Súmula n. 381
SÚMULA N. 381
Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da
abusividade das cláusulas.
Referências:
CPC, art. 543-C.
CDC, art. 51.
Resolução n. 8/2008-STJ, art. 2º, § 1º.
Precedentes:
AgRg no REsp
782.895-SC
(3ª T, 19.06.2008 – DJe 1º.07.2008)
AgRg no REsp
1.006.105-RS (4ª T, 12.08.2008 – DJe 29.09.2008)
AgRg no REsp
1.028.361-RS (4ª T, 15.05.2008 – DJe 16.06.2008)
AgRg nos EREsp 801.421-RS
(2ª S, 14.03.2007 – DJ 16.04.2007)
EREsp
645.902-RS
(2ª S, 10.10.2007 – DJ 22.10.2007)
REsp
541.153-RS
(2ª S, 08.06.2005 – DJ 14.09.2005)
REsp
1.042.903-RS (3ª T, 03.06.2008 – DJe 20.06.2008)
REsp
1.061.530-RS (2ª S, 22.10.2008 – DJe 10.03.2009)
Segunda Seção, em 22.4.2009
DJe 5.5.2009, ed. 355
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL N. 782.895-SC
(2005/0156263-9)
Relator: Ministro Sidnei Beneti
Agravante: Transportes e Distribuição de Gás Farias Ltda.
Advogado: Rogério Reis Olsen da Veiga
Agravado: Companhia Itauleasing de Arrendamento Mercantil
Advogado: Emerson Lodetti e outro(s)
EMENTA
Recurso especial. Agravo regimental. Contrato bancário.
Disposições de ofício. Inadmissibilidade. Cobrança antecipada do
VRG. Descaracterização do contrato de arrendamento mercantil.
Inocorrência. Juros remuneratórios. Não limitação. Capitalização
anual dos juros. Possibilidade. Comissão de permanência possibilidade
de cobrança desde que não cumulada com os demais encargos
moratórios. Taxa Referencial. Legalidade.
I - Embora incidente o Código de Defesa do Consumidor nos
contratos bancários, não se admite a revisão, de ofício, das cláusulas
contratuais consideradas abusivas.
II - A cobrança antecipada do valor residual garantido (VRG)
não descaracteriza o contrato de arrendamento mercantil
III - Os juros pactuados em taxa superior a 12% ao ano não são
considerados abusivos, exceto quando comprovado que discrepantes
em relação à taxa de mercado, após vencida a obrigação, hipótese não
ocorrida nos autos.
IV - É permitida a capitalização anual dos juros nos contratos
bancários.
V - É admitida a cobrança da comissão de permanência no período
da inadimplência, desde que não cumulada com correção monetária,
juros moratórios, multa contratual ou juros remuneratórios, calculada
à taxa média de mercado, limitada, contudo, à taxa contratada.
VI - É legítima é a utilização da Taxa Referencial como índice
de atualização, desde que pactuada no contrato. Proíbe-se o seu uso
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
somente como substitutivo de índices já extintos, em ajustes que não
a previam.
Agravo improvido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por
unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr.
Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Ari Pargendler e Massami Uyeda votaram com o Sr.
Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Nancy Andrighi.
Brasília (DF), 19 de junho de 2008 (data do julgamento).
Ministro Sidnei Beneti, Relator
DJe 1º.7.2008
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sidnei Beneti: 1. - Cuida-se de agravo regimental
interposto por Transportes e Distribuição de Gás Farias Ltda. contra a decisão
que, em autos de ação revisional de contrato de contrato bancário, conferiu
parcial provimento ao recurso especial do ora agravado excluindo do acórdão
recorrido as disposições julgadas de ofício; afastando a descaracterização do contrato de
arrendamento mercantil; afastando a limitação dos juros remuneratórios; admitindo
a capitalização anual dos juros; permitindo a cobrança da comissão de permanência,
após o vencimento da dívida, à taxa média do mercado apurada pelo Banco Central
do Brasil, limitada ao percentual do contrato, não se permitindo cumulação com
juros remuneratórios ou moratórios, correção monetária ou multa contratual, em
consonância com os precedentes desta Corte sobre a matéria; e admitindo a incidência
da TR como índice de atualização monetária (fls. 229).
2. - Sustenta a agravante que o recurso especial não poderia ser provido
porque: a) não houve prequestionamento dos dispositivos legais tidos por
violados, b) as questões foram decididas com base e interpretação de cláusulas
400
SÚMULAS - PRECEDENTES
contratuais; e c) o dissídio jurisprudencial não teria sido demonstrado nos
moldes exigidos.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Sidnei Beneti (Relator): 3. - Inicialmente, verifica-se que
o ora agravado, em suas razões de recurso especial, insurgiu-se apenas com
relação a questões de direito, que tais questões foram prequestionadas pelo
acórdão recorrido e que o dissídio jurisprudencial restou comprovado nos
moldes exigidos.
Ademais, a respeito das questões contra as quais se insurge o agravante,
assim dispôs a decisão agravada (fls. 226-229):
Assiste razão ao recorrente no que concerne à impossibilidade de o órgão
julgador revisar as cláusulas contratuais consideradas abusivas, a despeito de
irresignação da parte interessada, tendo em vista a natureza patrimonial dos
direitos envolvidos.
Consoante pacífico entendimento no âmbito da Segunda Seção do Superior
Tribunal de Justiça, o julgamento realizado de ofício pelo Tribunal ofende o
princípio tantum devolutum quantum appellatum positivado no artigo 515 do
Código de Processo Civil (CPC), uma vez que a Corte revisora exorbita na entrega
da prestação jurisdicional, indo além do que foi impugnado nas razões recursais.
Ressalvam-se, por óbvio, as restritas hipóteses em que tal atividade é autorizada.
Nesse sentido, são os seguintes precedentes desta Corte: REsp n. 541.153RS, Relator Ministro Cesar Asfor Rocha, DJ 14.9.2005; REsp n. 258.426-RS, Relator
Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 20.8.2001; REsp n. 42.995-MG, Relator
Ministro Aldir Passarinho Junior, DJ 18.8.1999.
Restam prejudicadas, todavia, as questões de mérito inseridas no contexto,
também submetidas a exame no recurso especial.
A questão da descaracterização dos contratos de leasing pela antecipação do
Valor Residual Garantido (VRG) foi sedimentada neste Tribunal, com a aprovação
pela Corte Especial da Súmula n. 293, com o seguinte enunciado: “A cobrança
antecipada do Valor Residual Garantido (VRG) não descaracteriza o contrato de
arrendamento mercantil”.
Prevaleceu neste Tribunal esse entendimento, porquanto as normas afetas a tais
pactos prevêem essa forma de contratação, sem que isto represente o exercício
compulsório da compra do bem arrendado. Isso porque, mesmo com a referida
antecipação, subsiste para o arrendatário a faculdade pela opção de compra,
renovação do contrato (artigo 5º da Lei n. 6.099/1974) ou devolução do bem.
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
401
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
A Segunda Seção desta Corte decidiu, no julgamento do REsp n. 407.097-RS,
Relator para o acórdão Ministro Ari Pargendler, DJ 29.9.2003, que o fato de as
taxas de juros excederem o limite de 12% ao ano, por si, não implica abusividade;
impõe-se sua redução, tão-somente, quando comprovado que discrepantes em
relação à taxa de mercado após vencida a obrigação. A respeito, entre muitos, os
seguintes julgados: REsp n. 537.113-RS, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ
20.9.2004; AGREsp n. 565.262-RS, Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ 13.9.2004.
A capitalização dos juros é admissível quando pactuada e desde que
haja legislação específica que a autorize. Assim, permite-se sua cobrança na
periodicidade mensal nas cédulas de crédito rural, comercial e industrial (DecretoLei n. 167/1967 e Decreto-Lei n. 413/1969), bem como nas demais operações
realizadas pelas instituições financeiras integrantes do Sistema Financeiro
Nacional, desde que celebradas a partir da publicação da Medida Provisória n.
1.963-17 (31.3.2000). Nesse sentido, o REsp n. 602.068-RS, Rel. Min. Antônio de
Pádua Ribeiro, DJ 21.3.2005, da colenda Segunda Seção. Não é o caso dos autos,
tendo em vista que o contrato objeto da revisão foi firmado em 26.10.1994 (fls. 8).
Todavia, conforme a jurisprudência dominante desta Corte, nessa hipótese deve
ser permitida a sua incidência na periodicidade anual, por incidência do art. 4º do
Decreto n. 22.626/1933 e da Súmula n. 121 do STF. Nesse sentido: REsp n. 468.281RS, Rel. Ministro Aldir Passarinho Junior, DJ 24.2.2003 e AgRg nos EDcl no REsp n.
774.591-RS, Rel. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 5.2.2007.
No que se refere à comissão de permanência, já admitiu esta Corte a legalidade
de sua cobrança em caso de inadimplemento, desde que não cumulada com
a correção monetária ou com os juros remuneratórios (Súmulas STJ n. 30 e n.
296). A egrégia Segunda Seção decidiu, ainda, no julgamento do AgRg no REsp
n. 712.801-RS, relatado pelo Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, e do AgRg
no REsp n. 706.638-RS, Relatora a Ministra Nancy Andrighi, ser vedada a cobrança
cumulada da comissão de permanência com juros moratórios e multa contratual.
Por outro lado, esse encargo pode ser calculado à base da taxa média dos juros no
mercado, desde que não exceda a taxa do contrato convencionada pelas partes
(Súmula n. 294-STJ).
É entendimento pacífico neste Superior Tribunal de que legítima é a utilização
da Taxa Referencial como índice de atualização, desde que pactuada no contrato.
Proíbe-se o seu uso somente como substitutivo de índices já extintos, em ajustes
que não a previam. Assim, o Enunciado n. 295 da Súmula deste Sodalício.
4. - O agravante não trouxe qualquer argumento capaz de modificar a
conclusão alvitrada, que está em consonância com a jurisprudência consolidada
desta Corte, devendo a decisão ser mantida por seus próprios fundamentos.
Pelo exposto, nega-se provimento ao agravo.
É o voto.
402
SÚMULAS - PRECEDENTES
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL N. 1.006.105-RS
(2007/0269634-1)
Relator: Ministro Carlos Fernando Mathias ( Juiz convocado do TRF 1ª
Região)
Agravante: Banco Finasa S/A
Advogados: Denise Cabreira Golambieski e outro(s)
Diogo Stieven Fleck e outro(s)
Agravado: Toni Roger de Oliveira
Advogado: Tatiane Coimbra Burille
EMENTA
Agravo regimental em recurso especial. Ação revisional.
Julgamento extra petita configuração. Contrato de alienação fiduciária.
Nulidade de cláusulas abusivas. Declaração de ofício. Impossibilidade.
Limitação dos juros remuneratórios. Inadmissibilidade na espécie.
Capitalização mensal de juros. Contrato firmado posteriormente à
edição da MP n. 1.963-17/2000. Cobrança. Possibilidade. Comissão
de permanência. Licitude na cobrança, desde que não cumulada
com juros remuneratórios, correção monetária ou encargos da mora.
Mora debendi. Ocorrência. Manutenção do devedor na posse do bem
financiado. Impossibilidade. Inclusão do nome do devedor em cadastros
de inadimplentes. Legalidade. Repetição do indébito. Possibilidade.
Prova do erro. Desnecessidade. Agravo regimental não provido.
1. Nos termos do artigo 515 do CPC, excetuando-se as matérias
de ordem pública, examináveis de ofício, o recurso de apelação devolve
para o Órgão ad quem a matéria impugnada, que se restringe aos
limites da impugnação. Impossibilidade do reconhecimento, de ofício,
de nulidade de cláusulas contratuais consideradas abusivas, sendo,
para tanto, necessário o pedido expresso da parte interessada.
2. Tendo o Órgão prolator da decisão recorrida proferido
julgamento extra petita – porquanto enfrentou questões atinentes a
direito patrimonial, que não constituíram objeto de insurgência –
devem ser afastadas as disposições ex officio relativas à exclusão da
taxa de abertura de crédito e da tarifa de emissão de boleto bancário,
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
403
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
à nulidade da cláusula de emissão de título de crédito e à autorização
dos depósitos.
3. No tocante aos juros remuneratórios, não incide a limitação
a 12% ao ano, prevista no Decreto n. 22.626/1933, salvo hipóteses
legais específicas, visto que as instituições financeiras, integrantes
do Sistema Financeiro Nacional, são regidas pela Lei n. 4.595/1964.
Tal entendimento, ressalte-se, não foi alterado após a vigência
do Código de Defesa do Consumidor, cujas normas também se
aplicam aos contratos firmados por instituições bancárias. Visando
à harmonização dos referidos diplomas legais, esta Corte Superior
consagrou a manutenção dos juros no percentual avençado pelas
partes, desde que não reste sobejamente demonstrada a exorbitância
do encargo.
4. No que tange à capitalização mensal de juros, o entendimento
prevalecente nesta Corte era no sentido de que esta somente seria
admitida em casos específicos, previstos em lei (cédulas de crédito
rural, comercial e industrial), conforme a Súmula n. 93-STJ. Com a
edição da MP n. 1.963-17, de 30.3.2000 (atualmente reeditada sob
o n. 2.170-36/2001), passou-se a admitir a capitalização mensal nos
contratos firmados posteriormente à sua entrada em vigor, desde que
haja previsão contratual.
5. No concernente à comissão de permanência, é lícita a sua
cobrança após o vencimento da dívida, devendo observar a taxa média
dos juros de mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil, limitada
à taxa de juros contratada para o período da normalidade. Destaca-se
que a cobrança da comissão de permanência não pode coligir com os
encargos decorrentes da mora, como os juros moratórios e a multa
contratual.
6. Os juros remuneratórios, não cumuláveis com a comissão de
permanência, são devidos no período de inadimplência, à taxa média
de mercado estipulada pelo Banco Central do Brasil, limitada ao
percentual contratado. (Súmula n. 296-STJ).
7. Em relação à manutenção do devedor na posse do bem ela não
pode persistir, porque refoge dos limites da ação revisional a discussão
possessória. Assim, não há falar-se em manutenção do bem na posse
do devedor, sendo facultado que ela seja requerida em ação própria
pelo credor, não podendo ser a credora impedida de tomar as medidas
404
SÚMULAS - PRECEDENTES
judiciais que entender cabíveis. (c.f. AgRg no REsp n. 831.780-RS,
Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJ 14.8.2006).
8. Quanto à legalidade da inclusão do nome do devedor nos
cadastros restritivos de crédito, os elementos constantes dos autos não
demonstram a presença concomitante dos requisitos autorizadores
do cancelamento dos registros, conseqüentemente, em sendo o
inadimplemento do recorrido incontroverso, legítima é a inclusão do
nome dele em cadastros de inadimplentes.
9. “Para a repetição de indébito, nos contratos de abertura de
crédito em conta-corrente, não se exige a prova do erro.” (Súmula n.
322-STJ).
10. Alegações do agravante nada acrescentaram, no sentido de
infirmar os fundamentos do decisum agravado.
11. Agravo regimental não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Senhores Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de
Justiça, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, nos termos
do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Fernando Gonçalves, Aldir
Passarinho Junior, João Otávio de Noronha e Luis Felipe Salomão votaram com
o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 12 de agosto de 2008 (data do julgamento).
Ministro Carlos Fernando Mathias ( Juiz convocado do TRF 1ª Região),
Relator
DJe 29.9.2008
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Fernando Mathias ( Juiz convocado do TRF 1ª
Região): Banco Finasa S/A interpõe agravo regimental de decisão monocrática
do eminente Ministro Massami Uyeda, que recebeu a seguinte ementa:
Recurso especial. Ação revisional. Contrato de alienação fiduciária. Nulidade
de cláusulas abusivas. Declaração de ofício. Impossibilidade. Limitação dos juros
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
405
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
remuneratórios. Inadmissibilidade na espécie. Capitalização mensal de juros.
Contrato firmado posteriormente à edição da MP n. 1.963-17/2000. Cobrança.
Possibilidade. Comissão de permanência. Licitude na cobrança, desde que não
cumulada com juros remuneratórios, correção monetária ou encargos da mora.
Mora debendi. Ocorrência. Manutenção do devedor na posse do bem financiado.
Impossibilidade. Inclusão do nome do devedor em cadastros de inadimplentes.
Legalidade. Repetição do indébito. Possibilidade. Prova do erro. Desnecessidade.
Recurso especial parcialmente provido. (fls. 444).
O aludido decisum foi assim relatado, na ocasião, in verbis:
Cuida-se de recurso especial interposto pelo Banco Finasa S/A, com
fundamento no art. 105, inciso III, alíneas a e c, da Constituição Federal, em que
se alega violação dos artigos 515 do Código de Processo Civil, 394, 395 e 876 do
Código Civil, 20, II, 41, 42 e 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor, 3º, 4º, VI e
IX, 9º e 10 da Lei n. 4.595/1964, 3º do Decreto-Lei n. 911/1969 e 5º da MP n. 2.17036/2001, bem como dissídio jurisprudencial.
Verifica-se, da análise dos autos, que a ação revisional proposta por Toni Roger
de Oliveira em face do recorrente, tendo por objeto contrato de financiamento
garantido por alienação fiduciária, teve o pedido julgado parcialmente
procedente pelo r. Juízo de primeiro grau.
Interpostas apelações pelas partes, o egrégio Tribunal de Justiça do Estado do
Rio Grande do Sul conferiu parcial provimento aos recursos, com disposições de
ofício, nos termos da ementa a seguir:
Ação revisional. Negócios jurídicos bancários. Alienação fiduciária.
Aplicação do CDC. Juros remuneratórios. Capitalização. Comissão de
permanência. Índice de atualização monetária. Encargos moratórios.
Compensação e/ou repetição do indébito. Cláusula de emissão de título de
crédito. Tarifa de abertura de crédito. Emissão de boleto bancário. Cadastro
de restrição ao crédito. Manutenção na posse do bem. Autorização para
depósito. Honorários advocatícios. [...].
No presente apelo nobre, busca o recorrente a reforma do v. acórdão,
insurgindo-se no que diz respeito: i) ao julgamento com disposições de ofício; ii) à
limitação dos juros remuneratórios; iii) à vedação da capitalização mensal destes;
iv) à exclusão da comissão de permanência; v) ao índice de atualização monetária;
vi) à descaracterização da mora; vii) à manutenção do devedor na posse do bem;
viii) à proibição de inscrição do nome do devedor nos cadastros de proteção ao
crédito; e ix) à repetição do indébito.
O recorrido não apresentou contra-razões, conforme certidão à fl. 438.
É o relatório. (fls. 444-445).
406
SÚMULAS - PRECEDENTES
Alega o agravante, em síntese, estar pacificado o entendimento
jurisprudencial de que é possível a cumulação da comissão de permanência com
outros encargos (juros moratórios, multa contratual e correção monetária), nos
termos contratados.
Requer o provimento do recurso, para que seja dado provimento, in totum,
ao REsp interposto.
É, no essencial, o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Fernando Mathias ( Juiz convocado do TRF
1ª Região) (Relator): A decisão ora agravada foi assim fundamentada pelo
eminente Relator, in verbis:
A irresignação merece prosperar em parte.
Com efeito.
Com relação à alegada ofensa ao art. 515 do CPC, o entendimento mais
recente desta egrégia Corte é no sentido da impossibilidade do reconhecimento,
de ofício, de nulidade de cláusulas contratuais consideradas abusivas, sendo, para
tanto, necessário o pedido expresso da parte interessada (ut REsp n. 612.470-RS,
Rel. Ministra Nancy Andrighi, DJ 30.6.2006.
Assinala-se, ainda, que, nos termos do artigo 515 do CPC, excetuando-se as
matérias de ordem pública, examináveis de ofício, o recurso de apelação devolve
para o Órgão ad quem a matéria impugnada, que se restringe aos limites dessa
impugnação.
Afere-se, na espécie, ter o Órgão prolator da decisão recorrida proferido
julgamento extra petita, porquanto enfrentou questões atinentes a direito
patrimonial, que não constituíram objeto de insurgência.
Dessa forma, devem ser afastadas as disposições ex officio relativas à exclusão
da taxa de abertura de crédito e da tarifa de emissão de boleto bancário, à
nulidade da cláusula de emissão de título de crédito e à autorização dos depósitos.
No tocante aos juros remuneratórios, a Segunda Seção deste egrégio Superior
Tribunal entende que não incide a limitação a 12% ao ano, prevista no Decreto n.
22.626/1933, salvo hipóteses legais específicas, visto que as instituições financeiras,
integrantes do Sistema Financeiro Nacional, são regidas pela Lei n. 4.595/1964.
Nota-se que cabe ao Conselho Monetário Nacional limitar tais encargos,
aplicando-se a Súmula n. 596 do STF. Veja-se, mais, que este entendimento não
foi alterado após a vigência do Código de Defesa do Consumidor, cujas normas
também se aplicam aos contratos firmados por instituições bancárias. E a fim de
se harmonizarem os referidos diplomas legais, aquele Órgão Julgador consagrou
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
407
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
a manutenção dos juros no percentual avençado pelas partes, desde que não
reste sobejamente demonstrada a exorbitância do encargo (v.g. AgRg no REsp n.
590.573-SC, Rel. Ministro Fernando Gonçalves, DJU 25.5.2004).
Ademais, a autorização do Conselho Monetário Nacional para a livre
contratação dos juros remuneratórios só se faz necessária em hipóteses
específicas, decorrentes de expressa exigência legal, tais como nas cédulas de
crédito rural, industrial ou comercial. Assim, resta dispensada a prova de prévia
autorização do CMN para fixar a taxa de juros além do patamar legal no caso em
concreto (v.g. AgRg nos EDcl no REsp n. 492.936-RS, Rel. Min. Antônio de Pádua
Ribeiro, DJ 22.11.2004).
No que tange à capitalização mensal de juros, o entendimento prevalecente
nesta Corte era no sentido de que esta somente seria admitida em casos
específicos, previstos em lei (cédulas de crédito rural, comercial e industrial),
conforme a Súmula n. 93-STJ. Com a edição da MP n. 1.963-17, de 30.3.2000
(atualmente reeditada sob o n. 2.170-36/2000), passou-se a admitir a capitalização
mensal nos contratos firmados posteriormente à sua entrada em vigor, desde que
houvesse previsão contratual. Verificando-se, in casu, o preenchimento dessas
condições, há de ser permitida a sua incidência.
No concernente à comissão de permanência, o entendimento predominante
neste Tribunal é no sentido de ser lícita a sua cobrança após o vencimento da
dívida. A comissão deve observar a taxa média dos juros de mercado, apurada
pelo Banco Central do Brasil, limitada à taxa de juros contratada para o período
da normalidade. Não pode, entretanto, ser cumulada com a correção monetária
nem com os juros remuneratórios, nos termos das Súmulas n. 30, n. 294 e n. 296
do STJ. De acordo com entendimento desta Seção, ainda, a cobrança da comissão
de permanência não pode coligir com os encargos decorrentes da mora, como
os juros moratórios e a multa contratual (c.f. AgRg no REsp n. 712.801-RS, Rel.
Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 4.5.2005 e AgRg no REsp n. 791.172RS, relator Ministro Hélio Quaglia Barbosa, DJ 22.8.2006).
Presente a incidência de quaisquer desses encargos após a caracterização
da mora, devem ser afastados, mantendo-se tão-somente a comissão de
permanência (ut AgRg no AgRg no REsp n. 805.874-RS, relator Ministro Aldir
Passarinho Júnior, DJ de 19.6.2006 e AgRg no REsp n. 828.290-RS, relatora Ministra
Nancy Andrighi, DJ de 26.6.2006).
Quanto à questão da mora, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça
é no sentido de sua descaracterização apenas no caso de cobrança de encargos
ilegais no período da normalidade, hipótese não ocorrida nos autos. Confira-se o
seguinte precedente:
Contrato bancário. Capitalização mensal de juros. - É permitida a
capitalização mensal de juros nos contratos bancários celebrados a partir
de 31.3.2000 (MP n. 1.963-17, atual MP n. 2.170-36), desde que pactuada.
Mora. Caracterização. Encargos legais. - A descaracterização da mora ocorre
408
SÚMULAS - PRECEDENTES
com a cobrança de encargos ilegais. não ocorrência. (AgRg no REsp n.
796.541-RS, relator Ministro Humberto Gomes de Barros, DJ 9.10.2006).
Desse modo, resta caracterizada a mora debendi pelo inadimplemento da
obrigação.
Em relação à manutenção do devedor na posse do bem, a Quarta Turma desta
a. Corte, por ocasião do julgamento do AgRg no REsp n. 831.780-RS, relatado pelo
em. Min. Aldir Passarinho Junior, DJ 14.8.2006, deixou assente o entendimento
de que tal discussão refoge, inequivocamente, dos limites da ação revisional,
recebendo o julgado, no que interessa, a seguinte ementa:
A manutenção do devedor na posse do bem não pode persistir. A uma,
porque refoge dos limites da ação revisional discussão possessória. A duas,
mesmo considerando que a instituição financeira não logrou demonstrar
a legalidade de todos os encargos cobrados, decaiu em menor parte
de sua pretensão, cabendo ao devedor efetuar o pagamento do débito
remanescente junto à instituição financeira. Assim, não há falar-se em
manutenção do bem na posse do devedor, podendo a mesma ser requerida
em ação própria pelo credor. [...]
Portanto, não pode ser a credora impedida de tomar as medidas judiciais que
entender cabíveis.
No tocante à legalidade da inclusão do nome do devedor nos cadastros
restritivos de crédito, veja-se que o entendimento atual deste colendo Superior
Tribunal de Justiça, baseado em recente julgamento efetuado pela Segunda
Seção (REsp n. 527.618-RS, relator Ministro Cesar Asfor Rocha), é o de que:
o pedido em procedimento judicial que busca o cancelamento ou a
abstenção da inscrição do nome do devedor em cadastro de proteção
ao crédito (SPC, Cadin, Serasa e outros) deve ser deferido com cautela,
ao prudente arbítrio do juiz, sendo indispensável a existência de prova
inequívoca ou da verossimilhança do direito alegado, ou ainda, da fumaça do
bom direito, consubstanciados na presença concomitante de três elementos:
a) a existência de ação proposta pelo devedor, contestando a existência
integral ou parcial do débito; b) a efetiva demonstração de que a cobrança
indevida se funda em jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal
Federal ou do Superior Tribunal de Justiça; c) o depósito do valor referente à
parte incontroversa do débito ou que seja prestada caução idônea.
Os elementos constantes dos autos não demonstram a presença concomitante
dos mencionados requisitos autorizadores do cancelamento dos registros. Sendo
o inadimplemento do recorrido incontroverso, legítima é a inclusão do seu nome
em cadastros de inadimplentes.
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
409
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Por fim, em relação à repetição do indébito, este eg. Tribunal já decidiu pela
sua admissão independentemente da prova de que o pagamento tenha sido
realizado por erro, com o objetivo de vedar o enriquecimento ilícito do banco
em detrimento do contratante, nos termos da Súmula n. 322, in verbis: “Para a
repetição de indébito, nos contratos de abertura de crédito em conta-corrente,
não se exige a prova do erro”.
Assim sendo, amparado no artigo 557, § 1º-A, do Código de Processo Civil, dáse parcial provimento ao recurso especial para: i) afastar as disposições de ofício
do Tribunal a quo acima elencadas; ii) afastar a limitação dos juros remuneratórios;
iii) admitir a capitalização mensal destes; iv) permitir a cobrança de comissão
de permanência, à taxa média de mercado, limitada à taxa do contrato, não
cumulada com juros remuneratórios, correção monetária, juros moratórios e
multa moratória; v) reconhecer a caracterização da mora do recorrido; vi) afastar
a disposição do acórdão referente à manutenção do devedor na posse do bem;
e vii) permitir a inclusão do nome do recorrido nos cadastros de inadimplentes.
Em razão da sucumbência recíproca, condena-se as partes ao pagamento das
custas e dos honorários advocatícios, mantido quanto a estes o valor fixado no
acórdão, que deverá ser reciprocamente suportado na proporção de 10% pelo
recorrente e 90% pelo recorrido, admitindo-se a compensação nos termos da lei.
Por ser o recorrido beneficiário da assistência judiciária gratuita (fl. 25), fica
suspensa a exigibilidade das custas judiciais e dos honorários advocatícios, nos
termos do art. 12 da Lei n. 1.060/1950. (fls. 445-448).
Quanto à irresignação do agravante no referente à comissão de
permanência, cabe ressaltar que a 2ª Seção do STJ, por ocasião do julgamento
do REsp n. 271.214, cujo relator para o acórdão foi o eminente Ministro Carlos
Alberto Menezes Direito, consignou que, por meio dela, a moeda poderá ser
atualizada e remunerada.
Nessa seara, a jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de impossibilitar
a cumulação da cobrança daquela comissão com os juros remuneratórios e com a
correção monetária, no último caso em harmonia com o Enunciado da Súmula
n. 30-STJ, verbis:
A Comissão de permanência e a correção monetária são inacumuláveis.
(Súmula n. 30-STJ).
Ainda, no tocante à comissão de permanência, confira-se as Súmulas n.
294-STJ e n. 296-STJ, litteris:
- Súmula n. 294: Não é potestativa a cláusula contratual que prevê a comissão
de permanência, calculada pela taxa média de mercado apurada pelo Banco
Central do Brasil, limitada à taxa do contrato.
410
SÚMULAS - PRECEDENTES
- Súmula n. 296: Os juros remuneratórios, não cumuláveis com a comissão de
permanência, são devidos no período de inadimplência, à taxa média de mercado
estipulada pelo Banco Central do Brasil, limitada ao percentual contratado.
Portanto, com todas as vênias, não prosperam as alegação do agravante, as
quais nada acrescentaram, no sentido de infirmar os fundamentos do decisum
agravado.
Em face da ausência de qualquer subsídio trazido pelo ora agravante,
capaz de alterar os fundamentos do decisum agravado, subsiste incólume o
entendimento nele firmado, não merecendo prosperar o presente recurso.
Ante o exposto, nego provimento ao agravo.
É como voto.
