Flavio Monteiro de Souza
FATORES ASSOCIADOS À
ASFIXIA PERINATAL NO BRASIL
Estudo populacional com base no
Sistema de Informações de Nascidos Vivos
Instituto Fernandes Figueira
Pós-graduação em Saúde da Criança e da Mulher
Rio de Janeiro
2003
O berço (1872). Berthe Morisot.
Musée D’Orsay, Paris.
FATORES ASSOCIADOS À
ASFIXIA PERINATAL NO BRASIL
Estudo populacional com base no
Sistema de Informações de Nascidos Vivos
Autor: Flavio Monteiro de Souza
Orientador: Alexandre José Baptista Trajano
Tese apresentada à coordenação da
Pós-graduação em Saúde da Criança e
da Mulher do Instituto Fernandes Figueira
– Fundação Oswaldo Cruz – como parte
dos requisitos necessários à obtenção
do grau de Doutor em Ciências – área
de concentração em Saúde da Criança
e da Mulher.
Rio de Janeiro
Fevereiro, 2003
Souza, Flavio Monteiro de
Fatores associados à asfixia perinatal no Brasil: estudo
populacional com base no Sistema de Informações de Nascidos
Vivos./Flavio Monteiro de Souza. – Rio de Janeiro, 2003.
xiv, 149 f.
Tese (Doutorado) – Fundação Oswaldo Cruz. Instituto Fernandes Figueira. Programa de Pós-graduação em Saúde da
Criança e da Mulher.
Título em inglês: Factors associated with perinatal asphyxia in Brazil: a population-based study using birth record
databases.
1. Asfixia/fatores de risco. 2. Assistência perinatal. 3. Índice de Apgar. 4. Declaração de nascimento. 5. Estudos
epidemiológicos.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil
ii
Às mães da minha vida:
Eugênia, avó querida,
Léa, mãe zelosa,
Joelma, mãe de meus filhos.
A Lucas, Daniel e Thaís,
crianças que nasceram sem asfixia
e que alegram a nossa vida.
A todas as mães que,
anonimamente, participaram
deste estudo e compartilharam
a experiência única de gerar uma nova vida.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil
iii
Agradecimentos
Ao Professor Alexandre José Baptista Trajano, orientador competente e
incansável, por todo o amparo pessoal, técnico e institucional
conferido durante a criação deste trabalho.
À Doutora Joelma Lira Jacob Barbosa, companheira e
auxiliar em todas as fases desta pesquisa.
Aos Professores Luiz Guilherme Pessôa da Silva e Marcos Vianna Lacerda
de Almeida que, com seus olhares agudos e críticos,
muito contribuíram para a forma final que este trabalho adquiriu.
Aos Professores Amaury Alves de Menezes e José Miguel Nigri pela sua
importância na formação de tantas gerações de obstetras. Sinto-me
honrado de ter sido discípulo destes ícones da obstetrícia brasileira.
Ao Professor Júlio César Soares Aragão que, com sua criatividade
admirável, ajudou a moldar a idéia embrionária desta pesquisa.
Aos Professores Nilson Ramirez de Jesús e Jader Coelho Dias pelo forte
apoio institucional nas fases finais de preparação desta pesquisa.
À Professora Renata Nunes Aranha, pela inestimável ajuda na interpretação
dos números e das interações epidemiológicas.
À Epidemiologista Joana Cunha Cruz pela competência e desprendimento
na análise multivariada.
À Professora Maria Angélica Bonfim Varela e ao interno de medicina Valter
Gabriel Maluly Filho pelo valioso auxílio com as referências bibliográficas.
À Doutora Monique Lin pela ajuda preciosa com a
língua inglesa na versão do resumo.
A todos os colegas da UERJ, da UNIGRANRIO e do Corpo de Bombeiros do
Estado do Rio de Janeiro, pela amizade e apoio na confecção deste trabalho.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil
iv
Resumo
Objetivo: Estudar a predição da asfixia perinatal representada pelo índice
de Apgar inferior a 7 no 5º minuto de vida a partir das variáveis contempladas nas declarações de nascidos vivos dos diversos estados do Brasil.
Material e método: Estudo de corte transversal baseado na população de
nascidos vivos do Brasil no ano de 1999, totalizando 3.256.433 registros. As
variáveis foram estudadas através do teste do X² de Pearson e calcularamse os riscos relativos (RR) para cada comparação. Posteriormente, efetuouse análise multivariada de regressão logística com cálculo das razões de
chances (OR) e intervalos de confiança para 95%. Comparou-se a prevalência do grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto com o Índice Municipal de
Desenvolvimento Humano (IDH-M) por unidade da federação através de regressão linear simples.
Resultados: A proporção de não preenchimento dos campos da DN variou
de 0% (sexo e local de nascimento) a 51,7% (estado marital materno). Depois de excluídos os casos de não preenchimento do grau de Apgar no 5°
minuto, do peso e os abortamentos, o número de casos estudados foi de
2.808.341. A prevalência de asfixia perinatal no Brasil em 1999 foi de 2,1%.
A prevalência variou por unidade da federação de 1,4% (São Paulo, Rio
Grande do Sul e Santa Catarina) a 6,2% (Piauí). A regressão linear simples
demonstrou que quanto melhor o IDH-M menor a prevalência de asfixia (R²
0,7437, p<0,001). A relação entre a asfixia e o estado marital materno foi
estudada apenas na análise bivariada (RR 1,20 para as mães solteiras comparadas com as que viveram ou vivem maritalmente). Na análise multivariada, estudaram-se 1.164.226 casos que continham todos os campos da DN
preenchidos e 69,7% das observações foram corretamente classificadas pelo
modelo. Encontrou-se risco significativamente maior de asfixia associado a:
cor não branca (OR 1,11), sexo masculino (OR 1,24), anomalias congênitas
(OR 5,44), idade materna entre 10 e 19 anos (OR 1,05) e igual ou superior a
35 anos (OR 1,12), mães sem instrução (OR 1,54) ou com menos de 8 anos
de instrução (OR 1,25), mães sem pré-natal (OR 1,37) ou com menos de 7
consultas (OR 1,32), história de natimorto anterior (OR 1,13), parto domiciliar (OR 1,71) ou em estabelecimento de saúde não hospitalar (OR 1,34),
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil
v
parto nas regiões nordeste (OR 1,67) e norte (OR 1,47) quando comparados
com a região sudeste, recém-nascidos macrossômicos (OR 1,24) e gestação
pós-termo (OR 1,22). Quanto menor o peso do recém-nascido e menor a
idade gestacional, maior o risco de grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto,
atingindo OR de 33,23 para pesos entre 500 e 999g e de 5,10 para idade
gestacional entre 22 e 27 semanas. Os partos na região centro-oeste obtiveram os mesmos resultados que os da região sudeste, assim como os partos
gemelares em relação às gestações únicas. Foram fatores de proteção contra
a asfixia: parto vaginal em comparação com o cesáreo (OR 0,92), parto na
região sul em comparação com a sudeste (OR 0,90) e filhos vivos tidos anteriormente (OR 0,83 para um ou dois filhos e OR 0,84 para mais de dois filhos vivos).
Conclusões: A prevalência de asfixia perinatal no Brasil é elevada e o índice
de Apgar no 5° minuto é um indicador que reflete as condições socioeconômicas e culturais da gestante. Vários fatores de risco estão associados com
baixo grau de Apgar no 5° minuto. Para a reversão deste quadro são necessárias medidas educacionais, melhora da assistência obstétrica e redução
das desigualdades sociais no Brasil.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil
vi
Abstract
Objective: To study the birth records in the various Brazilian states in order to identify the factors associated with perinatal asphyxia as measured
by Apgar scores less than 7 at 5 minutes of life.
Material and Methods: A cross sectional study was undertaken using birth
records for those infants born in Brazil in the year 1999, totaling 3,256,433
records. The identified variables were studied using Pearson's Chi Squared
Test and the risk ratios (RR) for each comparison were calculated. Secondly,
a multivariate logistic regression was employed to calculate the odds ratio
(OR) for each factor studied with a 95% confidence interval. A simple linear
regression was then used to compare the prevalence of an Apgar score of
less than seven at five minutes with the Municipal Human Development
Index (HDI-M).
Results: The proportion of uncompleted birth record fields ranged from 0%
(sex of infant and place of birth) to 51.7% (marital status). After excluding
the cases in which the 5 minute Apgar or the birth weight were missing,
and the maternal abortions, the total cases studied were 2,808,341. The
prevalence of asphyxia in Brazil in 1999 was 2.1%. The prevalence varied
by state from 1.4% (Sao Paulo, Rio Grande do Sul and Santa Catarina) to
6.2% (Piaui). A simple linear regression demonstrated that the better the
HDI-M the lower the prevalence of asphyxia (R² 0,7437, p<0,001). A bivariate analysis of asphyxia and maternal marital status revealed a RR of 1.20
for single mothers compared to those who were or are married. In the multivariate analysis, 1,164,226 cases (representing the records which were
entirely completed) were studied and 69.7% of the observations were correctly classified by the model. A significant increase in the risk of asphyxia
was encountered with the following variables: non-caucasian race (OR
1.11), newborn male sex (OR 1.24), congenital anomalies (OR 5.44), maternal age between 10 and 19 years (OR1.05), maternal age ≥35 (OR 1.12), no
maternal education (OR1.54) or less than 8 years of education (OR 1.25), no
prenatal care (OR 1.37) or less than 7 prenatal visits (OR 1.32), prior fetal
demise (OR 1.13), home birth (OR 1.71), birth in medical establishments
other than hospitals (OR1.34), births in the northeastern region of the
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil
vii
country (OR 1.67) and northern (OR 1.47) when compared to the southeastern parts of Brazil, macrosomic fetus (OR 1.24), and post term pregnancy
(OR 1.22). The lower the newborn weight and gestational age, the higher
the risk of Apgar score less than 7 at 5 minutes, with the highest OR of
33.23 for birth weight between 500-999g and OR 5.10 for gestational age
between 22-27 weeks. Births in the midwestern region of Brazil did not
have an increased risk when compared to those in the southeastern
part. Similarly, twins pregnancies fared as well as singletons. Protective factors against asphyxia included vaginal birth when compared to cesarean
section (OR 0.92), birth in the southern part of Brazil when compared to the
southeastern region (OR 0.90), and prior live births (OR 0.83 for 1-2 children and 0.84 for more than 2 children).
Conclusions: The prevalence of perinatal asphyxia in Brazil is elevated and
the 5 minute Apgar is an index that reflects the socioeconomic and cultural
condition of gravid females. Various risk factors are associated with low 5
minute Apgar scores. To ameliorate this situation in Brazil, education, improved obstetric care and reduction of social inequities are necessary.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil
viii
Instruções ao feto
Escolha uma mãe jovem, saudável, com boas condições
socioeconômicas, esbelta, com mais de 1,62m de altura,
Rh positivo e que tenha um ciclo menstrual regular.
Ela não deve fumar, usar drogas ou recorrer a medicamentos. Ela deve procurar bons cuidados pré-natais e
um lugar seguro para parir.
Então ordene seu próprio meio-ambiente e solicite não
nascer pré-termo ou pós-termo. Não deixe suas membranas se romperem antecipadamente e, acima de tudo,
entre no mundo primeiro com a cabeça e com o mínimo
atraso uma vez que a jornada tenha iniciado. Tendo
chegado, respire rapidamente antes que eles cortem seu
cordão. Procure logo o seio da sua mãe e não se acanhe
em começar a mamar!
Desta forma você tem a melhor chance de sobreviver
aos riscos de sua vida pré-natal.
Modificado de Charles P. Douglas (1975)
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil
ix
Índice
RESUMO
IV
ABSTRACT
VI
ÍNDICE
IX
LISTA DE ABREVIATURAS
XI
LISTA DE FIGURAS
XII
LISTA DE TABELAS
XIV
INTRODUÇÃO
1
APRESENTAÇÃO E JUSTIFICATIVA
2
OBJETO DO ESTUDO
5
O SISTEMA DE NASCIDOS VIVOS
5
FATORES DE RISCO AVALIÁVEIS ATRAVÉS DO SINASC
12
A ASFIXIA PERINATAL
15
O ESCORE DE APGAR
21
UM BRASIL, VÁRIOS “BRASIS”: AS DESIGUALDADES E A SAÚDE
27
OBJETIVOS
32
OBJETIVOS
33
MATERIAL E MÉTODO
34
FONTE DOS DADOS
35
VARIÁVEIS DE ESTUDO
38
CRITÉRIOS DE EXCLUSÃO
42
ANÁLISE ESTATÍSTICA
43
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil
x
RESULTADOS
45
CARACTERÍSTICAS DA POPULAÇÃO E DOS DADOS
46
O GRAU DE APGAR INFERIOR A 7 NO 5° MINUTO
52
ANÁLISE BIVARIADA
57
ANÁLISE MULTIVARIADA
70
COMENTÁRIOS
73
CONSIDERAÇÕES ACERCA DO MÉTODO E DA QUALIDADE DAS INFORMAÇÕES
74
DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
81
CONCLUSÕES E PONDERAÇÕES FINAIS
116
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
122
APÊNDICES
139
ANEXOS
143
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil
xi
Lista de abreviaturas
CID-10
Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas
Relacionados à Saúde – Décima revisão.
DATASUS
Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde.
DIP II
Desaceleração intraparto do tipo II: desaceleração tardia da
freqüência cardíaca fetal ou DIP placentário.
DIP III
Desaceleração intraparto do tipo III: desaceleração variável ou
umbilical da freqüência cardíaca fetal.
DN
Declaração de Nascido Vivo.
FTP
File Transfer Protocol – Protocolo de transferência de arquivos
através de redes de computadores.
FUNASA
Fundação Nacional de Saúde.
IBGE
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
IC
Intervalo de confiança do risco relativo ou da razão de chances
para 95% de significância estatística.
IDH
Índice de Desenvolvimento Humano.
IDH-M
Índice Municipal de Desenvolvimento Humano.
MS
Ministério da Saúde.
OMS
Organização Mundial de Saúde.
OPAS
Organização Panamericana de Saúde.
OR
Odds ratio: razão de chances.
p
Valor da probabilidade da correlação ter ocorrido devido ao acaso.
pCO2
Pressão parcial de dióxido de carbono.
pH
Potencial hidrogeniônico.
PNAD
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio do IBGE
PNUD
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.
pO2
Pressão parcial de oxigênio.
QI
Quociente de inteligência.
R²
Quadrado da correlação, utilizado na regressão linear. Mostra o
percentual da variância de uma das variáveis que pode ser explicado a partir do valor da outra.
RR
Risco relativo.
SES
Secretaria de Estado de Saúde.
SIM
Sistema de Informação de Mortalidade.
SINASC
Sistema de Nascidos Vivos.
SMS
Secretaria Municipal de Saúde.
SUS
Sistema Único de Saúde.
WHO
World Health Organization: o mesmo que OMS.
X²
Teste do qui-quadrado de Pearson
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil
xii
Lista de figuras
Número
Título
Página
1
Número de nascidos vivos ocorridos e registrados no
ano, por região de nascimento – Brasil, 1999.
2
Número de nascidos vivos registrados no ano, identifi8
cados pelo SINASC e estimativa de nascimentos – Brasil,
1999.
3
Fluxo da Declaração de Nascido Vivo.
4
Distribuição da proporção de não preenchimento do
52
grau de Apgar no 5° minuto somada à proporção de
casos com grau de Apgar igual a 0 no 1° e no 5° minutos
segundo as unidades da federação.
5
Distribuição da prevalência do grau de Apgar
inferior a 7 no 5° minuto segundo as unidades da federação.
6
Relação entre a prevalência do grau de Apgar inferior a 55
7 no 5° minuto e o Índice Municipal de Desenvolvimento
Humano agrupado por unidade da federação.
7
Relação entre a prevalência do grau de Apgar inferior a 56
7 no 5° minuto e o Índice Municipal de Desenvolvimento
Humano (IDH-M) agrupado por Unidade da Federação,
depois de excluídas as 2 unidades da federação com
prevalências do grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto
discrepantes em relação ao IDH-M.
8
Relação entre o inverso da prevalência do grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto e o Índice Municipal de Desenvolvimento Humano (IDH-M) agrupado por Unidade
da Federação, depois de excluídas as 2 unidades da
federação com prevalências do grau de Apgar inferior
a 7 no 5° minuto discrepantes em relação ao IDH-M.
56
9
Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5° minuto inferior a 7 segundo a idade gestacional.
59
10
Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5° minuto inferior a 7 segundo o peso do recém-nascido.
59
11
Distribuição do peso médio dos recém-nascidos segundo os grupos de grau de Apgar.
60
12
Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5° minuto inferior a 7 segundo a cor do recém-nascido.
60
13
Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5° minuto inferior a 7 segundo o sexo do recém-nascido.
61
8
10
53
Flavio Monteiro de Souza
Número
Asfixia perinatal no Brasil
Título
xiii
Página
14
Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5° minuto inferior a 7 segundo a presença de anomalias congênitas.
61
15
Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5° minuto inferior a 7 segundo a idade materna.
64
16
Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5° minuto inferior a 7 segundo o número de anos de estudo
materno.
64
17
Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5° minuto inferior a 7 segundo o número de consultas de prénatal.
65
18
Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5° minuto inferior a 7 segundo o estado marital materno.
65
19
Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5° minuto inferior a 7 segundo o número de filhos vivos tidos
anteriormente.
66
20
Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5° minuto inferior a 7 segundo a ocorrência de filhos mortos
anteriores.
66
21
Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5° minuto inferior a 7 segundo o tipo de gravidez (única ou
gemelar).
68
22
Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5° minuto inferior a 7 segundo a via do parto.
69
23
Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5° minuto inferior a 7 segundo o local de nascimento.
69
24
Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5° minuto inferior a 7 segundo a região geográfica do
país.
70
25
Distribuição da população residente por cor ou raça –
Brasil, 2001.
106
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil
xiv
Lista de tabelas
Número
Título
Página
1
Fatores biológicos de risco para a asfixia perinatal e pa- 18
ra o comprometimento neurológico do recém-nascido.
2
Definições dos componentes do escore de Apgar.
22
3
Classificação da asfixia ao nascer segundo a CID-10.
25
4
Campos disponíveis nos bancos de dados do SINASC e
sua correspondência nos formulários de declaração de
nascido vivo (DN).
37
5
Distribuição dos nascidos vivos no Brasil em 1999 por
região e por unidade da federação de residência da
mãe.
47
6
Distribuição dos nascidos vivos segundo as principais
variáveis das DN no Brasil em 1999, antes e depois de
aplicados os critérios de exclusão.
48
7
Distribuição dos nascidos vivos segundo as variáveis
referentes aos recém-nascidos depois de aplicados os
critérios de exclusão.
49
8
Distribuição dos nascidos vivos segundo as variáveis
referentes às mães depois de aplicados os critérios de
exclusão.
50
9
Distribuição dos nascidos vivos segundo as variáveis
51
referentes à gravidez e ao parto depois de aplicados os
critérios de exclusão.
10
Fatores associados ao grau de Apgar no 5° minuto inferior a 7 no Brasil – Análise bivariada das variáveis relacionadas ao feto ou recém-nascido.
58
11
Fatores associados ao grau de Apgar no 5° minuto inferior a 7 no Brasil – Análise bivariada das variáveis relacionadas à mãe.
63
12
Fatores associados ao grau de Apgar no 5° minuto inferior a 7 no Brasil – Análise bivariada das variáveis relacionadas à gravidez e ao parto.
68
13
Fatores associados ao grau de Apgar no 5° minuto
inferior a 7 no Brasil – Análise multivariada.
71 e 72
14
Distribuição de alguns indicadores sociais, econômicos
e culturais por raça ou cor – Brasil, 2001.
106
15
Distribuição dos partos hospitalares pelas diferentes regiões do Brasil em 1996
108
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
1
Introdução
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
2
Apresentação e justificativa
Ao acompanharmos o processo reprodutivo humano, duas apreensões principais afloram em relação ao recém-nascido: ele viverá? Se viver,
será saudável? Como médicos clínicos, acostumados a lidar com casos individuais, muitas vezes a reflexão através de uma perspectiva mais ampla,
epidemiológica, fica relegada a um plano secundário.
O Brasil convive com elevada taxa de mortalidade e morbidade
perinatal. Ao contrário dos países desenvolvidos, onde a principal causa
isolada de morte no período neonatal é a malformação congênita (DRUZIN;
GABBE, 1999), no Brasil a maioria dos óbitos perinatais é determinada pelas condições da gestante, características da assistência ao parto e ao recém-nascido. Entre as principais causas de óbitos associados às condições
maternas e do recém-nascido estão a prematuridade, baixo peso ao nascer,
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
Flavio Monteiro de Souza
3
afecções respiratórias do recém-nascido e a asfixia intra-uterina e intraparto (LANSKY et al., 2002).
Dentre as diversas entidades mórbidas encontradas no período
perinatal, a asfixia ocupa lugar de destaque por sua potencial influência no
futuro desempenho neuropsicomotor do recém-nascido (DIOS et al., 2001).
O grau de asfixia perinatal reflete a qualidade da assistência prestada à gestante durante o período pré-natal e durante o parto, além dos cuidados imediatos prestados ao recém-nascido.
Na formação do profissional de saúde, maior atenção é dada a
questões diretamente relacionadas ao parto e à causa imediata de asfixia,
sendo que pouco se discute sobre a influência dos fatores favorecedores ou
dos fatores preditivos da asfixia perinatal relacionados aos aspectos sociais,
econômicos e culturais envolvidos. De um modo geral, o médico assiste pacientes em instituições públicas com clientela determinada, ou em instituições
privadas,
atendendo
um
segmento
estratificado
que
possui
características socioeconômicas semelhantes. Assim, acreditamos que a
avaliação de todos os recém-nascidos no país, estudados como grupo heterogêneo, pode contribuir para o melhor entendimento dos fatores envolvidos
com a asfixia perinatal em função da diversidade de características encontradas no Brasil.
Sabe-se que o índice de Apgar inferior a 7 no 5° minuto de vida é
uma forma de medir o estado do recém-nascido e indica, de forma aproximada, o número de crianças que necessitarão de recursos especializados e
caros como, por exemplo, a internação em unidades de tratamento intensivo. Este é um grande problema de planejamento dos recursos em todo o
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
4
mundo e especialmente nos países em desenvolvimento, onde os recursos
são escassos. Conhecer os fatores que predizem condições deletérias para o
recém-nascido pode auxiliar no melhor planejamento da aplicação de recursos baseando-se na maior ou menor necessidade de cada grupo, contemplando os diferentes cenários encontrados no Brasil.
Desde a implantação do Sistema de Nascidos Vivos (SINASC) pelo
Ministério da Saúde, vários trabalhos em âmbito municipal e estadual descreveram as características dos recém-nascidos (LAUAND; SIMÕES, 1999;
MELLO JORGE; GOTLIEB, 2001; RODRIGUES et al., 2002; SANTA HELENA; WISBECK, 1998; SARINHO et al., 2001). Estes trabalhos vêm contribuindo para o entendimento sobre a mortalidade infantil e sobre o perfil dos
nascidos vivos nos locais onde são produzidos. Em sua maioria, no entanto,
são apenas dados estatísticos descritivos do perfil de nascimentos.
A disponibilidade de informações tão ricas e em volume dificilmente suplantado por qualquer outro país nos motivou a desenvolver uma
forma mais elaborada de avaliar fatores epidemiológicos que têm influência
nas condições de nascimento, particularmente os associados com a depressão neonatal imediata. Este trabalho, que acreditamos pioneiro na utilização do SINASC através deste método, pretende ser uma fotografia
instantânea dos fatores que predispõem à asfixia perinatal no Brasil.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
5
Objeto do estudo
O objeto deste estudo são todos os 3.256.433 recém-nascidos vivos no Brasil no ano de 1999, identificados pelo Sistema de Nascidos Vivos
(SINASC) da Fundação Nacional de Saúde do Ministério da Saúde (FUNASA/MS).
O Sistema de Nascidos Vivos
O Sistema de Nascidos Vivos (SINASC) foi implantado em 1990
com o objetivo de melhorar as informações sobre nascimentos e, principalmente, obter maior qualidade das informações relacionadas à mortalidade
infantil, já que os dados de registro civil eram falhos em relação aos nascimentos. É um sistema concebido e montado de forma semelhante ao Sistema de Informação de Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde (MS). As
estatísticas sobre nascimentos e as informações sobre mortalidade compõem o campo de trabalho das estatísticas vitais (NORONHA et al., 1997).
