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ARTICULAÇÃO ENTRE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO A
PARTIR DE UM RELATO DE EXPERIÊNCIA
Aline Reis - Licenciada em Pedagogia pelo Centro Universitário Estácio Uniseb.
Elizabete David Novaes - Doutora em Sociologia pela Unesp, docente do Centro Universitário
Estácio Uniseb.
Resumo
O presente trabalho apresenta, por meio de um relato de experiência, como o letramento pode
auxiliar na alfabetização, mesmo daqueles alunos que apresentam dificuldade de aprendizado.
Junto com o conceito de alfabetização, coloca-se o letramento como conceitos indissociáveis e
interdependentes, dado que alfabetizar só faz sentido quando ensinado por meio de práticas
sociais, ou seja com atividades de letramento, o que permite que o indivíduo desenvolva
plenamente suas capacidades de leitura e escrita na sociedade. Foi realizada uma experiência
empírica de letramento, por meio da qual foi acompanhada uma criança do 4º ano do ensino
fundamental, que apresentava dificuldade de aprendizado, durante quatro meses. O
acompanhamento foi realizado nos finais de semana, dedicando-se uma hora no sábado e uma
hora no domingo. Constatou-se que, mesmo tendo dificuldade de aprendizado durante sua vida
escolar, em pouco tempo, a criança mostrou grande avanço no aprendizado, evidenciando que
o letramento trouxe significado para o seu aprendizado.
Palavras-chave: Letramento, alfabetização, indissociabilidade de alfabetização e letramento.
1. Introdução
No Brasil, durante toda a sua história, nota-se um enorme esforço pela erradicação do
analfabetismo, que, embora tenha diminuído bastante, ainda se encontra como um problema
longe de ser solucionado.
Ferraro (2011) destaca as constantes mudanças em Censos realizados no Brasil quanto
à alfabetização, pois até o ano de 1950, era considerado alfabetizado o integrante da família que
simplesmente conseguisse assinar o próprio nome. A partir daí, por uma recomendação da
UNESCO, passou-se a considerar alfabetizado o sujeito que escrevesse sem problema um
bilhete simples. Contudo, enfatiza o autor que não é possível verificar a veracidade das
informações levantadas, pois sendo o analfabetismo tão estigmatizado no Brasil, sempre foi
natural que as pessoas tentassem esconder os fatos ao responder a pesquisa. Contudo, apesar
disto, nota-se em dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e estatística) que em 2010,
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o Brasil ainda apresentava 9% da população com mais de dez anos de idade, na condição de
analfabetos, perfazendo um total de 18 milhões de brasileiros.
Diante desta situação buscou-se apresentar neste trabalho um resgate histórico da
alfabetização no mundo, mas principalmente no Brasil, procurando destacar as inúmeras
tentativas de resolução do problema, evidenciando como, durante toda a história do país, um
método vem sempre em detrimento de outro, buscando novas formas de alfabetizar, muitas
vezes causando uma divisão entre professores defensores de métodos anteriores e atuais.
Complementarmente, procurou-se mostrar o letramento como um novo conceito viável
para a alfabetização, pois prioriza as práticas sociais de leitura e escrita, como forma de
aprendizagem significativa. Contudo, não foi descartado nenhum método nem defendida
alguma metodologia específica, pois se buscou evidenciar que todos os métodos são valiosos
para a aquisição da alfabetização, desde que concebidos de forma significativa para o aluno,
que deve reconhecer na escola práticas cotidianas de leitura e escrita.
A fim de mostrar na prática estas concepções pesquisadas, realizou-se uma experiência
empírica com uma criança, escolhida de forma conveniente, que apresentava dificuldade de
aprendizado. Buscou-se utilizar diversas formas de práticas sociais de leitura e escrita, mas não
deixando de lado exercícios que dessem conta especialmente das principais dificuldades da
criança.
Ao final ficou perceptível que, embora o tempo de estudo tenha sido pequeno, houve
um significativo avanço da criança, evidenciando o letramento como alternativa viável para
alfabetização, porém ficou clara também a necessidade da continuidade do trabalho, que
principalmente por ter sido feito de forma particular com a criança, colaborou imensamente
para seu avanço nas questões referentes à alfabetização.
