CADERNO DE FÍSICA DA UEFS 12 (02): 33-40, 2014 ATRITO DE ESCORREGAMENTO E ATRITO DE ROLAMENTO: ANÁLISE DE SITUAÇÕES SIMPLES1 SLIDING FRICTION AND ROLLING FRICTION: ANALYSIS OF SIMPLE CASES A. V. Andrade-Neto Departamento de Fı́sica Universidade Estadual de Feira de Santana Avenida Transnordestina, s/n, Novo Horizonte, Campus Universitário 44036-900 Feira de Santana, BA, Brazil. E-mail: [email protected] No presente trabalho apresentamos uma discussão elementar, mas unificada dos conceitos de atrito de escorregamento e atrito de rolamento. São exploradas algumas situações simples, mas de grande riqueza conceitual e ausentes da maioria dos livros textos. Palavras-chave: atrito de escorregamento, rolamento, atrito de rolamento. We present an elementary but unified discussion of the concepts of sliding friction and rolling friction. Are explored some simple situations but of very conceptual wealth and absent from most textbooks. Keywords: sliding friction, rolling, rolling friction. INTRODUÇÃO Quando as superfı́cies de dois corpos sólidos se tocam, esses corpos inter- agem através de forças de contato. São exemplos de forças de contato a força normal e as forças de atrito. Enquanto a normal (como o nome indica) é uma força perpendicular à superfı́cie, as forças de atrito são tangenciais à superficie de contato. O estudo dessas forças tem enorme interesse prático porque o seu controle permite aumentar a eficiência de máquinas e equipa- mentos, diminuindo o desgaste das partes móveis dessas máquinas como, por exemplo, o motor de um automóvel. Isso levou ao desenvolvimento de uma ciência denominada tribologia, que se ocupa do estudo da interação entre superfı́cies submetidas a cargas ou em movimentos relativos. De um ponto de vista fundamental, as forças de atrito tem origem nas interações atômicas que ocorrem nas regiões de contato entre as superfı́cies, o que torna o problema bastante complexo, já que a situação das superfı́cies influencia enormemente o fenômeno. Dentre os diversos fatores que influenciam o comportamento das forças de atrito podemos citar a natureza dos materiais e o grau de polimento das superfı́cies em contato, a existência ou não de umidade ou lubrificantes entre as superfı́cies e a velocidade relativa entre as superfı́cies. Devemos inicialmente definir o que se entende por ‘contato’ entre duas superfı́cies sólidas. Do ponto de vista macroscópico, o contato entre dois sólidos (considerados como rı́gidos, i.e., indeformáveis) pode se dar de forma pontual (e.g., uma esfera sobre um plano horizontal), segundo uma linha (e.g., um cilindro sobre um plano horizontal, cujo contato acontece ao longo de uma geratriz do cilindro) ou segundo uma área (e.g., um cubo com uma das faces apoiadas em um plano horizontal). Obviamente os casos de contatos pontuais e lineares são idealizações já que sempre existe uma deformação por contato devido a não rigidez absoluta dos corpos reais. Do ponto de vista microscópico, devido à rugosidade das superfı́cies na escala atômica, as regiões de efetivo contato são uma pequena parte da área macroscópica de contato. 1 Este trabalho é uma versão ampliada de um minicurso ministrado na XVI Semana de Física da UEFS. 33 Andrade-Neto CADERNO DE FÍSICA DA UEFS 12 (02): 33-40, 2014 Quando duas superfı́cies de corpos sólidos estão em contato, há uma força de atração entre os corpos conhecida como adesão, a qual tem origem nas forças atrativas interatômicas. O atrito é conseqûência da necessidade de vencer estas forças atrativas. Quando não há movimento relativo das superficı́es de dois corpos em contato falamos em atrito estático. Quando acontece movimento relativo entre as superfı́cies dizemos que ocorre atrito cinético ou dinâmico. O