A PRÁTICA PEDAGÓGICA NO ENSINO DE GÊNEROS TEXTUAIS: UMA PESQUISA EM DESENVOLVIMENTO ZATERA, Luciana Carolina Santos - PUC-PR [email protected] MARTINS, Pura Lúcia Oliver - PUC-PR [email protected] Resumo Este artigo está destinado especialmente aos professores atuantes em classes iniciais de Ensino Fundamental, que trabalham com a proposta de ensino de Língua Portuguesa centrada no ensino de gêneros textuais. Pretende colaborar para uma reflexão sobre a prática pedagógica do professor deste nível de ensino no que se refere ao trabalho com a recepção e produção de textos em sala de aula, observando em que os professores se apóiam para organizar suas práticas com gêneros textuais. Para tanto, traz uma breve apresentação dos mais atuais estudos sobre gêneros textuais e como uma pesquisa está sendo desenvolvida a partir da prática dos professores em classes do segundo ciclo do Ensino Fundamental. Esta pesquisa está baseada na proposta dos Parâmetros Curriculares Nacionais, que entende a língua como um sistema de signos histórico e social, de acordo com a perspectiva bakhtiniana. Nesse sentido, não há como se expressar oralmente ou por escrito sem fazer uso dos gêneros do discurso, que para essa teoria, são realizações lingüísticas concretas construídas historicamente pelo ser humano. De acordo com essa proposta, o aluno precisa estar em contato com os mais variados gêneros de texto para que saiba utilizá-los nas diferentes situações em que precise fazer uso da fala e também da escrita. Observando o cotidiano da sala de aula a partir de um estudo de caso e entrevistando professores atuantes em classes iniciais do ensino fundamental, será possível caracterizar, refletir e analisar sobre a prática desses profissionais que se utilizam dos gêneros textuais para ensinar Língua Portuguesa. Palavras-chave: Prática pedagógica. Gêneros textuais. Ensino de Língua Portuguesa. Os gêneros textuais e o ensino de língua portuguesa nas escolas O trabalho com a Língua Portuguesa nas escolas, centrado no ensino de gêneros textuais já vem há algum tempo sendo difundido no Brasil, principalmente depois da publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais (SEF, 1998). Diversas publicações sobre o assunto, como Dionísio & Bezerra (2005), Schneuwly & Dolz (2004), Meurer, Bonini & Motta-Roth (2005), Rojo & Batista (2003), Bagno (2002), Dionísio, Machado & Bezerra (2002), Rojo (2000), entre outras, comprovam a importância dos gêneros textuais como objeto de ensino da Língua Portuguesa. 2349 Com o objetivo de trazer elementos para uma reflexão sobre essa questão, o presente artigo mostra a base teórica de uma pesquisa em desenvolvimento1 sobre a prática pedagógica no ensino de gêneros textuais no segundo ciclo do ensino fundamental. Nessa fase de escolarização, o aluno, além de decodificar o código escrito, já é capaz de utilizar seus conhecimentos lingüísticos para ler e compreender diferentes textos, escrevê-los e expressálos oralmente com clareza para que possa, aos poucos, dominar diversos gêneros textuais, e deles, saber fazer uso nas mais variadas situações de interlocução. Sabe-se que desde muito cedo, a criança tem contato com uma diversidade imensa de enunciados (orais e escritos), mesmo antes de se apropriar do código escrito na escola. Ela ouve conversas de diferentes pessoas, assiste aos telejornais, visualiza outdoors, escreve cartinhas, ajuda sua mãe a fazer a lista de compras, a ler receitas culinárias... Enfim, sem mesmo se dar conta disso, a criança está o tempo todo em contato com os mais variados gêneros textuais, e sabe articulá-los muito bem, fazendo narrações de fatos, descrevendo objetos, defendendo seus pontos de vista. Constata-se então, que o aluno, ao vir para a escola, já tem conhecimentos sobre a língua utilizada em suas interações cotidianas. Logo, o processo de ensino aprendizagem pode acontecer a partir desses conhecimentos, do entrecruzamento que a criança faz entre o que já sabe e o que lhe está sendo ensinado. Cada aluno vai construir sua teia de relações do que já foi aprendido com o seu contexto e, gradativamente, com a elaboração de conceitos. Bakhtin (1992, p. 279) definiu gêneros como “tipos relativamente estáveis de enunciados”, caracterizados pelo conteúdo, estilo e construção composicional. Para