2. Alfabetização e Letramento
Segundo Soares (2004), Letramento é uma palavra com conceito bastante recente, que
surge pela necessidade de enquadrar comportamentos e práticas sociais da leitura e da escrita,
levando-se em conta não apenas do domínio do sistema ortográfico alfabético, mas também
outros elementos que envolvem leitura e escrita. Assim, à medida que a vida social e
profissional foi se tornando cada vez mais dependente da língua escrita, ficou claro que apenas
alfabetizar no sentido tradicional não é suficiente. Passou-se então por diversos termos como
“alfabetização funcional” ou a ideia de que “alfabetizar não é apenas ensinar a ler e a escrever”,
até que surgiu o termo letramento como forma de elucidar o uso da leitura e escrita em práticas
sociais.
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Como elucida Frade (2003), os professores encontram dificuldades para concretizar a
utilização dos diversos métodos, e isso pouco aparece em pesquisas. Há um questionamento se
os professores egressos dos cursos de formação saem prontos para alfabetizar. Ressalta a autora
que no decorrer da história, antes de existirem os livros didáticos, os professores utilizavam-se
de métodos não prescritos, ao começar a existir um livro para alfabetizar inicia-se a
preocupação com o método. Daí a tendência dos professores escolherem livros “menos
recomendáveis”, por talvez ali encontrarem métodos que eles já estão familiarizados.
Por antagonismo, Ângela Kleiman (2005) aponta aquilo que não é letramento, para
tentar explicar finalmente do que se trata. O letramento não é um método, embora em seu início
tenha sido interpretado erroneamente como tal, assim como tudo o que aparece de novo no
âmbito da alfabetização. A autora deixa claro que não se trata disso, que o letramento é uma
forma de imersão da criança e do jovem no mundo letrado, deixando claro que em todos os
lugares em que vivemos em sociedade há grande uso de leitura e escrita, seja em placas,
panfletos, muros etc. Desta forma, o professor deve levar o aluno a entrar em contato com essas
práticas levando em conta o que ele já sabe sobre isso, o que traz de bagagem, pois sabemos
que alguns trazem mais, outros menos. Não é alfabetização, pois esta se trata de uma prática,
que inclui saberes e agentes, por exemplo, o professor que conhece os códigos de leitura e
escrita e seus diversos usos, ensina seus alunos. Não é uma habilidade, pois não é possível, ao
contrário do que muitos pensam, ensinar o letramento, o que seria praticamente impossível,
pois trata-se de colocar o aluno em contato com o mundo letrado.
2.1. A Indissociabilidade entre Alfabetização e Letramento
Magda Soares (2004) explica que embora os termos alfabetização e letramento sejam
constantemente confundidos, os dois têm algumas particularidades, sendo o termo
“alfabetização” entendido como aquisição do sistema de convencional de escrita e o termo
“letramento” percebido como o desenvolvimento das habilidades de uso competente de leitura
e escrita nas práticas sociais. Trata-se, contudo, de conceitos indissociáveis e interdependentes,
dado que alfabetizar só faz sentido quando ensinado por meio de práticas sociais, ou seja com
atividades de letramento.
Nos anos 80, sobretudo pela obra de Emilia Ferreiro (SOARES, 2004), houve uma
mudança na forma de encarar a alfabetização, pois através do conceito do construtivismo,
Emilia Ferreiro mostrou que a criança deve, desde o início, ter contato com as práticas reais de
leitura e escrita.
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Entretanto, como o construtivismo não evidenciou claramente um método de ensino
enquanto deu clara ênfase à importância da criança ter contato com a leitura desde cedo, ocorreu
por consequência que muitos professores foram erroneamente levados a crer que apenas isso
seria suficiente para o aprendizado, que as crianças apenas por esse contato aprenderiam de
forma espontânea. Este fato tem gerado várias críticas ao construtivismo, além de diversas
manifestações para a volta do método fônico para a alfabetização.