movimento relativo entre duas superfı́cies em contato pode ser um escorregamento puro, um rolamento puro (também chamado de rolamento sem deslizamento) e, no caso mais geral, rolamento com deslizamento. Obviamente, a forma geométrica do corpo é fundamental para o tipo de movimento relativo. Um corpo só pode exibir rolamento puro se possuir uma seção circular (cilindro ou esfera, por exemplo). Desse modo as forças de atrito podem ser classificadas como atrito de escorregamento e atrito de rolamento, as quais serão analisadas a seguir. ATRITO DE ESCORREGAMENTO O atrito é uma das experiências mais familiares ao ser humano e possui uma longa história. Um dos primeiros a estudar de forma sistemática o atrito foi o italiano Leonardo da Vinci, que analisou o movimento de um bloco retangular sobre uma superfı́cie plana. Por volta de 1500 ele estabeleceu duas leis. A primeira afirma que as áreas em contato não tem efeito sobre o atrito e a segunda que se o peso do objeto é dobrado, o atrito também será dobrado. Também foi observado por da Vinci que o atrito é diferente para diferentes materiais. As leis de da Vinci foram redescobertas no século XVII pelo fı́sico francês Guillaume Amontons. Ele teorizou que o atrito era o resultado do trabalho realizado para levantar uma superfı́cie sobre a rugosidade da outra, bem como o trabalho para realizar a deformação da superfı́cie. Novos estudos sobre esse assunto foram realizados por Charles Coulomb, estabelecendo claramente que a força de atrito é proporcional à força compressiva (força normal). Coulomb também estabeleceu que a força de atrito não depende da velocidade, uma vez iniciado o movimento. Quando há movimento relativo entre as superfı́cies em contato, dizemos que há uma forca de atrito cinética. Em outras palavras, quando existe uma velocidade relativa não nula entre o contato das superfı́cies. As leis fenomenológicas de Amontons-Coulomb que descrevem o atrito de escorregamento podem ser expressas como (a) A força de atrito é independente da área aparente de contato. (b) O atrito é proporcional à carga normal. (c) O atrito cinético é aproximadamente independente da velocidade de deslizamento. Pela segunda lei do atrito, o módulo da força de atrito cinético é proporcional ao módulo da força normal N . Matematicamente temos que: Fc = µ c N, (1) onde µ c é o coeficiente de atrito cinético. Mesmo quando não há movimento relativo entre as superfı́cies, pode haver forças de atrito. Essa força é denominada atrito estático. Consideremos um bloco em repouso apoiado sobre uma 34 CADERNO DE FÍSICA DA UEFS 12 (02): 33-40, 2014 Atrito de Escorregamento e... Ԧ também horizontal, sabemos da experiência superfı́cie plana horizontal. Se aplicamos uma força F que o bloco só se move em relação à superfı́cie horizontal quando o módulo da forca F atinge um valor crı́tico que denominaremos (Fe )max . Esse valor máximo é proporcional a N, ou seja, (Fe)max = µ e N, (2) onde µ e é o coeficiente de atrito estático. Diferentemente da força de atrito cinético, que é aproximadamente constante, a força de atrito estático pode variar entre o valor nulo (quando não existe força paralela à superficie) até o valor máximo (Fe )max . Assim, 0 ≤ Fe ≤ µ e N. (3) Os conteúdos acima são abordados em todos os livros de fı́sica de nivel superior e também em livros de nı́vel médio de ensino. Esses conteúdos são apresentados sempre após as leis de Newton, como uma aplicação dessas leis e, o que é importante, em um contexto teórico no qual o corpo sob análise é modelado como uma partı́cula. Contudo, há situações em que o modelo de partı́cula é claramente inadequado. Na referência [1] é analisado o deslocamento lateral da força normal sobre um corpo (um bloco) em