ele, “a riqueza e a variedade dos gêneros do discurso são infinitas, pois a variedade virtual da atividade humana é inesgotável”. A expressão gêneros textuais é usada para se referir aos textos materializados que encontramos em nossa vida diária e que apresentam características sociocomunicativas definidas por conteúdos, propriedades funcionais, estilo e composição própria, como telefonema, sermão, cartas, romance, bilhete, reportagem, aula expositiva, notícia, horóscopo, receita culinária, bula de remédio, lista de compras, cardápio, manual de instruções, resenha, piada, chat, e-mail... Os gêneros textuais são, portanto, realizações lingüísticas concretas, construídas historicamente pelo ser humano. “A língua penetra na vida através dos enunciados concretos 1 Pesquisa esta que realizo no programa de Pós-graduação em Educação (mestrado) da PUC Paraná. 2350 que a realizam, e é também através dos enunciados concretos que a vida penetra na língua”. (BAKHTIN, 1992, p. 282) Nessa perspectiva, é fundamental que o ensino da linguagem na escola aponte para o uso da língua vinculada à vida cultural e social, permitindo que o aluno saiba por que está produzindo um texto, que finalidade pretende atingir e para quem escreverá. Nesse sentido, os textos produzidos na escola precisam ter um caráter social e não somente feitos para o professor ou para obtenção de notas. Assim: Ensinar a escrever textos torna-se uma tarefa muito difícil fora do convívio com textos verdadeiros, com leitores e escritores verdadeiros e com situações de comunicação que os tornem necessários. Fora da escola escrevem-se textos dirigidos a interlocutores de fato. Todo texto pertence a um determinado gênero, com uma forma própria, que se pode aprender. Quando entram na escola, os textos que circulam socialmente cumprem um papel modelizador, servindo como fonte de referência, repertório textual, suporte de atividade intertextual. A diversidade textual que existe fora da escola pode e deve estar a serviço da expansão do conhecimento letrado do aluno. (SEF, 1998, p. 34) É sabido então, que a partir do contato com a diversidade de gêneros textuais que o aluno será capaz de perceber vários fatores importantes para a produção de textos, tais como: quem escreve, com que intenção, quando, para quem, por que. A partir da década de 90 do século passado, a proposta de trabalho com gêneros textuais, fundamentada na teoria de M. Bakhtin (1992) está presente nos PCNS. Nessa perspectiva, todo texto se organiza dentro de um determinado gênero e não há como ensinar a ler e a escrever textos sem considerar a infinidade de gêneros presentes nas mais diferentes culturas. Assim sendo, os PCNS adotam as concepções bakhtinianas de gêneros discursivos como fonte teórica principal para o ensino de Língua Portuguesa, no que se refere ao aprendizado de leitura e produção de textos. Dialogam também com outros estudos lingüísticos preocupados com o ensino de língua que privilegie o texto em seus aspectos históricos, sociais e culturais. No ensino de gêneros textuais há grande preocupação por parte dos teóricos com as condições de produção, circulação e recepção de textos. Essa preocupação caracteriza a abordagem sócio-histórica do ensino de língua proposto nos PCNS2: 2 Os PCNS são propostas de ensino que podem ser aproveitadas pelos órgãos responsáveis pela educação em todo o Brasil para a construção de currículos adaptados e adequados para cada realidade escolar. 2351 [...] a língua é um sistema de signos histórico e social que possibilita ao homem significar o mundo e a realidade. Assim, aprendê-la é aprender não só as palavras, mas também os seus significados culturais e, com eles, os modos pelos quais as pessoas do seu meio social entendem e interpretam a realidade e a si mesmas. [...] não é possível dizer algo a alguém sem ter o que dizer. E o ter o que dizer, por sua vez, só é possível a partir das representações construídas sobre o mundo. Também a comunicação com as pessoas permite a construção de novos modos de compreender o mundo, de novas representações sobre ele. A linguagem, por realizarse na interação verbal dos interlocutores, não pode ser compreendida sem que se considere o seu vínculo com a situação concreta de produção. (SEF, 1998, p. 24 e 25) Os PCNS, além de serem