1
UNIMAR - UNIVERSIDADE DE MARILIA
ADRIANA APARECIDA DA SILVA
A DEFESA DA LIVRE CONCORRÊNCIA E DO CONSUMIDOR
ENQUANTO PRINCÍPIOS DA ORDEM ECONÔMICA NO ESTADO
DEMOCRÁTICO DE DIREITO
MARÍLIA
2008
2
ADRIANA APARECIDA DA SILVA
A DEFESA DA LIVRE CONCORRÊNCIA E DO CONSUMIDOR
ENQUANTO PRINCÍPIOS DA ORDEM ECONÔMICA NO ESTADO
DEMOCRÁTICO DE DIREITO
Dissertação apresentado ao Programa de Mestrado da
Faculdade de Direito da Universidade de Marília como
exigência parcial para a obtenção do grau de Mestre em
Direito, sob a orientação do Prof.a. Dr.a. Soraya Regina
Gasparetto Lunardi.
MARÍLIA
2008
3
Autora: ADRIANA APARECIDA DA SILVA
Título: A DEFESA DA LIVRE CONCORRÊNCIA E DO CONSUMIDOR ENQUANTO
PRINCÍPIOS DA ORDEM ECONÔMICA NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO
Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em Direito da Universidade de Marília,
área de concentração Empreendimentos Econômicos, Desenvolvimento e Mudança Social,
sob a orientação da Prof.ª Dr.ª Soraya Regina Gasparetto Lunardi.
Aprovado pela Banca Examinadora em ____/____/______
_________________________________________
Prof.ª Dr.ª
Orientadora
__________________________________________
Prof.(a) Dr.(a)
__________________________________________
Prof.(a) Dr.(a)
4
Dedico esse trabalho a Arildo Pedroso de Campos
(in memoriam), pessoa especial em minha vida e na
de meu filho Gabriel, que acreditava em mim e na
minha capacidade, que sempre esteve ao meu lado e
que nunca deixará de existir no meu coração.
5
Agradeço primeiramente a Deus que iluminou meu
caminho, a todas as pessoas de que alguma maneira
contribuiu para a realização desse sonho, em
especial a meu filho Gabriel, que soube superar
minha ausência, a minha mãe que me apoiou
incondicionalmente, a minha amiga Isadora, que
compartilhou todos os momentos ao longo do curso.
A minha orientadora Prof.ª Dr.ª Soraya Regina
Gasparetto Lunardi pela dedicação e pela paciência
na transmissão de seus conhecimentos que
enriqueceram o presente trabalho.
6
A DEFESA DA LIVRE CONCORRÊNCIA E DO CONSUMIDOR
ENQUANTO PRINCÍPIOS DA ORDEM ECONÔMICA NO ESTADO
DEMOCRÁTICO DE DIREITO
Resumo:
A presente pesquisa analisa a livre concorrência e a defesa do consumidor enquanto
princípios da ordem econômica no Estado Democrático de Direito. Tem como objetivo
demonstrar a inter-relação entre esses dois princípios, com base nos fundamentos e objetivos
da República Federativa do Brasil e nos princípios da ordem econômica. A livre concorrência
e a defesa do consumidor nem sempre são princípios harmônicos entre si, pode acontecer
situações em que existam conflitos entre a aplicação dos mesmos no caso concreto, uma vez
que os interesses dos fornecedores muitas vezes não são compatíveis com os do consumidor.
No entanto, necessário fazer um estudo do Estado Liberal e Social, demonstrando como se
chegou ao Estado neoliberal e o surgimento da Constituição Econômica. Destaca a
importância dos princípios da livre iniciativa, defesa do consumidor e livre concorrência.
Diante da realidade atual da economia, importante estudar as legislações infraconstitucionais
que em conjunto com os princípios constitucionais protegem a livre concorrência e defende o
consumidor, sempre no intuito de preservar o interesse da coletividade. Motivo em que às
vezes ocorrem os referidos conflitos, pois o objetivo maior é o coletivo e não o particular.
Demonstra-se como ocorrem os conflitos entre referidas normas e as soluções, inclusive nos
casos concretos. As estruturas de mercado serão estudadas em razão do desrespeito à livre
concorrência e aos abusos do poder econômico. Após a análise do mercado em sua situação
de normalidade foram descritos as situações patológicas do mercado: abuso de poder
econômico; desvios; cartéis, truste e dumping. A proteção das relações de consumo está
intimamente relacionada com a construção de uma política de defesa da concorrência, sendo
a defesa do consumidor o principio básico do direito concorrencial. As limitações impostas à
livre concorrência em razão da proteção do consumidor são importantes para que a
regulamentação do mercado se dê sem que o consumidor sofra restrições aos seus direitos
uma vez que fica vulnerável diante de oligopólios, monopólios etc. Logo a proteção imposta
pelo Código de Defesa do Consumidor acaba limitando o direito à livre concorrência, para
que possíveis abusos não comprometam os direitos do consumidor que precisa do serviço ou
do produto. Ao final será apresentada a regulamentação do CADE e sua atuação em casos
reais neste equilíbrio necessário entre princípios constitucionais que muitas vezes se mostram
conflitantes, no entanto em razão do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade
deverá ocorrer a interação e compatibilização dos referidos princípios.
Palavras chave: Livre concorrência - defesa do consumidor - abuso do poder econômico.
7
THE DEFENSE OF THE FREE COMPETITION AND THE
CONSUMER WHILE PRINCIPLES OF THE ECONOMIC ORDER IN
THE DEMOCRATIC STATE OF RIGHT.
Summary:
The present research analyzed the free competition and the defense of the consumer while
principles of the economic order in the Democratic State of Right. It was objectified to
demonstrate to the interrelation between these two principles, everything on the basis of the
general principle of the economic order. The free competition and the defense of the
consumer are principles that many times enter in conflict a time that the interests of the
suppliers, many times, are not compatible with the ones of the consumers. It was analyzed in
this work shunting lines of market in reason of the disrespect to the free competition, its
concepts, its limits, its application and the consequences of its descumprimentos. For in such
a way it was studied the constitutional legislation and the related laws infraconstitutional to
the subject, as well as the extrajudicial forms of prevention, rebuke and punishment to the
abuse of the economic power, for agencies as the CADE. For the analysis of; perfect
oncorrência, monopoly, oligopoly, oligopsônio and monopsônio had been traced the
characteristics of the main structures of market. After the analysis of the market in its
situation of normality the pathological situations of the market had been described: abuse of
being able economic; shunting lines; cartels, monopoly, dumping and holding. It was verified
that the principles of the free competition and the defense of the consumer are in the same
constitutional hierarchic position. The protection of the consumption relations closely is
related with the construction of one politics of free market defense, being that the defense of
the consumer is begins it basic of the concorrencial right. The limitations imposed to the free
competition in reason of the protection of the consumer are important so that the regulation
of the market if gives without the consumer suffers to restrictions to its rights a time that is
vulnerable ahead of oligopolies, monopolies. Soon the protection imposed for the Code of
Defense of the Consumer finishes limiting the right to the Free competition so that possible
abuses do not compromise the rights of the consumer whom it needs the service or the
product. To the end it is presented the regulation of the CADE and its performance in this
constitutional necessary balance between principles that many times if show conflicting.
Words key: It exempts competition - prohibited of the consumer - abuse of the economic
power.
8
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO......................................................................................................................11
1 FUNDAMENTOS, OBJETIVOS E OS PRINCÍPIOS LIGADOS A LIVRE
CONCORRÊNCIA E PROTEÇÃO DA DEFESA DO CONSUMIDOR.........................14
1.1 A TRAJETÓRIA DO ESTADO LIBERAL E O ESTADO SOCIAL..............................32
1.2 A FORMAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO ECONÔMICA..................................................43
1.3 CONSIDERAÇÕES SOBRE O PRINCÍPIO DA LIVRE INICIATIVA.........................47
1.3.1 A Defesa do Consumidor na Ordem Econômica............................................................53
1.3.2 O Princípio Constitucional da Livre Concorrência.........................................................59
2 PRINCIPAIS LEGISLAÇÕES INFRACONSTITUCIONAIS RELACIONADAS
AOS PRINCÍPIOS DA LIVRE INICIATIVA, DE DEFESA DO CONSUMIDOR E DA
LIVRE CONCORRÊNCIA..................................................................................................65
2.1 A LEI DE PROTEÇÃO A CONCORRÊNCIA – LEI Nº. 8884/94..................................65
2.2 A PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR ATRAVÉS DA LEI Nº. 8078/90..........................87
2.3 OS CONFLITOS ENTRE AS NORMAS.........................................................................94
3 ESTRUTURAS E DESVIOS DE MERCADOS ...........................................................101
3.1 CONCORRÊNCIA PERFEITA E IMPERFEITA..........................................................102
3.2 MONOPÓLIO E OLIGOPÓLIO.....................................................................................106
3.3 OLIGOPSÔNIO E MONOPSÔNIO...............................................................................110
3.4 CARTÉIS, TRUSTE E DUMPING.................................................................................111
4
INTERAÇÃO
E
COMPATIBILIZAÇÃO
DOS
PRINCIPIOS
DA
LIVRE
CONCORRÊNCIA E DA DEFESA DO CONSUMIDOR..............................................117
4.1 O ABUSO DO PODER ECONÔMICO..........................................................................117
9
4.2 INTERPRETAÇÃO SISTÊMICA DOS PRINCÍPIOS DA LIVRECONCORRÊNCIA E
DA DEFESA DO CONSUMIDOR.......................................................................................123
4.3 DEFESA DO CONSUMIDOR E DA LIVRE CONCORRÊNCIA ATRAVÉS DO CADE
– CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA....................................136
4.3.1 Decisões Administrativas do CADE - Conselho Administrativo de Defesa
Econômica..............................................................................................................................139
CONCLUSÃO......................................................................................................................148
REFERÊNCIAS...................................................................................................................153
10
LISTA DE ABREVIATURAS
CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica
CF – Constituição Federal de 1988
STF – Supremo Tribunal Federal
DJ – Diário da Justiça
EUA – Estados Unidos da América
SDE – Secretaria de Direito Econômico
GATT - Acordo Geral de Tarifas e Comércio
ANP – Agência Nacional de Petróleo
PROCON - Procuradoria de Proteção e Defesa do Consumidor
11
INTRODUÇÃO
Para estudar os princípios da livre concorrência e da defesa do consumidor, em um
primeiro momento, é necessário fazer uma análise sobre a trajetória do Estado Social e o
Estado Liberal, o que ajuda a entender como e por quais motivos os referidos princípios
foram positivados pela Constituição Federal de 1988.
Será utilizada como metodologia: estudo doutrinário, pesquisas bibliográficas, com o
uso do método hipotético dedutivo e a interpretação analítica e sistêmica das fontes
utilizadas, bem como, análise de decisões referentes ao controle do mercado de consumo.
A pesquisa centra-se artigo 170, da Constituição Federal de 1988, em especial, nos
princípios da livre concorrência e a proteção aos direitos do consumidor. A abordagem
enfoca a difícil tarefa de harmonização entre esses princípios e as demais legislações e a
aplicação dos mesmos nos casos práticos.
No que tange a estes aspectos, serão examinados alguns dos alicerces da República
Federativa do Brasil, previstos no artigo 1º da Constituição Federal de 1988; a soberania; a
cidadania; a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e
o pluralismo econômico, como fundamentos constitucionais para a proteção do direito do
consumidor.
Constata-se o que a Constituição Federal de 1988 encontra-se mais voltada para a
corrente ideológica do Estado Social do que para o Liberalismo, embora tenha natureza
mista, objetiva-se esclarecer se os princípios da livre concorrência e sua auto regulamentação
e a defesa do consumidor com medidas de proteção, são princípios conflitantes com as
demais normas ou se há prevalência, complementariede e harmonização entre todos.
A Constituição Federal de 1988 em seu artigo 3º, prevê como finalidade do Estado a
construção de uma sociedade livre, justa e solidária, garantir o desenvolvimento nacional,
erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais e
promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor idade e quaisquer
outras formas de discriminação.
12
A livre iniciativa será analisada em razão de ser um dos mais importantes princípios
da ordem econômica constitucional do Brasil, bem como, um dos aspectos a compor o
contexto no qual se insere a livre concorrência. A livre iniciativa pressupõe não apenas a
idéia de liberdade para acessar o mercado, mas também a idéia de liberdade para permanecer
no mercado em condições de competir em igualdade com os demais agentes de mercado
dedicados à mesma atividade, caracterizando-se assim a livre concorrência.
A livre concorrência é a afirmação de liberdade do mercado, podendo os agentes
econômicos atuar sem embaraço visando à produção e circulação de mercadoria. Por outro
lado este princípio sofre uma série de restrições legais inclusive na Constituição Federal de
1988, as quais serão estudadas para a verificação da existência ou não da compatibilização,
conciliação e composição dos mesmos.
A análise da legislação infraconstitucional relacionada aos princípios da livre
concorrência e da defesa do consumidor, especialmente a Lei Antitruste, demonstra como são
regulados esses conflitos. A legislação tem como objetivo preservar o cenário da liberdade
das empresas mediante o controle e a limitação das forças e práticas anticompetitivas, ainda
proteger o mercado contra seus efeitos autodestrutíveis visando à manutenção do sistema.
As intervenções do Poder Judiciário e especialmente do CADE devem, de acordo
com as normas constitucionais, fazer prevalecer às normas relativas à concorrência como
instrumento de implementação de uma política pública e protetora dos consumidores como
forma de concretização de valores sociais.
Os conflitos entre os princípios da livre concorrência e da defesa do consumidor suas
características, seus limites, suas conseqüências e as formas de controle adotadas pelo Estado
brasileiro dão base a este estudo. A demonstração desses conflitos e controle se dará pela
análise de decisões judiciais e do CADE onde se pode verificar como ocorre a interação e a
compatibilização desses princípios e como eles se harmonizam com os fundamentos e
objetivos da Republica Federativa do Brasil e com as demais legislações infraconstitucionais.
Diante das diferentes variedades de legislações a pesquisa apresenta um breve relato
sobre os conflitos entre as normas, visando um melhor estudo da ordem constitucional na
medida em que seus princípios e fundamentos são aqueles que devem orientar a conduta dos
13
agentes econômicos no mercado, sempre visando uma interpretação harmoniosa dos
referidos princípios com as demais normas.
Na seqüência serão analisadas as estruturas de mercado: concorrência perfeita,
monopólio, oligopólio, oligopsônio e monopsônio e os desvios de mercados, os quais são
abominados pelo sistema econômico: cartéis, truste e dumping.
Partindo do exame dessas estruturas de mercado, analisar-se-á o abuso do poder
econômico, caracterizado pelo comportamento do empresário quando visa à dominação do
mercado, prejudicar ou impedir a concorrência, tendo como intenção à obtenção de lucros
ilegítimos e que causam prejuízo aos consumidores.
Em seqüência será demonstrado como ocorre a interação e a compatibilização entre
os princípios da livre concorrência e da defesa do consumidor, oportunidade em que será
esclarecido como ocorre a harmonia e o equilíbrio entre tais princípios o que possibilita
definir a política econômica e busca pela sua prática em harmoniza com as relações de
consumo e com a defesa da concorrência.
Ao final será demonstrada a atuação do órgão administrativo que tem como principal
objetivo a prevenção, repreensão e punição ao abuso de poder econômico, o CADE –
Conselho Administrativo de Defesa Econômica, bem como são as decisões do CADE na
prática.
14
1
FUNDAMENTOS, OBJETIVOS E OS PRINCÍPIOS LIGADOS A LIVRE
CONCORRÊNCIA E PROTEÇÃO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
O Estado Democrático de Direito conduz à idéia de um Estado de Direito e de Justiça,
expressa a estrutura jurídica-política de uma comunidade que, sob um Estado de Justiça,
delibera sobre o conteúdo da vida boa e do bem comum.
1
Consistindo em superar as
desigualdades sociais e regionais e instaurar um regime que realize a justiça social.
O Estado neoliberal tem como objetivo atender as necessidades da população,
defendendo o coletivo, na preocupação da realização da justiça social para o cidadão, para
isso debruça-se sobre diversos instrumentos de políticas públicas, especialmente aquelas de
cunho social, que consiga nivelar as desigualdades existentes entre a população.
Eros Roberto Grau complementa que “[...] nesses preceitos, opera-se a superação da
dissociação entre a esfera política e a esfera social - aí caminham juntos, voltando-se à
realização dos mesmos fins, o Estado e a sociedade”. 2
A Constituição Federal de 1988 é um modelo econômico de bem-estar social,
marcadamente por desenhar o perfil completo das finalidades principiológicas a serem
perseguidas pelo Estado no setor econômico, à disposição nuclear da ordem econômica é a
prevista no artigo 170, porém necessário reunir os artigos 1º e 3º, os quais são vocacionados
totalmente para a ordem econômica.
Eros Roberto Grau afirma que:
A Constituição do Brasil de 1988 projeta um Estado desenvolto e forte, o
quão necessário seja para que os fundamentos afirmados no seu art. 1º e os
objetivos definidos no seu art. 3º venham a ser plenamente realizados,
garantindo-se tenha por fim, a ordem econômica, assegurar a todos a
existência digna. 3
O artigo 1º da Constituição Federal de 1988 define os fundamentos da República
Federativa do Brasil, demonstrando que o Estado Democrático de Direito está diretamente
1
BARZOTTO, Luís Fernando. A Democracia na Constituição. São Leopoldo: Unisinos, 2003.
GRAU, Eros Grau. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 11. ed. São Paulo: 2006, p.131.
3
Op cit.
2
15
vinculado à soberania nacional, à cidadania, à dignidade da pessoa humana, aos valores
sociais do trabalho, à livre iniciativa e ao pluralismo econômico.
Os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil estão previsto no artigo
3º da Constituição Federal de 1988; quais sejam: construir uma sociedade livre, justa e
solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização e
reduzir as desigualdades sociais e regionais e promover o bem de todos, sem preconceitos de
origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras de discriminação.
O artigo 170 da Constituição Federal de 1988, menciona que a ordem econômica será
fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por finalidade assegurar
a todos a existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os princípios da
soberania social; propriedade privada; função social da propriedade; livre concorrência;
defesa do consumidor; defesa do meio ambiente, mediante trabalho diferenciado conforme o
impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;
redução das desigualdades regionais e sociais e tratamento favorecido para as empresas de
pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no
País.
A soberania é um dos primeiros princípios expressos pela Constituição Federal de
1988, pois está reproduzido no artigo 1º como fundamento da República Federativa do Brasil
e no artigo 170, inciso I, como princípio da ordem econômica brasileira. A soberania
econômica revela o poder político supremo e independente:
[...] supremo porque “não está limitado por nenhum outro na ordem
interna”, independente, porque, “na ordem internacional, não tem de acatar
regras que não sejam voluntariamente aceitas e está em pé de igualdade
com os poderes supremos dos outros povos”. 4
As políticas econômicas a serem adotadas devem levar o Estado a firmar sua posição
de soberania interdependente perante os demais Estados, a soberania nacional decorre da
autonomia conseguida pelas pessoas que integram a nação. Não se pode falar de soberania da
nação se os indivíduos que a compõem são incapazes de reger-se por um padrão de vida
digno e independente.
4
CAETANO, Marcello apud SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 22. ed.rev. e
atual. São Paulo: Malheiros Editores, 2003, p. 104.
16
André Ramos Tavares aduz que:
Se não se trata de uma soberania absoluta, o que significa que a soberania
nacional contida no inc. I do art. 170 da Constituição de 1988 é, em termos
econômicos, a preferência por um desenvolvimento nacional. Portanto, a
leitura do “princípio da soberania” deve ocorrer em harmonia e plena
sintonia com outro princípio, o do desenvolvimento econômico. O país não
pode, em termos de produção capitalista, ser dependente de outro, não ter
emancipação econômica equivaleria a, na prática, ignorar a necessidade do
pleno desenvolvimento. 5
A soberania econômica é intangível diante da realidade atual, pois com o fenômeno
da globalização a economia moderna está cada vez mais integrada no plano internacional.
Em razão da globalização, quando se trata de questões econômicas, percebe-se que os limites
territoriais estão sendo ultrapassados, deixando visível a possibilidade de o Estado manter
uma soberania econômica absoluta é cada vez mais difícil.
A Constituição Federal de 1988 atribui ao Estado, em seu artigo 174, a função de
regulamentação da atividade econômica para impedir o chamado “abuso do poder
econômico” previsto no artigo 173 § 4° da Constituição Federal de 1988. Por outro lado o
texto constitucional prevê em seu artigo 170, IV, de forma expressa a liberdade de
concorrência. A idéia de abuso do poder econômico deverá tratar dos desvios de função do
poder, quando empresas ou grupos econômicos desenvolvem estratégias visando efeitos
anticoncorrenciais.
A cidadania está diretamente vinculada com a democracia, qualifica como cidadão
aquelas pessoas que dispõe dos direitos políticos e são que nacionais, as pessoas que
participam como eleitor da vida do Estado. Manoel Gonçalves Ferreira Filho argumenta que:
A cidadania, assim considerada, consiste na consciência de pertinentes à
sociedade estatal como titular dos direitos fundamentais, da dignidade
como pessoa humana, da integração participativa no processo do poder,
com a igual consciência de que essa situação subjetiva envolve também
5
TAVARES, André Tavares. Direito Constitucional Econômico. 2. ed.rev. e atua. São Paulo: Editora Método,
2006, p.142.
17
deveres de respeito à dignidade do outro, de contribuir para o
aperfeiçoamento de todos. 6
A cidadania é um status ligado ao regime político, assim é correto incluir os direitos
típicos do cidadão entre aqueles associados ao regime político, em particular entre os ligados
à democracia. 7
Hodiernamente a grande preocupação dos juristas é a proteção a ser conferida aos
cidadãos, logo necessário buscar a maneira mais segura dos direitos fundamentais nesse
quadro de relações sociais, econômicas e jurídicas, impedindo sua violação e o ponto de
partida deve ser a cidadania.
A proteção do consumidor como verdadeiro exercício da cidadania significa para
Brito José Geraldo:
[...] a qualidade de todo ser humano como destinatário final do bem
comum de qualquer Estado, que o habilita a ver reconhecida toda a gama
de seus direitos individuais e sociais, mediante tutelas adequadas colocadas
à sua disposição pelos organismos institucionalizados. 8
Permeia a Constituição Federal de 1988, pois como norte em sua implementação, a
realização da “justiça social”, a própria Constituição Federal associa-se à solidariedade,
deixando certo que o conceito envolve não apenas a prevalência do social sobre o individual,
como também o compromisso de uma dependência recíproca, entre os indivíduos.
André Ramos Tavares entende que:
A justiça social, em síntese, deve ser adotada como um dos princípios de
finalidade comunitarista expressos na Constituição de 1988 a interferir no
contexto da ordem econômica, visando ao implemento das condições de
vida de todos até um patamar de dignidade e satisfação, com o que o
caráter da justiça é-lhe intrínseco. 9
6
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 31. ed.rev. ampl. e atual. São Paulo:
Saraiva. 2005, p. 36.
7
Op cit.
8
BRITO, José Geraldo apud FARIAS, Cristiano Chaves. A proteção do consumidor na era da Globalização,
Revista do Consumidor. n. 41. RT, jan/mar de 2002, p. 85.
9
TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico, 2 ed. São Paulo: Editora Método, 2006, p.
131.
18
O artigo 170 da Constituição Federal de 1988 menciona a “existência digna”, como
finalidade da ordem econômica e o artigo 1º menciona “dignidade da pessoa humana” como
um dos fundamentos do Estado brasileiro, em ambos os sentidos haverá implicações
econômicas, deve-se prevalecer à dignidade da pessoa humana como princípio. 10
Pérez Luño aponta o conteúdo dúplice do princípio da dignidade:
A dignidade humana consiste não apenas na garantia negativa de que a
pessoa não será alvo de ofensas e humilhações, mas também agrega a
afirmação positiva do pleno desenvolvimento da personalidade de cada
indivíduo. O pleno desenvolvimento da personalidade pressupõe, por sua
vez, de um lado, o reconhecimento da total autodisponibilidade, sem
interferências ou impedimentos externos, das possíveis atuações próprias
de cada homem; de outro, a autodeterminação (Selbstbestimmung dês
Menschen) que surge da livre projeção histórica da razão humana, antes
que de uma predeterminação dada pela natureza. 11
De maneira que não se pode, equivocadamente, inferir no conteúdo da dignidade da
pessoa humana que se trata de um direito ou um princípio absoluto. A dignidade da pessoa
humana enquanto princípio, ao lado do direito à vida, é um direito inviolável, é o núcleo
essencial dos direitos humanos, juntamente com o valor social do trabalho e a livre iniciativa.
O texto constitucional deixa evidente que não é apenas fundamento da República
Federativa do Brasil, mas também o seu fim, dessa forma a ordem econômica deverá
contribuir para a sua concretização. No entendimento de Eros Roberto Grau:
No quadro da Constituição de 1988, de toda sorte, da interação entre esses
dois princípios e os demais por ela contemplados – particularmente o que
define com fim da ordem econômica (mundo do ser) assegurar a todos
existência digna – resulta que valorizar o trabalho humano e tomar como
fundamental o valor social do trabalho importa em conferir ao trabalho e
seus agentes (os trabalhadores) tratamento peculiar. 12
10
Op cit.
11
LUÑO, Antonio E. Pérez. Derechos humanos, estado de derecho y constitución. 5. ed. Madrid: Tecnos, 1995,
p. 318.
12
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988 (interpretação e crítica.) 8 ed. São
Paulo: Malheiros, 2006, p. 198.
19
Confirma-se que todos os princípios da ordem econômica brasileira estão na mesma
posição, com aos mesmos objetivos, deve-se haver a aplicação e realização de todos esses
princípios, bem como fundamentos e objetivos da República Federativa do Brasil para que se
possa atingir o objetivo constitucional da realização da dignidade da pessoa humana e justiça
social, assegurando a todos a existência digna.
Anotam José Joaquim Gomes Canotilho e Vital Moreira que:
Concebida como referência constitucional unificadora de todos os direitos
fundamentais, o conceito de dignidade da pessoa humana obriga a uma
densificação valorativa que tenha conta o seu amplo sentido normativoconstitucional e não qualquer idéia apriorística do homem, não podendo
reduzir-se o sentido de dignidade humana à defesa dos direitos pessoais
tradicionais, esquecendo-a nos casos de direitos sociais, ou invocá-la para
construir uma ‘teoria do núcleo da personalidade’ individual, ignorando-a
quando se trate de direitos econômicos, sociais e culturais. 13
A dignidade da pessoa humana é inviolável, como princípio o núcleo dos direitos
humanos. Cabe ao Estado respeitá-la e protegê-la, não somente como direito fundamental,
mas como fim da ordem econômica, pois se tem como o mais forte princípio no qual se
embasa a concepção constitucional do Estado Democrático de Direito.
A Constituição Federal de 1988 busca a valorização do trabalho humano, em conjunto
com o princípio da livre iniciativa, o qual se prende ao princípio da liberdade, retrato de uma
economia capitalista, que funciona pelas leis do mercado, com uma intervenção moderada do
Estado, de forma subsidiária.
A valorização do trabalho humano está relacionada com o princípio da igualdade, o
mesmo vem corroborado como uma conseqüência da evolução histórica, desde a época do
trabalho escravo, passando pela revolução industrial, até os dias de hoje, em que se pleiteia
cada vez mais um relacionamento capital-trabalho voltado para as necessidades do homem
enquanto indivíduo, procurando-se não retroagir a épocas passadas, de exploração
injustificada do trabalho humano.
13
CANOTILHO, José Joaquim Gomes e MOREIRA Vital. Constituição da República Portuguesa anotada. 2.
ed. Coimbra: Editora Coimbra, 1984, p. 70.
20
O texto constitucional consagra apenas a valorização do trabalho humano produtivo,
através do qual o ser humano obtém os meios suficientes para a sua subsistência de forma
digna, ao contrário do que ocorria na época do trabalho escravo, tempo em que o trabalho
indignificava o ser humano.
O trabalho passa a receber uma proteção politicamente racional, abandonando a
proteção meramente filantrópica. Surgindo então o reconhecimento do valor social do
trabalho, expressando a prevalência dos valores do trabalho na conformação da ordem
econômica.
No entanto na prática muitas vezes o trabalho humano não é valorizado, existem
lugares em que ainda existe o trabalho escravo, como na China, que além de trabalho escravo
tem exploração do trabalho infantil e o trabalho é muito pouco remunerado.
Os valores sociais do trabalho devem ser priorizados, que na realidade é o próprio
direito ao trabalho e a criação de trabalho se dá com a livre iniciativa, em verdade pode-se
afirmar que são à base de sustentação do sistema econômico.
A livre iniciativa é a projeção da liberdade individual no plano da produção,
circulação e distribuição das riquezas, assegurando não apenas a escolha das profissões e das
atividades econômicas, mas também a autônoma eleição dos processos ou meios julgados
mais adequados à consecução dos fins visados. 14
Fabiano Del Masso ressalta que:
[...] é impossível o desenvolvimento da atividade econômica sem a
valorização do trabalho, que representado ponto de toque da produção,
ainda mais quando na economia contemporânea, o que mais se valoriza é
justamente a técnica de produção. 15
14
COELHO, Inocêncio Mártines. A defesa da livre concorrência na Constituição de 1988. Revista da
Procuradoria Geral da Republica, São Paulo: 1995, p. 61.
15
DEL MASSO, Fabiano. Direito Econômico. Rio de Janeiro: Elseivier, 2007, p. 44.
21
A ordem econômica dá prioridade aos valores do trabalho humano sobre os demais
valores da economia de mercado.
16
Porque é através do trabalho que se chega aos objetivos
da ordem econômica e social do país.
Para Adam Smith a proporção segundo o qual o produto desse trabalho se reparte por
entre um número maior ou menor de consumidores é que torna uma nação mais ou menos
rica:
Segundo seja maior ou menor a proporção existente entre o produto do
trabalho – ou aquilo que no estrangeiro se adquire em troca desse produto –
e o número de consumidores, encontrar-se-á a nação mais ou menos
abastecida de todas as espécies de coisas necessárias ou cômodas de que
necessita. 17
A produção do trabalho está intimamente ligada com o atendimento do consumidor e
com a liberdade de iniciativa, pois se o ser humano tem liberdade para trabalhar de forma
livre, conseguirá ter uma boa produção, estendendo a divisão do trabalho a todas as
profissões garantindo a livre concorrência e garantindo os anseios do consumidor.
O pluralismo econômico está garantido pela Constituição Federal de 1988 como
forma de convivência de diversos grupos sociais, que buscam viver em harmonia,
defendendo seus ideais, com objetivo de evitar que o poder de decisão fique nas mãos de
poucos, no intuito de que a maioria possa ter poder de decisão e participação.
Oscar Dias Corrêa, faz importante colocação em relação à justiça social:
[...] implica melhoria das condições de repartição dos bens, diminuição das
desigualdades sociais, com a ascensão das classes menos favorecidas. Não
é objetivo que se alcance sem continuado esforço, que atinja a própria
ordem econômica e seus beneficiários. 18
16
SILVA, José Afonso. Comentário Contextual à Constituição. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 200.
SMITH, Adam apud HUGON, Paul, História das doutrinas econômicas. 14. ed. São Paulo: Atlas, 1980,
p.104.
18
CORRÊA, OSCAR DIAS apud TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. 2. ed.rev. e
atual. São Paulo: Editora Método, 2006, p.130.
17
22
A justiça social deve ser adotada como um dos princípios de finalidade comunitarista
expressos da Constituição Federal de 1988 a interferir no contexto da ordem econômica,
visando ao implemento das condições de vida de todos até um patamar de dignidade e
satisfação, com o que o caráter social da justiça é-lhe intrínseco.19 A Constituição Federal de
1988 associou sociedade livre, justa e solidária, realmente como um Estado Democrático de
Direito deve ser.
[...] a Constituição quer, com esse objetivo fundamental, é que a Republica
Federativa do Brasil construa uma ordem de homens livres, em que a
justiça distributiva e retributiva seja um fator de dignificação da pessoa e
em que o sentimento de responsabilidade e apoio recíproco solidifique a
idéia de comunidade fundada no bem comum. Surge ai o signo do Estado
Democrático do Direito, voltado à realização da justiça social, tanto quanto
a fórmula liberdade, igualdade e fraternidade o fora no Estado Liberal
proveniente da Revolução Francesa. 20
A justiça social deverá ser atingida pela garantia da dignidade da pessoa humana e
suprimento das necessidades humanas fundamentais, com a conseqüente eliminação da
miséria, da ignorância e desigualdades entre as diversas classes sociais.
Na Constituição Federal de 1988, um dos objetivos fundamentais do Estado brasileiro
é “garantir o desenvolvimento nacional”, dando ênfase à idéia de que o desenvolvimento há
de ser buscado igualmente não apenas no plano econômico e sim em outras órbitas, como a
social, a moral, a política e outras.
Convém destacar Adam Smith, o qual anotara que:
[...] é no Estado em progresso, quando a sociedade avança no sentido de
aquisição de maiores riquezas, mais do que no que corresponde ao pleno
desenvolvimento da sua riqueza, que a situação dos trabalhadores pobres, a
maior parte da população, se apresenta mais feliz e agradável. É dura no
Estado estacionário, e miserável no de declínio. O Estado em progresso é,
19
TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. 2. ed.rev. e atual, São Paulo: Editora Método,
2006, p.131.
20
SILVA, José Afonso. Comentário Contextual à Constituição. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 46.
23
realmente, o que maior felicidade e alegria traz a todas as classes da
sociedade. O Estado estacionário é insípido; o de declínio, melancólico. 21
O desenvolvimento nacional encontra-se diretamente relacionado à melhoria das
condições sociais, humanas, morais e ao aumento da qualidade de vida do cidadão brasileiro.
Isto não significa apenas a preocupação com o mero crescimento econômico, mas que esse
crescimento deve proporcionar a melhoria da qualidade de vida, tendo toda pessoa o direito
de participar do desenvolvimento econômico, social, cultural e político.
Muito embora na prática talvez não se tenha conseguido atingir tal objetivo, no
entanto o caminho está sendo trilhado nesse sentido, para que todos os brasileiros tenham
condições dignas de sobrevivência, que possam trabalhar, estudar e ajudar no crescimento do
país, que resultará em uma vida digna.
José Afonso da Silva transcreve que:
[...] o desenvolvimento é um processo econômico, social, cultural e
político abrangente, que visa ao constante incremento do bem-estar de toda
a população e de todos os indivíduos com base em sua participação ativa,
livre e significativa no desenvolvimento e na distribuição justa dos
benefícios daí resultantes. 22
Percebe-se que o constituinte procurou edificar o Estado sobre uma base de valores
que têm um significado profundo para a sociedade, procurando sempre preservar a dignidade
da pessoa humana. Outro objetivo que está intimamente ligado à dignidade da pessoa
humana é a erradicação da pobreza e marginalização e a redução das desigualdades sociais e
regionais.
A pobreza pode levar a marginalização, pois se a pessoa não tem condições de se
alimentar também não terá condições de trabalhar, ocorrendo à marginalização dessa pessoa,
o que é intolerável diante da injustiça de um país que tem tantas riquezas, distribuída de
maneira desigual, de maneira que as pessoas com menos poder aquisitivo não têm condições
21
TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. 2. ed.rev. e atual, São Paulo: Editora Método,
2006, p. 133.
22
SILVA, José Afonso. Comentário Contextual à Constituição. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 47.
24
sequer de viver dignamente e muito menos de participar do desenvolvimento econômico do
país.
Através do desenvolvimento econômico crescem as ofertas de trabalho, e isso confere
a população uma condição de vida melhor. Outra conseqüência que deve advir do
desenvolvimento econômico, nesse ponto a atuação do Estado é importante, é em relação à
distribuição de renda, que possibilitaria a diminuição das desigualdades sociais e regionais e
uma melhor condição de vida para a população e um desenvolvimento econômico mais
compatível com a justiça social.
A República Federativa do Brasil também apresenta como objetivo promover o bem
de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de
discriminação, para que se chegue a uma sociedade livre, justa e solidária.
Em relação aos princípios gerais da atividade econômica previstos no artigo 170 da
Constituição Federal de 1988, Celso Ribeiro Bastos entende serem quatros os princípios
enunciados no artigo 170 da Constituição Federal, afirmando que “[...] encontramos no caput
do artigo referencia a quatro princípios: valorização do trabalho humano, livre iniciativa,
existência digna, conforme os ditames da justiça social.” 23
Tal posição não é unânime na doutrina nem mesmo quanto à consideração dos
dispositivos do artigo 170 da Constituição Federal de 1988. João Bosco Leopoldino da
Fonseca, entende que a Constituição Federal de 1988, estabelece os princípios da cidadania,
da dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, os quais
se incorporam linhas de pensamento, uma ideologia a direcionar as regras. Ainda entende
como princípios a soberania nacional, da propriedade privada, da função social da
propriedade, da livre concorrência, da defesa do consumidor, da defesa do meio ambiente. 24
No entendimento de Washington Peluso Albino de Souza as disposições do caput
configuram fundamentos e objetivos da ordem constitucional, não princípios, considerando
que o autor que:
23
BASTOS, Celso Ribeiro. MARTINS, Ives Gandra da Silva. Comentários à Constituição do Brasil. 2. ed. São
Paulo: Saraiva, 2000, p. 12.
24
LEOPOLDINO DA FONSECA, João Bosco. Direito Econômico. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 51.
25
[a] o tratar dos ‘princípios gerais’, o legislador situou, no primeiro artigo a
preocupação para com os seus ‘fundamentos’ e os princípios a serem
observados. Como fundamentos da ‘ordem econômica’ nomeia a
‘valorização do trabalho humano e a livre iniciativa’. Como objetivo indica
o de ‘assegurar a todos a existência digna conforme os ditames da justiça
social’, seguindo-lhes, então os ‘princípios’ a serem observados. 25
Para que os fundamentos sejam concretizados e para que os fins sejam alcançados,
necessário adotar alguns princípios norteadores da ação do Estado, motivo pelo quais os
princípios constantes no artigo 170 da Constituição Federal de 1988 devem orientar a atuação
do Estado e dos particulares nos processos de produção, circulação, distribuição e consumo
de riquezas do país.
O artigo 170 da Constituição Federal de 1988 deveria ser lido segundo Eros Roberto
Grau, da seguinte maneira:
[...] as relações econômicas - ou a atividade econômica – deverão ser
(estar) fundadas na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa,
tendo por fim (fim delas, relações econômicas ou atividades econômica)
assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social,
observados os seguintes princípios.26
Eros Roberto Grau afirma que existe duas circunstâncias, especificamente, que
demarcaram os novos traços, ambos decorrentes do fato de o Estado ser compelido a refinar
o desempenho das funções, pelas quais responde de integração e modernização e de
legitimação capitalista, o que supõe a implementação de políticas públicas. 27
Analisando o caput do artigo 170 da Constituição Federal de 1988 percebe-se ter ele
estabelecido dois princípios, quais sejam o da valorização do trabalho humano e o da livre
iniciativa, que teriam como objetivo, assegurar a todos existência digna, conforme os ditames
da justiça social, pautando-se também pelos outros princípios que estão enumerados em nove
incisos.
25
SOUZA, Washington Peluso Albino de. A experiência brasileira de Constituição Econômica. Revista de
Informação Legislativa, n. 102, abr - jul. 1989, p.29.
26
EROS, Roberto Grau. A Ordem Econômica na Constituição de 1988 (Interpretação e crítica). 11. ed.rev. e
atual. Malheiros Editores. São Paulo: 2006, p. 68.
27
Op cit, p. 75.
26
Em um primeiro momento existe apenas uma diferenciação em razão da
nomenclatura utilizada pelos princípios, os fundamentos e os objetivos da ordem econômica,
pois a natureza jurídica de todos eles é principiólogica, de maneira que a função jurídica de
todos é de princípio, tendo por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames
da justiça social.
Existe um confronto entre os dois principais princípios constitucionais que embasam
a concorrência no Brasil, o texto constitucional prevê em seu art. 170, IV de forma expressa a
liberdade de concorrência, mas o artigo 173, § 4º da CF, visa impedir o abuso do poder
econômico, o que significa que existe a liberdade,no entanto não é ilimitada, de maneira que
o controle de condutas deve, portanto existir para que a as restrições existam, mas fiquem
limitadas à obtenção de objetivos lícitos.
Tal limitação visa impedir os atos que gerem efeitos anticompetitivos através da
análise de razoabilidade, isso assegura a eficiência distributiva que confirme um direito
antitruste coerente, que se preocupa com o consumidor.
Resta a dúvida de que até que ponto o Estado deverá interferir na atividade
econômica, momento em que deve ser levado em conta o princípio da proporcionalidade, que
segundo João Bosco Leopoldino da Fonseca o Estado não pode intervir mais do que
necessário para atingir os objetivos previstos na legislação, motivo necessário a
compatibilização dos princípios constitucionais. 28
A essência e destinação da norma da proporcionalidade devem preservar os direitos
fundamentais. O princípio, assim, coincide com a essência e destinação mesma de uma
Constituição que, tal como hoje se concebe, pretenda desempenhar o papel que lhe está
reservado na ordem jurídica de um Estado de Direito Democrático. 29
O princípio da proporcionalidade numa primeira aproximação é a exigência de
racionalidade, a imposição de que os atos estatais não sejam desprovidos de um mínimo de
sustentabilidade. 30
28
FONSECA, João Leopoldino da. Direito Econômico. 5. ed. ver. atual. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2005,
p.72.
29
TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 508.
30
Op cit, p. 506.
27
O
conteúdo
jurídico-material
do
princípio
da
proporcionalidade
decorre
inelutavelmente do reconhecimento da supremacia hierárquico-normativa da Constituição. A
proporcionalidade, como princípio jurídico implícito do Estado de Direito, é uma garantia
fundamental para a
concretização dos valores consagrados
na Constituição. A
proporcionalidade é princípio que concretiza o postulado segundo o qual o Direito não se
esgota na lei e sim deve representar a síntese da vontade geral. 31
Pode o princípio da proporcionalidade ser utilizado para afirmar que as leis devem ser
menos restritivas às garantias fundamentais e que os riscos derivados da incidência da norma
jurídica devem ser distribuídos de modo imparcial e proporcional entre os membros da
sociedade.
No estágio atual em que se encontra o princípio, viabiliza-se aos juízes que controlem
a razoabilidade e racionalidade da produção legislativa através de um processo técnico de
adequação das leis aos princípios fundamentais do direito, pautado por maior intervenção
estatal e pela relativização das garantias individuais em prol do interesse coletivo.
Paulo Bonavides obtempera:
O controle das leis, por meio do princípio da proporcionalidade deferido à
judicatura dos tribunais, precisa todavia manter aberto e desimpedido o
espaço criativo outorgado pela Constituição ao legislador pra avaliar fins e
meios, porquanto a determinação de meios e fins pressupões sempre uma
decisão política [...].32
A norma tem que ser razoavelmente relacionada com os objetivos da legislação. As
considerações do professor Helenilson Cunha, encontram amparo nas lições de Paulo
Bonavides que, por sua vez, afirma:
Em nosso ordenamento constitucional não deve a proporcionalidade
permanecer encoberta. Em se tratando de princípio vivo, elástico, prestante,
protege ele o cidadão contra os excessos do Estado e serve de escudo à
31
PESSOA, Leonardo Ribeiro. Os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade na jurisprudência
tributária norte-amerciana e brasileira. Jus navegandi, nov. de 2004. Disponível em
http://jus2.uol.com.br/doitrina/texto.asp?=5989. Acesso 27 de jul. 2008.
32
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 7. ed. ver. e ampl. São Paulo: Editora Malheiros,
1997, p. 382.
