Revista Nures no 15 – Maio/agosto 2010 – http://www.pucsp.br/revistanures
Núcleo de Estudos Religião e Sociedade – Pontifícia Universidade Católica – SP ISSN 1981-156X
Religiões afro-brasileiras. Da degenerescência à herança nacional: lendo Nina Rodrigues*
Rosenilton Silva de Oliveira1
Resumo
Nina Rodrigues pertenceu a um grupo de intelectuais brasileiros que estava disposto a apresentar
"soluções" para o "problema" da miscigenação no Brasil no final do século XIX. Com base em
teorias evolucionistas, assumiu o aspecto poligênico das raças humanas e apresentou a mestiçagem
como degeneração da espécie. Segundo ele, as religiões afro-brasileiras eram exemplos irrefutáveis
da degeneração e a legislação penal deveria ser alterada a fim de acompanhar a realidade social pósescravidão. Ele realizou muitas pesquisas com a população negra e mestiça na Bahia e escreveu a
primeira etnografia sobre as casas de candomblé na cidade de Salvador. Este artigo focaliza os dois
principais livros de Nina Rodrigues: O Animismo fetichista dos negros baianos e Mestiçagem,
degenerescência e crime. Defendo que, atualmente, os mesmos exemplos usados por Nina
Rodrigues para provar a inferioridade racial dos negros, em outras palavras, as religiões afrobrasileiras, têm sido invocados como uma estratégia eficaz para a preservação da identidade dessa
população.
Palavras-chave: religiões afro-brasileiras, Nina Rodrigues, mestiçagem.
Abstract
Nina Rodrigues belongs to a group of Brazilian intellectuals that was disposed to present
“solutions” for the “problem” of the miscegenation in Brazil by the end of the 19th century. Based
on evolutionist theories, he assumed the polygenic aspect of the human race and presented the
miscegenation as degeneration of the species. According to him, the Afro-Brazilian religions were
irrefutable examples of that degeneration and the criminal legislation should be changed in order to
follow the post-slavery social reality. He carried on many researches with the black and mestizo
population in Bahia and wrote the first ethnography about Candomblé houses in the city of
Salvador. This paper focus on the two main Nina Rodrigues´ books: O animismo fetichista dos
negros baianos (The fetishistic animism of the blacks from Bahia) e Mestiçagem, degenerescência e
crime (Miscegenation, degeneration and crime). I argue that nowadays the same examples used by
Nina Rodrigues to prove the racial inferiority of blacks, in other words, the Afro-Brazilian religions,
have been invoked as an effective strategy for the preservation of the identity of that population.
Keys-words: Afro-Brazilian religions, Nina Rodrigues, miscegenation.
* Uma versão preliminar desse texto foi apresentado como trahalho final na disciplina Uma história da antropologia
brasileira, no primeiro semestre de 2009 no programa de pós-graduação em antropologia social da Universidade de São
Paulo. Agradeço a prof. dra. Lilia Katri Moritz Schwarcz, ministrante do curso, pelas profícuas sugestões e,
ingualmente, ao prof. dr. Vagner Gonçalves da Silva que analisou essa a versão final.
1
Mestrando em antropologia social na Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas - Universidade de São Paulo.
Bolsista CAPES. Contato: [email protected].
Revista Nures no 15 – Maio/agosto 2010 – http://www.pucsp.br/revistanures
Núcleo de Estudos Religião e Sociedade – Pontifícia Universidade Católica – SP ISSN 1981-156X
Introdução
Este texto tem por objetivo fazer uma leitura da obra de Raimundo Nina Rodrigues e
mostrar, em contraste com o debate contemporâneo, de que forma as religiões afro-brasileiras foram
utilizadas como fenômeno empírico demonstrativo da inferioridade do negro e, agora, são
invocadas para ressaltar e valorizar a herança negra na constituição da sociedade brasileira.
A partir da análise de dois textos – O animismo fetichista dos negros baianos (2006) e
Mestiçagem, degenerescência e crime (2009) – demonstrarei a construção e fundamentação da sua
tese. Num segundo momento, observarei como esses mesmos argumentos são invocados com um
sentido simetricamente oposto.