equilibrio estático ou dinâmico, apoiado sobre uma superfı́cie plana sujeito a uma força de atrito. Já na referência [2] é discutido o equı́voco de se utilizar o modelo de partı́cula para se calcular o trabalho realizado pela força de atrito cinético que age sobre um corpo que escorrega. Outra situação que mostra o limite do modelo de partı́cula é o de rolamento, conforme analisado na referência [3]. ROLAMENTO Movimentos de corpos que rolam são muitos comuns no dia a dia. Como exemplos óbvios podemos citar os movimentos das rodas de uma bicicleta ou de um automóvel. Também é muito comum o uso de esferas em experimentos em plano inclinado. O próprio Galileu realizou experiências desse tipo [4]. Figura 1: Distribuição de velocidade de um corpo rígido que rola sem deslizamento. No caso de rolamento não podemos tratar o corpo como uma partı́cula. Um modelo adequado para esse caso é o de corpo rı́gido o qual, por definicão, é um sistema no qual a distância entre duas partı́culas do corpo é inalterável ou, em outras palavras, o corpo é indeformável. Obviamente, nenhum corpo real é perfeitamnete rı́gido, mas em muitos casos essa é uma idealização conveniente. Vamos iniciar nossa análise pelo caso ideal de rolamento sem deslizamento ou rolamento puro. Rolamento puro. Cinemática Quando um corpo com simetria axial (um cilindro, uma esfera, um anel) rola sobre uma superfı́cie plana e cada ponto da periferia da roda não desliza sobre o plano, dizemos que acontece um rolamento sem deslizamento ou rolamento puro. Para fixar ideia, consideremos um cilindro de raio 35 Andrade-Neto CADERNO DE FÍSICA DA UEFS 12 (02): 33-40, 2014 R rolando sem deslizar sobre uma superfı́cie horizontal. Quando ele gira de um ângulo θ, o ponto de contato do corpo com a superfı́cie horizontal terá se deslocado de uma distância s, tal que s = Rθ. (4) Essa é a distância percorrida pelo centro de massa do corpo quando o mesmo gira de um ângulo θ. Derivando a equação (4) em relação ao tempo obtemos que vcm = ωR, (5) onde vcm = ds/dt é a velocidade de translação do centro de massa e ω = dθ/dt é a velocidade angular de rotação do corpo em torno de um eixo que passa pelo seu centro de massa. A eq.(5) é a condição necessária para que ocorra rolamento sem deslizamento. Enquanto o centro de massa do corpo movimenta-se em uma trajetória retilı́nea, um ponto na borda do corpo descreve uma trajetória denominada ciclóide [Ver Apêndice]. Essa trajetória pode ser visualizada colocando-se uma fonte luminosa na borda de um cilindro que rola sobre uma superfı́cie plana. Vamos agora determinar a velocidade de um ponto qualquer do corpo. O movimento mais geral de um corpo rı́gido é uma combinação de translação e rotação [5]. Desse modo, pode-se decompor a velocidade de uma partı́cula arbitrária de um corpo rı́gido em dois termos: um que representa a velocidade instantânea de translação e outra que representa a velocidade instantânea de rotação. Assim, a velocidade de um ponto qualquer do cilindro será Ԧv = Ԧvcm + ω Ԧ × Ԧr, (6) onde, como já definido Ԧvcm é a velocidade de translação do centro de massa e Ԧr é o vetor posição relativo ao centro de massa. Considerando o eixo perpendicular ao plano do movimento como sendo o eixo z, tal que ω Ԧ = −ωẑ e Ԧr = Ԧz + ρԦ, onde Ԧz = zẑ e ρԦ é a componente de Ԧr contida no plano de movimento, então ω Ԧ × Ԧr = ω Ԧ × (Ԧz + ρԦ) = ω Ԧ × ρԦ, já que ω Ԧ × Ԧz = 0. Assim, a eq.(6) fica Ԧv = Ԧvcm + ω Ԧ × ρԦ. (7) A Figura 1 é uma representação gráfica da eq.