Antes da implantação do SINASC, as informações sobre nascimentos disponíveis no país eram obtidas através de registros civis realizados nos cartórios que, periodicamente, enviavam mapas de apuração ao
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) que os analisava e divulgava. Estas informações mostravam-se precárias, havendo problemas de
sub-registro, de qualidade e de fidedignidade dos dados. Conseqüentemente, as estimativas das taxas de mortalidade infantil eram imprecisas, o que
ficou demonstrado através de diversos trabalhos sobre o sub-registro legal
dos nascimentos (CBCD - CENTRO DA OMS PARA A CLASSIFICAÇÃO DE
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
6
DOENÇAS EM PORTUGUÊS (MS/USP/OPAS-OMS) - NÚCLEO DE ESTUDOS EM POPULAÇÃO E SAÚDE - NEPS/USP, 1992).
Técnicos de diversas áreas efetuavam os planejamentos em saúde tendo como base as estimativas imprecisas em relação aos nascidos vivos. Com a criação do SINASC, a caracterização de alguns aspectos sobre
as condições da gravidez, do parto, do recém-nascido e da mãe passou a ser
possível. O instrumento de coleta individual dos dados é a Declaração de
Nascido Vivo (DN – Anexos A e B).
Segundo a Classificação Estatística Internacional de Doenças e
Problemas Relacionados à Saúde – Décima Revisão (CID-10, 1993), nascimento vivo é a expulsão ou extração completa do corpo da mãe, independentemente da duração da gravidez, de um produto de concepção que,
depois da separação, respire ou apresente qualquer outro sinal de vida, tal
como batimentos do coração, pulsações do cordão umbilical ou movimentos
efetivos dos músculos de contração voluntária, estando ou não cortado o
cordão umbilical e estando ou não desprendida a placenta. Cada produto de
um nascimento que reúna essas condições se considera como uma criança
viva.
Ainda segundo a CID-10 (1993), óbito fetal é a morte de um produto da concepção, antes da expulsão ou da extração completa do corpo da
mãe, independentemente da duração da gravidez; indica o óbito o fato do
feto, depois da separação, não respirar nem apresentar nenhum outro sinal
de vida, como batimentos do coração, pulsações do cordão umbilical ou
movimentos efetivos dos músculos de contração voluntária.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
7
A implantação da DN permitiu a utilização de um documento básico, padronizado para todo o país, contendo informações úteis na avaliação
das condições de nascimento e no planejamento de ações em saúde pública.
Da mesma forma que a declaração de óbito, a DN passou a ser um formulário de emissão obrigatória. O registro civil do nascimento só pode ser emitido mediante apresentação de uma das vias da DN, seguindo determinação
estabelecida no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n° 8069 de 13 de
julho de 1990).
Esse sistema, gradativamente, foi implantado em todo o país e
hoje praticamente todas as unidades da federação o utilizam. Contudo, em
pelo menos um estado (Piauí), a implantação não está completamente efetivada (FUNASA, 2002).
O SINASC vem apresentando, em todas as regiões do país desde
1994, volume maior de registros do que o publicado em anuários do IBGE
com base nos dados de Cartórios de Registro Civil, permitindo assim a
construção de indicadores úteis para o planejamento e gestão dos serviços
de saúde. Em 1999 os dados do Brasil exibem número significativamente
maior de nascidos vivos que os obtidos com os registros civis de nascimento, embora este número seja um pouco inferior à estimativa de nascimentos
(Figuras 1 e 2). O conhecimento mais preciso do número de nascidos vivos a
cada ano possibilita o cálculo da taxa de mortalidade infantil e da taxa de
mortalidade materna, indicadores tradicionalmente utilizados para a monitoração das condições de vida da população.
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
Flavio Monteiro de Souza
1.400.000
1.250.252
8
1.351.192
1.200.000
1.000.000
915.528
800.000
Registro
civil (IBGE)
627.085
600.000
427.894
285.229
400.000 159.774
470.326
SINASC
234.158
190.203
200.000
0
Norte
Nordeste Sudeste
Sul
Centrooeste
Figura 1 – Número de nascidos vivos ocorridos e registrados no ano,
por região de nascimento – Brasil, 1999. (Fonte: IBGE, 1999 - Estatísticas do
Registro Civil; SINASC, 2002)
3.256.433
3.387.546
3.500.000
3.000.000
2.675.613
2.500.000
Registro civil
(IBGE)
2.000.000
SINASC
1.500.000
Estimativa
(IBGE)
1.000.000
500.000
0
BRASIL 1999
Figura 2 – Número de nascidos vivos registrados no ano, identificados
pelo SINASC e estimativa de nascimentos – Brasil, 1999. (Fonte:
IBGE, 1999 - Estatísticas do Registro Civil; IBGE, 2000 - Projeção da população do Brasil por sexo e idade para o período 1980-2050 - Revisão
2000; SINASC, 2002)
Assim como na declaração de óbito, os formulários de declaração
de nascidos vivos são pré-numerados, impressos em três vias e distribuídos
às secretarias estaduais de saúde pela FUNASA/MS. As Secretarias de Es-
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
Flavio Monteiro de Souza
9
tado de Saúde (SES) se encarregavam da sua distribuição aos estabelecimentos de saúde e cartórios. Embora ainda não tenha acontecido em todo o
país, o preconizado é que as Secretarias Municipais de Saúde (SMS) assumam esse encargo (FUNASA, 2002).
O preenchimento da DN é executado por profissionais de diferentes áreas (médicos, enfermeiros, auxiliares, técnicos, secretários, cartórios
de registro civil etc.), ao contrário das declarações de óbito, assinada exclusivamente por médicos. Estudos anteriores indicaram que a declaração de
óbito possui baixa qualidade de informações, enquanto a DN é um formulário bem utilizado (NORONHA et al., 1997). Ao longo do processo de implantação
do
sistema,
observam-se
melhorias
no
preenchimento
das
informações conforme observado por diversos autores, que avaliaram a freqüência do não preenchimento dos campos e validaram os dados ao longo
do processo (MISHIMA et al., 1999; SANTA HELENA; WISBECK, 1998;
SILVA et al., 2001b; SILVA et al., 1997).
O fluxo percorrido pela DN varia de estado para estado. O MS recomenda, contudo, que a 1ª via do documento seja recolhida ativamente
pelas SES ou SMS para processamento, enquanto a segunda via deve ser
entregue aos familiares para registro do nascimento no cartório. Esta via
ficará guardada no cartório de registro civil até ser coletada pela secretaria
de saúde. No caso de gravidez múltipla, deve ser preenchida uma DN para
cada recém-nascido vivo. Se ocorrer parto domiciliar, a DN é preenchida
pela unidade básica de saúde próxima à residência da mãe ou pelo cartório
de registro civil. Ao chegar à SMS, digitam-se os dados da DN e processamse relatórios de crítica da qualidade de digitação (Figura 3).
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
10
Figura 3 – Fluxo da Declaração de Nascido Vivo.
(Adaptado de FUNASA, 2002)
A terceira via deve ser entregue pela família à unidade assistencial que acompanhará a criança. No entanto, em vários municípios (Rio de
Janeiro, por exemplo) esta via é arquivada no prontuário hospitalar do recém-nascido. Após a digitação dos dados das DN, a Secretaria de Saúde
deveria remeter a primeira via à unidade de saúde onde se originou o documento, o que não ocorre nas localidades onde a terceira via fica no prontuário (FUNASA, 2002; NORONHA et al., 1997).
Nas SES os dados são processados, revistos e criticados. A legislação determina que o registro do nascimento seja feito no local de ocorrência do evento (Lei nº 6015/73). Entretanto, o MS solicita que os casos sejam
referidos ao município onde a paciente reside, o que possibilita um melhor
planejamento de saúde. Assim, os dados das SES são encaminhados para o
MS, que procede a novas críticas. As DN são processadas através da utilização de programas informatizados do SINASC (FUNASA, 2002).
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
11
As dificuldades no acesso aos bancos de dados do SINASC provavelmente justificam o subaproveitamento das informações desse sistema.
Os bancos de dados de todo o país só recentemente foram disponibilizados
para acesso público. Até janeiro de 2003 ainda não estavam franqueados
para acesso público através da Internet os dados referentes aos anos de
2000 e 2001, assim como os anteriores a 1998. Os bancos de dados de
1998 foram disponibilizados em agosto de 2000 e os de 1999 em abril de
2002. Conforme divulgado pela FUNASA (2002) apenas recentemente os
gestores públicos passaram a utilizar os bancos de dados, ainda de forma
incipiente e, na maioria das vezes, como denominador para o cálculo de taxas (mortalidade infantil e mortalidade materna, por exemplo). Apesar disso, alguns indicadores vêm sendo propostos, a maioria voltada à avaliação
de riscos e da rede de atenção à gravidez e ao parto.
Embora esses dados ainda não tenham sido mais amplamente
utilizados, estão disponíveis análises estatísticas produzidas por diversos
meios: relatórios de trabalho de secretarias municipais e estaduais de saúde, trabalhos de pesquisa, estatísticas vitais através do DATASUS
(DATASUS, 2003), entre outros. Estas análises são, em sua maioria, descrições das características da população. Começam também a ser desenvolvidos alguns estudos epidemiológicos mais elaborados utilizando as variáveis
disponíveis no SINASC, mas estes estudos são geralmente limitados a uma
cidade ou estado do país (AZEVEDO et al., 2002; GAMA et al., 2001; LAUAND; SIMÕES, 1999; NASCIMENTO; GOTLIEB, 2001; RODRIGUES et al.,
2002; SANTA HELENA; WISBECK, 1998; SARINHO et al., 2001).
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Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
12
Fatores de risco avaliáveis através do SINASC
O termo “risco” significa a probabilidade de ocorrência de um resultado desfavorável, de um dano ou de um fenômeno indesejado. Considera-se “fator de risco” de um dano toda característica ou circunstância que
acompanha aumento de probabilidade de ocorrência do fato indesejado,
sem que o fator tenha que intervir necessariamente em sua causalidade. A
demonstração estatística do risco permite avaliar a probabilidade da ocorrência de um acontecimento indesejado, ou dano (BARBOSA, 1999). Consideram-se como resultados perinatais desfavoráveis as mortes (abortamento,
natimorto, neomorto) e outros problemas relacionados ao recém-nascido,
tais como prematuridade, baixo peso ao nascer, anomalia congênita e síndromes genéticas (LUZ et al., 2000). A asfixia perinatal, por representar
maior probabilidade de morte ou seqüela definitiva no recém-nascido, também pode ser considerada como resultado desfavorável (ROSENBERG,
1999).
Grande gama de fatores de risco é comum para diferentes resultados gestacionais desfavoráveis. O maior risco de comprometimento do
bem estar da mãe e/ou do concepto pode ser detectado durante a gestação
pela assistência pré-natal (com ou sem a necessidade de exames complementares). Este incremento no risco pode ocorrer devido a doenças maternas próprias ou intercorrentes, além de distúrbios do desenvolvimento fetal.
As condições do nascimento também influenciam de forma importante o
risco fetal. Há fatores de risco que, em estudos epidemiológicos, mostram-se
mais importantes que outros na determinação de um dano específico. Existem três formas pelas quais os fatores de risco se associam à conseqüência
indesejável (LUZ et al., 2000):
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Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
13
1. Forma causal: a que desencadeia o processo mórbido.
2. Forma favorecedora: há clara conexão entre o fator e o dano,
ainda que o fator não seja a causa direta.
3. Fator preditivo ou marcador: quando a associação se faz através de múltiplos elos, de forma não claramente identificável, às vezes
evidenciada apenas através de associações estatísticas.
Dentre as condições de risco fetal relacionadas à mãe detectáveis
sem necessidade de exames complementares, podem ser citadas (LUZ et al.,
2000): origem e idade da gestante; menção de companheiro ou estabilidade
conjugal; paridade; tabagismo; intervalo interpartal; esforço físico no trabalho; padrão menstrual; história de prematuridade, baixo peso ao nascer,
natimortalidade ou neomortalidade; história de abortamento e gravidez ectópica; história de hemorragia em gestação anterior; história de préeclâmpsia em gestação anterior; história de cesariana; número de filhos
vivos e razão de sobrevivência da prole (número de gestações dividido pelo
número de filhos vivos); história de doenças sistêmicas; história de anomalia congênita em gestação anterior; idade da menarca; escolaridade; renda
familiar per capita.
Um dos principais objetivos da implantação do Sistema de Nascidos Vivos (SINASC) foi obter um perfil epidemiológico dos nascimentos, através de informações relativas às características do recém-nascido, da
gravidez, do parto e da mãe (MELLO JORGE et al., 1993). Em geral, os estudos sobre peso ao nascer, duração da gestação, tipo de parto e paridade,
dentre outros, obtêm as informações diretamente dos prontuários médicos
ou por meio de visitas domiciliares, sendo as investigações restritas a clien-
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
14
telas específicas de determinados serviços de saúde ou baseadas em amostras populacionais.
Estudos de fatores de risco gestacionais, com base em dados populacionais secundários obtidos de registros de nascimentos, são relativamente comuns em todo o mundo e contribuem com conclusões importantes
sobre esses fatores de risco, em especial se apresentarem número de casos
bastante elevado (BEKEDAM et al., 2002; CLAUSSON et al., 2001; GILBERT
et al., 1999; MOSTER et al., 2001; SALIBA et al., 2001; THORNGRENJERNECK; HERBST, 2001). No Brasil, a implantação do SINASC criou a
possibilidade de serem realizados estudos semelhantes com bases populacionais. Assim, a declaração de nascido vivo constitui uma importante fonte
alternativa de dados sobre os nascimentos (MISHIMA et al., 1999).
Os bancos de dados do SINASC permitem a avaliação de diversos
fatores, mensurando-se sua influência na ocorrência de eventos danosos ao
recém-nascido. Podem ser analisados: idade materna; escolaridade materna; freqüência à assistência pré-natal; estado marital; número de filhos vivos e mortos tidos anteriormente; gemelidade; raça ou cor do recémnascido; sexo do recém-nascido; via do parto; local de ocorrência do parto;
local de residência da mãe. Também podem ser avaliados fatores considerados tanto como predisponentes a resultados desfavoráveis (geralmente na
forma favorecedora) quanto como o próprio resultado desfavorável, dentre
eles: idade gestacional; peso ao nascimento; anomalias congênitas; índice
de Apgar no 1° e 5° minutos.
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Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
15
A asfixia perinatal
O feto sobrevive e se desenvolve em um meio de baixa pressão
parcial de oxigênio, quando comparado com o recém-nascido ou com o adulto. Assim, podemos dizer que o feto é, fisiologicamente, hipóxico em relação aos valores pós-natais de pressão parcial de oxigênio (pO2). Suas
reservas de oxigênio são reduzidas, fazendo com que o suprimento ininterrupto de oxigênio seja fundamental para sua sobrevivência. A transferência
de dióxido de carbono através da placenta é limitada apenas pela capacidade de difusão. A transferência de oxigênio, no entanto, é limitada pelo volume do fluxo sangüíneo. As reservas de oxigênio no sangue fetal são
suficientes para apenas 1 a 2 minutos de uso e lesões no sistema nervoso
central podem ocorrer com períodos relativamente curtos de ausência total
de oxigênio. O fluxo sangüíneo placentário, portanto, deve ser contínuo para manter valores normais de oxigênio na circulação fetal (CUNNINGHAM et
al., 2001c).
A saturação de oxigênio no sangue da veia umbilical é semelhante à saturação de oxigênio na circulação capilar materna. Apesar da pO2
relativamente baixa, o feto normalmente não sofre hipóxia. O feto humano
possui débito cardíaco por massa corporal consideravelmente maior que um
indivíduo adulto. O alto débito cardíaco, aliado à maior capacidade de
transporte de oxigênio da hemoglobina fetal, compensam de forma eficiente
a baixa tensão de oxigênio (CUNNINGHAM et al., 2001c).
A hipóxia intra-uterina ocorre quando, por algum motivo, houver
diminuição ou interrupção do aporte de oxigênio para o feto. Essa diminuição poderá ocorrer por fatores que diminuam o aporte sangüíneo para o
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Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
16
útero (por exemplo, uma redução dos níveis de oxigenação materna, a hipotensão arterial materna ou falha na função cardíaca materna), por alterações diretas na perfusão placentária (pela deficiência de irrigação do espaço
interviloso) ou por alterações no fluxo sangüíneo entre a placenta e o feto
(pelos acidentes com o cordão umbilical, por exemplo).
A asfixia súbita, embora mais comum durante o trabalho de parto, pode ocorrer durante a gestação como no caso de acidentes, traumas e
descolamento da placenta, e resulta em sofrimento fetal agudo. Nos casos
de gravidez de alto risco, a insuficiência placentária geralmente ocorre de
forma insidiosa, levando tanto à hipóxia fetal quanto a graus variáveis de
desnutrição do feto. Esse processo se faz cronicamente e pode ter como
conseqüência o crescimento intra-uterino retardado, dentre outras complicações perinatais (BERTINI et al., 2000b).
Os recém-nascidos normais podem apresentar algum grau de asfixia durante o processo do parto sem, contudo, haver comprometimento da
sua higidez. As contrações uterinas interrompem temporariamente o aporte
sangüíneo à placenta quando a pressão intramiometrial ultrapassa a pressão arterial média materna. Várias circunstâncias podem exagerar o grau
de asfixia, resultando em um lactente deprimido, em um recém-nascido
com lesão no sistema nervoso central ou na morte fetal durante o parto
(AGUIAR, 2000). Dentre elas, destacamos:
•
A hiperatividade uterina secundária ao uso inadequado
de ocitocina, à pré-eclâmpsia, à polidramnia, ao parto obstruído ou ao parto prolongado.
Flavio Monteiro de Souza
•
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
17
A hipotensão arterial materna, secundária à anestesia
(peridural, raqui ou geral), hemorragia materna e ao decúbito dorsal (que pode induzir à síndrome de hipotensão
supina).
•
Os acidentes e complicações envolvendo o cordão umbilical (circulares, nós, prolapsos, procidências).
•
A rotura uterina, circunstância rara atualmente mas de
extrema gravidade, secundária freqüentemente a assistência obstétrica inadequada.
•
A prematuridade, que implica feto mais frágil e sensível à
hipóxia, além de imaturidade nos mecanismos de adaptação perinatal.
•
A gravidez de alto risco, quando o feto apresenta previamente sofrimento crônico ou há insuficiência placentária.
•
No descolamento prematuro da placenta normoinserida, em que o sofrimento fetal é precoce, agudo e grave por
três motivos principais: redução da área de trocas placentárias (pelo descolamento da placenta), hiperatividade uterina (hipertonia ou taquissistolia induzida pela irritação
miometrial do coágulo retroplacentário) e posterior hipotensão materna pelo sangramento retroplacentário.
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
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18
Numerosos fatores biológicos podem atuar diretamente no feto e
no recém-nascido, levando à asfixia e ao comprometimento posterior da saúde do indivíduo (Tabela 1).
Tabela 1 – Fatores biológicos de risco para a asfixia perinatal e para o comprometimento neurológico do recém-nascido.
Maternos e pré-natais
Tabagismo
Diabete
Pré-eclâmpsia
Hipertensão crônica
Doença renal crônica
Uso de drogas ou medicamentos durante a gestação
Trauma durante a gravidez
Doenças sistêmicas maternas
Amniorrexe prematura
Amnionite
Placenta prévia
Descolamento prematuro da placenta
Prematuridade
Baixo peso ao nascer
Perinatais
Desacelerações tardias (DIP II) da freqüência cardíaca fetal
Desacelerações severas da freqüência
cardíaca fetal (DIP III desfavorável)
Bradicardia
Líquido amniótico meconial
Tipo de parto e atividade uterina
Anomalia placentária
Síndrome de angústia respiratória do
recém-nascido
Persistência do canal arterial
Uso de respirador
Complicações cardiovasculares
Infecção
Hemorragia intraventricular
Convulsões
Hiperglicemia
Hipoglicemia
Hipercalcemia
Hipocalcemia
Hiperbilirrubinemia
Baixo Apgar no 1° minuto
Baixo Apgar no 5° minuto
Anomalias congênitas
Displasia broncopulmonar
Recém-nascido pequeno para a idade
gestacional
Complicações gastrintestinais
Relacionados à asfixia
Desacelerações variáveis severas da
freqüência cardíaca fetal (DIP III desfavorável), desacelerações tardias (DIP II)
Líquido amniótico meconial
Necessidade de ressuscitação neonatal
ou de assistência respiratória
Hipotensão arterial neonatal
pH do sangue umbilical baixo ao nascimento
pCO2 alto no sangue umbilical
pO2 baixo no sangue umbilical
Convulsões neonatais
Baixo Apgar no 1° e 5° minutos
Bradicardia fetal ou neonatal
(Adaptado de AYLWARD, 1993)
Ao ser submetido a uma situação de baixa disponibilidade de oxigênio, seja aguda ou crônica, o feto lança mão de mecanismos de defesa e
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
19
de compensação. O objetivo principal destes mecanismos é a proteção de
órgãos nobres: o cérebro (na prevenção de lesões neurológicas), o coração
(para manutenção da capacidade circulatória do feto) e as glândulas suprarenais (importantes na resposta fisiológica ao estresse). Para isso, ocorre
redistribuição do fluxo sangüíneo, havendo dilatação nos vasos que os irrigam e vasoconstricção nos outros locais (intestino, pulmão, pele, músculos,
rins etc.). Este mecanismo é chamado de centralização (AGUIAR, 2000).
No processo de adaptação à hipóxia, inicialmente há elevação da
freqüência cardíaca fetal (taquicardia compensatória) objetivando aumentar
as trocas metabólicas. O débito cardíaco é mantido ou aumentado pela taquicardia. Persistindo a hipóxia, o consumo de oxigênio diminuirá e o feto
irá utilizar uma via alternativa para a geração de energia, o que é conseguido através da respiração anaeróbica. No entanto, a anaerobiose é um
meio pouco eficiente de geração energética, havendo alto consumo de glicose e glicogênio e o acúmulo de radicais ácidos e de dióxido de carbono,
levando à acidose inicialmente metabólica e posteriormente mista. Neste
ambiente, o feto lançará mão de mecanismos de proteção e de economia do
glicogênio. Este processo geralmente se evidencia na cardiotocografia intraparto pelas desacelerações tardias da freqüência cardíaca (DIP II). Persistindo a hipóxia, haverá agravamento da vasoconstricção periférica, perda da
variabilidade da freqüência cardíaca fetal, bradicardia e queda do débito
cardíaco. Finalmente ocorre a perda da capacidade de compensação, levando à hipotensão arterial fetal e redução do fluxo sangüíneo cerebral, que
poderá resultar em lesão cerebral ou morte (AGUIAR, 2000).
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
20
As conseqüências mais temidas da asfixia perinatal são a lesão
neurológica e a morte fetal. O único déficit neurológico claramente associado à asfixia é a paralisia cerebral. Apesar do retardo mental e da epilepsia
poderem acompanhar casos de paralisia cerebral, não há evidências de que
sejam causados pela asfixia perinatal exceto quando associados à paralisia
cerebral, e mesmo assim essa associação é posta em dúvida (LEVENE et al.,
1986; PANETH, 1993).
Mesmo com a nítida melhora da assistência materna e perinatal
com conseqüente redução nas taxas de mortalidade perinatal nas últimas
décadas, a prevalência de paralisia cerebral não declinou desde os anos 50
(CUNNINGHAM et al., 2001a). Nelson e Ellenberg (1986) fizeram importantes contribuições para o correto entendimento da paralisia cerebral e do
retardo mental. Analisando dados do Collaborative Perinatal Project, que
acompanhou 54.000 gestações e recém-nascidos até os 7 anos de idade,
concluíram que apenas 20% dos casos de paralisia cerebral possuíam alguma associação com a asfixia perinatal. Além disso, determinaram que os
principais fatores associados à paralisia cerebral foram:
1.
Evidência de anormalidades genéticas, tais como retardo
mental materno, microcefalia e anomalias congênitas.
2.
Peso ao nascimento inferior a 2000g.
3.
Idade gestacional inferior a 32 semanas.
4.
Infecção.
Os efeitos ambientais também possuem um papel crítico no resultado do desenvolvimento do indivíduo. Fatores ambientais adversos, tais
como baixo nível socioeconômico e suporte social fraco podem colocar a cri-
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
21
ança em risco de comprometimento. Relações entre a classe social, complicações perinatais e desenvolvimento cognitivo são complexas e interdependentes. Algumas crianças estão expostas tanto a riscos biológicos quanto a
riscos ambientais (AYLWARD, 1993).