As teorias do médico maranhense não são frutos do acaso, ou de uma mente isolada, pelo
contrário, estão inseridas num contexto bastante preciso: o das teorias evolucionistas do século
XIX. Ao retomá-las, não pretendo estigmatizar o autor maranhense, mas demonstrar o quanto suas
observações motivam o debate contemporâneo sobre religiões e raça no Brasil.
Nina Rodrigues e a condição do negro baiano
Raimundo Nina Rodrigues, professor na Faculdade de Medicina da Bahia, foi um dos
muitos intelectuais que se dispôs a apresentar uma solução para o problema da mestiçagem
brasileira. De formação evolucionista, desenvolveu muitos trabalhos com a população negra e
mestiça baiana. Motivado primeiramente por questões de saúde pública, reafirma a poligenia das
raças humanas conferindo-as um estatuto de realidades estanques aonde qualquer forma de
mestiçagem produz a degenerescência da espécie.
No final do século XIX, a jovem República brasileira procura atribuir liberdade e igualdade
de direitos entre todos os cidadãos brasileiros através do novo código penal. Nina Rodrigues,
assumindo o darwinismo social, entende que não há igualdade ontológica entre as raças, o que torna
impossível a universalização da lei. Defende a necessidade de um código capaz de absorver essas
desigualdades. Conforme Lilia Schwarcz (2009: 93) “o suposto era o da ‘desigualdade’ e, portanto,
da necessidade de criação de códigos penais distintos que permitisse estabelecer responsabilidades
atenuadas.”.
Em Mestiçagem, degenerescência e crime (1894), após observar a situação socio-material
da população negra e mestiça de Serrinha, Bahia, reafirma por meio de uma série de exemplos que a
mistura de raças produz degenerescência. Embora considere que as condições insalubres colaborem
Revista Nures no 15 – Maio/agosto 2010 – http://www.pucsp.br/revistanures
Núcleo de Estudos Religião e Sociedade – Pontifícia Universidade Católica – SP ISSN 1981-156X
para o desenvolvimento de “anomalias”, entende esse fato como mais um elemento revelador da
incapacidade mental de auto organização. No cruzamento entre raças, a “inferior” sempre degenera
a “superior”. O crime é, nesse contexto, fruto de uma incapacidade de adaptação às normas da
sociedade.
Publicado primeiramente como artigos na Revista Brazileira entre 1896 e 1897, O animismo
fetichista dos negros baianos (2006), pautado em etnografias realizadas nas casas de candomblés
baianas, apresenta sistematicamente, a gramática das religiões afro-brasileiras, como uma das
maiores expressões da inferioridade do negro. Constata que o fetichismo africano está disseminado
na população baiana. Afirmar que a Bahia é cristã, é um erro, considerando o número de negros e
de africanos que não se desvencilharam totalmente de seus costumes religiosos de origem em
virtude de sua incapacidade de adesão a uma religião superior e abstrata como o cristianismo.
As tentativas de catequese falharam, pois o catolicismo fora adaptado ao fetichismo africano
para torná-lo assimilável. Essa justaposição dos santos católicos aos orixás, descrita no capítulo
Ilusões da catequese no Brasil, corresponde a incapacidade intelectual de distinção e aceitação de
mistérios do cristianismo.
Em resumo, Nina Rodrigues conclui: 1) a espécie humana é poligênica, sendo a raça branca
superior a negra e a mestiçagem é uma forma de degenerescência que deve ser evitada; 2) a baixa
situação socioeconômica, os crimes e as enfermidades dos negros e mestiços são expressões da
inferioridade e degenerescência. 3) a religião (fetichismo) é a prova cabal da impossibilidade de sua
evolução e revela o mal que causam a sociedade já que na Bahia “todas as classes, mesmo as ditas
superiores, estão aptas a se tornarem negras [...] é que no Brasil o mestiçamento (sic) não é só físico
e intelectual, é ainda afetivo ou dos sentimentos, religioso igualmente, portanto” (NINA
RODRIGUES, 2006: 116).
