Carta da
SOBEET
Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas
Transnacionais e da Globalização Econômica
ANO XIV N° 60
Agosto/ 2011
O campo de International Business (IB), ou Negócios Internacionais, vem crescendo no Brasil, nos últimos
anos, refletindo a crescente internacionalização das empresas brasileiras. Com esta Carta, a SOBEET procura
explicar as linhas gerais deste campo de pesquisa, situando historicamente o seu recente desenvolvimento e
destacando as principais abordagens teóricas e as instituições nacionais e internacionais. Adicionalmente, a
Sobeet espera angariar a atenção dos pesquisadores e da comunidade de negócios para o estudo dos
Negócios Internacionais no Brasil, o que é importante tanto para a formulação de estratégias empresariais
quanto para o desenho de políticas públicas voltadas à internacionalização das empresas brasileiras e à
atração de investimentos diretos.
NEGÓCIOS INTERNACIONAIS: PESQUISA E APLICAÇÃO
Frederico Araujo Turolla
NO BRASIL1
Mario Antonio Margarido
*
**
Introdução
a estrutura institucional brasileira. Estas reformas incluíram
Em agosto de 1994, quando a Sobeet foi criada, o Brasil
experimentava um momento especial de sua economia. A
competição foi o elemento central da estratégia de
transformação. O impulso à competição já tinha sido
realizado pela abertura comercial da primeira metade dos
anos noventas, mas foi fortemente intensificado pela
apreciação cambial, a partir de 1994. Sem a feroz
competição doméstica, resultante da combinação de
abertura comercial com apreciação do câmbio, teria sido
difícil, talvez impossível, estabilizar uma inflação que, em
doze meses, atingia marcas tão espetaculares quanto a
de 4.000% ao ano, vencendo a sua forte inércia.
a criação de um aparato institucional parecido com o das
economias maduras. O sistema de defesa da concorrência
formou a necessária base para um posterior movimento
em direção ao controle de cartéis, essencial em uma
economia fortemente oligopolizada. Marcos regulatórios
foram introduzidos para setores com fortes falhas de
mercado. Mecanismos de decisão colegiada e de reporte,
em ambientes de concorrência, regulação e política
monetária, internalizaram os instrumentos que são comuns
em países que buscam limitar o espaço para a corrupção
e insular as decisões públicas dos interesses de grupos,
obviamente sob forte protesto dos que se beneficiavam
dos processos menos isentos.
Foi um período difícil, mas muito especial, na história
econômica brasileira. O choque de competição dos anos
noventas trouxe, como resultado, competitividade. As
empresas que operavam no Brasil, submetidas a uma forte
pressão, experimentaram um movimento inédito de
renovação de seu maquinário e da tecnologia incorporada
nos processos e produtos. O movimento generalizado de
modernização das máquinas e equipamentos em operação
no país e o impressionante salto na atração de
investimentos diretos estrangeiros foram apenas alguns
dos fatos que passavam a revelar uma notável capacidade
de ganhar produtividade, o que elevou o potencial de
crescimento da economia no período subseqüente.
Ainda nos anos noventas, uma série de reformas remodelou
*
Na área fiscal, um amplo conjunto de iniciativas permitiu
estabilização financeira após a era das crises de países
emergentes. Estas ações incluíram as primeiras reformas
nos campos previdenciário e administrativo, ajustes fiscais
diretos, assim como esforços de equacionamento dos
crônicos problemas dos governos subnacionais. A situação
patrimonial dos governos subnacionais foi, pela primeira
vez na história, resolvida e regulada. As reformas fiscais
formaram uma base sólida para um marcante
aprofundamento de mercados importantes, como os de
crédito e de capitais. Os mercados financeiros se
beneficiaram ainda de reestruturação setorial e de uma
regulação apertada, um dever de casa que países
desenvolvidos deixaram de fazer, arcando posteriormente
com graves consequências.
Frederico Araujo Turolla é Diretor da Sobeet.
Mario Antonio Margarido é Pesquisador do Instituto de Economia Agrícola do Estado de São Paulo.
**
Na elaboração desta Carta, agradecemos por comentários úteis e revisões gentilmente oferecidas por: Mario Henrique Ogasavara, Felipe Mendes
Borini, George Bedinelli Rossi, Ilan Avrichir, Eduardo Eugenio Spers, Thelma Valéria Rocha, Sergio Nunes Muritiba, Patricia Morilha Muritiba, Neusa
Santos Souza, Gabriel Vouga Chueke, Ronald de Oliveira Concer.
1
As informações expressas nesta Carta são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a posição institucional da SOBEET.
1
Ao final dos anos noventas, este amplo conjunto de reformas e de choques, nos âmbitos legal, institucional, econômico
e empresarial, marcaram a transformação de uma economia fechada e ineficiente em um gigante adormecido.
O Brasil começou os anos 2000 preparado para assumir um papel mais significativo na economia internacional. Passou
a contar com um setor privado vibrante e competitivo, que a partir disto ensaiou seus primeiros passos em direção à sua
internacionalização e logo assumiu uma posição relevante entre as nações emissoras de investimentos diretos estrangeiros.
Este é o assunto da próxima seção, que contextualiza os investimentos diretos brasileiros no exterior, como um pano de
fundo para a discussão seguinte, do campo de negócios internacionais e seu desenvolvimento no Brasil.
Investimento direto: de receptor a emissor
Nos anos 2000, como consequência dos avanços da década precedente, o Brasil assistiu a mais um passo, inédito para
o país, em direção à globalização. O investimento direto estrangeiro, que nos anos noventas foi predominantemente de
entrada, se tornou mais bidirecional. Não apenas os principais nomes corporativos globais passaram a competir no
mercado doméstico brasileiro, como os principais nomes corporativos brasileiros ensaiaram seus primeiros passos na
competição global, com presença direta nos mercados que anteriormente eram, no máximo, atendidos via exportação.
O gigante brasileiro despertou e ganhou uma emblemática capa da revista The Economist, que reconheceu o suor e o
esforço dos brasileiros, desde e principalmente nos anos noventas. Fomos alçados a uma posição de destaque no
mundo, contando desta vez com uma crescente presença das organizações brasileiras no cenário internacional.
O gráfico a seguir mostra o investimento direto estrangeiro no Brasil (IDE), apresentado com sinal positivo devido ao seu
caráter de fluxo de entrada no Balanço de Pagamentos; e o investimento brasileiro direto no exterior (IBD), apresentado
com sinal negativo. Para evitar os efeitos da inflação e permitir uma comparação histórica mais longa, os dados foram
tomados em dólares e ajustados pelo Índice de Preços ao Consumidor norte-americano, para preços vigentes em 2010.
Investimento Direto Estrangeiro e Investimento Brasileiro Direto em US$
bilhões, a preços de 2010
60,00
50,00
40,00
30,00
IED
20,00
10,00
0,00
-10,00
-20,00
-30,00
IBD
1970
1971
1972
1973
1974
1975
1976
1977
1978
1979
1980
1981
1982
1983
1984
1985
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
-40,00
Nota: dados em dólares atualizados para preços de 2010 pelo CPI dos Estados Unidos. F onte: Banco Central do Brasil e Bureau of Labor
2
Tomando-se separadamente o IBD, houve, pelo menos, dois movimentos principais de internacionalização das empresas
brasileiras.
Um deles, de pequena expressão, aconteceu a partir de meados dos anos setentas, na sequencia do período conhecido
como “milagre brasileiro”. Este movimento não se sustentou, possivelmente pela falta de estímulos à competitividade das
empresas brasileiras e o Brasil só retomou a internacionalização das suas empresas nos anos noventas.
