AZULEJOS EM BRASÍLIA AZULEJOS EM LISBOA Athos Bulcão e a tradição da azulejaria barroca Tile from Brasília – Tile from Lisbon Athos Bulcão and the baroque tiling tradition Museu Nacional do Azulejo – Lisboa Fundação Athos Bulcão – Brasília 2013 The relations between Brazil and Portugal go back to the instauration of the Brazilian national imagery. We have inherited the language, customs, culture, tastes, and music; we have mixed our beliefs, stories, and our art. In general, the Portuguese culture was responsible for introducing the great European artistic movements in the colonial Brazil. Our literature, painting, sculpture, decorative arts and architecture inevitably had inspirations coming from overseas. As relações entre o Brasil e Portugal remontam à própria instauração do imaginário nacional brasileiro. Herdamos o idioma, costumes, culturas, sabores e música; misturamos nossas crenças, histórias e nossa arte. De forma geral, a cultura portuguesa foi responsável pela introdução dos grandes movimentos artísticos europeus no Brasil colônia. Inevitavelmente, nossa literatura, pintura, escultura, artes decorativas e arquitetura tiveram inspirações vindas de além-mar. For Brazil, the subversion of this profound learning about the European culture determines the creation of an autonomous culture, at the turn of the 20th century. Para o Brasil, a subversão desse profundo aprendizado da cultura europeia determina a criação de uma cultura com caráter autônomo, já na virada do século XX. Athos Bulcão, a “carioca” from Catete and a Brazilian by choice, found in the tilery art integrated to architecture his greatest artistic expression. The recovery of the façade tile, which coincides with the renewal of the Brazilian architecture started in the 1930s, has in Oscar Niemeyer one of its main renewers. He saw the tile as a modular composition, on industrial scale; with Athos, his most frequent collaborator, this integrated art reaches its highest level in Brasília. Athos Bulcão, carioca do Catete e brasiliense por escolha, teve na arte azulejar integrada à arquitetura sua maior expressão artística. A retomada do azulejo de fachada, que coincide com a renovação da arquitetura brasileira iniciada nos anos 1930, encontra em Oscar Niemeyer um dos seus principais renovadores. Encarando o azulejo como composição modular, em escala industrial, e em parceria com Athos, seu mais regular colaborador, essa forma de integração alcança em Brasília o ponto máximo. In 2013, when we celebrate the Year of Brazil in Portugal, the Athos Bulcão Foundation, which is responsible for preserving and promoting this important Brazilian artist’s work, is pleased to present the exhibition Tile from Brasília – Tile from Lisbon. Athos Bulcão and the baroque tiling tradition. Brasília, May, 2013 Valéria Maria Lopes Cabral Executive Secretary – Fundação Athos Bulcão Em 2013, quando comemoramos o Ano do Brasil em Portugal, a Fundação Athos Bulcão, instituição responsável pela preservação e divulgação da obra desse importante artista brasileiro, tem o enorme prazer de apresentar no Museu Nacional do Azulejo, em Lisboa, a exposição Azulejos em Brasília – Azulejos em Lisboa. Athos Bulcão e a tradição da azulejaria barroca. Brasília, maio de 2013 Valéria Maria Lopes Cabral Secretária Executiva – Fundação Athos Bulcão À esquerda, painel do Salão Verde do Congresso Nacional, 1971 Left, panel of the Green Hall, National Congress, 1971 3 The CCR Group has a close relation to Portugal. It has long been committed to supporting cultural projects which show the power of Portugal and its influence in Brazilian culture. Therefore, it is with great pride that the CCR Group sponsors the exhibition Azulejos em Brasília – Azulejos em Lisboa (Tile from Brasília – Tile from Lisbon. Athos Bulcão and the baroque tiling tradition), featuring works by the great artist Athos Bulcão. Such support reinforces CCR’s proximity to and its interest in relation to such rich, multifaceted cultures, especially in the year that celebrates the relation between Brazil and Portugal. Renato Vale, president of the CCR Group, one of the largest infrastructure concession companies in the world. À esquerda, Athos Bulcão – painel externo do Brasília Palace Hotel, 1958 Left, Athos Bulcão – External panel of the Brasília Palace Hotel, 1958 A CCR tem uma relação muito próxima com Portugal. Temos um histórico de apoio a projetos culturais que mostram a força de Portugal e a sua influência na cultura brasileira. Portanto, é um grande orgulho patrocinar a exposição Azulejos em Brasília – Azulejos em Lisboa. Athos Bulcão e a tradição da azulejaria barroca, do brilhante artista plástico Athos Bulcão. Um apoio que reforça a nossa proximidade e o nosso interesse em relação a duas culturas tão ricas e cheias de facetas, sobretudo em um ano em que são comemoradas as relações entre o Brasil e Portugal. Renato Vale, presidente do Grupo CCR, um dos maiores grupos de concessões de infraestrutura do mundo. 5 The tile, a first-rate architetonic and decorative covering, has come a long way since the end of the 15th century, and it pervades in the global contemporaneity. The tile, an identity element in the Portuguese culture, reflects the encounter between Portuguese folks with other cultures and civilization, incorporating the news brought by the Eastern and Brazil, where it has assumed a remarkable role. With deep roots in the Islamic world, from which it has inherited the names zulaicha or zuleija, some techniques such as cuerda seca, cuenca (arris), and the geometric decoration – these small ceramic squares covered with colorful glazes, which arrived from Seville in the beginning of the 15th century, covered churches and palaces, changing deeply the spaces, causing a great decorative and luminal effect. The majolica technique used in Portugal in the beginning of the 16th century made it possible for a more nuanced palette as well as for the reproduction of a great variety of themes devoted to classical, religious, and civil inspiration, influenced by Italian-flamish compositions. The tiles, in Portugal, were thought of as a structuring element of architecture in great internal coverings, which were an innovative continuation of the first applications of the Seville-like tiles - the recurrent modules, in the 17th century Added to the polychromatic patterns, ornamental compositions of brutesque and grotesque, registers with the representation of Blessed Virgin or the saints, which are present in the great narrative cycles of the 17th century, À esquerda, azulejos de São Luís do Maranhão Left, tiles, São Luís do Maranhão O azulejo, revestimento arquitetónico e decorativo de excelência, percorreu um longo percurso, que se inicia nos finais do século XV, na Península Ibérica, e prossegue na contemporaneidade global. Elemento identitário da cultura portuguesa, o azulejo reflete o encontro das lusas gentes com outras culturas e civilizações, incorporando as novidades trazidas do Oriente e do Brasil, país onde assumiu um protagonismo notável. Com profundas raízes no mundo islâmico, do qual herdou o nome – zulaycha ou zuleija –, algumas técnicas (alicatado, corda seca e aresta) e a decoração geométrica, estes pequenos quadrados cerâmicos cobertos de vidrados coloridos que nos chegaram de Sevilha no início da centúria de quinhentos revestiram igrejas e palácios, metamorfoseando os espaços com grande efeito decorativo e lumínico. A técnica de majólica, utilizada em Portugal a partir de meados do século XVI, tornou possível uma paleta mais matizada e a reprodução de grande variedade de temas de inspiração clássica, religiosa e civil através de composições, na sua maioria de influência italo-flamenga. Continuação inovadora das primeiras aplicações de azulejos de padrão sevilhanos, foi com os módulos de repetição do século XVII que o azulejo foi pensado em Portugal como elemento estruturante de arquiteturas em grandes revestimentos interiores. Aos padrões policromos, composições ornamentais de grotescos e brutescos, registros com representação da Virgem ou dos 7 santos, que estão na origem dos grandes ciclos narrativos setecentistas, juntar-se-ia, em meados do século XVII, o exotismo proporcionado pela visão macroscópica do mundo, notável legado dos descobrimentos, quer através de elementos botânicos e zoológicos, inspirados em tecidos pintados ou bordados, especialmente de matriz indo-portuguesa, mas também chinesa, quer através de índios brasileiros, em painéis figurativos. No final da centúria, assiste-se a uma redução gradual da paleta cromática e a grandes encomendas a oficinas holandesas de painéis pintados a azul sobre branco de grandes dimensões, que marcaram de forma indelével a azulejaria portuguesa, obrigando as olarias nacionais a recorrerem a artistas qualificados que começaram a assinar as suas obras, dando início ao notável período denominado por Ciclo dos Mestres. Na continuidade do trabalho dos mestres, iniciou-se, no segundo quartel do século XVIII, a chamada “Grande Produção”, que manteve a paleta azul e branca enchendo palácios, igrejas e conventos em Portugal e no Brasil, representando cenas civis, religiosas, mitológicas, entre outras, em discursos adaptados aos espaços a que se destinavam. 