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL N. 1.028.361-RS
(2008/0025524-0)
Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior
Agravante: Severino Pedro de Borba
Advogado: Vanderlei José Bobrowski
Agravado: Banco Finasa S/A
Advogado: Tanise Schmidt e outro(s)
EMENTA
Civil e Processual. Agravo regimental. Contrato de mútuo com
alienação fiduciária em garantia. Julgamento extra petita. Exclusão dos
temas abordados de ofício. Juros. Limitação. Impossibilidade.
I. Inexistindo pedido ou recurso, é vedado ao órgão julgador de
ofício declarar a nulidade de cláusulas contratuais referentes a direito
patrimonial, conforme pacificado pela E. Segunda Seção, quando do
julgamento do REsp n. 541.153-RS, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha,
DJU de 14.9.2005.
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
411
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
II. Não se aplica a limitação de juros remuneratórios de 12% a.a.,
prevista na Lei de Usura, aos contratos bancários não normatizados
em leis especiais, sequer considerada excessivamente onerosa a taxa
média do mercado. Precedente uniformizador da 2ª Seção do STJ.
III. Agravo regimental improvido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide
a Quarta Turma, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental,
nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros João Otávio de
Noronha e Fernando Gonçalves votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 15 de maio de 2008 (data do julgamento).
Ministro Aldir Passarinho Junior, Relator
DJe 16.6.2008
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior: Severino Pedro de Borba interpõe
agravo regimental contra decisão que reconheceu a legitimidade da taxa de juros
remuneratórios como pactuada em contrato de financiamento garantido por
alienação fiduciária.
Alega, inicialmente, que é possível o julgamento de ofício pelo Tribunal de
origem.
Sustenta que é prática abusiva das instituições financeiras à cobrança dos
juros remuneratórios acima da variação da Taxa Selic.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior (Relator): Sem razão a agravante.
Ratifico os termos da decisão recorrida (fls. 273-274), que assim tratou da
matéria, verbis:
412
SÚMULAS - PRECEDENTES
No mérito, incidiu verdadeiramente em julgamento extra petita o
enfrentamento de ofício pelo aresto estadual das questões relativas à
descaracterização da mora, à instituição do IGP-M como índice de correção
monetária, e à possibilidade de compensação/repetição do indébito (REsp n.
42.995-MG e REsp n. 541.153-RS), restando que ficam excluídas do acórdão a quo,
motivo pelo qual não serão abordadas a seguir. Contudo, não houve julgamento
de ofício da questão referente à comissão de permanência, uma vez que suscitado
o pronunciamento pelo recurso de apelação, conforme se verifica à fl. 153.
(...)
Quanto à limitação dos juros remuneratórios, posicionou-se esta Corte no
rumo de que com o advento da Lei n. 4.595/1964, diploma que disciplina de
forma especial o Sistema Financeiro Nacional e suas instituições, restou afastada
a incidência da Lei de Usura, tendo ficado delegado ao Conselho Monetário
Nacional poderes normativos para limitar as referidas taxas, salvo as exceções
legais. A propósito, aplicável a Súmula n. 596-STF.
Por outro lado, ainda que aplicável a Lei n. 8.078/1990, a Segunda Seção
desta Corte (REsp n. 407.097-RS), sedimentou o entendimento de que o pacto
referente à taxa de juros só pode ser alterado se reconhecida sua abusividade em
cada hipótese, desinfluente para tal fim a estabilidade inflacionária no período, e
imprestável o patamar de 12% ao ano, já que sequer a taxa média de mercado,
que não é potestativa, se considera excessiva, para efeitos de validade da avença.
(...)
Conforme ressaltado na decisão agravada, incide verdadeiramente em
julgamento extra petita o enfrentamento de ofício pelo órgão julgador de
questões referentes a direito patrimonial, inexistindo pedido ou recurso nesse
sentido, conforme pacificado pela e. Segunda Seção, quando do julgamento
do REsp n. 541.153-RS (Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, unânime, DJU de
14.9.2005), cuja ementa é a seguinte:
Recurso especial. Ação revisional. Contrato de arrendamento mercantil.
Descaracterização. Exame de ofício. Juros remuneratórios. Capitalização mensal.
- Descaracterização do contrato. Incidência do Verbete n. 293 da Súmula-STJ.
- Exame de ofício de cláusulas contratuais pelo Tribunal de origem.
Impossibilidade, por ofensa ao art. 515 do CPC. Princípio tantum devolutum
quantum appelattum. Precedentes.
- Não estando as instituições financeiras sujeitas à limitação da Lei de Usura,
a abusividade da pactuação dos juros remuneratórios deve ser cabalmente
demonstrada em cada caso, com a comprovação do desequilíbrio contratual ou
de lucros excessivos, sendo insuficiente o só fato de a estipulação ultrapassar 12%
ao ano ou de haver estabilidade inflacionária no período (REsp’s n. 271.214-RS, n.
407.097-RS e n. 420.111-RS).
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
413
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
- Capitalização mensal. Inadmissibilidade na hipótese.
- Recurso parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido.
Ante o exposto, improvejo o agravo.
Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.
É como voto.
AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM
RECURSO ESPECIAL N. 801.421-RS (2006/0225242-8)
Relator: Ministro Ari Pargendler
Agravante: Elói dos Santos Leandro
Advogado: Omar Lopes de Souza e outros
Agravado: Banco Itaú S/A
Advogado: Jacqueline Filgueras Nogueira e outros
EMENTA
Processo Civil. Embargos de divergência. A jurisprudência da
Segunda Seção consolidou-se no sentido de que fere o princípio do
tantum devolutum quantum appellatum a revisão, de ofício, pelo juiz,
de cláusulas contratuais que não foram objeto de recurso (REsp n.
541.153, RS, Relator o Ministro Cesar Asfor Rocha, DJ de 14.9.2005).
Agravo regimental não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, por
unanimidade, negar provimento ao Agravo Regimental nos termos do voto do
Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Carlos Alberto Menezes Direito, Nancy
Andrighi, Castro Filho, Hélio Quaglia Barbosa, Massami Uyeda e Humberto
Gomes de Barros votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, ocasionalmente,
o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha.
414
SÚMULAS - PRECEDENTES
Brasília (DF), 14 de março de 2007 (data do julgamento).
Ministro Ari Pargendler, Relator
DJ 16.4.2007
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Ari Pargendler: O agravo regimental ataca a seguinte
decisão:
Nego seguimento aos embargos de divergência porque o acórdão de fl.
296-301 está em conformidade com a atual jurisprudência da Segunda Seção
no sentido de que a alteração, de ofício, da sentença contraria o artigo 515 do
Código de Processo Civil (REsp n. 541.153, RS, Relator o Ministro Cesar Asfor
Rocha, DJU de 14.9.2005) – fl. 329.
A teor das razões:
Em síntese, como acima exposto, é possível a declaração, de oficio, de nulidade
de cláusulas que ferem as normas do sistema protetivo do consumidor, a fim de
preservar o equilíbrio contratual devido em virtude da necessária igualdade entre
os contratantes.
Saliente-se que as disposições de ofício foram objeto do pedido inicial do
Autor, ora Agravante, e harmonizam com justiça a relação contratual em revisão.
Assim, por conclusão lógica, as disposições de oficio indeferidas na decisão ora
atacada, estão todas em consonância com o Código de Defesa do Consumidor,
com a fundamentação exposta acima e ao longo do acórdão do Tribunal a quo,
inclusive existindo sim divergência nessa respeitável Corte, merecendo, dessa
forma, apreciação e reconhecimento desse Agravo Regimental (fl. 360).
VOTO
O Sr. Ministro Ari Pargendler (Relator): O acórdão indicado como
paradigma está superado pela atual jurisprudência da Segunda Seção.
Recentemente, no julgamento do REsp n. 541.153, Relator o Ministro
Cesar Asfor Rocha, a Segunda Seção firmou o entendimento no sentido de que
fere o princípio do tantum devolutum quantum appellatum a revisão, de ofício,
pelo juiz, de cláusulas contratuais que não foram objeto de recurso, conforme o
acórdão assim ementado:
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
415
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Recurso especial. Ação revisional. Contrato de arrendamento mercantil.
Descaracterização. Exame de ofício. Juros remuneratórios. Capitalização mensal.
- Descaracterização do contrato. Incidência do Verbete n. 293 da Súmula-STJ.
Exame de ofício de cláusulas contratuais pelo Tribunal de origem. Impossibilidade,
por ofensa ao art. 515 do CPC. Princípio tantum devolutum quantum appellatum.
Precedentes. Não estando as instituições financeiras sujeitas à limitação da Lei de
Usura, a abusividade da pactuação dos juros remuneratórios deve ser cabalmente
demonstrada em cada caso, com a comprovação do desequilíbrio contratual ou
de lucros excessivos, sendo insuficiente o só fato de a estipulação ultrapassar 12%
ao ano ou de haver estabilidade inflacionária no período (REsp’s n. 271.214-RS, n.
407.097-RS e n. 420.111-RS). Capitalização mensal. Inadmissibilidade na hipótese.
- Recurso parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido (DJ de 14.9.2005).
Voto, por isso, no sentido de negar provimento ao agravo regimental.
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL N. 645.902-RS
(2005/0027242-8)
Relator: Ministro Fernando Gonçalves
Embargante: Banco Santander Meridional S/A
Advogado: Fabrício da Mota Alves e outro(s)
Embargado: Aline Baistorph da Silva
Advogado: Andréa Carla Tonin e outro(s)
EMENTA
Comercial. Empréstimo bancário. Contrato. Revisão.
Abusividade. Reconhecimento de ofício. Apelação. Ausência. Tantum
devolutum quantum apellatum. Violação.
1 - Viola o princípio do tantum devolutum quantum apellatum
o deferimento de repetição de indébito, em face do reconhecimento
de abusividade no contrato de financiamento bancário, sem que a
parte interessada tenha manejado o competente recurso de apelação.
Entendimento da Segunda Seção (EREsp n. 702.524-RS e REsp n.
541.153-RS).
2 - Embargos de divergência conhecidos e providos.
416
SÚMULAS - PRECEDENTES
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda
Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer dos Embargos de Divergência
e lhes dar provimento. Os Ministros Aldir Passarinho Junior, Hélio Quaglia
Barbosa, Massami Uyeda e Ari Pargendler votaram com o Ministro Relator.
Ausente, ocasionalmente, o Ministro Humberto Gomes de Barros.
Brasília (DF), 10 de outubro de 2007 (data do julgamento).
Ministro Fernando Gonçalves, Relator
DJ 22.10.2007
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Fernando Gonçalves: Por Aline Baistorph da Silva foi
ajuizada uma ação revisional de contrato de financiamento bancário cumulada
com repetição de indébito contra o Banco Santander Meridional S/A, julgada
parcialmente procedente, em primeiro grau de Jurisdição, determinando o juízo
“a revisão do contrato de financiamento firmado entre as partes desde a data
de assinatura da aludida avença, nos termos antes definidos, para o fim de que
seja observada a cobrança de juros correspondente à variação da Taxa Selic no
período, capitalizados mensalmente, admitindo a compensação por valores já
cobrados em desatenção ao aqui reconhecido, mantendo os demais critérios
estabelecidos, tornando definitiva a tutela anteriormente concedida.” (fls. 122)
Inconformado, o Banco maneja apelação, provida parcialmente pelo
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul:
Apelação cível. Negócios jurídicos bancários. Ação revisional.
Juros Remuneratórios: Incontroversa a prática de juros remuneratórios
superiores a 12% ao ano na operação bancária em exame, mas é inaplicável o art.
192, parágrafo 3º da Constituição Federal.
Taxa Referencial: Adoção como indexador, desde que livremente pactuada
entre as partes. Excluída, no caso.
Multa Moratória: A multa ajustada para a impontualidade no cumprimento
da obrigação, deverá obedecer ao art. 52, § 1º do Codecon, que a limitou,
inicialmente, em 10% (dez por cento) da dívida e após, com a redação da Lei n.
9.298, de 1º.8.1996, em até 2% (dois por cento).
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
417
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Comissão de Permanência: Expurgo.
- Repetição do Indébito ou Compensação: Não é obstáculo à revisional a ausência
de prova do pagamento indevido por erro quando aquela ação está embasada na
alegação de cobrança de verbas ilegais, logo nulas, podendo ser conhecidas até
de ofício pelo julgador.
Apelação cível provida em parte. (fls. 165).
Foram opostos embargos de declaração, suscitando o Banco a
impossibilidade de ser deferida a repetição de indébito, sem que tenha havido
recurso da parte contrária, ou seja, não se pode concedê-la de ofício.
Rejeitados os embargos (fls. 196), ascenderam os autos a esta Corte, via
recurso especial, afirmando o Banco, neste particular, violação aos arts. 128, 460
e 515 do CPC.
Por decisão singular (fls. 249-250), foi julgado o especial, fixando o Relator,
no tópico, a possibilidade de revisão, de ofício, do contrato e suas abusividades.
Interposto agravo regimental, não foi provido, por acórdão da Terceira
Turma, que guarda a seguinte ementa:
Agravo regimental. Contrato de financiamento. Exame de ofício. Art. 51, IV,
CDC. Comissão de permanência. Limitação ao pacto. Honorários advocatícios.
Fixação do valor em fase de liquidação. Reformatio in pejus. Impossibilidade.
- A jurisprudência permite afastar, de ofício, as cláusulas abusivas com base no
art. 51, IV, do CDC, questão de ordem pública.
- É lícito a cobrança de comissão de permanência no período da inadimplência,
desde que não cumulada com a correção monetária (Súmula n. 30), nem com
juros remuneratórios, calculada pela taxa média de mercado, apurada pelo Banco
Central do Brasil, limitada à taxa do contrato (Súmulas n. 294 e n. 296).
- A redistribuição da verba honorária reserva-se à liquidação da sentença,
limitada a condenação ao quantum fixado pelo acórdão recorrido, em atenção ao
princípio da reformatio in pejus. (AgRg no REsp n. 645.902-RS, Rel. Min. Humberto
Gomes de Barros) (fls. 271).
Daí os presentes embargos de divergência, onde sustenta o Banco Santander
Meridional S/A que, a manter a conclusão do julgado, violado estará o princípio
do tantum devolutum quantum apellatum, sendo certo o dissenso entre o acórdão
recorrido e paradigma da Quarta Turma, assim ementado:
Comercial. Revisão. Contrato de abertura de crédito em conta corrente. Citação.
Nulidade. Teoria da aparência. Representante de empresa. Certidão oficial.
Contraprova desacolhida. Ausência de prejuízo. Reexame. Inadmissibilidade.
418
SÚMULAS - PRECEDENTES
Súmula n. 7-STJ. Juros remuneratórios. Termo final. Vencimento. Comissão de
permanência. Incidência. Período de inadimplência. Limite. Julgamento extra
petita. Reconhecimento. Capitalização mensal dos juros. Vedação. Súmula n. 121STF. Compensação do indébito. Cabimento.
I. Efetivada a citação em funcionário que, segundo o oficial de justiça
encarregado da diligência, era o representante legal do banco réu, e insuficiente,
na dicção do acórdão estadual, a contraprova, a matéria recai no reexame fático,
vedado pela Súmula n. 7 do STJ.
II. Caso, ademais, em que a revelia em 1º grau não trouxe prejuízo à parte,
porquanto a controvérsia é essencialmente de Direito.
III. O julgamento da apelação sobre temas não provocados pelo recorrente
viola o princípio tantum devolutum quantum appellatum, inerente ao efeito
devolutivo do recurso, cujo excesso deve ser decotado com referência à comissão
de permanência.
IV. Segundo o entendimento pacificado na egrégia Segunda Seção (REsp n.
271.214-RS, Rel. p/ acórdão Min. Carlos Alberto Menezes Direito, por maioria,
DJU de 4.8.2003), os juros remuneratórios serão devidos até o advento da mora,
quando poderão ser substituídos pela comissão de permanência, calculada
pela variação da taxa média do mercado, segundo as normas do Banco Central,
limitada à taxa de juros pactuada, acrescida dos encargos contratuais previstos
para a inadimplência e observado o teor da Súmula n. 30-STJ.
V. No contrato de abertura de crédito em conta corrente, ainda que
expressamente pactuada, é vedada a capitalização mensal dos juros, somente
admitida nos casos previstos em lei, hipótese diversa dos autos. Incidência do art.
4º do Decreto n. 22.626/1933 e da Súmula n. 121-STF.
VI. Admite-se a repetição do indébito ou a compensação de valores pagos em
virtude de cláusulas ilegais, em razão do princípio que veda o enriquecimento
injustificado do credor.
VII. Recurso especial conhecido em parte e parcialmente provido. (REsp n.
528.530-RS, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior) (fls.288)
Embargos admitidos (fls. 298).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Fernando Gonçalves (Relator): A irresignação merece
acolhida, dado que o entendimento da Segunda Seção é no mesmo sentido
preconizado pelo recorrente:
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
419
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Embargos de divergência. Relação de consumo. Revisão de ofício do contrato,
para anular as cláusulas abusivas. Impossibilidade. Orientação da 2ª Seção.
- Não é lícito ao STJ rever de ofício o contrato, para anular cláusulas
consideradas abusivas com base no art. 51, IV, do CDC. (EREsp n. 702.524-RS, Rel.
Min. Nancy Andrighi, Rel. p/ Acórdão Min. Humberto Gomes de Barros, Segunda
Seção, DJU de 9.10.2006).
Recurso especial. Ação revisional. Contrato de arrendamento mercantil.
Descaracterização. Exame de ofício. Juros remuneratórios. Capitalização mensal.
- Descaracterização do contrato. Incidência do Verbete n. 293 da Súmula-STJ.
- Exame de ofício de cláusulas contratuais pelo Tribunal de origem.
Impossibilidade, por ofensa ao art. 515 do CPC. Princípio tantum devolutum
quantum appellatum. Precedentes.
- Não estando as instituições financeiras sujeitas à limitação da Lei de Usura,
a abusividade da pactuação dos juros remuneratórios deve ser cabalmente
demonstrada em cada caso, com a comprovação do desequilíbrio contratual ou
de lucros excessivos, sendo insuficiente o só fato de a estipulação ultrapassar 12%
ao ano ou de haver estabilidade inflacionária no período (REsp’s n. 271.214-RS, n.
407.097-RS e n. 420.111-RS).
- Capitalização mensal. Inadmissibilidade na hipótese.
- Recurso parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido. (REsp n. 541.153RS, Rel. Ministro Cesar Asfor Rocha, Segunda Seção, DJU de 14.9.2005)
Ante o exposto, conheço dos embargos e lhes dou provimento para afastar
da condenação a repetição de indébito.
RECURSO ESPECIAL N. 541.153-RS (2003/0073220-8)
Relator: Ministro Cesar Asfor Rocha
Recorrente: BCN Leasing Arrendamento Mercantil S/A
Advogado: Pedro Castiglia Netto e outros
Recorrido: Urgeped Clínica de Atendimento Infantil
Advogado: Irapuan Indio da Costa e outros
420
SÚMULAS - PRECEDENTES
EMENTA
Recurso especial. Ação revisional. Contrato de arrendamento
mercantil. Descaracterização. Exame de ofício. Juros remuneratórios.
Capitalização mensal.
- Descaracterização do contrato. Incidência do Verbete n. 293 da
Súmula-STJ.
- Exame de ofício de cláusulas contratuais pelo Tribunal de
origem. Impossibilidade, por ofensa ao art. 515 do CPC. Princípio
tantum devolutum quantum appelattum. Precedentes.
- Não estando as instituições financeiras sujeitas à limitação da
Lei de Usura, a abusividade da pactuação dos juros remuneratórios
deve ser cabalmente demonstrada em cada caso, com a comprovação
do desequilíbrio contratual ou de lucros excessivos, sendo insuficiente o
só fato de a estipulação ultrapassar 12% ao ano ou de haver estabilidade
inflacionária no período (REsp’s n. 271.214-RS, n. 407.097-RS e n.
420.111-RS).
- Capitalização mensal. Inadmissibilidade na hipótese.
- Recurso parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, na
conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade,
conhecer em parte do recurso, e nesta parte lhe dar provimento, nos termos
do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Aldir Passarinho Junior,
Jorge Scartezzini, Nancy Andrighi, Castro Filho, Barros Monteiro e Humberto
Gomes de Barros votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausentes, justificadamente, o Sr. Ministro Fernando Gonçalves e,
ocasionalmente, o Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro.
Brasília (DF), 8 de junho de 2005 (data do julgamento).
Ministro Cesar Asfor Rocha, Relator
DJ 14.9.2005
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
421
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha: Urgeped Clínica de Atendimento Infantil
ajuizou ação revisional contra BCN Leasing Arrendamento Mercantil S/A.
Julgado improcedente o pedido, a autora apelou, pleiteando a revisão das
cláusulas relativas aos juros e à capitalização.
A egrégia Décima Quarta Câmara Cível do TJRS deu provimento ao
recurso, com disposições de ofício, em acórdão assim sumariado:
Apelação cível. Arrendamento mercantil. Ação de revisão contratual. Aplicação
do Código de Defesa do Consumidor, possibilidade de revisão do contrato e
declaração ex officio da nulidade de cláusulas abusivas.
Nulidade de cláusulas abusivas. O Código de Defesa do Consumidor é norma
de ordem pública, que autoriza a revisão contratual e a declaração de nulidade de
pleno direito de cláusulas contratuais abusivas, o que pode ser feito até mesmo
de ofício pelo Poder Judiciário.
Descaracterização do contrato. O pagamento antecipado do VRG
descaracteriza o contrato de arrendamento mercantil para compra e venda a
prestações. Disposição de ofício.
Limitação dos juros. Sendo inadmissível a excessiva onerosidade do contrato,
a cobrança de juros abusivos é nula, especialmente em período de estabilidade
econômica. Juros limitados em 12% ao ano. Aplicação do art. 51, IV, do CDC.
Capitalização de juros. O anatocismo é vedado em contratos da espécie, por
ausência de permissão legal, ainda que expressamente convencionado.
Comissão de permanência. É vedada a cumulação de correção monetária
com comissão de permanência. Súmula 30, STJ. Também proibida a cobrança de
comissão de permanência na exata interpretação dos arts. 115 do CC e 51, IV, do
CDC. Disposição de ofício.
Correção monetária. O IGP-M é o índice que melhor recompõe as perdas
ocasionadas pela inflação. Disposição de ofício.
Inexistência de mora debendi. Sendo o contrato abusivo e estando ele eivado
de nulidades decorrentes de cláusulas ilegais e abusivas, não se constitui
validamente a mora debendi, já que os valores cobrados não são efetivamente
devidos. Em decorrência, não há incidência de encargos moratórios. Disposição
de ofício.
Multa. Limitada em 2%, nos termos da Lei n. 9.298/1996, a partir de 1º.8.1996, e
calculada sobre o valor da prestação. Disposição de ofício.
Juros de mora. Limitados em 1% ao ano, nos termos do art. 5º do Dec. n.
22.626/1933. Disposição de ofício.
Apelação provida, com disposições de ofício. (fl. 126).
422
SÚMULAS - PRECEDENTES
Os embargos de declaração não foram conhecidos, com imposição de
multa. Daí a interposição desse recurso especial (art. 105, III, a e c, da CF) por
BCN Leasing Arrendamento Mercantil.
Em síntese, alega violação dos arts. 535, II, do CPC, 145, 146, 151, 955,
960, 965, 1.009 e 1.010 do CCB. Insurge-se contra a descaracterização do
contrato, a limitação dos juros remuneratórios e o afastamento da capitalização
e da cobrança da comissão de permanência. Sustenta que o julgamento de ofício
afronta os arts. 128, 460 e 515 do CPC. Argumenta que é descabida a repetição
do indébito/compensação. Sustenta que a mora está caracterizada.
As contra-razões foram apresentadas (fls. 205-218).
Admitido o recurso, vieram-me os autos.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha (Relator): Eventual violação do art.
535, II, do CPC fica superada tendo em conta o que segue. Acrescento que a
recorrente não se insurgiu contra a aplicação da multa.
A egrégia Câmara não deferiu a repetição do indébito e a compensação,
razão por que, no ponto, não há interesse em recorrer.
O recurso prospera no que se refere à não-descaracterização do contrato,
ao exame de ofício de cláusulas contratuais e a não-limitação dos juros
remuneratórios.
Com efeito, nos termos do Verbete n. 293 da Súmula do STJ, “a cobrança
antecipada do Valor Residual Garantido (VRG) não descaracteriza o contrato
de arrendamento mercantil.”
Relativamente ao exame de ofício, conquanto existam decisões favoráveis
a que o Julgador examine cláusulas contratuais em relação as quais não
tenha havido insurgência, por aplicação do art. 51 do Código de Defesa do
Consumidor, tenho que o entendimento que deve prevalecer é o já assentado na
egrégia Terceira Turma.
Assim, não se tratando de questões relacionadas às condições da ação,
as matérias que não foram objeto da apelação não podem ser examinadas
pelo Tribunal. Nesse sentido foram julgados os REsp’s n. 258.426-RS (DJ
20.8.2001) e n. 726.517-RS (DJ 31.3.2005), ambos da relatoria do eminente
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
423
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Ministro Carlos Alberto Menezes Direito e o REsp n. 726.141-RS, relatado
pelo eminente Ministro Humberto Gomes de Barros, DJ 29.3.2005. Cito, ainda,
o REsp n. 248.155-SP, relatado pelo eminente Ministro Sálvio de Figueiredo
Teixeira, DJ 7.8.2000, cuja judiciosa fundamentação restou assim sumariada:
Processual Civil. Apelação. Princípio devolutivo. Inocorrência de impugnação.
Multa. Redução a 2%. Contrato anterior à vigência da nova redação do art. 51
do Código de Defesa do Consumidor. Impossibilidade de o Tribunal decidir de
ofício. Brocardo tantum devolutum quantum appellatum. Arts. 128, 460 e 515, CPC.
Recurso provido.
I - A extensão do pedido devolutivo se mede através da impugnação feita
pela parte nas razões do recurso, consoante enuncia o brocardo latino tantum
devolutum quantum appellatum.
II - A apelação transfere ao conhecimento do Tribunal a matéria impugnada,
nos limites dessa impugnação, salvo matérias examináveis de ofício pelo juiz.
III - Questão não refutada no recurso, que, pela natureza patrimonial do direito,
não pode ser decidida de ofício pelo Tribunal.
IV - Conquanto o CDC seja norma de ordem pública, não pode retroagir para
alcançar o contrato que foi celebrado e produziu seus efeitos na vigência da lei
anterior, sob pena de afronta ao ato jurídico perfeito.
No caso, ao julgar de ofício os encargos do contrato, inclusive no que se
refere à comissão de permanência, a egrégia Câmara violou o art. 515 do CPC.
No que tange aos juros remuneratórios, é de se acolher a irresignação, já
que o entendimento do STJ é no sentido de que, embora certa a incidência do
Código de Defesa do Consumidor nos contratos bancários, a abusividade da
pactuação dos juros remuneratórios deve ser cabalmente demonstrada em cada
caso, com a comprovação do desequilíbrio contratual ou de lucros excessivos,
sendo insuficiente o só fato de a estipulação ultrapassar 12% ao ano ou de haver
estabilidade inflacionária no período. Assim tem sido repetidamente decidido
desde o julgamento dos REsp’s n. 271.214-RS, n. 407.097-RS e n. 420.111-RS,
pela egrégia Segunda Seção, entendimento que deu ensejo à edição do Verbete
n. 296 da Súmula desta Corte.
A capitalização mensal, matéria acerca da qual não houve exame de ofício,
é de ser inadmitida na hipótese. Isso porque, embora a orientação firmada
na Segunda Seção a partir do julgamento do REsp n. 602.068-RS (relator o
eminente Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, DJ 21.3.2005) seja no sentido
de que é possível a pactuação de capitalização mensal, essa contratação só é
admitida para contratos firmados posteriormente à edição da MP n. 1.963. O
424
SÚMULAS - PRECEDENTES
caso em exame trata de contrato firmado em setembro de 1995, razão por que
não se aplica a nossa jurisprudência.
Dessarte, conheço em parte do recurso e, nessa extensão, dou-lhe
provimento, para afastar a descaracterização do contrato e as disposições de
ofício constantes do acórdão recorrido, bem como admitir a cobrança dos juros
remuneratórios à taxa pactuada até o vencimento do contrato. Tendo em conta
a sucumbência recíproca, arcará a recorrente com 25% das custas processuais e a
recorrida, com 75%, além dos honorários advocatícios, que fixo em R$ 400,00, já
efetuada a devida compensação.
RECURSO ESPECIAL N. 1.042.903-RS (2008/0065702-7)
Relator: Ministro Massami Uyeda
Recorrente: BV Financeira SA Credito Financiamento e Investimento
Advogado: Eduardo Borges de Freitas e outro(s)
Recorrido: Guaraci Ferreira da Silva
Advogado: Oscar L. Campos
EMENTA
Recurso especial. Ação revisional de contrato de financiamento
bancário. Nulidade de cláusulas abusivas. Declaração de
ofício. Impossibilidade. Limitação dos juros remuneratórios.
Inadmissibilidade. Comissão de permanência. Licitude na cobrança,
não cumulada com os demais encargos da mora, correção monetária
e juros remuneratórios e limitada à taxa de juros prevista no contrato
para o período da normalidade. Inclusão do nome do devedor em
cadastro de inadimplentes. Legalidade. Manutenção na posse do bem.
Impossibilidade. Recurso especial parcialmente provido.
I - É vedado o reconhecimento, de ofício, da nulidade de cláusulas
contratuais consideradas abusivas;
II - Não incide a limitação dos juros remuneratórios a 12% ao
ano, salvo hipóteses legais específicas;
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
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SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
III - É lícita a inclusão do nome do devedor em cadastro de
inadimplentes, caso não sejam preenchidos os requisitos autorizadores
do cancelamento da inscrição;
IV - Admite-se a cobrança da comissão de permanência, após o
vencimento da dívida, desde que não acrescida de juros remuneratórios
e de encargos decorrentes da mora;
V - Afasta-se a mora debendi pela cobrança de encargos ilegais no
período da normalidade, hipótese não verificada nos autos, devendo
ser revogada a liminar de manutenção na posse do bem;
VI - Recurso Especial parcialmente provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça,
na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, a Turma, por
unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe parcial provimento, nos
termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Sidnei Beneti, Ari
Pargendler e Nancy Andrighi votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 3 de junho de 2008 (data do julgamento).