No fim dos anos noventas, o movimento ganhou expressão e parece ter alcançado sustentação econômica mais firme.
Recentemente, o IBD chegou a superar o IDE, ainda que pontualmente, mas revelando números significativos.
O gráfico a seguir, também corrigido pela inflação norte-americana, mostra o IBD separadamente.
In v e s tim e n to B r a s ile ir o D ir e to n o e x te r io r , US $ b ilh õ e s
30,5
20,7
11,5
11,3
7,4
3,8
0,9 1,0 1,6 0,2 0,7 1,0 1,6
1,0 0,5 0,8 0,4
0,1 0,2 0,3 0,3 0,3
0,1 0,0 0,1 0,2 0,2 0,4 0,7 0,5 0,4 0,6
1,5
3,0
2,2 2,9
2,8
0,3
-0,7
-2,8
2010
2009
2008
2007
2006
2005
2004
2003
2002
2001
2000
1999
1998
1997
1996
1995
1994
1993
1992
1991
1990
1989
1988
1987
1986
1985
1984
1983
1982
1981
1980
1979
1978
1977
1976
1975
1974
1973
1972
1971
1970
-10,2
Nota: dados em dólar es atualiz ados para pr eç os de 2010 pelo CPI dos Es tados Unidos . Fonte: Banc o Central do Br as il e Bur eau of Labor Ser v ic es .
Refletindo a crescente internacionalização da economia brasileira, principalmente o investimento direto das empresas
nacionais no exterior, vem ganhando corpo, no país, o estudo de Negócios Internacionais (NI), ou em inglês International
Business (IB). Trata-se de uma área interdisciplinar que, no país, pode ser considerada como nova e incipiente, mas que
no mundo já se encontra bem mais consolidada.
O estudo de NI no Brasil pode contribuir para a intensificação e a definição do foco das nossas estratégias internacionais,
públicas e privadas, hoje em pleno andamento. É, também, fundamental para a inserção brasileira no exterior, dado que
já há uma ativa e crescente comunidade de NI da qual o Brasil, por muitos anos, pouco participou, mas desde recentemente
vem se inserindo de maneira mais efetiva.
A comunidade de NI
A comunidade de NI, espalhada pelo mundo, tem pelo menos duas importantes referências, que são:
• na área acadêmica, a mais importante organização de alcance mundial é a AIB – Academy of International Business.
Sua importância está nos encontros que promove e nas suas publicações científicas, especialmente o JIBS – Journal of
International Business Studies.
• na área de análise aplicada e de formulação de políticas para o investimento direto, com importante foco nos países em
desenvolvimento, a UNCTAD – United Nations Conference on Trade and Development, ou Conferência das Nações Unidas
para o Comércio e Desenvolvimento, possui estrutura própria de pesquisa e análise, promove eventos internacionais que
3
envolvem a comunidade e gera publicações como o World
Investment Report.
Há outras referências da comunidade de NI. A seguir, são
descritos apenas os papéis e alcance da AIB e da UNCTAD,
que podem ser consideradas como as principais referências
de alcance internacional, sendo a primeira na área
acadêmica e a segunda na pesquisa aplicada ao
desenvolvimento dos países emergentes.
Academy of International Business
A mais importante referência da comunidade acadêmica
de NI é a Academy of International Business (AIB), que
possui mais de 3 mil membros em 74 países. A AIB edita
o prestigiado JIBS – Journal of International Business
Studies. O JIBS tem uma característica peculiar: apesar
de altamente especializado nos tópicos de NI, tem natureza
interdisciplinar, portanto abrange estudos de gestão,
finanças, marketing, economia e das demais ciências
sociais. O JIBS possui um fator de impacto bastante
elevado, é considerado um dos dez principais business &
management journals da atualidade. Assim, publicar no
JIBS é o “sonho de consumo” dos acadêmicos de NI.
A AIB realiza um encontro anual, desde 1959. O encontro
da AIB foi realizado, inicialmente, nos EUA e depois em
países da Europa e Ásia, além de Canadá e México. Em
2010, o Encontro da AIB aconteceu pela primeira vez no
Brasil, no Rio de Janeiro, Barra da Tijuca, entre 25 e 29 de
junho. O encontro consistiu em sessões científicas, mas
contém também um grande número de painéis temáticos,
reuniões de trabalho e até mesmo um café da manhã diário
para conversa informal com os fellows da AIB, que são
acadêmicos de distinção. Em 2011, o encontro aconteceu
entre 24 e 28 de junho em Nagóia, no Japão, sob o tema
“Negócios internacionais para um desenvolvimento mundial
sustentável”.
A UNCTAD foi estabelecida em 1964, tendo como primeiro
Secretário-Geral o economista argentino Raúl Prebisch,
que assumiu o posto logo após o período de 13 anos em
que serviu como Secretário Executivo da Comissão
Econômica para a América Latina (CEPAL). Atualmente,
o tailandês Supachai Panitchpakdi cumpre seu segundo
mandato como Secretário-Geral, substituindo o brasileiro
Rubens Ricúpero que serviu no posto entre 1995 e 2004.
Uma das principais atividades da UNCTAD é a produção
anual do World Investment Report (WIR), publicado
anualmente desde 1991, sob a responsabilidade de uma
força-tarefa organizada pela Divisão de Investimentos e
Empresas (DIAE). O WIR contém análises, artigos e uma
ampla base de estatísticas sobre investimentos diretos.
No Brasil, o lançamento anual do WIR está a cargo da
SOBEET, há muitos anos, em uma conferência de
imprensa realizada ainda durante o período de embargo
internacional do texto.
A estrutura padrão do relatório é constituída de quatro
capítulos: os dois primeiros apresentam as tendências
globais e regionais dos investimentos diretos; o terceiro
se dedica às políticas nacionais e internacionais sobre o
tema; e o quarto capítulo é uma análise de um tema
selecionado a cada ano. O capítulo temático, preparado
durante um ano, é preparado sob supervisão dos
principais acadêmicos da área, como John Dunning, Peter
Buckley e Mark Casson, e conta com assistência de
especialistas internacionais convidados.
Geralmente, o capítulo temático do WIR se torna uma
referência importante na área em que é publicado. O WIR
de 2010 tratou do investimento em uma economia de baixo
carbono, sendo que nos anos precedentes os temas foram
os investimentos diretos em indústrias extrativas (2007),
infraestrutura (2008) e na agricultura (2009).
Os capítulos da AIB realizam encontros regionais. Em
2008, foi criado o capítulo latinoamericano, o AIB-LAT, que
realizou seu primeiro encontro anual no Rio de Janeiro,
junto ao encontro global da AIB, em junho de 2010,
paralelamente ao encontro da AJBS – Association of
Japanese Business Studies.
Neste ano de 2011, o relatório vai discutir os investimentos
que não envolvem a compra de capital acionário de
empresas (“non-equity investments”). Esta modalidade é,
já há muitos anos, uma tendência em Negócios
Internacionais e a UNCTAD decidiu estudá-la a fundo e
traçar seus elementos gerais.
UNCTAD/ONU
A UNCTAD também organiza eventos de repercussão
internacional. As sessões da Conferência são realizadas
a cada quatro anos, sendo que em 2004 foi realizada aqui
em São Paulo, seguida pela de Gana. Há também o World
Investment Forum, que no ano passado foi realizado na
China, e simpósios anuais em Genebra.
A UNCTAD é o mais importante think tank global em
políticas de investimentos diretos estrangeiros, com foco
nas políticas para o investimento dos países em
desenvolvimento. Está sediada em Genebra, na Suíça, no
4
complexo do Palácio das Nações.
