VERSÃO PRELIMINAR
MARIO DIAS RIPPER
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UNIVERSALIZAÇÃO DO ACESSO AOS SERVIÇOS DE
TELECOMUNICAÇÕES: O DESAFIO ATUAL NO
BRASIL*
Mario Dias Ripper
Desde a privatização do Sistema Telebrás, o Brasil fez um enorme progresso na
democratização do acesso ao serviço telefônico. Os números de 2002 da Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), do IBGE, divulgados no dia 10 de outubro,
mostram que o serviço de telefonia foi, entre os serviços públicos, o que mais se expandiu
em dez anos. De 1992 a 2002, o percentual de domicílios com linha telefônica (fixa ou só
celular) passou de 19,0% para 61,6%. Descontados os domicílios que só possuem
telefones celulares, esse percentual seria de 52,8%. A maior parte dessa expansão foi
realizada depois de 1999, quando 37,6% dos domicílios possuíam telefones.
O serviço de energia elétrica ainda é o mais universalizado: em 2002, 96,7% dos
domicílios tinham iluminação elétrica. Mas, cresceu muito menos nesse mesmo período:
7,9 pontos percentuais. O número de domicílios com saneamento básico é bem menor do
que os que contam com telefones: 50% das residências brasileiras não são servidas por
redes de esgoto. A pesquisa também mostra a contribuição da telefonia móvel para o
serviço de universalização: em 2002, 8,8% dos domicílios tinham somente um telefone
celular.
A expansão do serviço de telefonia fixa comutada (STFC), no nível em que se deu, foi
conseqüência de uma decisão política do governo. O acesso universal aos serviços básicos
de telecomunicações é um dos objetivos do modelo brasileiro e o modo como ele foi
inserido no arcabouço regulatório obrigou as operadoras, depois da privatização da
Telebrás, a realizarem grandes investimentos para cumprir obrigações de universalização.
O marco regulatório do setor, a Lei Geral de Telecomunicações, estabelece em seu artigo
2º que o objetivo básico da regulação promovida pelo Estado deve ser a garantia de
acesso às telecomunicações a tarifas e preços razoáveis e condições adequadas. Define,
também, o serviço telefônico fixo como um serviço prestado em regime público, atribuindo
deveres de universalização aos seus prestadores.
Os deveres de universalização têm por objetivo possibilitar o acesso de qualquer pessoa
aos serviços de telecomunicações, independente de sua localização geográfica ou
condição sócio-econômica. A lei detalha fontes de financiamento dessas obrigações, a fim
de cobrir a parcela dos custos que não pode ser recuperada com a exploração eficiente do
serviço – uma vez que supõe que os serviços que podem ter seus custos recuperados não
precisam ser objeto de obrigações. Sua oferta se dará naturalmente, por serem
comercialmente viáveis.
*
Outubro 2003.
2
As obrigações das operadoras foram definidas em seus contratos de concessão e
incluem o atendimento ao Plano Geral de Metas de Universalização (PGMU – Decreto
2592, de 15.05.1998) e ao Plano Geral de Metas de Qualidade (PGMQ). Pelo PGMU, ao
final deste ano, as concessionárias terão que atender solicitações de acessos individuais,
em cidades com mais de 600 habitantes, em até duas semanas e prover acessos coletivos
(TUPs) em cidades com mais de 300 habitantes. Além disso também terão que garantir
uma densidade mínima de 7,5 telefones de uso público (TUPs) por mil habitantes. Nas
cidades com mais de 600 habitantes, as pessoas deverão ter acesso a um telefone público
a menos de 300 metros.
A exposição de motivos da Lei Geral de Telecomunicações afirma que as obrigações de
universalização, por se tratarem de uma questão de natureza eminentemente social,
podem variar com o tempo à medida que objetivos forem atingidos e que o país registre
evolução em sua economia, no desenvolvimento regional, em questões demográficas e na
distribuição da renda. De acordo com esse princípio, o PGMU definiu metas até 2005. Um
novo plano de metas entra em vigor a partir de 2006, ano da prorrogação dos atuais
contratos de concessão.
O desafio de ampliar a universalização do serviço de telecomunicações e as metas
futuras, tanto as que ainda precisam ser implantadas no marco do atual PGMU, como as
definidas no novo plano são o foco da discussão desse trabalho. O governo decidiu ampliar
ainda mais o escopo do acesso ao serviço individual e incluir acesso público à Internet nas
novas obrigações de universalização. No novo PGMU (decreto 4.769, de 27 de junho de
2003), o poder público estabelece metas a serem cumpridas pelas concessionárias a partir
de 2006. Entre outras obrigações, cria os Postos de Serviços de Telecomunicações
(PSTs), nos quais deverá haver terminais para acesso à Internet. Os PSTs deverão estar
disponíveis a pelo menos 20% da população brasileira a partir de janeiro de 2007. Essa
base deverá ser ampliada ao longo dos anos.
No nosso entender, há um grande potencial de alocação ineficaz de recursos para a
realização de novas obrigações de universalização, que adotam, em sua definição, o
mesmo método utilizado em 1998, de estabelecer obrigações macro para todo o país.
Primeiro, porque o modelo atingiu os objetivos a que se tinha proposto até 2003, como por
exemplo, em termos de atendimento da população, como mostram os números do IBGE, o
cenário é totalmente diferente do de 1998. A demanda reprimida que havia há cinco anos já
foi atendida e a planta de telefones fixos em serviço está praticamente estática desde o fim
de 2002.
A planta de telefonia fixa não cresce mais porque, uma vez atendida a demanda, o
grande e principal obstáculo para a expansão do acesso é a renda per capita do país,
pequena e mal distribuída. Outro problema é que os novos objetivos pouco levam em conta
a evolução da telefonia móvel, que exerceu um papel importante na ampliação do acesso
individual e que deverá continuar se expandindo, graças a uma utilização particularmente
brasileira: o uso dos pré-pagos com ligações automáticas a cobrar. Além disso, não há
indicação de grandes evoluções nas tecnologias disponíveis que permitam reduzir os
custos de implantação de terminais fixos a valores mais compatíveis com a renda dos
brasileiros. E, a determinação de metas macro, comuns a todo o país, é uma forma ineficaz
de alocar recursos. Seria mais apropriado, agora que a fase de expansão acelerada da
3
planta se encerrou, definir metas micro, mais focadas, avaliando criteriosamente o ganho
social que elas podem trazer à região afetada.
