RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 I) FILOSOFIA 1) Conhecimento Afinal, o que é Conhecimento? O objetivo deste artigo é construir com o leitor um breve entendimento, através da história, sobre a compreensão das influências de várias teorias do conhecimento estabelecendo parâmetros de avaliação, critérios de verdade, objetivação, metodologia e relação sujeito e objeto para os vários modos de conhecimentos diante da crise da razão que se instaurou no século XX e que há de se prolongar neste presente século, através dos desafios da construção de uma ética normativa compatível com as evoluções das descobertas e do conhecimento no campo científico. Começamos por conceituar o conhecimento: Conhecimento é a relação que se estabelece entre sujeito que conhece ou deseja conhecer e o objeto a ser conhecido ou que se dá a conhecer. Na Grécia Antiga temos várias visões e métodos de conhecimento: Sócrates: Estabelecendo seus métodos: ironia e maiêutica. Platão – Doxa – A ciência é baseada na Opinião Aristóteles – Episteme – A ciência é baseada Observação (Experiência) I – Teoria do Conhecimento na Antigüidade: Podemos perceber que os Filósofos gregos deixaram algumas contribuições para a construção da noção de conhecimento: a. Estabeleceram a diferença entre conhecimento sensível e conhecimento intelectual b. Estabeleceram diferença entre aparência e essência. c. Estabeleceram diferença entre opinião e saber d. Estabeleceram regras da lógica pra se chegar à verdade II – Teoria do Conhecimento na Idade Média: 1. Na Patrística – Temos a tendência da conciliação do pensamento cristão ao pensamento platônico, sendo seu grande expoente Santo Agostinho. 2. Na Escolásticas - Temos a anexação da Filosofia aristotélica ao pensamento cristão, com o estreitamento da relação Fé e razão, sendo seu grande expoente São Tomás de Aquino. 3. Nominalismo – Temos o final do domínio do Pensamento Medieval, com a separação da Filosofia da teologia através do esvaziamento dos conceitos. Sendo seus expoentes Duns Scotto e Guilherme de Oclkam. III – Teoria do Conhecimento na Idade Moderna: A primeira revolução Científica trouxe várias mudanças para o pensamento, dentre as quais podemos destacar a mudança da visão teocentrista (Deus é o centro do conhecimento), para visão antropocentrista (o homem é o centro do conhecimento). 1. O racionalismo de. René Descartes – O discurso do Método: A máxima do cartesianismo “Cogito ergo sun”. 2. O empirismo: a. John Lock – a experiência b. David Hume – a Crença 3. O criticismo kantiano: O conhecimento a priori: Universal e necessário. 4. A herança iluminista: A razão. III – Teoria do Conhecimento na Idade Contemporânea: A Crise da Razão. O novo iluminismo de Habermas A razão crítica precisa: a. Fazer a crítica dos limites b. Estabelecer princípios éticos -1– RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 c. Vincular construção a raízes sociais. CONCLUSÃO: A construção do conhecimento fundado sobre o uso crítico da razão, vinculado a princípios éticos e a raízes sociais é tarefa que precisa ser retomada a cada momento, sem jamais ter fim. O assunto é por demais amplo e muito bem discutido por vários filósofos. Nossa pretensão foi apensas de trazer uma reflexão através de um esboço sistemático da história do conhecimento. Deixamos para apreciação através de uma análise analítica e crítica os principais modos de conhecer o mundo e suas formas de abordagens para se chegar ao conhecimento verdadeiro. Modos de Conhecer o Mundo Critérios de verdade Objetivação 1. O Mito A Fé Dogmatismo – Doutrinamento e Proselitismo 2. A Filosofia A razão A razão discursiva. 3. O Senso Comum A cultura ética e moral A Tradição cultural Metodologia A experiência pessoal A dialética (O discurso) As crenças silenciosas (Ideologias) 4. A Arte A estética 5. A Ciência A experimentação Esteticismo = A subjetividade do artista e do contemplador (observador) da arte. Objetividade Comprovação de uma determinada tese de modo objetivo O gosto A observação Relação sujeito-Objeto Relação Suprapessoal, onde a Revelação do Sagrado se manifesta (revela) sobrenaturalmente ao profano através do rito (Dramatização do mito, ou seja, da liturgia religiosa). Relação transpessoal onde a palavra diz as coisas. O mundo se manifesta pelos fenômenos e é dizível através do λογοσ Relação interpessoal, onde a ideologia estabelecida pelas idéias dominantes e pelos poderes estabelecidos. Relação pessoal, onde a criatividade e a percepção da realidade do autor e a interpretação e sensibilidade do observador. Relação “impessoal”, A isenção do cientista diante de sua pesquisa: O mito da neutralidade científica. © Copyright 2003 - Prof. Vanderlei de Barros Rosas - Professor de Filosofia e Teologia. Bacharel e Licenciado em Filosofia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro; Bacharel em teologia pelo Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil; Pós-graduado em Missiologia pelo Centro Evangélico de Missões; Pós-graduado em Educação Religiosa pelo Instituto Batista de Educação Religiosa. Fonte: http://www.mundodosfilosofos.com.br/vanderlei22.htm 2) Ontologia -2– RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 Breve histórico O termo ontologia tem um sentido especial em computação e inteligência artificial, diferente daquele tradicional, adotado na filosofia. De forma geral, estudar ontologias é definir categorias para as coisas que existem em um mesmo domínio. Ontologia é um “catálogo de tipos de coisas”, as quais assume-se existir em um domínio de interesse na perspectiva de uma pessoa que usa uma determinada linguagem. Historicamente o termo ontologia tem origem no grego “ontos”, ser e “logos”, palavra. É um termo novo na história da filosofia, introduzido originalmente com o objetivo de distinguir o estudo do ser como tal (ou seja do ser humano em sua essência), do estudo dos vários tipos de outros seres das ciências naturais. O termo original é a palavra aristotélica “categoria”, que pode ser usada para classificar e caracterizar alguma coisa. Em seus tratados, Aristóteles apresenta categorias que servem de base para classificar qualquer entidade e introduz ainda o termo “differentia” para propriedades que distinguem diferentes espécies do mesmo gênero. A técnica de herança é o processo de mesclar differentias definindo categorias por gênero e diferenciação e é fundamental para estudos semânticos, desde dicionários até a Web Semântica. Outra importante contribuição aristotélica foi a invenção dos silogismos como um padrão formal para representar regras de inferência. Esses estudos são a base para as regras de herança em hierarquias e para deduções sobre restrições em uma hierarquia. Também são a base da lógica de primeira ordem que é a base da lógica descritiva, da qual duas versões modernas são a DARPA Agent Markup Language (DAML) e a OIL. Algumas definições "Uma ontologia é uma especificação explícita de uma conceitualização. O termo é tomado da filosofia, onde uma ontologia é uma consideração sistemática da existência. Para os sistemas da inteligência artificial, o que existe é o que pode ser representado. [...] Dessa forma, no contexto da inteligência artificial, pode-se descrever a ontologia de um programa definindo um grupo de termos representacionais. Em tal ontologia, definições associam nomes de entidades no universo do discurso (por ex. classes, relações, funções ou outros objetos, com textos legíveis para pessoas, descrevendo o que os nomes significam, e, os axiomas formais que restringem a interpretação e o uso adequado desses termos) [...]." "[...] um ponto inicial nesse esforço de tornar claro o termo, será uma analise cuidadosa da interpretação adotada por Gruber. O principal problema com tal interpretação é que ela é baseada na noção conceitualização, a qual não corresponde a nossa intuição. [...] Uma conceitualização é um grupo de relações extensionais descrevendo um ‘estado das coisas’ particular, enquanto a noção que temos em mente é uma relação intensional, nomeando algo como uma rede conceitual a qual se superpõe a vários possíveis ‘estados das coisas’." "[...] por outro lado, em sua utilização em inteligência artificial, ontologia se refere a um artefato de engenharia, constituído por um vocabulário específico usado para descrever uma certa realidade, mais um conjunto de fatos explícitos e aceitos que dizem respeito ao sentido pretendido para as palavras do vocabulário. Este conjunto de fatos tem a forma da teoria da lógica de primeira ordem, onde as palavras do vocabulário aparecem como predicados unários ou binários. [...] Duas ontologias podem ser diferentes no vocabulário usado (palavras em inglês, francês ou italiano) e mesmo assim compartilhar a mesma conceitualização." “Uma ontologia é uma especificação formal e explícita de uma conceitualização compartilhada” GRUBER, T. What is an ontology? (1993). Available from Internet: <http://wwwksl.stanford.edu/kst/what- is-an-ontology.html>. Access: 14 Sep. 2002 . GUARINO, N.; GIARETTA, P. Ontologies and KBs, towards a terminological clarification. In: MARS, N. (Ed.). Towards a Very Large Knowledge Bases; Knowledge Building and Knowledge Sharing. [S.l.]: IOS Press, 1995. p. 25-32. BORST, W.N. Construction of engineering ontologies; Phd Thesis (1997). Available from Internet: <http://www.ub.utwente.nl/webdocs/inf/1/t0000004.pdf>. Access: 21 Apr. 2002. -3– RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 Fonte: http://www.eci.ufmg.br/mba/p1_2.html 3) Epsitemologia A Epistemologia A. C. Grayling Birkbeck College, Londres St Anne’s College, Oxford Introdução A epistemologia, também chamada teoria do conhecimento, é o ramo fa filosofia interessado na investigação da natureza, fontes e validade do conhecimento. Entre as questões principais que ela tenta responder estão as seguintes. O que é o conhecimento? Como nós o alcançamos? Podemos conseguir meios para defendê-lo contra o desafio cético? Essas questões são, implicitamente, tão velhas quanto a filosofia, embora seu primeiro tratamento explícito seja o encontrado em Platão (427347 AC), em particular no Theaetetus. Mas primordialmente na era moderna, a partir do século XVII em diante - como resultado do trabalho de Descartes (1596-1650) e Locke (1632-1704) em associação com a emergência da ciência moderna - que a epistemologia tem ocupado um plano central na filosofia. Um passo óbvio na direção de responder a primeira questão é tentar uma definição. A definição padrão, preliminarmente, é a de que o conhecimento é crença verdadeira justificada. Esta definição parece plausível porque, ao menos, ele dá a impressão de que para conhecer algo alguém deve acreditar nele, que a crença deve ser verdadeira, e que a razão de alguém para acreditar deve ser satisfatória à luz de algum critério - pois alguém não poderia dizer conhecer algo se sua razão para acreditar fosse arbitrária ou aleatória. Assim, cada uma das três partes da definição parece expressar uma condição necessária para o conhecimento, e a reivindicação é a de que, tomadas em conjunto, elas são suficientes. Há, contudo, dificuldades sérias com essa idéia, particularmente sobre a natureza da justificação requerida para a crença verdadeira eqüivaler a conhecimento. Propostas competidoras tem sido oferecidas para acolher as dificuldades, ou para acrescentar mais condições ou para achar um enunciado melhor para a definição posta. A primeira parte da discussão que se segue considera essas propostas. Paralelamente a esse debate sobre como definir o conhecimento há um outro sobre como o conhecimento é adquirido. Na história da epistemologia tivemos duas principais escolas de pensamento sobre o que constitui o meio mais importante para o conhecer. Uma é a escola "racionalista", que mantém que a razão é responsável por esse papel. A outra é a "empirista", que mantém que é a experiência, principalmente o uso dos sentidos, ajudados, quando necessário, por instrumentos, que é responsável por tal papel. O paradigma de conhecimento para os racionalistas é a matemática e a lógica, onde verdades necessárias são obtidas por intuição e inferência racionais. Questões sobre a natureza da razão, a justificação da inferência e a natureza da verdade, especialmente da verdade necessária, pressionam para serem respondidas. O paradigma dos empiristas é a ciência natural, onde observações e experimentos são cruciais para a investigação. A história da ciência na era moderna dá sustentação à causa do empirismo; mas precisamente para esta razão, questões filosóficas sobre percepção, observação, evidência e experimento tem adquirido grande importância. Mas para ambas tradições em epistemologia o interesse central é se podemos confiar nas rotas que elas respectivamente denominam. Os argumentos céticos sugerem que não podemos simplesmente assumi-las como confiáveis; certamente, elas sugerem que trabalho é necessário para mostrar que elas são confiáveis. O esforço para responder ao ceticismo, portanto, fornece um modo distinto de entender o que é crucial em epistemologia. A segunda parte está concentrada na análise do ceticismo e algumas respostas a ele. -4– RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 Há outros debates em epistemologia sobre, entre outras coisas, memória, julgamento, introspecção, raciocínio, distinção "a priori- a posteriori", método científico e diferenças metodológicas, diferenças metodológicas, se há, entre ciências da natureza e ciências sociais; as questões consideradas aqui são básicas para todos esses debates. (...) O método da dúvida de Decartes O objetivo de Descartes era o de achar uma base para o conhecimento, o qual ele acharia buscando uma ponto de início a respeito do qual ele poderia estar certo. Encontrar a certeza, ele necessitava rejeitar qualquer coisa que pudesse ser duvidosa, mesmo que fosse ter dúvida sobre algumas coisas fosse um absurdo, pois somente deste modo poderíamos ser deixados com o que é verdadeiramente indubitável. Na primeira Meditação ele embarca nessa tarefa tomando emprestado os argumentos céticos dos antigos. Primeiro ele cita o fato de que podemos ser enganados pela percepção. Mas isso não é um ceticismo completamente suficiente, pois mesmo se percebemos erradamente há ainda muito que podemos saber. Assim, ele, em seguida, considera a possibilidade de que em qualquer ocasião de afirmação de alguém de ela sabe algo, ela poderia estar sonhando. Esse pensamento cético consegue mais coisas para sua rede, mas é ainda insuficiente, pois mesmo no sonho podemos saber tais coisas como, por exemplo, verdades matemáticas. Assim, para alcançar uma consideração a mais ampla possível, Descartes introduz a idéia do "gênio malígno". Aqui a suposição é a de que com respeito a todas as coisas sobre as quais poder-se-ia possivelmente estar errado, com certeza o "gênio maligno" a engana. Notoriamente, o que um tal ser não poderia fazer errar é que cogito ergo sum quando se pensa "eu existo", esta proposição é verdadeira. O essencial a se notar no uso de Descartes desses argumentos é que se trata de um uso puramente metodológico. O resto das Meditações é devotado a mostrar que sabemos uma grande porção de coisas, porque o fato (como Descartes, se êxito, tenta provar) é que há um deus bom que garante que, tanto quanto usamos nossas faculdades responsavelmente, qualquer coisa que é percebido com clareza e distinção como verdadeira será certamente verdadeira. Isso porque um deus bom, diferentemente de um mau, não desejaria nossa ignorância. Descartes não foi, de maneira alguma, um cético, nem ele pensava que os argumentos céticos, menos de todos os que alguém empregava como dispositivo para por de lado tantas crenças quanto possíveis, fossem persuasivos. O "método da dúvida" era meramente um instrumento. Os sucessores de Descartes, contudo, estavam muito mais impressionados com os argumentos céticos que ele empregou do que sua resposta a eles. Pois a tradição do pensamento epistemológico após seu tempo, considerou esses problemas e similares não como mero dispositivos metodológicos, mas como problemas sérios que requeriam uma solução. Daí a distinção que tirei aqui entre ceticismo metodológico e ceticismo problemático. É claro que há considerações céticas que tem utilidade meramente metodológica, e não são genuinamente problemáticas, porque não representam um desafio persuasivo e estável para nossos padrões epistemológicos ordinários. O "gênio maligno" é um caso desse tipo. Uma vez que a hipótese de que há uma tal coisa é tão arbitrária e sem base quanto uma hipótese pode chegar a ser, ela não tem mérito ao ser tomada seriamente senão como uma estratégia para se provar um ponto de vista. Mas as considerações céticas sobre percepção, erro, ilusão e sonho soam mais interessantes e problemáticas, e consequentemente merecem exame. Entre a muitas questões dignas de preocupação sobre a discussão de Descartes temos duas, as seguintes. Primeiramente, como sugerido inicialmente, sua busca por certeza é mal concebida em argumentos. Certamente um estado psicológico de alguém pode ocorrer independentemente de se as crenças desse alguém são verdadeiras ou não. A falsidade de uma crença não é nenhuma barreira para que o sentimento de certeza desse alguém seja de outro modo. Descartes perseguiu modos específicos de reconhecer quais das nossas crenças são verdadeiras, mas ele foi falar de certeza porque - e este é o segundo ponto - ele assumiu que a tarefa da epistemologia é prover alguém com uma maneira de conhecimento, a partir de ponto de vista subjetivo próprio deste alguém, quando se possui conhecimento. Consequentemente, ele começa com o dado privado de uma consciência singular e -5– RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 tenta mover-se para fora dela, buscando garantias par os processos em rota. Quase todos os sucessores de Descartes em epistemologia, até Russell, incluindo Russell (1872-1970) e Ayer (19101989), aceitaram essa perspectiva a respeito de suas tarefas. Nesse sentido, ao menos, todos foram cartesianos. Falando de modo amplo, é por tais razões, como sugerimos acima, que eles acharam duro de enfrentar o desafio do ceticismo. (...) Idealismo e fenomenalismo Há, em paralelo a esse modo de Kant responder ao desafio cético, outra abordagem, que nega a existência de um fosso gerando pelo ceticismo. As figuras chefes nesse campo são Berkeley e, mais recentemente, os fenomenalistas, que - permitindo por diferenças entre eles, e lembrando que os dois últimos só mantém tais perspectivas em parte de suas carreiras - incluem Mill (1806-73, Russell e Ayer. Na perspectiva de Berkeley, o ceticismo emerge do pensamento de que atrás ou na frente de nossas experiências sensórias repousa um mundo material. O mundo "material" significa "feito de mattéria", e "matéria" é um termo filosófico técnico que é suposto denotar uma substância indetectável empiricamente, que os predecessores da filosofia de Berkeley usaram como base para as propriedades das coisas detectáveis sensoriamente, tais como cores, formas e texturas. Berkeley rejeitou o conceito de matéria assim entendido - é comum lê-lo erradamente, tomando-o como alguém que negou a existência de objetos físicos; ele não fez tal coisa - argumentando que por causa dos objetos físicos serem coleções de qualidades sensíveis, e porque qualidades sensíveis são idéias, e porque idéias só podem existir se percebidas, a existência de objetos, portanto, consiste em serem percebidos; se não por mentes finitas tais como as nossas, então em todos os lugares e em todo o tempo por uma mente infinita. (Podemos notar que Berkeley pensava que sua refutação do ceticismo era ao mesmo tempo um novo e poderoso argumento em favor da existência de Deus.) O costume de Berkeley de dizer que as coisas existem "na mente" levou leitores não críticos a supor que ele queria dizer que objetos existem somente na cabeça de alguém, que é o que o idealista subjetivista ou o solipsista podeiam tentar manter. O idealismo de Berkeley, se é ou não de algum modo defensável, é ao menos uma perspectiva não tão instável. Seu "na mente" deveria ser lido como significando "com referência essencial à experiência ou pensamento". Para os propósitos aqui presentes, a questão é que Berkeley buscou refutar o ceticismo por meio da negação da existência de um fosso entre experiência e realidade, sobre o fundamento de que experiência e realidade são a mesma coisa. (Ele tinha uma teoria de como, a despeito disso, poderíamos todavia imaginar, sonhar e errar). Os fenomenalistas, mesmo com uma importante diferença, argumentaram de modo parecido, partindo do que aparece para nós na experiência. Quando analisamos os aparecimentos - o "fenômeno - vemo que eles não não construídos separados do dados básicos dos sentidos, seja a menor passagem de cor no campo visual ou o mais baixo som em nosso campo auditivo. Fora dos dados dos sentidos "contruímos logicamente" as cadeiras e mesas, pedras e montanhas, constituindo os acessórios do mundo do dia-a-dia. Uma alternativa, mas equivalente, de se colocar tal questão, afirmam os fenomenalistas, é dizer que enunciados sobre objetos físicos são meramente convenientes atalhos de enunciados mais longos e mais complicados sobre como as coisas aparecem para nós no emprego usual de nossas capacidades sensórias. E para dizer que objetos continuam existindo mesmo quando não percebidos é dizer - na frase de Mill - que