28
defesa dos direitos e liberdades constitucionais. De tal sorte que urge,
quanto antes, extraí-lo da doutrina, da reflexão, dos próprios fundamentos
da Constituição, em ordem a introduzi-lo, com todo o vigor no uso
jurisprudencial. 33
O princípio da proporcionalidade está intimamente ligado com o princípio da
isonomia, estando relacionado ao aspecto material do conceito de isonomia, como critério de
justa medida de distribuição dos direitos e deveres. Não podendo duvidar que ambos os
princípios tenham a função de atualizar e efetivar a proteção dos direitos fundamentais 34
Leonardo Ribeiro Pessoa em seu artigo cita as lições de Luís Roberto Barroso o qual
aduz que é possível depreender que a razoabilidade deve ser aferida, em primeiro lugar,
dentro da lei, que é chamada razoabilidade interna, que diz respeito à existência de uma
relação racional e proporcional entres seus motivos, meios e fins. De outra parte, havendo a
razoabilidade interna da norma, é preciso verificar sua razoabilidade externa, isto é: sua
adequação aos meios e fins admitidos e preconizados pelo texto constitucional. Se a lei
contravier valores expressos ou implícitos no texto constitucional, não será legítima nem
razoável à luz da Constituição, ainda que o fosse internamente. 35
O princípio da proporcionalidade é visto como método de interpretação, tal
entendimento encontra guarida as concepções contemporâneas do Direito, o qualificam como
um sistema aberto de normas, diante da complexidade das relações sociais de nosso tempo,
não há como descer à concretude da vida social para apreendê-la em sua totalidade.
Dentro desse contexto, o princípio da proporcionalidade desponta como relevante
instrumento de solução de conflitos na medida em que se apresenta como mandamento de
“otimização de princípios”, ou seja, como critério de sopesamento de princípios quando estes
conflitam em dada situação concreta. 36
Tem o mesmo posicionamento Willi Santiago Guerra Filho o qual assevera:
33
PESSOA, Leonardo Ribeiro. Os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade na jurisprudência
tributária norte-amerciana e brasileira. Jus navegandi, nov. de 2004. Disponível em
http://jus2.uol.com.br/doitrina/texto.asp?=5989. Acesso 27 de jul. 2008.
34
TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 510.
35
PESSOA, Leonardo Ribeiro. Os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade na jurisprudência
tributária norte-amerciana e brasileira. Jus navegandi, nov. de 2004. Disponível em
http://jus2.uol.com.br/doitrina/texto.asp?=5989. Acesso 27 de jul. 2008.
36
Op cit.
29
[...] se verifica que os princípios podem se contradizer, sem que isso faça
qualquer um deles perder a sua validade jurídica e ser derrogado. É
exatamente numa situação em que há conflito entre princípios, ou entre eles
e regras, que o princípio da proporcionalidade (em sentido estrito ou
próprio) mostra sua grande significação, pois pode ser usado como critério
para solucionar da melhor forma tal conflito, otimizando a medida em que
se acata prioritariamente um e desatende o mínimo possível o outro
princípio.37
O princípio da proporcionalidade abarca três elementos necessários, a conformidade
ou adequação dos meios empregados, a necessidade ou exigibilidade da medida adotada e a
proporcionalidade em sentido estrito. 38
Assim todos os elementos devem ser concordantes entre eles e os valores encampados
pelo ordenamento jurídico. O princípio da proporcionalidade visa atingir a mais oportuna
relação entre meios e fins para melhor garantir os direitos do cidadão em situações
concretamente relacionadas.
A interpretação constitucional também passa pelo princípio da razoabilidade. Nesse
sentido, a interpretação não pode levar o estudioso do texto a uma posição absurda, destoante
da realidade.
O princípio da razoabilidade é um parâmetro de valoração dos atos do
Poder Público para aferir se eles estão informados pelo valor superior
inerente a todo ordenamento jurídico: a justiça. Sendo mais fácil ser sentido
do que conceituado, o princípio se dilui em um conjunto de proposições que
não o libertam de uma dimensão excessivamente subjetiva. É razoável o
que seja conforme a razão, supondo equilíbrio, moderação e harmonia; o
que não seja arbitrário ou caprichoso; o que corresponda ao sendo comum,
aos valores vigentes em dado momento ou lugar. 39
Muito embora os princípios da proporcionalidade e razoabilidade possam ser
assimilados, a distinção entre ambos é importante para evitar a diminuição dos princípios.
Para corroborar isto, é importante trazer a contribuição de Germana de Oliveira Moraes que
também discorda que tais princípios tenham conteúdo idêntico, in verbis:
37
GUERRA FILHO, Willis Santiago. Processo Constitucional e Direitos Fundamentais. São Paulo: Instituto
Brasileiro de Direito Constitucional. Celso Bastos Editor, 1999, p. 73.
38
TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 514.
39
BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e Aplicação da Constituição. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 204/205.
30
Inexiste sobreposição entre os princípios da razoabilidade e da
proporcionalidade. De toda sorte, embora com matriz histórica diversa e
conteúdos distintos, guardam vários pontos de identidade. Por isso, há quem
os trate indistintamente como noções fungíveis; há, por outro lado, quem
considere o princípio da razoabilidade como uma das vertentes do princípio
da proporcionalidade (Eros Roberto Grau); e ainda, por vezes, o princípio
da proporcionalidade é visto como uma das expressões do princípio da
razoabilidade (Celso Antônio Bandeira de Mello). [...] A idéia de
proporcionalidade, em sua tríplice manifestação, coincide com a noção de
racionalidade, isto é, com a primeira acepção do princípio da razoabilidade.
No entanto, não se confunde com a noção de razoabilidade em sentido
estrito. O teste de racionalidade envolve a adoção dos critérios de
proporcionalidade – adequação e exigibilidade, enquanto o teste de
razoabilidade, relacionado à questão da proporcionalidade em sentido
estrito, configura um método de obtenção do equilíbrio entre os interessados
em conflito. 40
A diferença reside na classificação e nos elementos constitutivos desses princípios, já
que a razoabilidade é mais ampla que a proporcionalidade. Sustentar entre os termos, no
Brasil, é dar à proporcionalidade um raio de aplicação que suas possibilidades [...].41
O Supremo Tribunal Federal, por exemplo, já decidiu, liminarmente, pela
inconstitucionalidade de uma lei Estadual que, para garantir direitos dos consumidores na
compra de botijões de gás, exigia o emprego de uma medida extremante onerosa para os
vendedores, conforme se apreende da leitura de sua ementa:
Gás liquefeito de petróleo: lei estadual que determina a pesagem de botijões
entregues ou recebidos para substituição a vista do consumidor, com
pagamento imediato de eventual diferença a menor: argüição de
inconstitucionalidade fundada nos arts. 22, IV e VI (energia e
meteorologia), 24 e pars, par. 2, 238, além da violação do princípio da
proporcionalidade e razoabilidade das leis restritivas de direito:
plausibilidade jurídica da argüição que aconselha a suspensão da cautelar da
lei impugnada, a fim de evitar danos irreparáveis a econômica do setor, no
caso de vir a declarar-se a constitucionalidade: liminar deferida. (S.T. F,
ADIN-medida cautelar, DJ de 1-10-1993, relator: Sepúlveda Pertence) 42
40
PESSOA, Leonardo Ribeiro. Os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade na jurisprudência
tributária norte-americana e brasileira. Jus navegandi, nov. de 2004. Disponível em
http://jus2.uol.com.br/doitrina/texto.asp?=5989. Acesso 27 de jul. 2008.
41
QUEIROZ, Raphael Augusto Sofiati. Os princípios da razoabilidade e Proporcionalidade das Normas e sua
Repercussão no Processo Civil Brasileiro. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 200, p. 45.
42
TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 515.
31
O princípio da proporcionalidade pauta a própria prestação jurisdicional do Estado,
através da escolha de melhor decisão que possa solucionar efetivamente os conflitos sociais:
Código de Defesa do Consumidor. Defeito de Fabricação. Indenização.
Pedido. Possibilidade de o juiz deferir, em vez de entrega de um carro novo,
a indenização pela diminuição do valor do bem. Observa-se o princípio de
que o processo deve ser conduzido e decidido de modo a assegurar a efetiva
prestação jurisdicional que, no caso, consistia em encontra a junta
composição dos danos. Recurso não conhecido. (S.T.J., Recurso Especial,
DJ de 12-5-1997, relator: Ruy Rosado Aguiar).
A razoabilidade exige que as medidas estatais sejam racionalmente aceitáveis e não
arbitrárias, o princípio da proporcionalidade determina que as mesmas, além de preencherem
tal requisito, constituam instrumentos de maximização dos comandos constitucionais,
mediante a menor limitação possível aos bens juridicamente protegidos. 43
A desarmonia semântica entre dois ou mais princípios não produz antinomia jurídica,
isto é, não se conclui que um princípio revoga o outro; eventual conflito solucionar-se-á na
dimensão de peso ou importância, e não na dimensão da validade, como se dá com as regras
jurídicas. 44
Pode-se afirmar que o ordenamento jurídico brasileiro está utilizando o princípio da
proporcionalidade e da razoabilidade para fundamentar decisões, no intuito de solucionar
conflitos, inclusive o CADE, que é um órgão administrativo.
O princípio da proporcionalidade se move no sentido de compatibilizar as
considerações das realidades que não estão amparadas pela legislação, ou estão
desatualizadas, aplicando a harmonização e interação na decisão de maneira proporcional ao
caso concreto.
A regra constitucional deve ser temperada sob os parâmetros do princípio da
proporcionalidade, que traduz a justa medida dos institutos jurídicos, ou, por outra maneira, o
43
PESSOA, Leonardo Ribeiro. Os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade na jurisprudência
tributária norte-americana e brasileira. Jus navegandi, nov. de 2004. Disponível em
http://jus2.uol.com.br/doitrina/texto.asp?=5989. Acesso 27 de jul. 2008.
44
GOMES, Carlos Jacques Vieira. Ordem Econômica Constitucional e Direito Antitruste. Porto Alegre: S.A.
Fabris, 2004, p 79.
32
princípio de proibição do excesso e pelo princípio da razoabilidade que visa equilíbrio,
moderação e harmonia.
1.1
A TRAJETÓRIA DO ESTADO LIBERAL E ESTADO SOCIAL
No Brasil, o Estado Liberal surgiu de uma progressiva erosão do poder monárquico e
de uma ruptura revolucionária e a seguir o Estado Social, que foi uma grande corrente de
pensamento que se insurge contra o liberalismo econômico em razão da necessidade de
estabelecer a igualdade entre os indivíduos e a intervenção mínima do Estado na vida
econômica.
O Estado Liberal e o Estado Social, são frutos de movimentos que resolveram e
abalaram os fundamentos da sociedade, buscava sem dúvida, ajustar o corpo social a novas
categorias de exercício do poder concebidas com o propósito de sustentar, desde as bases, um
novo sistema econômico adotado por meios revolucionários. 45
Desde fins do século XVII começaram a surgir na Europa ocidental correntes de
pensamento, a princípio tênues, voltados não apenas a enaltecer o ideal de liberdade e,
consequentemente, a contestar o poder absoluto dos monarcas, mas empenhadas igualmente
em discutir a idéia de liberdade, procurando dar-lhe contornos e condições de
operacionalidade, ou seja, ensaiando formas e meios pelos quais fosse possível organizar
uma sociedade, apta a pautar o seu funcionamento segundo os ditames e exigências da
liberdade. 46
O Estado democrático liberal consolidou-se nos séculos XVIII e XIX, fundamentado,
basicamente, na idéia de que todos, incluindo os governantes, deveriam sujeitar-se aos
ditames genéricos albergados nas leis. Isto permitiu assegurar as liberdades individuais,
especialmente as liberdades econômicas, estas, uma vez positivadas, constituíam limites à
atuação dos governantes. 47
Luis S. Cabral de Moncada assevera que:
45
BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social. 7. ed. 2. tiragem. São Paulo: Malheiros Editores,
2004, p.32.
46
NUSDEO, Fábio. Curso de Economia. Introdução ao Direito Econômico. 3. ed.rev. e atual. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2001, p. 124.
47
TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. 2. ed. São Paulo: Editora Método, 2006, p 47.
33
A caracterização do modelo jurídico liberal assenta em dois postulados
essenciais; a separação absoluta entre o direito público e o direito privado,
cada um deles com a sua esfera de aplicação perfeitamente diferenciada e o
predomínio da autonomia da vontade privada na esfera econômica. 48
A ordem econômica era estritamente privada eis que não era permitido que o direito
público interferisse na atividade econômica, existia um separação absoluta entre os direitos
públicos e privados.
Norberto Bobbio afirma que o liberalismo é a doutrina do “Estado mínimo”, para o
liberal o Estado é sempre um mal, mas é necessário, devendo, portanto, ser conservado
embora dentro dos limites os mais restritos possíveis. 49
André Ramos Tavares argumenta que:
[...] o liberalismo como doutrina filosófica e política, originou-se com as
restrições ao poder feudal e monárquico, ocorridas já desde o século XV,
consolidando-se, contudo, apenas na segunda metade do século XVIII,
época das chamadas revoluções liberais, baseados na idéia de liberdade. 50
A participação do Estado na vida econômica era totalmente abominável pelos liberais,
segundo Adam Smith era três as funções do Estado:
Proteger o país contra invasores estrangeiros, proteger os cidadãos contra
“injustiças” cometidas por outros cidadãos e o “dever” de erigir e manter
as instituições e obras públicas que, embora altamente vantajosas para toda
grande sociedade, são de natureza tal que os lucros jamais compensariam
as despesas se estas estivessem a cargo de um individuo ou de pequeno
número de indivíduos. 51
A atividade econômica se fundamenta unicamente num conjunto de relações
interindividuais, cuja expressão é o mercado. Este se configura como um sistema de
confronto e harmonização de interesses individuais baseado em regras própria, impermeáveis
à vontade do Estado [...] do ponto de vista do pensamento liberal o mercado é uma barreira
ao Estado, uma zona livre da sua intervenção e, portanto, um critério visível da liberdade
individual. 52
48
MONCADA, Luis S. Cabral. Direito Econômico. 2. ed. Coimbra, 1988, p.16.
BOBBIO, Norberto. Liberalismo e Democracia. Tradução Marco Aurélio Nogueira. São Paulo: Brasiliense,
2000, p.89.
50
TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. 2. ed. São Paulo: Editora Método, 2006, p 47.
51
Smith Adam apud HUNT, E. K & SHERMAN, Hjorward J. História do Pensamento Econômico. 16 ed.
Petrópolis: Editoras Vozes. 1998, p. 66.
52
MONCADA, Luis S. Cabral. Direito Econômico. 2. ed. Coimbra, 1988, p.17/18.
49
34
Até então somente o particular poderia auferir lucro, era proibido o Estado ter a idéia
de lucro, cabia ao Estado garantir a todos o desenvolvimento da liberdade individual, sem
interferir na atividade econômica.
O indivíduo contribuía para a prosperidade geral, sendo que a livre concorrência
alicerçada numa ordem jurídica contratual fazia com que o particular canalizasse as energias
individuais para a produção e invenção, concretizando assim cumulativamente a
prosperidade geral.
No Estado Liberal o indivíduo com o ideal de liberdade busca que o Estado
possibilite a materialização das conquistas implementadas no âmbito dele, o qual assumiu a
feição de não interventor.
O liberalismo econômico está assentado no interesse individual, o qual coincide com
o interesse geral, deve-se na prática, deixar plena liberdade de ação entre os interesses
privados. 53
Adam Smith afirma que a liberdade se impõe em seu sistema como conseqüência da
benfazeja harmonia espontânea entre o interesse do indivíduo e o da sociedade e como
corolário do fato de ser o indivíduo o único apto para discernir e buscar a satisfação de seu
próprio interesse. 54
Para os liberais o Estado tinha o dever de garantir nas relações sociais, através de
compatibilização dos interesses privados com os interesses coletivos, no entanto o Estado
não mais tinha a obrigação de buscar atingir os objetivos para o indivíduo e sim para o
coletivo.
Paulo Bonavides comenta que:
No século XVIII colocou, por conseguinte, todas as premissas e divisas
subseqüentes da rotação que a idéia revolucionária, para cumprir-se, teve
que cursar. Primeiro, promulgou as Constituições do chamado Estado de
Direito e, ao mesmo passo, com a Revolução da burguesia, decretou os
códigos da sociedade civil. Outro não foi, portanto, o Estado da separação
de poderes e das Declarações de Direitos, que entrou para a história sob a
denominação de Estado Liberal. 55
Norberto Bobbio relata que Locke, um dos pais do liberalismo moderno, parte do
estado de natureza descrito como um estado de perfeita liberdade e igualdade, governado só
53
SMITH, Adam apud HUGON, Paul, História das doutrinas econômicas. 14. ed. São Paulo: Atlas, 1980,
p.106.
54
Op cit. p. 108.
55
BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social. 7. ed. 2. tiragem. São Paulo: Malheiros Editores,
2004, p.31.
35
uma lei da natureza que [...] ensina a todos os homens, desde que desejem consultá-la, que,
sendo todos iguais e independentes, ninguém deve provocar danos aos demais no que se
refere à vida, à saúde, à liberdade ou às posses. 56
O indivíduo para a ter sua liberdade, como autonomia da conduta individual, passam
a ser sujeito de direito, com total liberdade e com a garantia da dignidade pessoal e dos
direitos naturais.
O Estado Liberal é justificado como o resultado de um acordo entre indivíduos livres
que convencionam estabelecer os vínculos inicialmente estritamente necessários a uma
convivência pacífica e duradoura, caracterizando-se pela margem de liberdade política,
econômica, ideológica, religiosa, dentre outras.
O professor Goettingen afirma que:
A possibilidade de dissociar a democracia do liberalismo se cinge, em
última análise, à distinção dos valores fundamentais sobre os quais se
baseiam. O valor essencial que inspira o liberalismo não se pode voltar
para a comunidade, mas para a liberdade criadora do individuo dotado de
razão. Partindo desse ponto de vista, havia o liberalismo desenvolvido um
sistema metafísico completo, fundado na fé de que uma solução racional
total podia resultar do livre concurso das opiniões individuais em todos os
domínios da vida [...] 57
O liberalismo defendia a liberdade econômica com a defesa da propriedade individual
como única garantia da liberdade econômica, entendida por sua vez como pressuposto
necessário da real explicação de todas as outras liberdades. 58
André Ramos Tavares relata que:
Havia a concepção de que o Estado cumpriria cuidar da ordem pública,
proporcionando um aparato policial, defendendo as instituições (prestando
Justiça) e protegendo-se contra agressões internacionais. O mercado, por
seu turno, deveria desenvolver-se livremente, isto é, sem a interferência do
Estado, salvo para prestar a necessária segurança e para atuar naqueles
setores nos quais não haveria interesse para a iniciativa privada. 59
56
BOBBIO, Norberto. Liberalismo e Democracia. São Paulo: Editora Brasiliense, 2000, p.12.
GOETTINGEN apud BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social. 7. ed. 2. tiragem. São Paulo:
Malheiros Editores, 2004, p.52.
58
BOBBIO, Norberto, Liberalismo e Democracia. Tradução Marco Aurélio Nogueira. São Paulo: Brasiliense,
2000, p.80.
59
TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. 2. ed. São Paulo: Editora Método, 2006, p 48.
57
36
Ao Estado caberia somente proporcionar proteção ao particular, o qual era totalmente
livre para desenvolver suas atividades econômicas, sem qualquer interferência ou
participação, o qual somente garantia ao particular o desenvolvimento de suas atividades.
Por sua vez Celso Ribeiro Bastos conceitua:
[...] liberalismo vem a ser um conjunto de idéias, ou concepções, comum a
visão mais ampla, abrangendo o homem e os fundamentos da sociedade,
tendo por objetivo o pleno desfrute da igualdade e das liberdades
individuais frente ao Estado. 60
A principal manifestação econômica da doutrina liberal é o postulado da livreiniciativa, que consagra o direito, atribuído a qualquer pessoa, de exercer atividade
econômica livre de qualquer restrição, condicionamento ou imposição descabida do Estado.
61
Segundo Celso Ribeiro Bastos a livre iniciativa é uma expressão fundamental da
concepção liberal do homem, que coloca como centro a individualidade de cada um. Para o
liberal, a livre-iniciativa é necessária para a sua própria expressão e dignidade enquanto
homem, porque cabe-lhe imprimir um destino à sua vida, uma escolha, a expressão de sua
capacidade, e isso tudo só é conseguido através da liberdade que se reserva a cada um para
poder exercer a atividade econômica.62
O princípio de organização da economia liberal constitui um regime econômico no
qual a oferta e a procura se ajustam espontaneamente, através do mecanismo dos preços, esse
quase automático, funciona em um regime de livre concorrência.
Os princípios fundamentais do liberalismo incluem a transparência, os direitos
individuais e civis, especialmente o direito à vida, à liberdade, à propriedade, um governo
baseado no livre consentimento dos governados e estabelecido com base em eleições livres;
igualdade da lei e de direitos para todos os cidadãos
Luis S. Cabral de Moncada afirma que:
A tarefa do Estado não consiste, portanto em prescrever fins para cada
cidadão, mas atuar de modo a que cada cidadão possa alcançar livremente
os seus próprios fins individuais; o Estado deve garantir para cada
indivíduo uma esfera de liberdade de maneira que, dentro dela, cada um
possa, segundo as suas capacidades e talento, prosseguir os fins que lhe
aprouveram.
60
BASTOS, Celso Ribeiro. Direito Econômico Brasileiro. São Paulo: IBDC, 2000, p.110.
TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. 2. ed. São Paulo: Editora Método, 2006, p 48.
62
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 452.
61
37
Esta concepção do Estado foi considerada pela doutrina negativa porque a
sua característica é a de não ter fins próprios e a sua tarefa essencial não é
a de fazer algo para a felicidade dos seus súditos, mas simplesmente
impedir que um cidadão não possa alcançar a sua própria felicidade e bemestar, segundo a sua maneira de ver; não se trata os obstáculos que se
colocam a que cada um alcance o seu bem-estar individual através de suas
próprias capacidade e meios. 63
A concepção de Estado Liberal gerou, em momentos críticos da humanidade, uma
situação insuportável, de modo que, mesmo em países de imensa tradição liberal e capitalista,
passou-se a admitir a necessidade de intervenção do Poder Público no mercado e na
economia, ainda que extremamente restrita ou em setores específicos e predeterminados. A
demanda por um Estado interventor, desta feita, decorre da existência de falhas na concepção
– utópica – liberal da economia. 64
De maneira que o mercado apresentará certas inoperalidades, que poderão influir
diretamente na sua eficiência, quando ausentes alguns pressupostos:
[...] a falta de mobilidade de fatores que gera as crises de super ou sub
produção; - o deficiente acesso a todas as informações relevantes pelos
agentes econômicos que falseia ou as suas decisões; - a concentração
empresarial derivada do fenômeno das economias de escala que elimina o
jogo concorrencial por inquinar a estrutura mercantil; - os efeitos externos
da atividade econômica produzindo custos e benefícios sociais – as
externalidades – que se quedam incompensados e, assim, deixam de
sinalizar adequadamente a escassez; - a impossibilidade de captar as
necessidades da comunidade por bens de caráter coletivo, isto é, aqueles
que atendem concomitantemente às necessidades de um número razoável
grande de pessoas. 65
A superação da liberdade qual a conceituava outrora o liberalismo, sem a
consideração dos fatores econômicos, reconhecidos, hoje, como indispensáveis à prática da
verdadeira liberdade humana. 66
Não há indícios de liberalismo no horizonte político do Estado brasileiro, nem na
formação da maioria de seus colaboradores, especialmente na área econômica.
63
67
O
MONCADA, Luis S. Cabral. Direito Econômico. 2. ed. Coimbra, 1988, p.22.
TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. 2. ed. São Paulo: Editora Método, 2006, p 50.
65
NUSDEO, Fábio. Fundamentos para uma codificação do direito econômico. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais. , 1995, p. 23.
66
BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social. 7. ed. 2. tiragem. São Paulo: Malheiros Editores,
2004, p.62.
67
SCANTIMBURGO, João de. História do Liberalismo. São Paulo: Editora LTr, 1996, p. 29.
64
38
liberalismo passou a ser criticado e combatido, sofrendo restrições, a partir de então o Estado
começou a intervir na atividade econômica, começando a assunção da responsabilidade
social pelo Estado, pois o Estado Liberal não mais estava conseguindo sobreviver e
proporcionar uma vida digna, os indivíduos mesmo com total liberdade não conseguiam sua
organização em sociedade e progresso na vida econômica de forma a contentar a sociedade,
seja de forma igualitária.
A atividade econômica deixou de ser mais um setor indiferenciado da atividade
privada em geral para passar a ser objeto específico da atividade conformadora dos Poderes
Públicos e do mesmo passo a ciência econômica deixa de ter por objeto o simples estudo do
comportamento econômico do indivíduo e passa a abranger também o Estado.
O Estado surge como um agente de realizações que se reportam principalmente ao
domínio da economia, na qualidade de responsável principal pela condução e operatividade
das forças econômicas, enquanto verdadeira alavanca da sociedade atual. 68
Com base nessas idéias começou a ser questionada a separação absoluta entre o
direito público e privado, o Estado passou a intervir no domínio da economia de forma a
atender finalidades de interesse geral e não somente a vontade privada.
O modelo liberal apesar de trazer os benefícios do progresso econômico acentuado,
não tardou em fracassar criando as condições para sua própria superação, já que foi a causa
de uma grande injustiça social, na medida em que apenas se assegurou uma situação de
privilégio para os que já eram economicamente fortes, sob o pretexto da proteção à liberdade.
69
A mão invisível de Adam Smith, que regularia o mercado sem a necessidade de
interferência estatal, foi substituída pela mão visível do Estado, mediante sua participação
direta sobre o domínio econômico. 70
O Direito intervém no sentido de conformar e condicionar o exercício da vontade
privada em ordem a interesse que assume em nome dos princípios da solidariedade social e
outros. Os limites ao relevo da autonomia da vontade privada como critério e fonte de direito
deixaram de ter caráter excepcional, passaram a constituir um verdadeiro sistema jurídico
alicerçado em regras próprias. 71
68
MONCADA, Luis S. Cabral. Direito Econômico. 2. ed. Coimbra, 1988, p.23.
DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos da Teoria Geral do Estado. 9. ed. São Paulo: Saraiva. 1982, p. 242-243.
70
GLÓRIA, Daniel Firmado de Almeida, A livre concorrência como garantia do consumidor. Belo Horizonte:
Del Rey; FUMEC, 2003, p.11.
71
MONCADA, Luis S. Cabral. Direito Econômico. 2. ed. Coimbra, 1988, p.25.
69
39
Até então o clássicos ingleses construíram uma ciência econômica sem levar em conta
o problema social e suas conseqüências, porém Stuart Mill deixa-se dominar por essa
preocupação e incorpora a econômica política clássica interesse pela “justiça social”. 72
Após a Segunda Guerra Mundial as Constituições marcam o advento do
constitucionalismo social, que não focaliza apenas o indivíduo em abstrato, mas, também,
como parte integrante da sociedade.
Os direitos sociais consagram-se, assim, mediante declarações expressas.
73
Surgindo
uma nova fase com alicerce na Constituição de Weimar, inaugurando o paradigma
constitucional do Estado Social de Direito.
Com a Constituição Mexicana de 1917 e a Constituição de Weimar de 1919, foi
abandonada a concepção da liberal democracia, para que se instituíssem a social democracia.
74
Essas tendências constitucionais se caracterizam pelo fato de não apenas se estruturar
a ordem política e civil, como fazia as Constituições anteriores, mas, também a ordem
econômico-social.
75
Nessa fase o ideal de igualdade era a material e não a formal como
sustentava o Liberalismo.
Com a Constituição Mexicana e a Constituição alemã de Weimar, as leis magnas
passaram a ter objetivos para a comunidade às quais se dirigem ou então preverem que tais
metas venham a ser periodicamente estabelecidas, através de planos tendentes a materializar
aspirações tais como o bem-estar, o desenvolvimento, a justiça social, a existência digna ,
atendimento às necessidades básicas.76
A Constituição Mexicana foi elaborada depois de uma grande guerra, a revolução
Mexicana, motivo que se pode afirmar que se tornou um grande fruto do movimento
revolucionário.
A Constituição Mexicana e de Weimar, foram pioneiras em estrutura da ordem
econômico-social, pode-se exemplificar os dizeres do artigo 151 da referida constituição: “a
vida econômica deve ser organizada em conformidade com os princípios da justiça e com
72
MILL, Stuart apud HUGON, Paul. História das doutrinas econômicas. 14. ed. São Paulo: Atlas, 1980, p. 139.
73
SILVA, Américo Luis Martins da. A Ordem Constitucional e Econômica. 2. ed. Rio de Janeiro: Ed. Forense,
2003. p. 6.
74
75
Op cit. p.9.
SOARES, Orlando. Comentários à Constituição da Republica Federativa do Brasil. 8. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1995, p. 26.
76
NUSDEO, Fábio. Curso de Economia. Introdução ao Direito Econômico. 3. ed. ver. e atual. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2001, p. 203.
40
vista a garantir a todos uma existência digna do homem”, ainda seu artigo 152 estabelecia
que: “as relações econômicas são regidas pelo princípio da liberdade dos contratos”.
No entanto ser uma boa constituição não foi o suficiente para o progresso econômico
na Alemanha, sendo que a Constituição de Weimar acabou por não conseguir atingir seus
objetivos:
A sociedade humana tem como natureza artificialidade e, por isso,
qualquer estabilidade conquistada é por demais frágil; qualquer mudança,
brusca ou sutil, pode derrubar os melhores sistemas econômicos e sociais.
Em tais circunstâncias não se pode dizer, com segurança, o que é, de
maneira geral, definitivamente bom ou ruim. Só podemos dizer que um
determinado sistema parece ter sido bom em determinado momento
histórico de uma determinada Nação, porém isto não é conveniência de um
sistema ou de outro. 77
A Constituição Mexicana e a de Weimar foram inspirações para a Constituição
brasileira, no aspecto do moderno constitucionalismo democrático, ocorrendo uma
materialização do direito.
O Brasil, desde 1934, conta em seus textos constitucionais com o título ‘da ordem
econômica e social’.
78
A Constituição de 1934 foi profundamente analisada as questões
econômicas, motivo que na promulgação desse texto constitucional se estabeleceu o
verdadeiro marco inicial da ordem econômica constitucional brasileira. 79
O legislador constituinte da Constituição de 1934 deu à liberdade econômica o status
de princípio constitucional, em seu artigo 115 dispunha que: “a ordem econômica deve ser
organizada conforme os princípios da justiça e as necessidades da vida nacional, de modo
que possibilite a existência digna”. 80
A Constituição de 1934 deu forma jurídica aos anseios sociais, colocando a nova
ideologia acatada pelo constitucionalismo social, inclusive no preâmbulo a Constituição fazia
77
SILVA, Américo Luis Martins da. A Ordem Constitucional e Econômica. 2. ed. Rio de Janeiro: Ed. Forense,
2003. p.21.
78
NUSDEO, Fábio. Curso de Economia. Introdução ao Direito Econômico. 3. ed. ver. e atual. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2001, p. 203.
79
SILVA, Américo Luis Martins da. A Ordem Constitucional e Econômica. 2. ed. Rio de Janeiro: Ed. Forense,
2003. p.13.
80
Op cit, p.25.
41
constar o sinal de mudança, declarando que tinha a intenção de organizar um regime
democrático, que assegurasse à nação a unidade, a liberdade, a justiça e o bem-estar social
econômico, deixando clara a nova ideologia. 81
De maneira que a Constituição de 1934 assegurou os direitos sociais pela primeira
vez no Brasil, com o intuito de existência digna, ainda nos moldes das Constituição do
México e de Weimar.
Positivado como princípio e regra de um Estado de Direito reconstruído sobre os
valores da dignidade da pessoa humana, o Estado Social, despontou para conciliar de forma
duradoura e estável a Sociedade com o Estado.
A história do socialismo constitui um protesto, continuamente renovado, contra o
regime de propriedade privada e empresa privada, tendo como principal causa à má
produtividade e da injusta repartição das riquezas. Motivo que propõe a limitação e supressão
a propriedade privada. 82
O Estado passou a assumir responsabilidades sociais crescentes, como a previdência,
a habitação e a assistência social, incluindo saúde, saneamento e educação, ampliando seu
leque de atuação como prestador de serviços essências.
Aprimorou o papel do Estado como empreendedor substituto, o que ocorre nos
setores considerados estratégicos para o desenvolvimento, como no energético, minerário e
siderúrgico, ou mesmo, mais recentemente, em países desenvolvidos, nos setores de
informática e tecnológico. 83
O Estado socialista seria aquele preocupado basicamente com o bem comum, com a
coletividade, praticamente ignorando a individualidade impedindo o individualismo liberal.
As prestações sociais serviriam de justificação para essa modalidade extrema de intervenção.
A livre concorrência parecerá para a ideologia socialista viciosa, uma vez que não
estava em condições de assegurar a melhor produção dos bens nem a sua distribuição
eqüitativa em muito menos, a harmonia de interesses individual e geral.
Enquanto consideraram os liberais a liberdade como quadro indispensável ao
funcionamento do mecanismo da vida econômica, os socialistas entendem necessários
combatê-la, propondo substituí-la por uma organização racional dos elementos econômicos.
O socialismo mostrou-se em muitos aspectos incompatível como respeito às
instituições democráticas. No entanto a Constituição de 1988 buscou compatibilizar a
81
FONSECA, João Bosco Leopoldino da. Direito Econômico. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 70.
HUGON, Paul. História das doutrinas econômicas. 14. ed. São Paulo: Atlas, 1980, p. 160.
83
TAVARES, André Tavares. Direito Constitucional Econômico. 2. ed.rev. e atual, São Paulo: Editora Método,
2006, p.59.
82
42
coexistência entre a ideologia liberal com o principio da justiça social, em nítido acolhimento
de uma democracia social, explicitado pela ligação do valor social do trabalho à liberdade de
iniciativa econômica. 84
Com a proclamação da Constituição Federal de 1988 constituiu outro momento
crucial na história do país, pois procurou democratizar o liberalismo brasileiro através de
diversos dispositivos, amplia a representação política; restabelece a independência e
harmonia dos poderes; torna a liberdade de iniciativa e o trabalho, fundamentos da ordem
econômica nacional; estende e define os direitos sociais e assegura a descentralização e a
autonomia dos Estados e Municípios. A Constituinte de 1988 consagrou, teses políticas e
sociais que historicamente foram levantadas pelos liberais. 85
A Constituição liberal-democrática pressupõe a clara elaboração ideológica sobre o
trânsito do liberalismo clássico para a democracia liberal. O Estado Democrático de Direito
consagra na Lei Magna as conquistas do processo de democratização do Estado Liberal
clássico ocorrida durante o século XIX e as primeiras décadas do século XX. Incorporaramse, nesse período, aos direitos fundamentais do homem e do cidadão. Proclamados no século
XVIII, direitos sociais e econômicos, nascidos das novas relações entre pessoas e grupos
sociais, que ocorreram no seio da sociedade industrial. . 86
As liberdades formais do Estado Liberal clássico – liberdade, segurança, propriedade,
igualdade, foram acrescentadas as liberdades reais do Estado Democrático de Direito
contemporâneo, entre outras, o direito a educação, saúde, habitação, transporte, previdência,
consideradas como responsabilidade primordial do poder público.
Tanto o Estado Liberal quanto o Estado Social deixaram a desejar, pois em ambos
houve a predominância de injustiças, o que levou ao Estado Democrático de Direito que tem
caráter misto, defender idéias do liberalismo como do socialismo. No entanto através da
Constituição Federal que declara as liberdades e os direitos e fixa os limites do poder do
Estado.
84
NETO, Manoel Jorge e Silva. Direito ConstitucionalEconômico. São Paulo: LTr, 2001, p. 96.
GUIMARÃES, Ulysses. O Liberalismo e a Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira,
1991, p. 21.
86
Op cit, p. 31.
85
43
1.2
A FORMAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO ECONÔMICA
O conjunto das instituições e das normas destinadas a reger a atividade econômica se
solidifica num contexto significante caracterizando-se a Constituição Econômica, sendo as
normas de conteúdo econômico os pressupostos de solidez da constituição política.
Os fundadores da democracia norte-americana repetiam sempre que a liberdade
econômica era a condição da liberdade dos cidadãos, que não haveria democracia plena se
não garantisse a liberdade econômica. 87
Luiz Regis Prado, afirma que:
O conceito de ordem econômica, de natureza ambígua, como objeto de
tutela jurídica, costuma ser expresso de forma estrita e ampla. Na primeira,
entende-se por ordem econômica a regulação jurídica da intervenção o
Estado na economia; na segunda, mais abarcante, a ordem econômica é
conceituada como a “regulação jurídica da produção, distribuição e
consumo de bens e serviços”. 88
A constituição econômica é o conjunto dos princípios fundamentais informadores da
atividade e da organização econômica, constituída simultaneamente por normas formalmente
constitucionais, isto é, normas inscritas no texto constitucional, são pilares da organização
básica da ordem econômica, sem assento no texto constitucional. 89
Conceitua Vital Moreira a Constituição econômica como:
Conjunto de preceitos e instituições jurídicas que, garantindo os elementos
definidores de um determinado sistema econômico, instituem uma
determinada forma de organização e funcionamento da economia e
constitui, por isso mesmo, uma determinada ordem econômica; ou, de
outro modo, aquelas normas ou instituições jurídicas que, dentro de um
87
LEOPOLDINO DA FONSECA, João Bosco. Direito Econômico. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense. 2005, p.51.
PRADO, Luiz Regis, Direito Penal Econômico. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004, p 27.
89
MONCADA, Luis S. Cabral de. Direito Econômico. 2. ed. Coimbra.: Editora Coimbra, 1988, p.79/80.
88
44
determinado sistema e forma econômicos, que garantem e (ou) instauram,
realizam uma determinada ordem econômica concreta. 90
A constituição econômica deve ser compreendida como a parte da Constituição que
interpreta o sistema econômico, que define como deverá ser a ordem econômica brasileira.
Para Orlando Soares:
O conceito de ordem econômica está entrelaçado ao de ordem social, dai a
dificuldade em abordar um deles, sem focalizar o outro, até porque as
instituições de ambas as ordens, abrangem sempre aspectos econômicos e
sociais. Por isso esclarece ele que a noção de ordem econômica e social
corresponde a um conjunto de princípios teóricos e normas jurídicoadministrativas, de natureza complexa, que abrangem aspectos diversos e
disciplinam e sistematiza as instituições, no campo da produção industrial,
circulação de riqueza, comercialização. Transporte uso de propriedade,
higiene e profissões, assim como costumes que regulam a vida dos
indivíduos em suas relações com particulares e com os órgãos
governamentais. Igualmente, a noção de ordem econômica e social está
intimamente ligada à evolução histórica dos diversos sistemas econômicos,
sobretudo após o advento da propriedade privada e da escravidão, até a
fase atual. 91
Nos dias atuais a ordem econômica encontra-se entrelaçada com a ordem social, até
mesmo porque a própria Constituição Federal de 1988, aglutinou no mesmo capítulo a ordem
econômica e a social, através de seus princípios fundamentais da organização econômica
previstos nos artigos 170 e seguintes.
A Ordem Econômica e Financeira é indissociável dos princípios fundamentais da
República Federativa e do Estado Democrático de Direito, como anteriormente comentado.
A propriedade e atividade econômica são reservadas à iniciativa privada como meios de
assegurar o bem-estar social cabendo ao Estado um papel incentivador e regulador, com
vistas ao perfeito funcionamento do mercado e dos mecanismos de concorrência. 92
90
LEOPOLDINO DA FONSECA, João Bosco. Direito Econômico. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense. 2005, p.93.
SOARES, Orlando, Comentários à Constituição da Republica Federativa do Brasil, 8 ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1995, p. 587.
92
SOUTO, Marcos Juruema Villela. Desestatização: Privatização, Concessões e Terceirizações. Rio de Janeiro:
Editora Lúmen Júris, 1997, p. 587.
91
45
A ordem jurídica transformadora da vida social passou a substituir o direito privado
pelo direito público de intervenção privilegiada, de mediação nos conflitos sociais e de
conformação da vida econômica e social. 93
Motivo em que o Estado encontra limites em sua intervenção na atividade econômica,
e na prática existe a necessidade de harmonização entre os conflitos sociais e econômicos,
necessitando existir uma interpretação sistêmica das normas legais, para uma correta
aplicação do Direito.
O Estado brasileiro conquanto reconheça e assegure a propriedade privada e a livre
empresa, condiciona o uso dessa propriedade e o exercício das atividades econômicas
voltadas ao bem-estar social, porém existem limites para o uso e gozo dos bens e riquezas
particulares e, quando o interesse público exige, intervém na propriedade privada e na ordem
econômica através de império tendentes a satisfazer as exigências coletivas e a reprimir a
conduta anti-social da iniciativa particular. 94
A idéia de regulamentação do poder econômico no mercado tem origem em uma
premissa socioeconômica fundamental, de maneira que todo o agrupamento social, quer seja
organizado ou não como forma de Estado, que deseje ter como fundamento básico da
organização econômica a economia de mercado deve contar com a constituição econômica,
que é um conjunto de regras mínimas que garantam ao menos o funcionamento desse
mercado, que garantam um nível mínimo de controle das relações econômicas. 95
A doutrina distingue entre a constituição econômica programática ou diretiva e a
estatutária. Luis S. Cabral de Moncada aduz que a constituição econômica programática ou
diretiva encerra o conjunto das normas que visam reagir sobre a ordem econômica de modo a
provocar aí certos efeitos, modificando-a e alternando-a em certo sentido preestabelecido,
visando estabelecer uma determinada ordem econômica alterando do mesmo passo a
estrutura econômica existente, através da ação política dos órgãos do Estado.
96
José Afonso da Silva define as normas programáticas como:
93
MONCADA, Luis S. Cabral de. Direito Econômico. 2. ed. Coimbra. 1988, p.80.
SILVA, Américo Luis Martins da. A ordem constitucional econômica. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p.
585.
95
FILHO, Calixto Salomão. Direito Concorrencial – As estruturas. 2. ed. Malheiros Editores. São Paulo: 2002,
p. 19.
96
MONCADA, Luis S. Cabral de. Direito Econômico. 2. ed. Coimbra. 1988, p.82.
94
46
Aquelas normas constitucionais, através das quais o constituinte, em vez de
regular, direta e imediatamente, determinados interesses, limitaram-se a
traçar-lhes os princípios para serem cumpridos pelos órgãos (legislativos,
executivos, jurisdicionais e administrativos), como programas das
respectivas atividades, visando à realização dos fins sociais do Estado. 97
No entendimento de Eros Roberto Grau, constituições programáticas são concebidas
as que não se bastam em conceber-se como mero “instrumento do governo”, mas, além disso,
enunciam diretrizes, programas e fins a serem pelo Estado e pela sociedade realizados. 98
A constituição estatutária é composta pelo conjunto de normas que caracteriza certa e
determinada forma econômica, que justamente a identifiquem enquanto tal, Luis S. Cabral de
Moncada exemplifica o caso das normas que definem o conteúdo e limites dos direitos de
propriedade e de livre iniciativa privada, absolutamente imprescindíveis para a caracterização
da ordem jurídica da economia dos países ocidentais. Sem as normas da constituição
econômica estatutária, a qual mostra o estatuto, a matriz das relações de produção dominante,
nunca a caracterização de uma dada ordem jurídica da economia seria possível, lançando
mão dos elementos para tanto decisivos. 99
A constituição estatutária é a que basta em definir um estatuto do poder, concebendose como mero “instrumento de governo”, enunciadoras de competências e reguladoras de
processos.
100
A constituição programática define o quadro das diretrizes das políticas
públicas, coerentes com determinados objetivos também por ela enunciados. 101
A constituição econômica é fundamentada na idéia de justiça, que normatiza a vida
econômica e confere forma ao sistema econômico, há de se entender o conjunto de normas
constitucionais que, exclusivamente ou não, regulam fatos que repercutem no modo de ser
econômico da sociedade.