O desejo de ampliar o conceito de universalização continua expresso, a nível político, no
Decreto 4.733, de 10 de junho de 2003, que definiu novas diretrizes para o setor. Nesse
decreto, o poder público expressa o desejo de assegurar acesso individualizado, por parte
de todos os cidadãos, a pelo menos um serviço de comunicação. E, de “garantir o acesso a
todos os cidadãos à rede mundial de computadores (Internet)”. Também se expressa no
recente anúncio, pelo Ministério das Comunicações, que se está formulando um novo
serviço universal, além do STFC, para acesso à Internet de banda larga. Este aparece em
medidas de regulamentação da agência. O projeto de oferecer acesso local à Internet em
todos os municípios do país, contemplado no regulamento sobre o 0i00 em estudo pela
Anatel depois de uma fase de consultas públicas, é um exemplo disso. Vamos utilizar esse
trabalho para mostrar como a definição de metas macro, sem a devida análise da relação
entre custos e benefícios gerados, pode criar uma impressão equivocada do seu impacto
junto à população.
A FASE HERÓICA
Entre a privatização do Sistema Telebrás, em 1998, e a atual discussão sobre as novas
obrigações de universalização, a densidade do serviço telefônico fixo no Brasil mais do que
dobrou - de 13,6% para 28,4% (1998-2002) em linhas instaladas por 100 habitantes. A
densidade por residência é bem mais alta como visto no início pelos dados do IBGE.. Os
investimentos realizados pelas operadoras para atender a demanda e cumprir as
obrigações do PGMU 1999–2005 garantiram esse significativo crescimento no número de
acessos individuais. Somente a Telemar investiu R$ 20 bilhões na expansão de sua planta,
entre 1998 e 2002. Os investimentos do setor somaram, neste mesmo período, R$ 70
bilhões.
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FIGURA 1- LINHAS INSTALADAS – BRASIL
Telefonia Fixa
linhas instaladas (milhões)
28,2%
Telefonia Móvel
usuários (milhões)
28,4%
Taxa de penetração
Taxa de penetração
Região Telemar
Região Telemar
Brasil
Brasil
19,8%
30,0
Privatização
23,1%
20,0
18,0
17,0%
Privatização
25,0
16,0
14,0%
14,0
20,0
16,8%
12,0
47,9
13,6%
8,6%
9,3%
10,4%
11,4%
49,6
9,1%
15,0
5,1
5,6
94
14,9
4,5%
6,0
6,4
15,0
16,9
7,5
95
10,8
12,8
18,0
1,7%
1,0%
0,75
1,64,4
0,75 2,7 0,6
17,0
0,5%
0,0
96
97
98
4,0
2,7%
5,0
8,8
8,0
23,2
10,0
27,8
14,6
10,0
28,7
38,3
22,1
12,7
34,7
99
00
01
02
94
95
7,4
7,2
1,2
2,7
96
9,6
12,0
15,6
2,0
0,0
2,1
97
98
99
00
01
02
Os acessos coletivos (orelhões) também tiveram sua densidade, em terminais instalados
por 1000 habitantes, ampliada de 3,62% em 1998 para 7,83% ao final de 2002, por força
do cumprimento dessas obrigações – e mais da metade (717 mil) do 1,37 milhão de
telefones públicos em serviço no Brasil estão na área da Telemar.
O acesso da população aos serviços de telecomunicações cresceu, também, por conta
da expansão da telefonia móvel celular, que não é objeto do plano oficial de metas de
universalização. A densidade da telefonia móvel cresceu de 4,5% em 1998 para 19,8%, ao
final de 2002, em telefones celulares por 100 habitantes, graças ao serviço pré-pago. No
início do segundo semestre de 2003, o número de telefones celulares no Brasil ultrapassou
o de terminais fixos em serviço. A PNAD 2002 e uma pesquisa recente da Telemar
demonstram que a telefonia celular já é uma alternativa crescente à rede fixa.
AS CONTRADIÇÕES DO PODER PÚBLICO
Com o plano de metas, o governo conseguiu atingir o objetivo de ampliar
significativamente o acesso ao serviço fixo comutado. Ao mesmo tempo – e
contraditoriamente – tomou decisões econômicas que afastaram o país do cumprimento
desse objetivo. Três decisões críticas exemplificam bem essa incoerência:
1. Nos leilões de privatização da telefonia, a métrica utilizada para escolher o vencedor
teve como objetivo maximizar o preço de venda da concessão, ou seja, a
arrecadação do governo. A alternativa potencial a esse modelo de outorga,
recentemente anunciada como instrumento importante das novas concessões a
serem outorgadas pelo setor elétrico, seria a métrica do menor preço do serviço, ou
seja, ganharia o leilão a operadora que se comprometesse a praticar as menores
tarifas. Foram poucos os governos que usaram tal critério. O governo de Israel assim
procedeu no leilão de licenças de telefonia celular. Em pouco tempo, com um serviço
bastante barato, Israel obteve um acesso quase universal no serviço celular.
5
2. A carga tributária do setor de telecomunicações no Brasil é uma das mais altas do
mundo, em particular no que se refere ao ICMS, imposto de valor adicionado. A cada
R$ 1,00 cobrado pela concessionária ao usuário se acrescentam tipicamente R$
0,43 somente de ICMS. Isso onera o serviço e o torna inacessível a uma parte
importante da população. E é muito pouco provável que essa carga seja reduzida na
reforma tributária. A Telemar arrecadará, somente em 2003, mais de R$ 4 bilhões
para os governos estaduais.
3. Os recursos do Fundo de Universalização (FUST), desde sua criação, estão
contingenciados, para que o governo atinja suas metas de superávit primário. A
contribuição de 1% da receita operacional bruta das empresas, que vai representar
cerca de R$ 700 milhões este ano, continua a onerar o serviço sem que nenhuma
contrapartida tenha sido obtida para as pessoas de menor renda.
A prática do governo, nessas importantes questões, tem sido contrária ao desejo
expresso de universalizar o acesso às telecomunicações. O poder público optou por
satisfazer outros objetivos de curto prazo, em vez de viabilizar uma redução das tarifas e
com isso ampliar a abrangência do serviço, protegendo as pessoas de menor renda.
A REALIDADE
A realidade é que o Brasil tem hoje uma densidade de acesso a telefonia fixa individual
(em linhas fixas por 100 habitantes) superior a que se deduziria do rendimento médio da
população (em PIB per capita), baseado na correlação entre esses dois indicadores para
um conjunto extenso de países – a “curva Jipp”. Essa constatação é coerente com o alto
índice Gini de distribuição de renda e a extensão de nosso território. Desde 2002, o país se
encontra com uma densidade de telefonia fixa acima da média de países do seu grupo de
renda, como Argentina, México e Malásia, segundo a classificação da União Internacional
das Telecomunicações (UIT)i. Mas, muito abaixo da dos países de renda alta como EUA,
França, Reino Unido, Espanha e Portugal, que têm densidades superiores a 60%.