8 Na segunda metade do século XIX, a prática de colocar azulejos industriais nas fachadas de edifícios, na sua maioria de rendimento, alterou a feição das cidades portuguesas, sendo durante muito tempo considerada uma moda de origem brasileira, pelo sucesso que esta prática teve neste país, onde o azulejo português foi grandemente usado com o mesmo fim. are the exoticism given by the macroscopic view of the world, remarkable legacy of discoveries, either by the botanical and zoological elements, inspired by the painted or embroidered fabrics, especially in the hindi-portuguese matrix, also the Chinese, or by the Brazilian indians, in figurative panels. At the end of the century, one can see a gradual reduction in the chromatic palette as well as a decrease in ordering large panels painted in blue over white (from the Netherlands), which marked the Portuguese tiling, forcing the national potteries request qualified artists to sign their works. A remarkable period called The Cycle of Masters initiated. On the second half of the 18th century, following the Masters’s works, the Great Production was started – it maintained the blueover-white palette – filling the palaces, churches, and convents in Portugal and Brazil, depicting life, religious, mythological scenes, among others, adapted to the contexts they were referred to. On the second half of the 19th century, the technique of placing the industrial tiles on the building façades modified the face of the Portuguese cities, being considered, for a long time, a fashion coming from Brazil, where the Portuguese tile had been widely used for the same purpose. great public constructions and remodeling the way the Portuguese cities were modernized is due to the concepts which led the architect Lúcio Costa build the Gustavo Capanema building or the Capanema Palace, also known as the Ministry of Education and Culture (MEC), in Rio de Janeiro – covered in Portinari’s tiles. This approach had its continuation in Oscar Niemeyer, which can be seen in the Pampulha Complex, in Belo Horizonte, and also in the local masterpiece – the San Francisco Church, with a rich architectural integration of Portinari’s tiling, the first building in Brazil to be declared a monument. Niemeyer’s architecture was again integrated to the tile, now Athos Bulcão’s, envisaging the city of the future, which became the new capital, Brasília. Maria Antónia Pinto de Matos Director – Museu Nacional do Azulejo Em meados do século XX, a prosperidade, nascida do pós-guerra, favoreceu o desenvolvimento urbano em Portugal, e o azulejo participou dessa renovação, associando-se às novas linguagens, abstratizando-se, mas mantendo ligações a conceitos, estéticas ou técnicas antigas. Este renascimento do uso do azulejo, agora empregue nas grandes obras públicas e que renovou a forma como as cidades portuguesas se modernizaram, é devedor dos conceitos que conduziram o arquiteto Lucio Costa à criação do edifício Gustavo Capanema ou Palácio Capanema, também conhecido por Ministério da Educação e Cultura (MEC), no Rio de Janeiro, revestido com azulejos de Portinari. Esta abordagem encontrou eco em Oscar Niemeyer, visível na construção do complexo da Pampulha, em Belo Horizonte, e naquela que é a obra-prima do local, a igreja de São Francisco de Assis, também com forte integração azulejar de Portinari, o primeiro edifício moderno a ser tombado no Brasil. A arquitectura de Niemeyer voltou a integrar o azulejo, agora de Athos Bulcão, naquela que era a sua visão de uma cidade do futuro e que veio a materializar na nova capital, Brasília. Maria Antónia Pinto de Matos At the beginning of the 20th century, prosperity, which was born in the post-war period, favored the urban development in Portugal, and the tile took part in this renovation, connecting to these new tendencies, becoming abstract, but maintaining its concepts, aesthetics or old techniques. This revival of the tile usage, then used in the Diretora do Museu Nacional do Azulejo 9 Belém do Pará Salvador São Luís do Maranhão Rio de Janeiro Ouro Preto Belo Horizonte 12 ATHOS ATHOS Primeiro Athos Athos I O aprendiz viu na Igreja de São Francisco da Pampulha como – peça a peça – o artista e as escalas, e o alvanel e as escadas construíram um mural. Aprendeu como levar, elevar e enlevar. Penso que o mosaicista já estava pronto. The apprentice saw in the San Francisco Church of Pampulha as – piece by piece – the artist and the scales, and the bricklayer and the stairs built a mural. He learnt how to lead, elevate, and enchant. I believe the mosaicist was already prepared. Segundo Athos Athos II Sobreveio o anseio de imaginar e logo desenhar os códigos indecifráveis das emoções poéticas, palavras geométricas, vírgulas coloridas, reticências que sabem ao odor de flores apenas vistas. Pois o desenhista se fez. The eagerness to imagine and soon draw the indecipherable codes of the poetic emotions, geometric words, colorful commas, ellipses that know the scent of only seen flowers. Then the artist made himself. Terceiro Athos Athos III Brasília ainda pouco mais ou menos que sua invenção desenhada e poética, vislumbrada no Alvorada, pousando empoeirada na vastidão cerrada. Ainda o mínimo do máximo. Athos tornou-se o pioneiro, plantou flores-azulejos, construiu jardins murais, esculpiu canteiros verticais, regurgitando a nova vida brasileira em pedaços de abstração, ora nos detalhes precisos de retas e curvas que se repetem sem se repetir em largas perspectivas. Penso que é sua visão primeva do cerrado. Brasília, even much more or less than its drawn and poetic invention, envisaged in the Alvorada, landing on its fierce dusty vastness. Yet the minimum of its most. Athos became the pioneer, he planted flower-like tiles, built garden-like murals, sculpted vertical building sites, regurgitating the new Brazilian life in pieces of abstraction on the accurate details of the lines and curves which are repeated without repeating themselves in large perspectives. I believe this is his primary view of the cerrado. Athos forever Agora sempre Athos The delicate drawer and sensitive painter reached, as a pioneer, outstanding architectural vibrations resulting in integrated and unique work. As all the great works, it stands as apparently easy being and having mutilpe artistic values in the partnerships with both architecture itself and the architects. O delicado desenhista e sensível pintor alcançou como pioneiro notáveis vibrações arquitetônicas, resultando em obra integrada e única. Como todas as grandes obras, resulta aparentemente fácil sendo e tendo múltiplos valores artísticos nas parcerias com as arquiteturas e com os arquitetos. It is now and always our heritage, it indelibly integrates our spaces, giving them shapes within the shadows of architecture. We are a privileged audience, accomplices and consumers, just like the pilgrims that touch the stones. There is something of music, it is touchable work, sometimes as a Gregorian chant, sometimes as an aria, many times as small and discreet unique pieces. Agora e sempre é nosso patrimônio, integra indelevelmente nossos espaços – configura-nos quando deambulantes pelas sombras das arquiteturas. Somos um público privilegiado, cúmplices e consumidores, como os peregrinos que tocam as pedras. Há algo de música, é obra tocável, às vezes em cantochão, às vezes uma ária, muitas vezes em pequenas e discretas peças únicas. Athos identifies us this way – pieces of a great social mosaic. This way is his work – strong and poetic, dedicated and delicate. Assim Athos nos identifica – pedaços de um grande mosaico social. Assim é a obra – a um só tempo forte e poética, dedicada e delicada. However, his work becomes remarkable and pioneering due to its solubility in the beautiful, discreet