Os artigos 1º e 3 º da
Constituição Federal de 1988, estão relacionado com a
constituição econômica, no entanto estão umbilicalmente relacionado com os preceitos do
97
SILVA, José Afonso. Aplicabilidade das normas constitucionais. Ed. Revista dos Tribunais. São Paulo: 1968,
p. 132.
98
EROS, Roberto Grau. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 11 ed.rev. atual. Malheiros Editores.
2006, p. 78.
99
MONCADA, Luis S. Cabral de. Direito Econômico. 2. ed. Coimbra. 1988, p.82.
100
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador. Coimbra Editora,
1987, p. 22.
101
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. 2. ed. Almeidina. Coimbra, 1980, p. 117.
47
artigo 170 e seguintes da referida constituição, o qual declara que a ordem econômica tem
por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social. Sendo que
referido artigo será objeto em outro tópico do trabalho.
1.3
CONSIDERAÇÕES SOBRE O PRINCÍPIO DA LIVRE INICIATIVA
A livre iniciativa é tratada como fundamento da República Federativa do Brasil, pois
a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 1º, inciso IV, dispõe que: “A República
Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito
Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamento: IV – os
valores sociais do trabalho e da livre-iniciativa”.
O tratamento privilegiado aponta para a posição de destaque que deve ocupar a livre
iniciativa, um dos fins de nossa estrutura política, é dizer, um dos fundamentos do próprio
Estado Democrático de Direito, de maneira que com a livre iniciativa assegurou-se a
liberdade da escolha da profissão e das condições de trabalho.
O artigo 170 ‘caput’ da Constituição Federal de 1988 dispõe que: “A ordem
econômica, fundada na valorização do trabalho e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a
todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes
princípios:” Em seu parágrafo único dispõe que: “é assegurado a todos o livre exercício de
qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo
nos casos previstos em lei”.
A livre iniciativa não só consubstancia alicerce e fundamento da ordem econômica,
como também deita raízes nos direitos fundamentais, aos quais se faz ínsita uma especial
proteção, se no caput do artigo 5º se encarregou de garantir o direito a liberdade, no viés
econômico ela ganha contornos mais preciso justamente na livre iniciativa.
48
Sendo livre o exercício de qualquer trabalho, oficio ou profissão (art. 5º, inciso XIII),
esta liberdade compreende também a liberdade de se lançar na atividade econômica de
acordo com o artigo 170, parágrafo único da Constituição Federal de 1988. 102
O princípio da livre iniciativa é considerado como fundamento da ordem econômica e
atribui à iniciativa privada o papel primordial na produção ou circulação de bens ou serviços,
constituindo a base sobre a qual se constrói a ordem econômica, cabendo ao Estado apenas
uma função supletiva, pois a Constituição Federal de 1988 determina que a ele caiba apenas a
exploração direta da atividade econômica quando necessária à segurança nacional ou
relevante interesse econômico.
A livre iniciativa erigida à condição de fundamento da ordem econômica e
simultaneamente constitucional fundamental a livre iniciativa talvez constitua uma das mais
importantes normas de nosso ordenamento constitucional. 103
Livre iniciativa nas palavras de Miguel Reale:
[...] não é senão a projeção da liberdade individual no pleno da produção,
circulação e distribuição de riquezas, assegurando não apenas a livre
escolha das profissões e das atividades econômicas, mas também a
autônoma eleição dos processos ou meios julgados mais adequados à
consecução dos fins visados. Liberdade de fins e de meios informa o
princípio da livre iniciativa, conferindo-lhe um valor primordial, como
resulta da interpretação conjugada dos citados arts. 1º e 170. 104
A livre iniciativa pode ser entendida como a projeção da liberdade individual no
plano da produção, circulação e distribuição de riquezas significando a livre escolha e o livre
acesso às atividades econômicas, de maneira livre e sem intervenção direta do Estado.
Tércio Sampaio Ferraz Junior, aduz:
102
PETTER, Lafayete Josué. Princípios constitucionais da ordem econômica: o significado do art. 170 da
Constituição Federal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 163.
103
ARAÚJO, Luiz Alberto David e NUNES JUNIOR, Vidal Serrano. Curso de direito constitucional. 4. ed. rev.
e atual. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 374.
104
REALE, Miguel apud PETTER, Lafayete Josué. Princípios constitucionais da ordem econômica: o
significado do art. 170 da Constituição Federal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 161.
49
Afirmar a livre iniciativa como base é reconhecer na liberdade um dos
fatores estruturais da ordem, é afirmar a autonomia empreendedora do
homem na conformação da atividade econômica, aceitando sua intrínseca
contingência e fragilidade; é preferir, assim, uma ordem aberta ao fracasso
a uma ‘estabilidade’ supostamente certa e eficiente. Afirma-se, pois, que a
estrutura da ordem está centrada na atividade das pessoas e dos grupos e
não na atividade do Estado. Isto não significa, porém, uma ordem do
‘laissez faire’, posto que a livre iniciativa se conjuga com a valorização do
trabalho humano. 105
A liberdade de iniciativa, entendida como liberdade de criação empresarial ou de livre
acesso ao mercado, somente é protegida enquanto favorece o desenvolvimento nacional e a
justiça social, tratando-se, portanto, de uma “liberdade maior ou liberdade condicional”. 106
A consagração da livre iniciativa significa que é através da atividade socialmente útil
a que se dedicam livremente os indivíduos, segundo suas inclinações, que se procurará a
realização da justiça social e, portanto, do bem-estar social.
107
A garantia da liberdade de
iniciativa é a melhor forma de organização do mercado, porém precisa ser desenvolvida de
acordo com os interesses da coletividade.
A livre iniciativa deve ser exercida sob determinados princípios inerentes à
exploração economica, sempre no intuito de atender aos interesses de sua clientela, deve-se o
empresário pautar-se pela honestidade e lealdade para o desenvolvimento de sua atividade
econômica.
Eros Roberto Grau considera a livre iniciativa como resistência ao poder e como
reivindicação por melhores condições de vida, descrevendo a liberdade como sensibilidade e
acessibilidade a alternativas de conduta e de resultado. 108
A concretização do direito de livre iniciativa econômica ou livre empresa compreende
a preservação do seu conteúdo múltiplo enquanto liberdade de acesso ao mercado e de
105
FERRAZ JR, Tércio Sampaio. Congelamento de preços – tabelamentos oficiais (parecer), in Revista de
Direito Público, n 91, 1989, p. 77.
106
COMPARATO, Fábio Konder. Direito Empresarial: estudos e pareceres. São Paulo: Ed. Saraiva. 1990, p.
6/7.
107
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição Brasileira. 2. ed. São Paulo: Saraiva.
1977, p.3.
108
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988: Interpretação e crítica, 2 ed. São
Paulo: Editora Revistas do Tribunal, 1991, p. 222.
50
exercício ou cessação da atividade empresarial, nenhum destes aspectos poderá ser eliminado
em favor do outro, a manutenção deles é condição necessária de afirmação do direito da livre
empresa. 109
A liberdade para criar e explorar uma atividade econômica, seja, como qualquer
princípio, a livre iniciativa não pode ser considerada absoluta, mas relativizada em função de
seu valor social, uma vez que há restrições que a própria ordem econômica, refletida em lei,
impõe sobre ela. Evidentemente tal relativização não pode ser desproporcional, de forma a
frustrar o conteúdo essencial do direito à livre iniciativa:
A exigência final consiste na necessidade de as leis restritivas respeitarem
o “conteúdo essencial” dos direitos fundamentais. Trata-se de um puro
conceito de valor que visa impor um limite negativo à actuação do
legislador, e a que certa doutrina tem ligado à noção de dignidade da
pessoa humana. 110
A livre iniciativa não deve ser tida como uma liberdade anárquica, porém social e
passível de ser limitada, o que é justamente feito pelo Estado quando a Constituição Federal
de 1988 determina que o Estado deva intervir para assegurar a existência digna, conforme os
ditames da justiça social seja através da aplicação de legislação constitucional ou
infraconstitucional.
A permanência do agente econômico no mercado demandará o cumprimento de
regras de controle de mercado, o que induz a uma necessária contraposição de valores
expressos individualmente em cada um dos princípios constitucionais.
O Estado pode
exercer sua função reguladora e controladora da atividade econômica, porém não pode
interferir na livre iniciativa:
Assim, o Estado, seja quando intervém operacionalmente, seja quando, por
força de sua programação econômica, exerce o controle legislativo e
administrativo sobre o processo produtivo, deve sempre respeitar o direito
à livre iniciativa como fonte fundamental da atividade econômica, em
109
110
MONCADA, Luis S. Cabral de. Direito Econômico. 2. ed. Coimbra: Editora Coimbra, 1988, p.142/143.
Op cit.
51
conseqüência, não pode eliminá-la, substituí-la, fora das estritas e
inquestionadas hipóteses previstas em lei. 111
A densidade normativa que lhe é característica, afirmando ser possível inferir dois
direitos básicos de seu enunciado “[...] a faculdade de criar e explorar uma atividade
econômica a título privado e a não sujeição a qualquer restrição estatal senão em virtude de
lei” 112
O postulado da livre iniciativa tem uma conotação normativa, significando a liberdade
garantida a qualquer pessoa, e uma outra que assume o viés negativo, impondo a não
intervenção do Estado, que só pode se configurar mediante a atividade legislativa que,
acrescente-se, há de respeitar os demais postulados constitucionais e não poderá anular ou
inutilizar o conteúdo mínimo da livre-iniciativa. 113
O artigo 170 da Constituição Federal de 1988 em seu parágrafo único dispõe que: “é
assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independente de
autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei”.
A liberdade privada dedica-se a uma determinada atividade econômica, o que
significa tão somente liberdade de desenvolvimento dessa atividade no quadro estabelecido
pelo Poder Público, dentro dos limites normativamente impostos a essa liberdade, necessário
que seja reconhecida às restrições impostas pelas leis, no entanto as mesmas terão que serem
plausíveis e compatíveis com o interesse público e da coletividade.
O importante é notar que a regra é a liberdade, que qualquer restrição terá que
decorrer da própria Constituição ou de leis editadas com fundamento nela. Assim a liberdade
de iniciativa preocupada com a realização da justiça social, não pode significar mais do que
“[...] liberdade de desenvolvimento da empresa no quadro estabelecido pelo poder público e,
111
CARVALHOSA, Modesto. A Ordem Econômica na Constituição de 1969. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1972, p. 120.
112
ARAÚJO, Luiz Alberto David e NUNES JUNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucional. 4. ed.rev.
e atual. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 375.
113
TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. 2. ed. São Paulo: Editora Método, 2006. p
240.
52
portanto, possibilidade de gozar das facilidades e necessidades de submeter-se às limitações
postas pelo mesmo” 114.
A livre iniciativa é um substrato da realidade econômica da empresa, a qual se
projetado em diversos ângulos da normatividade jurídica e constitui um dos suportes
fundamentais do processo de desenvolvimento:
[...] liberdade de desenvolvimento da empresa no quadro estabelecido pelo
poder público, e, portanto, possibilidade de gozar das facilidades e
necessidade de submeter-se às limitações postas pelo mesmo. “É legítima
enquanto exercida no interesse da justiça social. Será ilegítima, quando
exercida com o objetivo de puro lucro e realização pessoal do empresário”.
115
Fabio Ulhoa Coelho defende que a atitude do empresário em buscar lucros, esses que
serão gerados por sua empresa, no intuito de atender as necessidades suas e de sua família,
bem como buscar sua satisfação pessoal, não seria caso de livre iniciativa ilegítima, “[...] pois
costuma ser extremamente gratificante ao empresário admirar a evolução do empreendimento
que esboçou, organizou e dirigiu, bem como ver nos resultados a realização de seu projeto”.
Somente pode-se considerar ilegítima ou inconstitucional se não refletir a mesma igualação
valorativa dos demais princípios constitucionais.
116
Pode ocorrer à concentração do poder econômico como ofensa a livre iniciativa,
necessitando também da intervenção do Estado, para que a livre iniciativa não possa
sucumbir. Ao contrário do que se poderia imaginar, a intervenção do Estado no domínio
econômico, muito antes de limitar a iniciativa e a liberdade do particular, tem por fim,
mesmo preservá-la.
114
117
OTTAVIANO, Vittorio. La Costituzione Econômica. Pádua: Cedam, 1967, p. 202.
SILVA, José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição. São Paulo: Ed. Malheiros, 2005, p. 711.
116
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. vol. 1. 11. ed.rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p.
188.
117
PETTER, Lafayete Josué. Princípios Constitucionais da Ordem Econômica: o significado do art. 170 da
Constituição Federal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 162.
115
53
O desenvolvimento do poder econômico, fundado na concentração de empresas, é
também fator de limitação à própria iniciativa privada, na medida em que a concentração
capitalista impede ou estorva a expansão das pequenas iniciativas econômicas. 118
A livre iniciativa como direito à livre criação de empresa. Deve ser contextualizada
em sua função social e poderá, conforme a hipótese, ser tutelada pelas normas antitruste, por
meio do controle de exercício abusivo da livre iniciativa alheia, isto é, do detentor de poder
econômico que, por meio de prática abusiva, busca impedir o livre exercício da iniciativa
econômica por terceiro. 119
Pode-se afirmar que o legislador constituinte procura assegurar a liberdade de acesso
do mercado e a permanência no mesmo, a livre iniciativa será regulada e controlada pelo
Estado, dentro é claro dos limites já estabelecido pela legislação, o Estado irá também
proteger a livre iniciativa através de sua intervenção mínima quando necessário.
1.3.1 A Defesa do Consumidor na Ordem Econômica
A partir da Segunda Guerra Mundial, o projeto de produção capitalista passou a
crescer numa enorme velocidade, e, com o advento da tecnologia de ponta, dos sistemas de
automação, da robótica, da telefonia por satélite, das transações telefônicas, da computação,
da microcomputação, etc., a velocidade tomou um grau jamais imaginado até meados do
século XX. 120
A repercussão do capitalismo sem barreiras gerou problemas extremamente sérios,
mercê dos grandes segmentos da sociedade que foram injustiçados. No Brasil, a situação
também se mostrava preocupante, ao lado do fenômeno da ascensão das massas, verificou-se
118
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 5. ed. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 1989, p.664.
119
GOMES, Carlos Jacques Vieira Gomes. Ordem Econômica Constitucional e Direito Antitruste. Porto Alegre:
S. A. Fabris, 2004, p. 110.
120
NUNES, Luiz Antonio Rizzatto apud LUNARDI, Soraya Regina Gasparetto. A tutela no Código de Defesa
do Consumidor diante das garantias do devido processo legal. 1. ed. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira,
2002, p. 145/146.
54
com grande intensidade o êxodo rural. É um fenômeno que subsiste. Criaram-se assim
megalópoles com baixa qualidade de vida. 121
Estaria assim em um momento histórico onde se apresentava de um lado um
consumidor frágil, desprotegido, em face de todas as conseqüências da revolução industrial.
Por outro lado, existia a posição do Estado que precisava tutelar de forma satisfatória a
situação de desigualdade que se punha, uma vez que o tratamento individual existente até
então se mostrava inadequado. 122
Diante desta nova realidade, surge a necessidade de proteção ao consumidor: “O
direito do consumidor tem origem nas sociedades capitalistas centrais (EUA, Inglaterra,
Alemanha e França), sendo que as primeiras legislações protetivas dos direitos dos
consumidores surgiram nos EUA, o Federal Trade Commission Act (1914) e o Consumer
Product Safety Act, e se consolidaram após o pronunciamento de John Kennedy no Congresso
norte-americano, em 1962123. Já na Europa, a Loi Royer (França, 1973), a AGB Gesetz
(dispositivo legal de 1976 protegendo os consumidores alemães das cláusulas abusivas), a Lei
portuguesa n. 29, de 1981, e a Ley General para la Defensa de los Consumidores y Usuarios
(Espanha, 1984) foram pioneiras.” 124
No Brasil, da mesma forma foi percebida a necessidade de proteção à figura do
consumidor. A questão tomou proporções ainda maiores quando se tornou notória a
fragilidade dos consumidores, que era hipossuficiente economicamente frente ao poderio
econômico empresarial e em razão do crescimento da produção em massa e da padronização
dos contratos.
A defesa do consumidor está prevista no artigo 170 da Constituição Federal de 1988,
como princípio da ordem econômica, ainda trata-se da realização de um direito fundamental
121
Conforme dados do IBGE em 1980, 67,5% de nossa população viviam nas cidades e 32,5% nos campos (em
1940, 70% viviam no campo). A projeção do mesmo IBGE, para o fim desta década, é a de que 80% estarão a
viver nas cidades. No Estado de São Paulo, já em 1980, 80% da população habitava as cidades. (Folha de S.
Paulo, de 30 de novembro de 1991, p. 2).
122
MORAES, Voltaire de Lima apud LUNARDI, Soraya Regina Gasparetto. A tutela no Código de Defesa do
Consumidor diante das garantias do devido processo legal. 1. ed. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2002,
p. 145/146.
123
Em 15 de março de 1962, em mensagem especial ao Congresso sobre a problemática do consumidor, o
presidente dos EUA identificou os pontos mais importantes em torno da questão: 1) os bens e serviços colocados
no mercado devem ser sadios e seguros para o uso, promovidos e apresentados de uma maneira que permita ao
consumidor fazer a escolha satisfatória; 2) que a voz do consumidor seja ouvida no processo de tomada de
decisão governamental que determina o tipo, a qualidade e o preço de bens e serviços colocados no mercado; 3)
tenha o consumidor o direito de ser informado sobre as condições e serviços; 4) e ainda o direito a preços justos.
Seguindo o exemplo do presidente norte-americano, a Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas, em
sua 29ª Sessão, em 1973, em Genebra, reconheceu basicamente aqueles princípios como direitos fundamentais
do consumidor. (Cf. Miriam de Almeida Souza, A política legislativa do consumidor no direito comparado, p.
59-60).
124
BOLSON, Simone Hegele. O direito do consumidor à luz da globalização e do mercosul. p. 3.
55
positivo de proteção do Estado para o consumidor de acordo com o artigo 5º, inciso XXXII da
Constituição Federal de 1988.
O consumidor era identificado constitucionalmente como agente a ser necessariamente
protegido de forma especial, pois a Constituição Federal de 1988 definia apenas a proteção do
consumidor, não definia quais eram esses direitos e deveres.
Diante da inexistência de instrumentos normativos eficazes de proteção de consumidor
para fazer valer seus direitos mais básicos, determinou-se a edição de norma ordinária
regulamentado não só a relação de consumo, mas os mecanismos de proteção e efetividade
dos direitos do consumidor.
Momento em que foi elaborado o Código de Defesa do Consumidor, o qual entrou em
vigor em 11/09/90, estabelecendo normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem
pública e interesse social.
O direito do consumidor não é apenas um princípio da ordem econômica e sim um
direito fundamental. José Joaquim Canotilho e Vital Moreira ressaltam que: “Tudo somado
tem-se o relevante efeito de legitimar todas as medidas de intervenção estatal necessárias a
segurar a proteção prevista”. 125
Para João Batista de Almeida:
[...] a vulnerabilidade do consumidor é a espinha dorsal da proteção do
consumidor, sobre que se assenta toda a linha filosófica do movimento. È
induvidoso que o consumidor é a parte mais fraca das relações de
consumo; apresentam ele sinais de fragilidade e impotência diante do poder
econômico. 126
A tutela jurídica dos consumidores, motivada pelo princípio maior da vulnerabilidade,
constitui-se em conjunto de normas de ordem pública. É de normas jurídicas que consagram
direitos, cujo conteúdo é irrenunciável, tanto pelos consumidores, quanto pelo Estado, o qual
tem o dever constitucional de garantir a efetivação desses direitos. 127
Essa situação de vulnerabilidade se agrava ainda mais diante de um fornecedor que se
encontra em posição dominante no setor econômico que explora. A liberdade do consumidor
fica comprometida, ela às vezes não tem outra escolha senão contratar com aquele
fornecedor, em razão de sua fragilidade e impotência.
125
CANOTILHO, José Joaquim Gomes e MOREIRA, Vital. Constituição da Republica Portuguesa anotada, 2.
ed. Coimbra: Coimbra ed. 1984, p. 475.
126
ALMEIDA, João Batista de. A proteção jurídica do consumidor. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 200, p. 23.
127
AZEVEDO, Fernando Costa. Defesa do Consumidor e Regulação. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002.
56
O consumidor tem sua vulnerabilidade econômica ressaltada quando há a eliminação
da concorrência, o abuso da posição dominante, a formação de cartel.
128
A lei de defesa do
consumidor tem ao lado da vulnerabilidade mais quatro princípios. O princípio da
transparência, no qual o consumidor tem o direito de ser informado sobre bens e serviços,
condições, e essa informação deve ser clara e precisa.
O princípio da confiança que significa que o consumidor deve estar garantido a
respeito da adequação de produtos e serviços.
O princípio da boa-fé que é entendida como imperativo objetivo da conduta,
exigência de respeito, lealdade.
E finalmente o princípio da isonomia, tendo o direito entendido que por ser o
consumidor mais vulnerável poderá ser mais protegido que o fornecedor, sendo tratado de
forma desigual em razão do fornecedor. 129
O legislador procura proteger os mais fracos contra os mais poderosos, o leigo contra
o melhor formado; os contratantes devem sempre curvar-se diante do que os juristas
modernos chamam de ordem pública econômica. 130
Miguel Reale aduz que:
[...] se considerarmos, por exemplo, os vários grupos organizados para a
produção e circulação das riquezas, necessário é reconhecer que o Estado
não se confunde, nem pode se confundir, com nenhum deles, em particular,
porquanto cabe ao governo decidir segundo o bem comum o qual, nessa
hipótese, se identifica com o interesse geral dos consumidores”. E conclui
o referido pensamento, enfatizando que “autoridade do Estado deve
manifestar-se no sentido da generalidade daqueles interesses,
representando a totalidade do povo”. 131
128
GLÓRIA, Daniel Firmado de Almeida, A livre concorrência como garantia do consumidor. Belo Horizonte:
Del Rey; FUMEC, 2003, p. 106.
129
Op cit. p.. 42/43.
130
CAS, GERARD apud FILOMENO, José Geraldo Brito, Manual de direitos do consumidor. 5 ed. São Paulo:
Atlas, 2001. p 59.
131
Op cit. p 22.
57
João Bosco Leopoldino da Fonseca afirma que um dos elos da economia de mercado
é o consumidor e por isso impõe ao Estado sua proteção. A proteção do consumidor segundo
o autor tem duas facetas, a primeira é proteger o consumidor dentro de uma perspectiva
microeconômica e microjurídica, sendo que ao Estado interessa como uma das formas de
preservar e garantir a livre concorrência, proteger o consumidor através da adoção de
políticas econômicas adequadas. 132
Thierry Bourgoignie, afirma que:
[...] a proteção do consumidor pode ser examinada sob dois prismas. Sob
um ângulo mais próximo do econômico, a ênfase é dada ao papel que os
consumidores devem exercer para fazer o mercado funcionar. Há de se dar
à devida atenção aos consumidores, assim como é feito em relação aos
produtores, distribuidores e fornecedores, de modo que aqueles possam
“confiar mais” no mercado. Esta faceta do problema pressupõe a existência
de reais opções ofertadas aos consumidores e também a desistência de
informações claras quanto a elas. Medidas eficazes no regramento da
concorrência e sua instrumentalização para o fim de serem criadas e
aprimoradas reais opções de consumo, aliadas ao aperfeiçoamento de
mecanismos de real informação, tem efeito beneficio para a efetivação do
principio constitucional econômico da defesa do consumidor. 133
A defesa do consumidor como princípio da ordem econômica impõe o
desenvolvimento de uma política nacional de relações de consumo, cujo objetivo é o
atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à dignidade, da saúde e
segurança, proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem
como a transferência e harmonia das relações de consumo.
Hodiernamente se faz exigências de fortalecimento do indivíduo consumidor frente às
realidades e vicissitudes do mercado e da vida, dando maior concreção ao princípio da
dignidade da pessoa humana e a solidariedade que lhe é devida também na esfera econômica.
134
132
LEOPOLDINO DA FONSECA, João Bosco. Direito Econômico. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p,
129.
133
BOURGOIGNIE, Thierry. A política de proteção do consumidor: desafios à frente. Revista de Direito do
Consumidor, n. 41, p. 31.
134
PETTER, Lafayete Josué. Princípios constitucionais da ordem econômica: o significado do art. 170 da
Constituição Federal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 232.
58
Para se efetivar a proteção do consumidor há que se ter em mente seis classes de
interesses:
a) a saúde do consumidor, em face de produtos e serviços que possam causar-lhe
males de qualquer natureza;
b) segurança do consumidor, também em face de produtos e serviços que possam
oferecer riscos à incolumidade pessoal, como defeitos em máquinas, veículos etc...;
c) qualidade de produtos e serviços;
d) a quantidade de produtos no que diz respeito a volume e peso;
d) a publicidade enganosa ou abusiva;
e) as práticas comerciais, consideradas quaisquer manobras, principalmente por via
contratual ou então de mercado, que lesam o consumidor, potencialmente presente riscos a
seu patrimônio. 135
Na relação de consumo as condições desiguais de poder entre o fornecedor e o
destinatário final podem ser desequilibradas, o que demanda a criação no interior do Direito
do Consumidor de uma série de regras que regulam as condições obrigacionais desta relação,
por exemplo, a regulação dos anúncios publicitários que devem refletir as reais utilidades do
produto entre outros.
Apenas com a organização dos direitos do consumidor é que se pode equilibrar o
poder nas relações de consumo, pois na relação direta entre fornecedor e o consumidor quase
sempre aquele tem maiores condições de realizá-la considerando somente as suas
necessidades, o direito do consumidor ao reconhecer a hipossuficiência do destinatário final
visa a equilibrar a relação jurídica. 136
O consumidor é dirigido, manipulado e controlado pelas empresas e por uma
sociedade cada vez mais consumista e presa aos valores materiais. O que é facialmente feito
com propriedade através da publicidade, a qual transforma o supérfluo em necessidade.
135
FILOMENO, José Geraldo Brito, Manual de Direitos do Consumidor. 5 ed. São Paulo: Atlas, 2001, p.
114/115.
136
DEL MASSO, Fabiano. Direito Econômico. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 52.
59
Hoje o consumo passa a ser visto como objetivo maior dos indivíduos,
paradoxalmente a toda a idéia de proteção o consumidor é vitima de sua própria incapacidade
critica ou suscetibilidade emocional, sendo dócil objeto de exploração de uma publicidade
obsessora e obsidional, pois compra um objeto ou paga por um serviço. Não porque a sua
marca ateste qualidade, mas simplesmente porque ela evoca todo um reino de fantasias ou
devaneio de atração irresistível. 137
A política de proteção do consumidor há de levar em conta a harmonização dos
interesses dos participantes e a compatibilização da proteção do consumidor com a
necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios
nos quais se funda a ordem econômica.
1.3.2. O Princípio Constitucional da Livre Concorrência
Contempla o texto constitucional em seu no artigo 170, inciso IV, a livre
concorrência, como princípio da ordem econômica. A livre concorrência é como à abertura
jurídica concedida aos particulares competirem entre si, em segmento licito, objetivando o
êxito econômico pelas leis de mercado e a contribuição para o desenvolvimento nacional e a
justiça social. 138
A livre concorrência visa buscar chances iguais para a disputa do mercado entre os
particulares que desejarem exercer e permanecer numa atividade econômica, inclusive no
direito de entrar na atividade econômica pode ser vista como livre iniciativa e o direito de
permanecer no mercado seria a livre concorrência.
No dizer de Calixto Salomão Filho o termo ‘livre concorrência’ invoca a idéia
ortoliberal do sistema concorrencial, preocupada, como visto, com a igualdade de condições
137
COMPARATO, Fábio Konder. A proteção do consumidor: importante capítulo de Direito Econômico. Rio
de Janeiro: Forense, 1978, p. 480.
138
TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. 2. ed. São Paulo: Editora Método, 2006, p
259.
60
mínimas de concorrência, ou mais, precisamente, com a liberdade de acesso e permanência no
mercado. 139
Livre concorrência é disputar, em condições de igualdade, cada espaço com objetivos
lícitos e compatíveis com as aspirações nacionais, consiste, no setor econômico, na disputa
entre todas as empresas para conseguir maior e melhor espaço no mercado. 140
A livre concorrência tem como centro de suas atenções o consumidor, considerado
como parte vulnerável da relação de consumo a merecer a proteção jurídica promovida
também pela tutela da livre concorrência e igualmente aceitável que a tutela da concorrência
presta-se pela garantia de um eficiente e legitimo sistema econômico de mercado.
Através da livre concorrência que se melhoram as condições de competitividade das
empresas, forçando-as a um constante aprimoramento dos seus métodos tecnológicos, dos
seus custos, enfim, na procura constante de criação de condições mais favoráveis ao
consumidor.
Isabel Vaz comenta que a livre concorrência, tradicionalmente, pressupõe:
[...] uma ação desenvolvida por grande número de competidores, atuando
livremente no mercado de um mesmo produto, de maneira que a oferta e a
procura provenham de compradores ou de vendedores cuja igualdade de
condições os impeça de influir, de modo permanente e duradouro, nos
preços de bens e serviços. 141
As regras da concorrência não se limitam a defender o mercado como ordem normal
das trocas econômicas. Organizam o mercado e desenvolvem no pressuposto de que seu
funcionamento livre decorra: uma ordem econômica mais justa e eficiente. A defesa da
concorrência é levada a cabo porque se acredita ser ela a melhor garantia para a realização
dos objetivos da política econômica. 142
139
FILHO, Calixto Salomão. Direito Concorrencial. As estruturas. São Paulo: Malheiros. 1998, p. 32.
BARBEIRI FILHO, Carlos. Disciplina jurídica da concorrência: abuso do poder econômico. São Paulo:
Resenha Tributária, 1984, p. 119.
141
VAZ, Isabel. Direito Econômico da Concorrência. Rio de Janeiro: Forense, 1993, p.27.
142
MONCADA, Luis S. Cabral de. Direito Econômico. 2. ed. Coimbra: Editora Coimbra, 1988.p.313.
140
61
O mercado capitalista é uma realidade social que cabe ao Estado regulamentar, de
modo que a perenidade daquele depende da atuação estatal. O direito concorrencial não
poderia ser interpretado apenas como um mecanismo de eliminação de efeitos
autodestrutíveis do mercado liberal, mas como verdadeira técnica de que se vale o Estado na
implementação de políticas públicas. 143
No entendimento de Gesner Oliveira e João Grandino Rodas, políticas públicas
podem ser entendidas da seguinte maneira:
[...] o conjunto de medidas utilizadas pelos governos para intensificar,
valorizar o desafio dos mercados inibindo tanto ações privadas como
governamentais. Exemplificativamente, a aplicação dos objetivos da
política de concorrência podem compreender a privatização das empresas
pertencentes ao Estado, a redução de subsídios específicos para empresa, a
diminuição das exigências para licenciamento de novos investimentos ou a
adoção de medidas de liberalização do comércio. [...]
[...] o direito da concorrência é apenas um dos muitos instrumentos da
política de concorrência, a qual, ademais, possui um arsenal de medidas
outras, exemplificativamente, restrições à entrada, regulação do comércio,
restrição à saída, barreiras ao comércio e aos investimentos exteriores e
advocacia da concorrência. Deve-se ter em mente, ainda, que são os
objetivos e prioridades da política concorrencial que influenciam o
desenvolvimento e a interpretação das leis de concorrência [...]
[...] Impõe-se considerar também o bem-estar geral, que, pode acarretar a
diminuição da importância dada ao aspecto do bem-estar do consumidor,
enquanto componente da política da concorrência. O desenvolvimento de
tal política deve levar em conta não somente as pressões domésticas, pois,
em mercados globalizados, as políticas são elaboradas em resposta,
também, a pressões externas. Por isso, a regulação das concentrações,
frequentemente, inclui preocupações relativas à concentrações tanto
domésticas, como internacionais.[...] .144
Corroborando as idéias acima expostas, conceitua-se o direito concorrencial como
conjunto de regras jurídicas destinadas a apurar, reprimir e prevenir as várias modalidades de
abuso de poder econômico, com o intuito de impedir a monopolização de mercados e
favorecer a livre iniciativa, em favor da coletividade. 145
143
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988 (interpretação e crítica). 8 ed. São
Paulo: Malheiros, 2003, p. 25-29.
144
OLIVEIRA, Gesner; RODAS João Grandino. Direito e Economia da Concorrência. Rio de Janeiro:
Renovar, 2004, p. 25-26.
145
Op cit, p. 29.
62
A coexistência de três identidades é necessária para que se verifique a concorrência, o
tempo, o objeto e o mercado. De maneira que para a existência da concorrência necessária
que esteja ocorrendo o fato na mesma época, com o objeto de espécie idêntica, seja produto
ou serviço e que esteja diante da identidade de mercado e não mais se é colocada à identidade
de território em razão de já ser possível à concorrência entre territórios distantes. 146
Para a caracterização da concorrência, necessária a existência de liberdade para fazer
surgir diversos produtores ou prestadores de serviços a fim de praticarem a mesma atividade
econômica, de tal sorte a garantir para sociedade a possibilidade de escolha do melhor
produto, preço, condições de pagamento, etc.
Estimulando assim, em face da competitividade, um maior desenvolvimento do país e
uma busca no aprimoramento da atividade econômica, uma vez que é necessária uma
constante atualização para um concorrente não ser superado por outro.
A livre concorrência não é só aquela que espontaneamente se cria no mercado, mas
também aquela outra derivada de um conjunto de normas de política econômica. Existindo
um regime normativo da defesa da concorrência voltada ao restabelecimento das condições
de mercado livre, de maneira que o princípio constitucional autoriza esta sorte de intervenção
ativa no mercado, sem falar na negativa consistente na eliminação das disfunções e
imperfeições. 147
A concorrência empresarial tem natureza de instrumento de realização de uma
política econômica, cujo escopo principal não é simplesmente reprimir práticas econômicas
abusivas e sim estimular todos os agentes econômicos a participarem do esforço do
desenvolvimento.” 148
O objetivo da defesa da concorrência é de assegurar uma estrutura e comportamento
concorrenciais dos vários mercados no pressuposto de que o mercado livre, que selecionando
os mais capazes, logra em orientar a produção para os setores suscetíveis de garantir uma
146
SOUZA, Ferreira apud VAZ. Isabel. Direito Econômico da Concorrência. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1993,
p. 24/25.
147
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 456.
148
SILVA, Américo Luis Martins da. A Ordem Constitucional Econômica. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 1996, p.
58.
63
melhor satisfação das necessidades dos consumidores e ao mesmo tempo a mais eficiente à
afetação dos recursos econômicos disponíveis, seja os mais baixos e custos de preços. 149
Como afirma Celso Ribeiro Bastos:
[...] é essa atividade concorrente e competitiva dos diversos agentes, que
expõem no mercado produtos assemelhados, que leva à otimização dos
recursos econômicos e a preços justos, na medida em que, por intermédio
da concorrência recíproca, evitam lucros arbitrários e os abusos do poder
econômico. 150
Contribuindo dessa maneira para o desenvolvimento econômico do país e melhora
nas condições de vida do ser humano, pois a concorrência pode ser considerada como força
motiz da economia e do desenvolvimento econômico do país..
Segundo José Marcelo Proença:
A defesa da concorrência é o conjunto de leis que tem como intuito
proteger o mercado das restrições concernentes tanto à concorrência, no
que diz respeito aos comportamentos isolados de agentes econômicos ou
conglomerado empresarial, independentemente de sua forma jurídica,
quanto ao exercício abusivo de posições dominantes exercidos por uma
empresa ou empresas preponderantes no mercado, de modo a controlar as
operações de concentração. 151
Em decorrência de alguma imperfeição, na realidade demonstrou que as condições de
mercado se afastavam do modelo de mercado ideal, que seria da concorrência perfeita,
verificou-se, dentre outros fatos o surgimento de monopólios, oligopólios e concentrações
econômicas. 152 Os quais serão estudados em tópicos próprios.
A livre concorrência muitas vezes tem seu alcance reduzido pelo abuso do poder
econômico, porém o § 4º do artigo 173 da Constituição Federal de 1988 esclarece que a lei
149
MONCADA, Luis Solano Cabral de. Direito Econômico. 2. ed. Coimbra: Editora Coimbra, 1988, p.313.
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 455.
151
PROENÇA, José Marcelo Martins. Concentração Empresarial e o Direito da Concorrência. São Paulo:
Saraiva. 2001, p. 33-34.
152
GLÓRIA, Daniel Firmado de Almeida. A livre concorrência como garantia do consumidor. Belo Horizonte:
Del Rey; FUMEC, 2003, p. 57.
150
64
reprimirá o abuso do poder econômico que vise à eliminação da concorrência, à dominação
dos mercados e ao aumento arbitrário dos lucros.
Ainda hoje se vislumbra os preceitos constitucionais, no que tange à determinação em
se reprimir o abuso do poder econômico que vise à dominação de mercados e à eliminação de
concorrência; atender ao princípio da livre concorrência; reprimir o aumento arbitrário de
lucros, atendendo ao princípio da defesa do consumidor. E, nesse sentido, ao atender os
princípios da livre iniciativa e da livre concorrência, nada mais se está fazendo senão
instrumentalizar a promoção da dignidade humana.
O direito da concorrência engloba as regras que têm por objeto a intervenção do
Estado na vida econômica para garantir que a competição das empresas no mercado não seja
falseada por meio de práticas colusórias ou abusiva. 153 Miguel Reale sustenta que:
[...] o tipo liberal do processo econômico, o qual só admite a intervenção
do Estado para coibir abusos e preservar a livre concorrência de quaisquer
interferências, quer do próprio Estado, quer do embate econômico que
pode levar à formação de monopólios e ao abuso do poder econômico
visando o aumento arbitrários de lucros. 154
A livre concorrência goza do amparo constitucional, é de suma importância para o
desenvolvimento do país, como complemento da livre iniciativa, que é um dos fundamentos
do Estado Democrático de Direito, até mesmo porque a livre concorrência é uma
manifestação da livre iniciativa, que juntamente com a valorização do trabalho humano, são
base do Estado Democrático de Direito, assim tem a função de assegurar a vida digna e
efetivação da justiça social.
No entanto quando ocorrem eventuais ilegalidades e excessos deverão ser reprimidos
pelos mecanismos que a própria legislação estabelece, para que se cesse a injustiças e para
que se lute para uma igualdade de oportunidades entre os cidadãos.
153
FARIA, Werter R. Direito da concorrência e o contrato de distribuição. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris
Editor, 1992, p. 7.
154
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988 (interpretação e crítica). 8 ed. São
Paulo: Malheiros, 2006, p. 181.
65
2
PRINCIPAIS LEGILAÇÕES INFRACONSTITUCINAIS RELACIONADAS
AOS PRÍNCÍPIOS DA LIVRE INICIATIVA, DA DEFESA DO CONSUMIDOR E DA
LIVRE CONCORRÊNCIA
2.1
A LEI DE PROTEÇÃO A CONCORRÊNCIA – LEI Nº. 8884/94
A defesa da concorrência tende a espelhar o espaço reservado à intervenção estatal no
domínio econômico e, por conseguinte, à liberdade de atuação assegurada aos agentes
econômicos, o que o faz através da legislação, como a lei antitruste, objeto do estudo.
A Lei de Proteção e Defesa da Concorrência foi promulgada em 11 de junho de 1994,
sob a forma de proteção da coletividade contra os efeitos perniciosos produzidos pelos
monopólios e oligopólios, visando à prevenção e a repressão aos abusos cometidos contra a
ordem econômica.
No que diz respeito ao contexto histórico em que a lei antitruste surgiu com o cunho
de proteger a economia popular e este fator já seria capaz de determinar o caráter
instrumental, eis que se atrelava à economia popular e ao consumidor. 155
A Lei nº. 8884/94 incentiva a livre concorrência, e, combate às manobras tendentes à
eliminação das competições, define que deverão ser livres as ofertas e as procuras, devendo
ser penalmente reprimidas as manobras tendentes a obstar o mercado competitivo,
eliminando a concorrência, o que culmina com a dominação dos mercados, concentrados nas
mãos de uma só empresa.
156
Visando o livre mercado. Fábio Ulhoa Coelho aduz que:
A rigor, a legislação antitruste visa a tutelar a própria estruturação o
mercado. No sistema capitalista, a liberdade de iniciativa e a de competição
se relaciona com aspectos fundamentais da estrutura econômica. O direito,
no contexto, deve coibir as infrações contra a ordem econômica com vistas
a garantir o funcionamento do livre mercado. Claro que, ao zelar pelas
155
VAZ, Isabel. As Três Vertentes do Direito de Concorrência. Revista de Direito Econômico n. 27, Brasília:
Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE, 1988, p. 25.
156
CRETELLA JUNIOR, José. Comentários à Lei Antitruste. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 7.
66
estruturas fundamentais do sistema econômico de liberdade de mercado, o
direito de concorrência acaba refletindo não apenas sobre os interesses dos
empresários vitimados pelas práticas lesivas à constituição econômica,
como também sobre os consumidores, trabalhadores e, através da geração
de riqueza e aumento dos tributos, os interesses da própria sociedade em
geral. 157
A lei antitruste pretende proteger não somente os consumidores, os quais são
considerados os titulares imediatos, mas a todos os participantes do mercado, inclusive os
concorrentes, não podendo ainda ter preferência por qualquer tipo de agente econômico.
Luis. S. Cabral de Moncada entende que:
O legislador partiu do princípio de que a concorrência se não desenvolve
espontaneamente entre as empresas participantes no mercado, ao lhe
competindo tão-só estabelecer um conjunto de regras tendo por objectivo
simplesmente à prevenção e repreensão de situações em que o
comportamento das empresas lesa intoleravelmente certos interesses
públicos. Torna-se necessário para, além disso, organizar normativamente
um regime de concorrência através de estabelecimento e defesa de um
conjunto de normas políticas visando certos objectivos tais como alto
volume de emprego, uma ampla capacidade produtiva, uma relativa
estabilidade monetária, etc. Considerados só alcançáveis no quadro
institucional de um mercado aberto na maior medida possível a todos os
agentes econômicos e consumidores. 158
A Lei Antitruste é instrumental a uma determinada política econômica, possuindo,
por conseqüência, objetivos bem próprios. A qual deve garantir a liberdade de competição
entre os agentes econômicos objetivando assegurar as condições de produção e consumo
próprias de um regime de mercado. 159
A lei de defesa da concorrência tem seu objetivo previsto no artigo 170 da
Constituição Federal de 1988, “assegurar a todos uma existência digna, conforme os ditames
da justiça social” e a mesma é orientada pelo artigo 3º da Constituição Federal. Nesse
sentido, ao atender os princípios da livre iniciativa e da livre concorrência, nada mais se está
fazendo senão instrumentalizar a promoção da dignidade humana.
157
COELHO, Fábio Ulhoa. Direito Antitruste Brasileiro: comentários à Lei 8.884/94. São Paulo: Saraiva, 1995,
p. 5.
158
MONCADA. Luis S. Cabral de. Direito Econômico. 2. ed.rev. atual. Coimbra, Editora. 1988.
159
BAGNOLI, Vicente, Direito Econômico. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2007, p.150.
67
A análise funcional do Direito está em plena consonância com a natureza jurídica das
normas de direito antitruste, cuja principal característica é a de servir como instrumento à
formulação, pelo Estado, de políticas públicas de intervenção do domínio privado, visando
controlar, preventiva e repressivamente, o exercício abusivo do poder econômico. 160
A Lei Antitruste tem aptidão para a implementação de políticas públicas, não sendo
vista apenas em sua função de eliminação dos efeitos autodestrutíveis do mercado, mas
também como fomentadora de políticas públicas, para o desenvolvimento econômico do país.