É importante notar que o acesso praticamente universal ao serviço telefônico, medido
por número de linhas fixas por residências, é um fenômeno relativamente recente mesmo
no mundo desenvolvido. Ou seja, a menos dos Estados Unidos e Canadá, estes países
somente alcançaram o patamar de 90% no início dos anos 90 e, em condições bem mais
favoráveis que as nossasii. A maior parte desses países ricos tem dimensões geográficas
pequenas ou médias, enquanto a nossa é continental. Suas diferenças regionais foram
superadas e as nossas ainda são muito grandes. A renda, aqui baixa e concentrada, nos
países ricos é alta e bem distribuída. A universalização parcial do acesso individual /
residencial que alcançamos com investimentos enormes depois da privatização, já era
significativa nesses países, antes de o setor passar às mãos da iniciativa privada. Deste
modo, como vivemos em um país relativamente pobre, é natural que encontremos enormes
empecilhos no caminho de uma universalização ampla do acesso individual.
FALTA RENDA
A barreira estrutural mais séria a ser enfrentada no Brasil, para cumprir a meta de
oferecer acesso residencial universal aos serviços de telefonia, é a da concentração de
renda. A Figura 2 , da PNAD 2002 apresenta os domicílios particulares e o valor do
6
rendimento médio mensal domiciliar por situação do domicílio, segundo as classes de
rendimento mensal domiciliar - Brasil
No Brasil, somente 4,9% dos domicílios possuem renda superior a 20 salários mínimos,
com um rendimento mensal de R$ 7,300 mil por mês. Os domicílios que possuem renda
maior que 2 e até 5 salários mínimos representam 35,8%, com um rendimento médio
mensal de R$ 671,00. Finalmente, os domicílios que possuem renda de até 2 salários
mínimos representam 32,5% do total dos domicílios, com um rendimento médio mensal de
R$ 260,00. A média de rendimento desses 68% dos domicílios brasileiros é de R$ 470 por
mês.
FIGURA 2 - DOMICÍLIOS PARTICULARES E VALOR DO RENDIMENTO MÉDIO MENSAL
DOMICILIAR, POR SITUAÇÃO DO DOMICÍLIO,
SEGUNDO AS CLASSES DE RENDIMENTO MENSAL DOMICILIAR - BRASIL
Classes de rendimento
mensal domiciliar
(1)
Domicílios
particulares
Total..............................................
.......
Até 2 salários
mínimos.......................................................
....
Mais de 2 a 5 salários
mínimos...........................................
Mais de 5 a 10 salários
mínimos.........................................
Mais de 10 a 20 salários
mínimos.......................................
Mais de 20 salários
mínimos...............................................
Total
46 037
427
%
100,0
0%
14 846
586
16 487
313
8 397
345
4 051
688
2 254
495
32,25
%
35,81
%
18,24
%
8,80
%
4,90
%
Valor do
rendimento
médio
mensal
domiciliar
(R$)
(1) (2)
Total
260
671
1 427
2 809
7 324
Na região da Telemar, por uma pesquisa de 2001, somente 3% dos domicílios que
pertencem à classe A são responsáveis por 21,8% do consumo total, com um gasto médio
de R$ 8,060 mil por mês. Os domicílios da classe D, que representam 40% do total dos
domicílios, são responsáveis por 18,7% do consumo da região, com um gasto médio
mensal de R$ 615,00. Os da classe E representam 18% e são responsáveis por 3,9% do
consumo da região, com um gasto médio mensal de R$ 273,00. Praticamente 60% dos
domicílios na região da Telemar, correspondentes às classes D e E, têm renda domiciliar
media inferior a R$ 600,00.
FIGURA 3 – CARACTERÍSTICAS DA DISTRIBUIÇÃO DE RENDA NA REGIÃO DA TELEMAR
7
Consumo
Número de domicílios urbanos
Número de domicílios
R$ milhões
Consumo mensal por
domicílio
%
%
R$
A
3%
B
13%
666.883
64.504
21,8
8.060
2.404.454
88.862
31,1
3.080
C
26%
4.823.549
75.501
25,5
1.304
D
40%
7.492.258
55.304
18,7
615
E
18%
3.492.049
11.434
3,9
273
Esmiuçando o orçamento das famílias de classe D, vemos que em média, para terem
acesso ao serviço telefônico individual em suas residências, teriam que despender da
ordem de 5% de seu orçamento familiar. No mundo, esse percentual médio é de cerca de
2% a 3% do orçamento familiariii. Para contextualizar esse dispêndio, observa-se que
despesas com educação e saúde representam somente 10,5% dos gastos desses
domicílios. E, mais da metade da renda familiar é usada em compras para a casa (comida,
bebida, limpeza e remédios). Assim, uma casa típica de classe D está no seu limite de
renda para ter acesso a um telefone fixo.
Uma outra pesquisa recente da Telemar (junho de 2003) em residências de diversos
estados em sua região de atuação, com famílias que possuem renda familiar da ordem de
R$ 400,00, indicou que 56% dos moradores de baixa renda que vivem nessa região, mas
não são seus clientes, possuem telefones celulares. Porém, fazem 88% de suas ligações a
partir de orelhões. 18% usam também telefones de vizinhos e, somente 12% usam seus
celulares para originar chamadas. Esses clientes gastavam 17% do seu orçamento em
contas de serviços básicos (luz, água, gás e telefonia), enquanto que nos clientes Telemar
esse total era de 26%.
Os investimentos na expansão da planta telefônica pós-privatização ampliaram o
acesso, principalmente nas famílias de renda mais baixa, porque as classes de maior poder
aquisitivo já estavam bem servidas. Em 1998, 89% dos domicílios de classe A, na região da
Telemar, tinham telefones fixos.
FIGURA 4 - CARACTERÍSTICAS POR DOMICÍLIO – CLASSE D / E REGIÃO TELEMAR – 06/2003
Atualmente, como faz ligações telefônicas?