A comunidade brasileira de NI
No Brasil, a comunidade de NI ainda é relativamente
pequena. Tradicionalmente, ela se reúne em eventos como
o EnANPAD, que é o encontro anual da Associação
Nacional dos centros de Pós-Graduação em
Administração. O EnANPAD possui, desde o encontro de
2001, uma mesa específica de Gestão Internacional (GIN).
O gráfico abaixo mostra o crescimento da área no Encontro
da ANPAD.
que vêm realizando pesquisas na área de NI, agrupados
pelas instituições a que pertencem. A lista não é exaustiva
e corremos o risco de omitir nomes importantes; é certo,
entretanto, que sua extensão vem crescendo nos últimos
anos.
Instituição
Pesquisadores selecionados
COPPEAD/UFRJ
Luís Antônio Dib; Adriana Victoria Garibaldi de Hilal;
Renato Dourado Cotta de Mello; Otavio Henrique dos
Santos Figueiredo, Victor Manoel Cunha de Almeida
USP
Afonso Fleury; Moacir Miranda de Oliveira Jr;
Eduardo Pinheiro Gondim de Vasconcellos; Gilmar
Masiero; Glauco Antonio Truzzi Arbix
PUC-RJ
Angela Maria Cavalcanti da Rocha; Jorge M anoel
Teixeira Carneiro; Jorge Ferreira da Silva
ESPM / Programa de
Mestrado em Gestão
Internacional
Marcos Amatucci; Felipe Mendes Borini; Eduardo
Eugênio Spers; Thelma Valéria Rocha; Ilan Avrichir;
Manolita Correia Lima; Vivian Iara Strehlau; Mateus
Canniatti Ponchio; Júlio Cesar Bastos de Figueiredo;
Frederico Araujo Turolla; George Bedinelli Rossi
FGV/EAESP
Maria Tereza Leme Fleury; Rodrigo Bandeira de
Mello; Alvaro Bruno Cyrino; Antonio Gelis Filho;
Fabio Luiz Mariotto; Hsia Hua Sheng; Germano
Glufke Reis; Ely Laureano Paiva
FGV/EBAPE
Alexandre Almeida Faria; Ana Lucia Malheiros
Guedes; Ronaldo Couto Parente
Fundação Dom Cabral
Erika Penido Barcellos; Jase Ryan Ramsey; Luiz
Carlos Ferreira de Carvalho; Lívia Lopes Barakat;
Flávia de Magalhães Alvim
UNINOVE/PMDA
Eva Stal; Milton de Abreu Campanário; Patricia
Morilha Muritiba; Sergio Nunes Muritiba
FURB
Mohamed Amal
UNIFOR
Mario Henrique Ogasavara; Sergio Henrique Arruda
Cavalcante Forte
Insper
Dirk Michael Boehe
Centro Universitario
Positivo
Rene Eugênio Seifert Junior; Bruno Henrique Rocha
Fernandes
PUC-MG
Betania Tanure de Barros; Angela França Versiani;
Sérgio Fernando Loureiro Rezende
Número de trabalhossobre investimento direto noENANPAD
15
11
7
4
4
2004
2005
2006
2007
2008
Fonte: dados gentilmentecedidos peloProf. MarioOgasavara
Outros eventos atraem pesquisadores da área de NI. Entre
eles, a Escola Superior de Propaganda e Marketing
(ESPM) realiza, anualmente, o Simpósio Internacional de
Administração e Marketing, que tem em NI uma de suas
principais áreas, sendo que, em 2010, o Simpósio foi
realizado em 13 e 14 de outubro, em São Paulo.
A SOBEET é, também, uma tradicional referência da
comunidade brasileira de NI. Desde sua fundação, a Sobeet
vem realizando, coordenando ou patrocinando estudos,
com diversos focos e níveis de profundidade, sobre os
investimentos diretos brasileiros, nas duas direções, de
entrada e de saída.
Atualmente, a Sobeet realiza a pesquisa anual sobre a
internacionalização de empresas brasileiras junto ao Vale
Columbia Center, publicada no Brasil pelo Valor Econômico.
Recentemente, a SOBEET firmou Acordo de Cooperação
com o IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada,
para ações conjuntas que assegurem a realização de
estudos e pesquisas de interesse mútuo, principalmente
a respeito dos seguintes temas: Internacionalização de
empresas - estudos de caso; políticas de atração de
investimento direto externo – estudos de caso;
Investimento Direto Externo no Brasil e Políticas Públicas;
e Investimento direto e estratégias empresariais.
O quadro a seguir apresenta uma lista de pesquisadores
A comunidade acadêmica brasileira de NI tem suas raízes,
principalmente, na COPPEAD/UFRJ, USP e Fundação
Dom Cabral. Reporta-se que as primeiras pesquisas
sistemáticas sobre expansão internacional de empresas
brasileiras datam dos anos setentas, com esforços
realizados na Coppead-UFRJ e com a criação do Núcleo
de Estudos em Internacionalização de Empresas, em 1977,
naquela instituição (Mariotto, 2007, p. 38).
Hoje, há alguns núcleos importantes no país, sendo que a
maior concentração de pesquisadores está nas três
principais capitais do sudeste do país: Rio de Janeiro (PUCRJ, UFRJ/COPPEAD e IPEA), São Paulo (ESPM/PMGI,
FGV-SP, Insper, PUC-SP, Uninove/PMDA, USP) e Belo
5
Horizonte (FUMEC, Fundação Dom Cabral, PUC-MG,
UFMG). Além destas cidades, há pesquisadores, em
menor número, no Nordeste (Bahia, Ceará e Pernambuco)
e nos três estados da região Sul.
A FGV/EAESP criou, em junho de 2010, o International
Business Research Forum, um centro de estudos que
conta com a diretora da instituição, Maria Tereza Leme
Fleury, acadêmica de destaque na área e que esteve entre
os organizadores do encontro da AIB no Brasil.
Uma importante iniciativa na área de NI é o Projeto Ginebra
(Gestão para a Internacionalização de Empresas
Brasileiras), coordenado pelos professores Afonso e Maria
Tereza Fleury. O Ginebra congrega diversos pesquisadores
em torno da temática de Negócios Internacionais e procura
realizar um papel de agregação e de catalisação de
pesquisas e de relacionamentos temáticos.
Em 2009, a ESPM criou o PMGI – Programa de Mestrado
em Gestão Internacional, um mestrado acadêmico
especializado na área. O programa foi desenhado a partir
de 2005, pelo seu coordenador, professor Marcos
Amatucci. Apesar de jovem, o PMGI já marcou presença
nos mais importantes eventos da área, inclusive nos últimos
encontros da AIB, British Academy of Management,
Simpósio da UNCTAD e no EnANPAD. Seus docentes
publicaram o livro “Internacionalização de Empresas” pela
Editora Atlas e estão em fase final de preparação de uma
nova obra de referência sobre o mesmo tema. O PMGI
publica a InternexT, uma revista dedicada à área de NI.
O que se estuda em NI
A editora do JIBS, Lorraine Eden, apresentou, no encontro
anual da Anpad de 2009 em São Paulo, uma tentativa de
delimitação da pesquisa em Negócios Internacionais. Uma
tradução livre é apresentada no quadro a seguir.
Qual é o domínio da pesquisa em NI?
6
O que não é pesquisa em NI?