and eccentric architecture, adding or splitting… Everything depends on how we perceive it each day, as that extraordinary violinist at the entrance of the subway is seen and heard by the passers-by, as if he had always been there and would always be. This way we recognize and love him. Entretanto, chega a ser mais notável e pioneira por sua solubilidade nas arquiteturas, bela e discreta ou excêntrica, somando ou dividindo... Tudo dependendo de como a percebemos em cada dia, como aquele extraordinário violinista na boca do metrô é visto-ouvido pelos transeuntes como se sempre estivesse ali e para sempre estaria. Assim o reconhecemos e amamos. José Leme Galvão Junior Superintendent – Historic and Artistic National Heritage Institute – DF José Leme Galvão Junior Superintendente do IPHAN – Distrito Federal 13 Planta para painel de azulejos. Brasília Palace Hotel, 1958. Nanquim sobre papel vegetal, 86,05 x 65 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão Plan for tile panel. Brasília Palace Hotel, 1958. Nankin on parchment paper, 86,06x65. Athos Bulcão Foundation Collection Planta para painel de azulejos. Brasília Palace Hotel, 1958. Nanquim sobre papel vegetal, 86,05 x 65 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão 14 Plan for tile panel. Brasília Palace Hotel, 1958. Nankin on parchment paper, 86,06x65. Athos Bulcão Foundation Collection Planta para painel de azulejos. Escola Classe 407 Norte, 1965. Nanquim sobre papel vegetal, 97,07 x 74,09 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão Plan for tile panel. Public Elementary School 407 North, 1965. Nankin on parchment paper, 97,07x74,09. Athos Bulcão Foundation Collection 15 Estudo para painel de azulejos, 1985. Nanquim sobre papel, 32 x 32 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão Study for tile panel, 1985. Nankin on paper, 32 x 32. Athos Bulcão Foundation Collection Estudo de composição para painel em cerâmica da Residência Antônio Barbosa,1980. Módulos serigrafados sobre papel-cartão,15 x 15 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão Estudo de composição para painel em cerâmica da Estação de Transbordo da Lapa, 1981. Lápis de cor e nanquim sobre papel vegetal, 132 x 75 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão Study for panel in ceramics, Lapa Transfer Station, 1981. Colored pencil and nankin on parchment paper, 132 x 75. Athos Bulcão Foundation Collection Study for panel in ceramics of Antonio Barbosa’s residence, 1980. Serigraphed modules on cardboard paper, 15x15. Athos Bulcão Foundation Collection Estudo para painel de azulejos (não realizado), 1979. Guache sobre papel,15 x 15 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão Study for tile panel (not realized), 1979. Gouache on paper, 100 x 70. Athos Bulcão Foundation Collection Estudo para painel de azulejos do Batistério da Catedral de Brasília,1977. Guache sobre papel, 20 x 20 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão Study for tile panel, Batistery of the Brasília Cathedral, 1977. Gouache on paper, 20x20. Athos Bulcão Foundation Collection Estudo de composição para painel em cerâmica do Shopping Del Rey,1991. Módulos serigrafados sobre papel-cartão, 20 x 20 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão Study for panel in ceramics, Del Rey Shopping Mall, 1991. Serigraphed modules on cardboard paper, 20x20. Athos Bulcão Foundation Collection Estudo para painel de azulejos da Embaixada do Brasil em Buenos Aires,1989. Módulos serigrafados sobre papel-cartão,15 x 15 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão Study for tile panel, Brazilian Embassy in Buenos Aires, 1989. Serigraphed modules on paper,15x15. Athos Bulcão Foundation Collection Estudo para painel de azulejos do Ministério das Relações Exteriores – Anexo II,1983. Guache sobre papel, 34 x 38 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão Study for tile panel, Ministry of Foreign Affairs – Annex II, 1983. Gouache on paper, 34 x 38. Athos Bulcão Foundation Collection AZULEJOS EM BRASÍLIA, AZULEJOS EM LISBOA Athos Bulcão, a cidade nova e a tradição revisitada Marília Panitz Fiquei hipnotizado com aquela falta de paisagem, o céu, esta vastidão. O primeiro cuidado é não parecer que o prédio foi feito para ficar com aquela decoração na frente. Precisa-se sentir que é muito necessário, no que se refere à conclusão do projeto, evitar que pareça um ornamento. Athos Bulcão, sobre Brasília e suas parcerias com arquitetos. Tile from Brasília, Tile from Lisbon Athos Bulcão, the new city and the revisited tradition Marília Panitz I got hypnotized by that lack of landscape, the Sky, this vastitude. The foremost concern is to make it not look like a building which was meant to have that decoration on the front. It requires to be felt necessary concerning the conclusion of the project, avoiding it to look like an ornament. Athos Bulcão, on Brasília and his partnerships with architects. When the great Brazilian art critic Mario Pedrosa, in 1959, brought to Brasília (to be inaugurated) part of the International Art Critics Association’s meeting, which was held in Rio de Janeiro, his objective was to show to the world the “new city, synthesis of arts”.¹ Pedrosa placed the new capital of Brazil as “the collective work of art”. Nowadays, due to historical distance, we know that his utopian projection had a lot of poetry, and that the city keeps the idiosyncrasies of so many other urban centers. Life mingles with a planned city, which is modified from its original plan, and in many situations, these changes disfigure the original proposal. After all, the urban centers are alive, mutant. They cannot be kept as “greenhouse-grown flowers”.² But what is maintained from that city which would be like no other one, original in its urbanistic and architectonic proposals? The wisdom of such a Quando o grande crítico de arte brasileiro Mario Pedrosa, em 1959, trouxe para Brasília (ainda não inaugurada) parte do encontro da Associação Internacional de Críticos de Arte (AICA), que se realizava no Rio de Janeiro, seu objetivo era mostrar ao mundo a “cidade nova, síntese das artes”.1 Pedrosa situava a nova capital do Brasil como “obra de arte coletiva”. Hoje, com o distanciamento histórico, sabemos que a sua projeção utópica tinha muito de poesia, e que a cidade guarda as idiossincrasias de tantos outros centros urbanos. Em uma cidade planejada, a vida se imiscui e apresenta modificações ao plano inicial que, em muitas situações, desfiguram a proposta original. Afinal, os centros urbanos estão vivos, mutantes. Não podem 2 conservar-se como “flores de estufa”. Mas o que se mantém daquela que seria uma cidade como nenhuma outra, original em suas propostas urbanísticas e arquitetônicas? A sabedoria em um projeto tão arrojado como o da nova capital brasileira, planejada nos anos 1950, deve muito à composição entre tradição e inovação, à releitura dos princípios das antigas polis, à reformulação dos fundamentos de antigas edificações. Assim, na “cidade nova”, identificam-se muitas influências. A presença do azulejo, por exemplo, fruto da parceria de Oscar Niemeyer e Athos Bulcão inova o estatuto do material, ao mes- 19 Athos Bulcão, 1982. Painel de azulejos da passarela entre os anexos I e II do Palácio do Itamaraty, Brasília, DF Athos Bulcão, 1982. Tiles panel of the sidewalk between Annexes I and II of the Itamaraty Palace, Brasília, DF bold project as the one for the new Brazilian capital, planned in the 1950s, is due a lot to the composition between tradition and innovation, to the reinterpretation of the principles of the old polis, to the reformulation of the old construction foundations.. Therefore, in the “new city”, many influences are identified. The presence of the tile, for instance, resulted from the partnership between Oscar Niemeyer and Athos Bulcão, innovates the statute of the material at the same time it benefits from its thermal-insulation function and easy maintenance, creating one of the most striking visual characteristics of Brasília. There, the panels created by Athos for the Niemeyer’s buildings mingle with the tiles, in the sense of concept, of its initial idea. We cannot think of one without the other. Athos Bulcão, 1982. Painel de azulejos (obra demolida em 2009) dos jardins internos do Palácio do Planalto, Brasília, DF Athos Bulcão, 1982. Tiles panel (demolished in 2009) of the internal gardens of the Planalto Palace, Brasília, DF At an early age, Athos became friends with Cândido Portinari. This episode define the course of his life: I drew at Burle Marx’s home, I helped stretch the canvas, to make such artisanal things in order to learn how to paint on canvas, following Portinari’s people’s training. I was making drawings in gouache and Oscar (Niemeyer) got in the house to talk about any topic to Roberto (Burle Marx), and he asked: “What´s this”? I replied and then he said: “Oh, that´s a beautiful thing. Let´s make a tile with it”? It was Oscar who advised me a lot in the beginning of these visual, space and distance matters. I learned it with him. He once said that Lucio Costa had put his (Oscar´s) drawing on track. And it was Oscar who put me on track regarding this part of the architectural thinking.