Nutrição enteral precoce ou tardia para recém-nascidos pré-termos com restrição do crescimento intra-uterino:um ensaio randomizado Early or Delayed enteral Feeding for Preterm Growth-Restricted Infants: A Randomized Trial Alison Leaf, Jon Dorling, Stephen Kempley, Kenny McCormick, Paul Mannix, Louise Linsell, Edmund Juszczak, Peter Brocklehurst (Reino Unido) Pediatrics 2012;129:1-9 Internato Pediatria HRAS – 2012 Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS)/SES/DF Apresentação:Lucas Rodrigues, José Antônio B. Filho Coordenação: Paulo R. Margotto Brasília, 28 de abril de 2012 www.paulomargotto.com.br Ddos Rafaela, José Antônio, Lucas e Paula Balduíno ESCS! A restrição do crescimento intra-uterino aumenta o risco de enterocolite necrosante assim, o início da nutrição enteral é frequentemente atrasado. Não há evidência que o atraso no início da nutrição enteral seja benéfico e pode inclusive, comprometer a nutrição e o crescimento O que é conhecido a respeito do tema: prematuros com crescimento intra-uterino restrito apresentam alto risco de enterocolite necrosante (ECN). A ECN Ocorre mais freqüentemente em crianças que receberam NUTRIÇÃO ENTERAL. É comum a prática de atrasar introdução de nutrição enteral nessas crianças. O que este estudo nos informa: A introdução precoce de nutrição enteral resulta em se alcançar mais cedo a nutrição enteral plena. A nutrição enteral precoce não se associa a um maior risco de enterocolite necrosante. O retardo do início da nutrição enteral associa-se a um maior risco de colestase. Métodos Seleção: Recém-nascidos (RN) pré-termos com até 34 semanas de idade gestacional (IG); PIG (<p10); com menos de 48 horas de vida; e com as seguintes alterações no Doppler gestacional indicativos de restrição do crescimento intra-uterino (RCIU): Ausência ou reversão do fluxo diastólico final na artéria umbilical em pelo menos 50% das ondas. Reorganização do fluxo sanguíneo cerebral. Critérios de exclusão: Grande anomalia congênita; iso-imunização Rh; transfusão intra-útero; disfunção múltipla de órgãos; uso de drogas inotrópicas; uso de alimentação enteral antes de entrar no estudo. Intervenção: As crianças foram divididas em dois grupos que receberam uma dieta idêntica, exceto pela idade de início. Precoce: entre 24 e 48 horas de vida. Tardia: entre 120 e 144 horas de vida. Leite materno foi a primeira escolha de leite na dieta, seguida de leite humano de banco e por último fórmula infantil. A fortificação do leite humano foi indicada a partir do momento que se alcançasse o volume de 150mL/Kg/dia. Suporte ventilatório e presença de cateteres umbilicais não foram vistos como contra-indicação para alimentação enteral. Desfechos Desfechos primários: 1- Idade em dias para alcançar a nutrição enteral total de 150mL/kg/dia, por pelo menos 3 dias. 2- Diagnóstico de enterocolite necrosante (estágio 1, 2 ou 3 de Bell modificado) Cada episódio de ECN e outras patologias abdominais foi documentado em um formulário específico registrando dados clínicos, radiológicos, laboratoriais e histopatológicos visando chegar a um diagnóstico final para cada caso. Todos os formulários foram revistos por um comitê cego. Desfechos secundários Óbito antes da alta hospitalar Duração da internação hospitalar; em UTI; alta dependência de cuidados; tempo de alimentação parenteral. Perfuração e cirurgia gastrintestinal Sepse com cultura positiva PCA com necessidade de tratamento Colestase Anormalidade no ultra-som (US) do SNC Tipo de leite na alta Necessidade de O², peso e perímetro cefálico (PC), com idade pós-concepção (IGpc) de 36 semanas e na alta. Randomização As crianças foram randomizadas nos dois grupos por um programa especifico disponível no site da National Perinatal Epidemiology Unit, Clinical Trials Unit. Um algoritmo foi utilizado para garantir equilíbrio em relação aos seguintes quesitos: idade gestacional (acima e abaixo de 29 semanas) e o tipo de anormalidade do US gestacional. Cegamento A intervenção não podia ser desconhecida pelos médicos. No