Como mostra Frade (2003) os professores mais experientes parecem buscar em antigos
métodos um respaldo para ensinar as crianças a se apropriarem do sistema de leitura e escrita,
porém para os alfabetizadores com menos experiências faltam respaldo para isso tanto em sua
memória quanto nos livros didáticos. Historicamente, parece que pelos processos de um método
sempre precisar romper com outro, há uma crença de que existirá um método milagroso que
acabará com o problema da alfabetização.
A este respeito, Soares (2004) afirma que o momento não é de voltar ao passado com
um método já superado, e também não se pode ignorar as críticas construtivas que o novo pode
ter, mas deve-se “procurar caminhos e evitar descaminhos” nesta trajetória.
Para dar conta dessa questão, a temática da aprendizagem da leitura e escrita tem sido
estudada por diversas ciências nas últimas décadas, com cada qual privilegiando uma
particularidade dessa aprendizagem e com cada qual defendendo um método diferente.
No entanto, é importante considerar que privilegiar algumas facetas e subestimar outras
é um equívoco, e o procedimento ideal seria a articulação de conhecimentos e métodos
fundamentados em diferentes ciências.
Frade (2003) defende que discutir sobre métodos não deve ser considerado um
retrocesso e sim uma forma de tentativa de compreensão do como fazer. Questiona que talvez
a resistência de alguns professores em abandonar determinados métodos pode não ser apenas
teimosia, mas uma vivência suficiente para saber que aquele funciona.
Assim, como alternativa viável, Soares (2004) defende que criança aprenda o sistema
tradicional de leitura e escrita, através do letramento, com materiais reais de utilização, porém,
que seja inserida também nesse meio através da aprendizagem do sistema ortográfico. Trata-se
assim de um processo que pode ser entendido como “alfabetizar letrando” ou “letrar
alfabetizando”, de modo a utilizar as diversas facetas da aprendizagem sem que se esteja
escolhendo esta ou outra faceta da aprendizagem.
Fontes (2012) da mesma maneira, também defende que a criança deve ser considerada
um sujeito pensante na alfabetização, podendo opinar, participar e questionar. Para a autora,
alfabetização e letramento deve ocorrer simultaneamente, visto que o aluno deve aprender os
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códigos alfabéticos, desenvolver a capacidade de ler e escrever, mas, além disso, tornar-se
capaz de utilizar a língua escrita em diversos contextos sociais.
3. Relato de Experiência
Para a realização do presente artigo, foi feita uma experiência empírica com uma
criança, utilizando-se a metodologia de estudo de caso, numa abordagem qualitativa (ANDRE,
2005). Nesta pesquisa, o uso do estudo de caso se justificou pelo fato desta metodologia permitir
a análise aprofundada de uma unidade específica/individual, por meio de um intensivo
acompanhamento que permitiu captar linguagens e significados fornecidos pelo sujeito
investigado.
Para tanto, a criança foi escolhida por conveniência, pois além de já se conhecer sua
família, sabia-se que a criança tem apresentado, durante sua vida escolar, dificuldades de
aprendizagem dos conteúdos escolares. Em contato com os pais, lhes foi feita uma proposta de
acompanhamento à criança, como se fossem aulas de reforço1.
A criança em estudo tem 10 anos, está atualmente cursando o 4º ano do Ensino
Fundamental I, em uma escola municipal que atende crianças até o 5º ano.
A criança ficou retida no 3º ano no ano de 2013, pois de acordo com a professora não
tinha condições ainda para avançar a série. A esse respeito, de acordo com a mãe, as professoras
anteriores relatavam que apesar dos inúmeros esforços, a criança não consegue acompanhar os
demais. Em 2011, foi encaminhado a uma psicopedagoga, sendo que após esse
acompanhamento apresentou uma pequena melhora. Contudo, a criança perdeu a vaga, que era
fornecida pelo governo, por ter faltado 3 vezes seguidas sem justificativas, sendo que a mãe diz
ter perdido a vaga por falta de tempo de levá-la. A mãe também informa que o filho tem
demonstrado resistência em ir para a escola. Segundo a mãe: “Todos os dias é uma briga, ele
não quer ir à escola, tenho que forçar”.