³ mo tempo em que se utiliza de suas funções de isolamento térmico e fácil conservação, criando uma das características visuais mais marcantes de Brasília. Lá, os painéis criados por Athos para os edifícios de Niemeyer fundem-se a eles, no sentido do conceito, da ideia inicial. Não pensamos em um sem o outro. Athos, muito jovem, tornou-se amigo de Cândido Portinari. Esse fato define os rumos de sua vida: Eu desenhava na casa de Burle Marx, enfim, ajudava a esticar telas, fazer coisas assim bem artesanais, para aprender a pintar em tela, seguindo a formação do pessoal de Portinari. Eu estava um dia fazendo desenhos a guache e o Oscar [Niemeyer] entrou lá para falar um assunto qualquer com o Roberto [Burle Marx], e disse: “O que é isso?” Eu respondi. E ele: “Ah, que coisa bonita. Vamos fazer um azulejo com isso?” Foi o Oscar que me orientou muito no começo nestes problemas de visualidade, de espaço, de distância. Isso eu aprendi com ele. Ele falou uma vez que o Lucio Costa tinha posto ele no caminho, nos trilhos, na maneira de desenhar. E foi o Oscar quem me botou nos trilhos nesta parte do pensamento de arquitetura.3 Tais encontros foram definindo a estética moderna brasileira. E ela se alimentou de outra ousadia, essa do século XVIII, com a deglutição (para usar um termo tão caro às vanguardas modernistas pós-Semana de Arte Moderna de 1922)4 do barroco mineiro, em que a influência 21 Cândido Portinari, 1943. Painéis externo e internos para a Igreja São Francisco de Assis, do Conjunto Arquitetônico da Pampulha, Belo Horizonte, MG Cândido Portinari, 1943. External and Internal panels for the San Francisco Church, Pampulha Architectural Center, Belo Horizonte, MG Painel de azulejos da Igreja de São Francisco de Assis, Salvador, BA, 1749 e 1752 Tiles panel of the San Francisco Church, Salvador, BA, 1794 and 1752 Such meetings gradually defined the Brazilian modern aesthetics, which was fed by another daring event, from the 18th century, with the swallowing (using such an important term for the modernist avant-gardes of the post Modern Art Week of 1922)4 of the mineiro (related to the Minas Gerais State) baroque, in which the Portuguese influence mixed with the rising culture in the origin of the country, generating a unique piece of work such as the one of Antonio Francisco Lisboa, the Aleijadinho. It is to Ouro Preto, in the beginning of the 20th century, that the Modernist caravan (1924) of Mário e Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral and the poet French-swiss Blaise Cendrars is headed. In the same year, the architect and urbanist Lucio Costa also visits the city. It was in Minas Gerais, in the capital – Belo Horizonte, during the mayor Juscelino Kubitschek’s mandate, that the construction of the Pampulha Architectural Center was undertaken, in 1940, by Niemeyer, Burle Marx and Portinari. In order to help design the tiles, Portinari called the young artist Athos Bulcão. The sinuous shapes (architectural feature in Niemeyer’s work) of the church are in total synchronicity with the great painter’s panel – of expressionist aesthetics (as in all his works), as well as with the Portuguese baroque tiling, be it in his technique or in his color palette. It may be more visible in the panels inside the church – the ones in which the traces are free from the ridges of the external figures’ anatomy, becoming similar to the tiling used in the Brazilian old churches, with tiles coming from Lisbon and other European capitals.5 portuguesa se miscigenou com a cultura nascente na infância do país, gerando uma obra única como a de Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho. É para Ouro Preto do início do século XX que se dirige a caravana modernista (1924) de Mário e Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral e o poeta franco-suíço Blaise Cendrars. É neste mesmo ano que o arquiteto e urbanista Lucio Costa também visita a cidade. E foi em Minas Gerais, na capital Belo Horizonte, em gestão do então prefeito Juscelino Kubitschek, que se empreendeu nos anos 1940 a construção do Conjunto Arquitetônico da Pampulha, que reuniu Niemeyer, Burle Marx e Portinari. Para ajudá-lo na confecção dos azulejos, Portinari chamou o jovem artista Athos Bulcão. Em diálogo com as formas sinuosas da igreja, marca da arquitetura de Niemeyer, surge o painel do grande pintor, de estética expressionista (assim como em toda a sua obra) e em um diálogo direto com a azulejaria barroca portuguesa, tanto em sua técnica quanto em sua paleta de cores. Isso talvez se torne mais claro nos painéis do interior da igreja, em que os traços se liberam das arestas da anatomia das figuras externas, aproximando-os da azulejaria das antigas igrejas brasileiras, com seus azulejos vindos de Lisboa e de outras capitais europeias. 5 Portinari já havia demonstrado essa sua releitura do azulejo colonial nos dois grandes murais do Palácio Gustavo Capanema, no Rio de Janeiro: Conchas e hipocampos, e Estrelas-do-mar e peixes. Vários teóricos que analisaram esses painéis 23 Portinari had already demonstrated his reinterpretation of the colonial tile in his two enormous murals of the Gustavo Capanema Palace, in Rio de Janeiro: Shells and hippocampus, and Starfish and Fish. Many scholars who analyzed these panels noted the presence of sinuous lines which break the orthogonality of the tiling grid, as a tribute to the late-baroque aesthetics. Cândido Portinari, 1939-1943. Painel de azulejos para o Palácio Gustavo Capanema, edifício construído para o Ministério da Educação e Saúde, e que hoje abriga a Fundação Nacional da Arte do Ministério da Cultura (FUNARTE) Cândido Portinari, 19391943. Tile panel for the Gustavao Capanema Palace, built for the Ministry of Culture and Education. It is today home to the National Art Foundation of the Ministy of Culture (FUNARTE) Carlos Zílio, in his text “The quarrel of Brazil”, says: It is in this work that Portinari’s post cubist experience reaches its full potential, becoming not only his most important work, but also one of the most significant within Modernism. (…) The murals seem to come to life given the sea the artist seeks to promote, along with a permanent movement, organized by the diagonal lines, the seahorses, and small fish, and still by the great blue shapes. A complex space is also created, constituted by a superposition of backgrounds which brings the sensation of an ample space without giving an illusive sensation of deepness. (…) The panel is integrated to the landscape because it is extension of such.6 apontam para a presença das linhas sinuosas que quebram a ortogonalidade da grade azulejar, como tributária da estética tardo-barroca. Carlos Zílio, em seu texto “A querela do Brasil”, afirma que: É nessa obra que a experiência pós-cubista de Portinari atinge sua maior plenitude, constituindo-se não só a obra mais importante do artista, como também uma das mais expressivas do modernismo. (...) Os muros parecem ganhar a vida do mar que o artista procura imprimir-lhes, com um movimento permanente dado pelo direcionamento das diagonais, dos cavalos-marinhos e pequenos peixes e ainda das grandes formas azuis. Cria-se também um espaço complexo, formado por uma superposição de planos que dão a sensação de um amplo espaço sem recorrer a uma sensação ilusória de profundidade. (...) O painel integra-se na paisagem porque é dela um prolongamento.6 The artist, now and later, in the Pampulha Church, does not take that Portuguese polychromatic tiling of the 17th century as his basis, so present in the streets of the northern cities of Brazil, especially in São Luís and Belém. It is the 18th century tile, with the East India Company porcelain’s influence, always in white and blue, which pervades his panels. O artista, aqui e mais tarde, na Igreja da Pampulha, toma como base não aquela azulejaria policromada portuguesa do século XVII, tão presente nas ruas das cidades do norte do Brasil, especialmente em São Luís e Belém. É o azulejo do século XVIII, com influência da porcelana da Companhia das Índias, sempre em azul e branco, que domina os seus painéis. Athos Bulcão learns with it. But we cannot forget that the young artist also joins the intellectual Athos Bulcão aprende com ele. Mas não podemos nos esquecer que o jovem artista também 25 frequenta os encontros de intelectuais e artistas na casa de Maria Helena Vieira da Silva e Arpad Szenes (exilados no Brasil em função da Segunda Guerra Mundial). Com eles, Athos exercita a forma que tende à abstração, a certa geometria subvertida, tensionando a ortogonalidade pela via da modulação em curvas. E introduz a cor. Mas, em sua primeira parceria com Oscar Niemeyer,7 ainda estão presentes o azul e o branco. 