• Atividades, estratégias, estruturas e
processos de tomada de decisão
das empresas domésticas
Pode-se encontrar uma delimitação do campo de Negócios
Internacionais na página do JIBS, em http://www.palgravejournals.com/jibs/keywords_list.html. Ali são definidos os
principais métodos de pesquisa aceitos no Journal (quanto
à fonte de dados, o desenho da pesquisa, método de
análise e outros), as teorias e os principais tópicos
pesquisados. A página é extensa e por isto vamos
reproduzir, no quadro a seguir, apenas as teorias, cujo
nome foi mantido no original em inglês. As várias
abordagens comumente utilizadas para a análise dos
fenômenos de negócios internacionais estão embasadas,
quase invariavelmente, nas teorias apresentadas no
quadro.
Teorias em Negócios Internacionais (JIBS)
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
Agency Theory
Borrowing Theory
Chaos Theo ry
Comparative Advantage
Competitive Structure
Economic Sociology
Exploration vs. Exploitatio n
Game Theory
Framing Processes
Human Ecology Theory
Hybridization
Institutional Theory
Internalization Theory
International Trade Theory
Internationalization Theories and
Foreign Market Entry
Knowledge-Based View
Leadership Theories
Market Knowledge Co mpetence
Market Orientation
Neoinstitutional Theo ry
Network Relations Theory
Network Theory
Organization Theory
Organizational Ecology (Population
Ecology of Organizations)
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
Organizational Learning
Path Dependence
Political Economy
Portfolio Theory
Power-Dependence Theory
Relational Contracting Theory
Resource Dependency
Resource-Based View o r ResourceBased Theory
Signaling Theory
Social Cognition
Social Control Theory
Social Exchange Theory
Strategic Choice Theo ry
Syndicates
Systems Theory
Technolo gical Advantage Theory
Technolo gical Innovatio n Theory
Theory of FDI and the MNE
(Ownership-Location-Internalization)
Transaction Cost Theory, Transaction
Cost Economics, or Transaction Cost
Analysis
Upper Echelon Theory
Other
Fonte: reproduzido de http://www.palgrave-journals.com/jibs/keywords_list.html
As seções a seguir apresentam os elementos essenciais
de algumas das principais abordagens de Negócios
Internacionais, que são relevantes para fomentar a
discussão no Brasil. Note-se que não foram cobertas todas
as teorias apresentadas no quadro anterior, apenas algumas
abordagens principais que, em geral, utilizam algumas
dessas teorias.
•
Atividades, estratégias,
estruturas e processos de
tomada de decisão das Empresas
Multinacionais (EMNs)
•
Interações das EMNs com outros
atores, organizações e
instituições
•
Atividades cross border das
firmas
• Atividades intrafronteira das
firmas (ex: investimentos,
transferências de tecnologia)
•
Impactos do ambiente
internacional sobre as
atividades, estratégias,
estruturas e processos de decisão
das firmas
• Impactos do ambiente doméstico
(ex: cultural, político, econômico)
sobre as atividades, estratégias,
estruturas e processos de decisão
das firmas domésticas
•
Estudos comparativos cross
border de negócios, processos de
negócios e comportamento
organizacional
•
Dimensões internacionais das
formas e atividades
organizacionais
• Estudos comparativos dentro do
país de negócios, processos de
negócios e comportamento
organizacional no mesmo país ou
ambiente
O estudo dos investimentos diretos estrangeiros, assim
como o do comércio internacional, foi, até meados do
século XX, um item da disciplina Economia Internacional.
A teoria dominante, até os anos 60, era a de HeckscherOhlin, que previa que o comércio internacional ocorreria
devido às diferenças das dotações de trabalho e capital
entre as nações. Em outras palavras, países com mais
mão-de-obra se especializariam nos bens intensivos neste
fator e os exportariam para países com maior dotação de
capital fixo, e vice versa.
• Dimensões domésticas das formas
organizacionais (ex: alianças,
fusões e aquisições) e atividades
organizacionais (ex:
empreendedorismo, governança
corporativa)
Como desdobramento das teorias do comércio, logo se
procurou avaliar as transferências internacionais de capital.
Acreditava-se que estas transferências tinham origem nas
diferenças de taxas de juros ou retorno do capital entre as
• Interações das empresas
domésticas com outros atores,
organizações e instituições
Da Economia Internacional à Microeconomia:
Hymer e Vernon
nações. O capital deveria fluir das economias onde o
retorno é mais baixo para aquelas onde o retorno é mais
alto (Buckley e Casson, 2010). Isto deveria criar um fluxo
de investimentos diretos com origem nos países
desenvolvidos, de baixo retorno, em direção aos países
em desenvolvimento, onde o retorno é mais alto.
A predição da teoria, porém, não encontrava eco nos fatos.
Após a Segunda Guerra Mundial, o mundo assistiu a uma
intensificação dos investimentos diretos, mas este fluxo
aconteceu, principalmente, entre países desenvolvidos.
Além disto, boa parte do fluxo aconteceu a partir de países
que, naquele momento, apresentavam alta taxa de retorno,
como os EUA, em direção a países com baixa taxa de
retorno como o Reino Unido. Para Buckley e Casson
(2009), em linguagem moderna, os economistas da época
confundiram investimento em carteira com investimento
direto.
Nos anos 60, o estudo do investimento direto estrangeiro
passou da Macroeconomia à Microeconomia. Nesta nova
fase, o campo de Negócios Internacionais passou a se
beneficiar fortemente da teoria Microeconômica já bem
estabelecida, particularmente do estudo da Organização
Industrial, e dos desdobramentos dessa teoria nesta época,
incluindo a teoria das barreiras à entrada. Posteriormente,
o campo incorporou, com grande ênfase, os estudos na
linha inaugurada por Ronald Coase e a Nova Economia
Institucional, incluindo a contribuição, um pouco mais
recente, de Oliver Williamson.
O delineamento das feições atuais do estudo do
investimento direto estrangeiro como o conhecemos deve
muito à tese de doutorado do economista canadense
Stephen Hymer (1960) no M.I.T., orientada pelo proeminente
professor Charles Kindleberger. Foi Kindleberger que
popularizou o trabalho de Hymer (Kindleberger, 1969). A
tese de Hymer é considerada como a primeira tentativa de
explicação sistemática das atividades das empresas fora
das suas fronteiras nacionais (Dunning, 2001).
A tese apareceu poucos anos após a publicação do famoso
trabalho de Joe Bain (1956) sobre como as barreiras de
entrada influenciaram a estrutura de diversos setores nos
EUA, além de outras contribuições contemporâneas na
área da Economia Industrial. Hymer também foi influenciado
por fatos históricos: o substancial crescimento das
atividades estrangeiras das empresas norte-americanas,
especialmente no Canadá e na Europa Ocidental, desde
1950. Sua atenção se voltou para a intrigante concentração
destas atividades em setores específicos (Dunning, 2001).
Hymer apontou pelo menos duas razões para o IDE: uma,
que as empresas podem ter uma vantagem real de eficiência
e assim explorar múltiplos mercados; e outra, as empresas
tentariam eliminar a competição entre dois mercados,
ocupando ambos. Adicionalmente, haveria a diversificação
internacional dos mercados como razão para o
investimento direto estrangeiro.
Oliver Williamson comentou a explicação “dual” de Hymer
para o IDE e coletou uma citação do autor, de que o
investimento direto estrangeiro “permite as firmas
comerciais transferirem capital, tecnologia, e habilidade
organizacional de um país para outro. É também um
instrumento para restringir a competição entre firmas de
diferentes nações” (Hymer, 1970, p. 443, apud Williamson,
1985), criando vantagens monopolísticas. No começo dos
anos setentas, economistas como Richard Caves (1971)
e Robert Aliber (1971) seguiram na linha de vantagens
monopolísticas, explorando, por exemplo, o papel das
marcas e dos prêmios de taxa de câmbio (Buckley e
Casson, 2009).