Não Clientes Telemar
Clientes Telemar
Telefone fixo
96%
Telefone celular
31%
15%
Orelhão
2%
88%
3%
18%
12%
8
Casa de vizinho /
amigo / parente
Posse de telefone celular na residência
Clientes Telemar
Não Clientes
Telemar
80%
60%
40%
20%
0%
Total
RJ
BH
SAL
REC
Na classe D, apenas 10%. Em 2002, o percentual de domicílios da classe A com
telefones chegou praticamente a 100%. Na classe D, aumentou para 52%. Dos 8,2 milhões
de terminais instalados pela Telemar nesse período, 92% foram em domicílios das classes
C e D. A elasticidade em preço do acesso ao serviço telefônico para domicílios de renda
baixa, no entanto, é muito grande. Até porque, como vimos, um grande número desses
usuários da classe D já gasta, em vários serviços básicos, uma parte considerável do seu
orçamento. Todos os meses, desde o início de 2003, 250 mil clientes saem e entram na
base da Telemar, a maioria das vezes porque deixam de ter renda para pagar sua
assinatura ou porque voltam a ter receita para instalar um telefone em casa. Quase 5% dos
assinantes da operadora são como ondas na praia: vêm e voltam o tempo todo.
9
FIGURA 5 - TELEMAR – DOMICÍLIOS COM TELEFONE FIXO POR FAIXA DE RENDA (%)
2002
Domicílios (mil)
1998
7.512
92%
dos
acessos
individuais
instalados
foram nas classes C e D
Domicílios (mil)
6.809
5.008
4.540
2.648
2.400
692
627
A
B
C
D
Penetração 89
nos domicílios
(%)
80
42
10
A
Penetração
nos domicílios 100
(%)
B
C
D
96
94
52
ALGUMAS METAS ONEROSAS COM BENEFÍCIOS RESTRITOS
No entanto, nessa expansão acelerada, alguns dos desafios colocados pelo PGMU e
PGMQ (Plano Geral de Metas de Qualidade) originais para 1999 => 2003 se demonstraram
demasiadamente ambiciosos e, desse modo, muito onerosos em relação aos benefícios
obtidos.
A meta preconizada de instalação de telefones públicos fez com que o Brasil tenha hoje,
em unidades, a terceira maior rede de orelhões do mundo, somente atrás dos EUA e da
China. Em relação a densidade de terminais coletivos por 1000 habitantes, somos o
segundo país com maior densidade no mundoiv. E isso antes do cumprimento das
obrigações do PGMU de 2004 a 2005. Com essa densidade, verifica-se que praticamente
65% dos telefones públicos na região da Telemar não geram receita capaz de cobrir seus
custos operacionais e que um número significativo desses terminais (22%) gera menos de
250 créditos por mês, incluindo 5,3% que não são usados. A menos de comunidades onde
esses telefones são a única via de comunicação com o mundo externo, existe um claro
exagero.
A meta de instalação de uma nova linha em duas semanas após o pedido de um
usuário, meta que passará a ser de 1 semana a partir do fim deste ano, em qualquer parte
do território nacional, faz com que mesmo em áreas onde a demanda potencial é muito
baixa seja necessário colocar uma capacidade ociosa considerável para atender essa
obrigação. Em 1.050 localidades onde hoje o serviço individual é disponível, a demanda
efetiva é quase nula. Em comunidades entre 600 e 650 habitantes, a demanda também é
muito baixa. A meta de qualidade de no máximo 2,5% de reparos por ano que passará a
ser de 2% a partir do fim deste ano, por linha, por área de numeração também é
responsável por projetos de engenharia conservadores, e conseqüentemente caros. Ela
exige que o tempo médio de reparo de uma linha seja de 50 anos !!! Confiabilidade
10
extremamente complexa de ser obtida em equipamentos e linhas sujeitos a todas as
intempéries. Se comparado com médias de qualquer tipo de país, inclusive os ricos, (média
de 10,5% ao ano em 2001 - UIT), esse percentual é muito alto.
FIGURA 6 - ACESSO RESIDENCIAL
Telefones fixos
100
Computadores
95
81
76
46
41
9
A
B
C
DE
A
Acesso à Internet
B
C
1
DE
Acesso a Banda Larga
73
31
4
A
B
C
16
0
DE
A
4
B
0
C
0
DE
Fornecer acesso a comunidades remotas onde hoje não existe nem mesmo energia
elétrica comercial disponível pode ser um objetivo social válido. No entanto, manter o
serviço nessas localidades exige um investimento pesado, ainda mais com as metas atuais
de disponibilidade e de qualidade exigidas. A Telemar atende 800 localidades nessas
condições através de painéis solares. E, infelizmente, um grande número de roubos é
registrado. Somente no Pará onde existem 85 localidades sem energia, em julho e agosto
desse ano, 15 dessas localidades foram objeto de roubo – desde baterias à totalidade dos
painéis, a um custo de reposição superior a R$ 150 mil por painel. Além disso, mais de 860
localidades são atendidas via satélite.
Esses e outros exemplos indicam que a fase heróica de expansão do acesso telefônico
já trouxe, junto com todos os benefícios, principalmente para as classes de menor renda,
uma ineficiência de alocação de investimentos, que onera o serviço como um todo.
De qualquer modo, verifica-se (Figura 6) que a renda per capita é a principal alavanca
de acesso aos serviços telefônico e a outros serviços mais sofisticados de
telecomunicações.
11
O DESAFIO
Como então enfrentar o desafio da continua universalização do acesso aos serviços de
comunicações – em particular o de voz – além do atual patamar, conforme expresso nos
desejos do governo federal?
Na gráfico abaixo (Figura 7) estão referenciadas as duas principais dimensões do desejo
a conquistar : o da pobreza e o isolamento geográfico.
FIGURA 7 – MODELO CONCEITUAL
“Gap” de
Acesso
Pobreza
Político e
Socialmente Desejável
Comercialmente
viável
Isolamento Geográfico
Na figura seguinte (figura 8) está ilustrada, nessas dimensões e em relação ao acesso
de serviços de voz, a atual situação brasileira. De um certo modo, nas condições atuais, a
fronteira da prestação de serviços comercialmente viáveis está praticamente preenchida,
com uma potencial exceção em relação ao celular pré-pago. Ao mesmo tempo é indicado
que tanto o fornecimento de acesso individual como de acessos públicos (TUPs) já foi
universalizado além desta fronteira, para atendimentos e regiões onde a receita do
fornecimento do serviço não paga o custo. As metas de expansão universalização de
acesso do PGMU 03 => 05 expandirão ainda mais essa fronteira. Novos serviços de
telecomunicações, inclusive de acesso a Internet e a serviços de banda larga, poderiam ser
colocados nesse mesmo gráfico.Desse uma maneira praticamente óbvia, as soluções mais
adequadas devem tentar estender ao máximo a área do comercialmente viável e reduzir ao
mínimo o custo de prover acesso nas regiões onde isso não é possível.