uma orientação para a construção de currículos adaptados e adequados para cada realidade escolar em todo o território nacional, também orientam os autores de livros didáticos e as editoras na produção de material de apoio ao professor de ensino fundamental, fazendo a transposição didática das teorias sobres gêneros textuais. Muitos desses livros já contemplam essa prática de ensino de linguagem, explorando os mais diferentes gêneros textuais, como histórias em quadrinhos, entrevistas, propagandas, notícias, contos, receitas, cartas, artigos, resenhas etc. Nessa nova perspectiva, o professor é aquele que auxilia na formação do sujeito crítico, consciente de seu papel de escritor e leitor, fazendo com que seu aluno use a língua de maneira adequada a cada situação, seja na forma oral ou escrita, sabendo a que interlocutor quer atingir e que recursos lingüísticos pode utilizar em seu texto. Os gêneros textuais e a prática como objeto de pesquisa Os gêneros textuais são fenômenos históricos, profundamente vinculados “à vida cultural e social”, como afirma o estudioso Luiz Antonio Marcushi. Eles surgem de acordo com a necessidade de certa comunidade para fazer parte da comunicação diária. (DIONÍSIO, MACHADO & BEZERRA [org.], 2002, p. 19). Por essa razão, não podem ser tratados de forma isolada, como uma categoria estanque do ensino de Língua Portuguesa. Devem, pelo contrário, nortear todo o trabalho com a linguagem, contemplando seu aspecto sócio-discursivo. Parte-se de um gênero textual, muitas vezes já conhecido pelos alunos, mas não suficientemente dominado; sistematiza-se em forma de atividades que contemplem as características e usos desse gênero e, enfim, produzem-se textos orais ou escritos nesse mesmo gênero. Observa-se ainda que essa prática deva aproximar-se o quanto mais possível da realidade, fazendo com que o aluno produza textos reais, que circulam na sociedade e que sejam lidos por outras pessoas além do professor. 2352 A proposta de ensino de Língua Portuguesa centrada no trabalho com textos já vem sendo difundida no Brasil desde a década de 80, a partir de obras, estudos feitos com professores, nos cursos de magistério e na formação superior ligada a essa área. Brandão (2001, p. 17) afirma que hoje já é quase consensual que o trabalho com a linguagem na escola deve estar centrado no texto. Nas palavras da autora: Desde a década de 80, todo um trabalho vem sendo feito nesse sentido, não só em termos de capacitação, de treinamento dos professores, mas um conjunto de obras propondo mudanças, relatando e discutindo experiências, vem sendo publicado. No entanto, para muitos, o texto é ainda entendido como fonte ou pretexto para exploração das formas gramaticais isoladas do contexto ou como material anódino, indiferenciado, a ser trabalhado de forma homogênea nas pretensas atividades de leitura. (...) Para muitos, o texto ainda não chegou na sua dimensão textual discursiva. Uma dimensão discursiva do texto pressupõe uma concepção sóciointeracionista de linguagem centrada na problemática da interlocução. (p. 17) Nos últimos dez anos, portanto, podemos observar a predominância da discussão sobre gêneros textuais no ensino de Língua Portuguesa nas escolas em todos os níveis da Educação Básica, principalmente no que diz respeito à prática de leitura e produção de textos. Bakhtin (1992), em meados da década de 30, citado por Rosângela H. Rodrigues (MEURER, BONINI & MOTTA-ROTH, 2005, p. 153) já afirmava: ...um método eficaz e correto de ensino prático [ensino de línguas estrangeiras vivas] exige que a forma seja assimilada não no sistema abstrato da língua, i. é, como uma forma sempre idêntica a si mesma, mas na estrutura concreta da enunciação [enunciado], como um signo flexível e variável (Bakhtin [Voloshinov], 1988 [1929], p. 95). A língua materna – sua composição vocabular e sua estrutura gramatical – não chega ao nosso conhecimento a partir de dicionários e gramáticas, mas de enunciações concretas [enunciados concretos] que nós mesmos ouvimos e nós mesmos reproduzimos na comunicação discursiva viva com as pessoas que nos rodeiam. Assimilamos as formas da língua somente nas formas das enunciações [enunciados] e justamente com essas formas. As formas da língua e as formas típicas dos enunciados, i. é, os gêneros