Na mesma época, um pouco após Hymer, Raymond
Vernon tentou desvendar a atividade das empresas norteamericanas no exterior. Vernon argumentou que as
empresas norte-americanas desfrutavam de vantagens
específicas ao país, relacionadas à dotação de fatores da
economia americana, assim como aos padrões de
demanda e estrutura de mercado naquele país.
Inicialmente, tais vantagens seriam mais bem exploradas
no país de origem; mas, na medida em que os produtos
atingem a maturidade, ou mesmo se tornam padronizados,
e aumenta a ameaça de competição, a produção migra
para o estrangeiro (Dunning, 2001). Ele desenvolveu, assim,
uma teoria do ciclo de vida do produto em que, nos estágios
avançados, ocorre a internacionalização.
Nas palavras de Oliver Williamson, “o estudo de Raymond
Vernon de 1971 das corporações da Fortune 500 revelou
que 187 delas tinham uma presença multinacional
substancial. O dispêndio em P&D como porcentagem das
vendas era maior entre estas 187 do que entre as firmas
remanescentes no grupo das Fortune 500. Ademais, de
acordo com Vernon, as firmas que se tornaram
multinacionais tendiam a ser tecnologicamente inovadoras
no momento de fazer seus investimentos diretos
estrangeiros iniciais” (Williamson, 1985).
Vernon, assim, previu que empresas com elevado
investimento em inovação se internacionalizariam após
atingirem certo estágio. Desenvolveu, portanto, uma teoria
dinâmica da internacionalização das empresas, com
importantes aspectos comportamentais. A linha
comportamental sobre a internacionalização seria
explorada posteriomente pelos pesquisadores da
Universidade de Uppsala, que criariam a abordagem
comportamental mais famosa da atualidade.
Desde Hymer e Vernon, as teorias sobre o investimento
direto estrangeiro experimentaram uma evolução
7
significativa, com várias contribuições importantes, que são
apresentadas nos itens a seguir.
A mais ampla e reconhecida contribuição para a teoria
dos investimentos diretos foi realizada por John Dunning.
Embora as contribuições de Dunning sejam bastante
associadas aos seus trabalhos a partir dos anos setentas
(dois trabalhos frequentemente citados são Dunning 1977
e 1988), sua origem é anterior às contribuições de Hymer
e Vernon: datam da tese de doutorado de Dunning, de
1958, embora seus artigos mais importantes sejam
posteriores.
O “paradigma eclético” de John Dunning
O professor John Harry Dunning faleceu em janeiro de 2009,
deixando o mais amplo legado de contribuições à teoria
de negócios internacionais e à explicação dos
investimentos diretos estrangeiros, em quase 50 livros e
mais de 150 artigos. Foi uma figura central nas atividades
da UNCTAD e do United Nations Centre on Transnational
Corporations, desde os anos setentas até o fim da sua
vida, inclusive orientando a preparação anual do World
Investment Report.
Dunning criou e aperfeiçoou um paradigma geral de análise
da internacionalização, com base na racionalidade
econômica desse movimento. Desenvolveu, assim, uma
estrutura de explicação para o investimento direto (ou a
produção internacional de bens e serviços, como ele
denominou o fenômeno em um de seus principais artigos),
que foi batizada de “paradigma eclético”. Este ficou também
conhecido como “paradigma OLI”, pelos seus três
componentes, que refletem as vantagens que são
exploradas pelas empresas que se internacionalizam e
que constituem, de certa forma, a motivação dessas
empresas para a internacionalização.
Estas vantagens são: O, de ownership (propriedade); L,
de location (localização); e I, de internalização
(internalization). Estas são apresentadas no quadro a seguir.
Sumário do paradigma OLI
O
Nome
PROPRIEDADE
Característica Específicas à
empresa
Tipo de
vantagem
Ativos tangíveis e
intangíveis que a
firma detém.
L
I
LOCALIZAÇÃO
INTERNALIZAÇÃO
Específicas ao local
de destino
Relacionadas ao
custo de transacionar
Fatores locais dos
mercados de destino.
Economias obtidas
pela utilização de
transações internas à
empresa em vez de
usar o mercado.
Fonte: Fleury e Fleury (2007); Amatucci (2009); Mariotto (2007);
8
As vantagens específicas da empresa (O, de ownership)
são derivadas de sua propriedade e/ou nacionalidade.
Essas vantagens podem ser de caráter estrutural,
correspondente à posse ou acesso exclusivo e privilegiado
a recursos que criam ativos; ou transacional, que se refere
à capacidade da empresa de tirar proveito de falhas de
mercados, pela administração eficaz de conjuntos de ativos
localizados em diferentes países e da capacidade de
gerenciar alianças estratégicas e redes de empresas.
As vantagens específicas de localização (L, de location)
estão relacionadas aos locais onde se implantam as
operações no exterior. Também podem ser vistas pelo lado
estrutural ou transacional. Os aspectos estruturais estão
relacionados às condições locais - institucionais,
econômicas, culturais - que influenciam o desempenho
da subsidiária. Incluem, desde o acesso e uso de fatores
locais, até políticas de incentivo.
Pelo lado transacional, as vantagens de localização se
referem à capacidade da empresa de tirar proveito da
gestão coordenada de ativos instalados em diferentes
países em decorrência de sua implantação em um lugar
específico. As vantagens de localização se referem, por
exemplo, à obtenção de acesso a mercados, fontes de
matéria-prima, canais de distribuição, incentivos
governamentais locais, entre outros.
Nas vantagens específicas de internalização (I, de
internalization), a empresa procura reduzir e eliminar
diversos custos de transação, buscando minimizar
encargos com o câmbio, da propriedade de informação e
redução da incerteza, obter maior conhecimento sobre o
mercado em que está atuando, vantagens contratuais e a
utilização de um racional e adequado aparato legal, entre
outros.
A teoria da internalização
Com base nas teorias do custo de transação, a teoria da
internalização, associada a Buckley e Casson, se tornou
o paradigma dominante na explicação da existência e do
crescimento da empresa multinacional (Dunning, 2001).
As falhas de mercado e os custos de transação
assumiram, com isto, um papel central na teoria de
Negócios Internacionais. Trata-se de uma teoria
relativamente complexa, que gera uma abordagem peculiar
sobre a formação das empresas transnacionais.
Do fim dos anos setentas até o começo dos anos oitentas,
a empresa transnacional passou a ser percebida
crescentemente como “uma instituição que coordena o
uso de ativos intermediários gerados em um país, com
atividades de valor adicionado resultando destes ativos em
outro país (ou países), em vez de uma firma que possui ou
controla instalações de produção em dois ou mais países”
(Dunning, 2001, p. 41).
elemento central dessa visão é que alguns mercados são
mais imperfeitos que outros. Nas palavras de Buckley e
Casson, por várias razões, o mercado da tecnologia é, em
geral, altamente imperfeito, principalmente por duas razões.
Os expoentes da teoria da internalização em NI foram,
segundo Dunning (2001), os textos de Peter Buckley e
Mark Casson (1976) além de Jean-François Hennart (1977,
1982), Nils Lundgren (1977) e Birgitta Swedenborg (1979).
Em primeiro lugar, porque seus direitos de propriedade
são muito mal definidos. Por exemplo, ainda que seja
possível patentear inovações, é sempre possível criar “em
torno de” uma patente. Pode-se chegar a um ponto em
que inventores evitam proteger patentes para proteger
segredos e não chamar a atenção dos potenciais
concorrentes sobre sua invenção (Buckley e Casson, 2010,
p. 8).