eles são "possibilidades permanentes de sensação", significando que alguém poderia experienciá-los se fossem preenchidas certas condições. Berkeley mantém que cisa permanecem em existência quanto não percebidas por mentes finitas porque elas são percebidas por uma divindade. Os fenomenalistas agumentam que o que se quer dizer quando se fala que as coisas existem independentemente da percepção delas é que certas condições contra-factuais são verdadeiras, a saber, aqueles que afirmam que as coisas em questão seriam percebidas se algum ente que percebe estivesse adequadamente localizado com respeito a elas. Esses condicionais são notoriamente problemáticos, porque não está claro como entendê-los. O que, em particular, torna todos eles verdadeiros quando eles são (ou bem obviamente que são) verdadeiros? As -6– RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 respostas usuais, nos termos de mundos possíveis, leis e regularidades ideais ou similaridades exóticas, ajudam pouco. Não está claro quanto muito de um progresso é adquirido a partir da ubiqüidade da divindade de Berkeley ao simplesmente a substituirmos por contrafactuais verdadeiros. A perspectiva de Berkeley tem a modesta atração de que tudo no mundo é real - tudo que existe é percebido - em qualquer lugar no universo do fenomenalista a maioria do que existe é assim uma possibilidade antes do que uma realidade, a saber, uma possibilidade de percepção. Pelos menos uma coisa está clara: que não se alcança o fenomenalismo simplesmente subtraindo a teologia da teoria de Berkeley. Ao fazer isso, então reaparece o fosso metafísico, e então substitui-se uma comprometimento com a existência de simples verdades contra-factuais, com um comprometimento de fica acompanhado com a existência do possível. Tanto a teoria de Berkeley quanto o fenomenalismo, então, demanda ato preço para aproximar o fosso cético. (...) Observações finais Há muito gostar-se-ia insistir sobre uma tentativa correta para descrever o trabalho que necessita ser feito em epistemologia, para isso é necessário preliminarmente fazer o progresso que podem. Aqui, eu simplesmente sublinharei uma casal de observações já feitas acima. Primeiramente, debates sobre a definição de "conhecimento" me parecem ser um lado a ser mostrado. A justificação de afirmações nas ciências naturais, nas ciências sociais (não, no mínimo, na história) e direito é onde o trabalho real a ser feito em epistemologia fala mais alto. E sua explicação aplica-se somente ao caso empírico: o que das questões epistemológicas que apertam em ética e em filosofia da matemática? Pode não haver nenhuma garantia - e certamente é não razoável - que altar generalizações sobre justificação e conhecimento se aplicarão inequivocamente a todos esses campos. "Justificação" é um conceito mudo que necessita ser resgatado fora, nos termos particulares para campos particulares; muito seria óbvio a partir do fato de que explicações gerais de justificação não restritivamente mostram-se não ajudáveis à vulnerabilidade de contra-exemplos. Em segundo lugar, pouco da literatura corrente sobre o ceticismo torna alguém confiante de que sua natureza é propriamente entendida. O ceticismo define um problema central em epistemologia, a saber, a necessidade de mostrar como é possível justificação de crenças. Isso é feito ao nos defrontarmos com o desafio de mostrar que considerações céticas não produzem, após tudo, um fracasso de nossos melhores esforços neste ou naquele específico campo. Implícito nessa caracterização estão duas importantes afirmações: primeiramente, que o ceticismo é melhor entendido como um desafio, não como uma afirmação de que não sabemos nada ou que não podemos saber nada; e, secundariamente, que o melhor modo de responder ao ceticismo não é tentando refutá-lo na base de argumento por argumento, mas monstrando como fazemos as justificações para o que acreditamos. De algum modo, esse dois pontos, que foram óbvios aos nossos predecessores, parecem terem sido uma visão que se perdeu. Tradução de Paulo Ghiraldelli Jr. O texto foi traduzido de Grayling, A C. Epistemology. Bunnin and others (editors); The Blackwell Companhion to Philosophy. Cambridge, Massachusetts: Blackwell Publishers Ltd, 1996. As notas, as referências, leituras recomendadas e questões estão na obra original (NT). Fonte: http://www.cfh.ufsc.br/~wfil/grayling.htm 4) O Positivismo - Auguste Comte Características Gerais do Positivismo Ao idealismo da primeira metade do século XIX se segue o positivismo, que ocupa, mais ou menos, a segunda metade do mesmo século, espalhado em todo o mundo civilizado. O positivismo representa uma reação contra o apriorismo, o formalismo, o idealismo, exigindo maior respeito para a experiência e os dados positivos. Entretanto, o positivismo fica no mesmo âmbito imanentista do idealismo e do pensamento moderno em geral, defendendo, mais ou menos, o absoluto do fenômeno. "O fato é -7– RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 divino", dizia Ardigò. A diferença fundamental entre idealismo e positivismo é a seguinte: o primeiro procura uma interpretação, uma unificação da experiência mediante a razão; o segundo, ao contrário, quer limitar-se à experiência imediata, pura, sensível, como já fizera o empirismo. Daí a sua pobreza filosófica, mas também o seu maior valor como descrição e análise objetiva da experiência - através da história e da ciência - com respeito ao idealismo, que alterava a experiência, a ciência e a história. Dada essa objetividade da ciência e da história do pensamento positivista, compreende-se porque elas são fecundas no campo prático, técnico, aplicado. Além de ser uma reação contra o idealismo, o positivismo é ainda devido ao grande progresso das ciências naturais, particularmente das biológicas e fisiológicas, do século XIX. Tenta-se aplicar os princípios e os métodos daquelas ciências à filosofia, como resolvedora do problema do mundo e da vida, com a esperança de conseguir os mesmos fecundos resultados. Enfim, o positivismo teve impulso, graças ao desenvolvimento dos problemas econômico-sociais, que dominaram o mesmo século XIX. Sendo grandemente valorizada a atividade econômica, produtora de bens materiais, é natural se procure uma base filosófica positiva, naturalista, materialista, para as ideologias econômicosociais. Gnosiologicamente, o positivismo admite, como fonte única de conhecimento e critério de verdade, a experiência, os fatos positivos, os dados sensíveis. Nenhuma metafísica, portanto, como interpretação, justificação transcendente ou imanente, da experiência. A filosofia é reduzida à metodologia e à sistematização das ciências. A lei única e suprema, que domina o mundo concebido positivisticamente, é a evolução necessária de uma indefectível energia naturalista, como resulta das ciências naturais. Dessas premissas teoréticas decorrem necessariamente as concepções morais hedonistas e utilitárias, que florescem no seio do positivismo. E delas dependem, mais ou menos, também os sistemas político-econômico-sociais, florescidos igualmente no âmbito natural do positivismo. Na democracia moderna - que é a concepção política, em que a soberania é atribuída ao povo, à massa - a vontade popular se manifesta através do número, da quantidade, da enumeração material dos votos (sufrágio universal). O liberalismo, que sustenta a liberdade completa do indivíduo - enquanto não lesar a liberdade alheia - sustenta também a livre concorrência econômica através da lida mecânica, do conflito material das forças econômicas. Para o socialismo, enfim, o centro da vida humana está na atividade econômica, produtora de bens materiais, e a história da humanidade é acionada por interesses materiais, utilitários, econômicos (materialismo histórico), e não por interesses espirituais, morais e religiosos. O positivismo do século XIX pode semelhar ao empirismo, ao sensismo (e ao naturalismo) dos séculos XVII e XVIII, também pelo país clássico de sua floração (a Inglaterra) e porquanto reduz, substancialmente, o conhecimento humano ao conhecimento sensível, a metafísica à ciência, o espírito à natureza, com as relativas conseqüências práticas. Diferencia-se, porém, desses sistemas por um elemento característico: o conceito de vir-a-ser, de evolução, considerada como lei fundamental dos fenômenos empíricos, isto é, de todos os fatos humanos e naturais. Tal conceito representa um equivalente naturalista do historicismo romântico da primeira metade do século XIX, com esta diferença, entretanto, que o idealismo concebia o vir-a-ser como desenvolvimento racional, teológico, ao passo que o positivismo o concebe como evolução, por causas. Através de um conflito mecânico de seres e de forças, mediante a luta pela existência, determina-se uma seleção natural, uma eliminação do organismo mais imperfeito, sobrevivendo o mais perfeito. Daí acreditar o positismo firmemente no progresso - como nele já acreditava o idealismo. Trata-se, porém, de um progresso concebido naturalisticamente, quer nos meios quer no fim, para o bem-estar material. Mas, como no âmbito do idealismo se determinou uma crítica ao idealismo, igualmente, no âmbito do positivismo, a única realidade existente, o cognoscível, é a realidade física, o que se pode atingir cientificamente. Portanto, nada de metafísica e filosofia, nada de espírito e valores espirituais. No entanto, atinge a ciência fielmente a sua realidade, que é a experiência? E a ciência positivista é pura ciência, ou não implica uma metafísica naturalista inconsciente e, involuntariamente, discutível pelo menos tanto quanto a metafísica espiritualista? Nos fins do século passado e nos princípios deste século se determina uma crise interior da ciência mecaniscista, ideal e ídolo do positivismo, para dar lugar a outras interpretações do mundo natural no âmbito das próprias ciências positivas. Daí uma -8– RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 revisão e uma crítica da ciência por parte dos mesmos cientistas, que será uma revisão e uma crítica do positivismo. Nessa crítica e vitória sobre o positivsmo, pode-se distinguir duas fases principais: uma negativa, de crítica à ciência e ao positivismo; outra positiva, de reconstrução filosófica, em relação com exigências mais ou menos metafísicas ou espiritualistas. Augusto Comte - Vida e Obras Estudante da Politécnica aos 16 anos, Comte é nomeado em 1832 explicador de análise e de mecânica nessa mesma escola e, depois, em 1837, examinador de vestibular. Ver-se-á retirado desta última função em 1844 e de seu posto de explicador em 1851. Apesar de seus reiterados pedidos, não obterá o desejado cargo de professor da Politécnica, nem mesmo a cátedra de história geral das ciências positivas no Collège de France, que quisera criar em benefício próprio. A obra de Comte guarda estreitas relações com os acontecimentos de sua vida. Dois encontros capitais presidem as duas grandes etapas desta obra. Em 1817, ele conhece H. de Saint-Simon: O Organizador, o Sistema Industrial, e concebe, a partir daí, a criação de uma ciência social e de uma política científica. Já de posse, desde 1826, das grandes linhas de seu sistema, Comte abre em sua casa, rua do Faubourg Montmartre, um Curso de filosofia positiva - rapidamente interrompido por uma depressão nervosa (que lhe vale ser internado durante algum tempo no serviço de Esquirol). Retoma o ensino em 1829. A publicação do Curso inicia-se em 1830 e se distribui em 6 volumes até 1842. Desde 1831 Comte abrirá, numa sala da prefeitura do 3.° distrito, um curso público e gratuito de astronomia elementar destinado aos "operários de Paris", curso este que ele levaria avante por sete anos consecutivos. Em 1844 publica o prefácio do curso sob o título: Discurso dobre o espírito positivo. É em outubro de 1844 que se situa o segundo encontro capital que vai marcar uma reviravolta na filosofia de Augusto Comte. Trata-se da irmã de um de seus alunos, Clotilde de Vaux, esposa abandonada de um cobrador de impostos (que fugira para a Bélgica após algumas irregularidades financeiras). Na primavera de 1845, nosso filósofo de 47 anos declara a esta mulher de 30 seu amor fervoroso. "Eu a considero como minha única e verdadeira esposa não apenas futura, mas atual e eterna". Clotilde oferece-lhe sua amizade. É o "ano sem par" que termina com a morte de Clotilde a 6 de abril de 1846. Comte sente então sua razão vacilar, mas entrega-se corajosamente ao trabalho. Entre 1851 e 1854 aparecem os enormes volumes do Sistema de política positiva ou Tratado de sociologia que intitui a religião da humanidade. O último volume sobre o Futuro humano prevê uma reformulação total da obra sob o título de Síntese Subjetiva. Desde 1847 Comte proclamou-se grande sacerdote da Religião da Humanidade. Institui o "Calendário positivista" (cujos santos são os grandes pensadores da história), forja divisas "Ordem e Progresso", "Viver para o próximo"; "O amor por princípio, a ordem por base, o progresso por fim", funda numerosas igrejas positivistas (ainda existem algumas como exemplo no Brasil). Ele morre em 1857 após ter anunciado que "antes do ano de 1860" pregaria "o positivismo em Notre-Dame como a única religião real e completas". Comte partiu de uma crítica científica da teologia para terminar como profeta. Compreende-se que alguns tenham contestado a unidade de sua doutrina, notadamente seu discípulo Littré, que em 1851 abandona a sociedade positivista. Littré - autor do célebre Dicionário, divulgador do positivismo nos artigos do Nacional - aceita o que ele chama a primeira filosofia de Augusto Comte e vê na segunda uma espécie de delírio político-religioso, inspirado pelo amor platônico do filósofo por Clotilde. Todavia, mesmo se o encontro com Clotilde deu à obra do filósofo um novo tom, é certo que Comte, já antes do Curso de filosofia positiva (e principalmente em seu "opúsculo fundamental" de 1822), sempre pensou que a filosofia positivista deveria terminar finalmente em aplicações políticas e nas fundação de uma nova religião. Littré podia sem dúvida, em nome de suas próprias concepções, "separar Comte dele mesmo". Mas o historiador, que não deve considerar a obra com um julgamento pessoal, pode considerar-se autorizado a afirmar a unidade essencial e profunda da doutrina de Comte.(¹) (¹) Comte, afirmando vigorosamente a unidade de seu sistema, reconhece que houve duas carreiras em sua vida. Na primeira, diz ele sem falsa modéstia, ele foi Aristóteles e na segunda será São Paulo. -9– RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 A Lei dos Três Estados A filosofia da história, tal como a concebe Comte, é de certa forma tão idealista quanto a de Hegel. Para Comte "as idéias conduzem e transformam o mundo" e é a evolução da inteligência humana que comanda o desenrolar da história. Como Hegel ainda, Comte pensa que nós não podemos conhecer o espírito humano senão através de obras sucessivas - obras de civilização e história dos conhecimentos e das ciências - que a inteligência alternadamente produziu no curso da história. O espírito não poderia conhecer-se interiormente (Comte rejeita a introspecção, porque o sujeito do conhecimento confundese com o objeto estudado e porque pode descobrir-se apenas através das obras da cultura e particularmente através da história das ciências. A vida espiritual autêntica não é uma vida interior, é a atividade científica que se desenvolve através do tempo. Assim como diz muito bem Gouhier, a filosofia comtista da história é "uma filosofia da história do espírito através das ciências". O espírito humano, em seu esforço para explicar o universo, passa sucessivamente por três estados: a) O estado teológico ou "fictício" explica os fatos por meio de vontades análogas à nossa (a tempestade, por exemplo, será explicada por um capricho do deus dos ventos, Eolo). Este estado evolui do fetichismo ao politeísmo e ao monoteísmo. b) O estado metafísico substitui os deuses por princípios abstratos como "o horror ao vazio", por longo tempo atribuído à natureza. A tempestade, por exemplo, será explicada pela "virtude dinâmica"do ar (²). Este estado é no fundo tão antropomórfico quanto o primeiro ( a natureza tem "horror" do vazio exatamente como a senhora Baronesa tem horror de chá). O homem projeta espontaneamente sua própria psicologia sobre a natureza. A explicação dita teológica ou metafísica é uma explicação ingenuamente psicológica. A explicação metafísica tem para Comte uma importância sobretudo histórica como crítica e negação da explicação teológica precedente. Desse modo, os revolucionários de 1789 são "metafísicos" quando evocam os "direitos" do homem - reivindicação crítica contra os deveres teológicos anteriores, mas sem conteúdo real. c) O estado positivo é aquele em que o espírito renuncia a procurar os fins últimos e a responder aos últimos "por quês". A noção de causa (transposição abusiva de nossa expeirência interior do querer para a natureza) é por ele substituída pela noção de lei. Contentar-nos-emos em descrever como os fatos se passam, em descobrir as leis (exprimíveis em linguagem matemática) segundo as quais os fenômenos se encadeiam uns nos outros. Tal concepção do saber desemboca diretamente na técnica: o conhecimento das leis positivas da natureza nos permite, com efeito, quando um fenômeno é dado, prever o fenômeno que se seguirá e, eventualmente agindo sobre o primeiro, transformar o segundo. ("Ciência donde previsão, previsão donde ação"). Acrescentemos que para Augusto Comte a lei dos três estados não é somente verdadeira para a história da nossa espécie, ela o é também para o desenvolvimento de cada indivíduo. A criança dá explicações teológicas, o adolescente é metafísico, ao passo que o adulto chega a uma concepção "positivista" das coisas. (²) São igualmente metafísicas as tentativas de explicação dos fatos biológicos que partem do "princípio vital", assim como as explicações das condutas humanas que partem da noção de "alma". Fonte: http://www.mundodosfilosofos.com.br/comte.htm 5) Os irmãos Wachowski e a criação do mundo (ou como você vai escolher a pílula azul) Por Carina Martins, repórter iG em São Paulo SÃO PAULO - Você sabe muito bem que aquilo que chama de realidade pode ser apenas fruto de sua imaginação. Ou de programas de computador. Desde que Platão apresentou sua alegoria da caverna, há quase três mil anos, a questão da diferença entre o mundo sensível e o mundo real vem perturbando os homens, gerando diversas explicações e correntes filosóficas e até dando uma respingada na religião. Boa parte da humanidade, no entanto, passou a se interessar bem mais pelo assunto quando filosofia e pancadaria se encontraram e uma versão high-tech do mito de Platão ganhou as telas do mundo em 1999, com a estréia de “Matrix”, a obra-prima (pelo menos até a chegada de “Reloaded” e “Revolutions”) dos irmãos Andy e Larry Wachowski. - 10 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 Mesmo tantos milhares de anos de debate filosófico depois, ninguém ainda pôde determinar com exatidão o ponto em que as coisas deixam de ser reais. Se os fatos vão tão longe como na saga de Neo, em que somos meras pilhas para robôs vivendo em um mundo de ilusão, não se sabe. Mas na hipótese provável da coisa não ser tão grave assim, é melhor abrirmos o olho: se depender dos espertos Wachowski, vamos trocar nosso bom e velho universo por um novinho em folha, criado por eles – o universo de “Matrix”. Tudo começou com um filme que, quase que apenas no boca-a-boca, se tornou um dos maiores fenômenos da Warner de todos os tempos. O DVD de Matrix, que incluía os segredos de produção, foi o primeiro da história a vender mais de 1 milhão de cópias. O efeito “bullet time”, criado especialmente para transformar a imaginação dos Wachowski em realidade, foi tão copiado que virou piada em “Todo Mundo em Pânico” e “Shrek”. A influência animê está cada vez maior, para não falar dos filmes de kung-fu que voltaram com força total. “Matrix” foi inegavelmente um marco, e conseguiu fazer parte do imaginário pop. Mas isso foi apenas o primeiro dia no processo de criação do mundo dos Wachowski. Eles lançaram “Matrix”, e fez-se a luz. É pouco, muito pouco perto do que planejam e vieram desenvolvendo nos últimos quatro anos. Se alguém ainda tinha dúvidas sobre o tamanho da ambição, o produtor Joel Silver disse para quem quiser ouvir: “ ‘Matrix’ foi concebido para criar um universo”. O projeto é preencher todos os sentidos dos espectadores com o mundo de “Matrix”. Sim, um relacionamento inédito entre filmes, animação e game fará com que os fãs façam o caminho de Neo às avessas, ou seja, escolham a pílula azul e se entreguem totalmente a um universo paralelo. Os filmes Depois da luz, o próximo passo é a conclusão da trilogia de filmes. O intervalo de quatro anos entre o primeiro e os outros dois se explica pelo empenho da equipe na produção. John Gaeta, o supervisor de efeitos especiais que inaugurou uma nova era no cinema de ação, recebeu uma incumbência nada simples: fazer novamente a revolução, e dessa vez de um jeito que os outros levem anos até conseguir copiar. O resultado é a impressionante “fotografia virtual”, efeito que faz o “bullet time” parecer brincadeira de criança. Funciona mais ou menos assim: Gaeta filmou os atores por todos os ângulos com cinco câmeras da altíssima definição, para gravar até as menores irregularidades de seus rostos. O