(7). Várias conclusões podem ser tiradas da Figura 1: (a) O ponto de contato da roda com o plano horizontal tem velocidade resultante nula, o que significa que não ocorre deslizamento. O contato do cilindro com o plano acontece ao longo de uma geratriz, cuja velocidade no instante de contato é nula. (b) A velocidade de qualquer ponto da roda possui direção perpendicular à linha que liga esse ponto ao ponto de contato. (c) O centro do corpo desloca-se com uma velocidade Ԧvcm , enquanto o ponto superior da roda desloca-se com o dobro dessa velocidade (2Ԧvcm ). A conclusão (a) acima nos permite realizar a seguinte discussão. Como a velocidade relativa de escorregamento entre as superfı́cies é nula, isso significa que, no caso de rolamento puro, não pode haver atrito cinético entre as superfı́cies. Em outras palavras, no caso de rolamento puro de um corpo rı́gido, se existe atrito ele é necessariamente estático já que a velocidade relativa de escorregamento é nula. Deve ser observado que há um movimento relativo entre o centro de massa do corpo e a superfı́cie sobre a qual o corpo rola. O que não há é um movimento relativo das superfı́cies em contato e essa é a razão pela qual, nesse caso, não há atrito cinético. 36 CADERNO DE FÍSICA DA UEFS 12 (02): 33-40, 2014 Atrito de Escorregamento e... Figura 2: Forças que atuam sobre um corpo rígido de seção circular de raio R submetido a uma força F. Só uma análise posterior pode determinar se o sentido de Fat está correto. Se a Eq. (5) nã̃o é obedecida teremos um rolamento com deslizamento. Se vcm > ωR teremos um rolamento com deslizamento de translação. Isso acontece quando, por exemplo, um carro é freiado bruscamente, provocando derrapagem. Por outro lado, quando vcm < ωR há um rolamento com deslizamento de rotação. Um exemplo desse caso se dá quando um carro desliza sobre uma pista de lama e os pneus giram com velocidade angular tal que vcm < ωR. Essa descrição cinemática do rolamento é realizada pelos principais livros textos universitários utilizados nos cursos de fı́sica básica. Supreendentemente, a análise dinâmica desse caso é quase completamente ignorada. DINÂMICA DO ROLAMENTO DE UM CORPO RÍGIDO SOBRE UM PLANO HORIZONTAL Vamos agora analisar a dinâmica do rolamento em um plano horizontal. Vamos considerar ambos os corpos (o corpo que rola e o plano horizontal) ideais, i.e., corpos rı́gidos perfeitos. Vamos considerar o corpo se movendo sobre um plano horizontal submetido a uma força Ԧ aplicada a uma certa altura h do plano (Figura 2) e a uma força de atrito F Ԧat a motriz horizontal F qual, provisoriamente está orientada para a esquerda. Apenas uma análise posterior pode determinar se esse sentido é correto ou não. As equações de movimento para o sólido são: F − Fat = Macm (8) 2 F (h − R) + F atR = Iα = Mk α, (9) onde M é a massa do corpo, I é o momento de inércia do corpo calculado em relação a um eixo passando pelo seu centro de massa, α é a aceleração angular do corpo em torno desse eixo e k é o raio de giração (para uma esfera k2 = 2R2/5, para um cilindro k2 = R2/2 e para um anel k2 = R2). Das expressões acima e utilizando que acm = αR obtemos (10) Para a esfera, o cilindro e o anel temos explicitamente Vemos da equação acima que a depender do intervalo de h, a força de atrito pode ter sentido oposto ou não ao movimento do centro de massa do corpo e, inclusive, ser nula. Para a esfera, por exemplo, vemos que no intervalo 0 ≤ h < 7R/5, a força de atrito é positiva (Fat > 0), o que significa que seu sentido coincide com aquele mostrado na Figura 2. Para h = 7R/5 temos que Fat = 0, enquanto que no intervalo 7R/5 ≤ h ≤ 2R a força de atrito é negativa (Fat < 0), 37 Andrade-Neto CADERNO DE FÍSICA DA UEFS 12 (02): 33-40, 2014 logo o seu sentido é contrário ao indicado na Figura 2. Uma análise semelhante se aplica ao cilindro e ao anel. O ilustra a situação para uma esfera de raio R = 20 cm submetida a uma força F = 5 N . Podemos discutir vários aspectos