O escore de Apgar
O escore de Apgar, desenvolvido pela anestesiologista Virginia
Apgar em 1952 (APGAR, 1953), é um método rápido de avaliação das condições clínicas do recém-nascido. A facilidade de aplicação deste índice tem
feito com que seja usado em grande quantidade de estudos de resultados
perinatais (ALMEIDA et al., 1994; SOUZA et al., 1993a; SOUZA et al.,
1993b; TRAJANO, 1988a; TRAJANO, 1988b). O índice de Apgar possui cinco componentes (Tabela 2): freqüência cardíaca, esforço respiratório, tônus
muscular, irritabilidade reflexa e cor. A cada componente destes é atribuída
uma nota de 0, 1 ou 2. Apesar de haver variação entre observadores na avaliação do escore de Apgar, ele permanece sendo um indicador útil das condições gerais do recém-nascido (MARLOW, 1992).
Os estudos sobre asfixia perinatal geralmente têm sido elaborados com o uso do índice de Apgar como “padrão ouro”. As variáveis mais
extensamente avaliadas em relação ao grau de Apgar são a freqüência cardíaca fetal e o pH da artéria umbilical. Encontra-se alta especificidade na
relação entre padrões anormais da freqüência cardíaca fetal ou pH baixo no
sangue da artéria umbilical e índices de Apgar baixos. A sensibilidade destes testes é, no entanto, baixa, demonstrando que recém-nascidos com bai-
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
Flavio Monteiro de Souza
22
xo índice de Apgar podem apresentar pH normal no sangue da artéria umbilical ou traçados cardiotocográficos normais. A explicação para esse fato é
que o índice de Apgar não é apenas uma avaliação da asfixia intraparto,
mas também reflete outros fatores deletérios que possam ter atuado durante ou antes do parto (SCHMIDT et al., 1988).
Tabela 2 – Definições dos componentes do escore de Apgar.
Escore
Componente
0
1
2
Freqüência cardíaca
Ausente
< 100 bpm
≥ 100 bpm
Respiração
Ausente
Lenta ou irregular,
choro fraco,
hipoventilação
Boa, choro forte
Tônus muscular
Flácido
Alguma flexão
das extremidades
Movimentação
ativa
Irritabilidade reflexa
Sem resposta
Caretas
Choro ou retirada
ativa
Cor
Azul ou pálido
Corpo rosado,
extremidades
azuis
Completamente
rosado
(Adaptado de APGAR et al., 1958)
Os recém-nascidos que apresentam asfixia crônica e acidose metabólica compensada não respondem a um estímulo hipóxico adicional com
aumento da acidose, contudo estão expostos a maior risco perinatal. Esses
recém-nascidos recebem baixos índices de Apgar sem mostrarem redução
importante no pH do sangue umbilical. Há indicações, portanto, que a aci-
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
Flavio Monteiro de Souza
23
dose e o índice de Apgar são avaliações de processos fisiológicos diferentes
que parecem estar apenas fracamente relacionados (MARLOW, 1992).
Sabe-se que diversas causas, além da asfixia, podem estar associadas a baixos graus de Apgar. Dentre estas, merecem destaque a sedação
materna, efeitos da anestesia de condução, reflexo parassimpático por aspiração vigorosa ou intubação do recém-nascido, anomalias congênitas e doenças neurológicas, musculoesqueléticas ou cardiorrespiratórias do recémnascido (CUNNINGHAM et al., 2001a). É importante reconhecer que elementos que compõem índice de Apgar, tais como o tônus, a cor e a irritabilidade reflexa, são parcialmente dependentes da maturidade fisiológica da
criança. O recém-nascido prematuro saudável, sem evidência de agressão
hipóxica, acidemia ou depressão cerebral, pode receber um baixo índice de
Apgar apenas conseqüentemente à imaturidade (AMON et al., 1987).
O uso inadequado do índice de Apgar pode resultar em uma definição errônea de asfixia. A asfixia intraparto implica obrigatoriamente em
hipóxia fetal com conseqüente hipercarbia que, quando prolongada, levará à
acidose metabólica, compensada (com pH do sangue umbilical normal) ou
descompensada
(com
pH
do
sangue
umbilical
reduzido)
(ACOG
COMMITTEE OPINION, 1996; MARLOW, 1992).
Baixo grau de Apgar no 1° minuto de vida está fracamente associado ao resultado neurológico do recém-nascido sendo, na maioria das vezes, causado por período temporário de hipóxia durante a expulsão. O grau
obtido no 5° minuto é indicador útil da efetividade dos esforços de ressuscitação. Graus de Apgar que se mantém baixos aos 5 e 10 minutos geralmente significam complicações clinicamente importantes, indicando que o
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
24
recém-nascido não respondeu adequadamente à ressuscitação. O grau de
Apgar igual ou superior a 7 é considerado normal. Graus entre 4 e 6 são
intermediários e não são marcadores de alto risco para dano neurológico.
Podem indicar hipóxia perinatal ou serem afetados pela imaturidade fisiológica, uso de medicamentos, anomalias congênitas e outros fatores. Os
graus inferiores a 4 são possivelmente resultantes de hipóxia (ACOG
COMMITTEE OPINION, 1996; THORNGREN-JERNECK; HERBST, 2001).
O Comitê de Prática Obstétrica do Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas e o Comitê do Feto e Recém-nascido da Academia Americana de Pediatria concluem que o escore de Apgar é útil na avaliação
das condições da criança ao nascer, mas que o escore isoladamente não
deve ser usado como evidência de que algum dano neurológico tenha sido
causado por hipóxia ou por conduta inadequada de acompanhamento do
parto. Um recém-nascido que tenha sofrido asfixia próxima ao parto suficientemente grave para causar lesão neurológica deverá demonstrar os seguintes sinais (ACOG COMMITTEE OPINION, 1996):
•
Acidose metabólica ou mista profunda (pH<7,0) em uma
amostra do sangue arterial do cordão umbilical, se obtida.
•
Escore de Apgar entre 0 e 3 por mais de 5 minutos.
•
Manifestações neurológicas neonatais (por exemplo, convulsões, coma ou hipotonia).
•
Disfunção orgânica em múltiplos sistemas (por exemplo,
cardiovascular, gastrintestinal, hematológica, pulmonar ou
renal).
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
Flavio Monteiro de Souza
25
Embora saibamos que a identificação precisa da asfixia perinatal
só será obtida pela avaliação da hipóxia e da acidose, o escore de Apgar é,
freqüentemente, o único elemento disponível para identificar o grau da asfixia
perinatal
nos
países
com
carência
de
equipamentos
médicos
(EKOUNDZOLA et al., 2001). O diagnóstico de “asfixia ao nascer” na CID-10
(1993) é baseado no índice de Apgar baixo no primeiro minuto (Tabela 3), o
que freqüentemente é causado por depressão temporária. A definição de
asfixia grave (com grau de Apgar entre 0 e 3 no 1° minuto de vida) implica
em um alto nível de erro de avaliação, superestimando em oito vezes o número de crianças que apresentarão manifestações de encefalopatia neonatal
(ELLIS et al., 1998).
Tabela 3 – Classificação da asfixia ao nascer segundo a CID-10.
Capítulo XVI – Algumas afecções originadas no período perinatal (P00-P96)
P21 – Asfixia ao nascer
P21.0 – Asfixia grave ao
nascer
Asfixia:
— branca
— com Apgar no primeiro minuto de 0 a 3
Pulso inferior a 100 bpm ao nascer, diminuindo ou estável, respiração ausente ou ofegante, palidez, tônus
muscular ausente.
P21.1 – Asfixia leve ou moderada ao nascer
Asfixia:
— azul
— com Apgar no primeiro minuto 4-7
Respiração normal não estabelecida dentro do primeiro minuto, mas com freqüência cardíaca de 100 bpm
ou mais, algum grau de tônus muscular presente e algum grau de resposta a estímulo.
(Adaptado de CID-10, 1993)
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
26
O grau de Apgar baixo aos 5 minutos de vida parece estar fortemente associado a risco de morte neonatal e de paralisia cerebral. Em um
estudo populacional com mais de 200.000 recém-nascidos com peso superior a 2500g na Noruega, Moster et al. (2001) encontraram risco 386 vezes
maior de morte perinatal e 81 vezes maior de paralisia cerebral nos recém
nascidos com grau de Apgar inferior a 4 no 5° minuto quando comparados
aos que obtiveram grau de Apgar igual ou superior a 7. Esta forte associação com resultados indesejáveis demonstra que o grau de Apgar no 5° minuto é um importante indicador precoce de recém-nascidos com maior risco
de complicações sérias ou fatais.
O índice de Apgar fornece informações sobre o comprometimento
do recém-nascido e é uma forma de avaliação de sua depressão clínica nos
primeiros minutos de vida. Este índice é mais um preditor de resultados
perinatais desfavoráveis, aliado aos tradicionais, tais como o peso ao nascer, o parto prematuro e a mortalidade perinatal. Estudos recentes têm reforçado seu valor como ferramenta prognóstica na identificação de crianças
em risco (MOSTER et al., 2001; THORNGREN-JERNECK; HERBST, 2001).
Ao avaliarmos o índice de Apgar no 5° minuto em lugar do índice
no 1° minuto estamos excluindo aqueles casos de depressão temporária e
de adaptação imediata do recém-nascido a um novo ambiente. O recémnascido que permanece deprimido aos 5 minutos de vida apresenta uma
probabilidade maior de haver sofrido hipóxia importante durante o período
anterior ao nascimento. Portanto, avaliar o índice de Apgar no 5° minuto é o
mais próximo que podemos chegar da investigação da asfixia real em um
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
27
estudo com base em registros de nascimentos (THORNGREN-JERNECK;
HERBST, 2001).
Um Brasil, vários “Brasis”:
as desigualdades e a saúde
Gilberto Freyre, em 1960, observava:
Houve tempo em que na imprensa inglesa o Brasil apareceu
mais como "os Brasis" do que como "o Brasil". Reconheciase assim um pluralismo que de fato era tanto, deixasse de
haver entre nós uma unidade nacional que contrastava com
a fragmentação da América Espanhola em várias e turbulentas repúblicas, inimigas de morte umas das outras. Os
chamados "Brasis" formavam politicamente um império; e
social ou culturalmente um sistema de convivência em que
a unidade e a diversidade se completavam. Tinha esse sistema a língua portuguesa por principal expressão de sua
unidade e os contrastes regionais de predominâncias étnicas
- o ameríndio na Amazônia, o branco no Sul, o negro na Baía - eram as afirmações mais ostensivas de sua diversidade
ou pluralidade étnica. Étnica e cultural.
Hoje, sem ser Império, mas República federativa, o Brasil
continua a ser um conjunto de Brasis. Mas esse conjunto de
Brasis só tem sentido - social, cultural, étnico, econômico,
político - sob a forma de um vasto e só Brasil que, por ser
plural, não deixa de ser uno. Trata-se de uma das combinações sociologicamente mais expressivas, de unidade com
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
Flavio Monteiro de Souza
28
pluralidade, que o mundo moderno conhece. (FREYRE,
1960).
O pensamento de Freyre enfoca de forma contundente a pluralidade deste país, quando enfatiza que, no Brasil, havendo uma mística de
abrasileiramento, há, por outro lado, uma tradição que permite se conservarem culturas ou se desenvolverem variações culturais regionais associadas a predominâncias étnicas diversas: a do português, a do ameríndio, a
do italiano, a do alemão, a do polonês, a do africano, a do japonês, a do sírio, a do libanês, a do húngaro etc. Segundo seu ponto de vista, através
dessas predominâncias, regionalmente diversas, de étnica e cultura – ou da
tradição delas – vários Brasis se fazem sentir dentro de um só Brasil
(FREYRE, 1960).
A desigualdade econômica com concentração de renda é outro
aspecto importante da heterogeneidade encontrada no país. Segundo Guido
Mantega (1998), atualmente os principais indicadores econômicos e sociais
revelam uma degradação do quadro social brasileiro. Há o avanço do desemprego, acompanhado da redução da renda dos trabalhadores e de um
aumento dos rendimentos do capital, o que configura o aumento das desigualdades sociais. Esse quadro de deterioração das condições de vida da
população brasileira se manifesta também na piora dos serviços públicos
em geral, e é particularmente crítico na área da saúde pública. Entretanto,
quando se analisam os indicadores de saúde das classes mais altas dos países em desenvolvimento, verifica-se que os mesmos são comparáveis aos
observados nos países do Primeiro Mundo (SIQUEIRA, 1998).
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
29
Esta desigualdade social deu origem ao emprego do termo “Belíndia”, largamente empregado na mídia para nomear o Brasil: pequena parte da população vivendo nas condições da rica Bélgica e a maioria nas da
pobre Índia.
Desde os meados do século XIX, estudos que poderiam ser considerados como epidemiológicos já investigavam a relação entre as desigualdades de saúde da população e os fatores sociais e econômicos (ALMEIDA
FILHO, 1999). De uma maneira geral, as evidências apontam para um forte
gradiente de bem estar social no âmbito da saúde da população, invariavelmente desfavorável para os grupos menos privilegiados. Desta forma, o
nível socioeconômico, seja ele medido pela renda, educação, ocupação ou
posição na hierarquia social, irá forçosamente se refletir nas diferentes condições de saúde ou no acesso aos serviços de saúde (SZWARCWALD et al.,
2002). Essa desigualdade fez com que Tudor Hart (1971) enunciasse a lei
da assistência inversa: “A disponibilidade de bons serviços médicos tende a
ser inversamente proporcional às necessidades da população atendida”.
As desigualdades em saúde são consideradas como as diferenças
nas condições de saúde evidenciadas em grupos populacionais distintos. Os
subgrupos populacionais podem ser definidos e constituídos a partir de várias dimensões como a biológica, a social, a econômica ou a étnica
(MACKENBACH; KUNST, 1997).
As desigualdades também podem ser aferidas pelas diferenças
geográficas. Apesar da divisão geográfica conceitualmente não ser empregada como ponto de divisão socioeconômica, se observa com freqüência forte
associação entre o padrão das condições de vida e o padrão geográfico de
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
30
ocupação do espaço (SZWARCWALD et al., 2002). No entanto, esta avaliação é dificultada pela heterogeneidade da distribuição geográfica das desigualdades sociais, econômicas e culturais. Em cidades como o Rio de
Janeiro e outros grandes centros urbanos, a conformação geográfica das
desigualdades se assemelha a um mosaico de áreas pobres e ricas intercaladas (D´ORSI; CARVALHO, 1998). As desigualdades em saúde constituem
uma das dimensões para a avaliação do desempenho dos sistemas de saúde
e a análise da situação de saúde das populações contribui para a definição
das políticas públicas e na avaliação do impacto das intervenções (WHO,
2000).
Um indicador do nível de atendimento das necessidades básicas
de uma sociedade é o índice de desenvolvimento humano (IDH), que vem
sendo empregado pela a Organização das Nações Unidas (ONU) desde 1990.
Este índice incorpora três aspectos do bem-estar do indivíduo: vida longa e
saudável, acesso ao conhecimento e padrão de vida digno. Trata-se, assim,
de índice composto pela avaliação da expectativa de vida ao nascer, do nível
de instrução e do nível de renda. A combinação destes fatores gera um indicador de síntese, com valores que variam entre 0 e 1. Quanto mais próximo
de 1, maior será o nível de desenvolvimento humano do país ou região
(NAJBERG; OLIVEIRA, 2000).
Preliminarmente, o IDH foi calculado para os diversos países,
sendo possível a sua adaptação para municípios (IDH-M). A consolidação
dos diversos IDH-M resulta no índice de desenvolvimento humano de cada
estado brasileiro. Para efeito de análise, o Programa das Nações Unidas pa-
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Introdução
31
ra o Desenvolvimento (PNUD) estabeleceu três principais categorias
(NAJBERG; OLIVEIRA, 2000):
0 ≤ IDH < 0,5 – Baixo desenvolvimento humano
0,5 ≤ IDH < 0,8 – Médio desenvolvimento humano
0,8 ≤ IDH ≤ 1 – Alto desenvolvimento humano
D’Orsi e Carvalho (1998) observam que elementos do índice do
desenvolvimento humano, como as condições socioeconômicas da gestante,
podem interferir no escore de Apgar: “O grande diferencial socioeconômico
entre as gestantes reflete-se, hoje, na assistência de boa qualidade ao parto,
e o índice de Apgar assume importância crescente como indicador de risco.”
A qualidade da assistência pré-natal, influindo na preservação da
saúde do concepto, também interfere nas suas condições de vitalidade. Devemos considerar que o grau de Apgar depende da influência das condições
prévias do feto, durante a vida intra-uterina, havendo interação com as
condições de saúde da gestante, além da maturidade fisiológica do recémnascido.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Objetivos
32
Objetivos
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Objetivos
33
Objetivos
1. Estudar a predição da asfixia perinatal representada pelo índice de Apgar inferior a 7 no 5º minuto de vida a partir das
variáveis contempladas nas declarações de nascidos vivos das
diversas unidades da federação do Brasil.
2.
Correlacionar o índice de Apgar no 5º minuto com o índice de
desenvolvimento humano aferido em cada unidade da federação.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Material e método
34
Material e método
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Material e método
35
Fonte dos dados
Este trabalho constitui estudo de corte transversal baseado na
população de nascidos vivos do Brasil no ano de 1999. Foram avaliadas
todas as declarações de nascidos vivos (DN) referentes aos partos ocorridos
em 1999, totalizando 3.256.433 registros. As DN foram obtidas a partir dos
bancos de dados do Sistema de Nascidos Vivos (SINASC, 2002) através do
servidor FTP1 da Fundação Nacional de Saúde (FUNASA) do Ministério da
Saúde2.
1
FTP – File Transfer Protocol – Protocolo de transferência de arquivos.
Forma de transferência de arquivos em meio eletrônico pela rede Internet.
2
Arquivos disponíveis em <ftp://ftp.funasa.gov.br/pub/sinasc/>.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Material e método
36
Escolheu-se o ano de 1999 para análise por ser o período mais
recente, disponível com os bancos de dados de todo o país completos e revisados. Foram utilizados os bancos de dados em que as DN estavam agrupadas por local de residência da mãe.
Estão disponíveis no SINASC vinte e sete bancos de dados, correspondentes a cada uma das unidades da federação, que foram por nós
agrupados em um único arquivo contendo os registros de todo o país. Neste
processo foram incluídos, em cada um dos registros, dois novos campos,
referentes à unidade da federação e à região do país.
O formulário de declaração de nascido vivo em uso atualmente
(Anexo B) é um documento que contém 41 campos para preenchimento,
referentes a: cartório, local da ocorrência, características maternas, características da gestação e do parto, características do recém-nascido, identificação e dados do responsável pelo preenchimento. O preenchimento da DN é
obrigatório e indispensável para o registro civil do recém-nascido. Pode ser
preenchida por profissionais de diversas categorias (médicos, enfermagem,
secretários, funcionários do cartório de registro civil etc.) e os dados são
colhidos diretamente da mãe e/ou das histórias clínicas.
Nem todos os campos codificados nas DN estão disponíveis nos
bancos de dados do SINASC. As variáveis de identificação pessoal e os endereços, por exemplo, são excluídos do arquivo disponibilizado para acesso
público (Tabela 4).
No decorrer do ano de 1999, foi introduzida modificação no formulário de declaração de nascido vivo, coexistindo, neste ano, dois formulários diferentes (Anexo A – DN antiga; Anexo B – DN nova). Os formulários
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Material e método
37
que vinham em uso desde 1995 foram substituídos por uma versão mais
elaborada, que permanece em uso até hoje. Algumas codificações mudaram
com esta substituição de formulários, tendo-se que adaptar os dados entre
as duas versões das declarações sem haver, porém, perda de dados. Alguns
campos novos que não existiam no formulário antigo foram introduzidos. As
alterações pertinentes ao presente estudo introduzidas no novo formulário e
conseqüentes adaptações necessárias para a análise em conjunto destes
dois formulários estão descritas a seguir, no item “variáveis de estudo”. Os
campos constantes na estrutura dos bancos de dados do SINASC e os números dos campos correspondentes nas DN antiga e nova estão listados na
Tabela 4.
Tabela 4 – Campos disponíveis nos bancos de dados do SINASC e sua
correspondência nos formulários de declaração de nascido vivo (DN).
Número do campo na DN
Campo
Anomalia congênita (código)
Código do município de nascimento
Código do município de residência da mãe
Data do parto
Estado civil materno
Grau de Apgar no 1° minuto de vida
Grau de Apgar no 5° minuto de vida
Grau de escolaridade materna
Gravidez única ou múltipla
Idade gestacional
Idade materna
Local de nascimento
Número da declaração de nascido vivo
Número de consultas de pré-natal
Peso do recém-nascido
Quantidade de filhos mortos tidos anteriormente
Quantidade de filhos vivos tidos anteriormente
Raça ou cor do recém-nascido
Sexo do recém-nascido
Tipo de parto
DN antiga
(Anexo – A)
DN nova
(Anexo – B)
Não havia
3
24
10
Não havia
13
34
11
23
29
16
31
13
31
Não havia
15
14
19
5
17
12
21
21
Não havia
11
17
26
25
15
6
28
33
19
19
32
30
16
27
Asfixia perinatal no Brasil – Material e método
Flavio Monteiro de Souza
38
Variáveis de estudo
Variável dependente
•
Grau de Apgar no 5° minuto de vida.
Esta é a variável dependente, uma vez que representa o resultado ou desfecho estudado. O desfecho foi classificado
como desfavorável quando o índice de Apgar no 5º minuto foi
inferior a 7 e como favorável quando igual ou superior a 7
(APGAR, 1966).
Variáveis independentes relacionadas ao feto ou ao
recém-nascido
•
Idade gestacional.
A idade gestacional em semanas é codificada nas DN em faixas. Consideraram-se as seguintes faixas de idade gestacional: de 22 a 27 semanas, de 28 a 36 semanas, de 37 a 41
semanas e igual ou superior a 42 semanas3.
•
Peso ao nascer.
Para os recém-nascidos de baixo peso ao nascer, foram empregadas as seguintes faixas: de 500 a 999g, 1000 a 1499g,
3
A codificação deste campo mudou com a introdução da DN nova. Recodificaram-se os dados utilizando as faixas disponíveis na DN antiga por não ser
possível recriar a codificação mais completa da DN nova. As faixas existentes na DN
nova são: de 22 a 27 semanas, de 28 a 31 semanas, de 32 a 36 semanas, de 37 a
41 semanas, 42 semanas e mais.
Asfixia perinatal no Brasil – Material e método
Flavio Monteiro de Souza
39
1500 a 1999g, 2000 a 2499g. Os recém-nascidos com peso
normal, de 2500 a 3999g, foram analisados em um único
grupo, assim como os macrossômicos, com peso igual ou
superior a 4000g (CUNNINGHAM et al., 2001d; MONTEIRO
et al., 2000).
•
Cor.
A cor do recém-nascido é uma variável introduzida na DN
nova com as seguintes alternativas: branca, preta, amarela,
parda e indígena. No presente trabalho, segundo Aranha
(2002), optamos por empregar apenas duas categorias:
branca e não branca.
•
Sexo.
Sexo do recém-nascido (masculino ou feminino).
•
Presença de anomalias congênitas.
O banco de dados do SINASC possui os códigos das anomalias relatadas. Os casos em que havia referência a algum código de anomalia congênita foram considerados como
anomalia congênita presente e quando o campo não estava
preenchido foram considerados como anomalia congênita
ausente. Este campo foi introduzido na DN nova.
Variáveis independentes relacionadas à mãe
•
Idade materna.
Asfixia perinatal no Brasil – Material e método
Flavio Monteiro de Souza
40
Agrupou-se a idade nas seguintes faixas: de 10 a 19 anos,
de 20 a 34 anos e 35 anos ou mais (AZEVEDO et al., 2002).
•
Número de anos de estudo.
A escolaridade ou o grau de instrução é representado pelo
número de anos de estudo. Consideraram-se para análise as
seguintes faixas de número de anos de estudo: nenhum, 1 a
7, 8 e mais4.
•
Número de consultas pré-natais.
Os dados foram recodificados tendo como base a DN antiga
em nenhuma, 1 a 6 consultas, 7 e mais consultas5.
•
Estado marital.
O estado marital foi dividido em dois grupos: mulheres solteiras e mulheres que vivem ou já viveram maritalmente6.
