amostras da população
americana, tendem a predominar brancos (4,5%) e hispânicos (5,6%) em relação aos negros
(2,0%)30 ou não há diferença25. No estudo que reuniu crianças de escola particular e pública, em
Salvador, a presença de sobrepeso/obesidade e de hipercolesterolemia associou-se
significativamente à cor branca e ao fato de pertencer à escola particular29. Vale salientar que
77,5% dos alunos da escola particular tinham cor branca contra 13,4% dos alunos da escola
pública, caracterizando também a influência do estrato social.
DIAGNÓSTICO CLÍNICO E LABORATORIAL
As definições da OMS e do ATP III para adultos diferem4,5. Como já mencionamos,
a definição da OMS requer o diagnóstico de resistência à insulina, hiperglicemia ou diabetes
melito4. Já a definição do ATP III inclui apenas 3 dos 5 componentes clínicos e laboratoriais
comuns a ambas e de fácil obtenção: PA>140/90mmHg, aumento da circunferência abdominal
(>102cm para os homens e >88cm para as mulheres)5, HDL-C baixo (<40mg/dl para os homens e
<50mg/dl para as mulheres), hipertrigliceridemia (>150mg/dl) e glicemia de jejum >110mg/dl,
atualmente modificada para >100mg/dl32 . Pela sua praticidade, a primeira diretriz brasileira no
assunto adota os critérios do ATP III 33, o que deve incluir, naturalmente, a recente modificação32.
Ainda não existe unanimidade para o diagnóstico da SM em crianças e adolescentes.
Alguns autores têm sugerido o uso da definição do ATP III modificado 34 enquanto outros
preconizam a presença de resistência à insulina como critério básico35,25. Todavia, quaisquer que
sejam os critérios adotados, existem dados clínicos que permitem inferir a presença de resistência
à insulina na criança e no adolescente com sobrepeso/obesidade, os quais estão também
relacionados ao risco do desenvolvimento de diabetes melito tipo 2. São eles: história familiar de
diabetes melito tipo 2; presença de hipertensão; sobrepeso/obesidade central; dislipidemia;
acantose nigricans; e ovário policístico. Na presença de qualquer destes indicadores clínicos estaria
indicada a comprovação laboratorial da existência de resistência à insulina36.
O método padrão ouro para a investigação de resistência à insulina é o clamp
euglicêmico-hiperinsulinêmico35. Contudo representa técnica complexa, dispendiosa e invasiva,
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inadequada para estudos epidemiológicos. Por isto, o teste oral de tolerância à glicose (TOTG)
vem sendo utilizado. Todavia, como tende a ser normal nos estágios iniciais da síndrome da
resistência à insulina (SRI), foram desenvolvidas outras técnicas que mostram excelente correlação
com a técnica do clamp37,38. O homeostatic model assessment (HOMA) é o mais utilizado39,
medindo a sensibilidade à insulina por meio da fórmula: glicemia (mmol) x insulina (mU/ml) de
jejum/22,5, com ponto de corte para o seu diagnóstico >3,16 em crianças e adolescentes, superior
ao dos adultos, >2,540,41.
O sobrepeso/obesidade constitui também, na criança e no adolescente, o principal
componente da SM, o qual é avaliado pelo o índice de massa corporal (IMC) (peso em Kg/ altura
ao quadrado2) normatizado para a idade (2 a 20 anos) e o gênero pelas tabelas de crescimento
do National Center for Health Statistics (CDC growth charts) 42: sobrepeso, IMC > percentil 85
e < percentil 95, e obesidade, IMC> percentil 95. Alguns pesquisadores têm utilizado o escore Z
do IMC (escore z > 2,0) como maneira de corrigir diferenças quanto à distribuição da gordura
corporal25. Mais recentemente, a utilização da circunferência abdominal vem sendo preconizada
como método mais simples e prático, que expressa melhor a concentração abdominal de gordura,
fenótipo da SM43. Esta deve ser medida no ponto médio entre o rebordo costal inferior e a crista
ilíaca, tomando como ponto de corte para a anormalidade valores acima do percentil 90, de
acordo com idade e gênero44. Ferranti, Gauvreau, Ludwig, Neufeld, Newburger e Rifai34, contudo,
consideram como marcador de risco cardiovascular futuro valores acima do percentil 75, para
idade e gênero.
Crianças com história familiar de doença cardiovascular prematura, dislipidemia,
hipertensão e diabetes e com sobrepeso/obesidade devem ser avaliadas para hipertensão e
dislipidemia45,46. O National High Blood Pressure Education Program (NHBPEP) recomenda que
toda criança a partir dos 3 anos de idade deva ter a pressão arterial aferida. Para firmar o
diagnóstico de pré-hipertensão ou de hipertensão são necessárias três aferições em ocasiões
distintas47. Os componentes da síndrome metabólica com os seus respectivos níveis de risco estão
descritos no Quadro 1
1.
IMPORTÂNCIA COMO FATOR DE RISCO CARDIOVASCULAR
A presença de SM na idade pediátrica, em decorrência dos múltiplos fatores de risco
cardiovascular que a compõem, está associada a um maior risco de aterosclerose com início na
infância e adolescência e manifestações prematuras no adulto45,48,49,50,51,52. Dentre esses fatores de
risco, aquele com maior valor preditivo é o sobrepeso/obesidade46,48.