26 Com Juscelino Kubitschek eleito presidente nos anos 1950 e a decisão da construção da nova capital, reencontramos Lucio Costa, Oscar Niemeyer, Burle Marx e Athos Bulcão estabelecendo uma parceria que deu forma a Brasília, inaugurada em 1960. Nas duas primeiras obras de Athos para a cidade, na Igrejinha Nossa Senhora de Fátima (1957) e no Brasília Palace Hotel (1958), a lógica do azul e branco permanece, e a orientação compositiva ainda segue a tradição, no que tange à montagem. Outras obras extraordinárias do artista, produzidas mais tarde, para os prédios públicos da nova capital ainda trazem a predominância do azul, algumas vezes com diferentes saturações, como no caso das belas composições dos anexos do Palácio do Itamaraty e no Congresso Nacional. Aqui, porém, a subversão no módulo nas montagens produz uma riqueza compositiva inusitada e, ao mesmo tempo, a realização do vaticínio de Mario Pedrosa: Brasília seria “obra de arte coletiva”. Na parceria estabelecida com os operários que construíam seus murais, o artista colocava em prática a indicação do grande crítico. André Corrêa do Lago e Frederico de Morais apontam esse viés único de seu Igrejinha Nossa Senhora de Fátima, 1957 meetings of artists at Maria Helena Vieira da Silva and Arpad Azenes’s home (exiled from Brazil due to the World War II). With them, Athos exercises the shape that tends to abstraction, the right subverted geometry forcing the orthogonality through the curve modulation. And he introduces color. But the white and blue as still present in his first partnership with Oscar Niemeyer.7 As Juscelino Kubitschek was elected president in the 1950s and along came the decision of constructing the new capital, we find again Lucio Costa, Oscar Niemeyer, Burle Marx and Athos Bulcão establishing a partnership which gave shape to Brasília, inaugurated in 1960. The first two Athos’s works to the city are present in the Our Lady of Fatima Church (1957) and in the Brasília Palace Hotel (1958), the reasoning of white and blue remains, and the way it is composed still follows the tradition, in terms of assemblage. The other extraordinary artist’s works, later produced to the public buildings of the new capital are still pervaded by blue, presenting different saturations sometimes as the ones in the beautiful compositions of the Annexes of Itamaraty Palace and the National Congress. Here, though, the module subversion in the assemblies produces unusual richness and at the same time has Mario Pedrosa’s prediction come true: Brasília would be “a collective work of art.” In the partnership with his workers, which made it possible to build his murals, the artist put into practice the great critic’s suggestion. André Corrêa do Lago and Frederico de Morais signaled these unique features of Athos’s work and He was at the same time rooted Our Lady of Fatima Church, 1957 Sem título, 1982. Acrílico sobre tela, 68 x 57 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão Untitled, 1982. Acrylic on screen, 68x57. Athos Bulcão Foundation Collection Painel do Brasília Palace Hotel, 1958 Panel at Brasília Palace Hotel, 1958 Máscara Dourada, 1989. Relevo policromado, 32 x 32 x 6,5 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão Painel do Salão verde do Congresso Nacional, 1971 Golden Mask, 1989. Polychromatic relief, 32x32x6,5. Athos Bulcão Foundation Collection Panel at the Green Hall, National Congress, 1971 Bichos, 1986. Durepoxi com pintura acrílica, 17,5 x 8 x 8 cm. Acervo particular Anexo 1 do Palácio do Itamaraty, 1968 Animals, 1986. Epoxy mass and acrylic painting, 17,5x8x8. Private collection Annex I, Itamaraty Palace, 1968 São Luís do Maranhão Ouro Preto, MG Painel de azulejos do Aeroporto Juscelino Kubitschek, Brasília, DF, 1993 Tile Panel, Juscelino Kubitschek International Airport, 1993 Loja Hill House (Pedro Ivo Verçosa e Felipe Cavalcante), Brasília, anos 2000 Hill House Store – Brasília (2000s) Painel de azulejos do Mercado das Flores, Brasília, DF, 1983 Tile Panel, Flowers Market, Brasília, DF, 1983 Residência particular (Ligia de Medeiros), Brasília, anos 2000 Private residence – Brasília (2000s) Belém do Pará in the tradition he breaks in his own structure: The most remarkable contribution of Athos to the Brazilian art lies, undoubtedly, in his tiles. His several works surprise for the variety of colors and patterns. On one hand, his tiles enhance the so discussed baroque tradition in the Brazilian architecture, for they are a reference to the so praised ornament present in the colonial period. The Portuguese tiles sent to Brazil followed rigid compositions while being assembled, depicting religious, historical or landscape scenes. Athos, however, added an element that breaks with this tradition: even though in some works, Athos chooses abstract compositions which require an accurate drawing, it is in the random assemblage of the tiles that one can see his special originality.8 While liberating the workers’s imagination, Athos actually recovers one of the Portuguese tiling traditions, noted by José Meco, while observing that “the tile also became a tiler’s work, who knew how to viscerally place the tile in the architecture, playing with the shape and irregularities of the ornaments, demonstrating a great understanding of the ceramic materials and their rhythmic and color possibilities.”8 Athos was a colorist. His deeds in other sources such as painting, drawing, and modeling gives us the magnitude of his intimacy with color. In his integrated work to architecture, Athos revisits the polychromatic faience, and then gets close to the Brazilian old cities’ colonial houses, trabalho, ao mesmo tempo assentado na tradição que ele rompe em sua própria estrutura: A contribuição mais notável de Athos para a arte brasileira é, sem dúvida, sua obra em azulejos. Suas inúmeras realizações surpreendem pela variedade de cores e motivos. Por um lado, seus azulejos fortalecem a discutida tradição barroca na arquitetura brasileira, pois são uma referência ao ornamento tão prezado no período colonial. Os azulejos portugueses mandados para o Brasil eram montados seguindo composições rígidas, com cenas religiosas, históricas ou paisagens. Athos, no entanto, adiciona com frequência um elemento que desconstrói essa tradição: mesmo se, em algumas obras, Athos escolhe composições abstratas que exigem que se siga um desenho preciso, é na colocação aleatória dos azulejos que reside sua particular originalidade.8 Ao liberar a fantasia dos operários, Athos recupera, na verdade, uma das tradições da azulejaria portuguesa, anotada por José Meco, ao observar que “o azulejo se tornou também obra do ladrilhador, que soube aplicar quase visceralmente o azulejo à arquitetura jogando com a forma e irregularidades dos paramentos, demonstrando grande compreensão dos materiais cerâmicos e das suas possibilidades rítmicas e de cor”. Mas Athos era um colorista. Suas atividades em outros suportes como pintura, desenho e modelagem nos dão a dimensão de sua intimidade com a cor. 29 Em suas obras de integração com a arquitetura, ele revisita a faiança policromada, e aí se aproxima do casario das antigas cidades brasileiras, especialmente no centro e no norte. Afinal, em terras de clima quente e em início de urbanização, o material mostrou-se perfeito. Era funcional e belo. Um casamento perfeito com a arquitetura barroca. Na nova capital, não foi diferente. Mas a estrutura dos prédios era outra, certos parâmetros aqui não se aplicavam. E aí está a genialidade do trabalho do artista. João Filgueiras Lima, o Lelé, arquiteto e grande parceiro do artista em projetos para