A Ministra do Superior Tribunal de Justiça Fátima Nancy Andrighi comenta que a
legislação antitruste deve preservar os valores sociais, não apenas gizar com tanta ênfase a
liberdade de concorrência. 161
Em razão dos objetivos que podem ser perseguidos pela Legislação Antitruste vale
ressaltar as sábias palavras de Siro Lombardini “[...] oferecer um instrumento para que as
administrações públicas possam orientar as decisões dos grandes grupos de empresas para
realizar o processo de desenvolvimento tido como possível e desejável.” 162
Não se deve engessar a concorrência, pois a mesma é um instrumento de política
pública econômica e deve ser adaptada ao mundo atual, no pensamento de Paula A. Forgioni
a política pública da antitruste poderá ser atuada de duas maneiras, primeiro através da
aplicação da Lei Antitruste, por via de concessão de autorização ou isenção e em segundo
através da não aplicação da Lei a práticas restritivas, por exemplo, o Estado com intuito de
formatar o funcionamento do mercado, pode afastar ou amenizar a vigilância ou controle
sobre o processo de concentração. 163
O objetivo da legislação antitruste não pode ser reduzido a um fim em si mesmo,
‘eliminação dos efeitos autodestrutíveis do mercado’, não mais se caracteriza como um mero
instrumento de correção dos desvios funcionais do mercado, mas devendo ser utilizada como
instrumento de implementação de políticas públicas, viabilizando o surgimento de inteiras
propostas de reestruturações de mercado, baseados na lei e nos princípios constitucionais da
ordem econômica.
Luis S. Cabral de Moncada cita que:
160
GOMES, Carlos Jacques Vieira Gomes. Ordem Econômica Constitucional e Direito Antitruste. Porto
Alegre: S. A. Fabris, 2004, p. 20.
161
ANDRIGHI, Fátima Nancy apud GOMES, Carlos Jacques Vieira. Ordem Econômica Constitucional e
Direito Antitruste. Porto Alegre. S. A. Fabris, 2004. p. 15.
162
LOMBARDINI, Siro. La legislazione antimonopolistica nella política econômica. La liberta di concorrenza.
Milano: Giuffrè, 1970, p. 45.
163
FORGIONI, Paula Andréa. Os Fundamentos do Antitruste. 2 ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2005, p. 195.
68
É que a defesa da concorrência entre as unidades produtivas compreende
nos nossos dias um conjunto ordenado e homogêneo de normas de política
econômica, muito para além das normas de polícia. O legislador partiu do
princípio de que a concorrência se não desenvolve espontaneamente entre
as empresas participantes do mercado, não lhe competindo tão-só
estabelecer um conjunto de regras tendo por objetivo simplesmente à
prevenção e repressão de situações em que comportamento das empresas
lesa intoleravelmente certos interesses públicos. Torna-se necessário para,
além disso, organizar normativamente um regime de concorrência através
do estabelecimento e defesa de um conjunto de normas de política
econômica, visando certos objetivos tais como um alto volume de
emprego, uma ampla capacidade produtiva, uma relativa estabilidade
monetária, etc... considerados só alcançáveis no quadro institucional de um
mercado aberto na maior medida possível a todos os agentes econômicos e
consumidores. 164
O controle antitruste, a cargo do Estado, deve estar a serviço não apenas da livre
iniciativa e da livre concorrência, mas também dos escopos sociais e democráticos. 165
A legislação antitruste busca controlar o exercício abusivo do poder econômico,
porém não se limita ao aspecto econômico, mas também ao social e político, o controle do
exercício do poder econômico constitui instrumento de políticas públicas, a intervenção
estatal a serviço de valores político-sociais, porém sempre de acordo com os princípios
formadores da ordem econômica, previstos no artigo 170 da Constituição Federal de 1988.
A legislação Antitruste procedeu à “tipificação” das “infrações da ordem econômica,
independente de culpa” enumerando os “atos sob qualquer forma manifestados, que tenham
por objeto ou possam produzir efeitos ali registrados, ou as condutas previstas na mesma lei”.
166
O agente econômico só praticará ato ilícito se o mesmo detiver poder de mercado,
pois caso contrário não existirá prejuízo da livre concorrência. É necessário que existam
prejuízos ao mercado para que seja caracterizado o cometimento de um ato ilícito.
A legislação em tela aplica-se de acordo com seu artigo 15 às pessoas jurídicas e
privadas, associações de entidades ou pessoas constituídas de fato ou de direito ainda que
temporariamente, com ou sem personalidade jurídica, podendo incidir até mesmo em
empresas que operem sob o regime de monopólio legal. José Cretella Junior cita como
164
MONCADA, Luis S. Cabral. Direito Econômico. 2. ed.rev. atual. Coimbra. Editora. 1988, p. 312.
BRUNA, Sérgio Varella. O poder econômico e a conceituação do abuso em seu exercício. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 1997, p. 144.
166
SOUZA, Washington Peluso Albino. Primeiras linhas de direito econômico. 6. ed. São Paulo: LTr, 2005, p
.259.
165
69
exemplo o consórcio, que não tem personalidade jurídica, mas tem capacidade postulacional.
167
Em relação à pequena e média empresa, as mesmas não podem constituir objetivo da
lei antitruste, devendo as mesmas ser tratadas de maneira igualitária com as outras empresas,
Calixto Salomão Filho afirma “[...] que não é admissível que o direito concorrencial atribua à
pequena e média empresa vantagens adicionais em relação àquelas que naturalmente já
atribui”. 168
Para a pequena e média empresa ser sujeito ativo dos ilícitos que caracterizam o
abuso do poder é necessário que tenha o requisito de poder de mercado. No entanto as
mesmas devem estar sujeitas como qualquer empresa a punição por concorrência desleal, isto
é, por aquelas práticas que por si e independentemente das dimensões do agente constituem
os ilícitos previsto na lei de defesa da concorrência.
169
A pequena empresa será tratada de maneira igual as demais empresas, pelo fato da
mesma ter tratamento favorecido pela Constituição Federal de 1988 não significa que as
pequenas e médias empresas serão também favorecidas pela legislação antitruste.
A lei antitruste protege qualquer tipo de concorrente, quer pequenas ou grandes
empresas. As grandes empresas têm maiores capacidades produtivas e financeiras, podendo
investir mais em tecnologia, o que é bom para o consumidor, na medida em que são aptas, a
gerar produtos de maior qualidade e de menor custo, porém o tratamento será igualitário para
qualquer porte de empresa.
Em razão da responsabilidade prevista no artigo 16 da Lei nº. 8884/94 fica claramente
estabelecido que as infrações da ordem econômica implicam a responsabilidade da empresa e
a responsabilidade individual de seus dirigentes ou administradores, solidariamente.
O autor José Cretella Junior afirma que para infração cometida contra a ordem
econômica é necessário:
[...] a) o agente; a causa eficiente ou razão determinante da infração; b) o
dano causado, perfeitamente descrito, apurado e provado; c) o nexo de
causalidade, a relação fático jurídica entre a pessoa, física ou jurídica,
responsável, individual ou solidariamente; d) a norma infringida, o
disposto preciso da lei quebrado pela ação. 170
167
CRETELLA JUNIOR, José. Comentários à Lei Antitruste. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 62.
SALOMÃO FILHO, Calixto. Direito Concorrencial: as estruturas. São Paulo: Malheiros, 1988, p. 199.
169
Op cit, p. 200.
170
CRETELLA JUNIOR, José. Comentários à lei Antitruste. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 66.
168
70
No que diz respeito à responsabilidade da empresa, a legislação antitruste prevê em
seu artigo 17 que “serão solidariamente responsáveis às empresas ou entidades integrantes de
grupo econômico, de fato ou de direito, que praticarem infração econômica”, assim podendo
identificar que a apuração do responsável por infração da ordem econômica é o ponto crucial
da lei em tela, portanto empresas integrantes de um grupo econômico serão consideradas
como mesmo ente.
Para a caracterização da solidariedade é necessária a ocorrência da infração
econômica, praticada por uma das empresas integrantes do grupo, mesmo que uma empresa
não seja responsável pela infração responderá, o requisito é que faça parte do mesmo grupo.
A personalidade jurídica também poderá ser desconsiderada se ocorrer abuso de
direito na utilização da empresa, necessário que haja a desconsideração da personalidade
jurídica para que a mesma consiga ser afastada e que se possa vincular a responsabilidade
dos sócios, visando impedir a consumação de fraudes e abusos de direito levados a cabo
através de personalidade jurídica que visam lesionar terceiros. 171
A Lei nº. 8884/94 buscou sistematizar o regime jurídico do controle do exercício
abusivo do poder econômico, tanto em sua vertente repressiva, ao positivar, nos artigos 20 e
21, as condutas anticoncorrenciais capazes de limitar ou prejudicar a livre concorrência,
como em sua dimensão preventiva, ao sujeitar a eficácia jurídica dos atos e contratos hábeis a
produzir qualquer forma de concentração econômica, definidos no artigo 54, ‘caput’ e § 3º, à
aprovação da entidade administrativa competente (CADE). 172
O artigo 20 prevê infração a ordem econômica independente de culpa, mesmo que a
conduta consistente em limitar, prejudicar a livre concorrência e a livre iniciativa, dominar
mercado relevante de bens e serviços, aumentar arbitrariamente os lucros ou exercer de
forma abusiva a posição dominante.
O direito positivo estabelece que os atos de qualquer natureza que tenham o efeito,
potencial ou real, de limitar, falsear, ou prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa é
definido como infração da ordem econômica, não importando de que se reveste o ato
analisado, bastará à verificação dos efeitos atuais ou potenciais para comprovar a existência
da prática vedada.
Em relação ao aumento arbitrário de lucro, a lei não proíbe o lucro nem o aumento do
lucro, o que é coibido é a lucro arbitrário, sem causa, derivado de práticas abusivas.
171
FACHIN, Luiz Edson, CRETELLA JUNIOR, José, DOTTI René Ariel. Comentários ao Código do
Consumidor. Rio de Janeiro: Forense, 1992, 103.
172
GOMES, Carlos Jacques Vieira Gomes. Ordem Econômica Constitucional e Direito Antitruste. Porto
Alegre: S. A. Fabris, 2004, p. 62.
71
O aumento arbitrário dos lucros é decorrência do aumento abusivo dos
preços, quando existe número exíguo de empresa que não tem condições de
fazer-lhe concorrência em determinado segmento de mercado ou de
prestação de serviços, o que ocorre, por exemplo, quando uma empresa –
ou um grupo – controla em tal grau a produção, a venda, a distribuição ou a
prestação de bens ou serviços, que acaba por exercer decisiva influência
sobre os respectivos preços. 173
O domínio do mercado relevante é nefasto aos interesses da coletividade, exercido
sem qualquer ética ou respeito aos concorrentes, visando o domínio pelo prazer de dominar e
manipular o mercado, não se importando com os efeitos sociais desta prática egoísta aquele
que assim procede. 174
Para a aplicação de qualquer incidência das hipóteses contidas na legislação
antitruste, porquanto necessário à definição de mercado relevante, pois o impacto que uma
determinada concentração econômica poderá causar sobre o nível de concorrência
dependente, em primeira medida, do tamanho e do tipo de mercado relevante considerado.
Carlos Jacques Vieira Gomes aduz:
[...] que a definição do mercado relevante está diretamente relacionada com
a identificação da extensão do poder de mercado detido pelos agentes
econômicos: identificar o mercado relevante é o mesmo que descrever o
contexto em que o poder de mercado poder ser exercido. 175
O termo mercado relevante denota algo como mercado relativo, ou mercado
pertinente, no qual os produtos dele integrantes são, em conjunto, objetos de concentração de
ofertas e procuras que caracterizam a própria noção econômica de mercado. 176
O referencial básico estará no poder de mercado, cujas práticas seriam disciplinadas
juridicamente a partir das condições econômicas de seu entendimento e seu funcionamento.
173
CRETELLA JUNIOR, José. Comentários à Lei Antitruste. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 76.
POPP, Carlyle e ABDALA, Edson Vieira. Comentários à Nova Lei Antitruste, Curitiba: Juruá, 1994, p. 73.
175
GOMES, Carlos Jacques Vieira Gomes. Ordem Econômica Constitucional e Direito Antitruste. Porto Alegre:
S. A. Fabris, 2004, p. 156.
176
BRUNA, Sérgio Varella. O poder econômico e a conceituação do abuso em seu exercício. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 1997, p. 156.
174
72
177
Analisar-se-á três planos de análise necessários para a definição do mercado relevante:
dimensão do produto, dimensão geográfica e dimensão temporal. 178
A dimensão do produto do mercado relevante poder ser definida como o produto, ou
grupos de produtos, coloca à venda em uma determinada área geográfica, de tal modo que
um hipotético agente econômico é o único vendedor de tais produtos na referida área, poderia
aumentar o preço da venda verificado ao nível competitivo em montante pequeno mais
significante, e durante um certo espaço de tempo, não transitório.179
Paula Andréa Forgioni identifica o mercado relevante de dimensão geográfica com o
espaço físico onde se desenvolvem as relações de concorrências que são consideradas, pode
ser compreendido como a área na qual o agente econômico é capaz de aumentar os preços
que pratica sem causar um dos seguintes efeitos:
[...] (i) perder um grande numero de clientes, que passariam a utilizar-se de
um fornecedor alternativo situado fora da mesma área; ou (ii) provocar
imediatamente a inundação da área por bens de outros fornecedores que,
situados fora da mesma área, produzem bens similares. 180
Dimensão temporal do mercado relevante está relacionada com as indústrias que
operam em ciclos, isto é, apresentam distribuição heterogênea da quantidade produzida ao
longo do ano. 181
Mercado relevante material considerado sendo “[...] aquele em que o agente
econômico enfrenta a concorrência, considerando o bem ou serviço que oferece. Sua
limitação, a exemplo de mercado relevante geográfico, parte da identificação das relações de
concorrência”. 182
No Brasil serve como argumento para descaracterizar a incidência dos incisos I e II
do artigo 20 da Lei Antitruste, quanto maior o mercado relevante considerado, menores os
impactos anticoncorrenciais gerados pela pratica analisada, o elástico conceito de mercado
relevante é utilizado pelas empresas, que buscam furtar-se à necessidade de obtenção de
177
SOUZA, Washington Peluso Albino de. Primeiras linhas de direito econômico. 6. ed. São Paulo: LTr, 2005,
p. 268.
178
GOMES, Carlos Jacques Vieira Gomes. Ordem Econômica Constitucional e Direito Antitruste. Porto
Alegre: S. A. Fabris, 2004, p. 155.
179
Op cit, p. 156.
180
FORGIONI, Paula Andréa. Os Fundamentos do Antitruste. 2 ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos
Tribunais, p. 234.
181
GOMES, Carlos Jacques Vieira Gomes. Ordem Econômica Constitucional e Direito Antitruste. Porto
Alegre: S. A. Fabris, 2004, p. 163.
182
FORGIONI, Paula Andréa. Os Fundamentos do Antitruste. 2 ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2000, p. 241.
73
autorização prevista no artigo 54, § 3º da Lei da Concorrência, sustentando a maior
abrangência do mercado relevante em que atuam, procuram demonstrar que não possuem
vinte por cento desse mercado, buscando desobrigar-se da notificação da operação de
concentração ou ainda aplicação de multa pela falta de tempestiva comunicação. 183
As normas da Lei Antitruste podem ser repressivas ou preventivas, em seu aspecto
repressivo ocorre quando a sua hipótese de incidência pressupõe a prévia consumação da
conduta ilícita e preventiva quando autorizam o Estado a intervir previamente para evitar o
exercício do abuso do poder econômico.
As normas inseridas nos artigos 20 e 21 da Lei nº. 8884/94 e artigo 4º da Lei 8137/90
são normas que imputam sanção de natureza administrativa ou penal, portanto são normas de
dimensão repressiva.
A hipótese de aspecto preventivo opera-se por meio da eficácia jurídica dos atos e
contratos em que resulte concentração econômica à aprovação da entidade administrativa
competente, que está previsto o artigo 54, § 7º da Lei Antitruste.
A questão do jogo de interesses protegido, centraliza-se no artigo 20 da Lei nº.
8884/94, motivo que é necessário à análise de seus incisos. O inciso I tem o interesse de
limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa, ou
seja, é assegurada a liberdade de desenvolvimento de atividade econômica, e para garantir a
manutenção desses mesmos agentes, disciplinado seu comportamento no mercado, a
disciplina da concorrência resta correlata à livre iniciativa, da mesma maneira que previsto
no artigo 170 e 173 da Constituição Federal de 1988. 184
O bem juridicamente protegido á a liberdade de iniciativa, a livre concorrência, o
mercado, atua o Estado como mandatário de toda a sociedade, na tarefa de restaurar a ordem
jurídica atingida pela prática econômica abusiva.
Os incisos II e IV referem-se ao domínio de mercado relevante de bens e serviços e ao
abuso da posição dominante, sendo que o texto prevê a ilicitude de ato contrário à ordem
econômica, ainda que os fins visados não sejam alcançados, inclui-se na redação do artigo 20
a prática que possa ter só objeto ou por efeito a dominação de mercado, ou seja, propiciar a
detenção de poder econômico suficiente para assegurar o comportamento independente e
indiferente em relação aos demais agentes. 185
183
Op cit, p. 253.
FORGIONI, Paula Andréa. Os Fundamentos do Antitruste. 2 ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos
Tribunais, p. 271.
185
Op cit, p. 276.
184
74
O inciso III do artigo 20, proíbe o aumento arbitrário dos lucros, pois os altos lucros
não trazem incentivos algum à concorrência ou a livre iniciativa, à medida que a
possibilidade de sua auferição é um sinalizador para a concorrência potencial apto a
aumentar o grau de competitividade do mercado relevante.
Porém altos lucros atuam como sinalizador para os agentes econômicos, que são
incentivados pela possibilidade de lucros altos, melhorando a concorrência e livre iniciativa
no país, fomentando a economia com a entrada de novos concorrentes no mercado em
questão.
No entanto são preservados de forma mediata os direitos do consumidor:
A legislação brasileira antitruste, embora impregnada de um sentido
neoliberalista, não tem como único objetivo restabelecer o livre mecanismo
de preços e da concorrência. O legislador constituinte procurou ainda
proteger o consumidor conta a sede de lucros excessivos por parte de
empresas e associações de produtos que pretendem aumentar
arbitrariamente, seus ganhos em função de posições monopolísticas. 186
Restando evidente mais uma vez que existe uma interação, compatibilização e
harmonização entre as legislações de defesa da concorrência com a de defesa do consumidor.
O Brasil não pune a posição dominante em si, nos termos do artigo 20, § º da Lei nº.
8884/94, pois nada há de ilícito com a utilização do poder econômico, no momento em que
há abuso do poder econômico, há abuso do direito da liberdade econômica, liberdade de
iniciativa e de concorrência.
Passando o sujeito a fazer um uso anormal da posição dominante, que será
sancionado pela legislação antitruste. Nada de ilícito na conduta de empresa que conquista
parcela substancial do mercado relevante simplesmente por ser mais eficiente que seus
concorrentes.
A idéia de repressão ao abuso de direito traz à mente a regulamentação própria do
Estado Liberal, que intervém para neutralizar os efeitos autodestrutíveis que advêm do
mercado: 187
Os interesses da coletividade devem fatalmente preponderar sobre
prerrogativas do indivíduo. Assim como uma propriedade ilimitada, uma
concorrência sem limites é social e praticamente irrealizável: um direito
186
BRANCO, Nelson de Azevedo e BARRETO, Celso de Albuquerque. Repressão ao abuso do poder
econômico. São Paulo: Atlas, 1964, p. 23.
187
FORGIONI, Paula Andréa. Os Fundamentos do Antitruste. 2 ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2000, p. 325.
75
absoluto é destinado à destruição; ele devoraria a si próprio por seus
próprios excessos; como as demais liberdades, a liberdade de comércio que
ser regulamentada, sabiamente organizada. 188
O parágrafo 2º do artigo 20 da legislação antitruste estabelece que “Ocorre posição
dominante quando uma empresa ou grupo de empresas é controla parcela substancial de
mercado relevante, como fornecedor, intermediário, adquirente ou financiador de um
produto, serviço ou tecnologia a ele relativa”.
Não é somente sob a forma de monopólio que se vai conceber a posição dominante de
uma empresa no mercado, ficando explícito a respeito não se prendendo à quantidade, se de
“uma ou de um grupo de empresas”, mas à sua capacidade de “controlar parcela substancial,
determinada em 20 % do mercado relevante, alterado pelo CADE com a especificidade da
economia. 189
Paula Andréa Forgioni fornece um exemplo dado recentemente pela atuação da SDE:
[...] que determinou nos termos do artigo 31 da Lei antitruste, a instauração
de processo administrativo contra empresas produtoras de sucos de laranja,
por entender que, (i) em virtude de um cartel de compra de laranja dos
produtores, são detentoras de posição dominante no mercado relevante que
atuam, e (ii) teriam abusado dessa posição, ao descumprir as obrigações
contratuais assumidas com fornecedores. 190
Explica-se que se partindo do pressuposto da existência de “cartel”, imaginamos que
as empresas partícipes não tivessem assumindo posição dominante (ou posição relevante no
mercado): muito provavelmente seu ato seria interpretado como uma mera quebra contratual,
de tudo independentemente do direito antitruste, porquanto não prejudicial nem à livre
concorrência nem à livre iniciativa. 191
As condutas elencadas no artigo 21 da lei antitruste, referem-se a práticas de abuso de
posição dominante, sendo preocupação da legislação fornecer meios para controlar a
atividade dos agentes econômicos com relevante poder econômico.
188
JOSSERANDD apud FORGIONI, Paula Andréa. Os Fundamentos do Antitruste. 2 ed. rev. e atual. São
Paulo: Revista dos Tribunais, p. 326.
189
SOUZA, Washington Peluso Albino de. Primeiras linhas de direito econômico. 6. ed. São Paulo: LTr, 2005,
p. 266.
190
FORGIONI, Paula Andréa. Os Fundamentos do Antitruste. 2 ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2000, p. 350.
191
Op cit.
76
A imposição de preços não eqüitativos ao mercado é uma característica da posição
dominante. A prática de preços excessivos somente é coibida, portanto se levar ao aumento
arbitrário dos lucros, nos termos do inciso III do artigo 20 da Lei Antitruste, e os preços
predatórios serão vedados se prejudicarem a livre concorrência ou a livre iniciativa.
192
Se
não houver prejuízo ao consumidor e concorrência poderá ser considerada como fomento
para o desenvolvimento econômico do país.
As infrações a ordem econômica é classificada como abusos lesivos e exclusionários.
É exemplo de abusivos lesivos: aumento arbitrário de lucros previstos no artigo 20, inciso III,
a discriminação de preços perante consumidor ou fornecedor previsto no artigo 21, inciso
XII, a interrupção da produção em larga escala, sem justa causa prevista no artigo 21, incisos
XVII e XX, a cessação parcial ou total de atividades prevista no artigo 21, incisos XXI e
XXII, venda casada prevista no artigo 21, inciso XXIII e a imposição de preços excessivos
prevista no artigo 21, inciso XXIV. 193
Os abusos exclusionários correspondem ao comportamento daquele que objetiva
prejudicar o concorrente, na tentativa de diminuir ou mesmo suprimir a concorrência
existente, podendo utilizar-se de vários artifícios; recusar contratar com concorrente, produz
aumento nos custos necessários à entrada concorrente potencial, pratica preços predatórios e
antecipa em relação à demanda, a capacidade instalada para a produção do bem relevante. 194
São exemplos de abusos exclusionários: limitação, falseamento e o prejuízo à livre
concorrência e à livre iniciativa prevista no artigo 20, inciso I, o domínio de mercado
relevante de bens e serviços, previsto no artigo 20, inciso II, a adoção de conduta comercial
uniforme entre concorrentes previsto o artigo 21, incisos I, II e VIII, a divisão de mercados
prevista no artigo 21, inciso III, a criação de dificuldades ao livre exercício da atividade
comercial por concorrente previsto no artigo 21, incisos IV, V, VI. VII, IX, X, XIII, XIV,
XV e XVI, a imposição de restrições verticais prevista no artigo 21, inciso XI e a prática de
preço predatório previsto no artigo 21, incisos XVII e XIX. 195
192
FORGIONI, Paula Andréa. Os Fundamentos do Antitruste. 2 ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2000, p. 353.
193
GOMES, Carlos Jacques Vieira Gomes. Ordem Econômica Constitucional e Direito Antitruste. Porto
Alegre: S. A. Fabris, 2004, p. 98.
194
Op cit.
195
Op cit.
77
Necessário verificar a compatibilidade das estruturas frente ao ordenamento
brasileiro, eis que o artigo 21, incisos I, III e IX, da legislação antitruste deve ser analisado de
acordo com o artigo 54 da referida lei, pois em determinados acordos destinados à melhoria
das condições operativas do setor eles estão presentes é possível aprovar os contratos visando
à cooperação econômica entre os concorrentes. 196
O artigo 21 e seus 24 incisos da legislação antitruste dispõem sobre as condutas que
caracterizam infração a ordem econômica. Em seu inciso I, prevê a fixação ou prática em
acordo com concorrentes, de maneira que lei reprime a imposição de preços excessivos ou o
aumento injustificável de preços.
Sobre o assunto José Cretella Júnior ressalta que:
Se, porém, o preço do produto, ou sua elevação, tão-somente, for
influenciado pela introdução de melhorias de qualidade ou pelo
comportamento do custo dos respectivos insumos, não se configura a
conduta caracterizadora de infração da ordem economia. O que o
dispositivo proíbe é o “acordo”, o “concerto”,o “conchavo” da empresa
concorrente, na fixação ou pratica de preços e condições, sob qualquer
forma, conduta prejudicial, vedada por trazer sensível dano à ordem
econômica.197
Os acordos entre os concorrentes inviabilizam a própria economia de mercado, uma
vez que as reações percebidas no mercado não são resultados da livre atuação das forças de
mercado, mas resultam de um acordo que ofende profundamente as condições de atuação
eficiente de mercado e, sobretudo os consumidores, implicando em apropriação indevida de
excedentes e foco de ineficácias econômicas. 198 Não se admitindo o acordo dos preços entre
os concorrentes, caso contrário impediria a concorrência leal defendida pela legislação.
O inciso II prevê a obtenção ou influência a adoção de conduta comercial uniforme ou
concertada entre os concorrentes. Porém atinge somente o acordo lícito de conduta
comercial, não atingindo empresas concorrentes que adotem condutas parecidas e
independentes. 199
Comete a infração econômica prevista no inciso III a empresa que cindir mercados de
serviços ou produtos, acabados ou semi-acabados, ou as fontes de abastecimento de matérias
primas ou produtos intermediários.
196
SALOMÃO FILHO, Calixto. Direito Concorrencial: as estruturas. São Paulo: Malheiros, 1988, p. 197.
CRETELLA JUNIOR, José. Comentários à Lei Antitruste. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 76/77.
198
MARQUES, Fernando de Oliveira. Direito Concorrencial – Aspectos jurídicos e econômicos. 1. ed. São
Paulo: 2003, p.210.
199
POPP, Carlyle e ABDALA, Edson Vieira. Comentários à Nova Lei Antitruste, Curitiba: Juruá, 1994, p. 75.
197
78
O texto mostra duas situações distintas à primeira parte do inciso, a divisão dos
mercados esbarraria na possibilidade de formações de cartéis, de todo indesejável, e na
segunda parte a formação de oligopólios, os quais deteriam a matéria-prima, controlando
com exclusividade os preços e a sua distribuição, preferindo determinados clientes a outros,
hipóteses não prevista na legislação antitruste e merecedora de punição. 200
Configura
ilícito
econômico
todo
ato,
sob
qualquer
forma
manifestado,
independentemente de culpa, que tenha por objetivo limitar ou impedir ou que possa limitar
ou impedir o acesso de novas empresas ao mercado.
Constitui infração à ordem econômica todo ato que crie dificuldades à constituição,
ao funcionamento ou ao desenvolvimento de empresa concorrente ou de fornecedor,
adquirente ou financiador de bens e serviços, as condutas puníveis são apenas aquelas que
visem criar obstáculos aos concorrentes.
As fontes de insumo, matérias-primas, equipamentos, tecnologia e canais de
distribuição devem estar abertos a todos os competidores que labutam no mesmo mercado,
prevalecendo, no caso, sob qualquer forma manifestada, que impeça o acesso de concorrente
às mencionadas fontes. 201
Para que seja alcançado o objetivo maior da livre concorrência, é necessária a busca
pela qualidade e bons preços, o que não permite qualquer restrição às fontes de consumo, às
matérias primas, aos equipamentos de tecnologia, pois poderia haver uma superioridade e
possível domínio de mercado por parte um concorrente, em detrimento aos objetivos
almejados pela legislação.
Aquele que impede o acesso aos canais de distribuição, pois limita tal ato à
possibilidade de escolha do consumidor diante do produto desejado, aumentando o preço e
possivelmente, reduzindo a qualidade dos bens de consumo. 202
O inciso VIII, alude à concorrência pública ou administrativa, sendo que o ajuste
prévio de preços e de vantagem constitui infração a ordem econômica.
Em relação à provocação da oscilação de preços a mesma também é vedada, eis que
qualquer manobra empregada para provocar a oscilação de preços já fixados por terceiro é
punível pela legislação antitruste. A oscilação pode tanto para cima como para baixo e
qualquer tipo que seja é um acontecimento de extremo desconforto para o mercado.
200
Op cit, p. 76.
CRETELLA JUNIOR, José. Comentários à lei Antitruste. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 77.
202
POPP, Carlyle e ABDALA, Edson Vieira. Comentários à Nova Lei Antitruste, Curitiba: Juruá, 1994, p. 77.
201
79
O mercado de produção de bens e serviços deverá funcionar de modo normal, o
mesmo devendo ocorrer nos setores da pesquisa e da tecnologia, de maneira que constitui
infração a ordem econômica influir nesses mercados fazendo acordos para limitar ou
contratar a pesquisa tecnologica.
No Brasil não se encontra em condições de competição a nível internacional, ainda
que os preços praticados no país desestimulem o potencial comprador a adquirir
determinadas máquinas, em virtude de a tecnologia estar parcialmente desatualizada, porém
se o inciso X realmente for colocado em prática poderá ocorrer o nivelamento da produção
tecnologica nacional com a internacional.
Também constitui infração a ordem econômica a imposição no comércio de bens e
serviços, a distribuidores, varejistas e representantes, preços de revenda, desconto, condições
de pagamento, quantidades mínimas ou máximas margem de lucro ou quaisquer outras
condições de comercialização relativos a negócios destes com terceiros, o que está previsto
no inciso XI da legislação antitruste.
O objetivo do inciso é o livre comércio, a empresa que detém o produto não poderá
impor preços de revenda ao seu representante, sob pena de inexistir possibilidade de escolha
pelo consumidor do que deseja, ainda não poderá impor condições de pagamento, nem
quantidades, pois caso assim o fizesse estaria ferindo a livre iniciativa e a livre concorrência,
o que seria desaconselhável è estabilização do mercado. 203
O inciso XII visa proibir a discriminação aos setores do comércio que seriam
prejudicados por alguns poucos privilegiados, ainda a Constituição Federal de 1988 veda
qualquer tipo de discriminação, o que se deseja é evitar o privilégio inadequado à livre
concorrência, quando inadmissível facilitar-se-ia o fornecimento de bens ou serviços com
vantagens de preços ou de condições operacionais de venda aos protegidos, desconsiderandose os demais interessados na realização do negócio. 204
O que se deseja é que a fixação de preços e as condições operacionais de venda, ou
prestação de serviços devem ser uniformes para todos os fornecedores e adquirentes dos
produtos e serviços, sob pena de prejudicar a livre concorrência.
O comerciante não pode recusar a venda de bens ou prestação de serviço devido
dentro das condições de pagamento normal aos usos e costumes comerciais, a proteção do
consumidor se destaca eis que somente possível à recusa da venda quando em casos de
203
204
CRETELLA JUNIOR, José. Comentários à lei Antitruste. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 78.
POPP, Carlyle e ABDALA, Edson Vieira. Comentários à Nova Lei Antitruste, Curitiba: Juruá, 1994, p. 81.
80
intermediação regulados por leis especiais, caso contrário não poderá simplesmente recusar a
venda.
Constitui infração a ordem econômica todo ato que dificulte ou interrompa a
continuidade e desenvolvimento de relação comercial, diante da recusa do concorrente em
submeter-se a condições e cláusulas comerciais injustificáveis ou anticoncorrenciais, prevista
no inciso XIV da lei antitruste.
O contratante não poderá no decorrer da relação comercial forçar uma situação ao
contratado a cláusulas espúrias, incentivando novas condições que lhe auferisse vantagem:
Portanto, será justa a recusa do contratado em não se submeter à cláusula
injustificável para a continuidade do contrato, devendo, para isso, se
necessário, agasalhar-se no manto do poder judiciário, a fim de manter as
mesmas condições inicialmente pactuadas. 205
Todo o ato que manifestado sob qualquer forma se dirija a destruir, inutilizar ou
açambarcar matérias primas, os produtos intermediários ou acabados, ainda a destruição, a
inutilização ou a dificultação de operações de equipamentos, destinados a produzi-los,
distribuí-los ou transporta-los é visto como infração à ordem econômica, o que está na lei
antitruste em seu artigo 21, inciso XV.
As matérias-primas são significativas para o desenvolvimento não só do comércio,
mas também do país, de maneira que houver o perecimento ou inutilização ilegal ou posse de
forma abusiva atenta conta a dignidade do consumidor e de uma geração de trabalhadores, os
quais com muito custo vêem se perder o seu trabalho, por intermediários antiéticos que visam
o lucro espoliativo. 206
O inciso XVI tem o mesmo raciocínio, não permitir o domínio abusivo de direito de
propriedade industrial e intelectual ou de tecnologia, resguardando, também o direito à
exploração dos mesmos. Cuidado existente em razão de que muitos cientistas e
pesquisadores criam algo e acabam repassando para pessoas que se apropriam de seus feitos
e acabam registrando descobertas em seus próprios nomes ou de forma incorreta, lesionando
o verdadeiro inventor ou pesquisador.
Comete infração da ordem econômica toda ação que sem justa causa comprovada
afete lavouras ou plantações, quer abandonando ou destruindo. Com o intuito de sempre
205
206
Op cit, p. 82.
POPP, Carlyle e ABDALA, Edson Vieira. Comentários à Nova Lei Antitruste, Curitiba: Juruá, 1994, p. 83.
81
aumentar os preços, por maus costumes e às vezes incentivados pelo governo, podem os
agricultores destruir parcialmente ou totalmente as lavouras ou plantações para forçar a
subida dos preços, dada a diminuição da oferta.
O artigo 21 da Lei Antitruste em seu inciso XVIII enumera como possível infração a
ordem econômica a venda injustificadamente de bens abaixo do preso de custo, porém pode
ser lícita se considerada justificada. O que pode ocorrer em caso esporádico em que visa à
necessidade da venda de imediato do bem, não sendo um comportamento habitual do agente
econômico.
Outra situação também justificável seria um agente econômico que queira entrar no
mercado relevante e venda os bens abaixo dos custos para atrair a clientela, porém o objetivo
não poderá ser a eliminação do concorrente ou sinalização para evitar a entrada de
concorrentes no mercado.
Qual o critério utilizado para saber qual seria a causa, o real objetivo dos agentes
econômicos quando praticam preços abaixo do custo? José Frederico Marques explica que:
[...] e que é justa causa? É aquela que, embora não prevista em lei, está em
harmonia com o direito: é a causa secundum jus, aquela que lícita se
apresenta diante dos mandamentos da ordem jurídica, ou dos princípios
gerais do direito, tanto que, quem procede com justa causa, está no
exercício regular do direito. 207
A autora Paula Andréa Forgioni conclui que ao lidar com direito antitruste traz em si
uma série de dúvidas e indeterminações, assim a justificação da prática do inciso XVII do
artigo 21 da legislação antitruste pode ser comparada ao critério da razoabilidade. 208
José Cretella Junior pensa de forma diferente afirma que [...] se o vendedor vende a
mercadoria pelo “preço de custo” ocorre “prejuízo”, abaixo do preço de custo, então, o
prejuízo cresce.
209
Assim em havendo prejuízo o mercado sofrerá as conseqüências, uma
delas é a limitação da livre concorrência e a livre iniciativa.
207
MARQUES, José Frederico. Direito penal econômico – princípios sobre a interpretação de suas normas –
do conceito do monopólio. São Paulo: RT, 1985, RF 215, p. 50.
208
FORGIONI, Paula Andréa. Os Fundamentos do Antitruste. 2 ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2000, p. 364.
209
CRETELLA JUNIOR, José. Comentários à Lei Antitruste. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 79.
82
Não sendo também permitida a importação de quaisquer bens abaixo do custo no país
exportador, que não seja signatário dos Códigos Antidumping e de Subsídios do GATT, em
virtude da concorrência desleal.
Salvo justa causa comprovada, a interrupção ou redução em grande escala da
produção constitui infração da ordem econômica, não havendo duvida de que tal situação
ocorrerá por motivo escuso, tal vedação está expressa no inciso XX do artigo 21 da Lei nº.
8884/94.
Nenhuma empresa poderá, sem justa causa comprovada, cessar parcial ou totalmente
suas atividades. O que poderá ocasionar uma alta taxa de desemprego, um desequilibro de
mercado, seja na oferta, na procura ou nos preços.
A preocupação está no caso de falso fechamento da empresa, pois haverá uma
possibilidade maior de ocorrer à dominação do mercado em detrimento da ordem econômica,
caso isso realmente seja concretizado caberá a aplicação do inciso XXI com a determinação
para que retorne a atividade imediatamente, com as devidas fixações pelo descumprimento
da ordem emanada pelo CADE. 210
É vedado à retenção de bens de produção ou de consumo, exceto para assegurar os
custos operacionais:
A retenção de bens de produção ou de consumo não tem sentido num
sistema que prega a liberdade de iniciativa, a livre concorrência e a defesa
do consumidor, Salvo a exceção prevista neste inciso, a imposição da
permanência dos referidos bens só poderá gerar aumento de preço pela
diminuição da oferta, prática esta não desejada pelos competidores e pelos
administrados em geral. 211
Em relação ao inciso XXIII, quando falta ou rareia no mercado determinado bem, o
comerciante costuma vendê-lo, desde que o adquirente concorde em comprar outro ou outros
bens, ou subordinar a venda à utilização de serviço, ou ainda subordinar a prestação de um
serviço à utilização de outro serviço ou à aquisição de um bem, na verdade acaba adquirindo
um produto não desejável.
Com esse tipo de atitude dos empresários impedem a livre escolha do produto pelo
consumidor, o qual sem alternativa submete-se a vontade do empresário, sujeitando-se ao
abuso do mesmo.
210
211
Op cit, p. 86.
Op cit.
83
A imposição de preços excessivos ao público ou aumento sem justa causa o preço de
bem ou serviço, é ato contra a ordem econômica. É considerada uma pratica de extrema
deslealdade com o consumidor e seus competidores, vindo de encontro às punições da ordem
econômica. 212
Quando ocorre tal prática aumenta a inflação e com isso os preços ficam sem
parâmetros com o valor real do produto. Os aumentos abusivos decorrem de produtos que
desconhecem os fundamentos da livre iniciativa, podendo até mesmo aproveitar-se do
monopólio legal para perpetuar tal imoralidade.
Segundo José Cretella Junior as circunstâncias econômicas e mercadológicas
relevantes deverão ser consideradas na caracterização na infração da ordem econômica
consistente na imposição de preços excessivos ou de aumento injustificados de preços, que
esse inciso XXIV do artigo 21 equivale ao artigo 87, que foi alterado pelo Código de Defesa
do Consumidor, que seu artigo 39 veda ao fornecedor elevar, sem justa causa, o preços de
seus produtos ou serviços. 213
Na tipificação do delito de preços abusivos, além de outras circunstâncias econômicas
e mercadológicas relevantes, o aplicador da pena considerará o preço e sua elevação
deixando de levar em conta, como justificativas o comportamento do custo correspondentes
insumos ou a introdução de melhorias.
Não pode ser considerado como pretexto para a elevação dos preços o sucedâneo
resultante de alterações não substanciais, ainda a imposição de preços excessivos ou o
aumento injustificado de preços constitui infração da ordem econômica, independente dos
preços do produto e de serviços similares, ou sua evolução, em mercados competitivos
comparáveis.
O inciso VI do artigo 21 dispõe que não serve de justificativa ao infrator a existência
de ajuste ou de acordo que, sob qualquer forma, majore preços de bem ou serviços ou dos
respectivos custos, infração também capitulada no inciso I, acordo ente concorrentes.
De maneira que a pessoa física ou jurídica que incidir nos tipos elencados nos artigos
20 e 21 da Lei nº. 8884/94, isoladamente ou cumulativamente terá aplicada às sanções da
legislação antitruste.
Como sanção imposta pelo controle repressivo do exercício abusivo de poder
econômico pode abranger as seguintes medidas de forma isolada ou cumuladamente: ordem
de cessação de prática restritiva, prevista no artigo 53, § 5 da Lei Antitruste, imposição de
212
213
POPP, Carlyle e ABDALA, Edson Vieira. Comentários à Nova Lei Antitruste, Curitiba: Juruá, 1994, p. 87.
CRETELLA JUNIOR, José. Comentários à Lei Antitruste. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 80.
84
multa, prevista no artigo 23 da Lei nº. 8884/94, pena privativa de liberdade aos dirigentes
prevista no artigo 4º da Lei 8137/90, cisão e ordem pra a prática de ato especifico previsto no
artigo 24, inciso V, da Lei Antitruste, reparação do prejuízo e controle de preços previsto no
artigo 29 da legislação antitruste. 214
O artigo 23 define as penas que estão sujeitas os responsáveis pela prática da infração
da ordem econômica, no caso da pessoa jurídica ser apenada, após os procedimentos
administrativos adequados, a mesma sofrerá uma multa equivalente a um até trinta por cento
do valor do faturamento bruto ou no seu último exercício, excluindo-se os impostos, sendo
que a multa não poderá de qualquer forma ser inferior à vantagem obtida pelo infrator, isso
quando suscetível de quantificação.
As penas de multa são muito altas, que às vezes são consideradas “pena de morte”
para as pessoas jurídicas, pois não se pleiteia neste instante a defesa de um ramo como um
todo, mas o valor escolhido é sobremaneira pesado para a grade maioria dos empresários, os
quais atuam, muitas vezes, em legitima defesa do patrimônio, entendendo que um aumento
abusivo e injustificável de determinados produtos monopolizados gerariam o fechamento da
empresa se não houvesse uma reação por parte deste administrado. 215
O administrador será multado de dez a cinqüenta por cento do valor aplicável à
empresa, sendo essa punição de responsabilidade pessoal e exclusiva ao administrador, a
multa tem caráter personalíssimo, em caso de reincidência às multas terão seus valores
dobrados.
O artigo 24 dispõe sobre as sanções administrativas acessórias, as quais poderão ser
aplicadas isoladamente ou cumulativamente, sendo necessário à gravidade do fato e o
interesse público, o que pode levar a autoridade ordenar publicações de extrato da sanção
aplicada em jornal indicado na decisão, durante certo período, podendo ser até três semanas
consecutivas.
Além da pena de multa poderá ser imposta isolada ou cumulativamente a proibição de
celebrar contratos com instituições financeiras oficiais por prazo não inferior a cinco anos e
não poderá também o infrator da ordem econômica participa durante cinco anos de licitação
pública, junto â administração pública federal, estadual e municipal, bem como entidades da
administração indireta.
214
GOMES, Carlos Jacques Vieira Gomes. Ordem Econômica Constitucional e Direito Antitruste. Porto
Alegre: S. A. Fabris, 2004, p. 99.
215
POPP, Carlyle e ABDALA, Edson Vieira. Comentários à Nova Lei Antitruste, Curitiba: Juruá, 1994, p.
92/93.