homem guardou os poros de Keanu Reeves. Todo esse material é usado para adicionar os rostos dos atores em cenas impossíveis, como a já célebre “Burly Brawl” (algo como ‘Super Briga’). Nessa seqüência, que demorou três semanas para ficar pronta, Neo luta contra nada menos que cem Agentes Smith – o trechinho que está no trailer (clique aqui para ver) é de tirar o fôlego. Tudo foi aumentado. Se você gostou das seqüências de luta do primeiro filme, saiba que dessa vez o coreógrafo de luta Yuen Wo-pin trancafiou o elenco principal por quatro meses até ficarem afiadíssimos. O saldo, além de muita pancadaria, foi uma costela quebrada de Keanu, uma perna fraturada de Carrie-Anne Moss e um pulso torcido de Laurence Fishburne. É ‘Matrix’ mais uma vez interferindo na realidade. E, se nesse ponto você ainda acha a idéia de criação de um novo mundo extrema, saiba que para a filmagem do clímax de “Reloaded”- uma perseguição em auto-estrada - a produção simplesmente construiu uma rodovia de quase cinco quilômetros, porque não encontrou nada bom o bastante no mundo real. O Game Ok, então eles estão preparando mais dois filmões que devem virar febre e marcar a estética do entretenimento pelos próximos anos. Isso é muito. Mas ainda não é um universo paralelo, certo?. Ainda não. Só que os Wachowski estão longe de se contentar com o que seria o sonho da esmagadora maioria dos diretores americanos. Os irmãos lançam junto com “Reloaded” um conceito inédito de relação entre filmes e videogames. Se até agora era comum lançar jogos com personagens de filmes de ação, a importância desses produtos para o filme era a mesma das camisetas com estampas dos heróis – nenhuma. A partir de agora, isso deve mudar. “Enter the Matrix” é intrinsecamente ligado a “Reloaded” e “Revolutions”. Um roteiro - 11 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 paralelo foi escrito para o jogo, onde personagens secundários como Niobe e Ghost assumem o papel principal da trama. Os atores tiveram que gravar seus movimentos também para o game, e a ousadia não pára por aí: os diretores filmaram uma hora de tomadas com o elenco “vivo” que não vai aparecer em nenhum dos filmes, só no game. As cenas serão usadas nas passagens entre as fases do jogo, e explicam melhor certos detalhes dos filmes. São partes complementares que ajudam a formar o universo “Matrix”. E para facilitar a conquista do mundo, o jogo sai para todos os consoles: Playstation 2, PC, Xbox e GameCube. Animatrix A paixão pelo Wachowski pela animação japonesa ficou clara na influência do gênero na concepção inicial de “Matrix” (clique aqui para ver). Agora, numa espécie de agradecimento, os dois convidaram alguns dos maiores nomes do animê para realizar nove curtas expandindo o universo criado por eles. A maior parte deles teve o argumento escrito pelos irmãos, mas alguns dos diretores tiveram liberdade irrestrita. O conceito de inter-relação é o mesmo usado para o “Enter the Matrix” (clique aqui para ver). Todos são ligados ao mundo de Neo e companhia, e alguns são complementares. É o caso de “O Vôo Final de Osíris”, único dos curtas lançado nos cinemas. Infelizmente, por aqui a animação foi boicotada pelos donos de salas multiplex, que se recusaram a exibir o filme de nove minutos antes das sessões de “O Apanhador de Sonhos”, como mandava a Warner. Mais uma prova da falta de sensibilidade dos empresários. A história dos tripulantes da nave Osíris, que precisam avisar Zion de uma invasão de Sentinelas funciona como um aperitivo de “Reloaded”, é talvez o maior ponto de convergência das ramificações de “Matrix”, já que em “Enter the Matrix” uma das tarefas de Niobe é justamente retirar um pacote deixado pela tripulação de Osíris. E é nesse momento que os Wachowski chegam ao sétimo dia da criação: a franquia de “Matrix” é o acontecimento mais importante do ano no cinema, nos games e na animação – sem contar a repercussão estética que certamente vai gerar. Pouca gente vai conseguir escapar. Eles podem descansar. Eu quero a pílula azul! Então você é um resignado fã de “Matrix” e está louco para entrar de vez no universo dos Wachowski, mas ainda não sabe quando terá a oportunidade de tomar a pílula azul que o afastará de vez da realidade? Vamos por partes: “Matrix Reloaded” chega aos cinemas americanos no dia 15 de maio e nos brasileiros, dia 23. Você já pode conferir o que te espera no trailer. “Matrix Revolutions” será lançado em novembro. Os diretores Andy e Larry Wachowski queriam que fosse em junho, porque, segundo eles, ninguém vai agüentar esperar tanto tempo. Junto com “Reloaded”, chega às lojas “Enter the Matrix”. No intervalo entre os dois filmes será lançado o DVD “Animatrix”, com as nove histórias. Quatro delas estão disponíveis no site oficial e você pode conferir aqui. A previsão de lançamento é 3 de junho. Ainda este ano, deve sair também o DVD com o documentário sobre os bastidores do game. Depois disso, ninguém sabe. Provavelmente não teremos mais lembranças do mundo real. Fonte: Caderno i – Último Segundo http://ultimosegundo.ig.com.br/paginas/cadernoi/materias/147501-148000/147803/147803_1.html - 6) A FILOSOFIA POLÍTICA DE ORTEGA Y GASSET* Danilo Santos Dornas** Resumo Neste trabalho indicaremos como o filósofo José Ortega y Gasset analisou os problemas de seu tempo e a partir deles consolidou suas teses sociais e políticas. A partir dos textos sobre política do filósofo - 12 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 podemos verificar que sua preocupação fundamental era incentivar o homem em sair da sua condição de minoridade e caminhar meios para construir a sua vida singular. Palavras-Chave: Filosofia. Política. Raciovitalismo. Considerações Iniciais José Ortega y Gasset foi um filósofo que viveu os problemas de seu tempo e se preocupou com o destino da Espanha. O país se encontrava fragmentado, dividido e semeado por vários problemas sociais e políticos que o impediam de acompanhar o desenvolvimento das outras nações européias. Para enfrentar esses problemas, o filósofo pensou as questões políticas à luz de uma teoria da realidade, que ele elaborou e que se tornou conhecida como raciovitalismo. Essa teoria centrou a discussão no conceito de vida experimentado na primeira pessoa. Com a frase: Eu sou eu e minha circunstância, Ortega y Gasset particulariza os problemas de cada homem. A continuação desta mesma frase: se não salvo a ela (circunstância) não salvo a mim, Ortega y Gasset indica que o homem pode mudar a sua vida transformando a realidade em que vive. Se não fizer afunda-se na circunstância e não dá sentido a sua própria vida. Neste trabalho, indicaremos como, segundo o filósofo, devemos olhar os problemas sociais e políticos como estratégia para mudar a circunstância. O caminho mais simples é melhorando a educação e o nível cultural das pessoas, que são instâncias que aproximam os homens. Os escritos analisados estão reunidos nas Obras Completas editadas pela Alianza Editorial de Madri. Procuramos também nos valer, na elaboração desse artigo, da interpretação de diversos estudiosos de Ortega y Gasset, notadamente dos artigos editados na Revista de Estudios Orteguianos, o principal veículo de estudo da obra do filósofo espanhol. 1. A discussão contemporânea sobre os temas políticos de Ortega y Gasset Os problemas políticos integram um importante capítulo de filosofia da razão vital, fazem parte da dimensão social e história do viver. Julián Marías em sua História da Filosofia (1959) afirma que temos que dedicar atenção à reflexão de Ortega y Gasset sobre política porque aí encontramos elementos para entender o funcionamento da sociedade. Essa nunca está parada e a tentativa de estabelecer equilíbrio é sempre precária. A negociação política é a forma de violência menor para solucionar os problemas sociais. Em outras palavras, Julian Marías afirma que ao estudar a política, Ortega y Gasset estava enfrentando aspectos essenciais do mundo dos homens, vencendo obstáculos que o impediram de viver bem. Luis Gabriel Stheeman, no artigo La etimologia como estratégia retórica en los textos políticos de Ortega y Gasset (Revista de Estudios Orteguianos, 2000) exorta os estudiosos de Ortega y Gasset a observar a preocupação do filósofo com a clareza e a exatidão dos temas que utiliza no campo político. Essa é uma exortação válida que procuramos incorporar à esta pesquisa, manter a clareza dos conceitos. Na mesma revista, Maria Teresa Lopes de la Vieja escreveu um artigo intitulado Democracia e masas onde esclarece que o conceito de hiperdemocracia traduz a tentativa de imposição das massas de um certo comportamento uniformizado. Esse artigo nos esclarece que Ortega y Gasset não era contrário à democracia embora considerasse as instituições políticas e as relações sociais e pessoais seguem regras distintas. Em nossa pesquisa adotamos esse entendimento que nos parece fiel ao espírito do raciovitalismo. Um conjunto de artigos publicados no segundo número da Revista de Estudios Orteguianos sobre o livro La Rebelión de las masas, dentre dos quais se destaca o intitulado El mal radical de Felipe Ledesure, revela que a propensão a inércia do homem-massa constitui um mal radical. De fato, no atual momento de interpretação da obra orteguiana, o comportamento do homem-massa é representativo de uma crise mais profunda do homem. Essa foi a interpretação que demos ao assunto central da referida obra orteguiana. No terceiro número da revista de Estudios Orteguianos, José M. Sevilla esclarece, no artigo intitulado Ortega y Gasset y la idea de Europa, que a noção de Europa corresponde a nova crença orteguiana, radicalmente ontológica e inseparável da realidade histórica. De fato, observamos que Ortega y Gasset desenvolve uma meditação centrada na necessidade da unidade européia e na defesa da cultura, temas que são atuais e importantes. - 13 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 Dos intérpretes brasileiros de Ortega y Gasset, os mais notáveis são Gilberto de Mello Kujawski e Ubiratan Macedo. O primeiro autor do clássico Ortega y Gasset e a aventura da razão (1964), insiste na responsabilidade pessoal nos assuntos políticos lembrando que nisso consiste o principal freio contra as ditaduras. O mesmo autor esclarece também no ensaio A experiência de Ortega publicado no livro Discurso sobre a violência que o homem europeu viveu experiências diversas de organização política. Ele já foi democrata, liberal, absolutista e feudal e de cada período retirou experiências que devem ajudá-lo hoje na solução dos problemas políticos. Ubiratan Macedo escreveu ensaios memoráveis como A Filosofia de Ortega y Gasset (2001), publicado no livro A presença da moral na cultura brasileira, onde mostra que o engajamento do filósofo é com a razão, descartando toda tentativa de ver em Ortega y Gasset um filósofo militante na política, embora ele fosse um teórico que adotava posições políticas e assumia o risco delas. Os elementos interpretativos destes teóricos foram considerados na condução desta pesquisa. 2. Os problemas políticos A geração de Ortega y Gasset encontra uma Espanha mergulhada em problemas sociais. Tais problemas surgiram do mal uso da razão no exame da vida social e política. Para o filósofo, os homens de sua época deveriam utilizar a razão e a sensibilidade para examinar os problemas sociais que impedem a Espanha de se firmar como nação. Estes problemas sociais são originados pelo mal exercício da participação política. Maus governantes completam a dificuldade. Primeiro, é preciso entender o que o filósofo designa por nação. Ortega y Gasset explica que nação não é uma simples delimitação de terras, e sim o objeto de uma virtude que acompanha cada homem. Esta virtude é o patriotismo. A nação passa a existir se os homens exercitam seu patriotismo no país onde vivem. Faz parte do patriotismo identificar os vícios que aparecem em uma determinada nação. Os vícios nascem da distração dos membros dessa sociedade, distração que permite que pessoas pouco virtuosas cheguem ao comando da nação. Essa era a situação política da Espanha; regida por governantes não preparados, a nação não atendia o bem-estar do povo. Ortega y Gasset conclui que o povo espanhol, ao perder a capacidade de refletir sobre si mesmo, tornou-se motivo de desprezo por outras nações da Europa. É necessário esclarecer que Ortega y Gasset entende por homem desprezível aquele que não se esforça para superar as dificuldades que se lhe apresentam nem sequer reflete sobre suas ações. Entretanto, o homem desprezível não é o que simplesmente cai, mas o que não consegue reerguer-se após uma queda. O filósofo entende que sua geração estava mal preparada política e moralmente. Por isso, ele supõe que era necessário discutir os males da Espanha, assim como fazem outras nações da Europa. Os males políticos que atravessavam a Espanha se fundamentavam na má formulação do conteúdo moral das gerações precedentes. O filósofo diz que uma geração que não se prepara moralmente para as dificuldades que se avizinham deixa questões trágicas e não resolvidas para as que se seguem. Então, cada geração é mestra da que se segue, o que nos sugere uma valorização dos pressupostos históricos para a edificação de uma sociedade contemporânea, resgatando a moralidade que se encontra desvirtuada. Eis o que nos diz: É certo que a geração anterior não nos deixou de herança nenhuma virtude moderna. Cada geração chega ao mundo com uma missão específica, com o dever adscrito nominalmente a sua vida (Los problemas nacionales y la juventud. p. 15). Não custa recordar que, para o filósofo, a moral não é constituída de fórmulas abstratas. Isso porque a moralidade deve aparecer como um desafio vital ou uma tarefa a ser cumprida pelos homens. A resposta ao desafio faz com que os indivíduos mereçam o título de entes sociais. E, para agir moralmente, o homem deve se pautar em normas que foram desenvolvidas pelas gerações anteriores. A realidade histórica de cada geração consiste em ser o ponto de interseção da geração que lhe antecedeu e da outra que a seguirá. Essa dupla função é importante porque o filósofo coloca a educação como medula da história e regente da moral do homem: Cada qual faz o que é capaz de fazer, mas sua capacidade depende completamente de sua preparação: isto nos obriga a manter desperta a consciência de nossa solidariedade com as forças e até com os vícios do passado (idem. p. 16). - 14 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 Desse modo, Ortega y Gasset entende que, antes de mudar o sistema político, se deve observa-se falta ao povo entusiasmo, energia, pureza, sensibilidade para as instâncias morais. Essa a situação da Espanha e ela devia ser alterada. No entanto, a geração de Ortega y Gasset, assim lhe pareceu, não herdou virtudes nem ideais, herdou unicamente falta de entusiasmo e desânimo. Os homens estão destinados a viverem numa nação com características particulares e regionais, isso é o que tipifica e diferencia as nações. Essa característica particular e regional de uma nação significa um modo que antecede a desintegração por não considerar as qualidades do mundo ao redor. Os líderes políticos de cada povo devem ser sensíveis à vontade de seus cidadãos para que essa regionalização se extinga impedindo a formulação dos flancos, grupos particulares, para que a necessidade de todos sejam perseguidas por meio de uma discussão entre todos os homens. Um político que cria leis sem um debate entre os cidadãos não educa o povo, prejudica a nação e dificulta que ela se forme integralmente. Ortega y Gasset entende que resgatar a moral pública é tarefa da metafísica e não da sociologia, mas que tem implicação na política. Isso porque deve recuperar uma virtude comum aos cidadãos da Espanha. O filósofo grego Platão (427-347 a. C.), em sua República, pretendia que um rei-filósofo administrasse com sucesso a polis. Ortega y Gasset não pede tanto ao se referir à administração do Estado. Para ele, o governante precisa ser um homem preparado para enfrentar as dificuldades da administração pública. Governantes cultos são importantes porque eles identificam a alma de seu Estado e assim governam com mais eficácia. Ortega y Gasset diz que na Espanha, por exemplo, a alma identificada é a valentia e por isso há tantas guerras na história de seu povo: Na Espanha só temos a tradição de valentia: por um gesto de valentia vendemos a alma nacional ao diabo (idem. p. 21). Os problemas políticos são solucionados com o exercício da liberdade de cada ser humano. Para os atenienses, explica o filósofo, liberdade significava viver como quisessem, atendendo à busca de felicidade na polis. A liberdade, para Ortega y Gasset, não pode ser mais entendida como entre os gregos; ele a vê como respeito ao indivíduo e ao Estado. Ortega y Gasset completa que a liberdade de consciência só pode ser desenvolvida numa organização política forte que eduque o povo espanhol. E consciência significa sensibilidade, conhecimento dos deveres morais. Como educar o povo? Ortega y Gasset afirma que é promovendo a paz entre todos os homens. E a paz só é conseguida por um povo que possua uma alma culta: Paz e cultura tem um valor recíproco em meu vocabulário: paz é a postura da alma culta, e cultura é cultivo (idem. p. 23). Nesse sentido, o pensador espanhol se mostra contrário às revoluções como estratégia para introduzir mudanças políticas, entendendo que elas são constituídas por uma sucessão de crimes. Assim, impedem o exercício da paz entre os homens e não podem conduzir uma nação à liberdade por não respeitarem a individualidade de cada um. As revoluções mostram que quanto mais injustiças existirem mais os homens serão culpados em não refletir sobre o próprio compromisso moral que serve de guia para a vida social. Portanto, Ortega y Gasset entende que é exigência moral evitar as ações dos revolucionários, mas deve-se entender seu sentido porque elas só surgem como tentativas de solucionar os problemas encontrados em uma sociedade. 3. O homem massa e os problemas gerados pela política As teses sociais e políticas de Ortega y Gasset são uma resposta aos inúmeros problemas sociais provocados pelo individualismo exagerado, nascido segundo o filósofo do idealismo subjetivista. O autor explica em seus textos que os problemas sociais e políticos gerados na Europa são causados pela superlotação dos lugares públicos e pela padronização do comportamento que forma a massa social. O individualismo exagerado culmina na sociedade de massa. O que o preocupa é o homem não se comprometer com sua vocação ou missão. O homem massa, como ele o trata, é o indivíduo que não atribui a si um valor e, certamente, não se angustia com isso, sente-se bem ao ser idêntico aos demais indivíduos. Essa análise do filósofo destaca a preocupação em melhorar a qualidade de vida de cada homem para melhor identificar no corpo da nação uma coluna vertebral que une os homens. Dessa forma, o problema social evidente é o aglomerado de homens sem a preocupação de discutir os rumos políticos que devem seguir sua nação, e desorganizados na sociedade, distribuídos em blocos - 15 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 individuais. Esse distanciamento dos homens nos assuntos políticos consolidou lideranças conduzidas pela demagogia e pela ignorância. Esse acontecimento é o que ele chama de hiperdemocracia das massas cuja lei é: quem não for como todo mundo, quem não pensar como todo mundo, correrá o risco de ser eliminado. Essa hiperdemocracia é a imposição das massas, quanto aos seus gostos, que muitas vezes estão vinculadas a pressões materiais e ao desejo de poder sem o reconhecimento de leis, sem se preocuparem com a vida. O conceito de massa explica as dificuldades da sociedade contemporânea em se firmar como sociedade. Um dos sintomas mais evidentes da hiperdemocracia é o propósito das massas de fazer justiça por seus próprios meios. Ela recorre ao linchamento sem o reconhecimento das leis que garantam a paz. Ortega y Gasset verifica que quando as massas triunfam, reina também a violência como doutrina e única razão. Para controlar a violência das massas, nasce o Estado. O homem massa não se preocupa com sua civilização, sua cultura, e sua educação, que são os caminhos que ele tem para sair da condição de vulgaridade. O resultado dessa situação é fatal para a vida de cada ser humano porque os homens passam a viver em função do Estado, tornando-se peças da máquina estatal. Após certo tempo, trabalhando como máquinas, enferrujam. Essa é a razão dos governos totalitários que se espalharam ao longo do século XX, o homem perdeu a responsabilidade e o sentido de uma vida que é única, vivida na primeira pessoa. Os governos totalitários, comunistas e socialistas, e também a sociedade de consumo são potenciais fabricantes de homens massa porque o impedem de viver singularmente. Por isso, é perigoso se render a esses projetos políticos. Nessas formas políticas, o homem não tem nenhum valor próprio, não tem particularidade que o distinga dos demais homens. Está agarrado em suas circunstâncias de “massa” e a ela não se esforça para sair. Ortega y Gasset postula uma rebelião individual contra os desejos do homem massa em suas obras sobre política. Ou seja, defende a revolta pessoal contra a consciência coletiva para manter o homem numa posição seleta pela sua própria capacidade de trabalhar, construir e se esforçar cada vez mais para melhorar sua vida. Ortega y Gasset apresenta uma nova forma de encarar o mundo com a experiência individual identificada por raciovitalismo. Ele é um defensor do valor próprio de cada ser humano, enquanto, o homem massa é o inimigo consciente de sua singularidade. 