Ministro Massami Uyeda, Relator
DJe 20.6.2008
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Massami Uyeda: Cuida-se de recurso especial interposto
pela BV Financeira SA Credito Financiamento e Investimento (art. 105, III, alíneas
a e c, da Constituição Federal) em que se alega ofensa aos artigos 4º, IX, e 9º
da Lei n. 4.595/1964; 515 do CPC; 397, 397 e 877 do Código Civil; e 2º do
Decreto-Lei n. 911/1969, além de dissídio jurisprudencial.
Os elementos dos autos dão conta de que a ação revisional de contrato de
alienação fiduciária em garantia ajuizada pelo recorrido em face da recorrente
restou julgada procedente, em primeiro grau de Jurisdição, para limitar os
juros remuneratórios a 12% ao ano, admitir a capitalização anual dos juros,
fixar a correção monetária pelo IGP-M e afastar a cobrança da comissão de
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SÚMULAS - PRECEDENTES
permanência (fls. 106-111). Interposto recurso de apelação pela instituição
financeira, o egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul
conferiu-lhe parcial provimento, para admitir a capitalização de juros na forma
pactuada. Manteve a antecipação de tutela no sentido de vedar a inscrição do
nome do devedor no cadastro de inadimplentes e manter o bem na posse do
devedor. E, de ofício, fixou a multa moratória em 2% sobre o valor da parcela
inadimplida, afastou a mora debendi e seus encargos consectários, declarou
nulas as tarifas de cobrança e de taxa de abertura de crédito e admitiu a
repetição do indébito (fls. 156-171). Opostos embargos infringentes em relação
às disposições de ofício, foram eles desacolhidos.
Busca a recorrente a reforma do decisum, insurgindo-se, em síntese, contra
as disposições de ofício do Tribunal a quo acerca das cláusulas do contrato de
mútuo em tela, bem como a limitação dos juros remuneratórios, o afastamento
da comissão de permanência e a manutenção das tutelas antecipadas (fls. 204224).
O recorrido não apresentou contra-razões (fl. 245), recebendo o recurso
juízo positivo de admissibilidade do egrégio Tribunal de Justiça do Estado do
Rio Grande do Sul (fls. 246-247).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Massami Uyeda (Relator): O recurso especial merece
parcial provimento.
Com efeito.
Na realidade, o entendimento mais recente desta egrégia Corte é no
sentido da impossibilidade do reconhecimento, de ofício, de nulidade de
cláusulas contratuais consideradas abusivas, sendo, para tanto, necessário o
pedido expresso da parte interessada (ut REsp n. 612.470-RS, relatora Ministra
Nancy Andrighi, DJ 30.6.2006). Assinala-se, ainda, que, nos termos do artigo
515 do Código de Processo Civil, excetuando-se as matérias de ordem pública,
examináveis de ofício, o recurso de apelação devolve para o Órgão ad quem a
matéria impugnada, que se restringirá aos limites dessa impugnação.
Afere-se, na espécie, ter o Órgão prolator da decisão recorrida proferido
julgamento extra petita, porquanto enfrentou questões atinentes a direito
patrimonial, que não constituíram objeto de insurgência. Dessa forma, devem
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
427
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
ser afastadas as disposições ex officio do v. acórdão recorrido acerca da limitação
da multa moratória em 2% sobre o valor da parcela em atraso, do afastamento
da mora e seus consectários, da nulidade da cobrança das tarifas e das taxas de
abertura de crédito, e da possibilidade de repetição do indébito.
Em referência aos juros remuneratórios, a Segunda Seção deste egrégio
Superior Tribunal entende que não incide a limitação a 12% ao ano, prevista
no Decreto n. 22.626/1933, salvo hipóteses legais específicas, visto que as
instituições financeiras, integrantes do Sistema Financeiro Nacional, são
regidas pela Lei n. 4.595/1964. Nota-se que cabe ao Conselho Monetário
Nacional limitar tais encargos, aplicando-se a Súmula n. 596 do STF. Vejase, mais, que este entendimento não foi alterado após a vigência do Código
de Defesa do Consumidor, cujas normas também se aplicam aos contratos
firmados por instituições bancárias. E a fim de se harmonizarem os referidos
diplomas legais, aquele Órgão Julgador consagrou a manutenção dos juros no
percentual avençado pelas partes, desde que não reste sobejamente demonstrada
a exorbitância do encargo (ut AgRg no REsp n. 987.697-RS, relatora Ministra
Nancy Andrighi, DJ de 12.12.2007).
Ademais, a autorização do Conselho Monetário Nacional para a livre
contratação dos juros remuneratórios só se faz necessária em hipóteses
específicas, decorrentes de expressa exigência legal, tais como nas cédulas de
crédito rural, industrial ou comercial. Assim, resta dispensada a prova de prévia
autorização do CMN para fixar a taxa de juros além do patamar legal no caso
em concreto (v.g. AgRg nos EDcl no REsp n. 492.936-RS, Rel. Min. Antônio
de Pádua Ribeiro, DJ 22.11.2004).
No tocante à inclusão do nome do devedor nos cadastros restritivos de
crédito, veja-se que a compreensão atual deste colendo Superior Tribunal de
Justiça, baseado em recente julgamento efetuado pela Segunda Seção (REsp
n. 527.618-RS, relator Ministro Cesar Asfor Rocha) é de que: “o pedido em
procedimento judicial que busca o cancelamento ou a abstenção da inscrição
do nome do devedor em cadastro de proteção ao crédito (SPC, Cadin, Serasa
e outros) deve ser deferido com cautela, ao prudente arbítrio do juiz, sendo
indispensável a existência de prova inequívoca ou da verossimilhança do direito
alegado, ou ainda, da fumaça do bom direito, consubstanciados na presença
concomitante de três elementos: a) a existência de ação proposta pelo devedor,
contestando a existência integral ou parcial do débito; b) a efetiva demonstração
de que a cobrança indevida se funda em jurisprudência consolidada do Supremo
Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça; c) o depósito do valor
referente à parte incontroversa do débito ou que seja prestada caução idônea”.
428
SÚMULAS - PRECEDENTES
Os elementos constantes dos autos não demonstram a presença
concomitante dos mencionados requisitos autorizadores do cancelamento dos
registros, pois não há notícia de que tenha havido o depósito, ou que tenha sido
prestada caução idônea da parte incontroversa do débito, o que possibilita a
pretendida inclusão (cfr: REsp n. 880.230-RS, relator Ministro Carlos Alberto
Menezes Direito, DJ de 6.10.2006; Ag n. 790.510-RS, relator Ministro Aldir
Passarinho Júnior, DJ de 27.9.2006 e REsp n. 825.701-RS, relator Ministro
Cesar Asfor Rocha, DJ de 5.5.2006).
Quanto à questão da mora, o posicionamento perfilhado por esta Corte,
em uniformização jurisprudencial, é no sentido de sua descaracterização apenas
no caso de cobrança de encargos ilegais no período da normalidade (ut REsp n.
1.044.157-RS, relatora Ministra Nancy Andrighi, DJ de 16.4.2008), o que, na
espécie, não restou consubstanciado.
Desse modo, caracterizada a mora debendi, pelo inadimplemento
da obrigação, deve, por consectário lógico, ser revogada a liminar deferida
no sentido de manter o bem na posse do devedor. Nesse sentido: REsp n.
1.037.719-RS, relatora Ministra Nancy Andrighi, DJ de 12.5.2008; e REsp n.
799.638-RS, relator Ministro Sidnei Beneti, DJ de 12.5.2008.
Relativamente à comissão de permanência, o entendimento predominante
nesta Turma é no sentido de ser lícita a sua cobrança após o vencimento da
dívida. A comissão deve observar a taxa média dos juros de mercado, apurada
pelo Banco Central do Brasil, limitada à taxa de juros prevista para o período da
normalidade, não podendo, entretanto, ser cumulada com a correção monetária
nem com os juros remuneratórios, nos termos das Súmulas n. 30, n. 294 e n.
296 do STJ. De acordo com entendimento desta Seção, ainda, a cobrança da
comissão de permanência não pode ser acrescida dos encargos decorrentes da
mora, como os juros moratórios e a multa contratual (c.f. AgRg no REsp n.
712.801-RS, Rel. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 4.5.2005).
Presente a incidência de quaisquer desses encargos após a caracterização
da mora, devem ser afastados, mantendo-se tão-somente a comissão de
permanência (cfr: AgRg no AgRg no REsp n. 805.874-RS, relator Ministro
Aldir Passarinho Júnior, DJ de 19.6.2006 e AgRg no REsp n. 828.290-RS,
relatora Ministra Nancy Andrighi, DJ de 26.6.2006), o que torna, inclusive,
prejudicada a análise de quaisquer desses encargos.
Assim sendo, dá-se parcial provimento ao recurso especial, para afastar
a declaração de ofício da nulidade das cláusulas contratuais, validar os juros
remuneratórios contratados, permitir a cobrança da comissão de permanência,
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
429
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
à taxa média de mercado, limitada à taxa do contrato prevista para o período da
normalidade, não cumulada com os juros remuneratórios, a multa contratual, os
juros de mora e a correção monetária, e revogar os efeitos das tutelas anteriormente
deferidas, no sentido de possibilitar a inclusão do nome do devedor em cadastro
de inadimplentes e de não manter o devedor na posse do bem.
Em razão da sucumbência recíproca, as partes arcarão com as custas e
os honorários advocatícios, na proporção de 10% pela recorrente e 90% pelo
recorrido, estes últimos nos moldes fixados no v. acórdão recorrido, admitindo-se
a compensação, nos termos da lei. Por ser o recorrido beneficiário da assistência
judiciária gratuita (fl. 25-verso), fica suspensa a exigibilidade das custas judiciais
e dos honorários advocatícios, nos termos do art. 12 da Lei n. 1.060/1950.
É o voto.
RECURSO ESPECIAL N. 1.061.530-RS (2008/0119992-4)
Relatora: Ministra Nancy Andrighi
Recorrente: Unibanco União de Bancos Brasileiros S/A
Advogados: Mariane Cardoso Macarevich e outro(s)
Luciano Corrêa Gomes
Recorrido: Rosemari dos Santos Sanches
Advogado: Mauro Trápaga Teixeira
EMENTA
Direito Processual Civil e Bancário. Recurso especial. Ação
revisional de cláusulas de contrato bancário. Incidente de processo
repetitivo. Juros remuneratórios. Configuração da mora. Juros
moratórios. Inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes.
Disposições de ofício.
Delimitação do Julgamento
Constatada a multiplicidade de recursos com fundamento em
idêntica questão de direito, foi instaurado o incidente de processo
430
SÚMULAS - PRECEDENTES
repetitivo referente aos contratos bancários subordinados ao Código
de Defesa do Consumidor, nos termos da ADI n. 2.591-1. Exceto:
cédulas de crédito rural, industrial, bancária e comercial; contratos
celebrados por cooperativas de crédito; contratos regidos pelo Sistema
Financeiro de Habitação, bem como os de crédito consignado.
Para os efeitos do § 7º do art. 543-C do CPC, a questão de
direito idêntica, além de estar selecionada na decisão que instaurou o
incidente de processo repetitivo, deve ter sido expressamente debatida
no acórdão recorrido e nas razões do recurso especial, preenchendo
todos os requisitos de admissibilidade.
Neste julgamento, os requisitos específicos do incidente foram
verificados quanto às seguintes questões: i) juros remuneratórios; ii)
configuração da mora; iii) juros moratórios; iv) inscrição/manutenção
em cadastro de inadimplentes e v) disposições de ofício.
Preliminar
O Parecer do MPF opinou pela suspensão do recurso até o
julgamento definitivo da ADI n. 2.316-DF. Preliminar rejeitada ante
a presunção de constitucionalidade do art. 5º da MP n. 1.963-17/00,
reeditada sob o n. 2.170-36/01.
I - Julgamento das questões idênticas que caracterizam a
multiplicidade.
Orientação 1 - Juros remuneratórios
a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros
remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto n. 22.626/1933),
Súmula n. 596-STF;
b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao
ano, por si só, não indica abusividade;
c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de
mútuo bancário as disposições do art. 591 c.c. o art. 406 do CC/2002;
d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em
situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo
e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem
exagerada – art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada,
ante às peculiaridades do julgamento em concreto.
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
431
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Orientação 2 - Configuração da Mora
a) O reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos
no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e
capitalização) descarateriza a mora;
b) Não descaracteriza a mora o ajuizamento isolado de ação
revisional, nem mesmo quando o reconhecimento de abusividade
incidir sobre os encargos inerentes ao período de inadimplência
contratual.
Orientação 3 - Juros Moratórios
Nos contratos bancários, não-regidos por legislação específica,
os juros moratórios poderão ser convencionados até o limite de 1%
ao mês.
Orientação 4 - Inscrição/Manutenção em Cadastro de
Inadimplentes
a) A abstenção da inscrição/manutenção em cadastro de
inadimplentes, requerida em antecipação de tutela e/ou medida
cautelar, somente será deferida se, cumulativamente: i) a ação for
fundada em questionamento integral ou parcial do débito; ii) houver
demonstração de que a cobrança indevida se funda na aparência do
bom direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; iii)
houver depósito da parcela incontroversa ou for prestada a caução
fixada conforme o prudente arbítrio do juiz;
b) A inscrição/manutenção do nome do devedor em cadastro de
inadimplentes decidida na sentença ou no acórdão observará o que
for decidido no mérito do processo. Caracterizada a mora, correta a
inscrição/manutenção.
Orientação 5 - Disposições de Ofício
É vedado aos juízes de primeiro e segundo graus de Jurisdição
julgar, com fundamento no art. 51 do CDC, sem pedido expresso, a
abusividade de cláusulas nos contratos bancários. Vencidos quanto a
esta matéria a Min. Relatora e o Min. Luis Felipe Salomão.
II - Julgamento do Recurso Representativo (REsp n. 1.061.530-RS)
432
SÚMULAS - PRECEDENTES
A menção a artigo de lei, sem a demonstração das razões de
inconformidade, impõe o não-conhecimento do recurso especial, em
razão da sua deficiente fundamentação. Incidência da Súmula n. 284STF.
O recurso especial não constitui via adequada para o exame de
temas constitucionais, sob pena de usurpação da competência do STF.
Devem ser decotadas as disposições de ofício realizadas pelo
acórdão recorrido.
Os juros remuneratórios contratados encontram-se no limite
que esta Corte tem considerado razoável e, sob a ótica do Direito do
Consumidor, não merecem ser revistos, porquanto não demonstrada a
onerosidade excessiva na hipótese.
Verificada a cobrança de encargo abusivo no período da
normalidade contratual, resta descaracterizada a mora do devedor.
Afastada a mora: i) é ilegal o envio de dados do consumidor
para quaisquer cadastros de inadimplência; ii) deve o consumidor
permanecer na posse do bem alienado fiduciariamente e iii) não se
admite o protesto do título representativo da dívida.
Não há qualquer vedação legal à efetivação de depósitos parciais,
segundo o que a parte entende devido.
Não se conhece do recurso quanto à comissão de permanência,
pois deficiente o fundamento no tocante à alínea a do permissivo
constitucional e também pelo fato de o dissídio jurisprudencial não
ter sido comprovado, mediante a realização do cotejo entre os julgados
tidos como divergentes. Vencidos quanto ao conhecimento do recurso
a Min. Relatora e o Min. Carlos Fernando Mathias.
Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, provido,
para declarar a legalidade da cobrança dos juros remuneratórios, como
pactuados, e ainda decotar do julgamento as disposições de ofício.
Ônus sucumbenciais redistribuídos.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda
Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
433
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer em parte do recurso
especial e, nessa parte, dar-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra
Relatora, acompanhada pelos Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Sidnei
Beneti, Luis Felipe Salomão, Carlos Fernando Mathias, Fernando Gonçalves
e Aldir Passarinho Junior; salvo em relação às disposições de ofício, vencidos a
Ministra Relatora e o Ministro Luis Felipe Salomão, e quanto à comissão de
permanência, vencidos no conhecimento a Ministra Relatora e o Ministro Carlos
Fernando Mathias. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Massami Uyeda.
Brasília (DF), 22 de outubro de 2008 (data do julgamento).
Ministra Nancy Andrighi, Relatora
DJe 10.3.2009
QUESTÃO DE ORDEM
VOTO
O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior: Entendo que a sustentação oral
deve se restringir à dos ilustres advogados das partes.
QUESTÃO DE ORDEM
VOTO
O Sr. Ministro Fernando Gonçalves: Sr. Presidente, se há manifestação
escrita e por se tratar de um processo em que se vai apenas consolidar teses que
já estão, ao longo do tempo, sendo acatadas por todos os Membros da Seção,
não vejo razão para que haja sustentação oral, além das duas partes envolvidas.
Com a vênia devida da Sra. Ministra Relatora, indefiro, no sentido de
admitir somente a sustentação oral das partes.
RELATÓRIO
A Sra. Ministra Nancy Andrighi: Trata-se de recurso especial interposto
por Unibanco - União Brasileira de Bancos S.A., com fundamento nas alíneas a
e c do permissivo constitucional, contra acórdão proferido pelo TJ-RS.
434
SÚMULAS - PRECEDENTES
Ação: Rosemari dos Santos Sanches ajuizou ação de revisão contratual em
face do Unibanco – União Brasileira de Bancos S.A., alegando, em síntese, que
adquiriu uma motocicleta mediante financiamento concedido pela instituição
financeira recorrente. Obteve o empréstimo de R$ 4.980,00 (quatro mil,
novecentos e oitenta reais) para pagamento em 36 parcelas de R$ 249,48
(duzentos e quarenta e nove reais e quarenta e oito centavos).
Com base em precedente desta Corte (REsp n. 213.825-RS, Quarta
Turma, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha), a recorrida sustentou na inicial que “todas
as vezes que a contratação dos juros remuneratórios se apresente excessivamente
onerosa, em percentual caracterizadamente abusivo, por extrapolar os padrões
da conjuntura econômica pátria (...), pode ser aplicada a norma protetora
do consumidor, com o fito de coibirem-se intoleráveis abusos por parte das
instituições financeiras”.
Além de insurgir-se contra os juros remuneratórios, que considerou
excessivamente onerosos, pleiteou o afastamento da capitalização de juros, da
cobrança da comissão de permanência e da inclusão de seu nome em cadastro
de inadimplentes. Aventou a possibilidade de realizar o depósito da quantia
que entende devida, qual seja R$ 2.509,15 (dois mil quinhentos e nove reais e
quinze centavos), em 23 prestações de R$ 122,66 (cento e vinte e dois reais e
sessenta e seis centavos).
Ao final, requereu que fosse: (i) mantida na posse da motocicleta; (ii)
impedida a inscrição de seu nome em cadastro de inadimplentes, como Serasa,
SPC, Cartório de Protestos e Central de Risco do Banco Central; (iii) autorizada
a realizar o depósito da quantia incontroversa; (iv) apresentada pelo banco cópia
do contrato celebrado entre as partes; (v) declarada a nulidade das cláusulas que
contrariam a lei; (vi) estipulada a aplicação de juros remuneratórios de 12% ao
ano e (vii) excluída a capitalização mensal.
Sentença: Considerou que a taxa mensal de juros remuneratórios de
2,5654% ao mês era abusiva, razão pela qual a reduziu para 1% ao mês, afastando,
ainda, “a cobrança da comissão de permanência, que deverá ser substituída pelo
IGPM, e determinando a capitalização anual dos juros” (fls. 63).
Acórdão: O Tribunal de origem negou provimento à apelação interposta
pela instituição financeira, afastando, de ofício, a cobrança de certos encargos, tal
como resumido na seguinte ementa:
Ação revisional. Negócios jurídicos bancários. Alienação fiduciária. Aplicação
do CDC. Juros remuneratórios. Capitalização. Comissão de permanência. Índice
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
435
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
de atualização monetária. Encargos moratórios. Compensação e/ou repetição
do indébito. Cláusula de emissão de título de crédito. Tarifa de abertura de
crédito. Emissão de boleto bancário. Cadastro de restrição ao crédito. Protesto
de título. Manutenção na posse do bem. Autorização para depósito. Honorários
advocatícios.
1. Aplicação do CDC. O Código de Defesa do Consumidor implementou uma
nova ordem jurídica, viabilizando a revisão contratual e a declaração de nulidade
absoluta das cláusulas abusivas, o que pode ser feito inclusive de ofício pelo
Poder Judiciário.
2. Juros remuneratórios. É nula a taxa de juros remuneratórios em percentual
superior a 12% ao ano porque acarreta excessiva onerosidade ao devedor em
desproporção à vantagem obtida pela instituição credora, por aplicação do art.
51, IV, do CDC.
3. Capitalização. A capitalização dos juros é vedada em contratos da espécie,
por ausência de permissão legal, ainda que expressamente convencionado.
4. Índice de atualização monetária. Cabimento. Adoção do IGP-M para
atualização do valor da moeda. Disposição de ofício.
5. Comissão de permanência. É vedada a comissão de permanência por
cumulada com juros remuneratórios e correção monetária.
6. Encargos moratórios 6.1. Juros moratórios. Contemplados no contrato em 1%
ao mês e mantidos, vedada a cumulação com juros remuneratórios e multa. 6.2.
Multa contratual. Contemplada no contrato à taxa de 2% e mantida. Deve incidir
sobre a parcela efetivamente em atraso e não sobre a totalidade do débito. 6.3.
Mora do devedor. Por ter sido elidida a mora debendi, não há exigir os encargos
moratórios. Esses são exigíveis tão-só quando constituído em mora o devedor.
Disposição de ofício.
7. Compensação e/ou repetição do indébito. Após a compensação, e na
eventualidade de sobejar saldo em seu favor do devedor, é admitida a repetição
simples, afastada a previsão contida no parágrafo único do art. 42 do CDC.
Disposição de ofício.
8. Cláusula de emissão de título de crédito. A cláusula que prevê emissão
de título de crédito configura nulidade pela abusividade que ostenta ou pela
excessiva outorga de poderes conferida ao credor ou pelo excesso de garantia.
Disposição de ofício.
9. Tarifa de emissão de boleto bancário. A emissão de qualquer carnê ou boleto
para pagamento é obrigação do credor não devendo ensejar ônus algum ao
devedor, já que os arts. 319 do Código Civil/2002 e art. 939 do Código Civil/1916,
não trazem no seu bojo a condição de pagamento em dinheiro para ele receber o
que lhe é de direito. Disposição de ofício.
10. Taxa de abertura de crédito. Além de atender interesse exclusivo do
mutuante, essa cláusula contratual contraria o disposto no art. 46, parte final,
do Código de Defesa do Consumidor, pois não fornece ao mutuário todas as
informações sobre sua finalidade e alcance. Disposição de ofício.
436
SÚMULAS - PRECEDENTES
11. Cadastro de crédito. Inscrição negativa. Discussão da dívida que revela
probabilidade, ainda que mínima, de sucesso do devedor. Inveracidade de dados
e constrangimento desnecessário vedados no CDC.
12. Protesto do título. Na medida em que o devedor possui argumentos que
fragilizam o negócio subjacente, podendo ser excluídos juros e taxas consideradas
abusivas, o protesto revela-se ato temerário e que somente virá em prejuízo do
devedor, sem qualquer repercussão jurídica de monta para o credor.
13. Manutenção de posse. É de ser mantido o devedor na posse do bem
alienado fiduciariamente enquanto pendente pleito revisional.
14. Autorização de depósitos. É possível a autorização para depósito de valores
que o autor entende devidos, enquanto pende de julgamento ação revisional de
cláusulas contratuais. 1
5. Honorários advocatícios. Redimensionados. Disposição de ofício.
Apelo desprovido, com disposições de ofício.
Recurso Especial: Sustentou haver violação aos arts. 5º da MP n.
2.170/1936; 4º do Decreto n. 22.626/1933; 6º, V, e 52, § 1o, do CDC; 3o, 4º,
VI e IX, da Lei n. 4.595/1964; 2º, 20, 128, 333, I, 460, 515, 890 e 925 do CPC;
188, 397, 406, 422, 478, 876 e 877 do CC/2002; 4º, § 2o, da Lei n. 9.507/1997;
14 da Lei n. 9.492/1997; 161 do CTN e ainda Resolução n. 1.129 do CMN.
Apontou, também, a existência de dissídio pretoriano. Afirma, ainda, haver
violação aos arts. 5º, XXXV, e 192, CF.
Recurso Extraordinário: Interposto pela recorrente com base em suposta
violação do art. 62 da CF/1988.
Juízo Prévio de Admissibilidade: Transcorrido o prazo legal sem que
fossem apresentadas contra-razões, foi o recurso especial admitido na origem
e considerado inepto o recurso extraordinário, ante a falta de demonstração da
repercussão geral.
Aplicação do art. 543-C do CPC: O Min. Ari Pargendler, considerando
a multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito,
afetou o julgamento do recurso especial à Segunda Seção desta Corte, conforme
o rito do art. 543-C do CPC.
Assim, foram suspensos os recursos relacionados a direito bancário e que
digam respeito a: a) juros remuneratórios; b) capitalização de juros; c) mora;
d) comissão de permanência; e) inscrição do nome do devedor em cadastros
de proteção ao crédito; f ) disposições de ofício no âmbito do julgamento da
apelação acerca de questões não devolvidas ao Tribunal.
Em cumprimento ao despacho de fls. 226, no qual o Min. Ari Pargendler
determinou a redistribuição deste processo, por prevenção, a um dos Ministros
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
437
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
que compõem a Terceira Turma do STJ, recaiu sobre mim a incumbência de
relatar o presente recurso.
Responderam aos ofícios expedidos com base no art. 3º, I, da Resolução
n. 8/2008 do STJ, as seguintes entidades: (i) a Ordem dos Advogados do Brasil
(fls. 286); (ii) o Banco Central do Brasil (fls. 288); (iii) a Febraban – Federação
Brasileira de Bancos e (iv) o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor –
IDEC, que trouxe pareceres de Cláudia Lima Marques e Cristiano Heineck
Schmitt.
Manifestaram-se espontaneamente: (i) a Defensoria Pública do Estado do
Rio de Janeiro; (ii) a Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor – ProconSP; (ii) o Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor –
FNECDC; (iii) a Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário
e Poupança – Abecip; (iv) a Serasa S/A, trazendo parecer de Luiz Rodrigues
Wambier e José Miguel Garcia Medina; (v) a Defensoria Pública da União,
cujas manifestações foram juntadas, por linha, ao processo e (vi) os professores
Romualdo Wilson Cançado e Orlei Claro de Lima.
Parecer do Ministério Público Federal: Por fim, o Ministério Público
Federal opinou às fls. 957-1.024, em parecer da lavra do i. SubprocuradorGeral da República, Dr. Aurélio Rios, sustentando questão de ordem para
que se delimitasse a matéria a ser julgada. No mérito, propugnou pela parcial
procedência do especial, tão-somente em relação à taxa de indexação dos juros
remuneratórios, ressalvada a aplicação das taxas médias de mercado.
É o relatório.
VOTO
A Sra. Ministra Nancy Andrighi (Relatora):
DELIMITAÇÃO DO JULGAMENTO
A natureza do procedimento do art. 543-C do CPC visa unificar o
entendimento e orientar a solução de recursos repetitivos.
No despacho que instaurou o incidente do processo repetitivo, o
relator originário, Min. Ari Pargendler, determinou que fossem suspensos
os processamentos dos recursos especiais que versassem sobre “as seguintes
matérias, quando ativadas em ações que digam respeito a contratos bancários: a) juros
remuneratórios; b) capitalização de juros; c) mora; d) comissão de permanência;
e) inscrição do nome do devedor em cadastros de proteção ao crédito; f )
438
SÚMULAS - PRECEDENTES
disposições de ofício no âmbito do julgamento da apelação acerca de questões
não devolvidas ao Tribunal” (fls. 224).
Apesar da aparente abrangência do termo “contratos bancários” do
despacho supratranscrito, constata-se que a característica da multiplicidade de
recursos especiais, exigida pelo art. 543-C do CPC, evidencia-se nos contratos
bancários que se submetem à legislação consumerista. Portanto, este julgamento
abordará, em quaisquer de suas modalidades, apenas os contratos de mútuo
bancário em que a relação de consumo esteja caracterizada, nos termos do
alcance da ADI n. 2.591-1, relator para acórdão o Min. Eros Grau.
Conforme estabelecido na referida ADI, aos bancos aplica-se o CDC,
norma “de ordem pública e interesse social” (art. 1º do CDC). Eis a ementa do
julgado em comento:
Art. 3º, § 2º, do CDC. Código de Defesa do Consumidor. Art. 5º, XXXII, da
CB/1988. Art. 170, V, da CB/1988. Instituições financeiras. Sujeição delas ao
Código de Defesa do Consumidor. Ação direta de inconstitucionalidade julgada
improcedente.
1. As instituições financeiras estão, todas elas, alcançadas pela incidência das
normas veiculadas pelo Código de Defesa do Consumidor.
2. “Consumidor”, para os efeitos do Código de Defesa do Consumidor, é toda
pessoa física ou jurídica que utiliza, como destinatário final, atividade bancária,
financeira e de crédito.
Ressalte-se, ainda, que esta 2ª Seção, sem discrepar deste entendimento,
tem reiteradamente aplicado este diploma às relações bancárias, conforme a
Súmula n. 297-STJ, inclusive à taxa de juros (conf. REsp n. 327.727-SP, 2ª
Seção, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha DJ 8.3.2004; REsp n. 402.261-RS, 2ª
Seção, Rel. p. Acórdão Min. Ari Pargendler, DJ 6.12.2004; REsp n. 291.575-RS,
2ª Seção, Rel. p. Acórdão Min. Ari Pargendler, DJ 6.12.2004; REsp n. 420.111RS, 2ª Seção, Rel. p. Acórdão Min. Ari Pargendler, DJ 6.10.2003; REsp n.
407.097-RS, 2ª Seção, Rel. p. Acórdão Min. Ari Pargendler, DJ 29.9.2003).
Registre-se que não se encontram abrangidas por esta decisão as Cédulas
de Crédito Rural, Industrial, Bancária e Comercial; os contratos celebrados por
cooperativas de crédito, os que se incluem sob a égide do Sistema Financeiro da
Habitação, bem como os que digam respeito a crédito consignado.