Para Nina Rodrigues o Estado deveria estabelecer um código penal específico para os
negros, pois biologicamente eles são diferentes, isto é, inferiores e incapazes de compreender a
legislação e a moral tal como elas estão impostas aos brancos.
Esse mesmo paradigma será retomado nos dias de hoje assumindo nova face. Não se fala
mais em inferioridade racial, porque biologicamente ela não existe, porém os movimentos negros
invocam a noção de desigualdade social e, através das ações sociais, defende um tratamento
socialmente desigual ao negro para possibilitar sua ascensão social com as mesmas condições dos
brancos. No universo religioso, o problema também coloca-se: a Igreja Católica, trabalhando com o
conceito de “marginalizado” 2, defende a integração dos afrodescendentes na sociedade também
através de suas expressões culturais.
2
A noção de “marginalização” surgiu na Igreja Católica a partir da década de 1950 com o desenvolvimento da Teologia
da Libertação. Esse movimento teológico, encabeçado por teólogos latino-americanos, ressaltou a dimensão social da
Revista Nures no 15 – Maio/agosto 2010 – http://www.pucsp.br/revistanures
Núcleo de Estudos Religião e Sociedade – Pontifícia Universidade Católica – SP ISSN 1981-156X
Religiões afro-brasileiras. Da degenerescência à herança nacional
No inicio do século XX o país experimenta novo debate intelectual sobre a definição da
identidade nacional. O movimento modernista rejeita o índio e elege o mestiço como ícone nacional
entendendo que o Brasil se faz do encontro de várias culturas, principalmente da indígena, da
africana e da européia. Nesse contexto símbolos antes estigmatizados por pertencerem às raças
consideradas inferiores são habilitados como sendo da cultura nacional.
No tocante as expressões culturais, há um grande problema: todos os elementos
considerados da cultura negra estão diretamente relacionados com a religião. A saída encontrada
para tentar fugir desse impasse foi absorver essa religiosidade como mais um item cultural, para
tanto era preciso encontrar a “religião afro-brasileira pura”.
Muitos estudiosos, seguindo as pistas de Nina Rodrigues, pesquisaram as religiões afrobrasileiras, e consideraram os candomblés nagôs como guardiões dessa “pureza africana”. Arthur
Ramos, partindo de uma análise culturalista, afirma ser as culturas e não as raças que se colocam
em relação de superioridade e inferioridade; concorda com a suposta superioridade da cultura
sudanesa sobre a banto. Roger Bastide (1985; 2001) vê nos candomblés nagôs um lugar de
resistência e preservação da cultura africana e chega a falar em pedaços da África no Brasil.
Beatriz Góes Dantas (1988) demonstra, após analisar o Xangô em Recife, que a noção de
pureza nagô foi construída pela ação dos acadêmicos ao elegerem alguns sinais diacríticos como
sinais de pureza, transformando a categoria nativa em categoria analítica, com o passar do tempo
muitos candomblés reproduziram e internalizaram essas interpretações. James L. Matory (1998)
discorda, afirma que a pureza nagô não é invenção dos acadêmicos, mas construída num processo
diaspórico transatlântico pelas elites iorubas do século XIX e XX. Vagner Gonçalves da Silva
equaciona essas posições: se por um lado houve a agência de uma elite “iorubana”, por outro, a elite
brasileira aceitou e corroborou essas afirmações. Há uma troca entre o mundo do terreiro e o da
academia, e o impacto de um sobre o outro. Falar de “pureza nagô”, portanto, pressupõe considerar
as disputas políticas e simbólicas que envolvem os discursos (Silva, 2000 e comunicação pessoal).