do discurso, chegam à nossa experiência e à nossa consciência em conjunto e estreitamente vinculadas. Aprender a falar significa aprender a construir enunciados (porque falamos por enunciados e não por orações isoladas e, evidentemente, não por palavras isoladas) (Bakhtin, 2003a [1952-1953], p. 282-283). Essa afirmação, que embasa teoricamente os PCNS vem contribuir para a definição do objeto de estudo de Língua Portuguesa: os gêneros do discurso. Para Bakhtin (1992) não há como dissociar a língua da atividade humana. O uso que fazemos de inúmeros enunciados corresponde diretamente a nossas diferentes atividades numa sociedade. Falamos e escrevemos em forma de enunciados, que não são frases soltas ou formas gramaticais isoladas, mas sim realidades concretas e únicas, que variam de acordo com o local onde estamos inseridos (o contexto histórico), a época, a finalidade (intenção) e para quem 2353 dirigimos nossos discursos. O autor ainda diz que o enunciado caracteriza-se por seu conteúdo (temático), por seu estilo verbal (recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais) e por sua construção composicional. Bakhtin (1992) expõe sua postura dialógica quando questiona a posição dos lingüistas do século XIX que não consideravam a comunicação verbal como função essencial da linguagem, deixando de lado, assim, a relação entre locutores. Dessa forma, o autor admite que os enunciados produzidos por nós estão sempre carregados de outros enunciados que já ouvimos ou que já falamos em outros momentos. Nossos discursos não são neutros e dependem também da relação que estabelecemos com nosso interlocutor, que nesse caso, também é locutor ativo, capaz de modificar até mesmo nossa visão de mundo. Para tornar tudo isso concreto e possível de ser sistematizado e ensinado, podemos dialogar com a teoria de Adam (1992) que aproveita os estudos de Bakhtin (1992) para conceber as seqüências textuais. Essas seqüências (narração, descrição, explicação, argumentação e diálogo) são criadas para melhor entender e caracterizar cada gênero textual. Dessa forma, sem negar o aspecto histórico social dos gêneros, o autor francês trabalha de forma mais sistemática, mostrando preocupação com a prática do ensino de gêneros. No Brasil, no campo da Lingüística Aplicada, essas teorias vêm sendo discutidas e reelaboradas por autores preocupados com o ensino de língua praticado nas escolas. E como podem contribuir, a partir de suas pesquisas, para a melhor compreensão por parte dos professores sobre o ensino e aprendizagem da língua materna. Bagno (2002, p. 11) considera que o ensino de língua no Brasil neste século está em fase de transição. Os professores recém formados já estão percebendo que o conhecimento da Gramática Tradicional não é mais suficiente para ensinar Língua Portuguesa. O grande problema é que eles não sabem como concretizar essa consciência em prática de sala de aula. Nas palavras do autor: O ensino tradicional nunca levou em conta a infinita variedade dos gêneros textuais existentes na vida social, limitando-se a abordar somente os gêneros escritos literários de maior prestígio - o conto, o romance, às vezes a crônica, raramente a poesia -, e desprezando quase completamente o estudo de gêneros textuais característicos das práticas orais [...] (p. 55) [...] No tocante à produção textual escrita, as escolas brasileiras, em sua maioria, até hoje se restringem à prática da “redação”, gênero textual que só existe na escola, não 2354 tendo portanto nenhuma função sociocomunicativa relevante para a vida presente e futura do aprendiz. (p. 56) O autor complementa ainda, que a redação escolar, por deixar de lado as condições de produção do texto escrito (quem escreve, o que escreve, para quem escreve, para que escreve, quando e onde escreve), contribui para o empobrecimento dos objetivos de ensino de língua na escola. (2002, p. 56) Nessa mesma perspectiva, Rojo (2000) destaca em sua obra a dificuldade de conceituação, utilização e aplicação dos gêneros discursivos por parte dos professores e lingüistas. A autora aproxima a teoria apresentada nos PCNS de terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental com as práticas de linguagem dentro e fora da sala de aula. A autora discute também a difícil tarefa de transpor didaticamente