Os principais expoentes dessa teoria, que hoje podem
ser considerados os principais acadêmicos ativos na área
de Negócios Internacionais, são Peter Buckley e Mark
Casson. O professor Peter J. Buckley hoje dirige o Centre
for International Business da Universidade de Leeds, no
Reino Unido. Publicou 21 livros e mais de 120 artigos
acadêmicos, sendo 12 deles no JIBS. Foi presidente da
AIB entre 2002 e 2004 e atua como senior advisor na
produção do World Investment Report da UNCTAD. Mark
Christopher Casson é professor da Universidade de Reading
desde 1969. Escreveu ou editou mais de 30 livros e publicou
mais de 100 artigos acadêmicos. Atua como consultor
em diversas organizações internacionais e multilaterais,
inclusive como senior advisor na produção do World
Investment Report.
A teoria do custo de transação é a base conceitual dessa
discussão e descende, intelectualmente, de Ronald Coase
(1937). Conforme Buckley e Casson, havia uma
interessante percepção no artigo seminal de Coase. Ele
teria notado que, nas aulas sobre teoria dos preços, se
ensinava que os mercados coordenam a economia; nas
aulas de negócios se ensinava que os gestores coordenam
a economia; e nas aulas sobre socialismo, são os
planejadores que coordenam a economia. O quadro a
seguir sumariza estes mecanismos alternativos de
coordenação.
M ecanismos alternativos de coordenação segundo Ronald Coase
Disciplina
Teoria dos preços (microeconomia)
Business
Socialismo
Fonte: Buckley e Casson (2010)
Que m coordena a economia
Mercados
Gestores
Planejadores
Coase concluiu que, diante de mecanismos alternativos
de coordenação, se escolheria a forma mais barata. Todos
os mecanismos de coordenação são imperfeitos. Porém,
alguns mecanismos são mais imperfeitos que outros
(Buckley e Casson, 2010).
Assim, a explicação de Buckley e Casson para a
existência da empresa transnacional está assentada sobre
a visão de Coase sobre a coordenação, em que todos os
mecanismos de coordenação são imperfeitos. Um
Em segundo lugar, o custo de transferir a tecnologia para
outros países desencoraja empresas de investirem no
exterior, sendo que neste caso optam por explorar a
inovação no seu mercado doméstico. Buckley e Casson
consideram que esta é a razão pela qual as transnacionais
são mais comuns entre indústrias de alta tecnologia. Desta
forma, explicam a persistência de uma defasagem
tecnológica entre os países, mesmo com o investimento
das empresas transnacionais.
Assim, com imperfeições tão marcantes quanto no
mercado de tecnologia, o custo de usar o mercado na
coordenação das atividades é elevado e, neste caso, as
empresas preferem utilizar a sua organização interna.
Estabelecem, assim, estas atividades sob propriedade e
controle comuns.
Estas imperfeições não acontecem apenas no mercado
de tecnologia, havendo vários outros casos relevantes. Em
particular, se a tecnologia pode ser vista como um insumo
intermediário na produção de um bem, outros insumos
caracterizados por imperfeições de mercado podem ter
sua produção internalizada juntamente com a atividade a
jusante, o mesmo valendo para a atividade a montante da
cadeia produtiva (Buckley e Casson, 2010). Podem, assim,
ser obtidos de forma mais eficiente sob propriedade e
controle de uma mesma organização ou grupo econômico.
Entre estes insumos podem estar a propaganda e os
capitais, ambos caracterizados por imperfeições
importantes (Buckley e Casson, 2009; Williamson, 1985).
Um outro caso importante se refere aos insumos em que
há necessidade de controle de qualidade, atividade que
pode apresentar fortes assimetrias de informação. A própria
aquisição de tecnologia traz incerteza sobre o bem ou
serviço adquirido, podendo ser considerada como um
problema de controle de qualidade (Buckley e Casson,
2010).
9
Quando estas falhas de coordenação envolvem diferentes
países, as empresas se tornam empresas transnacionais.
Assim, as empresas transnacionais apareceram,
inicialmente, com maior ênfase, nos mercados com maior
intensidade tecnológica, onde a transferência de tecnologia
indiscutivelmente coloca maiores dificuldades em termos
de custos de transação (Williamson, 1985).
Buckley e Casson afirmaram, em 2010, na sua revisão da
teoria, após mais de 30 anos de pesquisa, que “nós
começamos com um problema – como explicar a
existência da empresa multinacional e a forma como ela
se comporta”. Eles acreditam que, juntamente com outros
acadêmicos, encontraram a resposta a esta pergunta.
Entretanto, afirmaram que a resposta apenas levantou
novas questões, que se multiplicaram em outras novas
questões. Esta percepção reflete a riqueza e a variedade
de temas no campo de NI, além de estar na origem da
crescente atividade de pesquisa hoje verificada em torno
da abordagem de internalização.
O modelo de Uppsala
Os pesquisadores da Universidade de Uppsala, na Suécia
construíram, a partir de meados dos anos setentas, uma
abordagem pioneira sobre os aspectos comportamentais
da internacionalização das empresas.
Inicialmente, os pesquisadores de Uppsala (Hörnell, Vahlne
e Wiedersheim-Paul, 1973; Johanson e Wiedersheim-Paul,
1975; Johanson e Vahlne, 1977), observando a
internacionalização das empresas suecas, verificaram que
o comportamento organizacional observado se mostrava
diferente do que previa a literatura de NI naquela época.
A previsão da literatura era de que as empresas
escolheriam, para sua internacionalização, o melhor modo
de entrada em um mercado através da análise dos seus
custos e riscos, com base nas características do mercado
e levando em consideração os seus próprios recursos. O
que eles encontraram no histórico das empresas suecas
foi algo diferente, que eles chamaram de establishment
chain: primeiro as empresas exportavam; depois,
formalizavam suas entradas através de negociações com
intermediários, representantes ou agentes no país de
destino. Quando cresciam no mercado externo,
substituíam os representantes ou agentes por pessoal
próprio; e, crescendo ainda mais, estabeleciam a planta
para produzir no mercado-alvo, evitando assim as barreiras
comerciais (Johanson e Vahlne, 2009).
Outro achado importante dos pesquisadores de Uppsala
10
foi que o processo de internacionalização das empresas
suecas não começava pelo “melhor” mercado disponível
no mundo. Em vez disso, frequentemente o processo se
iniciava por mercados que eram próximos do mercado
doméstico em termos de distância psíquica.
Este conceito, distância psíquica, foi definido por eles como
"os fatores que dificultam o entendimento dos ambientes
estrangeiros” (Johanson e Vahlne, 2009, p. 1412). A
distância psíquica consiste na soma de fatores que
interferem no fluxo de informações entre países; a distância
geográfica, uma vez que pode envolver diferenças culturais,
políticas, sociais e econômicas, é um exemplo (Vahlne e
Wiedersheim-Paul, 1973).
Quanto maior a distância psíquica, segundo eles, maior a
liability of foreigness, outro conceito importante do modelo
de Uppsala. Porém, gradualmente, após a entrada em
mercados próximos, a empresa adquire experiência, e
passa a entrar em mercados mais distantes em termos
psíquicos. O modelo tem um caráter dinâmico, pois o
aprendizado gradual permite a entrada em novos
mercados, em um processo sequencial e contínuo de
internacionalização.
Há importantes limitações do modelo de Uppsala: o
processo é linear, esquemático, determinista e não tem
volta, não considerando a possibilidade dos
desinvestimentos. Não considera aspectos como a
possibilidade de “queimar etapas”, típica de empresas de
países em desenvolvimento e também de empresas de
tecnologia, assim como omite o ambiente de negócios
(Borini et al, 2006, p. 46). Há, inclusive, a teoria das
empresas “born globals”, introduzida por Knight e Cavusgil
(1996), que dá conta de um grande número de empresas
cuja velocidade ou padrão de internacionalização desafiam
as predições de Uppsala.