Esta variável foi estudada apenas na análise bivariada por
4
A codificação deste campo mudou e os dados foram recodificados tendo como base as faixas da DN nova. As faixas de anos de estudo de 1 a 3 anos e de
4 a 7 anos mostraram prevalência semelhante de grau de Apgar inferior a 7 no 5°
minuto e foram colocadas em um único grupo (de 1 a 7 anos). As faixas de 8 a 11
anos e 12 anos e mais também foram agrupadas (8 anos e mais).
5
A codificação deste campo mudou com a introdução da DN nova. Recodificaram-se os dados utilizando as faixas disponíveis na DN antiga por não ser
possível recriar a codificação mais completa da DN nova. As faixas existentes na DN
nova são: nenhuma, de 1 a 3, de 4 a 6, 7 e mais.
6
O campo “estado civil” existe apenas na DN nova. Agruparam-se os
dados referentes às mulheres casadas, que vivem em união consensual, separadas
e viúvas como “vive ou já viveu maritalmente” por apresentarem prevalência semelhante de grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto em avaliação preliminar dos dados.
Asfixia perinatal no Brasil – Material e método
Flavio Monteiro de Souza
41
haver grande proporção de dados perdidos (mais de 35% de
campos não preenchidos ou preenchidos como “ignorado”).
•
Quantidade de filhos vivos tidos anteriormente.
Número de filhos vivos, excluída a gestação atual.
•
Filhos mortos tidos anteriormente.
Presença de natimortos, excluída a gestação atual. O resultado foi dicotomizado (“sim” ou “não”) em função do pequeno
número de casos com mais de um natimorto em gestações
anteriores.
Variáveis independentes relacionadas à gravidez e ao
parto
•
Gravidez única ou gemelar.
Foram consideradas como gestações gemelares as com dois
ou mais fetos.
•
Via do parto.
Ocorrência do parto por via vaginal ou por cesariana.
•
Local de nascimento.
Local onde ocorreu o parto, estratificado em: hospital, outros
estabelecimentos de saúde e domicílio.
•
Unidade da federação.
Asfixia perinatal no Brasil – Material e método
Flavio Monteiro de Souza
42
Unidade da federação de residência da mãe.
•
Região.
Região do Brasil de residência da mãe.
Índice de Desenvolvimento Humano da Organização das
Nações Unidas
Analisou-se a relação entre o Índice de Desenvolvimento
Humano em cada estado (consolidação dos índices municipais de desenvolvimento humano – IDH-M) com a prevalência do grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto. Os valores do
IDH-M foram obtidos através do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD, 2002a - Anexo C).
Critérios de exclusão
Do banco de dados que elaboramos para a análise estatística, foram excluídos os registros referentes aos seguintes casos:
•
Grau de Apgar no 5° minuto não preenchido.
•
Grau de Apgar igual a 0 no 5° minuto de vida quando associado a grau de Apgar igual a 0 no 1° minuto.
•
Idade gestacional inferior a 22 semanas.
•
Peso fetal inferior a 500g ou peso fetal não preenchido.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Material e método
43
Depois de aplicados estes critérios de exclusão, foram selecionados para estudo 2.808.341 registros. Além destas exclusões gerais, em
cada tabela foram excluídos os casos em que a variável estudada não estivesse preenchida ou estivesse preenchida como “ignorado”. Como conseqüência, há totais menores para distribuições de algumas variáveis.
Análise estatística
Inicialmente avaliou-se a freqüência de cada uma das variáveis e
seu nível de não preenchimento. A seguir, foram elaboradas tabelas de distribuição de cada fator de risco em relação ao desfecho adverso (grau de
Apgar no 5° minuto inferior a 7 – análise bivariada). Os grupos foram comparados através do teste do qui-quadrado (X²) de Pearson, considerando-se
como significativo o valor de p<0,05. Calcularam-se os riscos relativos (RR)
e seus respectivos intervalos de confiança (IC) para 95%.
Na investigação da relação entre o desfecho desfavorável (grau de
Apgar inferior a 7 no 5° minuto) e as demais variáveis, realizou-se análise
multivariada de regressão logística. Permaneceram no modelo final os fatores com nível de significância superior a 95%.
Na análise multivariada foram estudadas todas as variáveis disponíveis no banco de dados referentes à DN nova, à exceção do estado marital, por apresentar perda superior a 35%: índice de Apgar no 5° minuto
(variável de desfecho); idade gestacional; peso ao nascimento; cor do recémnascido; sexo do recém-nascido; presença de anomalias congênitas; idade
materna; número de anos de estudo; número de consultas pré-natais; nú-
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Material e método
44
mero de filhos vivos; filhos mortos anteriores; gravidez única ou gemelar; via
do parto; local de nascimento; região do país.
Na comparação entre o índice de desenvolvimento humano e a
prevalência do grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto nas unidades da federação, efetuou-se análise de regressão linear simples.
Utilizou-se o programa Epi Info versão 2002 para a criação do
banco de dados de estudo e análise bivariada. Efetuou-se a análise multivariada e a regressão linear simples com o programa Statistical Analysis System (SAS) versão 8.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
45
Resultados
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
Flavio Monteiro de Souza
46
Características da população e dos dados
No ano de 1999 foram registradas 3.256.443 declarações de nascidos vivos no Brasil. A Tabela 5 demonstra a distribuição dos nascimentos
por região e por unidade da federação.
A proporção de campos não preenchidos nos formulários de nascidos vivos variou de 0% para o sexo do recém-nascido a 51,71% para o
estado civil materno. A existência de dois formulários diferentes neste ano,
com alguns campos diversos, influenciou esta variação. Depois de aplicados
os critérios de exclusão, houve redução do número total de casos em 13,8%
(Tabela 6). As Tabelas 7, 8 e 9 demonstram a distribuição de nascidos vivos
segundo as principais variáveis das DN no Brasil em 1999, depois de aplicados os critérios de exclusão. A distribuição original, antes de aplicados os
critérios de exclusão, encontra-se no Apêndice A.
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
Flavio Monteiro de Souza
Tabela 5 – Distribuição dos nascidos vivos no Brasil em 1999
por região e por unidade da federação de residência da
mãe.
Região / Unidade da
Federação
Número
de nascimentos
Norte
8,8
Rondônia
Acre
Amazonas
Roraima
Pará
Amapá
Tocantins
285.229
31.077
14.939
62.037
9.669
127.417
13.592
26.498
28,1
Maranhão
Piauí
Ceará
Rio Grande do Norte
Paraíba
Pernambuco
Alagoas
Sergipe
Bahia
915.528
96.587
49.436
143.101
57.937
54.510
164.601
65.517
41.118
242.721
41,5
Minas Gerais
Espírito Santo
Rio de Janeiro
São Paulo
1.351.192
307.751
60.800
268.213
714.428
470.326
186.675
98.854
184.797
14,4
Paraná
Santa Catarina
Rio Grande do Sul
Nordeste
Sudeste
Sul
Percentual
1,0
0,5
1,9
0,3
3,9
0,4
0,8
3,0
1,5
4,4
1,8
1,7
5,1
2,0
1,3
7,5
9,5
1,9
8,2
21,9
5,7
3,0
5,7
Centro-Oeste
234.158
Mato Grosso do Sul
41.859
48.933
Mato Grosso
Goiás
94.017
Distrito Federal
49.349
7,2
Total do Brasil
100,0
3.256.433
1,3
1,5
2,9
1,5
47
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
48
Tabela 6 – Distribuição dos nascidos vivos segundo as principais variáveis das DN
no Brasil em 1999, antes e depois de aplicados os critérios de exclusão.
Antes de aplicados os
critérios
Depois de aplicados
os critérios
Variável
Número
Registros
perdidos
(%)
Grau de Apgar no 5° minuto
Grau de Apgar no 1° minuto
Idade gestacional
Peso ao nascimento
Cor a
Sexo
Anomalias congênitas
Idade materna
Número de anos de estudo a
Número de consultas pré-natais
Estado marital a
Quantidade de filhos vivos tidos
anteriormente
Quantidade de filhos mortos tidos
anteriormente
Gravidez única ou gemelar
Via do parto
Local de nascimento
2.842.810
2.869.777
3.228.725
3.208.817
2.336.181
3.256.433
3.256.433
3.210.368
2.301.997
3.172.417
1.572.451
12,7
11,9
0,9
1,5
28,3
0,0
1,4
29,3
2,6
51,7
2.808.341
2.765.872
2.808.341
2.082.002
2.803.208
2.808.341
2.782.520
1.877.107
2.612.010
1.084.932
0,0
1,5
0,0
25,9
0,2
0,9
33,2
7,0
61,4
2.855.159
12,3
2.517.402
10,4
2.465.305
3.245.729
3.244.940
3.256.338
24,3
0,3
0,4
0,0
2.218.070
2.800.555
2.797.402
2.805.280
21,0
0,3
0,4
0,1
Total de casos (Brasil)
3.256.433
-
2.808.341
13,8
a
Número
Registros
perdidos
(%)
Estas variáveis não constavam na DN antiga. Daí o valor artificialmente alto de registros
perdidos.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
Tabela 7 – Distribuição dos nascidos vivos segundo as
variáveis referentes aos recém-nascidos depois de
aplicados os critérios de exclusão.
Variável
Número
Grau de Apgar no 5° minuto
<7
≥7
Idade gestacional
22 a 27 semanas
28 a 36 semanas
37 a 41 semanas
≥42 semanas
Peso ao nascimento
500-999g
1000 a 1499g
1500 a 1999g
2000 a 2499g
2500-3999g
≥4000g
Cor
Branca
Não branca
Sexo
Masculino
Feminino
Anomalias congênitas
Sim
Não
2.808.341
58.961
2.749.380
2.765.872
10.036
155.811
2.381.313
218.712
2.808.341
7.747
16.771
38.991
150.412
2.433.043
161.377
2.082.002
1.198.875
883.127
2.803.208
1.439.573
1.363.635
2.808.341
5.262
2.803.079
%
2,1
97,9
0,4
5,6
86,1
7,8
0,3
0,6
1,4
5,4
86,6
5,7
57,6
42,4
51,4
48,6
0,2
99,8
49
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
Tabela 8 – Distribuição dos nascidos vivos segundo as
variáveis referentes às mães depois de aplicados
os critérios de exclusão.
Variável
Número
Idade materna
2.782.520
641.946
1.908.258
232.316
1.877.107
91.897
1.153.125
632.085
2.612.010
129.492
1.135.659
1.346.859
1.084.932
385.084
13.101
686.747
10 a 19
20 a 34
35 e mais
Número de anos de estudo
Nenhum
1 a 7 anos
8 e mais
Número de consultas pré-natais
Nenhuma
1a6
7 ou mais
Estado marital
Solteira
Já viveu maritalmente
Vive maritalmente
Quantidade de filhos vivos tidos
anteriormente
Nenhum
1
2
Superior a 2
Filhos mortos tidos anteriormente
Nenhum
1 ou mais
2.517.402
855.411
807.781
478.551
375.659
2.218.070
1.933.479
284.591
%
23,1
68,6
8,3
4,9
61,4
33,7
4,9
43,5
51,6
35,5
1,2
63,3
34,0
32,1
19,0
14,9
87,2
12,8
50
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
Flavio Monteiro de Souza
51
Tabela 9 – Distribuição dos nascidos vivos segundo as
variáveis referentes à gravidez e ao parto depois de
aplicados os critérios de exclusão.
Variável
Número
Gravidez única ou gemelar
Única
Gemelar
Via do parto
Vaginal
Cesáreo
Local de nascimento
Hospital
Outros estabelecimentos de saúde
Domicílio
Região
Norte
Nordeste
Sudeste
Sul
Centro-oeste
2.800.555
2.750.156
50.399
2.797.402
1.699.757
1.097.645
2.805.280
2.758.705
42.942
3.633
2.808.341
254.084
656.577
1.231.248
456.026
210.406
%
98,2
1,8
60,8
39,2
98,3
1,5
0,1
9,0
23,4
43,8
16,2
7,5
A proporção de não preenchimento do campo relativo ao grau de
Apgar no 5° minuto foi de 12,7% e a proporção de casos com grau de Apgar
igual a 0 no 1° e no 5° minuto foi de 0,5%. A Figura 4 representa a distribuição destes casos excluídos da análise por unidade da federação. Nesta
figura, os estados com pior grau de preenchimento estão coloridos em vermelho, os estados próximos à média brasileira em amarelo e os estados de
melhor preenchimento em azul.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
52
Figura 4 – Distribuição da proporção de não preenchimento do grau de
Apgar no 5° minuto somada à proporção de casos com grau de Apgar
igual a 0 no 1° e no 5° minutos segundo as unidades da federação.
O grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto
Verificamos que 58.961 recém-nascidos apresentaram grau de
Apgar inferior a 7 no 5° minuto (2,1%). A distribuição da prevalência desta
variável pelos estados do Brasil variou de 1,4% (estados de São Paulo, Rio
Grande do Sul e Santa Catarina) a 6,2% (Estado do Piauí). A Figura 5 demonstra esta variação. Neta figura, os 10 estados com pior resultado estão
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
53
coloridos em vermelho, os 8 estados próximos à média brasileira em amarelo e os 9 estados de melhor resultado em azul.
Figura 5 – Distribuição da prevalência do grau de Apgar
inferior a 7 no 5° minuto segundo as unidades da federação.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
54
Associação do grau de Apgar inferior a 7 no 5º minuto
com o Índice Municipal de Desenvolvimento Humano –
IDH-M – regressão linear simples.
Encontrou-se relação inversamente proporcional entre a prevalência do desfecho desfavorável e o índice de desenvolvimento humano por
unidades da federação (Figura 6). Esta associação é expressa pelo “quadrado da correlação” (R²) que apresentou valor de 0,4266 (p<0,001)7. Este valor
significa que 43% da variação observada no desfecho desfavorável é atribuível às variações entre as predições baseadas no valor do IDH-M.
Em dois estados, a prevalência observada de grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto mostrou-se significativamente diferente da esperada
(Alagoas, prevalência observada 1,6% e esperada 3,9%, p<0,05; Piauí, prevalência observada 6,2% e esperada 3,4%, p<0,05). Em face desta discrepância, montou-se novo modelo de regressão linear simples com a exclusão
destes dois estados (Figura 7), que indicou R² de 0,6582 (p<0,001)8.
A modelação dos dados na regressão linear simples que melhor
evidenciou esta correlação foi através da utilização do inverso da prevalência do grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto, com a exclusão dos dois es-
7
O modelo matemático desta correlação é: Prevalência de Apgar <7 no
5° min.=12,858 – 14,11 x IDH-M, que corresponde à linha reta observada na Figura 6.
8
O modelo matemático desta correlação é: Prevalência de Apgar <7 no
5° min.=13,523 – 15,033 x IDH-M.
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
Flavio Monteiro de Souza
55
tados que mostraram a prevalência do desfecho desfavorável discrepante
(Figura 8). Neste modelo encontrou-se R² de 0,7437 (p<0,001)9.
7%
Prevalência do grau de
Apgar <7 no 5° minuto
6%
5%
R2 = 0,4266
4%
3%
2%
1%
0%
0,6
0,65
0,7
0,75
0,8
0,85
Índice Municipal de Desenvolvimento Humano
Figura 6 – Relação entre a prevalência do grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto e
o Índice Municipal de Desenvolvimento Humano agrupado por unidade da federação (IDH-M - figura criada com dados desta pesquisa e dados externos do PNUD,
2002a).
9
O modelo matemático desta correlação é: 1/Prevalência de Apgar <7
no 5° min. = 1,5498 – 2,7364 x IDH-M.
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
Flavio Monteiro de Souza
56
Prevalência do grau de
Apgar <7 no 5° minuto
5%
4%
R2 = 0,6582
3%
2%
1%
0%
0,6
0,65
0,7
0,75
0,8
0,85
Índice Municipal de Desenvolvimento Humano
Figura 7 – Relação entre a prevalência do grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto e
o Índice Municipal de Desenvolvimento Humano (IDH-M) agrupado por Unidade da
Federação, depois de excluídas as 2 unidades da federação com prevalências do
grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto discrepantes em relação ao IDH-M (Piauí e
Alagoas - figura criada com dados desta pesquisa e dados externos do PNUD,
2002a).
Inverso da prevalência do grau de
Apgar <7 no 5° minuto
0,80
0,70
0,60
0,50
0,40
0,30
R2 = 0,7436
0,20
0,10
0,00
0,6
0,65
0,7
0,75
0,8
0,85
Índice Municipal de Desenvolvimento Humano
Figura 8 – Relação entre o inverso da prevalência do grau de Apgar inferior a 7 no
5° minuto e o Índice Municipal de Desenvolvimento Humano (IDH-M) agrupado por
Unidade da Federação, depois de excluídas as 2 unidades da federação com prevalências do grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto discrepantes em relação ao
IDH-M (Piauí e Alagoas - figura criada com dados desta pesquisa e dados externos
do PNUD, 2002a).
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
57
Análise bivariada
Variáveis relacionadas ao feto ou ao recém-nascido.
A Tabela 10 demonstra a análise bivariada das variáveis relacionadas ao feto ou ao recém-nascido. Houve forte relação entre a prematuridade (aferida pela idade gestacional ou inferida pelo peso ao nascimento) e a
ocorrência de recém-nascidos deprimidos no 5° minuto de vida. Quanto
menor a idade gestacional e o peso ao nascimento, maior o risco de ocorrência do desfecho desfavorável, sendo o risco relativo (RR) de 28,56 (intervalo de confiança para 95% - IC – 27,85 – 29,28) para idades gestacionais
inferiores a 28 semanas e risco relativo de 37,99 (IC 37,17 – 38,82) para
pesos inferiores a 1000g. Nas gestações pós-termo e nos recém-nascidos
macrossômicos, também foi observado acréscimo no risco, quando comparados com os grupos de referência (gestações a termo e peso entre 2500g e
3999g; RR 1,79, IC 1,74 – 1,84 e RR 1,34, IC 1,29 – 1,38 respectivamente).
As Figuras 9 e 10 representam as relações entre a prevalência do
grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto, a idade gestacional e o peso ao
nascimento por faixas. O peso médio dos recém-nascidos na população estudada foi de 3.195g (±536g), tendo sido menor no grupo que apresentou
índice de Apgar no 5° minuto inferior a 7 (2.731 ±971g – Figura 11).
Os recém-nascidos de cor não branca apresentaram maior risco
de asfixia perinatal em relação aos recém-nascidos de cor branca (RR 1,54,
IC 1,52 – 1,57). Os do sexo masculino mostraram também maior probabilidade de asfixia que os do sexo feminino (RR 1,19, IC 1,17 – 1,21). Nos casos
de anomalia congênita verificamos grande freqüência de desfecho desfavorável (RR 6,09, IC 5,67 – 6,54). As figuras 12, 13 e 14 ilustram as relações
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
Flavio Monteiro de Souza
58
entre a prevalência do grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto e a cor, o
sexo e a presença de anomalias congênitas.
Tabela 10 – Fatores associados ao grau de Apgar no 5° minuto inferior a 7 no
Brasil – Análise bivariada das variáveis relacionadas ao feto ou recémnascido.
Apgar<7
Apgar≥7
Número (%) Número (%)
Variável
Idade
gestacional
RRa
IC 95%b
22 a 27 sem.
28 a 36 sem.
37 a 41 sem.
≥42 sem
4.253 (42,4)
11.727 (7,5)
35.340 (1,5)
5.795 (2,6)
5.783 (57,6)
144.084 (92,5)
2.345.973 (98,5)
212.917 (97,4)
28,56 (27,85- 29,28)
5,07 (4,97 - 5,18)
1,00 c
1,79 (1,74 - 1,84)
500-999 g
1000-1499 g
1500-1999 g
2000-2499 g
2500-3999 g
≥4000 g
4.451 (57,5)
4.396 (26,2)
4.495 (11,5)
5.561 (3,7)
36.797 (1,5)
3.261 (2,0)
3.296 (42,5)
12.375 (73,8)
34.496 (88,5)
144.851 (96,3)
2.396.246 (98,5)
158.116 (98,0)
37,99
17,33
7,62
2,44
1,00
1,34
Cor
Branca
Não branca
20.168 (1,7) 1.178.707 (98,3)
22.949 (2,6) 860.178 (97,4)
1,00 c
1,54 (1,52 - 1,57)
Sexo
Feminino
Masculino
26.054 (1,9) 1.337.581 (98,1)
32.647 (2,3) 1.406.926 (97,7)
1,00 c
1,19 (1,17 - 1,21)
Ausentes
Presentes
58.295 (2,1) 2.744.784 (97,9)
666 (12,7)
4.596 (87,3)
1,00 c
6,09 (5,67 - 6,54)
Peso ao
nascimento
Anomalias
congênitas
a RR
– risco relativo. Os riscos relativos em negrito correspondem a p<0,00001(X²).
95% - intervalo de confiança para 95%.
c Categorias de referência para o cálculo dos riscos relativos (sem negrito).
b IC
(37,17(16,86(7,40 (2,38 -
38,82)
17,81)
7,85)
2,51)
c
(1,29 - 1,38)
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
Flavio Monteiro de Souza
Prevalência do grau de
Apgar <7 no 5° minuto
50,0%
40,0%
42,4%
30,0%
20,0%
7,5%
10,0%
2,6%
1,5%
0,0%
De 22 a 27
De 28 a 36
De 37 a 41
42 e mais
Idade gestacional (semanas)
Prevalência do grau de
Apgar <7 no 5° minuto
Figura 9 - Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5°
minuto inferior a 7 segundo a idade gestacional.
60,0%
57,5%
50,0%
40,0%
26,2%
30,0%
20,0%
11,5%
10,0%
3,7%
1,5%
2,0%
2500 a
3999
≥4000
0,0%
500 a 999
1000 a
1499
1500 a
1999
2000 a
2499
Peso do recém-nascido (gramas)
Figura 10 - Distribuição da prevalência do grau de Apgar no
5° minuto inferior a 7 segundo o peso do recém-nascido.
59
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
Flavio Monteiro de Souza
3300
3205 (±519)
3195 (±536)
Peso médio dos RN (g)
3200
3100
3000
2900
2800
2731 (±971)
2700
2600
Apgar 5° min. <7
Apgar 5° min. ≥7
Total
Figura 11 – Distribuição do peso médio dos recém-nascidos
segundo os grupos de grau de Apgar.
2,6%
Prevalência do grau de
Apgar <7 no 5° minuto
3,0%
2,0%
1,7%
1,0%
0,0%
Branca
Não branca
Cor do recém-nascido
Figura 12 - Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5° minuto
inferior a 7 segundo a cor do recém-nascido.
60
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
Flavio Monteiro de Souza
3,0%
Prevalência do grau de
Apgar <7 no 5° minuto
2,3%
1,9%
2,0%
1,0%
0,0%
Feminino
Masculino
Sexo do recém-nascido
Figura 13 - Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5° minuto
inferior a 7 segundo o sexo do recém-nascido.
12,7%
14,0%
Prevalência do grau de
Apgar <7 no 5° minuto
12,0%
10,0%
8,0%
6,0%
4,0%
2,1%
2,0%
0,0%
Ausentes
Presentes
Anomalias congênitas
Figura 14 - Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5° minuto
inferior a 7 segundo a presença de anomalias congênitas.
61
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
62
Variáveis relacionadas à mãe.
A Tabela 11 resume a análise bivariada das variáveis relacionadas à mãe. Tanto as mães adolescentes quanto as mais idosas apresentaram risco maior de asfixia perinatal quando comparadas com as de idade
entre 20 e 34 anos (RR 1,30, IC 1,28 – 1,33 e RR 1,21, IC 1,17 – 1,24 respectivamente, Tabela 11 e Figura 15).
O menor número de anos de estudo relacionou-se com maior freqüência de asfixia, sendo o risco relativo de 2,16 (IC 2,08 – 2,25) para mães
sem estudo e o risco relativo de 1,38 (IC 1,34 - 1,41) para mães com 1 a 6
anos de estudo, quando comparadas com mães que tiveram mais de 6 anos
de estudo (Tabela 11 e Figura 16).
O número de consultas de pré-natal também influenciou no desfecho desfavorável. Naquelas mães que não freqüentaram o pré-natal, o risco relativo mostrou-se de 2,51 (IC 2,44 – 2,59) e naquelas com 1 a 6
consultas o risco relativo foi de 1,57 (IC 1,54 – 1,60) quando comparadas
com as que tiveram mais de 7 consultas (Tabela 11 e Figura 17).