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*Todos os percentuais são específicos para idade e gênero 42,47.
IMC= índice de massa corporal; PAS= pressão arterial sistólica;
PAD= pressão arterial diastólica.
Quadro 1. Componentes da síndrome metabólica com os seus respectivos níveis de risco.
Tratamento
O tratamento da SM é dirigido para os seus componentes metabólicos básicos,
tendo como alvo principal o controle do sobrepeso/obesidade, maior responsável pela expressão da
resistência à insulina com as suas conseqüências sobre o metabolismo glicídico, lipídico e o valor
da pressão arterial. Neste particular, a recomendação da Academia Americana de Pediatria é que a
manutenção ou perda de peso da criança dependerá da idade, do peso e da presença de
complicações secundárias. Assim, para crianças menores de 7 anos, com IMC > percentil 95, o
peso deve ser mantido a não ser que haja hipertensão, dislipidemia ou intolerância à glicose.
Nesse caso, reduzir o IMC abaixo do percentil 85. Crianças com 7 anos ou mais, com IMC acima
do percentil 85 devem perder peso45,53.
Dieta e exercício diário regular devem ser escolhidos como terapia para reduzir o
peso. O apoio familiar é fundamental para que as mudanças nos hábitos alimentares ocorram. A
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dieta deve incluir o ajuste do VET (valor energético total) para a redução do peso com manutenção
do crescimento. A distribuição dos macro e micronutrientes é a recomendada pela American Heart
Association: gordura total < 30% do VET, com <10% de gordura saturada e relação de gorduras
mono para poliinsaturadas de 2/1, 55% a 60% de carboidratos, variando inversamente ao valor do
IMC e evitando carboidratos simples, 10% a 15% de proteínas, <300mg de colesterol e < 2,4g de
sódio por dia, incluindo no cálculo o sódio natural dos alimentos45,46. A estruturação da dieta deve
garantir a palatabilidade e a riqueza diversificada em frutas e vegetais.
A prática regular de atividade física aeróbica (caminhada, corrida, natação, ciclismo)
e de atividades lúdicas deve ser estimulada, ocupando cerca de 60 minutos por dia e, no mínimo,
5 dias por semana. É importante também reduzir o tempo gasto com assistência à televisão e
prática de videogames. O aumento da atividade física está associado a menores níveis e maior
sensibilidade à insulina54 e a menores níveis de pressão arterial55.
Nos casos das crianças e adolescentes que mantenham a pressão arterial acima do
percentil 95 após a adoção das medidas não farmacológicas, durante 6 meses, o tratamento
farmacológico com um inibidor da enzima conversora da angiotensina deve ser iniciado47.
Quanto à dislipidemia, além da dieta e do exercício, o tratamento farmacológico é
recomendado para crianças maiores de 10 anos com LDL-C >190mg/dl ou >160mg/dl se
associado a 2 ou mais outros fatores de risco cardiovascular46. Nesses casos, as estatinas são a
primeira escolha. No caso de HDL-C baixo e TG elevados a principal abordagem se baseia na
perda de peso (dieta e exercício) já que os fibratos não são utilizados nesta faixa etária e a niacina,
única medicação liberada para o uso, é pouco tolerada.
As resinas não são indicadas por elevarem as TG e diminuir o HDL-C. O ezetimibe
poderá ser uma alternativa para uma estatina, mas são necessárias evidências que não traz prejuízo
à absorção de macro e micronutrientes, necessários para um desenvolvimento saudável.
Por tudo isto, fica patente a necessidade de se investir intensamente nas mudanças
no estilo de vida como arma principal no controle da dislipidemia desses pacientes45,46.
Crianças e adolescentes com SM serão melhor orientadas e tratadas por especialista
com experiência no manejo dos seus diversos componentes, principalmente na eventualidade do
emprego de ações farmacológicas.
CONCLUSÃO
O conhecimento sobre SM na população pediátrica está em evolução, necessitando
de critérios diagnósticos mais bem definidos. A AHA alerta os pediatras para a freqüência
crescente de fatores de risco cardiovascular na faixa pediátrica ligados ao sobrepeso/obesidade, os
quais necessitam de intervenção precoce.
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É evidente que o ponto chave da questão é a prevenção do sobrepeso/obesidade,
fruto de um estilo de vida que privilegia o binômio alimentação inadequada e inatividade física.
Esta não é, portanto, uma tarefa apenas para o médico. Ela deve incluir a sociedade civil
organizada tendo como núcleos de atuação direta a família e a escola. No âmbito maior, de um
lado está o estado que pode criar, pelo seu poder normativo e executivo, condições para a
educação e execução de hábitos saudáveis por parte do estudante e dos seus familiares e para a
produção e comercialização de alimentos dentro dos padrões hoje exigidos para a prevenção das
doenças crônico-degenerativas, com destaque para as doenças cardiovasculares, diabetes e vários
tipos de câncer. Do outro lado, estão os setores produtivo e de comercialização de alimentos que
precisam se conscientizar do seu importante papel para a saúde pública e no particular da
prevenção dessas doenças. Nesse contexto também se incluem os meios de comunicação, peça
fundamental para a veiculação das estratégias necessárias para o combate ao mal.