Se num primeiro momento o Estado reprime as religiões afro-brasileiras como feitiçaria
(Yvonne Maggie, 1992); depois, com o apoio de intelectuais, lideres religiosos e artistas constrói a
idéia da magia como cultura. Nesse sentido Jocélio T. Santos (2005) demonstra que o trânsito
desses agentes entre o terreiro e o governo possibilitou a formação de alianças benéficas para
Igreja e a sua dedicação preferencial pelos pobres e oprimidos. Essa postura foi validada oficialmente pela Igreja nos
anos seguintes através das Conferencias Episcopais de Medelim, Puebla, e mais recentemente em Aparecida.
Revista Nures no 15 – Maio/agosto 2010 – http://www.pucsp.br/revistanures
Núcleo de Estudos Religião e Sociedade – Pontifícia Universidade Católica – SP ISSN 1981-156X
ambos: os candomblés deixam de ser perseguidos e tidos como inferiores ao mesmo tempo em que
reforçam a ideologia multiculturalista e tolerante, gestado pelas políticas estatais e disseminado no
imaginário da população brasileira.
Os efeitos dessa mudança radical de paradigma foram observados em outros setores da
sociedade. Van de Port (2005), por exemplo, estuda a ligação das religiões afro-brasileiras com os
movimentos ecológicos, homossexuais e negros, pois essas religiões cultuam deuses associados à
natureza, possuem um ethos3 onde o ser humano é concebido de maneira holística e a noção de bem
e mal são relacionais de acordo com a cosmologia religiosa.
A criação de institutos e fundações responsáveis em pesquisar, resgatar e preservar o
patrimônio cultural negro foi fundamental no processo de transformação de alguns objetos e
espaços do candomblé em monumentos. Considerando que a herança não é apenas material, mas
também imaterial, para Roger Sansi (2007) criou-se “um reconhecimento, uma dignidade, um valor
que pudesse fazer dos monumentos negros equivalente aos monumentos da ‘alta cultura’, e não ao
da ‘cultura popular” (Sansi: 2007, 121). Nesse processo alguns dos elementos invocados para o
tombamento de templos religiosos católicos (valor arquitetônico, preservação ambiental, elementos
etno-religiosos) também foram utilizados para os terreiros4.
Conforme apontamos acima o Brasil experimentou no início do século XX um momento
histórico e social que o obrigou a repensar sua “identidade nacional”; nesse contexto não se pode
menosprezar que até pouco tempo a Igreja Católica era considerada como religião oficial do país,
isso na prática significa dizer que a religião era também Estado, ou ainda: os atos cívicos de certa
forma passavam por um processo de sacralização para adquirirem plena validade. Mesmo depois da
separação das esferas o catolicismo continuou gozando de uma posição privilegiada em relação as
outras expressões religiosas.
Nina Rodrigues no capítulo Ilusão da catequese no Brasil cita trechos de jornais que
relatavam a necessidade de combater os feiticeiros que deturpavam a moral e os bons costumes. Por
exemplo, um feitiço depositado as portas do edifício da câmara, em Salvador, como forma de conter
um embate entre políticos opositores, revela “um modo de intervenção da população fetichista da
cidade tão lógico e legítimo na sua manifestação sociológica, quanto era natural a intervenção do
digno prelado arquidiocesano que, conferenciando com os chefes dos dois grupos litigantes,
procurava restabelecer a paz e concórdia na família baiana” (NINA RODRIGUES, 2006:119).
É preciso ainda considerar que a categoria cultura substituiu, de certa forma, o conceito raça.
Validada a tese da monogenia da espécie humana, a diversidade foi explicada através da cultura,
dito de outra forma: há apenas uma ‘raça’ humana, porém é múltipla a sua expressão através da
3
Rita Amaral (2002) apresenta de maneira brilhante o jeito de ser do povo-de-santo.
Jocélio T. Santos (op. Cit.) descreve o processo para o tombamento do primeiro terreiro de candomblé na Bahia.
Vagner Gonçalves da Silva (1995) observa ação semelhante em São Paulo.