Por fim, em decisão colegiada, os Ministros da 2ª Seção consideraram que
os efeitos externos trazidos pelo art. 543-C, § 7º, do CPC somente atingiriam os
temas que, cumulativamente: i) estivessem previstos no despacho que instaurou
o presente incidente de processo repetitivo; ii) tivessem sido discutidos nas
razões do recurso especial e iii) conseguissem preencher todos os requisitos de
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
439
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
admissibilidade e fossem alvo de expressa manifestação desta 2ª Seção quanto
ao mérito recursal.
As demais questões trazidas no especial serão igualmente apreciadas
no exame do recurso representativo, mas as razões de decidir aqui declinadas
quanto a tais pontos não terão a aptidão de produzir os referidos efeitos externos
do art. 543-C, § 7º, do CPC.
PRELIMINAR
- Do pedido de suspensão do julgamento formulado pelo MPF.
Em seu parecer, o i. Subprocurador-Geral da República, Dr. Aurélio
Virgílio Veiga Rios, afirma que “o Superior Tribunal de Justiça não deve,
enquanto não julgada definitivamente a ADIn n. 2.316-DF, manifestar-se sobre
o tema capitalização mensal de juros” (fls. 989).
Entretanto, até que seja encerrado o julgamento do referido processo,
deve prevalecer a presunção de constitucionalidade do art. 5º da MP n. 1.96317/2000, reeditada sob o n. 2.170-36/2001, que admite a capitalização mensal
de juros nas operações realizadas por instituições financeiras.
O princípio da imperatividade assegura a auto-executoriedade das normas
jurídicas, dispensando prévia declaração de constitucionalidade pelo Poder
Judiciário. Ainda que esta presunção seja iuris tantum, a norma só é extirpada
do ordenamento com o reconhecimento de sua inconstitucionalidade. E essa
questão, na hipótese específica do art. 5º da MP n. 1.963-17/2000, ainda não foi
resolvida pelo STF, nem mesmo em sede liminar.
Logo, entende-se que não deve ser acolhido este pedido de suspensão do
julgamento.
JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE
CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE - ART. 543-C, § 7º, DO CPC
I - PERÍODO DA ADIMPLÊNCIA
1. JUROS REMUNERATÓRIOS
Juros remuneratórios são aqueles que representam o preço da
disponibilidade monetária, pago pelo mutuário ao mutuante, em decorrência do
negócio jurídico celebrado entre eles.
440
SÚMULAS - PRECEDENTES
1.1. Juros Remuneratórios Pactuados
O entendimento hoje vigente nesta 2ª Seção indica que a regra, no Sistema
Financeiro Nacional, é a liberdade na pactuação dos juros remuneratórios. Isso
implica, mais especificamente, reconhecer que:
(i) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros
remuneratórios que foi estipulada na Lei de Usura (Decreto n. 22.626/1933),
como já dispõe a Súmula n. 596-STF.
Inaplicabilidade da Lei de Usura.
Ministro Relator
Julgado
Órgão
Fernando Gonçalves
AgRg no REsp n. 1.041.086-RS, j. em 19.8.2008 4ª Turma
Aldir Passarinho Junior
REsp n. 680.237-RS, j. em 14.12.2005
Nancy Andrighi
AgRg no Ag n. 921.983-RJ, j. em 1º.4.2008
2ª Seção
3ª Turma
João Otávio de Noronha AgRg no Ag n. 888.492-SP, j. em 18.12.2007
4ª Turma
Massami Uyeda
REsp n. 1.036.474-RS, j. em 27.5.2008
3ª Turma
Sidnei Beneti
Ag n. 1.026.104-MG, DJe de 1º.8.2008
Unipessoal
Luis Felipe Salomão
REsp n. 1.007.071-RS , DJe de 27.8.2008
Unipessoal
Carlos Mathias
REsp n. 1.038.020-RS, DJe de 26.9.2008
Unipessoal
Ari Pargendler
REsp n. 402.261-RS, j. em 26.3.2003
2ª Seção
(ii) A simples estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao
ano não indica abusividade.
Não abusividade pela simples estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano.
Ministro Relator
Julgado
Órgão
Fernando Gonçalves
AgRg no REsp n. 913.609-RS, j. em 20.11.2007 4ª Turma
Aldir Passarinho Junior
AgRg no REsp n. 688.627-RS, j. em 17.3.2005 4ª Turma
Nancy Andrighi
REsp n. 715.894-PR, j. em 26.4.2006
2ª Seção
João Otávio de Noronha REsp n. 1.038.242-RS, DJe de 12.9.2008
Unipessoal
Massami Uyeda
REsp n. 1.042.903-RS, j. em 3.6.2008
3ª Turma
Sidnei Beneti
AgRg no REsp n. 879.902-RS, j. em 19.6.2008 3ª Turma
Luis Felipe Salomão
REsp n. 1.007.071-RS, DJe de 27.8.2008
Unipessoal
Carlos Mathias
REsp n. 1.038.020-RS, DJe de 26.9.2008
Unipessoal
Ari Pargendler
AgRg nos EDcl no REsp n. 681.411-RS, j. em 3ª Turma
27.9.2005
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
441
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
(iii) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo
bancário as disposições do art. 591 c.c. o art. 406 do CC/2002 (Único voto
encontrado: REsp n. 680.237-RS, 2ª Seção, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior,
DJ de 15.3.2006).
(iv) É inviável a utilização da Selic - taxa do Sistema Especial
de Liquidação e Custódia - como parâmetro de limitação de juros
remuneratórios.
Vedação da utilização da Taxa Selic para limitação dos juros remuneratórios.
Ministro Relator
Julgado
Órgão
Fernando Gonçalves
REsp n. 1.056.274-RS, DJe de 12.9.2008
Unipessoal
Aldir Passarinho Junior
REsp n. 915.572-RS, j. em 7.2.2008
4ª Turma
Nancy Andrighi
AgRg nos EDcl no REsp n. 808.324-RS, j. em 3ª Turma
9.5.2006
João Otávio de Noronha REsp n. 1.044.457-RS, DJe de 2.9.2008
Unipessoal
Massami Uyeda
AgRg no REsp n. 1.023.399-RS, j. em 13.5.2008 3ª Turma
Sidnei Beneti
REsp n. 1.055.002-RS, DJe de 1º.8.2008
Unipessoal
Luis Felipe Salomão
REsp n. 986.943-RS, DJe de 5.8.2008
Unipessoal
Carlos Mathias
REsp n. 919.838-RS, DJe de 26.9.2008
Unipessoal
Ari Pargendler
REsp n. 901.518-RS, DJe de 13.8.2008
Unipessoal
1.2. A Revisão dos Juros Remuneratórios Pactuados
Fixada a premissa de que, salvo situações excepcionais, os juros
remuneratórios podem ser livremente pactuados em contratos de empréstimo
no âmbito do Sistema Financeiro Nacional, questiona-se a possibilidade de o
Poder Judiciário exercer o controle da liberdade de convenção de taxa de juros
naquelas situações que são evidentemente abusivas.
A dificuldade do tema, que envolve o controle do preço do dinheiro é
enorme. Isso não é, entretanto, suficiente para revogar o art. 39, V, CDC, que
veda ao fornecedor, dentre outras práticas abusivas, “exigir do consumidor
vantagem manifestamente excessiva”, e o art. 51, IV, do mesmo diploma, que
torna nulas as cláusulas que “estabeleçam obrigações consideradas iníquas,
abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam
incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade”.
442
SÚMULAS - PRECEDENTES
As premissas básicas de solução foram lançadas no julgamento do REsp
n. 407.097-RS, DJ de 29.9.2003, quando a 2ª Seção estava diante da cobrança
de taxa de juros de 10,90% ao mês em contrato de abertura de crédito em
conta corrente. Naquela oportunidade, a maioria dos Ministros manifestou o
entendimento de que os juros não deveriam ser limitados, salvo em hipóteses
excepcionais.
A excepcionalidade pressupunha: (i) aplicação do CDC ao contrato e
(ii) taxa que comprovadamente discrepasse, de modo substancial, da média do
mercado na praça do empréstimo, salvo se justificada pelo risco da operação (no
mesmo sentido, vide REsp n. 420.111-RS, Segunda Seção, Rel. Min. Pádua
Ribeiro, Rel. p. Acórdão Min. Ari Pargendler, DJ de 6.10.2003).
Acompanhando tais precedentes, os Ministros que atualmente compõem
esta 2ª Seção têm admitido a possibilidade de controle dos juros manifestamente
abusivos naqueles contratos que se inserem em uma relação de consumo.
O Min. Aldir Passarinho Junior vem considerando “que a pactuação
[dos juros] é livre entre as partes, somente se podendo falar em taxa abusiva se
constatado oportunamente por prova robusta que outras instituições financeiras,
nas mesmas condições, praticariam percentuais muito inferiores” (REsp n.
915.572-RS, Quarta Turma, DJe 10.3.2008).
Por isso, o Ministro Aldir defende que essa abusividade seja demonstrada
em “perícia que propicie a comparação com as taxas praticadas por outras
instituições financeiras, desde que coincidentes o produto, a praça e a época
da firmatura do pacto” (AgRg no REsp n. 935.231-RJ, Quarta Turma, DJ de
29.10.2007).
No mesmo sentido, o Min. João Otávio de Noronha tem asseverado que
“a alteração da taxa de juros pactuada depende da demonstração cabal de sua
abusividade em relação à taxa média do mercado” (AgRg no REsp n. 939.242RS, Quarta Turma, DJe de 14.4.2008).
O Min. Luis Felipe Salomão, por sua vez, afirma que “a abusividade da
pactuação dos juros remuneratórios deve ser cabalmente demonstrada em cada
caso, com a comprovação do desequilíbrio contratual ou de lucros excessivos,
sendo insuficiente o só fato de a estipulação ultrapassar 12% ao ano ou de haver
estabilidade inflacionária no período, o que não ocorreu no caso dos autos”
(AgRg no REsp n. 881.383, DJ de 27.8.2008).
O Min. Fernando Gonçalves sustenta que “a alteração da taxa de juros
pactuada depende da demonstração cabal da sua abusividade em relação à taxa
média de mercado” (AgRg no REsp n. 1.041.086-RS, Quarta Turma, DJe de
1º.9.2008).
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
443
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
O Min. Massami Uyeda entende ser “firme o entendimento desta
augusta Corte no sentido de que, não obstante a inequívoca incidência da
lei consumerista nos contratos bancários, a abusividade da pactuação dos
juros remuneratórios deve ser cabalmente demonstrada em cada caso, com a
comprovação do desequilíbrio contratual ou de lucros excessivos (...)” e, com
base nesse argumento e na Súmula n. 7-STJ, já manteve acórdão que reduziu
uma taxa de juros de 45,65% ao ano, em contrato de alienação fiduciária, para
o patamar da taxa média de 37,42% ao ano (REsp n. 1.036.857-RS, Terceira
Turma, DJe de 5.8.2008).
O Min. Sidnei Beneti reconheceu que “para o período da inadimplência,
permite-se o controle judicial dos juros remuneratórios, com base nas regras do
Código de Defesa do Consumidor, quando ficar comprovado que o percentual
cobrado destoa da taxa média do mercado para a mesma operação financeira”.
Assim, conclui o Min. Beneti que, como “o Acórdão recorrido apurou
que a taxa de juros remuneratórios cobrada pela instituição financeira recorrida
encontra-se acima do dobro da taxa média do mercado para a modalidade do
negócio jurídico efetivado”, na inadimplência, os juros deveriam variar “segundo
a taxa média do mercado, para a operação de mútuo, apurada pelo Banco Central
do Brasil, na forma da Circular da Diretoria n. 2.957, de 28 de dezembro de
1999 (...)” (REsp n. 977.789-RS, Terceira Turma, DJe de 20.6.2008). Ressaltese, para fins ilustrativos, que nessa hipótese havia dois contratos de mútuo, um
com taxa de 9,9% ao mês e outro de 8,8% ao mês.
Aponta-se, ainda, precedente de minha lavra, com o qual manifestaram
concordância os Min. Ari Pargendler, Massami Uyeda e Sidnei Beneti, no
qual, diante de empréstimo pessoal a juros de 249,85% ao ano, superiores
ao dobro da taxa média apurada pelo Banco Central, ficou estabelecido que
“cabalmente demonstrada pelas instâncias ordinárias a abusividade da taxa de
juros remuneratórios cobrada, deve ser feita sua redução ao patamar médio
praticado pelo mercado para a respectiva modalidade contratual” (REsp n.
1.036.818, Terceira Turma, DJe de 20.6.2008).
Por sua importância, ainda vale mencionar a posição de alguns Ministros
que não mais integram esta 2ª Seção:
O Ministro Cesar Asfor Rocha, diante de juros remuneratórios pactuados
à taxa de 34,87% ao mês contra uma taxa média, apurada por perícia, de
14,19% ao mês, entendeu que, estando “cabalmente comprovada por perícia,
nas instâncias ordinárias, que a estipulação da taxa de juros remuneratórios foi
aproximadamente 150% maior que a taxa média praticada no mercado, nula é
a cláusula do contrato” (REsp n. 327.727-SP, Segunda Seção, DJ de 8.3.2004).
444
SÚMULAS - PRECEDENTES
O Min. Pádua Ribeiro, por seu turno, constatando cobrança de taxa
superior ao triplo da média (380,78% ao ano contra 67,81% ao ano), reduziu-a
para o “patamar médio praticado pelo mercado para a respectiva modalidade
contratual” (REsp n. 971.853-RS, Quarta Turma, DJ de 24.9.2007).
O Ministro Ari Pargendler consignou que “evidentemente, pode-se, em
casos concretos reconhecer a existência de juros abusivos. Por exemplo, no
Agravo de Instrumento n. 388.622, MG, tive ocasião de decidir que, ‘se o
acórdão, confortado por laudo pericial, dá conta de que os juros praticados na
espécie excediam em quase 50% à taxa média de mercado, não há como fugir da
conclusão de que são, mesmo, abusivos’ (DJ, 10.8.2001). O tema, com certeza,
é complexo, porque o risco de cada operação influi na respectiva taxa de juros.
Mas o peso desse componente, e de outros, no custo do empréstimo deve, então,
caso a caso, ser justificado pela instituição financeira, o juiz saberá decidir as
controvérsias a propósito, se respeitar a racionalidade econômica, representada
pelo mercado” (voto proferido no REsp n. 271.214-RS, Rel. p. Acórdão Min.
Menezes Direito, DJ de 4.8.2003; no mesmo sentido, vide REsp n. 420.111-RS,
Segunda Seção, Rel. Min. Pádua Ribeiro, Rel. p. Acórdão Min. Ari Pargendler,
DJ de 6.10.2003; REsp n. 1.061.512, Rel. Min. Ari Pargendler, DJ de 7.8.2008).
Logo, diante desse panorama sobre o posicionamento atual da 2ª Seção,
conclui-se que é admitida a revisão das taxas de juros em situações excepcionais, desde
que haja relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em
desvantagem exagerada – art. 51, § 1º, do CDC) esteja cabalmente demonstrada.
Necessário tecer, ainda, algumas considerações sobre parâmetros que
podem ser utilizados pelo julgador para, diante do caso concreto, perquirir a
existência ou não de flagrante abusividade.
Inicialmente, destaque-se que, para este exame, a meta estipulada pelo
Conselho Monetário Nacional para a Selic – taxa do Sistema Especial de
Liquidação e Custódia – é insatisfatória. Ela apenas indica o menor custo,
ou um dos menores custos, para a captação de recursos pelas instituições que
compõem o Sistema Financeiro Nacional. Sua adoção como parâmetro de
abusividade elimina o “spread” e não resolve as intrincadas questões inerentes ao
preço do empréstimo. Por essas razões, conforme destacado, o STJ em diversos
precedentes tem afastado a Taxa Selic como parâmetro de limitação de juros.
Descartados índices ou taxas fixos, é razoável que os instrumentos para
aferição da abusividade sejam buscados no próprio mercado financeiro.
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
445
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Assim, a análise da abusividade ganhou muito quando o Banco Central
do Brasil passou, em outubro de 1999, a divulgar as taxas médias, ponderadas
segundo o volume de crédito concedido, para os juros praticados pelas
instituições financeiras nas operações de crédito realizadas com recursos livres
(conf. Circular n. 2.957, de 30.12.1999).
As informações divulgadas por aquela autarquia, acessíveis a qualquer
pessoa através da rede mundial de computadores (conforme http://www.bcb.
gov.br/?ecoimpom - no quadro XLVIII da nota anexa; ou http://www.bcb.
gov.br/?TXCREDMES, acesso em 6.10.2008), são segregadas de acordo com
o tipo de encargo (prefixado, pós-fixado, taxas flutuantes e índices de preços),
com a categoria do tomador (pessoas físicas e jurídicas) e com a modalidade
de empréstimo realizada (“hot Money”, desconto de duplicatas, desconto de
notas promissórias, capital de giro, conta garantida, financiamento imobiliário,
aquisição de bens, “vendor”, cheque especial, crédito pessoal, entre outros).
A taxa média apresenta vantagens porque é calculada segundo as
informações prestadas por diversas instituições financeiras e, por isso, representa
as forças do mercado. Ademais, traz embutida em si o custo médio das
instituições financeiras e seu lucro médio, ou seja, um “spread” médio. É certo,
ainda, que o cálculo da taxa média não é completo, na medida em que não
abrange todas as modalidades de concessão de crédito, mas, sem dúvida, prestase como parâmetro de tendência das taxas de juros. Assim, dentro do universo
regulatório atual, a taxa média constitui o melhor parâmetro para a elaboração
de um juízo sobre abusividade.
Como média, não se pode exigir que todos os empréstimos sejam feitos
segundo essa taxa. Se isto ocorresse, a taxa média deixaria de ser o que é, para ser
um valor fixo. Há, portanto, que se admitir uma faixa razoável para a variação
dos juros.
A jurisprudência, conforme registrado anteriormente, tem considerado
abusivas taxas superiores a uma vez e meia (voto proferido pelo Min. Ari
Pargendler no REsp n. 271.214-RS, Rel. p. Acórdão Min. Menezes Direito, DJ
de 4.8.2003), ao dobro (REsp n. 1.036.818, Terceira Turma, minha relatoria,
DJe de 20.6.2008) ou ao triplo (REsp n. 971.853-RS, Quarta Turma, Min.
Pádua Ribeiro, DJ de 24.9.2007) da média.
Todavia, esta perquirição acerca da abusividade não é estanque, o que
impossibilita a adoção de critérios genéricos e universais. A taxa média de
mercado, divulgada pelo Banco Central, constitui um valioso referencial, mas
446
SÚMULAS - PRECEDENTES
cabe somente ao juiz, no exame das peculiaridades do caso concreto, avaliar se os
juros contratados foram ou não abusivos.
1.3. Taxa aplicável quando reconhecida a abusividade na contratação
dos juros remuneratórios.
A questão final atinente a este tópico procura responder ao seguinte
problema: constatada a abusividade, qual taxa deve ser considerada adequada
pelo Poder Judiciário?
Muitos precedentes indicam que, demonstrado o excesso, deve-se aplicar a
taxa média para as operações equivalentes, segundo apurado pelo Banco Central
do Brasil (vide, ainda, EDcl no AgRg no REsp n. 480.221-RS, Quarta Turma,
Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, DJ de 27.3.2007; e REsp n. 971853-RS,
Terceira Turma, Rel. Min. Pádua Ribeiro, DJ de 24.9.2007).
Esta solução deve ser mantida, pois coloca o contrato dentro do que,
em média, vem sendo considerado razoável segundo as próprias práticas do
mercado. Não se deve afastar, todavia, a possibilidade de que o juiz, de acordo
com seu livre convencimento racional, indicar outro patamar mais adequado
para os juros, segundo as circunstâncias particulares de risco envolvidas no
empréstimo.
CONSOLIDAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA
Portanto, no que diz respeito aos juros remuneratórios, a 2ª Seção do STJ
consolida o entendimento de que:
a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros
remuneratórios que foi estipulada na Lei de Usura (Decreto n. 22.626/1933),
como dispõe a Súmula n. 596-STF;
b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano por si só
não indica abusividade;
c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo
bancário as disposições do art. 591 c.c. o art. 406 do CC/2002;
d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações
excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade
(capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, § 1º, do
CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do caso concreto.
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
447
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
II - PERÍODO DA INADIMPLÊNCIA
2. CONFIGURAÇÃO DA MORA
Quanto à mora em contratos bancários, são vários os entendimentos
cristalizados pela jurisprudência do STJ ao longo dos anos. De forma sucinta,
a seguir serão expostos tais entendimentos, no sentido do mais geral ao mais
particular.
É preciso alertar, apenas, que nem sempre foram encontradas decisões
que exemplificassem a utilização de cada uma de tais posições. E esse fato
não deve ser interpretado como representativo de uma eventual superação ou
desprestígio de certo entendimento em face de outro. Trata-se, apenas, de um
sinal demonstrativo das relações de continência e de especialidade existentes
entre os tópicos, pois, à medida que existe certo diálogo entre eles, é natural que
nem todos sejam citados cumulativamente.
A partir de tais ressalvas, o entendimento mais genérico é aquele
consubstanciado no precedente REsp n. 607.961-RJ, 2ª Seção, de minha
Relatoria, julgado em 9.3.2005, segundo o qual “não basta o ajuizamento de ação
revisional para descaracterização da mora”.
Esse primeiro posicionamento é encontrado, isoladamente, em decisões de
alguns Ministros, conforme segue:
Insuficiência do mero ajuizamento de ação revisional para descaracterizar a mora.
Ministro Relator
Julgado
Órgão
Fernando Gonçalves
Aldir Passarinho Junior
Nancy Andrighi
REsp n. 607.961-RJ, j. em 9.3.2005
2a Seção
REsp n. 1.071.004-RS, DJ de 15.8.2008
Unipessoal
João Otávio de Noronha
Massami Uyeda
Sidnei Beneti
Luis Felipe Salomão
Carlos Mathias
Ari Pargendler
AgRg no Ag n. 678.120-SP, j. em 29.11.2005 3a Turma
O entendimento mais utilizado, todavia, é aquele derivado do julgamento
do EREsp n. 163.884-RS, 2ª Seção, Rel. Min. Barros Monteiro, Rel. p/ Acórdão
448
SÚMULAS - PRECEDENTES
Min. Ruy Rosado de Aguiar, julgado em 23.5.2001, segundo o qual apenas
a constatação de que foram exigidos encargos abusivos na contratação permite o
afastamento da configuração da mora.
Tal posicionamento é reiteradamente aceito:
A exigência de encargos abusivos permite o afastamento da mora.
Ministro Relator
Fernando Gonçalves
Julgado
Órgão
AgRg no REsp n. 1.060.855-RS, j. em
19.8.2008
4a Turma
Aldir Passarinho Junior AgRg no REsp n. 990.830-RS, j. em 24.6.2008 4a Turma
Nancy Andrighi
AgRg no Ag n. 710.601-MS, j. em 16.2.2006
3a Turma
João Otávio de Noronha REsp n. 1.029.420-RS, DJ de 4.8.2008
Unipessoal
Massami Uyeda
REsp n. 1.068.353-RS, DJ de 15.8.2008
Unipessoal
Sidnei Beneti
AgRg no REsp n. 973.646-RS, j. em 25.3.2008 3a Turma
Luis Felipe Salomão
Carlos Mathias
Ed no AgRg no REsp n. 593.205-RS, j. em 3a Turma
23.11.2005
Ari Pargendler
De forma correlata, é possível citar diversos precedentes utilizando o
mesmo argumento, mas com a inversão da premissa e da conclusão – ou seja, se
não existe abusividade, a mora do devedor está configurada:
Configuração da mora na ausência de abusividade.
Ministro Relator
Julgado
Órgão
4a Turma
Fernando Gonçalves
REsp n. 750.022-RS, j. em 15.9.2005
Aldir Passarinho Junior
AgRg no REsp n. 917.459-RS, j. em 13.5.2008 4a Turma
Nancy Andrighi
AgRg no REsp n. 958.662-RS, j. em 25.9.2007 3a Turma
João Otávio de Noronha REsp n. 1.067.303-RS, DJ de 15.8.2008
Unipessoal
Massami Uyeda
REsp n. 894.916-RS, DJ de 19.12.2006
Unipessoal
Sidnei Beneti
REsp n. 1.063.818-RS, DJ de 22.8.2008
Unipessoal
Luis Felipe Salomão
REsp n. 1.015.148-RS, DJ de 4.8.2008
Unipessoal
REsp n. 708.633-RS, j. em 26.2.2008
3a Turma
Carlos Mathias
Ari Pargendler
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
449
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Porém, deve-se deixar claro que é o eventual abuso na exigência dos
chamados “encargos da normalidade” – notadamente nos juros remuneratórios
e na capitalização de juros – que deve ser levado em conta para tal análise,
conforme definido no precedente EDcl no AgRg no REsp n. 842.973-RS, 3ª
Turma, Rel. originário Min. Humberto Gomes de Barros, Rel. p/ Acórdão Min.
Nancy Andrighi, julgado em 21.8.2008.
De outro modo, o eventual abuso em algum dos encargos moratórios não
descaracteriza a mora. Esse abuso deve ser extirpado ou decotado sem que haja
interferência ou reflexo na caracterização da mora em que o consumidor tenha
eventualmente incidido, pois a configuração dessa é condição para incidência
dos encargos relativos ao período da inadimplência, e não o contrário.
Os encargos abusivos que possuem potencial para descaracterizar a mora são,
portanto, aqueles relativos ao chamado “período da normalidade”, ou seja, aqueles
encargos que naturalmente incidem antes mesmo de configurada a mora.
Somente o abuso na cobrança de encargo “da normalidade” descaracteriza a mora.
Ministro Relator
Julgado
Órgão
Fernando Gonçalves
REsp n. 905.278-RS, DJ de 27.6.2008
Aldir Passarinho Junior
Ed no AgRg no REsp n. 533.704-RS, j. em 4a Turma
8.3.2005
Unipessoal
Nancy Andrighi
Ed no AgRg no REsp n. 842.973-RS, j. em 3a Turma
21.8.2008
João Otávio de Noronha Voto-vista no Ed no AgRg no REsp n. 3a Turma
842.973-RS, j. em 21.8.2008
3a Turma
Massami Uyeda
REsp n. 1.036.474-RS, j. em 27.5.2008
Sidnei Beneti
AgRg no REsp n. 1.017.958-RS, j. em 3a Turma
15.4.2008
Luis Felipe Salomão
REsp n. 996.217-RS, DJ de 4.8.2008
Unipessoal
Carlos Mathias
Ari Pargendler
Voto-vista no Ed no AgRg no REsp n. 3a Turma
842.973-RS, j. em 21.8.2008
CONSOLIDAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA
Logo, os seguintes enunciados representam a jurisprudência consolidada
na 2ª Seção quanto ao tema:
I. Afasta a caracterização da mora:
450
SÚMULAS - PRECEDENTES
(i) a constatação de que foram exigidos encargos abusivos na contratação,
durante o período da normalidade contratual.
II. Não afasta a caracterização da mora:
(i) o simples ajuizamento de ação revisional;
(ii) a mera constatação de que foram exigidos encargos moratórios abusivos
na contratação.
3. JUROS MORATÓRIOS
Juros moratórios são aqueles pagos pelo mutuário ao mutuante em
decorrência da mora no cumprimento da prestação estabelecida no contrato.
3.1. Posicionamento Atual da 2ª Seção
A jurisprudência do STJ encontra-se pacificada no sentido de que, nos
contratos bancários não alcançados por lei específica, os juros moratórios podem
ser convencionados até o limite de 1% ao mês.
Dentre outros, neste sentido, confiram-se os seguintes julgados:
Juros moratórios – Limitação de 1% ao mês.
Ministro Relator
Julgado
Órgão
Fernando Gonçalves
AgRg no REsp n. 672.168-RS, j. em 5.4.2005 4a Turma
Aldir Passarinho Junior
AgRg no Ag n. 558.753-RS, j. em 8.6.2004
Nancy Andrighi
AgRg no REsp n. 469.538-RS, j. em 20.2.2003 3a Turma
João Otávio de Noronha
Ag n. 965.353-RS, DJe de 12.2.2008
Unipessoal
Massami Uyeda
REsp n. 1.038.417-RS, DJe de 25.6.2008
Unipessoal
Sidnei Beneti
AgRg no REsp n. 879.902-RS, j. em 19.6.2008 3a Turma
4a Turma
Luis Felipe Salomão
REsp n. 1.007.561-RS, DJe de 5.8.2008
Unipessoal
Carlos Mathias
-
-
Antônio de Pádua Ribeiro
AgRg no REsp n. 406.841-RS, j. em 10.6.2003 3a Turma
Ari Pargendler
REsp n. 188.674-MG, j. em 17.6.2003
3a Turma
Barros Monteiro
REsp n. 400.255-RS, j. em 2.9.2003
4a Turma
Carlos A. Menezes Direito
AgRg no REsp n. 765.674-RS, j. em 3a Turma
26.10.2006
Castro Filho
REsp n. 402.483-RS, j. em 26.3.2003
2ª Seção
Cesar Asfor Rocha
REsp n. 623.691-RS, j. em 27.9.2005
4a Turma
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
451
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Hélio Quaglia Barbosa
AgRg no REsp n. 791.172-RS, j. em 22.8.2006 4a Turma
Humberto Gomes de Barros AgRg no Ag n. 830.575-RS, j. em 19.12.2007
3a Turma
CONSOLIDAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA
A 2ª Seção mantém o entendimento de que, nos contratos bancários
não alcançados por legislação específica, os juros moratórios poderão ser
convencionados até o limite de 1% ao mês.
4. CADASTROS DE INADIMPLÊNCIA
Entende-se por cadastros de inadimplência todos os bancos de dados
mantidos por quaisquer instituições, financeiras ou não, para controle acerca
da reputação do correntista, quanto à solvabilidade das obrigações por ele
contraídas. São exemplos os cadastros mantidos por instituições financeiras
(Serasa) ou empresas particulares (SPC), sem prejuízo de outros, existentes ou
que venham a ser criados.