A criança diz não querer ir à escola por não conseguir acompanhar: “A professora passa
lição com letra de mão e eu não consigo copiar, tenho que pegar caderno emprestado e depois
não entendo”. Além do mais, isto tem gerado na criança um sentimento de frustração, e
dificuldade em várias outras disciplinas, inclusive em matemática, que de acordo com a mãe,
antes era sua disciplina favorita, porém com o passar do tempo, com a exigência de
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Foram explicados aos pais quais eram os objetivos da experiência empírica e do trabalho proposto. Feitas as
devidas elucidações, a mãe assinou o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, tendo ainda a informação de
que nem a criança nem os pais teriam suas identidades divulgadas. Deste modo, em nenhum momento do trabalho
foi feita a identificação da criança, não mencionando seu nome nem dados pessoais.
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compreensão de enunciados cada vez mais complexo, a dificuldade vem sendo cada vez mais
evidente.
Apesar dos relatos, a criança apresenta uma hipótese de escrita, ora silábica – alfabética,
ora com características alfabéticas, nas sílabas mais simples já demonstra um domínio na escrita
(como em BOLA, CASA, BONECA). Apresenta maior dificuldade com sílabas mais
complexas, e com palavras monossílabas (quando uma sílaba tem mais de duas letras, a criança
parece não entender como funciona, porém quando levada a pensar, consegue problematizar a
falta de alguma letra, mesmo não sabendo direito qual é). Ainda não consegue fazer leitura de
frases completas, apenas de palavras isoladas.
O acompanhamento foi realizado aos finais de semana, sendo dedicada uma hora no
sábado e uma hora no domingo. A seguir são apresentadas as atividades realizadas no decorrer
do acompanhamento.
1º dia de atividade:
Atividade: Ditado de algumas palavras, para diagnóstico. Esse dia foi apenas combinada
a forma de trabalho, e o ditado feito apenas para verificar o nível de escrita da criança.
Figura 1- Ditado de palavras
Observou-se que nessas palavras a criança apresenta a hipótese silábico-alfabética, pois
ainda está em transição entre uma hipótese e outra.
2.º dia de atividade:
Atividade: Escrita de nomes familiares. Foi solicitado que a criança escrevesse com o
alfabeto móvel uma lista de nomes de seus familiares.
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Figura 2 – Nomes dos Familiares
LUCIA
MARCOS
ADRIANO
MARIA
ALINE
GERALDO
JUNIOR
Nos nomes mais simples como: Aline, Lucia e Maria, a criança não apresentou
dificuldades, escreveu corretamente, embora para separar as sílabas ainda tivesse dificuldade
com o fato de algumas sílabas terem apenas uma letra.
Para os nomes com sílabas complexas a escrita foi a seguinte: Para Marco = MA – CO;
Geraldo = GE – RA – DO. Observam-se outras a seguir, com o nome Junior e Adrianao.
Figura 3- Sílabas complexas
Após ter deixado a criança escrever os nomes e separar as sílabas conforme achava
correto, foi feita uma intervenção. No nome Marco solicitou-se que a criança fizesse a leitura
das sílabas separadas, sendo que ela lia “MAR” onde estava escrito apenas “MA”. Tirou-se
então a sílaba “CO” de perto e pediu-se que lesse novamente apenas aquela sílaba. Assim a
criança entendeu que na verdade ali não estava escrito “MAR”. Então lhe foi explicado: “esta
sílaba tem na verdade 3 letras, está faltando o R”; a criança então perguntou: “Mar é igual que
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a gente nada?” Quando foi-lhe dito que sim ele comemorou. O mesmo foi feito com o nome
GERALDO, e a criança demonstrou ter entendido.
Com o nome JUNIOR, a criança escreveu “JUNIO”. Ao ser questionada sobre a falta
de uma letra na última sílaba a criança repetiu a sílaba e falou: “Falta o R”. Assentindo-lhe
afirmativamente, ele inseriu o R antes do O conforme a figura, formando a palavra JUNIRO.
Foi pedido que lesse as sílabas separadamente, fazendo com que notasse que dessa forma o
nome não faria sentido, então foi mostrado o nome correto e solicitado que a criança registrasse
corretamente no caderno.