Na versão mais recente da teoria de Uppsala,
sistematizada em Johanson e Vahlne (2009), a raiz da
incerteza se deslocou para o conceito de redes, em vez
das fronteiras nacionais. Em outras palavras, a empresa
enfrenta incertezas relacionadas à penetração nas redes
relevantes de negócios internacionais. Como coloca Eden
(2009), “ser estranho à rede relevante, em vez da distância
psíquica, é a causa original da incerteza” (Eden, 2009, p.
1409).
A abordagem das redes considera que os mercados são,
na verdade, redes de empresas onde, no contexto da
internacionalização, as empresas devem desenvolver
posições em redes no exterior (Carneiro e Dib, 2007, p. 6).
Assim, o conceito original, de liability of foreigness, ou o
problema de ser estrangeiro, foi substituído pela liability of
outsidership, ou a questão de se estar fora de uma rede
relevante. No contexto da análise de subsidiárias, a rede
de relacionamento pode ser externa, que diz respeito ao
relacionamento da subsidiária com fornecedores e outros
parceiros, ou interna – entre as subsidiárias da mesma
empresa (Borini, Fleury e Fleury, 2010).
Tropicalização: a teoria sob o Cruzeiro do Sul
Uma importante contribuição à teoria de NI no Brasil teve
origem na UFRJ, através de autores como a professora
Angela da Rocha e os pesquisadores do Núcleo de
Pesquisa em Internacionalização de Empresas, instalado
no final dos anos setentas.
Mais recentemente, Afonso e Maria Tereza Fleury (2007)
desenvolveram uma interessante discussão sobre a
internacionalização dos “entrantes tardios” (late movers).
O tema não é novo na literatura e já foi explorado desde o
fim dos anos setentas, avaliando as novas transnacionais
do terceiro mundo (Ogasavara e Masiero, 2009).
Um número razoável de empresas de países emergentes,
tradicionalmente exportadoras, vem aumentando suas
operações globais. Em contraste com as pioneiras (early
movers) dos países desenvolvidos, as condições e
características da internacionalização dos entrantes tardios
(late movers) são sensivelmente distintas.
As principais diferenças incluem: o grau de competição
mais elevado, demandando mais inovação; os early movers
já estarem avançando para sofisticadas formas de controle
da cadeia global de valor; a maior incidência de políticas
públicas e de intervenção no processo de
internacionalização; e a presença de restrições
institucionais ao comércio, afetando fortemente os países
em desenvolvimento (Fleury e Fleury, 2007, p. 5).
A caracterização das empresas entrantes tardias na
literatura de Gestão Internacional identifica, conforme os
professores Afonso e Maria Tereza, algumas características
salientes: empresas maduras e integradas, originadas em
mercados protegidos da competição internacional, ainda
que bastante turbulentos, com processos intensivos em
recursos naturais e mão-de-obra barata, com baixa
competência tecnológica e baixa capacitação gerencial.
A argumentação de Fleury e Fleury vai na linha de Bartlett
e Goshal (2000) e de Ramamurti (2004), que introduziram
novos elementos relacionados ao papel das empresas
transnacionais de países emergentes na agenda de NI.
Parte da argumentação considera que as novas
multinacionais, entrantes tardios oriundos dos países
emergentes, não possuem ativos intangíveis que se tornem
vantagens significativas para sua penetração nos mercados
internacionais (Silveira e Spohr, 2010).
Há, assim, algum ceticismo sobre a viabilidade dos late
movers na competição internacional. Em particular, Bartlett
e Goshal (2000) prevêem que as heranças de origem
(liabilities of origin) vão levar as empresas de países de
internacionalização tardia a se verem presos a mercados
internacionais de commodities, operando em posições
fracas e vulneráveis (Fleury e Fleury, 2007).
Apesar dos esforços iniciais nas últimas três décadas, a
literatura sobre as multinacionais tardias ainda não se
encontra bem desenvolvida, com muitas questões
relevantes ainda em aberto – ou seja, com grandes
oportunidades de pesquisa e de aplicação no Brasil!
Leituras sobre Negócios Internacionais
Para o leitor interessado em uma revisão mais sistemática
da literatura de NI, um ótimo texto é o Oxford Handbook of
International Business, editado por Alan Rugman e Thomas
Brewer, publicado em 2001. A editora Wiley tem dois
volumes, Handbook of International Business e o Handbook
of International Management, sendo que o primeiro,
publicado inicialmente em 1982, tem uma edição revista
recente.
Há também um manual mais didático e mais amplo,
“Negócios Internacionais: Estratégia, Gestão e Novas
Realidades”, de Tamer Cavusgil, Gary Knight e John
Riesenberger, traduzido para o português e publicado aqui
pela editora Pearson em 2010.
Os pesquisadores acadêmicos e demais estudiosos
encontrarão excelentes atualizações das principais
abordagens, feitos pelos seus próprios autores principais,
em:
•
Buckley e Casson (2010), um livro que sumariza o
entendimento mais recente dos autores sobre a teoria da
internalização e que eles denominaram “o essencial de
Buckley e Casson”. Uma versão mais compacta pode ser
encontrada no artigo de Buckley e Casson (2009) publicado
no JIBS.
•
Johanson e Vahlne (2009), um artigo que reflete o
entendimento dos autores sobre o estado atual de sua teoria.
11
•
Dunning e Lundan (2006), um dos mais importantes
artigos de John Dunning antes de sua morte.
Na verdade, os pesquisadores científicos vão se deliciar
com a edição de aniversário do JIBS de 2009, que contém
artigos que resumem duas dessas revisões acima
mencionadas, uma do modelo de Uppsala por seus
próprios autores (Johansen e Vahlne, 2009) e outra de
Buckley e Casson sobre a teoria da internalização (Buckley
e Casson, 2009).
Claramente, o estudo dos países emergentes, seus
investimentos diretos e suas empresas multinacionais é
um tema prioritário de pesquisa no cenário mundial da
área de NI. Um importante livro recente nessa linha foi
editado em 2009 por Ravi Ramamurti e Jitendra Singh,
“Emerging Multinationals in Emerging Markets”. Este livro
foi destacado pela professora Maria Teresa Fleury em sua
carta de apresentação ao encontro da AIB no Rio, em
2010.
No Brasil, já existem várias publicações em NI, refletindo
o crescente amadurecimento da produção intelectual
brasileira neste campo. Na área científica, várias revistas
publicam artigos na área de NI. Há uma revista
especializada, a InternexT - Revista eletrônica de Negócios
Internacionais, que pode ser acessada em www.espm.br/
internext.
O quadro a seguir apresenta os principais livros já lançados
no Brasil em Negócios Internacionais.