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Recebido em 09.03.2006. Aprovado em 04.07.2006.
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RESUMO DE TESE
Revista Baiana
de Saúde Pública
CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO EM SAÚDE
SAÚDE::
O ENSINO DE BIOSSEGURANÇA EM CURSOS DE NÍVEL MÉDIO
NA FUNDAÇÃO OSW
ALDO CRUZ 1
OSWALDO
Marco Antonio Ferreira da Costa
O estudo realizado no período 2004-2005 teve como objetivo geral investigar a
situação atual do ensino de biossegurança em cursos de nível médio da área de saúde. Teve como
foco de coleta de dados 6 cursos de nível médio da Fundação Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro.
Um total de 97 alunos, 12 professores e 3 coordenadores dos locais pesquisados participaram. Foi
uma pesquisa teórico-empírica, com abordagem qualitativa e utilização de dados quantitativos que
emergiram ao longo do processo de trabalho. Os dados foram analisados à luz da
multirreferencialidade. Esta investigação justificou-se pela defasagem da biossegurança em relação
ao mundo do trabalho, ao mundo da escola, às demandas decorrentes do progresso técnicocientífico e da própria evolução social, no que se refere a biossegurança em espaços da saúde. Os
resultados obtidos apontaram para uma necessidade de aprimoramento dos processos de ensino
em biossegurança em cursos de nível médio da área de saúde na Fundação Oswaldo Cruz. O
estudo, inserido no processo educação-trabalho-saúde, poderá suportar ações pedagógicas no
campo da educação profissional, especificamente no que se refere ao ensino da biossegurança em
cursos de nível médio da Fundação Oswaldo Cruz, na área de saúde, e também atuar como
instrumento de apoio para a elaboração de políticas públicas no âmbito do SUS e de sistemas de
ensino em geral, principalmente aos relacionados às Escolas Técnicas do SUS (ETSUS).
Palavras-chave: Ensino de Biossegurança. Educação Profissional em Saúde.
KNOWLEDGE CONSTRUCTION IN HEALTH: BIOSAFETY TEACHING IN SECONDARY
LEVEL COURSES IN OSWALDO CRUZ FOUNDATION
This study, undertaken from 2004 to 2005 intended to investigate the present
situation of biosafety teaching in secondary level courses in health. Data collection focused on 6
1
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ensino de Biociências e Saúde Instituto Oswaldo Cruz (Fiocruz),
Rio de Janeiro. Orientador Prof. Dra. Maria de Fátima Barrozo da Costa (ENSP/FIOCRUZ – RJ) e Dr. Sidnei Quezada Meireles
Leite (CEFET-QUÍMICA – RJ). Defendida e aprovada em 17 de dezembro de 2005.
v.30 n.2, p.363-364
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secondary level courses in Rio de Janeiro’s Oswaldo Cruz Foundation. Overall, 97 students, 12
instructors and 3 local area supervisors took part in the study. This was a theoretical empirical
research, with qualitative approach and using quantitative data emerging during data collection.
Data were analyzed according to multireferenciality. This investigation is justified by means of the
lack of biosafety updating as regards work and school scenarios, and in face of demands from
technological and scientific progress and social development itself, as far as health spaces are
concerned. Results point out to the experienced demand in terms of the improvement of biosafety
teaching processes in secondary level course in Oswaldo Cruz Foundation’s health area. The study,
part of the education-work-health process, will be able to support pedagogical actions in terms of
professional education, particularly in terms of Oswaldo Cruz Foundation’s health area secondary
level biosafety courses, as well as serve as a supporting instrument for the creation of public
policies within SUS and teaching systems in general, particularly those associated with SUS
Technical Schools (ETSUS).
Keywords: Biosafety Teaching. Professional Health EducationKey words: Biosafety Teaching.
Professional Health Education.
Recebido em 09.01.2006. Aprovado em 09.01.2006.
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RESUMO DE DISSERTAÇÃO
Revista Baiana
de Saúde Pública
EXPOSIÇÃO OCUP
ACIONAL A NÉVOAS ÁCIDAS E AL
TERAÇÕES SALIV
ARES 1
OCUPACIONAL
ALTERAÇÕES
SALIVARES
Carlos Alberto Lima da Silva
Objetivos
Objetivos: identificar e descrever alterações salivares frente à exposição ocupacional
a névoas ácidas. Métodos
Métodos: trata-se de um estudo de corte transversal conduzido com 65
trabalhadores de uma indústria química que produz ácido clorídrico. Os dados foram obtidos
através de um programa piloto de promoção em saúde bucal, realizado nessa empresa. Antes do
exame oral, foram coletados dados sócio-demográficos e de estilo de vida. Medidas do pH da
saliva estimulada e não estimulada, capacidade tampão, taxa de fluxo salivar e concentração de
imunoglobulinas A e G foram mensuradas. A medida da exposição foi baseada em auto-relato dos
trabalhadores e no inventário de monitoramento de agentes químicos; este último foi conduzido
por higienistas ocupacionais dessa empresa. Trabalhadores somente foram considerados expostos a
névoas ácidas quando houve concordância para ambas as fontes de informação. Resultados
Resultados: a taxa
de fluxo salivar foi maior no grupo exposto (Média=3,04 versus 2,57 ml/min, p<0,10), enquanto a
capacidade tampão foi menor entre trabalhadores expostos (Média=6,58 versus 6,88 pH, p<0,10),
mesmo quando a exposição ocorreu em níveis baixos, como foi observado neste estudo. Regressão
linear múltipla, método dos mínimos quadrados, foi empregado para todas as co-variáveis, sendo
observada associação positiva com taxa de fluxo salivar para idade, consumo de alimentos ácidos,
hipertensão arterial e uso de próteses. Foram verificadas, para capacidade tampão, associação
negativa para escolaridade e positiva com consumo de álcool. Conclusões
Conclusões: exposição a névoas
ácidas, conhecida pelo seu efeito sobre os tecidos dentais e trato respiratório superior, pode causar
alterações salivares, desestabilizando mecanismos protetores para a saúde bucal.