3º dia de atividade:
No terceiro encontro, a criança estava aguardando com um caderno na mão tentando
reescrever os nomes do outro dia, ainda tinha errado alguns, mas mostrou um avanço no nome
ADRIANO.
Figura 4- Exercício
No nome ADRIANO, mostrou ter entendido as sílabas, porém, colocou o P no lugar do
D. Em MARCOS e JUNIOR é possível notar também um avanço, pois já inseriu o R e o S,
embora ainda não tenha escrito a palavra completa. Em MARIA trocou o R pelo M. Bastante
significativo, contudo, é o fato de que quando foi pedido que a criança lesse as palavras, em
todas elas, logo ela notou o erro e as corrigiu.
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Para prosseguir com a atividade, foi solicitado que a criança colocasse os nomes em
ordem alfabética e separasse as sílabas. Nessa atividade não houve dificuldade, somente no
nome GERALDO que ela separou incorretamente como GE-RA-LDO, mas ao pedir que lesse,
a criança já disse: “O L está no lugar errado” e corrigiu o erro.
Foi pedido que a criança formasse palavras a partir das sílabas dos nomes. Ela
apresentou dificuldades na atividade, juntou algumas letras que não faziam sentido, e quando
formou a palavra LUA, pediu para usar outras letras para tentar formar palavras novas, mas a
criança confunde a leitura dessas palavras.
Figura 5- Formação de palavras
4º dia de atividade
Foi feita a leitura do livro “E o dente ainda doía” de Ana Terra. Ao fazer a leitura foi
proposto à criança que olhasse o texto para que acompanhasse a leitura palavra por palavra.
Em seguida foi solicitado à criança que procurasse no texto palavras com as escritas
como em DENTE e circulasse. Foram encontradas as seguintes palavras:
Figura 6- palavras encontradas
COM, AGUENTAR, DOENTE, SEGUNDO, AINDA, ENTRARAM, CINCO, TENTAR,
FRENTE, REPENTE, NINGUÉM, FUNCIONOU.
Foi realizada a leitura das palavras junto com a criança e mostrado a família de sílabas:
A N, E N, IN, ON, U N.
Com auxílio do alfabeto móvel, foi solicitado que a criança escrevesse algumas palavras
com essas mesmas sílabas, como mostram os exemplos a seguir.
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Figura 7- Usando o Alfabeto Móvel
Ao terminar este dia de atividade notou-se que a criança ainda apresentava dificuldades
para a leitura e escrita dessa classe de palavras, e foi então combinado com a criança que ainda
nos próximos dois encontros seriam feitas atividades de fixação.
5º dia de Atividades
Foi realizada a leitura de uma lista de palavras com a mesma forma de escrita, solicitado
que a criança dividisse as palavras pela a escrita uma lista com A N, outra com E N etc, depois
se solicitou que a criança formasse frases com uma palavra de cada lista. A criança formou as
frases e fez a leitura corretamente, como mostram as frases a seguir.
Figura 8- Formação de frases
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As frases foram redigidas pela criança, porém na palavra “PADRINHO” houve um
auxílio devido às dificuldades apresentadas. A criança escreveu PADIO; foi mostrada a palavra
correta à criança, visto que a mesma apresenta duas sílabas complexas: “DRI”, “NHO”. Após
a escrita a criança leu as frases corretamente, parando novamente na palavra PADRINHO.
Após essa atividade, foi dada a criança um caça-palavras, ela leu e encontrou as dez
palavras propostas (bengala, fazenda, injeção, nunca, gancho, redondo, ponto, cinco, tinta,
imundo).
6º dia de Atividades
Foram dados à criança, vinte envelopes contendo uma palavra dividida em sílabas cada
um, para que ela montasse a palavra e as registrasse no caderno em seguida.