Obras brasileiras selecionadas em Negócios Internacionais
12
Autor(es)
Título
Editora
Ano
Afonso Fleury e
Maria Tereza Leme
Fleury
Brazilian Multinationals:
Competences for
Internationalization
Cambridge
University
Press
2011
Moacir de Miranda
Oliveira Jr
Multinacionais
brasileiras –
internacionalização,
inovação e estratégia
global
Bookman
2010
Afonso Fleury
Gestão empresarial para
a internacionalização das
empresas brasileiras
Atlas
2010
Jase Ramsey e André
Almeida
(organizadores)
A ascenção das
multinacionais
brasileiras
Elsevier
2010
Marcos Amatucci
(organizador)
Internacionalização de
Empresas: Teorias,
Problemas e Casos
Atlas
2009
Eduardo Vasconcellos
(organizador)
Internacionalização,
estratégia e estrutura: o
que podemos aprender
com o sucesso da
Alpargatas, Azaléia,
Fanen, Odebrecht, Voith
e Volkswagen
Atlas
2008
Eduardo Vasconcellos
(organizador)
Internacionalização
competitiva: Braskem,
CCR, CSN, Dixtal,
Embraer, Natura
Atlas
2008
Afonso Fleury e
Maria Tereza Leme
Fleury
(organizadores)
Internacionalização e os
Países Emergentes
Atlas
2007
Fábio L. M ariotto
Estratégia Internacional
da Empresa
Thomson
2007
Ana Lucia Guedes
Negócios Internacionais
Thomson
2007
SOBEET
Internacionalização das
empresas brasileiras:
fórum de líderes
Clio
2007
André Almeida
(organizador)
Internacionalização de
empresas brasileiras:
perspectivas e riscos
Elsevier
2006
Joaquim Carlos R acy
(organizador)
Introdução à gestão de
negócios internacionais
Thomson
2006
Carlos A. Hemais
(org)
O desafio dos mercados
externos: teoria e prática
na internacionalização
da firma (Vol I e Vol II)
Mauad
2004
Angela da Rocha
(organizador)
As novas fronteiras: a
multinacionalização das
empresas brasileiras
Mauad
2003
Angela da Rocha
(organizador)
A internacionalização
das empresas brasileiras:
estudos de gestão
Mauad
2002
Fonte: informações e imagens obtidas nas páginas das editoras ou
livrarias
Um sumário da pesquisa acadêmica brasileira sobre a
internacionalização das nossas empresas –
aparentemente, o primeiro sumário no Brasil – foi produzido
por Mario Ogasavara e Gilmar Masiero (2009) e foi
apresentado no EnANPAD em 2009. Os autores revisaram
94 artigos acadêmicos brasileiros relevantes, sendo 39
capítulos de livros, 41 artigos dos anais do EnANPAD e
14 de revistas acadêmicas.
Um aspecto interessante do estudo é o perfil das citações
realizadas pelos autores brasileiros. Os 94 artigos
apresentaram 2,5 mil citações. Entre estas, três quartos
foram de autores estrangeiros, conforme mostra o quadro
a seguir. Nos artigos em revistas, a proporção de citação
de estrangeiros é ainda maior.
Perfil das citações nos estudos sobre internacionalização de
empresas brasileiras
Autocitação
4%
Autores
estrangeiros
74%
Autores nacionais
22%
Fonte: Ogasavara e Masiero (2009, p. 9)
O estudo mostra que há um caminho significativo para a
intensificação da produção nacional. Esta pode se dar pela
simples “substituição de importações” – uma analogia à
estratégia de industrialização protecionista e de baixa
competitividade perseguido pela economia brasileira na
segunda metade do século passado – ou por outras vias.
Note-se que, como defendem Ogasavara e Masiero, o
elevado peso das citações estrangeiras é positiva, por
revelar que a produção brasileira dialoga com a
internacional, mas também é preocupante, ao se observar
uma simples aplicação e replicação das abordagens
estrangeiras.
Comentários finais: o futuro de NI no Brasil
O processo de internacionalização das empresas
brasileiras está em pleno andamento. Como várias
empresas brasileiras estão no começo, ou no meio deste
processo, é provável que novos passos serão dados e que
os investimentos diretos no exterior se sustentarão em
patamar elevado ainda por muitos anos. Esta é uma
predição que pode ser avaliada à luz das principais teorias
comportamentais que antecipam, de certa forma, uma
inércia no processo de internacionalização: na medida em
que se inserem nas redes relevantes no mercado
internacional, as possibilidades de novos negócios se
multiplicam.
O processo, entretanto, não está isento de riscos. Em
primeiro lugar, há o risco apontado pelos “pessimistas da
internacionalização tardia”, que não vêem inovação e
competitividade suficientes para a sustentação do
movimento. O “pessimismo” de alguns teóricos da
industrialização tardia deve ser levado a sério, no mínimo,
como advertência. Os antídotos contra esses riscos
incluem, portanto, ênfase em esforços de inovação e de
promoção de competitividade genuína.
Em segundo lugar, há o importante risco de se investir na
criação de “campeões nacionais”, que se internacionalizam
sem a devida sustentação, mas por escolha discricionária
de governos. Invariavelmente, isso dá através de iniciativas
travestidas de políticas públicas, com justificativas
equivocadas. A história empresarial do mundo e até mesmo
do Brasil contém eloqüentes exemplos de fracassos
baseados em excesso de proteção e de voluntarismo
governamental na seleção artificial de empresas. A conta
recai, na maioria desses casos, sobre toda a sociedade,
penalizando contribuintes e consumidores, inclusive das
gerações seguintes.
Por outro lado, o processo de internacionalização das
empresas parece irreversível: é fundamental que as
empresas brasileiras e estrangeiras que operam no Brasil
avancem para padrões mundiais, o que inevitavelmente
implica na sua expansão ao além-mar. A
internacionalização de muitas dessas empresas pode ser
uma dura prova para evidenciar a sua competitividade
efetiva.
Seria um retrocesso se retornarmos ao tempo, anterior ao
Plano Real, em que o sucesso no Brasil não estava
relacionado à competitividade genuína, mas sim ao apoio
público, a proteção excessiva, a regras especiais de
formação de preços e a um grande número de expedientes
estranhos à competição.
A pesada carga tributária e as deficiências de infraestrutura
também contribuem para a internacionalização – melhor
caracterizada, neste caso, como expulsão de empresas
– mas é preciso enfrentar estes desafios, que o país vem
evitando, porém é necessário fazê-lo com muito mais
energia.
O quadro atual, entretanto, é de manutenção de elevados
patamares de investimentos diretos brasileiros, de
consequente crescimento do estoque de capitais
brasileiros no exterior, e de necessidade de políticas
públicas mesmo com os riscos delas decorrentes. Há,
portanto, justificativas de sobra para se impulsionar a
pesquisa em Negócios Internacionais no Brasil. Há espaço,
ainda, para a promoção de novos investimentos a partir do
melhor entendimento dos processos estratégicos e de
gestão que estão envolvidos na internacionalização das
empresas brasileiras.
Hoje, o esforço de pesquisa nos parece pequeno frente à
magnitude dos desafios do país e de suas empresas no
mercado internacional. É fundamental que a Academia se
beneficie do amplo estoque de conhecimento que, há pelo
menos cinco décadas, vem sendo acumulado no
entendimento do investimento direto e dos negócios
internacionais.
O melhor a esperar de nós, que nos dedicamos aos
Negócios Internacionais no Brasil, é que não sejamos
meros sujeitos de um processo de “substituição de
importações” do conhecimento internacional pela produção
interna de artigos na área. De fato, boa parte do
conhecimento utilizado na área é hoje importado: conforme
estudo recente, três quartos das citações nos artigos
brasileiros se referem a artigos estrangeiros.
Nossa melhor contribuição à internacionalização brasileira
será dada se nos tornarmos competitivos na produção do
conhecimento específico, ocupando um papel relevante
13
no cenário internacional, notadamente no que se refere à compreensão do investimento direto brasileiro, da
internacionalização tardia de nossas empresas e de outros fenômenos dos países em desenvolvimento.
Políticas públicas bem desenhadas e efetivas para a internacionalização sustentável das empresas brasileiras seriam
uma decorrência natural e provável do fortalecimento da pesquisa na área de Negócios Internacionais, no Brasil.
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14
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SOBEET- SOCIEDADE BRASILEIRA DE ESTUDOS DE EMPRESAS TRANSNACIONAIS E DA GLOBALIZAÇÃO ECONÔMICA
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