Palavras-chaves: Riscos ocupacionais. Névoas ácidas. Erosão dental. Saliva.
OCCUPATIONAL EXPOSURE TO ACID MIST AND SALIVA CHANGES
Objectives
Objectives: to identify and to describe saliva changes associated with occupational
exposures to acid mists. Methods
Methods: this is a cross-sectional study conducted with 65 workers of a
1
Dissertação apresentada ao Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal da Bahia (UFBA). Orientadora: Prof. Dra. Vilma
Sousa Santana. Defendida e aprovada em 18 de março de 2002.
Biblioteca depositária: Biblioteca do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia. Rua Padre Feijó, 29, 4º
andar. Salvador, Bahia, Brasil.
v.30 n.2, p.365-366
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hydrochloric acid industry. Data were obtained from the initial phase of an oral exam,
sociodemographic and life style data were collected using individual questionnaires. pH in
stimulated and non-stimulated saliva, buffer capacity, saliva flow rate and immunoglobuline A,
IgA, and G, IgG concentration were all measured. Exposure assessment was based on both workers
self-report and measurements from the chemical substances monitoring conducted by industrial
hygienists in this plant. Acid mists exposed workers were those who scored positive in both
registers. Results
Results: Saliva flow rate was higher in the exposed group (Mean=3.04 vs 2.57 ml/min,
p<0.10), while buffer capacity was lower among exposed workers (Mean=6.58 vs 6.68 pH,
p<0.10), even when exposure occured at small levels, as observed in this study site. Using ordinary
least square linear regression, associated factors to saliva flow rate were age, acid food, high blood
pressure and oral prothesis. For buffer capacity, a negative association with education and positive
with alcohol consumption were also found. Conclusions
Conclusions: acid mists exposure besides their known
effect on dental tissues and other upper respiratory and digestive trait, may also cause saliva
changes that can undermine its protective effects for oral health.
Keywords: Occupational risks. Acid mists. Dental erosion. Saliva. Salivary.
Recebido em 21.06.2006. Aprovado em 03.07.2006.
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RESUMO DE DISSERTAÇÃO
Revista Baiana
de Saúde Pública
AVALIAÇÃO DA IMPLEMENT
AÇÃO DA ESTRA
TÉGIA DE A
TENÇÃO INTEGRADA ÀS
IMPLEMENTAÇÃO
ESTRATÉGIA
ATENÇÃO
DOENÇAS PREV
ALENTES NA INFÂNCIA (AIDPI) NO EST
PREVALENTES
ESTADO
ADO DA BAHIA 1
Cristina Campos dos Santos
Trata-se de um estudo exploratório e descritivo sobre a avaliação da implementação
da Atenção Integrada às Doenças Prevalentes na Infância (AIDPI) no estado da Bahia, no período
de 1998-2002. Na avaliação, consideram-se os eixos da implementação da AIDPI: capacitação de
recursos humanos, metodologia da assistência e infra-estrutura dos serviços. O objetivo geral é
avaliar a implementação da AIDPI na Bahia. Como objetivos específicos, adotaram-se: a) descrever
o processo de implementação da AIDPI; b) avaliar a implementação da AIDPI com base nos
indicadores de processos selecionados; c) analisar os limites e as possibilidades relativos à
implementação da AIDPI. Adota-se no estudo uma abordagem quantitativa/qualitativa e os
elementos de uma pesquisa interessada. Foram selecionados como amostra os 67 municípios com
AIDPI implantada. Os dados quantitativos foram coletados nos registros em relatórios técnicos da
Secretaria Estadual de Saúde (SESAB), e os qualitativos em documentos e entrevistas semiestruturadas com técnicos do âmbito central da SESAB que atuam direta e/ou indiretamente no
gerenciamento da AIDPI. Para a análise das entrevistas, utiliza-se a técnica de análise de
enunciação; e dos dados quantitativos, técnicas estatísticas simples. Identifica-se que a
implementação da AIDPI no estado da Bahia resultou na capacitação de 562 profissionais nas três
modalidades de curso, sendo as enfermeiras a categoria com maior número de profissionais
capacitados. O eixo da capacitação é o foco priorizado pela SESAB, dado que permite uma
visibilidade política da estratégia, por possuir uma estruturação e organização prévia que facilitam,
em parte, a implementação. Em relação ao eixo da assistência identifica-se que o percentual de
crianças classificadas e tratadas corretamente, bem como as orientações adequadas sobre
alimentação estão mantidas em média num patamar de 70%, com um decréscimo no ano 2000, o
que se caracteriza como um desempenho satisfatório. Quanto à infra-estrutura dos serviços, a
despeito da falta de alguns medicamentos, este eixo não foi identificado como um obstáculo
significativo para a implementação da estratégia. Quanto à inserção da enfermeira na AIDPI, torna-
1
Dissertação apresentada ao Curso de Pós-Graduação da Escola de Enfermagem da Universidade Federal da Bahia - Salvador.