FIGURA 8 – MODELO CONCEITUAL - SITUAÇÃO BRASILEIRA ATUAL
12
“Gap” de
Acesso
Pobreza
Político e
Socialmente Desejável
Comercialmente
viável
Acesso Celular
Pré Pago
Acesso
Público
(TUP’s)
Metas de
expansão
de acesso
(PGMU 03/06)
Residências
com Acesso
Individual
Isolamento Geográfico
Vamos analisar a pergunta inicial deste capítulo sob diversas perspectivas:
 Pela Demanda : Renda / Subsídios / Impostos
 Pela Oferta : Redução de Custos / Tecnologia
 Pela Oferta : Diversidade de Opções
 Pela Eficácia : Custo / Benefício – Soluções Focadas
 PELA DEMANDA : RENDA / SUBSÍDIOS / IMPOSTOS
Renda - A solução mais duradoura para obter maior abrangência do acesso ao serviço
telefônico adviria quase que naturalmente do crescimento econômico do país,
principalmente se associado a uma distribuição de renda mais justa e equitativa.
Infelizmente, isso só será viável no longo prazo, como resultado de uma ação firme e
consistente com esses objetivos.
Recursos Orçamentários - Outra alternativa seria utilizar recursos orçamentários do
Estado para subsidiar o serviço para usuários de renda baixa. Dadas as outras
necessidades mais prementes dessas pessoas (alimentação, saúde, educação...), é fácil
perceber que essa possibilidade é muito restrita.
Carga Tributária - Uma terceira alternativa, que teria efeito semelhante à anterior, seria
reduzir a carga tributária, em particular o ICMS, sobre serviços de telecomunicações. Como
visto, esses impostos oneram sobremaneira o serviço. Com a elasticidade de demanda
existente, sua redução traria rapidamente acesso a um número considerável de novas
residências. No entanto, dado o peso da contribuição desses tributos no total da
arrecadação dos Estados, nada nos permite acreditar que isso ocorra.
Diversas mobilizações para obter uma redução foram feitas no passado, ainda que
somente para terminais coletivos, argumentando que esses geram menos de 10% da
arrecadação e que são usados pela parcela mais pobre da população. Mesmo assim, muito
13
pouco foi conseguidov. Hoje, na realidade, os serviços de telecomunicações estão entre os
maiores contribuintes da receita dos Estados, em níveis muito superiores a essa
contribuição em países mais ricos.
FUST - A liberação dos recursos do FUST tem se demonstrado difícil, ultimamente
devido a aspectos legais. A atual tentativa de solução nos parece demasiadamente
complexa e ilógica. Criar um novo serviço universal de acesso em banda larga tendo por
origem a decisão do TCUvi de 13 de agosto, que tem objeto principal o de liberar recursos
do FUST, parece um contra-senso. Ainda mais se colocada na perspectiva da dificuldade e
da falta de recursos para prover acesso universal a um serviço bem mais simples e barato
como a telefonia. Nenhum país do mundo formalizou esse desafio em textos legaisvii,
exatamente pela necessidade substancial de recursos para alcançá-lo. Países como o
Estados Unidos e a Inglaterraviii não incluíram, em suas recentes revisões das obrigações
de universalização, o acesso a Internet através da telefonia discada a 56 kbit/s exatamente
pelo custo adicional requerido para incrementar a rede das operadoras de forma a permitir
esse acesso.
No entanto, prover acesso a Internet a escolas e hospitais gradualmente, com acesso
discado ou de banda larga, nos parece um objetivo a ser perseguido. As soluções para o
presente desafio da universalização têm que ser procuradas dentro de outras ópticas que
não a acima.
 PELA OFERTA : REDUÇÃO DE CUSTOS / TECNOLOGIA
Outra dimensão potencial para ampliar o acesso ao serviço seria através da redução do
custo das tecnologias de acesso, já que a maior parte dos investimentos necessários estão
associados a esses elementos. O gráfico abaixo (Figura 9), originado de um trabalho do
Banco Mundialix apresenta algumas das tecnologias básicas de acesso em função da
distância das centrais e da densidade de usuários. Vamos nos deter em três delas: satélite,
rádio multi-acesso e telefonia celular. As duas primeiras são mais críticas para áreas
remotas. A celular, conforme veremos a seguir, é hoje um importante componente no
atendimento a serviços de voz em áreas de maior densidade.
14
FIGURA 9 – AS DIMENSÕES DO ACESSO
Satélite
Área de baixa
densidade
Celular
e Sem-fio
Rádio
Multi-acesso
Vantagens semfio para multiacesso & satélite
Área de alta
densidade
Fio
Normal
Fio & Microondas, Cabo ou Fibra
Distância da central
Satélite - Para comunidades mais isoladas, o uso de satélite é ainda a opção mais
barata. No entanto, apesar da redução significativa de custos desta solução na ultima
década e de alguns projetos pioneiros de tentativa de universalização de acesso por esta
tecnologia, o provimento de serviços de comunicação por satélite continua a ser
substancialmente mais caro que os tradicionais em áreas de maior densidade. Somente
uma redução substancial de custo possibilitaria o seu uso, em áreas remotas de renda
baixa, sem subsídios. Isso não parece viável a curto prazo.
Rádio multi-acesso - Para comunidades remotas, mas não tão isoladas, a solução
economicamente mais adequada é a da utilização de transmissão por rádio multi-acesso, a
partir de comunidades já conectadas a estas. O componente de transmissão rádio se
demonstra o elemento principal de custo desse atendimento. No entanto, mais uma vez é
uma solução cara. Em países de dimensão continental, como o Brasil, os rádios são
elementos importantes da rede. Um potencial desafio tecnológico para o país, associado a
demanda concreta desses equipamentos para atender a interconexão de comunidades
menores, seria tentar desenvolver tecnologias de rádio de melhor custo / performance.
Mais uma vez a possibilidade, porém, de atingirmos um nível de custo que viabilize o
serviço sem subsídios parece também remota.
Aparelho celular - Em comunidades de maior densidade populacional, o acesso através
da telefonia celular tem se demonstrado cada vez mais importante. Nesse acesso, o custo
do aparelho celular é o elemento mais significativo. O investimento em infra-estrutura para
a incorporação de usuários de renda baixa é relativamente pequeno, devido ao baixo
tráfego desses aparelhos em um sistema pré-pago com tarifa elevada.