85
A autoridade competente ordenará a inscrição do infrator no Cadastro Nacional de
Defesa do Consumidor durante determinado tempo, ainda poderá recomendar aos órgãos
públicos que ao infrator não somente seja concedida licença compulsória de patentes de
titularidade e poderá requer o cancelamento do incentivo fiscal ou subsidio público obtido,
no todo ou em parte, como, negando parcelamento de tributos federais devidos.
Para a imediata eliminação dos efeitos danosos à ordem econômica se concretize de
maneira natural, a autoridade competente providenciara a cisão de sociedade, a transferência
de controle acionário, a venda de ativos, a cessação parcial de atividade. 216
Destaca-se aqui a efetivação de tal punição sem a presença do Poder
judiciário, pois a lesão ao direito irá ocorrer com essa sanção, chocando-se
com o artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal de 1988, além de
que o mesmo artigo 5º, inciso XIX, da Constituição Federal, afirma que as
associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas
atividades suspensas por decisão judicial, insurgindo-se no primeiro caso, o
transito em julgado. 217
O artigo 25 trata de penas acessórias, no caso de continuidade das infrações que
mereceram reprimenda do plenário do CADE ou quando descumprir condição elencada na
medida preventiva ou no compromisso de cessação, impondo multa diária fixa, cujo valor
poderá ser aumentado de acordo com a situação econômica do infrator e a gravidade da
infração.
Segundo José Cretella Junior o artigo 26 retrata quatro situações que dificultam a
decisão do CADE, SDE e SPE:
Para a tomada de providências ou instauração de processo administrativo,
entidade ou órgãos – CADE, SDE, SPE, ou qualquer entidade pública –
poderão solicitar informações ou documentos ao infrator. Este é obrigado a
atender às solicitações. Em caso de recusa, omissão, enganosidade,
retardamento u recalcitrância, a infração será punida com multa fixada, a
qual para garantia de sua eficácia, poderá ser aumentada até 20 vezes, em
razão da situação econômica do infrator. 218
Na aplicação das penas estabelecidas pela legislação antitruste serão levados em
considerações alguns fatores que estão previstos no artigo 27 da referida lei. A gravidade da
infração será levada em conta o caso concreto e os efetivos danos causados ao consumidor e
216
CRETELLA JUNIOR, José. Comentários à lei Antitruste. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 95.
POPP, Carlyle e ABDALA, Edson Vieira. Comentários à Nova Lei Antitruste, Curitiba: Juruá, 1994, p. 95.
218
CRETELLA JUNIOR, José. Comentários à lei Antitruste. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 96.
217
86
à ordem econômica como um todo. No entanto é por demais subjetivo, pois a legislação não
estabelece o nível das infrações.
A boa-fé do infrator é uma condição atenuante. A vantagem realmente auferida ou
meramente pretendida também é fator de consideração no momento na aplicação da pena.
Obteve-se vantagem e esta foi quantificada, a multa aplicável jamais será menor do que a que
a perícia apurou, no caso de não ter alcançado a vantagem à multa deve manter-se no
patamar mínimo legal.
A multa será aplicada de forma proporcionalmente quando houve a consumação da
infração em relação a quando não houver a consumação, eis que a multa será menor quando
não houver a consumação da infração.
Levar-se-á em consideração o grau de lesão ou o perigo de lesão à livre concorrência,
à economia nacional, os consumidores ou a terceiros, seja a todas as hipóteses dos bens ou
destinatários que podem ser atingidos:
Poder quantificar o grau de lesão ou perigo desta será tarefa das mais
difíceis ao relator, o qual dependerá de pareceres técnicos de cada área
atingida, não podendo a aplicar o referido inciso por presunção, sob pena
de profunda injustiça ao processado. 219
A infração da ordem econômica sempre produz efeitos negativos no mercado, o que
causa dificuldade de analisar a agravante prevista no inciso VI, eis que a conduta praticada
pelo infrator deverá ser gravíssima para causar um dano ao conjunto mercadológico e
somente o governo ou o megaempresariado o serão passiveis desse agravamento ser
concretizado.
A situação econômica do infrator e a reincidência serão levadas em consideração no
momento da aplicação da multa. Carlyle Popp e Edson Vieira Abdala afirmam que “[...] De
nada adiantará uma rigorosa aplicação da lei quando não existir possibilidade de
cumprimento da mesma pelo apenado, pois não servirá de exemplo para os que vierem a
tomar conhecimento da punição ofertada, tornando-a inócua”. 220
Prescreve em cinco anos as infrações de ordem econômica, inicia-se a contagem da
data da prática do ilícito ou no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que
houver cessado a infração. A prescrição é a extinção do direito de punir do Estado, ante a sua
inércia.
219
220
Op cit, p. 99.
POPP, Carlyle e ABDALA, Edson Vieira. Comentários à Nova Lei Antitruste, Curitiba: Juruá, 1994, p. 99.
87
Pode haver interrupções no prazo da prescrição, seja qualquer ato administrativo ou
judicial que tenha por objeto a apuração de infração contra a ordem econômica ou ainda
suspende a prescrição durante a vigência do compromisso de cessação ou de desempenho.
O artigo 53 da legislação antitruste regula o compromisso de cessão, o representado
celebrará em qual fase do processo administrativo com o CADE o compromisso de cessar a
prática sob investigação, no prazo estabelecido, na fase os artigos 54 e 58 referem-se ao
compromisso de desempenho, onde o representado compromissar-se-á a praticar os atos
autorizados pelo CADE que aumentem a produtividade, melhorem a qualidade de bens ou
serviços ou propiciem a eficiência e o desenvolvimento econômico ou tecnológico, nesses
dois compromissos suspende o prazo prescricional. 221
Pode-se afirmar que à lei antitruste visa proteger e preservar a livre iniciativa e a livre
concorrência dentro de uma política de modernização da economia brasileira, de maneira que
todos sejam beneficiados, sempre visando à proteção do bem estar do consumidor.
Pois acaso não existissem as leis de proteção ao Direito de Concorrência, alguns
poucos se beneficiariam dos frutos da deslealdade para com os consumidores e concorrentes.
Toda a sociedade resultaria prejudicada com as vantagens que seriam auferidas por uma
minoria, em detrimento de muitos.
2.2
A PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR ATRAVÉS DA LEI Nº. 8078/90
O Código de Defesa do Consumidor foi fruto de uma expressa determinação
constitucional que buscou preencher uma lacuna legislativa existente no Direito Brasileiro,
onde as relações comerciais, tratadas de forma obsoleta por um Código Comercial atrasado,
que não trazia nenhuma proteção ao consumidor.
Tornava-se necessária a elaboração de normas que acompanhassem o dinamismo de
uma sociedade de massas que se formou no decorrer dos dias atuais, de acordo com o que
dispunha a Constituição de 1988 no seu artigo 5°, inciso XXXII, que prevê a proteção do
consumidor. Por sua vez, o artigo 48 do ADCT da nova Constituição determinava que,
dentro de 120 dias da sua promulgação, deveria ser elaborado o Código de Defesa do
Consumidor.
221
Op cit, p. 98.
88
Por outro lado, com a redemocratização do país, a partir da promulgação da
Constituição Federal de 1988, houve um fortalecimento das entidades não-governamentais,
fortalecendo o clamor popular por uma regulamentação dos direitos sociais, o que se fez
sentir também na criação deste corpo normativo.
Finalmente, o Código de Defesa do Consumidor foi promulgado em 1990, gerando
importantes mudanças nas relações de consumo, impondo uma maior qualidade na fabricação
dos produtos e no próprio atendimento das empresas de um modo geral.
Com a promulgação do Código de Defesa do Consumidor conferiu-se ao direito do
consumidor sua autonomia, ainda resgatando as pessoas e suas funções do processo
econômico para a ordem jurídica.
O Código Brasileiro de Defesa do Consumidor é composto por normas de ordem
pública e interesse social, visando também estabelecer condições mais favoráveis ao
consumidor, frente ao poderio econômico dos fornecedores no mercado de consumo e os
eventuais por estes cometidos. 222
Com regras de ordem eminentemente social, o Estado reconheceu no consumidor
brasileiro a hipossuficiência, procurando não limitar sua liberdade contratual, mas garantir-lhe
a autonomia privada, com o objetivo de protegê-lo dos economicamente poderosos.
O direito do consumidor, ainda que autônomo, necessita do amparo jurisdicional
desses outros ramos do direito, a fim de que os direitos considerados “fundamentais” ao
consumidor possam ser tutelados e protegidos. O consumidor quer considerado
individualmente ou como categoria, possui o direito fundamental à:
Segurança de vida e de saúde: visando-se a sua proteção contra a
comercialização de produtos perigosos ou nocivos.
Informação: visando-se a sua proteção contra práticas fraudulentas,
enganosas, falsas.
Escolha: visando-se, sempre que possível, seu acesso a variedades de
produtos e preços competitivos; e, que lhe sejam assegurados a segurança
de qualidade satisfatória e preços justos.
E, finalmente, o direito de ser ouvido: assegurando-lhe que seus interesses
sejam considerados na formulação da política governamental, e que suas
reclamações tenham tratamento justo e célere nos tribunais. 223
222
HABIBE, Taís Cruz. Cartel e conseqüências para o consumidor. Revista de Direito do Consumidor nº. 52. p.
228/229.
223
DONATO, Maria Antonieta Zanardo. Proteção ao Consumidor. Conceito e extensão. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais. 1993, p. 33.
89
No Código de Defesa do Consumidor, a proteção despendida, se reflete especialmente
no asseguramento legislativo da garantia constitucional do Estado assegurar a igualdade entre
as partes.
O tratamento paritário entre as partes, assume nuances próprios, onde se vê
sentidos de igualdade expressos, positivados, diferentemente do texto constitucional que traz
seu significado meramente formal.
Os princípios da igualdade e da liberdade norteiam o Estado Democrático de Direito,
pois, ao lado da fraternidade, conduz à configuração de um dos principais fundamentos da
República Federativa do Brasil, qual seja “a dignidade da pessoa humana”.
224
O sistema jurídico até a entrada em vigor da legislação consumeirista se mostrava
inadequado em razão de que seus fundamentos, pois era elaborado com base na presunção
das igualdades das partes contratantes e regida pela autonomia das vontades. Isso relegava o
consumidor, a um estado de vulnerabilidade e hipossuficiência na relação jurídica contratual,
motivo pelo qual o legislador da Constituição Federal de 1988, promoveu a proteção do
consumidor.
A razão de ser do Código de Defesa do Consumidor é a vulnerabilidade do
consumidor, só existindo porque o consumidor está em posição de desvantagem técnica e
jurídica em face do fornecedor, buscando sempre o restabelecimento do equilíbrio nas
relações de consumo. 225
Realmente indisfarçável a vulnerabilidade do consumidor, sendo que o mesmo é a
parte mais fraca, frágil na relação de consumo, mantida junto ao fornecedor sua proteção
maior exige a interferência do Estado nas relações privadas.
O artigo 4º do Código de Defesa do Consumidor define princípios formadores que
devem pautar a relação de consumo:
[...] reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de
consumo; ação governamental no sentido de proteger efetivamente o
consumidor; harmonização dos interesses dos participantes das relações de
consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade
de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os
princípios nos quais se funda na ordem constitucional sempre com base na
boa-fé e equilíbrio das relações entre os consumidores e fornecedores;
educação e informação de fornecedores e consumidores, quando aos seus
direitos e deveres, com vistas à melhoria do mercado de consumo;
224
BONATTO, CLAUDIO. MORAES, PAULO VALÉRIO DAL PAI. Questões Controvertidas no Código de
Defesa do Consumidor – Principiólogica, Conceitos, Contratos Atuais. Porto Alegre: Livraria do Advogado
Editora. 1999, p.30.
225
CAVALIERI FILHO, Sérgio. O direito do consumidor no limiar do Século XXI. Belo Horizonte: 2000. p. 5.
90
incentivo à criação pelos fornecedores de meios eficientes de controle de
qualidade e segurança de produtos e serviços, assim como de mecanismos
alternativos de solução de conflitos de consumo, coibição e repressão
eficientes de todos os abusos praticados no mercado de consumo, inclusive
a concorrência desleal e utilização indevida de inventos e criações
industriais das marcas e nomes comerciais e signos distintivos, que possam
causar prejuízos aos consumidores; racionalização e melhoria de serviços
públicos e estudo constante das modificações do mercado de consumo. 226
O Código de Defesa do Consumidor, primeiro tratou de dar uma definição a
consumidor, a qual está em seu artigo 2º, senão vejamos:
Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto
ou serviço como destinatário final.
Parágrafo único. Equipara-se o consumidor a coletividade de pessoas,
ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.
No entendimento de Fábio Konder Comparato “[...] consumidor é aquele que se
submete ao poder de controle dos titulares de bens de produção, isto é, dos empresários”. 227
Othon Sidou, mesmo antes da Constituição Federal de 1988 e do Código de Defesa
do Consumidor, conceituava consumidor como qualquer pessoa, natural ou jurídica, que
contrata, para sua utilização, a aquisição de mercadoria ou a prestação de serviço,
independente de modo de manifestação de vontade; isto é, sem forma especial, salvo quando
a lei expressamente a exigir. 228
Consumidor é aquele que se encontra em situação de usar e consumir, estabelecendose, por isso, uma relação atual ou potencial, fática sem dúvida, porém a que se deve dar uma
valoração jurídica, a fim de protegê-lo, quer evitando quer reparando os danos sofridos. 229
Na visão de José Geraldo Brito Filomeno, a definição de consumidor como um dos
participes das relações de consumo, que nada mais são do que relações jurídicas por
excelência, mas que devem ser obtemperada precisamente pela situação de manifesta
inferioridade frente ao fornecedor de bens e serviços. Conclui-se, pois, que toda relação de
consumo:
226
GLÓRIA, Daniel Firmato de Almeida. A livre concorrência como garantia do consumidor. Belo Horizonte:
Del Rey. 2003, p 148/149
227
COMPARATO, Fábio Konder. Estudos e pareceres de direito empresarial. Rio de Janeiro: Forense, 1980. p.
476.
228
SIDOU, Othon. Proteção ao Consumidor. Rio de Janeiro: Forense, 1977, p.2.
229
BULGARELLI Waldirio apud FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de Direitos do Consumidor. 5. ed.
São Paulo: Atlas, 2001, p.33.
91
1.
envolve basicamente duas partes bem definidas: de um lado o
adquirente de um produto ou serviço (consumidor); de outro o fornecedor
ou vendedor de um serviço ou produto (produtor/fornecedor);
2. destina-se à satisfação de uma necessidade privado do consumidor;
3. o consumidor, não dispondo, por si só, de controle sobre a produção
de bens de consumo ou prestação de serviços que lhe são destinados,
arrisca-se a submeter-se ao poder e condições dos produtores daqueles
mesmos bens e serviços.230
Em relação ao termo destinatário final o mesmo é indeterminado, necessitando de
uma interpretação lógica e voltada para a proteção do consumidor:
Destinatário final é aquele “destinatário fático e econômico” do bem ou
serviço, seja ela pessoa jurídica ou física. Logo, segundo esta interpretação
teleológica não basta ser destinatário fático do produto, retira-lo da cadeia
de produção, leva-lo para o escritório ou residência, é necessário ser
destinatário final econômico do bem, não adquiri-lo para revenda, não
adquiri-lo para uso profissional, pois o bem seria novamente um
instrumento de produção cujo preço será incluído o preço final do
profissional que o adquiriu. Neste caso não haveria a exigida “destinação
final” do produto ou serviço”. 231
A definição de consumidor prevista no artigo 2º do Código de Defesa do Consumidor
é definição ‘strictu sensu’, concentrada na idéia de “destinatário final”, e não a de bystantder
ou terceiro na relação contratual, que de alguma forma interveio ou da vítima da relação de
consumo, por sua vez o Código de Defesa do Consumidor na relação contratual, além de
definir o conceito de consumidor, ainda se utiliza do termo ‘pessoas equiparadas aos
consumidores’, que na realidade não poderiam ser qualificadas como consumidores strictu
sensu. 232
Isso porque, concentrado talvez na vulnerabilidade fática, institui o legislador
brasileiro três normas de extensão do campo de aplicação, conceituando os agentes que
considera equiparado aos consumidores, seja artigo 2º, parágrafo único, já comentado e os
artigos 17 e 29.
O artigo 17 prevê que “serão solidariamente responsáveis às empresas ou entidades
integrantes de grupo econômico, de fato ou de direito, que praticarem infração da ordem
230
FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de Direitos do Consumidor. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2001. p.34.
MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor. 3. ed. São Paulo: RT, 1999,
p.142.
232
Op cit, p. 318.
231
92
econômica”, se trata de uma relação extracontratual, que considera suas normas aplicáveis a
todas as vítimas do evento danoso causado por um produto ou serviço.
Bastando ser ‘vítima’ de um produto ou serviço para ser privilegiado com a posição
de consumidor legalmente protegido pelas normas sobre responsabilidade objetiva pelo fato
do produto presentes no Código de Defesa do Consumidor.
No entendimento de Claudia Lima Marques a finalidade da proteção é geral, como
ensina o STJ em caso de explosão de fornecedores de fogos de artifício:
Em consonância com o art. 17 do Código de Defesa do Consumidor,
equiparam-se aos consumidores da relação de consumo, vêm a sofrer as
conseqüências do evento danoso, dada a potencial gravidade que pode
atingir o fato do produto ou do serviço, na modalidade vício de qualidade
por insegurança” (STJ, 3.ª T., REsp 181.580/SP, rel. Min. Castro Filho, j.
09.12.2003).233
Através do uso ponderado do artigo 17 do Código de Defesa do Consumidor, a
jurisprudência brasileira já equiparou moradores próximos a uma refinaria por dano
ambiental resultante de acidente de consumo e produção, proprietários e locadores de prédio
desabado, consumidores desalojados por oito meses pelo desabamento do prédio ao lado,
todas as vítimas de incêndio em shopping center, o locados de shopping center que tem seu
carro furtado no estacionamento e aquele comerciante que se fere com explosão de garrafa de
cerveja. 234
O artigo 29 do Código de Defesa do Consumidor também tem a figura do
consumidor equiparado, pois tal artigo faz referências aos prejudicados e não aos
consumidores, como definido do artigo 2º, equipara todas as pessoas, determináveis ou não,
expostas às práticas nele previstas.
Assim pessoas, grupos e mesmo profissionais podem intervir nas relações de
consumo de outra fora, a ocupar uma posição de vulnerabilidade. Mesmo não preenchendo as
características de um consumidor strictu sensu, a posição dominante do fornecedor e a
posição de vulnerabilidade destas pessoas sensibilizaram o legislador e, agora, os aplicadores
da lei. 235
No caso da aplicação da vulnerabilidade em relação ao artigo 29, a mesma continua
sendo elemento essencial-superado, apenas foi o critério da destinação final, sendo que
233
Op cit, 357.
Op cit, p. 318.
235
Op cit, p. 355.
234
93
mesmo não sendo destinatário final do produto ou serviço, pode o agente econômico ou
profissional liberal vir a ser beneficiado pelas normas tutelares do Código de Defesa do
Consumidor como consumidor-equiparado. 236
O artigo 29 supera os estritos limites da definição jurídica de consumidor para
imprimir uma definição de política legislativa, parece que para harmonizar os interesses
presentes no mercado de consumo, para reprimir eficazmente os abusos de poder econômico,
para proteger os interesses econômicos dos consumidores finais, o legislador colocou um
poderoso instrumento nas mãos daquelas pessoas expostas às praticas abusivas, estas, mesmo
não sendo consumidores strictu sensu, poderão utilizar as normas especiais do Código de
Defesa do Consumidor, seus princípios, sua ética de responsabilidade social no mercado, sua
nova ordem pública, para combater as práticas comerciais abusivas. 237
Em virtude do disposto no artigo 29 do Código de Defesa do Consumidor, o
legislador brasileiro no intuito de proteger os interesses econômicos dos consumidores
concedeu um novo e poderoso instrumento (as ações autorizadas pelo CDC e sua ética de
boa-fé objetiva nas relações negociais) para que os consumidores equiparados combatam as
práticas comerciais abusivas que os lesam diretamente e que, mediatamente, prejudicam os
outros consumidores e a harmonia de mercado.
A partir da leitura conjunta entre o capítulo da proteção do consumidor e do alcance
dos conceitos, bem se verifica que a idéia é proteger o consumidor, o que já era objetivo da
Constituição Federal de 1988, porém com a promulgação da legislação os direitos e deveres
foram colocados de forma explicita clara. O referido código também objetivou proteger a
concorrência, como forma de não causar dano ao consumidor e atingir o fim constitucional
da realização da Justiça Social.
236
MARQUES, Claudia Lima, Contratos no Código de Defesa ao Consumidor. 5. ed. ver. atual. e ampl., São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 355.
237
Op cit, p. 360.
94
2.3
OS CONFLITOS ENTRE AS NORMAS
A prática dos primeiros dez anos de Código de Defesa do Consumidor demonstrou
que muitas discussões judiciais tinham como ponto central a aplicação ou não da lei protetiva
do consumidor a determinado contrato de consumo ‘sub judice’ e os conflitos de leis no
tempo.
A pluralidade de leis é um desafio para o aplicador da lei, eis que muitas delas podem
conflitar-se, havendo uma colisão entre os campos de aplicação das leis, que também é
chamado de conflitos de lei no espaço, momento em que o aplicador da lei deverá decidir
sobre a prevalência de uma lei sobre outra.
A prática nos últimos tempos demonstrou a consolidação de alguns pontos, como a
não aplicação retroativa do Código de Defesa do Consumidor a contratos assinados antes de
sua entrada em vigor, a aplicação análoga das normas protetivas do Código de Defesa do
Consumidor através das cláusulas gerais do direito comum, a não revogação do Código de
Defesa do Consumidor pelas leis especiais que regulam tipos contratuais especiais e
privilégios dos fornecedores em alguns contratos, assim como pelo próprio Código Civil de
2002.
Antigamente havia apenas três critérios para resolver os conflitos de leis no tempo,
que seria a anterioridade, especialidade e hierarquia.
O critério da anterioridade que a lei posterior será prevalente em relação à lei
cronologicamente anterior, o critério hierárquico, a norma hierarquicamente superior deve
prevalecer sobre a outra e o critério da especialização baseia-se nas idéias de leis especiais
para reger determinados assuntos ou determinados indivíduos ou grupos, pressupondo a
maior força as leis especificas em face das leis gerais. 238
A doutrina atualizada está à procura de outros critérios, seja mais harmônico e de
coordenação entre as normas do ordenamento jurídico, do que da exclusão. A solução
238
MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 4. ed., rev. atual. e ampl. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 533.
95
sistemática pós-moderna dever mais flexível, a permitir maior mobilidade e fineza nas
decisões.
No entendimento de Nathalie Sauphanor seria o uso da coerência derivado ou
restaurada, que procura uma eficiência não só hierárquica, mas funcional do sistema plural e
complexo no direito contemporâneo, a evitar a antinomia, a incompatibilidade ou a nãocoerência entre as normas. 239
Importante discorrer sobre os conflitos de leis no tempo ou antinomia de normas
legislativas aplicáveis no caso concreto, na medida em que os princípios e fundamentos da
constituição econômica são aqueles que devem orientar a conduta dos agentes econômicos no
mercado, mister se faz uma interpretação harmoniosa dos princípios da livre iniciativa, da
livre concorrência e da defesa do consumidor com as demais leis.
A interpretação pluralista da Constituição Federal de 1988 é uma proposta formulada
por Habermas em sua obra traduzida como hermenêutica constitucional, na qual ele propõe
que o processo de interpretação da Constituição tem que ser aberto e plural, no qual se leva
em consideração todos os sujeitos. Como a Constituição Federal é a norma fundamental que
rege toda a sociedade e tem como dever enquadrar-se com a realidade. E o intérprete da
mesma que deve levar em consideração aquilo que a sociedade pensa. 240
Por muito tempo, afirmou-se que, havendo relação jurídica de consumo não seria
possível a aplicação concomitante do Código Civil, do Código de Defesa do Consumidor e
da Lei Antitruste. Isso, na vigência do Código anterior, eminentemente individualista e muito
distante da proteção do vulnerável constante da Lei Consumerista.
Muitas dúvidas existiam a respeito de qual lei deveria ser aplicada, se civil ou
especial, porém atualmente ambas as leis são aplicáveis à mesma relação jurídica de
consumo e colaboram com a mesma finalidade, concorrendo, dialogando, protegendo, com
luzes e eficácias diferentes, caso a caso, mas com uma mesma finalidade, a de cumprir o
mandamento constitucional, sempre prevalecendo à lei mais favorável ao consumidor. 241
239
SAUPHANOR, Nathalie. L´Influence du Droit de la Consommation sur le systeme juridique, Paris: LGDJ,
2000, p. 23.
240
MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 5. ed, rev. atual. e ampl. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 583.
241
Op cit, p. 583.
96
Diálogo esse defendido por Claudia Lima Marques, seja “diálogo das fontes” o qual
foi preconizado por Erik Jayme:
[...] la soluciondes conflits de lois emerge comme résultat d’um dialogue
entre lês sources lês plus hétérogenes. Lês droits de l’homme, lês
constitucions, lês conventions internalionales, lês systèmes nationaux:
toutes ces sources ne s’excluent pás mutuellement; elles ‘parlent’ une à
l’autre. Lês juges sont tenus de coordonner ces sources em écoutant ce
qu’elles disent. 242
O aplicador da lei deve visar o diálogo das fontes, de forma a dar efeito útil a um
grande número de normas, privilegiando as normas narrativas, os valores constitucionais e,
sobretudo os direitos humanos. Havendo uma aplicação conjunta de duas ou mais normas ao
mesmo tempo e no mesmo caso concreto, uma complementando a outra.
Na teoria de Jayme os direitos fundamentais seriam as novas “normas fundamentais”
e estes direitos constitucionais influenciariam o novo direito limite, a ponto do direito civil
assumir um novo papel social, como limite, como protetor do indivíduo e como inibidor de
abusos. 243
O sistema de direito estruturado hierarquicamente e funcionalmente, visto hoje como
um complexo de elementos em interação coerentes ou orgânicos, de normas, princípios e
jurisprudência, conjunto de elementos diversos cuja organização e interação fornecem a toda
a ordem jurídica positiva reconhecida como tal os meios para alcançar a coerência e seu
funcionamento. 244
Assim na pluralidade de leis existentes de aplicação convergentes e flexíveis, pode
utilizar várias leis, desde que em diálogo uma com a outra, dependendo do caso concreto,
chegando assim ao melhor resultado para o consumidor.
242
ERIK, Jayme apud MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 4. ed., rev.
atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 589.
243
Op cit. p. 587.
244
SAUPHANOR, Nathalie. L´Influence du Droit de la Consommation sur le systeme juridique, Paris: LGDJ,
2000, p. 32.
97
O que ajuda o aplicador na interpretação das normas é que o código é um sistema, um
conjunto de normas ordenado segundo princípios, sendo assim não deve surpreender o fato
da própria lei indicar em seu texto os objetivos por ela perseguidos, o que, por exemplo, o
Código de Defesa do Consumidor faz em seu artigo 4º.
O CDC representa, portanto, o centro de um sistema de tutela especial do
consumidor, pois disciplina de maneira mais clara e objetiva os princípios
da nova proteção do grupo social considerado vulnerável, mas ao mesmo
tempo o CDC não exclui as demais normas protetoras dos interesses do
consumidor, ao contrário, recebe-as como normas importantes à
consecução de seus objetivos. 245
A Constituição Federal de 1988 é a lei maior, o ápice do sistema jurídico, o centro do
próprio sistema do direito brasileiro, assim pelo conceito de hierarquia das normas, pode-se
resolver o problema das antinomias, pois a Constituição Federal de 1988 determina que seus
valores e conceitos estejam presentes e são eficazes em todo o ordenamento jurídico, afinal é
através dela que são resguardados os valores mais importantes para a sociedade, é o primeiro
e o hierarquicamente o mais forte a ser considerado pelo aplicador da Lei.
Oscar Tenório ensina que “[...] a vida das normas jurídicas não é eterna; elaboradas
para as relações dos homens, em sociedade, têm o seu destino condicionado ao subtractum
social que elas disciplinam e ordenam.” 246
A antinomia no sentido original da teologia e da ciência do direito indica a
contradição, aparente ou real, entre duas leis ou dois princípios no momento da aplicação
prática e um caso concreto.
247
No entendimento de Bobbio para que exista antinomia são necessárias duas
condições, as duas normas devem pertencer ao mesmo ordenamento jurídico e devem ter o
mesmo âmbito de validade, (temporal, espacial, pessoal e material), após tais considerações
Bobbio conceitua “[...] a antinomia jurídica como aquela situação que se verifica entre duas
245
MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 4. ed., rev. atual. e ampl. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 510.
246
Op cit, p. 515.
247
Op cit, p. 516.
98
normas compatíveis, pertencentes ao mesmo ordenamento e tendo o mesmo âmbito de
validade”. 248
Para solucionar a antinomia aparente é um processo de aplicação de normas mais
brando, não como é quando se trata de conflitos de normas, aqui quando existe uma
contradição real entre normas, o aplicador preferirá uma por sua especialidade, hierarquia ou
anterioridade dando-lhe eficácia, enquanto afasta a outra norma, ao contrário do que acontece
no caso dos conflitos de normas. De maneira que o aplicador deverá dar preferência a
compatibilização das normas e aplicação simultânea das leis, na realidade aplicação do
“diálogo das fontes”.
Claudia Lima Marques conceitua o diálogo das fontes:
[...] é, pois a aplicação simultânea, compatibilizadora, das normas em
conflito, sob a luz da Constituição, com efeito útil para todas as leis
envolvidas, mas com eficácias (brilhos) diferenciados a cada uma das
normas em colisão, de forma a atingir o efeito social (e constitucional)
esperado. O ‘brilho’ maior será da norma que concretizar os direitos
humanos envolvidos no conflito, mas todas as leis envolvidas participarão
da solução concorrentemente. 249
Necessário o aplicador verificar se a contradição da norma nascerá uma
incompatibilidade que decretará a revogação da norma ou se a contradição poderá ser
resolvida através da interpretação, que seria através da antinomia aparente.
O primeiro passo para o aplicador da lei em relação ao aparecimento de uma
contradição entre normas do Código de Defesa do Consumidor e leis anteriores, gerais ou
especiais ou ainda posteriores, gerais ou especiais, deverá inicialmente verificar se é possível
a compatibilização entre as duas normas, pretensamente sem contradição, desde que a
aplicação das duas normas seja possível ao mesmo tempo, desaparecerá a antinomia.
248
BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 10. ed.
1999, p. 88.
249
MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 4. ed., rev. atual. e ampl. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 519.
99
Hodiernamente diante da complexidade do sistema jurídico a jurisprudência foi a
solução para a convivência e aplicação simultânea das leis especiais e do Código de Defesa
do Consumidor e do Código Civil.
Pois a preocupação do direito é a legitimidade da solução, pois todas as normas de
conflito são “válidas” e devem ter alguma eficácia, mesmo que auxiliar. O diálogo das fontes
é, pois a aplicação simultânea, compatibilizadora, das normas de conflito, sob a luz da
Constituição Federal de 1988, com efeito útil para todas as leis envolvidas, mas com
eficácias diferenciadas a cada uma das normas de colisão, de forma a atingir o efeito social e
constitucionalmente esperado. 250
Não havendo solução clara sugere-se a utilização da Constituição, que como guia
máximo do sistema poderá fornecer valores e linhas da razoabilidade para a escolha a ser
efetuada pelo aplicador da lei.
A defesa dos interesses dos consumidores não se desvincula do principio instrumental
da livre iniciativa e consequentemente da livre concorrência, corolário daquele, os princípios
da defesa do consumidor, da livre iniciativa e da livre concorrência devem ser interpretados
de forma harmônica, dentro do contexto constitucional.
A convergência de princípios entre o Código de Defesa do Consumidor e o código
Civil é a base da inexistência principiólogica de conflitos possíveis entre estas leis que com
igualdade ou equidade, visam a harmonia nas relações civis e nas de consumo.
No entendimento da Ministra Eliana Calmon o Código de Defesa do Consumidor é
diploma legislativo que já se amolda aos novos postulados, inscritos como princípios éticos,
tais como, boa-fé, lealdade, cooperação, equilíbrio e harmonia das relações.
251
Portanto não
existirão conflitos de princípios entre as duas leis, apenas conflitos de normas ou antinomias.
O campo de aplicação do Código de Defesa do Consumidor é especial, regulando a
relação de consumo, já a aplicação do Código Civil é geral, regulando toda a relação privada
não privilegiada por legislação especial.
250
MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 5. ed., rev. atual. e ampl. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 603/604.
251
CALMON, Eliana. As gerações dos direitos e as novas tendências. Revista de Direito do Consumidor.
jul/set., 2001, p. 41.
100
Pois não foi incorporada a matéria de proteção ao consumidor no Código Civil, a
proteção existente no código é geral e não especifica ao consumidor, motivo que o Código
Civil respeita a lei especial de tutela dos direitos dos consumidores.
De maneira que não é Código de Defesa do Consumidor que limita o Código Civil, é
o Código Civil que dá base e ajuda o Código de Defesa do Consumidor, e se o Código Civil
for mais favorável ao consumidor do que o Código de Defesa do Consumidor não será esta
lei especial que limitará a aplicação da lei geral, mas sim a dialogará a procura da realização
do mandamento constitucional de proteção especial do sujeito mais fraco. 252
Cada norma será preservada para atuar em seu campo de aplicação, mas, se em caso
concreto se encontrarem, ambas serão teoricamente aplicáveis ao caso, cabendo ao intérprete
a escolha da norma competente para regular aquela matéria, de acordo com Bobbio a “[...]
mais justa para o caso”. 253
Tendo em vista o caráter de lei especial geral do Código Civil e de lei especial do
Código de Defesa do Consumidor, as disposições daquele que são convergentes ou
complementares com as deste em nada prejudicarão o consumidor, poder ser eventualmente
aplicadas supletivamente em seu beneficio, as disposições divergentes não serão aplicáveis
ao consumidor, também em razão da especialidade do tema. 254
Atualmente tem-se feito uma interpretação sistêmica entre o Código Civil, Código de
Defesa do Consumidor e Legislação Antitruste entende-se que os três sistemas não se
excluem, mas se complementam, para a melhor solução do caso concreto, é necessário que o
legislador se atenha também aos princípios da proporcionalidade e da razoalibidade para
depois fazer a melhor escolha da legislação para ser aplicada ao caso.
252
MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 4. ed., rev. atual. e ampl. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 504.
253
Op cit.
254
PASQUALOTTO, Adalberto. O Código de defesa do consumidor em face do novo Código Civil. Revista de
Direito do Consumidor. n 43. p.110.
101
3
ESTRUTURAS E DESVIOS DE MERCADO
Importante esclarecer que mercado entende-se como um local ou contexto em que
compradores e vendedores de bens, serviços ou recursos estabelecem contato e realizam
transações. O lado dos compradores é constituído tanto de consumidores que são
compradores de bens e serviços quanto de empresas, que são compradoras de recursos
utilizados na produção de bens e serviços. 255
O consumidor conhece mercado como sendo um lugar geográfico, como uma feira
livre, um lugar específico, onde vendedores e compradores se encontram para trocarem seus
produtos.
A função principal de mercado reside na manutenção do intercâmbio entre os diversos
produtores e entre estes e os consumidores, desempenhando, portanto, no sistema de livre
concorrência, a função mecânica de fixador de preços. 256
Fábio Nusdeo coloca que um pressuposto básico do sistema de mercado,
imprescindível para lhe assegurar o pretendido automatismo e adaptabilidade a condições
mutantes, vem a ser o da chamada atomização, isto é, o mercado para bem funcionar deve ser
composto por um número razoavelmente elevado de compradores e vendedores em interação
recíproca, e nenhum deles muito grande e muito importante. 257
No entanto o mercado pode ser abalado em razão de simulações, fraudes, monopólio
e outros que podem afetar o equilíbrio entre as ofertas e procura e entre os preços.
A concentração econômica representa uma falha no mercado a inibir os mecanismos
decisórios e controladores do mercado. Em um mercado concentrado, a alta de preços
proveniente de um aumento da procura não necessariamente levará a um aumento da oferta,
pelo simples fato de ser mais fácil para as poucas unidades nele atuantes conluiarem-se e
elevarem mais o preço, por outro lado, estes poderão também subir, por iniciativa dos
vendedores conluiados, sem qualquer relação com um a possível elevação da procura. 258
A concentração econômica representa uma falha na estrutura dos mercados, que
correspondem a uma situação nas quais os seus pressupostos de funcionamento não se fazem
255
PASSOS, Carlos Roberto Martins e NOGAMI Otto, Princípios de Economia. 3. ed. São Paulo: Segmento &
Co. Produções Gráficas Ltda. 200, p. 16.
256
BARROS, Buys de apud GASTALDI, J. Petrelli. Elementos de economia política. 16. ed. São Paulo: Saraiva,
1995, p. 186.
257
NUSDEO, Fabio. Curso de econômica: Introdução ao Direito Econômico. 3. ed.rev. atual. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2001, p. 146.
258
Op cit.
102
presentes, tornando-o inoperacional. Podem-se classificar as estruturas de mercado para o
setor de bens e serviços da seguinte forma: concorrência perfeita, concorrência imperfeita ou
monopolística, oligopólio, olipsônio, monopólio e monopsônio.
3.1
CONCORRÊNCIA PERFEITA E IMPERFEITA
A concorrência perfeita é uma situação de mercado na qual o número de compradores
e vendedores é tão grande que nenhum deles, agindo individualmente, consegue afetar o
preço. Além disso, os produtos de todas as empresas no mercado são homogêneos.
259
Referida estrutura de mercado visa descrever o funcionamento ideal de uma economia.
O autor Fabio Nusdeo fornece vários requisitos para a caracterização da concorrência
perfeita, senão vejamos:
a) grande número de compradores e de vendedores em interação
recíproca;
b) nenhum deles suficientemente importante a ponto de exercer qualquer
influencia nas condições de compra ou de venda do produto em questão
(atomização de mercado);
c) homogeneidade do produto objeto das operações;
d) plena mobilidade dos agentes operadores e de seus fatores, isto é,
facilidade de acesso ao mercado e de retirada dele por parte de qualquer
interessado;
e) pleno acesso dos operadores a todas as informações relevantes;
f)
ausência de economias de escala;
g) ausência de economias externas.260
Descrevendo a concorrência perfeita como modelo referencial, precisam-se examinar
as regras de que resulta sua avaliação como protótipo de eficiência social. A primeira é a
forma como se apresenta a função procura para uma empresa perfeitamente competitiva. A
segunda é a demonstração de que a maximização do lucro (no sentido de máximo beneficio
atingível pelo produtor) não é conflitante, na concorrência perfeita, nem com o máximo
beneficio do consumidor nem com a alocação ótima dos recursos, do ponto de vista dos
interesses da sociedade como um todo. O terceiro é comparar as condições de equilíbrio assim
259
PASSOS, Carlos Roberto Martins e NOGAMI Otto. Princípios de Economia. 3. ed. São Paulo: Segmento &
Co. Produções Gráficas Ltda. 2001.p. 228.
260
NUSDEO, Fabio. Introdução ao Direito Econômico. 3. ed.rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2001, p. 263.
103
estabelecidas com o que se verifica na realidade dos mercados. Após se deduzirão regras para
intervenção corretivas e para exceções que atendem a outros requisitos de eficiência em escala
social. 261
Segundo José Paschoal Rossetti:
[...] pelos pressupostos teóricos que regem o modelo de concorrência
perfeita, nenhuma empresa, isoladamente considerada, tem condições para
exercer quaisquer formas de controle ou de manobras especulativas que
impliquem alterações nos preços vigentes. A empresa perfeitamente
competitiva submete-se aos resultados do livre jogo das forcas de mercado
– determinados pela interação de um grande número de compradores e de
vendedores, que não têm qualquer poder para promover mudanças
substantivas no preço de equilíbrio. 262
A subordinação de todos os agentes aos preços ditados pelo mercado é uma
decorrência natural de suas diminutas taxas de participação nas vendas e nas compras totais.
As parcelas do abastecimento do mercado ou das aquisições são tão pequenas, tanto para a
empresa como para os consumidores, que nenhum deles reúne qualquer condição para operar
a preços minimamente divergentes dos estabelecidos pelo mercado. 263
A concorrência perfeita corresponde ao modelo onde são muitos os vendedores e
muitos os compradores e, isoladamente, nenhum deles tem o poder suficiente para dominar o
mercado, porém à idealização desta descrição opõe-se a realidade da vida. 264
No entendimento de Luis Solano Cabral de Moncada a concorrência perfeita, seja a
homogeneidade dos produtos, atomocidade do mercado, mobilidade dos fatores de produção e
transparência de preços, corresponde a um tipo ideal de mercado, o que não se verifica na
prática de nossos dias. 265
No pensamento de Sérgio Varella Bruna:
No modelo de concorrência perfeita, o produtor, é, por acaso, dizer, um
escravo do mercado: incapaz de nele influir, mas por ele absolutamente
controlado; forçado a produzir, em conjunto com seus concorrentes, tanto
quanto seja possível, a fim de reduzir a escassez no mínimo, segundo
possibilidades econômicas materiais existentes. Sua remuneração é a maior
possível, o mínimo necessário para que ele se mantenha em atividade.
Ganancioso, porque procura elevar seu lucro ao máximo, é uma fera
261
ROSSETTI, José Paschoal. Introdução à Economia. 18. ed. reest. atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2000, p.
487.
262
Op cit.
263
Op cit, p. 488.
264
PETTER, Lafayete Josué. Princípios constitucionais da ordem econômica: o significado do art. 170 da
Constituição Federal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 222.
265
MONCADA, Luis Solano Cabral de. Direito Econômico. 2. ed. Coimbra: Editora Coimbra, 1988, p.314.
104
enjaulada, enclausurada pelas
inexoravelmente pelo mercado. 266
barreiras
intransponíveis
impostas
De maneira que uma empresa qualquer, isoladamente considerada, não consegue
vender por um preço superior ao de equilíbrio, por duas razões: a primeira é o perfeito
conhecimento de todos os participantes das condições em que o mercado está operando; a
segunda é o grande número de outras empresas dispostas a vender pelas condições vigentes. E
o mesmo se pode dizer dos compradores: isoladamente, nenhum tem condições para forçar os
preços para baixo. 267
E, tanto de um lado como de outro, não são admissíveis coalizões para semelhantes
propósitos, pelo simples fato de que, existindo quaisquer formas de agrupamentos
conspirativos de agente individuais, para imposição de quaisquer condições, o modelo se
desvia das hipóteses que definem a concorrência perfeita. Em contrapartida, ao preço de
equilíbrio não há quaisquer limitações para quantidades que cada agente decida vender ou
comprar. Isto porque, por maiores que sejam essas quantidades, elas ainda serão pequenas,
por definição, para abalar o equilíbrio de mercado estabelecido. 268
Percebe-se que a concorrência perfeita está longe de ser atingida, embora seja um ideal
a ser alcançado, porém na busca de melhor posição é que se deve ter cuidado para não se
afastar dos limites à livre concorrência, devendo respeitar os direitos consagrados sob pena de
incorrer na prática de ato abusivo que venha a caracterizar a concorrência desleal, o que é
reprimido pela legislação legal.
Em se tratando de deslealdade vale transcrever as palavras de Túlio Ascarelli, senão
vejamos:
Para poder jugar se requiere no hacer trampa; el mismo principio de la
libre concurrencia exige que las modalidades de la concurrencia em le caso
concreto no choquem con la justificación de la liberdad de concurrencia,
eto es, con la posibilidad, que ésta tiende a garantizar, del triunfo de los
mejores, juzgados por los consumidores a través de la preferência
manifestada por determinados bienes en la satisfacción de sus necesidades.