As mães solteiras apresentaram risco relativo de 1,20 (IC 1,17 –
1,24) para asfixia perinatal em relação às mulheres que vivem ou que já
viveram maritalmente. Na Figura 18 pode-se observar que a proporção de
recém-nascidos asfíxicos foi essencialmente a mesma nas mulheres separadas e viúvas (que já viveram maritalmente) e nas que são casadas ou vivem
com companheiro, e que nesses dois grupos a prevalência de grau de Apgar
inferior a 7 no 5° minuto foi inferior à observada nas solteiras.
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
Flavio Monteiro de Souza
63
As mulheres com história prévia de 1 ou 2 filhos vivos apresentaram proteção em relação à asfixia (RR 0,81, IC 0,80 – 0,83) quando comparadas às que nunca tiveram filhos vivos. Já as que tiveram mais de dois
filhos vivos anteriormente mostraram risco de asfixia discretamente superior (RR 1,06, IC 1,04 – 1,09 - Tabela 11 e Figura 19). As mães que tiveram
filhos mortos anteriormente mostraram risco maior de asfixia perinatal (RR
1,18, IC 1,15 – 1,21) quando comparadas com as mães que nunca tiveram
filhos mortos anteriormente (Tabela 11 e Figura 20).
Tabela 11 – Fatores associados ao grau de Apgar no 5° minuto inferior
a 7 no Brasil – Análise bivariada das variáveis relacionadas à mãe.
Apgar≥7
Apgar<7
Número (%) Número (%)
RRa
10 a 19 anos
20 a 34 anos
≥ 35 anos
15.987 (2,5) 625.959 (97,5)
36.465 (1,9) 1.871.793 (98,1)
5.360 (2,3) 226.956 (97,7)
1,30 (1,28 - 1,33)
1,00 c
1,21 (1,17 - 1,24)
Nenhum
1a7
≥8
3.143 (3,4) 88.754 (96,6)
25.090 (2,2) 1.128.026 (97,8)
9,995 (1,6) 622.090 (98,4)
2,16 (2,08 - 2,25)
1,38 (1,34 - 1,41)
1,00 c
Nenhuma
1a6
≥7
5.104 (3,9) 124.388 (96,1)
27.923 (2,5) 1.107.736 (97,5)
21.121 (1,6) 1.325.738 (98,4)
2,51 (2,44 - 2,59)
1,57 (1,54 - 1,60)
1,00 c
Solteira
Viveu ou
vive maritalmente
8.391 (2,2)
1,20 (1,17 - 1,24)
12.671 (1,8) 687.177 (98,2)
1,00
Nenhum
1a2
Superior a 2
19.066 (2,2) 836.345 (97,8)
23.319 (1,8) 1.263.013 (98,2)
8.895 (2,4) 366.764 (97,6)
1,00 c
0,81 (0,80 - 0,83)
1,06 (1,04 - 1,09)
Nenhum
Um ou mais
38.622 (2,0) 1.894.857 (98,0)
6.726 (2,4) 277.865 (97,6)
1,00 c
1,18 (1,15 - 1,21)
Variável
Idade materna
Número de anos
de estudo
Número de consultas pré-natais
Estado marital
Número de filhos
vivos
Filhos mortos
a RR
376.693 (97,8)
– risco relativo. Os riscos relativos em negrito correspondem a p<0,00001(X²).
95% - intervalo de confiança para 95%.
c Categorias de referência para o cálculo dos riscos relativos (sem negrito).
b IC
IC 95%b
c
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
Flavio Monteiro de Souza
Prevalência do grau de
Apgar <7 no 5° minuto
4,0%
3,6%
2,7%
2,5%
3,0%
2,2%
1,9%
1,8%
20 a 29
30 a 34
2,0%
1,0%
0,0%
10 a 14
15 a 19
35 a 39
≥40
Idade materna (anos)
Figura 15 - Distribuição da prevalência do grau de Apgar no
5° minuto inferior a 7 segundo a idade materna.
4,0%
Prevalência do grau de
Apgar <7 no 5° minuto
3,4%
3,0%
2,2%
2,2%
2,0%
1,6%
1,0%
0,0%
Nenhum
De 1 a 3
De 4 a 7
8 e mais
Anos de estudo
Figura 16 - Distribuição da prevalência do grau de Apgar no
5° minuto inferior a 7 segundo o número de anos de estudo
materno.
64
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
Flavio Monteiro de Souza
Prevalência do grau de
Apgar <7 no 5° minuto
5,0%
4,0%
3,9%
3,0%
2,5%
2,0%
1,6%
1,0%
0,0%
Nenhuma
De 1 a 6
7 ou mais
Número de consultas de pré-natal
Figura 17 - Distribuição da prevalência do grau de Apgar no
5° minuto inferior a 7 segundo o número de consultas de
pré-natal.
Prevalência do grau de
Apgar <7 no 5° minuto
2,5%
2,2%
1,8%
2,0%
1,8%
1,5%
1,0%
0,5%
0,0%
Solteira
Já viveu
maritalmente
Vive maritalmente
Estado marital
Figura 18 - Distribuição da prevalência do grau de Apgar no
5° minuto inferior a 7 segundo o estado marital materno.
65
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
Flavio Monteiro de Souza
Prevalência do grau de
Apgar <7 no 5° minuto
3,0%
2,4%
2,2%
2,0%
1,8%
1,9%
Um
Dois
1,0%
0,0%
Nenhum
Mais de dois
Filhos vivos tidos anteriormente
Figura 19 - Distribuição da prevalência do grau de Apgar no
5° minuto inferior a 7 segundo o número de filhos vivos tidos
anteriormente.
2,4%
2,4%
Prevalência do grau de
Apgar <7 no 5° minuto
2,3%
2,2%
2,1%
2,0%
2,0%
1,9%
1,8%
Nenhum
Um ou mais
Filhos mortos
Figura 20 - Distribuição da prevalência do grau de Apgar no
5° minuto inferior a 7 segundo a ocorrência de filhos mortos
anteriores.
66
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
67
Variáveis relacionadas à gravidez e ao parto.
A Tabela 12 sintetiza a análise bivariada das variáveis relacionadas à gravidez e ao parto. Observou-se que a gravidez gemelar implica em
risco relativo de 2,94 (IC 2,84 – 3,05) para recém-nascidos deprimidos no 5°
minuto. O parto por via vaginal também apresentou risco maior, na análise
bivariada, em relação ao parto cesáreo (RR 1,25, IC 1,23 – 1,27).
O parto em ambiente hospitalar foi o mais seguro, sendo que os
nascidos em estabelecimentos de saúde não hospitalar e os nascidos nos
domicílios mostraram risco relativo para asfixia de 1,93 (IC 1,84 – 2,02) e
2,41 (IC 2,09 – 2,78) respectivamente.
Observaram-se diferenças significativas na prevalência de asfixia
perinatal quando comparadas as regiões do Brasil. Nascer na região norte e
nordeste implicou em risco relativo de asfixia perinatal de 1,82 (IC 1,77 –
1,87) e 1,91 (IC 1,87 – 1,95) respectivamente, quando estas regiões foram
comparadas com a região sudeste. Nascer na região sul do país implicou em
risco menor de asfixia (RR 0,89, IC 0,87 – 0,92). A região centro-oeste mostrou resultados semelhantes à região sudeste (RR 1,00).
As Figuras 21, 22, 23 e 24 demonstram as relações entre a prevalência do escore de Apgar inferior a 7 no 5° minuto e o tipo de gravidez, a
via do parto, o local de nascimento e as regiões geográficas do país, respectivamente.
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
Flavio Monteiro de Souza
68
Tabela 12 – Fatores associados ao grau de Apgar no 5° minuto inferior
a 7 no Brasil – Análise bivariada das variáveis relacionadas à gravidez
e ao parto.
Variável
Apgar<7
Apgar≥7
Número (%) Número (%)
RRa
IC 95%b
Gravidez
Única
Gemelar
55.726 (2,0) 2.694.430 (98,0)
3.002 (6,0) 47.397 (94,0)
1,00 c
2,94 (2,84 - 3,05)
Via do parto
Vaginal
Cesáreo
38.660 (2,3) 1.661.097 (97,7)
20.001 (1,8) 1,077.644 (98,2)
1,25 (1,23 - 1,27)
1,00 c
Local de
nascimento
Região
Hospital
56.934 (2,1) 2.701.771 (97,9)
Estab. saúde
não
hospitalar
1.712 (4,0) 41.230 (96,0)
Domicílio
181 (5,0)
3.452 (95,0)
1,93 (1,84 - 2,02)
2,41 (2,09 - 2,78)
Norte
Nordeste
Sudeste
Sul
Centro-oeste
1,82
1,91
1,00
0,89
1,00
7.646 (3,0)
20.747 (3,2)
20.361 (1,7)
6.726 (1,5)
3.481 (1,7)
246.438 (97,0)
635.830 (96,8)
1.210.887 (98,3)
449.300 (98,5)
206.925 (98,3)
1,00
c
(1,77 - 1,87)
(1,87 - 1,95)
c
(0,87 - 0,92)
(0,97 - 1,04)d
a RR
– risco relativo. Os riscos relativos em negrito correspondem a p<0,00001(X²).
95% - intervalo de confiança para 95%.
c Categorias de referência para o cálculo dos riscos relativos (sem negrito).
d p>0,05.
b IC
6,0%
6,0%
Prevalência do grau de
Apgar <7 no 5° minuto
5,0%
4,0%
3,0%
2,0%
2,0%
1,0%
0,0%
Única
Gemelar
Gravidez
Figura 21 - Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5° minuto
inferior a 7 segundo o tipo de gravidez (única ou gemelar).
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
Flavio Monteiro de Souza
3,0%
Prevalência do grau de
Apgar <7 no 5° minuto
2,3%
1,8%
2,0%
1,0%
0,0%
Vaginal
Cesáreo
Via do parto
Figura 22 - Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5° minuto
inferior a 7 segundo a via do parto.
5,0%
5,0%
Prevalência do grau de
Apgar <7 no 5° minuto
4,0%
4,0%
3,0%
2,1%
2,0%
1,0%
0,0%
Hospital
Estab. saúde não
hospitalar
Domicílio
Local do nascimento
Figura 23 - Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5° minuto
inferior a 7 segundo o local de nascimento.
69
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
Flavio Monteiro de Souza
70
Prevalência do grau de
Apgar <7 no 5° minuto
4,0%
3,2%
3,0%
3,0%
2,0%
1,7%
1,7%
Sudeste
Centrooeste
1,5%
1,0%
0,0%
Nordeste
Norte
Sul
Região
Figura 24 - Distribuição da prevalência do grau de Apgar no 5° minuto
inferior a 7 segundo a região geográfica do país.
Análise multivariada
A Tabela 13 apresenta a síntese da análise multivariada efetuada
com todas as variáveis de estudo em conjunto, como medida de controle dos
fatores de confusão. Nesta análise foram considerados os 1.164.226 casos
em que os todos campos referentes a todas as variáveis estivessem preenchidos. Desta forma, foram excluídos os casos em que qualquer campo estivesse em branco ou registrado como “ignorado”. O poder de predição do
modelo, expresso pelo número de observações corretamente classificadas,
foi de 69,7%. Observa-se, de uma maneira geral, que as razões de chances
(odds ratio – OR) para os fatores de risco da asfixia perinatal se aproximam
dos riscos relativos encontrados na análise bivariada.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
71
Alguns fatores, no entanto, mostraram valores das razões de
chances significativamente diferentes dos valores dos riscos relativos observados na análise bivariada, após o controle das variáveis de confusão. Salientam-se as inversões dos riscos ocorridas em relação ao número de filhos
vivos superior a 2 (OR 0,84, IC 0,80 – 0,88) e à via do parto vaginal (OR
0,92, IC 0,90 – 0,95), que passaram a representar fatores de proteção contra a asfixia, ao contrário de fatores de risco, como a análise bivariada havia
sugerido. O maior risco relativo de asfixia encontrado na gravidez gemelar
deixou de existir (OR 0,95, IC 0,88 – 1,02). Houve também reduções importantes dos riscos de asfixia em relação à idade gestacional (OR 5,10, IC 4,59
– 5,67 para a faixa entre 22 e 27 semanas e OR 1,98, IC 1,89 – 2,08 para a
faixa de 28 a 36 semanas) e à idade materna entre 10 e 19 anos (OR 1,05,
IC 1,01 – 1,08).
Tabela 13 – Fatores associados ao grau de Apgar no 5° minuto
inferior a 7 no Brasil – Análise multivariada.
Variável
Idade gestacional
ORa
IC 95%b
22 a 27 sem.
28 a 36 sem.
37 a 41 sem.
≥42 sem.
5,10
1,98
1,00
1,22
500-999 g
1000-1499 g
1500-1999 g
2000-2499 g
2500-3999 g
≥4000 g
33,23
13,23
5,64
2,17
1,00
1,24
Cor
Branca
Não branca
1,00
1,11
c
Sexo
Feminino
Masculino
1,00
1,24
c
Ausentes
Presentes
1,00
5,44
c
10 a 19 anos
20 a 34 anos
35 anos e mais
1,05
1,00
1,12
Peso ao nascimento
Anomalias congênitas
Idade materna
(4,59 - 5,67)
(1,89 - 2,08)
c
(1,15 - 1,30)
(29,93 (12,29 (5,29 (2,06 -
36,90)
14,24)
6,02)
2,28)
c
(1,16 - 1,32)
(1,08 - 1,15)
(1,21 - 1,28)
(4,88 - 6,06)
(1,01 - 1,08)
c
(1,06 - 1,18)
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Resultados
72
Tabela 13 – Fatores associados ao grau de Apgar no 5° minuto
inferior a 7 no Brasil – Análise multivariada (continuação).
Variável
Número de anos de estudo
Número de consultas pré-natais
Número de filhos vivos
Filhos mortos
Gravidez
Via do parto
Local de nascimento
Região
ORa
IC 95%b
Nenhum
1 a 7 anos
≥ 8 anos
1,54
1,25
1,00
Nenhuma
1a6
≥7
1,37
1,32
1,00
Nenhum
1a2
Superior a 2
1,00
0,83
0,84
c
Nenhum
Um ou mais
1,00
1,13
c
Única
Gemelar
1,00
0,95
c
Vaginal
Cesáreo
0,92
1,00
Hospital
Estab. saúde não
hospitalar
Domicílio
1,00
1,34
1,71
(1,03 - 1,75)
(1,54 - 1,89)
Norte
Nordeste
Sudeste
Sul
Centro-oeste
1,47
1,67
1,00
0,90
1,00
(1,39 - 1,56)
(1,61 - 1,73)
(1,44 - 1,64)
(1,21 - 1,29)
c
(1,29 - 1,45)
(1,28 - 1,37)
c
(0,80 - 0,85)
(0,80 - 0,88)
(1,09 - 1,18)
(0,88 - 1,02)d
(0,90 - 0,95)
c
c
c
(0,86 - 0,94)
(0,92 - 1,08)d
Número de casos analisados: 1.164.226.
69,7% das observações corretamente classificadas pelo modelo.
aOR – odds ratio (razão de chances). As razões de chances em negrito correspondem a p<0,05.
bIC 95% - intervalo de confiança para 95%.
c Categorias de referência para o cálculo das razões de chances (sem negrito).
d p>0,05.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
73
Comentários
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
74
Considerações acerca do método e
da qualidade das informações
O presente estudo pode ser caracterizado como de corte transversal ou seccional. Estudos desta natureza constituem investigações que pretendem produzir “instantâneos” da situação de saúde de uma população ou
comunidade, com base na avaliação individual do estado de saúde de cada
um dos membros do grupo, com a subseqüente produção de indicadores
globais de saúde para a população investigada. Nestes estudos, o efeito e o
fator que o provoca são observados num mesmo momento histórico, ou seja, os dados são colhidos todos em um mesmo momento. Este desenho de
pesquisa tem sido o mais empregado na prática de investigação da saúde
coletiva atualmente. Utilizam, em geral, amostras da população, devido às
dificuldades para a realização de investigações que incluam a totalidade dos
membros de um determinado grupo (ALMEIDA FILHO; ROUQUAYROL,
1999). Este não é o caso da presente pesquisa, já que foram avaliadas todas
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
75
as declarações de nascidos vivos (DN) de 1999 constituindo, portanto, um
estudo populacional.
O estudo de corte transversal é efetuado com uma população definida e os participantes não são selecionados com base em seu estado de
exposição a algum fator associado (estudo de coorte) ou em seu estado de
saúde ou doença (estudo de caso-controle). Segundo Sackett (1979) este
tipo de estudo está sujeito à influência de alguns vieses:
•
O fator de risco eventualmente pode ser também um fator
de prognóstico, mudando a duração da doença. Nestes casos os estudos são menos eficazes.
•
Pode ser difícil identificar a seqüência temporal de causaefeito.
•
Lapsos de memória de quem presta a informação em ocorrências antigas podem configurar o viés de informação.
•
Viés de seleção pode influir na detecção de fatores de risco
ou do desfecho.
Na nossa pesquisa, não conseguimos identificar claramente nenhuma destas causas de tendenciosidade. Os fatores de risco estudados
não são fatores de prognóstico para o desfecho desfavorável, a variável de
desfecho e as variáveis de estudo são bem definidas temporalmente e as
informações são colhidas de um estado atual da gestante, sendo improvável
que o prestador das informações não se lembre, por exemplo, da idade, escolaridade ou estado marital. O viés de seleção também não foi identificado
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
76
uma vez que trabalhamos com a população, não sendo realizada a amostragem.
O modelo de regressão logística utilizado na análise multivariada,
descreve a relação existente entre uma variável de resposta binária (codificada em “sim” ou “não”) e um conjunto de variáveis explicativas. No nosso
caso, ele permitiu aferir, através das razões de chance (odds ratio – OR), os
efeitos de cada uma das variáveis consideradas na explicação da asfixia perinatal. Permitiu também observar os efeitos de algumas interações entre as
variáveis, pela comparação com os resultados da análise bivariada. Na análise de regressão logística, o poder de predição do modelo foi de 69,7% (observações corretamente classificadas), ou seja, com as informações dos
fatores associados ao grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto é possível
prever-se o desfecho do recém-nascido (Apgar <7 ou ≥7) em cerca de 70%
das vezes.
Esta pesquisa utilizou dados secundários, obtidos através das
DN digitadas nos bancos de dados do Sistema de Nascidos Vivos (SINASC).
Das 3.256.433 DN originalmente constantes nos bancos de dados da
FUNASA no período de estudo, 1.164.226 (37,8%) puderam ser avaliadas
através da análise multivariada. Esta redução no número total de casos
ocorreu por haver muitos registros que se enquadravam em algum critério
de exclusão. O principal fator implicado nesta redução de casos foi o não
preenchimento de todos os campos das DN considerados para a presente
pesquisa, já que, no nosso modelo, a análise multivariada só é válida quando todos os registros referentes a cada nascimento apresentam dados
completos. As tabelas da análise bivariada apresentam número total de
casos maior para cada variável analisada porque, para esse tipo de
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
77
maior para cada variável analisada porque, para esse tipo de avaliação, bastam estar completos os dados referentes às variáveis analisadas naquela
tabela.
A dimensão de um possível viés na presente pesquisa é difícil de
estimar, sendo, porém, lícito especular sobre sua direção: se na direção da
hipótese nula (ausência de associação) a tendenciosidade subestima a associação, se na direção contrária à hipótese nula a tendenciosidade superestima ou pode provocar inversão da associação. Provavelmente, a exclusão
dos dados das DN incompletas estará subestimando nossos achados, diluindo o efeito das variáveis na predição da asfixia. Parece-nos mais provável
que a falta de registro das variáveis esteja associada a maior proporção de
grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto, já que a qualidade da informação
tem sido identificada como indicador indireto da qualidade da assistência.
Estudando 538.945 certificados de nascimentos na Califórnia, Gould et al.
(2002) concluíram que os certificados com informações incompletas (7,25%
do total de certificados) eram mais comuns em mulheres com maior risco de
resultados perinatais desfavoráveis, sendo um marcador para a mortalidade
perinatal.
Especificamente em relação à variável de desfecho (grau de Apgar
inferior a 7 no 5° minuto), observamos que 13,2% das DN não continham
este dado ou apresentavam grau de Apgar igual a 0 no 1° e no 5° minutos.
A freqüência deste achado não é uniforme em todas as unidades da federação, variando de 1,1% (Rio Grande do Norte) a 95,6% (Roraima – Figura 4).
Pode ter havido um erro sistemático (viés) na digitação dos dados ou na coleta da informação.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
78
A decisão de excluir do estudo os casos em que o escore de Apgar
apresentava-se igual a 0 no 1° e no 5° minutos de vida foi tomada depois da
análise preliminar dos dados, quando observamos que este fato ocorreu em
0,5% do total de registros. Consideramos estes registros como valores perdidos, já que a ocorrência real deste evento em recém-nascidos vivos é extremamente baixa. Provavelmente, quase todos estes casos correspondiam a
escore de Apgar desconhecido, erroneamente anotado como 0, ou a natimortos que tiveram declaração de nascido vivo preenchida. Em estudo efetuado na Universidade do Tennessee, Haddad et al. (2000) relatam a
ocorrência deste evento com ressuscitação exitosa em 33 casos no total de
81.603 nascimentos, o que corresponde à freqüência de 0,04%.
Dentre as variáveis que existiam tanto nas DN novas quanto nas
DN antigas, as com menor grau de preenchimento foram a quantidade de
filhos mortos tidos anteriormente (24,3%), o grau de Apgar no 5° minuto
(12,7%) e a quantidade de filhos vivos tidos anteriormente (12,3% - Tabela
6). As outras variáveis apresentaram grau de não preenchimento inferior a
2,7%. As variáveis introduzidas na DN nova apresentam grau de não preenchimento artificialmente elevado (estado marital, 51,7%; número de anos de
estudo, 29,3%; cor do recém-nascido, 28,3% - Tabela 6) porque essas freqüências foram calculadas levando-se em consideração o total de registros
daquele ano.
Desde a implantação do SINASC, diversos estudos têm sido desenvolvidos para avaliar a qualidade das informações coletadas com as DN.
Estes estudos avaliaram o sistema tanto quantitativamente (grau de cobertura) quanto qualitativamente (fidedignidade dos dados colhidos).
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
79
Silva et al. (2001b) estudaram a qualidade dos dados coletados
em São Luiz, Maranhão, comparando os dados das DN com os prontuários
hospitalares em 1997 e 1998. Concluíram que os campos referentes ao peso
do recém-nascido, sexo, local de nascimento, tipo de parto e idade materna,
apresentam alta concordância com os dados hospitalares. Os campos referentes ao número de fetos, nascidos vivos, nascidos mortos e escolaridade
materna tiveram concordância um pouco inferior. A idade gestacional e o
número de consultas pré-natais mostraram baixa correlação.
Avaliando as DN do mês de julho de 1996 em Ribeirão Preto, São
Paulo, Mishima et al. (1999) observaram que a concordância das DN com os
dados hospitalares foi superior a 90% em 13 das 18 variáveis investigadas.
As discordâncias ocorreram principalmente nas informações sobre o número de filhos vivos, número de consultas de pré-natal, grau de instrução da
mãe e nome do pai. O grau de Apgar mostrou-se concordante com os avaliados nos prontuários médicos em 92,4% das DN.
As discordâncias entre os dados dos prontuários médicos e os
dados coletados nas DN não são exclusividade brasileira. Comparando os
certificados de nascimento com os prontuários médicos do condado de
Hillsborough, na Flórida, Gore et al. (2002) encontraram discrepâncias em
relatos de complicações médicas maternas, complicações do parto, condições neonatais e anomalias congênitas.
Entretanto, alguns estudos realizados no Brasil ao longo da década de 1990, sugerem que a qualidade das informações parece estar melhorando com o tempo. Análise das DN em Blumenau, Santa Catarina,
entre 1994 e 1997, evidenciou uma melhora progressiva no preenchimento
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
80
de todos os campos, sendo o percentual de campos ignorados inferior a 1%
no ano de 1997 (SANTA HELENA; WISBECK, 1998). Na opinião de Silva et
al. (1997) a qualificação do SINASC vem se dando satisfatoriamente desde a
sua implantação, considerando a tendência de melhoria na qualidade das
informações. Ainda segundo estes autores, a boa qualidade do sistema é
provavelmente influenciada pelo fato do documento ter a finalidade de registrar um nascimento, em oposição à má qualidade do Sistema de Informações de Óbitos.
No presente trabalho, consideramos como um dos aspectos mais
consistentes o grande número de casos estudados, interessando à totalidade dos nascimentos em 1999. Por outro lado, uma limitação é a possível
discordância de variáveis em alguns registros assim como os não preenchidos em algumas DN. As falhas de preenchimento e/ou possíveis discordâncias entre os dados constantes no banco de dados do SINASC e as reais
características dos casos configuram limitação que, no nosso entender, é
minimizada pelo elevado número de casos estudados.