Qual seria, então, a esperança de contarmos com celulares mais baratos ? Os
fabricantes mundiais desses aparelhos vêm se concentrado no provimento de terminais
para a faixa de renda mais alta da população, hoje da ordem de 1,1 bilhão de pessoas.
15
Como se prevê ainda um aumento substancial dessa base, isso poderia indicar que o
desenvolvimento de modelos mais baratos seria um objetivo importante e atingível. No
entanto, a maioria dos lançamentos tem sido de celulares de menores dimensões, maior
funcionalidade e mais facilidades para incorporação de novos serviços, a exemplo das telas
coloridas e da capacidade de tirar fotos. Esta dinâmica lembra a dos computadores
pessoais (PCs), em que a mesma dinâmica de funcionalidade (Microsoft + Intel) limitou
muito a queda do preço unitário.
A concentração da fabricação de celulares em poucas empresas, as economias de
escala necessárias e o potencial risco de canibalização das vendas nos momentos de
substituição de aparelhos mais caros por outros de custo baixo fazem vislumbrar que não
será do interesse desses fabricantes – a menos de dinâmicas novas – a redução de modo
significativo do preço desses aparelhos. Isso marginaliza os usuários e países mais pobres.
Deste modo, infelizmente também aqui, apesar de existirem possibilidades concretas, há
pouca esperança de mudanças muito radicais no curto prazo, a menos talvez da China...
 PELA OFERTA : DIVERSIDADE DE OPÇÕES
Uma direção bem mais frutífera no desafio da universalização do serviço fixo comutado
é a de mudar o âmbito deste desafio, pois na prática isto já está sendo feito. O conceito da
universalização através da telefonia fixa comutada advém da experiência dos países ricos e
da dificuldade de prever-se, há cinco anos, a enorme taxa de crescimento da telefonia
celular, em particular dos pré-pagos, no Brasil e no mundo. A maioria dos países ricos
tinha, vinte anos atrás, uma penetração de telefonia fixa da ordem de 50% das residências,
menor que à brasileira hoje. Somente na década passada este percentual cresceu para
acima de 90%. Assim sendo, quando houve a privatização do setor nesses países, o
desafio de universalização do STFC estava praticamente superado. Nesta mesma época, a
taxa de penetração da telefonia celular era muito baixa. Desta maneira, o conceito de
universalização adotado por nós, herdado do dos países ricos, apesar da flexibilidade
demonstrada na exposição de motivos da LGT, foi o de acessos fixos (STFC) em
residências.x
O crescimento da telefonia celular, como é sabido, tem sido impressionante. Hoje não só
no Brasil, como em todo mundo, há mais telefones celulares que telefones fixos. Previsões
de crescimento de celulares, como as da UIT, indicam para os próximos anos um
crescimento substancial (de 1.154 milhões em 2002 para 1,76 bilhão em 2005), contra um
crescimento bem mais limitado na telefonia fixa (de 1,098 bilhão em 2002 para 1,15 bilhão
em 2005).
Uma serie de características da telefonia celular continuam a garantir o seu crescimento.
Uma certamente é a sua conveniência, mesmo que somente para receber ligações. O
custo de interconexão das ligações de telefones fixos para as redes celulares,
principalmente na Europa e também no Brasil, é alto. Deste modo, ligações de telefones
fixos para telefones celulares trazem aos operadores celulares uma receita considerável.
Por isso, mesmo os telefones pré-pagos, que geram pouca ou mesmo nenhuma receita de
tráfego originado, são lucrativos para as operadoras celulares. Se incluirmos o fato de que
no Brasil o usuário pode fazer ligações a cobrar de modo automático a partir do seu celular,
podemos perceber que existe um “novo” serviço – para receber ligações: celular pré-pago,
isto é sem custo para o assinante de assinatura mensal, idem para capturar recados. Para
16
originar ligações : ligações a cobrar do celular, também sem custo para o usuário, ou
utilização do telefone público.
Este serviço de custo muito baixo, a menos da aquisição de um aparelho, é muito
interessante para um usuário de renda baixa que não queira ou não possa ter o
compromisso mensal de pagar a assinatura de um telefone fixo. O acesso ao serviço é
feito, na realidade, pela compra de um bem, o telefone, comportamento semelhante ao
usado para aquisição de outros bens como geladeira e televisão de forte, penetração em
famílias de renda mais baixa. Pesquisas da Telemar e os dados da PNAD 2002, onde se
verifica que 8,8% das residências hoje só dispõem de telefone celular, corroboram com
essa percepção.xi
Essa conscientização de que a universalização pode e está sendo feita com mais
alternativas, por meio de novos serviços e não somente do STFC, permite um maior
otimismo em relação ao seu sucesso. A telefonia celular na sua modalidade pré-pago com
ligações automáticas a cobrar e alto custo de interconexão de rede – portanto
indiretamente subsidiada –, em uso simbiótico com a telefonia fixa, só tem limite no preço
do aparelho ou as áreas de cobertura da telefonia móvel.
Modelagem interessante, com objetivo de dar acesso a comunidades remotas, foi
adotada no Chilexiixiii. Neste país, o regulador, através do seu Fundo de Universalização,
criou condições para provimento de acesso através de telefones públicos (TUPs), entre
1995 e 2000, para 6 mil comunidades rurais. O elemento mais importante na modelagem
utilizada foi prover um custo de interconexão para essas comunidades semelhante ao das
redes celulares, isto é, exercitando o instrumento usado no celular de subsídio indireto –
simbiótico através da telefonia fixa. O método utilizado foi realizar, ao longo dos anos, um
conjunto grande de licitações nas quais a empresa que pedisse a menor remuneração do
fundo ganharia a concessão. O requerido das empresas era garantir a disponibilidade de
um telefone público por 10 anos nessas comunidades. O interessado também receberia,
caso desejado, o direito de explorar serviço de telefone fixo individual, Internet, freqüências.
A medida que comunidades mais remotas foram incluídas, o recurso mínimo solicitado ao
fundo cresceu substancialmente, em uma relação de 1 a 40 por TUP instalado.
Desse modo, novas concepções de universalização, não “clássicas” e não
necessariamente
através da telefonia fixa comutada, mas normalmente de modo
simbiótico com esta, estão trazendo uma expansão considerável no acesso aos serviços de
comunicações.
Para os países mais pobres, este entendimento da natureza do desafio permite uma
abordagem mais ampla e dá uma maior esperança no acesso a serviços de
telecomunicações.
