AS CONCEPÇÕES QUE OS ALUNOS TRAZEM DO ACASO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA O ENSINO E APRENDIZAGEM DA PROBABILIDADE E ESTATÍSTICA VARGAS, Saulo1; MORETTO, Geraldo2 Palavras-Chave: Concepções. Obstáculos. Ensino e Aprendizagem. Introdução Saber que concepções os alunos trazem sobre um tema a ser explorado, facilita o processo de ensino e aprendizagem de qualquer ciência. “A aprendizagem da ciência é um processo de desenvolvimento progressivo do senso comum. Só podemos ensinar e aprender partindo do senso comum que o aprendiz dispõe” (ALVES, 1985, p.12). Todos os alunos trazem contribuições e carregam uma bagagem que deve ser (re)conhecida nesse processo pelo professor, cabendo a ele desenvolver recursos que captem o conhecimento prévio do aluno acerca do assunto a ser estudado. As concepções que os alunos trazem são sempre carregadas de juízo de valor e por isso podem tornar-se verdadeiros obstáculos na aprendizagem. Bachelard (1996) aponta que os alunos possuem conhecimentos empíricos constituídos a partir do senso comum que podem impedi-los de alcançar o conhecimento científico. As experiências primeiras são apontadas por este autor como o primeiro obstáculo, pois estas são realizadas sem maiores reflexões e acima de qualquer crítica. São saberes oriundos de relações com o mundo social e natural onde atuam e são obtidos de modo não uniforme, uma vez que podem ser aprendidos com os amigos, com a família, através da mídia e por outros meios de experimentação, sem qualquer crítica, apenas para resolver/entender situações cotidianas. Certas concepções dos alunos podem tornar-se obstáculos para a construção do conhecimento científico quando não consideradas pelo professor como fatos no sistema de pensamento do aluno. Entretanto, se consideradas, servem de instrumento para a confrontação 1 Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências Naturais e Matemática da Universidade Regional de Blumenau – FURB, Blumenau/SC. e-mail: [email protected] 2 Pós Doutor em Biologia Molecular pela Universidade de São Paulo – USP. Professor e pesquisador da Universidade Regional de Blumenau – FURB, Blumenau/ SC. e-mail: [email protected] das concepções dos alunos com o conhecimento real do objeto em estudo até se chegar a uma verdade de concepções que melhor represente o objeto estudado. Libâneo (1994, p.153) enfatiza que “nenhum ensino pode ser bem sucedido se não partir das condições prévias dos alunos para enfrentar conhecimentos novos”. Nessa perspectiva o obstáculo presente pode ser um indicativo da distância entre a concepção prévia do aluno e o conhecimento científico, que pode ser diminuída à medida que se reconstrói essa concepção, tentando atingir o conhecimento científico por um processo de transição entre uma concepção prévia e outra mais conexa com o conceito científico. Dessa forma o estudo apresentado aponta algumas concepções que os alunos trazem do acaso a partir de suas experiências sociais e naturais e suas implicações para o ensino e aprendizagem da disciplina que contempla as estruturas do acaso, Probabilidade e Estatística. Metodologia O presente estudo caracteriza-se por uma pesquisa exploratória, desenvolvida pela análise de levantamento, uma vez que possibilitou o acesso as concepções dos alunos investigados acerca do acaso. A amostra foi composta por 45 acadêmicos dos Cursos de Biologia e Medicina Veterinária da Fundação Universidade Regional de Blumenau, que responderam a um questionário com perguntas abertas. A escolha desses cursos se deu pela acessibilidade e por suas matrizes curriculares contemplarem disciplinas voltadas ao ensino da probabilidade e estatística. A análise qualitativa dos dados foi feita a partir de um conjunto de técnicas de exploração de documentos denominada de análise de conteúdo. Resultados e Discussões O foco da análise de conteúdo neste estudo foi colocar em relevo as informações fornecidas pelas respostas apresentadas ao questionário, não contestando o mérito das concepções que os alunos trazem do acaso, mas sim contribuindo para um novo olhar no ensino e na aprendizagem da probabilidade e estatística. A partir da análise dos questionários respondidos foram verificadas três concepções que os alunos trazem do acaso, a partir de como inseriram o não causal em suas respostas. 1 - Consideram o acaso e o utilizam corretamente em suas justificativas. Isto significa que esses acadêmicos compreendem que não é possível conhecer as causas que influenciam na ocorrência de um determinado evento aleatório, e apresentam este fato nas justificativas de suas respostas. 2 - Consideram o acaso, mas não o utilizam (corretamente) em suas justificativas. O que significa que estes acadêmicos consideram a ocorrência de um determinado evento aleatório, mas não justificam corretamente que não é possível conhecer as causas que influenciam em tal ocorrência. 3 - Não consideram o acaso. Isto denota que esses acadêmicos não consideram a ocorrência de um determinado evento aleatório e que compreendem que é possível conhecer as causas que influenciam em tal ocorrência. Observa-se que essas concepções podem estar presentes em qualquer grupo, e quando não (re)conhecidas pelo professor, se tornam obstáculos no processo de ensino e aprendizagem da probabilidade e estatística, principalmente quando o aluno não considera o acaso ou não o utiliza corretamente para justificar a ocorrência de eventos aleatórios. Um aluno que não considera o acaso admitindo conhecer as causas que influenciam na ocorrência de eventos aleatórios, se julgará capaz de predizer a ocorrência de algum evento aleatório, mesmo este não sendo um evento certo. Seguramente, esta atitude o prejudicará na compreensão e interpretação das oscilações dos fenômenos aleatórios do mundo em que vive e na tomada de decisões. Desconhecer que os alunos trazem concepções prévias pode resultar em um ensino desvinculado de sua realidade, em que o professor, possivelmente, não conseguirá conduzir os alunos a uma aprendizagem significativa, onde estes sejam capazes de compreender os fenômenos da sociedade e de transformá-la para melhor. Conclusão Admitir não conhecer as causas que levam a ocorrência de um fenômeno aleatório é aceitar a existência do acaso. Admitir conhecê-las, excluindo as possibilidades de trapaça ou ingenuidade humana, é negar a existência do acaso, é atribuir uma causa para todo fenômeno aleatório. De acordo com os dados obtidos nesse estudo, percebe-se que essas são as principais concepções de acaso que os alunos trazem de suas experiências sociais e naturais, e que, quando não consideradas pelo professor, podem implicar em obstáculos de ensino e aprendizagem da probabilidade e estatística. A sondagem sobre as concepções dos alunos, antes de se iniciar um determinado conteúdo, auxilia o trabalho do professor, pois as concepções deixam de ser um obstáculo no processo de ensino e aprendizagem e passam a constituir um ponto de partida, onde o professor tem a possibilidade de adaptar o tema de forma a atender melhor as necessidades dos alunos. Referências ALVES, Rubem. Filosofia da ciência. 6 ed. São Paulo: Brasiliense, 1983. BACHELARD, Gaston. A formação do espírito científico: contribuição para uma psicanálise do conhecimento. Tradução de Estela dos Santos Abreu. Rio de Janeiro: Contraponto, 1996. LIBANÊO, José Carlos. Didática. São Paulo: Cortez, 1994.