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
Flavio Monteiro de Souza
81
Discussão dos resultados
História da gestação atual e história pregressa: idade
gestacional e peso ao nascer, anomalias congênitas,
sexo do recém-nascido, gemelidade, via do parto, idade
materna, filhos tidos.
A prematuridade (idade gestacional inferior a 37 semanas) é uma
condição que traz resultados deletérios para o recém-nascido, contribuindo
sobremaneira nas taxas de morbidade e mortalidade neonatais. As freqüentes imprecisões na avaliação da idade gestacional fizeram com que se utilizasse
o
peso
do
concepto
inferior
a
2500g
como
indicativo
de
prematuridade. Embora um sinal indireto, tem sido utilizado em estudos
clínicos e epidemiológicos por ser objetivamente mensurável. Este ponto de
corte ainda mantém razoável valor preditivo, tanto para a morbidade quanto
para a mortalidade. Quando se emprega o critério ponderal, o termo mais
adequado para classificar essas crianças é “recém-nascidos de baixo peso”
(ALMEIDA, 2001).
A prematuridade pode ser espontânea, geralmente secundária ao
trabalho de parto prematuro ou à rotura prematura das membranas ovulares. Pode ser também iatrogênica, quando a interrupção da gravidez dá-se
por indicação médica. As causas da prematuridade espontânea são diversas, havendo freqüentemente a ação de fatores predisponentes tais como
condições socioeconômicas desfavoráveis, assistência pré-natal precária e
infecções geniturinárias (BERTINI et al., 2000a).
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
82
Em face da sua maior fragilidade muscular e óssea, o prematuro
tem maior risco de apresentar tocotraumatismos e baixos graus de Apgar
em comparação com o feto a termo (SOUZA, 1992). Por sua imaturidade, é
mais susceptível à hipoxia, apresentando maior tendência à asfixia em relação ao feto a termo. A prematuridade também está associada a maior freqüência de apresentações anômalas, principalmente a apresentação pélvica
(SOUZA, 2000; SOUZA; TRAJANO, 2003b).
Os prematuros, em conseqüência da imaturidade de vários sistemas orgânicos, têm maior chance de apresentar numerosas complicações
neonatais, tais como síndrome de angústia respiratória do recém-nascido,
hemorragia intraventricular, displasia broncopulmonar, persistência do canal arterial, enterocolite necrotizante, sepse, apnéia e retinopatia. Estes riscos aumentam na relação inversa à idade gestacional (IAMS, 1999).
No presente trabalho, para estudarmos a prematuridade, avaliamos o recém-nascido tanto pelo peso, que possui maior precisão de observação e de anotação na DN segundo diversos autores (MELLO JORGE et al.,
1996; MISHIMA et al., 1999; SILVA et al., 2001b; SILVA et al., 1997), quanto pela idade gestacional, que é o parâmetro preconizado pela Organização
Mundial de Saúde (BERTINI et al., 2000a). Para a análise, dividimos os recém-nascidos de baixo peso em faixas de 500g (LANSKY et al., 2002; MONTEIRO et al., 2000). Os recém-nascidos macrossômicos (peso ≥4000g) foram
agrupados e a categoria de referência para o cálculo dos riscos relativos foi
a dos pesos situados entre 2500 e 3999g (CUNNINGHAM et al., 2001b).
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
83
A prevalência de recém-nascidos de baixo peso no nosso grupo de
estudo mostrou-se de 7,6% e a de prematuros, considerando-se a idade gestacional relatada, de 5,9% (Tabela 7). Na análise bivariada, observamos risco relativo do índice de Apgar inferior a 7 no 5° minuto maior para os
recém-nascidos prematuros e de baixo peso, e este risco é tanto maior
quanto menor a idade gestacional, atingindo o valor de 28,56 (IC 27,85 –
29,28) para idade gestacional entre 22 e 27 semanas, e de 37,99 (IC 37,17 –
38,82) para pesos inferiores a 1000g (Tabela 10). O risco se reduz à medida
que o peso e a idade gestacional aumentam, mas mesmo os recém-nascidos
com pesos próximos do limite superior da definição de baixo peso (entre
2000 e 2499g) apresentam risco maior de baixos graus de Apgar (RR 2,44,
IC 2,38 – 2,51).
Na análise multivariada, os riscos relacionados aos pesos se
mantém semelhantes (OR 33,23, IC 29,93 – 36,90 para pesos entre 500 e
999g, e OR 2,17, IC 2,06 – 2,28 para pesos entre 2000 e 2499g, Tabela 13).
O risco associado à idade gestacional, no entanto, sofreu uma redução importante, embora ainda tenha se mantido maior em relação à gravidez a
termo (OR 5,10, IC 4,59 – 5,67 para idade gestacional entre 22 e 28 semanas, e OR 1,98, IC 1,89 – 2,08 para idades gestacionais entre 28 e 36 semanas, Tabela 13). O pareamento pelas outras variáveis, principalmente
pelo peso, variável mais precisa, pode explicar esta variação.
Os recém-nascidos muito prematuros apresentam imaturidade
em diversos sistemas e os parâmetros de irritabilidade reflexa, tônus muscular e esforços respiratórios podem estar menos pronunciados nessas crianças quando comparadas às maduras (MARLOW, 1992). Durante a
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
84
gravidez, quanto menor a idade gestacional e o peso, maior a sensibilidade
do feto a situações de hipóxia que, por sua vez, agravam o prognóstico neurológico após o nascimento (BOSE; BOSE, 1995; GAUDIER et al., 1994;
SHANKARAN et al., 2002). No nosso estudo, o maior risco de grau de Apgar
inferior a 7 no 5° minuto nos prematuros parece demonstrar a associação
da imaturidade do recém-nascido com a sua maior sensibilidade à hipóxia.
A prematuridade não é o único motivo para o baixo peso ao nascer. O crescimento intra-uterino retardado é também importante fator de
baixo peso, estando associado à insuficiência placentária e, conseqüentemente, à asfixia perinatal (GOLAN et al., 1994). A discriminação da idade
gestacional na DN em faixas não permite que se associe este parâmetro ao
peso para a discriminação dos conceptos pequenos para a idade gestacional, uma forma indireta de se suspeitar ter havido restrição de crescimento
intra-uterino.
A gestação prolongada (com idade gestacional igual ou superior a
42 semanas) é condição comum. A freqüência observada no Brasil em 1999
foi de 8,9% (Apêndice A). Esta condição se associa a comprometimento do
concepto, havendo maior incidência de mortalidade perinatal, síndrome de
aspiração meconial, tempo de permanência prolongado no berçário, distocia
de espáduas, macrossomia fetal, indução do parto, e parto cesáreo
(TRAJANO, 1988a). Os recém-nascidos com idade gestacional igual ou superior a 42 semanas apresentaram, em nosso estudo, maior risco de asfixia
perinatal, tanto na análise bivariada (RR 1,79, IC 1,74 – 1,84) quanto na
multivariada (OR 1,22, IC 1,15 – 1,30). Este achado pode ser explicado tanto pela insuficiência placentária quanto por complicações durante o parto, e
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
85
está de acordo com diversos autores que referem maior freqüência de asfixia
perinatal e baixos índices de Apgar nessa intercorrência obstétrica
(INGEMARSSON; KALLEN, 1997; TRAJANO, 1988a; VORHERR, 1975). Em
estudo populacional com mais de 1 milhão de recém-nascidos na Suécia,
Thorngren-Jerneck e Herbst (2001) relatam risco crescente de baixos índices de Apgar no 5° minuto à medida que a idade gestacional aumenta além
de 40 semanas, atingindo OR 1,82 (IC 1,48 – 2,23) para gestações de 43
semanas.
Os recém-nascidos macrossômicos também apresentaram risco
maior de asfixia em relação aos de peso adequado (RR 1,34, IC 1,29 – 1,38
na análise bivariada e OR 1,24, IC 1,16 – 1,32 na análise multivariada).
Nossos resultados são concordantes com os de Thorngren-Jerneck e Herbst
(2001) que relatam risco crescente de grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto a partir de 4000g (OR 1,68, IC 1,50 – 1,88) até pesos superiores a 5500g
(OR 7,39, IC 1,35 – 40,5), quando comparados com recém-nascidos de peso
em torno de 3500g.
Os fatores que favorecem a ocorrência de fetos macrossômicos
são: diabete melito materna, pais com índice de massa corporal maior que
30, multiparidade, gravidez prolongada, idade materna avançada, sexo
masculino, gravidez prévia com feto pesando mais de 4000g e fatores étnicos (JOHNSON et al., 1992; SPELLACY et al., 1985; TRAJANO, 1988a). O
crescimento fetal excessivo resultando em macrossomia foi, durante muito
tempo, considerado causa importante de morbidade e mortalidade perinatais, principalmente na gravidez complicada por diabete (CHERVENAK;
GABBE, 1999). No parto, o feto macrossômico é mais propenso a sofrer dis-
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
86
tocia de espáduas, traumatismo e asfixia (SOUZA; TRAJANO, 2003a). O feto
macrossômico é, portanto, mais predisposto a resultado perinatal adverso,
o que justifica nossos achados.
Observou-se relação fortemente positiva entre a presença de anomalias congênitas e o desfecho desfavorável na análise bivariada (RR
6,09, IC 5,67 – 6,54, Tabela 10), fato que se repete na análise multivariada
(RR 5,44, IC 4,88 – 6,06, Tabela 13). A intensidade do risco observado sugere que a anomalia congênita aumenta o risco na forma favorecedora, onde
há clara conexão entre o fator e o dano, ainda que o fator não seja a causa
direta, ou na forma causal, desencadeando o processo mórbido.
O campo referente à anotação das anomalias congênitas não existia na DN antiga e, portanto, o número total de casos é, certamente, maior que o registrado pela nossa pesquisa. Devemos considerar também que
pôde ter havido subnotificação de anomalias congênitas, em especial aquelas que, por serem menos evidenciadas clinicamente, podem não ter sido
detectadas. Foram registrados 5.677 casos de anomalias congênitas nos
registros do SINASC, correspondendo a 0,2% dos nascimentos (Apêndice A).
O número de casos estudados, depois de aplicados os critérios de exclusão,
foi de 5.262, correspondendo à mesma proporção (0,2%, Tabela 7). A soma
das incidências relatadas na literatura de apenas três das anomalias mais
comuns, os defeitos de fechamento do tubo neural (0,14 a 0,20%,
CUNNINGHAM et al., 2001e), a hipoplasia pulmonar (0,11 a 0,14%, MOESSINGER et al., 1989) e os defeitos cardíacos (0,70%, BURN; GOODSHIP,
1996) é nitidamente superior à prevalência relatada de anomalias
congênitas em nosso estudo.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
87
A ausência do campo “detectada alguma malformação congênita
e/ou anomalia cromossomial” na DN antiga (campo número 34 da DN nova,
Anexo B) e a subnotificação reduzem a intensidade do risco observado, subestimando o impacto da observação, já que alguns recém-nascidos com anomalias congênitas não foram classificados como tal. Estes recémnascidos provavelmente tiveram maior freqüência de baixo escore de Apgar
no 5° minuto que os recém-nascidos normais, como podemos deduzir da
associação encontrada entre esta variável e o desfecho desfavorável. Outra
consideração importante na análise destes resultados é que as anomalias
relatadas provavelmente se referiam a anomalias estruturais grosseiras facilmente identificáveis ao nascimento, e não a alterações cromossomiais que
poderiam causar alterações fenotípicas mais discretas, o que certamente
aumentaria ainda mais o número de observações.
A maior parte dos valores anormais do escore de Apgar associados a anomalias congênitas é facilmente explicável. Por exemplo, deformidades do sistema nervoso central (anencefalia, microcefalia, encefalocele,
etc.) interferem no controle da respiração e de outras funções vitais. Hipoplasia e outras alterações pulmonares interferem com a troca de gases levando à asfixia neonatal. Anomalias cardíacas, por influírem na circulação
sangüínea, podem levar à redução do fluxo sangüíneo cerebral (NAEYE,
1979).
O número de embriões masculinos é maior que o de embriões
femininos após a concepção (MUNNE et al., 1993). Durante a gestação, a
perda de fetos do sexo masculino, seja por abortamentos espontâneos ou
por morte fetal, mostra-se maior (JAKOBOVITS, 1991). A mortalidade peri-
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
88
natal é também superior nos fetos do sexo masculino, e estes nascem com
idades gestacionais menores em relação aos do sexo feminino (HALL; CARRHILL, 1982). Saliba et al. (2001) relatam risco relativo de 1,8 para convulsões neonatais em recém-nascidos de baixo peso do sexo masculino quando
comparados com os do sexo feminino. Lieberman et al. (1997) observaram
que a taxa de cesarianas por sofrimento fetal entre os conceptos do sexo
masculino é 2,2 vezes superior em relação aos de sexo feminino, mesmo
após o controle por fatores de confusão, incluindo o peso ao nascimento, a
idade gestacional e a circunferência cefálica. Verificaram também que os
fetos masculinos nascidos pela via alta indicada por sofrimento fetal, mostraram risco mais de três vezes superior de apresentarem grau de Apgar
igual ou inferior a 7 no 1° e 5° minutos. Estes resultados sugerem maior
vulnerabilidade dos fetos masculinos durante a gestação e o parto.
Na presente pesquisa, a freqüência de recém-nascidos do sexo
masculino no grupo de estudo foi de 51,3% e do sexo feminino de 48,6%
(Tabela 7). O risco de asfixia perinatal nos fetos do sexo masculino mostrouse superior aos do sexo feminino tanto na análise bivariada (RR 1,19, IC
1,17 a 1,21 – Tabela 10) quanto na análise multivariada (OR 1,24, IC 1,21 a
1,28 – Tabela 13). Nossos achados são semelhantes aos de Bekedam et al.
(2002) que, analisando mais de 400.000 nascimentos na Holanda no período de 5 anos, relatam OR de 1,27 (IC 1,20 – 1,34) para baixos índices de
Apgar no 5° minuto entre os fetos de sexo masculino após ajuste para o peso fetal e a idade gestacional no momento do parto. Encontraram também
risco maior de morte perinatal (OR 1,27, IC 1,20 – 1,34) e de sofrimento fetal durante o trabalho de parto (OR 1,48, IC 1,44 – 1,51) nos conceptos
masculinos. Em recente estudo populacional sobre fatores de risco para
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
89
baixo índice de Apgar no 5° minuto, com análise de 1.028.705 nascimentos
na Suécia, Thorngren-Jerneck e Herbst (2001) observaram que as meninas
apresentam menor freqüência de depressão ao 5° minuto avaliada pelo índice de Apgar em relação aos meninos (OR 0,78, IC 0,74 – 0,81).
O mecanismo biológico responsável pela maior freqüência de sofrimento fetal e asfixia perinatal nos conceptos do sexo masculino não é
claro. A insuficiência placentária severa é mais comum nos conceptos de
sexo masculino (EDWARDS et al., 2000). A insuficiência placentária pode
ser a explicação para a maior perda fetal e a maior freqüência de asfixia nos
conceptos masculinos. Parece haver diferenças no metabolismo energético e
na taxa de crescimento pela influência do cromossoma Y, já que a taxa de
crescimento dos blastocistos e embriões é maior nos conceptos XY que nos
XX (CLARKE; MITTWOCH, 1995). Ao mesmo tempo, há argumentos que
sugerem relação inversa entre a expectativa de vida e a taxa metabólica
(LYNN; WALLWORK, 1992). Portanto, a taxa metabólica elevada poderia
aumentar a vulnerabilidade do feto masculino durante estágios críticos do
desenvolvimento (BEKEDAM et al., 2002).
A maior freqüência de depressão neonatal nos recém-nascidos do
sexo masculino pode ser também resultado de diferenças no desenvolvimento dos fetos masculinos e femininos. Pesquisas em animais sugerem
que o desenvolvimento do sistema neurossimpático pulmonar e adrenal
ocorre mais cedo no sexo feminino (PADBURY et al., 1981; PADBURY et al.,
1983). Na espécie humana, observou-se que os fetos prematuros do sexo
feminino produzem, em resposta à asfixia, maior quantidade de catecolaminas que os do sexo masculino e que o aumento dos níveis de catecolaminas
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
90
pode melhorar a resposta fetal aos efeitos da hipóxia (GREENOUGH et al.,
1987; LAGERCRANTZ; SLOTKIN, 1986; NYLUND et al., 1987). Além disso,
Lagercrantz (1982) observou, entre recém-nascidos com acidose moderada
(pH umbilical médio de 7,16), que aqueles que apresentavam índices de Apgar inferior a 7 tinham menores níveis séricos de catecolaminas ao nascer
em comparação com os que apresentavam índices de Apgar igual ou superior a 7. Portanto, estas diferenças na secreção de catecolaminas podem estar
relacionadas às diferenças que encontramos na freqüência do grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto entre os recém-nascidos masculinos e femininos.
A gravidez gemelar implica em resultado gestacional menos favorável tanto à mãe quanto ao concepto. As repercussões maternas mais relevantes dizem respeito à maior freqüência de anemia, diabete melito e
hipertensão arterial. O resultado perinatal é caracterizado por maior coeficiente de mortalidade perinatal, maior freqüência de índice de Apgar baixo, de
asfixia perinatal, de anomalias congênitas, de tocotraumatismos e de prematuridade. Os gêmeos, em geral, apresentam baixo peso e o segundo gemelar tem prognóstico mais adverso que o primeiro gemelar (TRAJANO,
1988b).
Em nosso estudo, foram avaliados 50.399 gemelares (Tabela 9).
Observamos risco de asfixia quase 3 vezes superior na gestação gemelar em
comparação com a gravidez única na análise bivariada (RR 2,94, IC 2,84 –
3,05, Tabela 12). Entretanto, na análise multivariada este risco não se confirmou (OR 0,95, IC 0,88 – 1,02, Tabela 13). Estes resultados sugerem que a
gemelaridade, por si só, não implica em maior risco de asfixia para o con-
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
91
cepto. Este risco aumentado parece estar relacionado à presença de outras
condições adversas associadas à gemelidade. Quando a análise foi controlada para fatores como a idade gestacional, o peso do recém-nascido, as variáveis socioeconômicas, a idade e paridade maternas, a via do parto e a
presença de anomalias congênitas, o risco de asfixia na gestação gemelar se
igualou ao da gestação única. É provável que os fatores que mais tenham
influenciado nesta diferença sejam o peso do recém-nascido, a idade gestacional e a presença de anomalias congênitas, pois estas condições são as
que mais contribuem para a morbidade e mortalidade dos gemelares
(TRAJANO, 1988b).
A redução na taxa de asfixia perinatal na gravidez gemelar quando há controle pelo peso do recém-nascido também foi observada por
Thorngren-Jerneck e Herbst (2001). Estudando 12.866 gemelares a termo,
encontraram razão de chances de grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto
de 4,14 para o segundo gemelar e de 2,40 para o primeiro. Após padronização pelo peso, este risco reduziu-se para 2,41 e 1,62 respectivamente. Ao
contrário do observado em nosso estudo, o risco continuou maior para a
gravidez gemelar após a padronização. Uma possível explicação para esta
diferença é que aqueles autores não controlaram a análise para outros fatores de risco que poderiam estar também influenciando no resultado perinatal. Por outro lado, a redução do risco que observamos poderia ser
secundária à assistência prestada à gestação gemelar. É provável que as
gestações gemelares, quando diagnosticadas durante o pré-natal, tenham
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
92
um acompanhamento do parto mais cuidadoso, por profissional de melhor
padrão técnico, enquanto a assistência ao parto nas gestações únicas seja
prestada, em especial nas populações carentes, por pessoas menos hábeis10.
Em nosso estudo não foi possível avaliar as diferenças entre os resultados
do primeiro e dos gemelares subseqüentes, já que a DN não contém campo
que indique a ordem de nascimento.
O parto por via vaginal mostrou-se fator de risco para a asfixia
perinatal na análise bivariada (RR 1,25, IC 1,23 – 1,27, Tabela 12). Na análise multivariada este risco não só se reduziu, mas se inverteu, identificando o parto vaginal como fator de proteção contra a asfixia (OR 0,92, IC 0,90
– 0,95, Tabela 13). Acreditamos que esta inversão do risco pode ser explicada quando levamos em conta a freqüência da operação cesariana no Brasil,
as indicações para o procedimento, as características sociais, econômicas e
culturais da gestante e as características do feto.
Em países reconhecidos pela boa qualidade da assistência médica, a freqüência de cesariana, tanto na clientela pública quanto na privada,
não ultrapassa 25%. Nos Estados Unidos, nos últimos 10 anos, a taxa tem
variado entre 20 e 23%. Na Europa, a taxa é significativamente menor e raramente ultrapassa 15%. No Brasil, que convive com elevado número de
cesarianas, esta taxa é absurdamente elevada em alguns hospitais priva-
10
Em São Luís do Maranhão, quase 27% dos partos hospitalares não
são realizados por médico (SILVA et al., 2001a) e em Pelotas, no Rio Grande do Sul,
esta proporção é de 12% (COSTA et al., 1996). Na região norte 18,1% dos partos
em 1996 ocorreram fora do ambiente hospitalar e na região nordeste esta taxa foi
de 16,6% (ÁREA TÉCNICA DA SAÚDE DA MULHER DO MS, 2001).
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
93
dos, chegando a 90%, valores sem paralelo nos países que apresentam os
melhores indicadores de qualidade de assistência obstétrica tais como a
morbi-mortalidade materna e perinatal (TRAJANO; SOUZA, 2003). A incidência de cesariana no Brasil em 1999, segundo os registros do SINASC,
observada no presente estudo, foi de 37% (Anexo C) e a taxa de cesariana
apresentada ao SUS em 1999 foi de 25% (ÁREA TÉCNICA DA SAÚDE DA
MULHER DO MS, 2001). Esta diferença de 12% a mais na taxa de cesariana
de todo o país em relação às pacientes atendidas pelo SUS provavelmente
deve-se à elevada freqüência de procedimentos executados em hospitais
privados e conveniados com operadoras de saúde, que atendem clientela
com padrão econômico diferenciado. Este fato provavelmente resultou em
grande número de cesarianas efetuadas em mulheres de menor risco para a
asfixia perinatal e também em grande número de procedimentos desnecessários, distorcendo a observação dos riscos.
Costa et al. (1996), estudando a assistência médica maternoinfantil em Pelotas, RS, observaram que os cuidados menos adequados de
assistência ao parto são dedicados às mães pobres e de alto risco gestacional. Ainda segundo estes autores, mulheres de baixo risco gestacional apresentam maior probabilidade de serem submetidas a cesariana do que
gestantes de alto risco (como as com baixa estatura, com perdas reprodutivas prévias ou apresentando intercorrências clínicas). Quando a renda familiar mostrou-se superior a 10 salários mínimos, a freqüência de cesariana
foi de 50%. Estes dados se repetem em outras regiões do Brasil. Na região
Nordeste, cesarianas são realizadas em cerca de 9% das gestantes com renda inferior a 1 salário mínimo e em 39% daquelas com renda superior a 4
salários mínimos (BARROS et al., 1995).
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
94
Campos e Carvalho (2000), estudando a assistência ao parto no
município do Rio de Janeiro através de dados do SINASC de 1995 e da pesquisa sobre assistência médico-sanitária do IBGE e do ministério da saúde,
identificaram dois grupos de maternidades. O primeiro, onde as parturientes e recém-nascidos apresentavam boas condições, apresentou freqüência
de 81,5% de cesarianas. No segundo grupo, onde houve menor proporção
de cesarianas (32,2%), era maior a freqüência de indicadores que apontavam maiores riscos para o concepto, tais como baixo peso, prematuridade,
baixa escolaridade materna e maior proporção de mães adolescentes.
Oliveira e Silva e Pessôa da Silva (informação verbal)11, estudando
mais de 6300 partos no Hospital Pró-Matre no Rio de Janeiro, observaram
redução da taxa de cesariana de 30,6% para 19,9% do ano de 2001 para o
ano de 2002. Neste período foram implementadas atividades diferenciadas
de atenção à gestante e assistência ao parto. A freqüência de asfixia perinatal aferida pelo escore de Apgar inferior a 7 no 5° minuto, concomitantemente, reduziu-se de 1,4% para 0,8% (p<0,05) demonstrando que a redução
da taxa de cesariana aliada à assistência diferenciada ao parto melhorou o
resultado perinatal.