 PELA EFICÁCIA : CUSTO / BENEFÍCIO – SOLUÇÕES FOCADAS
Fora das áreas onde é comercialmente viável oferecer serviços de telecomunicações, o
componente mais importante do desafio é reduzir ao mínimo o custo de prover acesso nas
regiões / populações onde isso não é possível. Isto requer estabelecer metas eficazes e
pragmáticas de universalização. Uma vez encerrada a fase heróica da expansão, onde a
demanda reprimida facilitava uma solução, é preciso formular com grande cuidado os
desafios a serem propostos. Metas que podem parecer justas e razoáveis, em sua
17
formulação, nem sempre têm o efeito desejado quando aplicadas, principalmente por conta
das dificuldades, já abordadas, que a limitação e concentração de renda e a extensão
territorial brasileira representam.
De modo a ilustrar essa questão, vamos utilizar a proposta de prover acesso local à
Internet em todos os municípios do país, na forma do projeto 0i00, colocada em consulta
pública pela Anatel, e em fase de análise final pela agência.
0i00 - A Figura 10 apresenta o número de domicílios urbanos por faixa de renda nos
municípios da região da Telemar nos quais há hoje acesso local a Internet (porque
possuem portas da rede IP da operadora) e também os domicílios onde esse acesso não é
disponível. Na Figura 6, já apresentamos a média de residências por faixa de renda que
têm acesso à Internet no Brasil.
FIGURA 10 - ACESSO LOCAL À INTERNET EM TODO O BRASIL (0I00) - O CASE NA TELEMAR
Domicílios com rede IP
Número de domicílios urbanos
%
A
3%
B
13%
Penetração
estimada de
Internet*
%
Domicílios
urbanos
mil
Domicílios sem rede IP
Domicílios
urbanos
sem IP
mil
Penetração
potencial de
Internet*
%
491
73%
97
73%
1.595
31%
516
31%
C
26%
2.771
4%
1.438
4%
D
40%
3.437
0%
3.049
0%
E
18%
1.254
0%
1.718
0%
964 mil domicílios com
acesso local à Internet
Demanda potencial de 289
mil domicílios para acesso
local à Internet
Assumindo que essa mesma distribuição seja valida para a região da Telemar, pode-se
estimar em aproximadamente 960 mil domicílios que teriam hoje esse acesso e em 289 mil
domicílios passariam a utilizar a Internet, caso houvesse acesso local. A maioria desses
domicílios seria das classes A e B. Os 4,76 milhões de domicílios das classes D e E que
seriam agregados à área de cobertura com acesso local continuariam sem acesso, da
mesma forma que os 4,7 milhões que hoje poderiam acessar localmente a rede IP e não o
fazem. Por falta de renda.
O investimento necessário para ampliar a rede IP na região da Telemar para todos os
municípios, estimado em mais de R$ 1 bilhão, demandaria um aumento da ordem de 15%
no valor das assinaturas básicas, a ser pago por todos os clientes, sem distinção de classe.
18
Esse aumento beneficiaria, na realidade, apenas 2% dos usuários residenciais – os 289 mil
domicílios que passariam a ter acesso local à Internet. O desafio de ampliar a
disponibilidade de acesso local, portanto, é aparentemente bom, mas se efetivado traria um
efeito social na realidade negativo. Esses investimentos beneficiariam apenas os usuários
de classes A e B, em detrimento de um custo incremental do serviço, que afetaria
principalmente as pessoas de renda mais baixa, muitas das quais estariam incapacitadas
de continuar a dispor de seu telefone fixo. Por isso, a obrigação de acesso local à Internet
em todo o país, nas condições atuais, seria altamente injusta.
PGMU (2003 => 2005). Outro exemplo que merece revisão é o das obrigações
adicionais do atual PGMU (2003 => 2005). Por este plano de metas de universalização, ao
final de 2005 as concessionárias terão que atender solicitações de acessos individuais, em
cidades com mais de 300 habitantes, em até uma semana e prover acessos coletivos
(TUPs), em cidades com mais de 100 habitantes. Nas cidades com mais de 300 habitantes,
as pessoas deverão ter acesso a um telefone público a menos de 300 metros. Na região da
Telemar estima-se em 7.600 as localidades entre 100 e 300 habitantes das quais 3.400 já
são atendidas por acesso coletivo. Do mesmo medo estima-se em 4.700 o numero de
localidades entre 300 e 600 habitantes das quais 450 já atendidas por acesso individual.
Restam pois a atender da ordem de 8.500 localidades.
O ganho social de estender o acesso a telefones públicos para as comunidades entre
cem e 300 habitantes, apesar do alto investimento não rentável, tem por mérito permitir
interligação de comunidades hoje mudas, com todos os ganhos sociais e econômicos daí
advindos. Isto é, provavelmente, o custo – benefício é adequado, apesar do subsídio
necessário. Mas o benefício social resultante da meta de estender o acesso a telefones
individuais, em comunidades entre 300 e 600 habitantes, será muito baixo, principalmente
porque muito poucas pessoas terão renda para contratar esse serviço. A experiência do
Chile colabora com essa percepçãoxiv. No Chile, a obrigação para pequenas áreas rurais foi
de prover um acesso coletivo (TUP) e não foi colocada nenhuma obrigação de atender
acessos individuais, a menos que as operadoras desejassem fornecer este serviço. A
relação deste provimento foi de 1,13% acessos individuais por 100 habitantes. 6.000
comunidades, compreendendo 2,2 milhões de habitantes e 25 mil linhas individuais.
Para atender essa meta, será preciso implantar rotas de transmissão de rádio ou satélite
capazes de permitir uma demanda de tráfego individual, todas soluções de alto custo,
simplesmente pelo potencial de existirem usuários demandando acesso individual. O
investimento para cumprir essa meta, comparado ao provável pequeno número de pessoas
beneficiadas, sugere que certamente será possível utilizar esse mesmo investimento em
outros serviços, como por exemplo acesso à Internet a escolas, com benefício social muito
superior.
O foco das novas metas de universalização do setor deve, portanto, se voltar a soluções
pragmáticas, geralmente de menor escala, focadas em iniciativas que maximizem os
benefícios reais para as classes mais necessitadas. Para isso, alguns cuidados devem ser
tomados:
1) As metas devem ter, a priori, um claro entendimento do custo-benefício econômico /
social, ou seja, seu custo estimado tem que ser compatível com os benefícios
gerados. No modelo atual do setor, as concessionárias têm a obrigação de realizar o
19
investimento para cumprir as obrigações impostas pelo poder concedente. No
entanto, também têm o direito de – caso não haja um retorno econômico no
fornecimento do serviço, como nas obrigações de universalização – obter uma
remuneração adequada por esse investimento adicional, quer através de recursos
adicionais do governo, quer através de repasse às tarifas, gerando ônus para todos
os assinantes. Esse ônus tem que ser compatível com o benefício social obtido.