Brasília, diz do trabalho conjunto: “o Athos foi meu parceiro em quase todos os projetos. Sua atuação nunca foi complementar. Por isso seus trabalhos sempre interferiram na arquitetura.”9 Estão presentes a relação entre o azulejo e seu suporte, e a importância, na estrutura do recobrimento, para além da função ornamental. Mas a diferença se estabelece claramente na presença de um pensamento moderno, o frescor do novo. Nas palavras de Bulcão: “Recusei-me sempre à imitação dos desenhos ‘antigos’, de épocas em que dominava o artesanato. Os belos arabescos a bico de pato de outrora não podem ser transformados em ‘carimbos’. Isso, penso, equivaleria a uma máquina de escrever que imitasse a caligrafia de Luís XIV.”10 30 Com Athos, Brasília incorpora o azulejo à sua paisagem urbana. É ele que colore as superfícies brancas e cor de concreto que predominam no Plano Piloto. E as novas gerações produzem, de- especially in the center and north of the country. After all, for the hot weather, at the beginning of its urbanization, the material was perfect. It was functional and beautiful. A perfect encounter with the baroque architecture. It was not different in the new capital. But the structuring of the buildings was a different one, certain parameters were non-applicable here. And here lies the genius of the artist’s work. João Filgueiras Lima, “Lelé”, architect and great colleague in projects to Brasília, says of the collective work: “Athos was my colleague in almost all the projects. His contribution was fundamental. That is why my works always interfered in the architecture”.9 The connection between the tile and its support, and the importance in covering structure, are beyond mere ornamental function. But the difference is clearly established in the presence of modern thought, the freshness of something new. In Bulcão’s words: “I refused to imitate the old drawings, when handcrafts was dominant. The beautiful memorable arabesques from old times can no longer be transformed into “stamps”. This, I think to myself, would be like a typewriter imitating Luís XIV’s handwriting”.10 With Athos, Brasília incorporates the tile into its urban landscape. It is him who colors the white and concrete surfaces which pervade Plano Piloto. And the new generations work, after him, on new proposals to the material. Far from the repetition of the master’s formula, they tend to be supporting workers, but maintain the experimentation of the assemblage in the study of the Athos Bulcão – Painel de azulejos da Rede SARAH, Brasília, DF, 1982 Painel de azulejos, faiança estampilhada e madeira (MNAz 7266). Lisboa, séc. XIX (1833-1880) Tile panel, Sarah Hospitals, Brasília, DF, 1982 Tiles panel, wooden and stamped faience (MNAz 7266). Lisbon, 19th Century (1833-1880) Athos Bulcão – Painel de azulejos do Edifício Paulo Octávio Investimentos Imobiliários, Brasília, DF, 1987 Painel de azulejos barro vidrado, majólica (MNAz 143). Portugal, séc. XVII (2ª metade) Tile panel, Paulo Octavio building, Brasília, DF, 1987 Tiles panel glazed terracotta, majolica (MNAz 143). Portugal, 17th Century (second half) Athos Bulcão – Painel de azulejos da Igrejinha Nossa Senhora de Fátima, Brasília, DF, 1957 Painel de azulejos barro vidrado, majólica. Faiança azul sobre branco (MNAz 168). Lisboa, séc. XVIII (1ª metade) Tile panel, Our Lady of Fatima Church, Brasília, DF, 1957 Tiles panel glazed terracotta, majolica. XXX (MNAz 168). Lisbon, 18th Century (1st half) 31 pois dele, novas propostas com o material. Muito distante de uma repetição da fórmula do mestre, elas tendem à figuração, mas de seu ensino conservam a experimentação na montagem e o estudo da modulação como forma de subversão da mesma, incorporando as variações. Essa é a lição do artista que acolheu a cidade e por ela foi acolhido como seu artista maior. E é esta a ideia da mostra Azulejos em Brasília – Azulejos em Lisboa. Athos Bulcão e a tradição da azulejaria barroca, organizada para a comemoração do Ano do Brasil em Portugal no espaço do Museu do Azulejo: identificar influências na presença dos azulejos na capital do Brasil. Ela nos convida a observarmos a tradição da azulejaria portuguesa como influência para a azulejaria brasileira. O trabalho de Athos Bulcão presente em toda a cidade de Brasília é o condutor desse mergulho nas formas que se produziram ao longo dos séculos. Suas parcerias com renomados arquitetos, como Oscar Niemeyer, Hélio Uchôa, Ítalo Campofiorito, João Filgueiras Lima e Glauco Campello, entre outros, dão testemunho da propriedade com que o mestre da intervenção da arte na arquitetura utilizava o material e das inovações que incorporou na retomada do seu uso, avançando em elaborações formais geométrico-abstratas, que destinaram ao azulejo o papel de protagonista da obra arquitetônica. 32 As aproximações propostas entre o azulejo de Athos Bulcão e os tradicionais do barroco português e seus desdobramentos não pretendem estabelecer uma tese sobre as relações entre shape modulation and its subversion, incorporating variations, keeping the master’s teaching. This is the artist’s legacy, who welcomed the city and was welcomed as its greatest artist. Here is the Idea of the exhibition Tile from Brasília – Tile from Lisbon. Athos Bulcão and the baroque tiling tradition, organized to celebrate the year of Brazil in Portugal, in the Tile Museum: identify the influences present in the tiles in the capital of Brazil. It invites us to observe the Portuguese tiling tradition as an influence to the Brazilian tiling. Athos Bulcão”s work, present in all Brasília, leads us to this immersion in the shapes that have been produced throughout the centuries. His partnerships with renowned architects, such as Oscar Niemeyer, Hélio Uchôa, Ítalo Campofiorito, João Filgueiras Lima and Glauco Campello, among others, give the testimony of the supremacy on which the master of art’s intervention in the architecture used to work with the material as well as the innovations incorporated by him while using the tile again, progressing into formal abstract-geometric elaborations, conferring on the tile its main recognition in his architectural work. The proposed proximity between Athos Bulcão’s tiles and the traditional Portuguese baroque tiles and its disclosures are not intended to establish a thesis about their relationship. The pairs have been chosen due to various characteristics: composition similarities, color palette, similar images, logic in the assembling process. Nevertheless, more important than any other reason, it was intended, in a poetic manner, to make times closer, pausing, for a while, the historic and geographic distances, composing a contemplative space, where the panels are destituted of their functional use, making the work come to fruition in its intrinsic feature: the aesthetics possibilities of their modular composition. On both sides of the ocean. eles. Os pares foram escolhidos em função de características diversas: semelhanças compositivas, paleta de cores, evocações aproximativas entre imagens, lógica do processo de montagem. Todavia, mais do que qualquer outro motivo, pretendeu-se, de maneira poética, aproximar tempos, suspender provisoriamente as distâncias históricas e geográficas e compor um espaço contemplativo onde os painéis são destituídos de seu caráter funcional, possibilitando a fruição da obra naquilo que lhe é intrínseco: as possibilidades estéticas de sua composição modular. De um lado e de outro do oceano. NOTAS NOTES As he names it in his speech. In: PEDROSA, Mario. From Portinari’s murals to the spaces of Brasília. São Paulo: Ed. Perspectiva, 1981. pp. 355 – 363 1 As Lucio Costa, responsible for the urbanistic design of Brasília, says it while visiting the city, in 1987. 2 Athos Bulcão is interviewed by Carmen Moretzsohn, Jornal de Brasília (a local newspaper), July, 1982. In: ATHOS BULCÃO. Brasília: FundAthos, 2009. P. 357. 3 One cannot forget to mention that the principles of the first Brazilian Modernist Movement are on the “Manifesto Antropófago” (Anthropophagic Manifesto ), by Oswald de Andrade. 4 1 Como ele a nomeia em seu discurso. In: PEDROSA, Mario. Dos murais de Portinari aos espaços de Brasília. São Paulo: Ed. Perspectiva, 1981. p. 355-363. 2 Como afirma o criador do desenho urbanístico de Brasília, Lucio Costa, em sua visita à cidade em 1987. 3 Fala de Athos em entrevista concedida a Carmen Moretzsohn, publicada pelo Jornal de Brasília em 2 de julho de 1998. In: ATHOS BULCÃO. Brasília: FundAthos, 2009. p. 357. 