Na nossa análise, o parto vaginal apresentou menor risco quando
controlamos as variáveis influenciadas pelas condições socioeconômicas e
culturais, a idade gestacional, a idade materna e o peso do recém-nascido.
Isto nos faz concluir que, na realidade, estas variáveis, associadas intima-
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
95
mente com as condições de nascimento, estavam influenciando o resultado
desfavorável, não sendo a via do parto a responsável pelo desfecho.
A idade materna tem sido objeto de estudos que procuram determinar as dimensões do risco gestacional nos extremos da fase reprodutiva (adolescentes e idosas - AZEVEDO et al., 2002; DILDY et al., 1996;
GAMA et al., 2001; GAMA et al., 2002; GILBERT et al., 1999; GOLDANI et
al., 2000; OLIVEIRA, 1998). Alguns trabalhos parecem indicar que, na
adolescência, existe maior probabilidade de recém-nascidos com baixo peso,
parto prematuro, amniorrexe prematura, pré-eclâmpsia e diabete gestacional (AZEVEDO et al., 2002; GAMA et al., 2001). No entanto, o risco social
parece ser mais importante que o risco biológico. A gravidez na adolescência
parece estar associada a maior freqüência de violências e abusos, à pressão
para adotar comportamentos determinados pelo seu grupo social, e a condições sociais e culturais desfavoráveis (FOSTER, Jr. et al., 1999). Grávidas
adolescentes e mulheres adultas que engravidaram na adolescência apresentam pior nível de instrução, maior probabilidade de serem solteiras, usam com maior freqüência o fumo e drogas ilícitas e freqüentam menor
número de consultas pré-natais (GAMA et al., 2002). Para um bom resultado perinatal, talvez mais importante que a idade materna sejam as condições de vida e saúde da gestante, principalmente a qualidade da assistência
obstétrica pré-natal e durante o parto (BUKULMEZ; DEREN, 2000).
11
Dados apresentados no Fórum Materno-Infantil do CREMERJ em 11
de dezembro de 2002.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
96
Encontramos maior risco de asfixia perinatal quando a idade materna estava compreendida entre 10 e 19 anos (RR 1,30, IC 1,28 – 1,33, Tabela 11). Ao realizarmos a análise multivariada, este risco quase
desapareceu (OR 1,05, IC 1,01 – 1,08, Tabela 13), demonstrando que o poder preditivo da asfixia perinatal nesta faixa etária é influenciado por outras
variáveis que foram controladas na análise multivariada. De fato, o baixo
peso ao nascer, a nuliparidade, o baixo grau de instrução materno e o pequeno número de consultas pré-natais estão fortemente associados à gravidez na adolescência (AZEVEDO et al., 2002; GAMA et al., 2001;
NASCIMENTO; GOTLIEB, 2001). Todas estas variáveis se associaram a
maior risco para asfixia perinatal em nossa pesquisa. Assim, o maior risco
de asfixia perinatal na adolescência parece decorrer essencialmente de fatores sociais e de saúde associados à adolescência, e não do efeito “biológico”
da idade.
Estudando apenas gestações a termo na Suécia, ThorngreenJerneck e Herbst (2001j) encontraram menor risco de asfixia perinatal no
grupo de idade entre 15 e 19 anos (RR 0,74, IC 0,64 – 0,86). O menor gradiente social daquele país, associado a melhores condições de assistência
obstétrica e à exclusão de recém-nascidos prematuros pode ser a explicação
para as diferenças entre o nosso estudo e o daqueles autores.
A idade materna maior que 35 anos tem sido associada a maior
risco tanto para as mães quanto para seus filhos. A ocorrência de hipertensão arterial crônica, diabete gestacional, multiparidade, placenta prévia e
discinesia uterina é maior nesta faixa etária, sendo referido aumento nas
taxas de mortalidade perinatal, parto prematuro, baixo peso ao nascer, cri-
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
Flavio Monteiro de Souza
97
anças pequenas para a idade gestacional e anomalias cromossomiais
(DILDY et al., 1996; MAIN et al., 2000).
As gestantes com idade superior a 35 anos apresentaram, em
nosso trabalho, maior probabilidade de que seus filhos tivessem índice de
Apgar inferior a 7 no 5° minuto tanto na análise bivariada quanto na multivariada (RR 1,21, IC 1,17 – 1,24 e OR 1,12, IC 1,06 – 1,18 respectivamente
– Tabelas 11 e 13). Este fato pode ser explicado pela maior associação de
intercorrências clínicas e obstétricas em mulheres mais idosas. Nossos resultados são concordantes com os de Gilbert et al. (1999) e de ThorngrenJerneck e Herbst (2001) que, em grandes estudos populacionais, relatam
maior chance de asfixia perinatal nesta faixa etária materna.
Quanto ao número de filhos vivos, encontramos risco menor de
asfixia perinatal quando as mães haviam tido 1 ou 2 crianças anteriormente
em comparação com as que não tiveram filhos vivos (RR 0,81, IC 0,80 –
0,83, Tabela 11). Nas mulheres com mais de 2 filhos, este risco mostrou-se
discretamente maior (RR 1,06, IC 1,04 – 1,09, Tabela 11). Na análise multivariada observamos, no entanto, que o risco das multíparas não só desapareceu como a multiparidade passou a ser identificada como fator de
proteção contra a asfixia (OR 0,84, IC 0,80 – 0,88, Tabela 13), enquanto o
risco para as mulheres com 1 ou 2 filhos vivos se manteve essencialmente o
mesmo (OR 0,83, IC 0,80 – 0,85, Tabela 13). Nossos achados são concordantes com os de outros estudos controlados de base populacional que demonstraram risco aumentado de asfixia em primíparas e risco reduzido em
multíparas,
incluindo
grandes
multíparas
THORNGREN-JERNECK; HERBST, 2001).
(GILBERT
et
al.,
1999;
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
98
Além da primiparidade, o prolongamento do segundo período do
parto também tem sido imputado como fator associado a baixos escores de
Apgar (NATHOO et al., 1990). É sabido que as primíparas apresentam duração total do parto e duração do período expulsivo maior que as mulheres
que já tiveram filhos também podendo padecer de distocias que se mostram
menos freqüentes em quem já pariu pela via vaginal. Os partos das multíparas, por outro lado, podem cursar com alterações da dinâmica uterina,
além do fato destas mulheres, pelo geral, serem mais idosas e poderem apresentar intercorrências clínicas ou obstétricas relacionadas com a idade
mais avançada (REZENDE; REZENDE FILHO, 1998).
Tanto a primiparidade quanto a história de mais de 2 filhos anteriores vêm sendo associadas ao baixo peso do recém-nascido (COSTA; GOTLIEB, 1998; NASCIMENTO; GOTLIEB, 2001). A multiparidade também
pode estar associada à pior qualidade da assistência pré-natal. Em análise
multivariada de 702 gestações em Caxias do Sul, RS, Trevisan et al. (2002)
observaram que quanto maior o número de filhos, mais tardiamente iniciou-se o pré-natal e menor foi o número de consultas.
A inversão do risco observada na análise multivariada em relação
às multíparas demonstra que não é a multiparidade, em si, o fator responsável pela maior freqüência de asfixia perinatal. Provavelmente os fatores
associados à multiparidade, tais como idade avançada, pior assistência prénatal e baixo peso ao nascer, são os principais responsáveis pela maior freqüência de resultados desfavoráveis. Quando controlados, fazem com que a
multiparidade se evidencie como fator de proteção contra a asfixia.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
99
O antecedente de uma perda fetal ou neonatal pode configurar
um evento isolado ou associado a alguma complicação orgânica, mas a gestação seguinte envolve, certamente, aspectos emocionais que podem elevar
o risco gestacional. Quando ocorrem duas ou mais perdas gestacionais, a
chance de estar havendo associação com algum distúrbio clínico ou obstétrico é maior. Em sua etiologia destacam-se, entre outras, diabete mal controlado, isoimunização pelo fator Rh, hipertensão arterial crônica, préeclâmpsia, cardiopatias, nefropatias e doenças infecciosas (BRUNO, 2000).
Além disso, as gestantes sem assistência pré-natal ou com assistência inadequada exibem maior probabilidade de natimortalidade (TREVISAN et al.,
2002).
No nosso trabalho, tanto a análise bivariada quanto a multivariada exibiram maior risco de asfixia perinatal para os conceptos de mães
com história de natimortos anteriores (RR 1,18, IC 1,15 – 1,21 e OR 1,13,
IC 1,09 – 1,18 respectivamente, Tabelas 11 e 13). Estas crianças possivelmente estão expostas a fatores clínicos e obstétricos desfavoráveis, o que
explica a maior freqüência de asfixia, apesar da proteção relativa conferida
pela paridade materna.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
100
As desigualdades de saúde no Brasil: índice de desenvolvimento humano por estados, região de nascimento,
escolaridade, cor, local de nascimento, número de consultas pré-natais, estado marital.
A questão das relações entre as desigualdades sociais e econômicas e as condições de saúde das populações tem sido objeto de estudos recentes. A avaliação das desigualdades evidencia que os fatores sociais
constituem elementos centrais na determinação dos padrões de morbidade
e de mortalidade das sociedades (D´ORSI; CARVALHO, 1998; NUNES et al.,
2001; SZWARCWALD et al., 2002).
O objetivo da comparação entre o índice municipal de desenvolvimento humano (IDH-M) e a prevalência do grau de Apgar inferior a 7 nas
unidades da federação, foi demonstrar que o comprometimento das condições de vida da população se reflete na prevalência de desfecho gestacional
desfavorável. Este tipo de abordagem permite analisar não apenas a posição
relativa de cada unidade da federação, mas também o grau de ajustamento
entre a situação de saúde e as condições de vida existentes em cada uma
delas (NUNES et al., 2001).
A regressão linear é considerada como a melhor forma de avaliação das desigualdades em saúde quando as duas variáveis (nível de saúde e
nível socioeconômico) podem ser expressas quantitativamente e estejam
sujeitas a modificações de acordo com modelo matemático que explique adequadamente a relação entre as duas variáveis (SZWARCWALD et al.,
2002).
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
101
No Brasil, o IDH-M (Anexo C) é menor nos estados das regiões
nordeste e norte e maior nos estados das regiões sudeste, centro-oeste e
sul. Dos 10 piores resultados do IDH-M, 9 são estados da região nordeste e
um da região norte. Apenas 5 estados podem ser considerados como tendo
alto desenvolvimento humano (Distrito Federal, São Paulo, Rio Grande do
Sul, Santa Catarina e Rio de Janeiro, nesta ordem). Os outros 22 estados
apresentam médio desenvolvimento humano. Os estados da Paraíba, Piauí,
Maranhão e Alagoas apresentam os piores resultados (PNUD, 2002a, anexo
C).
A regressão linear apresentada na Figura 6 correlaciona o IDH-M
com a prevalência do grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto. Observamos
relação inversamente proporcional: quanto melhor o IDH-M menor a prevalência do desfecho desfavorável, uma vez que quanto piores as condições de
vida da população pior deverá ser a qualidade da assistência e da saúde. Há
nítida correlação entre maior freqüência de recém-nascidos asfíxicos e menores níveis do IDH-M. Conforme já mencionado, o quadrado da correlação
(R²) de 0,4266 equivale a dizer que 43% da variação observada no desfecho
desfavorável é atribuível às variações entre as predições baseadas no valor
do IDH-M.
Foram detectados, no entanto, dois estados com prevalências observadas do desfecho desfavorável significativamente diferentes das prevalências esperadas. Estas discrepâncias foram encontradas nos estados de
Alagoas (prevalência do desfecho desfavorável significativamente menor que
a esperada) e do Piauí (prevalência do desfecho desfavorável significativamente maior que a esperada). Estas situações sugerem a existência de erro
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
102
na coleta ou no registro das informações, ou podem refletir a realidade assistencial destes estados. Neste ponto, a análise deve transcender ao cálculo
estatístico e incorporar dados da natureza política e sócio-demográfica que,
juntamente com o fato destes estados apresentarem um número significativamente alto de perda de registros do índice de Apgar no 5º minuto (Alagoas
34,2%, Piauí 31,8% - Figura 4), nos faz acreditar que estes resultados sejam, em maior parte, secundários a erros de preenchimento (NUNES et al.,
2001).
Assumindo a possibilidade de ter havido erro no registro das informações, montamos novo modelo de regressão linear com a exclusão destes dois estados. Neste caso, observamos R² maior (0,6582, p<0,001, Figura
7) em relação ao encontrado no modelo sem as exclusões. O modelo matemático que melhor enfatiza esta relação é o que utiliza o inverso da prevalência do grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto (1/prevalência do grau de
Apgar inferior a 7 no 5° minuto – Figura 8), com a exclusão dos dois estados
que mostraram a prevalência do desfecho desfavorável discrepante. Neste
modelo encontrou-se R² de 0,7437 (p<0,001), indicando que 74% da variação observada no inverso do grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto é atribuível à variação entre as predições baseadas nos valores do IDH-M. A
correlação entre as variáveis é alta e a maioria dos pontos se aproxima da
reta de regressão, mostrando que há relação diretamente proporcional entre
elas. Os estados com piores resultados do IDH-M também apresentam as
menores taxas do inverso do grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto.
Tanto a análise bivariada quanto a análise multivariada mostram
diferenças nas taxas de asfixia perinatal nas diferentes regiões do país. As
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
103
regiões foram comparadas com a região sudeste como categoria de referência, por ter havido nesta região o maior número de nascimentos em 1999. A
região com o pior resultado (nordeste, OR 1,67, IC 1,61-1,73, Tabela 13)
apresentou freqüência de asfixia perinatal de 3,2% (Tabela 12 e Figura 24),
valor mais de 2 vezes superior à região de melhor resultado (sul, OR 0,90,
IC 0,86-0,94 – Tabela 13 – prevalência 1,5% - Tabela 12 e Figura 24). A região norte vem em segundo lugar em relação aos resultados desfavoráveis
(prevalência de 3,0% - Tabela 12 e Figura 24 – OR 1,47, IC 1,39-1,56 – Tabela 13). A região centro-oeste se compara à região sudeste (prevalência do
resultado desfavorável de 1,7%, Tabela 12 e Figura 24), ambas com resultados melhores que a média do Brasil (2,1%, Figura 5).
Estes resultados estão de acordo com a noção de que a ocorrência de recém-nascidos deprimidos está relacionada com a qualidade da assistência prestada e as condições gerais de saúde da gestante e do feto. A
prevalência do desfecho desfavorável mostra nítida relação com o nível socioeconômico, condições de saúde e características culturais da população
avaliados pelo IDH-M. Mostra também relação com as regiões geográficas do
país, o que parece representar reflexo das condições de vida em cada região.
Estas diferenças tornam-se ainda mais evidentes quando comparamos a prevalência do grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto do Brasil12
com países desenvolvidos. Moster et al. (2001), na Noruega13, estudaram
12
O Brasil está classificado em 73° lugar em comparação com os outros
países através do IDH aferido em 2000 (0,757 - PNUD, 2002b).
13
A Noruega ocupa o 1° lugar mundial na classificação pelo IDH (0,942
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
104
todos os 233.165 nascimentos de fetos pesando 2500g ou mais entre 1983
e 1987. Encontraram prevalência de recém-nascidos com grau de Apgar
inferior a 7 no 5° minuto de 0,7%. A prevalência do desfecho desfavorável
nessa faixa de peso encontrado no nosso grupo de estudo é de 1,5%, 2,1
vezes superior à observada na Noruega. Em outro estudo de base populacional realizado na Suécia14 com todos os 1.028.705 nascimentos de crianças com peso igual ou superior a 2500g entre 1988 e 1997, a prevalência de
recém-nascidos asfíxicos, definidos como grau de Apgar inferior a 7 no 5°
minuto, foi de 0,76% (THORNGREN-JERNECK; HERBST, 2001).
A escolaridade é um indicador das condições sociais, econômicas
e culturais e é utilizada com freqüência em estudos epidemiológicos. Está
relacionada a comportamentos importantes para a saúde e é um dado que
pode ser obtido com facilidade. O acesso e o correto entendimento das ações
preventivas, tais como a assistência pré-natal, aleitamento materno e programas de imunizações, são, em geral, profundamente influenciados pelos
anos de estudo (SILVA et al., 1997).
A proporção da população com menos de quatro anos de estudo é
alta em todos os estados do Brasil. As maiores proporções estão no nordeste
e no norte, e as menores nos estados do sul e sudeste. No nordeste, a baixa
escolaridade é 53,3% maior que no país como um todo. Praticamente 1/3
da população brasileira ainda permanece com menos de 4 anos de estudo,
- PNUD, 2002b).
14
A Suécia ocupa o 2° lugar na classificação pelo IDH (0,941).
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
105
embora quando se compara com o início da década de 90, esta proporção
mostra 16,1% de redução (NUNES et al., 2001).
A escolaridade está fortemente associada à renda familiar e à
presença de marido ou companheiro (TOMASI et al., 1996). Parece haver,
também, relação significativa entre a baixa escolaridade e outros indicadores de saúde, como, por exemplo, a presença de enteroparasitoses nas gestantes (SOUZA et al., 2002). Analisando o perfil de nascimentos por bairros
no município do Rio de Janeiro, utilizando-se dos dados do SINASC, d’Orsi
e Carvalho (1998) observaram que as proporções de nascidos vivos com índice de Apgar alto, de operações cesarianas, de mães com escolaridade acima do segundo grau e de mães adolescentes apresentam padrão de
distribuição espacial bem definida pelos bairros da cidade, havendo coincidência de baixos valores de Apgar com os indicadores de pobreza. Estes
autores concluem que o índice de Apgar baixo reflete assistência menos adequada ao parto associada à baixa escolaridade e ao baixo padrão socioeconômico.
Neste contexto, nossos resultados, que demonstram maior proporção de asfixia perinatal entre crianças cujas mães não tiveram instrução
alguma em comparação com as que estudaram mais de 7 anos (RR 2,51, IC
2,44-2,59, Tabela 11), são plenamente justificáveis. Este risco mostrou-se
menos intenso nas que estudaram entre 1 e 7 anos (RR 1,57, IC 1,54-1,60,
Tabela 11). Também é compreensível a atenuação dos valores dos riscos
quando observamos a análise multivariada (OR 1,54, IC 1,44-1,64 para
mães sem instrução e OR 1,25, IC 1,21-1,29 para mães com 1 a 7 anos de
estudo, Tabela 13), já que esta análise tem o controle de outras variáveis
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
106
que podem estar associadas a padrões socioeconômicos desfavoráveis como,
por exemplo, a prematuridade e o peso ao nascer, a cor, a região de nascimento e o número de consultas pré-natais.
Uma das variáveis menos utilizadas nos estudos sobre diferenciais em saúde no Brasil é a raça ou a etnia. Esta variável, entretanto, aparenta ter alta relevância em um país como o nosso, onde vemos nítidas
diferenças nas condições de vida relacionadas à origem étnica (CUNHA,
2001).
A avaliação de indicadores socioeconômicos e de saúde distribuídos por raça ou cor no Brasil é outra forma de se dimensionar as desigualdades. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio de 2001 (PNAD,
IBGE, 2002) demonstra que a sociedade brasileira é multirracial e que os
afrodescendentes (pessoas pretas e pardas) constituem quase a metade da
população do Brasil (Figura 25). A sociedade brasileira, no entanto, não parece estar oferecendo condições de vida e de bem estar equilibradas aos diversos grupos étnicos que a compõem. Há grande diferença entre as
condições econômicas e sociais vividas pelos grupos de brancos e afrodescendentes, que se expressam em diferentes indicadores observados na
PNAD (Tabela 14).
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
Flavio Monteiro de Souza
107
Outras
0,6%
Afrodescendentes
46,0%
Branca
53,4%
Figura 25 - Distribuição da população residente por cor ou raça – Brasil, 2001.
(Fonte: PNAD, IBGE, 2002)
Tabela 14 – Distribuição de alguns indicadores sociais, econômicos e culturais por raça
ou cor – Brasil, 2001.
Indicadores
Afrodescendentes
Brancos
Desemprego (em percentagem da população economicamente ativa)
10,7%
8,3%
Renda familiar per capita mensal em reais de
janeiro de 2002
205,00
482,00
Proporção de pobres e indigentes
68,6%
30,8%
Trabalho infantil: crianças de 5 a 9 anos que
trabalham
3,3%
1,8%
Taxa de analfabetismo
15 anos ou mais
de
18,2%
7,7%
Percentagem da população de 25 anos ou
mais com curso superior completo
2,5%
10,2%
Percentagem de pessoas vivendo
domicílios com esgoto inadequado
em
48,4%
26,3%
Percentagem de pessoas vivendo
domicílios que têm microcomputador
em
5,0%
18,6%
em
pessoas
(Fonte: PNAD, IBGE, 2002)
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
108
Cunha (2001), associando dados das DN com dados das declarações de óbitos em São Paulo, analisou casuística expressiva de 41.621 óbitos em crianças com menos de 1 ano de idade ocorridos em 1997 e 1998.
Os afrodescendentes apresentavam maior proporção de partos vaginais,
mães sem instrução ou com baixa instrução, índices de Apgar no 1° minuto
baixos, baixo peso ao nascer, multiparidade, óbitos de crianças sem assistência médica e óbitos infantis por causas evitáveis.
Diferenças nas taxas de mortalidade em relação à etnia também
podem ser encontradas em outros países. Em um estudo com todas as
29.469 mortes fetais ocorridas nos Estados Unidos da América nos anos de
1995 a 1997, utilizando dados de registros de nascimentos e óbitos daquele
país, Vintzileos et al. (2002) encontraram maiores taxas de mortalidade para
os afrodescendentes, independentemente de suas mães terem ou não freqüentado consultas pré-natais. Em outro estudo com a observação de
18.339 mortes neonatais, resultados semelhantes em relação à etnia foram
encontrados (VINTZILEOS et al., 2002).
Quanto ao registro da cor do recém-nascido na DN, em função da
observação do procedimento nos diversos serviços em que trabalhamos,
somos da opinião de que este dado é colhido, na maior parte das vezes, através da observação das características da mãe, e não do recém-nascido.
Entretanto, verificamos que a proporção de referência à cor branca no total
das DN do Brasil em 1999 (55,3%, Apêndice A) é próxima à observada pela
PNAD de 2001 (53,4%, Figura 25).
Em nosso trabalho, a análise bivariada demonstra risco maior de
asfixia perinatal para a raça não branca (RR 1,54, IC 1,52 - 1,57, Tabela
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
109
10). A análise multivariada demonstra risco ainda significativo, porém de
menor magnitude que o encontrado na análise bivariada (OR 1,11, IC 1,08 –
1,15, Tabela 13). Esta diferença no risco observada entre a análise bivariada e a multivariada pode ser explicada pelo controle, na análise multivariada, de outras variáveis que apresentam forte associação com as condições
socioeconômicas. No entanto, mesmo depois de controlados os fatores de
confusão disponíveis, o risco maior para a cor não branca persiste, demonstrando que outros elementos não ponderados podem estar influindo nesses
resultados.
A assistência à mulher no momento do parto no Brasil é, em sua
maior parte, hospitalar, com diferentes percentuais para cada região (Tabela
15). Estas diferenças refletem a diversidade de condições de acesso e organização dos serviços em cada região. Na região norte ocorre a maior parte
dos partos domiciliares, o que demonstra a insuficiência da rede de serviços
de saúde e a dificuldade de acesso que, em grande parte das vezes, é feito
através da via fluvial (ÁREA TÉCNICA DA SAÚDE DA MULHER DO MS,
2001).
Tabela 15 – Distribuição dos partos hospitalares pelas
diferentes regiões do Brasil em 1996
Região
Norte
Nordeste
Sudeste
Centro-oeste
Sul
Parto hospitalar (%)
81,9
83,4
95,1
97,1
97,1
(Fonte: ÁREA TÉCNICA DA SAÚDE DA MULHER DO MS, 2001)
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
110
No que diz respeito ao local de ocorrência, verificamos que 1,2%
dos partos são domiciliares. Entretanto, é provável que parte significativa
dos partos domiciliares ocorridos no Brasil não seja notificada. Observamos
também que 1,9% dos partos ocorreram em estabelecimentos de saúde não
hospitalares (Apêndice C). Após aplicarmos os critérios de exclusão, o número de partos em estabelecimentos de saúde não hospitalares disponíveis
para análise decresceu de 60.319 para 42.942 e o número de partos domiciliares de 6.969 para 3.633 (Apêndice C e Tabela 9). A maior parte dessa redução se deu pelo não preenchimento do grau de Apgar, provavelmente por
não ter sido aferido. Os casos remanescentes para estudo tiveram a variável
de desfecho anotada.