4. A preocupação com o social A primeira coisa a se fazer para melhorar a vida na Espanha, na avaliação de Ortega y Gasset, é socializar os homens fazendo com que saiam da condição de homens massa. Isso pode parecer um paradoxo, mas não o é. A vida singular do homem se dá no meio social e só nele o homem está como que em casa. Preocupar-se com a política é ocupar-se com a vida social, o que só pode ser conseguido pelo humanismo e pela cultura. Assim, preocupar-se com o social é cultura, construção que, por sua vez, promove a paz social pelo princípio de amizade. Logo, o socialismo é construtor da paz, afirma o filósofo. Por socialismo Ortega entende não a teoria marxista, como foi comum no seu tempo, mas uma preocupação com a vida social e senso de responsabilidade quanto aos destinos de seu grupo. Ortega y Gasset diz que os socialistas não devem ser inimigos de seus inimigos, mas amigos de seus amigos. Em seguida explica os ideais que entende o socialismo alimenta. Os socialistas devem se agrupar, comungar, comunicar e socializar todos os homens: antes de mais nada, o socialismo é um princípio de amizade aos homens, uma forma de humanismo, que o filósofo julga necessário existir nas relações sociais. Como naquele momento socialismo estava identificado com marxismo, o filósofo procura explicar o que entende por socialismo. Ortega y Gasset explica que o marxismo consiste em solucionar toda variação histórica como uma variação de relações econômicas: cada época se caracteriza por um tipo de produção, por uma maneira especial de obter o produto, de decidir a coisa econômica como meio para a vida. O que interessava a Karl Marx era determinar que tudo de mal que compõe a história social humana, religião, política, moral são sempre formas de realidade econômica, que não tem sentido sem referir ao econômico (La ciencia y la religión como problemas políticos. p. 32). A economia é entendida, segundo Karl Marx (1818-1883), como matéria para a vida. Ortega y Gasset não concorda com esse entendimento porque não admite reduzir a vida humana às relações - 16 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 econômicas. Para o filósofo espanhol, sempre haverá o capitalismo porque sempre existirão instrumentos de produção. E, ainda completa, o socialismo nasceu com Platão quando afirmou que os cidadãos não devem se empenhar em uma perpétua luta entre ricos e pobres na polis. Erradicar a luta de classes como meio para socializar a produção é proposta do marxismo, mas essa forma não promove a paz e a liberdade entre os homens. Em outras palavras é inútil tentar eliminar a luta de classes, mas é possível mantê-la sujeita a estrita regras. Os acontecimentos históricos dos últimos anos confirmam a avaliação do filósofo. O socialismo tal como ele o propõe eleva o nível cultural das sociedades. E cultura, para Ortega y Gasset, não é uma palavra vaga, sem sentido. Cultura é o cultivo científico do entendimento de cada homem, de sua moralidade e de seu sentimento. Por isso, a cultura é o verdadeiro poder espiritual para reconstruir a sociedade onde todos os homens podem participar juntos. Homem, em seu sentido soberano, é o que pensa e constrói. Ortega y Gasset diz que todos devem se comportar moralmente para a paz ser edificada. O socialismo garante a paz entre os homens porque todos devem trabalhar para o benefício de todos, porque só assim existirá uma comunidade firme. 5. A pedagogia social como solução para os problemas sociais e políticos Nossa consciência necessita de um motor para se colocar em movimento. Ortega y Gasset diz que este motor é a educação. Por educação, o filósofo entende a transformação de um homem imperfeito em indivíduo com irradiações virtuosas. A pedagogia, enquanto ciência, trata de modificar o caráter, tem por objetivo integrar os indivíduos em uma comunidade. Desse modo, a pedagogia deve começar por um ideal moral. O homem, segundo Ortega y Gasset, não é apenas um indivíduo biológico. O homem se difere de um cavalo por saber determinar o que é bom para si e para sua comunidade. Então, a pedagogia não significa um adestramento de homens, e sim de uma atividade formadora que insere o homem singular, consciente de sua situação, em um grupo social. É o que afirma o filósofo: O cavalo é uma coisa física, é todo uma exterioridade, vive só uma vida espacial. Agora bem, o problema da pedagogia não é educar o homem exterior, o anthropos, e sim o homem interior, o homem que pensa, sente e quer (La pedagogia social como programa político. p. 51). As características da ciência, da moral e da arte são que seus conteúdos pertencem ao patrimônio comum, apesar dos amores, ódios e caprichos serem subjetivos. Portanto, existe um eu individual, que sente tais emoções e um eu comunitário, que pensa algo que é comum a todos. Para que exista uma comunidade entre os homens é necessário que exista uma linguagem comum. Ortega y Gasset completa que sem linguagem não há pensamento. O pensar é um monólogo e o monólogo não é originário, e sim a imitação de um diálogo, um diálogo de uma só dimensão" (idem p. 52). Ortega y Gasset explica que sem o uso da linguagem o espírito não chega a possuir conteúdo para a interação. Um indivíduo que extingue sua comunicabilidade com os outros se mantém solitário e se transforma em um átomo social. Todo individualismo é mitológico e anticientífico. Assim, Ortega y Gasset considera a pedagogia individual um erro e projeto inútil. Platão, na sua República, que é preciso primeiramente educar a polis e depois o indivíduo. Então, a pedagogia platônica privilegia a dimensão social. Ortega y Gasset explica que a escola só é um espaço momentâneo e que a verdadeira educação se adquire em casa, nas praças e estabelecimentos públicos; enfim, onde as relações humanas sejam mais intensas. A pedagogia é entendida pelo filósofo como a ciência que transforma as sociedades, pela moralidade, em um reunião de pessoas com ideais. Antes, essa transformação do indivíduo era entendida como produto da política, explica o pensador. Mas não se pode fazer política sem antes passar por uma pedagogia social. O social é a combinação dos esforços individuais para realizar uma obra comum. Um grupo de homens, ao trabalharem em uma obra comum, recebem em seus corações, por reflexão, a unidade dessa obra e, assim, nasce o elo da unanimidade. Ortega y Gasset conclui que pela cooperação se forma uma sociedade unida. Socializar o homem é fazer do trabalho uma magnífica tarefa humana, pela cultura, onde a cultura abarca tudo, desde cavar a terra até compor versos (idem. p. 58). Não pode participar bem da sociedade quem não trabalha. Ortega y Gasset entende que pela consciência do trabalho pode-se superar as lutas entre ricos e pobres na nação. Erradicar a luta de - 17 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 classes como meio de socializar a produção é proposta do marxismo, e não promove a paz e nem assegura a liberdade entre os homens. Ao contrário, é onde a luta de classes encontra meios políticos de expressão que a sociedade consegue os melhores benefícios. O verdadeiro poder espiritual para reconstruir a sociedade onde todos os homens podem participar juntos e reconstruir a moralidade do homem. Homem, em seu sentido soberano, é o que pensa e constrói. Ortega y Gasset diz que todos devem se comportar moralmente para a paz ser edificada. O socialismo garante a paz entre os homens porque todos com seu trabalho contribuem para o destino da comunidade, só assim o futuro poderá ser mirado com esperança. 6. Reflexões de Ortega y Gasset acerca dos governos totalitários Para Ortega y Gasset, os governos totalitários não incentivam a democracia porque não restauram os sucessos do passado nascidos na liberdade e na pluralidade de opinião. Ao invés de tornar o Estado um espaço de homens virtuosos, o totalitarismo transforma o Estado em algo “forte” e emprega meios dissolventes para fazer valer as convicções da minoria, violentando os direitos individuais. Assim, o governo totalitário extermina a liberdade dos homens, transformado-os em seres alienados de sua vida e do seu destino. Ortega y Gasset explica que em épocas anteriores havia a necessidade de preservar a intimidade de cada um, problema cuja solução foi buscado pela liberal-democracia. Porém, o sistema totalitário surge como uma reação ao liberalismo, considerando-o incapaz de resolver os problemas sociais. Partindo desta constatação, o filósofo espanhol, considera o totalitarismo como um fenômeno histórico. Isso significa que, a verdadeira natureza do totalitarismo está fora do tempo histórico. Trata-se de tentativa em ocultar a liberdade humana e é uma forma de garantir o poder e a autoridade do grupo. Ortega y Gasset explica ainda que o totalitarismo cria as armas para sua autodestruição ao abandonar a liberdade vital. O totalitarismo é algo inautêntico porque entende que os homens são aquilo que eles verdadeiramente não são – seres coletivos. Paralelamente, os ideais que os totalitários acreditam não constituem a verdadeira realidade da vida. Por esta razão é ilusório buscar no totalitarismo um sentido autêntico porque ele não considera a vitalidade humana. Toda agremiação política não é mais do que uma palavra vaga, e só adquire sentido autêntico quando reúne os ideais distintos integrando uma fase histórica. Para Ortega y Gasset, exatamente o que o totalitarismo não almeja é socializar seus ideais com a pluralidade de opiniões e além disso, prefere ocultar o que pretende de forma violenta. O totalitarismo é uma forma de massificar os homens e encobrir suas contradições. Uma destas contradições é supor que o vencedor de uma disputa necessita da ajuda dos vencidos. Desse modo, o vencedor forja a debilidade de seu inimigo. A análise do filósofo revela que a busca do poder nada mais é que um jogo de estratégia, onde o mais débil não têm forças para se erguer, e por isso deve ser mantido nesta condição pela força de autoridade. Por isso, Ortega y Gasset entende que se deve buscar nas circunstâncias a explicação para a debilidade dos homens, ou seja, buscar na vida aquilo que permitiu o governo totalitário chegar ao controle de vários estados europeus. Comparando, o totalitarismo com a chegada ao poder do romano Júlio César, no século 70 a.C. Ortega y Gasset explica: A dificuldade (da sociedade romana) que falamos é idêntica a que sentimos diante do totalitarismo. Mais que o triunfo de César sobre os demais homens, nos parece que são os demais homens quem desejam o triunfo de César (Sobre el Fascismo. p. 500). É necessário esclarecer que Ortega y Gasset, não considera que as épocas históricas possam se identificar, mas têm algo em comum. O fator comum, por exemplo, entre o governo de César, no período romano, e o totalitarismo, estabelecido na Europa no século XX é o prévio desprestígio das instituições estabelecidas. O fato mais grave nestes sistemas de governo, na avaliação do filósofo, são as mudanças radicais nas idéias e nos sentimentos que o totalitarismo provoca. Ortega y Gasset, está preocupado com a vida de cada um ao tratar as mudanças circunstanciais como algo grave. O totalitarismo comporta partidos de posições autoritárias, conforme afirma no texto que se segue: Um partido autoritário, como o são muitos; confusamente antidemocráticos, como vem sendo todas as direitas e esquerdas extremas; nacionalistas, como outra meia dúzia de grupos, de revolucionários, socialistas, etc. ( Idem p. 501). - 18 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 Para o filósofo, as características destes sistemas de governos são a violência e a ilegitimidade. O primeiro é conseqüência do segundo, e vice-versa formando um círculo vicioso. Os governos autoritários adquirem o poder através da violência e por isso são ilegais, assim como a violência que é um crime e favorece os autoritários chegarem ao poder. Ortega y Gasset explica que o totalitarismo exerce o poder em nome da justiça, de uma ética e concepção de universo elaborados por um grupo particular. Estes valores são criados conforme as conveniências de consolidar a autoridade daqueles que mandam. Para fazer valer seus valores, os grupos autoritários usam a violência sem se preocupar em dar um fundamento jurídico a suas ações, além de, não se preocupar em construir nenhuma sólida teoria política. Esses governos totalitários, não pretendem governar com os direitos subordinados a uma ética comum que respeite a pluralidade dos homens. Os direitos que os autoritários conhecem são: a força e a violência das quais se valem para impor suas vontades. A permanente prática da arbitrariedade estabelece um caos jurídico nos Estado autoritário. Ortega y Gasset, indaga-se sobre os motivos que fizeram as forças sociais, que estiveram sempre presentes na defesa da liberdade, não se esforçarem para impedir a vitória do caos jurídico que se instala com o autoritarismo. A resposta, a que o filósofo chega é a seguinte: Pela sensível razão de que hoje não existem forças sociais importantes que possam viver esse entusiasmo; ou, porque hoje não existe nenhuma nação continental capaz de dar legitimidade que satisfaça a ilusão dos espíritos (Idem p. 503). Ortega y Gasset, explica que a política que possibilita o triunfo da liberdade é o espírito público. O filósofo explica que esse espírito “dá a forma externa a profunda realidade oculta nos corações” (Idem p.503). Isso significa que se deve abrir bem os olhos para tentar surpreender o enigma da realidade e extrair do que se averigua na política massificante férteis sugestões para evitar novos erros desta natureza. A fragilidade do sistema autoritário é que depende para existir de que haja uma debilidade nos homens, uma ignorância dos assuntos vitais e políticos. 7. Reflexões de Ortega y Gasset acerca do Liberalismo Ortega y Gasset pensa o Liberalismo a partir das transformações científicas ocorridas no século XIX. Da mesma forma que o cientificismo influenciou a vida dos homens também influiu no exercício da política. Assim, houve um processo de adequação entre as idéias científicas e as idéias políticas, o que gerou inúmeros choques de in-culturalização. O filósofo explica que na Europa existem muitos conservadores, e todo conservadorismo entende que não há mais nada para criar ou edificar numa cultura. Os conservadores querem construir um conjunto forte de homens, e assim não partem do princípio vital, base de vida de cada indivíduo, mas da necessidade do Estado em submeter todos os homens sob seu comando. Conservadores são, no sentir do filósofo, os governos autoritários e totalitários. O governo conservador não deseja que os homens adquiram forças para sair das suas circunstâncias, e viver é vencê-las. Ortega y Gasset diz que o homem é um eu e sua circunstância e isto significa mencionar a acomodação imposta pelos conservadores às massas. Os sistemas políticos que preferem a coletividade não incentivam o indivíduo a sair das suas circunstâncias que o impedem de dar uma melhor significação a sua vida. Essa idéia conservadora de que o homem não saia da sua circunstância é típica das políticas anti-liberais. Ela promove uma incultura no homem, estagnando e fragmentando a nação. Na passagem que se segue o filósofo explica que as políticas de massa considera os homens simples resultado das circunstâncias em que vivem, mas lhes impede de refletir sobre o mundo ao redor: Não nos é perguntado antes se queremos ser fortes; poderia ser que prefería ser bons, nada mais que bons; justos, nada mais que justos; discretos, em último caso, nada mais que discretos. E se nos proíbe a direção, nos impõe o dever da incultura (La Reforma Liberal. p.32). O principal instrumento de educação política para que o homem vença os seus problemas, é a imprensa. A imprensa tem um papel fundamental na definição dos rumos da política. Entretanto, os periódicos não abordam seriamente os temas sociais e políticos, são artísticos. Ortega y Gasset explica que essa forma de arte controla as emoções sociais, por isso não dá ao povo a chance de debater os assuntos e não lhes mostra caminhos para seguir: - 19 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 Os periódicos estão carregados de idéias da emoção para que expande a carga emotiva; não lhes toca elaborar afirmações ou negações, isto é para o sábio. Para o estadista; sua tarefa se reduz a expressar robustamente essas afirmações ou negações desempenhadas por outros (Idem p.33). Para o filósofo é fundamental ressuscitar o Liberalismo e instaurar na Europa um verdadeiro partido liberal com atenção voltada para a liberdade. Mas, para isso, Ortega y Gasset explica que é preciso contar com o auxílio dos espíritos revolucionários. De que tipo de revolucionário ele fala? Não de um revolucionário armado, que usa a força para impor sua ideologia, mas um revolucionário capaz de unir os homens por um ideal de liberdade. O Liberalismo para ser edificado e seguir seu curso na História deve se apresentar como o “partido da revolução”. Eis o que diz: O Liberalismo se não quiser seguir sendo um fenômeno da História, tem que se confessar e se declarar inequivocamente sistema da revolução. Aos ânimos que acostumaram espantar-se com a sombra que desejam o ar das palavras proponho este ponto de meditação: que preferem: um sistema de revolução ou revolucionários sem sistema? (Idem p. 34). O Liberalismo, para Ortega y Gasset, é uma forma de pensamento político que antepõe a realização de um ideal moral não dividir os homens em classes. O caminho seguido pelos totalitários, ao contrário, não atende as exigências vitais, nega o valor ético dos homens e atende este ponto de vista quando constrói uma constituição política sem identificar os valores éticos do seu tempo. O Liberalismo acredita que nenhum regime social é definitivamente justo. Ortega y Gasset explica que sempre a norma ou idéia de justiça necessita de uma visão que transcenda a lei escrita: Como os peripatéticos tinham que buscar fora do mundo e falavam em um Deus invisível ou primeiro motor imóvel, que impulsiona as coisas que vemos mover-se, assim o primeiro motor jurídico das transformações constitucionais é esse direito não escrito, esse direito ideal, centro da energia ética da História. A este direito sobreconstitucional que é sua vez de grado dever, chamo de revolução (Idem. p.35). O Liberalismo, no entendimento de Ortega y Gasset, é o exercício de liberdade. Porém, que liberdade é essa a que o filósofo se refere? Trata-se de uma liberdade mencionada na política platônica, aquela que reconhece o indivíduo fora do Estado. O Liberalismo orteguiano é resposta aos erros originais da fundamentação positivista utilitária do Liberalismo inglês. Tal forma é norma em toda Europa, provocando um individualismo exacerbado. Na visão utilitária do Liberalismo, a palavra liberdade se reduz a certa forma de tolerância, explica Ortega y Gasset. Na passagem que se segue o filósofo explica o que entende por tolerância: A tolerância não é renúncia ou extinguir a luta, e sim a utilização desta palavra, significa a confirmação e a legalização das armas de combate (Idem p. 36). Para Ortega y Gasset, o exercício da liberdade é mais do que isto, significa modificar a constituição na medida que as gerações exigirem tal modificação. Não indica somente que há de respeitar as leis escritas: este valor negativo não distinguiria o liberal do conservador. Liberdade, em seu valor positivo, para o filósofo, é dada pela ética que encaminha os homens, respeitando seus conceitos vitais. Desse modo, o filósofo conclui que o Liberalismo serve para estabelecer virtudes necessárias para a socialização dos homens: Não creio que há uma missão mais perfeita e gloriosa na terra; porque se há algo certo é que este gigantesco alambique do Universo está posto aqui para que tú, senhor leitor, e eu, e nossos filhos, vamos destilando do nossos corações umas gotas de virtude (Idem. p.38). 