interessantes a partir dos resultados acima. Em primeiro lugar vemos que existe um valor crı́tico de h para o qual a força de atrito se anula, independente do valor de F. Isso mostra que pode haver rolamento de um corpo sobre uma superfı́cie plana mesmo na ausência de atrito. Isso é importante porque, como os livros textos tratam quase exclusivamente de rolamento sobre um plano inclinado, sem tratar da dinâmica de rolamento sobre uma superfı́cie horizontal, isso induz os estudantes a imaginar que a força de atrito é sempre uma condição necessária para a existência do rolamento. Vemos também que se a força F está aplicada a uma altura maior que esse valor crı́tico, a força de atrito tem o mesmo sentido do movimento do centro de massa do corpo, i.e., a força de atrito contribui para aumentar a aceleração do corpo. Esse resultado só é estranho quando analisado no contexto do modelo de partı́cula. No contexto do modelo de corpo rı́gido, no qual deve-se levar em conta outras grandezas dinâmicas na análise do movimento, como o torque, esse resultado é perfeitamente compreensı́vel. Outra consequência interessante das Eqs. (10) ou (11) é que se a força F for nula, i.e., se não existe força motriz, a força de atrito se anula. Nesse caso ideal (sólidos e superfı́cies inderformáveis), desprezando a resistência do ar, As únicas forças que atuam no corpo que rola sem deslizar sobre uma superfı́cie horizontal, são a força peso e a normal, ambas aplicadas no centro de massa do corpo. Gráfico 1: Fat em função de h para uma esfera de raio R = 20cm submetida a uma força F = 5N. Mas, por que razão a força de atrito é nula no rolamento puro em um plano horizontal? o motivo é que, nesse caso ideal, se houvesse uma força de atrito não nula retardando o movimento, o torque produzido por essa força aumentaria a velocidade angular do corpo mas, ao mesmo tempo, essa força de atrito diminuiria a velocidade do centro de massa do corpo, o que é absurdo. Então, a força de atrito deve ter o mesmo sentido do movimento de translação do corpo? Nesse caso, o torque produzido por Fat provocaria a diminuição da velocidade angular do corpo enquanto a velocidade do centro de massa aumentaria com o tempo. As duas situações são absurdas, o que significa que em um plano horizontal a força de atrito (entre o plano e o corpo que rola) é nula e, portanto, vcm = ωR = constante. Uma análise detalhada dessa situação é feita na Referência [3]. 38 CADERNO DE FÍSICA DA UEFS 12 (02): 33-40, 2014 Atrito de Escorregamento e... Figura 3: Forças que atuam sobre um corpo deformável. Deve ser notado que a força N está deslocada em relação à posição de um corpo perfeitamente rígido. ATRITO DE ROLAMENTO Por que é muito mais fácil deslocar um corpo que possui rodas (um móvel de escritório, por exemplo) do que o mesmo corpo sem rodas? A resposta a essa questão nos remete ao conceito de atrito de rolamento. Sabemos da experiência que um corpo sólido que rola em um plano hor- izontal perde velocidade e pára após certo tempo. Então por que o corpo pára? além da resistência do ar (arrasto aerodinâmico) há o atrito de rolamento que surge devido ao fato de que nem o corpo nem o plano são perfeitamente rı́gidos e, assim, no movimento de rolamento, ambos sofrem deformações, o que dá origem ao atrito de rolamento. Considermos, para fixar ideia, um cilindro que rola em um plano horizontal. Vamos considerar que as deformações ocorrem exclusivamente no corpo que rola. Um exemplo dessa situação seria um pneu de automóvel trafegando sobre uma pista hor- izontal de concreto ou asfalto. A Figura 3 mostra as forças que atuam sobre o corpo onde mais uma vez Ԧ será desprezaremos a resistência do ar. Devido ao achatamento do corpo, o ponto de