O risco de asfixia para o recém-nascido é superior para os nascimentos fora do ambiente hospitalar, seja em estabelecimento de saúde,
seja no domicílio da mãe (OR 1,34, IC 1,03 – 1,75 e OR 1,71, IC 1,54 – 1,89
respectivamente, Tabela 13), com maior risco para os partos domiciliares.
Esta diferença provavelmente ocorre devido a dois fatores: ausência de instalações adequadas para o acompanhamento da parturiente e do recémnascido assim como a assistência por pessoal menos qualificado tecnicamente.
Analisando os partos não institucionais ocorridos entre 1984 e
1986 em Linares, Chile, Skarmeta et al. (1987) observaram que as causas
para os partos domiciliares foram a ocorrência de “parto iminente”, o “desinteresse materno” pelo parto hospitalar e a dificuldade de acesso ao hospital. Em estudo qualitativo com 105 mulheres de vários estratos
socioeconômicos que decidiram ter seus filhos em casa em Bogotá, Colôm-
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
111
bia, Villegas (2001) observou que entre os fatores condicionantes do parto
domiciliar se destacam a segurança psicológica e o bem estar que proporciona sua residência, o medo e a desconfiança em relação aos médicos e aos
hospitais, as deficiências dos serviços de atenção ao parto e a falta de acesso ao serviço de saúde. Esta autora identificou 4 tendências nos discursos
das mulheres entrevistadas: resistência ao modelo médico ocidental, reivindicação de seus direitos sexuais e reprodutivos, ineqüidade no acesso aos
serviços de saúde e busca de segurança e bem-estar no parto.
Os resultados gestacionais dos partos domiciliares são controversos. Comparando 6.133 partos domiciliares planejados com 10.593 partos
hospitalares no estado de Washington, nos Estados Unidos da América,
entre 1989 e 1996, Pang et al. (2002) encontraram, no primeiro grupo, maior risco de morte neonatal (RR 1,99, IC 1,06 – 3,73) e de grau de Apgar inferior a 4 no 5° minuto de vida (RR 2,31, IC 1,29 – 4,16). Metanálise de 6
estudos observacionais sobre partos domiciliares planejados com suporte de
hospitais de referência bem equipados (OLSEN, 1997) constatou menor freqüência de índice de Apgar baixo (OR 0,55, IC 0,41 – 0,74) e lacerações perineais severas (OR 0,67, IC 0,54 – 0,83) nos partos domiciliares, além de
menos intervenções médicas. A mortalidade perinatal não diferiu nos dois
grupos. Este autor observa, no entanto, que algumas diferenças podem ser
conseqüentes à tendenciosidade: o grupo de mulheres que tiveram seus
partos domiciliares não apresenta complicações durante a gravidez ou trabalho de parto que indiquem internação hospitalar.
Nossos achados de maior risco para o recém-nascido diferem dos
de Olsen (1997) provavelmente porque a maior parte dos partos domiciliares
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
112
no Brasil não ocorre com planejamento prévio e dentro de condições de segurança ideais. A maioria dessas mulheres vive em área rural ou de difícil
acesso, com assistência precária (ÁREA TÉCNICA DA SAÚDE DA MULHER
DO MS, 2001). Em estudo de revisão sobre a segurança do parto não hospitalar em nações industrializadas, Scotland e Declercq (2002) concluem que,
em geral, os partos fora do ambiente hospitalar demonstram mortalidade
perinatal comparável com os partos hospitalares de gestantes de baixo risco, e implicam em menos intervenções obstétricas. Observam, no entanto,
que há evidências de resultados piores quando o treinamento técnico de
quem está prestando assistência é inadequado e quando a triagem das candidatas ao parto domiciliar é inapropriada.
A importância da assistência pré-natal está em melhorar o resultado perinatal e reduzir as taxas de morbidade e mortalidade tanto maternas quanto perinatais. Se a gestante não for adequadamente acompanhada,
principalmente quando existe a superposição de processos mórbidos, há o
aumento do risco para ambos (VINTZILEOS et al., 2002).
O Programa de Humanização do Pré-natal e Nascimento do Ministério da Saúde preconiza, dentre outras medidas, que as gestantes devem freqüentar no mínimo 6 consultas pré-natais. Devem, também,
começar o acompanhamento até a 14ª semana de gestação e ter suas consultas distribuídas no mínimo uma vez no 1° trimestre, duas no 2° trimestre e três no 3° trimestre (ÁREA TÉCNICA DA SAÚDE DA MULHER DO MS,
2000).
Mesmo a observação destas recomendações, no entanto, não garante assistência adequada. Santos et al. (2000), em estudo de coorte reali-
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
113
zado em Pelotas (RS) em 1993, constataram que, apesar da cobertura prénatal abrangente, persistiam desigualdades nos cuidados oferecidos às grávidas. As pacientes de maior risco apresentavam maior proporção de atenção inadequada ou de qualidade intermediária, quando comparadas com as
grávidas consideradas de menor risco obstétrico.
Resultado concordante é relatado por Costa et al. (1996) que estudaram 1.364 crianças em 1993 em Pelotas (RS). Estes autores referem
que, ao estratificarem os indicadores de cuidados pré-natais pelas variáveis
socioeconômicas, quanto pior o nível de renda e maior o escore de fatores
de risco gestacional, mais baixo o desempenho da assistência à saúde.
Conforme já mencionado, Trevisan et al. (2002), em análise multivariada de 702 partos ocorridos no Hospital Geral de Caxias do Sul entre
março de 2000 e março de 2001, observaram que tanto a escolaridade
quanto a paridade materna mostraram-se como fortes determinantes da
adequação do pré-natal. Quanto maior a escolaridade da gestante, mais
precoce foi a busca pela assistência e maior o número de consultas realizadas. Quanto maior a paridade, menor o número de consultas e mais tardio
o início do acompanhamento.
No Brasil, graves problemas existem na assistência pré-natal.
Dentre eles, podemos citar a “alta” recebida no momento mais crítico da
assistência, ao redor do oitavo mês, época em que se agravam doenças como pré-eclâmpsia ou diabete melito. Também é preocupante a falha na detecção destas doenças e de outros fatores de risco gestacional (ÁREA
TÉCNICA DA SAÚDE DA MULHER DO MS, 2001).
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
114
Apesar de não termos como avaliar a qualidade do pré-natal com
os dados disponíveis no SINASC, pudemos analisar a influência do número
de consultas na asfixia perinatal e concluir que a assistência com baixa freqüência de consultas se associa a maior probabilidade do desfecho desfavorável. O risco relativo de asfixia nos casos em que a mãe não teve
assistência pré-natal foi de 2,51 (IC 2,44 – 2,59, Tabela 11) em comparação
com as mães que freqüentaram mais de 6 consultas. Este risco se mostrou
menor na análise multivariada (OR 1,37, IC 1,29 – 1,45, Tabela 13) o que
pode ser explicado pelo controle por outros fatores relacionados às condições de vida da gestante. Entre aquelas que tiveram entre 1 e 6 consultas, o
risco também se mostrou elevado (RR 1,57, IC 1,54 – 1,60 na análise bivariada e OR 1,32, IC 1,28 – 1,37 na análise multivariada, Tabelas 11 e 13).
Pacientes com maior número de consultas apresentam melhor
evolução perinatal. Isto pode ser devido à auto-seleção de pacientes motivadas a melhores cuidados gerais de saúde, já que as gestantes sem assistência pré-natal geralmente provêm de grupos menos favorecidos (JOHNSON et
al., 1999). Nos Estados Unidos, o Centers for Disease Control and Prevention avaliou os motivos de gestantes iniciarem tardiamente ou não receberem assistência pré-natal. As razões para os cuidados inadequados
variavam por grupo social e étnico, idade e método de pagamento da assistência. As alegações mais comuns foram: desconhecimento da gravidez, falta de dinheiro ou de seguro saúde e dificuldade para agendar consultas
(CUNNINGHAM et al., 2001f). É provável que estas causas se repitam no
Brasil, associadas à dificuldade de acesso por ambulatórios lotados ou distantes.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Comentários
115
O estado marital materno só pôde ser avaliado através da análise
bivariada devido ao grande número de registros sem este dado (61,4% depois de aplicados os critérios de exclusão, Tabela 6). Este campo não constava na DN antiga. Observamos que as mães solteiras apresentaram risco
maior de terem filhos asfíxicos (RR 1,20, IC 1,17 – 1,24). A prevalência do
índice de Apgar inferior a 7 no 5° minuto não diferiu nas mulheres que vivem maritalmente (casadas ou com companheiro) e nas que já viveram maritalmente (separadas e viúvas), motivo pelo qual estudamos estes dois
grupos em conjunto. O maior risco de asfixia perinatal nas mulheres sem
menção de companheiro provavelmente está associado às piores condições
culturais e econômicas neste grupo. A renda familiar tem se mostrado fortemente associada com a escolaridade e com a presença de marido ou companheiro (TOMASI et al., 1996).
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Conclusões e ponderações finais
116
Conclusões e
ponderações finais
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Conclusões e ponderações finais
117
Da análise dos nossos resultados pudemos concluir que:
1.
A prevalência de asfixia perinatal no Brasil, avaliada pelo grau de Apgar inferior a 7 no 5° minuto, é
elevada (2,1%).
2.
Existem significativas diferenças regionais em relação à prevalência de asfixia perinatal, sendo melhores resultados os da região sul e piores os das
regiões nordeste e norte.
3.
Os estados com os maiores índices de desenvolvimento humano apresentaram os melhores resultados no que tange à asfixia perinatal.
4.
Os fatores socioeconômicos associados à asfixia perinatal foram: parto domiciliar ou em estabeleci-
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Conclusões e ponderações finais
118
mentos de saúde não hospitalares, baixa escolaridade, pré-natal inadequado, cor não branca e mães
solteiras.
5.
Os fatores biológicos associados à asfixia perinatal
foram: peso do recém-nascido (baixo peso ou macrossomia), anomalias congênitas, idade gestacional
(prematuridade ou gravidez prolongada), sexo masculino, idade materna acima de 35 anos e história
de natimorto em gestação anterior.
6.
O parto transpélvico e a história de mais de dois filhos vivos são condições de risco apenas pelos fatores associados que, quando controlados, fazem com
que estas condições figurem como protetoras da asfixia perinatal.
7.
A gravidez na adolescência e a prenhez gemelar são
fatores de risco de asfixia perinatal em função dos
fatores associados, em especial a prematuridade no
caso da prenhez múltipla e as condições socioeconômicas no caso da gravidez na adolescência.
*****
Os fatores envolvidos na asfixia perinatal são complexos e múltiplos. Há uma intensa interação, modelando e modificando as respostas de
cada um. Este trabalho exibiu uma intrincada associação das condições
sociais, econômicas e educacionais, com as características da gravidez, do
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Conclusões e ponderações finais
119
parto e do recém-nascido. O desfecho gestacional favorável parece depender
de uma corrente de elementos onde todos os elos devem ser fortes e íntegros.
Os recém-nascidos com menores chances de sofrer asfixia perinatal no Brasil devem ser maduros, com peso adequado, sem anomalias
congênitas, do sexo feminino, nascidos em hospital, de parto vaginal, com
mães de boa condição social, econômica e cultural, que freqüentaram mais
de seis consultas pré-natais, e que já tenham tido pelo menos mais um filho
vivo anteriormente. Há também indícios de que a adequada assistência obstétrica e os maiores cuidados da gestante com ela mesma contribuam para
minimizar o risco de asfixia.
Em nosso entendimento, o sucesso no processo reprodutivo se
equilibra sobre um suporte tridimensional formado pela dimensão social
(condição social, econômica, educacional e cultural da gestante), pela dimensão do sistema de saúde (prevenção, assistência, ações de saúde) e pela
dimensão biológica (características pessoais, hereditárias, enfermidades
etc.). As condições individuais associadas às condições de assistência à saúde e ao parto são moduladas pela dimensão social.
As desigualdades no âmbito da saúde devem ser enfrentadas não
apenas através do compromisso com a transformação político-social e a
maior eqüidade econômica. É necessária também a definição de estratégias
de redução das desigualdades através de medidas preventivas, educativas e
de melhora do sistema de saúde.
Além da dimensão social, de correção difícil e lenta, a qualidade
da assistência é um dos elos fracos nessa corrente. É necessário facilitar o
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Conclusões e ponderações finais
120
acesso da gestante a cuidados de boa qualidade, tanto no acompanhamento
dos processos fisiológicos quanto na prevenção e tratamento das doenças. A
boa qualidade assistencial não se faz apenas com melhores condições materiais das unidades de saúde, mas, principalmente, com melhores profissionais. É essencial que haja forte investimento na formação, capacitação,
atualização e disponibilização de profissionais qualificados na área da saúde perinatal.
Por outro lado, não basta melhorar as condições assistenciais e
profissionais se o indivíduo que as recebe não for capaz de compreender as
informações, não estiver motivado a cuidar de sua saúde ou não possuir
meios para custear os gastos necessários, a começar pela própria alimentação e higiene. O melhor mecanismo para alterar este cenário é a educação.
Elevando-se o nível educacional e cultural, criam-se os meios para que o
indivíduo melhore suas condições de subsistência e passe a entender melhor a si próprio e o mundo em sua volta.
Também não basta melhorar a condição educacional e assistencial se o profissional não for capaz de detectar os fatores de risco, diagnosticar os possíveis desvios do fisiológico, encaminhar, quando necessário, os
casos para atendimento especializado e, principalmente, compreender a
pessoa com quem interage. Compreender a cultura e o indivíduo, a linguagem e os sinais. É necessária a percepção mútua: a gestante deve entender
e poder seguir as recomendações sobre sua saúde, os profissionais devem
compreender a gestante. Deve ser estabelecida uma relação segura e humanizada.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Conclusões e ponderações finais
121
Com melhores condições materiais e de assistência, melhor capacitação profissional, maior eqüidade econômica e de saúde e maior nível
educacional, podemos vislumbrar uma real melhora nas condições de nascimento no nosso país.
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Referências bibliográficas
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Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Apêndices
139
Apêndices
Asfixia perinatal no Brasil – Apêndices
Flavio Monteiro de Souza
Apêndice A
Características da população: distribuição dos nascidos vivos
segundo as variáveis referentes aos recém-nascidos, antes de
aplicados os critérios de exclusão.
Número de
registros
preenchidos
Variável
Grau de Apgar no 5° minuto
<7
≥7
Grau de Apgar no 1° minuto
<7
≥7
Idade gestacional
22 a 27 semanas
28 a 36 semanas
37 a 41 semanas
≥42
Ignorada
Peso ao nascimento
0-999g
1000-1499
1500-1999
2000-2499
2500-3999g
≥4000g
Ignorado
Cor
Branca
Não branca
Sexo
Masculino
Feminino
Ignorado
Anomalias congênitas
Sim
Não
2.842.810
76.230
2.766.580
2.869.777
270.236
2.599.541
3.228.725
13.076
181.552
2.688.850
287.584
57.663
3.204.997
9.744
19.537
44.646
171.541
2.770.667
188.832
30
2.336.181
1.292.989
1.043.192
3.256.433
1.668.602
1.581.076
6.755
3.256.433
5.677
3.250.756
%
2,7
97,3
9,4
90,6
0,4
5,6
83,3
8,9
1,8
7,7
0,6
1,4
5,4
86,4
5,9
0,0
55,3
44,7
51,2
48,6
0,2
0,2
99,8
140
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Apêndices
Apêndice B
Características da população: distribuição dos nascidos vivos
segundo as variáveis referentes às mães, antes de aplicados
os critérios de exclusão.
Variável
Idade materna
10 a 19
20 a 34
35 e mais
Número de anos de estudo
Nenhum
1 a 7 anos
8 e mais
Ignorados
Número de consultas pré-natais
Nenhuma
1a6
7 ou mais
Ignoradas
Estado marital
Solteira
Já viveu maritalmente
Vive maritalmente
Ignorado
Quantidade de filhos vivos tidos
anteriormente
Nenhum
1
2
Superior a 2
Filhos mortos tidos anteriormente
Nenhum
1 ou mais
Número de
registros
preenchidos
3.210.368
754.160
2.188.254
267.954
2.301.997
130.642
1.349.561
690.457
131.337
3.172.417
173.180
1.295.996
1.510.040
193.201
1.572.451
427.279
14.248
751.378
379.546
2.855.159
931.975
917.442
558.290
447.452
2.465.305
2.126.374
338.931
%
23,5
68,2
8,3
5,7
58,6
30,0
5,7
5,5
40,9
47,6
6,1
27,2
0,9
47,8
24,1
32,6
32,1
19,6
15,7
86,3
13,7
141
Asfixia perinatal no Brasil – Apêndices
Flavio Monteiro de Souza
Apêndice C
Características da população: distribuição dos nascidos vivos
segundo as variáveis referentes à gravidez e ao parto, antes
de aplicados os critérios de exclusão.
Número de
registros
preenchidos
Variável
Gravidez única ou gemelar
Única
Gemelar
Ignorado
Via do parto
Vaginal
Cesáreo
Ignorado
Local de nascimento
Hospital
Outros estabelecimentos de saúde
Domicílio
Ignorado
Região
Norte
Nordeste
Sudeste
Sul
Centro-oeste
3.245.729
3.178.085
58.510
9.134
3.244.940
2.026.461
1.201.500
16.979
3.256.338
3.149.412
60.319
39.638
6.969
3.256.433
285.229
915.528
1.351.192
470.326
234.158
%
97,9
1,8
0,3
62,4
37,0
0,5
96,7
1,9
1,2
0,2
8,8
28,1
41,5
14,4
7,2
142
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Anexos
143
Anexos
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Anexos
Anexo A
Declaração de nascido vivo antiga – em vigor de 1995 a 1999
5
144
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Anexos
Anexo B
Declaração de nascido vivo nova – em vigor a partir de 1999
145
Asfixia perinatal no Brasil – Anexos
Flavio Monteiro de Souza
146
Anexo C
Índice municipal de desenvolvimento humano (IDH-M) divulgado
pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD –
em 2002. Tabulação por estados do Brasil no ano de 2000.
A primeira tabela exprime o IDH-M total. As tabelas 2, 3 e 4 mostram a variação dos itens que participam do cálculo do IDH-M (educação,
renda e expectativa de vida).
Fonte: Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento –
PNUD,
2002.
Disponível
em
<http://www.undp.org.br/IDHM-
BR%20Atlas%20Webpage/Textos_IDH/var_idh_ufs.xls>. Último acesso em
02/01/2003.
Tabela 1 – Índice Municipal De Desenvolvimento Humano (IDH-M)
Distância p/ o
Ranking
2000 Distância p/ o melhor
pior
Distrito Federal
0,844
0,000
0,212
São Paulo
0,814
-0,030
0,182
Rio Grande do Sul
0,809
-0,035
0,177
Santa Catarina
0,806
-0,039
0,173
Rio de Janeiro
0,802
-0,042
0,170
Paraná
0,786
-0,058
0,153
Goiás
0,770
-0,075
0,137
Mato Grosso do Sul
0,769
-0,076
0,136
Mato Grosso
0,767
-0,077
0,134
Espírito Santo
0,767
-0,078
0,134
Minas Gerais
0,766
-0,079
0,133
Amapá
0,751
-0,093
0,119
Roraima
0,749
-0,096
0,116
Rondonia
0,729
-0,115
0,096
Tocantins
0,721
-0,124
0,088
Pará
0,720
-0,124
0,088
Amazonas
0,717
-0,127
0,084
Rio Grande do Norte
0,702
-0,143
0,069
Ceará
0,699
-0,146
0,066
Bahia
0,693
-0,151
0,061
Acre
0,692
-0,152
0,060
Pernambuco
0,692
-0,153
0,059
Sergipe
0,687
-0,157
0,055
Paraíba
0,678
-0,167
0,045
Piauí
0,673
-0,171
0,041
Maranhão
0,647
-0,198
0,014
Alagoas
0,633
-0,212
0,000
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Anexos
Tabela 2 – IDHM-Educação (Acesso ao conhecimento)
Ranking
Distrito Federal
Santa Catarina
Rio Grande do Sul
Rio de Janeiro
São Paulo
Amapá
Paraná
Goiás
Roraima
Mato Grosso do Sul
Mato Grosso
Espírito Santo
Minas Gerais
Rondonia
Tocantins
Pará
Amazonas
Bahia
Rio Grande do Norte
Ceará
Sergipe
Pernambuco
Acre
Maranhão
Paraíba
Piauí
Alagoas
Distância p/ o
2000 Distância p/ o melhor
pior
0,000
0,232
0,935
0,906
-0,030
0,202
0,904
-0,031
0,201
0,902
-0,034
0,198
0,901
-0,034
0,198
0,881
-0,055
0,177
0,879
-0,056
0,176
0,866
-0,069
0,163
0,865
-0,071
0,161
0,864
-0,071
0,161
0,860
-0,075
0,157
0,855
-0,081
0,151
0,850
-0,085
0,147
0,832
-0,103
0,129
0,827
-0,109
0,123
0,815
-0,121
0,111
0,813
-0,122
0,110
0,785
-0,151
0,081
0,779
-0,156
0,076
0,772
-0,163
0,069
0,771
-0,165
0,067
0,768
-0,167
0,065
0,757
-0,178
0,054
0,738
-0,197
0,035
0,737
-0,199
0,033
0,730
-0,205
0,027
0,703
-0,232
0,000
147
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Anexos
148
Tabela 3 – IDHM-Renda (Acesso a recursos monetários)
Ranking
Distrito Federal
São Paulo
Rio de Janeiro
Rio Grande do Sul
Santa Catarina
Paraná
Mato Grosso
Espírito Santo
Mato Grosso do Sul
Goiás
Minas Gerais
Rondonia
Roraima
Amapá
Pernambuco
Acre
Rio Grande do Norte
Amazonas
Tocantins
Pará
Sergipe
Bahia
Ceará
Paraíba
Alagoas
Piauí
Maranhão
Distância p/ o
2000 Distância p/ o melhor
pior
0,000
0,284
0,842
0,790
-0,052
0,232
0,779
-0,063
0,221
0,755
-0,087
0,197
0,750
-0,092
0,192
0,736
-0,106
0,178
0,719
-0,123
0,161
0,719
-0,123
0,161
0,718
-0,124
0,160
0,718
-0,124
0,160
0,711
-0,131
0,154
0,683
-0,159
0,125
0,682
-0,160
0,124
0,666
-0,176
0,108
0,643
-0,199
0,085
0,640
-0,202
0,083
0,636
-0,206
0,078
0,634
-0,208
0,076
0,633
-0,209
0,075
0,629
-0,213
0,071
0,623
-0,219
0,066
0,620
-0,222
0,062
0,616
-0,226
0,058
0,610
-0,232
0,052
0,597
-0,245
0,040
0,584
-0,258
0,026
0,558
-0,284
0,000
Flavio Monteiro de Souza
Asfixia perinatal no Brasil – Anexos
Tabela 4 – IDHM-Longevidade (Saúde e sobrevivência)
Ranking
Rio Grande do Sul
Santa Catarina
Distrito Federal
São Paulo
Paraná
Minas Gerais
Rio de Janeiro
Espírito Santo
Goiás
Mato Grosso do Sul
Mato Grosso
Pará
Ceará
Amapá
Piauí
Amazonas
Tocantins
Roraima
Rio Grande do Norte
Paraíba
Acre
Bahia
Rondonia
Sergipe
Pernambuco
Maranhão
Alagoas
Distância p/ o
2000 Distância p/ o melhor
pior
0,000
0,172
0,769
0,762
-0,008
0,164
0,756
-0,013
0,159
0,753
-0,017
0,156
0,743
-0,027
0,146
0,736
-0,033
0,139
0,727
-0,043
0,129
0,726
-0,043
0,129
0,726
-0,044
0,128
0,724
-0,045
0,127
0,722
-0,047
0,125
0,718
-0,051
0,121
0,709
-0,061
0,111
0,707
-0,062
0,110
0,706
-0,064
0,108
0,704
-0,065
0,107
0,703
-0,066
0,106
0,699
-0,070
0,102
0,690
-0,079
0,093
0,687
-0,082
0,090
0,679
-0,090
0,082
0,675
-0,094
0,078
0,672
-0,098
0,074
0,668
-0,101
0,071
0,663
-0,106
0,066
0,644
-0,126
0,047
0,597
-0,172
0,000
149
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Tese Doutorado Flavio Monteiro de Souza