Por ello, ell principio general de la liberdad de ejercicio de la
actividade privada y de la consiguinte libertad de concurrencia va siendo
flanqueada por la disciplina de la concurrencia desleal, esto es, por la
represión legal de aquellas modalidades de concurrencia, de aquellos actos
de concurrencia, en contraste con la finalidad misma que la justifica. 269
266
BRUNA, Sérgio Varella. O poder econômico e a conceituação do abuso em seu exercício. 1. ed. 2. tir. – São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001, p.31.
267
ROSSETTI, José Paschoal. Introdução à Economia. 18. ed. reest. atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2000, p.
488.
268
Op cit, p. 487/488.
269
ASCARELLI, Túlio. Teoria da la concurrencia y de los biens inmateriales. Barcelona: Bosch. Casa Editora.
1970, p. 37/38.
105
A concorrência perfeita é a que mais de destaca, sendo esta concepção mais teórica
segundo a doutrina econômica, porque os mercados altamente concorrenciais existentes, na
realidade, são apenas aproximações desse modelo, eis que, em condições normais, sempre
parece existir algum grau de imperfeição que distorce o seu funcionamento. 270
No caso da estrutura da concorrência perfeita, é praticamente impossível que a
empresa tenha condições de exercer alguma influência sobre a formação e o controle do
preço.
Total subordinação da empresa aos preços ditados pelo mercado
advém, ademais, de sua limitada participação nesse mesmo mercado.
A parcela do abastecimento do mercado proporcionada pela empresa
perfeitamente competitiva é tão diminuta, e o número de concorrentes, tão
elevado, que a empresa não reúne qualquer condição para vender sua
produção a preços superiores aos determinados pelo livre jogo de seus
preços para níveis inferiores. Como o volume de sua participação é
insignificante, a empresa poderá vender a quantidade que desejar desde que
se subordine aos preços vigentes. 271
Devido ao surgimento das grandes empresas, ao desenvolvimento do comércio, à
diferenciação dos produtos, às campanhas publicitárias e à dificuldade para o
estabelecimento de novas empresas, entre outros fatores, a concorrência perfeita é
praticamente impossível. 272
Em sentido oposto existiriam os mercados imperfeitamente competitivos, onde apesar
de a concorrência ocorrer entre produtos e compradores, suas condições não são ideais, pois
faltam os pressupostos dos mercados perfeitamente competitivos.
No mundo real não há perfeição, os mercados reais são mais ou menos imperfeitos.
273
Na concorrência imperfeita, os vendedores podem influenciar os compradores e o fazem
através de uma publicidade maciça e da diferenciação de produtos. 274
Na concorrência imperfeita os bens e serviços não são totalmente homogêneos, a
mobilidade dos fatores de produção está longe de ser completa, as unidades de produção não
tem dimensão semelhante, de modo que algumas delas influenciam o mercado e as variações
270
NUSDEO, Fabio. Curso de econômica: Introdução ao direito econômico. 3. ed.rev. atual. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2001.p. 194/196.
271
ROSSETTI. José Paschoal. Introdução à Economia. 14. ed. São Paulo: Atlas, 1990, p, 277/278.
272
DEL MASSO. Fabiano. Direito Econômico. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p137.
273
CHAMBERLIN. Edward Hasting. Teoria de la Competência Monopólica. Tradução de Crsitobal Lara
Bautell e Victor L. Urquidi. México: Fondo de Cultura Econômica. p. 15.
274
GLÓRIA, Daniel Firmado de Almeida, A livre concorrência como garantia do consumidor. Belo Horizonte:
Del Rey; FUMEC, 2003, p. 57.
106
dos preços não correspondem sempre à variação das preferências dos consumidores e
produtores. 275
Esse regime caracteriza-se pela existência de um número bastante grande de
compradores e vendedores, porém em relação aos requisitos encontrados na concorrência
perfeita não são os mesmos aqui encontrados, seja a homogeneidade dos produtos
negociados no mercado.
Como compradores e vendedores não se encontram atomizados nem atuam
exclusivamente em função do preço, objetivamente fixados por um mercado único, a procura
não apresenta fluida, mas sim viscosa, ou seja, determinados consumidores estão jungidos a
determinados fornecedores, seja em função de sua localização física, seja pela preferência pó
determinada marca, seja em virtude de publicidade, seja por qualquer outro motivo. 276
Na concorrência imperfeita existe a possibilidade de uma empresa atuar não em um,
mas em vários mercados que são discriminados em função do processo de diferenciação do
produto, ainda relevante ressaltar que quanto mais imperfeita for à concorrência mais difícil
se torna a interligação entre os compartimentos do mercado e, em cada um deles, os
vendedores desfrutarão de uma posição próxima à de um monopolista. Daí ser o regime
também chamado de concorrência monopolísticas, pois em alguns casos mais extremos, a
possibilidade competitiva dentro de cada segmento tornou-se muito remota. 277
Na concorrência imperfeita a qual também é chamada de concorrência monopolista,
as empresas produzem produtos diferenciados, porém com substitutos próximos, por
exemplo, as empresas de diferentes tipos de cigarros, sabonete ou refrigerantes.
278
Nesse tipo de estrutura o consumidor tem várias opções semelhantes para o consumo,
de maneira que conseguem fugir do aumento dos preços, ainda igualmente a concorrência
perfeita não existe barreiras para a entrada de novas empresas.
3.2
MONOPÓLIO E OLIGOPÓLIO
No monopólio o setor é a própria empresa porque existe um único produtor que
realiza toda a produção, de maneira que a oferta da empresa é a oferta do setor e a demanda
da empresa é a demanda do setor. 279
275
MONCADA, Luis Solano Cabral de. Direito Econômico. 2. ed. Coimbra: Editora Coimbra, 1988, p.314.
NUSDEO, Fabio. Curso de econômica: Introdução ao direito econômico. 3. ed.rev. atual. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2001, p. 265.
277
Op cit, p. 266/267.
278
PINHO, Diva Bernardes. Manual de Economia. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 188.
276
107
Monopólio significa exclusividade ou privilégio de venda, representa uma distorção
da livre concorrência ou do livro jogo entre a oferta e a procura.
280
A supressão de uma
atividade do regime de livre iniciativa, imposta pelo Estado, em beneficio do interesse
coletivo.
Uma estrutura de mercado caracterizada como de monopólio pode ser imaginada
como sendo gerada a partir do seguinte conjunto de hipóteses:
I – o setor é constituído de uma única firma;
II – a firma produz um produto para o qual não existe substituto próximo;
III – existe concorrência entre os consumidores;
IV – a curva de receita média é a curva de demanda do mercado. 281
O monopólio pode ser definido com o extremo oposto da concorrência perfeita. A
primeira condição para que se configure um caso atípico de monopólio é a existência de
apenas uma empresa, que domina, conseqüentemente, do extremo da oferta atomizada, típica
da concorrência perfeita, se vai para outro extremo, o da oferta concentrada em apenas um
produtor. 282
Mas não basta essa condição, pelo menos outras duas são imprescindíveis: a
inexistência de substitutos para o produto da empresa monopolista e a interposição de
barreiras à entrada de concorrentes.
Havendo substitutos para o produto, descaracteriza-se a situação de monopólio puro. E
se as barreiras forem baixas e facilmente transponíveis, o poder de monopólio fica reduzido,
notadamente quando à fixação de preços: o monopolista, vulnerável ao ingresso de
concorrentes, manterá os preços baixos como diretriz estratégica para desestimular possíveis
entrantes em seu mercado.
Os monopólios configuram-se pela unicidade do produtor, pela insubstitutibilidade do
produto e por intransponíveis barreiras de entrada. Em decorrência disso, sendo a única
supridora do mercado, a empresa monopolista não possui concorrentes diretos e, em casos
extremos e puros, até concorrentes indiretos não existem ou se encontram tão longe de
substituírem a oferta monopolizada que se consideram desprezíveis. Sem substitutos para seu
produto, ela domina inteiramente o mercado. 283
Monopólio corresponde segundo Fábio Nusdeo:
279
PINHO, Diva Benevides. Manual de Economia. 4 ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 191/202.
GASTALDI, J. Petrelli. Elementos de EconomiaPolítica. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p.191 e 212.
281
PINHO, Diva Benevides. Manual de economia. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 183.
282
ROSSETTI, José Paschoal. Introdução à Economia. 18. ed. reest. atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2000, p.
502.
283
Op cit.
280
108
Corresponde a uma situação na qual apenas uma pessoa ou uma empresa se
apresenta como vendedora de um dado produto. Manifesta-se aqui em toda
a sua plenitude o poder econômico, pois o monopolista está em condições
de atuar simultaneamente nas duas variáveis que caracterizam a compra e
venda, isto é, o preço e a quantidade. Pode, por conseguinte, reduzir a
quantidade oferecida, criando destarte uma sensação de escassez e, ao
mesmo tempo, fixar o seu preço tão alto quanto possível. Este preço tão alto
quanto possível será aquele que multiplicado pela quantidade que os
compradores estejam dispostos a adquirir assegure para o monopolista uma
receita bem superior ao seu custo, pois, nesse caso, evidentemente, seus
lucros estarão maximizados. 284
Monopólio é o domínio da oferta ou da procura por uma única entidade ou um único
sujeito econômico. Os preços resultantes dos monopólios são decorrências da imposição e não
do livre jogo da oferta e da procura, em mercado prefeito, onde impere a livre concorrência.
Sendo que subentende atividade lucrativa exclusiva de um indivíduo ou de um grupo
de indivíduos, os quais fixam os preços conforme as suas vontades, porquanto, em geral, os
monopolistas se encontram livres das pressões decorrentes da quantidade oferecida ou
procurada a influir nos preços e a instigar, no mercado, os que nele comparecem. 285
Explica que os custos unitários de uma única empresa, em determinado nível
absorvível pelo mercado, são decrescentes à medida que sua produção aumenta, seguindo essa
tendência até alcançar toda a produção do mercado. Seus custos em regime de monopólio são
assim inferiores àqueles em que incorreriam várias empresas, individualmente, num mercado
competitivo, pois a alta proporção dos custos fixos exige a produção em grande escala, e o
mercado somente absorve a oferta de uma empresa nesse nível de produção, conclui que
seriam, pois as próprias condições estruturais-tecnológicas desses setores a impedirem a sua
organização em regime de concorrência. 286
Nessas condições, diversos setores antes vistos como monopólios naturais passaram a
comportar mais recentemente algum grau de concorrência e, portanto, foram considerados
passíveis de se organizarem por parâmetros do mercado, sujeitos, porém, a uma meticulosa
regulamentação estatal, atenta às suas características próprias como se deu no Brasil, com a
criação de agências reguladoras especiais: Agência Nacional de Energia Elétrica – Aneel e a
284
NUSDEO, Fabio. Introdução ao Direito Econômico. 3. ed.rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2001, p. 269.
285
GASTALDI, J. Petrelli. Elementos de economia política. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 212.
286
Op cit.
109
Agência Nacional de Telecomunicações – Anatel, para os setores de energia elétrica e
telecomunicações, respectivamente, além da Agência Nacional de Petróleo – ANP. 287
Foram, assim, estabelecidas regras de organização com vistas à implantação, naqueles
setores, de um regime concorrencial, na medida permitida pelas suas condições estruturais e
tecnológicas.
Oligopólio constitui uma estrutura de mercado nas economias capitalistas que se
caracteriza pela existência de reduzido número de produtos e relativamente poucos
vendedores fabricando bens que são substitutos próximos entre si.
A noção fundamental subjacente ao oligopólio é a da interdependência econômica, de
forma que se todos os produtores são importantes, ou possuem uma faixa significativa do
mercado, as decisões sobre o preço e a produção de equilíbrio são interdependentes, porque a
decisão de um vendedor influi no comportamento econômico dos outros vendedores. É uma
estrutura de mercado cada vez mais comum que prevalece no mundo ocidental, inclusive no
Brasil, por exemplo, na indústria e no transporte aéreo e rodoviário, nos setores químico e
siderúrgico, entre outros. 288
Paralelamente à concorrência monopolística, a qual é caracterizada por diferenciação
de produto, o oligopólio funciona quase na mesma estrutura, com a ressalva de que nos
sistemas oligopolísticos são poucas empresas explorando o mercado.
Por sua vez o oligopólio consiste no regime na qual a oferta está concentrada nas
mãos de poucos, cita ainda como exemplo a indústria automobilística.
289
Grandes empresas
controlando significativa parcela do mercado, esmagando a concorrência tendo enorme poder
de mercado.
Os comportamentos típicos dos oligopolistas seria a diferenciação entre produtos e a
manutenção de participações estáveis de mercado. Em conseqüência da ausência da
competição do preço, as diferenças entre os participantes no mercado dever ser estabelecidos
e os estímulos aos consumidores devem ser dados através de diferenciação dos produtos. 290
Esse modelo em especial, exige um exercício bastante forte das autoridades de defesa
da concorrência, eis que ao analisar a conduta racional dos agentes econômicos atuantes
nesse mercado, poder-se-á estar diante de um caso altamente competitivo, apesar das
287
NUSDEO, Fabio. Introdução ao Direito Econômico. 3. ed.rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2001, p. 271.
288
TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. 2 ed. Editora Método, São Paulo: 2006, p.
197-198.
289
NUSDEO, Fábio. Curso de economia: introdução ao direito econômico. São Paulo: RT, 1997, p. 307/308.
290
FILHO, Calixto Salomão, Direito concorrencial – As Estruturas – 2 ed. São Paulo: Malheiros Editores.
2002, p. 137.
110
oligopolização, ou seja, do reduzido número de competidores, como também deparar com
uma situação quase de monopólio, em que poucos agentes, por meio de práticas colusivas,
restringirem ao máximo a concorrência.
3.3
OLIGOPSÔNIO E MONOPSÔNIO
O oligopsônio considera-se um tipo de competição imperfeita, é o mercado em que
existem relativamente poucos compradores, que dominam o mercado e muitos vendedores.
Os oligopsonistas tem poder de mercado, devido ao fato de poderem influenciar os
preços de determinado bem, variando apenas a quantidade comprada. Os seus ganhos
dependem da elasticidade da oferta. Seria uma situação intermediária entre a de monopsônio
e a de mercado plenamente competitivo.
Oligopsônio na realidade não passa de um oligopólio de compras, a situação na qual
poucos compradores se defrontam em vendedores atomizados, ainda o lucro dos
oligopsonistas provém do controle da procura e não da oferta, e toda a sua estratégia terá por
objetivo pagar um preço menor daquele que se estabeleceria em regime de concorrência pura
ou quase pura.291
Sebastião Calixto Filho argumenta que uma estrutura oligopsônista implica um alto
risco, pois aumenta em muito a probabilidade de comportamento paralelo por parte dos
oligopsonistas no mercado de vendedor de seu produto final. 292
A atitude do monopsonista será quase sempre a de retardar as suas compras tanto
quanto possível, a fim de forçar os vendedores a lhe entregar o produto a um preço mais
baixo.293
O monopsônio é caracteriza péla existência de muitos vendedores e um único
comprador, sendo que essa estrutura pode prevalecer no mercado de trabalho, como no caso
de empresa que se instala no interior e por ser única, tornar-se demandante exclusiva da mão291
NUSDEO, Fábio. Curso de economia: introdução ao direito econômico. São Paulo: RT, 1997, p. 268/269.
Op cit, p. 147.
293
NUSDEO, Fábio. Curso de economia: introdução ao direito econômico. São Paulo: RT, 2001, p. 271.
292
111
de-obra local, não deixando outra opção para os trabalhadores senão trabalhar no
monopsônio. 294
Fábio Nusdeo cita como exemplo o caso de abatedouro de aves, sendo o mesmo o
único a operar numa dada região, caso ele retarde as suas compras, poderá levar os granjeiros
a situações insustentáveis, pois é sabido que as aves têm um momento certo para serem
abatidas, passado do qual elas não mais convertem ração em peso, pelo menos na proporção
que compense a espera, motivo que os granjeiros são obrigados a entregar pelo preço
proposto pelo dono do abatedouro.295
No caso dos oligopsônios e monopsônios o raciocínio é muito parecido com os do
monopólios e oligopólios, porém o agente monopsionista ou oligopsionista detém essa
posição em outro patamar da estrutura de mercado, nomomento de adquirir produtos ou
serviços de fornecedores para repassar ao consumidor final e não propriamente no momento
da oferta do produto ou serviço ao conumidor final.296
Esses desvios de mercado descritos nesse tópico vem sendo combatidos tanto
legislação constitucional, bem como as infraconstitucionais, que tem o poder de combater e
reprimir o abuso de poder econômico e de mercado.
3.4
CARTÉIS, TRUSTE E DUMPING
As regras para um efetivo funcionamento do mercado baseiam-se na participação
concorrencial de diversos fornecedores sempre em busca de melhores tecnologias para seus
produtos ou serviços, com o objetivo de conquistar o mercado consumidor.
No entanto tal ideal nem sempre se verifica na prática, em razão dos agentes
econômicos, muitas vezes preocupados apenas com o aumento de lucros, podem restringir ou
eliminar a concorrência, através de acordos ou compromissos para combinar preços ou
294
PINHO, Diva Bernardes. Manual de Economia. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 189.
NUSDEO, Fábio. Curso de Economia: introdução ao direito econômico. São Paulo: RT, 2001, p. 273.
296
BAGNOLI, Vicente. Direito Econômico. 2. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2007, p. 138.
295
112
diminuir o padrão de qualidade de determinado bem ou serviço, cujo custo pode ser alto
demais, sempre com o objetivo de majorar as receitas. 297
Sendo que os cartéis constituem a mais deletéria infração às normas de defesa da
concorrência, a conduta que traz maior prejuízo ao ambiente competitivo e atinge mais
diretamente o consumidor.
O cartel representa um livre convênio entre empresas da mesma categoria econômica
e independentes entre si, que objetivam uma finalidade monopolista, pelo domínio de
mercado, eliminado a mútua concorrência, derivada da luta pela colocação de produtos
similares. 298
Torna-se importante trazer a baila, para uma melhor compreensão do instituto, o
conceito atribuído por Neide Terezinha Malard que:
O cartel é constituído por um grupo de empresas que disputam o mesmo
mercado, na condição de concorrentes, sujeitas às leis da livre concorrência
buscando a preferência dos consumidores no preço e na qualidade de seus
produtos. A partir de um dado momento, verificam que podem obter lucros
mais elevados se fixarem em preço único para seus produtos ou dividirem
os mercados consumidores, ou ainda, se estabelecerem uma estratégia
conjunta para explorar suas atividades. 299
Nos cartéis, as empresas coligadas, embora visando objetivos monopolísticos,
continuam livres e independentes economicamente e juridicamente, portanto cada empresa
conserva sua personalidade jurídica, embora sejam interdependentes entre si, sendo seu
principal objetivo regularizar a produção. 300
Um dos objetivos mais comuns das empresas cartelizadas é a maximização de seus
lucros, porém tal ajuste entre as empresas concorrentes coloca os consumidores em posição
de desvantagem, pois os fornecedores passam a deter o controle dos preços e da qualidade
dos produtos, bem como as informações, das condições de fornecimento, do pagamento, etc.,
motivo em que num mercado cartelizado, os preços sejam elevados e a oferta uniforme entre
os agentes.
297
HABIBE, Taís Cruz. Cartel e conseqüências para o consumidor, Revista de Direito do Consumidor. n. 52.
São Paulo: RT, out. – dez. 2004, p. 249.
298
GASTALDI, J. Petrelli. Elementos de economia política. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 163/164.
299
MALARD, Neide Terezinha apud BASTOS, Aurélio Wander. Estudos Introdutórios de direito econômico.
Brasília: Brasília Jurídica, 1997. p. 65.
300
GASTALDI, J. Petrelli. Elementos de Economia Política. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 64.
113
Os acordos na maioria das vezes são feitos de forma ‘oral’, raras vezes são feitos sob
a forma de contrato, geralmente através de reuniões secretas, onde combinam como irá agir,
motivo em que é difícil provar a existência do cartel.
Verifica-se também não ser necessária a existência de poucos competidores para que
ocorra a cartelização de determinado setor da economia, apesar de ser mais fácil e comum
que acordo ou conduta uniforme se materialize em mercados oligopolizados, atentando-se,
no entanto, para o fato de que, quanto maior o número de concorrentes em determinado setor
cartelizado, mais fácil torna-se a quebra do acordo por aparte de algum deles. Motivo que se
conclui que um setor economia, que se encontra concentrado, tende a favorecer a conduta
concertada entre os competidores. 301
O cartel somente será punido pela legislação antitruste se a conduta for hábil a
produzir em um dos efeitos do artigo 20 da referida legislação, pois caso não seja, não há que
se falar em punição.
Paula Andréa Forgioni explica que a tradicional definição de cartel para o contexto da
legislação antitruste, se deve concluir que se um acordo não restringe a livre concorrência ou
não acarreta a incidência de qualquer inciso do artigo 20 da referida lei, não há que se falar
na existência de cartel, pois a associação não traz, em si, qualquer efeito anticompetitivo que
interesse à proteção da ordem econômica. 302
Por exemplo, a situação hipotética de algumas empresas que atuem nomes mo
mercado relevante material e geográfico e que se reúnem com o objetivo de aumentar e
nivelar os preços dos seus produtos para maximizar os lucros (art. 21, I). Ainda o aumento de
preços consistente em uma conduta comercial uniforme (art. 21, II), sendo capaz, inclusive,
de prejudicar o acesso de novos competidores no mercado (art. 21, IV), que não terão as
mesmas igualdades na revenda do produto ao mercado consumidor, o que pode ocasionar a
falência da nova empresa, na medida em que seu funcionamento ou desenvolvimento ficará
prejudicado (art. 21, V). 303
Os participantes de cartéis têm a intenção de eliminar a concorrência, aumentando os
preços e restringindo a produção, no entanto seus participantes tentam manter uma ilusão de
concorrência, enquanto na realidade não existe qualquer tipo de escolha para o consumidor,
os quais são submetidos a pagar o preço exigido pelas empresas cartelizadas.
301
Op cit, p. 250/251.
FORGIONI, Paula Andréa. Os fundamentos do Antitruste. 2. ed.rev. atual. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2003, p. 198.
303
HABIBE, Taís Cruz. Cartel e conseqüências para o consumidor, Revista de Direito do Consumidor. n. 52.
São Paulo: RT, out. – dez. 2004, p. 252.
302
114
Existem diferentes espécies ou categorias de cartéis:
a) cartel do preço, o qual estabelece uma tarifa única para a venda dos produtos
fabricados pelos contratantes;
b) cartel de condições que é aquele que não apenas contém um acordo sobre preços,
mais vai até a fixação do restante das condições de venda, por exemplo, desconto para as
vendas paga a vista;
c) cartel de região é o que delimita as zonas ou regiões que ficam reservadas para
cada um dos associados em determinada área de influência mutua;
d) cartel de contingentes é o que não se satisfaz com a determinação das condições de
venda ou com o convênio de preços, mas procura influir, também no modo monopolizador,
sobre preços, reduzindo a própria produção e limitando a oferta;
e) cartel geral que representa a união de vários cartéis de categoria econômica comum
em um único cartel. 304
A estabilidade do equilíbrio do cartel dependerá, entre outros fatores, da sua maior ou
menor capacidade de detectar e de punir desvios de conduta como esse. No entanto, pode-se
afirmar que a situação de equilíbrio de preços imposta pelo cartel tende a ser menos estável
do que a de um oligopólio, já que no cartel sempre valerá a pena violar as regras,
aumentando a produção e reduzindo os preços. 305
Os cartéis subvertem a lógica da livre competição, pois uniformizam os preços,
diminuindo a qualidade e quantidade de produtos colocados a disposição dos consumidores,
o que resulta em muitas vezes a limitação de entrada de novas empresas no mercado,
impedindo que haja mais concorrência e diversificação de produtos e serviços e menores
preços.
Diante da evolução dos cartéis e do crescimento de seus danos na economia do país e
lesão ao bem-estar dos consumidores, constituiu prioridade das autoridades de defesa da
concorrência a repressão aos cartéis.
Os trustes também são considerados desvios de mercado, eis que representam o
monopólio quase absoluto de um ramo de produção: constituem uma espécie de consórcio
monopolístico, quer sob a forma de fusão, quer pela modalidade de controle único das
empresas integradas. 306
304
GASTALDI, J. Petrelli. Elementos de Economia Política. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 64.
BRUNA, Sérgio Varella. O poder econômico e a conceituação do abuso em seu exercício. 12. ed. 2. tir. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001, p, 54.
306
GASTALDI, J. Petrelli. Elementos de Economia Política. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 164/165.
305
115
No truste a fusão é total, desaparecendo as personalidades jurídico-econômicos das
empresas coligadas e surgindo uma nova empresa de grande porte, que é representada por
uma grande concentração, sob a forma de sociedade por ações, tendo como objetivo principal
satisfazer a procura de bens econômicos. 307
Truste é organização econômico-financeira formada por empresas obedientes a um
centro decisório, com o fim básico de interferir no mercado e exercer poder monopolístico. O
termo dumping é utilizado no comércio internacional para designar a exportação de um
produto com preço inferior ao preço de venda do mesmo produto no mercado interno do país
exportador.
De acordo com o artigo 2º, inciso I, do Acordo Relativo à Implementação do Gatt,
pode-se compreender como:
[...] a introdução de um produto de mercado de outro país a preço inferior
ao seu valor normal, se o preço de exportação do produto, quando
exportado de um país para outro, for inferior ao preço comparável,
praticado no curso de operações comerciais normais de um produto similar
destinado ao consumo no país exportador. 308
Como uma prática do mercado, um mecanismo desleal de comércio que consiste na
introdução de um bem no mercado doméstico, a preço de exportação inferior ao valor
normal.
309
Valor normal seria o preço efetivamente praticado para produto similar nas
operações mercantis normais, que o destinem o consumo interno no país exportador.
Tal modalidade de estrutura de mercado foi pacificado pela Resolução 20/99 do
CADE, como sendo a “[...] prática deliberada de preço abaixo do custo variável médio,
visando eliminar concorrentes para, em momento posterior, poder praticar preços e lucros
mais próximos do nível monopolista”. 310
O Dumping atinge diretamente a liberdade de concorrência, ainda podendo ser
considerada como abuso de poder econômico destinado a impedir a existência de um
mercado saudável, seu combate assume conotações de ordem nacional.
307
Op cit, p. 165.
FARIA, Werter R. Constituição Econômica: liberdade de iniciativa e de concorrência. Porto Alegre: Fabris,
1990, p 47.
309
CHIARO, José Del; SILVEIRA, João Marcos; LEMES, Selma M. Ferreira. Fundamentos e objetivos da
legislação antidumping. Revista de Direito Econômico n. 25. Brasília: Conselho Administrativo de Defesa
Econômica – CADE, 1997, p. 24.
310
OLIVEIRA Gesner; RODAS, João Grandino. Direito e economia da concorrência. Rio de Janeiro: Renovar,
2004, p. 58.
308
116
O combate à prática do dumping visa à proteção do setor da economia nacional
atingindo pela discriminação de preços ou ameaçado de sofrer dano iminente, como, por
exemplo, o retardamento do início das atividades de uma indústria em fase de implantação.
311
Percebe-se que tal prática desleal é inibidora de um produção, iniciativa ou
concorrência local, deixando graves mazelas para o mercado produtor e consumidor atingido,
pois atinge diretamente a liberdade de concorrência, e passa ser caracterizada como um abuso
de poder econômico destinado à existência de um mercado saudável.
Todas as condutas aqui comentadas trazem prejuízos ao ambiente concorrencial e
atinge também o consumidor, tais acordos ilícitos redundam em flagrante atentado à
soberania do cidadão, na medida em que restringem a liberdade de escolha do consumidor.
Em relação às repressões administrativas às infrações econômica, além das
atribuições preventivas contra atos que possam limitar ou prejudicar a livre concorrência ou
resultar a dominação de mercado compete ao CADE – Conselho Administrativo de Defesa
Econômica resolver tais situações, caso a parte não concorde com a posição do CADE
poderá a mesma interpor recurso ao Poder Judiciário.
311
FARIA, Werter R. Constituição Econômica: liberdade de iniciativa e de concorrência. Porto Alegre: Fabris,
1990. p. 49.
117
4
A INTERAÇÃO E COMPATIBILIZAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA LIVRE
CONCORRÊNCIA E DA DEFESA DO CONSUMIDOR
4.1
ABUSO DO PODER ECONÔMICO
O poder é uma relação social na qual a vontade tem capacidade de produzir efeitos
desejados. Esta relação social se qualifica tanto em relação aos meios de que se utiliza a
vontade para produzir efeitos desejados, quanto aos próprios resultados por ela pretendidos.
312
O direito repudia duas formas de concorrência e que desprestigiam a livre iniciativa e
a livre concorrência, seja a concorrência desleal e o abuso de poder econômico.
Poder econômico, por sua vez, é aquele exercido através de instrumentos de
produção, circulação, distribuição e consumo de riquezas, mas projeta resultado sobre
qualquer desses quatro segmentos da atividade econômica.
Importantes são as considerações realizadas por Pedro Dutra sobre o tema:
Poder econômico é a soma de meios materiais e não materiais, de
expressão econômica, de que o agente dispõe e emprega no exercício de
sua atividade ordinária, no mercado de bens ou serviços onde atua. A
titularidade e o uso deste poder econômico são legítimos; todos os agentes
que exploram atividades econômicas, atuantes em mercado de bens e
serviços, são estimulados, pela própria dinâmica destes mercados, a
aumentar a sua capacitação, o seu poder econômico de mercado, pois é
pelo emprego dele que o concorrente haverá a sua participação no
mercado, em disputa com os demais pela busca da preferência do
consumidor. 313
É relevante destacar que o uso do poder econômico é legítimo. Isto por que todo
agente econômico atuante no mercado detém certa medida de poder, já que exibe
determinada soma de meios que o habilitaram a entrar e a permanecer no mercado. O
312
MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. A Configuração do Abuso do Poder Econômico (Apontamentos
sobre a técnica da Lei nº. 8.884, de 11 de junho de 1994).
313
DUTRA, Pedro. O controle da concentração do poder econômico de mercado e a defesa da livre
concorrência in Livre concorrência e regulação de mercados: estudos e pareceres. Rio de Janeiro: Renovar,
2003, p. 322/323.
118
emprego do poder econômico, por sua vez, prepara o agente econômico para disputar a
preferência do consumidor. Assim, cabe afirmar que o uso do poder de mercado de que se
vale o agente econômico não é apenas legítimo, mas indispensável para que este se mantenha
competitivo, buscando a preferência do consumidor.
314
Hodiernamente, se materializa uma situação totalmente subordinada a um
emaranhado de normas e idéias, clamando por uma providência inspirada nos princípios
constitucionais e na velha sabedoria que transborda nas relações de consumo.
As infrações à ordem econômica estão definidas na legislação Antitruste, abusa do
seu direito o titular que dele se utiliza levando um malefício a outrem, inspirado na intenção
de fazer mal, e sem proveito próprio. O fundamento ético da teoria pode, pois, assentar em
que ali não deve permitir que alguém se sirva de seu direito exclusivamente para causar dano
a outrem. 315
No que tange à concorrência, pode-se estar fazendo uso legítimo de um direito, sem
haver necessariamente abuso, mas sim intenção de prejudicar alguém. É fato que quando o
poder econômico passa a ser usado com o propósito de impedir a iniciativa de outros, com a
ação no campo econômico, ou quando o poder econômico passa a ser o fator concorrente
para um aumento arbitrário de lucros do detentor do poder, o abuso fica manifesto.
Neste sentido Marcus Elidius Michelli de Almeida, conceitua abuso de poder:
[...] o abuso de poder é caracterizado pelo comportamento aparentemente
lícito de alguém, mas que ao utilizar o seu direito, vem a causar dano a
outrem em razão de contrariar de forma manifesta o espírito do instituto. 316
Abuso de direito segundo o entendimento de Bejarano Sánchez citado por Fernández
Sessarego, vem a ser:
[...] una conducta que parece ser congruente con la norma de derecho, un
comportamiento que no contradice el enunciado formal de la regla jurídica
y que, sin embargo, quebrante y contraría el espíritu y el propósito de los
derechos ejercidos de maneira que su actualización no es ya una acción
válida y legítima sino un acto ilícito. 317
314
Op cit, p. 323.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 18 ed. Rio de Janeiro. Ed. Forense, 1995, v. 1,
p. 430.
316
ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli de. Abuso do Direito e Concorrência Desleal. São Paulo: Quartier
Latin, 2004. p. 39.
317
SESSAREGO, Carlos Fernandez. Abuso del derecho. Buenos Aires: Editora Astrea. 1992, p. 23.
315
119
O abuso do poder econômico deve ser entendido como desvio de função do poder
sem duvida significa conduta estratégica, visando à obtenção dos efeitos anticoncorrenciais.
318
Henrique Marcello dos Reis, afirma que:
[...] o abuso de poder econômico é toda ação ou manobra do empresário ou
de seu representante legal que, dominando o mercado e a concorrência,
tenha por objetivo a obtenção de lucros excessivos, causando danos a
outras pessoas, físicas ou jurídicas, e ao Estado. 319
Comete o delito de abuso de poder econômico o empresário que se utiliza de seu
interesse pessoal, antepondo-o ao interesse geral e causando danos ou prejuízos à
coletividade. Procurando dominar o mercado e eliminar a concorrência para obter lucros
excessivos, o indivíduo e as empresas acabam usando o poder econômico de que dispõem
para a satisfação de ambições pessoais, deixando de atender à função social da empresa. 320
O abuso de direito é o ato realizado, com o apoio em preceito legal, que causa dano a
interesse não especificamente protegido pelo ordenamento positivo, manifestado pela lesão a
princípios éticos e sociais, objetiva ou subjetivamente, mediante adequação entre o
intencional e o sentido da lei. 321
Merece destaque ainda a definição proposta pelo professor da Universidade de
Coimbra, Jorge Manuel Coutinho de Abreu, que, ao apresentar uma definição sobre a matéria,
assim se manifestou: “Há abuso de direito quando um comportamento, aparentando ser
exercício de um direito, se traduz na não realização dos interesses pessoais de que esse direito
é instrumento e na negação de interesses sensíveis de outrem”. 322
Para a caracterização do abuso do poder econômico, é necessário conjugarem-se dois
dispositivos da Lei nº. 8884/94, de um lado o artigo 20, que estabelece o objetivo ou efeitos
possíveis da prática empresarial ilícita e de outro lado o artigo 21, que elenca diversas
hipóteses em que a infração pode ocorrer.
O controle do abuso do poder econômico como instrumento de intervenção estatal
hábil a tutelar não apenas a livre iniciativa e a livre concorrência, mas também os princípios
sociais regentes na espécie, em especial a dignidade da pessoa humana, a valorização do
trabalho, a busca do pleno emprego e a redução das desigualdades regionais e sociais.
318
FILHO, Calixto Salomão Direito Concorrencial – As Estruturas – 2 ed. São Paulo: Malheiros Editores.
2002. p. 110.
319
REIS, Henrique Marcello dos. Direito Econômico. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 37.
320
CRETELLA JUNIOR, José apud REIS, Henrique Marcello dos. Direito Econômico. São Paulo: Quartier
Latin, 2005. p. 37/38.
321
STRENGER, Irineu. Reparação do dano em direito internacional privado. São Paulo: RT. 1973, p. 24.
322
ABREU, Manuel Coutinho de. Do Abuso de Direito. Porto Alegre: Ed. Livraria Almedina. 1999, p. 43.
120
Tal instituto procura evitar, dentre outras práticas: a obtenção de lucros arbitrários; as
tentativas de dominação de mercado relevante e atos que tenham por objeto ou possam
produzir efeitos de limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a
livre iniciativa.
O poder econômico passa a ser usado com o propósito de impedir a iniciativa de
outros, com a ação no campo econômico, ou quando o poder passa a ser o fator concorrente
para um aumento arbitrário de lucros do detentor do poder, o abuso fica manifesto. 323
Sendo que referido entendimento é extraído do artigo 173, § 4º, da Constituição
Federal de 1988 que dispõe: “A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à
dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.”.
De maneira que a Constituição Federal reconhece a existência do poder econômico,
prescreve o Estado o dever, de por lei, reprimir seus abusos, na medida em que, por vezes,
este acaba sendo exercido de modo anti-social. 324
A defesa da concorrência deve ser vista como garantia institucional, logo se exige
uma atuação do Estado no sentido de garantir a correta atuação no mercado, sempre
direcionando para o bem da coletividade e do individuo, estabelecendo ditames de
comportamento para o Estado, sendo assim uma garantia institucional.
O direito concorrencial sendo uma garantia institucional, perde o interesse a estrutura
do direito objetivo/direito subjetivo, muito mais adaptável à garantia de uma instituição que
se quer proteger é a estrutura do poder-dever ou direito-função, seja equiparar os deveres do
detentor do poder econômico aos deveres do agente estatal, isso explica a perfeição o
conteúdo do art. 173, § 4º, que claramente contribuiu ao poder econômico ou faz dele uma
função pública, ou melhor, dizendo, social. 325
A repressão ao abuso de poder econômico tem o objetivo coibir as finalidades típicas
desta espécie de abuso, que são a dominação de mercados, eliminação da concorrência e o
aumento arbitrário dos lucros, objetivando subtrair do concorrente uma parcela do mercado
que este haja legitimamente conquistado. Pertinentes são as lições de Pedro Dutra acerca dos
institutos do domínio de mercado, da eliminação da concorrência e do aumento arbitrário de
lucros:
323
REIS, Henrique Marcello dos. Direito Econômico. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 35.
Op cit.
325
FILHO, Calixto Salomão Direito concorrencial – As Estruturas – 2 ed. São Paulo: Malheiros Editores. 2002.
p. 109.
324
121
Dominar mercado é fazer-se senhor dele, e assim poder ignorar a ação
oposta pelos concorrentes; age o dominador como se, só, atuasse no
mercado, e, nesta situação, pode impor preço e volume do produto ou
serviço que oferta, ou adquire assenhorando-se do mercado em que atua. A
expressão domínio (ou dominação) de mercado, corrente no direito
comunitário europeu, corresponde à expressão poder monopólico –
monopolistic power – empregada no direito norte-americano; ambas
expressam o mesmo sentido, de ação incontrastada, indiferente, por parte
do seu detentor que se acha acima das forças do mercado, do qual se faz
senhor – dominador – e em conseqüência age como lhe convêm.
Eliminar a livre concorrência; eliminar aí está em sentido largo – por
qualquer forma prejudica-la, restringir-lhe o curso; livre aí está por fluente,
sem desvios, a dizer sem estorvo à disputa que os agentes travem, causado
pela ação abusiva de um ou alguns deles, à rivalidade que se tenha entre
eles, na luta pela preferência do consumidor. Não se há de ver, portanto,
ofensa à ordem concorrencial só se ocorrer à eliminação da livre
concorrência, senão em toda ação abusiva que por alguma forma a
restrinja, e, irreprimida, ao fim leve à eliminação da concorrência.
Aumento arbitrário de lucros é a majoração desarrazoada, de lucros
resultado de uma conduta abusiva; arbitrário, pois é lucro que não guarda
relação com a paga devida do esforço competitivo liso, e sim produto de
uma conduta infrativa, ordinariamente a elevação do preço do produto ou
serviço acima do seu nível competitivo. Há, nesta hipótese, um lucro
perverso, decorrente de uma ação abusiva, que desviou renda dos demais
competidores, ao infrator. 326
A concorrência desleal visa retirar a clientela de outrem, ou ainda, manter a sua
própria clientela, mediante atos elencados na lei e desta feita caracterizados desleais. 327
Waldemar Ferreira define a concorrência desleal:
Consiste a concorrência desleal, em suma, na prática de atos de comércio e
em procedimento reprovável destinado a desviar a freguesia do concorrente;
eis porque o texto ressaltou ao prejudicado o direito de haver perdas e danos
em ressarcimento de prejuízos causados por outros atos de concorrência
desleal nele não previstos, tendentes a prejudicar a reputação, os negócios
alheios, a criar confusão entre estabelecimentos comerciais ou industriais ou
entre produtos e artigos postos no comércio. Estes atos não se reputam
crimes e não se sujeitam a pena; mas não delituais do ponto de vista do
Direito Comercial, atos ilícitos que criam à obrigação de indenizar perdas e
danos. 328
326
DUTRA, Pedro. Livre concorrência e regulação de mercados: estudos e pareceres. Rio de Janeiro: Renovar,
2003, p. 324-325.
327
ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli de. Abuso do Direito e Concorrência Desleal. São Paulo: Quartier
Latin, 2004, p. 126.
328
FERREIRA, Waldemar. Tratado de Direito Comercial. São Paulo: Editora Saraiva. 1960, p. 354.
122
Com a edição da Lei nº. 9.279/96 – Lei de Propriedade Industrial, a concorrência
desleal, e, por conseqüência, os crimes passaram a ser disciplinados em seu artigo 195, pois
até então existia apenas a punição administrativa e não penal.
Para a existência da concorrência desleal é necessário que estejamos diante de uma
concorrência, a qual deve ser entendida como livre concorrência e que exista a clientela, que
será o objeto de desejo do concorrente que usará de métodos desleais para conseguir alcançar
seu objetivo. 329
No caso da concorrência leal a mesma pode e deve existir e ser incentivado, porém a
concorrência desleal deve ser reprimida, porquanto se utiliza de práticas que superem a
barreira do aceitável, lançando meios desonestos para alcançar a clientela alheia. 330
A concorrência desleal na realidade é reprimida, mas não compromete a livre
concorrência, e a infração a ordem econômica, compromete a livre concorrência, por sua vez
concorrência desleal e as infrações a ordem econômica se diferencia, pois as lesões
produzidas pela concorrência desleal não alcançam outros interesses além dos do empresário
diretamente vitimado pela prática irregular, porém na infração da ordem econômica, a
concorrência ilícita ameaça as estruturas da economia de mercado, e, portanto, um universo
de interesses juridicamente relevantes são atingidos.
O intuito do empresário é de prejudicar seus concorrentes, de modo claro, retirandolhes total ou parcialmente, fatias do mercado que haviam conquistado, infligindo perdas a
seus concorrentes, porque é assim que poderão obter ganhos.
O preceito em apreço tem o escopo assegurar o regime de mercado no cenário
econômico nacional. Deste modo, qualquer tipo de conduta estatal ou privada que venha a
coibir o regime de livre concorrência estará violando a Constituição. 331
A concorrência leal, saudável, deve ser preservada e protegida, para que todos sejam
beneficiados. Acaso não existissem as leis de proteção ao Direito de Concorrência, alguns
329
ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli de. Abuso do Direito e Concorrência Desleal. São Paulo: Quartier
Latin, 2004, p. 140.
330
Op cit.
331
ARAÚJO, Luiz Alberto David e NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucional. 4. ed.
ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 375.
123
poucos se beneficiariam dos frutos da deslealdade para com os consumidores e concorrentes.
Toda a sociedade resultaria prejudicada com as vantagens que seriam auferidas por uma
minoria, em detrimento de muitos.
4.2
INTERPRETAÇÃO
SISTÊMICA
DOS
PRINCÍPIOS
DA
LIVRE
CONCORRÊNCIA E DA DEFESA DO CONSUMIDOR
O objetivo maior da pesquisa será proceder à análise da interação, compatibilidade e
harmonização do princípio da livre concorrência e legislação da defesa da concorrência com
o princípio da defesa do consumidor e legislação da defesa do consumidor.
A construção de uma política econômica que objetive harmonizar as relações de
consumo encontra-se intimamente relacionada à construção de uma política de defesa da
concorrência. A defesa do consumidor como já abordado anteriormente está definida no
artigo 170, inciso V, da Constituição Federal de 1988, encontra-se ao lado da defesa da livre
concorrência, prevista no inciso IV, do mesmo artigo, ambos princípios da ordem econômica.
Essa pluralidade de interesses existente entre os princípios da defesa do consumidor e
o princípio da livre concorrência é repetida na legislação infraconstitucional, Código de
Defesa do Consumidor e Legislação de Defesa da Concorrência.