8. Desempenhos sociais dos sistemas dos governos totalitários e liberal As diferentes formas de governo identificadas acima por Ortega y Gasset têm como alicerce a educação. Cada forma de governo tem um paradigma de educação que fornece valores para serem seguidos pela sociedade. Desta forma, educação significa conduzir alguém para fora do lugar onde se encontra. Essa definição tem um sentido para Ortega y Gasset. Ao criar meios para que o homem saia da sua minoridade, como já dizia Immanuel Kant (1724-1808), Ortega y Gasset envolve o homem no abandono de suas referências ou circuntâncias. Portanto, o processo educativo para Ortega y Gasset, significa uma dilatação da vida para fora do meio em que ela está situada. - 20 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 Ortega y Gasset afirma que as políticas totalitárias não cuidam de levar o homem para fora das suas circunstâncias. Ao contrário, as políticas totalitárias prendem o indivíduo no conjunto de referências ou circunstâncias e se esforça por manter o indivíduo preso na minoridade. Dessa forma, entende-se este método como uma doutrina, e não como uma educação no sentido clássico de levar alguém para determinado objetivo. Como exemplo, podemos citar o filósofo russo Anton Semiónovitch Makarenko (1888-1939) que desenvolveu uma pedagogia socialista entendendo que o coletivo é um organismo social vivo. Suas idéias tinham como base que nenhum método pode ser elaborado à base do par aluno-professor, mas só à base da idéia geral da organização da sociedade e do coletivo, extinguindo o talento individual. Entendemos que toda educação é atividade essencialmente política, pois trabalha com dois problemas vitais: o homem e a sociedade. Unir estes dois problemas foi o que intentou Makarenko. Para Ortega y Gasset, o homem tem a condição de ser livre e essa liberdade é que esclarece sua vida social. Sem a liberdade não se chega à compreensão do que é a vida de cada indivíduo. A educação liberal faz com que o homem perceba sempre a existência de novos caminhos a serem seguidos. Trata-se de buscar na experiência vital de cada um os meios para chegar ao objetivo, que é a formação de cidadãos. Considerações Finais As teses examinadas anteriormente traduzem aquilo que é essencial para a discussão da filosofia política de Ortega y Gasset. Elas nos ajudam a entender os problemas do homem do século XX e o significado e amplitude da crise observada por vários filósofos. O problema encontrado pelo filósofo no campo da política é o que ele chama de “hiperdemocracia das massas” que significa que as massas atuam sem leis, por meio de pressões materiais, impondo suas aspirações e seus gostos. Desse modo, as massas propuseram se a distanciar dos assuntos políticos, não discutindo e não participando das atividades políticas, o que consolidou lideranças conduzidas pela demagogia e ignorância. Entretanto, o grande feito do mundo ocidental é a criação da civilização, por meio da socialização. Isso porque, por mais de dois milênios os homens se esforçam para edificarem uma construção comum, mas mesmo com todo o esforço e sucesso o homem continua vulnerável, fraco e até adoece por causa de seus problemas e suas inseguranças. O homem não consegue viver humanamente sem manter uma tensão criadora e precisa estar alerta aos desafios de sua época para vencer os desafios. A partir do momento em que o homem não consegue responder aos seus desafios, ele experimenta problemas psicológicos, ele perde horizonte. Ortega y Gasset entende que o homem deve-se ocupar com o que ele identifica como desafio, caso contrário, experimentará o fracasso, transformando-se em “homem-massa”. Cabe aos educadores e filósofos enfrentarem essa doença do século. Eles não devem se limitar a ensinar as técnicas da vida moderna, mas educar o homem para que ele socialize as preocupações e encontre soluções. Neste trabalho examinamos as teses políticas e sociais de Ortega y Gasset. Vimos os problemas causados por uma sociedade de massa que desarticula a noção de responsabilidade pessoal e tira o caráter único do viver. Tal influência deve ser alterada para não se transformar a nação numa hiperdemocracia. A hiperdemocracia é o exercício das massas e imposição de seus costumes ao restante da sociedade com todas as implicações negativas daí decorrentes. Entretanto, isso não significa uma posição antidemocrática, que o filósofo condenava. Pensamos que ele espera superar o democratismo de inspiração rousseniana (cf. Carvalho, 2001. p. 411-415), ou melhor, conforme diz Maria Teresa Lopez de la Vieja, a crítica à hiperdemocracia é uma tentativa de suplantar os abusos da imposição e os inconvenientes do domínio do homem massa ao longo do século XX. Nossos estudos comprovam a correção desta tese. Um dos modos de evitar a hiperdemocracia é permitir que a educação seja o exemplar fio condutor para os homens e assim privilegiar as decisões políticas de forma exemplar, valorizando o conhecimento e a competência. Aqui se verifica que, Ortega y Gasset dialoga com Aristóteles (367– 322 a. C.), e assume a virtude da prudência. Aquele que se guiar nestes moldes será sempre um modelo a ser seguido. No que se refere ao exame do papel da educação na vida social, os intérpretes não se afastam do que aqui propusemos. Há leitores de Ortega y Gasset que identificam a preocupação em formar homens puros como uma estratégia aristocrática. Essa não era a intenção do filósofo conforme já podemos deixar esclarecido. - 21 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 Esses intérpretes desconhecem que o filósofo valoriza a vida de todos de modo igual. E, para que haja uma vida política sem destruir os valores de cada pessoa, teria a educação a função de unificar, socializar os homens num princípio de amizade; essa é a real intenção do filósofo que nada revela de elitista. A posição aparentemente elitista de Ortega y Gasset se refere a aspectos psicológicos e antropológicos que, conforme nos indicou Maria Teresa Lopez de la Vieja, significa colocar a inteligência para guiar a atividade utilitária. Trata-se de um convite ético a ser bom, mas não de um governo para poucos. O filósofo não discute questões como eleições, partidos e formas de governo, e sim, deseja estabelecer bases de uma “pedagogia política”. Essa pedagogia seria o modo para regular os conflitos de interesses e os valores. Refletir, formar opinião e animar a vida pública através do meio cultural não são tarefas dos políticos, e sim de uma elite cultural. São poucos os homens que contam com a capacidade de esforço suficiente para transcender a vida comum. Como se vê o problema é de ordem moral. O instrumento com que conta cada homem para se orientar em sua vida não é outro que a razão, uma razão voltada para a vida. A vida é, pois, uma atividade que se fortalece com a razão, mesmo sendo mais do que ela. Referências bibliográficas CARVALHO, José Maurício de. Lições de Ortega sobre a vida humana. Ética e Filosofia Política. Juiz de Fora: UFJF, 1996. v. 1.______. Contribuição Contemporânea à História a Filosofia Brasileira. Londrina: EDUEL, 2001. GONZÁLEZ, Leopoldo Jesus Fernández. A gratuidade na ética de Ortega y Gasset. São Paulo: Annablume, 2001. KUJAWSKI, Gilberto de Mello. Ortega y Gasset e a aventura da razão. São Paulo: Moderna, 1994. ______. Discurso sobre a violência. São Paulo: Soma, 1985. LAVEDÁN, Maria Isabel Ferreiro. La docilidad de las masas en la teoria social de Ortega y Gasset. Revista de Estudios Orteguianos. v.2 Madrid: Fundación José Ortega y Gasset, 2001. LEDESURE, Felipe. El moral radical. 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VIEJA, Maria Teresa López de la. Democracia y masas en Ortega y Gasset. Revista de Estudios Orteguianos. v.1 Madrid: Fundación José Ortega y Gasset, 2000. *01/2002, orientado pelo Prof. Dr. José Mauricio de Carvalho. Graduado em Filosofia pela Universidade Federal de São João del-Rei. Pós-Graduando em Filosofia Contemporânea – Ética. ** Fonte: http://www.consciencia.org/ortegagassetdanilo.shtml 7) A Filosofia de Descartes O Método Descartes quer estabelecer um método universal, inspirado no rigor matemático e em suas "longas cadeias de razão". 1. - A primeira regra é a evidência: não admitir "nenhuma coisa como verdadeira se não a reconheço evidentemente como tal". Em outras palavras, evitar toda "precipitação" e toda "prevenção" (preconceitos) e só ter por verdadeiro o que for claro e distinto, isto é, o que "eu não tenho a menor oportunidade de duvidar". Por conseguinte, a evidência é o que salta aos olhos, é aquilo de que não posso duvidar, apesar de todos os meus esforços, é o que resiste a todos os assaltos da dúvida, apesar de todos os resíduos, o produto do espírito crítico. Não, como diz bem Jankélévitch, "uma evidência juvenil, mas quadragenária". 2. - A segunda, é a regra da análise: "dividir cada uma das dificuldades em tantas parcelas quantas forem possíveis". 3. - A terceira, é a regra da síntese: "concluir por ordem meus pensamentos, começando pelos objetos mais simples e mais fáceis de conhecer para, aos poucos, ascender, como que por meio de degraus, aos mais complexos". 4. - A última á a dos "desmembramentos tão complexos... a ponto de estar certo de nada ter omitido". Se esse método tornou-se muito célebre, foi porque os séculos posteriores viram nele uma manifestação do livre exame e do racionalismo. - 23 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 a) Ele não afirma a independência da razão e a rejeição de qualquer autoridade? "Aristóteles disse" não é mais um argumento sem réplica! Só contam a clareza e a distinção das idéias. Os filósofos do século XVIII estenderão esse método a dois domínios de que Descartes, é importante ressaltar, o excluiu expressamente: o político e o religioso (Descartes é conservador em política e coloca as "verdades da fé" ao abrigo de seu método). b) O método é racionalista porque a evidência de que Descartes parte não é, de modo algum, a evidência sensível e empírica. Os sentidos nos enganam, suas indicações são confusas e obscuras, só as idéias da razão são claras e distintas. O ato da razão que percebe diretamente os primeiros princípios é a intuição. A dedução limita-se a veicular, ao longo das belas cadeias da razão, a evidência intuitiva das "naturezas simples". A dedução nada mais é do que uma intuição continuada. A Metafísica No Discurso sobre o Método, Descartes pensa sobretudo na ciência. Para bem compreender sua metafísica, é necessário ler as Meditações. 1. - Todos sabem que Descartes inicia seu itinerário espiritual com a dúvida. Mas é necessário compreender que essa dúvida tem um outro alcance que a dúvida metódica do cientista. Descartes duvida voluntária e sistematicamente de tudo, desde que possa encontrar um argumento, por mais frágil que seja. Por conseguinte, os instrumentos da dúvida nada mais são do que os auxiliares psicológicos, de uma ascese, os instrumentos de um verdadeiro "exército espiritual". Duvidemos dos sentidos, uma vez que eles freqüentemente nos enganam, pois, diz Descartes, nunca tenho certeza de estar sonhando ou de estar desperto! (Quantas vezes acreditei-me vestido com o "robe de chambre", ocupado em escrever algo junto à lareira; na verdade, "estava despido em meu leito"). Duvidemos também das próprias evidências científicas e das verdades matemáticas! Mas quê? Não é verdade - quer eu sonhe ou esteja desperto - que 2 + 2 = 4? Mas se um gênio maligno me enganasse, se Deus fosse mau e me iludisse quanto às minhas evidências matemáticas e físicas? Tanto quanto duvido do Ser, sempre posso duvidar do objeto (permitam-me retomar os termos do mais lúcido intérprete de Descartes, Ferdinand Alquié). 2. - Existe, porém, uma coisa de que não posso duvidar, mesmo que o demônio queira sempre me enganar. Mesmo que tudo o que penso seja falso, resta a certeza de que eu penso. Nenhum objeto de pensamento resiste à dúvida, mas o próprio ato de duvidar é indubitável. "Penso, cogito, logo existo, ergo sum" . Não é um raciocínio (apesar do logo, do ergo), mas uma intuição, e mais sólida que a do matemático, pois é uma intuição metafísica, metamatemática. Ela trata não de um objeto, mas de um ser. Eu penso, Ego cogito (e o ego, sem aborrecer Brunschvicg, é muito mais que um simples acidente gramatical do verbo cogitare). O cogito de Descartes, portanto, não é, como já se disse, o ato de nascimento do que, em filosofia, chamamos de idealismo (o sujeito pensante e suas idéias como o fundamento de todo conhecimento), mas a descoberta do domínio ontológico (estes objetos que são as evidências matemáticas remetem a este ser que é meu pensamento). 3. - Nesse nível, entretanto, nesse momento de seu itinerário espiritual, Descartes é solipsista. Ele só tem certeza de seu ser, isto é, de seu ser pensante (pois, sempre duvido desse objeto que é meu corpo; a alma, diz Descartes nesse sentido, "é mais fácil de ser conhecida que o corpo"). É pelo aprofundamento de sua solidão que Descartes escapará dessa solidão. Dentre as idéias do meu cogito existe uma inteiramente extraordinária. É a idéia de perfeição, de infinito. Não posso tê-la tirado de mim mesmo, visto que sou finito e imperfeito. Eu, tão imperfeito, que tenho a idéia de Perfeição, só posso tê-la recebido de um Ser perfeito que me ultrapassa e que é o autor do meu ser. Por conseguinte, eis demonstrada a existência de Deus. E nota-se que se trata de um Deus perfeito, que, por conseguinte, é todo bondade. Eis o fantasma do gênio maligno exorcizado. Se Deus é perfeito, ele não pode ter querido enganar-me e todas as minhas idéias claras e distintas são garantidas pela veracidade divina. Uma vez que Deus existe, eu então posso crer na existência do mundo. O caminho é exatamente o inverso do seguido por São Tomás. Compreenda-se que, para tanto, não tenho o direito de guiar-me pelos sentidos (cujas mensagens permanecem confusas e que só têm um valor de sinal para os instintos do ser vivo). Só posso crer no que me é claro e distinto (por exemplo: na matéria, o que existe verdadeiramente é o que é claramente pensável, isto é, a extensão e o movimento). Alguns acham que Descartes fazia um circulo vicioso: a evidência me conduz a Deus e Deus me garante a evidência! Mas não se trata da mesma evidência. A evidência ontológica que, pelo - 24 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 cogito, me conduz a Deus fundamenta a evidência dos objetos matemáticos. Por conseguinte, a metafísica tem, para Descartes, uma evidência mais profunda que a ciência. É ela que fundamenta a ciência (um ateu, dirá Descartes, não pode ser geômetra!). 4. - A Quinta meditação apresenta uma outra maneira de provar a existência de Deus. Não mais se trata de partir de mim, que tenho a idéia de Deus, mas antes da idéia de Deus que há em mim. Apreender a idéia de perfeição e afirmar a existência do ser perfeito é a mesma coisa. Pois uma perfeição não-existente não seria uma perfeição. É o argumento ontológico, o argumento de Santo Anselmo que Descartes (que não leu Santo Anselmo) reencontra: trata-se, ainda aqui, mais de uma intuição, de uma experiência espiritual (a de um infinito que me ultrapassa) do que de um raciocínio. Fonte: http://www.mundodosfilosofos.com.br/descartes.htm 8) Edmund Husserl (1859-1938) Nasceu em Prosznitz (Morávia - Tchecoslováquia), em 8 de abril de 1859 Edmund Husserl realizou seus estudos em Leipzig , Berlim e Viena, dedicando-se primeiramente à matemática. Influenciado por Franz Bretano, Husserl aproximou-se da filosofia por volta de 1884. Através deste filósofo, Husserl encontrou a objetividade diante dos problemas propostos pela filosofia , ciência esta que até então olhava com desconfiança. Foi nomeado professor de filosofia em Gotinga no ano de 1901. Lecionou em Friburgo em1916. Por ser judeu, teve que interromper sua carreira universitária, sofrendo pressão do regime nazista. Faleceu em 1938 na cidade de Friburgo no dia 26 de abril. Defendeu em 1883 uma tese sobre cálculos de variações. Já influenciado pela filosofia, em 1891 publicou "A Filosofia da Aritmética". Em 1887 foi nomeado livre docente em Halles. Publicou em 1901 "Pesquisas Lógicas"; em 1911 "A Filosofia como Ciência Rigorosa"; em 1913 "Idéias por uma Fenomenologia Pura e uma Filosofia Fenomenológica"; em 1929 "A Lógica Formal e a Lógica Transcedental"; em 1931 foram publicadas suas conferências parisienses com o título "Meditações Cartesianas". Alguns textos permaneceram inéditos após a sua morte e encontram-se no "Arquivo Husserl" de Lovaina. Em 1950 foi publicada "A Crise das Ciências Européias e a Fenomenologia Transcedental", escrito entre 1935 e 1936. O ideal husserliano exprime-se pela determinação em dar consistência científica à filosofia e assim atingir as outras ciências, através de uma base sólida de racionalidade, como exige uma fundamentação rigorosa. Herda a necessidade de exatidão de seus estudos matemáticos, buscando constantemente maior clareza em suas descobertas. Isto faz com que esteja presente em sua filosofia um dinamismo permanente, onde nada é tido como fechado, acabado, caracterizando esta filosofia por uma consciência sempre aberta. Husserl funda então a fenomenologia. Inicialmente desenvolveu uma ciência da experiência, a que denominou de psicologia rigorosa descritiva. Em seu texto "Investigações Lógicas", Husserl procurou mostrar que há uma diferença de direito entre a psicologia e as ciências normativas puras, considerando que as leis lógicas não fundamentam a psicologia, pois considera o psíquico como um fenômeno e não como uma coisa física, palpável. Fenômeno para ele é consciência enquanto fluxo temporal de vivências, apresentando intencionalidade enquanto estrutura, ou seja, consciência de algo. A fenomenologia procura examinar a experiência humana de forma rigorosa, por meio de uma ciência da experiência. Desta maneira, a reflexão se faz necessária, a fim de tornar possível observar as coisas tal como elas se manifestam em sua pureza original e descrevê-las. É a investigação daquilo que é genuínamente possível de ser descoberto e que esta potencialmente presente, mas nem sempre visto, através de procedimentos próprios e adequados. É o encontro com as coisas mesmas. Para tanto, Husserl propõe a suspensão de qualquer julgamento, abandonando os pressupostos em relação ao fenômeno que se apresenta, ao que denomina de suspensão fenomenológica ou epoché. Phenomenom + logos, ou seja, fenomenologia é então o discurso sobre aquilo que se mostra como é, caracterizando esta ciência como estando em contato direto com o ser absoluto das coisas, dirigindo o conhecimento para o que há de essencial nas coisas. É a filosofia do inacabado, do devir, do movimento constante onde o vivido aparece e é sempre ponto de partida para se chegar a algo. Para Husserl, a lógica, ou seja, a teoria das ciências, necessita também de uma fundamentação na sua própria essência de teoria. Fundamentar a lógica e fundamentar a filosofia são expressões equivalentes para este pensador. Acredita ele, que este alicerce - 25 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 só será possível através da fenomenologia. Sua teoria acaba por influenciar diversos pensadores que, por serem seus discípulos ou por entrarem em contato com a sua obra, de alguma outra forma acabaram divulgando esta filosofia e atribuindo a ela outros rumos, como por exemplo: Heidegger, Sartre, Max Scheler, Merlau-Ponty, Gabriel Marcel, Tran Duc Tao, Nicolai Hartmann, etc. Deve-se ainda à fenomenologia influências sobre outras ciências como: psicologia, psiquiatria, antropologia, filosofia da religião e filosofia moral. Fonte: http://www.pucsp.br/~filopuc/verbete/ehusserl.htm 9) O Mito da Caverna O Mito da Caverna narrado por Platão no livro VII do Republica é, talvez, uma das mais poderosas metáforas imaginadas pela filosofia, em qualquer tempo, para descrever a situação geral em que se encontra a humanidade. Para o filósofo, todos nós estamos condenados a ver sombras a nossa frente e tomá-las como verdadeiras. Essa poderosa crítica à condição dos homens, escrita há quase 2500 anos atrás, inspirou e ainda inspira inúmeras reflexões pelos tempos a fora. A mais recente delas é o livro de José Saramago A Caverna. A Condição Humana Platão viu a maioria da humanidade condenada a uma infeliz condição. Imaginou (no Livro VII de A República, um diálogo escrito entre 380-370 a.C.) todos presos desde a infância no fundo de uma caverna, imobilizados, obrigados pelas correntes que os atavam a olharem sempre a parede em frente. O que veriam então? Supondo a seguir que existissem algumas pessoas, uns prisioneiros, carregando para lá para cá, sobre suas cabeças, estatuetas de homens, de animais, vasos, bacias e outros vasilhames, por detrás do muro onde os demais estavam encadeados, havendo ainda uma escassa iluminação vindo do fundo do subterrâneo, disse que os habitantes daquele triste lugar só poderiam enxergar o bruxuleio das sombras daqueles objetos, surgindo e se desafazendo diante deles. Era assim que viviam os homens, concluiu ele. Acreditavam que as imagens fantasmagóricas que apareciam aos seus olhos (que Platão chama de ídolos) eram verdadeiras, tomando o espectro pela realidade. A sua existência era pois inteiramente dominada pela ignorância (agnóia). Libertando-se dos grilhões Se por um acaso, segue Platão na sua narrativa, alguém resolvesse libertar um daqueles pobres diabos da sua pesarosa ignorância e o levasse ainda que arrastado para longe daquela caverna, o que poderia então suceder-lhe? Num primeiro momento, chegando do lado de fora, ele nada enxergaria, ofuscado pela extrema luminosidade do exuberante Hélio, o Sol, que tudo pode, que tudo provê e vê. Mas, depois, aclimatado, ele iria desvendando aos poucos, como se fosse alguém que lentamente recuperasse a visão, as manchas, as imagens, e, finalmente, uma infinidade outra de objetos maravilhosos que o cercavam. Assim, ainda estupefato, ele se depararia com a existência de um outro mundo, totalmente oposto ao do subterrâneo em que fora criado. O universo da ciência (gnose) e o do conhecimento (espiteme), por inteiro, se escancarava perante ele, podendo então vislumbrar e embevecer-se com o mundo das formas perfeitas. As Etapas do Saber Com essa metáfora - o tão justamente famoso Mito da Caverna - Platão quis mostrar muitas coisas. Uma delas é que é sempre doloroso chegar-se ao conhecimento, tendo-se que percorrer caminhos bem definidos para alcançá-lo, pois romper com a inércia da ignorância (agnosis) requer sacrifícios. A primeira etapa a ser atingida é a da opinião (doxa), quando o indivíduo que ergueu-se das profundezas da caverna tem o seu primeiro