4
Revista Nures no 15 – Maio/agosto 2010 – http://www.pucsp.br/revistanures
Núcleo de Estudos Religião e Sociedade – Pontifícia Universidade Católica – SP ISSN 1981-156X
cultura; assim a natureza é tida como universal e a cultura como particular. Para além dos debates
contemporâneos sobre esse tema os quais tentam romper com essa dicotomia, no momento histórico
em que observamos é importante perceber o surgimento dessa nova categoria para se pensar a
diferença humana.
A Igreja Católica, a partir da década de 1960, utiliza essa categoria para pensar as
especificidades de cada povo. Dada a sua preocupação em manter-se como religião universal,
através do documento Ad Gentes5, ela estabelece e reconhece nas múltiplas culturas a presença do
deus cristão, ou seja, deus também pode ser encontrado nas mais diversas expressões religiosas. Ao
fazer isso ela dá margem para validar a igualdade entre os povos e também a importância das
diversidades cultural.
Analisando o mesmo tema a partir do caso indígena, Marcos Rufino atesta esse fato, suas
conclusões são bastante ilustrativas: “essa mudança nos instrumentos intelectuais é alimentada por
alterações na percepção que esses agentes [missionários católicos] realizam acerca da diversidade
cultural, ela é simultaneamente, responsável por nutrir uma sensibilidade do aparelho missionário
diante dessa percepção” (Rufino, 2006: 253).
Aqui há uma inversão simétrica da tese de Nina Rodrigues: ao invés de afirmar que a
natureza inferior do negro africano e do crioulo os tornam incapazes de assimilarem os dogmas
cristãos, por isso a cosmologia cristão é justaposta com o fetichismo africano, o discurso da Igreja
Católica entende esse processo como inculturação, ou seja, revelação da fé cristã na cultura própria
do outro.
As religiões afro-brasileiras não são provas de degenerescência ou inferioridade, como
queria Nina Rodrigues, mas da igualdade entre as raças tornando o negro capaz de ser evangelizado.
Valorizar a cultura negra é revelar sua forma especifica de rezar, ou inversamente: ao se valorizar a
expressão religiosa do negro, valoriza-se também a sua cultura. Nesse contexto a mestiçagem não
produz degenerescência, pelo contrário, ela coloca as culturas em diálogo possibilitando a
existência harmônica da espécie humana.
Esse processo de valorização da cultura negra dentro da Igreja Católica tem sido
desenvolvido desde os anos de 1980 através da Pastoral6 Afro, criada quando começaram os
preparativos para a comemoração dos cem anos da abolição da escravidão no Brasil. Nessa
oportunidade, a Igreja Católica reservou o ano de 1988 para a realização de uma Campanha da
5
“Sobre a atividade missionária da Igreja”. Esse documento foi promulgado pela Igreja Católica em 1965 durante a
realização do Concílio Vaticano II (1960-1965) – evento em que os bispos católicos reunidos repensaram as estratégias
de atuação da Igreja Católica no mundo.
6
Pastoral é um organismo da Igreja Católica responsável em colocar em pratica as estratégias de ação a igreja. Elas são
organizadas de acordo com as necessidades materiais, sociais e “espirituais” onde se encontra a igreja local.
Revista Nures no 15 – Maio/agosto 2010 – http://www.pucsp.br/revistanures
Núcleo de Estudos Religião e Sociedade – Pontifícia Universidade Católica – SP ISSN 1981-156X
Fraternidade7 sobre o negro, com o lema “Escutai o clamor do teu povo”, na qual procurou
denunciar a situação de miséria, abandono e preconceito em que vivia a população negra no país.
Através das “missas afro” a Igreja Católica também se mostrasse empenhada em integrar o
negro tanto na sociedade quanto no seu interior. Na prática isso significou incluir na litúrgia
elementos considerados da cultura negra: ritmos musicais, cores, alimentos, danças entre outrosç
revelando o “jeito negro de rezar”.
É possível argumentar, por fim, que essa abertura interna para acolher o outro é um
fenômeno que se manifesta na sociedade brasileira: a ênfase na diferença cultural como marca
própria da identidade nacional.