os referenciais presentes nos PCNS para a prática de sala de aula. Disso depende, como os parâmetros prevêem, a formação inicial e continuada de professores, a análise de livros didáticos e a avaliação nacional. (ROJO, 2000, p. 28) Ainda como contribuição para os estudos de gêneros, Schnewly & Dolz (2004) trazem a idéia de seqüências didáticas para o ensino de produção oral e escrita de textos. Definem seqüência didática como “um conjunto de atividades escolares organizadas, de maneira sistemática, em torno de um gênero textual oral ou escrito” (p. 97). Resgatam a concepção de Bakhtin (1992) que define gêneros como “tipos relativamente estáveis de enunciados”, afirmando: Os textos escritos ou orais que produzimos diferenciam-se uns dos outros e isso porque são produzidos em condições diferentes. Apesar dessa diversidade, podemos constatar regularidades. Em situações semelhantes, escrevemos textos com características semelhantes, que podemos chamar de gêneros de textos, conhecidos e reconhecidos por todos, e que, por isso mesmo, facilitam a comunicação. Os autores valorizam principalmente os gêneros mais interessantes à escola e propõem o uso de seqüências didáticas para “ajudar o aluno a dominar melhor um gênero de texto”, para que este possa adequar-se melhor a cada situação comunicativa (Schnewly & Dolz, 2004, p.97). As seqüências didáticas por eles apresentadas, constituem-se em: • apresentação da situação; • produção inicial; • módulos (atividades sobre gêneros); 2355 • produção final. Essas atividades escolares organizadas aparecem nos livros didáticos de Língua Portuguesa de diversas formas, com atividades de leitura, compreensão e interpretação de textos e com a produção de textos orais e escritos. Dionísio & Bezerra (2005) discutem a aquisição da competência lingüística e comunicativa do educando em diferentes enfoques do ensino de língua, principalmente no que diz respeito à seleção de textos nos livros didáticos de Língua Portuguesa. Em um dos capítulos, Bezerra (2005) faz um resgate histórico das abordagens textuais dos livros didáticos de Português (LDP) desde 1960. Nessa década, somente os textos literários eram contemplados, pois a imitação dos clássicos era considerada a única maneira de se aprender a ler e escrever. Em 70, os LDP já apresentam textos jornalísticos e histórias em quadrinhos e exploram as questões de identificação dos elementos de comunicação (emissor, receptor, mensagem, código, canal, referente). (p. 36) A partir da década de 90 a idéia de gêneros textuais começa a ser difundida e aparece com mais força nos LDPs. Em relação à qualidade desses livros, Rojo & Batista (2005) analisam o material didático do terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental encaminhado às escolas públicas brasileiras. Os livros didáticos são avaliados pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) e recomendados aos professores que escolhem o material para o uso em sala de aula. O trabalho de análise organizado pelos autores traz grande contribuição para pesquisadores interessados em desenvolver estudos sobre livros didáticos de Língua Portuguesa e no meu caso, verificar a prática pedagógica do professor no uso desses livros. Toda a obra de Rojo & Batista (2005) contempla a prática de ensino de Língua Portuguesa em relação ao uso de livros didáticos, especialmente no terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental (de 5ª a 8ª séries). O desenvolvimento de pesquisas centradas na prática pedagógica do ensino de língua no segundo ciclo do Ensino Fundamental (3ª e 4ª séries) é ainda escasso. As obras apresentadas priorizam, em sua maioria, o terceiro e quarto ciclos. Os PCNS confirmam que o maior nível de repetência no Brasil está no primeiro ciclo (1ª e 2ª séries), por dificuldade em alfabetizar e no início do terceiro ciclo (5ª série), por não conseguir garantir o uso eficaz da linguagem. (SEF, 1998, p. 19) Há então, uma lacuna a ser preenchida. O que se faz em relação ao ensino de Língua Portuguesa, no segundo ciclo para dar continuidade ao processo de letramento e levar o aluno a usar, cada vez melhor, a língua de forma eficaz? 