A controvérsia acerca da inscrição do nome do devedor em cadastros
de inadimplência apresenta-se sob duas óticas, a saber: (i) a possibilidade
de inscrição no curso do processo em que se discute o saldo devedor – e a
conseqüente ponderação acerca dos requisitos para o deferimento de tutela
antecipada ou medida liminar que a impeça; e (ii) a possibilidade de inscrição
depois de discutido o mérito da ação, e os requisitos a serem observados pela
sentença para autorizar ou negar tal inscrição.
Cada uma dessas questões deve ser analisada à luz da jurisprudência desta
Corte, para uniformização dos precedentes sobre a questão.
4.1. Pedido de antecipação de tutela.
A jurisprudência da 2ª Seção, consolidada no REsp n. 527.618-RS, Rel.
Min. Cesar Asfor Rocha, julgado em 22.11.2003, firmou o entendimento de
que, para que se defira medida liminar ou antecipação de tutela que impeça a
inscrição do nome do devedor em cadastros de inadimplência, no curso do
processo, devem ser exigidos cumulativamente os seguintes requisitos: a) que
haja ação proposta pelo devedor contestando a existência integral ou parcial do débito;
b) que nessa ação esteja efetivamente demonstrado que a contestação da cobrança
indevida se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do
452
SÚMULAS - PRECEDENTES
STF ou STJ; c) contestada apenas parte do débito, ofereça-se o depósito da parcela
incontroversa ou a prestação de caução, fixada conforme o prudente arbítrio do juiz.
Cadastros de inadimplência - Pedido de antecipação de tutela.
Ministro Relator
Julgado
Órgão
Fernando Gonçalves
REsp n. 871.832-PR, j. em 25.9.2007
4a Turma
Aldir Passarinho Junior
REsp n. 712.126-RS, j. em 22.3.2005
4a Turma
Nancy Andrighi
AgRg no REsp n. 991.037-RS, j. em 18.3.2008 3a Turma
João Otávio de Noronha REsp n. 1.070.998-MS, DJ de 27.8.2008
Unipessoal
Massami Uyeda
Ag n. 851.538-RS, DJ de 3.8.2007
Unipessoal
Sidnei Beneti
Ag n. 821.076-RJ, DJ de 30.6.2008
Unipessoal
Luis Felipe Salomão
AgRg no Ag n. 970.099-DF, j. em 26.8.2008
4a Turma
Carlos Mathias
Ag n. 920.214-DF, DJ de 5.9.2008
Unipessoal
Ari Pargendler
AgRg no Ag n. 651.764-RS, j. em 27.8.2008
3a Turma
4.2. Sentença com resolução do mérito.
A remessa do nome do devedor para os referidos cadastros de inadimplentes deve
se limitar a acompanhar o que ficar decidido quanto à mora, ou seja, tal inscrição
somente será lícita se a mora restar configurada.
CONSOLIDAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA
Logo, os seguintes enunciados representam a jurisprudência consolidada
na 2ª Seção quanto ao tema:
a) A proibição da inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes,
requerida em antecipação de tutela e/ou medida cautelar, somente será deferida
se, cumulativamente: i) houver ação fundada na existência integral ou parcial do
débito; ii) ficar demonstrado que a alegação da cobrança indevida se funda na
aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; iii)
for depositada a parcela incontroversa ou prestada a caução fixada conforme o
prudente arbítrio do juiz;
b) A inscrição/manutenção do nome do devedor em cadastro de
inadimplentes, por ocasião da sentença ou do acórdão, seguirá a sorte do que
houver sido decidido no mérito do processo quanto à mora. Autoriza-se a
inscrição/manutenção apenas se configurada a mora.
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
453
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
5. DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO. REVISÃO DE OFÍCIO DE
CLÁUSULAS CONTRATUAIS NAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS.
Considerando a renovação da composição da 2ª Seção, dado que sou a única
remanescente do julgamento do EREsp n. 702.524-RS, propus a rediscussão
do entendimento consolidado e registrei que o meu posicionamento, sempre
ressalvado, foi no sentido de admitir a revisão de ofício, pelos julgadores das
instâncias ordinárias, pois estes julgamentos, muitas vezes, limitam-se a reconhecer
proteções ao consumidor que já estão pacificadas pela jurisprudência do STJ.
No EREsp n. 702.524-RS, consignei que a visão restritiva da análise
das disposições de ofício, mediante perspectiva puramente processual, estava
empurrando a jurisprudência do STJ para um paradoxo, porque em questão
similar – decretação de ofício da nulidade da cláusula de eleição de foro –, a
solução adotada foi pelo conhecimento de ofício da questão.
Diante da antinomia dos julgamentos, por que assumir postura diversa em
relação a todas as demais cláusulas abusivas que possam vir a serem declaradas
nulas?
Ademais, essa proposição, hoje, reafirma-se pela tomada de posição do
legislador, que inseriu um parágrafo único no art. 112 do CPC (pela Lei n.
11.280/2006), segundo o qual “a nulidade da clausula de eleição de foro, em
contrato de adesão, pode ser declarada de ofício pelo juiz, que declinará de
competência para o juízo de domicilio do réu”.
Atenta ao micro-sistema introduzido pelo CDC, vinculado aos demais
princípios e normas que orientam o direito pátrio, notadamente do CC/2002,
que é sua fonte de complementação normativa, entendo que não é coerente
adotar perante hipóteses idênticas soluções diversas.
O CDC é categorizado como norma de ordem pública (art. 1º); portanto,
todas as suas disposições possuem interesse público que impelem o juiz a atuar
de ofício. Além do mais, o CDC adotou a mesma teoria de nulidades que regula
os contratos regidos pelo Código Civil, especificando os vícios que são causa
de nulidade e que o juiz deve declarar de ofício. A abusividade, por exemplo, é
disciplinada como vício de nulidade da cláusula do contrato – art. 51, IV, do CDC.
Outro motivo relevante que me levou a fazer esta proposição é o resultado
dos julgamentos em favor dos consumidores, na perspectiva da política judiciária.
Como explicar ao consumidor, leigo juridicamente, que determinada
cláusula, apesar de abusiva, é válida para ele, mas não o é para o seu vizinho, em
situação idêntica?
454
SÚMULAS - PRECEDENTES
O que ocorre é que na ação revisional proposta pelo vizinho houve pedido
expresso de declaração de nulidade, ao passo que no seu processo não foi
formulado tal pedido, o que impede o juiz de pronunciá-la.
Conseqüências graves são geradas por esse tipo de julgamento: a primeira
é a equivocada priorização da norma processual (que exige a formulação de
pedido expresso) de molde a inviabilizar o conhecimento e a aplicação do
direito material (nulificação da cláusula abusiva), exigindo para tanto uma nova
movimentação da máquina judiciária com a propositura de outra ação; a segunda
é o manifesto descumprimento de regra que disciplina a sanção decorrente
da abusividade/nulidade, prevista expressamente no CDC e no ordenamento
jurídico complementar (CDC, art. 51, todos os seus incisos, cumulado com o
CC/2002, parágrafo único, do art. 168, que determina ao juiz pronunciar as
nulidades provadas, quando conhecer do negócio jurídico ou de seus efeitos); a
terceira é o descrédito no Poder Judiciário, que tem a obrigação constitucional
de tratar igualmente os consumidores que se encontram em situações idênticas;
a quarta é a frustração de toda a operacionalidade do novo instrumento dos
processos repetitivos, pois o não reconhecimento de ofício impõe reiteração
de ações e recursos, que o art. 543-C visa impedir, prejudicando a almejada
celeridade na entrega da prestação jurisdicional.
O entendimento da Relatora foi acompanhado, com fundamentos diversos,
pelo i. Min. Luis Felipe Salomão.
Os demais Ministros que compõem a 2ª Seção do STJ mantiveram a
tese de que o juiz não está autorizado a proceder à revisão de ofício de cláusulas
contratuais.
Os precedentes que cristalizaram essa posição são o REsp n. 541.153-RS,
Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, julgado em 8.6.2005, e o EREsp n. 702.524-RS,
do qual fui relatora originária, vencida, e Relator para acórdão o Min. Humberto
Gomes de Barros, julgado em 8.3.2006.
Registro, por oportuno, que todos os Ministros que compõem a 2ª Seção
possuem decisões neste sentido, ainda que com ressalvas. Confira-se:
Impossibilidade de revisão de ofício de cláusulas contratuais nas instâncias ordinárias.
Ministro Relator
Julgado
Órgão
2a Seção
Fernando Gonçalves
EREsp n. 645.902-RS, j. em 10.10.2007
Aldir Passarinho Junior
AgRg no REsp n. 1.028.361-RS, j. em 15.5.2008 4a Turma
Nancy Andrighi
AgRg no REsp n. 824.847-RS, j. em 16.5.2006 3a Turma
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
455
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
João Otávio de Noronha REsp n. 1.064.594-RS, DJ de 4.8.2008
Unipessoal
Massami Uyeda
REsp n. 1.042.903-RS, j. em 3.6.2008
3a Turma
Sidnei Beneti
AgRg no REsp n. 782.895-SC, j. em 19.6.2008 3a Turma
Luis Felipe Salomão
REsp n. 1.007.561-RS, DJ de 5.8.2008
Unipessoal
Carlos Mathias
-
-
Ari Pargendler
AgRg no EREsp n. 801.421-RS, j. em 14.3.2007 2a Seção
CONSOLIDAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA
Assim, resta mantido o posicionamento desta 2ª Seção no sentido de que
é vedado aos juízes de primeiro e segundo grau, com fundamento no art. 51 do
CDC, julgar, sem pedido expresso, a abusividade de cláusulas contratuais.
RESUMO DAS ORIENTAÇÕES - ART. 543-C, § 7º, DO CPC
1 - JUROS REMUNERATÓRIOS
a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros
remuneratórios que foi estipulada na Lei de Usura (Decreto n. 22.626/1933),
como dispõe a Súmula n. 596-STF;
b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano por si só
não indica abusividade;
c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo
bancário as disposições do art. 591 c.c. o art. 406 do CC/2002;
d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações
excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade
(capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, § 1º, do
CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do caso concreto.
2 - CONFIGURAÇÃO DA MORA
a) Afasta a caracterização da mora a constatação de que foram exigidos
encargos abusivos na contratação, isto é, durante o período da normalidade
contratual;
b) O mero ajuizamento de ação revisional ou a constatação de que foram
exigidos encargos moratórios abusivos não afastam a caracterização da mora.
456
SÚMULAS - PRECEDENTES
3 - JUROS MORATÓRIOS
Nos contratos bancários não alcançados por legislação específica, os juros
moratórios poderão ser convencionados até o limite de 1% ao mês.
4 - INSCRIÇÃO/MANU TENÇÃO EM CADASTRO DE
INADIMPLENTES
a) A proibição da inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes,
requerida em antecipação de tutela e/ou medida cautelar, somente será deferida
se, cumulativamente: i) houver ação fundada na existência integral ou parcial do
débito; ii) ficar demonstrado que a alegação da cobrança indevida se funda na
aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; iii)
for depositada a parcela incontroversa ou prestada a caução fixada conforme o
prudente arbítrio do juiz;
b) A inscrição/manutenção do nome do devedor em cadastro de
inadimplentes, por ocasião da sentença ou do acórdão, seguirá a sorte do que
houver sido decidido no mérito do processo quanto à mora. Autoriza-se a
inscrição/manutenção apenas se configurada a mora.
5 - JULGAMENTO COM DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO
É vedado aos juízes de primeiro e segundo grau, com fundamento no art.
51 do CDC, julgar, sem pedido expresso, a abusividade de cláusulas contratuais.
Vencidos quanto a esta matéria a Min. Relatora e o Min. Luis Felipe Salomão.
JULGAMENTO DO RECURSO REPRESENTATIVO
REsp n. 1.061.530-RS
1. Deficiência na fundamentação.
Embora mencione uma suposta violação aos arts. 6o, V, do CDC; 4o, VI, da
Lei n. 4.595/1964; 422 e 478 do CC/2002; 2º, 20 e 331, I, do CPC; 14 da Lei
n. 9.492/1997 e 161 do CTN, o recorrente não demonstrou, em relação a tais
dispositivos legais, no que consistiria a ofensa à legislação federal.
A simples menção a artigo de lei, sem a demonstração das razões de
inconformidade, não abrem o caminho do Especial (Conf. AgRg no Ag n.
663.548-MS, Terceira Turma, DJ de 10.4.2006).
Incide, por isso, a Súmula n. 284-STF.
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
457
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
2. Violação a dispositivos constitucionais.
Aponta o recorrente violação aos arts. 5º, XXXV, e 192 da CF/1988.
Todavia, a análise de pretensa ofensa a dispositivo constitucional refoge à
competência desta Corte, a que a Carta Magna confia a missão de unificação do
direito federal, nos exatos termos do art. 105, III, da CF/1988. Em se tratando,
portanto, de violação de normas constitucionais, o tema não há de ser analisado
nesta sede recursal.
3. Capitalização de Juros
O Tribunal de origem afastou a capitalização mensal de juros com base
na inconstitucionalidade da MP n. 1.963-17/2000. Quanto a esta questão,
usualmente debatida nos recursos especiais que versam sobre a capitalização de
juros, encontra-se assente nesta Corte o entendimento de que o recurso especial
não constitui via adequada para o exame de temas constitucionais, sob pena de
caracterizar usurpação da competência do STF.
Neste sentido, confiram-se os seguintes julgados:
Impossibilidade da apreciação da constitucionalidade da MP n. 1.963-17/2000 em recurso especial.
Ministro Relator
Julgado
Órgão
Fernando Gonçalves
AgRg nos EDcl no REsp n. 734.838-RS, j. em 4ª Turma
18.10.2005
Aldir Passarinho Junior
AgRg no REsp n. 900.411-DF, j. em 6.3.2007
Nancy Andrighi
AgRg no REsp n. 999.829-RS, j. em 21.2.2008 3ª Turma
João Otávio de Noronha AgRg no Ag n. 897.830-RS, j. em 20.11.2007
4ª Turma
4ª Turma
Massami Uyeda
AgRg no Ag n. 668.746-RS, j. em 4.3.2007
4ª Turma
Sidnei Beneti
Ag n. 1.049.956-RJ, DJe de 28.8.2008
Unipessoal
Luis Felipe Salomão
-
-
Carlos Mathias
-
-
Portanto, não se conhece do recurso especial quanto ao ponto.
4. Disposições de ofício.
Nos termos do entendimento ora firmado, é inviável o exame de ofício de
cláusulas consideradas abusivas em contratos que regulem relação de consumo.
458
SÚMULAS - PRECEDENTES
Portanto, devem ser decotadas as disposições de ofício julgadas pelo
acórdão recorrido.
5. Juros remuneratórios.
O recurso especial deve ser provido no que diz respeito à limitação dos
juros remuneratórios, pois, conforme reiteradamente afirmado por este Tribunal,
a taxa de juros não é abusiva apenas porque supera o patamar de 12% ao ano ou
o valor da Taxa Selic.
Vê-se, ademais, que as partes, em 28.12.2004, celebraram um contrato de
empréstimo para financiamento da aquisição de veículo a pessoa física, com taxa
de juros pré-fixada em 2,5654% ao mês, ou 35,5222% ao ano. As informações
divulgadas pelo Banco Central do Brasil revelam que, à época, a taxa média
praticada no mercado, para operações similares, era de 35,63% ao ano.
Assim, não se vislumbra discrepância exagerada entre a taxa contratada e
aquilo que representava a média de mercado para o período, porquanto aquele é,
inclusive, inferior a esta.
Logo, os juros remuneratórios contratados encontram-se no limite que
esta Corte tem considerado razoável e, sob a ótica do Direito do Consumidor,
não merecem ser revistos, porquanto não demonstrada a onerosidade excessiva
na hipótese.
6. Configuração da Mora
Não tendo sido alterada a conclusão do acórdão recorrido quanto à
capitalização dos juros, verifica-se a cobrança de encargo abusivo no período
da normalidade contratual. Por esse motivo, resta descaracterizada a mora do
devedor, não havendo que se falar em violação aos arts. 397 e 406 do CC/2002
e 52, §1o, CDC.
7. Inscrição em cadastro de inadimplentes.
Afastada, na espécie, a mora do consumidor, é ilegal o envio de seus dados
para quaisquer cadastros de inadimplência.
8. Manutenção na posse.
A questão relativa à manutenção na posse relaciona-se diretamente com
aquilo que restou decidido quanto à configuração da mora. Como consolidado
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
459
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
na Súmula n. 72-STJ, “a comprovação da mora é imprescindível à busca e
apreensão do bem alienado fiduciariamente”. Confira-se, ainda, nesse sentido:
AgRg no REsp n. 400.227-RS, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJ de
28.2.2005; AgRg no REsp n. 1.005.202-RS, 3ª Turma, Rel. Min. Sidnei Beneti,
DJe 7.5.2008.
Logo, afastada a mora da recorrida, não há como ser acolhido o pleito
da instituição financeira de afastar a recorrida da posse do bem alienado
fiduciariamente.
Assim, não merece provimento o recurso especial também nesse ponto.
9. Protesto de Título.
Embora a jurisprudência desta 2a Seção venha reconhecendo que “o
protesto do título representativo da dívida é procedimento legítimo e inerente
à cobrança executiva, não podendo ser obstado em face de simples ajuizamento,
pelo devedor, de ação revisional do contrato de empréstimo, salvo situação
excepcional, sequer objeto de discussão no recurso especial” (REsp n. 337.794SC, 4ª Turma, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJ de 15.4.2002), a hipótese
vertente revela que foram cobrados encargos abusivos, durante o período de
“normalidade” (capitalização mensal), e que, com isso, afastou-se a mora.
Dessa forma, sendo o protesto um procedimento que pressupõe a
inadimplência, o acórdão recorrido deve, nesse ponto, ser mantido.
10. Depósitos.
Embora a recorrida tenha pleiteado e o Tribunal de origem tenha aceitado
a realização de depósitos parciais, o recorrente vem sustentando que, nos termos
do art. 890 do CPC, só é possível o depósito integral.
Nesse aspecto, cumpre ressaltar que não há qualquer vedação legal à
efetivação de depósitos parciais, segundo aquilo que a parte entende devido.
Isso, por si só, afasta a pretensão do recorrente.
É bem verdade que a existência de depósito integral, ou não, pode ser
relevante para a análise de uma série de questões legais. Como demonstrado,
a vedação à inscrição do nome do devedor em cadastro de inadimplentes, em
pedido de antecipação dos efeitos da tutela, exige, entre outros requisitos, o
depósito apenas parcial.
460
SÚMULAS - PRECEDENTES
Veja-se, à guisa de exemplo, as seguintes situações em que esta Corte
aceitou o depósito parcial: AgRg no REsp n. 827.035-RS, 4a Turma, Rel. Min.
Aldir Passarinho, DJ 19.6.2006; REsp n. 448.602-SC, 4a Turma, Rel. Min. Ruy
Rosado de Aguiar DJ 17.2.2003.
Incide, portanto, a Súmula n. 83-STJ.
11. Comissão de Permanência
11.1. Juízo de Admissibilidade.
A Segunda Seção, por maioria, deixou de conhecer do recurso especial
quanto à comissão de permanência, por considerar o recurso deficientemente
fundamentado quanto à alínea a do permissivo constitucional e pelo fato de
o dissídio jurisprudencial não ter sido comprovado, mediante a realização do
cotejo analítico entre os julgados tidos como divergentes.
Quanto a este aspecto, fiquei vencida juntamente com i. Desembargador
convocado Carlos Fernando Mathias, pois consideramos que o especial neste
ponto poderia ser apreciado em razão da notoriedade do dissídio jurisprudencial,
notadamente por se tratar de matéria repetitiva, objeto de questionamento em
milhares de recursos que ingressam neste STJ.
Apesar de o presente recurso não ter logrado êxito em preencher os requisitos
de admissibilidade, deixo aqui consignados os fundamentos que teci quanto à
legalidade da cláusula que prevê a cobrança da comissão de permanência:
1. Definição
Definir a comissão de permanência talvez seja uma das tarefas mais árduas do
Direito Bancário. Este encargo foi instituído pela Resolução n. 15/66 do Conselho
Monetário Nacional (CMN) e regulado pelas Circulares n. 77/67 e n. 82/67, ambas
do Banco Central.
Com efeito, há insegurança até quanto à sua definição, natureza jurídica e,
principalmente, quanto aos componentes incorporados em seu cálculo.
Trata-se de uma faculdade concedida às instituições financeiras para
cobrar uma importância calculada sobre os dias de atraso, nas mesmas bases
proporcionais de juros, encargos e comissões cobradas na operação primitiva.
Em resumo, é um mecanismo utilizado para o banco compensar-se dos prejuízos
decorrentes do inadimplemento.
Com o surgimento da Lei n. 6.899/1981, que possibilitou o direito à correção
monetária a partir do vencimento do débito e, algum tempo depois, com a
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
461
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
edição da Resolução n. 1.129/86 do CMN, as instituições financeiras ficaram
expressamente autorizadas a cobrar a comissão de permanência de seus
devedores por dia de atraso, além dos juros de mora.
O Banco Central do Brasil, ao responder o convite para se manifestar neste
incidente de processo repetitivo, afirmou, expressamente, desconhecer os
encargos que compõem a comissão de permanência:
Não é possível saber com antecedência os encargos que a instituição
financeira deverá arcar para reequilibrar sua situação líquida após o
atraso no pagamento, ante a existência de inúmeras variáveis (como a
disponibilidade de crédito no mercado, os custos operacionais de cada
instituição financeira, sua situação patrimonial, etc.), razão pela qual a
permanência no inadimplemento gera diferentes encargos em cada
contrato, a depender de suas especificidade e do momento em que o
atraso no pagamento ocorre. (grifo no original).
A Federação Brasileira de Bancos – Febraban, também em resposta ao ofício de
fls. 224, afirmou que os encargos moratórios (juros de mora e multa contratual)
devem ser cumulados com a comissão de permanência, pleiteando a modificação
da jurisprudência neste ponto.
Em seguida, foi novamente oficiado à Febraban a respeito da definição deste
encargo, seu modo de cálculo e componentes, bem como sobre as taxas cobradas
por alguns dos maiores bancos brasileiros. Contudo, diante das respostas, como
se verificará em tópico posterior, constatou-se que cada instituição financeira
calcula a comissão de permanência de maneira particular e diferenciada das
demais, o que dificulta sobremaneira qualquer categorização definitiva.
2. A evolução jurisprudencial da 2ª Seção.
Quatro são as principais controvérsias jurídicas a respeito da cobrança da
comissão de permanência, a saber: (i) cumulação da comissão com a correção
monetária; (ii) cumulação com os juros remuneratórios; (iii) cálculo da comissão
pelas taxas contratuais ou pela taxa média de mercado; (iv) cumulação com os
encargos moratórios (multa e juros de mora).
As quatro controvérsias foram resolvidas da seguinte forma:
(i) Impossibilidade de cumulação com a correção monetária, porque
incorporada na própria comissão de permanência (Súmula n. 30-STJ);
(ii) Impossibilidade de cumulação com os juros remuneratórios, porque a já
citada Resolução n. 1.129/86 proibia a cobrança de “quaisquer outras quantias
compensatórias”. Foi reconhecido o caráter múltiplo da comissão de permanência,
que se prestava para atualizar, bem como para remunerar a moeda. O leading
case é o REsp n. 271.214-RS, julgado pela 2a Seção, Relator o Min. Carlos Alberto
Menezes Direito;
(iii) O cálculo da taxa, a título de comissão de permanência, pela média de
mercado divulgada pelo Banco Central, não caracteriza potestatividade, pois a
462
SÚMULAS - PRECEDENTES
taxa média não é calculada pela instituição financeira, mas pelo mercado, sendo
que a taxa pactuada pelas partes limita o teto da cobrança (Súmulas n. 294 e n.
296-STJ);
(iv) A incidência da comissão de permanência leva necessariamente à exclusão
de todos os outros encargos, tenham eles natureza remuneratória ou moratória
(AgRg no REsp n. 706.368-RS, também pela 2a Seção, de minha Relatoria, ainda
no mesmo sentido o AgRg no REsp n. 712.801-RS, 2a Seção, Relator o Min. Carlos
Alberto Menezes Direito).
Esclareceu-se, portanto, que a natureza da cláusula de comissão de
permanência é tríplice: índice de remuneração do capital (juros remuneratórios),
atualização da moeda (correção monetária) e compensação pelo inadimplemento
(encargos moratórios). Assim, esse entendimento, que impede a cobrança
cumulativa da comissão com os demais encargos, protege, como valor primordial,
a proibição do bis in idem.
Mais recentemente, o Ministro Ari Pargendler passou a adotar – em nome
da transparência – posicionamento que explicita quais encargos podem ser
cobrados sob a denominação “comissão de permanência”.
Confira-se:
A Segunda Seção, no julgamento do REsp n. 863.887, RS, consolidou o
entendimento de que a comissão de permanência abrange três parcelas, a
saber, os juros remuneratórios, à taxa média de mercado, nunca superiores
àquela contratada para o empréstimo, os juros moratórios e a multa
contratual; daí ser impossível a sua cobrança cumulada com juros de mora
e multa contratual, sob pena de incorrer em bis in idem. (AgRg no REsp n.
986.508-RS, Terceira Turma, j. em 20.5.2008).
Em outro precedente, julgado na mesma data pela Terceira Turma, o Min. Ari
Pargendler chegou, inclusive, a classificar de abusiva a comissão calculada em
percentual muito acima do cobrado nos juros remuneratórios, não sem antes
reforçar a natureza tríplice daquela:
Quer dizer, após o vencimento, a comissão de permanência visa
manter, por meio dos juros remuneratórios, a base econômica do negócio,
desestimular, mediante os juros de mora, a demora no cumprimento da
obrigação e reprimir o inadimplemento pela aplicação da multa contratual.
(AgRg no REsp 1.016.657-RS, Terceira Turma, j. em 20.5.2008)
Neste julgado, a cláusula que estipulava a comissão de permanência em
14,90% ao mês foi considerada manifestamente abusiva, uma vez que, no período
da normalidade, os juros remuneratórios eram de 2,451% ao mês.
No âmbito da Quarta Turma, também o Min. João Otávio de Noronha já seguiu
tal orientação. Confira-se:
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
463
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Processo Civil. Contrato bancário. Revisional. Comissão de permanência.
Licitude da cobrança. 1. A partir do vencimento do mútuo bancário,
o devedor responderá exclusivamente pela comissão de permanência
(assim entendida como os juros remuneratórios, à taxa média de mercado,
acrescidos de juros moratórios e multa contratual) sem cumulação com a
correção monetária (Súmula n. 30, STJ). 2. Agravo regimental provido. (AgRg
no REsp n. 930.807-RS, Quarta Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, j.
em 23.9.2008).
Da jurisprudência consolidada, duas orientações surgiram:
(i) É possível a cobrança da comissão de permanência, desde que não
cumulada com nenhum outro encargo moratório ou remuneratório. Prevista a
cobrança da comissão de permanência cumulada com outro encargo, este deve
ser afastado, mantendo-se somente aquela.
Orientação 1 – Manutenção isolada da comissão de permanência e afastamento de outros encargos.
Ministro Relator
Julgado
Órgão
Fernando Gonçalves
AgRg no REsp n. 1.020.737-RS, j. em 24.6.2008
4a Turma
Nancy Andrighi
AgRg no REsp n. 1.057.319-MS, j. em 19.8.2008
3a Turma
João Otávio de Noronha
AgRg no Ag n. 961.275-SP, j. em 6.3.2008
4a Turma
Massami Uyeda
AgRg no REsp n. 1.056.827-RS, j. em 7.8.2008
3a Turma
Sidnei Beneti
EDcl no AgRg no REsp n. 1.014.434-MS, j. em 19.8.2008
3a Turma
Ari Pargendler
AgRg no REsp n. 1.016.657-RS, j. em 20.5.2008
3a Turma
Carlos A. Menezes Direito
REsp n. 821.357-RS, j. em 23.8.2007
3a Turma
Hélio Quaglia Barbosa
AgRg no REsp n. 986.179-RS, j. em 27.11.2007
4a Turma
Humberto Gomes de Barros
AgRg no REsp n. 896.269-RS, j. em 6.12.2007
3a Turma
Carlos Mathias
(ii) Se o acórdão recorrido permitiu a cobrança de qualquer outro encargo,
afasta-se a cobrança da comissão de permanência, mantendo os demais encargos.
Este entendimento é defendido pelos Ministros Aldir Passarinho Junior e Luis
Felipe Salomão:
Orientação 2 – Afastamento da comissão de permanência e manutenção dos outros encargos.
Ministro Relator
Julgado
Órgão
Aldir Passarinho Junior
AgRg no REsp n. 990.830-RS, j. em 24.6.2008
4a Turma
Luis Felipe Salomão
AgRg no REsp n. 920.180-RS, j. em 26.8.2008
4a Turma
3. Da Ilegalidade da Comissão de Permanência.
A jurisprudência atual da 2ª Seção está pacificada no sentido de admitir a
cobrança da comissão de permanência, desde que não cumulada com nenhum
464
SÚMULAS - PRECEDENTES
outro encargo – moratório ou compensatório – e calculada à taxa média do
mercado, limitada às taxas contratuais.
A resposta aos ofícios encaminhados à Febraban revelou dados novos que não
podem passar despercebidos e que merecem ser considerados na elaboração
deste voto.
Os bancos, ao responderem às indagações da Febraban acerca da composição
da comissão de permanência, solicitaram, por questões comerciais e concorrenciais,
que esta julgadora mantivesse sigilo de suas informações, o que será respeitado.
Isto não impede, porém, que alguns desses dados sejam utilizados, de forma
impessoal e genérica, na elaboração deste voto.
As enormes variações constatadas das respostas ao ofício, demonstram que
cada banco trata da cláusula de comissão de permanência de maneira particular
e diferenciada, o que impossibilita o conhecimento pelo consumidor daquilo que
está pagando, além de inviabilizar a comparação dos custos da inadimplência
face aos outros bancos.
