I T P Instituto Trianon de Psicologia Centro Lacaniano de psicanálise O Mito Individual do Neurótico* Antonia Claudete A. L. Prado Aula de 24 de agosto de 2009 *LACAN, J. O mito individual do neurótico, ou Poesia e verdade na neurose (1953). In: O mito individual do neurótico. Ed. Zahar. R.J. 2008. Psicanálise Ciência Não é objetivável Lacan a aproxima do campo das artes (liberais) Trata da relação do homem consigo mesmo Pelo uso da fala Que não diz toda a verdade Que é construída Interna – relação intersubjetiva Pelo MITO Constitui o discurso Sempre na experiência analítica Objetiva Mito Individual Coletivo (Psicanalista) Revive – vem de dentro, da história pessoal, pela fala. (Xaman*) Tratamento (sobre um mito) Vive – vem de fora, do social, pela narrativa. A cura se dá pela fala Produzem efeitos terapêuticos O xaman fala, o sujeito escuta. Na idade média: epos (narrativa), gestas (crônicas): ilustram esquemas neuróticos Fundante da neurose presentes na prática clínica. O sujeito fala, o psicanalista escuta. Ao falar constrói o mito individual A cura está no sujeito, pelo simbólico. A cura está no xaman, pelo imaginário. * Ref. a um caso de cura xamanística entre os índios Cuna do Panamá (Lévi-Stauss, O mito individual, Ed. Assírio & Alvin, Lisboa, 1987). O mito Individual do Neurótico* Conflito Fundamental (base da psicanálise) Fantasmas mito individual Rivalidade com o pai Liga-se ao valor simbólico essência Sempre às custas de uma certa degradação concreta ligada a uma situação específica da história do pai. * 1952-53 – contemporâneo à “Função e campo da fala e da ling... (1953) – marco do início do ensino de Lacan e início do simbólico. A neurose obsessiva do Homem dos Ratos De início: Fixação ideativa ligada a uma fantasia Aprisiona Determina a crise neurótica Fascina Horror Fascinado (conteúdo do HR) Ao ouvir, falar, rememorar. Extrema angústia Quando se torna insuportável, procura Freud. Particularidades do Caso Relações em Jogo: Freud: Cada caso deve ser tratado em sua particularidade. A história dessa neurose remonta à pré-história do sujeito. Relações familiares envolvidas na união dos pais. Ressoam na obsessão. Constelação Familiar Pai Entre duas mulheres, casa-se com a moça rica. Suboficial depreciado. A outra é bonita, mas pobre. Situações degradantes: A ao tornar-se pai, o prestígio é da mãe. Brincadeira que se repete Zomba do marido Sustenta a família Certamente impressionou o sujeito. B Dívida paterna (castração) e passado sujo. Conflito do Homem dos Ratos Reproduz exatamente o conflito paterno. •Moça x Moça pobre •Pequena dívida envolvendo o amigo •Dívida impagável. Estratégia Obsessiva Transforma a dívida em um conflito obsessivo Tormento insuportável Pagamento impossível Pagar a “A”: Juramento Comandado por uma necessidade interna Questão: O que dá o caráter mítico a este roteiro fantasístico? Capitão Tenente A Moça rica (do correio) Moça pobre (da hospedaria) Tenente B Resposta: A reprodução, mais ou menos modificada, dos mesmos ingredientes. Deslocamento do drama original para a cena atual da rede mítica. 1. Dívida do pai com um amigo, 2. Moça rica / moça pobre, 3. Dificuldade de reembolso. Uma tentativa de solucionar o que não foi resolvido no passado. A dupla dívida do pai Frustração frente à castração paterna Dívida social Movimento Neurótico Tentar cobrir esses dois elementos da dívida Introduzir soluções inadequadas O que busca não é a solução – a dívida não pode ser paga. Ele precisa “querer pagar” para não pagar. A Transferência Freud Moça rica Filha de Freud Amigo Fantasia • Tem todos os Bens da Terra; • E estrume nos olhos. HR Ambiguidade Rica e maléfica Desdobramento do sujeito, e do outro Eu e Não-eu O sujeito ama e odeia algo nele e no outro – ao mesmo tempo Narcisismo Dois personagens que se confundem Ambivalência Na relação com o analista, a fórmula obsessiva congrega Mito e Fantasia Situação de Quatuor Sujeito desejo Objeto Amigo+ HR Rica+ (Moça do correio) mulher HR devedor- Imaginário Real Pobre- (criada de albergue) Uma realidade clínica que serve para orientar