contanto com as novas e imprecisas imagens exteriores. Nesse primeiro instante, ele não as consegue captar na totalidade, vendo apenas algo impressionista flutuar a sua frente. No momento seguinte, porém, persistindo em seu olhar inquisidor, ele finalmente poderá ver o objeto na sua integralidade, com os seus perfis bem definidos. Ai então ele atingirá o conhecimento (episteme). Essa busca não se limita a descobrir a verdade dos objetos, mas algo bem mais superior: - 26 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 chegar à contemplação das idéias morais que regem a sociedade - o bem (agathón), o belo (to kalón) e a justiça (dikaiosyne). O Visível e o Inteligível Há pois dois mundos. O visível é aquele em que a maioria da humanidade está presa, condicionada pelo lusco-fusco da caverna, crendo, iludida que as sombras são a realidade. O outro mundo, o inteligível, é apanágio de alguns poucos. Os que conseguem superar a ignorância em que nasceram e, rompendo com os ferros que os prendiam ao subterrâneo, ergueram-se para a esfera da luz em busca das essências maiores do bem e do belo (kalogathia). O visível é o império dos sentidos, captado pelo olhar e dominado pela subjetividade; o inteligível é o reino da inteligência (nous) percebido pela razão (logos). O primeiro é o território do homem comum (demiurgo) preso às coisas do cotidiano, o outro, é a seara do homem sábio (filósofo) que volta-se para a objetividade, descortinando um universo diante de si. O Desconforto do Sábio Platão então pergunta (pela boca de Sócrates, personagem central do diálogo A República), o que aconteceria se este ser que repentinamente descobriu as maravilhas do mundo dominado por Hélio, o fabuloso universo inteligível, descesse de volta à caverna? Como ele seria recebido? Certamente que os que se encontram encadeados fariam mofa dele, colocando abertamente em dúvida a existência desse tal outro mundo que ele disse ter visitado. O recém-vindo certamente seria unanimemente hostilizado. Dessa forma, Platão traçou o desconforto do homem sábio quando é obrigado a conviver com os demais homens comuns. Não acreditam nele, não o levam a sério. Imaginam-no um excêntrico, um idiossincrático, um extravagante, quando não um rematado doido (destino comum a que a maior parte dos cientistas, inventores, e demais revolucionários do pensamento tiveram que enfrentar ao longo da história). Quais as Alternativas Deveria por isso o sábio então desistir? O riso e o deboche com que invariavelmente é recebido fariam com que ele devesse se afastar do convívio social? Quem sabe não seria preferível que ele se isolasse num retiro solitário, com as costas voltadas para a cidade. Hostil à idéia da vida monacal ao estilo dos pitagóricos, Platão foi incisivo: o conhecimento do sábio deve ser compartilhado com seus semelhantes, deve estar à serviço da cidade. O filósofo cheio de sabedoria e geometria que leva uma existência de eremita, acreditando-se um habitante das ilhas afortunadas, de nada serve. Isso porque a lei não se preocupa em assegurar a felicidade apenas para uma determinada classe de cidadãos (no caso, os sábios), mas sim se esforça para "realizar a ventura da cidade inteira". A liberdade que os sábios (o conhecimento dá aos seus portadores a sensação de liberdade) parecem gozar não é para eles "se voltarem para o lado que lhes aprouver, mas para fazê-los concorrer ao fortalecimento do laço do Estado". - 27 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 O Governo dos Sábios Platão não ficou apenas na recomendação de que os sábios devem socializar o conhecimento. Ousou ir bem mais além. Justamente por eles, os filósofos, serem menos "apressados em chegar ao poder" (sabendo perfeitamente distinguir o visível do inteligível, a imagem da realidade, o falso do verdadeiro), é que devem ser chamados para a regência das sociedade. A presença deles impediria as sedições e as intermináveis lutas civis internas tão comuns entre os diversos pretendentes rivais, "gente ávidas de bens particulares", sempre em luta, divergindo com espadas, na tentativa de ficar com o poder. O governo da cidade cabe pois aos mais instruídos e aos que manifestam mais indiferença ao poder, ainda que seja a característica do sábio "o desprezo pelos cargos públicos", pela simples razão deles terem sido os únicos a terem vislumbrado o bem, o belo e o justo. Os Dois Mundos de Platão Mundo visível Mundo invisível A sua geografia limita-se ao espaço sombrio da caverna É todo universo fora da caverna, o espaço composto pelo ar e pela terra inteira Caracteriza-se pela escuridão, é um mundo de sombras, de lusco-fusco, de imagens imprecisas (ídolos) Dominado pela claridade exuberante de Hélio, o Sol que tudo ilumina com seus raios esplendorosos, permitindo a rápida identificação de tudo, alcançando-se assim a ciência (gnose) e o conhecimento (episteme) Nele o homem se encontra encadeado, constrangido a olhar só para a parede na sua frente, ficando com a mente embotada, preocupando-se apenas com as coisas mesquinhas do seu dia-a-dia Plenitude do homem liberto da opressiva caverna, podendo investigar e inquirir tudo ao seu redor conhecendo enfim as formas perfeitas Homem dominado pelas sensações e pelos sentidos mais primários Homem orientado pela inteligência (nous) e pela razão (logos) Em situação de desconhecimento e ignorância (agnosis) Em condições de cultivar a sabedoria e a busca pela verdade e pelo ideal da junção do bem com o belo (kalogathia) Condição em que se encontra o homem comum Condição do filósofo Fontes: http://educaterra.terra.com.br/voltaire/cultura/caverna.htm http://educaterra.terra.com.br/voltaire/cultura/caverna2.htm http://educaterra.terra.com.br/voltaire/cultura/caverna3.htm II - CIENCIA POLÍTICA 1) Santo Agostinho Teólogo, filósofo, escritor e mitógrafo, nascido em Tagaste, próximo de Hipona, na então província romana de Numídia, na África romana, hoje Suk Ahras, na Argélia, conhecido como o último dos antigos e o primeiro dos modernos filósofos a refletir sobre o sentido da história e o arquiteto do projeto intelectual da Igreja Católica, o primeiro grande patrístico do período nissênico, com pensamento próprio, e um dos fundadores da Teologia. Filho de pais ricos, o pagão e depois convertido Patrício e da cristã Mônica, mais tarde canonizada, levou na mocidade uma vida circense e em atividades teatrais. Estudou retórica em Cartago (371-374), onde aos 17 anos passou a viver com uma concubina, da qual teve um filho, Adeodato. Interessou-se por filosofia após ler Hortensius, de Cícero e quando também aderiu ao maniqueísmo, caracterizadamente rigorista e proselitista. Retornando a Tagaste, lecionou retórica por um ano. Mais uma vez em Cartago, continuou no mesmo magistério, por 8 anos. - 28 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 Passou um ano em Roma e três em Milão, onde começou a ensinar retórica em Milão (384), e conheceu Santo Ambrósio, bispo da cidade. Interessou-se pelo cristianismo, voltou-se para o estudo dos filósofos neoplatônicos, renunciou aos prazeres físicos e converteu-se ao cristianismo (387), quando foi batizado por santo Ambrósio, junto com o filho Adeodato. Retirou-se do magistério, dedicando-se mais intensamente à filosofia neoplatônica. Retornou finalmente à África, e decidiu fundar um mosteiro com os bens que então herdara, em Tagasta (387), a origem da ordem agostiniana. Nessa época perdeu a mãe e, pouco depois, o filho. Ordenado padre em Hipona (391), pequeno porto do Mediterrâneo, atual Bône, na Argélia, tornou-se bispo-coadjutor da diocese (395) e foi nomeado bispo com a morte (397) do bispo diocesano Valério. Por causa de sua atividade como bispo de Hipona, esta cidade se ligou ao seu nome. Tomado pelo ideal da ascese, não tardou para que fundasse uma comunidade ascética nas dependências da catedral, uma ordem com o seu nome e sua influência que atingiu até, pelo menos, o século XVII. Foi testemunha dos acontecimentos decisivos da história universal, como o fim da antiguidade clássica, a invasão de Roma pelos visigodos e a decadência do Império Romano sob o ataque dos bárbaros. Sob esse clima estudou, ensinou e escreveu suas obras. No final de sua vida suas preocupações se concentraram na teologia, buscando aprimorar os conceitos neoplatônicos, os quais aliás deram sustentação teológica à polêmica doutrina sobre a atribuição da divindade às três pessoas: um Pai, um Filho e um Espírito Santo. Morreu durante o cerco de Hipona pelo rei dos vândalos, Genserico, e é festejado como doutor da igreja, venerado no dia 28 de agosto, tido como data de sua morte. Ainda que atingisse a posição de o mais expressivo teólogo e filósofo cristão do primeiro milênio, o seu pensamento não chegou a explicitar um sistema filosófico perfeitamente acabado. Sua obra se ressentiu contudo pela falta de preparo em língua grega, a qual lia apenas em traduções. Do neoplatônico Plotino (~204-270), através da tradução latina do patrístico Mário Victorino, encontrou o embasamento para desenvolver a doutrina cristã a um tempo monoteísta e trinitária, mas se libertou das emanações plotinianas, expondo uma conceituação filosófica da Trindade, que multiplicou as pessoas divinas e não a natureza. Sua obra, em si mesma imensa, de extraordinária riqueza, antecipou, além disso, o cartesianismo e a filosofia da existência. Fundou a filosofia da história e dominou todo o pensamento ocidental até o século XIII, quando deu lugar ao tomismo e à influência aristotélica. Voltou à cena com os teólogos protestantes Lutero e, sobretudo, Calvino, e hoje é um dos alicerces da teologia dialética. Escreveu cerca de 100 títulos e dentre os autores cristãos da antiguidade romana, foi um dos mais volumosos. Suas obras passaram a ser reeditadas até hoje. Nos 10 anos anteriores ao episcopado (386-396) escreveu: Contra os acadêmicos (Contra academicos), sobre a certeza; Da vida feliz (De beata vita); Da ordem (De ordine), sobre a providência divina e a educação; Solilóquios (Soliloquiorum), sobre Deus e a alma que fala a Deus; Da imortalidade da alma (De immortalitate animae); Da grandeza da alma (De quantitate animae), sobre a capacidade da alma para a virtude a contemplação de Deus; Do mestre (De magistro), sobre a língua e a instrução; Do livre arbítrio (De libero arbitrio), contra o determinismo maniqueísta e Deus como princípio do bem; Da música (De musica), sobre o ritmo e a elevação a Deus; Dos costumes da igreja e sobre os costumes dos maniqueus (De moribus ecclesiae et de moribus manichaeorum); Do Gênesis contra os maniqueus (De Genesi contra manichaeos); Da utilidade de crer (De utilitate credendi); Contra Adimanto, discípulo de Maniqueu (Contra Adimantum, Manichaei discipulum). Do início do episcopado são também as suas três obras mais importantes: Confissões (Confessiones, 397), autobiografia e espiritualidade, com elementos filosóficos sobre a criação e Deus; Da Trindade (De Trinitate, 400-416, 15 volumes), esclarecimento sobre as pessoas divinas, à luz de elementos neoplatônicos; e Da cidade de Deus (De civitate Dei, 413-426), obra mais tardia e escrita num curso mais longo de tempo (413-426), sendo uma apologia do cristianismo e uma visão do Reino de Deus, em termos de teologia da história; Retratações, 2 vols (Retractationes, 426-427). Como estudioso da natureza classificou os animais em úteis, nocivos e indiferentes. Fonte: http://www.brasilescola.com/biografia/santo-agostinho.htm 2) Niccolò Machiavelli – 1469-1527 - 29 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 Temas Importantes Para A Análise Da Obra A Verdade Efetiva Das Coisas O foco para Maquiavel sempre foi o Estado, não aquele imaginário e que nunca existiu; mas aquele que é capaz de impor a ordem! O ponto de partida e de chegada é a realidade corrente – por isto a ênfase na verità effetuale – ou seja: ver e examinar a realidade como ela é e não como se gostaria que fosse. O que Maquiavel se questiona incessantemente é: como fazer reinar a ordem – como instaurar um estado estável – como resolver o ciclo de estabilidade e caos. Ele chega a algumas conclusões interessantes – A ordem deve ser construída para evitar a barbárie. Uma vez alcançada, não é definitiva. Natureza Humana E História Fiel ao conceito da verdade efetiva, Maquiavel estuda a história, sobretudo a antigüidade clássica. Conclui que qualquer que seja o tempo e o espaço o homem tem traços humanos imutáveis quais sejam: ingratos, volúveis, simuladores, covardes e ávidos de lucro – O Príncipe cap. XVII. Destes atributos negativos temos os fundamentos para o conflito e a anarquia. Para Maquiavel o estudo do passado indicará os acontecimentos que se sucederão em qualquer estado e também quais os meios empregados para solucionar problemas pela coincidência ou similaridade. Segundo Maquiavel, os principados são dois os tipos de principados: REPUBLICA ou PRINCIPADOS. Os Principados podem ser hereditários ou novos. Principados mistos: Quando não são inteiramente novos. Maquiavel aconselha que quem adquire um território, desejando conserva-lo, deve tomar em consideração duas coisas: UMA, que a estirpe do seu antigo príncipe desapareça; a OUTRA, não alterar as suas leis, nem os seus impostos. Assim, dentro de um brevíssimo tempo, formam um corpo só. Quando o príncipe reside em seu domínio, dificilmente acontece de vir a perdê-lo. Outro meio igualmente eficaz e mandar colonizar algumas regiões que sejam como chaves do novo Estado. Esta medida e pouco dispendiosa ou nada custa alem de descontentar uns poucos. Apenas aqueles de que se tira os campos para dar aos novos habitantes. Neste caso, os lesados por ficarem pobres e dispersos, nunca poderão acarretar-lhe embaraços. Note-se, dizia Maquiavel, que os homens devem ser suprimidos ou lisonjeados, pois se vingam das ofensas leves, mas não podem fazê-lo das graves. Por conseguinte, a ofensa que se faz ao homem deve ser tal, que o impossibilite de tirar desagravo. Em sua opinião o exercito e dispendioso e causa descontentamentos a uma gama muito maior que a colônias, por isso, considerava-os inúteis. Quando se conquista um país acostumado a viver segundo as suas próprias leis e em liberdade, três maneiras há de proceder para conservá-lo: DESTRUI-LO; ou IR MORAR NELE; ou DEIXA-LO VIVER COM SUAS LEIS. Sobre os novos Principados conquistados dizia “Os Estados rapidamente surgidos, como todas as outras coisas da natureza que nascem e crescem depressa, não podem Ter raízes e as aderências necessárias para a sua consolidação. – Extingui-los a, a primeira borrasca, a menos que seus fundadores eram tão virtuosos que saibam imediatamente preparar-se para conservar o que a fortuna lhes concedeu e lancem depois alicerces idênticos aos que os demais príncipes construíram antes de tal se tornarem. Segundo Maquiavel, existem ainda duas outra maneiras de um simples cidadão chegar ao poder que não por meio da fortuna ou da virtude – através da pratica de ações celeradas e nefastas ou favor dos outros concidadãos. Quando um cidadão chega ao poder por meio da ajuda dos seus concidadãos, o principado pode ser chamado de civil e para alguém governa-lo, não precisa Ter exclusivamente VIRTUDE ou FORTUNA, mas sim ASTUCIA AFORTUNADA. Quem chega ao poder com o auxilio dos grandes, tem maiores dificuldades do que aquele que chega com o apoio dos vulgos. - 30 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 Desejo do povo e ficar livre de opressão enquanto os grandes querem oprimir o povo. Na sua opinião, o governo de um desses Estados começa a vacilar quando da ordem civil passa a MONARQUIA ABSOLUTA. Aconselha a que o príncipe deve fazer com que seus súditos necessitem sempre do Estado e dele porque a ele se submeterão. Anarquia X Principados e República Aliada a desordem, característica da natureza humana, existe a presença de duas forças opostas em qualquer sociedade: a) Não querer ser dominado nem oprimido pelos grandes,.....e b) Os grandes querem dominar e oprimir. Para Maquiavel só há dois caminhos que respondam à anarquia da natureza humana e ao confronto entre os dois grupos sociais: O Principado ou a República. A escolha de um ou de outro não é obra do acaso mas recai sobre fatos e situações concretas como se vê: a) Nação ameaçada de deterioração, corrupção alastrada = necessita de um governo forte que iniba as forças centrífugas = Principado – não necessariamente um ditador, mas um estadista. b) Sociedade equilibrada na qual o poder político cumpriu a função regeneradora e educadora = República. As instituições são estáveis e os conflitos indicam cidadania ativa. Virtù X Fortuna Virtù é, como vimos, energia, vontade dirigida para um objetivo. Fortuna é sorte (boa ou má), acaso ou oportunidade (propícia ou desfavorável). No caso do príncipe é o momento certo, antecipadamente calculado por ele; momento no correr do tempo porém o momento com certeza de êxito garantida pela perspicácia do príncipe. A crença na predestinação ou fatalidade dominava a muito tempo. A atividade política era uma prática de homens livres, o homem como sujeito da história. Este era um dogma contra o qual Maquiavel teria que lutar. A fortuna era uma deusa que possuí-a os bens que o homem deseja possuir: honra, riqueza, glória e poder. Era importante seduzi-la antes que outros o fizessem. Como era deusa - mulher era necessário mostrar-se vir homem de inquestionável coragem. Desta forma o homem que possuísse uma virtù no mais alto grau seria agraciado com a fortuna. Maquiavel na sua obra O Príncipe monta um cenário para comprovar que é possível se estabelecer uma aliança com a virtù pois parece haver um sentido de complementaridade e não de sobreposição. O poder que nasce da própria natureza humana encontra sua base na força mas o importante é a sabedoria no uso da força; ao governante para se manter no poder não basta ser simplesmente o mais forte – ele deve possuir virtù para manter o domínio adquirido. A Estratégia em “O Príncipe” Como se deve medir as forças de todos os principados? 1) Deve-se verificar se o príncipe tem condições de oferecer resistência sozinho a quem lhe ataca, isto é, dinheiro e exército para resistir. 2) Se necessita de ajuda alheia para defender seu trono, ou seja, refugia-se dentro dos muros de sua cidade para defender estes. Dos principados eclesiásticos Para conquistá-los basta virtude e sorte e para conservá-los não necessitam nem de uma ou outra coisa, pois as instituições religiosas são tão sólidas de tal natureza que permitem aos príncipes manterem-se no poder seja qual for o modo de procederem ou que vivem. Diz-se que estes principados são os únicos seguros e felizes. Obs.: Maquiavel diz isso porque nesta época a Igreja Católica Medieval era muito poderosa, estando acima e no topo da hierarquia máxima do estado medieval. - 31 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 Dos soldados mercenários Um príncipe para ter um estado forte é necessário que ele tenha um bom exército e boas leis. As tropas mercenárias ou auxiliares são inúteis e perigosas, o rei nunca terá tranqüilidade e nem segurança, pois elas são desunidas, ambiciosas, sem disciplina, infiéis, corajosas diante dos amigos e covardes diante dos inimigos e sem temor a Deus. Querem ser soldados do patrão enquanto ele não faz guerra, mas ao romper esta, querem fugir ao compromisso. Dos deveres de um príncipe para com a milícia O príncipe não deve cultivar outra arte a não ser a da guerra juntamente com as regras que ela requer para conservar seu estado. Obs.: “Manter sempre forte seu exército, em sempre estar aliado a ele.” Das coisas pelas quais um homem ou príncipe são louvados ou censurados Faça o que for necessário para não cair em ruína o seu trono, mesmo que seja censurado. Na escolha, do que se deve fazer, encontrará algo com aparência de virtude, que cuja adoção lhe trará a ruína, e algo com aparência de defeito que o conduzirá a uma situação de segurança e bem-estar. De que maneira os príncipes devem cumprir suas promessas 1º Só deverá cumpri-las se forem benéficas. Saiba que existe dois modos de combater: é pela lei ou pela força, não sendo muitas vezes suficiente a primeira convém recorrer a segunda. Um príncipe sábio não pode e nem deve manter-se fiel as suas promessas quando extinta a causa a que o levou fazê-las. Este preceito não servia se todos os homens fossem bons, como são maus por isso faltariam com a palavra que deram e nada impede que venhamos faltar com a nossa também. Justificativa para o não cumprimento da promessa feita. “Os homens em geral formam suas opiniões guiando-se pela vista, do que pelo tato; vê o que parecemos ser, e não sentem o que realmente somos. Os homens são tão simplórios e obedecem de tal forma as necessidades presentes que aquele que engana encontrará sempre quem se deixe enganar. É necessário a um príncipe que ele tenha um espírito pronto adaptar-se as variações das circunstâncias e da fortuna e manter-se quanto possível no caminho do bem, mas pronto igualmente a enveredar pelo do mal, quando for necessário. Como se deve evitar o desprezo e o ódio O príncipe deve em geral abster-se de praticar o que o torne malquisto ou desprezível. O que acarreta ódio dos súditos é usurpar os seus bens e as suas mulheres, pois os homens vivem contentes enquanto ninguém lhes toca nos haveres e na honra. O desprezo incorre quando os seus governados o julgam, inconstante, leviano e irresoluto. Tem de ter o máximo de cuidado, esta