Adam Smith afirma que o mercado somente existe para atender as necessidades do
consumidor, pois o consumo é o único objetivo da produção e interesse do produtor em
produzir termina no exato momento em que as necessidades do consumidor são atendidas. 332
O funcionamento adequado do sistema pressupõe a liberdade individual dos agentes
econômicos e dos consumidores de tomar suas decisões econômicas em um ambiente de livre
concorrência. 333
O consumidor que é o destinatário econômico final das normas concorrenciais, com a
manutenção de um ambiente competitivo será garantido preços mais baixos, maior qualidade
e variedade de produtos e serviços, inclusive a informação pelos consumidores.
332
SMITH, Adam. A riqueza das nações: investigações sobre sua natureza e suas causas. 3. ed. São Paulo:
Nova Cultural, 1988, cap. 8.
333
BRITO, Beatriz Gontijo. Concentração de empresas no direito brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p.
91.
124
A relação de instrumentalidade entre a defesa da concorrência e o bem-estar do
consumidor, são as normas concorrenciais importantes meios de tutelar juridicamente os
interesses dos consumidores. 334
Ao estipular como princípios está dizendo que nenhuma exploração poderá atingir os
consumidores nos direitos a eles outorgados, está também designado que o empreendedor
tem de oferecer o melhor de sua exploração, independentemente de atingir ou não os direitos
do consumidor, o explorador tem de oferecer mais. A garantia dos direitos dos consumidores
é o mínimo, de maneira que a regra constitucional exige mais, sendo que essa ilação decorre
do sentido da livre concorrência. 335
A proteção do consumidor é o princípio básico do direito da concorrência, pois se não
houver concorrência não há uma efetiva defesa do consumidor:
Não resta dúvidas, contudo de que, em econômica de mercado, a situação
dos consumidores resultará tanto mais débil quanto maiores forem os
atropelos ao quadro geral de funcionamento das regras da concorrência.
Estas constituem, portanto uma forma indirecta de proteção. O nível dos
preços, a variedade dos produtos, a sua qualidade, as condições de
fornecimento são tendencialmente melhores, sempre que, do lado dos
agentes fornecedores, exista um número elevado, ou pelo menos razoável,
de empresas que entre si disputem à clientela. 336
As duas legislações têm princípios que se podem dizer comuns, principalmente no
que diz respeito ao sistema de mercado que se justifica pela sua capacidade de produzir mais
e melhores bens de consumo, a denominada “eficiência alocativa” e promover uma melhor
distribuição da riqueza, a “eficiência distributiva”. 337
O mercado não poderia existir sem o fornecedor que oferta e o consumidor que
demanda, motivo que o Direito tem a função de estabelecer as bases fundamentais para que
se estabeleça o equilíbrio entre as empresas e entre estas e os consumidores. 338
A defesa da ordem econômica tem como razão final a proteção dos interesses e
direitos dos consumidores, eis que destinatários finais de tudo o que é produzido no mercado,
seja em matéria de produtos ou serviços. Isso porque o consumo é o único objetivo da
produção e o interesse do produtor em produzir termina no exato momento em que as
334
MARTINEZ, Ana Paula. Revista de Direito do Consumidor. n 52. jan. - março. 2005, p. 8.
NUNES, Rizzato. Curso de Direito do Consumidor. 2. ed.rev. modif. Ampl. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 56.
336
ALMEIDA, Carlos Ferreira de. Os direitos dos Consumidores. Coimbra: Almedina, 1982, p.72.
337
LOPES, José Reinaldo de Lima. Direito da concorrência e direito do consumidor. Revista de Direito do
Consumidor. São Paulo: n. 34, abr/jun. 2000, p. 79.
338
GLÓRIA, Firmato de Almeida Glória. A livre concorrência como garantia do consumidor. Belo Horizonte:
Del Rey, 2003, p.vii.
335
125
necessidades do consumidor são atendidas, é assim o consumidor destinatário econômico
final das normas concorrênciais.
Considera-se que a interpretação do princípio da livre iniciativa pode-nos levar a
permitir o lançamento de vários agentes no mercado, e, através da livre concorrência, é que
se terá uma disputa entre tais agentes, a conseqüência da conjunção dos dois princípios
mencionados só tem a beneficiar o consumidor, que terá como exemplo, a garantia de
melhores produtos e serviços a preços mais baixos.
A análise conjunta dos princípios somente é possível porque os princípios possuem a
mesma hierarquia formal, e somente não há antinomia entre eles, na medida em que os
mesmos não pretendem ser exclusivos. 339
Os dois princípios são constitucionais estando na mesma posição hierarquia, um não
deve sobrepor o outro, havendo conflitos poderá o aplicador da lei utilizar-se de meios e dar
aplicação de ambos os princípios para a resolução do caso concreto.
Ambos os princípios estão intimamente ligados, que não há sentido da concorrência
se não houver a ótica do consumidor:
[...] prevenindo e reprimindo os abusos que possam afetar a livre
concorrência, os efeitos da lei atingem indiretamente os consumidores, em
que repercutirão os benefícios de sua ação quando adquirirem o produto
final por livre escolha e a um preço justo. 340
No tocante a estabelecer o consumidor como o centro do direito da concorrência
realmente é fato inegável. O direito concorrencial visa a estabelecer o equilíbrio das relações
de mercado, buscando a equidade e a boa condução dessas relações, também tem interesse
em buscar a satisfação do consumidor:
[...] a concorrência tem um papel, indireto, mas não secundário, na
proteção do consumidor. Onde são efetivos, os consumidores têm opção de
produtos e serviços, assim como melhor informação sobre eles, já que
haverá disputa pela preferência. 341
As regras concorrenciais podem interferir nas relações de consumo e vice-versa.
Existem regras no Código de defesa do consumidor, que podem interferir diretamente nas
339
HABIBE, Taís Cruz. Cartel e conseqüências para o consumidor. Revista de Direito do Consumidor nº. 52. p.
229.
340
MAGALHÃES, Carlos Francisco. Leis que preservam a concorrência protegem o consumidor. Revista de
Direito Econômico. Brasília, Conselho Administrativo de Defesa Econômica, ano II, n. 5, 1976, p.3.
341
CRANSTON Ross apud BENJAMIN, Antonio Herman. A proteção do consumidor e patentes: o caso dos
medicamentos. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, n. 10, 1994, p. 22.
126
relações concorrenciais, pode acontecer que um mesmo suporte fático desencadeie a
incidência de normas de defesa do consumidor e de normas de defesa da concorrência.
342
Dois são os grupos principais dessa regras: (i) regras que se relacionam à
regulamentação geral da publicidade e (ii) regras sobre a coerção do consumidor baseadas na
manipulação da oferta de um determinado produto ou serviço. 343
A concorrência é extremamente salutar seja diretamente para o consumidor, que
deseja adquirir um bem ou um serviço, como para a própria sociedade como um todo, em
razão da imposição implícita aos empresários da necessidade de sempre buscar melhorar seu
produto.
Isabel Vaz aduz que:
A defesa da livre concorrência apresenta-se assim como Janus, o deus de
duas faces. De um lado, os pressupostos da livre concorrência procuram
assegurar ao agente econômico a livre iniciativa, a liberdade de entrar e
sair de um mercado e de nele prevalecer, tendo acesso aos fatores de
produção, às informações relevantes, sem qualquer interferência
monopolista; de outro lado, impõe aos agentes econômicos o dever de
abster-se de quaisquer abusos tendentes a restringir a concorrência e a
causar prejuízos ao consumidor. 344
O Estado interessa como uma das formas de preservar e garantir a livre concorrência,
proteger o consumidor através da adoção de políticas econômicas adequadas.
345
O
consumidor encontrava-se totalmente desamparado para enfrentar os abusos do mercado de
consumo, pois até então havia somente a previsão constitucional, seja somente existia o
princípio da defesa do consumidor prevista do artigo 170, inciso V, da Constituição Federal
de 1988, não existindo formas de como seria feita essa defesa, não sendo possível garantir os
interesses mínimos do consumidor.
O princípio constitucional da defesa do consumidor veio a ser garantida com o
advento da Lei nº. 8.078/90, a qual estabeleceu os parâmetros da Política Nacional de
Relações de Consumo e fixando os princípios que deverão nortear o Estado na
implementação dessa política. 346
342
FORGIONI, Paulo. Os fundamentos do antitruste. São Paulo: RT, 1998, p.248.
FILHO, Salomão Calixto, Condutas tendentes à dominação dos mercados. São Paulo: Malheiros, 2001, p.
95.
344
VAZ, Isabel apud GLÓRIA, Daniel Firmado de Almeida. A livre concorrência como garantia do
consumidor. Belo Horizonte: Del Rey; FUMEC, 2003, p.93.
345
LEOPOLDINO DA FONSECA. Direito Econômico. 5. ed.rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 129.
346
Op cit, p. 130.
343
127
Na visão de Sérgio Cavalieri Filho “[...] a razão de ser do Código é a vulnerabilidade
do consumidor; só existindo porque o consumidor está em posição de desvantagem técnica e
jurídica.”. 347
A tutela jurídica dos interesses dos consumidores nem sempre se dá de forma
imediata pelas normas constitucionais, pelo contrário na maioria dos casos, essa proteção é
mediata, ocorrendo por meio da proteção da concorrência, pois a concorrência é
indispensável para a dinâmica do mercado e o mercado tem por destinatário final o
consumidor, assim à situação de concorrência não pode ser senão beneficiar os
consumidores.
A livre concorrência é essencialmente uma garantia do consumidor e do mercado, ela
significa que o explorador tem de oferecer ao consumidor produtos e serviços melhores do
que os de seus concorrentes, logo o processo de concorrência de faz não só pela qualidade,
mas também por seu parceiro necessário, que é o preço. “[...] todo elemento concorrencial na
luta pelo consumidor é o binômio “qualidade/preços”.
348
Sempre visualizando a produção e
oferta de produtos com a melhor qualidade e os menores preços possíveis, tudo para
conquistar o consumidor.
Através da livre concorrência entre as empresas no mercado que se terá, também, uma
forma de se proteger alguns dos direitos dos consumidores e de se garantir oportunidades
iguais entre os agentes econômicos.
349
Motivo que os dois princípios e legislações devem
ser compreendidos como complementares, vez que a concretização fatia de um deles exige a
concretização do outro.
O artigo 1º da Lei de Defesa da Concorrência prevê que se oriente pelos ditames
constitucionais de liberdade de iniciativa, livre concorrência, função social da propriedade,
defesa dos consumidores e abuso do poder econômico, o que evidencia a posição que os
consumidores ostentam frente às normas de defesa da concorrência, devendo a proteção de
seus interesses servir como diretriz para o aplicador da legislação antitruste.
O referido artigo inclui o propósito da defesa do consumidor, quando menciona que a
coletividade é a titular dos bens jurídicos protegidos por esta lei, o legislador quis dizer os
347
CAVALIERI FILHO, Sérgio. O direito do consumidor no limiar do século XXI. In 5º Congresso Brasileiro e
3º Congresso Mineiro de Direito do Consumidor, maio de 2000. Belo Horizonte. Anais do Congresso. Belo
Horizonte, 2000, p. 6.
348
NUNES, Rizzato. Curso de Direito do Consumidor. 2. ed.rev. modif. Ampl. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 57.
349
HABIBE, Taís Cruz. Cartel e conseqüências para o consumidor. Revista de Direito do Consumidor n. 52. out.
– dez. 2000, p. 225.
128
consumidores, podendo concluir que é o consumidor o alvo de proteção da lei de
concorrência. 350
A liberdade de escolha como objetivo último da legislação antitruste vem sendo
considerado como o novo paradigma antitruste. A liberdade de escolha é vista como a
essência da soberania do consumidor, que deve ser buscada tanto pela política das relações
de consumo quanto pela política de defesa da concorrência. 351
A soberania existirá quando estiverem presentes os seguintes elementos: (i) existência
de opções efetivas de escolha proporcionada pela concorrência; e (ii) possibilidade dos
consumidores escolherem livremente entre essas opções.
352
Busca-se então um equilíbrio
entre a eficiência e a manutenção de uma série de opções efetivas para o consumidor.
As normas concorrenciais têm interesses bem definidas na tutela do consumidor, os
interesses podem ser divididos em interesse proteção e interesse satisfação, protegendo o
consumidor, ainda a norma concorrencial visa estabelecer o equilíbrio das relações no
mercado, buscando a equidade e a boa condução dessas relações.
A tutela dos consumidores pelas normas concorrenciais ocorre de várias maneiras, a
livre concorrência é forma de tutela do consumidor, na medida em que a competividade
induz a uma distribuição de recursos o mais baixo preço. 353
Além do preço baixo a livre concorrência pode dar aos consumidores a possibilidade
de maior rede de produtos e serviços a escolher, constante inovação, melhor relação de
qualidade e preço e amplo acesso a informação. A concorrência é indispensável para a
dinâmica do mercado e mercado tem por destinatário final o consumidor.
Calixto Salomão Filho em razão da proteção aos atos tendentes à dominação de
mercado, aduz que “[...] diretamente o que há é o interesse institucional na proteção da
ordem concorrencial.” 354
Existe interação ainda em razão da cláusula de exclusividade, sendo inegável o
caráter de mediação que a proteção da concorrência tem para a proteção dos interesses dos
consumidores em razão de tal assunto, eis que por meios de acordos de exclusividade, os
350
GLÓRIA Firmato de Almeida Glória. A livre concorrência como garantia do consumidor. Belo Horizonte:
Del Rey, 2003, p.95.
351
AVERITT Neil W e LAND Robert H. apud MARTINEZ, Ana Paula. A proteção dos Consumidores pelas
normas concorrenciais. Revista de Direito do Consumidor. n 52. jan. - março. 2005, p. 12.
352
MARTINEZ, Ana Paula. A proteção dos Consumidores pelas normas concorrenciais. Revista de Direito do
Consumidor. n 52. jan. - mar. 2005, p. 12.
353
JUNIOR, Tércio Sampaio Ferraz apud MARTINEZ, Ana Paula. A proteção dos Consumidores pelas normas
concorrenciais Revista de Direito do Consumidor n 52. jan. - mar. 2005, p. 13.
354
CALIXTO, Salomão Filho Apud MARTINEZ, Ana Paula. Revista de Direito do Consumidor. n 52. jan-mar.
2005, p. 14.
129
compradores de determinado bem ou serviço comprometem-se adquiri-lo com exclusividade
de determinado vendedor, restando proibido de comercializar com os concorrentes, caso a
cláusula de exclusividade fosse tolerada e não havendo produtos semelhantes no mercado, o
consumidor teria reduzidas suas opções de compra e serviços.
Os artigos 21, 27, inciso V e 29 da Lei de Defesa da Concorrência e os artigos, 54,
inciso II e 58 da Lei de Defesa do Consumidor, têm sempre em vista os interesses dos
consumidores, tendo em vista que o artigo 21 define as infrações a ordem econômica, o
artigo 27, prevê critérios para a dosimetria da pena a ser aplicado em razão da infração à
ordem econômica, seu inciso V, define que será levado em consideração o grau de lesão, ou
perigo de lesão, à livre concorrência, à economia nacional, aos consumidores, ou a terceiros,
existindo uma relação direta entre a pena e o dano ou perigo de dano causado pela conduta
anticoncorrencial ao consumidor, seja quanto maior o grau de perigo de lesão ou lesão aos
consumidores, maior será a pena aplicada ao agente infrator, o artigo 29 define que o
consumidor poderá ingressar em juízo para obter a cessação de práticas que constituam lesão
ao consumidor e ainda receberem indenização em razão de danos.
O artigo 54, inciso II, da Lei de Defesa do Consumidor, coloca os atos que possam
limitar ou prejudicar a livre concorrência, ou resultar na dominação de mercados relevantes
de bens ou serviços, que deverão ser submetidos à apreciação do CADE, ainda que os
benefícios decorrentes sejam distribuídos eqüitativamente entre os participantes e os
consumidores ou usuários finais e finalmente o artigo 58, o qual assegura a aplicação do
artigo 54, visando à proteção dos interesses do consumidor.
Neste sentido Calixto Salomão Filho relata que “[...] é inquestionável a existência de
uma relação direta entre o agente que pratica o ilícito e o consumidor. [...] ali, está na
verdade, o centro nervoso do direito concorrencial em matéria de proteção ao consumidor.”
355
Outro ponto de interação e harmonização das duas leis está no artigo 15 da Lei nº.
8884/94 e o artigo 3º da Lei nº. 8078/90, trata-se do destinatário da lei de defesa da
concorrência e do conceito de fornecedor no caso da Lei da defesa do consumidor, sendo
praticamente idênticas às disposições legais.
355
FILHO, Salomão Calixto. Condutas tendentes à dominação dos mercados. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 93.
130
Toda pessoa física e jurídica, privada ou pública, nacional ou estrangeira, bem como
quaisquer associações de entidades de pessoas, constituídas de fato e de direito, serão alvo da
aplicação destas duas leis balizadoras das relações no mercado. 356
Paula Andréa Forgioni afirma que com a amplitude que foi dada pelo artigo 15 da lei
de defesa da concorrência restou prejudicado a alegação de qualquer ente público ou privado,
de que não está sujeito às disposições da Lei Antitruste, procurando esquivar-se das
restrições que lhe sejam postas, ainda coloca que até mesmo as atividades que não tem
tenham fins lucrativos. 357
Em relação à solidariedade da responsabilidade entre as empresas causadora de danos,
o assunto é tratado tanto pela Lei de Defesa da Concorrência como pela Lei de Defesa do
Consumidor.
O artigo 17 define que serão solidariamente responsáveis as empresas ou entidades
integrantes de grupo econômico, de fato ou de direito, que praticarem infração da ordem
econômica, por sua vez artigo 7, parágrafo único, define também sobre a responsabilidade
solidária para a reparação dos danos previstos nas normas de consumo quando houver mais
de um autor na ofensa e o artigo 25 veda a estipulação contratual de cláusula que
impossibilite, exonere ou atenue a obrigação de indenizar, sendo o dano causado por
componente ou peça incorporada ao produto ou serviço, serão responsáveis solidários seu
fabricante, construtor ou importador e o que realizou a incorporação.
A desconsideração da personalidade jurídica da empresa, quando houver abuso do
direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou
contrato social e quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade
da pessoa jurídica provocados por má administração, também estão previstas no artigo 18 da
Lei da Defesa da Concorrência e pelo artigo 28 da Lei de Defesa do Consumidor.
A Lei de Defesa do Consumidor prevê em seu artigo 21 as infrações à ordem
econômica, sendo que as mesmas estão em sintonia com as praticas abusivas do artigo 39 e
51 da Lei de Defesa do Consumidor, pois objetivam a proteção do consumidor no mercado.
O artigo 21, inciso XIII da Lei de Defesa da Concorrência e o artigo 39, inciso II da
Lei de Defesa do Consumidor prevêem a recusa da venda de bens e serviços de
conformidade com os usos e costumes, devendo o consumidor sempre atender a demanda de
consumo.
356
GLÓRIA Firmato de Almeida Glória. A livre concorrência como garantia do consumidor. Belo Horizonte:
Del Rey, 2003, p.95.
357
FORGIONI, Paula Andréa. Os fundamentos Antitruste. 2. ed.rev. atual. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2005, p. 157.
131
Na opinião de João Bosco Leopoldina Fonseca a diferença existente entre os dois
textos de lei está que, na primeira a relação jurídica é concorrencial e na segunda a relação é
de consumo. 358
Outro ponto que merece destaque é a venda casada, prevista no artigo 21, inciso
XXIII da Lei de defesa da concorrência e artigo 39, inciso I, da Lei de Defesa do
Consumidor, entendida como [...] a vinculação de um produto ou serviço a outro produto ou
serviço. 359
Sob a ótica do direito do consumidor, para que se caracterize a venda casada basta a
vinculação de um produto ou serviço a outro produto ou serviço. No âmbito do direito
concorrencial constitui uma verdadeira barreira ao ingresso de concorrentes no mercado.
Segundo Fábio Ulhoa Coelho:
A venda casada, em si mesma, não é ilícita. Será infração contra a ordem
econômica somente se inserida no contexto das praticas restritivas,
voltadas à eliminação da concorrência, domínio de mercados ou aumento
arbitrário dos lucros. 360
Para o direito econômico a venda casada fere o direito a livre concorrência, na medida
em que o agente econômico com poder de mercado consegue, através da vinculação da
venda, criar barreiras ao ingresso de concorrentes no mercado ou ainda criar empecilhos à
expansão dos concorrentes, impedindo a permanência destes no mercado.
Paula Andréa Forgioni conclui que de acordo com a sistemática brasileira, a partir do
momento em que a venda casada implique a incidência de qualquer um dos incisos do artigo
20, será considerada contrária à ordem econômica. 361
Sustenta-se que uma empresa com diminuto poder de mercado não é apta a praticar
atos que levem ao prejuízo ou livre concorrência, por exemplo, uma venda cassada não pode
prejudicar a livre concorrência se a empresa não detiver poder no mercado, assim não existirá
a coerção sobre o consumidor, o qual poderá optar por outro produto. Pode então concluir
358
LEOPOLDINO DA FONSECA, João Bosco. Lei de Proteção da Concorrência (Comentários à Lei
Antitruste). Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 100.
359
GLÓRIA Firmato de Almeida Glória. A livre concorrência como garantia do consumidor. Belo Horizonte:
Del Rey, 2003, p.96.
360
COELHO, Fabio Ulhoa. Direito Antitruste Brasileiro – Comentários a Lei 8884/94. São Paulo: Saraiva,
1995, p. 84.
361
FORGIONI, Paula Andréa. Os fundamentos do Antitruste. 2.ed.rev.atual. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2005, p. 149.
132
que os prejuízos ao mercado podem variar conforme o poder de mercado do agente
econômico. 362
O artigo 30 da Lei nº. 8884/94 possibilita aos consumidores iniciarem um processo
administrativo com o objetivo de fazer cessar práticas anticompetitivas, o que mais uma vez
se evidencia a relação de instrumentalidade existente entre proteção do consumidor e defesa
da concorrência, de maneira que o consumidor pode abrir mão de órgãos como o PROCON e
recorrer ao SBDC para defender seus direitos.
A elevação sem justa causa do preço de bem ou serviço também encontra previsão
nas legislações aqui tratadas. O artigo 21, inciso XXIV, da Lei de Defesa da Concorrência e
o artigo 39, inciso X, da Lei de Defesa do Consumidor dispõe que a elevação injustificada de
preços fere os princípios da ordem econômica, pois a garantia de um melhor preço diz
respeito à defesa da concorrência e do consumidor. As grandes corporações apresentam
maiores influências nos preços e nas condições de mercado, nas práticas e clausula abusivas.
A prática de preços predatórios é um dos atos tendentes à dominação de mercado
mais comum, pois o produtor incorre em prejuízos no presente com o fim de eliminar
concorrentes, para em momento posterior, poder praticar preços e lucros próximos do nível
monopolista.
Em um primeiro momento o consumidor é beneficiado, pois os preços dos bens e
serviços seriam inferiores aos anteriormente praticados. Se o interesse do consumidor fosse
tutelado imediatamente, essa prática seria lícita, porém o interesse maior do consumidor é a
existência de um mercado competitivo, o que não existiria no caso de preços predatórios
durante período suficiente para a eliminação dos concorrentes.
Motivo que o interesse do consumidor é o mercado competitivo, via de conseqüência,
a liberdade de escolha, sendo que tais interesses são mediados pela proteção dos
concorrentes, sob tal prisma, a prática é ilícita e deve ser punida pela lei de defesa da
concorrência. 363
Em relação ao direito de ação a Lei de Defesa da Concorrência prevê em seu artigo
29, que os prejudicados poderão ingressar em juízo em defesa de seus direitos e a Lei de
Defesa do Consumidor define em seu artigo 6, inciso VI, como direito básico do consumidor
a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e
difusos, ainda o artigo 82, define os legitimados que iram atuar no interesse da coletividade.
362
Op cit, p. 150/151.
MARTINEZ, Ana Paula. A proteção dos Consumidores pelas normas concorrenciais. Revista de Direito do
Consumidor. n 52. jan. - março. 2005, p. 15.
363
133
Os prejudicados a que se refere à legislação quer dizer as empresas e os consumidores,
podendo ser a coletividade.
O artigo 58 da Lei de Defesa da Concorrência define o compromisso de desempenho,
que seria uma espécie de condição a ser observada para que se concretize a aprovação de ato
de concentração, sendo possível uma maior flexibilização no tratamento das concentrações
empresariais pelo CADE, porém os ganhos devem ser distribuídos entre os fornecedores e o
consumidor.
O aspecto contratual, através do denominado controle judicial dos contratos, é um
bom instrumento para a proteção da concorrência. 364
O Código de Defesa do Consumidor tem uma visão mais social, tenta valorizar uma
garantia de equilíbrio contratual de modo a evitar a lesão, evitando que consumidor sofra o
prejuízo.
O artigo 83 da Lei nº. 8884/94, prevê a utilização subsidiária do Código de Defesa do
Consumidor à Lei de Defesa da Concorrência, sendo mais um indicativo da existência de
relação da defesa do consumidor e defesa da concorrência.
O regime jurídico brasileiro, baseado em estrutura de economia capitalista,
reconhecendo a importância da publicidade criou um sistema especial, a carga de serventias
do Estado, publicar no sentido inerente a tal sistema corresponde à ação de registrar a de
tornar conhecível o direito assentado, bem como o agente que interferiu (ou agentes que
interferiram) no negócio jurídico alusivo ao direito ou a o bem da vida mencionado. 365
Importante é o valor das regras de publicidade para o direito concorrencial, uma vez
que serve para estimular a concorrência. O artigo 36 da Lei de Defesa do Consumidor, diz
respeito à publicidade, prevê que a publicidade deve ser veiculada de tal forma que o
consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal, sendo vedada, portanto, a
publicidade subliminar, a qual o agente visa a influenciar o inconsciente do individuo ao
bombardear a publicidade a uma velocidade tal que a mente humana não consegue identificar
conscientemente a publicidade, em simples palavras é a propaganda que contém apenas
sugestão e não contém informação.
Os elementos de equilíbrio entre a liberdade de criação e de informação dão
parâmetros para o exercício da comunicação social, contrapostos às garantias individuais,
cujo rol se encontra a defesa do consumidor.
364
LEOPOLDINO FONSECA, João Bosco, Cláusulas abusivas nos contratos. 2.ed. Rio de Janeiro: Forense,
1995, p .198.
365
MEIRELLES, Hely Lopes, apud CENEVIVA, Walter. Publicidade e Direito do Consumidor. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais. 1991.p. 71.
134
Por sua vez, o artigo 37 do Código de Defesa do Consumidor, cuida da publicidade
enganosa e da publicidade abusiva. O § 1º define a publicidade enganosa:
É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter
publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo,
mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da
natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem,
preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços.
O § 2º define a publicidade abusiva:
É abusiva, dentre outras, a publicidade discriminatória de qualquer
natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se
aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança,
desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor
a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança.
O conteúdo da publicidade é formado por informação e por sugestão, o caráter de
sugestão não pode ser exclusivo e precisa ser destacado na informação para que o
consumidor possa ser capaz de diferenciar uma da outra. 366
Na sugestão que a publicidade enganosa pode dar lugar a uma prática de concorrência
desleal, que alterará ou falseará de forma considerá-la a concorrência. Contudo é difícil
determinar o momento em que a publicidade enganosa dará lugar à prática de concorrência
desleal, sendo necessário que a transferência potencial de consumidores do produtor alvo da
prática para o produtor responsável pela publicidade seja considerável a ponto de pôr em
risco a concorrência de tal concorrente.
Restando evidente que a liberdade do consumidor, que é considerado destinatário
final das normas concorrenciais, é a estruturada geralmente ao redor do sistema de mercado
livre, as instituições permitem aos consumidores eleger os bens e serviços que lhes dêem
maior satisfação, ainda através da liberdade de comprar o que quer, o consumidor pode
influir mediante sua demanda sobre os planos de produção, condicionando-os para as
atividades para as quais haja maior procura.
Pode-se afirmar que as duas legislações têm princípios que de pode considerar como
comum, como por exemplo, a idéia de que o sistema de mercado se justifica pela capacidade
de produzir mais e melhores os bens de consumo e ainda promover melhor a distribuição da
366
FILHO, Salomão Calixto. Condutas tendentes à dominação dos mercados. São Paulo: Malheiros, 2001, p.
96.
135
riqueza e que indicando o bem-estar do consumidor como objetivo econômico a ser
alcançado pela Lei de Defesa da Concorrência.
Neste sentido Daniel Firmato de Almeida Glória é fundamental “Não restam dúvidas,
pois, de que é o consumidor o “personagem principal” da obra “direito da concorrência.” 367
A política de defesa da concorrência e política de relações de consumo bem
elaboradas apresenta caminhos complementares a promover o bem estar dos consumidores.
4.3
DEFESA DO CONSUMIDOR E DA LIVRE CONCORRÊNCIA ATRÁVES DO
CADE – CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA
O CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica foi criado pela lei
4137/62, mas, conforme crítica da doutrina mais autorizada restava como um órgão
inoperante, sem maior força, que sequer possuía natureza de autarquia. A Lei 8884/94,
visando conferir maior estrutura e celebridade ao órgão, revestiu-o de natureza autárquica,
motivo pelo qual não mais subsistem dúvidas concernentes ao órgão administrativo. 368
Após a sua transformação em autarquia federal o CADE foi vinculado ao Ministério
da Justiça, passando a exercer, de fato, uma tutela administrativa, assim atualmente não
procede mais discussão absolutamente nenhuma sobre a natureza do CADE e a importância e
efetividade das funções exercidas por ele.
O Estado intervém nas relações negociais para reprimir o domínio de mercado,
prevenir e reprimir as infrações econômicas e o aumento arbitrário dos lucros, dentre outras e
o fez através do CADE, aplicando para tanto as disposições da lei que a instituiu e os
princípios constitucionais da Ordem Econômica.
O Código de Defesa do Consumidor integra o SNDC - Sistema Nacional de Defesa
do Consumidor, SDE – Secretaria de Direito Econômico, por meio de seu DPDC Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor e os demais órgãos federais, estaduais,
do Distrito Federal, municípios e entidades civis de defesa do Consumidor.
367
GLÓRIA, Daniel Firmado de Almeida, A livre concorrência como garantia do consumidor. Belo Horizonte:
Del Rey; FUMEC, 200, p.118.
368
PROENÇA, José Marcelo Martins. Concentração empresarial e o direito da concorrência. Dissertação de
mestrado. São Paulo: Universidade de São Paulo, 1999. p. 61.
136
Todos os órgãos acima referidos atuam no controle das estruturas de mercado que
resultem em concentração econômica ou de qualquer modo possam afetar a livre
concorrência e afetar o direito do consumidor, quanto ao controle das condutas, que objetiva
reprimir as infrações à ordem econômica.
A autonomia de autarquia do CADE confere ao mesmo maior poder de ação,
passando a englobar funções e competências no âmbito administrativo, cabendo-lhe intervir
nas negociações empresariais, sem que haja necessidade da anuência de outros órgãos
governamentais. No entanto o CADE continua sujeito à autoridade do Poder Judiciário, suas
decisões podem ser submetidas ao crivo da autoridade judiciária.
O CADE é um órgão julgador, que decide se houve ou não infração por parte da
empresa, ou empresas, em suas condutas, impondo ou não multas, e determinando cessação
de práticas. Decide também, sobre a legitimidade da concentração de poder econômico,
avaliando se os efeitos de determinados atos jurídicos – fusão, incorporação de empresas ou
qualquer outra forma de integração – restringem, ou poderão restringir, ou eliminam, por
qualquer forma, a concorrência. 369
Conforme-se na dicção do caput do art. 1º da Lei do CADE, deve este órgão pautar-se
pelos princípios que regem a Ordem Econômica Brasileira, pois, direcionam a aplicação de
todas as outras normas atinentes à matéria e dispostas na lei nº. 8.884/94.
O CADE deve pautar-se pelos ditames constitucionais, totalmente desdenháveis, pois,
não é a legislação infraconstitucional que determina quando ela própria deve orientar-se
pelos princípios constitucionais e sim, a própria Constituição Federal que orienta as normas
Constitucionais quando estabelece princípios para o sistema.
Entende-se que o CADE é uma entidade com caráter administrativo de função quase
judicial, quer dizer apenas maiores formalidades na preparação e edição de seus respectivos
atos, tendo em vista que tais formalidades são muito semelhantes às praticadas no Judiciário.
O CADE tem a tarefa de julgar os processos, de três formas, seja preventiva,
repressiva e educativa. De forma preventiva corresponde à análise dos atos de concentração,
ou seja, à análise das fusões, incorporações e associações de qualquer espécie ente agentes
econômicos. O papel repressivo corresponde à análise das condutas anticoncorrenciais
369
GLÓRIA, Daniel Firmado de Almeida, A livre concorrência como garantia do consumidor. Belo Horizonte:
Del Rey; FUMEC, 2003. p.84.
137
(cartéis, vendas cassadas, preços predatórios e etc.). O papel educativo se desenvolve através
de seminários, cursos e palestras, onde o CADE tem a função de educar a coletividade.
A importância do CADE está na sua capacidade de dificultar entradas de certas
empresas, as quais vêm com intenções de investimentos nitidamente abusivo através de
punição de empresas que tenham essa intenção e no zelo pela livre concorrência no mercado
recém aberto ao capital livre internacional.
A análise obrigatória a ser efetivada pelo CADE, não consiste apenas em uma simples
averiguação das condutas prejudiciais à concorrência, previstas na lei antitruste foram ou não
praticadas, mas na efetiva adoção de medida que visem à suspensão do ato prejudicial, bem
como a penalização do agente que lhe deu causa. Uma vez constatada a prática de conduta
que prejudique de qualquer forma a livre concorrência, pode o CADE determinar o
desfazimento do ato ou contrato, ou autorizar a sua efetivação, condicionada à realização de
um Compromisso de desempenho que tem como objetivo a correção do ato impugnado.
Deve o CADE, no exercício das atribuições que a lei lhe confere, exercerem o
controle sobre a iniciativa privada quando da prática, por parte desta, de infrações à Ordem
Econômica, infrações estas carreadas no artigo 20 da lei nº. 8.884/94, já estudadas, podendo
o CADE, para tanto, promover, através de sua procuradoria a execução judicial de seus
julgados, ou, na forma do artigo 12, parágrafo único, solicitar ao Ministério Público Federal
que também promova a execução de seus julgados ou do compromisso de cessação, bem
como a adoção de medidas judiciais cabíveis na forma da lei, no exercício da atribuição
estabelecida pela alínea b, do inciso XIV, do artigo 6º da Lei complementar nº. 75 de 1993.
Percebe-se claramente pelas disposições do artigo 20 da Lei do CADE que, a
principal finalidade é coibir condutas lesivas à ordem econômica brasileira, reprimindo os
atos abusivos à concorrência e ao exercício da livre iniciativa, podendo, para tanto, impor
penas às mais diversas, na forma do artigo 23 da lei retro-mencionada, como multas,
proibição de contratar com instituições financeiras oficiais, participar de licitações e tantas
outras.
Na aplicação destas penalidades, o CADE deverá observar os requisitos de
culpabilidade, fazendo uma alusão à culpabilidade em matéria penal, conquanto estas
sanções não tenham esta natureza do infrator, dispostas no artigo 27 de sua lei.
Função de extrema importância, no entanto, encontra-se designada no artigo 54 da
Lei do CADE, que ampliou a atuação da lei, define ser da competência deste apreciar todo e
qualquer ato que, de qualquer forma possa vir a limitar, prejudicar a livre concorrência ou
resultar na dominação de mercado relevante de bens e serviços, considerando-se, que o
138
percentual igual ou acima de 20% de dominação de um mercado é que é considerado para
efeitos de análise da referida autarquia, bem como a ordem repressiva, validando os contratos
entre particulares que possam limitar ou reduzir a concorrência.
O CADE pode autorizar um ato e concentração que tenha efeitos anticoncorrenciais
desde que tal ato tenha por objetivo aumentar a produtividade, melhorar a qualidade de bens
e serviços, propiciar a eficiência e o desenvolvimento tecnológico ou econômico. Necessário
que os benefícios sejam distribuídos entre os particulares e os usuários ou consumidores, que
não haja eliminação da concorrência e que ato não implique restrições da concorrência que
não sejam absolutamente necessárias para que se atinjam os objetivos visados.
Somente será permitida a concentração se primar por vantagens econômicas e sociais,
pois necessita compensar os malefícios que ocasionará à concorrência e aos consumidores.
Em muitos casos, o objetivo maior decorrente de algumas concentrações empresariais
é apenas o de controlar, limitar ou manipular a concorrência de forma a se assegurar o
domínio da produção e da distribuição no mercado. Por outro lado, convivendo juntamente
com esses processos agressivos de crescimento das empresas, observa-se também que
algumas delas unem-se ou concentram-se no intuito de se defenderem, hipótese que ocorre
quando a concentração passa a assegurar a sobrevivência da própria empresa ou o controle do
próprio mercado nacional tomado por multinacionais estrangeiras.
Desta forma, se o bem jurídico tutelado pela lei é a própria ordem econômica, logo
qualquer ente, inclusive as instituições financeiras, deve-se sujeitar-se as decisões do CADE,
nos eventos de concentração econômica, proveniente de fusões, conglomeração ou
incorporações. Resultam a necessidade de uma análise do CADE para verificação da
manutenção das condições de concorrência e das demais previstas em lei, como forma
necessária de se autorizar o funcionamento do grupo econômico decorrente do ato de
concentração sob análise.
Todas as operações que resultem numa concentração econômica de 20% de um
determinado mercado ou em que o faturamento bruto anual de qualquer dos participantes seja
de quatrocentos milhões.
139
4.3.1 Decisões administrativas do CADE
Vários são as decisões proferidas pelo CADE, vale ressaltar alguns casos: 370
1) Caso Ambev:
O ato de concentração nº. 08012.005846/99-12, em que envolvia a operação de
agrupamento societário das empresas Companhia Antártica Paulista – Indústria Brasileira de
Bebidas e conexos (Antártica) e Companhia Cervejaria Brahma (BRAHMA), para
constituição da AMBEV no setor de bebidas e de malte.
Para efeito de análise do caso, três mercados relevantes foram afetados pela
operação: o mercado de águas, o mercado de refrigerantes e o mercado de cervejas.
Após análise das características de cada mercado relevante, entendeu-se que a
probabilidade de exercício de poder de mercado após a operação era muito baixa nos
mercados de águas e refrigerantes. No entanto, no mercado de cervejas, essa probabilidade
foi considerada alta o suficiente para levantar preocupações do CADE em relação à
aprovação da operação.
Assim, a alta concentração de mercado que a operação acarretou em todos os
mercados relevantes definidos e o fato de que o mercado de cervejas possui elevadas
barreiras à entrada, ligadas a algumas características do mercado tais como a diferenciação de
produtos (a Ambev reuniu três das maiores marcas de cerveja no Brasil) e a distribuição
exclusiva, levaram o CADE à conclusão de que a operação limitava a concorrência no
mercado relevante de cervejas.
A partir da análise das eficiências que poderiam advir da operação concluiu-se que a
constituição da Ambev resultaria em aumento da produtividade, melhoria da qualidade dos
bens ofertados e geraria eficiências e desenvolvimento tecnológico capazes de compensar os
prejuízos potenciais à concorrência advindos da associação.
370
Disponível hptt/www. cade.gov.br. Acesso em 27 de jul de 2008.
140
O TCD determinou a implementação do chamado “conjunto integrado de medidas”
que compreendeu a venda da marca Bavária, a alienação de 5 (cinco) fábricas e o
compartilhamento da distribuição. Além disso, a AMBEV deveria compartilhar sua rede de
distribuição em cada um dos cinco mercados geográficos relevantes definidos, desativar as
demais fábricas apenas mediante oferta pública, manter o nível de emprego, sendo que
eventuais dispensas associadas à reestruturação empresarial deveriam ser acompanhadas de
programas de retreinamento e recolocação, não impor exclusividade aos pontos de venda e
adotar todas as medidas visando alcançar as eficiências pertinentes à fusão.
As determinações tiveram como um de seus principais objetivos permitirem a entrada
quase imediata de um novo participante no mercado, sem que o mesmo tenha todos os custos
associados à criação de uma rede de distribuição, a construção de uma rede fabril e a fixação
de uma marca, além de propiciar o acesso de pequenas cervejarias à distribuição da AMBEV.
Assim, conforme autorizado pelo artigo 54 da Lei nº. 8.884/94 e em razão das medidas
estruturais impostas pelo CADE, das eficiências invocadas e dos benefícios alegados
preencherem as condições previstas na legislação em comento, o CADE autorizou com
restrições a operação que resultou na criação da Companhia de Bebidas das Américas –
AMBEV.
2) Caso Nestlé:
O ato de Concentração nº. 08012.001697/2002-89, que tinha como requerentes a
Nestlé Brasil Ltda e Chocolates Garoto S/A, como empresa subsidiária brasileira do grupo
suíço Nestlé, submeteu à apreciação do Cade a aquisição da empresa Chocolates Garoto S/A.
Como em outros casos, a definição do mercado relevante exigiu uma análise
aprofundada do caso. Duas fontes diferentes de informação serviram de base para estabelecer
as fronteiras do mercado relevante: a) dados provenientes da aplicação da metodologia PEM
(Price Elasticity Model), comumente utilizada em estudos de marketing pelas empresas; b)
dados de varejo Nielsen que serviram de base para estimações econométricas da demanda de
chocolates. Ambos os estudos tinham como objetivo conhecer a reação do consumidor a um
potencial aumento de preços dos chocolates Nestlé/Garoto.
O Conselheiro-Relator definiu quatro mercados relevantes afetados pela operação: (i)
o mercado de balas e confeitos sem chocolates, (ii) o mercado de coberturas de chocolates,
(iii) o mercado de achocolatados e (iv) o mercado de chocolates sob todas as formas,
excluindo os chocolates artesanais.
141
Quanto à dimensão geográfica, todos os mercados relevantes foram definidos como
nacionais. As Requerentes propuseram uma definição mais abrangente da dimensão
geográfica do mercado de chocolates sob todas as formas, que incluía todos os países
membros do Mercado Comum do Sul (Mercosul). No entanto, o Plenário entendeu que as
restrições relativas à existência de restrições às importações, decorrentes da perecibilidade do
produto, o gosto do consumidor brasileiro e sua fidelidade à marca e a exigência de uma rede
de distribuição nacional inviabilizavam a entrada de produtos provenientes de outros países
do Mercosul, notadamente da Argentina, na escala suficiente para disciplinar os preços de
chocolates no Brasil.
Não foram vislumbrados problemas nos mercados de balas e confeitos e de
achocolatados. No primeiro, a participação de mercado resultante da operação (2,7%) seria
incapaz de conferir poder de mercado às Requerentes; e a elevada participação da Nestlé no
segundo mercado não resultava da operação, sendo que o aumento da participação da líder
(Nestlé/Garoto) de 58,1% para 61,2% não alterou substancialmente a estrutura de oferta,
permanecendo o mercado com as condições competitivas similares às existentes antes da
operação.
No mercado de coberturas de Chocolate, no entanto, entendeu-se que a operação
introduziu incentivos para condutas colusivas ou, no mínimo, condutas de colaboração tácita
entre as duas únicas ofertantes do mercado, não sendo a rivalidade entre os dois concorrentes
remanescentes condição suficiente para proteger os clientes de práticas abusivas.
No mercado de produtos de chocolate em geral, a Garoto era a terceira maior empresa
do Brasil, enquanto a Nestlé e a Kraft Foods (Lacta) alternavam-se na posição de liderança. A
aquisição aumentava significativamente a concentração horizontal no mercado de chocolates
e Outras questões foram analisadas, incluindo a estimativa das barreiras à entrada e as
perspectivas de expansão de marcas rivais como Mars e Hershey, que formavam uma franja
competitiva constituída por grandes empresas multinacionais.