2356 É oportuno então, ressaltar que na presente pesquisa, além do conhecimento específico de Língua Portuguesa no que se refere aos gêneros textuais, se faz necessário também o aprofundamento teórico a respeito da relação entre a teoria e a prática de professores atuantes em sala de aula. Há muitos autores preocupados com essa temática que podem ser melhor explorados nesta pesquisa, como Martins (1989), Perrenoud (1993), Pimenta (1999), Pereira (2000), entre outros. Martins (2002) relata em sua obra, a dificuldade dos professores em articular o que aprendem na disciplina de Didática com a realidade das salas de aula, ou seja, com a didática prática. Sua pesquisa, realizada com professores de 1º grau, mostra a grande contradição entre a formação acadêmica do professor e a sua prática pedagógica. Percebe que muitas vezes, os professores buscam alternativas para diminuir as dificuldades dos alunos, mas que essas soluções são apenas imediatas. Ao vivenciar o processo de ação-reflexão-ação em sua pesquisa, aponta alguns caminhos para uma melhor articulação entre a teoria e a prática: Os cursos de Didática (...) não trabalham as implicações da organização do trabalho para a prática docente. Para romper com essa organização, é imprescindível que o futuro professor compreenda as raízes profundas dos problemas postos pela prática pedagógica das escolas onde vão atuar. Somente assim, poderão desenvolver conscientemente os germes da teoria pedagógica alternativa, ultrapassando o plano do imediato, assumindo coletivamente, dentro da sua unidade escolar, o controle do processo de ensino, e descobrindo formas organizacionais mais coerentes com os objetivos por eles perseguidos. Dessa forma, a organização deixa de ser um fim para ser um meio, em função da direção política para o processo. (p. 174-175) Na tentativa de estabelecer um diálogo entre os autores preocupados com a temática apresentada, minha pesquisa está centrada na prática pedagógica de professores para o desenvolvimento do trabalho com gêneros textuais em salas de aula, pois estudos mais aprofundados sobre esse tema podem contribuir para o melhor entendimento e efetivação da proposta de ensino de Língua Portuguesa presente nos PCNS. Assim sendo, uma questão está na base dos meus estudos e da minha investigação: Em que os professores da rede pública de ensino do estado do Paraná se apóiam para realizar o trabalho com gêneros textuais na prática de ensino de Língua Portuguesa? Como esses professores desenvolvem o trabalho com gêneros textuais em suas práticas pedagógicas? 2357 Considerações Finais Sistematizar as práticas pedagógicas com gêneros textuais desenvolvidas por professores do segundo ciclo do Ensino Fundamental da rede pública de ensino do Paraná, tendo em vista contribuir para a formação inicial dos professores daquele nível de ensino, é um desafio e um compromisso com essa área do conhecimento. Para tanto, o estudo que venho desenvolvendo numa abordagem qualitativa de pesquisa, inclui a caracterização das práticas com gêneros textuais desenvolvidas por professores do segundo ciclo do Ensino Fundamental da rede pública de ensino do Paraná; a verificação das seqüências didáticas utilizadas por esses professores em suas práticas. E, por fim, prevê a análise critica das iniciativas dos professores e suas implicações para a aprendizagem dos alunos. O contato inicial com os professores sujeitos da pesquisa e suas práticas indicam que já há grande preocupação por parte desses profissionais em trabalhar com gêneros textuais nas aulas de Língua Portuguesa, e que o fazem apoiados na proposta que a escola acredita. O encaminhamento para a realização do ensino de gêneros está também de acordo com o que a rede pública de ensino propõe. A partir da fala desses professores, há também indícios da importância da formação continuada para a melhoria e continuidade desse trabalho. REFERÊNCIAS ADAM, J.-M. Lês textes; types et prototypes. Paris: Nathan, 1992. BAGNO, Marcos. Língua materna: letramento, variação e ensino. São Paulo: Parábola editorial, 2002 BAKHTIN, M. Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1992. DIONÍSIO, Angela P. & BEZERRA, Maria A. (orgs.) O livro didático de Português: múltiplos olhares. 3 ed. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005. DIONÍSIO, A. P.; MACHADO, A. R.; BEZERRA, M. A. (orgs.). Gêneros Textuais e Ensino. 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