reputação é perigosa, seus atos devem ser de grandeza, coragem, austeridade e vigor. Como deve portar-se um príncipe para ser estimado Torna-se estimado quando sabe ser verdadeiro amigo ou inimigo, isto é, quando abertamente se declara a favor de alguém e contra outrém, é sempre melhor que manter-se neutro. Deve mostrar-se também amante da virtude, premiando os homens que se sobressaiam. Deve incutir nos seus súditos a idéia que poderão praticar seu ofício em paz, seja no comércio, agricultura, ou qualquer outro, para que estes não criem outros ramos de atividades para fugir dos impostos. “Idéia de Liberalismo.” Deve distrair o povo com festas durante certas épocas do ano e manter o controle sobre os grêmios ou corporações que divide a cidade. “Idéia de pão e circo.” “Futebol”. Principados “Território ou Estado cujo soberano é um príncipe ou princesa.” - 32 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 Podem ser Hereditários ou Novos. Maquiavel não atribuía interesse aos Principados Hereditários, pois são demasiados estáveis, demasiado fáceis, pois basta ao Príncipe “não ultrapassar os limites estabelecidos pelos antepassados e contemporizar com os acontecimentos”. As verdadeiras dificuldades, tanto para conquistar quanto para conservar encontram-se nos principados novos. Maquiavel propôs um código prático de anexação, devendo-se levar em conta na avaliação o modo de governo, se é despótico (tirano), aristocrático (nobreza) ou se é republicano (livre). Maquiavel se move no domínio do fato, isto é a força, pois o triunfo do mais forte sendo o fato essencial da história humana, e isto era bastante natural para Maquiavel e seus contemporâneos, é um fato natural, banal. “O desejo de conquistar é sem dúvida algo de ordinário e natural, e todo aquele que se entrega a tal desejo, quando possui os meios para realizá-lo é antes louvado que censurado; mas formar o desígnio sem poder executá-lo é incorrer na censura e cometer um erro ...” Precisa-se Ter forças para conquistar, assim para conservar. A razão primeira e última da política do príncipe é o emprego dessas forças de guerra. Para todo Estado antigo, novo ou misto, “as principais bases são: boas leis e boas armas.” Não há boas leis onde não há boas armas. Boas armas, boas tropas, são apenas as que pertencem ao príncipe, compostas de seus cidadãos, de seus súditos, de suas criaturas. Para Maquiavel existem quatro maneiras de conquistar, as quais poderão corresponder à diferentes maneiras de conservar ou de perder. a) Conquista pela própria “Virtu” (energia, vigor, resolução, talento, valor bravio e se necessário feroz); b) Conquista pela Fortuna e pelas armas alheias; c) Conquista pela Perversidade; d) Conquista pelo Consentimento dos concidadãos. Maquiavel interessa-se mais pelas duas primeiras maneiras. Os que se tornaram príncipes pela própria “Virtu” e pelas próprias armas, conhecem muitas dificuldades para conquistar e instalarem seus principados, para nele se radicarem, mas depois encontram muita facilidade para conservá-lo. Os Principados conquistados com as armas alheias, isto é, pela fortuna, a regra é inversa: facilidade para conquistar, dificuldade para conservar. É também possível tornar-se Príncipe por meio das perversidades: Para Maquiavel existem dois tipos de crueldades: as bem praticadas e as mal praticadas. As bem praticadas, são as que se cometem todas ao mesmo tempo, no início do reinado a fim de prover a segurança do novo Príncipe. Parecem menos amargas, ofendem menos. As crueldade mal praticadas são aquelas que se arrastam, se renovam, e pouco numerosas no princípio se multiplicam com o tempo em vez de cessarem. Os súditos perdem então o sentido de segurança. Tenha o cuidado de ofender os impotentes se possível. Se é obrigado a ofender os poderosos, seja radical na ofensa. A conquista pelo fator dos concidadãos exige alguma fortuna e alguma “virtu”. Ora é o povo, ora são os grandes que assim constituem um Príncipe. O Príncipe elevado pelos grandes – que se julgam seus iguais, que são insaciáveis, e aos quais não domina – encontra uma dificuldade em manter-se do que um Príncipe elevado pelo povo. O Príncipe elevado pelos grandes, contra a vontade do povo, deverá fazer tudo para se reconciliar o quanto antes com o povo. Fica transparente a preferência de Maquiavel pelo povo e sua hostilidade para com os grandes. Maquiavel não se interessa por estes principados chamados de “civis” e nem pelos Eclesiásticos, que adquirem pela fortuna, e para conservá-los não precisa nem de fortuna e nem de “virtu”. Basta o poder das instituições religiosas. Distinção entre os Estados a conquistar: - 33 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 Despótico: Difícil de conquistar porque todos os súditos se agregam ao redor do Príncipe e nada tem a esperar do estrangeiro. É fácil conservar, bastando para isso extinguir a raça do Príncipe. Aristocrático: Fácil de conquistar. Sempre tem descontentes prontos para abrir o caminho para o estrangeiro. Difícil de conservar, pois não é possível satisfazer a todos os grandes e nem extinguí-los de todo. República: Difícil de manter. Existe um princípio de vida mais ativo, um ódio mais profundo, um desejo de vingança muito mais ardente, causada pela lembrança da antiga liberdade. Maquiavel não consegue ocultar sua preferência, ternura e admiração pelos governos livres. Os três meios para domar a liberdade republicana são: a) Venha o Príncipe residir nas terras conquistadas para reprimir as desordens; b) Governe o país conforme suas leis, pelos próprios cidadãos recebendo um tributo. c) O meio radical: destruir, aniquilar a antiga e incurável República. Em O Príncipe Maquiavel aproveitou a ocasião de mostrar o perfil de César Borgia, tipo de príncipe novo, modelo de virtuosidade política, em oposição a Luís XII, príncipe hereditário que acumula as faltas. O principal da obra está nos capítulos XV a XX, e que constituem a essência do maquiavelismo. Subentende-se os deveres do príncipe cristão. O novo príncipe vive no seio do perigo, acompanhando-o dois receios: 1) o interior de seus estados e o proceder dos súditos; 2) o exterior e os disignios das potências circundantes. O príncipe deve aprender a não ser sempre bom, a ser ou não ser bom “conforme a necessidade”. O príncipe deve conservar o seu reino. O autor está desiludido com ou outros homens. Distingue perfeitamente o bem e o mal, e que até preferiria o bem, mas que recusa fechar os olhos ante o que julga ser a necessidade do Estado, ante o que julga serem as sujeições da condição humana. Para um príncipe ser considerado liberal, generoso é bom, todavia ser parcimonioso é um dos vícios que fazem reinar. Igualmente o príncipe deseja ser considerado clemente, mas é a crueldade que restabeleceu a ordem e a união na Romagna. Donde surge a questão clássica: Mais vale ser amado que temido, ou temido que amado? É melhor ser temido. Porque? Os homens são ingratos. O vínculo do amor rompem-no ao sabor do próprio interesse, enquanto o temor se conserva por um medo do castigo, que jamais os abandona. Ser temido não significa ser odiado. Há uma singela receita para evitar o ódio: é abster-se de atentar, seja contra os bens dos súditos, seja contra a honra de suas mulheres. Os príncipes que fizeram grandes coisas violando a sua fé, impondo-as aos homens pela astúcia, é que acabaram por dominar aqueles que se baseavam na lealdade. O príncipe deve escolher por modelo a raposa e o leão. Deve tratar de ser simultaneamente a raposa e leão, pois, se for apenas leão, não perceberá as armadilhas; se for apenas raposa, não se defenderá contra os lobos. Quando se é príncipe, pode-se “deixar de encontrar razões legítimas para colorir a falta de cumprimento” do que se prometeu. O novo príncipe deve observar em jamais tornar poderoso outro príncipe, pois seria trabalhar para sua própria ruína. Também o novo príncipe não se deve permanecer neutro, pois os que abraçam esta posição quase sempre vão a ruína. Somente um príncipe já sábio por si mesmo pode ser bem aconselhado. Deve tomar conselho quando quer e não quando outros o querem. Jamais se deixar dominar por aqueles que o aconselham. Um bom ministro é aquele que nunca pensa em si mesmo, mas sempre no príncipe. Mas o príncipe também deve pensar neste seu ministro, cumulando-o de riquezas, de consideração, de honras e dignidades, para que receie toda mudança. O Segredo de Maquiavel. Nos últimos 03 capítulos de O Príncipe (sobretudo no XXVI), Maquiavel revela seu grande segredo: A Itália. Um violento amor da pátria despedaçada, subjugada e devastada. O sonho de um libertador, de um redentor da Itália atormenta Maquiavel. No capítulo XXIV, manifesta Maquiavel seu desprezo aos - 34 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 príncipes italianos, tais como o rei de Nápoles, o Duque de Milão, que, após uma longa posse, perderam seus Estados. No último capítulo (XXVI), diz o autor que na Itália, nunca as circunstâncias foram tão favoráveis a um príncipe novo que queira “tornar-se ilustre”. O Destino da Obra Lourenço de Médicis recebeu O Príncipe em manuscrito. Não lhe dispensou atenção alguma. Nas mãos de contemporâneos onde circulou o manuscrito, o interesse foi medíocre. A partir de 1519, recupera Maquiavel certo favor dos Médicis, mas devido sua reputação de funcionário prudente, de hábil político, e não por causa de O Príncipe. Recebe uma pensão para escrever a sua História de Florença. Em 1527 os Médicis são de novo expulsos de Florença, restabelecendo-se a República, e a 22 de junho de 1527, aos 58 anos de idade, NICOLAU MAQUIAVEL falece, vítima de males intestinais. Quatro anos após sua morte, O Príncipe é publicado, com um breve de autorização do Papa Clemente VI (1531); a edição é dedicada a um cardeal. Inicialmente inofensiva, as edições vão se multiplicando. A Renascença pagã. sucedeu a Reforma protestante, que obrigou a própria Igreja a reformar-se interiormente. Assim o livro de Maquiavel achou-se envolvido nos turbilhões de vastas contendas. O Cardeal - Arcebispo de Canteerbury, Reginald Pole, católico, julga O Príncipe escrito “pela mão do Demôniuo”. Em1557, o escrito indigno e celerado denunciado pelo Papa Paulo IV; é condenado pelo Concílio de Trento, e muitas outras acusações. Também os protestantes abominam Maquiavel como jesuíta. Os jesuítas o denunciam à indignação católica. Porém os soberanos e primeiros ministros, apaixonados do Poder, fazem de O Príncipe, breviário do absolutismo, o livro de cabeceira. Por volta de 1738, Frederico, príncipe real da Prússia, compõe um Antimaquiavel, homenagem de um “filósofo”, de um futuro “déspota esclarecido”, ao idealismo político, ao otimismo do século. Mas Maquiavel, “simulando dar lições aos reis, deu grandes lições aos povos”. Napoleão aparece a seus inimigos, como a realização mais perfeita do príncipe. Maquiavel tem direito à mais fervorosa gratidão da Itália unificada de 1870, e dos democratas do mundo inteiro. Na segunda guerra mundial, julgou-se a derrota de Hitler como a derrota de Maquiavel. Mas a derrota de Hitler é em grande parte a vitória de Stalin. No entanto, a força corrosiva do pensamento e do estilo de Maquiavel ultrapassaram, de infinita distância, o objeto do momento. Por ter realçado tão cruelmente o problema das relações entre a política e a moral; por ter concluído, em uma cisão profunda, uma irremediável separação entre elas, O Príncipe atormentou a humanidade durante quatro séculos. E continuará a atormentá-la, senão eternamente”, como se disse, - ao menos enquanto essa humanidade não tiver analisado inteiramente certa cultura moral, herdada, no que diz respeito ao Ocidente, de alguns Antigos célebres, e, sobretudo, do cristianismo. Fonte: http://www.brasilescola.com/sociologia/ciencia-politica-maquiavel.htm III – SOCIOLOGIA 1) Max Weber – Vida e Obra Pondo-se de lado alguns trabalhos precursores, como os de Maquiavel (1469-1527) e Montesquieu (1689-1755), o estudo científico dos fatos humanos somente começou a se constituir em meados do século XIX. Nessa época, assistia-se ao triunfo dos métodos das ciências naturais, concretizadas nas radicais transformações da vida material do homem; operadas pela Revolução Industrial. Diante dessa comprovação inequívoca da fecundidade do caminho metodológico apontado por Galileu (1564-1642) e outros, alguns pensadores que procuravam conhecer cientificamente os fatos humanos passaram a abordá-los segundo as coordenadas das ciências naturais. Outros, ao contrário, afirmando a peculiaridade do fato humano e a conseqüente necessidade de uma metodologia própria. Essa metodologia deveria levar em consideração o fato de que o conhecimento dos fenômenos naturais e um conhecimento de algo externo ao próprio homem, enquanto nas ciências sociais o que se procura conhecer é a própria experiência humana. De acordo com a distinção entre experiência externa e - 35 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 experiência interna, poder-se-ia distinguir uma série de contrastes metodológicos entre os dois grupos de ciências. As ciências exatas partiriam da observação sensível e seriam experimentais, procurando obter dados mensuráveis e regularidades estatísticas que conduzissem à formulação de leis de caráter matemático. As ciências humanas, ao contrário, dizendo respeito à própria experiência humana, seriam introspectivas, utilizando a intuição direta dos fatos, e procurariam atingir não generalidades de caráter matemático, mas descrições qualitativas de tipos e formas fundamentais da vida do espírito. Os positivistas (como eram chamados os teóricos da identidade fundamental entre as ciências exatas e as ciências humanas) tinham suas origens sobretudo na tradição empirista inglesa que remonta a Francis Bacon (1561-1626) e encontrou expressão em David Hume (1711-1776), nos utilitaristas do século XIX e outros. Nessa linha metodológica de abordagem dos fatos humanos se colocariam Augusto Comte (1798-1857) e Émile Durkheim (1858-1917), este considerado por muitos como o fundador da sociologia como disciplina científica. Os antipositivistas, adeptos da distinção entre ciências humanas e ciências naturais, foram sobretudo os alemães, vinculados ao idealismo dos filósofos da época do Romantismo, principalmente Hegel (1770-1831) e Schleiermacher (1768-1834). Os principais representantes dessa orientação foram os neokantianos Wilhelm Dilthey (1833-1911), Wilhelm Windelband (1848-1915) e Heinrich Rickert (1863-1936). Dilthey estabeleceu uma distinção que fez fortuna: entre explicação (erklären) e compreensão (verstehen). O modo explicativo seria característico das ciências naturais, que procuram o relacionamento causal entre os fenômenos. A compreensão seria o modo típico de proceder das ciências humanas, que não estudam fatos que possam ser explicados propriamente, mas visam aos processos permanentemente vivos da experiência humana e procuram extrair deles seu sentido (Sinn). Os sentidos (ou significados) são dados, segundo Dilthey, na própria experiência do investigador, e poderiam ser empaticamente apreendidos na experiência dos outros. Dilthey (como Windelband e Rickert), contudo, foi sobretudo filósofo e historiador e não, propriamente, cientista social, no sentido que a expressão ganharia no século XX. Outros levaram o método da compreensão ao estudo de fatos humanos particulares, constituindo diversas disciplinas compreensivas. Na sociologia, a tarefa ficaria reservada a Max Weber. Uma educação humanista apurada Max Weber nasceu e teve sua formação intelectual no período em que as primeiras disputas sobre a metodologia das ciências sociais começavam a surgir na Europa, sobretudo em seu país, a Alemanha. Filho de uma família da alta classe média, Weber encontrou em sua casa uma atmosfera intelectualmente estimulante. Seu pai era um conhecido advogado e desde cedo orientou-o no sentido das humanidades. Weber recebeu excelente educação secundária em línguas, história e literatura clássica. Em 1882, começou os estudos superiores em Heidelberg; continuando-os em Göttingen e Berlim, em cujas universidades dedicou-se simultaneamente à economia, à história, à filosofia e ao direito. Concluído o curso, trabalhou na Universidade de Berlim, na qual idade de livre-docente, ao mesmo tempo em que servia como assessor do governo. Em 1893, casou-se e; no ano seguinte, tornou-se professor de economia na Universidade de Freiburg, da qual se transferiu para a de Heidelberg, em 1896. Dois anos depois, sofreu sérias perturbações nervosas que o levaram a deixar os trabalhos docentes, só voltando à atividade em 1903, na qualidade de co-editor do Arquivo de Ciências Sociais (Archiv tür Sozialwissenschatt), publicação extremamente importante no desenvolvimento dos estudos sociológicas na Alemanha. A partir dessa época, Weber somente deu aulas particulares, salvo em algumas ocasiões, em que proferiu conferências nas universidades de Viena e Munique, nos anos que precederam sua morte, em 1920. Compreensão e explicação Dentro das coordenadas metodológicas que se opunham à assimilação das ciências sociais aos quadros teóricos das ciências naturais, Weber concebe o objeto da sociologia como, fundamentalmente, "a captação da relação de sentido" da ação humana. Em outras palavras, conhecer um fenômeno social seria extrair o conteúdo simbólico da ação ou ações que o configuram. Por ação, Weber entende "aquela cujo sentido pensado pelo sujeito jeito ou sujeitos jeitos é referido ao comportamento dos - 36 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 outros; orientando-se por ele o seu comportamento". Tal colocação do problema de como se abordar o fato significa que não é possível propriamente explicá-lo como resultado de um relacionamento de causas e efeitos (procedimento das ciências naturais), mas compreendê-lo como fato carregado de sentido, isto é, como algo que aponta para outros fatos e somente em função dos quais poderia ser conhecido em toda a sua amplitude. O método compreensivo, defendido por Weber, consiste em entender o sentido que as ações de um indivíduo contêm e não apenas o aspecto exterior dessas mesmas ações. Se, por exemplo, uma pessoa dá a outra um pedaço de papel, esse fato, em si mesmo, é irrelevante para o cientista social. Somente quando se sabe que a primeira pessoa deu o papel para a outra como forma de saldar uma dívida (o pedaço de papel é um cheque) é que se está diante de um fato propriamente humano, ou seja, de uma ação carregada de sentido. O fato em questão não se esgota em si mesmo e aponta para todo um complexo de significações sociais, na medida em que as duas pessoas envolvidas atribuem ao pedaço de papel a função do servir como meio de troca ou pagamento; além disso, essa função é reconhecida por uma comunidade maior de pessoas. Segundo Weber, a captação desses sentidos contidos nas ações humanas não poderia ser realizada por meio, exclusivamente, dos procedimentos metodológicos das ciências naturais, embora a rigorosa observação dos fatos (como nas ciências naturais) seja essencial para o cientista social. Contudo, Weber não pretende cavar um abismo entre os dois grupos de ciências. Segundo ele, a consideração de que os fenômenos obedecem a uma regularidade causal envolve referência a um mesmo esquema lógico de prova, tanto nas ciências naturais quanto nas humanas. Entretanto, se a lógica da explicação causal é idêntica, o mesmo não se poderia dizer dos tipos de leis gerais a serem formulados para cada um dos dois grupos de disciplinas. As leis sociais, para Weber, estabelecem relações causais em termos de regras de probabilidades, segundo as quais a determinados processos devem seguir-se, ou ocorrer simultaneamente., outros. Essas leis referem-se a construções de “comportamento com sentido” e servem para explicar processos particulares. Para que isso seja possível; Weber defende a utilização dos chamados “tipos ideais”, que representam o primeiro nível de generalização de conceitos abstratos e, correspondendo às exigências lógicas da prova, estão intimamente ligados à realidade concreta particular. O legal e o típico O conceito de tipo ideal corresponde, no pensamento weberiano, a um processo de conceituação que abstrai de fenômenos concretos o que existe de particular, constituindo assim um conceito individualizante ou, nas palavras do próprio Weber, um “conceito histórico concreto”. A ênfase na caracterização sistemática dos padrões individuais concretos (característica das ciências humanas) opõe a conceituação típico-ideal à conceituação generalizadora, tal como esta é conhecida nas ciências naturais. A conceituação generalizadora, como revela a própria expressão, retira do fenômeno concreto aquilo que ele tem de geral, isto é, as uniformidades e regularidades observadas em diferentes fenômenos constitutivos de uma mesma classe. A relação entre o conceito genérico e o fenômeno concreto é de natureza tal que permite classificar cada fenômeno particular de acordo com os traços gerais apresentados pelo mesmo, considerando como acidental tudo o que não se enquadre dentro da generalidade. Além disso, a conceituação generalizadora considera o fenômeno particular como um caso cujas características gerais podem ser deduzidas de uma lei. A conceituação típico-ideal chega a resultados diferentes da conceituação generalizadora. O tipo ideal, segundo Weber, expõe como se desenvolveria uma forma particular de ação social