Figura 9- Montagem de palavras
Algumas palavras a criança montava corretamente, em outras era feita a montagem
incorreta, porém ao solicitar-se a leitura, a criança logo notava e tentava até montar
corretamente, por exemplo em “PERGUNTA” ela escreveu: “GUN-TA-PER” ao ler ela logo
exclamou: “Está errado”, em seguida montou: “PER-TA-GUN” e disse “Não é assim”, quando
montou corretamente ela exclamou “Ah pergunta!”. As palavras são vistas na imagem a seguir.
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Figura 10 – Palavras escritas
Após a leitura das palavras foi solicitado à criança que criasse frases com pelo menos
três delas. As frases foram respectivamente: “NUNCA FAÇA ISSO”; “EU ERREI UMA
PERGUNTA DA PROVA” e “EU ESTAVA ANDANDO E VI UM PONTO DE ÔNIBUS”.
Figura 11- Formando frases
Para finalizar realizou-se um ditado em que a criança errou apenas duas palavras que
foram corrigidas pela mesma através do alfabeto móvel. Foram entregues à criança apenas as
letras que compunham a palavra, em pente a mesma questionou: “Não tem a A?” quando se
respondeu que não, a criança disse: “Então é com E?” ao ser informado que sim a criança
escreveu corretamente. Em mundo a criança disse: “Acho que esqueci o N”, foi então que foi
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dito a criança: “Você trocou o M de lugar também”, ao receber as letras a criança exclamou:
“Ah escrevi Undo” e sorriu, em seguida escreveu a palavra corretamente e registrou-as no
caderno.
Figura 12 - Ditado
7º dia de Atividades
A partir do nome ADRIANO, o qual a criança mostrou dificuldade ao entender a questão
das 3 letras em uma única sílaba, foram dadas à ela várias figuras e nomes recortados de forma
aleatória. Solicitou-se à criança que fizesse a correspondência entre os nomes e as figuras. Para
que isso fosse possível era necessário que a criança conhecesse todas as figuras, ao questionála sobre os nomes, a mesma apenas não reconheceu a figura do hidrante disse: “não lembro
como chama”, foi então questionado se já havia visto “Sim é aquele negócio que o bombeiro
usa para apagar o fogo”. Após dizer o nome solicitou-se que a criança locasse as figuras com
os nomes embaixo, e após isso ela os colocaria em seu caderno.
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Figura 13 – Palavras com figuras
Após a atividade mostrou-se à criança, a partir de uma revista, que em língua portuguesa
existem sílabas formadas com uma, duas três ou mais letras. A criança respondeu que já sabia,
porém, que não consegue escrever com mais de duas letras “Eu não sei escrever com três
letras”. Foi-lhe dito então que seria melhor trabalhado esse tipo de sílaba.
8º dia de Atividades
Ainda a exemplo de sílabas complexas, realizou-se uma leitura junto com a criança de
uma receita de brigadeiro, chamando sempre sua atenção para os dígrafos “Br”. Antes de
começar a atividade, questionou-se a criança sobre que tipo de texto era aquele, e ela respondeu
“É pra aprender a fazer brigadeiro”. Questionou-se então que nome era dado a este tipo de
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texto, e ela disse “receita, usa para saber cozinhar”. Mostrou-se então a estrutura do texto e
iniciou-se a leitura.
Figura 14 – Leitura de texto
Durante a leitura a criança já não demonstrou dificuldade para ler palavras trabalhadas
anteriormente como “enrolar” “unte” “manteiga”, porém, ainda não conseguia ler frases
completas, o que dificultou o entendimento geral do texto. Após a leitura solicitou-se que a
criança enumerasse o passo a passo da receita de acordo com o que foi lido, o que fez sem
maiores problemas.
9º dia de Atividades
Mostrou-se à criança uma lista de palavras escritas com o dígrafo “Br” trabalhado
anteriormente. Ao iniciar a leitura não lembrava como era feita. Lia “Setembo”, depois
“Setembor”. Após ler para a mesma, ela passou a ler corretamente as demais.
Após isso se solicitou à criança que tentasse lembrar de palavras que tivessem outros
dígrafos como: Br, Cr, Dr etc, escolhesse 5 delas e formasse frases. Para formar as frases a
criança não conseguia escrever muitas palavras e pediu auxílio, foi dado e informado que em
uma próxima vez ela deveria escrever sozinha.