Vejam-se os seguintes dados:
(i) Um dos bancos cobrou, para abertura de crédito, em setembro de 2007,
acima de 16% ao mês nos dois primeiros meses, e em torno de 5,50% após, em
ambos os casos acrescido de 1% ao mês a título de juros de mora;
(ii) Em outro banco, a tendência é que a comissão se aproxime muito das taxas
de juros, encontrando-se ao redor de 0,5% ao dia;
(iii) Outro banco comunicou serem vários os componentes formadores do
encargo, como os custos com a captação de recursos, os impostos, o risco de
inadimplência e o chamado custo de administração, que envolve gastos com
pessoal, operacional, de instalações e equipamentos. Para este banco, a comissão
foi de 12% ao mês para as diversas modalidades de operação de crédito;
(iv) Outro banco informou que, nos últimos doze meses, a comissão de
permanência variou entre, aproximadamente, 4,70% e 6,30% ao mês;
(v) Na resposta mais esclarecedora, um banco afirmou que compõem a sua c
omissão de permanência, entre outros, os seguintes itens: “custas com despesas
jurídicas pela ação de cobrança” e “custo operacional pela ativação da cobrança
(...) Escritórios de Cobrança e Escritórios de Advocacia”. Aqui, a comissão variou
entre 6,5% até quase 20% ao mês.
Acrescente-se, por fim, a palavra da Febraban, entidade representativa dos
bancos, que, textualmente, assevera:
Em outras palavras, é impossível apontar critérios uniformes de cálculo da
comissão de permanência para todas as instituições, dado que esse cálculo
se baseia em diferentes peculiaridades. (grifei).
Como se depreende de tais informações, a incidência da cláusula de comissão
de permanência, tal como ocorre nos dias atuais, viola uma série de princípios e
direitos previstos no CDC.
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
465
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Numa listagem meramente exemplificativa, são afrontados o princípio
da transparência (art. 4º, caput); o princípio da boa-fé e equilíbrio entre os
contratantes (art. 4º, III); o direito à informação adequada e clara sobre os produtos
e serviços (art. 6º, III); além das regras específicas para a outorga de crédito ou
concessão de financiamento ao consumidor, previstas nos incisos do art. 52 do
CDC (informação prévia e adequada sobre o preço do produto, o montante dos
juros e os acréscimos legais).
Tais princípios são essenciais na sistemática do CDC, como anota a doutrina
em diversas oportunidades:
(i) Sobre a boa-fé e a transparência:
Poderíamos afirmar genericamente que a boa-fé é o princípio máximo
orientador do CDC; neste trabalho, porém, estamos destacando igualmente
o princípio da transparência (art. 4º, caput), o qual não deixa de ser um
reflexo da boa-fé exigida aos agentes contratuais. (Cláudia Lima Marques,
Antônio Herman Benjamin e Bruno Miragem, in Comentários ao Código de
Defesa do Consumidor, RT, São Paulo, 2003, p. 124).
(ii) Sobre o direito à informação:
Trata-se, repita-se, do dever de informar bem o público consumidor
sobre todas as características importantes de produtos e serviços, para
que aquele possa adquirir produtos, ou contratar serviços, sabendo
exatamente o que poderá esperar deles. (Ada Pellegrini Grinover e outros,
in Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do
Anteprojeto, Forense Universitária, Rio de Janeiro, 2004, p. 138).
Assim, se está diante de uma situação de total indefinição sobre os encargos
que integram a comissão de permanência e de suas taxas, situação que se agrava,
inclusive, pelo inusitado pedido de sigilo formulado pelos bancos.
Exsurge gritante a ausência de informação transparente e precisa ao
consumidor, bem como a potestatividade da sua cobrança.
Logo, deve ser definitivamente excluída a cláusula de comissão de
permanência, mesmo quando expressamente pactuada, permitindo-se aos
bancos-credores, para o período de inadimplência, a cobrança especificada dos
seguintes encargos, numericamente individualizados: (i) juros remuneratórios,
limitados pela taxa pactuada ou calculados à taxa média de mercado; (ii) juros
moratórios, de acordo com a lei aplicável; (iii) multa moratória de 2%, nos termos
do art. 52, § 1º, do CDC; e (iv) correção monetária, se for a hipótese.
12. Dispositivo
Forte em tais razões, conheço parcialmente do Recurso Especial e, nesta
parte, dou-lhe provimento para declarar a legalidade da cobrança dos juros
466
SÚMULAS - PRECEDENTES
remuneratórios, na forma como pactuados na espécie, e afastar as disposições de
ofício realizadas pelo Tribunal de origem.
Em razão da sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento das
custas processuais e dos honorários advocatícios, mantendo quanto a estes o valor
fixado no acórdão recorrido, que serão reciprocamente distribuídos e suportados
na proporção de 80% pelo recorrente e de 20% pela recorrida, e devidamente
compensados, conforme a Súmula n. 306-STJ. Suspensa a exigibilidade, em
relação à recorrida, enquanto perdurarem os efeitos da concessão do benefício
da assistência judiciária gratuita.
VOTO (proferido oralmente na sessão)
O Sr. Ministro João Otávio de Noronha:
a) Sustentação oral pela Febraban e pelo Idec
Senhor Presidente, se não estou enganado, a votação em questão de ordem
começa pelo mais antigo, mas já posso proferir meu voto.
Indefiro. Com relação a este processo, a lei é taxativa: aqueles que não são
partes podem se manifestar; todavia, hão de manifestar-se por escrito.
Trata o caso de mais um recurso especial, apenas julgado pela técnica
ou metodologia do instituto denominado “recurso repetitivo”. A lei permite
ao relator ouvir terceiros interessados, vale dizer, pessoas que, embora não se
submetam à eficácia da coisa julgada que derivará do acórdão no caso concreto,
têm legítimo interesse na defesa da tese apreciada, tendo em vista a repercussão
que dela se extrairá para futuros julgamentos de outros recursos. No caso, os
terceiros interessados foram ouvidos e se manifestaram por escrito. Portanto,
penso que, para manter a boa ordem, deve-se cumprir o que ficou estabelecido
nesta Seção em julgamento anterior: a sustentação oral deverá ficar reservada
apenas para as partes.
b) Mérito
I
Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. advogados, inicialmente, parabenizo os
advogados que ocuparam a tribuna: Dr. Luciano, pela parte recorrente; Dra.
Cláudia Lima, grande especialista em Direito do Consumidor; Dr. Marcos
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
467
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Cavalcante, grande especialista na matéria de Direito Bancário; e Dr. Valter
Moura, do Idec. Todos prestaram, da tribuna, proveitosos esclarecimentos.
Entendo ser importante elucidar que esta Corte, no presente julgamento,
não tem por propósito questionar a incidência do Código de Defesa do
Consumidor nas relações de Direito Bancário. Ao contrário, temos tal questão
como resolvida em caráter definitivo, razão por que este Sodalício editou a
Súmula n. 297.
Tenho que reconhecer, outrossim, que, no caso em espécie, não fomos
felizes na escolha do processo tipo, ou seja, aquele afetado a julgamento da
Seção nos termos do art. 543-C do Código de Processo Civil. Com efeito, dois
temas importantes não poderão ser analisados - quais sejam, capitalização de
juros e comissão de permanência –, pois, diante das peculiaridades do caso em
concreto, afigura-se impossível transpor a fase do conhecimento para analisar
tais questões, que integram o núcleo do mérito recursal.
O que restou então para ser analisado? As teses relativas: a) às “disposições
de ofício”; b) ao limite dos juros remuneratórios; c) à configuração da mora - e,
nesse ponto, parece-me termos um problema de ordem técnica -; e d) à inscrição
do nome do devedor no cadastro de inadimplentes.
Manifesto-me, primeiramente, sobre a capitalização de juros.
Entendo que a capitalização de juros é matéria que não ultrapassa a fase de
conhecimento - e peço vênia à Sra. Ministra Relatora para divergir no que tange
aos fundamentos, porquanto, embora o acórdão tenha enfrentado explicitamente
a questão, fê-lo sob a vertente constitucional. Confira-se:
No que respeita à Medida Provisória n. 2.070, não é aplicável, pelo fato de
não atender aos requisitos da relevância e urgência estabelecidas no art. 62
da Constituição Federal; por isso, é inconstitucional, dependendo de processo
legislativo ordinário para a sua aplicação. Tanto é assim que a eficácia do art. 5º foi
suspensa em 3 de abril de 2002, por decisão do Ministro Sidney Sanches.
Observa-se, portanto, com uma leitura mais atenta do acórdão recorrido,
que há enfrentamento da questão, mormente porque pressupõe contratada a
capitalização de juros.
A minha divergência, contudo, está em que o recurso não pode ser
conhecido porque o enfrentamento da questão deu-se com base em fundamento
constitucional, ou seja, o acórdão está respaldado em norma constitucional;
tanto é que o recorrente também aviou recurso extraordinário – inclusive
468
SÚMULAS - PRECEDENTES
causou-me perplexidade o fato de esse recurso não ter sido admitido na origem,
tendo em vista o prequestionamento explícito da norma constitucional.
Portanto, a questão da capitalização dos juros, no caso, ainda está em
aberto, pendente de apreciação pelo Colendo Supremo Tribunal Federal. Aqui,
vejo algo mais grave, que, aliás, passou desapercebido pelo recorrente e por
todos que, no Tribunal de origem, participaram do julgamento –. O Tribunal,
na realidade, ao afastar a constitucionalidade da norma, fê-lo em julgamento
em sede de órgão fracionário, violando, sem sombra de dúvida, o princípio da
reserva de plenário, visto que somente o Órgão Especial do Tribunal do Rio
Grande do Sul poderia aferir a inconstitucionalidade da norma, nos termos do
art. 97 da Constituição Federal e dos artigos 481 e 482, ambos do CPC.
Esta Corte teria condições de conhecer da matéria se, no recurso especial,
a questão da violação dos artigos 481 e 482 do CPC tivesse sido agitada no
acórdão recorrido. Como não foi, entendo que não temos como enfrentá-la, uma
vez que matérias que não foram prequestionadas não podem ser apreciadas por
este Tribunal ante a incidência das Sumulas n. 282 e n. 356 do Colendo STF.
Entretanto, se a capitalização de juros encontra-se pendente de apreciação
– porque aviado recurso extraordinário – surge outra questão: a mora está, então,
descaracterizada? No caso em julgamento, ainda não. Com efeito, é certo que
a mora só poderá ser considerada descaracterizada caso o Supremo Tribunal
acolha a tese de inconstitucionalidade da capitalização mensal dos juros ressalto, matéria ainda submetida à apreciação da excelsa Corte em vista do
ajuizamento pelo ora recorrente de recurso extraordinário. Assim, entendo que,
enquanto pender a apreciação da tese no Supremo Tribunal, não temos como
analisar a abusividade dos encargos contratados de modo a descaracterizar a
mora. Isso porque o recurso extraordinário, no caso em espécie, é prejudicial ao
julgamento do recurso especial.
Essa questão a Sra. Ministra Relatora não enfrentou, até porque S. Exª diz,
em seu voto, quando trata da capitalização de juros, à fl. 10, que:
Os encargos abusivos que possuem potencial para descaracterizar a mora
são, portanto, aqueles relativos ao chamado “período de normalidade”, ou seja,
aqueles encargos que, naturalmente, incidem, antes mesmo de configurada a
mora.
Ainda que ultrapassada essa questão, penso que temos um incidente de
prejudicialidade, que importaria na suspensão do próprio julgamento do recurso
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
469
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
especial para apreciação primeiro do recurso extraordinário. Só aqui na Seção,
lendo o voto da Ministra Nancy Andrighi, é que constatei esse fato. Aliás, tal
questão nem sequer foi mencionada nos memoriais que me foram entregues
pelas partes ou pelos terceiros interessados.
Se suplantada a questão, enfrento os demais argumentos.
Quanto à comissão de permanência, também não conheço do recurso,
visto que não foi demonstrada analiticamente a divergência, bem como não
foi apontado nenhum dispositivo de lei violado. A mera citação de súmula e
de paradigmas não dispensa a demonstração analítica da divergência como,
reiteradamente, entende a jurisprudência desta Corte.
Seguirei a ordem da eminente Relatora.
No que tange aos juros de mora, a eminente Relatora manteve a posição já
consolidada deste Sodalício, no sentido de ser permitido até o limite da taxa de
1% (um por cento) ao mês, com o que estou de pleno acordo.
Quanto ao cadastro de inadimplência, também estou de pleno acordo com
a Sra. Ministra Relatora, inclusive no que tange ao pedido de antecipação de
tutela, porquanto o seu voto está em consonância com a reiterada jurisprudência
da Segunda Seção deste Tribunal.
Juros remuneratórios: nesse ponto, peço vênia para divergir.
É evidente que, em se tratando de juros remuneratórios, há de ser apreciada
a questão da abusividade das taxas; não tenho dúvida quanto a isso. Tal análise,
contudo, há de ser feita caso a caso. Data vênia, não vejo como pode esta
Corte tarifar ou tabelar tal encargo financeiro como forma de estabelecer um
paradigma para o diagnóstico da abusividade da taxa contratada.
E por que me posiciono contra o tarifamento ou tabelamento dos juros? A
um, porque essa não é uma atribuição que nos é dada pela Constituição Federal.
A dois, porque entendo que decisão dessa natureza acaba por penalizar ou
prejudicar aquele que a lei quer proteger, ou seja, o consumidor.
Os agentes econômicos têm inteligência e instrumentos suficientes para
contornarem um eventual (e absurdo) tabelamento judicial dos juros. Em caso
tal, a primeira conseqüência seria um aumento radical das taxas cobradas como
forma de elevar a “taxa média de mercado”, o que encareceria sobremaneira
o custo da moeda para os tomadores, mormente para aqueles com menor
potencial negocial, como os consumidores.
Por isso, hei de divergir da proposta da eminente relatora de que esta Corte
estabeleça um teto correspondente ao dobro da taxa média como sendo os
470
SÚMULAS - PRECEDENTES
juros razoáveis. Vale dizer, haveria o Judiciário de reconhecer como abusivos os
encargos financeiros quando a taxa pactuada ultrapassasse o dobro da média da
taxa de juros praticada pelo mercado financeiro. A meu sentir, melhor será aferir
a abusividade diante do caso concreto, tendo em conta a realidade econômica
vigente em determinado local e tempo. Confio que, nas instâncias ordinárias,
os julgadores saberão, caso a caso, diagnosticar se está ou não configurada a
chamada abusividade dos encargos cobrados para daí, então, descaracterizar ou
não a mora.
Há outro detalhe: Sua excelência Ministra Nancy Andrighi, embora
estipule o dobro, sustenta que é permitido à instituição financeira provar que,
com relação àquele cliente, os riscos oferecidos são maiores. Tenho como correta
tal afirmativa, pois, na estipulação da taxa de juros, segundo a boa técnica
bancária, o banco há de levar em conta não apenas os riscos macroeconômico
e setorial, mas também o risco do cliente. Todavia, surge outro problema:
admitida essa possibilidade, que me parece extremamente razoável, inviabilizada
encontra-se a tese que permite ao juiz, de ofício, conhecer da abusividade dos
encargos, visto que, ante a falta de alegação do devedor, o que torna a questão
incontroversa, nem sequer seria possível oferecer à instituição financeira a
oportunidade de desincumbir-se do mister de demonstrar e provar que a
elevação da taxa de juros, no caso concreto, decorreria do elevado risco-cliente.
No caso em julgamento, pedindo novamente vênia à ilustre Relatora,
entendo que não está configurada a abusividade dos juros pactuados, porquanto a
taxa estipulada é inferior à taxa média de mercado vigente à época da celebração
do contrato. Também, como afirmei, não há de ser estipulada nenhuma tarifação,
nenhum limite, visto que a abusividade dos encargos há de ser aferida nas
instâncias ordinárias, diante do caso concreto.
II
Não, Excelência. Mantenho a taxa média de mercado, mas não estipulo o
seu dobro como teto ou mesmo estabeleço qualquer outro limite. O parâmetro
da razoabilidade dos encargos pactuados deve ser aferido pelo Juiz diante do
caso concreto, que poderá concluir pelo dobro, pelo triplo ou por outro critério
que seja inclusive inferior ao teto que V. Exª propõe.
Até digo que, quando ficar estabelecido o dobro, a instituição financeira
penderá por contratar sempre por uma taxa que, embora inferior, seja mais
próxima desse teto. Entendo que, às vezes, considerando determinada situação
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
471
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
da economia e do cliente, uma vez e meia a taxa média poderá caracterizar
preço excessivo da moeda. Reafirmo: é melhor que o juiz, caso a caso, mediante
demonstração cabal da situação, tendo em conta a realidade econômica
subjacente ao contrato e às provas dos autos, decida, justificadamente, se há ou
não onerosidade da taxa contratada.
Lamento que, no Brasil, discuta-se a abusividade das cláusulas contratuais
apenas com fundamento no Código de Defesa do Consumidor. Na verdade, o
instituto da onerosidade excessiva tem aptidão para se configurar em qualquer
tipo de relação contratual, pouco importando a sede legislativa em que as partes
estribam seus fundamentos. No Código Civil atual, existe a figura da lesão, que
anteriormente achava-se consagrada por força doutrinária e jurisprudencial.
Na verdade, quando julgamos o recurso especial pela técnica do
procedimento repetitivo de que trata o art. 543-C do Código de Processo
Civil, considerando a multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica
questão de direito, primeiramente sufragamos o entendimento da “tese jurídica”
para depois aplicarmos o entendimento ao caso em concreto. Mas no caso, não
vejo como assim proceder, visto que o recurso em questão não ultrapassa a fase
do conhecimento ante a ausência do prequestionamento da tese ora debatida.
III
Agora, manifesto meu posicionamento a respeito da revisão de ofício das
cláusulas contratuais nas instâncias ordinárias.
Aqui, novamente, peço vênia a Exmª Ministra Nancy Andrighi, pois,
neste ponto, temos como caracterizada entre nós uma profunda divergência de
cunho até ideológico, certamente em razão de nossas origens. Sua Excelência
desenvolveu toda a sua vida profissional, de forma brilhante, na magistratura,
enquanto eu finco minhas raízes no exercício por mais de duas décadas na
advocacia para só depois ingressar, como magistrado, neste Colendo Tribunal,
do que, aliás, muito me orgulho.
Sempre entendi que não cabe ao juiz distanciar-se de sua neutralidade na
condução do processo; não deve ele advogar no sentido de defender interesse
algum no processo. Se lhe é dado examinar amplamente as provas e até tomar a
iniciativa de inverter o seu ônus de produção, isso não pode nos levar à conclusão
de que o juiz protege o hipossuficiente. Não, o juiz não protege ninguém, é a
lei que, na forma por ela taxativamente prevista, protege o hipossuficente nas
472
SÚMULAS - PRECEDENTES
relações de consumo, mas nunca o juiz. A este cabe a tarefa de, diante do caso
concreto, subsumir os fatos a norma e, mediante um juízo de valor, formular a
regra jurídica aplicável ao caso.
Na atualidade, para a defesa dos hipossuficientes, a Constituição Federal
instituiu as defensorias públicas. Aliás, a jurisprudência desta Sessão pacificouse no sentido de não ser admissível a revisão de ofício das cláusulas contratuais
para taxá-las de onerosas.
Repiso a indagação: Como o juiz poderá saber se há abusividade ou não
diante do caso concreto se a própria parte não a alegou?
E mais: até para ser coerente com o que sustentei - acerca da impossibilidade
de ser estabelecido um teto -, como admitir possa o juiz, de ofício, promover o
decote dos encargos financeiros pactuados sem que seja oferecida à outra parte –
o banco – a oportunidade de provar que, no caso concreto, a taxa pactuada fora
fixada tendo em conta as condições imperantes no mercado e segundo a boa
técnica bancária, não caracterizando portanto abusividade?
Ademais, é bom que se diga que nem sempre será do agente financeiro
o ônus da prova da não-caracterização da abusividade, porquanto existem
hipóteses em que a inversão do ônus da prova não deve ser deferida, como, por
exemplo, quando a parte litigante for pessoa jurídica que não se enquadra na
relação de consumo ou quando não caracterizada a hipossuficiência daquele que
litiga com a instituição financeira.
Reitero minhas vênias para discordar também de um dos fundamentos
invocados pela eminente Relatora, qual seja, o da alteração legislativa, que,
a meu ver, diz respeito apenas às regras de competência, não se referindo à
possibilidade de conhecimento e decote de ofício das cláusulas contratuais
relativas aos encargos financeiros. Oportuno lembrar que, na espécie, estamos
tratando de direitos disponíveis e não se pode olvidar que a parte, de regra, sabe
o que pode e o que não pode contratar e honrar.
Considero estranha à discussão estabelecida no presente caso a questão
relativa ao dever de informação da instituição financeira, ora ventilada pela
eminente Relatora.
Assim, peço vênia a Exma. Ministra Relatora, mas não vejo razão que
justifique que esta Corte altere o entendimento jurisprudencial cristalizado ao
longo de vários anos de julgamento.
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
473
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Rejeito também porque, durante esses seis anos de Tribunal, constatei que
o consumidor tem sido muito bem defendido no Judiciário. A meu ver, o micro
sistema legislativo que regula as relações de consumo - segundo diz a eminente
Dra. Cláudia Lima Marques - vem atingindo alto grau de eficácia, conforme se
infere do exame dos acórdãos deste Tribunal. Aliás, a jurisprudência edificada
nesta Corte a respeito do tema não se consolidou por obra do acaso. Ao
contrário, é fruto direto do hercúleo trabalho desenvolvido pelos advogados
contratados por diversos organismos de proteção do consumidor, como por
exemplo, o Idec. Assim, afigura-se inegável que a estrutura protetiva das relações
de consumo não está exigindo que o juiz perca sua neutralidade no processo; por
isso, entendo não deva ele atuar substituindo ou dispensando a manifestação da
parte indigitada como hipossuficiente na defesa de seus interesses.
Assim, com as ressalvas aqui colocadas quanto a) ao conhecimento de
ofício; b) ao fundamento da questão acerca da capitalização mensal dos juros; e
c) ao estabelecimento de um teto – que a Sra. Ministra Relatora indicou como
sendo o dobro da taxa média de mercado – para aferição da abusividade da taxa
de juros contratada, acompanho, no mais, o brilhante, didático e claro voto da
Sra. Ministra Fátima Nancy Andrighi.
Conheço parcialmente do recurso especial e dou-lhe provimento em maior
extensão do que aquele dado pela Relatora.
Fica pendente a questão da prejudicialidade relativa à questão da
capitalização de juros, tese que tem relação com a descaracterização da mora.
c) Correção do resultado após esclarecimentos
Sr. Presidente, dou provimento ao recurso especial neste ponto; dou
provimento ao recurso especial quanto aos juros remuneratórios, porque a Sra.
Ministra Relatora também o proveu; entendo que, quanto à configuração da
mora, temos uma questão de prejudicialidade para ser resolvida. Penso que
deveríamos primeiro apreciar essa questão. Quanto à inscrição no cadastro
de inadimplemento, estou acompanhando o voto da Sra. Ministra Relatora.
Conheço parcialmente do recurso especial, porque dele não conheço com
relação à comissão de permanência, e dou-lhe provimento em maior extensão
que a Sra. Ministra Relatora.
d) Esclarecimentos do Ministro João Otávio para a Ministra Nancy
Andrighi, no sentido de divergir dos fundamentos de seu voto quanto à
estipulação de um teto para aferir sobre a abusividade da taxa de juros
474
SÚMULAS - PRECEDENTES
I
Quanto aos percentuais, acompanho o voto de V. Exa. Sra. Ministra Nancy
Andrighi. Não há abusividade. Mas, como V. Exª avança em seus fundamentos,
e o acórdão deste julgamento certamente será considerado como paradigma nas
instâncias ordinárias, reafirmo que não concordo com o estabelecimento de um
teto ou limite como forma de balizar a aferição da abusividade dos encargos
financeiros. Reafirmo: esta aferição deverá ser feita pelo juiz caso a caso.
II
Acredito até que essa questão não é objeto de discussão, mas V. Exa.
sobre ela tece considerações em seu voto. Entendo que, mesmo que inserido no
seu voto como obter dictum, algum operador do direito, menos atento, poderá
pleitear a aplicação do limite proposto por V. Exª Daí o cuidado que devemos
ter para que questão não efetivamente apreciada por esta Corte possa ser
tomada como se decidida o fosse por ela.
III
Minha preocupação reside – Exma. Ministra Nancy Andrighi - no
cuidado que devemos ter com o efetivo entendimento do que aqui restou
decidido. Suponhamos que V. Exa. seja autora do voto vencedor e, por isso,
lavre o acórdão. Se do seu voto constar esse fundamento - com o qual não
concordamos -, esse entendimento poderá pautar a conduta dos julgamentos nas
instâncias originárias, quando, na realidade, a Corte sobre essa questão jurídica
definitivamente ainda não se manifestou. Ademais, não há sequer um precedente
desta Seção que fixe qualquer limite ou parâmetro para caracterização da
abusividade da taxa de juros.
IV
Estou apenas mostrando a conseqüência. De modo algum ataquei o
posicionamento de V. Exa.; pelo contrário, o debate está no mais alto nível e
nossa intenção aqui é estabelecer regras claras que possam orientar os juízes
deste país quando do julgamento de causas fundamentadas em tese idêntica a
esta que estamos apreciando.
e) Esclarecimentos do Ministro João Otávio após o voto do Ministro
Sidnei Beneti
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
475
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
I
Com relação à prejudicialidade, chamei a atenção para o fato de o Tribunal
ter reconhecido a inconstitucionalidade de norma federal por órgão fracionário,
isto é, sem observância do princípio da reserva de plenário.
A parte interpôs recurso extraordinário, que se encontra pendente de
apreciação pelo STF. Esse recurso não foi suspenso pelo Excelso Pretório, em
que pese o processamento da ADIn que tem por objeto a mesma matéria.
II
Não, Sr. Ministro Sidnei Beneti, o art. 481, parágrafo único, do Código
de Processo Civil dispensa o órgão fracionário de submeter ao órgão pleno a
argüição de inconstitucionalidade quando esta já o fora declarada pelo próprio
órgão pleno ou pelo plenário do Supremo Tribunal Federal. No caso, nenhuma
das hipóteses ocorreu.
f ) Esclarecimentos do Ministro João Otávio à Ministra Nancy Andrighi
Afirmei o seguinte: divirjo de V. Exª na aplicação da Súmula n. 7, já que
o Tribunal enfrentou expressamente a questão da capitalização, dizendo que
a afastava porque a Medida Provisória n. 2.170 é inconstitucional. Vale dizer,
afastou a eficácia da norma por inconstitucionalidade sem suscitar o incidente
de que tratam os artigos n. 480 a 482 do Código de Processo Civil – incidente
de inconstitucionalidade.
Por isso, não incide a Súmula n. 5 nem a Súmula n. 7. O Tribunal claramente
enfrentou a tese da inconstitucionalidade. A matéria encontra-se explicitamente
prequestionada. O proceder do Tribunal de Justiça é que me parece, data venia,
equivocado. Concluindo pela inconstitucionalidade, caberia a ele suscitar o
incidente de inconstitucionalidade na forma preconizada pela Constituição e
pelo CPC. Todavia, não o fez. Nada obstante, a parte não ventilou a nulidade do
julgamento no recurso especial nem no recurso extraordinário. A questão, assim,
restou preclusa. Destarte, a questão relativa à reserva de plenário, no presente
caso, encontra-se sepultada.
Avanço: se se quer descaracterizar a mora por causa da capitalização,
porque vingou, no Tribunal a quo, a tese de que a capitalização é inconstitucional,
e se a questão da capitalização continua aberta porque não transitada em julgado
na medida em que tal fundamento do acórdão recorrido restou impugnado por
476
SÚMULAS - PRECEDENTES
meio do recurso extraordinário, apesar de o TJ ter-lhe negado seguimento (fato
que me parece absurdo, pois é a típica hipótese de prequestionamento explícito),
a parte teve o cuidado de interpor recurso de agravo de instrumento, cujo
julgamento encontra-se pendente. Portanto, não está transitada em julgado a
questão da capitalização. É esse o fundamento.
g) Esclarecimentos do Ministro João Otávio após elucidação da
Ministra Nancy Andrighi de que não considerou a mora caracterizada
I
Ora, se a mora não restou descaracterizada, então não ocorrerá a
prejudicialidade, uma vez que, na hipótese de provimento do recurso
extraordinário interposto, o STF decidirá de modo definitivo a questão da
constitucionalidade ou não da capitalização dos juros.
II
Sra. Ministra Nancy Andrighi, V. Exa. disse, com todas as letras, que a
mora, no caso, não está descaracterizada. O erro foi meu. Assim, estou apenas
dissentindo no que tange ao fundamento relativo à estipulação do teto dos juros
remuneratórios e à disposição de ofício.
RETOMADA DO JULGAMENTO
a) Sobre o pedido de suspensão formulado pelo Ministério Público em
razão da ADIN n. 2.316-DF
Sr. Presidente, entendo que esteja prejudicado o pedido, mas voto de
acordo com a Sra. Ministra Relatora.
b) Comissão de permanência/ manutenção de posse/ cláusula-mandato/
protesto do título/ repetição de indébito, que não fazem parte das teses de
uniformização, pois referem-se ao caso concreto
I
Não conhecemos do recurso quanto à comissão de permanência, porque
não havia demonstração analítica no que tange à alínea c. Então, V. Exa. está
mudando o voto?
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
477
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
II
Estou afirmando que V. Exª está mudando o voto e pedirei vista para
examinar.
O que é comissão de permanência? São os encargos moratórios, isto é,
cobrados após o vencimento da obrigação. O que tínhamos de fazer seria fixálos. A jurisprudência evoluiu para entender que a comissão de permanência é
composta das seguintes parcelas: a) juros segundo a taxa média de mercado; b)
multa moratória de até 2% na forma do CDC: e c) juros de mora fixado em até
1% ao mês.
Cabe-nos a missão de deixar claro aos juridicionados qual o entendimento
deste Tribunal sobre o conteúdo da denominada cláusula “comissão de
permanência”. Aliás, esta Seção já o fez. Aqui estamos apenas precisando e
reiterando o seu conceito.
Comissão de permanência é, portanto, o somatório dos encargos que
incidem no período do inadimplento da obrigação, ou seja, após o vencimento
da dívida. Destarte, o devedor que honra pontualmente com suas obrigações a
esse encargo não estará submetido.