entanto, um comitê cego revisou todos os casos de ECN e outras patologias abdominais. Métodos Estatísticos Os dados foram analisados usando Stata (version 10, Stata Corp, College Station, TX). A regressão de Cox* foi utilizada para comparar a idade em dias em que a alimentação enteral total foi alcançada em cada grupo. Isso permitiu que RN que foram a óbito pudessem ser incluídos no denominador. Curvas de Kaplan-Meier* foram elaboradas, o Hazard Ratio* (HR) e o IC 95% são apresentados ao longo do artigo. *Estatística computacional: Uso do SPSS - o essencial Autor(es): Paulo R. Margotto (página 83) Escores SD(SDS) foram calculados para análise do crescimento. A mudança do SDS do nascimento até 36° semana e na alta hospitalar foram estudados por análise de covariância ajustando peso ao nascer. Uma análise de subgrupo foi planejada usando um teste estatístico de interação, para IG no parto ( < 29 sem e >= 29 sem) e o tipo de anormalidade no Doppler. Resultados Amostra: 404 crianças foram recrutadas entre abril de 2006 e maio de 2009, em 54 hospitais do Reino Unido e Irlanda (Figura 1) As características clínicas foram equilibradas nos dois grupos embora houvesse uma proporção um pouco maior de RN com peso > 1250g no grupo precoce (Tabela 1) Fig. 1. Participantes Tabela 1.Características pré-natais e clínicas dos grupos Observação da introdução de dieta enteral: A dieta começou dentro do tempo esperado em 164/198 (83%) do grupo precoce e em 147/194 (76%) do grupo tardio. Essas porcentagens saltam para 87% e 86% respectivamente, se for estabelecida uma tolerância de + ou – 2 horas. Em 78% do grupo precoce e 94% do grupo tardio a dieta inicial continha pelo menos um pouco de leite materno, que foi complementado com LHB ou fórmula infantil. Receberam exclusivamente leite humano 74% e 91% respectivamente. Desfechos Primários Nutrição enteral plena (NEP) foi alcançada em 190 crianças de cada grupo (95%) NEP foi alcançada antes no grupo precoce, com idade mediana de 18 dias (interquartil range [IQR] 15- 24) A mediana de idade no grupo tardio foi de 21 dias (IQR: 19 – 27) Hazard Ratio: 1,36 [IC95%: 1,11 – 1.67]. P= 0,003 (figura 2). (Isto indica que a chance de se estabelecer NEP, em qualquer momento, foi 36% maior no grupo precoce) FiG.2. Proporção de recém-nascidos com enteral plena estabelecida entre os grupos A análise anterior foi repetida com correção da IG, pois havia um pequeno desequilíbrio nos grupos que poderia explicar a diferença. O HR corrigido foi: 1,45. [IC95%: 1,19 – 1,78] p < 0,001 Episódios de ECN Grupo precoce: 36 = 18%. Grupo tardio: 30 = 15%. Risco relativo(RR): 1,20. [IC95% :0,77 – 1,87] p = 0,42 Quando se analisa a ECN apenas nos estágios 2 e 3 (de maior importância clínica) a incidência foi de 8% nos dois grupos. A incidência de ‘patologias abdominais’ foi maior no grupo precoce (59 = 29%) que no grupo tardio (42 = 21%). RR: 1,40 [IC95%: 1,00 – 1,98]. Não houve diferença entre os grupos em relação ao número de pacientes com íleo séptico, perfuração intestinal, cirurgia, ou morte resultante de complicações gastrointestinais (Tabela 2). Tabela 2-Resultados primários e patologia abdominal Desfechos Secundários (tabela 3) Icterícia colestática foi menos comum no grupo precoce (25/195 = 13%) que no grupo tardio (43/195 = 22%). RR: 0,58 [IC95%: 0,37 – 0,91] A incidência de sepse tardia foi de 28% (55) no grupo precoce e de 35%(69) no grupo tardio. Mas essa diferença não foi estatisticamente significante. RR: 0,80 [IC95%: 0,60 – 1,08) A dieta enteral precoce resultou em menos tempo de dieta parenteral e alta dependência de cuidados. Mas não houve diferença no tempo de internação hospitalar ou em UTI. Os pacientes tinham uma grave restrição do crescimento ao nascimento com SDS de 2,32, no grupo precoce, e de 2,41 no grupo tardio. Na ocasião da alta o SDS de peso era ainda menor que no nascimento em ambos os grupos, devido período de restrição de crescimento pós-natal, mas um maior grau de restrição do crescimento no grupo da nutrição enteral tardia (p=0,04) Tabela 3-Resultados secundários Análise dos Subgrupos 86 (21%) das crianças tinham menos de 29 semanas de idade ao nascimento, e 316 (79%) tinham 29 semanas ou mais de idade. No grupo com <29 sem Precoce: mortalidade foi de 5/44 (11%) e houveram 17 (39%) casos de ECN (8 nos estágios 2 e 3). Idade média de NET: 25 dias Tardio: Mortalidade foi de 6/42 (14%); e houveram 16 (38%) casos de ECN (8 nos estágios 2 e 3). Idade média de NET: 29 dias. A diferença na idade de NET não foi significante. No grupo com > 29 semanas: Precoce: mortalidade foi de 4/157(3%). Incidência de ECN: 19 (12%) casos (9 casos no estágios 2 e 3). Idade média de NET: 17 dias Tardio: mortalidade: 2/159 (1%). Incidência de ECN: 14 (9%) casos (10 nos estágios 2 e 3). Idade média de NET: 21 dias. A diferença na idade média de NET foi estatisticamente significante com HR: 1,54 [IC95% 1,23 – 1,93] O subgrupo de análise baseado no tipo de anormalidade do US gestacional não foi realizado porque menos de 5% dos pacientes tinham relato de redistribuição do fluxo cerebral. Discussão O conhecimento de que RN com RCIU tem risco aumentado para intolerância alimentar e ECN fez com que se tornasse comum a pratica de adiar o início da dieta dessas crianças. Os achados deste estudo sugerem que esta prática não é justificável. Crianças que iniciaram a dieta precocemente estabeleceram NEP em uma idade significantemente menor (diferença média de 3 dias) Não houve diferença na incidência de ECN, principalmente nas suas formas mais graves (estágios 2e 3 de Bell) Embora no grupo de dieta enteral precoce a incidência de dismotilidade intestinal tenha sido significantemente maior, não houve diferença de incidência de cirurgias, óbitos relacionados à doenças do trato gastrintestinal e sepse tardia. Entre os benefícios da dieta enteral precoce estão: menor incidência de icterícia colestática, menor tempo de nutrição parenteral, menor tempo de alta dependência de cuidados. Os RN pré-termos com RCIU e sepse recebendo NPT apresentam alto risco de apresentar icterícia colestática (esta piora absorção de gorduras, comprometendo a nutrição e o crescimento) Durante o estudo as crianças sofreram uma restrição do crescimento pós-natal. Essa restrição foi significantemente menor no grupo de dieta enteral precoce, sugerindo que esta prática tenha impacto positivo no crescimento( 3 dias de diferença em alcançar a NEP pode ter um impacto positivo no crescimento) O leite humano tem-se mostrado protetor contra a ECN. Neste estudo, mais do que 75% dos RN receberam leite humano na dieta inicial. Conclusão Este estudo demonstrou que não há benefício em adiar a introdução de pequenos volumes de dieta enteral em prematuros com RCIU por mais que 2448 horas. A introdução precoce de alimentos permite alcançar a NEP mais precocemente, reduz a incidência de icterícia colestática e melhora o ganho de peso. O desafio agora é compreender a melhor forma de progredir a dieta para garantir um amadurecimento saudável do intestino imaturo, minimizando a inflamação excessiva e nociva. REFERÊNCIAS Consultem também: Nutrição Enteral (II Encontro Neonatal em Fortaleza, 2223/9/2011) Autor(es): Paulo R. Margotto A Nutrição Enteral (NE) é muito mais efetiva que a Nutrição Parenteral (NP) na diminuição efeito proteólise e aumenta a incorporação protéica. Prematuros extremos não alcançam NE plena por um período de semanas sendo proveitoso combinar NP e NE, podendo assim diminuir proteólise e aumentar incorporação protéica Recuperação nutricional dos recém-nascidos da UTI Neonatal do HRAS Autor(es): Nathália Falchano Bardal Foi observado que quanto mais precoce ocorreu a introdução da nutrição enteral, mais rapidamente a nutrição enteral plena foi atingida (p<0,001) Houve menor ocorrência de sepse, persistência do canal arterial e ECN no grupo que atingiu a dieta enteral plena com idade menor ou igual a 10 dias, porém sem significância estatística. Nutrição enteral plena: uma meta precoce ou tardia Autor(es): Cléa Leone (SP). Realizado por Paulo