Orientadora: Profa. Dra. Climene Laura de Camargo. Defendida e aprovada em 07 de novembro de 2003.
Biblioteca depositária: Biblioteca da Escola de Enfermagem da Universidade Federal da Bahia.
v.30 n.2, p.367-369
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se visível que ela possui competência técnica reconhecida pelos informantes, além de estar
presente de forma continuada e por maior tempo nos serviços. Deste modo, esta profissional é
reconhecida pelos entrevistados como imprescindível na implementação da AIDPI. Como
conclusão, ressalta-se que a maioria dos municípios com AIDPI implantada não se enquadra nos
critérios mais importantes exigidos pela estratégia. A avaliação aponta para uma necessidade
urgente de re-direcionamento da implantação/implementação da AIDPI no estado da Bahia, bem
como melhor alocação dos recursos financeiros e a urgente descentralização de todo o processo
para os municípios interessados. Deste modo, poderá contribuir com as ações de atenção à saúde
da criança e ser parte essencial na construção de um novo modelo de atenção à saúde na Bahia e
no Brasil.
Palavras-chave: Processo de Avaliação. Programa de Saúde. Atenção à saúde da criança
EVALUATING THE IMPLEMENTATION OF INTEGRATED HEALTH
CARE STRATEGY TO FACE PREVALENT DISEASES IN CHILDHOOD (AIDPI)
IN THE STATE OF BAHIA, BRAZIL
This is an exploratory and descriptive investigation to evaluate the implementation
of Integrated Health Care Strategy to Face Childhood Prevalent Diseases (AIDPI) in the state of
Bahia, Brazil, in the 1998-2002 period. With a quantitative/qualitative approach theoretically
supported by the concepts of policy oriented investigation, it aims at attaining specific objectives:
a) describing the process of AIDPI implementation; b) evaluating the process based on this
strategy´s selected indicators; c) to analyze constrains and possibilities of the implementation
through the evaluation of three axes of the AIDPI strategy: personnel training, care methodology
and health services infrastructure. The universe of the research was a sample of 67 municipalities
where the AIDPI strategy has been implemented. Quantitative data were collected from State
Health Office’s (SESAB) reports, whereas qualitative data from program documents and keyinformants with the support of semi-structured interviews. Qualitative data were conducted by
means of content analysis technique, whereas quantitative data by simple statistical analysis. The
results showed that there are 562 health professionals trained to develop AIDPI in health services,
nurses being the majority of those professionals. Training is the best organized of the three axes,
showing the priority with which it is treated by SESAB, due to its potential to give the strategy
political visibility. Related with the methodology of care, 70% of overall children have been
treated correctly, with a little drop in 2000, which is characterized as a satisfactory result. As to
health services infrastructure, the evaluation detected the lack of some standardized medicines,
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Revista Baiana
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which is not considered a problem for the strategy implementation. Key informants considered the
nurse’s performance as being technically competent and most relevant to the strategy. By way of
conclusion, the investigation shows that the majority of municipalities do not respond to the most
important criteria to organize the AIDPI, that is, to have high infant mortality rates. The evaluation
points out to the need of a re-directioning of the strategy as well as to the necessity of performing a
better distribution of funds as well as urgent decentralization of the organization, settlement and
implementation of AIDPI by the municipalities. Only then AIDPI strategy could contribute to
change the health care model in Bahia and Brazil.
Keywords: Process evaluation. Health program. Children’s Health Care.
Recebida em 09.03.2006. Aprovada em 04.07.2006.