Com base nisso, não há como prosperar, data vênia, o entendimento de
que eventual abusividade na estipulação dos encargos que integram a cláusula
“comissão de permanência” teria o condão de descaracterizar a mora. Ora, não
se pode olvidar que a cláusula “comissão de permanência” só adquire eficácia
quando a mora já estiver caracterizada.
Reportando-me ao princípio da boa-fé objetiva – que deve ser aplicado à
relação contratual de forma a incidir em ambos os lados da relação negocial – na
hipótese, especificamente com relação ao deferimento da busca e apreensão do
bem em face do inadimplemento contratual, entendo que não se deve permitir
que o devedor que contratou e adquiriu o bem com o produto do financiamento
permaneça na posse do referido bem quando apenas honrou uma única ou
poucas prestações, só pelo fato de ter ele ajuizado ação revisional. Não é esse o
comportamento que se espera de um homem probo.
Registro que tenho, no meu gabinete, inúmeros processos nos quais se
verifica a seguinte situação: paga-se uma ou duas parcelas do financiamento
e ajuíza-se a ação revisional sob alegação de que cláusula de comissão de
permanência é abusiva. Não se paga mais nada, e, ainda assim, há decisões
judiciais determinando que o bem (normalmente um carro) deve ficar na posse
do devedor inadimplente. É lógico que tais decisões, longe de aplicarem o
princípio da boa-fé objetiva, acabam por violá-lo.
478
SÚMULAS - PRECEDENTES
Sr. Presidente, eventual excesso dos encargos financeiros integrantes da
cláusula “comissão de permanência” deve levar o juiz simplesmente a decotá-los,
ajustando o seu conteúdo àquele admitido pela jurisprudência consolidada deste
Sodalício.
Destarte, temos que nos pautar por aquele entendimento que respeite e
privilegie a conduta dos contratantes em conformidade com o princípio da boafé objetiva, não tolerando abusividade na cobrança dos encargos de mora e não
permitindo a proliferação de condutas abusivas do devedor, evitando-se ao mesmo
tempo o crescente inadimplemento no tráfico comercial, situação que prejudica a
todos, mormente os adimplentes, que sofrem as conseqüências na medida em que
a elevação do risco importa no aumento dos encargos financeiros. Cabe-nos zelar
pelo prestígio do princípio da segurança jurídica a bem de todos.
III
Sra. Ministra Nancy Andrighi, um aparte, por favor. É importante.
A mora não foi descaracterizada por V. Exª na semana passada. Entendi que
estava sendo descaracterizada e errei ao propor o incidente de prejudicialidade.
Mas, hoje, V. Exa. está voltando a descaracterizar a mora pela cláusula de
comissão de permanência ou não entendi nada do voto de V. Exa..
c) Manifestação do Ministro João Otávio de Noronha após os
esclarecimentos da Ministra Nancy Andrighi de que não estava decidindo
acerca da mora, mas apenas retirando a eficácia da cláusula que prevê a
comissão de permanência
I
Entendo que essa posição de V. Exa. prejudica o consumidor, porque a
jurisprudência evoluiu em benefício dele ao estabelecer que a taxa de juros
integrante da comissão de permanência – refiro-me aos juros remuneratórios –
será calculada segundo a taxa média de mercado.
Qual a grande vantagem para o consumidor?
II
Sra. Ministra Nancy Andrighi, V. Exa. também não está entendendo o que
estou afirmando.
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
479
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
A comissão de permanência, ou seja, os encargos que incidem após a mora
- segundo o entendimento de nossa jurisprudência -, na verdade, beneficia o
consumidor quando a taxa de juros que a integra oscila segundo a taxa média de
juros de mercado apurada pelo Banco Central do Brasil. Isso é evidente, pois, na
hipótese de queda dessa taxa, o consumidor sai beneficiado sem que isso altere o
equilíbrio financeiro do contrato.
d) Após a proposta de se votar a preliminar de conhecimento sobre a
questão da comissão de permanência
I
Sr. Presidente, li o voto novamente e verifico que o dissídio efetivamente
não restou demonstrado.
Tenho que a matéria é relevante, mas, ainda assim, no caso concreto, não
vejo como ultrapassar o conhecimento do recurso.
Bom seria que o critério reitor do juízo de admissibilidade fosse o da
relevância da tese jurídica, o que faria preponderar sempre o interesse geral
sobre o particular. Aliás, é a posição que defendo minoritariamente nesta
Corte. Mas, infelizmente não é o entendimento da maioria dos Ministros que
integram este Tribunal.
No caso vertente, como já dito, não tendo o recorrente se desincumbido de
demonstrar o dissídio jurisprudencial, não vejo como conhecer do recurso nesse
ponto.
II
Sr. Presidente, não conheço do recurso especial pelas alíneas a e c.
e) Esclarecimentos sobre o teto – parâmetro para aferir abusividade da
taxa de juros
I
Sr. Presidente entendo que a fixação de um teto referencial igual a duas
vezes a taxa média de juros do mercado para caracterização da abusividade, data
vênia, não se mostra conveniente para o próprio consumidor. É sabido que o
custo do dinheiro varia segundo o tempo, o espaço geográfico, as condições da
macroeconomia e outras variáveis.
480
SÚMULAS - PRECEDENTES
Melhor deixar que tal aferição, ou seja, a da abusividade, fique entregue
ao juiz que, diante do caso concreto, tendo em conta a realidade do mercado
no momento da contratação, saberá decidir se o consumidor estará ou não
sendo prejudicado. Aliás, é bom que se diga, que, em determinadas situações,
o estabelecimento do dobro da taxa média poderá ser inclusive oneroso para o
devedor. Tudo dependerá da realidade econômico-financeira reinante.
II
Faço um complemento para melhor informar meus Pares, com relação à
fixação da taxa de juros. Cito aqui um exemplo: no Banco do Brasil, a taxa de
juros do cheque especial é fixada diferentemente para cada cliente tendo em
conta sempre o retorno financeiro oferecido, o grau de risco que ele apresenta,
a pontualidade e ainda o seu histórico econômico-financeiro. A isso somam-se
o risco setorial e o risco legal do produto. Inegável, portanto, que, para fixar a
taxa de juros, o banco leva em consideração uma série de variáveis ou fatores. Se
assim o é, como poderá ser estabelecido por decisão judicial um critério geral,
desprezando conseqüentemente as peculiaridades de cada contratação?
Se optarmos por estabelecer um teto, toda essa realidade fática e econômica
será desconsiderada e em detrimento de quem? Do consumidor, é evidente.
O consumidor que quita seus financiamentos no vencimento, que, com
seus negócios, oferta uma razoável retribuição ao banco pode obter uma taxa
muito inferior àquela equivalente à média do mercado. Para este consumidor, a
fixação de uma taxa de juros igual ou um pouco inferior, inclusive, ao dobro da
taxa média de juros vigente poderá caracterizar abusividade.
É por isso, Senhores Ministros, que prefiro confiar na prudência do juiz
da causa, que, diante da realidade do caso concreto, saberá adotar a decisão que
melhor atenda o equilíbrio contratual e, por conseguinte, beneficie, nos exatos
termos da lei, o consumidor probo e honesto.
f ) Esclarecimentos do Ministro João Otávio ao Ministro Sidnei Benetti
sobre a fixação de parâmetro para aferir a abusividade da taxa de juros
Sr. Ministro Sidnei Beneti, começarei pelo último ponto, a competição.
Penso que, por mais de dez anos, não teremos uma efetiva concorrência
no sistema financeiro: os bancos cresceram, grandes instituições incorporaram
outras menores, diminuindo, conseqüentemente, a disputa pelo mercado. O que
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
481
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
se tem observado no mundo, nestes últimos tempos, é uma redução do número
de instituições financeiras. Bancos maiores incorporando menores ou, quando
não, dois grandes conglomerados fundindo-se, resultando numa instituição
ainda maior e mais forte, facilitando inclusive a formação de cartéis no sistema.
Então, competitividade no sistema financeiro, nesta crise, por um prazo
que estimo em dez anos, não haverá. Assim, não acredito, pelo que tenho
lido, que o sistema financeiro não se reabilitará nos níveis de competitividade
observados nos últimos anos, tamanho o estrago feito no sistema americano,
que refletiu diretamente no sistema europeu. De outro lado, o sistema brasileiro
está protegido porque os nossos fundos de pensão não puderam comprar títulos
emitidos pelas instituições estrangeiras.
É sabido que a taxa média de juros de mercado é calculada segundo as taxas
praticadas pelas instituições financeiras, das quais algumas conseguem captar a
custos baixos e outras não. Conseqüentemente, as taxas por elas praticadas
variam segundo o custo de captação. Assim, a cobrança de encargos pelas
grandes instituições, que normalmente captam recursos a custos menores, tendo
como parâmetro a média da taxa, poderá ser-lhes extremamente vantajosa. Já
para os bancos pequenos, a taxa média poderá ser inclusive inferior ao custo de
captação.
Destarte, tenho que a estipulação de um teto para aferição de abusividade
poderá sugerir aos agentes financeiros procederem, preventivamente, ao
aumento das taxas praticadas como forma de elevar o cálculo da própria média,
procedimento que seria altamente prejudicial aos tomadores. Daí a importância
de não ser adotado um critério geral, mas ter sempre em conta a realidade
econômica-financeira que subjaz à causa posta à apreciação do Judiciário.
É certo que o aumento da oferta de recursos certamente reduziria o preço
do dinheiro e conseqüentemente influenciaria na diminuição das taxas cobradas
pelas instituições financeiras. Isso seria o desejável neste momento. Entretanto, é
sabido que a demanda por crédito, nesses últimos tempos, cresceu em dimensão
maior do que a oferta, fato que provocou a interrupção da tão desejada queda
das taxas que estava ocorrendo no mercado. Ou seja, a demanda por crédito
voltou, neste momento da economia brasileira, a ser bem maior do que a oferta
–, basta ver que os pequenos bancos estão passando por dificuldades para
manter o giro de suas carteiras, fato observado inclusive no crédito consignado
que, pela maior segurança que oferece ao financiador, permite seja cobrada, no
financiamento, uma taxa menor que a cobrada nos outros empréstimos em geral.
482
SÚMULAS - PRECEDENTES
Está aí a razão de o Governo brasileiro instituir, por meio da edição de
medida provisória, a exemplo do que está acontecendo na Europa e nos Estados
Unidos, um mini proer para permitir que os bancos maiores, inclusive o Banco
do Brasil e a Caixa Econômica Federal, possam adquirir carteiras de crédito
de outros bancos menores que enfrentam problema de liquidez em razão do
descasamento entre os prazos de captação e o de empréstimo dos recursos.
São essas as razões – Exmo. Ministro – que me levam a me posicionar
contrariamente à Exma. Sra. Minstra Nancy Andrighi no que tange à
estipulação de um parâmetro (judicial) para aferição da abusividade da cláusula
dos encargos financeiros.
VOTO-PRELIMINAR
O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior: Sr. Presidente, na verdade, o Sr.
Ministro Luis Felipe Salomão tem razão, a Sra. Ministra Relatora não conheceu.
Então, estou com a Relatora por duas razões: uma, porque não conheceu da
matéria, então, está prejudicada e, segundo, porque também não seria o caso de
se aguardar, mas, de qualquer forma, a Relatora não está conhecendo.
VOTO
O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior: Sr. Presidente, rogo vênia a Sra.
Ministra Relatora para também não conhecer do recurso especial em função
da especificidade da matéria. Apenas pela mera nulidade da cláusula pelo nome
que se dá à comissão de permanência, eu não teria como enfrentar pela letra c.
Examinei a petição recursal e, de fato, pela letra c fica muito difícil o
enfrentamento dessa questão, até porque a própria tese de mérito diz respeito a se
se poderia considerar nula ou não a comissão de permanência, considerando que
a nossa própria jurisprudência, em relação ao tema, considera válida a cláusula,
apenas limitando-a a uma taxa média de mercado, ou seja, independentemente
do que se ponha na comissão, sempre limitamos à taxa média de mercado sem
agregação de outros encargos, mas sempre validando-a.
Portanto, entendo que pela letra c ficaria difícil enfrentar a cláusula
específica, muito embora eu entenda a preocupação da eminente Relatora
no sentido de se procurar solucionar essa questão, agilizando o julgamento.
Devemos ter uma largueza maior nessa interpretação, mas, no caso específico, eu
teria essa dificuldade em função de como está sendo colocada a tese.
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
483
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Feita essa ressalva, acompanho a divergência inaugurada pelo Sr. Ministro
João Otávio de Noronha, não conhecendo do recurso especial.
Sr. Presidente, não conheço da matéria alusiva à capitalização dos juros e
também em relação à comissão de permanência, pelos motivos já declinados –
inclusive em um deles já antecipamos esse não-conhecimento.
Em relação aos juros remuneratórios, acompanho em parte a eminente
Ministra Relatora no sentido de entender que não há a limitação de juros.
Constitucionalmente, isso foi abolido, e o que se entende é que se considera
abusivo aquilo que for demonstrado como ultrapassando, em muito, a taxa
média de mercado. Essa consideração, realmente, fica a juízo das instâncias
ordinárias e me parece até que, nesse ponto, depois que assim se firmou, vêm os
Tribunais Estaduais aplicando, de forma razoável, a orientação do STJ.
Entendo a posição da Sra. Ministra Nancy Andrighi quando quis
estabelecer um teto objetivo para aferição da abusividade poder, pelo menos,
aliviar as instâncias superiores. Muito embora vendo a praticidade da proposta,
penso que as instâncias ordinárias é que devem avaliar, mesmo porque – o Sr.
Ministro João Otávio de Noronha destacou, e é fato – isso depende de uma série
de fatores, inclusive do risco jurídico de cada região e suas peculiaridades.
Em relação à mora, estou com a Sra. Ministra Relatora porque, como no
caso deu-se uma interpretação de que não havia sido pactuada capitalização, e
essa matéria ficou vencida porque não conhecemos do especial nessa parte, não
houve a mora, conseqüentemente.
Quanto à inscrição do devedor no Cadastro de Proteção ao Crédito,
acompanho a Sra. Ministra Nancy Andrighi, que fez um pormenorizado
levantamento da nossa jurisprudência. Faço a ressalva quanto às disposições
de ofício porque, efetivamente, entendo que não é uma questão de formalismo:
a ação segue conforme a prestação jurisdicional que é solicitada; dizer que o
contrato é abusivo, data venia, não dá direito a que o juiz saia lendo o contrato
e fazendo uma interpretação subjetiva do que ele pensa ser ou não abusivo. E
o grau de subjetivismo, hoje, é extraordinário. Esse é um grande problema. Por
mais boa-vontade que se possa ter na tese, muitos advogados, conscientes de que
aquela pretensão não tem amparo legal, nem a põe na inicial porque sabem que
aquilo não irá longe, mas o Tribunal ou, às vezes, o juiz, vão além, em defesa de
teses já ultrapassadas no STF e STJ, e aí cria-se um contencioso que nem foi
pretensão da parte autora.
Então, realmente, penso que a estrita observância ao pedido inicial, nesse
ponto, há de preponderar.
484
SÚMULAS - PRECEDENTES
Em relação às questões do processo repetitivo, da afetação, estou, em suma,
acompanhando a eminente Relatora, salvo na sugestão de se considerar como
abusivo apenas a partir do dobro da taxa média de mercado e em relação ao
conhecimento, de ofício, de cláusula contratual, que entendo não ser possível.
Em relação ao restante, estou de acordo com a eminente Relatora.
VOTO
O Sr. Ministro Fernando Gonçalves: Sr. Presidente, não conheço do
recurso especial.
VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Luis Felipe Salomão:
1. Relatório
A autora propôs ação revisional em face de Unibanco – União Brasileira de
Bancos S/A, pedindo: a) antecipação da tutela, a fim de evitar que seu nome seja
inscrito em cadastro de inadimplentes, bem como para ficar em posse do bem
objeto do financiamento até o encerramento da discussão judicial; b) depósito
em juízo do valor incontroverso; c) apresentação do contrato pela empresa ré; d)
fixação de juros em 12%; e) exclusão da capitalização; f ) aplicação do Código
de Defesa do Consumidor; e g) declaração de nulidade de encargos contratuais
considerados abusivos. Cuida-se de contrato bancário, garantido por alienação
fiduciária, no qual a autora, Rosemari dos Santos Sanches, obteve financiamento
para a aquisição de motocicleta Honda CG 150, com pagamento de uma
entrada e parcelamento do saldo remanescente (R$ 4.980,00) em 36 (trinta e
seis) prestações no valor, cada uma, de R$ 249,48 (duzentos e quarenta e nove
reais e quarenta e oito centavos).
A antecipação de tutela foi deferida à fl. 17, no sentido de manter a posse
do veículo, uma vez depositados os valores incontroversos, assim como para
impedir a negativação de seu nome nos cadastros de proteção ao crédito.
A sentença (fls. 61-63) julgou procedente o pedido, reduzindo os juros
remuneratórios para 1% ao mês, substituindo a comissão de permanência
pelo IGPM e determinando a capitalização anual de juros. Estabeleceu que
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
485
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
os demais encargos do contrato devem ser mantidos, inexistindo abusividade.
Condenou o réu ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios,
arbitrados em R$ 700,00 (setecentos reais).
Por sua vez, o acórdão recorrido negou provimento ao apelo da instituição
financeira, afastando, de ofício, disposições contratuais, nos seguintes termos
(fls. 114-133):
Ação revisional. Negócios jurídicos bancários. Alienação fiduciária. Aplicação
do CDC. Juros remuneratórios. Capitalização. Comissão de permanência. Índice
de atualização monetária. Encargos moratórios. Compensação e/ou repetição
do indébito. Cláusula de emissão de título de crédito. Tarifa de abertura de
crédito. Emissão de boleto bancário. Cadastro de restrição ao crédito. Protesto
de título. Manutenção na posse do bem. Autorização para depósito. Honorários
advocatícios.
1. Aplicação do CDC. O Código de Defesa do Consumidor implementou uma
nova ordem jurídica, viabilizando a revisão contratual e a declaração de nulidade
absoluta das cláusulas abusivas, o que pode ser feito inclusive de ofício pelo
Poder Judiciário.
2. Juros Remuneratórios. É nula a taxa de juros remuneratórios em percentual
superior a 12% ao ano porque acarreta excessiva onerosidade ao devedor em
desproporção à vantagem obtida pela instituição credora, por aplicação do art.
51, IV, do CDC.
3. Capitalização. A capitalização dos juros é vedada em contratos da espécie,
por ausência de permissão legal, ainda que expressamente convencionado.
4. Índice de atualização monetária. Cabimento. Adoção do IGP-M para
atualização do valor da moeda. Disposição de ofício.
5. Comissão de Permanência. É vedada a comissão de permanência por
cumulada com juros remuneratórios e correção monetária.
6. Encargos Moratórios
6.1. Juros moratórios. Contemplados no contrato em 1% ao mês e mantidos,
vedada a cumulação com juros remuneratórios e multa.
6.2. Multa Contratual. Contemplada no contrato à taxa de 2% e mantida. Deve
incidir sobre a parcela efetivamente em atraso e não sobre a totalidade do débito.
6.3. Mora do Devedor. Por ter sido elidida a mora debendi, não há exigir os
encargos moratórios. Esses são exigíveis tão-só quando constituído em mora o
devedor. Disposição de ofício.
7. Compensação e/ou Repetição do Indébito. Após a compensação, e na
eventualidade de sobejar saldo em seu favor do devedor, é admitida a repetição
simples, afastada a previsão contida no parágrafo único do art. 42 do CDC.
Disposição de ofício.
486
SÚMULAS - PRECEDENTES
8. Cláusula de Emissão de Título de Crédito. A cláusula que prevê emissão
de título de crédito configura nulidade pela abusividade que ostenta ou pela
excessiva outorga de poderes conferida ao credor ou pelo excesso de garantia.
Disposição de ofício.
9. Tarifa de Emissão de Boleto Bancário. A emissão de qualquer carnê ou boleto
para pagamento é obrigação do credor não devendo ensejar ônus algum ao
devedor, já que os arts. 319 do Código Civil/2002 e art. 939 do Código Civil/1916,
não trazem no seu bojo a condição de pagamento em dinheiro para ele receber o
que lhe é de direito. Disposição de ofício.
10. Taxa de Abertura de Crédito. Além de atender interesse exclusivo do
mutuante, essa cláusula contratual contraria o disposto no art. 46, parte final,
do Código de Defesa do Consumidor, pois não fornece ao mutuário todas as
informações sobre sua finalidade e alcance. Disposição de ofício.
11. Cadastro de Crédito. Inscrição Negativa. Discussão da dívida que revela
probabilidade, ainda que mínima, de sucesso do devedor. Inveracidade de dados
e constrangimento desnecessário vedados no CDC.
12. Protesto do Título. Na medida em que o devedor possui argumentos que
fragilizam o negócio subjacente, podendo ser excluídos juros e taxas consideradas
abusivas, o protesto revela-se ato temerário e que somente virá em prejuízo do
devedor, sem qualquer repercussão jurídica de monta para o credor.
13. Manutenção de Posse. É de ser mantido o devedor na posse do bem
alienado fiduciariamente enquanto pendente pleito revisional.
14. Autorização de Depósitos. É possível a autorização para depósito de valores
que o autor entende devidos, enquanto pende de julgamento ação revisional de
cláusulas contratuais.
15. Honorários Advocatícios. Redimensionados. Disposição de ofício.
Apelo desprovido, com disposições de ofício.
Sobreveio recurso especial da ré (fls. 137-151), fundamentado nas alíneas
a e c do permissivo constitucional, reclamando, em síntese: a) caracterização da
mora da devedora e a conseqüente imposição de encargos moratórios; b) ofensa
ao princípio da boa-fé objetiva; c) impossibilidade do julgamento de ofício; d)
não limitação dos juros remuneratórios; e) possibilidade da capitalização mensal
de juros; f ) validade da cobrança de comissão de permanência; g) descabimento
da repetição de indébito; h) seu direito à negativação do nome da devedora; i)
equívoco na manutenção da ré na posse do bem; j) validade da cambial emitida
(“cláusula mandato”).
A instituição financeira interpôs, igualmente, recurso extraordinário,
que teve seu seguimento negado na origem ante a ausência da preliminar de
repercussão geral (fls. 201-203).
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
487
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Admitido o recurso especial, os autos ascenderam a esta Egrégia Corte
Superior, sendo afetado a julgamento à Segunda Seção, segundo a sistemática
do art. 543-C do CPC, por despacho do Relator Ministro Ari Pargendler (fls.
224), que identificou, em processos repetidos, as seguintes questões de direito:
a) juros remuneratórios; b) capitalização de juros; c) mora; d) comissão de
permanência; e) inscrição do nome do devedor em cadastros de proteção ao
crédito; f ) disposições de ofício.
O feito foi redistribuído à Relatoria da Ministra Nancy Andrighi (fl. 565).
2. Voto da Min. Relatora:
Em extraordinário e denso trabalho, a culta Ministra Relatora proferiu
bem-fundamentado voto, estabelecendo as seguintes teses:
a) Afastamento da mora quando constatada a cobrança abusiva de qualquer
dos encargos da normalidade; mantida sua caracterização quando verificada a
simples propositura de ação revisional ou a cobrança de encargos moratórios
abusivos.
b) Autorização da cobrança de juros moratórios até o limite de 1% ao mês.
c) Concessão de liminar para impedir a inscrição do devedor em cadastro
de inadimplentes quando reunidos os seguintes requisitos: “a) houver ação
fundada na existência integral ou parcial do débito; b) ficar efetivamente
demonstrado que a alegação de cobrança indevida se funda na aparência do
bom direito e em jurisprudência consolidada do STF e STJ; c) for depositada a
parcela incontroversa, ou prestada a caução fixada conforme o prudente arbítrio
do juiz”.
d) Não reconhecimento da abusividade das taxa de juros que não
ultrapassem o dobro da taxa média de mercado, conforme apurada pelo Banco
Central;
e) Possibilidade de as instâncias ordinárias afastarem de ofício cláusulas
abusivas, nos termos do art. 51, do CDC.
Até o momento, além da Ministra Nancy Andrighi, votaram os Ministros
João Otávio de Noronha e Sidnei Beneti, aquele, divergindo do entendimento
da Relatora quanto ao estabelecimento de critérios fixos para a aferição de
abusividade da taxa de juros remuneratórios e quanto à possibilidade de análise
de ofício dos encargos contratados pelo consumidor; este, apenas quanto ao
segundo ponto.
488
SÚMULAS - PRECEDENTES
Tendo pedido vista dos autos na sessão do dia 8.10.2008, profiro meu voto.
3. Aspectos processuais – extensão horizontal e vertical do julgamento:
3.1. Por primeiro, cumpre bem delimitar a extensão do julgamento que
ora se procede, com a nova sistemática introduzida pelo art. 543-C do CPC
(Lei n. 11.672/2008), seja em relação ao processo entre as partes recorrente e
recorrida, seja no tocante aos efeitos externos do acórdão, atingindo os inúmeros
outros recursos com “fundamento em idêntica questão de direito”, de modo a
ser afastada qualquer dúvida quanto aos efeitos do acórdão que ora se constitui,
resguardando a segurança jurídica e judicial.
É que a inclusão do art. 543-C no Código de Processo Civil, cujo
processamento foi regulado pela Resolução n. 8/2008 do Superior Tribunal
de Justiça, permitirá a objetivação no julgamento dos recursos especiais, com a
análise, em abstrato, de questões reiteradamente conduzidas à apreciação desta
Corte, assentando seu entendimento e orientando a atuação das instâncias
ordinárias.
Contudo, em decorrência do potencial impacto das decisões proferidas
em recurso repetitivo a milhares de relações jurídicas intersubjetivas, faz-se
necessário delimitar com exatidão, em cada caso, a extensão da controvérsia
sujeita à disciplina do art. 543-C, CPC, afastando as questões não conhecidas
no especial e aquelas não afetadas ao exame da Seção.
Esse problema foi habilmente suscitado pelo parecer ministerial, que
consignou (fls. 982-983):
Dito de outro modo, a principal atividade a ser desempenhada no julgamento
de recursos que apresentem esses contornos peculiares relaciona-se com o
fato de que o Superior Tribunal de Justiça delimite, de maneira estrita, o objeto
da questão jurídica a ser debatida, até mesmo para que se procure diferenciar
situações fático-jurídicas para ulteriores casos aparentemente semelhantes.
Com estas considerações, almeja-se destacar que, para fins de aplicação do
art. 543-C do CPC, é de grande importância operacional a definição da estrita
delimitação da controvérsia no âmbito do julgamento de recurso especial, até
mesmo para, após o julgamento da Corte, ser possível identificar, exatamente,
quais recursos especiais “terão seguimento denegado” ou “serão novamente
examinados pelo Tribunal de origem”.
Como se sabe, a Lei n. 11.672/2008 não criou propriamente um requisito
específico de admissibilidade do recurso especial - e nesse ponto se distancia
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
489
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
do instituto da “repercussão geral” para o recurso extraordinário (art. 102, §
3º, da CF e art. 543-A do CPC) -, mas tratou apenas do processamento a
ser observado quando interposto determinado recurso especial na situação
particular de ser um entre tantas causas repetitivas.
Em outras palavras, valendo-me de uma estrutura pouco mais esquemática,
ao examinar o recurso especial em que o relator percebe: a) multiplicidade de
recursos; b) com fundamento em idêntica questão de direito, procederá:
1º) exame dos requisitos (pressupostos) genéricos do recurso nobre;
2º) exame dos requisitos (pressupostos) específicos;
3º) afetação à Seção das questões de direito que serão julgadas, de modo a
se conferir ao acórdão os efeitos do art. 543-C, § 7º, CPC;
4º) expedirá ordem para suspensão de todos os demais recursos repetidos;
5º) procederá, na seqüência, conforme dispõe o art. 543-C, §§ 3º a 6º,
CPC.
3.2. Parece interessante, nesse passo, estabelecer corretamente a(s)
questão(ões) de direito do caso concreto ora em exame, na medida em que
estas é que estão relacionadas à matéria de fundo do recurso especial, ou seja, ao
mérito de questão.
Esse é o elemento identificador da controvérsia, que irá determinar a
existência ou não de multiplicidade de recursos acerca do tema.
A ausência de qualquer dos pressupostos de admissibilidade do recurso
especial impõe óbice intransponível à apreciação do mérito, de maneira que,
em relação aos temas não conhecidos, não se há falar nos efeitos “externos” do
recurso (§ 7º do art. 543-C, CPC).
Ademais, a análise dos pressupostos de admissibilidade do recurso especial
não é realizada em abstrato, mas singularmente, no caso concreto, contrariando
a lógica de objetivação imposta pelo art. 543-C.
Por oportuno, transcrevo lição de Teresa Arruda Alvim Wambier e José
Miguel Garcia Medina extraída da Revista de Processo n. 159:
Assim, por exemplo, em relação ao sobrestamento de recursos extraordinários,
o § 2º do art. 543-C estabelece que, decidindo o STF no sentido da inexistência
de repercussão geral, os recursos cuja tramitação ficou suspensa, “considerarse-ão automaticamente não admitidos”. Vê-se que a decisão do STF tem caráter
absolutamente vinculante, quanto à inadmissibilidade do recurso em razão da
490
SÚMULAS - PRECEDENTES
ausência de repercussão geral. Deverá o órgão a quo, portanto, ater-se ao que
tiver deliberado o STF, a respeito. O mesmo, porém, não ocorre em relação aos
recursos especiais: o não conhecimento dos recursos especiais selecionados
não importará, necessariamente, na inadmissibilidade dos recursos especiais
sobrestados.
No mesmo ponto, extrai-se das notas de rodapé:
4. A solução prevista no § 7º do art. 543-C refere-se, a nosso ver, apenas
e tão-somente ao julgamento do mérito do recurso especial, e não à sua
inadmissibilidade.
(Wambier, Teresa Arruda Alvim e Medina, José Miguel Garcia. “Sobre o novo
art. 543-C do CPC: sobrestamento de recurso especiais ‘com fundamento em
idêntica questão de direito’ in “Revista de Processo. ano 33. n. 159. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2008. p. 216-217).