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Figura 15- Formando Frases com escolha de palavras
10º dia de Atividades
Solicitou-se à criança que escrevesse novamente uma lista de nomes com o alfabeto
móvel e depois registrasse no caderno. Desta vez conseguiu realizar quase todos, por esta razão
questionou-se à criança quais outros nomes ela gostaria de escrever, e assim formou-se uma
lista maior com o nome de vários de seus familiares.
Figura 16- Nomes de pessoas
Foram montados alguns nomes com pequenos erros, como se observa.
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Figura 17 – Nomes com Alfabeto Móvel
Em MARCOS, faltou o S, porém na família da criança as pessoas pronunciam MARCO,
e por isso o erro é normal. Foi dito novamente à criança o nome em voz alta, e ela afirmou: “Tá
Faltando o S”.
Figura 18 – Nomes com Alfabeto Móvel
Em GERALDO, primeiramente escreveu GARAUDO. Ao solicitar a leitura a criança
disse “Tá errado, aqui é E”. Ao trocar a letra fez a leitura do nome dizendo “Agora está certo”,
então informou-se a criança que ali estava escrito a palavra, mas que em português algumas
palavras com som de U são na verdade escritas com L e assim foi realizada a correção e feito o
registro no caderno.
Figura 19 – Nomes com Alfabeto Móvel
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Para o nome ROBERTO, também ao realizar a leitura, a criança mesma percebeu que
algo estava errado, lendo sílaba por sílaba afirmou: “Falta o R”, mas após inseri-lo ainda não
conseguiu ler a palavra, então se questionou à criança: “Existe sílaba sem vogal?”. Ela
informou que não, assim perguntou-se: “Então que vogal você acha que está faltando nessa
sílaba”. Ela respondeu corretamente que era a E, e registrou igualmente o nome.
11º dia de Atividade
Neste dia foram realizadas junto com a criança algumas atividades que ela não havia
conseguido realizar em sala de aula: uma de matemática, e uma de português em que a palavra
estava escrita ao contrário e a criança deveria escrevê-la corretamente.
Ao questionar o porquê não havia realizado a tarefa a criança informou que não entendeu
o que fazer. Quando questionado por que não pediu à professora, respondeu: “A tia disse que
era fácil e já tinha explicado”.
Com o auxílio do alfabeto móvel foi mostrado à criança como era a atividade, solicitouse que ela colocasse as letras do mesmo modo que estava na atividade, e depois que invertesse
a posição das letras uma por uma. Ela observou: “Então é só escrever de trás pra frente?”. Ao
informar-lhe que sim, ela conseguiu realizar a tarefa sem problemas.
12º dia de Atividades
Neste dia propôs-se a criança que escrevesse novamente as palavras do primeiro dia de
atividades para ser feito um novo diagnóstico. Notou-se que a criança já conseguia escrever
GOL de forma correta; a palavra CAMPO a criança ainda não escreveu corretamente, mas já
se percebeu a tentativa, e nesse caso o erro cometido foi apenas na grafia, pois a
correspondência da escrita com a fala já foi realizada corretamente, assim como em FUTEBOL
que anteriormente foi escrito com V no lugar do F, a palavra CAMIZETA foi escrita da mesma
maneira.
Após isso se realizou a leitura de um pequeno livro trazido pela criança, em sua leitura,
notou-se que muitas palavras já puderam ser lidas tranquilamente, e embora ainda tenha
engasgado nas palavras com sílabas complexas, foi possível notar que a criança já conseguia
compreender boa parte do texto mesmo lendo com dificuldades.
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Figura 20 – Escrita de palavras
13º dia de Atividades
A criança trouxe para esse encontro um Gibi da Turma da Mônica que a mesma havia
comprado e informou que gostaria de ler. Realizou-se a leitura junto à criança e depois solicitouse que a mesma escrevesse algumas palavras do gibi Posteriormente, com a ajuda do alfabeto
móvel propôs-se a criança a correção das palavras.