R. Margotto Nutrição Parenteral (NP): a NP nos mostra cada vez mais que ela não é uma solução; é uma alternativa, diria, um acessório, para nos ajudar a chegar aonde deveremos chegar. Em primeiro lugar, o que é Nutrição Enteral (NE)Plena? Consultando a literatura, há diferenças conceitos: desde volume maior ou igual a 110ml/kg/dia, volumes de 115-120ml/kg/dia e 140ml/kg/dia, (mais citado). Os últimos estudos têm usado o conceito 150ml/kg/dia. Olhando o nosso dia a dia, dificilmente vamos chegar precocemente a este volume (no máximo chegamos a 115-120ml/kg/dia). Esta é a recomendação de NE Plena segundo um painel de 35 peritos em NE (35 neonatologistas que se dedicam a pesquisar sobre nutrição) reunidos em um Simpósio e definiram NE plena como sendo uma oferta de 150ml/kg/dia, com uma oferta energética concomitante de 120kcalkg/dia (110-175kcal/dia), com uma relação protéica/calórica de 2,5 a 3,6g/100 kcal. Consultem também: Regulação da proteólise e ótimo acréscimo de proteína nos recém-nascidos extremamente prematuros Autor(es): Scott C Denne. Apresentação: Daniela Vilela A grande característica metabólica do pré-termo extremo é a intensa proteólise (catabolismo intenso); o dobro comparado em adultos saudáveis Quando se atinge a nutrição parenteral (NP) plena 17% dos RN termo conseguem suprimir a proteólise, mas nos prematuros praticamente não se tem resposta. Colestase associada a nutrição parenteral (CANP) em recémnascidos pequenos para a idade gestacional Autor(es): Daniel T. Robinson and Richard A. Ehrenkranz. Apresentação:Cynthia Bettini L. de C. Monteiro, Clarice de Menezes, Alberto Guerra Dias, Paulo R. Margotto Nutrição parenteral (NP) é um dos principais fatores para desenvolvimento de colestase em bebês prematuros. O RN pré-termo PIG é fator de risco de independente para a colestase associada a nutrição parenteral Cateteres arteriais umbilicais não afetam as respostas do fluxo sanguíneo intestinal a dieta enteral mínima Autor(es): T Havranek et al. Apresentação: Danilo Figueiredo de Freitas, Ulisses Mariano Nascimento, Paulo R. Margotto A presença do cateter arterial umbilical não afeta a resposta da velocidade do fluxo sanguíneo da artéria mesentérica superior pós-prandial à alimentação enteral mínima As preocupações a respeito do fluxo sanguíneo da artéria mesentérica não deve limitar o uso de dieta enteral mínima em RN de muito baixo peso com cateter arterial umbilical Alimentacão em RN prematuro em uso de cateter umbilical arterial baixo Autor(es): Andrew M Davey e cl O objetivo deste estudo foi mostrar que não há diferença na freqüência de problemas alimentares e Enterocolite Necrosante entre um grupo de RN prematuro que recebeu alimentação enteral precocemente enquanto tinha cateter arterial baixo e outro grupo que só foi alimentado 24 horas após remoção do cateter. Crianças que foram alimentadas precocemente evoluíram com menos freqüência para septicemia, tiveram menor tempo de permanência de cateteres venosos centrais e menos tempo de dieta zero. Alimentação enteral mínima reduz o risco de sepse em recém-nascidos de muito baixo peso com intolerância alimentar Autor(es): Terrin G et al. Apresentação:André Mello e Souza, Johnny Emanuel, Suélen Tavares, Paulo R. Margotto Os resultados sugerem que: -a nutrição enteral mínima pode ser uma estratégia eficaz e segura em recém-nascido de muito baixo peso com intolerância alimentar, podendo reduzir o tempo para alcançar a nutrição enteral total e a incidência de sepse, sem aumentar o risco para NEC e para morte -a suspensão da nutrição enteral a partir da detecção do primeiro sinal de intolerância alimentar, representaria um risco cumulativo para sepse e não uma estratégia protetora contra a enterocolite necrosante Logo, ao decidir pela suspensão da nutrição enteral em prematuros com intolerância alimentar, deve-se lembrar que a dieta tem um papel importante no desenvolvimento intestinal e na defesa sistêmica. Ddo José Antônio, Dda Paula Balduíno, Dr.Paulo R. Margotto, Dda Rafaela e Ddo Lucas ESCS!