aplicação de N Ԧ atua no caso do corpo deslocado para frente por uma distância x em relação ao ponto em que N Ԧat é a força de atrito que se opõe ao movimento. As equações dinâmicas ficam agora: indeformável. F F − Fat = −Ma cm (12) FatR − Nx = −Iα (13) onde I é o momento de inércia do corpo e α a aceleração angular em relação ao centro de massa. Na referência [3] é desenvolvida a teoria que mostra por que o corpo pára. Se o corpo se desloca com velocidade do centro de massa constante, as equações de movimento ficam F = Fat , (14) FatR = Nx. (15) Da Eq. (15) podemos definir uma grandeza adimensional µ r tal que µ r =x/R=Fat/N (16) onde µ r é denominado coeficiente de atrito de rolamento ou coeficiente de resistência ao rolamento. Deve ser observado que se o corpo é perfeitamente rı́gido x = 0 e, desse modo, µ r = 0. Isso explica porque no rolamneto puro de um corpo rı́gido a força de atrito é nula. Valores tı́picos de µ r para pneus de carro sobre asfalto são da ordem de 0, 01 enquanto o coeficiente de atrito estático (µ e ) é da ordem de 0, 9, ou seja, µ r é cerca de 90 vezes menor que µ e . Esses valores explicam porque é tão mais fácil deslocar um móvel que possui rodas em comparação com o mesmo móvel sem rodas. CONCLUSÕES 39 Andrade-Neto CADERNO DE FÍSICA DA UEFS 12 (02): 33-40, 2014 Neste trabalho consideramos a dinâmica do rolamento sobre uma superfı́cie horizontal plana, assunto ignorado pela maioria dos livros textos universitários de fı́sica básica, que, em geral, considera a cinemática de rolamento e a dinâmica de rolamento em um plano inclinado. Consideramos duas situações, a saber, o movimento de rolamento sem e com força motriz. A matemática envolvida na análise desse movimento é bastante simples e é acessı́vel inclusive para estudantes do ensino médio. Apesar de sua simplicidade matemática, essas situações fornecem as condições ótimas para a introdução e aprofundamento de importantes conceitos como o de corpo rı́gido, a conservação da energia, conservação do momento angular, forças de atrito, dentre outros. APÊNDICE Ciclóide é a curva gerada por um ponto P sobre uma circunferência que rola sem deslizar sobre uma superfı́cie horizontal. Consideremos um cı́rculo de raio R que se move ao longo do eixo x, com o ponto P inicialmente na origem. As equações paramétricas da curva descrita pelo ponto P (a ciclóide) são dadas por onde θ é o ângulo de rotação do cı́rculo à medida que o corpo gira. A ciclóide é de grande importância na história da ciência porque é a solução de dois problemas famosos. O primeiro é o problema da braquistócrona (menor tempo), o qual consiste na determinação da curva (trajetória) ao longo da qual um corpo deslizando sem atrito gastará o menor tempo possı́vel para ir de um ponto A a um ponto B, sob ação da gravidade. É admitido que os pontos A e B não estão na mesma vertical, cuja solução, neste caso, seria uma reta. O segundo é o denominado problema da tautócrona (tempos iguais), que consiste em determinar a forma da curva que faz com que um corpo atinja o ponto mais baixo da curva em intervalos de tempos iguais, independente- mente da altura em que o corpo é solto. A solução de ambos problemas é uma ciclóide invertida. REFERÊNCIAS [1] Eden V. Costa e C. A. Faria Leite. Revista Brasileira de Ensino de Fı́sica v. 32, n.4, 4301 (2010). [2] Osman Rosa e Ronilson Carneiro Filho Leite. Revista Brasileira de Ensino de Fı́sica v. 33, n.2, 2308 (2011). [3] A. V. Andrade-Neto, J. A. Cruz, M. S. R. Miltão e C. S. Ferreira. Revista Brasileira de Ensino de Fı́sica v. 35, n.3, 3704 (2013). [4] Michael Segre. Caderno de Fı́sica da UEFS, 06, 87 (2008). [5] H. Moysés Nussenzveig. Curso de Fı́sica Básica 1: Mecânica. Editora Edgar Blücher, (1997). 40