2) Deve haver eficácia na formulação para melhor gestão dos recursos, ou seja, é
necessário fazer o máximo com o menor investimento possível. Objetivos macro são
mais fáceis de serem formulados, mas não necessariamente os mais eficazes.
Considerações sobre o perfil temporal da demanda a fornecedores e de uma política
industrial devem também fazer parte da formulação.
CONCLUSÃO
A primeira fase da universalização do acesso no Brasil, que chamamos de fase heróica,
por conta dos investimentos realizados e dos resultados alcançados, se encerrou. Não é
mais possível desenvolver políticas para ampliar o acesso da população aos serviços de
telecomunicações – sejam telefones fixos ou Internet – com grandes objetivos, definidos
sem levar em conta a heterogeneidade das regiões atendidas pelas operadoras e o real
efeito dos investimentos a serem realizados.
Graças à política de universalização, a densidade de telefones fixos no Brasil é superior
a que seria permitida por sua estrutura de renda e pelas desigualdades regionais. Essa
expansão, no entanto, encontra um limite quase intransponível na baixa renda da maioria
da população brasileira. O crescimento sustentado do país e medidas para reduzir a
concentração de renda poderiam incluir milhões de pessoas na base de usuários de
serviços de telecomunicações, mas não são soluções simples nem prováveis no curto e
médio prazo.
Para continuar a ampliar rapidamente o acesso, seriam necessários substanciais
investimentos do Estado ou uma redução expressiva da carga tributária sobre o setor.
Como essas alternativas também são remotas, resta abandonar a fase heróica de
expansão e começar uma nova fase, com a busca de soluções focadas e uma gestão
regulatório micro.
As novas obrigações, ao contrário de algumas recentemente formuladas, devem
priorizar acessos de uso coletivo e levar em conta uma visão mais realista do custo
financeiro envolvido e dos benefícios sociais efetivos. Se essa equação não for montada de
modo adequado, o país, que não tem recursos sobrando, corre o risco de investir mais do
que o necessário em soluções não eficazes.
20
21
i
NOTAS e REFERÊNCIAS
ITU – World Telecommunications Development Report – 2002 – Reinventing Telecoms – Março
2002
ii
ITU – World Telecommunications Development Report – 1998 - Universal Access – Março
1998
iii
Telecommunicatios and Information Services for the Poor – Towards a Strategy for Universal
Access – World Bank - Juan Navas- Sabatter et all – April 2002 – pg 10
iv
Idem ref 1
v
Nos Estados da Bahia, Pernambuco e Sergipe o ICMS para cartões é de 25% e para outros
serviços de telecomunicações de 27%.
vi
Em uma decisão de 13.08.03, contrária ao parecer do Ministério Público, o TCU entendeu
que os recursos do FUST devem ser regulados pela Lei Geral de Telecomunicações e não
pela Lei de Licitações. Nesta decisão, o ministro afirmou que para atender os objetivos do
FUST e utilizar os seus recursos do FUST. seria necessário criar um novo serviço universal de
telecomunicações - acesso por banda larga e que para tal o presidente Luiz Inácio Lula da
Silva deverá publicar um decreto formalizando esse serviço e posteriormente um novo Plano
Geral de Outorgas e de um Plano Geral de Metas de Universalização para esse novo serviço.
vii
A Islândia foi o único páis do mundo a colocar como obrigação a disponibilização universal de
linhas ISDN (128 kbbit/s) em agosto de 2000 e estar considerando agora estender essa
obrigação a 2 Mbit/s) . Birth of Broadband – ITU - Internet Reports – Setembro 2003.
viii
OFTEL – Review of Universal Telecommunication Services – September 2000
ix
Telecommunicatios and Information Services for the Poor – Towards a Strategy for Universal
Access – World Bank - Juan Navas- Sabatter et all – April 2002 – pg 17
x
Exposição de Motivos da LGT - “A idéia da universalização do acesso contempla duas
situações genéricas:
Serviços de telecomunicações individuais, com níveis de qualidade aceitáveis, devem ser
fornecidos, a tarifas comercialmente razoáveis, dentro de um prazo razoável, a qualquer
pessoa ou organização que os requisitar
Outras formas de acesso a serviços de telecomunicações...àquelas pessoas que não tiverem
condições econômicas de pagar tarifas comerciais razoáveis por serviços individuais
Na primeira dessas situações, as tarifas cobrem os custos operacionais e proporcionam retorno
comercialmente atrativo ao capital investido, de modo que os provedores de serviço buscarão,
normalmente, satisfazer a esses clientes como parte de sua estratégia de negócios.
Já a segunda situação diz respeito àqueles casos em que o custo de prover o acesso físico seja
elevado...ou em que os clientes potenciais disponham de renda inferior à que seria necessária
para criar uma oportunidade de investimento atrativa para algum provedor se serviço. Nesse
caso, o acesso a serviços de telecomunicações poderá requerer algum tipo de subsídio...”
xi
Pela PNAD 2002 a porcentagem de residências somente com telefone móvel do total de
residências com telefone no Brasil é de 14,2%. Em regiões mais pobres de nosso pais como a
norte e nordeste esse percentual é respectivamente bem mais alto 22,3% e 18,7% enquanto
que em regiões mais ricas como a sudeste é de 10,7%. Esses dados mais uma vez sugerem
da importância do celular como instrumento de universalização. Em agosto de 2003 pré pagos
compunham 74% da base total de celulares no pais.
xii
Closing the Gap in Access to Rural Communication : Chile 1995 – 2002 – World Bank – Bjorn
Wellenius – Nov 2001
xiii
Model Universal Services / Access – Policies, regulations and Procedures – Part II: Minimum
subsidy competitive auction mechanisms for fundinf public telecommunicatios Access in rural
áreas and tariff / interconnection regulation for the promotion of universal services / Access.
UIT / CTU - Edgardo Sepulveda – Novembro 2002
xiv
No Chile, onde a obrigação as empresas de telecomunicação era para pequenas áreas rurais
somente a de fo colocar um TUP, ficando para estas caso desejado fornecer o serviço
individual , a demanda econômica foi de 1,13% - 6.000 comunidades, compreendendo 2,2
milhões de habitantes e 25 mil linhas individuais instaladas. Fonte : Bjorn Wellenius acima.
Download

Universalização do Acesso aos Serviços de Telecomunicações : O