Com isso, os exemplos apresentados por Nina Rodrigues como demonstrativos da
inferioridade do negro agora são revisitados para demonstrar como eles não são inferiores, nem
expressões da degenerescência da raça negra, mas como uma estratégia eficaz para a preservação da
própria identidade.
Referencias bibliográficas
AMARAL, Rita, Xirê, o modo de crer e de viver no candomblé,. Rio de Janeiro, Pallas, 2002.
BASTIDE, Roger, As Religiões Africanas no Brasil, São Paulo, Pioneira, 1985.
_____, O candomblé da Bahia. São Paulo, Companhia das Letras, 2001.
CNBB, Pastoral afro-brasileira, São Paulo, Paulus, 2002 - Coleção Estudos da CNBB nª 85.
DANTAS, Beatriz Góes, Vovó Nagô e Papai Branco, Rio de Janeiro, Graal. 1988.
HOFBAUER, Andreas, Uma história de branqueamento ou o negro em questão, São Paulo,
UNESP, 2006.
MAGGIE, Yvonne - Medo de Feitiço: Relações entre magia e poder no Brasil. Rio de Janeiro.
Arquivo Nacional. 1992.
MATORY, J. Lorand, “Yorubá: As rotas e as raízes da nação transatlântica, 1830-1950". In:
Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, Brazil, 4(9): 263-292; 1998.
NINA RODRIGUES, Raimundo, O animismo fetichista dos negros baianos, Rio de Janeiro,
Fundação Biblioteca Nacional/Editora UFRJ, 2006.
_____.
7
Mestiçagem,
degenerescência
e
crime,
1894,
Disponível
http://www.pagu.unicamp.br/?q=node/21, Acesso em 27, junho 2009.
em:
A Campanha da Fraternidade é um evento realizado anualmente pela Igreja Católica através da Conferencia Nacional
dos Bispos do Brasil (CNBB) e da Cáritas Brasileira, ela tem dois objetivos principais: conscientizar a população sobre
determinado problema social e arrecadar fundos para empreender ações. Os temas são escolhidos anualmente.
Revista Nures no 15 – Maio/agosto 2010 – http://www.pucsp.br/revistanures
Núcleo de Estudos Religião e Sociedade – Pontifícia Universidade Católica – SP ISSN 1981-156X
RUFINO, Marcos Pereira, O código da cultura: o CIMI no debate da inculturação. In: Montero,
Paula, Deus na aldeia: missionários, índios e mediação cultural, Rio de Janeiro, Globo,
2006. P.235-276.
SANSI, Roger. Fetishes and Monuments: Afro-Brazilian Art and Culture in the Twentieth Century.
New York: Berghahn Books, 2007.
SANTOS, Jocélio Teles, O poder da cultura e a cultura no poder: a disputa simbólica da herança
cultural negra no Brasil, Salvador, Edfuba, 2005.
SCHWARCZ, Lilia Katri Moritz. Quando a Desigualdade é Diferença: Reflexões sobre
Antropologia Criminal e Mestiçagem na Obra de Nina Rodrigues. Gazeta Médica da
Bahia, 2006, n.76 (Suplemento 2). p. 47-53.
_____, Nina Rodrigues: um radical do pessimismo, In: idem (org), Um enigma chamado Brasil: 29
intérpretes e um país, São Paulo, Companhia das Letras, 2009, p. 90-103.
SILVA, Vagner Gonçalves da, Construção e legitimação de um campo do saber acadêmico (19001960), Revista USP, São Paulo, n. 55. setembro/novembro 2002. p.82-111.
_____ Orixás da Metrópole, Petrópolis, Vozes, 1995.
VAN DE PORT, Mattijs, Candomblé in pink, green and black. Re-scripting the Afro-Brazilian
religious heritage in the public sphere of Salvador, Bahia. Social Anthropology, 2005, 13,
p.1 3-26.
VIER, Frederico (coord.), Compêndio do Concílio Vaticano II, Petrópolis, Vozes, 1986.
Download

Religiões afro-brasileiras. Da degenerescência à herança - PUC-SP