O CADE concluiu que as importações não eram fatores significativos no mercado e
que havia barreiras a novas entradas em razão das dificuldades para garantir a distribuição por
atacado e devido à diferenciação do produto sustentada por elevados gastos em propaganda.
Além disso, foram descartadas as eficiências apresentadas pelas empresas, uma vez que ou
não seriam específicas à operação e poderiam ser obtidas de outras formas menos lesivas à
concorrência, ou porque as eficiências decorriam de transferências financeiras.
Assim, o Plenário concluiu que a transação deveria ser rejeitada porque nem a
esperada redução nos custos variáveis (eficiências), nem o grau de rivalidade remanescente no
142
mercado, seriam suficientes para evitar os aumentos de preço ao consumidor de chocolate, e
não havia qualquer remédio estrutural capaz de reduzir os efeitos negativos da elevação da
concentração.
Determinando o CADE à Nestlé que vendesse os Chocolates Garoto a um concorrente
que tivesse participação inferior a 20% no mercado relevante.
3) Caso Cosipa e Libra Terminais:
O ato de concentração nº. 08012.007443/1999-17, em que envolvia Santos Brasil S/A
- TECON Terminal de Contêineres, Companhia Siderúrgica Paulista - COSIPA e Libra
Terminais S/A-T-37.
O Processo Administrativo foi instaurado pela Secretaria de Direito Econômico – SDE
em 27/08/1999, em desfavor dos terminais portuários do Porto de Santos para apurar as
práticas associadas à cobrança de valores (a chamada THC2) para a transferência de
contêineres para outros recintos alfandegados, o que, supostamente, estaria limitando o acesso
de novas empresas ao mercado de armazenagem alfandegada; criando dificuldades ao
funcionamento de empresas concorrentes; regulando mercados por meio de acordos para
limitar ou controlar a prestação de serviços; e impondo preços excessivos.
Os mercados relevantes afetados pela prática foram dois. O primeiro é o mercado de
movimentação de cargas transportadas em contêineres, que compreende os serviços de carga e
descarga das embarcações e os serviços em terra (movimentação do costado do navio ao
portão do terminal). O segundo é o mercado de armazenagem alfandegada de mercadorias em
contêineres, que compreende a armazenagem até o desembaraço aduaneiro das mercadorias.
Na dimensão geográfica, esses mercados restringiram-se à área de influência do porto
de Santos, compreendida toda a área da Baixada Santista, no Estado de São Paulo.
A análise deste caso ateve-se à investigação dos possíveis efeitos anticoncorrenciais da
cobrança, por parte de operadores de terminais portuários, de valores para a transferência de
contêineres desembarcados no Porto de Santos para recintos alfandegados. Tais valores
restringiriam a concorrência no mercado de armazenagem de contêineres nos recintos
alfandegados (designados à época da instauração do PA como Terminais Retroportuários
Alfandegados – TRA, Instalações Portuárias Alfandegadas – IPA e Estações Aduaneiras do
Interior – EADI), uma vez que os custos da armazenagem poderiam ser elevados
artificialmente por meio do pagamento ao qual se condicionou a transferência dos contêineres.
143
Como os terminais portuários integraram verticalmente a atividade de armazenagem
alfandegada, o problema de concorrência decorrente da cobrança da Taxa de Liberação de
Container (TLC ou THCs) estaria associado à capacidade que o Terminal Portuário teria de
utilizar essa cobrança para eliminar ou disciplinar seus rivais no mercado de armazenagem e,
por meio dessa eliminação ou disciplina arrefecer a intensidade da concorrência, gerando
potencialmente, os efeitos previstos no artigo 20 da Lei 8884/94.
Os Representados apresentaram estudos, laudos técnicos e simulações, tentando
justificar sua conduta, alegando que:
(i) os Terminais Portuários incorrem em custos para prestar serviços aos Recintos
Alfandegados, custos esses que têm que ser suportados por alguém;
(ii) o valor da THC2 corresponde ao diferencial de custos provocado pela segregação e
entrega imediata dos contêineres destinados a outros não cobertos pela “box rate”13; e
(iii) o valor cobrado corresponde ao custo de operações físicas e administrativas
necessárias para a entrega de contêineres, não cobertas pela “box rate”.
Em resumo, os operadores de terminais portuários alegavam que a cobrança da THC2
era uma conduta competitiva legítima, resultante da dinâmica natural do mercado e, mesmo
que os terminais não-integrados fossem excluídos, isso não seria devido a uma conduta
anticoncorrencial, mas sim ao resultado natural da nova configuração do mercado, que seria a
de firmas integradas verticalmente.
O CADE concluiu que nenhuma dessas razões era forte o suficiente para legitimar a
prática adotada, dentre outras razões porque nenhum dos estudos, laudos e simulações
conseguiram demonstrar que as alegações dos Representados procediam.
O caso foi entendido como uma prática de elevação dos custos dos rivais, viabilizada
pela integração vertical para frente dos terminais portuários. A TLC tem o efeito de criar um
limite inferior para os preços praticados pelos Recintos Alfandegados não integrados
verticalmente, limitando assim a concorrência nesse mercado. Sem guardar proporção com os
custos efetivos da movimentação de contêineres, a TLC eleva os custos de todas as indústrias
que importam insumos, reduzindo o bem-estar dos consumidores e prejudicando a
competitividade da indústria brasileira.
O CADE condenou as Representadas por infração à ordem econômica, determinando:
(i) a imediata cessação da cobrança de liberação de contêineres dos recintos alfandegados; (ii)
o pagamento de multa correspondente a 1% (um por cento) de seu faturamento bruto no ano
anterior à instauração do processo e, no caso da Usiminas, que explora inúmeras atividades
não relacionadas à atividade portuária, que a multa deveria incidir sobre o faturamento bruto
144
referente apenas à sua atividade portuária no terminal em questão; (iii) a publicação do teor da
decisão em meia página de jornal de grande circulação nacional, por dois dias seguidos e em
duas semanas consecutivas; além de outras determinações.
Foi determinado, ainda, o encaminhamento de cópia da decisão à Agência Nacional de
Transportes Aquaviários – ANTAQ, à Secretaria de Direito Econômico do Ministério da
Justiça – SDE/MJ e à Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda –
SEAE/MF.
Ressaltando que todas as empresas acima descritas não aceitaram as decisões do
CADE e recorreram ao Poder Judiciário para tentar anular a decisão administrativa do
mesmo.
Sem dúvida o CADE tem competência para impor punições àqueles que, de qualquer
forma, praticarem atos lesivos à ordem econômica, na forma do que dispõe sua legislação
específica.
Prevê a lei as sanções administrativas a serem impostas contra os empresários
condenados pela prática de infração à ordem economia: multa, publicação pela empresa de
extrato da decisão condenatória, proibição de contratar como Poder Público ou com
instituições financeiras oficiais, inscrição no Cadastro Nacional de Defesa do Consumidor,
recomendação de licenciamento obrigatório de Patente titularizada pelo infrator, de negativa
de parcelamento dos tributos ou cancelamento de beneficio fiscal, bem como a determinação
de atos societários como cisão ou transferência de controle compulsório.
As decisões administrativas condenatórias, proferidas pelo CADE, são títulos
executivos extrajudiciais e comportam execução específica quando impõem obrigação de
fazer ou não fazer, podendo o juiz para isso decretar a intervenção da empresa.
Não pode o Poder Judiciário se abster de examinar quaisquer pedidos, pelos órgãos
devidamente legitimados para tal, conforme o art. 29 da Lei do CADE, quando se argüir
ofensa à ordem econômica. Traduz claramente este artigo que quaisquer prejudicados, por si
ou pelos legitimados pelo artigo 82 da Lei nº. 8078/90, poderão ingressar em juízo para
defenderem seus direitos ou interesses que julgarem ofendidos.
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, inciso XXXV, dispõe que, "[...] a lei
não excluirá da apreciação do poder judiciário lesão ou ameaça a direito.", conseqüentemente,
toda e qualquer lesão, ou ameaça de lesão à estabilidade da Ordem Econômica poderá ser
apreciada pelo Poder Judiciário, independente de ter sido questionada em qualquer área
administrativa. Em última ratio, o juiz decide, pois, possui todos os poderes constitucionais
necessários a isto.
145
Não resta dúvida de que, no confronto CADE x JUDICIÁRIO, em que pese o CADE
poder, por intermédio dos poderes que lhe foram conferidos, até executar suas decisões,
poderá o Judiciário desconstituir qualquer decisão proveniente do mesmo, ou ratificar, com
base no artigo 5º, inciso XXXV da Constituição Federal de 1988. 371
Ademais, cumpre acrescentar que, o Judiciário deverá sempre observar a
constitucionalidade dos atos promovidos pelo poder executivo, no tocante ao âmbito de
intenção no domínio econômico, como sendo próprio de sua esfera ou não. É desta forma que
ao Judiciário caberá analisar quaisquer formas de intervenção do Estado no domínio
econômico, já que o Estado deve sempre dirigir-se, no tocante à atuação estatal, pelo
princípio da subsidiariedade, restringindo sua atuação ao necessário ao desenvolvimento de
funções relacionadas ao serviço público, ou, aos ditames do artigo 173 da Constituição
Federal de 1988, devendo, se assim for necessário, decretar a inconstitucionalidade destas
interferências.
O problema que surge em relação às decisões do Poder Judiciário é que muita vezes
o aplicador da Lei não é especialista em economia ou tem pouco conhecimento, deixando em
suas decisões prevalecer apenas o direito individual, deixando de levar em consideração a
realidade social e atual do problema, que muitas vezes é bem maior que o problema
individual que está sendo discutido na oportunidade.
De maneira que o aplicador do direito aplica a lei levando em consideração o
interesse individual e não o coletivo e o interessante para o direito econômico é a
coletividade e o social, pois todas as decisões serão diretamente refletidas na questão
econômica do país.
A atuação do CADE, desde meados dos anos 90, vem se consolidando de forma a já
não se vislumbrar “surtos” de aplicação da Lei Antitruste, mas sim uma linha continua de
atuação. 372 Sempre no interesse de impedir as práticas anticoncorrenciais e coibir o abuso do
poder econômico, objetivando o desenvolvimento econômico do país de forma licita e clara,
sem prejuízos a qualquer das partes integrantes da relação consumerista.
371
POOP, Carlyle.VIEIRA, Edson. Comentários à Nova Lei Antitruste. Curitiba: Juruá, 1994, p. 38.
FORGIONI, Paula Andréa. Os Fundamentos do Antitruste. 2. ed.rev. Atual. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2005. p.144.
372
146
Pode-se afirmar que o CADE está cumprindo com sua função de orientador de
mercado, orientado, fiscalizando prevenindo e apurando os abusos de poder econômico,
exercendo o papel tutelador da prevenção e repressão do mesmo.
Com as tendências mundiais modernas o CADE ofereceu uma nova configuração e
consolidação do direito da concorrência, no entanto atualmente o CADE precisa ser mais
fortalecido em razão dos entes setoriais.
Atualmente na prática o aplicador do direito tem se atido mais ao objeto e aos efeitos
potenciais de forma descentralizada, deixando de lado a interpretação literal, vinculando as
doutrinas econômicas, eis que a legislação às vezes se mostra insuficientes para acomodar a
realidade a ser disciplinada pelo antitruste.
Tércio Sampaio Filho afirma que é impossível de ser dominada por saberes genéricos
e formais, daí a necessidade de especialização em áreas de atuação demarcadas, nas quais o
conhecimento técnico exige uma formação especial. 373
A dúvida está se a aplicação da Lei Antitruste será aplicada à econômica como um
todo ou somente em setores específicos do mercado, deve-se estar alerta para os riscos desse
processo, eis que as regras da concorrência são mais eficazes do que a fragmentação em
vários setores, no entanto se a missão de zelar pela competição for fatiada entre os vários
setores da economia, o Brasil estará andando na contramão das tendências regulatórias atuais.
Ao que parece o problema não é somente de articular competências entre as agências
reguladoras e o CADE, mas de fazer uma inserção do CADE na nova configuração
regulatória do país.
Nesse sentido Calixto Sebastião Filho assevera que todos os setores cuja regulação
tem um fundamento concorrencial mínimo não escapam ao controle concorrencial, ocorre que
a aplicação dos princípios constitucionais e da própria lei concorrencial é diversa tratando-se
de setores regulados, o que é decorrente do caráter mais interventivo exigido do direito
antitruste em mercados mais concentrados. 374
A problematização existe no sentido de que não existem fronteiras entre a matéria da
regulação e da concorrência, sendo assim o CADE deve relativizar à aplicação do direito de
concorrência no caso de agências reguladoras, sopesando concretamente os valores da esfera
setorial com os princípios da ordem econômica constitucional.
373
FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Agências Reguladoras: Legalidade e Constitucionalidade. Revista
Tributária e de Finanças Públicas, São Paulo: ano 8, n 35, nov./dez, 2000.
374
Op cit.
147
Por fim nesses casos deve também haver proporcionalidade entre o sacrifício que leva
à aplicação restrita do antitruste e a finalidade almejada, utilizando-se da proporcionalidade.
Pedro Aurélio de Queiroz Pereira da Silva aduz que o principio da proporcionalidade,
funda-se em três pressupostos: a adequação, a necessidade e exigibilidade e a
proporcionalidade em sentido estrito. A adequação indica que a medida deve ser eficaz ao
alcance da finalidade a que se destina, a necessidade requer que tal medida seja menos
impactante ou menos gravosa dentre aquelas aptas à consecução da finalidade e a
proporcionalidade significa a ‘justa’ medida. 375
Independente do ente setorial, o CADE poderá e deverá utilizar dos meios adequados
para repreender a prática de atos anticoncorrenciais, pois na realidade as leis setoriais não
adotam a isenção da Lei Antitruste, ao contrário as respeitam, porém o CADE precisa ser
fortificado para poder dar resolução a todos os problemas dessas questões regulatórias, eis que
com o passar do tempo os entes setoriais podem abandonar as práticas legais e começar a
praticar os abusos anticoncorrenciais e o CADE precisa ser o suficientemente forte para
enfrentar tal situação.
375
Op cit.
148
CONCLUSÃO
A Constituição Federal de 1988 tem natureza mista, eis que se preocupa com os
princípios do liberalismo e com os ideais do socialismo, inclue a transparência, os direitos
individuais e civis, especialmente o direito à vida, à liberdade, à propriedade, eleições livres,
igualdade da lei e de direitos para todos os cidadãos.
Com o desenvolviemnto econômico do país e com as restrições que a estrutura
econômica passou a enfrentar, o Estado foi obrigado a intervir na tentativa de organizar a
vida econômica e social, havendo uma interimplicação e integração entre a constituição
política e a constituição econômica, eis que até aquele momento o cidadão tinha uma
liberdade plena, sem limites, o que muitas vezes atrapalhava o desenvolvimeto econômico da
nação, o sucesso na maioria das vezes era tido como individual, necessitando da assunção da
responsabilidade social por parte do Estado.
Momento em que começou haver mudanças no sentido de assegurar à nação a
unidade, a liberdade, à justiça, a intervenção mínima do Estado e o bem-estar social
econômico, deixando clara a nova ideologia era o bem comum entre a coletividade e não
somente individual, existindo uma auto-limitação por parte do Estado nos termos da
legislação constitucional.
A Constituição Federal de 1988 buscou compatibilizar a coexistência entre a
ideologia liberal com os ideais da justiça social, em nítido acolhimento de uma democracia
social, explicitado pela ligação do valor social do trabalho, à liberdade de iniciativa
econômica, a livre concorrência e a preocupação com o consumidor, que na realidade estava
sendo visto como a coletividade.
Com o Estado de bem-estar social, surgiu então a constituição econômica que pode
ser entendida como conjunto dos princípios fundamentais informadores da atividade e da
organização econômica do país, através dela terá os princípios a serem seguidos na atividade
econômica.
A Constituição Federal de 1988 define um modelo econômico de bem-estar social
previsto na Ordem Econômica, em seus artigos 170 e seguinte, porém necessário que os
fundamentos afirmados no artigo 1º e os objetivos definidos no artigo 3º venham a ser
plenamente realizados, garantindo a ordem econômica assegurar a todos existência digna.
Existe uma diferenciação em razão da nomenclatura utilizada pelos princípios, os
fundamentos e os objetivos da ordem econômica, pois a natureza jurídica de todos eles é
149
principiólogica, de maneira que a função jurídica de todos é de princípio, tendo por fim
assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social.
O princípio da livre iniciativa assegura não apenas a livre escolha das profissões e das
atividades econômicas seja o livre acesso ao mercado, mas também a autônoma eleição dos
processos ou meios julgados mais adequados à consecução dos fins visados.
O direito do consumidor trata-se da realização de um direito fundamental positivo de
proteção do Estado de acordo com o artigo 5º, inciso XXXII da Constituição Federal de
1988, sendo o consumidor identificado constitucionalmente como agente a ser
necessariamente protegido de forma especial, além de estar como princípio da ordem
econômica, o mesmo tem ainda a proteção do Código de Defesa do Consumidor, que é
composto por normas de ordem pública e interesse social, visando também estabelecer
condições mais favoráveis ao consumidor, frente ao poderio econômico dos fornecedores no
mercado de consumo.
O princípio da livre concorrência visa buscar chances iguais para a disputa do mercado
entre os particulares que desejarem exercer e permanecer numa atividade econômica no
território brasileiro, inclusive o direito de entrar na atividade econômica pode ser vista como
livre iniciativa e o direito de permanecer no mercado seria a livre concorrência, concluindo
que não pode uma existir sem a outra, pois ambas se complementam no mesmo objetivo,
visam tutelar o sistema de mercado e especialmente proteger a livre concorrência contra a
tendência da concentração capitalista.
A defesa da concorrência tende a espelhar o espaço reservado à intervenção estatal no
domínio econômico e, por conseguinte, à liberdade de atuação assegurada aos agentes
econômicos e combate às manobras tendentes à eliminação da concorrência, o que o faz
através da legislação, como a lei antitruste, sob a forma de proteção da coletividade contra os
efeitos perniciosos produzidos pelas práticas anticoncorrenciais, visando à prevenção e a
repressão aos abusos cometidos contra a ordem econômica, sempre tendo como principal
protegido o consumidor, seja seu titular imediato.
A concentração econômica representa uma falha na estrutura dos mercados, que
correspondem a uma situação nas quais os seus pressupostos de funcionamento não se fazem
presentes, tornando-o inoperacional e acabam por abalar a relação de consumo, classifica-se
como: concorrência perfeita e imperfeita, monopólio, oligopólio, oligopsônio e monopsônio.
O abuso de poder por sua vez comete o delito o empresário que se utiliza de seu
interesse pessoal, antepondo-o ao interesse geral e causando danos ou prejuízos à
coletividade, procurando dominar o mercado e eliminar a concorrência para obter lucros
150
excessivos, o indivíduo e as empresas acabam usando o poder econômico de que dispõem
para a satisfação de ambições pessoais, deixando de atender aos objetivos da ordem
econômica, prejudicando a economia do país e prejudicando claramente os consumidores que
são constitucionalmente protegidos.
Os cartéis, truste e dumping são coibidos pela legislação constitucional, sendo referido
entendimento extraído do artigo 173, § 4º, da Constituição Federal de 1988 que dispõe: “A lei
reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da
concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.” E da Lei Antitruste, a qual seguiu os
comandos normativos supremos da Constituição Federal e tem como objetivo a prevenção e
repressão aos abusos cometidos contra a ordem econômica.
A Constituição Federal de 1988 reconhece a existência do poder econômico,
prescrevendo ao Estado o dever, de por lei, reprimir seus abusos, na medida em que, por
vezes, este acaba sendo exercido de modo anti-social, sendo necessário à intervenção do
Estado para ver os objetivos da ordem econômica satisfeitos.
A Lei Antitruste dispõe em dois dispositivos, de um lado o artigo 20, que estabelece o
objetivo ou efeitos possíveis da prática empresarial ilícita e de outro lado o artigo 21, que
elenca diversas hipóteses em que a infração a ordem econômica pode ocorrer e lesionar a
atividade econômica.
O controle do abuso do poder econômico pode ser visto como instrumento de
intervenção estatal hábil a tutelar não apenas a livre iniciativa e a livre concorrência, mas
também os princípios sociais regentes na espécie, em especial a dignidade da pessoa humana,
a valorização do trabalho, a busca do pleno emprego, a redução das desigualdades regionais e
sociais e em especial a defesa do consumidor.
A defesa dos interesses dos consumidores não se desvincula do princípio instrumental
da livre iniciativa e consequentemente da livre concorrência, corolário daquele, bem como a
legislação infraconstitucional, o Código de Defesa do Consumidor e Lei Antitruste, os quais
comungam de muitos objetivos que paralelamente se apóiam e possuem objetivos bastante
próximos.
O consumidor é destinatário econômico final das normas concorrenciais, a
manutenção de um ambiente concorrencial possibilita preços mais acessíveis, possibilidade de
escolha entre produtos e serviços inovadores e amplo acesso à informação por parte do
consumidor.
A proteção jurídica de seus interesses se dá comumente pela defesa da concorrência,
assim a defesa do consumidor e da livre concorrência, enquanto princípios constitucionais
151
imprescindíveis para a implantação de políticas públicas baseadas nos objetivos que se interrelacionam de forma intensa, devendo a formulação de tais políticas públicas ser feita de
forma harmônica, para que não ocorra desvios de objetivos.
Por todos os motivos expostos é que não se pode dizer que exista uma
incompatibilidade entre as leis da concorrência e da defesa do consumidor, ainda mais na
qualidade de princípios constitucionais, os quais estão na mesma posição hierárquica, não
devendo de nenhuma maneira um sobrepor ao outro.
Geralmente não há incompatibilidade entre as legislações infraconstitucionais a
respeito do assunto em tela, no entanto podem ocorrer conflitos entre as mesmas, ao quais
deveram ser resolvidos pela interpretação do aplicador da lei, eis que o mesmo deverá
escolher a que de a melhor solução ao caso concreto, ou ainda utilizar-se das duas normas de
forma harmônica e integrada, com o objetivo de solucionar o problema no caso concreto da
melhor maneira possível.
Utilizará uma harmonia proveniente da interpretação sistêmica e integrada que deverá
ser realizada diante da aplicação das leis que melhor proteja o consumidor no caso concreto.
O legislador busca a aplicação conjunta, integrada e compatibilizada dos princípios da ordem
econômica, bem como de toda a legislação referentes ao mesmo assunto, a fim de garantir a
harmonia da ordem econômica.
O aplicador da lei além de interpretar os princípios e as normas de forma harmônica,
deve ainda utilizar-se do principio da proporcionalidade o qual concretiza o postulado
segundo o qual o Direito não se esgota na lei e sim deve representar a síntese da vontade
geral, seja o legislador precisa utilizar-se da proporcionalidade no momento de escolher qual
norma ou princípio aplicar no caso concreto, não esquecendo de que precisa se adequar às leis
aos princípios fundamentais do direito, pautado por maior intervenção estatal e pela
relativização das garantias individuais em prol do interesse coletivo.
De maneira que dentro desse contexto, o princípio da proporcionalidade desponta
como relevante instrumento de solução de conflitos na medida em que se apresenta como
mandamento de “otimização de princípios”, ou seja, como critério de sopesamento de
princípios quando estes conflitam em dada situação concreta.
A construção de uma política econômica que objetive harmonizar as relações de
consumo encontra-se intimamente relacionada à construção de uma política de defesa da
concorrência, tanto que os princípios da livre concorrência e da defesa do consumidor e
legislações sobre o assunto têm interesses em comum, sendo vários os artigos das legislações
que tem a mesma finalidade, o direito concorrencial visa a estabelecer o equilíbrio das
152
relações de mercado, buscando a equidade e a boa condução dessas relações, também tem
interesse em buscar a satisfação do consumidor.
Assim, pode-se afirmar que as duas
legislações têm princípios que pode considerar como comum, como por exemplo, a idéia de
que o sistema de mercado se justifica pela capacidade de produzir mais e melhores os bens de
consumo e ainda promover melhor a distribuição da riqueza e que indicando o bem-estar do
consumidor como objetivo econômico a ser alcançado pela Lei de defesa da concorrência,
ambas tem a mesma igualação valorativa.
Motivo que não se deve deixar a responsabilidade de proteção da livre concorrência
apenas para a legislação Antitruste e pelo CADE, mas também deve ser atribuído ao
consumidor o dever de juntamente colaborar no intuito de evitar as práticas
anticoncorrenciais que por fim acabem prejudicando o próprio consumidor.
O consumidor pode colaborar evitando adquirir produtos e serviços de empresas que
sabe que não são honestas, que não usam da ética negocial, de empresas que fazem parte de
cartéis, comprarem produtos falsificados, pois caso o consumidor não consuma ficará difícil
para as empresas aumentar os preços dos produtos e assim dominar o mercado.
O objetivo último da ordem econômica é a preservação do ambiente concorrencial
saudável, impedindo e coibindo a prática de condutas anticompetitivas, por agentes
econômicos, que seja deletéria ao consumidor e a sociedade como um todo.
O Estado deve atuar para garantir os direitos básicos da pessoa humana, deve agir
como propulsor do bem-estar social, sua política econômica deve voltar-se cada vez mais
para a justiça social. Devendo o aplicador da lei entender que a legislação em tela deve ser
compreendidas como complementares, eis que a concretização da defesa da concorrência
exige a concretização da defesa do consumidor.
Tudo com intuito de se formar um mercado transparente, saudável, harmônico e leal,
almejado pela maioria dos concorrentes e consumidores, onde exista pluralidade de
concorrentes, liberdade de escolha, respeito ao consumidor, qualidade de produtos e serviços
e insegurança com relação às posições dominantes, tornando viável o encontro de um ponto
de equilíbrio ente a liberdade e a proteção.
153
REFERÊNCIAS
ABREU, Manuel Coutinho de. Do abuso de direito. Porto Alegre: Ed. Livraria Almedina.
1999.
ALMEIDA, Carlos Ferreira de. Os direitos dos consumidores. Coimbra: Almedina, 1982.
ALMEIDA, João Batista de. A proteção jurídica do consumidor. 2. ed. São Paulo: Saraiva,
2000.
ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli de. Abuso do Direito e Concorrência Desleal. São
Paulo: Quartier Latin, 2004.
ARAÚJO, Luiz Alberto David e NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito
Constitucional. 4. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2001.
AZEVEDO, Fernando Costa. Defesa do Consumidor e Regulação. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2002.
ASCARELLI, Túlio. Teoria da la concurrencia y de los biens inmateriales. Barcelona:
Bosch. Casa Editora. 1970.
BAGNOLI, Vicente. Direito Econômico. 2. ed. são Paulo: Atlas, 2007.
BARBEIRI FILHO, Carlos. Disciplina jurídica da concorrência: abuso do poder
econômico. São Paulo: Resenha Tributária, 1984.
BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. São Paulo: Saraiva,
1996.
BARZOTTO, Luís Fernando. A Democracia na Constituição. São Leopoldo: Unisinos, 2003.
BASTOS, Aurélio Wander. Estudo sobre a recuperação legislativa de conceitos de direito
econômico no Brasil. Revista de Direito do Consumidor. =n. 23/24. São Paulo: RT, jul - dez,
1997.
______Estudos Introdutórios de direito econômico. Brasília: Brasília Jurídica, 1997.
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 1998.
______ Direito Econômico Brasileiro. São Paulo: IBDC, 2000.
______ Hermenêutica e Interpretação Constitucional, 2. ed. São Paulo: IBDC, 1999.
______BASTOS, Celso Ribeiro. MARTINS, Ives Gandra da Silva. Comentários à
Constituição do Brasil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2000.
154
BENJAMIN, Antonio Herman. A proteção do consumidor e patentes: o caso dos
medicamentos. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo: n. 10, 1994.
BOBBIO. Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. 10. ed. Brasília: Editora Universidade
de Brasília, 1999.
______Liberalismo e Democracia. Tradução Marco Aurélio Nogueira. São Paulo:
Brasiliense, 2000.
BOLSON, Simone Hegele. O direito do consumidor à luz da globalização e do mercosul.
BONATTO, Cláudio. MORAES, Paulo Valério Dal Pai. Questões Controvertidas no Código
de Defesa do Consumidor – Principiólogica, Conceitos, Contratos Atuais. Porto Alegre:
Livraria do Advogado Editora. 1999.
BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social. 7. ed. 2. Tiragem. São Paulo:
Editora Malheiros. 2004.
______Curso de Direito Constitucional. 7. ed. ver. e ampl. São Paulo: Editora Malheiros,
1997.
BOURGOIGNIE, Thierry. A política de proteção do consumidor – desafios à frente. Revista
de Direito do Consumidor, n. 41.
BRANCO, Nelson de Azevedo e BARRETO, Celso de Albuquerque. Repressão ao abuso do
poder econômico. São Paulo: Atlas, 1964.
BRITO, Beatriz Gontijo. Concentração de empresas no direito brasileiro. Rio de Janeiro:
Forense, 2002.
BRUNA, Sérgio Varella. Poder econômico e a conceituação do abuso em seu exercício. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.
_____ O poder econômico e a conceituação do abuso em seu exercício. 2. tir. – São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2001.
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador.
Coimbra Editora, 1987.
______Direito Constitucional. 2. ed. Almeidina. Coimbra. 1980.
CANOTILHO, José Joaquim Gomes e MOREIRA, Vital. Constituição da República
Portuguesa anotada, 2. ed. Coimbra: Coimbra ed. 1984.
CARVALHO, Carlos Eduardo Vieira de. Apuração de práticas restritivas à concorrência.
Revista do Ibrac, v. 1, n. 4, nov, 1994.
CARVALHOSA, Modesto. A Ordem Econômica na Constituição de 1969. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1972.
155
CAVALIERI FILHO, Sérgio. O direito do consumidor no limiar do Século XXI. Belo
Horizonte: 2000.
CENEVIVA, Walter. Publicidade e Direito do Consumidor. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1991.
CHAMBERLIN. Edward Hasting. Teoria de la Competência Monopólica. Tradução de
Crsitobal Lara Bautell e Victor L. Urquidi. México: Fondo de Cultura Econômica.
CHIARO, José Del; SILVEIRA, João Marcos; LEMES, Selma M. Ferreira. Fundamentos e
objetivos da legislação antidumping. Revista de Direito Econômico n. 25. Brasília: Conselho
Administrativo de Defesa Econômica – CADE, 1997.
COELHO, Fábio Ulhoa. Direito Antitruste Brasileiro – comentários à lei n.8884/94. São
Paulo: Saraiva, 1995.
______Curso de Direito Comercial. Direito de Empresa. 11. ed.rev. atual., São Paulo:
Saraiva, 2007.
COELHO, Inocêncio Mártines. A defesa da livre concorrência na Constituição de 1988.
Revista da Procuradoria Geral da Republica, São Paulo: 1995.
COMPARATO, Fábio Konder. A proteção do consumidor – importante capítulo de Direito
Econômico. Rio de Janeiro: Forense, 1978.
______Estudos e pareceres de direito empresarial. Rio de Janeiro: Forense, 1980.
______Direito Empresarial – estudos e pareceres. São Paulo: Ed. Saraiva. 1990.
CRETELLA JUNIOR, José. Comentários à lei Antitruste. Rio de Janeiro: Forense, 1996.
DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos da Teoria Geral do Estado. 9. ed. São Paulo:
Saraiva. 1982.
DEL MASSO, Fabiano. Direito Econômico. Rio de Janeiro: Elseivier, 2007.
DONATO, Maria Antonieta Zanardo. Proteção ao Consumidor. Conceito e extensão. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1993.
DUTRA, Pedro. A concentração do poder econômico: jurisprudência anotada. Rio de
Janeiro: Renovar, 1999.
______Livre concorrência e regulação de mercados: estudos e pareceres. Rio de Janeiro:
Renovar, 2003.
______O controle da concentração do poder econômico de mercado e a defesa da livre
concorrência in Livre concorrência e regulação de mercados – estudos e pareceres. Rio de
Janeiro: Renovar, 2003.
156
FACHIN, Luiz Edson, CRETELLA JUNIOR, José, DOTTI René Ariel. Comentários ao
Código do Consumidor. Rio de Janeiro: Forense, 1992.
FARIA, Werter R. Constituição econômica: liberdade de iniciativa e de concorrência. Porto
Alegre: Fabris, 1990.
______Direito da concorrência e o contrato de distribuição. Porto Alegre: Sergio Antonio
Fabris Editor, 1992.
FARIAS, Cristiano Chaves. A proteção do consumidor na era da Globalização. Revista do
Consumidor. n. 41. RT, jan/mar de 2002.
FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Congelamento de preços – tabelamentos oficiais
(parecer), in Revista de Direito Público, n 91, 1989.
______Da abusividade do poder econômico. Revista de direito econômico.
______Agências Reguladoras: Legalidade e Constitucionalidade. Revista Tributária e de
Finanças Públicas, São Paulo: ano 8, n 35, nov./dez, 2000.
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 31. ed.rev. ampl e
atual. São Paulo: Ed. Saraiva, 2005.
______Comentários à Constituição Brasileira. 2. ed. São Paulo: Saraiva. 1977.
FERREIRA, Waldemar. Tratado de Direito Comercial. São Paulo: Editora Saraiva. 1960.
FILHO, André Franco Montoro. PINHO, Diva Benevides. VASCONCELLOS, Marco
Antonio Sandoval. Manual de Economia. 3. ed.rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 1998.
______ Manual de Economia. 2. ed.rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 1992.
FILOMENO, José Geraldo Brito, Manual de Direitos do Consumidor. 5 ed., São Paulo:
Atlas, 2001.
FORGIONI, Paula Andréa. Os Fundamentos do Antitruste. 2 ed. rev. e atual. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2005.
______Os Fundamentos do Antitruste. 2 ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2000.
_____Os Fundamentos do Antitruste. 2. ed.rev. atual. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2003.
______Os Fundamentos do Antitruste. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998.
FRANÇA, Rubens Limong. Abuso de direito. Enciclopédia Saraiva do Direito. São Paulo.
Ed. Saraiva, 1997.
GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2001.
157
GASTALDI, J. Petrelli. Elementos de economia política. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 1995.
GLÓRIA, Daniel Firmado de Almeida, A livre concorrência como garantia do consumidor.
Belo Horizonte: Del Rey; FUMEC, 2003.
GOMES, Carlos Jacques Vieira. Ordem Econômica Constitucional e Direito Antitruste.
Porto Alegre: S.A. Fabris, 2004.
GOMES, Orlando. A crise do direito. São Paulo: Max Limonad, 1955.
GREMAUD, Amaury Patrick e MONTORO FILHO, André Franco, entre outros [et al].
Organizadores: PINHO, Diva Benevides e VASCONCELLOS, Marco Antônio Sandoval de.
Manual de Economia. 4 ed. São Paulo: Saraiva, 2003.
GUERRA FILHO, Willis Santiago. Processo Constitucional e Direitos Fundamentais. São
Paulo: Instituto Brasileiro de Direito Constitucional. Celso Bastos Editor, 1999.
GUIMARÃES, Ulysses. O liberalismo e a constituição de 1988: textos selecionados de Rui
Barbosa. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1991.
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988 (interpretação e
crítica). 8 ed. São Paulo: Malheiros, 2003.
______A Ordem Econômica na Constituição de 1988: Interpretação e crítica, 2 ed. São
Paulo: Editora Revistas do Tribunal, 1991.
______A Ordem Econômica na Constituição de 1988 (Interpretação e crítica). 11. ed.rev. e
atual. Malheiros Editores. São Paulo: 2006.
HABIBE, Taís Cruz. Cartel e conseqüências para o consumidor. Revista de Direito do
Consumidor nº. 52, São Paulo: RT, out. – dez. 2004.
_____Cartel e conseqüências para o consumidor. Revista de Direito do Consumidor nº. 52.
out./dez. 2000.
HORTA, Raul Machado. Constituição e ordem econômica e financeira. Revista de
informação Legislativa. Brasília: ano 28, n. 111, jul/set, 1991.
HUGON, PAUL. História das Doutrinas Econômicas. 14. ed. São Paulo: Atlas, 1980.
HUNT, E. K & SHERMAN, Hjorward J. História do Pensamento Econômico. 16. ed.
Petrópolis: Editora Vozes. 1998.
LEOPOLDINO DA FONSECA, João Bosco. Lei de proteção da concorrência (Comentários
à Lei Antitruste). Rio de Janeiro: Forense, 1995.
_____Cláusulas
abusivas nos contratos. 2 ed., Rio de Janeiro: Forense, 1995.
158
______Direito Econômico. Rio de Janeiro: Forense, 1995.
______Direito Econômico. 5. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2005.
LOMBARDINI, Siro. La legislazione antimonopolistica nella política econômica. La liberta
di concorrenza. Milano: Giuffrè, 1970.
LOPES, José Reinaldo de Lima. Direito da concorrência e direito do consumidor. Revista de
Direito do Consumidor. São Paulo: n. 34, abr/jun. 2000.
LORENZETTI, Ricardo Luis. Fundamentos do direito privado. Tradução Vera Maria Jacob
de Fradera. São Paulo: RT, 1998.
LUNARDI, Soraya Regina Gasparetto. A tutela no Código de Defesa do Consumidor diante
das garantias do devido processo legal. 1. ed. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2002.
LUÑO, Antonio E. Pérez. Derechos humanos, estado de derecho y constitución. 5. ed.
Madrid: Tecnos, 1995.
MAGALHÃES, Carlos Francisco. Leis que preservam a concorrência protegem o
consumidor. Revista de Direito Econômico. Brasília, Conselho Administrativo de Defesa
Econômica, ano II, n. 5, 1976.
MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 5. ed. ver. atual.
e ampl., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005.
______Contratos no código de defesa do consumidor. 3. ed. São Paulo: RT, 1999.
______Contratos no código de defesa do consumidor. 4. ed. São Paulo: RT, 2002.
MARQUES, Fernando de Oliveira. Direito Concorrencial – Aspectos jurídicos e econômicos.
São Paulo: 2003.
MARQUES, José Frederico. Direito penal econômico – princípios sobre a interpretação de
suas normas – do conceito do monopólio. São Paulo: RT, 1985.
MARTINEZ, Ana Paula. Revista de Direito do Consumidor. n 52. jan./março. 2005.
MONCADA, Luis S. Cabral de. Direito Econômico. 2. ed. Coimbra: Editora Coimbra, 1988.
MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. A Configuração do Abuso do Poder Econômico
(Apontamentos sobre a técnica da Lei nº. 8.884, de 11 de junho de 1994).
NETO, Manoel Jorge e Silva. Direito Constitucional Econômico. São Paulo: LTr, 2001.
NERY JUNIOR, Nelson. Os princípios Gerais do Código Brasileiro de Defesa do
Consumidor. Direito do Consumidor. 3. ed. São Paulo: RT, setembro/dezembro. 1992.
NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de Direito do Consumidor. 2. ed.rev. modif. Ampl.
São Paulo: Saraiva, 2005.
159
NUSDEO, Fábio, Curso de economia, introdução ao direito econômico. 3. ed. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2001.
______Curso de economia: introdução ao direito econômico. São Paulo: RT, 1997.
______ Fundamentos para uma Codificação do Direito Econômico. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 1995.
OLIVEIRA, Gesner; RODAS João Grandino. Direito e economia da concorrência. Rio de
Janeiro: Renovar, 2004.
OTTAVIANO, Vittorio. La Costituzione Econômica. Pádua: Cedam, 1967.
PASQUALOTTO, Adalberto. O Código de defesa do consumidor em face do novo Código
Civil. Revista de Direito do Consumidor. n 43.
PASSOS, Carlos Roberto Martins e NOGAMI Otto, Princípios de Economia. 3. ed. são
Paulo: Segmento & Co. Produções Gráficas Ltda. 2000.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 18. ed. Rio de Janeiro: Ed.
Forense, 1995, v. 1.
PESSOA, Leonardo Ribeiro. Os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade na
jurisprudência tributária norte-amerciana e brasileira. Jus navegandi, nov. de 2004.
Disponível em http://jus2.uol.com.br/doitrina/texto.asp?=5989. Acesso 27 de jul. 2008.
PETTER, Lafayete Josué. Princípios constitucionais da ordem econômica: o significado e o
alcance do art. 170 da Constituição Federal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2005.
POPP, Carlyle e ABDALA, Edson Vieira. Comentários à Nova Lei Antitruste, Curitiba:
Juruá, 1994.
PRADO, Luiz Regis. Direito penal econômico. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2004.
PROENÇA, José Marcelo Martins. Concentração empresarial e o direito da concorrência.
Dissertação de mestrado. São Paulo: Universidade de São Paulo, 1999.
______Concentração Empresarial e o Direito da Concorrência. São Paulo: Saraiva. 2001.
QUEIROZ, Raphael Augusto Sofiati. Os princípios da razoabilidade e Proporcionalidade
das Normas e sua Repercussão no Processo Civil Brasileiro. Rio de Janeiro: Lúmen Júris,
2000.
REIS, Henrique Marcello dos. Direito Econômico. São Paulo: Quartier Latin, 2005.
ROSSETTI, José Paschoal. Introdução à Economia. 18. ed. reest. Atual. E ampl. São Paulo:
Atlas, 2000.
160
______Introdução à Economia. 14. ed. São Paulo: Atlas, 1990.
SALOMÃO FILHO, Calixto. Regulação da atividade econômica. São Paulo: Malheiros
Editores, 2001.
______Direito Concorrencial – As estruturas. São Paulo: Malheiros, 1998.
______Direito Concorrencial – As estruturas. 2. ed. Malheiros Editores. São Paulo: 2002.
______ Condutas tendentes à dominação dos mercados. São Paulo: Malheiros, 2001.
SESSAREGO, Carlos Fernandez. Abuso del derecho. Buenos Aires: Editora Astrea. 1992.
SCANTIMBURGO, João de. História do Liberalismo no Brasil. São Paulo: Editora LTr,
1996.
SIDOU, J. M. Othon. Proteção ao consumidor. Rio de Janeiro: Forense, 1977.
SILVA, Américo Luis Martins da. A Ordem Constitucional e Econômica. 2. ed. Rio de
Janeiro: Ed. Forense, 2003.
_______ A Ordem Constitucional Econômica. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 1996.
______ Curso de Direito Constitucional Positivo. 5. ed. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 1989.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 22. ed.rev. e atual. São
Paulo: Malheiros Editores, 2003.
______ Curso de Direito Constitucional Positivo. 5. Ed. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 1989.
______ Comentário Contextual à Constituição. São Paulo: Malheiros, 2005.
______ Aplicabilidade das normas constitucionais. Ed. Revista dos Tribunais. São Paulo:
1968.
SMITH, Adam. A riqueza das nações: investigações sobre sua natureza e suas causas. 3. ed.
São Paulo: Nova Cultural, 1988.
SOARES, Orlando. Comentários à Constituição da Republica Federativa do Brasil. 8. ed.
Rio de Janeiro: Forense, 1995.
SOUTO, Marcos Juruema Villela. Desestatização:
Terceirizações. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 1997.
Privatização,
Concessões
e
SOUZA, Washington Peluso Albino de. A experiência brasileira de Constituição
Econômica. Revista de Informação Legislativa, n. 102, abr - jul. 1989.
161
______Primeiras linhas de direito econômico. 6. ed. São Paulo: LTr, 2005.
STRENGER, Irineu. Reparação do dano em direito internacional privado. São Paulo: RT.
1973.
REIS, Henrique Marcello dos. Direito Econômico. São Paulo: Quartier Latin, 2005.
TAVARES, André Ramos. Direito constitucional Econômico. 2. ed., São Paulo: Editora
Método, 2006.
______Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2002.
VAZ, Isabel. Direito Econômico da Concorrência. Rio de Janeiro: Forense, 1993.
______ As três vertentes do Direito de Concorrência. Revista de Direito Econômico n. 27,
Brasília: Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE, 1988.
Disponível em hptt/www.cade.gov.br. Acesso em 27 de jul de 2008.
Download

Texto na Íntegra 0,8MB