a experiência analítica Questão central do sujeito masculino Fazer-se reconhecer, ser merecedor Na função viril No trabalho (relação com o outro sexo) (imagem social) Sobre Goethe* Aos 22 anos de idade apaixona-se por Frederica. Isso o libera do encantamento feito por uma antiga namorada que, ao surpreendê-lo beijando sua irmã, proferira palavras fatais. Malditos sejam para todo o sempre esses lábios. Que a desgraça recaia sobre a primeira que receber a homenagem* A paixão por Frederica é mais forte que ele, e vence a interdição interna – fica em euforia. * LACAN, J. O mito individual do neurótico. Ed. Zahar, RJ. 2008. p. 32. Um romance muito enigmático na vida de Goethe. Apaixonado, ele põe fim ao romance. Esse é o maior enigma na sua vida, cheia de contradições. Uma das contradições que provocaram profundo interesse entre os goetheforschers, stedhalianos, bossuetistas*. Lacan toma o enigma sobre Frederica e faz a seguinte aposta: A chave dos problemas está nos seus antecedentes imediatos. * Pesquisadores de Goethe; Stendhal: novelista francês, Bossuet: teólogo (tudo se subordina às leis divinas). Antecedentes imediatos, o encontro com Frederica Ato 1: Em uma viagem à sua aldeia, fora fantasiado com uma sotaina* o que o deixou encabulado ao encontrar uma moça tão sedutora em trajes que não o favoreciam aos seus olhos. Ato 2: Decide voltar à aldeia, agora bem vestido. Ato 3: Seu desejo não se realiza, em lugar de ir bem vestido, volta vestido de bobo – com uma roupa que toma emprestada de um empregado da hospedaria. Justifica isso para os amigos como estando no plano da brincadeira, da conquista, do jogo sexual. * Batina. A vida de Goethe é plena de ambiguidades Entre outras: • Sua autobiografia: Dichtung und Warheit – Poesia e Verdade • A história do bolo de batizado – uma brincadeira que ele conta na sua autobiografia, mas que nunca existiu de fato – para Lacan: uma fantasia de valor muito significativo. Pergunta: Por que Goethe age assim? Hipótese: Por medo. Indício: Fim do romance com Frederica. A estratégia Obsessiva Levar o bolo de batizado, dá a ele o lugar de suboficiante, não o herói principal. Desdobramento da função pessoal do sujeito, nas funções míticas do neurótico. A quebra do encantamento maléfico, não o libera para o amor, ao contrário, seu temor só aumentou. Em prol do “desejo de não se ligar”, “para preservar o destino sagrado do poeta”, ele substitui o objeto desejado pela poesia. Gesto típico do obsessivo: instalar um substituto para o objeto de desejo. O sistema quaternário Impasses + solução impossível + manobras + o 4º elemento Distingue-se do Édipo tradicional (desejo, interdição, fantasia) • Função paterna: recobrir o real pelo simbólico Sempre incompleto • Pai contemporâneo: carente, humilhado (Claudel). • Constituição do eu narcisismo Função decisiva na constituição do sujeito Experiência do eu: fundamental no ser humano Estádio do espelho Angústia na passagem da dependência, da insuficiência, do desamparo para a constituição do eu Depositada nas relações imaginárias, no semelhante, no duplo – um deles: o pai. Relação imaginária Funda as identificações, a agressividade, a experiência de morte. Pai – imaginário / simbólico • Importância estrutural na constituição do eu, • Lugar particular na história de cada sujeito, • Pode ser desdobrado por contingências, como: morte, separação, entrada de um terceiro substituto rivalidade, ciúmes viril. Pode ser um amigo – como no caso do HR – papel essencial na lenda familiar. O quarto elemento É a morte Elemento mediador na constituição do eu Deve ser imaginada – para haver mediação, caso contrário “o movimento dialético cessaria por falta de combatentes” (Hegel). Dialética do senhor e do escravo. É da morte imaginada que se trata Na relação narcísica Na dialética edipiana I T P Instituto Trianon de Psicologia O Mito Individual do Neurótico* Antonia Claudete A. L. Prado Aula de 17 de agosto de 2009 *LACAN, J. O mito individual do neurótico, ou Poesia e verdade na neurose (1953). In: O mito individual do neurótico. Ed. Zahar. R.J. 2008.