4 Não nos esqueçamos de que os princípios do primeiro movimento modernista brasileiro estão colocados no “Manifesto Antropófago” redigido por Oswald de Andrade. Rafael Alves Pinto Junior, in his text “Portinari’s tiles as visual elements of the modernist architecture of Brazil”, published in the Vitruvius magazine, August, 2007, says: “Seen as a sequence of tiling production of the Ministry (of Education and Culture, Gustavo Capanema Palace, in the 1930s, in Rio de Janeiro), the tiles in the Pampulha Church were instructured in the same White-and-blue pattern, widely used in our colonial tiling”. 5 Rafael Alves Pinto Junior, em seu texto “Os azulejos de Portinari como elementos visuais da arquitetura modernista no Brasil”, publicado na revista Vitruvius de agosto de 2007, afirma que: “Visto como sequência da produção dos azulejos do Ministério [da Educação e Saúde, Palácio Gustavo Capanema, dos anos 1930, no Rio de Janeiro], os azulejos da Igreja da Pampulha se estruturam no mesmo padrão de azul e branco, que, como vimos, lastreava-se na nossa azulejaria colonial.” Carlos Zílio apud PINTO JUNIOR, Rafael Alves. Portinari’s Tiles as visual elements of the Modernist Architecture in Brazil. Vitruvius, Aug. 2007 6 Carlos Zílio apud PINTO JUNIOR, Rafael Alves. Os azulejos de Portinari como elementos visuais da arquitetura modernista no Brasil. Vitruvius, ago. 2007. 5 6 7 In the Hospital of Lagoa, Rio de Janeiro, 1955 7 No Hospital da Lagoa, Rio de Janeiro, 1955. 8 In: ATHOS BULCÃO. Brasília: FundAthos, 2009. pp 28 and 385. 8 In: ATHOS BULCÃO. Brasília: FundAthos, 2009. p. 28 e 385. Apud FARIAS, Agnaldo. Construtor de espaços. In: ATHOS BULCÃO. Brasília: FundAthos, 2009. p. 398. 9 Apud FARIAS, Agnaldo. Space Builder. In: ATHOS BULCÃO, Brasília: FundAthos, 2009. p 398. 9 10 Athos Bulcão’s interview for a Master’s dissertation about his work, in 1988. 10 Athos Bulcão em entrevista concedida para uma dissertação de mestrado sobre sua obra em 1988. 33 34 Painel de Azulejos da Igrejinha Nossa Senhora de Fátima, Brasília, 1957. 155 x 65 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão Tile Panel, Our Holy Lady Fatima Church, Brasília, 1957. 155x65. Athos Bulcão Foundation Collection Painel de azulejos barro vidrado, majólica. Faiança azul sobre branco (MNAz 168). Lisboa, séc. XVIII (1ª metade) Tiles panel glazed terracotta, majolica. XXX (MNAz 168). Lisbon, 18th Century (1st half) 35 36 Painel de azulejos da Torre de Televisão, Brasília, 1966. 155 x 65 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão Tile Panel, TV Tower, Brasília, 1966. 155x65. Athos Bulcão Foundation Collection Painel de azulejos barro vidrado, majólica. Faiança (MNAz 175). Raúl Lino. Lisboa (Sacavém, fábrica de Louça de Sacavém, projeto), séc. XX [1915 (projeto) / 1970 (réplica)] Tiles panel, glazed terracotta, majolica. Faience (MNAz 175). Raúl Lino. Lisbon (Sacavem, china factory). 20th Century [1915 (project) / 1970 (reproduction)] 37 38 Painel de azulejos da Residência Ivany Valença, Brasília, 1972. 155 x 65 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão Tile Panel, Ivany Valença’s Residence, Brasília, 1972. 155x65. Athos Bulcão Foundation Collection Painel de azulejos, faiança estampilhada e madeira (MNAz 7266). Lisboa, séc. XIX (1833-1880) Tiles panel, wooden and stamped faience (MNAz 7266). Lisbon, 19th Century (1833-1880) 39 40 Painel de azulejos do Mercado das Flores, Brasília, 1983. 155 x 65 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão Tile Panel, Flowers Market, Brasília, 1983. 155x65. Athos Bulcão Foundation Collection Painel de azulejos barro vidrado, corda seca e aresta (MNAz 69). Sevilha, séc. XVI Standard tiles panel glazed terracotta, cuerda seca (MNAz 69). Seville, 16th Century 41 42 Painel de azulejos da Rede SARAH de Hospitais de Reabilitação, Brasília, 1982. 155 x 65 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão Tile Panel, SARAH Rehabilitation Hospitals, Brasília, 1982. 155x65. Athos Bulcão Foundation Collection Painel de azulejos, faiança estampilhada e madeira (MNAz 7266). Lisboa, séc. XIX (1833-1880) Tiles panel, wooden and stamped faience (MNAz 7266). Lisbon, 19th Century (1833-1880) 43 Painel de azulejos do Ministério das Relações Exteriores, cobertura do anexo II, Brasília, 1983. 155 x 65 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão 44 Tile Panel, Ministry of Foreign Affairs, Annex II Penthouse, Brasília, 1983. 155x65. Athos Bulcão Foundation Collection Painel de azulejos ponta de diamante. Faiança policroma (MNAz 518). Lisboa, séc. XVII Diamond-point tiles panel polychromatic faience (MNAz 518). Lisbon, 17th Century 45 Painel de azulejos do Ministério das Relações Exteriores, cobertura do anexo II, Brasília, 1968. 155 x 65 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão 46 Tile Panel, Ministry of Foreign Affairs, Annex II Penthouse, Brasília, 1968. 155x65. Athos Bulcão Foundation Collection Painel de azulejos enxaquetados em barro vidrado, engobe. Faiança azul e branca (MNAz 114). Lisboa, séc. XVII Checkered tiles panel glazed terracotta, white and blue faience, (MNAz 114). Lisbon, 17th Century 47 Painel de azulejos do Edifício Paulo Octávio Investimentos Imobiliários, Brasília, 1987. 155 x 65 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão 48 Tile Panel, Paulo Octávio Real Estate Ventures Building, Brasília, 1987. 155x65. Athos Bulcão Foundation Collection Painel de azulejos barro vidrado, majólica (MNAz 143). Portugal, séc. XVII (2ª metade) Tiles panel glazed terracotta, majolica (MNAz 143). Portugal, 17th Century (second half) 49 50 Painel de azulejos do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Brasília, 2011. 144 x 65 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão Tile Panel, Institute of Economic Studies (Inesc), Brasília, 2011. 144x65. Athos Bulcão Foundation Collection Painel de azulejos, grande vista de Lisboa – zona de Belém, Alcântara e Santos, barro vidrado, majólica (MNAz 01). Atribuído a Gabriel del Barco. Lisboa, séc. XVIII (c.1700) Tiles panel – great view of Lisbon – Belem, Alcantara and Santos area, glazed terracotta, majolica (MNAz 01). Gabriel del Barco. Lisbon, 18th Century 51 52 Painel de azulejos da Residência Regina Célia Borges, Brasília, 2001. 144 x 65 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão Tile Panel, Regina Célia Borges’s Residence, Brasília, 2001. 144x65. Athos Bulcão Foundation Collection Painel de azulejos faiança policroma de procedência desconhecida, (MNAz 6934). Lisboa, 1790 - 1800. Tiles panel polychromatic faience, unknown origin, (MNAz 6934). Lisbon, 1790-1800. 53 54 Painel de azulejos do Centro Cultural Missionário, Brasília, 1995. 144 x 65 cm. Acervo Fundação Athos Bulcão Tile Panel, Missionary Cultural Center, Brasília, 1995. 144x65. Athos Bulcão Foundation Collection Azulejo de cercadura, barro vidrado, majólica (MNAz 611). Lisboa, séc. XVII (1ª metade) Border tile glazed terracotta, majolica (MNAz 611). Lisbon, 17th Century (1st half) 55 ATHOS BULCÃO Athos Bulcão João Filgueiras Lima João Filgueiras Lima The Arhitect periodical, year I, 5th edition, November, 1996 Jornal do Arquiteto, ano I, n.º 5, novembro de 1996 It is always with heartfelt emotion that I refer to this great artist and wonderful human being, my dear friend Athos Bulcão. É sempre com muita emoção que me refiro ao grande artista e ao ser humano maravilhoso meu querido amigo Athos Bulcão. Over the last forty years in which we have been working jointly in several projects, I have never tired admiring his creative genius, his impeccable command of coloring, and the spirited, intelligent, and accurate manner in which he interferes in architecture by incorporating his works into buildings and the urban space, just as Fernand Léger preached. Strictly speaking, Bulcão reaches far beyond Léger’s proposals, because his works are all so tightly integrated into and anchored on architecture itself, that it would be impossible to picture them dissociated from their respective buildings, or vice-versa. Há mais de trinta anos que participamos juntos de inúmeros trabalhos e nunca me canso de admirar seu gênio criador, seu impecável domínio das cores e a forma corajosa, inteligente e precisa com que interfere na arquitetura. Athos é sem dúvida o artista plástico do nosso tempo que mais realizou as previsões de Fernand Léger de que os pintores no decorrer deste século iriam incorporar seus trabalhos aos espaços urbanos e aos nossos edifícios. A rigor, ele foi muito mais além, porque não os incorporou