No caso em apreço, não se está conhecendo do recurso especial nos
seguintes pontos:
a) capitalização de juros, pois o acórdão está amparado somente em
fundamento constitucional para afastá-la, escapando da competência desta
Corte;
b) comissão de permanência, uma vez que o recorrente não especifica
qualquer dispositivo legal tido por violado ou realiza o necessário cotejo analítico
com o precedente paradigma.
c) manutenção de posse do devedor em relação ao bem, pois os dispositivos
tidos por violados não foram apreciados pela Corte local. Aplica-se, portanto, a
Súmula n. 282-STF.
d) “análise da cláusula mandato”, uma vez que a matéria suscitada não
foi devidamente prequestionada, esbarrando no óbice da Súmula n. 282STF. Ademais, o recorrente não empreendeu o necessário cotejo analítico dos
precedentes transcritos, sendo impossível a constatação da similitude fática
perante os acórdãos paradigmas.
Dessa forma, essas matérias estão expressamente excluídas dos efeitos
determinados pelo § 7º do art. 543-C.
Bem por isso, também prejudicadas as questões de ordem suscitada pelo
Ministério Público e a prejudicial alteada no voto do eminente Ministro João
Otávio Noronha, no que se refere aos aspectos relativos à capitalização de juros.
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
491
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
3.3 Outro ponto que merece destaque diz respeito à abrangência do
acórdão proferido em recursos repetitivos, especificamente, no caso vertente, no
que se refere aos juros remuneratórios não pactuados.
No caso em análise, houve previsão expressa da incidência de juros
remuneratórios ao contrato bancário, por meio de cláusula declarada nula pelo
acórdão recorrido. Por sua vez, o recurso especial da instituição bancária versa
acerca da impossibilidade de limitação dos juros legalmente pactuados.
Assim, para que não haja qualquer dúvida a respeito do ponto, esclareça-se
que a discussão não abrange os juros não pactuados.
Se, por um lado, é necessário fixar, em abstrato, a tese jurídica que orientará
a atuação dos Tribunais locais quanto aos recursos sobrestados; por outro, não
se pode olvidar que estamos diante de um caso concreto, que exige, nos termos
da Súmula n. 456-STF e do art. 257 do RISTJ, a aplicação do direito à espécie:
Art. 257. No julgamento do recurso especial, verificar-se-á, preliminarmente, se
o recurso é cabível. Decidida a preliminar pela negativa, a Turma não conhecerá
do recurso; se pela afirmativa, julgará a causa, aplicando o direito à espécie.
Dessa forma, qualquer manifestação desta Corte acerca da taxa de
juros aplicável quando inexiste pactuação expressa, conquanto válida para
fundamentar a decisão, não poderá integrar a tese jurídica a que se pretende
atribuir efeito extensivo, nos termos do § 7º do art. 543-C.
3.4. De outra parte, deve-se tratar ainda das demais matérias constantes
do recurso especial de fls. 137-151 e que não foram afetadas ao procedimento
dos recursos repetitivo, no caso, a afirmada validade da cláusula mandato e a
impossibilidade da manutenção da devedora na posse da motocicleta.
Em tese, é competência da Turma a apreciação de pontos que não
foram afetados pelo Ministro Relator, ou seja, sobre os quais não repousa
multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito.
Contudo, vislumbram-se as dificuldades práticas do julgamento fragmentado
do recurso, com parte sendo apreciado pela Seção e o restante pela Turma
originária.
Por todas, acredito que o recurso deva ser julgado em sua totalidade pela
Seção, nos termos do art. 34, XII, do RISTJ, porquanto não haverá prejuízo ao
recorrente em ver sua controvérsia apreciada pelo colegiado maior.
492
SÚMULAS - PRECEDENTES
Art. 34. São atribuições do relator:
(...)
XII – Propor à Seção ou à Turma seja o processo submetido à Corte Especial ou
à Seção, conforme o caso.
Entretanto, ainda que esta Segunda Seção decida pelo conhecimento do
recurso nesses pontos, tais matérias devem ser destacadas dos efeitos do § 7º do
art. 543-C, visto que não foram afetadas a julgamento conforme disciplina dos
recursos repetitivos.
São as seguintes as matérias que não foram conhecidas, nem afetadas e
tampouco analisadas no voto da eminente Relatora: a) manutenção do devedor
na posse; b) “análise da cláusula mandato”.
4. Mérito (teses consolidadas, com os efeitos do § 7º do art. 543-C, do
CPC)
4.1. Caracterização da mora do devedor e cadastros de inadimplência
Quanto à descaracterização da mora do devedor e a possibilidade de
sua inscrição em cadastros de inadimplência acompanho o voto da Ministra
Relatora, o qual traduz o entendimento precedente desta Segunda Seção
(EREsp n. 163.884-RS, 2ª Seção, Rel. Min. Barros Monteiro, Rel. p/ Acórdão
Min. Ruy Rosado de Aguiar, julgado em 23.5.2001; REsp n. 607.961-RJ, 2ª
Seção, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado de 9.3.2005; REsp n. 527.618-RS, 2ª
Seção, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, julgado em 22.11.2003).
4.2. Juros moratórios
Em conformidade com a jurisprudência da Segunda Seção, que já decidiu
que os juros moratórios podem ser pactuados até o limite de 12% ao ano,
conforme previsto na Lei de Usura (REsp n. 402.483-RS, 2ª Seção, Rel. Min.
Castro Filho, julgado em 26.3.2003), acompanho o voto da Ministra Relatora.
4.3. Juros remuneratórios
A jurisprudência desta Corte está pacificada no sentido de que os juros
remuneratórios cobrados pelas instituições financeiras não sofrem a limitação
imposta pelo Decreto n. 22.626/1933 (Lei de Usura), conforme o disposto na
Súmula n. 596-STF.
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
493
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Contudo, uma vez demonstrado que a pactuação dos juros remuneratórios
é evidentemente abusiva, o Poder Judiciário tem o dever de exercer o controle da
taxa contratada, como explicitado no voto da eminente Ministra Relatora.
Todavia, ouso divergir em relação aos critérios para a aferição da
abusividade da taxa de juros remuneratórios.
No julgamento dos Embargos Declaratórios na ADI n. 2.591-1-DF, os
Ministros do Supremo Tribunal Federal deram provimento, por unanimidade,
aos embargos opostos pelo Procurador Geral da República para reduzir a ementa
referente ao julgamento da ADIN. O Relator, Ministro Eros Grau, esclareceu o
alcance da decisão prolatada em relação à taxa de juros remuneratórios:
A ementa efetivamente é explícita ao afirmar que incumbe ao Conselho
Monetário Nacional a definição do custo das operações ativas e da remuneração
das operações passivas praticadas por instituições financeiras na exploração da
intermediação do dinheiro na economia, providência essencial à formulação das
políticas monetária e de crédito do Estado, cuja racional elaboração é essencial à
efetividade da soberania nacional. Atribuir a órgãos de defesa do consumidor e/
ou mesmo ao Poder Judiciário essa definição seria insensato, colocaria em risco a
continuidade da atividade estatal.
Isso não significa, contudo, que o Poder Judiciário não fiscalize, que o Poder
Judiciário não controle e opere a revisão, caso a caso, de eventual abusividade,
onerosidade excessiva ou outras distorções na composição contratual das taxas de
juros. Isso diz a ementa. Diz que o Poder Judiciário operará o controle e a revisão, em
cada caso, de eventual abusividade, onerosidade excessiva ou outras distorções na
composição contratual da taxa de juros. Estamos seguramente de acordo quanto a este
ponto. Não há, nele, contradição nenhuma a ser superada, nem há omissão qualquer a
ser colmatada. De resto, é inadmissível o rejulgamento da matéria nesta sede, que é
isso o que se pretende mediante o oferecimento dos presentes embargos.
Portanto, em face da decisão do Supremo Tribunal Federal, a qual estamos
estritamente vinculados, conforme o art. 102, § 2º, da CF, a abusividade dos
juros remuneratórios pactuados deve ser analisada caso a caso, não cabendo
estabelecer critérios estritos de aferição.
Cumpre ressaltar que o efeito vinculativo decorrente da improcedência
da ADI n. 2.591-1-DF não se limita à parte dispositiva, mas se estende aos
fundamentos da decisão. Corrobora esse entendimento lição do Ministro
Gilmar Mendes:
(...) resta evidente que o efeito vinculante da decisão não está restrito à parte
dispositiva, mas abrange também os próprios fundamentos determinantes.
494
SÚMULAS - PRECEDENTES
Como se vê, com o efeito vinculante pretendeu-se conferir eficácia adicional
à decisão do STF, outorgando-lhe amplitude transcendente ao caso concreto.
Os órgão estatais abrangidos pelo efeito vinculante devem observar, pois, não
apenas o conteúdo da parte dispositiva da decisão, mas a norma abstrata que
dela se extrai, isto é, que determinado tipo de situação, conduta ou regulação – e
não apenas aquela objeto de pronunciamento jurisdicional – é constitucional ou
inconstitucional e deve, por isso, ser preservada ou eliminada. (MENDES, Gilmar
Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de
Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 1.222).
Logo, não cabe ao Superior Tribunal de Justiça tarifar os juros
remuneratórios para demonstrar sua excessividade quando o Supremo Tribunal
Federal já afirmou que a questão deve ser analisada caso a caso.
Acompanho o voto da Ministra Relatora quanto aos demais pontos
referentes aos juros remuneratórios pactuados, quais sejam:
a) não sujeição das instituições financeiras à limitação dos juros
remuneratórios conforme estipulado no Decreto n. 22.626/1933;
b) inexistência de abusividade pela simples estipulação de juros
remuneratórios superiores à 12% ao ano;
c) impossibilidade de utilização da Selic como parâmetro de limitação de
juros remuneratórios.
4.4. Disposições de ofício
Apesar de a relação jurídica existente entre o contratante e a instituição
financeira ser disciplinada pelo Código de Defesa do Consumidor, a Segunda
Seção do Superior Tribunal de Justiça entende que o julgamento realizado de
ofício pelo Tribunal de origem ofende o princípio tantum devolutum quantum
appellatum, previsto no artigo 515 do CPC, conforme manifestado pelo Min.
Cesar Asfor Rocha, em 8.6.2005, no julgamento do REsp n. 541.153-RS: “não
se tratando de questões relacionadas às condições da ação, as matérias que não
foram objeto da apelação não podem ser examinadas pelo Tribunal”.
A questão foi reapreciada por ocasião do EREsp n. 702.524-RS, julgado
em 8.3.2006, sendo assentado o entendimento acima referido por maioria de
votos.
Diante da modificação substancial na composição da Segunda Seção,
a Ministra Relatora propõe a rediscussão da matéria para admitir a revisão
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
495
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
de ofício, tendo em vista o caráter de norma de ordem pública do CDC e a
disciplina do art. 51 do CDC c.c. ao art. 168, parágrafo único, do Código Civil.
Embora consciente do fundamental papel do Superior Tribunal de Justiça
de guardião da unidade do Direito Federal, assim também o de uniformizar
a jurisprudência infraconstitucional, com as inúmeras conseqüências daí
decorrentes, mas força é convir que decisões consolidadas da Corte não se
constituem jurisprudência imutável do Tribunal.
É bem verdade que o STJ, ao longo de sua história, consolidou-se como o
Tribunal da Cidadania, com uma jurisprudência sólida que não pertence a um
ou alguns Ministros, mas obra coletiva que orgulha o povo brasileiro.
Contudo, malgrado a observação de que a jurisprudência firmada deve
ser perene em resguardo à segurança jurídica, num ou noutro ponto, com
fundamentos diferentes, é possível avançar.
De modo a se tentar a evolução da jurisprudência sem o inconvenientes
das “guinadas bruscas”, com seguidos avanços e retrocessos, parece que, no tema,
a boa medida do equilíbrio apresenta-se, no meu modo de ver, mais acertada.
Refiro-me à possibilidade de reconhecimento das disposições de ofício, quando
presente a hipossuficiência do consumidor/contratante.
É, na verdade, uma interpretação sistêmica e convergente dos artigos 51 e
art. 4º, I, 6º, IV, e 39, IV, CDC.
Anteriormente à consolidação do atual entendimento desta Segunda
Seção, ambas as Turmas decidiam pela possibilidade da análise de ofício de
cláusulas abusivas em contratos de consumo, conforme abaixo transcrito:
Agravo regimental. Recurso especial. Capitalização mensal dos juros.
Inexistência de previsão contratual. Medida Provisória n. 2.170-36/2001. Não
incidência. Comissão de permanência. Limite máximo. Taxa de juros do contrato.
Cláusulas abusivas. Revisão de ofício. Possibilidade.
1. A Segunda Seção desta Corte entende cabível a capitalização dos juros em
periodicidade mensal, para os contratos celebrados a partir de 31 de março de
2000 - data da primitiva publicação do art. 5º da MP n. 1.963-17/2000, atualmente
reeditada sob o n. 2.170-36/2001 -, desde que pactuada, requisito in casu
inexistente, obstando, pois, o seu deferimento.
2. A limitação máxima da comissão de permanência à taxa de juros
remuneratórios do próprio contrato não enseja nenhuma ilegalidade ou
irregularidade, estando, aliás, em consonância com o leading case sobre o assunto
(REsp n. 271.214-RS), em que foi pacificada pela Segunda Seção.
496
SÚMULAS - PRECEDENTES
3. O STJ tem preconizado a possibilidade de rever, de ofício, cláusulas
contratuais consideradas abusivas, para anulá-las, com base no art. 51, IV do CDC.
Nesse sentido: REsp n. 248.155-SP, in DJ de 7.8.2000 e REsp n. 503.831-RS, in DJ de
5.6.2003.
4. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no REsp n. 655.443-RS, Rel. Ministro Fernando Gonçalves, Quarta Turma,
julgado em 5.4.2005, DJ 2.5.2005 p. 372).
Agravo regimental. Contrato de financiamento. Exame de ofício. Art. 51, IV,
CDC. Comissão de permanência. Limitação ao pacto. Honorários advocatícios.
Fixação do valor em fase de liquidação. Reformatio in pejus. Impossibilidade.
- A jurisprudência permite afastar, de ofício, as cláusulas abusivas com base no
Art. 51, IV, do CDC, questão de ordem pública.
- É lícito a cobrança de comissão de permanência no período da inadimplência,
desde que não cumulada com a correção monetária (Súmula n. 30), nem com
juros remuneratórios, calculada pela taxa média de mercado, apurada pelo Banco
Central do Brasil, limitada à taxa do contrato (Súmulas n. 294 e n. 296).
- A redistribuição da verba honorária reserva-se à liquidação da sentença,
limitada a condenação ao quantum fixado pelo acórdão recorrido, em atenção ao
princípio da reformatio in pejus.
(AgRg no REsp n. 645.902-RS, Rel. Ministro Humberto Gomes de Barros, Terceira
Turma, julgado em 28.9.2004, DJ 17.12.2004 p. 542, REPDJ 1º.2.2005 p. 556).
Embora não se possa generalizar, o fato é que o reconhecimento da
abusividade de ofício, em casos extremos, é indispensável, ou seja, quando
reconhecida a hipossuficiência do consumidor.
O Ministro Antônio Herman Benjamin, em seu Manual de Direito do
Consumidor, explica o conceito de hipossuficiência disposto no art. 39, IV do
CDC:
O consumidor é, reconhecidamente, um ser vulnerável de consumo (art. 4º,
I). Só que, entre todos os que são vulneráveis, há outros cuja vulnerabilidade é
superior a média. São os consumidores ignorantes e de pouco conhecimento,
de idade pequena ou avançada, de saúde frágil, bem como aqueles cuja posição
social não lhes permite avaliar com adequação o produto ou serviço que
estão adquirindo. Em resumo: são os consumidores hipossuficientes. Protegese, com esse dispositivo, por meio de tratamento mais rígido que o padrão, o
consentimento pleno e adequado do consumidor hipossuficiente.
A vulnerabilidade é um traço universal de todos os consumidores, ricos ou
pobres, educados ou ignorantes, crédulos ou espertos. Já a hipossuficiência é
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
497
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
marca pessoal, limitada a alguns – até mesmo a uma coletividade -, mas nunca a
todos os consumidores.
A utilização, pelo fornecedor, de técnicas mercadológicas que se aproveitam
da hipossuficiência do consumidor caracteriza a abusividade da prática.
A vulnerabilidade do consumidor justifica a existência do Código. A
hipossuficiência, por seu turno, legitima alguns tratamentos diferenciados no
interior do próprio Código, como, por exemplo, a previsão de inversão do ônus da
prova (art. 6º, VIII).
(BENJAMIN, Antônio Herman; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA, Leonardo
Roscoe. Manual de Direito do Consumidor São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2007. p. 220).
Logo, em face da grande desigualdade existente entre a instituição
financeira e o consumidor hipossuficiente, ou seja, o consumidor que possui
uma vulnerabilidade técnica ou econômica ou jurídica, agravada em razão de
suas condições pessoais, deve-se protegê-lo de maneira mais rígida e ativa.
Portanto, nos casos de existência de cláusulas nulas de pleno direito, como
as exemplificadas no art. 51 do CDC, e em virtude da posição de vulnerabilidade
extremada do consumidor (art. 4, I; art. 6º, IV e art. 39, IV), entende-se como
possível o reconhecimento das nulidades das cláusulas abusivas.
Destarte, reconheço a possibilidade do juiz de dispor de ofício, quando
diante de cláusulas absolutamente nulas, conforme o Código de Defesa do
Consumidor, desde que o consumidor esteja comprovadamente em situação
de hipossuficiência. Acompanho o voto da Ministra Relatora para manter o
acórdão recorrido, embora por fundamentos diversos.
5. Manutenção de posse do bem e cláusula mandato (sem os efeitos do §
7º, 543-C, CPC)
As questões referentes à manutenção da posse do bem objeto da alienação
fiduciária (fl. 147) e da cláusula mandato (fl. 148), conforme anteriormente
explicitado, carecem dos pressupostos de admissibilidade do recurso especial,
não devendo ser conhecidas.
6. Parte Dispositiva
Ante o exposto, acompanho parcialmente o voto da eminente Ministra
Relatora, divergindo em relação aos seguintes pontos:
498
SÚMULAS - PRECEDENTES
a) em preliminar, não conheço do recurso especial em relação à capitalização
de juros e à comissão de permanência, restando as referidas matérias afastadas
dos efeitos do § 7º do art. 543-C do CPC;
b) deixo de apreciar a questão relativa aos juros remuneratórios não
pactuados, tendo em vista que a matéria não integra os limites da lide, estando
excluída igualmente dos efeitos do § 7º do art. 543-C do CPC;
c) não conheço, igualmente, dos pontos relativos à manutenção da posse
do devedor em relação ao bem e à alegada validade da cláusula mandato,
esclarecendo que, ainda que fossem apreciadas por esta Corte, tais matérias
restariam excluídas dos efeitos dos recursos repetitivos, uma vez que não foram
afetadas ao procedimento do art. 543-C do CPC.
d) reconheço a legalidade da fixação de juros remuneratórios superiores
a 12% ao ano, mas divirjo quanto aos critérios de fixação da abusividade de tal
encargo, que deve ser analisada caso a caso;
e) mantenho o acórdão no tocante às disposições de ofício, desde que
reconhecida expressamente a hipossuficiência do consumidor/contratante.
É como voto.
VOTO-PRELIMINAR
O Sr. Ministro Carlos Fernando Mathias ( Juiz Federal convocado do TRF
1ª Região): Sr. Presidente, peço as mais respeitosas vênias àquilo que designarei
de divergência, porque, na realidade, estão surgindo questões novas, como é esse
problema do conhecimento pela alínea c.
Renovo as respeitosas vênias, desculpem-me a redundância, mas tenho a
impressão de que o mais importante é discutir a matéria de fundo.
Pelo que ouvi da eminente Ministra Relatora - farei as anotações -, S. Exa.
não se retratou, mas trouxe uma nova ótica, uma nova visão sobre o ponto e
está conhecendo do recurso também pela alínea c. Não vejo nenhum perigo em
avançarmos e discutirmos o que seria, pedindo empréstimo à expressão do Sr.
Ministro Luis Felipe Salomão, a matéria de fundo.
Conheço do recurso especial pela alínea c, reservando-me, obviamente,
quando em tempo oportuno, a discutir o mérito.
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
499
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
VOTO-MÉRITO
O Sr. Ministro Carlos Fernando Mathias ( Juiz Federal convocado do
TRF 1ª Região): Sr. Presidente, como a Sra. Ministra Relatora teve o cuidado
de mandar farto material, não só cópia dos votos, como uma síntese didática de
todo seu estudo neste processo, lembrei-me do poeta Manuel Bandeira, que,
diante do verso “Tu pisavas nos astros, distraída”, dizia que se ralava de inveja de
não ser o autor daqueles versos.
Que magistrado não gostaria de poder proferir o voto que proferiu a
eminente Ministra Fátima Nancy Andrighi, borbulhando a magistratura
brasileira? É um trabalho de escafandro em matéria com tanta complexidade,
em que S. Exa. teve o cuidado, inclusive, de fazer, quando diante de tão claro
relato, um resumo das soluções para o caso concreto e um resumo das soluções
para as teses repetitivas.
Evidentemente que os elogios não ficam só a ela. Eu, particularmente,
adoraria ter os conhecimentos de Direito Bancário, entre outros, que tem o Sr.
Ministro João Otávio de Noronha, com segurança, com firmeza, com vivência,
com saber teórico e com saber de experiência feita.
Quem não gostaria de proferir um voto-vista como este que acaba de
proferir o eminente Ministro Luís Felipe Salomão?
Mas todos nós fomos nos debruçar, porque recebemos esse farto material:
memoriais, adendos, aditivos e cópias de votos. Aqui, renovo os elogios
desnecessários, que nada acrescentam aos méritos da eminente Relatora, mas o
cuidado que ela teve de nos mandar e de discutir muitos pontos.
Permito-me pedir respeitosas vênias à eminente Ministra Relatora em
um ponto que tenho dificuldade de transpor. S. Exª, com a objetividade de
sempre, lembra, com relação à revisão de ofício das chamadas cláusulas abusivas,
que é a única remanescente que participou do julgamento dos Embargos de
Divergência no Recurso Especial n. 702.524-RS.
O Sr. Ministro Carlos Fernando Mathias ( Juiz convocado do TRF 1ª
Região): Já na sessão anterior, quando a matéria foi aventada, tive o cuidado
de colher tudo o que havia a respeito, e, agora, acrescento, inclusive, um outro
EREsp da lavra do não menos eminente Ministro Fernando Gonçalves.
Louvo, mais uma vez, S. Exª, porque, se o ser humano não ousasse, não
teria inventado a roda, domesticado o fogo e conquistado o espaço. É da
500
SÚMULAS - PRECEDENTES
essência do ser humano estar em mutação. Aliás, Toynbee dizia que só os
desafios constroem a história. A história é feita por desafios.
Aqui me permitirei, e o farei com todo o cuidado, inclusive prestando
modestíssima homenagem à Professora Cláudia Lima Marques, que tanto
admiro e no que não sou original, porque todos a admiramos, e também ao
grande Mestre que esteve nesta Seção por muito tempo, Ministro Ruy Rosado
de Aguiar, que escreveram, entre outros, sobre cláusulas abusivas. Eu mesmo
rabisquei algumas coisas sobre esse assunto, louvando-me em trabalhos de S.
Exas.
Confesso, no entanto, que tenho enorme dificuldade em transpor esse fato,
porque, mesmo sabendo que estamos vivendo uma era de desconstrutivismo,
portanto, derrubando cânones, vivendo a era dos direitos de terceira geração, dos
direitos de solidariedade, já não podemos afirmar com tanta tranqüilidade, por
exemplo, que o contrato faz lei entre as partes.
Hoje, é preciso ter coragem de justificar isso com tanta tranqüilidade. A
revolução no Direito das Obrigações, que foi a maior revolução desde o Código
de Napoleão, que é o Direito do Consumidor. Não gosto da expressão “Direito
Consumerista”, desses neologismos, porém, não vamos brigar por palavras, fazer
moinhos de ventos particulares para, quixotescamente, brigar mais.
Porém, tenho dificuldade. Como fica o problema do pedido? Aquilo que
está no Código de Processo Civil? Como fica o princípio do tantum devolutum
quantum apellatum? São também outros cânones. E o Direito Pretoriano, que
também faz Direito. O Direito Pretoriano, que tanto fascínio imprimiu a
Savigny – aliás, ele dizia que as duas grandes construções, todos sabem, não
legislativas, eram o Direito Pretoriano, Romano e a Common Law, que não são
construções legislativas.
O Sr. Ministro Carlos Fernando Mathias ( Juiz convocado do TRF 1ª
Região): Então, confesso que não vejo por que mudarmos uma posição que
está sedimentada na Seção. E, agora, vejo que não só S. Exª participou, mas
também o Sr. Ministro Fernando Gonçalves. Tenho cópia das ementas dos
acórdãos dos Embargos de Divergência no Recurso Especial n. 702.524-RS,
que está expressamente citado no voto de S. Exª Tenho aqui cópia do acórdão
do Recurso Especial n. 541.153-RS e um outro mais recente - estou enfatizando
isso porque o eminente Ministro Luis Felipe Salomão citou um precedente que
está aqui e o eminente Ministro Fernando Gonçalves teria votado em outro
sentido. Mas esse aqui é recentíssimo:
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
501
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Viola o princípio do tantum devolutum quantum apellatum o deferimento de
repetição de indébito, em face do reconhecimento de abusividade no contrato
de financiamento bancário, sem que a parte interessada tenha manejado o
competente recurso de apelação.
O Sr. Ministro Carlos Fernando Mathias ( Juiz convocado do TRF 1ª
Região): Agradeço a V. Exª pelo esclarecimento e me penitencio, mas isso em
nada altera a minha postura; não por teimosia, mas por convicção. Esse é o
único ponto.
Eu me permitiria, em atenção ao voto do eminente Ministro Luis Felipe
Salomão, dizer que a questão da capitalização dos juros com relação às soluções
para o caso concreto, do resumo didático que S. Exª, a eminente Ministra
Relatora, teve a bondade de nos fazer chegar às mãos, está no item III:
Não conhecido; ausência de pactuação; aplicação das Súmulas n. 5 e n. 7 do
Superior Tribunal de Justiça.
S. Exª, com relação ao resumo das soluções para as teses repetitivas,
também enfrenta, mantendo a jurisprudência atual:
Nas operações realizadas por instituições integrantes do Sistema Financeiro
Nacional após 31 de março de 2000 admite-se a capitalização mensal de juros,
desde que pactuados.
Com essas considerações - e meu voto é bem aquém de todos tão brilhantes
aqui, proferidos -, não vejo como deixar de acompanhar a eminente Ministra
Relatora, que conhece parcialmente do recurso especial e, nessa parte, dá-lhe
provimento, salvo no ponto da revisão, de ofício, pelas instâncias ordinárias, das
chamadas cláusulas abusivas, que são essas novas conquistas desses novos bemvindos direitos.
Sr. Presidente, V. Exa. não precisa de elogio algum, mas quero, também,
me permitir um registro da serenidade oriental, da paciência quase monástica
com que V. Exa. está presidindo - nada surpreendente -, tão bem e de forma
tão objetiva, separando um processo tão complexo, em que temos questões de
ordem geral e questões de ordem específicas.
Renovo, mais uma vez, as homenagens à minha Mestra Cláudia de Lima
Marques. Enfatizo isso, porque recorro aos seus ensinamentos. Dirá S. Exa. que
concordo com ela nos artigos, porém, no momento que seria mais preciso, mais
pragmático, não voto com ela.
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SÚMULAS - PRECEDENTES
O Sr. Ministro Carlos Fernando Mathias ( Juiz convocado do TRF 1ª
Região): Sr. Presidente, permita-me corrigir essa parte em que votei “a vôo de
pássaro”. Não estou acompanhando quanto ao dobro das taxas.
O Sr. Ministro Carlos Fernando Mathias ( Juiz convocado do TRF 1ª
Região): Tenho nota aqui que isso já estaria resolvido, mas se não está – e, vejo
que não foi apenas eu que pensei assim, o Sr. Ministro Beneti também –, salvo se
a eminente Relatora vier a alterar essa questão do dobro, não haveria divergência
alguma. Mas, também com relação ao dobro dos juros remuneratórios.
VOTO
O Sr. Ministro Fernando Gonçalves: Sr. Presidente, não tenho a verve, a
eloqüência, nem a criatividade do Sr. Ministro Carlos Fernando Mathias. Sou
mais objetivo.
Gostaria de estabelecer o que se está votando em termos de recurso
repetitivo.
A meu ver, a mora do devedor e o cadastro de inadimplência seriam
os primeiros temas. No caso, estou acompanhando o voto da Sra. Ministra
Relatora no que diz respeito à possibilidade de inscrição do devedor remisso
no cadastro de inadimplência, naquelas condições já estabelecidas no leading
case, que é o Recurso Especial n. 527.618-RS, do qual foi Relator o Sr. Ministro
Cesar Asfor Rocha.
A segunda tese diz respeito aos juros moratórios, que podem ser pactuados
até o limite de 1% ao mês.
Se eu estiver enganado, corrijam-me, por favor. A questão dos juros
remuneratórios, a fixação é de acordo com a taxa média de mercado estabelecida
pelo Banco Central, tendo como limite o que foi pactuado, quer dizer, o contrato.
VOTO
O Sr. Ministro Fernando Gonçalves: Acompanho.
E a última é a questão da revisão de ofício das cláusulas chamadas abusivas.
Efetivamente - e o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão cita um julgado meu, de
2005 -, na minha anterior investidura na Quarta Turma, em que acompanhei
aquele entendimento, mas, agora, recobrando a razão, retifico a posição anterior,
RSSTJ, a. 7, (34): 395-504, abril 2013
503
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
não permitindo a revisão de ofício, mesmo porque não entendo o conceito de
hipossuficiente; é um conceito fugidio, que, em qualquer figurino, se encaixa.
O Sr. Ministro Carlos Fernando Mathias citou um voto que proferi no ano
de 2007, no qual afirmo que:
Viola o princípio do tantum devolutum quantum apelatum o deferimento de
repetição de indébito, em face do reconhecimento de abusividade no contrato
de financiamento bancário, sem que a parte interessada tenha manejado o
competente recurso de apelação.
Esse foi o entendimento tirado da jurisprudência da Segunda Seção.
Portanto, meu voto é nesse sentido.
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Súmula n. 381 - Superior Tribunal de Justiça