se o fizesse racionalmente em direção a um fim e se fosse orientada de forma a atingir um e somente um fim. Assim, o tipo ideal não descreveria um curso concreto de ação, mas um desenvolvimento normativamente ideal, isto é, um curso de ação “objetivamente possível”. O tipo ideal é um conceito vazio de conteúdo real: ele depura as propriedades dos fenômenos reais desencarnando-os pela análise, para depois reconstruí-los. Quando se trata de tipos complexos (formados por várias propriedades), essa reconstrução assume a forma de síntese, que não recupera os fenômenos em sua real concreção, mas que os idealiza em uma articulação significativa de abstrações. Desse modo, se constitui uma “pauta de contrastação”, que permite situar os fenômenos reais em sua relatividade. Por - 37 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 conseguinte, o tipo ideal não constitui nem uma hipótese nem uma proposição e, assim, não pode ser falso nem verdadeiro, mas válido ou não-válido, de acordo com sua utilidade para a compreensão significativa dos acontecimentos estudados pelo investigador. No que se refere à aplicação do tipo ideal no tratamento da realidade, ela se dá de dois modos. O primeiro é um processo de contrastação conceituai que permite simplesmente apreender os fatos segundo sua maior ou menor aproximação ao tipo ideal. O segundo consiste na formulação de hipóteses explicativas. Por exemplo: para a explicação de um pânico na bolsa de valores, seria possível, em primeiro lugar, supor como se desenvolveria o fenômeno na ausência de quaisquer sentimentos irracionais; somente depois se poderia introduzir tais sentimentos como fatores de perturbação. Da mesma forma se poderia proceder para a explicação de uma ação militar ou política. Primeiro se fixaria, hipoteticamente, como se teria desenvolvido a ação se todas as intenções dos participantes fossem conhecidas e se a escolha dos meios por parte dos mesmos tivesse sido orientada de maneira rigorosamente racional em relação a certo fim. Somente assim se poderia atribuir os desvios aos fatores irracionais. Nos exemplos acima é patente a dicotomia estabelecida por Weber entre o racional e o irracional, ambos conceitos fundamentais de sua metodologia. Para Weber, uma ação é racional quando cumpre duas condições. Em primeiro lugar, uma ação é racional na medida em que é orientada para um objetivo claramente formulado, ou para um conjunto de valores, também claramente formulados e logicamente consistentes. Em segundo lugar, uma ação é racional quando os meios escolhidos para se atingir o objetivo são os mais adequados. Uma vez de posse desses instrumentos analíticos, formulados para a explicação da realidade social concreta ou, mais exatamente, de uma porção dessa realidade, Weber elabora um sistema compreensivo de conceitos, estabelecendo uma terminologia precisa como tarefa preliminar para a análise das inter-relações entre os fenômenos sociais. De acordo com o vocabulário weberiano, são quatro os tipos de ação que cumpre distinguir claramente: ação racional em relação a fins, ação racional em relação a valores, ação afetiva e ação tradicional. Esta última, baseada no hábito, está na fronteira do que pode ser considerado como ação e faz Weber chamar a atenção para o problema de fluidez dos limites, isto é, para a virtual impossibilidade de se encontrarem “ações puras”. Em outros termos, segundo Weber, muito raramente a ação social orienta-se exclusivamente conforme um ou outro dos quatro tipos. Do mesmo modo, essas formas de orientação não podem ser consideradas como exaustivas. Seriam tipos puramente conceituais, construídos para fins de análise sociológica, jamais encontrando-se na realidade em toda a sua pureza; na maior parte dos casos, os quatro tipos de ação encontram-se misturados. Somente os resultados que com eles se obtenham na análise da realidade social podem dar a medida de sua conveniência. Para qualquer um desses tipos tanto seria possível encontrar fenômenos sociais que poderiam ser incluídos neles, quanto se poderia também deparar com fatos limítrofes entre um e outro tipo. Entretanto, observa Weber, essa fluidez só pode ser claramente percebida quando os próprios conceitos tipológicos não são fluidos e estabelecem fronteiras rígidas entre um e outro. Um conceito bem definido estabelece nitidamente propriedades cuja presença nos fenômenos sociais permite diferenciar um fenômeno de outro; estes, contudo, raramente podem ser classificados de forma rígida. O sistema de tipos ideais Na primeira parte de Economia e Sociedade, Max Weber expõe seu sistema de tipos ideais, entre os quais os de lei, democracia, capitalismo, feudalismo, sociedade, burocracia, patrimonialismo, sultanismo. Todos esses tipos ideais são apresentados pelo autor como conceitos definidos conforme critérios pessoais, isto é, trata-se de conceituações do que ele entende pelo termo empregado, de forma a que o leitor perceba claramente do que ele está falando. O importante nessa tipologia reside no meticuloso cuidado com que Weber articula suas definições e na maneira sistemática com que esses conceitos são relacionados uns aos outros. A partir dos conceitos mais gerais do comportamento social e das relações sociais, Weber formula novos conceitos mais específicos, pormenorizando cada vez mais as características concretas. Sua abordagem em termos de tipos ideais coloca-se em oposição, por um lado, à explicação estrutural dos fenômenos, e, por outro, à perspectiva que vê os fenômenos como entidades qualitativamente - 38 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 diferentes. Para Weber, as singularidades históricas resultam de combinações específicas de fatores gerais que, se isolados, são quantificáveis, de tal modo que os mesmos elementos podem ser vistos numa série de outras combinações singulares. Tudo aquilo que se afirma de uma ação concreta, seus graus de adequação de sentido, sua explicação compreensiva e causal, seriam hipóteses suscetíveis de verificação. Para Weber, a interpretação causal correta de uma ação concreta significa que “o desenvolvimento externo e o motivo da ação foram conhecidos de modo certo e, ao mesmo tempo, compreendidos com sentido em sua relação”. Por outro lado, a interpretação causal correta de uma ação típica significa que o acontecimento considerado típico se oferece com adequação de sentido e pode ser comprovado como causalmente adequado, pelo menos em algum grau. O capitalismo é protestante? As soluções encontradas por Weber para os intrincados problemas metodológicos que ocuparam a atenção dos cientistas sociais do começo do século XX permitiram-lhe lançar novas luzes sobre vários problemas sociais e históricos, e fazer contribuições extremamente importantes para as ciências sociais. Particularmente relevantes nesse sentido foram seus estudos sobre a sociologia da religião, mais exatamente suas interpretações sobre as relações entre as idéias e atitudes religiosas, por um lado, e as atividades e organização econômica correspondentes, por outro. Esses estudos de Weber, embora incompletos, foram publicados nos três volumes de sua Sociologia da Religião. A linha mestra dessa obra é constituída pelo exame dos aspectos mais importantes da ordem social e econômica do mundo ocidental, nas várias etapas de seu desenvolvimento histórico. Esse problema já se tinha colocado para outros pensadores anteriores a Weber, dentre os quais Karl Marx (1818-1883), cuja obra, além de seu caráter teórico, constituía elemento fundamental para a lufa econômica e política dos partidos operários; por ele mesmo criados. Por essas razões, a pergunta que os sociólogos alemães se faziam era se o materialismo histórico formulado por Marx era ou não o verdadeiro, ao transformar o fator econômico no elemento determinante de todas as estruturas sociais e culturais, inclusive a religião. Inúmeros trabalhos foram escritos para resolver o problema, substituindo-se o fator econômico como dominante por outros fatores, tais como raça, clima, topografia, idéias filosóficas, poder político. Alguns autores, como Wilhelm Dilthey, Ernst Troeltsch (1865-1923) e Werner Sombart (1863-1941), já se tinham orientado no sentido de ressaltar a influência das idéias e das convicções éticas como fatores determinantes, e chegaram à conclusão de que o moderno capitalismo não poderia ter surgido sem uma mudança espiritual básica, como aquela que ocorreu nos fins da Idade Média. Contudo, somente com os trabalhos de Weber foi possível elaborar uma verdadeira teoria geral capaz de confrontar-se com a de Marx. A primeira idéia que ocorreu a Weber na elaboração dessa teoria foi a de que, para conhecer corretamente a causa ou causas do surgimento do capitalismo, era necessário fazer um estudo comparativo entre as várias sociedades do mundo ocidental (único lugar em que o capitalismo, como um tipo ideal, tinha surgido) e as outras civilizações, principalmente as do Oriente, onde nada de semelhante ao capitalismo ocidental tinha aparecido. Depois de exaustivas análises nesse sentido, Weber foi conduzido à tese de que a explicação para o fato deveria ser encontrada na íntima vinculação do capitalismo com o protestantismo: “Qualquer observação da estatística ocupacional de um país de composição religiosa mista traz à luz, com notável freqüência, um fenômeno que já tem provocado repetidas discussões na imprensa e literatura católicas e em congressos católicos na Alemanha: o fato de os líderes do mundo dos negócios e proprietários do capital, assim como os níveis mais altos de mão-de-obra qualificada, principalmente o pessoal técnica e comercialmente especializado das modernas empresas, serem preponderantemente protestantes”. A partir dessa afirmação, Weber coloca uma série de hipóteses referentes a fatores que poderiam explicar o fato. Analisando detidamente esses fatores, Weber elimina-os, um a um, mediante exemplos históricos, e chega à conclusão final de que os protestantes, tanto como classe dirigente, quanto como classe dirigida, seja como maioria, seja como minoria, sempre teriam demonstrado tendência específica para o racionalismo econômico. A razão desse fato deveria, portanto, ser buscada no caráter intrínseco e permanente de suas crenças religiosas e não apenas em suas temporárias situações externas na história e na política. - 39 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 Uma vez indicado o papel que as crenças religiosas teriam exercido na gênese do espírito capitalista, Weber propõe-se a investigar quais os elementos dessas crenças que atuaram no sentido indicado e procura definir o que entende por "espírito do capitalismo". Este é entendido por Weber como constituído fundamentalmente por uma ética peculiar, que pode ser exemplificada muito nitidamente por trechos de discursos de Benjamin Franklin (1706 - 1790), um dos líderes da independência dos Estados Unidos. Benjamin Franklin, representante típico da mentalidade dos colonos americanos e do espírito pequeno-burguês, afirma em seus discursos que “ganhar dinheiro dentro da ordem econômica moderna é, enquanto isso for feito legalmente, o resultado e a expressão da virtude e da eficiência de uma vocação”. Segundo a interpretação dada por Weber a esse texto, Benjamin Franklin expressa um utilitarismo, mas um utilitarismo com forte conteúdo ético, na medida em que o aumento de capital é considerado um fim em si mesmo e, sobretudo, um dever do indivíduo. O aspecto mais interessante desse utilitarismo residiria no fato de que a ética de obtenção de mais e mais dinheiro é combinada com o estrito afastamento de todo gozo espontâneo da vida. A questão seguinte colocada por Weber diz respeito aos fatores que teriam levado a transformar-se em vocação uma atividade que, anteriormente ao advento do capitalismo, era, na melhor das hipóteses, apenas tolerada. O conceito de vocação como valorização do cumprimento do dever dentro das profissões seculares Weber encontra expresso nos escritos de Martinho Lutero (1483-1546), a partir do qual esse conceito se tornou o dogma central de todos os ramos do protestantismo. Em Lutero, contudo, o conceito de vocação teria permanecido em sua forma tradicional, isto é, algo aceito como ordem divina à qual cada indivíduo deveria adaptar-se. Nesse caso, o resultado ético, segundo Weber, é inteiramente negativo, levando à submissão. O luteranismo, portanto, não poderia ter sido a razão explicativa do espírito do capitalismo. Weber volta-se então para outras formas de protestantismo diversas do luteranismo, em especial para o calvinismo e outras seitas, cujo elemento básico era o profundo isolamento espiritual do indivíduo em relação a seu Deus, ó que, na prática, significava a racionalização do mundo e a eliminação do pensamento mágico como meio de salvação. Segundo o calvinismo, somente uma vida guiada pela reflexão contínua poderia obter vitória sobre o estado natural, e foi essa racionalização que deu à fé reformada uma tendência ascética. Com o objetivo de relacionar as idéias religiosas fundamentais do protestantismo com as máximas da vida econômica capitalista, Weber analisa alguns pontos fundamentais da ética calvinista, como a afirmação de que “o trabalho constitui, antes de mais nada, a própria finalidade da vida”. Outra idéia no mesmo sentido estaria contida na máxima dos puritanos, segundo a qual “a vida profissional do homem é que lhe dá uma prova de seu estado de graça para sua consciência, que se expressa no zelo e no método, fazendo com que ele consiga cumprir sua vocação”. Por meio desses exemplos, Weber mostra que o ascetismo secular do protestantismo “libertava psicologicamente a aquisição de bens da ética tradicional, rompendo os grilhões da ânsia de lucro, com o que não apenas a legalizou, como também a considerou como diretamente desejada por Deus”. E m síntese, a tese de Weber afirma que a consideração dó trabalho (entendido como vocação constante e sistemática) como o mais alto instrumento de ascese e o mais seguro meio de preservação da redenção da fé e do homem deve ter sido a mais poderosa alavanca da expressão dessa concepção de vida constituída pelo espírito do capitalismo. É necessário, contudo, salientar que Weber, em nenhum momento considera o espírito do capitalismo como pura conseqüência da Reforma protestante. O sentido que norteia sua análise é antes uma proposta de investigarem que medida as influências religiosas participaram da moldagem qualitativa do espírito do capitalismo. Percorrendo o caminho inverso, Weber propõe-se também a compreender melhor o sentido do protestantismo, mediante o estudo dos aspectos fundamentais do sistema econômica capitalista. Tendo em vista a grande confusão existente no campo das influências entre as bases materiais, as formas de organização social e política e os conteúdos espirituais da Reforma, Weber salientou que essas influências só poderiam ser. confirmadas por meio de exaustivas investigações dos pontos em que realmente teriam ocorrido correlações entre o movimento religioso e a ética vocacional, Com isso “se poderá avaliar” - diz o próprio Weber – “em que medida os fenômenos culturais contemporâneos se originam historicamente em motivos religiosos e em que medida podem ser relacionados com eles”. - 40 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 Autoridade e legitimidade A aplicação da metodologia compreensiva à análise dos fenômenos históricos e sociais, por parte dê Weber, não sê limitou às relações entre o protestantismo ê o sistema capitalista. Inúmeros foram seus trabalhos dê investigação empírica sobre assuntos econômicos ê políticos. Entre os primeiros, salientam-se A Situação dos Trabalhadores Agrícolas no Elba ê A Psicofisiologia do Trabalho Industrial. Entre os segundos, devem ser ressaltadas suas análises críticas da seleção burocrática dos líderes políticos na Alemanha dos Kaiser Guilherme I e II ê da despolitização levada a cabo com a hegemonia dos burocratas. Para a teoria política em geral, contudo, foram mais importantes os conceitos ê categorias interpretativas que formulou e que se tornaram clássicos nas ciências sociais. Weber distingue no conceito de política duas acepções, uma geral e outra restrita. No sentido mais amplo, política é entendida por ele como “qualquer tipo dê liderança independente em ação”. No sentido restrito, política seria liderança dê um tipo dê associação específica; em outras palavras, tratar-se-ia da liderança do Estado. Este, por sua vez, é defendido por Weber como “uma comunidade humana que pretende o monopólio do uso legítimo da força física dentro de determinado território". Definidos esses conceitos básicos, Weber é conduzido a desdobrar a natureza dos elementos essenciais quê constituem o Estado ê assim chega ao conceito dê autoridade ê dê legitimidade. Para quê um Estado exista, diz Weber, é necessário quê um conjunto dê pessoas (toda a sua população) obedeça à autoridade alegada pêlos detentores do poder no referido Estado. Por outro lado, para quê os dominados obedeçam é necessário quê os detentores do poder possuam uma autoridade reconhecida como legítima. A autoridade pode ser distinguida segundo três tipos básicos: a racional-legal, a tradicional e a carismática. Esses três tipos dê autoridade correspondem a três tipos dê legitimidade: a racional, a puramente afetiva e a utilitarista. O tipo racional-legal tem como fundamento a dominação em virtude da crença na validade do estatuto legal e da competência funcional, baseada, por sua vez, em regras racionalmente criadas. A autoridade desse tipo mantém-se, assim, segundo uma ordem impessoal e universalista, e os limites de seus poderes são determinados pelas esferas de competência, defendidas pela própria ordem. Quando a autoridade racional-legal envolve um corpo administrativo organizado, toma a forma dê estrutura burocrática, amplamente analisada por Weber. A autoridade tradicional é imposta por procedimentos considerados legítimos porquê sempre teria existido, e é aceita em nome de uma tradição reconhecida como válida. O exercício da autoridade nos Estados desse tipo é definido por um sistema dê status, cujos poderes são determinados, em primeiro lugar, por prescrições concretas da ordem tradicional ê, em segundo lugar, pela autoridade dê outras pessoas que estão acima dê um status particular no sistema hierárquico estabelecido. Os poderes são também determinados pela existência dê uma esfera arbitrária de graça, aberta a critérios variados, como os de razão de Estado, justiça substantiva, considerações dê utilidade e outros. Ponto importante é a inexistência de separação nítida entre a esfera da autoridade e a competência privada do indivíduo, fora de sua autoridade. Seu status é total, na medida em que seus vários papéis estão muito mais integrados do que no caso de um ofício no Estado racional-legal. Em relação ao tipo de autoridade tradicional, Weber apresenta uma subclassificação em termos do desenvolvimento e do papel do corpo administrativo: gerontocracia e patriarcalismo. Ambos são tipos em que nem um indivíduo, nem um grupo, segundo o caso, ocupam posição de autoridade independentemente do controle de um corpo administrativo, cujo status e cujas funções são tradicionalmente fixados. No tipo patrimonialista de autoridade, as prerrogativas pessoais do "chefe" são muito mais extensas e parte considerável da estrutura da autoridade tende a se emancipar do controle da tradição. A dominação carismática é um tipo de apelo que se opõe às bases de legitimidade da ordem estabelecida e institucionalizada. O líder carismático, em certo sentido, é sempre revolucionário, na medida em que se coloca em oposição consciente a algum aspecto estabelecido da sociedade em que atua. Para que se estabeleça uma autoridade desse tipo, é necessário que o apelo do líder seja considerado como legítimo por seus seguidores, os quais estabelecem com ele uma lealdade de tipo pessoal. Fenômeno excepcional, a dominação carismática não pode estabilizar-se sem sofrer profundas - 41 – RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO Disciplina: Filosofia, Ciência Política e Sociologia Prof.: Ricardo Maurício Freire Data: 28/10/2007 mudanças estruturais, tornando-se, de acordo com os padrões de sucessão que adotar e com a evolução do corpo administrativo, ou racional-legal ou tradicional, em algumas de suas configurações básicas. Bibliografia: Weber, Os Pensadores, Ed. Abril Weber, Grandes Cientistas Sociais, Ed. Ática Fonte: http://www.culturabrasil.org/weber.htm IV) Bibliografia citada em aula: Paulo Nader – Filosofia do Direito. Ed. Forense. Dalmo de Abreu Dallari - Elementos de Teoria Geral do Estado. Ed. Saraiva Antonio Luiz Machado Neto - Sociologia Jurídica. Ed. Saraiva. Ricardo Mauricio freire - Tendências do Pensamento Jurídico Contemporâneo. Ed. Jus Podium. Ricardo Maurício Freire – Direito, Justiça e Princípios Constitucionais. Ed. Ricardo Maurício Freire – A Nova Interpretação do Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Asne Seierstad - O livreiro de Cabul. Ed. Record. Nicolau Maquiavel – O Príncipe. Platão – A República. Thomas Hobbes – Leviatã. Bobbio – Os intelectuais e o Poder John Locke – Tratado do Governo Civil Jean Jacques Rousseau – Contrato Social Barão de Montesquieu – O espírito das leis Para saber sobre Cosme de Farias (citado em aula) ver o site: O MAJOR COSME DE FARIAS http://www.cosmedefariasonline.hpg.com.br/biografia.htm - 42 –