como simples adornos ou complementos decorativos mas os tornou fortemente ancorados e integrados à própria arquitetura. Essa integração é de tal ordem que seria impossível imaginar seus trabalhos dissociados dos respectivos edifícios ou vice-versa. Como pensar, por exemplo, o Teatro Nacional sem os relevos admiráveis que revestem as duas empenas do edifício, ou o espaço magnífico do salão do Itamaraty sem suas treliças coloridas? How to picture, for example, the National Theater of Brasilia designed by Oscar Niemeyer, without the reliefs that clad the two lateral outside walls of the building, or yet the magnificent environment of the main salon of the Itamaraty building, also by Niemeyer, without its color latticework? À esquerda, Athos Bulcão em frente ao painel de azulejos da Igrejinha Nossa Senhora de Fátima, Brasília Left, Athos Bulcão at the Our Holy Lady Fatima Church, Brasília 57 Foi o próprio Oscar Niemeyer que na década de 50 percebeu o talento do jovem pintor e convocou-o para seus primeiros trabalhos em azulejos, entre eles os do Hospital Sul América, no Rio de Janeiro, realizado em 1955. A partir daí são inúmeras as contribuições de Athos aos projetos de Oscar. Seus primeiros trabalhos em Brasília foram os azulejos da Igreja de Nossa Senhora de Fátima e logo em seguida o painel mural do Brasília Palace Hotel. No exterior realizou obras importantes em projetos de Oscar para as oficinas gráficas Mondadori, residência Mondadori, sede do Partido Comunista francês, Universidade de Argélia, etc. No meu caso particular, a atuação de Athos tem sido decisiva na maioria de meus trabalhos. Ainda recentemente, no projeto do Hospital Sarah de Belo Horizonte eu havia decidido pintar os brises-soleil que ocupam toda a fachada do prédio mais alto de amarelo, mantendo a torre de circulação vertical em concreto aparente. Athos, durante uma rápida visita que fez à obra, com sua visão de arquiteto, aconselhou-me a pintar os brises de branco, e a torre de amarelo. Dessa forma, o prédio mais alto não se dissociaria do bloco da frente predominante branco e o amarelo da torre (como nos ensinava Léger) cumpriria a função de afastar os dois blocos, como convinha. Imediatamente acatei seu conselho e o resultado foi exatamente o que desejávamos. 58 Apesar de ser extremamente solicitado para colaborar com arquitetos, Athos sempre dedicou uma parte de seu tempo à pintura de cava- Oscar Niemeyer himself readily spotted Bulcão’s talent on a Sunday afternoon, back in the forties, when he caught the artist painting a gouache at Roberto Burle-Marx’s studio. Niemeyer immediately invited Bulcão to study the lateral outside walls of the Municipal Theater of Belo Horizonte, which were never built. It was only in 1955, with the execution of a tile mural for the Sul América Hospital of Rio de Janeiro, also designed by Oscar Niemeyer, that Bulcão started implementing his outstanding project of integrating artworks to architectural renditions. After this mural, Bulcão made countless contributions to Niemeyer’s project designs. In Brazil, the first two were the tiles for the Church of Our Lady of Fatima, and a mural for the Brasilia Palace Hotel, both in Brasilia. Abroad, he also contributed important works for Oscar Niemeyer’s commissions as for example the headquarters of Italy’s largest publishing house Mondadori and the Mondadori residence in Milan, the headquarters of the French Communist Party, the University of Algeria, and others. Despite being on high demand for his works in partnership with architects, Bulcão always devoted himself part time to easel painting. After dropping out of medical school in Rio de Janeiro as result of his lack of vocation, he began to study painting. In 1941, he showed in the Modern Section of the National Salon of Fine Arts and received two silver medals for his works of drawing and painting, respectively. During 1945, he attended the studio of Cândido Portinari, where he worked on a mural representing St. Francis of Assisi, for the Pampulha Church, of Belo Horizonte. Although the artist himself admits that some influence by Paul Klee, Fernand Léger or Miró may be spotted in his painting, his entire production is original and always reflects his condition as a self-taught artist. In our life of all but daily contact during a long period in Brasilia, I followed the development of his works of the figurative phase (1960s and 70s) and of masks (1970s and 80s), all of them always impregnated with strong mystical content. Despite the imminently abstract nature of his more recent production, the artist confesses to his need to make chance forays into figurative painting. As of lately, in the 1990s, Bulcão has been actively working for hospitals and buildings designed and built by the Technology Center of Sarah Hospitals, an institution that currently houses a very important collection of his more recent works. Athos Bulcão moved to Brasilia at the beginning of its construction, in 1958. Thanks to his extraordinary creative capacity and tireless devotion to work, his works are found throughout the city. Today Athos Bulcão stands on a par with the highest-ranking cultural references in our country. lete. Iniciou seus estudos com Cândido Portinari, com quem trabalhou durante cerca de um ano em 1945. Trabalhou também com Roberto Burle Marx em 1946. É possível que se encontre em sua pintura alguma influência de Paul Klee, Fernand Léger ou Miró, como ele próprio reconhece, mas toda a sua produção é extremamente original e reflete sempre sua condição de autodidata. Em nosso convívio quase que diário durante um longo período em Brasília pude acompanhar o desenvolvimento de suas obras na fase figurativa durante as décadas de 60 e 70 e a das máscaras nas décadas de 70 e 80, todas sempre carregadas de um forte conteúdo místico. Embora sua produção atual seja eminentemente abstrata, ele sempre confessa que sente a necessidade de eventuais incursões à pintura figurativa. No decorrer dos últimos anos, na década de 90, vem trabalhando intensamente sobretudo para os hospitais e prédios desenvolvidos pelo Centro de Tecnologia da Associação das Pioneiras Sociais, instituição que hoje detém um acervo significativo de suas obras. Athos Bulcão constitui, sem dúvida, um dos referenciais culturais mais importantes de Brasília, para onde se transferiu no início de sua construção, em 1959. Hoje, graças à sua extraordinária capacidade criativa e sua incansável dedicação ao trabalho, a cidade, por toda parte, está impregnada de suas obras, seja no aeroporto, no congresso, nos palácios, na universidade, em escolas, hospitais e residências. 59 AGRADECIMENTOS | Special thanks to Agradecemos a todos os que colaboraram para que esta exposição fosse realizada, especialmente We would like to thank everyone that worked to make this exhibition possible, especially Embaixador António Cotrim Embaixador Francisco Ribeiro Telles Embaixador Hadil da Rocha Vianna Embaixador Mauro Vilalva Ministra Eliana Zugaib Ministro George Firmeza Conselheira Moira Pinto Coelho Secretário Diogo Mendes de Almeida Carla Queiroz Eduardo José Cabral Guilherme Reis Henilton Menezes João Pedro Monteiro Joaquim Pedro Penna Laís Musetti Maria Pace Maura Torres de Carvalho Myriam Lewin Nicola Goretti Rui Brito Silvia Caetano Aos profissionais e gestores dos espaços: To the professionals and managers of the following places: 60 Palacete do Pinho, Capela e Convento de Santo Antônio, Hotel Pousada Colonial, Igreja e Convento de São Francisco, Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, Igreja Basílica do Senhor do Bonfim, Palácio Gustavo Capanema, Museu do Açude, Outeiro da Glória, Igreja da Pampulha, Pousada Vila Rica e Igreja Nossa Senhora do Carmo. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Azulejos em Brasília, azulejos em Lisboa : Athos Bulcão e a tradição da azulejaria barroca = Tile from Brasília, tile from Lisbon. Athos Bulcão and the baroque tiling tradition / organização: Valéria Maria Lopes Cabral, Rosanalha Martins, Marília Panitz – Brasília : Fundação Athos Bulcão, 2013. 60 p. : il., fots. col. ; 20 x 20 cm. Textos paralelos em português e inglês. Exposição do catálogo de 29 de maio a 28 de julho de 2013, Museu Nacional do Azulejo, Lisboa, Portugal. ISBN : 978-85-88797-08-6. 1. Azulejo. 2. Decoração de edifícios. 3. Arquitetura. I. Cabral, Valéria Maria Lopes II. Martins, Rosanalha. III. Panitz, Marília. CDU 738.8(469)(81) Ficha catalográfica elaborada pela Bibliotecária Georgia Fernandes do Nascimento CRB1/2319