Figura 21 – Escrita de palavras
Para a maioria das palavras, ao pegar o alfabeto móvel a criança já sabia de imediato
que estava faltando alguma letra. No caso de plano a criança disse que não conseguia “Eu não
sei escrever”. Então, foram entregues apenas as letras que a palavra continha. A criança
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questionou “O L é antes ou depois do A?”. Sugeriu-se que colocasse e realizasse a leitura, e ao
fazer isso a criança imediatamente escreveu corretamente a palavra.
Nos demais dias de atividades, buscou-se realizar algumas leituras em voz alta e
silenciosa com a criança, quando se notou a dificuldade de interpretação da criança, que muitas
vezes conseguiu realizar sem problemas a leitura dos textos, porém quando se faz perguntas
referentes ao conteúdo da leitura, a criança demonstra ter pouca compreensão daquilo que leu,
evidenciando a necessidade de um trabalho maior no que tange a leitura da criança.
Última Avaliação
Na última avaliação realizada durante o trabalho, solicitou-se que a criança escrevesse
as palavras escritas na primeira avaliação, e foi possível notar que a criança evoluiu muito na
escrita:
Figura 22 – Escrita de palavras
Solicitou-se que formasse frases com as palavras.
Figura 23 – Formando frases
Nessas frases percebe-se que a criança ainda possui uma escrita limitada, pois não
consegue formar frases muito diferentes uma da outra, porém nota-se a evolução de sua escrita.
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4. Considerações Finais
Neste trabalho, mostrou-se que o letramento, vem questionar uma visão equivocada, de
que ao alfabetizar, seria necessária a utilização de textos sem sentido, fazendo com que o aluno
repita várias vezes até que decore, como se o alfabetizando não tivesse nenhum tipo de
conhecimento sobre leitura e escrita, como se apenas na escola, ele fosse apresentado de forma
mágica ao mundo letrado.
Evidencia-se portanto, que também na escola é necessário utilizar os recursos que o
aluno traz, a fim de facilitar seu aprendizado, visto que este aluno muito antes de entrar na
escola, já tem contato com diversas formas de escritas no seu dia a dia, seja por meio de
pequenos bilhetes, rótulos, cartazes, propagandas, etc.
Corroborando com tal perspectiva, foi realizada uma experiência empírica de
letramento, por meio da qual foi acompanhada uma criança do 4º ano do ensino fundamental
durante quatro meses. A criança em estudo ficou retida no 3º ano, em 2013, pois de acordo com
a professora não apresentava condições para avançar a série.
A esse respeito, de acordo com a mãe, as professoras anteriores relatavam que apesar
dos inúmeros esforços, a criança não conseguia acompanhar os demais. Em 2011, a criança foi
encaminhada a uma psicopedagoga, sendo que após esse acompanhamento apresentou uma
pequena melhora. Contudo, a criança perdeu a vaga, que era fornecida pelo governo, por ter
faltado 3 vezes seguidas sem justificativas. O acompanhamento foi realizado nos finais de
semana, dedicando-se uma hora no sábado e uma hora no domingo.
Constatou-se que, mesmo tendo dificuldade de aprendizado durante sua vida escolar,
em pouco tempo, a criança mostrou grande avanço no aprendizado, evidenciando que o
letramento trouxe significado para o seu aprendizado.
Porém, fazem-se necessárias algumas considerações. Constatou-se que a criança ainda
não atingiu ao nível esperado de aprendizado, pois ainda não apresenta compreensão total de
textos que lê, e ainda escreve frases e textos com visível dificuldade.
Quanto tempo seria ainda necessário para que a criança apresentasse novos avanços?
Que trabalhos faltam ser realizados? A criança necessitaria de algum tipo de auxílio especial
além daquele que foi realizado?
O questionamento maior que se coloca aqui, num momento de balanço final do trabalho
realizado, volta-se para o fato de que inúmeras crianças vivenciam realidades semelhantes a
esta que aqui foi descrita e que não encontram solução para suas dificuldades pela
impossibilidade de acompanhamento específico para suas demandas particulares. Afinal, será
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possível que a educação massificada realize procedimentos efetivos de letramento que
permitam a superação das dificuldades enfrentadas pelas crianças?
Referências
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