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INDICE POR AUTOR
(número da página)
A
F
ALELUIA, L.R. de A. p.105
FERREIRA, A.P. p.309
ANDRADE, M.L.B. p.141
FERREIRA, M. de A. p.294
ARAUJO, T.M. p.59
G
B
GOMES, ACMG p.169
BARREIROS, M. F. p.77
GOMES, KRO p.238
BARRETTO, N.S.A. p.294
GOMES, MAM p.169
BASTOS, L. p.179
GOMES JUNIOR, RS p.141
BISPO, D.D.de C. p.294
GUIMARÃES, AC p.349
BISPO JÚNIOR, J.P. p.248
GUIMARÃES, ICB p.349
GRAÇA, CC p.59
C
CANGUÇU, S. p.154
J
CARDOSO, D.N. R. p.294
JACOBINA, R.R. p.19
CARDOSO, E. p.50
JORGE, L.C. p.309
CASTRO, M. p.211
COELHO, S.M.P.S. p. 90
K
COUTO, O.K. p.105
KRAYCHETTE, D. p.211
COSTA, M.A.F. da p.363
COSTA, M.R.A. p.90
L
CUNHA, C.L.N.da p.309
LENZI, M.F. p.309
CUNHA, M. S.de C. p.90
LIMA, B.G. de C. p.284
CRUZ, M.F. de A. p.189
LOPES, I.B. p.224
D
M
DALTRO, C. p.211
MAGALHÃES, L.B.N.C. p.169
DANTAS, N . p.154
MAIA, H.F. p.224
MAIA, M.G. de M. p.129
E
MARTINS, I. p.179
ELOY, L. p.154
MATOS, C.M.S. de p.284
370
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370
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Revista Baiana
de Saúde Pública
MATOS, Cleuza Maria Santos de (284)
REIS, Francisco (154)
MASCARENHAS, Márcio D. M. (238)
RIOS, Carolina (154)
MEIRA, Marluce de Oliveira Brito (161)
RIOS, Maria Helena (90)
MELO, Ailton (50)
ROCHA, Emilia (179)
MELO, Eliana Ferraz (284)
ROCHA, Mateus Teixeira do Amaral (294)
MENEZES, Nívia Martins (90)
ROCHA, Tânia Margarida de Novaes (141)
MESQUITA, Cláudio Márcio de (309)
RODRIGUES, Bernardo (50)
MESSIAS, Kelly Leite Maia de (248)
MOLESINI, Joana Angélica Oliveira (141)
MUNIZ, Pascoal Torres (129)
S
SACRAMENTO, Mariana (179)
SAMPAIO, José Jackson Coelho (248)
SANTOS, Cristina Campos dos (367)
N
NUNES, João Luiz Barbosa (39)
SANTOS, Elda S. (238)
SANTOS, Grazyella P.(238)
SANTOS, Josenaide Engrácia dos (161)
O
OLIVEIRA, Manoela (154)
OLIVEIRA, Telma Dantas Teixeira de (105)
SCIPPA, Ângela Miranda (211)
SERVO, Maria Lúcia Silva (7)
SILVA, Bruno Mendonça Potásio da (294)
SILVA, Carlos Alberto Lima da (365)
P
SILVA, Cátia Andrade (179)
PARANÁ, Raymundo (154)
SILVA, Cruiff Emerson Pinto (59)
PEREIRA, Ana Paula Chsncharulo de Morais
SILVA, Sônia de Moura (169)
(7)
SILVANY NETTO, Annibal Muniz (39)
PORTINHO, Bartira Gomes (77)
SOLLA, Jorge José Santos Pereira (332)
PREARO, Alice Yamashita (191)
SOUZA, Carla Lima de (272)
SOUZA, Marcos Barbosa de (309)
Q
SOUZA, Norma Suely Souto (77)
QUADROS, Rachel Silvany (39)
QUARANTINI, Lucas (211)
T
TAVARES – NETO, José (129)
R
TEIXEIRA, Carla Regina de Souza (261)
RABELO, Antônio Reinaldo (50)
THOMÉ, Célia Regina (272)
RABELO, Mina Modesto (50)
RANGEL, Maria Lígia (322)
V
REGO, Marco Antônio Vasconcelos (294)
VASCONCELOS
S, José Narciso Gonçalves de
REGO, Rita de Cássia Franco (129)
(169)
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W
WANDERLEY, Camila (179)
WERMELINGER, Eduardo Dias (309)
Z
ZANETTI, Maria Lúcia (261)
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NORMAS P
ARA PUBLICAÇÃO
PARA
Revista Baiana
de Saúde Pública
A Revista Baiana de Saúde Pública (RBSP), publicação oficial da Secretaria da Saúde
do Estado da Bahia (SESAB), de periodicidade semestral, dedica-se a publicar contribuições sobre
aspectos relacionados aos problemas de saúde da população e à organização dos serviços e
sistemas de saúde e áreas correlatas. Serão aceitas para publicação as contribuições escritas
preferencialmente em português, de acordo com as normas da RBSP publicadas, obedecendo a
ordem de aprovação pelos editores.
CA
TEGORIAS ACEIT
AS:
CATEGORIAS
ACEITAS:
1. Artigos originais
1.1
Pesquisa: artigos apresentando resultados finais de pesquisas científicas
(10 a 15 laudas).
1.2
Ensaios: artigos com análise crítica sobre um tema específico (5 a 8
laudas).
1.3
Revisão: artigos com revisão crítica de literatura sobre tema específico,
solicitados pelos editores (8 a 10 laudas).
2. Comunicações: informes de pesquisas em andamento, programas e relatórios
técnicos (5 a 8 laudas).
3. Teses e dissertações: resumos de dissertações de mestrado e de teses de
doutorado/livre docência defendidas e aprovadas em universidades brasileiras
(máximo 2 laudas). Os resumos devem ser encaminhados com o título
oficial da tese, dia e local da defesa, nome do orientador e local disponível
para consulta.
4. Resenha de livros: resenhas de livros publicados sobre temas de interesse,
solicitados pelos editores (1 a 4 laudas).
5. Relato de experiências: apresentando experiências inovadoras (8 a 10 laudas).
6. Carta ao editor: carta contendo comentários sobre material publicado (2
laudas).
7. Editorial: de responsabilidade do editor, podendo ser redigido por convidado
por solicitação deste.
8. Documentos: de órgãos oficiais sobre temas relevantes (8 a 10 laudas).
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ORIENT
AÇÕES AOS AUTORES
ORIENTAÇÕES
INSTRUÇÕES GERAIS PARA ENVIO
Os trabalhos a serem apreciados pelos editores e revisores seguirão a ordem de
recebimento e deverão obedecer aos seguintes critérios de apresentação.
Devem ser encaminhadas à secretaria executiva da revista três cópias impressas. As
páginas devem ser formatas em espaço duplo com margem de 3cm à esquerda, fonte
Times New Roman, tamanho 12, página padrão A4, numeradas no canto superior
direito (não numerar as páginas contendo tabela, gráfico,desenho ou figura).
Podem também ser enviados para o e-mail da revista, desde que não contenham
desenhos ou fotografias digitalizadas.
Uma cópia em disquete deverá ser entregue com a versão final aceita para
publicação.
ARTIGOS
Folha de rosto: deve constar, o título (com versão em inglês), nome(s) do(s)
autor(es), principal vinculação institucional de cada autor, orgão(s) financiador(es) e
endereço postal e eletrônico de um dos autores para correspondência.
Segunda folha: iniciar com o título do trabalho sem referência à autoria e acrescentar
abstract). Trabalhos
um resumo de no máximo 200 palavras, com versão em inglês (abstract).
em espanhol ou inglês devem também ter acrescido o resumo em português.
Palavras-chave (3 a 8) extraídas do vocabulário DECS (Descritores em Ciências da
Saúde/ www.decs.bvs.br) para os resumos em português e do MESH (Medical
Subject Headings / www.nlm.nih.gov/mesh) para os resumos em inglês.
Terceira folha: Título do trabalho sem referência à autoria e início do texto com
parágrafos alinhados nas margens direita e esquerda (justificados), observando a
seqüência: introdução
introdução, incluindo justificativas, citando os objetivos no último
parágrafo; material e métodos; resultados; discussão; e referências
referências. Digitar em
página independente os agradecimentos, quando necessário.
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Revista Baiana
de Saúde Pública
TABELAS, GRÁFICOS E FIGURAS
Obrigatoriamente, os arquivos das tabelas, gráficos e figuras devem ser digitados em
arquivos independentes e impressos em folhas separadas. Estes arquivos devem ser
compatíveis com processador de texto “Word for Windows” (formatos: PICT, TIFF,
GIF, BMP). O número de tabelas, gráficos e, especialmente, ilustrações deve ser o
menor possível. As ilustrações, figuras e gráficos coloridos somente serão publicados
se a fonte de financiamento for especificada pelo autor. No texto do item resultados,
as tabelas, gráficos e figuras devem ser numeradas por ordem de aparecimento no
texto, com algarismos arábicos e citadas em negrito (e.g. “... na Tabela 2 as medidas
..) Tabela (não utilizar linhas verticais), Quadro (fechar com linhas verticais as
laterais). O título deve ser objetivo e situar o leitor sobre o conteúdo, digitado após
o número da Tabela, Gráfico, etc., e.g.: Gráfico 2. Número de casos de AIDS no
Brasil de 1986 a 1997, distribuído conforme a região geográfica
geográfica.
Figuras reproduzidas de outras fontes já publicadas devem indicar esta condição na
legenda.
ÉTICA EM PESQUISA
Trabalho que tenha implicado em pesquisa envolvendo seres humanos ou outros
animais deve vir acompanhado de cópia de documento que atesta sua aprovação
prévia por um Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), além da referência em material e
métodos.
REFERÊNCIAS
Preferencialmente, qualquer tipo de trabalho encaminhado (exceto artigo de revisão),
deverá ter até 30 referências.
As referências no corpo do texto deverão ser numeradas em sobrescrito,
consecutivamente, na ordem em que forem mencionadas a primeira vez no texto.
As notas explicativas e/ou de rodapé são permitidas e devem ser ordenadas por letras
minúsculas em sobrescrito.
As referências devem aparecer no final do trabalho, listadas pela ordem de citação,
seguindo as regras propostas pelo Comitê Internacional de Editores de Revistas
Médicas, disponíveis em: http://www.icmje.org ou www.abec-editores.com.br
(Requisitos uniformes para manuscritos apresentados a periódicos biomédicos/
Vancouver).
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Exemplos:
a) LIVRO
Acha PN, Szyfres B. Zoonosis y enfermedades transmisibles comunes al hombre y a
los animales. 2ª. ed. Washington: Organizacion Panamericana de la Salud; 1989.
b) CAPÍTULO DE LIVRO
Almeida JP, Rodriguez TM, Arellano JLP. Exantemas infecciosos infantiles. In:
Arellano JLP, Blasco AC, Sánchez MC, García JEL, Rodríguez FM, Álvarez AM,
editores. Guía de autoformación en enfermedades infecciosas. Madrid:
Panamericana; 1996. p. 1155-68.
c) ARTIGO
Azevêdo ES, Fortuna CMM, Silva KMC, Sousa MGF, Machado MA, Lima AMVMD,
et al. Spread and diversity of human populations in Bahia, Brazil. Human Biology
1982;54: 329-41.
d) TESE E DISSERTAÇÃO
Britto APCR. Infecção pelo HTLV-I/II no Estado da Bahia [Dissertação]. Salvador
(BA): Univ. Federal da Bahia; 1997.
e) RESUMO PUBLICADO EM ANAIS DE CONGRESSO
Santos-Neto L, Muniz-Junqueira I, Tosta CE. Infecção por Plasmodium vivax não
apresenta disfunção endotelial e aumento de fator de necrose tumoral-a (FNT-a) e
interleucina-1b (IL-1b). In: Anais do 30o. Congresso da Sociedade Brasileira de
Medicina Tropical. Salvador, Bahia; 1994. p.272.
f) DOCUMENTO EXTRAÍDO DE ENDEREÇO DA INTERNET
[autores ou sigla e/ou nome da instituição principal]. [Título do documento ou
artigo] Extraído de [endereço eletrônico], acesso em [data]. Exemplo:
COREME, Comissão de Residência Médica do Hospital Universitário Professor
Edgard Santos (HUPES) da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Regimento
Interno da COREME. Extraído de [http://www.hupes.ufba.br/coreme], acesso em [20
de setembro de 2001].
Não incluir nas “Referências” material não-publicado ou informação pessoal. Nestes
casos, assinalar no texto: (i) FF Antunes Filho, Costa SD: dados não-publicados; ou
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Revista Baiana
de Saúde Pública
(ii) JA Silva: comunicação pessoal, 1997. Todavia, se o trabalho citado foi aceito
para publicação, incluí-lo entre as referências, citando os registros de identificação
necessários (autores, título do trabalho ou livro e periódico ou editora), seguido da
expressão latina In press e o ano.
Quando o trabalho encaminhado para publicação tiver a forma de relato de
investigação epidemiológica, relato de fato histórico, comunicação, resumo de
trabalho final de curso de pós-graduação, relatórios técnicos, resenha bibliográfica e
carta ao editor, o(s) autor(es) deve(m) utilizar linguagem objetiva e concisa, com
informações introdutórias curtas e precisas, delimitando o problema ou a questão
objeto da investigação. Seguir as orientações para referências, gráficos, tabelas e
figuras.
As contribuições encaminhadas só serão aceitas para apreciação pelos editores e
revisores se atenderem às normas da revista.
Endereço para remessa de trabalho
Revista Baiana de Saúde Pública
Escola da Saúde Pública Prof° Francisco Peixoto
de Magalhães Netto
Rua Conselheiro Pedro Luiz nº 171
Rio Vermelho – Salvador – Bahia
CEP 41950-610
TEL/FAX 0XX71 3116-5313/3334-0428
[email protected]
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AGRADECIMENTOS ESPECIAIS AOS COLABORADORES, PELAS A
VALIAÇÕES
AV
NO ANO 2006 E ESPERAMOS CONT
AR COM O APOIO NO ANO 2007.
CONTAR
Alcina Andrade
Ana Maria Fernandes Pitta
Augusto César Cardoso
Carlito Nascimento Sobrinho
Carmen Fontes Teixeira
Ceuci Nunes
Fernando Martins Carvalho
Helma Cotrim
Isabela Sales Junqueira Ayres
Jacy Amaral Freire de Andrade
Giuseppe Benitivoglio Greco
Joana Oliveira Molesini
Jorge José Santos Pereira Solla
José Carlos Barboza Filho
José Henrique Barreto
José Tavares Neto
Juarez Pereira Dias
Lauro Antônio Porto
Lígia Rangel
Luiz Carlos Passos
Marco Antônio Rego
Maria de Lourdes Lima
Maria Izabel Pereira Viana
Marilia Fontoura
Marlene B. Carvalho
Mônica Angelim
Rosanita Baptista
Roseli Carvalho
Tânia Maria Araújo
Telma Dantas Oliveira
Vera Lúcia Almeida Formigli
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Revista Baiana
de Saúde Pública
SECRETARIA DA SAÚDE DO ESTADO DA BAHIA - SESAB
SUPERINTENDÊNCIA DE EDUCAÇÃO PERMANENTE E COMUNICAÇÃO EM SAÚDE SUPECS
ESCOLA ESTADUAL DE SAÚDE PÚBLICA PROF. FRANCISCO PEIXOTO DE MAGALHÃES
NETTO - EESP
REVISTA BAIANA DE SAÚDE PÚBLICA - RBSP
Rua Conselheiro Pedro Luiz, 171 - Rio Vermelho
CEP 41950-610 Caixa Postal 631
Tel 71 3334-1888 Fax 71 3334-0428
Recebemos e agradecemos
Nous avons reçu
We have received
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Desejamos receber
Il nous manque
We are in want of
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Enviamos em troca
Nou envoyons en echange
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Fazenda Grande do Retiro
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Tels.: (71) 3116-2850/2806
Fax: (71) 3116-2902
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